- 2 -
C â n t i c o
Ele disse: «lava a tua casa retira os móveis todos aí quero dançar»
assim o Senhor dança nos salões vazios: semelhante a um turíbulo espalha o seu perfume
não fechei as portas abri as janelas: os ladrões evitam a casa iluminada
fiz tapetes de flores pus grinaldas na entrada pois é muito grande a festa de Um só convidado
espero nas traseiras e ceio no umbral o Senhor ocupa-me e a casa toda é sua
sirvo na bandeja as mais frescas iguarias os frutos colhidos nos dias de canseira
o Senhor dorme no leito e eu estou acordado o Senhor levanta-se e eu não posso dormitar
a água sai pura das suas lavagens lavo-me na água que o Senhor usou
de manhã o Senhor veste-se com a roupa que lhe trago come do que tenho – e assim eu empobreço
visto o meu Senhor e eu o alimento assim fico sem nada e Ele me sustém
que eu nunca me atrase à chamada do Senhor não vá Ele mostrar-me não precisar de mim
que eu não seja dos que perdem primaveras e outonos que não seja contado entre os ignorantes
enquanto o Senhor dança o meu coração exulta: que Deus este que não para de se mover por mim!
Carlos Poças Falcão (1951). Poeta.
- 3 -
5 março 2017 | ano 42 | Quaresma 1
[…] As alegrias mais intensas da vida surgem, quando se pode provocar a felicidade dos outros, numa antecipação do Céu. Vem a propósito recordar a cena feliz do filme
A FESTA DE BABETTE , quando a generosa cozinheira recebe um abraço agradecido e este elogio: «Como deliciarás os anjos!» É doce e consoladora a alegria de fazer as delícias dos outros, vê-los usufruir delas. Este júbilo, efeito do amor fraterno, não é o da vaidade de quem olha para si mesmo, mas o do amante que se compraz no
bem do ser amado, que transborda para o outro e se torna fecundo nele.
Am or i s l a e t i t i a , nº 129.
no altar de Babette www.serradopilar.com
- 4 -
UMA EPÍSTOLA DO
NOVO TESTAMENTO,
tradicionalmente
atribuída a Tiago, irmão do
Senhor, o epistológrafo lança uma
crítica fulminante aos que vivem
na terra para o luxo e para o prazer
do corpo: “engordastes os vossos
corações” (Tiago 5:5). A ideia –
sabemo-lo bem – de que
hedonismo e espiritualidade se
opõem como contrários está
expressa em todas as religiões e
sistemas filosóficos do mundo.
Sexo, comida e bebida são vistos
como os inimigos figadais do
espírito. Já Platão escreveu que
cada prazer é mais um prego que
prende a alma ao caixão do corpo.
Só a renúncia permite aceder ao
reino do espírito. É assim no
platonismo, no orfismo, no
estoicismo, no cristianismo, no
budismo, hinduísmo, islão e
judaísmo... até o epicurismo, no
mundo antigo, tinha como objetivo
o prazer supremo da renúncia a
todos os prazeres.
Claro que o imaginário referente à
história do cristianismo nos coloca
sempre diante dos olhos a imagem
do abade obeso e amante da boa
pinga; assim como da freira gulosa,
compensando outras renúncias
com o chuto glicémico dos
chamados doces conventuais. Mas
esse imaginário é um produto da
realidade católica. Pensamos no
cristianismo luterano e logo nos
surgem diante dos olhos as
imagens austeras daqueles
pastores nos filmes de Ingmar
Bergman, torturados pela suspeita
insidiosa e impossível de sacudir
de que a religião é toda ela um
logro. Nada compensa o vazio da
inexistência de Deus: nem o
melhor vinho, nem o bolo mais
delicioso. A vida sem Deus é
sempre a preto e branco.
Ora “A FESTA DE
BABETTE” (1987) mostra-nos
que a vida COM Deus, mas sem
bolo nem vinho, equivale à
existência naquele corpo-caixão do
ideário pitagórico e platónico, ao
passo que o reino de Deus na terra
acontece instantaneamente quando
o ser humano se abre ao milagre do
prazer.
