Er4UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO, CURRÍCULO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DOCENTE À FORMAÇÃO CONTÍNUA
DE PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
REBECA RAMOS CAMPOS
NATAL/RN
2017
REBECA RAMOS CAMPOS
DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DOCENTE À FORMAÇÃO CONTÍNUA DE
PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, para
obtenção do título de Doutora em
Educação.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Estela
Costa Holanda Campelo
NATAL–RN
2017
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE
Campos, Rebeca Ramos.
Das necessidades de formação docente à formação contínua de
professores da Educação Infantil / Rebeca Ramos Campos. - 2017. 201 f.: il.
Tese (doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Centro
de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2017. Orientador: Profa. Dra. Maria Estela Costa Holanda Campelo.
1. Formação docente - Educação Infantil - Tese. 2. Educação
Infantil - Tese. 3. Pré-escola - Tese. 4. Leitura e Escrita - Tese.
5. Educação - Tese. I. Campelo, Maria Estela Costa Holanda. II.
Título.
RN/UF/BCZM CDU 377.8
DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DOCENTE À FORMAÇÃO CONTÍNUA
DE PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
COMISSÃO JULGADORA
_________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Estela Costa Holanda Campelo (UFRN – Orientadora)
_________________________________________________________
Prof. Dr. Alexandro da Silva (UFPE)
_________________________________________________________
Prof. Dr. Júlio Ribeiro Soares (UERN)
_________________________________________________________
Profª Drª. Márcia Maria Gurgel Ribeiro (UFRN)
_________________________________________________________
Prof. Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa (UFRN)
_________________________________________________________
Profª. Drª. Débora Amorim Gomes da Costa-Maciel (UPE)
________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria das Graças Soares Rodrigues (UFRN)
Natal – RN, 06 de Fevereiro de 2019.
Ao meu Deus fiel, horizonte para o qual todas as
minhas práticas são construídas.
AGRADECIMENTOS
Ao glorioso Deus, sempre, por ter me ensinado a viver em paz e cheia da verdadeira
alegria.
Aos meus familiares, em especial meus pais e irmãos, pelo apoio, pelos ensinamentos,
por acreditarem em mim. Principalmente no amparo ao meu filho, nos últimos meses de
feitura dessa tese. Uma boa família é uma dádiva de Deus!
Ao meu esposo João Helvécio Júnior e ao meu filho Lucas, pelo amor, compreensão e
companheirismo, pelo crescimento como mãe e mulher, que me ajudaram de fato a
crescer também academicamente. Sem esquecer a habilidade nos gráficos e tabelas,
especialidade de Júnior, que enriqueceram este trabalho. Amo vocês!
À minha preciosa orientadora. Hoje, completo ao seu lado, onze anos de pesquisa. A
admiração e a gratidão são inestimáveis, as oportunidades que ofereceu mudaram a minha
vida. Obrigada! Parabéns pelas contribuições e pela trajetória de sucesso nas pesquisas
sobre oralidade, leitura e escrita em nossa Universidade.
Aos meus amigos queridos Cibele Lucena, Danielle Medeiros, Dominique Cristina,
Milene Figueiredo, Kívia Faria e Sandro Cordeiro, pela sincera amizade que compartilha
dores e alegrias, que se doa, que torce e que está sempre unida.
Aos amigos queridos da IBE, pelo convívio e comunhão agradável. Em especial à amiga
Nale, que contribuiu de forma valorosa e responsável para a transcrição dos dados dessa
pesquisa.
Às professoras que participaram dessa pesquisa, pelo acolhimento, disponibilidade,
carinho, envolvimento e principalmente pelos ensinamentos, compartilhados entre nós. À
todas, minha admiração!
À Denise de Oliveira, por chegar a minha casa e me ajudar a cuidar de minha família,
nesse momento que necessitei me ausentar mais do que o comum. Sou muito grata ao seu
carinho com todos nós, em especial com meu filho Lucas.
À Andréa Campelo, por me presentear com a arte para a capa deste trabalho e,
principalmente, pela delicadeza de seu gesto, que me deixou ainda mais motivada pelo
trabalho.
À equipe Nei, por aprovar e garantir afastamento de dois anos para a conclusão desta tese.
Ao Programa de Pós-Graduação em Educação desta Universidade, pela oportunidade na
pesquisa.
Acho que é isso, essa emoção do dia-a-dia, de ver o retorno, a
criança que você viu chorando porque não queria ficar na escola,
está aprendendo a ler e a escrever. Você acompanhar o
desenvolvimento dela e vê seu trabalho resultando ali, ela dando
a resposta de seu trabalho, não é em vão. Eu tinha cinco crianças
novatas na pré-escola, que nem conheciam as letras e através dos
crachás com seus nomes e dos jogos que tem o alfabeto móvel,
vamos trabalhando as identidades delas, ela vai reconhecendo as
letras inicias e isso é avanço! Amanhã vou vê-la escrevendo e eu
sei que estou contribuindo para ela chegar lá. Então isso pra mim
me faz continuar. E todos os obstáculos, dificuldades... Não
seriam suportáveis se a gente não gostasse, não tivesse na alma,
na formação, no íntimo, essa necessidade de estar aqui fazendo
isso. (Trecho da fala da professora Conhecimento, 2014)
RESUMO
O estudo em tela teve como objetivo desenvolver um curso de formação contínua
orientado por Necessidades da Formação Docente de professoras da Educação Infantil/
Pré-Escola. Inscrito na Abordagem Qualitativa de Pesquisa, o trabalho se utilizou das
metodologias de Estudo de Caso e da Pesquisa-Ação. Para a construção dos dados, foram
utilizados questionário, entrevista semiestruturada, observação participante, notas de
campo, diários de aula e análise documental. O campo empírico foi um Centro Municipal
de Educação Infantil localizado na zona leste da cidade de Natal/RN. A pesquisa teve
duas etapas de análise de dados, ambas orientadas por princípios da Análise de Conteúdo,
conforme Bardin (2011) e Franco (2003). Como resultados da primeira etapa da pesquisa,
foi constatado que, no cuidado e educação das crianças, as professoras vivenciavam
necessidades formativas: no planejamento de atividades didático-pedagógicas; no
desenvolvimento da prática pedagógica nos eixos da oralidade, da leitura, da escrita, da
linguagem matemática e das múltiplas linguagens; no apoio à própria formação docente;
na compreensão do pensamento de crianças pré-escolares; no atendimento
individualizado, sobre regras e limites, a todas as crianças, particularmente, aquelas com
necessidades educacionais especiais; na relação família x escola; na melhoria da
utilização de espaços físicos inadequados; na melhoria da prática pedagógica, apesar da
escassez de materiais. No âmbito das necessidades indicadas pela investigação, o grupo
elegeu “Leitura e Escrita’, como grande temática da formação contínua intitulada: Ação
didático-pedagógica para construção de práticas de leitura e escrita na Educação
Infantil/Pré-escola. Como categorias do grande tema, emergiram os conteúdos
programáticos da formação (segunda etapa da pesquisa): concepções de criança, infância
e cultura; planejamento na Educação Infantil/Pré-escola; construção/elaboração de
atividades escolares; alfabetização e letramento; psicogênese da língua escrita; leitura e
produção de textos. Os procedimentos metodológicos da formação foram organizados em
sessões reflexivas de leitura, observação participante e da articulação teoria-prática,
desenvolvidos em observações e encontros quinzenais. A avaliação, como processo
contínuo da formação, realizou-se a partir de registros em diários de aula, reconstrução
de planejamentos e práticas e do diálogo compartilhado nos encontros de formação. A
ação formadora foi bem avaliada pelas professoras, destacando-se um progresso evidente
nos conhecimentos teórico-metodológicos, além da superação de dificuldades no
planejamento, nas práticas de oralidade, leitura e escrita com crianças e na construção de
‘atividades para casa’. Os resultados do trabalho confirmam a tese de que uma formação
contínua para professores da Educação Infantil, que considere as suas necessidades de
formação, contribui na superação de dificuldades encontradas no desenvolvimento da
prática pedagógica com crianças.
Palavra-chave: Necessidades de formação docente; Educação Infantil/Pré-escola; leitura
e escrita.
SUMMARY
The following study had as its objective the development of an ongoing training course
guided by the Teacher Training Needs of Early Childhood/Pre-School Teachers.
Subscribed in the Qualitative Approach to Research, it used the Case Study and Action
Research Methodologies. In order to construct the data, questionnaire, semi-structured
interview, participant observation, field notes, class diaries and document analysis were
used. The empirical field was a Municipal Early Childhood Education Center located in
the east side of the city of Natal/RN. The research had two data analysis steps, both guided
by principles of Content Analysis, in accordance to Bardin (2011) and Franco (2013).
Results of the first step verified that, in the care and education of children, the teachers
experienced formative needs: in the planning of didactic-pedagogical activities; in the
development of the pedagogical practice in the orality, reading, writing, mathematical
language and multiple language axis; in support to the teacher training itself; in
understanding the thinking of preschool children; in individualized care, on rules and
limits, to all children, particularly those with special educational needs; in the family x
school relation; in the better use of the inappropriate physical spaces; in improving
pedagogical practice, despite the scarcity of materials. In the context of the needs
indicated by the investigation, the group elected ‘Reading and Writing’, as the main theme
of the ongoing training entitled: Didactic-pedagogical Actions to build orality, reading
and writing practices in the Early Childhood/Pre-School Education. As categories of the
main theme, emerged the programmatic contents of the training (second step of the
research): conceptions of child, childhood and culture; planning in the Early
Childhood/Pre-School Education; building/creation of school activities; basic literacy
and literacy; psychogenesis of written language; reading and production of texts. The
methodological procedures of the training were organized in reflexive reading sessions,
participant observation and theory-practice articulation, developed in observations and
fortnightly meetings. The evaluation, as an ongoing training process, was carried out from
records in class diaries, planning and practices reconstructions and the shared dialogue
during the training meetings. The formative action was well evaluated by the teachers,
highlighting an evident progress in theoretical-methodological knowledge, in addition to
overcoming difficulties in planning, in orality, reading and writing practices with children
and in building ‘homework’. The results of the research confirm the thesis that an ongoing
training for Early Childhood Education teachers, which takes into consideration their
training needs, contributes to overcoming the difficulties found in the development of the
pedagogical practice with children.
Keywords: Teacher Training Needs; Early Childhood/Pre-School Education; reading
and writing.
RESUME
L’étude en question a eu comme objectif de développer un cours de formation continue
orienté par des Nécessités de Formation d’enseignant des professeures de l’Education
Infantile/Préscolaire. Inscrit dans l’Approche Qualitative de Recherche, le travail a utilisé
des méthodologies d’Étude des Cas et de la recherche-action. Pour la construction des
données ont été utilisées un questionnaire, un entretien semi-structuré, de l’observation
des participants, des notes sur le terrain, des notes de cours et de l’analyse documentaire.
Le champ empirique a été un Centre Municipale de l’Éducation Infantile localisé dans la
zone est de la ville de Natal/RN. La Recherche a eu deux étapes d’analyse de données, à
la fois guidées par des principes d’analyse de Contenu, selon Bardin (2011) et Franco
(2003). À la suite de la première étape de la recherche, cela a été constaté que, dans
l’attention et l’éducation des enfants, les enseignantes avaient des besoins de formation:
dans la planification des activités didactico-pédagogiques; dans le développement de la
pratique pédagogique sur les axes de la lecture, de l’écriture, du langage mathématique et
des multiples langages; dans le soutien de la propre formation des professeurs; dans la
compréhension de la pensée des enfants préscolaires; dans la prise en charge
individualisée, sur les règles et les limites, à tous les enfants, particulièrement, ceux avec
des besoins éducatifs spéciaux, dans la relation famille x école; dans l’amélioration de
l’utilisation des espaces physiques inappropriés; dans l’amélioration de la pratique
pédagogique, en dépit de la pénurie des matériaux. Dans le cadre des nécessités indiquées
par la recherche, le groupe a élu la triade « Langage oral, Lecture et Écriture », comme
un thème majeur de la formation continue intitulé: L’Action didactico-pédagogique pour
la construction des pratiques de lecture et de l’écriture dans l’Éducation
Infantile/Préscolaire.Comme des catégories de la grande thématique, ont émergés des
contenus programmatiques de la formation (deuxième étape de la recherche): conceptions
de l’enfant, de l’enfance et de la culture; planification de l’Éducation
Infantile/Préscolaire; construction/élaboration des activités scolaires; alphabétisation et
littératie; psychogenèse de la langue écrite; du langage oral; de la lecture et production de
textes. Les procédures méthodologiques de la formation ont été organisés en séances
reflexives de lecture, d’observation des participants et de l’articulation théorie-pratique,
développées en observations et rencontres bimensuelles L’évaluation comme processus
de formation continue a été realisée á partir d’enregistrements de journaux de classe, de
la reconstruction de la planification et des pratiques, et du dialogue partagé dans les
rencontres de formations. L’action formatrice a été bien évalué par les professeures, en
se démarquant en un progrès évident dans les connaissances théorico-méthodologiques,
en plus du dépassement des difficultés dans la planification, dans les pratiques de l’oralité,
de lecture et de l’écriture avec des enfants, et dans la construction des « devoirs pour la
maison. Les résultats du travail confirment la thèse que la formation continue pour les
professeurs de l’Éducation Infantile, en tenant compte leurs nécessités de formation, aide
à surmonter les difficultés rencontrées dans le développement de la pratique pédagogique
avec des enfants.
Mots-clés: Besoins de Formation des professeurs; Éducation Infantile/Préscolaire;
lecture et écriture.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Representação em quatro fases do ciclo básico da investigação-ação,
segundo Tripp, 2005.............................................................................
48
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Total de concluintes por cursos do PROFOC/UFRN 2011-2013.......... 84
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Tema, categoria e subcategorias das dificuldades vivenciadas na
docência da pré-escola..........................................................................
94
Quadro 2 Tema, categoria e subcategorias do Cuidado e Educação de crianças
na Educação Infantil/ Pré-escola..........................................................
107
Quadro 3 Categorias e Subcategorias da ação didático-pedagógica para
construção de práticas de oralidade, leitura e escrita na Educação
Infantil/Pré-escola................................................................................
127
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Quantidade/Porcentagem de trabalhos publicados em “formação
continuada de professores” comparada à quantidade de trabalhos
publicados “em formação de professores”.............................................
31
Tabela 2 Comparação da quantidade/porcentagem de publicação entre os eixos
“Formação continuada de professores”, “Necessidades de Formação”
e “Leitura e Escrita”...............................................................................
34
Tabela 3 Quantidade de publicações que relacionam os eixos “Formação
continuada de professores” e “Leitura e Escrita...................................
36
Tabela 4 Caracterização dos sujeitos da pesquisa................................................ 58
Tabela 5 Conteúdos programáticos referentes a ação didático-pedagógica para
construção de práticas de leitura e escrita na Educação Infantil/Pré-
escola.....................................................................................................
64
Tabela 6 Cursos do PROFOCO/UFRN – 2011 a 2013....................................... 83
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 19
1.1 MOTIVAÇÕES DA PESQUISA.................................................................................... 20
1.2 JUSTIFICATIVA............................................................................................................ 23
1.3 QUESTÃO DE PESQUISA, OBJETO E OBJETIVO................................................... 29
1.4 ESTADO DA ARTE........................................................................................................ 30
1.5 ESTRUTURA DA TESE................................................................................................. 39
2 PERCURSO INVESTIGATIVO.................................................................................. 42
2.1 ABORDAGEM QUALITATIVA .................................................................................. 43
2.2 ESTUDO DE CASO........................................................................................................ 44
2.3 PESQUISA AÇÃO.......................................................................................................... 46
2.4 INSTRUMENTOS PARA CONSTRUÇÃO DOS DADOS .......................................... 49
2.5 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................ 50
2.6 CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DO LÓCUS................................................................. 53
2.6.1 Lócus selecionado........................................................................................................... 54
2.7 CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DOS SUJEITOS.......................................................... 56
2.7.1 Sujeitos selecionados ..................................................................................................... 56
2.8 PLANEJAMENTO DA PESQUISA............................................................................... 58
3 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES................ 66
3.1 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO ............................................................................. 67
3.2 A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES ...................................................... 75
4 DIAGNÓSTICO DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORAS
DA EDUCAÇÃO INFANTIL/ PRÉ-ESCOLA...........................................................
94
4.1 NECESSIDADES VIVENCIADAS................................................................................ 94
4.2 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORAS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL/PRÉ-ESCOLA..............................................................................................
106
4.3 A SELEÇÃO DA NECESSIDADE DE FORMAÇÃO: OBJETIVO PARA
FORMAÇÃO CONTÍNUA ............................................................................................
107
5 LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA:
CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS AO PROFESSOR .......................................
112
5.1 LEITURA E ESCRITA NA PRÉ-ESCOLA: É POSSÍVEL? COMO?......................... 117
6 A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORAS A PARTIR DE SUAS
NECESSIDADES DE FORMAÇÃO ..........................................................................
127
6.1 AÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA PARA CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS DE
LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-
ESCOLA..........................................................................................................................
127
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 167
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 171
APENDICES.................................................................................................................. 183
INTRODUÇÃO
19
1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa se preocupa em investigar três grandes temáticas relacionadas aos
professores de educação infantil/pré-escola: formação contínua, necessidades de
formação e a leitura e escrita de crianças.
É resultante de uma trajetória acadêmica de onze anos, que nasce da oportunidade
como bolsista de iniciação científica, em que já investigava as necessidades de formação
do professor alfabetizador, inserida nos Projetos de Pesquisa da linha “Práticas
Pedagógicas e Currículo”, do Programa de Pós-Graduação em Educação –
PPGEd/UFRN.
Percorre por um curso de especialização em “Docência do Ensino Superior”,
como discente, que permitiu observar as questões a partir de um outro lugar, agora no
papel de formador do professor, ou seja, o outro lado da moeda: o formador do formador.
E avança para o Mestrado em Educação com a dissertação intitulada “Necessidades de
Formação de Professoras Principiantes da Educação Infantil/Pré-Escola”.
A mesma trouxe resultados relacionados às dificuldades de educar/cuidar de
crianças, quando o professor vivencia o início de sua carreira. Essas dificuldades
apontaram necessidades de formação docente e sugeriram reflexão acerca do conteúdo
programático de cursos de formação inicial e contínua, dos procedimentos metodológicos
adequados para o exercício dessa docência, dos autores que deverão ser estudados, da
frequência e da estrutura dos cursos de formação contínua nessa área.
Esses resultados nos motivaram a dar continuidade aos estudos com as
necessidades formativas. Porém, agora, não apenas relacionadas ao professor
principiante, mas a todos os professores que atuam na Educação Infantil/Pré-escola1,
independentemente do tempo em que atuam na área, ampliando assim a pesquisa. E ainda
o desejo de desenvolver, junto a eles, uma formação contínua que considere suas
necessidades formativas para educar/cuidar de crianças.
Vale a pena destacar que a intenção de trabalhar com a segunda etapa da Educação
Infantil atende dois motivos: o interesse de pesquisar a realidade profissional na qual nos
inserimos, já que desde assunção em concurso público como professora, o trabalho se
1 Vale a pena esclarecer que a utilização do termo “Educação Infantil/Pré-escola”, tem a necessidade de
deixar claro de qual etapa da Educação Infantil nós estamos falando, já que a mesma se subdivide em creche
(0 a 3 anos) e pré-escola (4 a 5 anos e 11 meses). Além disso, utiliza o termo estabelecido na própria
legislação brasileira. A lei 12.796 de 4 de abril de 2013, que define a obrigatoriedade da educação básica
para crianças a partir de 4 anos, podemos verificar o termo pré-escola presente na organização da educação
básica, ao lado do ensino fundamental e do ensino médio.
20
efetivou, em sua grande maioria, na pré-escola e por isso os questionamentos surgem da
prática diária como docente de crianças pré-escolares; além de delimitar o objeto da
pesquisa, já que o trabalho com creche tem suas especificidades, o que poderia tornar a
pesquisa rica em extensão, mas pobre em profundidade.
1.1 MOTIVAÇÕES DA PESQUISA
A preocupação em pesquisar formação de professores surge antes mesmo do
início da docência. Na escolha e aprovação, em vestibular, para o curso de Pedagogia, na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a alegria e a satisfação pessoal,
foram ao encontro dos sentimentos de decepção e piedade dos amigos e familiares mais
próximos, que esperavam uma aprovação nos cursos de Direito ou Medicina.
Muito admirados pela escolha, com discursos que previam, com certeza, um
futuro profissional difícil e fracassado, os questionamentos acompanharam (e ainda
acompanham) toda a trajetória profissional docente. Dessa sensação de desconforto
nasceram algumas reflexões iniciais: será que posso ser uma professora diferente? O que
é necessário fazer, para que a sociedade me respeite enquanto professora? Essa escolha
profissional poderá ser bem vista algum dia?
Infelizmente, esse preconceito com o curso pode ser proveniente de características
que definem o perfil do aluno de Pedagogia no Brasil, como demonstra o estudo intitulado
“Professores do Brasil: impasses e desafios”, coordenado por Bernadete Angelina Gatti e
Elba Siqueira de Sá Barreto, para a Unesco, em 2009.
A pesquisa apresenta um questionário socioeconômico do Exame Nacional de
Cursos (Enade, 2005), identificando as características desses estudantes, futuros
professores. Os dados sobre o tipo de escola que os alunos cursaram o Ensino Médio
identificam que mais de 70% o fizeram em escola pública. Sobre a situação
socioeconômica são revelados, a partir de tabela “renda mensal da família”, que 41,9%
se sustentam com até 3 salários mínimos. Quanto aos conhecimentos escolares das
famílias dos estudantes, os dados divulgam que os pais e as mães desses alunos possuem
baixa escolaridade, já que mais de 50% não possuem nem o Ensino Fundamental
completo. Outro dado importante é que apenas 26, 2% não trabalham e são custeados pela
família. Portanto, a maioria dos estudantes, 73,8%, são trabalhadores.
Não significa dizer que um estudante de escola pública não será um bom
profissional, nem que por pertencer a uma família de pais analfabetos não será bem-
21
sucedido, ou ainda que, por trabalhar, não conseguirá se formar e possuir um emprego
digno, pois alguns não trabalham, foram alunos de escola privada, possuem pais com
Ensino Superior, vivem com boa renda familiar e mesmo assim não garantem que os seus
futuros sejam promissores. Essas características não são definidoras e nem determinantes
do futuro de nenhum estudante, porém nos chama atenção porque traça um perfil de
aluno, que compõe os cursos de Pedagogia e que mais tarde se tornará professor.
Sabemos que nossa escola pública apresenta dificuldades, que o aluno que
trabalha possui tempo reduzido para estudar e que, quem não dispõe de conhecimento
diversificado, enfrenta obstáculos no acesso à Educação. Reforçamos que isso não é
determinante, porém acreditamos que essas características contribuam e expliquem a falta
de prestígio do profissional professor: geralmente ele provém de escola pública, foi um
estudante trabalhador, viveu com uma renda de até 3 salários mínimos e possui pais
analfabetos ou que cursaram até o atual 5º ano do Ensino Fundamental.
A sociedade reconhece esse profissional com desconfiança, é fato. Porém, ao
longo do curso de graduação, pude perceber que a falta de status relacionado à profissão
docente não atingia, da mesma maneira, uma classe de professores: os universitários. Eles
eram respeitados pelos seus alunos, pelos colegas, pela sociedade. Mas porquê? Ninguém
questionava a todo momento porque eles haviam escolhido o curso de Pedagogia, já que
a maioria era pedagogos e, talvez, até se encaixassem no perfil traçado acima, pelo estudo
das autoras.
Foi nesse momento que passamos a observar um dos fatos que poderia diferenciar
o professor universitário dos demais: a formação. Os nossos professores sempre estavam
envolvidos em pesquisas e, frequentemente, evidenciavam a importância da leitura e dos
estudos em nossas vidas. Percebíamos essa realidade na conduta das aulas, na seleção dos
textos, na construção dos programas para cada disciplina, na participação de eventos
científicos e publicação de trabalhos acadêmicos. A maioria possuía Doutorado em
Educação, apresentava boas condições de vida e, principalmente, não reproduzia os
discursos vitimados sobre a própria profissão.
Se faz importante dizer que, no decorrer da formação profissional, reconhecemos
que o status de um professor universitário não pode ser pensado a partir de um único fator,
como o da formação, por exemplo, por se tratar de um conceito multidimensional. Sendo
assim, a classe econômica e social de origem de cada professor também são fatores que
definem essa condição de status.
Infelizmente, havia pouca discussão sobre formação durante a graduação. É
complexo para um aluno iniciante do curso de Pedagogia compreender o propósito de um
22
maior volume de estudo, já que os próprios colegas de turma (que já começavam a
trabalhar e compreendiam melhor o universo de ser professor na prática) criticavam a
profissão e seus salários. Ou seja, naquele momento não eram mais só os amigos e a
família, os próprios colegas de turma também estigmatizavam a profissão.
Ao mesmo tempo, também fomos percebendo que, boa parte dos alunos que
realizavam essas críticas apresentavam dificuldades com as disciplinas acadêmicas. A
maioria não possuía um bom desempenho nas avaliações e nas práticas que envolviam
pesquisas. Depois de formados, a maioria desistiu da profissão e a estigmatizava também.
Naquela época, essa situação, em uma análise superficial, pareceu falta de
interesse. Porém, não podemos esquecer que muitos são os fatores que nos afetam durante
a vida e, que cada um também possibilita a maneira na qual será ser afetado, como nos
diz Spinoza (2007) em suas ideias sobre os indivíduos e os seus afetos. As nossas
condições psicológicas, políticas, culturais, econômicas, dentre outras, nos acompanham
no trilhar desse percurso acadêmico. Por isso, concluímos que a possível falta de interesse
poderia estar relacionada à falta de tempo para se dedicar ao estudo por motivo de
trabalho, condições precárias de sobrevivência, condição econômica desfavorável para
adquirir material de leitura e se manter na Universidade, através de alimentação e
transporte, cansaço da necessidade de trabalhar, estudar e já manter uma família, dentre
outros.
Desconfiadas de que a formação poderia ser um possível (mas não único) caminho
para o desenvolvimento de um futuro profissional de realização e de respeito, refletimos
sobre o fato de tentar responder aquelas questões iniciais (será que posso ser uma
professora diferente? O que é necessário fazer, para que a sociedade me respeite enquanto
professora? Essa escolha profissional poderá ser bem vista algum dia?) e por isso assumir
uma postura de mais estudo e envolvimento na universidade. Diante disso, os autores
Nuñez e Ramalho (2008) acreditam que buscar uma profissionalização da docência é o
caminho para uma nova representação da profissão docente em nossa sociedade; mas isso
deve ser parte dos projetos pessoais e coletivos do desenvolvimento profissional de cada
professor, ou seja, também depende de nós.
Por isso destacamos que, embora este trabalho de tese possua outras temáticas, a
formação foi a primeira grande curiosidade ingênua que se tornou epistêmica, pois surge
exatamente desse desejo de defesa da profissão, enxergando-a como uma alternativa de
emancipação pessoal e efetivação da profissionalização docente, concretizadas a partir da
formação contínua.
23
Já o interesse em estudar leitura e escrita se manifestou em duas oportunidades:
na disciplina “Processo de Alfabetização”, ainda na graduação, e na experiência como
bolsista de iniciação científica, em 2005, na linha “Práticas Pedagógicas e Currículo”,
ambas orientadas pela professora doutora Maria Estela Costa Holanda Campelo (UFRN).
Durante esse período os projetos desenvolvidos pesquisavam os saberes docentes, o
sucesso/fracasso escolar e a formação do professor alfabetizador da escola pública, no
Ensino Fundamental.
O grupo de estudos se preocupava com as estatísticas, que revelavam, naquele ano
de 2007, segundo a divulgação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), cerca de 14,1 milhões de
analfabetos com 15 anos ou mais de idade, no Brasil. Essa vivência e relação com a
pesquisa culminaram no trabalho monográfico que investigou dificuldades do professor
alfabetizador nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Porém, a escolha por pesquisas que relacionam as necessidades de formação e a
educação infantil/pré-escola, é diretamente influenciada pela assunção de cargo federal,
como professora de Educação Infantil/Pré-escola, no Colégio de Aplicação da UFRN, o
Núcleo de Educação da Infância – NEI/CAp.
Como principiante, que segundo Huberman (2007) é aquele professor que se
encontra nos três primeiros anos da carreira e que está consolidando sua prática
profissional, enfrentamos “um choque de realidade’, quando as teorias pareciam não
corresponder às práticas vivenciadas. A alegria de possuir uma profissão era paralela aos
sentimentos de medo e insegurança, tornando esse momento difícil e contraditório.
Além disso, se o preconceito como aluna de Pedagogia, e mais tarde como
professora era crescente, como professora de crianças a discriminação é maior. De certa
forma, a intensidade dos julgamentos também foi proporcional ao desejo de realizar
pesquisas nessa área. Por isso, as temáticas se apresentam e se relacionam com o espaço
infantil.
1.2 JUSTIFICATIVA
A formação de professores poderá deixar de assumir papel prioritário nas ações
de reforma educativa no país. Isso porque acreditamos que o Plano Nacional de Educação
(PNE /2014-2024), desenvolvido como referência para os planos nacionais, estaduais e
24
distrital no período de dez anos, estabelecido a partir de vinte metas de orientação e de
melhoria para a educação brasileira, se encontra ameaçado.