N
- 5 -
Obrigada a fugir de Paris, onde era
chefe de cozinha no celebrado Café
Anglais, Babette encontra refúgio
numa aldeia erma na costa oeste da
Dinamarca, fustigada o ano inteiro
por chuva e vento. Acolhida em
casa de duas irmãs idosas, filhas
solteiras de um pastor pietista cuja
modalidade de cristianismo
preconizava a austeridade extrema,
a grande artista da culinária
parisiense abraça uma vida
apagada, numa sociedade em que o
conceito de conseguimento
culinário é uma sopa ascética de
pão velho fervido. Nunca as irmãs
se apercebem do talento da sua
criada e cozinheira: até ao dia em
que chega a Babette uma notícia de
França, de que (graças aos bons
ofícios de um amigo em Paris)
ganhara dez mil francos numa
lotaria.
Em jeito de despedida das patroas,
Babette oferece um jantar (em que
gasta os dez mil francos até ao
último “sou”) com ingredientes
vindos de França: uma experiência
de luxo sibarítico com que
ninguém naquela comunidade
dinamarquesa alguma vez
contactara. A comunidade pietista
reúne-se em casa das irmãs, num
contexto celebrativo do centenário
do fundador daquela comunidade,
pai das velhas solteiras. Pelo
método do “flashback”, nós,
espetadores, já estamos cientes
neste momento do grau de
renúncia que as irmãs tinham
escolhido no passado: ambas
tinham recusado casar; e uma
delas, talentosíssima cantora, tinha
abdicado de uma carreira que se
lhe oferecera como artista nos
grandes teatros de ópera da
Europa. Percebemos que o pastor
que fundara aquela comunidade
não só era avesso ao prazer, como
era avesso também ao matrimónio,
na boa tradição paleocristã de
prezar acima de todas as
qualidades aquela que mais
percebemos ser valorizada na
epistolografia de São Paulo (“quem
casa faz bem; e quem não casa, faz
melhor ainda”: 1 Coríntios 7:38).
Por engenhosa fabricação do
enredo (o realizador do filme,
Gabriel Axel, baseou-se num conto
de Karen Blixen), está presente na
festa de Babette um dos potenciais
- 6 -
pretendentes de uma das irmãs:
um general aristocrático, cujo
passado cosmopolita e experiência
dos prazeres da vida parisiense lhe
permite identificar as maravilhas
que estão a ser servidas à mesa –
assim como os vinhos, os melhores
de França. Receosos de que a festa
dos sentidos gustativos pudesse
configurar uma espécie de ritual
satânico, os comensais pietistas
decidem não comentar a comida e
reagir a ela como se estivessem a
comer sopa de pão velho fervido.
Só que não conseguem resistir ao
milagre do prazer. À sopa de
tartaruga (verdadeira) com xerês
seguem-se “blinis Demidoff” com
champagne Veuve Clicquot; depois
vêm as “codornizes em sarcófago”
(“cailles en sarcophage”),
acompanhadas do celestial vinho
tinto Clos de Vougeot; as
sobremesas incluem um “savarin
au rhum”, frutas exóticas (como
ananás), com Sauternes, conhaque
e outras delícias.
Os comensais, inicialmente
marcados pelos ódios e rancores
que a dedicação à vida religiosa
nunca curara, começam a sofrer
uma transformação: estas pessoas
secas, desconfiadas, mesquinhas e
acidamente beatas
metamorfoseiam-se em pessoas
cheias de calor humano, de amor
ao próximo. De repente, o prazer
da comida e do vinho, o puro
hedonismo execrado pela religião
cristã, opera o mais cristão dos
milagres. À mesa de Babette, é pelo
prazer que se dá, afinal, a vivência
verdadeira do Evangelho: “nisto
serão reconhecidos todos aqueles
que são meus discípulos, contanto
que tenhais amor uns pelos outros”
(João 13:35). O milagre, que o
fundador daquela comunidade
nunca lograra operar, é operado
não por um homem, mas por uma
mulher; não por um pastor/padre,
mas por uma artista.
“Extra artem nulla salus”: fora da
arte não há salvação.
Frederico Lourenço. Escritor, tradutor e professor universitário português. Prémio Pessoa 2016.
https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=1704907253092523&id=100007197946343
- 7 -
damos graças a Deus pela nossa Folha Dominical, que soma hoje 2.000 edições
Claro que, nesta celebração [Quaresma, 1 – 05.03.2017],
damos graças a Deus pela nossa FOLHA DOMINICAL , que
soma hoje 2.000 edições: todos os que a leem — irmãos da
Comunidade e amigos de fora — e todos os que a fizeram e
fazem. Ela é, de algum modo, um registo da nossa história e
uma ajuda à leitura dos “sinais dos tempos”. Quantos já a
leram! — e quantos já morreram! — e, Deus o queira! -
quantos haverão de a ler e fazer!
Digo agora com palavras de Isaías: “O passado já o predisse
de antemão! Saiu da minha boca e anunciei-o. Algumas vezes,
disse-o de repente e as coisas logo aconteceram. Mas como
tendes cabeça dura, predisse-vos os acontecimentos com
muita antecedência. E por amor de Sião não me calarei, por
amor de Jerusalém não descansarei até que apareça a aurora
da Justiça e a salvação brilhe como uma chama! (Is 48,3-4 e
62,1.2).
- 8 -
«tanto caminho já andado!»
OMEÇOU A PUBLICAR-SE NO ANO 2.000 UMA OBRA DE 7 VOLUMES,
a História Religiosa de Portugal. No 3º Volume (publicado em
2.002), havia um longo capítulo sobre “O CATOLICISMO
PORTUGUÊS NO SÉCULO XX”. Entre os vários sub-títulos e
respetivos textos havia um — “Em Portugal, 20 anos depois” (do Vaticano II, 1962-1982) — que, na página 250, era ilustrado com a fotografia da
Folha Dominical 358, da Serra do Pilar, de 2 de Janeiro de 1982.
O texto a que me refiro resumo-o nesta frase: “Refletindo os esforços de renovação pastoral da Igreja Católica, o II Concílio do Vaticano repercutiu-se no catolicismo português, gerando novo impulso reformador, em particular nos sectores mais envolvidos nas questões da transformação da sociedade, nomeadamente a justiça social, a paz e a liberdade — temas centrais do magistério pontifício nesta década” (p.
249-250). É verdade o que escreveu o historiador Paulo Fontes, que não
falava só da Serra do Pilar. A Comunidade da Serra do Pilar esforçava-se
na renovação pastoral da Igreja e na transformação da sociedade, visando
a justiça social, a paz e a liberdade. O autor entendeu que a Folha
dominical da Serra do Pilar era ótima para ilustrar o seu pensamento.
Quando isto aconteceu, já ela ia no ano 7º da sua publicação e, às vezes,
até já se imprimia em papel de cor. Tinha nascido em 13 de Abril de 1975
mas com o número 300 havia já terminado a sua primeira fase que,
apesar de tudo, se ocupara mais da vida interna da Comunidade nascente.
Saliento uma caixa do número 300:
«Trezentos números na vida de uma folha dominical não é nada, pela mesma razão por que seis anos de história da Igreja nada é. Mas se a Serra do Pilar é hoje uma realidade eclesial, muita da sua vida está retratada nesta pequena folha; a melhor prova de que ela tem lugar na Comunidade da Serra é quando, porventura, um qualquer domingo ela não se publica, toda a gente pergunta por ela».
C
- 9 -
A partir do nº 300 [ano 81], a Folha passou a ser dactilografada por quem
se ofereceu para o fazer. Esse quem, dactilógrafo, rapidamente deixou de
o ser pois que depressa amadureceu; e se alguma vez sofreu algum
reparo, foi maneiro, pois que já tinha sido elevado à categoria não de
diretor mas de mentor.