A antiga Proposta de Emenda Constitucional n° 241-2016 (PEC 241 – intitulada
também de “PEC do Teto dos Gastos Públicos”), e atual PEC 55, aprovada pelo Senado
no dia treze de dezembro de 2016, põe em risco a estrutura do PNE, já que estabelece um
congelamento de gasto público na área da Educação por vinte anos, afim de pagar juros
e dívidas do governo. Se o PNE previa, praticamente, dobrar as atuais receitas
orçamentárias da União, como se manterá estruturado?
Se faz necessário destacar, antes de tentar responder essa questão que a PEC 55
não é a única responsável por esse possível desmonte na educação pública de nosso país.
Aos poucos, outras situações, antes mesmo da aprovação desta PEC, já vinham
contribuindo para essa desconstrução, tais como a tramitação do projeto de lei, de autoria
do senador José Serra sobre o fim do controle da exploração do Pré-sal pela Petrobras,
comprometendo a receita de royalties do petróleo para o Fundo Nacional do Pré-Sal, que
destina 75% dos recursos à educação pública. Em 29 de novembro de 2016, alterou a lei
12.351, de 22 de dezembro de 2010, transformando-se na Lei 13.365.
Além disso, o cancelamento de bolsas do Programa Ciências sem Fronteiras, a
paralisação do programa Brasil Alfabetizado, o atraso nos repasses dos recursos para a
Rede Nacional de Pesquisa, a nomeação de novos membros para o Conselho Nacional de
Educação e a exoneração de nomes importantes na luta pela educação do nosso país, como
no caso da professora Rita de Cássia de Freitas Coelho, da Coordenação Geral de
Educação Infantil (Coedi) do Ministério da Educação.
Conscientes dessa situação, nos preocupamos com a relação entre o desmonte da
educação pública e a formação de professores. Das vinte metas do PNE, quatro estão
relacionadas à formação de maneira mais abrangente (metas 13,14,15 e 16), uma à
valorização profissional (meta 18) e três especificamente, à formação contínua (13,14 e
16):
Meta 13: elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e
doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação
superior para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e
cinco por cento) doutores.
25
Meta 14: elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de
modo a atingir a titulação anual de 60.000 (sessenta mil) mestres e 25.000 (vinte e cinco
mil) doutores.
Meta 16: formar, em nível de pós-graduação, 50% (cinquenta por cento) dos professores
da educação básica, até o último ano de vigência deste PNE, e garantir a todos(as) os(as)
profissionais da educação básica formação continuada em sua área de atuação,
considerando as necessidades, demandas e contextualizações dos sistemas de ensino.
(MEC/ SASE, 2014).
As três metas acompanham as preocupações reais sobre formação no Brasil. Não
basta apenas elevar o número de matrículas no ensino superior, o ensino precisa ser de
qualidade, como releva a meta 13. Essa discussão vem se tornando presente desde a
expansão de cursos superiores de ensino no país, a partir da Lei de Diretrizes e Base da
Educação (LDB) em 1996 - Lei 9.394/96, que estabeleceu as diretrizes e bases da
educação nacional, ampliando cursos e vagas e oferecendo autonomia às instituições de
ensino superior. E também com a publicação do PNE para os anos de 2011 a 2010, que
demonstrava em suas metas, a relação de desenvolvimento com a expansão das
universidades no país.
No embate que envolve essas instituições particulares em espaços com visões
apenas mercadológicas e não pedagógicas (essa não é uma discussão generalizadora, mas
presente no meio educacional), a preocupação com a formação dos alunos é necessária,
visto que o número de matrículas nessas instituições cresceu 130% entre 2000 e 2013.
Em 2000, a rede privada tinha 1,8 milhão de estudantes matriculados, em 2013, 4,4
milhões (SEMESP, 2015).
Vale salientar que, se queremos modificar essa situação, a formação dos
profissionais que formam esses alunos deve ser priorizada. Formar o formador. A
formação contínua parece ser um dos caminhos para isso. Dessa maneira a meta 14
complementa a meta 13 e enfatiza a titulação de mestres e doutores. Dessa forma valoriza
a pesquisa científica e, portanto, a postura de um professor pesquisador no ensino.
A meta 16, assim como as outras, também se constitui em um desafio. A sinopse
Censo Superior, 2014 (nos revela que 74,3%, do total de dois milhões de professores do
ensino superior cursaram pós-graduação. Porém quando se trata de professores da
educação básica, esse número cai para 31,42%. Para se chegar aos 50% propostos pela
meta, até o final do Plano, uma média de 400.00 mil professores deverão estar formados
26
a nível de pós-graduação, além de cursarem formação contínua que atendam às suas
necessidades e demandas escolares. Para que essa meta seja alcançada, uma rede de
estratégias deverá ser lançada, tais como
Implementar ações articuladas entre os sistemas de ensino e os
programas de pós-graduação das universidades públicas, bem como
assegurar a implantação de planos de carreira e remuneração para os
professores da educação básica, de modo a garantir condições para a
realização satisfatória dessa formação [...]. Além disso, a CAPES, o
CNPq e as agências de fomento poderão fomentar tal formação pós-
graduada (BRASIL, 2014, p.52)
De certa forma a maioria das outras metas também estão correlacionadas à
formação contínua, na medida em que almejam elevação de escolaridade média de jovens
de 18 a 29 anos, o fomento da qualidade da educação básica, aprendizagem na idade certa,
erradicação do analfabetismo absoluto, entre outras.
Por isso, estamos preocupados com o futuro do PNE. Para alguns que são contra
a PEC 55, ele será descontruído; para outros a favor, ela é necessária e não irá retirar
recursos da área da Educação.
Compreendemos que não podemos pensar na formação como único e exclusivo
remédio salvacionista da sociedade. Os problemas de insucesso escolar, analfabetismo,
avaliação, evasão, violência e tantos outros que se perpetuam na escola, fazem parte de
um contexto social que abrange as esferas econômicas, políticas e culturais. Porém,
reconhecemos o seu valor enquanto elemento fomentador de mudança, de práticas de
transformação, por isso, as pesquisas sobre formação contínua se fazem legítimas.
Além disso, a pertinência dessas pesquisas se faz presente quando declaramos que
os dados estatísticos atuais, relacionados à formação dos professores, mesmo antes da
implementação da PEC 55, já são preocupantes. Segundo MEC/Inep/DEED/Censo
Escolar em 2013, 74,8% dos professores da educação básica possuem ensino superior,
graduação. Se esses números se aplicam à formação inicial, poderíamos imaginar os que
se destinam à formação contínua, já que sabemos que são sempre menores.
Os dados também revelam que apenas 31,1% dos professores da educação básica
possui pós-graduação, ou seja, quase 70% dos professores não tiverem acesso à educação
contínua no Brasil no ano de 2014. Na Educação Infantil essa porcentagem ainda cai para
23,9%, sendo o índice mais baixo se comparado à formação dos professores dos anos
inicias do Ensino Fundamental (30,1%), dos Anos Finais (31,1%) e do Ensino Médio
(38,7%).
27
Já os dados que se referem ao nível de aprendizagem em leitura e escrita no nosso
país, infelizmente, ainda nos preocupam. Segundo o MEC e o Instituto Nacional de
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a partir da Avaliação Nacional da
Alfabetização - ANA (2014), verificou-se que 22,21% dos alunos estão no nível mais
baixo de leitura, se distanciando pouco dos 24,13% que os dados apontaram na ANA
realizada em 2013, comprovando uma pequena evolução. E ainda que, apenas 11,2% de
crianças brasileiras que estudam em escola pública possuem o nível esperado de
proficiência em leitura, que é o nível quatro.
A preocupação se amplia quando temos conhecimento de que o percentual
analisado por região retrata o Nordeste como a que possuí maior concentração de crianças
no primeiro nível de leitura do país, com 36%. Na escrita, a avaliação retrata que apenas
9,88% das crianças possuem aprendizagem adequada para o fim do ciclo de alfabetização
e na matemática, 25,15%. Em relação aos adultos, segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE, quase 14 milhões de brasileiros com mais de 15 anos se
autodeclararam analfabetos.
Em cinco anos, de 2007 a 2012, desde o início de nossas pesquisas na área, três
milhões desses adultos brasileiros deixaram de ser analfabetos, o que é significante. As
políticas públicas não têm fechado os olhos para a alfabetização/analfabetismo, e o Plano
Nacional de Educação – PNE é um exemplo disso, com vigência de 2014 a 2024, sendo
a alfabetização contemplada em duas de suas vinte metas. A primeira (a meta 5) diz
respeito à “Alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3º ano do Ensino
Fundamental” e a segunda (a meta 9) “Elevar a taxa de alfabetização da população com
15 anos ou mais para 93,5% até 2015 e, até o final da vigência deste PNE, erradicar o
analfabetismo absoluto e reduzir em 50% a taxa de analfabetismo funcional”.
Diante do quadro de incertezas e instabilidades atual de nosso país, ainda não
sabemos o que ocorrerá com o Plano Nacional de Educação, porém nos perguntamos o
que vinha sendo feito, até os dias de hoje, para mudar esse quadro de insucesso/fracasso
escolar? Desde do ano de 2012 foi criado o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade
Certa – PNAIC, com o intuito de assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas
até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do Ensino Fundamental. Um compromisso
firmado entre governos, estados e municípios. Para isso os professores alfabetizadores
participam de formações contínuas, que já se constituem no terceiro ano presencial,
totalizando 120 horas por ano.
Alguns outros programas voltados para a leitura e escrita já foram e vem sendo
ofertados pelo Ministério da Educação. Um exemplo deles foi o Programa de Formação
28
de Professores Alfabetizadores (PROFA) que aconteceu no ano 2001; o Pró-Letramento
que oferece formação continuada para os professores das séries iniciais do Ensino
Fundamental (1º ao 5º ano) desde 2006; o Programa Brasil Alfabetizado, desde 2003,
com foco na Educação de Jovens e Adultos – EJA e o Programa Nacional do Livro
Didático para a Alfabetização de Jovens e Adultos (PNLDEJA), que disponibiliza livros
didáticos aos alunos de EJA.
No entanto, o número de mais 13 milhões de analfabetos ainda é muito alto. Então,
cientes desses programas, do reconhecimento de suas qualidades e seriedade, nos
questionamos por que o Brasil ainda possui a oitava maior população de analfabetos do
mundo, segundo pesquisa (Pnad) divulgada pela Unesco, em 2014?
Os fatores são inúmeros, já que a alfabetização, como diz SOARES (2003), é um
fenômeno complexo e multifacetado. Porém pensamos que mesmo com um bom
programa de formação específica para alfabetização, a falta de articulação com políticas
de outras áreas dificulta o seu desenvolvimento.
Algumas vivências práticas podem nos apresentar exemplos de como isso
aconteceria na escola: um grupo de docentes participa do PNAIC, mas, quando retorna à
escola, a equipe gestora não abraça o projeto, dificultando suas práticas. Ou então, quando
as crianças não conseguem se concentrar nas atividades porque sentem fome.
Corroboramos com Dourado (2011, p.36) quando comenta que “historicamente, a ação
governamental tem tido centralidade nas políticas educacionais, sobretudo as ações e os
programas sem articulação com políticas mais amplas”, como na área da saúde, por
exemplo.
Além disso, autoras como Gatti (2006, p.3) revelam que a formação dos
professores dos cursos que formam alfabetizadores é questionável,
Ensinar a ler e escrever é um processo muito complexo. No entanto, os
cursos superiores não dão a atenção devida a esse processo. Eles
também não estão preparados para formar os alfabetizadores. Os
professores desses cursos não têm formação suficiente para formá-los.
Alguns cursos superiores não valorizam esse processo, então os formadores de
professores já são provenientes de uma formação sem qualidade, sendo assim como vão
formar bem o futuro professor?
O processo de alfabetização é um processo sócio histórico, provoca tanto nas
pessoas, quanto na sociedade transformações de natureza cultural, política e econômica,
uma vez que, após o conhecimento do sistema de escrita, a pessoa passa a ter outra
29
condição de vida, sua percepção diante dos fatos é diferente e a percepção que os outros
têm diante dela também (SOARES, 1996).
Devemos aqui relembrar que o sujeito que lê e escreve possui condições de
emancipação, pois poderá quebrar as correntes da submissão e ficar longe de ser
acomodado, pois já não concebe injustiças, não permite ser diminuído, exige participação
nos fatos, é de fato um cidadão histórico. Como ainda não oportunizar nossos alunos à
essa condição? Isso parece ser tão óbvio, mas por vezes, tão banalizado. Essa banalização
de certo, se transforma em falta de interesse e conhecimento. Por isso, vamos conhecer
quais são nossas questões de pesquisa, objetos e objetivos.
1.3 QUESTÃO DE PESQUISA, OBJETO E OBJETIVO
Diante do exposto, a questão de pesquisa que norteará esse estudo é:
- Que conteúdos programáticos devem compor um curso de formação contínua orientado
por Necessidades da Formação Docente de professoras da Educação Infantil/ Pré-Escola?
Como objeto de estudo, partindo da tese que uma formação contínua para
professores da Educação Infantil, que considere as suas necessidades de formação,
contribui na superação de dificuldades encontradas no desenvolvimento da prática
pedagógica com crianças, temos:
- Curso de formação contínua orientado por Necessidades da Formação Docente de
professoras da Educação Infantil/Pré-escola.
Com aquela questão de pesquisa e objeto definidos, elaborou-se o seguinte
objetivo que norteará este trabalho de tese:
- Desenvolver um curso de formação contínua orientado por Necessidades da Formação
Docente de professoras da Educação Infantil/ Pré-Escola.
30
1.4 ESTADO DA ARTE
As pesquisas do tipo “estado da arte” são complexas de serem definidas. Para
alguns autores, como Romanowski e Ens (2006), são pesquisas que mapeiam o
conhecimento que se desenvolveu ou que está sendo desenvolvido sobre algum tema e
que possuem carácter bibliográfico. Analisa o destaque dado àquele assunto, a partir da
publicação de teses de doutorado e dissertações de mestrado defendidas, de artigos e
pesquisas em periódicos e em anais de congresso. Tudo isso em um determinado tempo
e espaço.
Para outros, como Ferreira (2002), a expressão “estado do conhecimento” também
poderá ser utilizada, pois acredita que o “estado da arte” ou “estado do conhecimento”
tem por objetivo mapear e discutir uma certa produção acadêmica em determinado campo
de conhecimento (Ferreira, 2002, p.258).
Já para Therrien, Therrien,(2004), existem diferenças entre os termos e propões
caracterizar cada expressão: “estado da arte”, “estado da questão” e “revisão de
literatura”. Para os autores o estado da arte tem o objetivo de “mapear e discutir uma certa
produção científica acadêmica em determinado campo de conhecimento” (THERRIEN,
THERRIEN, 2004, p. 8). Nesse trabalho assumiremos a expressão de estado da arte
baseada no conceito de Romanowski (2006).
O trabalho com estado da arte é complexo. Muitas vezes há dificuldades de acesso
a esses materiais, como a falta de atualização dos bancos de dados das bibliotecas
universitárias, por exemplo, ou ferramenta de busca com usabilidade pouco acessível aos
seus usuários, como no caso da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações -
BDTD, neste trabalho; que na mesma busca informou resultados diferentes, em
momentos diferentes, quando deveria ser estável, o que o fez ser eliminado de nossa
pesquisa; ou simplesmente a ausência total dessas ferramentas, tornando o trabalho mais
cansativo de abrir e ler produção por produção publicada.
Por isso, essa pesquisa de estado da arte pretende fazer um levantamento sobre a
formação contínua de professores a partir de suas necessidades de formação e sobre a
formação do professor que ensina leitura e escrita.
Para tanto realizamos a procura por palavras-chave em títulos e/ou assuntos,
seguida da leitura de resumos até trabalhos na íntegra, considerando os últimos cinco anos
de produção, no Brasil, pois necessitávamos inserir um corte cronológico. Em seguida,
cruzamos todas elas, pois esse conjunto é o que dá origem e significado à esta tese. Estes
bancos foram selecionados, segundo André; Simões; Carvalho; Brzezinski (1999, p. 304)
31
de acordo com os “critérios de expressividade e acessibilidade, considerando-se a
importância da instituição divulgadora e sua circulação nacional”.
Nesse sentindo, consideramos em nível nacional: o Banco de Teses e Dissertações
da Capes2 e o Portal de Periódicos da Capes, além de outros sete periódicos de destaque
na área de Educação intitulados: Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas,
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Revista da Faculdade de Educação da USP,
Cadernos Cedes, Educação e Realidade, Educação e Sociedade e Revista Brasileira de
Educação. Ainda os trabalhos publicados no Grupo de Trabalho de Formação de
Professores – GT 08, da ANPED. À nível local, o banco de teses e dissertações do
Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGEd, bem como nossa revista local,
Educação em Questão.
Iniciamos a investigação com a digitação da expressão “formação de professores”,
no campo de busca de cada banco de dados, selecionado acima. Em seguida, “formação
continuada de professores”, já que a palavra continuada contém a palavra contínua e
sabemos que o primeiro termo também é utilizado por pesquisadores. Utilizamos essa
técnica para compreender quantos trabalhos de formação de professores discutem sobre
formação contínua de professores. A tabela abaixo demonstra nossas pesquisas:
Tabela 1 – Quantidade/Porcentagem de trabalhos publicados em “formação continuada
de professores” comparada à quantidade de trabalhos publicados “em formação de
professores”
BANCO DE DADOS
Formação de
professores
Formação Continuada de
professores
Banco de Teses e Dissertações Capes 3.596 963 26,77%
Portal de periódicos da Capes 3.197 565 17,67%
Banco de teses e dissertações PPGEd 38 7 18,42%
2 De acordo com nota da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o Banco
de Teses dispõe de trabalhos defendidos na pós-graduação ano a ano, incluindo dissertações. Porém, nesse
momento, apenas os trabalhos de 2012 e 2011 estão disponíveis para consulta pública on line.
32
Cadernos de Pesquisas da Fundação
Carlos Chagas
16
3
18.75%
Revista Brasileira de Estudos
Pedagógicos
17
7
41,17%
Revista da Faculdade de Educação da
USP
16
5
31,25%
Cadernos Cedes 10 6 60%
Educação e Realidade 21 2 9,5%
Educação e Sociedade 20 5 25,00%
Revista Brasileira de Educação 13 4 30,7%
GT 08 – ANPED 89 11 12,35%
Educação em Questão 20 4 20%
TOTAL 12.479 1.885 15,10%
É explícita a grande quantidade de trabalhos que investiga formação de
professores em nosso país, porém somos surpreendidos com a proporção de pesquisas
que destas se relacionam à formação contínua. Apesar do tema “formação de professores”
estar em alta, com mais de doze mil trabalhos publicados, a “formação
contínua/continuada” não acompanha esse volume científico, pois representa apenas
15,10% de suas publicações.
Apenas um periódico, os cadernos Cedes, publicação do Centro de Estudos
Educação e Sociedade Campinas, São Paulo - possui mais de 50% de suas publicações
referentes à formação continuada/contínua. A Revista da Faculdade de Educação da USP
se aproxima desse valor com 41,17%, no entanto, outros doze bancos de dados ainda
circulam com baixa ênfase na temática. Verificamos que a maioria dos trabalhos sobre
formação de professores são relacionados à formação inicial.
A Revista Educação em Questão, do nosso Programa de Pós-Graduação em
Educação - PPGEd/UFRN, possui 20% de trabalhos publicados, ultrapassando o Portal
33
de Periódicos da Capes, que apresenta um contingente bem maior de pesquisas que uma
revista local e de publicação quadrimestral.
A porcentagem baixa, que indica média total em estudos sobre formação
contínua/continuada, pode comprovar que essa temática merece uma atenção maior dos
pesquisadores, investigadores da formação docente. Isso porque esses dados podem
explicar um dos motivos para compreendermos pela qual estas possuem baixo impacto
na melhoria do ensino.
Segundo pesquisa intitulada “Formação Continuada de Professores no Brasil”,
realizada pelo Instituto Ayrton Senna em parceria com Boston Consulting Group (BCG),
divulgada no mês de julho de 2014, as necessidades dos professores não são contempladas
nos cursos oferecidos. Mesmos quando dizem focar nas práticas, esses cursos priorizam
a teorização de conceitos e não gera impacto nas ações de sala de aula.
Um exemplo disso são as professoras que cursaram vários programas de formação
nos últimos vinte anos na rede estadual de São Paulo, entrevistadas por Altobelli (2008),
afirmando até terem mudado suas concepções e ideias sobre leitura e escrita, por exemplo,
mas isto não significou que os cursos influenciaram suas práticas. Queixam-se de que o
programa não propiciou momentos de exposição em que pudessem relatar suas
dificuldades, já que não estavam previstas na pauta de cada aula (GATTI, 2009).
Além disso, a estabilidade da estrutura de uma formação contínua é complexa pois
sua existência deve estar relacionada às necessidades sociais, que são instáveis e mutáveis
por natureza. Essa estabilidade poderia trazer um rigor, além da qualidade dos cursos de
formação contínua, evitando que cursos inadaptados e incoerentes fossem oferecidos.
Porém as palavras estabilidade e unidade também podem indicar falta de
movimento, trazendo uma característica engessada aos programas de formação e se
relacionando com a ideia anterior, da falta de diálogo com as reais dificuldades dos
professores. Para Malgalive (1995, p.21) “de facto, é impossível satisfazer essas
necessidades variadas exclusivamente por meio de vias de ensino estáveis ajustadas a
nível padrão de entrada e saída e que se destinam a públicos homogêneos”.
Refletir sobre formação contínua é uma atividade complexa. Sua estrutura deve
atender a multiplicidade de fatores sociais e ao mesmo tempo possuir coerência
epistemológica, direção. Ela não pode se apresentar de qualquer forma, apenas porque
atende à uma necessidade. É preciso, portanto, mudar a forma de fazer, mas que sempre
se adeque à objetivos de necessidades reais e não hipotéticas.
34
Posteriormente, analisamos nossos três eixos de pesquisa comparando a
quantidade de publicação entre eles. Gostaríamos de saber qual a temática mais e menos
discutida entre as três.
Tabela 2 – Comparação da quantidade/porcentagem de publicação entre os eixos
“Formação continuada de professores”, “Necessidades de Formação” e “Leitura e
Escrita”
Banco de Dados
Formação
continuada de
professores
Necessidades de
Formação de
professores
Leitura
e
Escrita
Banco de Teses e
Dissertações Capes
963 67,06%
333 23,18%
140 9,74%
Portal de periódicos da
Capes
565 62,29%
246 27,12%
96 10,58%
Banco de teses e
dissertações PPGEd
7 38,89%
4 22,22%
7 38,89%
Cadernos de Pesquisa da
Fundação Carlos Chagas
3 60%
0 0%
2 40%
Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos,
7 77,78%
1 11,11%
1 11,11%
Revista da Faculdade de
Educação da USP
5 29,41%
0 0%
12 70,58%
Cadernos Cedes 6 30% 0 0% 14 70%
Educação e Realidade 2 50% 0 0% 2 50%
Educação e Sociedade 5 50% 0 0% 5 50%
35
A temática “formação contínua/continuada” possui a maior porcentagem de
publicação entre os três eixos, com 64,30% de trabalhos publicados. Encontramos a
formação contínua relacionada a diversos segmentos da educação: tecnologia, mídia,
educação especial, políticas públicas, educação infantil, ensino fundamental, formação
inicial e continuada e muitas outras. Pudemos identificar que as teses e dissertações
lideram as modalidades de pesquisas nessa área. Isso pode nos indicar que pesquisadores
iniciantes, à nível de mestrado (já que muitos iniciam sua vida de pesquisa científica
apenas a partir desse momento mesmo) por exemplo, se interessam por essas temáticas.
Podem também ser útil como alerta para que os pesquisadores mais experientes
(já que os periódicos acima possuem rigorosos critérios de publicação) pesquisem e
estimulem as discussões sobre esses eixos, como os de “necessidades de formação”, por
exemplo, que mesmo com a média total de 23,90% de trabalhos publicados, superando
“leitura e escrita” com 11,78%, possui um ou quase nenhum trabalho em periódicos, com
exceção do Grupo de Trabalho 08 - Formação de Professores - ANPED, com três, de uma
amostra de onze produções.
É importante conhecer a quantidade de trabalhos produzidos em cada temática
para compreender a relevância do nosso trabalho em termos numéricos. Por isso cruzamos
todos os eixos “formação de professor” + “necessidades de formação de professores” +
“leitura e escrita” para compreender, de fato, quanto já foi produzido com essas temáticas
esperando um resultado promissor, para então partimos para a questão da qualidade do
que está sendo produzido.
Nos surpreendemos ao encontrar apenas um trabalho. Uma única tese, pertencente
à nossa Universidade (UFRN), intitulada “Análise de necessidades de formação: uma
prática reveladora de objetivos da formação docente”, da doutoranda Maria Júlia de Paiva
Almeida, defendida em 2014, que tinha como objetivo conhecer necessidades de
formação de professoras alfabetizadoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental e na
Revista Brasileira de
Educação
4 50%
0 0%
4 50%
GT 08 – ANPED 11 64,70% 3 17,64% 3 17,64%
Educação em Questão 4 0% 1 0% 4 100%
TOTAL 1.582 64,30% 588 23,90% 290 11,78%
36
Educação de Jovens e Adultos. Defendeu a tese de que de que a professora alfabetizadora
revela/constrói necessidades de formação ao fazer a relação teoria/prática concernente à
alfabetização.
Até encontramos pesquisas que discutiam a formação contínua/continuada e a
leitura e escrita (como demonstra a tabela 3) porém nenhuma, além da que citamos acima,
esteve relacionada às necessidades de formação desses professores.
Tabela 3 – Quantidade de publicações que relacionam os eixos “Formação continuada
de professores” e “Leitura e Escrita”
As vinte e quatro produções que se destacam no Portal de Periódicos da Capes,
discutem sobre uma enorme variedade de temas, tais como: o Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa - PNAIC, O Programa Um Computador por aluno –
Banco de Dados Formação Continuada e
Leitura e Escrita
Banco de Teses e Dissertações Capes 20
Portal de periódicos da Capes 24
Banco de teses e dissertações PPGEd 6
Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas 0
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 2
Revista da Faculdade de Educação da USP 0
Cadernos Cedes 2
Educação e Realidade 0
Educação e Sociedade 0
Revista Brasileira de Educação 0
GT 08 – ANPED 3
Educação em Questão 0
TOTAL 51
37
PROUCA, a postura do professor crítico-reflexivo, as políticas e o banco mundial,
sociolinguística, o uso do computador, práticas pedagógicas, instrumentos de
alfabetização, avaliação de programas como o Letra e Vida e Pró-Letramento, livros de
alfabetização, o Ensino Fundamental de nove anos, identidade profissional e programas
de formação no Brasil e Portugal.
No banco de Teses e Dissertações da Capes, observamos que algumas produções
se repetem no Portal de Periódicos da mesma, além de só disporem de produções
referentes aos anos de 2011 e 2012 (destacado anteriormente em nota de rodapé). Por isso
as temáticas são basicamente as mesmas, acrescidas de: Educação de Jovens e Adultos,
auto formação e ludicidade.
No PPGEd/UFRN, encontramos seis produções. A primeira, no ano de 2011, em
que a aluna Adélia Dieb Ubarana, investigou em sua tese, o percurso formativo de
professores que conseguem alfabetizar crianças na escola pública, e os contextos de ação
didático-pedagógico que definem suas práticas exitosas. No ano de 2012, a dissertação
de Francisca Edilma Aureliano, que analisou as repercussões do Programa Pró-
Letramento Curso Alfabetização e Linguagem nas concepções e práticas de alfabetização
de professores cursistas.
Em 2013, a dissertação de Adele Guimarães Ubarana Santos, “Não é que eu sei
ser professora! Formação continuada e construção do currículo da Matemática para o
ciclo de alfabetização”, investigou como a prática da formação continuada em
Matemática dos professores do Núcleo de Educação da Infância/Colégio de Aplicação
(NEI/CAp) tem possibilitado a construção do currículo da Matemática para o ciclo de
alfabetização nessa instituição.
Ainda em 2013, a tese “Vozes não silenciadas de alfabetizandos jovens e adultos
e suas repercussões na formação docente”, da autora Cristine Tinoco da Cunha Lima
Rosado, pesquisou as concepções que alfabetizandos jovens e adultos possuem sobre si
mesmos, sobre seu direito à educação, sobre a escola e seu processo de alfabetização e
como esses saberes contribuem para um processo de formação continuada de seus
professores.
A quinta produção, em 2014, é a tese de Clotenir Damasceno Rabêlo, que analisou
o papel exercido pelo Município nas políticas de formação continuada de alfabetizadores,
tomando como campo de estudo os Municípios cearenses de Jaguaruana e Palhano. Vale
destacar que a sexta produção é a da doutoranda Maria Júlia de Paiva Almeida, defendida
em 2014, citada anteriormente, já que também se relaciona com as necessidades de
formação de professores.
38
Na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, volume 92, número 231, em 2011,
encontramos o artigo de Telma Ferraz Leal e Andrea Tereza Brito Ferreira, que discute
sobre estratégias formativas utilizadas no programa Pró-Letramento.
No Cadernos Cedes os únicos trabalhos encontrados foram o da autora Arlene de
Paula Lopes Amaral, que apresenta reflexões sobre a participação no Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa, presente no caderno 95, Volume 35 – Formação continuada
e práticas formadoras, em janeiro-abril de 2015. E o das autoras Ana Carolina Perrusi
Brandão, Telma Ferraz Leal e Bárbhara Elyzabeth Souza Nascimento, sobre o papel da
mediação docente na utilização de textos na alfabetização, Número 90, Volume 33 –
Alfabetização em Foco, em maio-agosto de 2013.
No GT 08 da ANPED - Formação de Professor, três trabalhos foram focados na
formação do professor, leitura e escrita: o de Adriana Bauer, intitulado “Formação
continuada de professores para alfabetização: avaliação de impacto do Programa Letra e
Vida”, em 2011; o das autoras Giovana Medianeira Fracari Hautrive e Doris Pires Vargas
Bolzan, com o título “Aprendizagem da docência alfabetizadora no contexto da surdez”,
em 2013; e o de Luciana Ribolli de Oliveira “Educação continuada: um estudo sobre
participantes dos programas letra e vida e ler e escrever”, também em 2013.
Podemos dizer que, essa pesquisa de estado da arte tentou ser o mais verossímil
possível em seus dados e análises, porém encontrou obstáculos que dificultaram alguns
acessos, causando um trabalho cauteloso e exaustivo de conferência de cada periódico,
na íntegra.
A pesquisa nos permitiu concluir que as produções sobre formação contínua são
inferiores às de formação inicial, pois representam apenas 15,10% da média total de
trabalhos que versam sobre formação de professores. Que entre os eixos temáticos
selecionados “formação continuada de professores”, “necessidades de formação
continuada” e “ leitura e escrita” as pesquisas em “formação continuada de professores”
representam 64,30% da totalidade dos três.
E que ainda cruzando as três temáticas, só encontramos um trabalho de tese de
doutorado, em 2014, que ainda sim se difere da nossa, por tratar das questões de leitura e
escrita relacionadas ao Ensino Fundamental e à EJA, e não à Educação Infantil/Pré-
escola, como fazemos. Esses dados ratificam e justificam a relevância de nossa pesquisa.
1.5 ESTRUTURA DA TESE
39
Na introdução desta tese de doutorado apresentamos a gênese e as motivações do
estudo justificando os eixos: formação docente e formação contínua, necessidades de
formação e a leitura e escrita de crianças na Educação Infantil/Pré-escola. Além disso
apresentamos uma contextualização acerca dos estudos atuais sobre esses eixos,
oferecendo um panorama nacional e local dessas discussões, a partir de um estado da arte
que acessou os principais bancos de dados sobre educação no país.
No segundo capítulo – Percurso Investigativo, contemplamos os princípios
teórico-metodológicos que irão subsidiar a tese, os instrumentos para a construção de
dados bem como os critérios de escolha para os sujeitos e lócus da pesquisa. Além disso,
contemplamos o planejamento da pesquisa, apresentando como ela foi organizada para
se desenvolver na instituição selecionada.
No terceiro capítulo – Necessidades de formação contínua de professores
abordamos as necessidades de formação a partir do diálogo sobre seus conceitos e
características enquanto campo teórico e prático, bem como sua importante ação
reveladora de objetivos para formação docente. E ainda as teorias relativas à formação
contínua de professores, discutindo seus conceitos, sua faceta reguladora, a construção
dos currículos para esta formação, bem como os sentidos heterogêneos a que se propõe,
interligados aos ciclos de desenvolvimento e interesses da profissão professor. Destaca a
postura do professor reflexivo/pesquisador, da auto formação e do profissionalismo como
possibilidade de caminho para se alcançar a transformação da formação, em ação. Ainda
alerta que, para fazer sentido, uma formação contínua deve ter como centro de interesses
a escola.
No quarto capítulo – Diagnóstico das necessidades de formação de professoras
da Educação Infantil/ Pré-escola, apresentamos as necessidades que as professoras de
Educação Infantil/Pré-escola enfrentam na prática de educar e cuidar crianças. Dessas, os
sujeitos da pesquisa selecionaram uma para se que se concretizasse em um objetivo para
formação contínua.
No quinto capítulo – Leitura e Escrita na Educação Infantil/Pré-escola:
conhecimentos necessários ao professor privilegiamos discussões sobre leitura e
escrita, destacando o caráter libertador e emancipatório dessa aprendizagem em nossa
sociedade, além da divergência de opiniões sobre sua presença nas práticas pedagógicas
infantis. Além disso, tentamos responder as questões: é possível uma prática pedagógica
de leitura e escrita na Educação Infantil/Pré-escola? Como?
40
No sexto e último capítulo – A formação contínua de professoras a partir de
suas necessidades de formação. Com as necessidades investigadas e uma selecionada
entre o grupo, apresentamos as categorias e subcategorias construídas na pesquisa a partir
da grande temática Ação didático-pedagógica para construção de práticas de leitura e
escrita na Educação Infantil/Pré-escola, no âmbito de uma prática pedagógica que
perspective a superação das dificuldades e a construção de um trabalho de qualidade no
espaço infantil.
Por fim, tecemos nossas Considerações Finais acerca do caminho percorrido, dos
pontos mais significativos, fazendo uma reflexão sobre o trabalho, e consequentemente,
sobre o objeto de pesquisa apreendido. Ainda com destaque para desdobramentos na
pesquisa com necessidades de formação.
PERCURSO INVESTIGATIVO
42
2 PERCURSO INVESTIGATIVO
“Pesquisar é sempre navegar com direção”
(Ghedin;Franco, 2006, p.8)
Com o intuito de atingir nosso objetivo e partindo da tese de que uma formação
contínua para professores da Educação Infantil, que considere as suas necessidades de
formação, contribui na superação de dificuldades encontradas no desenvolvimento da
prática pedagógica com crianças nos questionamos sobre qual a direção investigativa
mais apropriada para essa pesquisa.
Sem estereótipos metodológicos, acreditamos que a definição desse caminho é
uma questão de conhecimento, reflexão e planejamento. Conhecer a metodologia da
pesquisa educacional, seus pressupostos, suas raízes; refletir sobre sua relação direta com
o objeto; planejar como se dará cada passo dessa trajetória, são ações essenciais para uma
investigação de qualidade. Além disso, rigor científico, fidedignidade, transparência,
validade e ética são critérios que não poderão deixar de ser almejados.
A definição da metodologia de uma pesquisa é uma tarefa complexa, e além do
teor direcional, como falam Ghedin e Franco (2006), é também expositiva. Complexa
porque estrutura um conjunto de muitas ações que necessitam sempre estar relacionadas
a um objeto. Quando essa relação não se estabelece o trabalho fica comprometido. Muitos
não conseguem articular seu objeto à sua metodologia ou vice-versa. Aplicam métodos e
instrumentos que não sustentam o foco de seu trabalho. Expositiva porque coloca às claras
concepções e paradigmas que a pesquisa assume (ANDRÉ, 2014).
Nessa perspectiva de assunção, destacamos nosso referencial teórico: Lüdke e
André (1986), Rodrigues e Esteves (1993), Malglaive (1995), Imbernón (1998), Engel
(2000), Yin (2001), Franco (2003), Zabalza (2004), Tripp (2005), Rodrigues (2006), Flick
(2009), Bauer e Gaskell (2010), Fazenda (2010), Bardin (2011), Thiollent (2011), Bogdan
e Biklen (2013) e André (2014).
Ao declaramos nossas escolhas teóricas, compreendemos que nossa pesquisa se
insere na Abordagem Qualitativa de Pesquisa que, embora muito extensa e disseminada
parece que não possui seu conceito “suficientemente discutido, o que tem resultado em
críticas ou defesas, às vezes pouco fundamentadas, de posições, sem que se explicite de
que tipo de pesquisa qualitativa cada um está falando” (ANDRÉ, 2014, p. 19).
43
Preocupadas com essa fundamentação e com a clareza de nossas escolhas
apresentaremos a seguir, a relação deste trabalho acadêmico com esse tipo de
investigação.
2.1 ABORDAGEM QUALITATIVA
Para desenvolver uma formação contínua com professores será providencial
escutar e observar pessoas, promover conversas, descrever detalhes. Por isso é que,
reconhecendo a natureza desses objetos de pesquisa, acreditamos que possua uma estreita
afinidade com a abordagem qualitativa, já que segundo Guba (1978; Wolf,1978 apud
BOGDAN E BIKLEN, 2013, p. 17) nessa pesquisa “o investigador frequenta os locais
em que naturalmente se verificam os fenómenos nos quais está interessado, incidindo os
dados recolhidos nos comportamentos naturais das pessoas: conversar, visitar, observar,
comer, etc”.
A pesquisa qualitativa tem se apresentado como uma modalidade de pesquisa
extremamente útil para a Educação, visto que permite o estudo de experiências,
sentimentos e emoções da forma como são explicitados pelos sujeitos do estudo. Além
disso, possibilita a compreensão de aspectos complexos da realidade, considerando as
particularidades de um contexto sócio educacional específico.
Para Bogdan e Biklen (1994) a abordagem da investigação qualitativa exige que
tudo pode constituir uma pista para a compreensão do objeto de pesquisa, que nada é
trivial. E é nessa perspectiva que pensamos em investigar as necessidades de formação,
compreendendo que nada é simples ou banal e que tudo pode constituir uma necessidade.
Porém, temos quer ter cuidado para ao considerar “tudo” não o considerarmos de
“qualquer jeito”, pois é justamente nesse fato que residem algumas críticas relativas a
essa abordagem.
Não gostaríamos que nossa pesquisa, por investigar necessidades, que não são
mensuradas por dados quantitativos, fosse menos criteriosa ou menos válida, por
exemplo. Por isso, buscamos em Gaskell e Bauer (2010) critérios de boa prática para
guiar uma pesquisa qualitativa, no âmbito da relevância e da confiabilidade. Os autores
elegem seis critérios para tal: triangulação e reflexividade de perspectivas, documentação
transparente de procedimentos, detalhes da construção do corpus, descrição detalhada dos
resultados, evidência de surpresa pessoal e, em algumas circunstâncias, a validação
comunicativa.
44
Poderíamos nos perguntar se não seria fácil apenas indagar os professores sobre
essas necessidades, eles responderiam quais seriam e teríamos os resultados facilmente
nas mãos para desenvolver um curso de formação contínua.
Não é tão simples investigar necessidades de formação, como alguns podem
pensar. Primeiro porque muitas de nossas necessidades são inconscientes, não as
reconhecemos como necessidades, e segundo que são paradoxais, pois se apresentam
subjetivas, o que pode ser necessário para mim pode não ser para o outro e; ao mesmo
tempo, objetivas, pois se transformam em objetivos de formação. É apenas
ressignificando-as com o diálogo entre pesquisado e pesquisador que poderemos chegar
à uma conclusão legítima sobre necessidades de formação.
A abordagem qualitativa permite esse diálogo. O pesquisador é necessariamente
envolvido na vida dos sujeitos (ou participantes) visto que os procedimentos de
investigação se baseiam em ações como ouvir, conversar e permitir a expressão livre dos
interlocutores. Tais procedimentos possibilitam um certo clima de informalidade e o
simples fato dos sujeitos poderem falar livremente a respeito de um tema, colabora para
diminuir o distanciamento entre o investigador e os investigados (SANTOS; ROSSI;
JARDILINO, 2000).
Como nosso objetivo de pesquisa foi definido previamente, já sabíamos que para
se investigar as necessidades de formação de professores poderíamos estudar um grupo
de professores em uma determinada escola. Nesse sentido, selecionamos o Estudo de
Caso como uma das metodologias desse trabalho. Iríamos estudar o caso das necessidades
de formação de professores da escola X para depois planejar uma ação didático-
pedagógica. Mas o que seria um estudo de caso?
2.2 ESTUDO DE CASO
O Estudo de Caso se configura como “[...] uma pesquisa empírica que investiga um
fenômeno contemporâneo em seu contexto natural, em situações em que as fronteiras
entre o contexto e o fenômeno não são claramente evidentes, utilizando múltiplas fontes
de evidência” (YIN, 2001, p.23).
Segundo Stake (1995 apud BORDEST et al. 2006), o objetivo de estudar um caso
é entendê-lo em profundidade e não para compreender outros casos ou fazer
generalizações, uma vez que um dos principais critérios na escolha do caso a ser estudado
é a possibilidade de aprendizado a partir do que é revelado por ele. Porém, André (2014,
p.26) nos acrescenta que “o interesse do pesquisador, ao selecionar determinada unidade,
45
é compreendê-la como uma unidade. Isso não impede, no entanto, que ele esteja atento
ao seu contexto e às suas inter-relações como um todo orgânico, e à sua dinâmica como
um processo, uma unidade em ação”.
O autor destaca cinco características para que o estudo de caso seja considerado
“exemplar”. Nesse sentido, o estudo de caso deve ser: significativo, completo, atraente;
deve, ainda, considerar possibilidades de alternativas e apresentar evidências suficientes.
Assim sendo, convém sublinhar que
o estudo de caso é o estudo de um caso, seja ele simples e específico,
como o de uma professora competente de uma escola pública, ou
complexo e abstrato, como o das classes de alfabetização (CA) ou do
ensino noturno. O caso é sempre bem delimitado, devendo ter seus
contornos claramente definidos no desenrolar do estudo (LÜDKE;
ANDRÉ, 1986, p.17).
É também o conhecimento do particular (ANDRÉ, 2014). Nesta pesquisa, o caso
a ser estudado é o de um grupo de professoras de Educação Infantil/Pré-escola de uma
instituição pública, que conheceremos a seguir, ou seja, um grupo específico e delimitado.
Uma das características mais importantes e questionadas desse método de
pesquisa é o rigor. “Por muitas e muitas vezes, o pesquisador de estudo de caso foi
negligente e permitiu que se aceitassem evidências equivocadas ou visões tendenciosas
para influenciar o significado das descobertas e das conclusões (YIN, 2001, 28-29). Por
isso decidimos realizar, além de entrevistas semiestruturadas com cada professor, como
veremos mais adiante no capítulo dos procedimentos de pesquisa, também observações
participantes, estruturadas a partir de um protocolo individual para cada observação,
contemplando também a boa prática da documentação transparente de procedimentos
como reforçam Gaskell e Bauer (2010).
Ainda, segundo Yin (2001) não existe instrumento para avaliar as habilidades
necessárias a um estudo de caso. No entanto, uma lista básica de habilidades comumente
exigidas incluiria o seguinte:
- Uma pessoa deve ser capaz de fazer boas perguntas - e interpretar as respostas;
- Uma pessoa deve ser uma boa ouvinte e não ser enganada por suas próprias ideologias
e preconceitos;
- Uma pessoa deve ser capaz de ser adaptável e flexível, de forma que as situações
recentemente encontradas possam ser vistas como oportunidades, não ameaças;
46
- Uma pessoa deve ter uma noção clara das questões que estão sendo estudadas, mesmo
que seja uma orientação teórica ou política, ou que seja de um modo exploratório. Essa
noção tem como foco os eventos e as informações relevantes que devem ser buscadas a
proporções administráveis;
- Uma pessoa deve ser imparcial em relação a noções preconcebidas, incluindo aquelas
que se originam de uma teoria. Assim, uma pessoa deve ser sensível e estar atenta a provas
contraditórias (YIN, 2001, p. 81).
Essas habilidades, sem dúvida, auxiliam o pesquisador que estuda um caso. Não
é de qualquer maneira que podemos ir à campo. Devemos estar munidos de habilidades
próprias a fim de que os dados não sejam distorcidos da realidade e assim, comprometam
o rigor da pesquisa.
Neste trabalho, o estudo de caso foi utilizado, especificamente, para construção
das necessidades de formação dos professores que atuavam na Educação Infantil de uma
determinada escola. Mas e depois da descoberta, o que faríamos com esses dados,
enquanto pesquisadores? Essa questão nasce ainda na conclusão do Mestrado em
Educação que, como já dissemos na introdução do trabalho, investigou necessidades de
formação do professor principiante, especificamente.
Nós construímos essas necessidades, concluímos o trabalho, mas nos sentimos
incomodados por não termos dado continuidade à pesquisa utilizando esses dados para
possibilitar uma transformação na prática pedagógica daquelas professoras. Queríamos
desempenhar um papel ativo e almejar uma pesquisa na qual as pessoas tivessem algo a
“dizer” e a “fazer” (THIOLLENT, 2011).
Agora, nesta tese de doutoramento seria quase que, impossível, não pensar em
uma maneira de superar a descoberta de dados e promover/concretizar uma ação. Como
falamos de necessidades de formação, essa ação estaria intrinsecamente ligada à formação
de professores. Por isso, o método da pesquisa-ação também foi utilizado neste trabalho,
como veremos a seguir.
2.3 PESQUISA-AÇÃO
O uso da pesquisa-ação pode estar relacionado a substantivos como: emancipação,
reforma, participação, eficiência, transformação e conscientização. Foi criada a partir da
necessidade de relacionar teoria e prática, na década de 1960, pelo psicólogo alemão Kurt
Lewin (Engel, 2000). Segundo Thiollent (2011, p.20):
47
A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é
concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a
resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os
participantes representativos da situação ou do problema estão
envolvidos.
Como gostaríamos de investigar as necessidades de formação para, em seguida,
pensar e construir conhecimentos para um programa de formação, pautada na ação de
transformar a realidade que encontramos, acreditamos que o método da pesquisa-ação é
o que melhor se aplica ao nosso contexto de pesquisa.
O autor ainda define alguns de seus aspectos, nos quais assumimos em nossa
pesquisa. São eles:
a) Há uma ampla e explícita interação entre pesquisadores e pessoas implicadas na
situação investigada;
b) Desta interação resulta a ordem de prioridade dos problemas a serem pesquisados e
das soluções a serem encaminhadas sob forma de ação concreta;
c) O objetivo da pesquisa-ação consiste em resolver ou, pelo menos, em esclarecer os
problemas da situação observada;
d) Há, durante o processo, um acompanhamento das decisões, das ações e de toda a
atividade intencional dos atores da situação;
e) A pesquisa não se limita a uma forma de ação (risco de ativismo): pretende-se
aumentar o conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou o “nível de
consciência” das pessoas e grupos considerados (THIOLLENT, 2011, p. 22-23)
. Alguns autores preferem não confundir o termo pesquisa-ação com investigação
ação, como Tripp (2005) que acredita que este é apenas um dos inúmeros tipos de
investigação-ação. Porém, quando conceitua investigação-ação, se aproxima do que
consideramos pesquisa-ação. Vejamos: “pesquisa-ação é uma forma de investigação-ação
que utiliza técnicas de pesquisa consagradas para informar a ação que se decide tomar
para melhorar a prática” (TRIPP, 2005, p.447). Sobre investigação-ação:
Investigação-ação é um termo genérico para qualquer processo que siga
um ciclo no qual se aprimora a prática pela oscilação sistemática entre
agir no campo da prática e investigar a respeito dela. Planeja-se,
implementa-se, descreve-se e avalia-se uma mudança para a melhora de
48
sua prática, aprendendo mais, no correr do processo, tanto a respeito da
prática quanto da própria investigação (TRIPP, 2005, p.445-446)
Por isso, neste trabalho, assumimos os dois termos como sinônimos. A última
citação pode ser melhor representada a partir da figura abaixo, que representa o ciclo
básico da investigação-ação em quatro fases: planejar, agir, descrever e avaliar.
Figura 1 – Representação em quatro fases do ciclo básico da investigação-ação,
segundo Tripp, 2005
Fonte: Tripp, 2005
Ao conhecer as necessidades de formação das professoras de Educação Infantil
daquela escola e eleger uma delas para construir um programa de formação, teremos que
planejar nosso programa, partindo da premissa que desejamos aperfeiçoar a prática
daquelas professoras. Em seguida, o plano deverá ser implementado, a partir de encontros
formativos de reflexão, que posteriormente serão registrados pelas professoras e por nós
pesquisadores, descrevendo os efeitos daquela ação. Por fim, o grupo poderá avaliar todo
o processo da ação implementada, fechando assim, o ciclo de investigação-ação.
Para que essas fases sejam realizadas com qualidade, vamos conhecer alguns
instrumentos utilizados na pesquisa que oportunizaram a construção de nossos dados.
AÇÃO
AVALIAR os resultados da ação
PLANEJAR uma
melhora da
prática
AGIR para implementar a melhora planejada
INVESTIGAÇÃO
Monitorar e
DESCREVER os
efeitos da ação
49
2.4 INSTRUMENTOS PARA CONSTRUÇÃO DOS DADOS
Os instrumentos de pesquisa são um forte aliado do pesquisador, afinal são com
eles que podemos construir os nossos dados. Não acreditamos na coleta ou na recolha
deles, afinal os dados não estão à espera do pesquisador, e sim permeados em uma rede
de sentidos e significados.
A seleção dos instrumentos mais adequados à pesquisa está intrinsecamente
relacionada aos objetivos do trabalho em questão. Os objetivos que escolhem os métodos
e instrumentos e não o contrário, como ouvimos de alguns colegas que já escolhem o
método ou os instrumentos antes mesmo de definirem sua questão de pesquisa e/ou
objetivos.
Sendo assim, essa pesquisa contou com os seguintes instrumentos para construção
de seus dados:
Questionário: aplicado no início da pesquisa (apêndice 1). O seu principal objetivo foi
realizar a caracterização dos professores que participariam da pesquisa. Dados como
sexo, faixa etária, escolaridade e tempo de serviço foram contemplados. A importância
do questionário se define pela facilidade com que se interroga um elevado número de
pessoas, num espaço de tempo relativamente curto. Na nossa pesquisa, 6 questionários
foram aplicados.
Entrevista semiestruturada: tipo de entrevista que possui uma flexibilidade em suas
perguntas. Há um planejamento prévio de questões a serem seguidas, mas que pode sofrer
acréscimo ou modificação de perguntas a serem feitas. Se o entrevistado não entender a
questão, o pesquisador pode reformular sua pergunta, por exemplo. Foram realizadas sete
entrevistas semiestruturadas durante a pesquisa. Uma coletiva e seis individuais (apêndice
2). “As boas entrevistas caracterizam-se pelo facto de os sujeitos estarem à vontade e
falarem livremente sobre os seus pontos de vista [...] As boas entrevistas produzem
riqueza de dados, recheados de palavras que revelam as perspectivas dos respondentes”
(BOGDAN e BIKLEN, 2013, p. 136).
Observação Participante: foram realizadas 24 observações durante a pesquisa. Foram 6
dias de observação em cada uma das quatro turmas, que acontecia de maneira intercalada
com a formação: uma semana observação, na semana seguinte: encontro de formação e,
50
assim sucessivamente, pelo período de um semestre. Cada participação foi registrada,
posteriormente, a partir de um protocolo de registro (apêndice 3). Segundo Bogdan e
Biklen (2013, p.125) “é necessário calcular a quantidade correta de participação e o modo
como se deve participar, tendo em mente o que se propôs elaborar”. O número de
observações correspondeu à necessidade de um movimento de reflexão e ação pelas
docentes, atendendo a ideia de práxis educativa.
Notas de campo: referente à pesquisadora. Esse foi utilizado para registro das
observações, após a saída do campo de pesquisa, bem como anotações pessoais sobre o
processo de toda a pesquisa, informações sobre a escola, datas, horários, contatos de
professores, entre outros. “Relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiência
e pensa no decurso da recolha e refletindo sobre os dados de um estudo qualitativo”
(BOGDAN e BIKLEN, 2013, p. 150).
Diários de Aula: referente aos sujeitos da pesquisa. Os diários de aula foram introduzidos
na pesquisa como um instrumento específico para a avaliação do processo formativo.
Foram construídos ao longo da formação e possuíam desde resumos e fichamentos dos
encontros de formação, até considerações sobre a relação com a prática, sentimentos e
impressões sobre o processo formativo. O que são diários de aula? “Documentos em que
os professores e professoras anotam suas impressões sobre o que vai acontecendo em suas
aulas” Zabalza (p.13, 2004). E ainda: “Utilizado como recurso para registrar o andamento
da aula e também voltado para a pesquisa e avaliação dos processos didáticos”.
(ZABALZA, 2004, p.15).
Análise Documental: os documentos utilizados na análise foram as entrevistas
transcritas, os diários de aula das professoras bem como os seus cadernos de
planejamento, os cadernos das crianças, as atividades xerocadas das crianças e o projeto
político pedagógico da escola.
2.5 ANÁLISE DOS DADOS
Os dados da nossa pesquisa foram construídos na interação/triangulação das
informações obtidas através dos instrumentos anteriormente discutidos.
Após a obtenção dos dados, passamos a sistematizá-los, agrupando-os por blocos
de temas, categorias e subcategorias. Essa organização foi necessária no sentido de
51
direcionar o nosso olhar para o conteúdo das falas mais pertinentes quanto às questões de
estudo.
Categorizar resultados significa agrupar os elementos comuns, as ideias ou
expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo (GOMES, 1998). A
categorização facilita o trabalho de análise do pesquisador, uma vez que toma como ponto
de partida as informações mais amplas da construção dos dados, até chegar às mais
específicas.
Após essa organização, os dados são analisados, o que
[...] significa “trabalhar” todo o material obtido durante a pesquisa, ou
seja, [...] as transcrições de entrevista, as análises de documentos e as
demais informações disponíveis. A tarefa da análise implica, num
primeiro momento, a organização de todo o material, dividindo-o em
partes, relacionando essas partes e procurando identificar nele
tendências e padrões relevantes. Num segundo momento, essas
tendências e padrões são reavaliados, buscando-se relações e
inferências num nível de abstração mais elevado. (LÜDKE; ANDRÉ,
1986, p.45).
Para tanto, tomou-se de empréstimo algumas ideias contidas na proposta de
análise de conteúdo defendida por Bardin. A análise de conteúdo é um conjunto de
técnicas que visam obter informações sobre os significados implícitos nas mensagens.
Permite o tratamento de diversos tipos de texto, sejam eles escritos ou imagéticos,
buscando extrair uma interpretação possível e considerando que “por detrás de um
discurso aparente, geralmente simbólico e polissêmico, esconde-se um sentido que
convém desvendar” (BARDIN, 2009, p.136).
Em posse dos dados, como iríamos então analisá-los? Além do que nos sugere
Ludke e André (1986) em citação anterior, para esse labor tomamos como referências as
concepções de Franco (2003) e Bardin (2013) sobre Análise de Conteúdo. Procedimento
de pesquisa que passou a ser utilizado “para produzir inferências acerca de dados verbais
e/ou simbólicos mas, obtidos a partir de perguntas e observações de interesse de
determinado pesquisador” (FRANCO, 2003, p.10).
Mas por que acreditamos na importância da escolha da Análise de Conteúdo, para
prosseguir com a análise de nossos dados? Por uma questão de rigor e descoberta. Os
métodos da Análise de Conteúdo correspondem a dois objetivos práticos: a superação da
incerteza (contestando a transparência dos fatos, a superação da subjetividade própria e
da compreensão espontânea), e o enriquecimento da leitura (sob o olhar atento, a leitura
de dados tende a ser mais fecunda e relevante) (BARDIN, 2013).
52
Ainda para Bardin (2013) a Análise de Conteúdo se organiza a partir de 3 pólos:
a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados. E foi assim que
prosseguimos com a análise dos nossos dados. Durante a pré-análise,
1) Estabelecemos um contato prévio com nossos dados, conhecendo os textos e
realizando o que Bardin (2013) chama de “leitura flutuante”, em que as primeiras
impressões e direcionamentos são tomados nesse contato inicial, numa espécie de pré-
exploração;
2) Em seguida partimos para a construção de um corpus de pesquisa, a partir da seleção
de documentos para serem submetidos à análise, respeitando as regras de exaustividade,
representatividade, homogeneidade e pertinência. “A palavra corpus (latim; plural
corpora) significa simplesmente corpo” (BAUER; AARTS, 2010, p.44). Ou seja, o corpo
do trabalho.
3) Com base nessa seleção, formulamos algumas hipóteses (afirmações provisórias)
relacionadas aos nossos objetivos iniciais;
4) Escolhemos alguns índices e construímos indicadores prévios, selecionando unidades
de significados. “O índice pode ser a menção explícita de um tema numa mensagem”
(BARDIN, 2013, p. 130) Como realizamos essa etapa? Fazendo recortes do texto e
testando sua eficácia e pertinência ao longo da leitura dos documentos.
5) Ao fim da pré-análise, preparamos todos os documentos para a exploração do material.
Essa preparação consistiu na enumeração de tudo o que possuímos para a análise.
Inicialmente: impressão de guias de entrevistas, transcrição dos áudios (entrevista
coletiva e individuais), organização de pastas no computador com as gravações dessas
entrevistas, questionários aplicados. Em seguida: gravações dos encontros de formação,
aquisição de pasta com folhas transparentes para organização de cronogramas, folhas de
frequência dos encontros de formação, protocolos de observação e textos base para os
encontros, bem como a organização de cadernos capa dura, utilizados como diários de
aula e diário de campo.
Chegando ao segundo pólo, o de exploração do material, nos preocupamos em
realizar a codificação e a categorização dos nossos dados. Essa é a parte mais longa e
criteriosa da Análise de Conteúdo, pois consiste na transformação dos dados brutos em
unidades (categorias e subcategorias). Segundo Franco (2003, p. 51) a categorização “é
uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por
diferenciação seguida de um reagrupamento baseado em analogias, a partir de critérios
definidos”. O critério que utilizamos foi o semântico, ou seja, agrupamentos a partir da
53
proximidade de significados das palavras, frases e trechos textuais, considerado a partir
de temas.
Além disso, Bardin (2013) define qualidades para que as categorias sejam boas.
São elas: a exclusão mútua (em que um elemento não pode existir em mais de uma
categoria); homogeneidade (um único princípio de classificação deve organizar a
organização do trabalho); pertinência (adaptação das categorias ao material de análise e
teóricos definidos); objetividade e fidelidade (organizar os índices que pertencem a uma
categoria, o material deve ser codificado todo da mesma maneira selecionada) e a
produtividade (produção de dados férteis).