A Folha começou a ganhar leitores que nos eram próximos e, ao longe,
viviam os mesmos problemas e sonhos que nós: Aborto (325), O Papa vem
a Portugal de pára-quedas? (327), Vai, Serra do Pilar (337), O Bispo
(Júlio) na Serra do Pilar (372), Timor-Leste, genocídio físico, cultural e
religioso (385), Martinho Lutero, 500 anos após o nascimento (393),
Uma crise é sempre um desafio à criatividade (399), A teologia da
Libertação (427), Salários em atraso, tomada de posição de um grupo de
padres da diocese do Porto (458), Vivó Porto!, Título de Futebol (463), A
história das cabeças de frango ou A fome e o Parque são biológicos (503),
A morte do Chico (638), D. Júlio na investidura da Presidência Leiga
(729) …
Quando eu fui para Espanha naquele ano 92, e enquanto por lá andei
durante 5 anos!, também eu a recebia pelo correio, ainda não havia
internet. Por lá a lia como quem bebe um copo de água fresca em pleno
Verão.
Quando regressei, em 1997, já ela navegava em mar alto, sem medo de
perigosos ventos muito menos de ataques de piratas. A Folha chegava a
todo o lado: à China, à Inglaterra, a Angola, à França e à Suíça…, ao
Fundão, ao Algarve, a Coimbra, à Capela do Rato em Lisboa… Espalhou-
se porque já não tratava só do intra-comunitário e do histórico mas sim
do novo, do que “está a aparecer, não vedes?”, perguntava o fazedor, com
palavras de Isaías (43,19).
Logo chegou o número 1.000, em Novembro de 1997. Nesse 1.000,
alguém escreveu assim: “A Unesco e o genoma humano é o título da folha dominical de amanhã. Penso na variedade de temas sobre a vida comunitária, eclesial, cultural e política que têm percorrido estes 1.000 números e no importante papel de divulgação que a folha tem tido, tornando acessíveis textos importantes, publicados onde pouca gente os teria lido, ou dando voz a reflexões oriundas do interior da comunidade. … A folha dominical tem a importância de ser epifania da comunidade”.
Era a força da adultez. Ela lá continuou, segura e serena, mar alto, dizia, e
no 1.500 ela própria se espantava: «tanto caminho já andado!». E foi
- 10 -
exatamente para esta, a 1.500, que D. Manuel Martins — que já a
recebia, em Setúbal — escreveu nela, assim: «É sempre momento de grande prazer e proveito aquele que passo na leitura da Folha Dominical da Comunidade Cristã da Serra do Pilar. Sinto um ar de frescura a invadir-me a alma e a fé. Porque a Folha traz-me a força e a vida de uma Igreja tocada pelos “ventos” de Deus».
No entanto, não por gosto mas ao jeito de noticiar o recuo teológico-
pastoral e litúrgico que acontecia na Igreja romana começaram a surgir
muitos, curiosíssimos e variados títulos: E Cristo voltou a chorar nos
jardins do Vaticano (1560), Igreja: Casa de Misericórdia ou Tribunal?
(1572), Os banqueiros de Deus, salvos da crise graças ao ouro e aos
fundos (1574), Hoje já não tenho esses sonhos! (1597), A última tragédia
de Deus, Elie Wiesel (1600)… As folhas iam-nos dando conta do
caminhar regressivo da Igreja na primeira década do século XXI.
No entanto, uma que outra miragem, lá ao fundo, parecia profetizar:
Portas abertas aos católicos divorciados e casados de novo (1627), Deus é
negra e sem documentos (1651), Debate dos abusos sexuais na Igreja
(1654), Deus é um cultivador de lírios (1714), A Igreja que o Concílio
não quis (1752), Cardeal Martini (1779), A lição do silêncio de
Auschwitz (1630), O Deus dos ricos não está em crise (1672), Obama
canoniza D. Óscar Romero. Por que espera Roma? (1708), O Ano da Fé:
do Papa ou de Jesus? (1749), Demitiu-se como Deus manda? Este último
título saiu na folha 1.800, Fevereiro de 2013. Não sei se o profeta veria
melhor ou se foi mesmo o profeta que viu bem!