No terceiro e último pólo: tratamento dos resultados, tivemos o objetivo de
tornar os dados “falantes” e válidos, como sugere Bardin (2013), realizando além da
descrição, a interpretação, que segundo Flick (2009, p.276) “é a essência da pesquisa
qualitativa”.
Sobre questão da validade Flick (2009, p.345) afirma que “pode ser resumida na
questão de definir se os pesquisadores veem aquilo que acha que veêm”. Por isso, nos
preocupamos em deixar claro todo o processo pelo qual construímos nossa análise de
dados, verificando a pertinência que possuía com a abordagem, metodologias e
instrumentos para construção dos dados, demonstrando como foi realizada a
categorização dos dados, que seguiu critérios e que estava fundamentada teoricamente
(Bardin, 2013).
Portanto, com a certeza de que conhecemos exatamente os caminhos e a direção
de nossa pesquisa, nos restava então, eleger alguns critérios para seleção de nosso lócus.
Foram eles:
2.6 CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DO LÓCUS
1. estejam situadas na região metropolitana de Natal (NATAL. Prefeitura Municipal.
SEMURB, 2006);
2. contemplem as esferas públicas de atendimento;
3. ofereçam atendimento de pré-escola;
4. possuam em seu corpo docente professores que estejam atuando na pré-escola durante
o ano de 2014 (ano corrente da realização da pesquisa ação-formação);
5. possibilitem o acesso da pesquisadora.
54
2.6.1 Lócus selecionado
Com esses critérios já estabelecidos, chegamos ao lócus Centro Municipal de
Educação Infantil (CMEI), criado em 2011. Atende crianças do bairro e seus adjacentes,
na faixa etária entre dois e cinco anos de idade (creche e pré-escola).
A escola já contou com modificações na localização de seu espaço físico e em sua
nomenclatura. Em 1980, na sua inauguração, possuía outro nome, em homenagem a
primeira dama do município e funcionava em um prédio cedido pelo Conselho
Comunitário do Bairro.
Em virtude de algumas mudanças políticas na Educação Básica, principalmente
da que alterou sua instituição mantenedora, com a transição de MEIOS (Movimento de
Integração e Orientação Social) para CMEI, deixando a cargo do município as
responsabilidades para a Educação Infantil.
A professora, que dá nome à escola, é nascida na cidade de Currais Novos e, com
apenas 16 anos recebeu título de professora, conferido pelo Diretor do Grupo Escolar
Capitão Mor Galvão, pois lecionava em algumas fazendas.
Após casamento, no ano de 1950, veio morar em Natal e lecionou durante dez
anos em uma escola estadual no bairro das Quintas, chamada Theódulo Câmara. Em
seguida foi professora do Instituto Sagrada Família, dessa vez, já possuidora de titulação
oficial de um curso oferecido para professoras leigas.
Em 1972, passou a ser conhecida na comunidade por suas aulas de reforço a alunos
de diferentes escolas. A procura foi tanta que decidiu fundar uma escola particular, que
em seguida passou a ter novo nome. O número de alunos e turmas foi aumentando ao
ponto de necessitarem ampliar o atendimento das crianças para o Ensino Médio e,
portanto, transformar a escola em um atual Centro Educacional, muito conhecido na
cidade, e que já possui mais de uma unidade em nosso estado.
A professora recebeu em outubro de 2009, o título de cidadã natalense, pelos
serviços prestados à educação na cidade, homenagem concedida pela Câmara Municipal
de Vereadores de Natal. Em dezembro deste mesmo ano, faleceu aos 94 anos de idade.
Após essa breve explanação sobre a gênese do CMEI, vamos nos ater ao
funcionamento desse espaço, atualmente. O prédio de funcionamento do Centro
Municipal, recebeu em outubro de 2013, denúncia de rachaduras e desabamento. Os pais
da escola se reuniram e pediram sua interdição. Provisoriamente, por apenas 3 meses, a
escola mudaria de endereço e passaria a se instalar em um novo espaço, pertencente ao
55
governo do Estado. Porém, o próprio governo já havia cedido esse espaço para uma escola
cooperativista chamada de COEDUC, que chegou a falir.
Com essa situação, a mesma cedeu seu espaço para o CMEI. Porém a COEDUC
construiu um galpão nesse terreno, por isso, a prefeitura precisou instalar lâmpadas,
ventiladores, entre outros para que viabilizasse o funcionamento de uma escola para
crianças. Como galpão, faz locações do local para grupos de teatros, por exemplo, e por
isso o espaço escolar é dividido com outras instituições, o que acarreta alguns transtornos
no cotidiano dos alunos e professores.
Além disso, uma outra escola, como o mesmo problema, também recebeu o
benefício desse espaço. Resumindo, duas escolas funcionam em um mesmo espaço,
dividido também com grupos de teatro e outras instituições: como um conselho da polícia
militar e uma federação de jogo de botão, que utilizam o espaço no turno noturno. Neste
uso, está o compartilhamento dos espaços comuns como cozinha e banheiros, o que
ocasiona alguns conflitos por uso inapropriado ou uso de material alheio, como
mantimentos para lanche das crianças, por exemplo.
No ano de realização dessa pesquisa, em 2014, ainda não havia previsão de
mudança desse espaço. A promessa é de um terreno para a construção de um novo prédio,
que, há quase dois anos após as denúncias, ainda não se efetivou.
Atualmente o espaço destinado ao CMEI conta com uma sala de
secretaria/direção, uma sala que comporta almoxarifado e espaço para planejamento de
professores, ao mesmo tempo e, duas salas de aula com mesas e cadeiras adaptadas.
No entanto, nessas duas salas de aula, funcionam quatro turmas. Na primeira, as
turmas 1 e 2 (creche) preenchem o horário do dia inteiro já que oferecem matrícula
integral para as crianças pequenas. Na segunda, turmas 3 e 4 (pré-escola) dividem o
espaço em turnos matutino e vespertino, o que gera algumas dificuldades na prática
escolar das professoras e na rotina das crianças. Além disso, possui ampla cozinha, quadra
de esportes, parque de areia, área de recreação coberta e quatro banheiros, dois para os
funcionários e dois para as crianças. Lembrando que todos esses espaços, excluindo-se as
duas salas de aula, são divididos com outro CMEI.
A filosofia da escola está fundamentada nos valores sociais da verdade, da
sensibilidade, da autonomia, da competência, da sociabilização e do respeito. Sua
proposta metodológica está baseada no conhecimento prévio do aluno e em sua vivência,
considerando a interação com a família, o diálogo e a troca de experiências.
Como forma de preservar, e não expor a escola citada acima, utilizaremos o nome
fictício de CMEI Estela Campelo (em homenagem a professora orientadora desse
56
trabalho de tese) para nos referimos ao lócus selecionado. E foi nesse espaço que
buscamos conhecer os sujeitos de nossa pesquisa. Antes disso precisávamos saber se
atendiam aos nossos critérios de seleção, como veremos a seguir.
2.7 CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DOS SUJEITOS
Como critérios para seleção dos sujeitos dessa pesquisa, elencamos:
1. estar atuando como professora ou coordenadora de turma de pré-escola em 2014 (ano
da pesquisa);
2. possuir cargo efetivo na esfera de trabalho;
2. estar disponível, espontaneamente, a colaborar com a pesquisa.
2.7.1 Sujeitos selecionados
Com esses critérios estabelecidos selecionamos quatro professoras e duas
coordenadoras de turnos distintos: duas professoras e uma coordenadora do turno
matutino e duas professoras e uma coordenadora do turno vespertino. A seleção das
coordenadoras se deu ao fato de que poderiam oferecer um olhar mais abrangente das
práticas pedagógicas das professoras e também de suas necessidades formativas, visto
que orientam e acompanham as docentes em seu trabalho diário, substituem professoras
em momentos de ausência das mesmas, são, portanto, professoras das professoras. Além
disso, as pesquisas sobre necessidade de formação indicam que não temos consciência de
muitas de nossas necessidades, por isso são desconhecidas pelo próprio sujeito que as
possui, como veremos a seguir no capítulo que conceitua e caracteriza as necessidades de
formação.
No entanto, uma das professoras do turno matutino necessitou assumir outro cargo
em cidade diferente da nossa, logo após a realização da entrevista semiestruturada, o que
ocasionou a inclusão da mesma, no período de investigação das necessidades formativas,
mas de sua exclusão, no período da formação, totalizando então três professoras e duas
coordenadoras, nesse último momento.
Os sujeitos foram identificados, neste trabalho, por nomes fictícios. A escolha
desses nomes está relacionada – a substantivos recorrentes mencionados por cada
professora e coordenadora nas entrevistas, aos traços de personalidade e de prática de
cada profissional - em uma relação direta com os saberes indispensáveis à prática docente
57
de educadores críticos, como diz Paulo Freire, em sua Pedagogia da Autonomia (1996).
Portanto, as seis entrevistadas nesse trabalho passarão a se chamar: Firmeza,
Conhecimento, Paciência, Criatividade, Cuidado e Humildade, palavras que compõem o
cenário da Educação Infantil/Pré-escola e indicam traços da prática e da personalidade de
cada uma delas. A professora Conhecimento foi a que não participou do período de
formação, pelo motivo já explicitado.
A partir de um questionário aplicado e de algumas questões da entrevista
semiestruturada, conseguimos uma caracterização dessas professoras: os seis sujeitos são
do sexo feminino. Uma professora está na faixa etária acima de 50 anos, duas na faixa
etária entre 41 e 50 anos e as outras três na faixa entre 31 a 40 anos.
No que diz respeito à escolaridade, Firmeza concluiu Magistério no Ensino
Médio, cursou Pedagogia e está com o curso de especialização “EJA Prisional” em
andamento. Paciência também, com a diferença que seu curso de especialização é na área
da Educação Infantil. Conhecimento e Cuidado também possuem Magistério no Ensino
Médio e Ensino Superior, em Pedagogia e Letras, respectivamente, mas não possuem
especialização. Criatividade possui graduação em Pedagogia e Humildade possui a
mesma formação de nível superior mas com o diferencial de uma especialização como a
de Paciência, que é em Educação Infantil. Concluindo: quatro professoras concluíram
Magistério no Ensino Médio. Todas possuem Ensino Superior, três em Pedagogia e uma
em Letras. Duas possuem especialização em Educação Infantil, e uma está com
especialização em EJA Prisional em andamento. Outras três professoras não possuem
curso lato sensu.
O tempo de serviço como professora oscila entre cinco e onze anos de experiência,
sendo especificamente quatro professoras com cinco anos, uma com dez e outra com onze
anos. Sobre o tempo de experiência na Educação Infantil/Pré-escola, o tempo de duas
professoras coincidem com o tempo total de suas experiências na docência, cinco anos.
Ou seja, se dedicaram à Educação Infantil em todo o tempo que se tornaram professoras.
Quando nos referimos ao tempo de serviço na escola, lócus da pesquisa, quatro
professoras possuem três anos e apenas uma, um ano de exercício no CMEI. Todas
possuem cargo efetivo no município de Natal. Uma possui vínculo também com o Estado
e outra possui outros vínculos, não mencionados no questionário. A tabela abaixo
demonstra esses dados com mais clareza:
58
Tabela 4 – Caracterização dos sujeitos da pesquisa
Fonte: a autora
2.8 PLANEJAMENTO DA PESQUISA
Com toda a fundamentação teórica compreendida e relacionada com o objeto de
pesquisa, organizamos nossas ações a partir de um planejamento. A ação de planejar nos
ofereceu segurança e objetividade na pesquisa. “Um bom plano garante que teoria, coleta,
análise e interpretação de dados estejam integrados” diz Franco (2003, p.32).
Fomos à escola investigar se atendia aos critérios de seleção do lócus, em seguida
se os sujeitos ali presentes atendiam aos critérios descritos anteriormente. Atendendo
ambos aos critérios estabelecidos, o primeiro passo foi marcar um encontro com a equipe
docente e com a direção da escola. Nos apresentamos e apontamos os objetivos da
pesquisa.
Com a aceitação do grupo gestor e das professoras ali presentes, indicamos o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (apêndice). Nessa etapa inicial a equipe se
mostrou, naturalmente, mais reservada. Porém, logo marcamos as entrevistas
semiestruturadas individuais, o que tornou o contato pesquisador-pesquisado mais íntimo,
e facilitou os encontros posteriores.
Finalizadas as entrevistas individuais, uma entrevista coletiva foi proposta e aceita
pelo grupo (apêndice). Pensamos em realizar esse formato coletivo, por acreditar que,
assim como pensam Bogdan e Biklen (1994, p. 138) esse tipo de entrevista “pode ser útil
para transportar o entrevistador para o mundo dos sujeitos”. E que ainda, nessa situação,
Fem
inin
o
Mas
culin
o
31
-40
an
os
41
-50
an
os
Mai
s d
e 5
0 a
no
s
até
2 s
alár
ios
mín
imo
s
3-4
sal
ário
s
mín
imo
s
Mai
s d
e 4
sal
ário
s
mín
imo
s
Ensi
no
Méd
io
Ensi
no
Su
per
ior
Pó
s-gr
adu
ação
Men
os
de
10
an
os
10
-15
an
os
Mai
s d
e 1
5 a
no
s
Men
os
de
10
an
os
10
-15
an
os
Mai
s d
e 1
5 a
no
s
Men
os
de
10
an
os
10
-15
an
os
Mai
s d
e 1
5 a
no
s
Nív
el 3
Nív
el 4
Co
ord
enaç
ão
Mat
utin
o
Ves
per
tin
o
Efet
ivo
Esta
giár
io
Serv
iço
Ou
tro
s
Esta
do
Mu
nic
ípio
Ou
tro
s ví
ncu
los
Conhecimento X X X X X X X X X X X X
Paciência X X X X X X X X X X X X X
Criatividade X X X X X X X X X X X X
Firmeza X X X X X X X X X X X X X
Cuidado X X X X X X X X X X X X
Humildade X X X X X X X X X X X X
Tempo de
experiência
na Educação
Infantil/Pré-
Escola
SUJE
ITO
S
Tempo de
serviço no
CMEI
Turnos
que
leciona
no CMEI
Local
CARACTERÍSTICAS DOS SUJEITOS
Faixa salarialSexo Faixa etária Escolaridade
Tempo de
serviço como
professor
Vínculo
Empregatício
Turmas que
leciona no
CMEI
59
várias professoras juntas poderão ser encorajadas a falar sobre um tema e estimular uma
as outras, avançando em suas ideias (BOGDAN; BIKLEN, 1994).
Após a realização de seis entrevistas individuais, com duração média de 1 hora e
meia, mais uma entrevista coletiva de três horas, necessitamos de um tempo para realizar
a primeira análise e categorização de dados da pesquisa.
Com essa organização realizada, várias necessidades de formação foram
construídas. Como forma de oferecer mais validade aos resultados da pesquisa, sentimos
necessidade de, também, realizar observações em cada turma.
As docentes sentiram-se um pouco desconfortáveis com o pedido. É válido
destacar que, conversamos sobre a possibilidade dessa presença na sala de cada uma
delas, durante um momento de suas aulas, 40 minutos ou 1 hora no máximo.
Primeiramente, deixando claro que objetivo não era da crítica nem do juízo, e sim do
olhar mais apurado sobre essa prática a fim de confirmar ou não as categorias resultantes
das entrevistas. Foi dito que só entraríamos com permissão. Se assim não consentissem
não haveria problema. Deixamos claro que a contribuição era apenas para elas. Todas
consentiram.
Nossa intenção seria apresentar a categorização desses dados a partir de uma
tabela, afim de selecionarmos, todas unidas, a necessidade de formação mais urgente
àquele grupo escolar. Para isso, necessitávamos de mais um encontro coletivo.
O encontro ocorreu e as discussões iniciais apontavam que a necessidade
selecionada poderia estar relacionada ao Ensino da Matemática, porém durante a
categorização inicial de dados, a frequência com que citaram dificuldades relacionadas à
leitura e escrita foram maiores que as relacionadas ao ensino da matemática.
Além dessa frequência, após as primeiras observações, constatamos que algumas
dificuldades estavam se concretizando nas práticas de leitura e escrita com as crianças.
Podemos também afirmar que, o desejo da formação em Matemática foi marcado por uma
minoria mais falante de duas professoras, no início do diálogo. Quando a discussão se
desenvolveu, as outras professoras, mais tímidas, foram apontando questões relacionadas
diretamente ao ensino da leitura e escrita: posso corrigir as palavras escritas pelas
crianças? Elas podem aprender o alfabeto? Os pais nos cobram que a criança saiba ler e
escrever no último ano da Pré-escola, está certo? O que fazer com as crianças menores
(de quatro anos) na sala, elas podem escrever textos? Como eu vou pedir para a criança
contar uma história se ela ainda não sabe ler?
Diante dessas questões, apresentamos a categorização dos dados realizada.
Destacamos as quatro observações realizadas (uma em cada turma) e o grupo chegou à
60
conclusão que havia uma grande necessidade de compreensão sobre as práticas de leitura
e escrita na escola. Essa situação também ofereceu condições intelectuais à pesquisadora
de desenvolver e sustentar um curso de formação contínua nesta temática, já que possui
maior intimidade, desde o período que atuava como bolsista de iniciação científica nos
assuntos relacionados à leitura e à escrita.. Sobre essa ação conjunta
(pesquisador/sujeitos) de selecionar uma necessidade/objetivo para a ação de formação,
Thiollent nos diz,
“Muitos autores consideram que são apenas as populações que
determinam o tema. Outros dizem que há sempre uma adequação a ser
estabelecida entre as expectativas da população e as da equipe de
pesquisadores. A nosso ver, deve haver entendimento. Um tema que
não interessar à população não poderá ser tratado de modo participativo.
Um tema que não interessar aos pesquisadores não será levado a sério
e eles não desempenharão um papel eficiente (THIOLLENT, 2011,
p.60)”.
Por isso, contemplando o interesse de ambas as partes e com a necessidade de
formação selecionada, discutimos sobre a estrutura mais adequada para nossa ação:
procedimentos metodológicos, frequência dos encontros, das observações e a avaliação.
O quadro abaixo nos permite visualizar, com mais clareza, nosso planejamento para o
curso de formação contínua.
Ao planejarmos os mais adequados procedimentos metodológicos para compor
nossa ação de formação pensamos, inicialmente, na possibilidade de ser uma prática
formativa coletiva escolar, com encontros que consistissem em sessões reflexivas com os
professores. A ideia é que as docentes chegassem a cada encontro com a leitura do texto
base para a discussão já realizada e que no momento coletivo retomássemos dúvidas,
ideias principais e, assim, discutíssemos questões dirigidas pela formadora.
Porém, conversamos sobre as possibilidades reais de tempo que as professoras
possuíam durante a semana: infelizmente quase nenhuma. Por isso, reconfiguramos nosso
formato inicial de leitura antecipada e sessão reflexiva posterior, para sessões de leitura e
reflexão, onde cada texto seria lido na íntegra, durante o próprio encontro, deixando o
mesmo espaço aberto para reflexão. Esse formato poderia garantir que todas as
professoras que comparecessem às sessões, fariam realmente a leitura do texto. Nos
acordos firmados entre formador e formandas, todas concordaram com esse formato de
ação didático-pedagógica.
61
Além disso, a articulação entre teoria e prática seria contemplada em todos os
encontros, a partir de questões e dúvidas das professoras relacionadas às suas práticas
reais no esforço de cuidar e educar crianças pré-escolares, como por exemplo, a
construção das atividades de casa, citada já na entrevista coletiva inicial. Esse
procedimento poderá permitir que as professoras compreendam que toda a prática está
sustentada em uma teoria, mesmo que, muitas vezes, não se tenha consciência delas,
além da importância de nos atualizarmos periodicamente sobre os estudos e pesquisas na
área da infância.
Portanto, sessões de leitura e reflexão, observação participante e articulação entre
teoria e prática, constituem os procedimentos metodológicos de nosso curso de formação.
Sobre a frequência dos encontros pensamos em ser quinzenal. Semanalmente
poderia ser desgastante para a rotina das professoras. Mensalmente tornaria a formação
lenta, por vezes poderia correr o risco de se tornar desinteressante. Ao apresentar a
proposta quinzenal ao grupo, todas estiveram de acordo.
Mesmo destacando que o tempo de nossos encontros aumentaria para quase quatro
horas, devido às leituras presenciais, as professoras opinaram que esse formato seria mais
produtivo: quinzenal, com duração de quatro horas.
Ao todo, sete encontros foram planejados, sendo o primeiro a reunião coletiva
para diálogo e seleção da necessidade/objetivo de formação e os outros seis, relacionados
às sessões de leitura e reflexão com as professoras (apêndice).
Refletindo sobre a frequência das observações, pensamos que o movimento de
observar as turmas em uma semana e, na semana seguinte refletir sobre a aula observada,
poderia provocar um certo frescor mental ao grupo e à formadora. Todos poderiam
lembrar com facilidade como havia sido a aula com as crianças, lembrar do encontro de
formação anterior com tranquilidade e destacar suas dúvidas e questionamentos,
relacionando a temática do encontro com a prática pedagógica, com facilidade.
Além disso, essa dinâmica poderia ser capaz de imprimir um movimento mais
ativo e profundo à formadora, às professoras participantes e à formação, já que não
permitiria nenhuma “paralização” na ação (desde a semana de início da formação até o
seu encerramento haveria sessão de reflexão e leitura, bem como observações
intercaladas). Por isso, optamos em ampliar o número de observações, no intuito de
estendê-las até a semana anterior ao último encontro, totalizando vinte e oito observações
(sete observações em quatro turmas diferentes).
Obviamente que essa decisão irá conferir mais trabalho à pesquisa, mas a
possibilidade de imprimir à formação uma certa dinâmica, poderá influenciar o curso
62
positivamente, motivando as docentes. Outra possibilidade de motivação diz respeito ao
trabalho em grupo. Mesmo pertencendo à mesma escola, muitas vezes, não há tempo
suficiente para conhecer detalhadamente o trabalho das colegas ou para dialogar sobre a
prática docente, por isso, podemos dizer que esses encontros também poderão provocar
uma maior união entre a equipe.
Sobre a avaliação de nosso curso de formação ela consistirá em uma avaliação
formativa contínua, mas devemos deixar claro de que forma ela será realizada. O registro
em diário de aula das professoras será de grande valia. A cada encontro, os
conhecimentos, comentários, reflexões e apontamentos poderão ser anotados em um
caderno, doado para esses fins, pela formadora. Ao retomar a leitura de todos esses
diários, teremos a oportunidade de verificar como e o quanto as professoras refletiram
sobre suas práticas e até sobre suas vidas (já que o professor é um ser completo,
constituído de valores profissionais e pessoais) e já que o diário de aula permite esse tipo
de registros, como veremos posteriormente no capítulo que versa sobre os instrumentos
de pesquisa.
Fomos percebendo, ao longo das observações e da socialização de atividades nos
encontros de formação, que as práticas dessas professoras foram sendo ressignificadas,
proporcionando a reconstrução de seus planejamentos. Um exemplo desse momento
aconteceu quando Humildade revelou ao grupo que, as antigas “coleções de atividades”-
um grupo de atividades padrão vendidas geralmente em bancas de jornais e revistas , tão
questionadas e discutidas na Educação sobre sua forma descontextualizada de se
apresentar, estavam sendo, gradualmente, deixadas de lado pelas professoras.
É notória a diminuição das atividades xerografadas, oriundas das
“coleções” adquiridas pelas professoras, utilizadas no cotidiano do
CMEI. Buscam novas maneiras de selecionar, pesquisar, estudos,
parceria com as companheiras de trabalho e isso faz a diferença. O
professor tem papel importante na investigação dos processos de
significação das crianças, tanto quanto na escolha de atividades que
promovam o seu desenvolvimento (Humildade)
Durante todo o seu diário de aula a professora/coordenadora Humildade, avaliou
o grupo e a dinâmica da prática escolar como um todo.
Sobre o diálogo compartilhado, podemos dizer que também avaliamos e
percebemos a qualidade de nossa formação a partir do diálogo tecido em todo o
desenvolvimento da formação e também a partir de uma avaliação coletiva, realizada
oralmente no último dia da formação.
63
Questionamos sobre o formato desses encontros: as professoras chegariam ao
encontro para ler o texto coletivamente, fazendo pausas para questionamentos e dúvidas
recorrentes do texto. Nesse momento, também poderiam fazer um breve registro em seus
diários de aula, estabelecendo uma atitude de reflexão e relação com a prática pedagógica
vivenciada ou com a prática em geral. Além disso, lançaríamos questionamentos
motivadores de discussão para serem respondidos, garantindo movimento aos saberes.
A cada encontro a formadora poderia ler o protocolo (apêndice) das atividades,
retomando todos os pontos de discussão levantadas. Em seguida, faria apontamentos
sobre as aulas das professoras observadas. Durante o encontro o ponto alto deveria ser a
tentativa de relacionar a leitura textual com a prática pedagógica, refletindo também sobre
sua prática observada.
A avaliação seria contínua. Além das observações do texto, cada professora
poderia realizar anotações, impressões, lembretes, questões ou sentimentos sobre a leitura
e sobre os diálogos no encontro. Ao fim da formação, todas as professoras registrariam
pontos negativos e/ou positivos dos encontros, das leituras e reflexões. Além disso, o
desenvolvimento das aulas de cada professora, em um percurso de seis observações
durante um semestre, nos daria amparo para avaliar a progressão ou não dessa prática
docente. A qualidade dos diálogos estabelecidos durante os encontros também nos
possibilitaria a avaliação da ação em geral e do envolvimento e aprendizagem de cada
professora.
O conteúdo programático foi realizado a partir da análise de dados, que apontou a
necessidade de discutir alguns temas específicos. No entanto, outros temas surgiram da
necessidade do grupo, durante o desenvolvimento da ação e não a priori. Para Engel
(2000, p.182) “Uma das características deste tipo de pesquisa é que através dela se
procura intervir na prática de modo inovador já no decorrer do próprio processo de
pesquisa e não apenas como possível consequência de uma recomendação na etapa final
do projeto”.
Nossa ação de formação foi intitulada como “Ação didático-pedagógica para
construção de práticas de Leitura e Escrita na Educação Infantil/Pré-escola” e
construímos o seguinte quadro de planejamento para guiar nossas ações (Quadro 1). Os
conteúdos programáticos foram responsáveis por direcionar cada encontro, que foram
também intitulados de “sessões de leitura e reflexão”. Tivemos, ao todo, sete sessões de
leitura e reflexão.
64
Tabela 5 Conteúdos programáticos referentes a ação didático-pedagógica para
construção de práticas de leitura e escrita na Educação Infantil/Pré-escola
Conscientes de que traçar o planejamento de uma pesquisa ação não garante a sua
qualidade, mas que é primordial como primeiro passo de uma pesquisa segura, seguimos
com o entendimento de que essa estrutura seria flexível e que poderia ser alterada, seja
pela dinâmica de uma escola, que está em constante movimento, seja pela própria vida
dos sujeitos da pesquisa, que são passíveis de imprevistos.
Além disso, planejar um caminho para o trabalho com necessidades de formação
evidencia que a pesquisa com necessidades não é tão óbvia e simples, como pensam
alguns pesquisadores. Investigar necessidades de formação não é o mesmo que,
simplesmente, levantar dados. A investigação exige uma série de exigências que vamos
começar a conhecer a partir do próximo capítulo.
ENCONTROS TEMAS DATAS
1º CRIANÇA, INFÂNCIA, PLANEJAMENTO 23/09/2014
2º ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO 01/10/2014
3º PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA 13/10/2014
4º MEDIAÇÃO DE ATIVIDADES 28/10/2014
5º PRODUÇÃO DE TEXTOS 13/11/2014
6º LEITURA 24/11/2014
7º PRODUÇÃO DE TEXTOS, FECHAMENTO, AVALIAÇÃO 03/12/2014
NECESSIDADES DE FORMAÇÃO
CONTÍNUA DE PROFESSORES
3 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES
“O que caracteriza hoje a formação contínua dos
adultos é a sua vocação para satisfazer novas
necessidades ligadas às múltiplas evoluções da
sociedade e aos itinerários pessoais dos indivíduos
que têm de as enfrentar” (MALGLAIVE, 1995,
p.21).
O trabalho com necessidades de formação de professores se preocupa
fundamentalmente com a formação profissional dos docentes. Um conceito está
relacionado ao outro. Como, neste trabalho, nosso objetivo está relacionado ao
desenvolvimento de um curso de formação contínua, achamos conveniente discutir um
pouco sobre as necessidades de formação contínua de professores.
Este capítulo pretende discutir, portanto, os conceitos sobre formação contínua e
suas especificidades, se comparada à formação inicial. Além disso, busca compreender
suas finalidades; que podem estar relacionadas à heterogeneidade e aos interesses
profissionais de seu público: professores em diferentes ciclos de desenvolvimento, e
também à velocidade de informações e exigências do mundo globalizado, que gera, além
de mal-estar docente, dificuldades na construção e estruturação de um currículo coerente.
Apresenta ainda, a trajetória das ações políticas no Brasil e os atuais programas
de formação contínua, vigentes. Adverte sobre a faceta reguladora de que esses cursos se
revestem e destaca a escola como centro da formação contínua. Por fim, discute que:
profissionalismo, reflexão, pesquisa e auto formação podem contribuir com a
transformação dos saberes em uso, em ação, fazendo sentido na prática de cada docente,
atingindo, portanto, seu maior objetivo e também desafio.
Para fundamentar tais discussões nos baseamos em alguns referenciais teóricos,
que atenderam os seguintes critérios:
- que o estudo fosse considerado relevante no âmbito da formação de professores;
- que a temática fosse pertinente quanto ao nosso objeto de estudo – no caso a formação
contínua de professores e,
- que os autores fossem representativos de diferentes partes do mundo.
Portanto, definimos como referências: Freire (1981, 1996), Núñez, Ramalho
(2008), Gatti, Barreto (2009), Candau (1996, 2014), no Brasil; Estrela (1992), Rodrigues
e Esteves (1993), Nóvoa (1995, 2001), Alarcão (2001), Rodrigues (2006) em Portugual;
Garcia (1995) e Imbernón (1998, 2011) na Espanha; Josso (2004), Perrenoud (1998) e
Huberman, (2007) na Suíça; Malglaive (1995) na França; Tardif, Lessard (2013) no
Canadá; Popkewitz (1995), Schön (1995) e Zeichner (1995, 1998), nos Estados Unidos.
3.1 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO
É igualmente feita a recomendação de que os
programas de formação sejam antecedidos de uma
análise de necessidades de formação realizada
segundo as formas variadas e adaptadas ao público
a quem se dirige (RODRIGUES E ESTEVES, 1993,
P. 67)
As necessidades de formação surgem como campo teórico e prático desde o final
dos anos 60. Manifestam-se do desejo de atender as demandas sociais e da preocupação
com o sucesso das ações de formação. A sua relação com a formação contínua de
professores vem se tornando crescente já que sinaliza uma etapa do processo pedagógico
da formação.
Segundo o decreto 6.755 de 29 de janeiro de 2009, que institui a Política Nacional
de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, já apresentou como
um de seus objetivos, no artigo 3º, inciso IV- identificar e suprir a necessidade das redes
e sistemas públicos de ensino por formação inicial e continuada de profissionais do
magistério.
E por isso, traça que, seu plano estratégico, deverá contemplar, em seu artigo 5º:
I - diagnóstico e identificação das necessidades de formação de profissionais do
magistério e da capacidade de atendimento das instituições públicas de educação
superior envolvidas;
II - definição de ações a serem desenvolvidas para o atendimento das necessidades de
formação inicial e continuada, nos diferentes níveis e modalidades de ensino;
Em seu artigo 8º reforça o atendimento às necessidades de formação continuada
de profissionais do magistério dar-se-á pela indução da oferta de cursos e atividades
formativas por instituições públicas de educação, cultura e pesquisa, em consonância
com os projetos das unidades escolares e das redes e sistemas de ensino.
No decreto nº 8.752, de 9 de maio de 2016, mais atual, que dispõe sobre a Política
Nacional de Formação dos Profissionais da Educação Básica, as necessidades de
formação assumem posição de destaque. Podemos evidenciar essa informação a partir
do Planejamento Estratégico Nacional e dos Planos Estratégicos dos Estados e do
Distrito Federal. Em seus artigos 9º e 10º o documento nos alerta:
Art. 9o Os planos estratégicos a que se refere o inciso I do caput do art. 7o serão
quadrienais, com revisões anuais, e deverão contemplar:
I - diagnóstico e identificação das necessidades de formação inicial e continuada de
profissionais da educação e da capacidade de atendimento das instituições envolvidas,
de acordo com o Planejamento Estratégico Nacional;
II - definição de ações a serem desenvolvidas para o atendimento das necessidades de
formação inicial e continuada, nas diferentes etapas e modalidades de ensino
Art. 10. O diagnóstico, o planejamento e a organização do atendimento das
necessidades de formação inicial e continuada de profissionais das redes e dos sistemas
de ensino que integrarão o Planejamento Estratégico Nacional e os planejamentos
estratégicos estaduais e distrital se basearão nos dados do Censo Escolar da Educação
Básica, do Censo Escolar da Educação Superior e nas informações oficiais
disponibilizadas por outras agências federais e pelas Secretarias de Educação dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em especial os indicadores dos Planos de
Ações Articuladas. (BRASIL, 2016)
Esses decretos embasam a importância do trabalho com necessidades de
formação, já que como vimos acima é reconhecido legalmente pelo governo de nosso
país.
Considerando esse contexto legal, consideramos significativo o diálogo sobre os
conceitos de necessidades de formação, bem como suas características. Além disso,
abordar sua importante ação reveladora de objetivos para formação docente. Para nos
amparar nessas questões tomamos como referência teórica os autores Maslow
(1943,1954), Charlot (1976), D’Hainaut (1979), Rodrigues e Esteves (1993), Malglaive
(1995), Leite (1997), Forbes (2005), Rodrigues (2006) e Vigotski (2007).
Embora todos os trabalhos que discutem necessidades de formação apresentem a
polissemia do termo em suas pesquisas, nós também compreendemos que a discussão
sobre os seus diversos conceitos se faz inevitável. Primeiramente porque o trabalho com
as necessidades de formação exige que se deixe claro os fundamentos epistemológicos
e metodológicos (o que veremos mais adiante) sob pena de desqualificar a pesquisa.
O conceito de necessidades de formação de professores para a mudança parece
corresponder, em termos genéricos, à perspectiva analítica apresentada na tipologia de
Stufflebeam (1985 apud LEITE, 1997, p.52): a necessidade é encarada como condição
para um melhoramento do sistema educativo, no sentido da adequação deste às novas
orientações da sociedade. O autor destacou quatro significados que para ele abrangem a
maior parte dos estudos com necessidades:
1 - Necessidades como discrepâncias ou lacunas;
2 - Necessidades com mudança ou direção desejada por uma maioria;
3 - Necessidade como direção em que se prevê que ocorra um melhoramento;
4 - Necessidade é algo cuja ausência ou deficiência provocam prejuízo ou cuja presença
é benéfica.
Para Zabalza (1994 apud LEITE, 1997, p.9) “a necessidade é construída pela
diferença ou discrepância entre o estado actual das coisas e um marco de referência
tridimensional que tem em conta: a forma como as coisas deveriam ser/poderiam
ser/gostaríamos que fossem”.
As autoras Esteves e Rodrigues (1993) se apoiam nas definições de Mckillip
(1987) que define as necessidades como “juízos de valor” e de Monette (1977) que
apresenta o termo necessidade relacionado à algum problema de valor ou de referência.
Relacionando os termos “necessidades” e “formação”, Monteiro (1987) definiu o
construto necessidades formativas como o conjunto de desejos, problemas, carências e
deficiências encontrados pelos professores no desenvolvimento de seu ensino.
Porém, para Malglaive (1995) baseado nos pensamentos de Nuttin (1985), a ideia
de carência para falar de necessidades na formação de adultos não é considerável, na
medida em que admite a necessidade como a exigência de uma relação entre o indivíduo
e o meio e que, fora desta relação, nenhum sujeito pode se manter nem se desenvolver.
Não são, portanto, as necessidades que estão na origem da motivação e sim a motivação
que está na origem das necessidades (LEITE, 1997).
D’Hainaut (1979) apresenta uma proposta de categorização das necessidades
baseada em cinco possibilidades:
1- Necessidades das pessoas versus necessidades dos sistemas: nem sempre há
concordância entre as necessidades das pessoas e seus grupos.
2- Necessidades particulares versus necessidades coletivas: na medida em que as
necessidades variam muito de um indivíduo para o outro, as necessidades coletivas se
apresentam com uma multiplicidade ainda maior de todos esses desejos. O que pode
acontecer é que em um grupo muito grande, as necessidades podem não serem
significativas para algumas pessoas, o que tornaria a formação insignificante para
alguns. Muitas vezes isso é o que acontece nos programas nacionais do governo, já que
se trata das necessidades de todo um país.
3- Necessidades conscientes versus necessidades inconscientes: a maioria das
necessidades não se expressam de forma imediata. Isso pode acontecer quando há falta
de conhecimento sobre determinado assunto. A ignorância sobre a necessidade impede
de percebê-la como tal. Como um professor poderá ter consciência de suas necessidades
para alfabetizar e letrar na perspectiva da Psicogênese da Língua Escrita, se nem ao
menos ele a conhece, por exemplo?
4- Necessidades actuais versus necessidades potencias: na educação, como os resultados
são vistos, na maioria das vezes, a longo prazo, as necessidades são potenciais, porém
podem ocorrer no presente. Quanto mais complexa a necessidade mais tempo
despenderá para que seja superada.
5- Necessidades segundo o sector que se manifestam: para o autor as necessidades
podem se diferenciar pelo campo onde surgem, como na estrutura do “quadro da vida”,
em que seis campos desempenham o papel global do indivíduo:
- Quadro de vida privada e familiar;
- Quadro de vida social;
- Quadro de vida política;
- Quadro de vida cultural;
- Quadro de vida profissional;
- Quadro de vida de ócio e desporto.
As necessidades de formação acompanham as mudanças da sociedade e dos
sujeitos, são provenientes de crenças, valores sociais e pessoais. Não são absolutas,
devido ao seu caráter de movimento e desempenham uma função social, já que estão
sempre se moldando à essa sociedade, querendo transformar suas carências, sendo úteis.
As necessidades de formação emergem assim, num plano de
conscientização, em que se cruzam as exigências sociais e institucionais
que pendem sobre o professor e de que ele toma consciência, e as
exigências de um profissionalismo alicerçado num conjunto de saberes
e saberes-fazer especializados (RODRIGUES, 2006, p. 297).
Portanto, podemos dizer que as necessidades, nesse cenário de movimento do que
é real e pertinente, vai se constituindo enquanto conceito. Elas não surgem a priori,
manifestam-se nas relações e na construção do conhecimento. Quanto maior o
conhecimento, maior o número de necessidades. Segundo Rodrigues e Esteves (1993)
há uma relação das necessidades com a zona de desenvolvimento proximal
(VIGOTSKI, 2007), já que é na construção do conhecimento que surgem as
necessidades. Elas ‘não parecem existir externamente ao indivíduo, sendo, por isso,
mais adequado falar da elaboração/construção das necessidades do que propriamente da
sua emergência” (RODRIGUES, ESTEVES, 1993, p. 22).
Embora a prática de análise de necessidades de formação suscite críticas e
desconfianças por seu caráter ambíguo, é relativamente fácil acordarmos em aceitar que
o conhecimento das necessidades dos formandos é uma condição importante da eficácia
da formação. Contudo podemos fazer como Barbier e Lesne (1986 apud RODRIGUES,
2006) e associá-la a dois apontamentos: um a partir de uma concepção objetiva e outro
subjetiva.
Na concepção objetiva a ideia central é o conceito de exigência da necessidade e
da formação, ou seja, que há algum objeto que pode ser conhecido objetivamente, a
partir de técnicas e análises de um investigador, como uma operação de determinação
de necessidades. Na concepção subjetiva, a necessidade está associada ao sentimento
dessa exigência, direcionando-a ao contexto de quem as sente, portanto “é elaborado
por um sujeito particular, num contexto espacio-temporal singular, procuram, não
factos, mas realidades construídas num processo interactivo que inclui o investigador e
é atravessado pelos valores das pessoas envolvidas” (RODRIGUES, 2006, p.96), sendo
assim uma operação de construção de necessidades.
Neste trabalho assumimos a postura de investigadores que consideram as
necessidades relacionadas à segunda concepção, pois acreditamos que não encontramos
as necessidades postas, à espera de quem as procure, e sim entrelaçadas em seus sujeitos,
construídas em determinado tempo e espaço.
Alguns autores como Maslow (1943,1954) conhecido pelos estudos do
comportamento humano em organizações (Teoria das necessidades) referência para área
de Administração e Psicologia, diz haver uma hierarquia de necessidades fundamentais
que se estabelece em cinco categorias: necessidades fisiológicas, de segurança, de
pertença, de estima e de realização pessoal. Sendo as duas primeiras relacionadas à
sobrevivência e as outras à vida em sociedade.
Para ele, o indivíduo satisfaz suas necessidades nível por nível, chegando ao seu
patamar máximo que é o da auto realização, a partir de suas motivações. As necessidades
fisiológicas estão ligadas à fome, sede, sono; as de segurança ligadas à segurança do
emprego, da família; as de pertença fazem relação com o ser social, de pertencer a algum
grupo, seja familiar ou de amizade; as de estima consideram o respeito, a autoestima, a
autoconfiança e, por fim, a realização pessoal, com o equilíbrio da aceitação dos fatos,
da moralidade e da criatividade.
Para Maslow o indivíduo só poderia chegar a esse nível se todas as outras
necessidades anteriores estivem sido superadas, pelo menos parcialmente. As críticas às
suas teorias surgem na contestação de que uma pessoa pode ser auto realizada sem,
contudo, desenvolver plenamente suas necessidades fisiológicas. Ou ainda, que estas
necessidades podem ocorrer ao mesmo tempo, sem obrigatoriedade hierárquica, o que
também nos parece mais plausível, fato que se confirma ainda mais por sermos
diferentes uns dos outros e, portanto, possuirmos motivações e desejos distintos.
Para o psicanalista Jorge Forbes (2005) as necessidades estão relacionadas ao
desejo e nem sempre nós queremos o que desejamos. Como assim? Neste mundo
globalizado, em que as necessidades são provisórias, vivemos um período em que o ser
humano pode muito mais do que deseja. Antes dizíamos: ah se eu pudesse fazer tal coisa
eu faria.... Hoje quase tudo pode ser feito através da tecnologia, por exemplo, ela nos
deu esse poder, para o bem e para o mal, e isso nos trouxe vazio pessoal e cobrança de
exigências profissionais maiores.
A angústia de ter que saber de tudo a todo o tempo é predominante, porém nunca
será saciada. Então o autor nos ajuda a pensar que, para que não sejamos refém dessa
efemeridade, devemos pensar o que realmente desejamos e então, fazer escolhas. E o
que isso tem a ver com as necessidades de formação? Quando falávamos de mal-estar
docente no capítulo anterior, discutíamos justamente uma maneira de não nos tornarmos
submissos à velocidade das exigências sociais direcionadas aos professores e à sua
formação. Escolher, portanto, o que deve ser feito, o que deve fazer parte do conteúdo
programático de um curso de formação contínua, por exemplo, é uma maneira de
estabelecer limites e orientação à todas essas necessidades.
Fazer escolhas, que parece ser uma atividade tão simples, é complexa e pouco
pensada atualmente. Não é fácil fazer escolhas, mas pensar que temos que fazê-las nos
parece uma alternativa digna para que não sejamos engolidos por esse inchaço de
necessidades.
Essas necessidades, quando analisadas, podem assumir caráter técnico e
pedagógico. Sem dúvida, quando relacionado à formação contínua, o caráter pedagógico
é evidenciado. Há um consenso no que diz respeito ao cerne das necessidades em
formação: “escutar o formando”, o sujeito, o professor-aluno. Isso promove a
articulação da formação com as reais necessidades do professor e é também uma
estratégia de escolha: escolher o mais significativo para aqueles os quais a formação é
direcionada.
Além disso, a todo momento, falamos de construção das necessidades. Essa ideia
de evolução se dá porque mesmo em um programa de formação estabelecido de acordo
com as necessidades de professores, outras necessidades podem surgir. As dúvidas, os
questionamentos, o diálogo nunca antes estabelecido sobre aquele assunto, pode suscitar
outras necessidades. O problema é que muitos investigadores e professores-formadores,
por não quererem prejudicar sua organização e planejamento antecipados e inflexíveis,
não permitem a implementação das mesmas durante a formação, pois não estão
dispostos a construí-las, apenas a encontrá-las prontas e imutáveis.
Se elas não forem consideradas naquele momento, a formação será prejudicada.
Aquelas dúvidas que não foram esclarecidas prejudicam o andamento da formação e
provocam desinteresse dos formandos. A formação parece mais uma vez, aos olhos dos
formandos, um projeto do formador, direcionado e preocupado com o término do
programa.
Por um lado, o formador pensa que, por ter concluído a formação, atingiu seus
objetivos pois levou em consideração as necessidades dos professores. Do outro lado,
os professores, ou se sentem mais inferiorizados por não terem dado conta daquela
formação, ou se sentem desestimulados a participarem de grupos de formação, pois já
sabem que não conseguirão mudar suas práticas. É um faz de conta dual. Para evitar
esse tipo de situação Rodrigues e Esteves (1993) nos alertam que
a análise de necessidades não se pode reduzir a um questionamento
externo ou a uma sondagem estatística de preferências ou dificuldades.
[...] os objetivos de formação não são definidos e impostos
externamente sugerindo-se, contudo, uma forte implicação do formador
no processo de fazer emergir as aspirações da pessoa e a sua
colaboração na sua legítima satisfação (RODRIGUES E ESTEVES,
1993, p.22).
Por isso, temos a obrigação de compreender que a participação do professor-
aluno, em seu próprio processo de formação é imprescindível para a eficácia da acção e
assim toma forma o conceito de contrato pedagógico, que irá abranger os objetivos, os
conteúdos e as metodologias, dando origem a uma negociação das necessidades de
formação (CHARLOT, 1976). Essa cooperação promove a participação dos professores
nos programas de formação por adesão, nas situações em que se sentem receosos em
participar, como os casos de pesquisas-ação, por exemplo.
Esse receio, sabemos, também pode surgir da concepção de necessidade de
formação como falta ou déficit profissional, como apontamos no início do capítulo, estas
são baseadas nas perspectivas deterministas e no paradigma positivista, e não nos
pressupostos do construtivismo, como acreditamos. Quanto a esse impasse Rodrigues
reforça que
Não se trata de descobrir as necessidades de formação concebidas como
as necessárias leis da formação às quais se submeteriam fatalmente
formandos e formadores, mas, como as finalidades que cada um
actualiza ou projecta num dado contexto, em função das representações
que constrói do real e da sua relação com ele. Não se trata de descobrir
um dado objeto - necessidades de formação - com uma existência
objectiva e evidenciável independentemente de quem o conhece, mas
de construir (eventualmente ajudar a construir) um projecto –
necessidades de formação – que se elabora na relação interactiva
sujeito-contexto-objecto-instrumentos usados nessa interacção.
(RODRIGUES, 2006, p. 102).
Assim sendo, podemos reafirmar que, construir necessidades de formação não é
tarefa fácil e simples, é necessária uma grande articulação entre os sujeitos e o
investigador. A postura do professor-formador terá grande influência nesse processo,
pois ele poderá permitir ao formando tomar consciência de suas necessidades,
garantindo o desenvolvimento pessoal do professor-aluno e evitando uma tendência dos
formandos de expressarem estereótipos e modas, muitas vezes vagas, imprecisas
(CHARLOT, 1976). Nesse sentido, o padrão de formação e de professor pode viabilizar
ou não a conscientização dos sujeitos.
Bem, diante de tudo o que foi discutido sobre os conceitos de necessidades de
formação e suas características, destacamos que LEITE (2006) resume as mais
importantes ideias sobre esse assunto, as quais coincidem com as nossas:
- não existe uma operacionalização universalmente aceite do conceito de necessidade;
- não existem necessidades absolutas;
- não existem necessidades fixas e estáveis;
- não existem uma coerência global na expressão das necessidades;
- nem todas as necessidades são consciencializadas pelos sujeitos.
Além disso, acrescentaríamos a essa lista de resumo, a relação direta que as
necessidades de formação possuem com os objetivos de formação pois “a análise de
necessidades, no âmbito particular das acções de formação pode ser considerada como
uma estratégia de planificação, capaz de produzir objetivos válidos e fornecer
informação útil para decidir sobre conteúdos e as atividades de formação”
(RODRIGUES E ESTEVES, 1993, p. 20).
Finalizamos esse capítulo, afirmando que investigar necessidades de formação se
apresenta como condição primordial de qualquer formação contínua de professores, já
que aponta caminhos coerentes e significativos para a construção de seus objetivos. Por
isso, consideramos conveniente dialogarmos, também, sobre algumas especificidades
da formação contínua de professores, como veremos a seguir.
3.2 A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES
Ao iniciarmos nosso diálogo sobre formação contínua gostaríamos, previamente,
de deixar claro que nos referimos a palavra contínua e não continuada, por
compreendermos que o sufixo-ada, estabelece uma relação de educação como uma ação
finalizada. A escolha de contínua reforça a ideia de progressão e não finalização da
formação (LIBERALI, 2006). Por isso, podemos dizer que a formação contínua é aquela
que se estabelece em um contínuo, sugerindo uma ideia de evolução e desenvolvimento,
que continua, após a formação inicial. As autoras Gatti e Barreto, acrescentam que
a designação de formação continuada presencial cobre um universo
bastante heterogêneo de atividades, cuja natureza varia, desde formas
mais institucionalizadas, que outorgam certificados com duração
prevista e organização formal, até iniciativas menos formais que têm o
propósito de contribuir para o desenvolvimento profissional do
professor, ocupando as horas de trabalho coletivo, ou se efetivando
como trocas entre pares, grupos de estudo e reflexão, mais próximos do
fazer cotidiano, na unidade escolar e na sala de aula (GATTI,
BARRETO, 2009, p. 200).
Rodrigues e Esteves também reforçam nossa compreensão sobre esse conceito e
destacam que formação contínua é
aquela que tem lugar ao longo da carreira profissional após a aquisição
da certificação profissional inicial (a qual só tem lugar após a
conclusão da formação em serviço) privilegiando a ideia de que a sua
inserção na carreira docente é qualitativamente diferenciada em
relação à formação inicial, independentemente do momento e do
tempo de serviço docente que o professor já possui quando faz a sua
profissionalização (RODRIGUES e ESTEVES, 1993, P.44).
Assim como as autoras, Malglaive (1995) nos chama a atenção para compreender
que a formação contínua se distingue da formação inicial. Revela que há distinção nas
formas como se organizam, como decidem seus conteúdos e objetivos e de como
sistematizam os materiais e as questões pedagógicas. Ainda se diferenciam quanto aos
públicos para qual são direcionadas, em suas finalidades e funcionamentos.
O autor espanhol Imbernón (1998) ambém acredita nessa condição divergente e
apresenta três grandes linhas ou eixos de atuação que diferenciam uma formação da outra.
São eles:
1- A reflexão sobre a própria prática (mediante análises da realidade educativa) e a
compreensão, interpretação e intervenção sobre ela;
2- O intercâmbio de experiências, a necessária atualização e confrontação em todos os
campos de intervenção educativa;
3- O desenvolvimento profissional em e para o centro mediante o trabalho colaborativo
para transformar essa prática e provocar processos de comunicação (IMBERNÓN, 1998,
p.57).
No entanto, mesmo que as duas formações sejam diferentes são complementares,
necessitam caminhar juntas, pois não há formação contínua sem formação inicial.
Segundo Garcia (1995, p.55) há “necessidade de existir uma forte interconexão entre o
currículo da formação inicial de professores e o currículo da formação permanente de
professores”.
A formação contínua não está relacionada com a formação inicial por uma questão
de “tapar seus buracos”, como podem pensar alguns, pois consiste em um trabalho de
reflexão sobre a prática e de reconstrução diária de identidade pessoal e profissional. Essa
concepção aliás, pode ser até muito perigosa, já que adia a aprendizagem de muitos
conhecimentos que serão pré-requisitos para outros, no futuro.
No entanto, pode indicar áreas que necessitam de complementação, já que não
foram estudadas anteriormente. As professoras, sujeitos deste trabalho de tese, são
exemplo dessa situação. A professora Cuidado atua na Pré-escola, é formada no curso de
Letras e ainda não cursou uma pós-graduação na área infantil. Confessa, sentir muita
dificuldade em seu dia a dia com as crianças. Nessa situação, por mais que ela não tenha
se formado em Pedagogia, a formação contínua poderia oferecer embasamento para suas
vivências diárias, permitindo que reflita sobre os conceitos de criança e infância, por
exemplo, conhecimentos fundamentais ao desenvolvimento dessa prática específica.
Pode ser ainda que um professor com alguns anos de experiência, se depare com
uma nova situação, por exemplo com o cargo de coordenadora da Educação Infantil de
sua escola, como o caso da professora Paciência. Mesmo com a sua graduação em
Pedagogia, ela se deparou com situações novas e inusitadas que o curso, por si só, não
ofereceu condições de enfrentá-las. Por isso, a docente procurou realizar um curso de
Especialização em Educação Infantil e nos conta que se sente bem mais preparada para
assumir o cargo. Nesse sentido, acreditamos, como Rodrigues e Esteves (1993, p.43), que
essa formação visa atender às seguintes condições:
- atividades formativas que ocorrem após a certificação profissional inicial;
- atividades que visam principal ou exclusivamente melhorar os conhecimentos, as
habilidades práticas e as atitudes dos professores na busca de maior eficácia na educação
dos alunos.
Porém, Laderriére, (1981), citado por Rodrigues e Esteves (1993) considera que
as finalidades de uma formação contínua podem estar ligadas ou não ao ensino. Como
assim? Bem, a motivação inicial na procura desse tipo de formação pode se efetuar pelo
desejo de ascensão profissional, por exemplo. Ou até mesmo para uma preparação de
mudança de função, como a de coordenador ou diretor e, não necessariamente, na
melhoria de alguma prática em sala de aula.
Acrescidos a essa multiplicidade de fins, o ciclo de vida profissional de
professores também nos revela que essa formação é fundamentada na heterogenia. O
autor Huberman (2007), que dedicou seus estudos a investigar esse desenvolvimento
profissional, considera que os professores possuem motivações e desejos diferentes ao
longo do tempo e do seu exercício profissional e que, por isso, seus objetivos e
necessidades se transformam. Um professor principiante não possui os mesmos
questionamentos e anseios de um professor com vinte anos de carreira, por exemplo,
como a vontade de se estabilizar no ambiente de trabalho, de explorar novas turmas e a
necessidade de ser aceito pelo grupo, dentre vários outros fatores. Esse por sua vez,
também já se difere das motivações do outro, que pode estar perto do período hábil para
aposentadoria e que poderá fazê-la de modo sereno ou de maneira a se lamentar. Em
ambos os casos a tendência é que, em sala de aula, se apresentam menos vulneráveis à
avaliação dos outros e que se aceitam tais como são e não como os outros querem que
sejam.
Candau (1996) nos chama atenção para a reflexão sobre esse conhecimento.
Compreender que os professores possuem essas especificidades possibilita a construção
de um currículo flexível e coerente na formação contínua.
Esta preocupação com o ciclo de vida profissional dos professores e
professoras apresenta para a formação continuada o desafio de romper
com modelos padronizados e criar sistemas flexíveis e diferenciados
que permitam aos professores/as explorar e trabalhar os diferentes
momentos de seu desenvolvimento profissional de acordo com suas
necessidades específicas (CANDAU, 1996, p.1)
Além desse desafio, o de acompanhar a velocidade das mudanças e exigências da
sociedade, parece ser ainda mais complexo. As transformações ocasionadas pela
globalização e a evolução de seus meios de comunicação e tecnologias, determinam um
sufocante número de requisitos para se tornar “um bom professor”, que se modificam a
todo momento. Para Tardif e Lessard (2013, p.8) essa situação “parece acelerar-se e as
condições econômicas, sociais e culturais nas quais evoluem os docentes mudam às vezes
a olhos vistos, forçando-os a se adaptarem rapidamente a problema inéditos e a aceitarem
numerosos e novos desafios”.
Sabemos que se formar continuamente é peça chave para sobrevivência
profissional, é aliás, um direito. Quem não se informa e não se forma fica para trás e
possui dificuldades para conviver nessa cultura exigente. No entanto, esse caráter
efêmero, faz com que o professor sofra com a quantidade de atribuições e
responsabilidades delegadas à sua função e enfrenta um verdadeiro mal-estar docente.
Rodrigues nos confirma essa situação quando realça que “as transformações econômicas,
sociais e culturais dos últimos cinquenta anos são responsáveis por exigências cada vez
maiores e mais diversificadas feitas à escola e ao professor” (RODRIGUES, 2006, p.20).
Além disso, Candau (2014, p.34) nos confirma que “insegurança, estresse,
angústia parecem cada vez mais acompanhar o dia a dia dos docentes. Sua autoridade
intelectual e preparação profissional são frequentemente questionadas”. E acrescenta que
“ser professor hoje vem se transformando em uma atividade que desafia sua resistência,
saúde e equilíbrio emocional”.
Diante dessas constatações, qual a alternativa para a construção de um currículo
significativo? Como selecionar o que devemos ou não contemplar em um currículo de
formação contínua, considerando toda a velocidade das transformações sociais?
A partir dos anos 1990, multiplicaram-se as propostas curriculares, assim como as
tentativas de modificar a formação e os educadores, para que estejam marcados pelas
exigências discutidas acima.
Todavia, acreditamos que o cerne de tudo é a escola. Para Estrela (1992, p.45)
“núcleo privilegiado de situações profissionais do educador”. A escola é a fonte real das
necessidades de formação e, portanto, fonte de material programático para cursos de
formação contínua. Nóvoa corrobora com essa ideia quando diz que,
práticas de formação continuada devem ter como pólo de referência as
escolas. São as escolas e os professores organizados nas suas escolas
que podem decidir quais são os melhores meios, os melhores métodos
e as melhores formas de assegurar esta formação continuada. Com isto,
eu não quero dizer que não seja muito importante o trabalho de
especialistas, o trabalho de universitários nessa colaboração. Mas a
lógica da formação continuada deve ser centrada nas escolas e deve
estar centrada numa organização dos próprios professores (Nóvoa,
2001, p.1)
O pensamento de Nóvoa é totalmente coerente e até permite parafrasear parte do
título de um outro livro “Afinal o que importa é saber o que importa! ”, dos autores
Gilberto Dimenstein e Mario Sergio Cortella. O que importa para a escola? Para seus
professores? E para seus alunos? Quais as suas reais necessidades? Devemos manter a
escola no centro das discussões. Para Rodrigues (2006, p.21) “a subordinação da
formação dos professores às perspectivas sociais sobre a educação e a escola é, aliás, um
imperativo da sociedade democrática”.