E em Março (de 2013) começou Francisco a puxar. E começou ela a
penetrar águas mais profundas: Boas vindas ao Papa Chico (1822), Não
só reforma da Cúria mas também do Papado (1823), Necessitamos de
outros bispos (1827), Óscar Lopes e o Transcendente (1829), O
apartamento vazio do Papa Francisco assusta o Vaticano (1830), Evangelii gaudium (1852), Memória das Coisas (1882), Família e Matrimónio
(1879), A porção feminina de Deus (1887), O Islão ainda espera a sua
revolução cultural (1900), Permaneço cristão, mesmo se escolher a forma
como quero morrer (1902), O pequenito afogado faz-nos chorar e pensar
(1925), O papa Francisco, amigo dos pecadores (1928), Comunidade da
Serra do Pilar (1958), Iconoclastia e mística (1971), O rosto feminino de
Deus (1987), É preciso pensar na matança que ainda hoje ocorre “em
nome de Deus” (1992) … E mais, mas muito mais…
- 11 -
O Adelino “rezou” muitas vezes esta ou semelhante poesia de Sophia de Mello:
«Escuto mas não sei
Se o que oiço é silêncio
Ou Deus
Escuto sem saber se estou ouvindo
O ressoar das planícies do vazio
Ou a consciência atenta
Que nos fins do universo
Me decifra e fita
Apenas sei que caminho como quem
É olhado amado e conhecido
E por isso em cada gesto ponho
Solenidade e risco»
Eu creio que as folhas dominicais do Adelino estão para a Serra do Pilar
como os Lusíadas de Camões para os portugueses!
* * *
Mas não esqueçamos o trabalho “duro” dos tipógrafos do antigamente e
do modernamente. O Avô Pereira foi um professor da sua arte e todos os
mais aprenderam com ele. E foram e são muitos os que imprimiram,
dobraram e enviaram por correio. Bem hajam! Como havemos de vos
pagar!
Uma palavra final
Como disse o Salmista: “Escrevam-se estas coisas para as gerações futuras
e os que hão de nascer louvarão o Senhor” (Salmo 102, 19). E eu
acrescento: “Uma nova geração servirá o Senhor e narrará aos vindouros
a sua Justiça” (Sl 22, 31).
Entretanto, Adelino, “O espírito do Senhor continue a falar por ti, a sua
palavra esteja na tua língua, a falar como a luz da aurora, quando se
levanta o sol, numa manhã sem nuvens que faz germinar a erva que brota
da terra, depois da chuva” (2 Sm 23, 2-4).
Pe. Arlindo de Magalhães. (Homilia. 1º Domingo da Quaresma, 05.03.2015)
- 12 -
ERNESTO CARDENAL (Foto: Jorge Mejía Peralta | Flickr)
Eu tive um caso com ele
No centro do nosso ser
não somos nós,
mas outro.
Se o ferro do meu sangue
é o mesmo dos trilhos,
e meu cálcio o das alcantiladas,
onde está, Deus meu,
este eu meu que te ama?
Parte da tua ternura, eu sinto,
são estas partículas que eu tenho.
Doçura de saber que me fizeste.
Deus dos números absurdos,
do dementemente grande
e do dementemente pequeno.
Se é infinito,
também será infinita loucura,
espontaneidade infinita.
Que, um dia, tu e eu nos acariciemos,
como o fazem, com olhos cerrados,
gemendo, os amantes,
num lugar infinito
e numa data eterna,
mas tão real como dizer
esta noite às oito.
Fonte: Ernesto Cardenal. Cântico Cósmico. São Paulo: Hucitec, 1996, p. 389.