Porém, sabemos que nem sempre é assim que acontece. Existem órgãos
responsáveis pela seleção curricular de cada formação em nosso país e, por isso, não
podemos esquecer a faceta reguladora que se esconde por trás de cada uma delas.
Popkewitz nos alerta sobre essa condição da formação lembrando que,
A pedagogia está relacionada com a seleção, organização e avaliação
do conhecimento. Por conhecimento, não entendo somente os factos e
conteúdos que fazem parte do currículo. A linguagem que utilizamos
nos debates sobre ensino (infância, individualidade, sociedade, etc.) não
são apenas lentes cognitivas, mas também modos de pensar, de ver, de
sentir e de actuar no mundo. Neste sentido, é preciso encarar os actos
de ensino como formas de regulação social, que selecionam os
fenómenos, impondo-lhes fronteiras, classificando-os, distinguindo o
essencial do acessório, sem esquecer que as fronteiras delimitam
também o que deve ser omitido (POPKEWITZ, 1995, P.47).
Quando falamos em formação assumimos ideias, posições epistêmicas. O seu
conteúdo, portanto, não deixa de ser uma prática construída socialmente e politicamente
determinada. Afinal, para Freire (1996, p.125) ensinar exige reconhecer que a educação
é ideológica e “a ideologia tem que ver diretamente com a ocultação da verdade dos fatos,
com o uso da linguagem para penumbrar ou opacizar a realidade, ao mesmo tempo em
que nos torna ‘míopes’”.
Por isso, devemos assumir uma postura crítica perante nossos programas de
formação, já que Popkewitz e Pereyra (1992, p.21) nos alertam que “nos relatórios e
práticas de investigação de cada país existem definições sobre o que se pode falar, quem
deve falar e o que deve ser omitido”.
Diante dessa revelação, se faz pertinente que possamos conhecer o que tem sido
feito e o que está sendo construído na perspectiva de uma política pública de formação
nacional. Uma breve e recente história das políticas educacionais deve ser relembrada sob
pena de não fragilizar ainda mais as ações contínuas na área de formação em nosso país.
Em 1996, podemos destacar a importância da promulgação da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB) no Brasil. Os incisos I, II e III do caput do art. 61 da Lei nº
9.394, de 20 de dezembro de 1996, asseguram que todos os professores e as professoras
da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de
licenciatura na área de conhecimento em que atuam. Reconhece também o direito à
programas de formação contínua para os profissionais de educação dos diversos níveis,
comprometendo as instâncias governamentais pelo oferecimento dessa formação, e
confirmando sua importância.
Em 2002, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores
são promulgadas. Em 2003, com a Portaria nº 1.403, de 09 de junho, substituída
posteriormente pela Portaria n° 1.472, de 7 de maio de 2004, institui-se o Sistema
Nacional de Formação Continuada de Professores, criado com o objetivo de contribuir
para a melhoria da formação dos professores e alunos. As universidades passam a integrar
a Rede Nacional de Formação de Professores e, atuam vinculadas às redes públicas de
ensino, responsáveis pela formação dos professores da educação básica. Além disso,
podem receber financiamento destinado à produção de materiais didáticos para cursos à
distância e semipresenciais.
Essas universidades, se estabeleceram como Centros de Pesquisa e
Desenvolvimento da Educação e atendem as necessidades da rede nas seguintes áreas:
alfabetização e linguagem, educação matemática e científica, ensino de ciências humanas
e sociais, artes e educação física, gestão e avaliação da educação.
Em 2009, a partir do decreto nº 6.755 – janeiro, várias instâncias educacionais, em
ação conjunta, formularam a Política Nacional de Formação de Profissionais do
Magistério da Educação Básica e cada Estado, a partir de seu Fórum Permanente de
Apoio à Formação Docente, concretizava essa política com a formação inicial e contínua
de seus professores do magistério das redes públicas da educação básica. Em 2011, essa
mesma Política Nacional sofreu uma reestruturação em sua gestão, com a finalidade de
buscar melhorias em seus processos, como na execução de recursos, por exemplo.
Em setembro de 2011, foi instituída a Rede Nacional de Formação Continuada
de Profissionais da Educação Básica, conforme Portaria nº 1.328, de 23 de setembro de
2011, formada pelas Instituições de Educação Superior (IES), públicas e comunitárias
sem fins lucrativos, e pelos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IF)
que apresentarem seus termos de adesão à Rede.
Os avanços dessa construção permitiram a oferta dos seguintes
programas/oportunidades de formação contínua no país:
- Formação no Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - curso presencial
de 2 anos para os Professores alfabetizadores, com carga horária de 120 horas por ano,
metodologia propõe estudos e atividades práticas. Os encontros com os Professores
alfabetizadores são conduzidos por Orientadores de Estudo. Estes são professores das
redes, que estão fazendo um curso específico, com 200 horas de duração por ano, em
universidades públicas.
- Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica – Parfor - O Parfor
induz e fomenta a oferta de educação superior, gratuita e de qualidade, para professores
em exercício na rede pública de educação básica, para que estes profissionais possam
obter a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB e
contribuam para a melhoria da qualidade da educação básica no País.
- Proinfo Integrado - é um programa de formação voltado para o uso didático-
pedagógico das Tecnologias da Informação e Comunicação – TIC no cotidiano escolar,
articulado à distribuição dos equipamentos tecnológicos nas escolas e à oferta de
conteúdos e recursos multimídia e digitais oferecidos pelo Portal do Professor, pela TV
Escola e DVD Escola, pelo Domínio Público e pelo Banco Internacional de Objetos
Educacionais.
- e-Proinfo - é um ambiente virtual colaborativo de aprendizagem que permite a
concepção, administração e desenvolvimento de diversos tipos de ações, como cursos a
distância, complemento a cursos presenciais, projetos de pesquisa, projetos colaborativos
e diversas outras formas de apoio a distância e ao processo ensino-aprendizagem.
- Pró-letramento - é um programa de formação continuada de professores para a
melhoria da qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e matemática nos anos/séries
iniciais do ensino fundamental. O programa é realizado pelo MEC, em parceria com
universidades que integram a Rede Nacional de Formação Continuada e com adesão dos
estados e municípios.
- Gestar II - O Programa Gestão da Aprendizagem Escolar oferece formação continuada
em língua portuguesa e matemática aos professores dos anos finais (do sexto ao nono
ano) do ensino fundamental em exercício nas escolas públicas. A formação possui carga
horária de 300 horas, sendo 120 horas presenciais e 180 horas a distância (estudos
individuais) para cada área temática. O programa inclui discussões sobre questões
prático-teóricas e busca contribuir para o aperfeiçoamento da autonomia do professor em
sala de aula.
Partindo para o âmbito local, nossa Universidade, especificamente nosso Centro
de Educação – CE/UFRN, não deixa de se preocupar, também, com a formação contínua
dos professores. E por isso, a partir do Programa de Formação Continuada do Centro de
Educação (PROFOCO) oferta cursos destinados a profissionais da educação básica e
ensino superior. Nos anos de 2011 a 2013, os seguintes cursos foram ofertados:
Fonte: Projeto “A contribuição dos cursos de formação continuada para atuação profissional dos
professores”, CE/UFRN. 2015.
Segundo o Programa, no período de 2011 a 2013, vinte e um cursos foram
ofertados pela UFRN, que formou quase 5.000 alunos, num total de 4.816. Os cursos
foram oferecidos nas modalidades de aperfeiçoamento, especialização e capacitação,
como demonstra o gráfico abaixo, apresentado por ordem decrescente de número de
concluintes, por curso, segundo dados do Projeto do CE, intitulado “A contribuição dos
cursos de formação continuada para atuação profissional dos professores”, de 2015.
Tabela 6 - Cursos do PROFOCO/UFRN – 2011 a 2013
CURSOS NIVEL
N° 1 – Pedagogia do Movimento na Infância. Aperfeiçoamento
N° 2 – Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Aperfeiçoamento
N° 3 – Formação Continuada em Conselhos Escolares. Aperfeiçoamento
N° 4 – Docência na Escola de Tempo Integral (Mais Educação). Aperfeiçoamento
N° 5 – PROINFO. Aperfeiçoamento
N° 6 – Infância e Ensino Fundamental de 9 anos, currículo e trabalho pedagógico nos três primeiros anos. Aperfeiçoamento
N° 7 – Conhecimento, apreciação e Prática em Artes Visuais. Aperfeiçoamento
N° 8 – Curso de Aperfeiçoamento. Currículo, Planejamento e Organização do Trabalho na Educação Infantil. Aperfeiçoamento
N° 9 – Curso Aperfeiçoamento. Campo de Experiências Saberes. Aperfeiçoamento
N° 10 – Curso Aperfeiçoamento Educação Infantil, Infâncias e Arte. Aperfeiçoamento
N° 11 – Novas Vertentes Metodológicas na Perspectiva da Biodiversidade e da Formação Cidadã. Aperfeiçoamento
N° 12 – Mediadores de Leitura. Aperfeiçoamento
N° 13 – Dança e Pluralidade Cultural. Aperfeiçoamento
N° 14 – Oficina de Educação Musical. Aperfeiçoamento
N° 15 – Ensino de História Local e Produção de Material Didático. Aperfeiçoamento
N° 16 – Atendimento Educacional Especializado na Perspectiva da Educação Inclusiva. Aperfeiçoamento
N° 19 – Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica. Especialização
N° 20 – Curso de Especialização em Docência na Educação Infantil. Especialização
N° 21 – Especialização em Educação Musical. Especialização
Fonte: Projeto “A contribuição dos cursos de formação continuada para atuação profissional dos
professores”, CE/UFRN. 2015.
O curso com maior número de concluintes nesses três anos foi o curso de
Formação Continuada em Conselhos Escolares, com 950 alunos, o que é um dado
admirável. Porém, não podemos deixar de valorizar o curso com a menor quantidade de
alunos concluintes “Conhecimentos, apreciação e práticas em artes visuais”, já que se
configura como uma das necessidades de formação vivenciadas pelas professoras que
participaram desta pesquisa, pois o trabalho com as múltiplas linguagens, envolve as
práticas em Artes Visuais.
Esse projeto visa a investigar a contribuição dos cursos de formação continuada
ofertadas pela UFRN, sob a coordenação do Comitê Gestor Institucional de Formação
Inicial e Continuada de Profissionais do Magistério da Educação Básica (COMFOR –
UFRN), para a prática pedagógica dos professores egressos em suas atividades docentes
no dia a dia em sala de aula.
Nos anos de 2014 e 2015, o próprio site do Centro de Educação, divulga os cursos
ofertados, mas ainda sem o número de matriculados, pois alguns continuam em
andamento. Os cursos de aperfeiçoamento, capacitação, especialização, foram:
- Currículo, planejamento e organização do trabalho pedagógico na educação infantil
- Campos de experiências e saberes e ação pedagógica na educação infantil
- Educação infantil, infâncias e arte, pacto nacional pelo fortalecimento do ensino médio
- Pacto nacional pela alfabetização na idade certa
- Sala de recursos multifuncionais: educação e tecnologia
- Formação continuada em conselhos escolares
- Docência na educação infantil
- Especialização em gestão escolar
- Educação, pobreza e desigualdade social
- Educação em direitos humanos
Essa diversidade de cursos de formação contínua demonstra a seriedade de nossa
Universidade em respeitar as políticas destinadas à formação contínua de professores de
nosso país, bem como a preocupação em estreitar as relações entre a academia e a escola
pública brasileira.
A apresentação e o conhecimento desses programas nos dizem que existe uma
política de formação no país. Mas porque ainda nos deparamos com estatísticas que já
divulgamos anteriormente, pelo MEC/INEP, em que apenas 9,88% das crianças possuem
aprendizagem adequada em escrita, para o fim do ciclo de alfabetização, segundo a
Avaliação Nacional de Alfabetização – ANA (2014)? Como, de fato, os programas de
formação contínua poderão dar suas contribuições nesse contexto amplo e complexo, de
maneira que transforme o saber do professor de sala de aula em uso?
Uma das possibilidades pode ser a de que esses programas, possibilitem dar mais
notoriedade às outras dimensões da formação. Estrela (1992, p.44) nos informa que a
estrutura da formação contínua, vai além da dimensão do ensino e “pressupõe o
reconhecimento de diversas perspectivas que poderemos agrupar em três planos: o
político-administrativo, o técnico-científico e um outro que designaremos por
profissional”.
A questão que o próprio autor nos coloca é saber equilibrar todas essas
necessidades e possibilidades de formação, lembrando que a questão administrativa,
quase sempre deixada de lado, não pode ser esquecida, já que possui função organizativa
do sistema. A maioria até começa cheia de boas intenções, mas não conseguem alcançar
seus objetivos, pois a gestão dos sistemas públicos, por exemplo, não abraça as
formações, o que gera um divórcio.
Esse abraço se refere à valorização que uma Secretaria do Estado, direção ou
coordenação pode dar ao professor, em seu dia a dia. Muitos retornam à sua escola cheios
de expectativas para colocar o saber em movimento, mas esbarram na morosidade e
burocracia dessa gestão, que não se envolve com o projeto de desenvolvimento implícito
em cada formação contínua. Como trabalhar com jogos de alfabetização se as professoras
não possuem acesso a esses jogos? Como proporcionar momentos de leitura com as
crianças, se os livros que a escola recebe ficam trancados no armário da coordenadora e
ela nem sempre está na escola? Esses são pequenos exemplos de outras experiências de
pesquisa de como a falta de envolvimento da gestão dificulta a execução desses
programas nas escolas. Para Huberman (1987 apud Rodrigues e Esteves, p. 40) “a inércia
das instituições constitui, por sua vez, um obstáculo poderoso às reestruturações exigidas
pelos novos dispositivos emergentes da pesquisa e às próprias decisões políticas.
No entanto, quando o programa e a gestão parecem exercer bem seus papéis, eis
que surge o professor nesse contexto. Qual o seu papel na transformação do saber em
movimento? Com ele pode contribuir para essa transformação?
Iniciamos a resposta dessas perguntas com outra questão: será que todo docente,
frequentador de um programa de formação contínua possui o objetivo de mudar sua
prática em sala de aula? Essa pergunta já foi respondida anteriormente, no início do
capítulo, no momento em que discutimos as finalidades da formação contínua e os ciclos
de desenvolvimento profissional do professor, por isso sabemos que a resposta é NÃO.
Alguns desejam um aumento salarial, outros uma promoção na carreira. Não
iremos criticar a motivação de crescimento e ascensão profissional dos professores, até
porque essa pode ser uma consequência da formação contínua e o desejo natural e
saudável de qualquer profissional. Porém, acreditamos que não devemos perder o
compromisso com o ensino.
Os professores possuem um papel importante no desenvolvimento da formação
contínua. Além de levarmos em conta que o currículo deve escutá-lo, já que é parte
importante da escola, acreditamos que ele influencia a qualidade dessa formação.
Dessa forma, pensamos que alguns eixos devem embasar a ação do docente na
busca da transformação das dificuldades e dos saberes em uso. Como conseguir que os
saberes compartilhados nos programas de formação contínua se efetivem com qualidade
em sala de aula?
Como sabemos que a formação contínua não se dá apenas a partir de programas,
mas também no dia a dia docente, pelas vias de grupos de estudo, do diálogo com os
pares, entre outros, também nos questionamos: como o professor pode contribuir para sua
própria formação contínua, deixando de ser mero executor de programas e propostas
externas (GATTI, BARRETO, 2009)? Para responder esses dois questionamentos
acreditamos que os professores deverão assumir uma postura baseada na concepção de
profissionalismo, reflexão, pesquisa e auto formação.
A palavra profissionalismo pode se confundir com profissionalidade, mas Núñez
e Ramalho (2008) nos ajudam a compreender bem a diferença entre esses conceitos,
O termo “profissionalidade” expressa a dimensão relativa ao
conhecimento, aos saberes, técnicas e competências necessárias à
atividade profissional. Por meio da profissionalidade, o professor
adquire as competências necessárias para o desempenho de suas
atividades docentes e os saberes próprios de sua profissão. Profissionalismo é a expressão da dimensão ética dos valores e normas,
das relações, no grupo profissional, com outros grupos. É mais do que
um tema de qualificação e competência, uma questão de poder:
autonomia, face à sociedade, ao poder político, à comunidade e aos
empregadores; jurisdição, face aos outros grupos profissionais; poder e
autoridade, face ao público e às outras profissões ou grupos
ocupacionais. É uma construção social na qual se situa a moral coletiva,
o dever ser e o compromisso com os fins da educação como serviço
público, para o público (não discriminatória) e com o público
(participação). O profissionalismo se associa ao viver-se a profissão, às
relações que se estabelecem no grupo profissional, às formas de se
desenvolver a atividade profissional (NÚÑEZ E RAMALHO, 2008,
p.4).
Ou seja, nem todo professor, que possui uma profissionalidade possui também
profissionalismo. Nem todo professor que participa de um curso de formação realmente
está preocupado com o desenvolvimento de seus alunos, com as estatísticas lamentáveis
de nossa educação. Esse dado é importante, pois indica que os programas de formação
devem também se preocupar com esse aspecto, como apontou Estrela (1992)
anteriormente.
Muitos são os professores que reclamam de seus salários, de seu trabalho,
gostariam de estar no lugar de outros colegas, com maior status profissional, como os
professores universitários, por exemplo; mas não querem fazer o que eles fazem:
aprofundar seus estudos, ler e escrever cientificamente, participar de congressos, realizar
pesquisas a partir de investigações, socializar experiências, ou seja, se formar
continuamente e,
fazer a profissão do professor “sair do quadro das atividades intuitivas
e artesanais em que tradicionalmente tem estado inserida, e dotá-la de
um quadro teórico de conjunto em que se fundamente cientificamente
a intervenção profissional, é uma ambição, mas é também um
imperativo social. A implementação de uma verdadeira formação
profissional é uma medida fundamental no sentido do reconhecimento
da profissão do professor” (RODRIGUES E ESTEVES, 1993, p. 42)
Essa discussão está presente na introdução desta tese, mas é importante retomá-
la neste momento para dizer que é comovente saber do esforço, do trabalho e do
investimento financeiro que um programa de formação demanda, para que se esbarre na
falta de profissionalismo de um profissional docente. Com falta de profissionalismo os
saberes compartilhados em um curso de formação contínua jamais chegarão ao chão da
escola, pois já ofereceram ao seu portador, um título ou benefícios pessoais maiores que
os da sala de aula.
Ou que ainda, por falta de compromisso e de envolvimento com a profissão são
incapazes de se movimentarem a favor de sua própria formação, pois não querem “mais
trabalho nessa vida”, deixando tudo como está: fingindo que ensinam e permitindo que
os alunos finjam que aprendem, colocando de lado o envolvimento ético com a profissão
que possui o papel primordial de ensinar.
Por isso, é que, “na formação permanente de professores, o momento fundamental
é o da reflexão crítica sobre a prática” (FREIRE, 1996, p.38), “se torna necessário que o
professor reflicta permanentemente sobre sua acção e sobre seu pensamento”
(ESTRELA, 1992, p. 45). Observar sua turma, escutar seus alunos, avaliar suas
atividades, trocar experiências, são exemplos de como poderá refletir sobre sua
profissionalidade e seu profissionalismo. Essa atividade é fundamental para que o
professor supere seu saber ingênuo, proveniente da prática espontânea e produza um saber
crítico, com rigorosidade e curiosidade epistemológica. Esse saber não irá brotar dos
livros, nem de guias de seres iluminados, necessita ser produzido pelo próprio aprendiz,
com seus pares (FREIRE, 1996).
O professor deve se fazer sujeito de sua própria formação e reconhecer suas
dificuldades a partir de sua prática, por isso o ato de refletir passa a ser o elemento
estruturador da maioria das propostas de formação, ele aproxima o saber ingênuo do saber
crítico e
é pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode
melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à
reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se funda
com a prática. O seu “distanciamento” epistemológico da prática
enquanto objeto de sua análise, deve dele “aproximá-lo ao máximo.
Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da
prática em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da
superação da ingenuidade pela rigorosidade” (FREIRE, 1996, p.39)
Entretanto, Zeichner (1995) se queixa ao expor que falar sobre professor reflexivo
se tornou um modismo. Todos reconhecem que o professor deve refletir. E Nóvoa (2001,
p.1) também desabafa: “o que me importa mais é saber como é que os professores
refletiam, antes que os universitários tivessem decidido que eles deveriam ser professores
reflexivos”. Nesse sentido, necessitamos questionar a qualidade dessa reflexão. Descobrir
o que convém aprender, é diferente de apenas aprender a aprender, pois
a reflexão não é apenas um processo psicológico individual, passível de
ser estudado a partir de esquemas formais, independentes do conteúdo,
do contexto e das interacções. A reflexão implica a imersão consciente
do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado de
conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências
afectivas, interesses sociais e cenários políticos (PÉREZ GÓMEZ,
1995, p. 103).
Nesse movimento de imersão pode ser capaz de compreender e reconhecer suas
fragilidades, suscitar ou procurar formação adequada, coerente com sua reflexão. Esses
momentos também podem e devem acontecer coletivamente, então “espera-se que [...] os
docentes se assumam como protagonistas, com a consciência de que todos são sujeitos
quando se diferenciam, trabalham juntos e desenvolvem uma identidade profissional”
(IMBERNÓN, 2011, p.1). Mas, “em primeiro lugar, a formação em serviço requer um
clima de real colaboração entre os pares. Quem não se dispõe a mudar não transforma a
prática. E quem acha que já faz tudo certo não questiona as próprias ações” (IMBERNÓN,
2011, p.1).
A reflexão coletiva contribui para a prática do professor, na medida em que
alcança pontos ainda não observados solitariamente. Mas para isso, corroboramos com
Imbernón e acreditamos que a postura é de maturidade, e não apontamento de defeitos,
na vontade única de conscientização e construção do conhecimento.
Para Alarcão (2001, p.11) essa coletividade reflexiva é expressa em uma escola
reflexiva, “concebida como uma organização, que continuadamente se pensa a si própria,
na sua missão social e na sua organização, e confronta-se com o desenrolar da sua
atividade em um processo heurístico de simultaneamente avaliativo e formativo”. Na
escola reflexiva os currículos inertes se tornam vivos e os professores, a partir de suas
trocas coletivas se tornam atores de sua formação.
Todavia, assim como as questões relacionadas ao profissionalismo, a prática
reflexiva também pode vim a confrontar-se com a burocracia escolar, segundo Schön
(1995, p.87) muitos professores “se sentem frustrados pela resistência oferecida pela
escola” aos seus pensamentos reflexivos, e infelizmente, decidem sair da instituição, já
que a escola agora é pequena e reguladora demais para suas ideias. A escola perde,
portanto, um professor capaz de enxergar além, “o professor tem de se tornar um
navegador atento à burocracia. E os responsáveis escolares que queiram encorajar os
professores a tornarem-se profissionais reflexivos devem tentar criar espaços de liberdade
tranquila onde a reflexão-na-ação seja possível” (SCHÖN, 1995, p.87), alerta.
Sendo assim, de nada adianta refletir se não puder transformar sua reflexão em
ação. E a reflexão na prática é a pesquisa como nos diz Miranda (2006, p.135): “O
professor pesquisador centra-se na consideração da prática, que passa a ser meio,
fundamento e destinação dos saberes que suscita, desde que esses possam ser orientados
e apropriados pela ação reflexiva do professor”. Em outras palavras, a reflexão orienta a
pesquisa, diz que direção deverá tomar.
Mas para Freire (1996) não se pode conferir pesquisa à função do professor, como
se fosse um atributo a ser acrescentado em sua profissão. A pesquisa faz parte da natureza
do professor. É intrínseca a ele. Basta apenas que os professores se conscientizem disso
e que assumam sua postura pesquisadora.
Zeichner (1998) traz à tona uma discussão muito importante sobre a pesquisa na
docência: a separação que existe entre o mundo dos professores-pesquisadores e o mundo
dos pesquisadores acadêmicos. Parece que só quem produz pesquisa são os segundos. “É
muito raro, por exemplo, ver citações do conhecimento produzido por professores nos
artigos de pesquisadores acadêmicos ou ver o uso de conhecimento gerado por
professores em programas de formação de professores” Zeichner 1995 (apud
ZEICHNER, 1998, P.1).
Para o autor essa desunião é causada por diversos motivos. Um deles é que os
professores não procuram a pesquisa para tentar melhorar suas práticas. Um outro é que,
as pesquisas acadêmicas, aos olhos dos professores, não são importantes para o exercício
docente. Isso se deve ao fato de que os próprios pesquisadores segundo Zeichner (1998,
p.1) “rejeitam a pesquisa dos professores das escolas por considerá-la trivial, ateórica e
irrelevante para seus trabalhos”.
A linguagem acadêmica de difícil acesso e a visão de que somente pesquisa quem
está fora da sala de aula, são outras causas da distância entre o professor e a pesquisa. Na
maioria das vezes, quanto mais difícil de se compreender, mais o trabalho possui status e
é enaltecido. Na verdade, estes são também os mais inúteis.
Além disso, o fato de serem depreciados nas pesquisas acadêmicas fazem com que
os professores não se interessem e nem se sintam confortáveis nesse grupo, que o julga
de maneira negativa. Os professores “sentem que os pesquisadores acadêmicos são
insensíveis às complexas circunstâncias vivenciadas em seus trabalhos e frequentemente
se sentem explorados pelos pesquisadores universitários” (ZEICHNER, 1998, p.2).
Cabe a nós pesquisadores acadêmicos desmitificarmos esse saber inacessível, que
tem por objetivo inicial alcançar os professores e o chão da escola. A começar pelo
respeito de compreender que a pesquisa apenas se encerra quando compartilhamos seus
resultados com nossos sujeitos e nos preocupamos com ele, construindo e desenvolvendo
com eles, por exemplo, uma pesquisa-ação, como será o caso desta tese.
No entanto, reflexão e pesquisa, apesar de fazerem parte do paradigma
predominante na área de formação de professores, não são suficientes para responder à
todas as dificuldades dessa área.
Por isso, na tentativa de criar novos dispositivos consistentes, gostaríamos de
discutir sobre o conceito de auto formação. Esta, segundo Pineau e Marie-Michèle, (1983
apud PINEAU, 1985, p.1) “possui uma perspectiva de autonomização educativa, segundo
uma problemática de poder, definindo-a formalmente como a apropriação por cada um
do seu próprio poder de formação”.
Para Josso (2004) a auto formação é um esforço de poder dar a si mesmos os meios
de serem professores cada vez mais conscientes. Quando o professor participa de algum
programa de formação contínua ou até mesmo de reuniões pedagógicas com seus pares,
necessita refletir sobre as dificuldades vivenciadas naqueles momentos.
Pensar sobre seu papel na escola, imaginar o que precisa ainda esclarecer para
efetivar sua prática com qualidade, pesquisar e agir. Esse movimento se traduz em auto
formação. É muito bom quando temos alguém que possa mediar nossas dúvidas e nos
fazer refletir sobre alguns aspectos de nossa prática, mas na maioria das vezes, estamos
sós frente aos problemas e não podemos esperar um curso, reunião, congresso e outros
que possam tratar especificamente cada uma de nossas questões.
O professor, pode, a partir de um processo constante de auto avaliação orientar
seu desenvolvimento profissional (IMBERNÓN,1998). Com essa atitude temos “o
alargamento das capacidades de autonomização e, portanto, de iniciativa e criatividade”
(JOSSO, 2004, p.63). Dessa maneira a formação é mais coerente, faz mais sentido, possui
mais vigor e é realizada com vivacidade.
Mas essa auto formação desperta também um conhecimento pessoal, além do
profissional, implica, segundo Nóvoa (1995, p.25) “um trabalho livre e criativo sobre os
percursos e os projectos próprios, com vista à construção de uma identidade, que é
também uma identidade profissional”. O próprio Nóvoa (1995, p.46) nos conta que já viu
“excelentes programas de formação que parecem não adentrar na sala de aula de jeito
nenhum, muitas vezes por falta de desenvolvimento de outras áreas do professor”. Essas
áreas dizem respeito também ao lado pessoal do professor, numa compreensão de
formação total.
Por isso, acreditamos em uma formação de sentidos, não só profissional, mas
pessoal também, e Nóvoa, mais uma vez, concorda conosco quando acredita que “urge
por isso (re)encontrar espaços de interacção entres as dimensões pessoais e profissionais,
permitindo aos professores apropriar-se dos seus processos de formação e dar-lhes um
sentido no quadro das suas histórias de vida” (NOVOA 1995, P 25).
Os professores participam de muitas formações, mas elas não tocam suas almas.
Elas não os modificam, pois não há envolvimento. Aliás essa é a palavra-chave:
envolvimento. O professor que não se envolve com seus alunos, sua escola e sua prática,
dificilmente irá dar sentido à formação. “A formação está indissociavelmente ligada à
produção de sentidos sobre as vivências e sobre as experiências de vida” (FINGER, 1989;
BALL E GOODSON, 1989 APUD NÓVOA, 1995, p.26).
Achamos conveniente finalizar o capítulo deixando as ideias do filósofo Michel
Montaing (2010), que desde sua obra Os ensaios - já se preocupava e desprezava a
inutilidade do saber erudito - para a construção de uma “cabeça bem-feita” ao invés de
“uma cabeça cheia”. Uma cabeça bem-feita, já dizia Morin (2003, p.21) “significa que,
em vez de acumular o saber, é mais importante dispor ao mesmo tempo de: – uma aptidão
geral para colocar e tratar os problemas; – princípios organizadores que permitam ligar
os saberes e lhes dar sentido”.
Segundo o pensador, “um erudito, com discurso eloquente, repleto de adornos
emprestados, até pode se disfarçar de sábio, mas isto não passa de aparência”
(THEOBALDO, 2008, p.41). Não queremos que a formação contínua viva de aparências.
Não deixemos que a formação contínua de professores se torne apenas instrução oca.
Acreditando que uma formação contínua que considere as necessidades de
formação do professor, possa contribuir para a superação desses desafios, vamos
conhecer as principais necessidades de formação desse grupo de educadoras, temática
principal do próximo capítulo.
DIAGNÓSTICO DAS NECESSIDADES DE
FORMAÇÃO DE PROFESSORAS DA
EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA
94
4 DIAGNÓSTICO DAS NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORAS
DA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA
As professoras relataram, que durante suas práticas vivenciam/enfrentam algumas
dificuldades no cuidado e educação das crianças da Educação Infantil/Pré-Escola.
4.1 NECESSIDADES VIVENCIADAS
Os nossos dados foram organizados através de temas, categorias e subcategorias,
uma vez que pretendíamos realizar uma análise temática. As dificuldades que as
professoras de Educação Infantil/Pré-Escola vivenciam no cuidado e educação das
crianças (docência na pré-escola) estão pautadas em doze subcategorias, que serão
discutidas individualmente.
Quadro 1 – Tema, categoria e subcategorias das dificuldades vivenciadas na docência da
pré-escola
TEMA CATEGORIA SUBCATEGORIA
1.1 Docência na pré-escola
1.1.1 Necessidades vivenciadas
1.1.1.1 - No planejamento
1.1.1.2 - Nos conhecimentos
relacionados à Leitura e Escrita
1.1.1.3 – Nos conhecimentos
relacionados à Linguagem
Matemática
1.1.1.4 – No conhecimento sobre
a criança pré-escolar: como elas
pensam?
1.1.1.5- Múltiplas linguagens:
“trabalho no escuro”
1.1.1.6 - No atendimento
individualizado à criança
1.1.1.7 - No atendimento às
crianças com necessidades
especiais
1.1.1.8 - Na relação família x
escola
1.1.1.9 – No ensino sobre regras
e limites
1.1.1.10 – No apoio à formação
docente
1.1.1.11- Na inadequação do
espaço físico
1.1.1.12 – Na escassez de
materiais
95
O planejamento foi uma das dificuldades mais citadas por todas as docentes e
coordenadoras. Todos os profissionais de Educação compreendem a importância de um
bom planejamento. Afinal,
a atividade de planejar é atividade intrínseca à educação por suas
características básicas de evitar o improviso, prever o futuro, de
estabelecer caminhos que podem nortear mais apropriadamente a
execução da ação educativa, especialmente quando garantida a
socialização do ato de planejar, que deve prever o acompanhamento e
a avaliação da própria ação (PADILHA, 2001, p.45).
Porém, nem sempre a relevância desse momento é vivenciada nas escolas de
Educação Infantil. Na escola pesquisada, as docentes possuem uma hora de planejamento
diário. Analisando previamente, esse dado nos motiva já que totaliza cinco horas de
planejamento semanal. Todavia, quando questionamos as professoras se o tempo que
possuem para planejar é suficiente, as docentes respondem que até seria se não fosse tão
fragmentado. Vejamos os comentários a seguir:
o tempo da gente é até bom, é suficiente, porém ele é quebrado. A gente
tem cinco horas de planejamento semanal, só que é uma hora por dia. É
complicado por isso, quando a gente começa uma discussão, acabou! E
fora que a gente ainda tem a dificuldade do espaço físico, porque esse
espaço que nós estamos é coordenação, almoxarifado e é onde as
pessoas almoçam. Então eu planejo, atendo pais, crianças, atendo
telefonemas. Aí a gente tá conversando, um se mete na conversa do
outro. É complicado. (Paciência)
Elas ainda revelam que acabam levando trabalho para casa, prática comum ao
ofício de professor, atualmente. Porém, a sobrecarga de atividades e exigências destinadas
ao professor têm gerado, o que já falamos anteriormente, um mal-estar docente (ESTEVE,
1999), que é retratado nas falas das professoras que se seguem:
para planejar a gente nunca vai ter tempo suficiente. Por quê? Por que
você planeja o que fazer, acabou-se o tempo! Você vai ter que se virar
para confeccionar o que você vai fazer. Eu não tenho alfabeto móvel,
eu tenho que digitar, mandar imprimir. Então eu vou ter que levar
trabalho para casa. A gente diz que não leva pra não botar em costume,
mas que por debaixo do pano você leva, ah leva. É muito cansativo.
(Conhecimento)
Se eu quero fazer um bingo, aí eu vou ter que sempre trazer um bingo
pronto de casa. Não dá tempo de executar, de produzir material. Esse
tempo quebradinho é muito ruim. Além disso, existe uma demanda de
pais na escola que me procuram nesse momento e às vezes como que
quero muito falar com eles sobre algo importante de seus filhos, como
96
agressividade por exemplo, aí eu tenho que parar e conversar.
(Criatividade)
Além disso, as famílias não compreendem que as professoras necessitam de tempo
para essa atividade e se incomodam quando a escola fecha para um planejamento coletivo,
por exemplo. Nesse sentido, nos explica a professora...
As mães acham ruim se a gente fecha para planejar. A gente precisa
parar as atividades para planejar. Planejar uma festa? Não! O nosso
planejamento pedagógico é sacrificado. Não tem outro tempo para isso,
se parar a comunidade vai reclamar, e não vai reclamar na escola não,
é na Secretaria, e a Secretaria vai cobrar da gestora. Então, para evitar
cobranças, nós sacrificamos sempre o nosso planejamento. Com aquela
velha história né: pode ser feito de qualquer jeito! Então de seus pulos,
porque o importante é receber a criança. (Conhecimento)
Em relação aos conhecimentos relacionados à Leitura e Escrita as professoras
dialogam sobre a popularidade do assunto nas formações e discussões coletivas. Porém,
a quantidade de diálogo não corresponde à qualidade da teoria e a professora Humildade
confessa que ainda sente muita dificuldade no trabalho de desenvolvimento da leitura e
da linguagem escrita na Educação Infantil, principalmente porque leciona no Ensino
Fundamental e tem medo de antecipar aprendizagens às crianças pequenas,
eu tenho muita dificuldade de saber como fazer minha intervenção com
a escrita, esse menino traçar como era... Principalmente na pré-escola,
na creche. Como é que você vai apresentar a essa criança, os números,
as letras e de que forma? E como é que você vai fazer essas
intervenções? Aí, como vai apresentar a ele o papel, o lápis?
(Humildade)
Emília Ferreiro e seus colaboradores (1999) demonstraram com seus estudos
sobre a gênese psicológica da língua escrita, os processos existentes no sujeito para a
aquisição da escrita, entendendo que existe um sujeito que conhece e que, para conhecer,
emprega mecanismos de aprendizagem. Diante da complexidade desse aprendizado,
Ferreiro, Teberosky e colaboradores elaboraram a Psicogênese da Língua Escrita.
Para a superação das dificuldades nessa área, a compreensão sobre a Psicogênese,
pelas professoras, é fundamental, pois é condição sine qua non para o engajamento de
suas práticas na descoberta do que a escrita representa, como ela representa e como os
alunos irão construir formas de diferenciação entre as representações.
97
Os conhecimentos matemáticos, assim como a leitura e a escrita, também são
motivos de dificuldades no cotidiano de sala de aula. Primeiramente, porque as próprias
professoras confessam que não apresentam, naquele momento, conhecimento sobre os
conceitos matemáticos; em seguida, porque não sabem como ensinar algo que nem elas
mesmas aprenderam. Essa dificuldade é destacada na fala das professoras,
Eu sinto muita necessidade da linguagem matemática, de trabalhar os
jogos, o lúdico na matemática. A tendência da gente é sempre correr
para as artes plásticas, para essa parte ilustrativa. Mas trabalhar a
matemática, essa construção do conhecimento lógico, das regras dos
jogos, como se joga isso para começar a estruturar o pensamento deles,
daí eu acho que a gente precisa enfatizar mais, eu particularmente
preciso. (Conhecimento)
Eu acho que em qualquer sala de aula que você entrar hoje o “bicho
papão” é a matemática. (Firmeza)
Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (2001,
p.213), “as crianças têm e podem ter várias experiências com o universo matemático e
outros que lhes permitem fazer descobertas, tecer relações, organizar o pensamento, o
raciocínio lógico, situar-se e localizar-se espacialmente”. Este documento apresenta
objetivos, conteúdos e orientações gerais para o professor no eixo da Matemática, porém
as professoras ouvidas não se utilizam desse documento e de nenhum outro para a
realização de seus planejamentos, justificando que eles não oferecem respaldo para a
prática. Por isso o trabalho se encontra solto, sem “fio condutor”, o que gera insegurança
e dificuldade. Vejamos a fala das coordenadoras que acompanham os planejamentos das
professoras,
As professoras dizem: não, mas eu trabalho matemática, eu conto com
as crianças. Mas não tem: hoje é o dia da matemática! Não há um foco.
E quando você tenta mostrar que elas poderiam fazer assim ou assado,
daí vem aquele discurso: mas eu conto quantos alunos vieram, mostro
os crachás, mostro os números, sem relacionar... O conceito de número
é uma construção social, não é? Como é que eu vou construir um
conceito se eu apenas decorar que aquele número é dois, se não fizer
essa relação de número e notação numérica, de quantidade, que é bem
complexa... (Paciência)
A matemática fica em segundo plano, porque, às vezes, o professor não
foi trabalhado, não teve uma formação. Tem o RCNEI, tem o Nacional,
tem o da Prefeitura, que dá aquele embasamento, direcionamento, mas
assim, não lhe dá respaldo assim ... para o trabalho mesmo! Hoje a gente
tem a internet, então tira de um blog, de um portal e fica tirando de um
e outro. (Humildade)
98
Seguindo para a próxima dificuldade explicitada, o conhecimento sobre a criança
pré-escolar, este é fundamental para o trabalho na Educação Infantil. Compreender a
maneira como as crianças aprendem, como pensam, nos auxilia na prática diária de
cuidar e educar. As crianças pré-escolares já são capazes de “reconstituir suas ações
passadas sob forma de narrativas e de antecipar suas ações pela representação verbal”
(PIAGET, 2007, p.24). Além disso, apresentam avanços no pensamento simbólico,
permitindo refletirem sobre pessoas, objetos e eventos que não estão fisicamente
presentes, por isso são capazes de distinguir fantasia de realidade. Este fato é presenciado
na linguagem, na imitação ou no jogo de faz de conta (VYGOTSKY, 2007). A professora
Criatividade se preocupa com essas aprendizagens quando questiona a maneira como as
crianças dessa idade aprendem. Assim vejamos:
como é que ela entende? Como é que eu vou explicar para ela? Eu posso
trazer uma atividade e não ser nada para ela, não ter sentido nenhum!
Como é que eu vou conseguir que essa informação chegue até ela?
(Criatividade)
A referida docente compreende que a maneira como as crianças aprendem irá
influenciar a sua maneira de ensinar, e ela está certa em seu pensamento. Basta nos
reportarmos aos estudos desenvolvidos por Ferreiro e Teberosky (1999) sobre a
Psicogênese da Língua Escrita, citados anteriormente. Compreendendo como elas
pensam é que planejamos atividades e situações de desafios, conflitos e construção do
pensamento sobre a língua escrita.
Partindo para o trabalho com as múltiplas linguagens na Educação Infantil, este
oferece um universo de possibilidades de trabalho com as crianças pequenas. Como já
dizia o poema de Loris Malaguzzi (apud EDWARDS, 1999) “a criança tem cem
linguagens” e é por isso que necessita de diversas oportunidades para se expressar e se
constituir enquanto sujeito cultural.
Essa vivência é tão importante, que as diretrizes curriculares nacionais para a
Educação Infantil (documento oficial com caráter mandatório) afirmam que “a proposta
pedagógica das instituições de Educação Infantil deve ter como objetivo garantir à
criança o acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos
e aprendizagens de diferentes linguagens” (BRASIL, 2010, p. 18). Além dos documentos
citados, os estudiosos da área confirmam que
As diferentes linguagens presentes nas atividades realizadas nas creches
e pré-escolas possibilitam às crianças trocar observações, ideias e
planos. Como sistemas de representação, essas linguagens estabelecem
99
novos recursos de aprendizagem, pois se integram às funções
psicológicas superiores e as transformam. Com isso ocorre uma
reorganização radical nos interesses e exigências infantis, modificando
a relação existente entre a ação e o pensamento infantil (OLIVEIRA,
2007, p.227).
No entanto, quando questionadas sobre as experiências com as múltiplas
linguagens, as professoras dizem “trabalhar no escuro”. Reconhecem o trabalho com o
corpo, a música, as artes, mas fazem o que acham certo e/ou reproduzem o que as outras
colegas estão fazendo. Vejamos, pois, o que nos revelam as professoras que se seguem...
A questão do Movimento; é aí que entra a dificuldade... Eu tenho
habilidade em Artes, mas nem todo professor tem. Eu fiz metade do
curso de artes visuais, mas não consegui terminar. A música também;
não tive formação alguma, não vi na graduação. (Criatividade)
Nós deveríamos ter um professor de música e de educação física.
Trabalhar o corpo, nós não temos nenhuma orientação. A gente faz, mas
não sabe se está certo. É complicado fazer sem conhecimento.
(Cuidado)
Porque a gente faz no escuro, tentando acertar. (Conhecimento)
Sobre o atendimento individualizado a cada criança, esse também consiste em
uma das dificuldades vivenciadas pelas professoras na Educação Infantil/Pré-escola. O
número de crianças por turma é pequeno, porém o espaço e a falta de uma professora
auxiliar impedem, muitas vezes, uma atenção individualizada. Zabalza nos fala dessa
importante ação quando nos explica que,
[...] mesmo que não seja possível desenvolver uma atenção individual
permanente, é preciso manter, mesmo que seja parcialmente ou de
tempos em tempos, contatos individuais com cada criança. É o
momento da linguagem pessoal, de reconstruir com ela os
procedimentos de ação, de orientar o seu trabalho e dar-lhe pistas novas,
de apoiá-la na aquisição de habilidades ou condutas muito específicas,
etc. (ZABALZA, 1998 p. 63).
A professora Criatividade nos relata a maneira como atende seus alunos que
possuem dificuldades em sala de aula,
a gente sabe que tem aquele aluno que tem mais dificuldade. Durante a
atividade, eu sempre tento sentar com ele para ajudar, enquanto os
outros já estão conseguindo fazer sozinhos. (Criatividade)
Porém, é importante planejarmos uma ação que contemple o atendimento a todas
as crianças, porque o comum é sempre sentarmos com as que têm dificuldade, deixando,
100
muitas vezes, de incentivar aqueles que já superaram alguns conhecimentos, mas
necessitam ser desafiados para os próximos, que virão.
Zabalza (1998, p.63) nos tranquiliza em relação a esse ponto, destacando que
“pensar que é possível dar atenção a cada criança de maneira separada durante todo o
tempo é uma fantasia”. Um ‘rodízio de atendimento’ é uma boa estratégia para observar
os alunos mais de perto. Se a turma possuir vinte alunos, por exemplo, atender cinco por
dia, não deixando nenhum de fora, é possível e satisfatório.
Em relação ao atendimento de crianças com necessidades especiais, as
professoras possuem muito medo e confessam já terem deixado de receber algumas na
instituição por não terem condições físicas nem profissionais para esse atendimento.
Vejamos,
aqui temos crianças especiais que vão chegar na pré-escola, como é que
vamos receber esta criança? Por enquanto a gente olha, ela está ali no
nível II, no nível I, mas amanhã ela vai ser minha aluna, como é que eu
vou enfrentar isso? Tem crianças com múltiplas dificuldades, ela não
anda, ela não fala, ela não escuta. (Conhecimento)
E que inclusão é essa? A criança está aqui, mas que atividade a gente
vai fazer? (Criatividade)
A gente não tem formação para isso. E todo ano sempre tem criança
especial, não é? (Cuidado)
Pois é, uma criança ou outra que até deixa de frequentar a escola porque
não tem suporte, não é? (Conhecimento)
Historicamente as crianças com necessidades especiais eram ensinadas em turmas
separadas das demais. Contudo, mesmo nos dias de hoje, é difícil a inserção respeitosa
dessas crianças na escola. A maioria reconhece que a escola comum é o melhor contexto
de desenvolvimento e aprendizagem, pois antes de tudo, são crianças e devem conviver
com as outras (OLIVEIRA, 2007). Porém, quando essas crianças batem na porta de suas
escolas, o medo e a insegurança tomam conta das professoras e demais envolvidos com
a prática pedagógica da instituição.
É evidente que o desafio é grandioso, pois a maioria das deficiências comove a
comunidade escolar e evidencia a necessidade de formações específicas, que podem
demandar muitos estudos e pesquisas. Os recursos, materiais e as metodologias terão que
se adequar à nova realidade, que podem ser diversas: aprendizagem da língua brasileira
de sinais (LIBRAS) pela equipe, produção de material para as crianças autistas, cadeiras
101
e mesas adaptadas e uma infinidade de possibilidades que exigem risco, aceitação do novo
e rejeição a qualquer tipo de discriminação (FREIRE, 1996).
Outro ponto de dificuldade bem relevante diz respeito ao relacionamento família
e escola. Todas as professoras, sem exceção, destacam esse vínculo como difícil e
complicado.
Existe um pensamento comum de que a família se constitui em um ambiente
perfeito, sem conflitos. Muitos professores não imaginam que quando chegam às suas
casas, aquelas crianças podem enfrentar situações de violência, separação de pais, fome,
descuido, abandono, brigas ou, até mesmo, abuso. Por essa razão os docentes estão
sempre insatisfeitos e se consideram até mais responsáveis que os pais.
Os professores precisam se despir da compreensão de família como opositora e
acolhê-la com seus problemas e dificuldades; afinal, essa união é melhor para a criança,
para os pais e professores. Não existe concorrência em “quem educa mais”,
[...] o professor não tem um papel terapêutico em relação à criança e
sua família, mas o de conhecedor da criança, de consultor, apoiador dos
pais, um especialista que não compete com o papel deles. Ele deve
possuir habilidades para lidar com as ansiedades da família e partilhar
decisões e ações com ela. Se assim ocorrer, a família terá no professor
alguém que lhe ajude a pensar sobre seu próprio filho e a se fortalecer
como recurso privilegiado do desenvolvimento infantil (OLIVEIRA,
2007, p. 181).
Muitas vezes, essa competição faz com que os pais se afastem da escola, como
maneira de se proteger dos olhares críticos que lhes cercam e lhes dizem que sua família
possui problemas; e essa pode ser a causa da falta de envolvimento e até de interesse pelo
trabalho desenvolvido pela escola. Abaixo, algumas insatisfações acerca dessa relação:
A relação de ordem família-escola é difícil. Porque a dificuldade é que
existe aquele conceito histórico construído, que nós estamos aqui para
receber as crianças para os pais trabalharem e muitos nem consideram
nosso trabalho com as crianças. A escola para esses é um depósito de
crianças. (Conhecimento)
A gente é professor das crianças e dos pais. Quem já viu intervir na vida
dos adultos! Uma avó vem e conversa com você e você tem que pisar
em ovos, porque depois vem a mãe. Uma diz uma coisa e a outra diz
outra. Você tem que ser neutra. Eles vêm para a gente como se a gente
fosse resolver a vida deles. (Cuidado)
A maior dificuldade é lidar com os pais mesmo. É um trabalho de
formiguinha. O pai chega entrega a bolsa da filha, que já tem 6 anos,
sugerindo que o professor guarde. Nós dizemos: fulana leve sua bolsa
102
lá na sala. Falamos isso durante o ano todo. Ela ainda dorme de fralda,
toma mamadeira e chupa chupeta. E mora bem pertinho da escola e vem
no colo. Ah não! (Firmeza)
O professor necessita de maturidade profissional para não entrar em um espaço
que não lhe cabe - o de mãe ou pai. Nenhum adulto quer ser apontado em reuniões e
conversas que, apenas, lhe contam como não está “dando conta” de seus filhos. Uma
reflexão coletiva sobre esse relacionamento é primordial em qualquer escola.
Às vezes, já estamos tão acostumados a criticar a família como causa dos fracassos
e insucessos das crianças que esquecemos que elas possuem problemas e que precisamos
acolhê-la. Experimentar abraçar essas famílias pode provocar uma ação talvez nunca
imaginada e sempre almejada: a escola e a família de mãos dadas no desenvolvimento
das crianças.
Essa relação família e escola abrange também outra dificuldade experimentada
pelas professoras: o ensino de regras e limites. Os professores dizem que os pais não
sabem mais educar seus filhos e que eles reproduzem a falta de respeito de casa na escola,
gritando e sendo agressivo com professores e colegas,
um aluno gritou em sala de aula e ele estava meio agressivo, se eu
chamasse o nome dele respondia: o que éééeéééé, gritando. E aí na hora
você fica: meu Deus e eu faço o que? Eu aumento minha voz para ele
entender? Ele está passando por algum problema? Será que em casa ele
é assim? Para ter limite, alguém tem que falar alto com ele?
(Criatividade)
Às vezes, em casa, eles não têm esse limite. Falam com os pais gritando
e com a gente quer falar também. Aí então eu digo: não é assim não,
fale baixinho. (Cuidado)
A dificuldade está em saber o que fazer nessas situações: enfrentar? Reprimir?
Ignorar? Esse é o momento para que o grupo dialogue a respeito de normas e regras
presentes na sociedade, presentes também na escola. É importante falar de disciplina e
discutir limites. A palavra “disciplina”, que tanto assusta os educadores infantis não pode
ser encarada de uma maneira pejorativa, uma vez que, automaticamente, quando
pensamos em disciplina na educação infantil pensamos em crianças robóticas e tristes que
não se movimentam.
Disciplina é importante para a constituição da criança enquanto sujeito que
respeita e sabe conviver com as regras de sua cultura. Por isso é importante desmistificar
103
essa palavra, compreendendo o seu real conceito. Nesse sentido, é fundamental esclarecer
que
A disciplina consiste num dispositivo e num conjunto de regras de
conduta destinadas a garantir diferentes atividades num lugar de ensino.
A disciplina não é um conceito negativo; ela permite, autoriza, facilita,
possibilita. A disciplina permite entrar na cultura da responsabilidade e
compreender que as nossas ações têm consequências. Quem olha para
a disciplina como algo negativo não entende o que é. Ser disciplinado
não é obedecer cegamente; é colocar a si próprio regras de conduta em
função de valores e objetivos que se quer alcançar (PARRAT-
DAYAN, 2008, p.8).
No entanto, devemos ter cuidado com os “professores castigadores”, que se
aproveitam do conceito distorcido da palavra disciplina para aplicar os seus castigos, que
hoje assumem menos um caráter de agressão física, porém não menos de violência, desde
os mais visíveis até os mais sutis (LUCKESI, 1999).
O apoio à formação docente deveria ser algo natural quando falamos de
professores, porque estamos discutindo sobre educação. No entanto, as professoras
relatam que esse apoio, na prática, não acompanha a oferta destacada pela mídia, de
cursos de formação contínua. Embora essa formação exista realmente, dois fatores não
permitem que ela se concretize de fato, a partir de uma matrícula. O primeiro diz respeito
à dupla jornada de trabalho das professoras, como desabafa a professora Criatividade,
eu não tenho tempo de fazer cursos de formação. Trabalho os dois
turnos. Saio de casa às 6 da manhã, chego às 6 da noite. Ir para um curso
e chegar às nove horas da noite é muito desgastante. (Criatividade)
O segundo, à falta de vagas e a oportunidade de cursá-las. Quando as vagas
surgem são poucas e sorteadas por toda a equipe, porque a escola não pode liberar muitas
professoras e fechar turmas (algo já comentado anteriormente na dificuldade sobre o
tempo para planejar; não oferecer um dia de aula é algo inconcebível). Então, geralmente,
só uma professora, de toda a escola, poderá se matricular.
Lamento não ter mais. Porque nós temos a dificuldade assim, quando
tem algum curso ele vem para ser sorteado por aquele professor que
está em sala de aula. Não existe a facilidade de tirar todo mundo e
mandar para a formação, não! Escolhe um professor para ver se
consegue alguém para substituir essa turma e evitar o máximo liberar a
turma né. (Conhecimento)
Não vem inscrições para gente em congressos, para formação. É muito
importante de se ir, mas não vem nenhuma. Quando vem é pago e às
vezes 150 reais e ainda ter que dispensar as crianças para podermos ir
104
.... Então tem toda uma dificuldade. Sabe aquele do Nei? Só veio uma
entrada para cada CMEI. (Humildade)
Infelizmente, a prática da formação contínua, tão pesquisada e incentivada na
academia, não se desenvolve como imaginamos no cotidiano das escolas. Uma solução
poderia ser um planejamento para essa formação: a entrada de uma coordenadora em sala
de aula, nos dias de formação, uma atividade diferenciada para os alunos, ministrada por
algum colega da equipe, enfim, como se trata de um grupo, todos poderiam se ajudar para
que pudessem desfrutar de oportunidades de formação, já que
a formação continuada de professores aparece como uma das dimensões
do processo formativo do professor, que poderá contribuir para que este
se mantenha sempre numa postura constante de construção e
reconstrução de seu próprio conhecimento, tendo em vista as rápidas e
profundas transformações ocorridas em todos os setores da vida
humana (VIEIRA, 2010, p.33).
A inadequação do espaço físico que as crianças e professores vivenciam na escola
é complexa. Duas turmas, com crianças de diferentes idades, dividem o mesmo espaço,
ao mesmo tempo. Isso mesmo. Essa escola sofreu denúncia de desabamento em seu local
de origem e necessitou de outro espaço provisório para acomodar as crianças.
Então, imaginem que uma turma com crianças de 3 e 4 anos convive com outra
de 4 e 5 anos, onde os interesses, atividades e rotina são bem diferentes. Cada grupo
possui uma professora, que se esforça para conseguir contar histórias, dialogar, realizar
atividades. Quando uma turma precisa de silêncio para escutar a orientação de uma
atividade, a outra está no momento de faz-de-conta, com muitas brincadeiras e
gargalhadas.
Essa realidade desestabiliza as professoras, que se esforçam para “dar conta” de
seus planejamentos, muitas vezes frustrados, por essa situação. A estratégia que
encontraram foi alternar o espaço da sala com combinação de horários, quando uma está
no parque, a outra realiza uma atividade de maior concentração em sala. Em alguns
momentos, as turmas se encontram, como no parque e nas brincadeiras,
está um absurdo a dificuldade de dois professores na mesma sala. É um
sacrifício. Mas era assim ou não se tinha o ano letivo, porque não havia
estrutura física para outro CMEI. (Conhecimento)
105
As duas turmas juntas isso eu acho que não é muito bom. Porque alunos
maiores com alunos menores, às vezes os maiores batem nos menores,
aí... É muito complicado. (Cuidado)
Às vezes eu faço a roda lá entre as minhas cadeiras, quando eu quero
fazer algo específico, porque é complicado. Eu tenho 13 alunos,
juntando com os da outra turma ficam 20, é muito barulho. Eu estou
rouca de tanto falar alto. Queria poder contar uma história só para os
meus alunos, fazer um trabalho mais efetivo, mas sempre uma turma
acaba atrapalhando a outra. (Criatividade)
Já a escassez de material é relatada até em tom de denúncia pelas docentes, pois
inviabiliza o desenvolvimento da maioria de suas atividades. Sabemos que embora o
Ensino Fundamental continue sendo a prioridade do ensino nacional, há um fundo que
respalda o financiamento da Educação Infantil, que pós- LDB (1996) foi incluída
integralmente no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB.
Portanto, é incompreensível a falta de materiais, pois existe verba para isso (pelo
menos, na “letra morta” da lei), sem contar que reconhecemos a importância da utilização
de um material pedagógico adequado às crianças no trabalho com as múltiplas linguagens,
por exemplo. Como pintar sem tinta? Como expor as produções escritas das crianças nas
paredes se a fita que vem para a escola não cola? Sua falta torna difícil a possibilidade de
recriar e ampliar o campo de experiências das crianças. Impede inclusive o
desenvolvimento da linguagem, que se constrói na interação com o objeto de
conhecimento.
Falta muito material. A gente às vezes quer fazer uma atividade
diferente, mas não tem material. E até a xerox mesmo, a gente tem que
fazer a atividade bem antes e esperar que diretora leve para a secretaria
para poder fazer as cópias. Isso é meio complicado. (Cuidado)
Material higiênico às vezes falta e até o professor traz de casa, tiram do
próprio bolso mesmo. Já trouxeram até TV para as crianças assistirem
a um DVD. (Humildade)
Eu já cancelei minha conta no armarinho perto de casa porque estava
enorme. A gente vai levando uma fita, um pincel, uma cartolina e
quando vê.... Poxa nosso salário já é baixo e a gente ainda tem que
comprar material para fazer algo significativo para as crianças? Eu acho
isso um absurdo, uma falta de respeito com a gente e com as crianças.
(Firmeza)
Compreendendo que as necessidades de formação podem se constituir a partir de
dificuldades vivenciadas/enfrentadas na prática escolar de professores, compreendemos
106
que as onze subcategorias comentadas anteriormente se articulam às necessidades
específicas de formação de professoras da Educação Infantil/Pré-escola no cuidado e
educação de crianças.
Pensando nessas necessidades como objetivos de formação, temos um quadro
semelhante ao anterior, que agora aponta em suas subcategorias possíveis conteúdos
programáticos para o desenvolvimento de nossa pesquisa-ação, como veremos a seguir.
4.2 NECESSIDADES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORAS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL/PRÉ-ESCOLA
Em reunião coletiva com o grupo de professoras, o quadro 2, resultado da análise
de dados realizado a partir das entrevistas semiestruturadas individuais e de quatro
observações iniciais, foi apresentado. Primeiramente, gostaríamos de saber se o quadro
realmente refletia a realidade de necessidades de formação daquelas docentes. Todas
disseram que sim e ficaram entusiasmadas com os primeiros resultados compartilhados.
Menina como é que você conseguiu fazer tudo isso? (Firmeza)
É tudo isso mesmo viu! Está direitinho... (Criatividade)
A apresentação dessa organização e análise de dados também permitiu que as
professoras olhassem a pesquisa com “bons olhos”, compreendendo o rigor e a qualidade
com que estava preocupada a formadora. Os dados demonstraram que aquela pesquisa
não era qualquer pesquisa, era de fato uma pesquisa que se preocupava com cada uma
delas, imprimindo confiança ao trabalho.
Em seguida, iríamos selecionar, junto às professoras, a necessidade de formação
mais relevante para constituir um objetivo para formação contínua.
107 Quadro 2 – Tema, categoria e subcategorias do Cuidado e Educação de crianças na Educação
Infantil/ Pré-escola.
4.3 A SELEÇÃO DA NECESSIDADE DE FORMAÇÃO: OBJETIVO PARA
FORMAÇÃO CONTÍNUA
A seleção da necessidade de formação, já foi pontuada brevemente durante o
subcapítulo 2.8, intitulado Planejamento da Pesquisa. Porém, aqui pretendemos tornar
mais claro como se deu esse processo de escolha.
A primeira dificuldade dessa ação consistiu em reunir o grupo de professoras
como um todo, já que possuem horários diferentes na instituição e já haviam participado
de uma entrevista coletiva anteriormente. Seria importante todo o grupo reunido nesse
momento, já que a escolha do objetivo de formação deveria contemplar o desejo e
interesse da maioria.
Inicialmente explicamos que não faríamos apenas uma indicação/seleção, mas sim
uma explanação sobre cada escolha apontada. Ou seja, não bastava apenas escolher um
objetivo, cada professora deveria justificar porque seria importante para ela e para a
instituição uma formação contínua que contemplasse sua escolha.
Duas das professoras apontaram o Ensino da Matemática, como objetivo para
formação. Outra docente, o trabalho com as Múltiplas Linguagens, especificamente com
a Música. Vejamos algumas falas que surgiram nesse momento:
TEMA CATEGORIA SUBCATEGORIA
2 Cuidado e Educação de
Crianças na Educação
Infantil/Pré-escola
2.1 Necessidades de Formação
de Professoras/Objetivos para
Formação Contínua
2.1.1.1 - Planejamento
2.1.1.2 - Linguagem Oral,
Leitura e Escrita
2.1.1.3 -Linguagem Matemática
2.1.1.4 -Pensamento Infantil
2.1.1.5- Múltiplas linguagens
2.1.1.6 -Atendimento
individualizado à criança
2.1.1.7 -Atendimento às crianças
com necessidades especiais
2.1.1.8 - Relação família x escola
2.1.1.9 -Regras e limites
2.1.1.10 -Formação docente
2.1.1.11- O espaço na Educação
Infantil
2.1.1.12- Escassez de materiais
108
Eu acho que em qualquer sala de aula que você entrar hoje, o bicho
papão é a Matemática (Firmeza)
Outra coisa que eu valorizo também é um professor de música, que traz
instrumentos. Não é aquela música que a gente canta só na roda não, é
aquela que estuda o dó, o ré, mi, fá, sol, lá, si... Acho que seria super
interessante. (Conhecimento)
Porém, pontuamos a frequência com que as palavras e questões relacionadas ao ensino
da leitura e da linguagem escrita foram recorrentes nas entrevistas e, além disso, proporcionamos
uma discussão sobre as observações inicias em cada turma (pensadas inicialmente para confirmar
a necessidade de formação escolhida).
A observação também é um instrumento de pesquisa que aponta que o trabalho com
necessidades de formação não é um simples levantamento de dados, é um processo de construção,
que necessita de um trabalho longo e atento do pesquisador, como Rodrigues e Esteves (1993, p.
22) apontam: “Por isso sugere-se que o formador apoie o formando na construção das suas
necessidades, mediante a criação de espaços favoráveis à consciencialização dos seus problemas,
dificuldades e interesses, ao longo da formação”
O trabalho com a Leitura e a Linguagem Escrita foi revelado como uma necessidade de
formação, mas no momento de escolha só duas professoras se posicionaram: uma a favor da
Matemática e a outra da Música.
Após a discussão sobre as observações muitas questões começaram a surgir, como já
reveladas anteriormente, nenhuma das professoras a selecionou como objetivo para formação
naquele momento. Isso revelou um certo conforto no desenvolvimento de práticas pedagógicas
com leitura e escrita.
Por que Língua Portuguesa, não é? Já está inserida em tudo... (Cuidado)
Leitura e Escrita a gente percebe que é hors concours, ela é muito o
foco principal. É como se as outras fossem coadjuvantes (Paciência)
Porém, as observações revelaram que haviam algumas fragilidades nas práticas
das professoras. O trabalho com letras isoladas, o dia de trabalhar a letra “O”, por
exemplo. A escassez de oportunidades para se escrever com significado. As atividades de
leitura se restringiam apenas ao momento de contação de história pelas professoras. Não
existia livros ao alcance das crianças. As atividades não apresentavam desafios para se
pensar sobre a escrita. Não havia referência de letras e/ou alfabeto no espaço da sala,
apenas crachás com os nomes das crianças, por isso quando as crianças tinham dúvida de
109
qual letra utilizar as professoras ditavam sem que ele pudesse consultar ou pensar sobre
a letra a ser registrada.
Essas situações, apenas iniciais, nos levaram a questionar se o trabalho com a
leitura e escrita estava mesmo estruturado na escola. Por isso ao escolherem a Matemática
como objetivo de formação, indaguei sobre esses equívocos encontrados. Nesse momento
a humildade da pesquisadora em se colocar no lugar de quem quer acrescentar foi de
fundamental importância. A formação a partir das necessidades de professores não é tão
fácil quanto parece, justamente, porque pode envolver o conceito de “falta”, como
apresentamos no capítulo anterior sobre a polissemia do termo “necessidade”. E ninguém
se sente confortável em escutar, do outro, o que está faltando em nós mesmos. Por isso
reafirmo que, construir uma formação a partir de necessidades de formação é um trabalho
que exige paciência, prudência, conhecimento e humildade.
Somos sinceras em dizer que estávamos preparadas para os sentimentos de defesa,
resistência e desconfiança virem à tona, mas fomos recebidas com ideias de aprovação ao
que compartilhávamos. Surgia naquele momento uma relação de confiança e então a
temática Leitura e Escrita foi escolhida pelo grupo, se constituindo como nosso objetivo
de formação contínua. O mais importante, como dizem Rodrigues e Esteves (1993, p. 23)
é que as professoras compreendessem que as necessidades de formação, no âmbito das
atividades de formação “ permite conhecer as necessidades dos indivíduos a formar,
visando satisfazer as suas lacunas, tornando o formando e os seus problemas e
dificuldades no verdadeiro centro do processo formativo”.
Vale salientar que a pesquisa, realizada em 2014, se baseou no Referencial
Curricular Nacional da Educação Infantil –RCNEI (BRASIL, 1998), documento mais
atual no momento que poderia subsidiar a prática das professoras, por possuir simples
linguagem e estrutura prática. Hoje, em 2016, a 2ª versão da Base Nacional Curricular
Comum – BNCC, mesmo ainda não publicada sua versão final, surge como a mesma
finalidade, de unificar o currículo nacional e orientar a prática do professor. O documento
atualizou esses termos, inserindo a nomenclatura “campos de experiência”, “direitos e
objetivos de aprendizagem” no lugar de “eixos de trabalho” e adotou os nomes “Escuta,
fala, linguagem e pensamento” para representar as vivências com leitura e escrita. Por
isso adotamos em nosso título as palavras Leitura e Escrita de crianças e não apenas
Leitura e Linguagem Escrita.
LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO
INFANTIL/PRÉ-ESCOLA:
CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS AO
PROFESSOR
112
5 LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA:
CONHECIMENTOS NECESSÁRIOS AO PROFESSOR
Preocupadas com as mais recentes estatísticas nacionais que divulgam o Brasil
como o país que possui a oitava maior população de analfabetos do mundo (Pnaid, 2012),
e reconhecendo a alfabetização e o letramento também como processos históricos e atos
político-culturais, este capítulo tem como objetivos fomentar o diálogo sobre a
alfabetização como prática emancipadora de liberdade e democratização em nossa
sociedade; além de discutir a possibilidade de alfabetizar letrando na educação infantil/
pré-escola, compreendendo como essas concepções podem se concretizar na prática.
Acreditamos que o conhecimento sobre o conjunto dessas questões pode oferecer suporte
consistente à uma prática alfabetizadora de qualidade com crianças pré-escolares.
Para isto recorremos às reflexões teóricas de Campelo (1996, 2001, 2013, 2015),
Ferreiro (2007, 2013), Ferreiro e Teberosky (1999), Soares (1996, 1999, 2003, 2009),
Paulo Freire (1967, 1996, 2005), Giroux (1990), Lerner (2002), Morais (2005, 2015),
Coutinho (2005), Soligo (2006), Gatti (2006), Vigotski (2007), Albuquerque (2007),
Santos e Albuquerque (2007), Arce e Martins (2007), Stemmer (2007), Mignolo (2008),
Brandão e Leal (2010), Leal e Silva (2010), Morais e Silva (2010), Albuquerque e Leite
(2010), Dourado (2011), Barbosa e Noronha (2014).
Conceituar alfabetização não é tarefa fácil por se tratar de um fenômeno
complexo, multifacetado (SOARES, 2003) determinado por fatores intra e extraescolares
(CAMPELO,1996). Num dos seus estudos sobre alfabetização, Soares (1999) destaca que
a mesma pode ser discutida nas dimensões individual e social e seus conceitos podem ser
vistos numa perspectiva restrita, ampla e também etimológica.
Etimologicamente, alfabetizar seria levar à aquisição do alfabeto e nesse conceito
não há nenhuma referência à compreensão e expressão nem à competência do sujeito para
os usos individuais/sociais de leitura/escrita. Certamente, houve épocas em que apenas o
conceito etimológico era suficiente.
Porém, a sociedade brasileira, tendo vivenciado grandes transformações
associadas ao processo de industrialização, redemocratização e urbanização necessitou
adequar-se à novas exigências sociais, acompanhando o desenvolvimento das Artes, da
Literatura e da Ciência. Nesse contexto a alfabetização ultrapassou o simples significado
de levar à aquisição do alfabeto.
113
Nos anos 1980, Emília Ferreiro e colaboradores, trouxeram uma verdadeira
revolução para a alfabetização quando apresentaram a psicogênese da língua escrita,
pesquisa que trata da origem do desenvolvimento das funções psicológicas que são
evoluídas no processo de aquisição da linguagem escrita. Campelo (2015) nos explica
que,
Da mesma forma que Vygotsky e Piaget, Emilia Ferreiro e Ana
Teberosky acreditam que para compreendermos um conhecimento, é
imprescindível que procuremos reconstruir a sua gênese. E foi o que
fizeram as autoras quando substituíram o ‘como se ensina? Pelo ‘como
se aprende?’, mudando, pois, a questão epistemológica básica das
pesquisas nessa área e, consequentemente, a perspectiva de onde era
olhada a alfabetização (CAMPELO, 2015, p.187).
Numa época em que as discussões sobre Educação eram pautadas apenas nos
métodos de ensino, Emília Ferreiro (1999) propôs dar voz ao sujeito da aprendizagem,
afirmando que ele pensa, formula hipóteses e, portanto, interage com o objeto do
conhecimento – a escrita.
O ensino a partir da memorização e reprodução com as cartilhas passava a não
fazer mais sentido. O sujeito deveria agora compreender a função social da escrita. Ele
deveria saber o que a escrita representa? Como ela representa? E como ele iria construir
formas de diferenciação dessas representações? Definitivamente, os exercícios repetitivos
não levariam os alunos à essas respostas.
Até os dias atuais, a psicogênese subsidia teoricamente a prática de muitos
professores alfabetizadores, que planejam suas aulas pensando no aluno como sujeito
cognoscente e não como mero receptor de métodos de ensino. Porém, vale salientar, que
com essa afirmação, não estamos condenando a utilização de métodos na alfabetização,
até porque segundo Soares (2003) “absurdo é não ter método na educação. Educação é,
por definição, um processo dirigido a objetivos”, nem ao menos sugerindo a volta aos
antigos métodos de alfabetização.
O que acreditamos é que existe um ajuste de domínio de práticas e métodos a
determinados contextos, além da capacidade de planejar sequências didáticas
relacionadas à reflexão sobre o funcionamento do sistema alfabético como um sistema
notacional e não como código. Pois para aprender a ler e a escrever não é preciso apenas
discriminar uma letra de outra, traçá-las de modo legível e decorar os sons a que elas se
referem. É preciso compreender as propriedades desse sistema notacional alfabético,
como ele funciona (SOARES, 2003; MORAIS, 2005).
114
Infelizmente, algumas práticas anteriores à essa descoberta epistemológica ainda
são vivenciadas nas escolas do país. As crianças, jovens e/ou adultos não são ensinados a
pensar sobre a escrita, apenas a reproduzi-la, como um sistema de códigos. Esse é um dos
motivos do fracasso escolar em nossas salas de alfabetização.
Diante dessa situação é que surge a necessidade de pensarmos sobre o uso social
da leitura e escrita. Por isso falamos no termo letramento, que segundo o material de
formação contínua para professores, o Pró-letramento (2008, p.11), constitui
o resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever, bem como
o resultado da ação de usar essas habilidades em práticas sociais, é o
estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como
consequência de ter-se apropriado da língua escrita e de ter-se inserido
num mundo organizado diferentemente: a cultura escrita”.
Nessa perspectiva, a possibilidade de alfabetizar letrando seria a prática mais
coerente nos dias atuais. Mas em que consiste essa prática? Segundo Santos e
Albuquerque (2007) para alfabetizar letrando devemos
oportunizar situações de aprendizagem da língua escrita nas quais o
aprendiz tenha acesso aos textos e a situações sociais de uso deles, mas
que seja levado a construir a compreensão acerca do funcionamento do
sistema de escrita alfabético (SANTOS, ALBUQUERQUE, 2007,
p.98)
Embora tenham sido vários os estudos acerca da relação letramento e
alfabetização, no contexto escolar, segundo Soares (1996, p.95) o letramento adquire “um
conceito restrito e fortemente controlado, nem sempre condizente com as habilidades de
leitura e escrita e as práticas sociais fora das paredes escolares”. Nesse sentido, para
autora, são frequentes os casos em que indivíduos “são capazes de comportamentos
escolares de letramento, mas são incapazes de lidar com os usos cotidianos da leitura e
da escrita em contextos não escolares”.
Para Soares (1996, p.37) quando alfabetizado e letrado, nem o indivíduo, nem a
sociedade continuam sendo os mesmos, pois a pessoa passa a ter uma outra condição
social e cultural, modificando seu modo de viver na sociedade, sua percepção em relação
ao meio sociocultural no qual está inserida, e a percepção que os outros indivíduos
possuem a seu respeito. Acrescenta ainda que,
a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna alfabetizada – e
que passa a fazer: uso da leitura e de escrita – que se torna letrada – é
115
diferente de uma pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou,
sabendo ler e escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é
alfabetizada, mas não é letrada, não vive no estado ou condição de
quem sabe ler e escrever e pratica a leitura e a escrita (SOARES, 1996,
p.36)
Cientes dos programas destinados a formação do professor alfabetizador
(PNAIC), das metas que contemplam a alfabetização em seu plano governamental (PNE)
e da qualidade de cursos como o Pacto , por exemplo, do reconhecimento de suas
qualidades e seriedade, nos questionamos por que o Brasil ainda possui a oitava maior
população de analfabetos do mundo, segundo pesquisa (Pnad) divulgada pela Unesco, em
2012?
Bem, os fatores são inúmeros, já que a alfabetização, como dizia SOARES (2003)
no início do texto é um fenômeno complexo e multifacetado. Porém pensamos que
mesmo com um bom programa de formação específica para alfabetização, a falta de
articulação com políticas de outras áreas dificulta o seu desenvolvimento.
Um exemplo típico dessa falta de articulação em sala de aula acontece quando
uma professora, mesmo com boa formação, planeja uma atividade pensada para o aluno
que, não frequenta a escola há uma semana porque sua mãe ou pai foram presos e ele,
temporariamente, está morando com os avós no interior do estado. Ou então, um grupo
de docentes participa do PNAIC mas quando volta para a escola, a equipe gestora não
abraça o projeto dificultando suas práticas. Ainda quando as crianças não conseguem se
concentrar nas atividades porque sentem fome. Dourado (2011, p.36) corrobora com
nossas ideias quando comenta que “historicamente, a ação governamental tem tido
centralidade nas políticas educacionais, sobretudo as ações e os programas sem
articulação com políticas mais amplas”. Isso prova que a alfabetização envolve múltiplos
fatores.
Para autoras como Gatti (2006, p.3) a formação dos professores dos cursos que
formam alfabetizadores também contribui para essas estatísticas e é questionável,
Ensinar a ler e escrever é um processo muito complexo. No entanto, os
cursos superiores não dão a atenção devida a esse processo. Eles
também não estão preparados para formar os alfabetizadores. Os
professores desses cursos não têm formação suficiente para formá-los.
Já para Barbosa e Noronha (2014, p. 111-112), especialmente quando se trata do
papel da escola, os desafios de fazer ler no Brasil são vários,
116
formação docente adequada, formação e contratação de bibliotecários,
condições de trabalho, envolvimento e valorização dos mediadores de
leitura parentais, valorização da leitura e do livro como objetos
culturais, acesso ao livro, espaços de leitura adequados, a biblioteca
escolar como espaço de convergência da comunidade com a escola, o
lugar da leitura no currículo escolar, além de um ideário de exclusão
social, que tem na leitura uma prática de privilégio.
O sujeito que lê e escreve se emancipa, quebra as correntes da submissão, fica
longe de ser acomodado, pois já não concebe injustiças, não permite ser diminuído, exige
participação nos fatos. Não é que, alfabetizado, ele se torne livre imediatamente, mas o
faz presente e atuante na luta a favor de sua própria história, na luta para que sua voz seja
ouvida (GIROUX, 1990), já que a alfabetização é um processo que irá permanecer por
toda sua vida, assim como a educação, é um “quefazer permanente” (FREIRE, 2005)
buscando enfim participar de uma sociedade democrática, dialógica.
Porém, Paulo Freire nos relembra o quanto nós somos “inexperientes
democráticos”. O Brasil, como país colonizado, nasceu e cresceu sem experiência de
diálogo (FREIRE, 1967). Jamais houve interesse algum na população, além de sua
exploração comercial,
Realmente, repita-se, com o tipo de exploração econômica que
caracterizou a nossa colonização, não teria sido possível a criação de
uma vivência comunitária. Tudo nos levava à dispersão com a
“propriedade sesmeira”. Não podíamos, dentro destas circunstâncias,
marchar para formas de vida democrática, que implicava num alto senso
de participação nos problemas comuns. Senso que se “instala” na
consciência do povo e se transforma em sabedoria democrática
(FREIRE, 1967, p. 71).
Infelizmente, muitas escolas ainda reproduzem as relações da época colonial.
Professor como detentor do conhecimento, aluno submisso, oprimido. Como alfabetizar
as crianças, os jovens e adultos superando essa história?
A educação problematizadora é a solução, torná-los desobedientes epistêmicos,
em busca de sua identidade política (MIGNOLO, 2008). Alfabetizar para que as letras
façam sentido ao aluno e que o auxiliem no movimento de construção de seu “SER
MAIS” (FREIRE, 2005). As práticas pedagógicas refletem quem é o sujeito que
queremos educar. Os professores necessitam refletir sobre o tipo de criança, jovem ou
adulto que estão formando em suas salas de aula, pois ensinar exige reflexão crítica sobre
a prática, exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo, exige
117
reconhecer que a educação é ideológica (FREIRE, 1996). Portanto, uma simples atividade
cotidiana no universo escolar, está imbuída de muito poder.
No ensino da leitura e escrita, os exercícios repetitivos, mecânicos e sem sentido
não consideram um sujeito que pensa e que reflete, portanto escondem alunos que não
conseguem se relacionar ativamente com a sociedade em que vivem. O ensino, nesse
sentido reproduz uma sociedade antidemocrática e a democracia, ressalta Freire (1967)
“antes de ser uma forma política, é uma forma de vida”, por isso se faz essencial.
A alfabetização assume caráter de movimento social, porque não apenas se resume
a compreender um sistema de representação, mas reivindica libertação social, estabelece
relações de poder. Livres da cegueira do analfabetismo, os indivíduos estão prontos para
serem conscientes do mundo, desalienados, participantes, dialógicos, construtores de
democracia. Iniciar esse trabalho com crianças é oferecer condições para que esses
desejos se construam no presente e se concretizem no futuro. Portanto, tentaremos
descobrir no subtítulo seguinte se é possível alfabetizar e letrar crianças na pré-escola e
como isso se efetivaria na prática.
5.1 LEITURA E ESCRITA NA PRÉ-ESCOLA: É POSSÍVEL? COMO?
As crianças necessitam ampliar seus contatos com a leitura e a escrita na Pré-
escola. Ensinar aos pequenos não é proibido na Educação Infantil. Arce e Martins (2007)
reiteram nossa afirmação na publicação do livro Quem tem medo de ensinar na educação
infantil? em defesa do ato de ensinar, esclarecendo que a criança está em processo de
construção e que necessita se apropriar do patrimônio da cultura humana para se
humanizar e tornar-se social. Para isso, o professor e a escola devem, a partir do saber
sistematizado, ensiná-la sobre esse patrimônio, portanto, o ensino não pode ser negado.
Ao contrário dos que muitos pensam, existem diversas possibilidades para
alfabetizar e letrar sob o ponto de vista das necessidades e interesses das crianças. Sobre
isso Vigotski (2007) afirma,
Não negamos a possibilidade de ensinar leitura e escrita às crianças em
idade pré-escolar; pelo contrário, achamos desejável que crianças mais
novas entrem para a escola, uma vez que já são capazes de ler e
escrever. No entanto, o ensino tem de ser organizado de forma que a
leitura e a escrita se tornem necessárias às crianças (Vigotski, 2007, p.
143).
E Emília Ferreiro, acrescenta,
118
O que proponho é substituir a pergunta centrada no ensino por outra
centrada na aprendizagem: deve-se permitir ou não que as crianças
aprendam sobre a língua escrita na pré-escola? Nesse caso, a resposta é
redondamente sim. [...]. Refiro-me aos quatro ou cinco anos – o que se
pode fazer aos quatro ou cinco anos? Dar condições para ter
experiências variadas com a língua escrita: escutar, ler, permitir
escrever, poder perguntar, descobrir as diferenças e as relações entre
imagem e texto [...]. Um ambiente em que se possa aprender, que não
proíba aprender, deve ter livros, deve deixar circular a informação sobre
a língua escrita, mas é evidente que o ambiente por si mesmo não é o
que alfabetiza. [...]. A simples presença do objeto não garante
conhecimento, mas a ausência do objeto garante desconhecimento
(FERREIRO 2001, p. 146, 147-148).
Morais (2015) também nos faz refletir criticamente sobre a construção dos novos
documentos curriculares nacionais, como a Base Nacional Comum Curricular, que não
considera o ensino da notação escrita e da linguagem que se usa ao escrever textos na
Educação Infantil, como se o mesmo fosse um ensino antecipado de alfabetização para
crianças menores de seis anos. Para o autor, devemos lutar contra as consequências de
propostas pedagógicas que,
Em nome do respeito à condição das crianças que frequentam
aquela etapa da educação básica, defendem, ardorosamente, que
na Educação Infantil os verbos ensinar e aprender estejam
proscritos e que também esteja proibido definir “conteúdos” de
ensino-aprendizagem. Em nosso entender, na prática, tais
propostas se prestam para manter o apartheid entre meninos e
meninas pobres e seus pares de classe média (MORAIS, p. 165-
166).
Morais (2015) ainda tece críticas a documentos como o Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998) e às Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil ou DCNEI (BRASIL-CNE,2009). Para o autor o
primeiro documento não assumia conteúdos de ensino e por isso, elucidou os termos
cuidar, educar, desenvolver e brincar, deixando a proposta para o ensino da linguagem
escrita, por exemplo, muito ampla, assumindo um caráter de “poder” e não de “dever”. E
as diretrizes percorreram na mesma linha “diluindo” a escrita entre as demais linguagens.
Situando a alfabetização na história, até os anos 60, no Brasil predominava a
concepção de “prontidão” para alfabetização, em que o aluno deveria estar maduro em
certas habilidades e, portanto, pronto, para aprender a ler e a escrever. Essas habilidades
119
consistiam em treino motor, memória visual e auditiva, atenção, concentração, entre
outros. Os exercícios eram “preparatórios”, repetitivos, vazios de significado, obrigando
as crianças a ficarem presas ao lápis e papel (BRANDÃO, LEAL, 2010).
O trabalho com a linguagem escrita assume atualmente diversos caminhos. Para
as autoras Brandão e Leal (2010), três caminhos são destacados: “a obrigação da
alfabetização”, “o letramento sem letras” e “ler e escrever com significado na educação
infantil”.
A obrigação da alfabetização está disseminada entre os que adotam um
aligeiramento nas práticas com a linguagem escrita. Pretendem que as crianças terminem
a Educação Infantil lendo e escrevendo. Mas para isso trabalham exaustivamente a
memorização de som e grafia. A diferença para a concepção anterior (de prontidão) é que
trabalham com letras e palavras para treinar as questões perceptuais e motoras, e não com
formas e/ou figuras. Porém, esse trabalho com letras parte do reconhecimento das vogais,
depois das consoantes e, em seguida, das famílias silábicas. Aqui predomina a ideia da
alfabetização como um código, aprendido mecanicamente e não como um sistema de
representação. “Isto é, concebemos, erroneamente, que a tarefa do aprendiz consistiria em
‘dominar um código’ e subestimamos a fascinante empreitada cognitiva que ele terá que
assumir” (MORAIS, 2005, P. 37-38).
O letramento sem letras destaca a importância dada às outras linguagens da
Educação Infantil (musical, plástica, etc) e o disfarce, diríamos quase que um
“esquecimento” da linguagem escrita no trabalho com as crianças. Mas como assim?
Nesta concepção a alfabetização é vista como um conteúdo escolar e, portanto,
proibida na Educação Infantil. Não se trabalha com letras, palavras, muito menos com
produção de textos que se encontram em nossa sociedade. O equívoco perpassa pela
definição de escola como espaço rígido, sem criatividade, que forma crianças passivas,
que não pensam. Quando as crianças se interessam pela aprendizagem das letras, os
professores não estão preparados e ficam sem saber o que ensinar. O que deve ser feito
para esclarecer esses docentes é desmistificar e especificar de que escola e alfabetização
nós estamos conversando.
O terceiro caminho ler e escrever com significado na Educação Infantil se difere
dos dois anteriores pois não pretende obrigar as crianças a se alfabetizarem na Educação
Infantil nem tampouco quer excluir os textos, palavras e letras da vida das crianças. Esse
caminho se inspira nas ideias de Ferreiro e Teberosky sobre alfabetização.
Para Ferreiro (2007) é possível que as crianças vivenciem momentos de
aproximação com a leitura e a escrita. De que maneira? Observando a professora lendo e
120
escrevendo, diferenciando desenho de escrita, explorando o espaço gráfico, copiando ou
construindo uma escrita, lendo textos produzidos pela turma, como bilhetes, convites...
Antes mesmo de estarem alfabetizados, as autoras descobriram que as crianças
pensam sobre a escrita, por isso elaboram hipóteses sobre o funcionamento desse sistema.
Nesse processo de aquisição do objeto do conhecimento Ferreiro (1999) acredita que o
alfabetizando vivencia três grandes períodos, enfrentando e superando conflitos
cognitivos. Campelo (2015) especifica esses períodos,
“1º período: distinção entre a representação icônica e não-icônica;
constituição das cadeias de letras como objetos-substitutos; 2º período:
construção de modos de diferenciação: intrafigurais ou intra-
relacionais; e interfigurais ou inter-relacionais; 3º período: fonetização
da escrita” (CAMPELO, 2015, p.198).
Para as autoras, esses períodos não constituem “fases ou etapas” de escrita em que
as crianças pulam de uma para outra, compreendendo esse desenvolvimento como um
processo, fruto de muito esforço da criança.
Por isso, quando as crianças perguntam qual a letra para escrever tal palavra ou
som, não podemos nos ancorar na concepção do letramento sem letras, pois não podemos,
nem temos o direito, de esconder ou evitar a leitura e a escrita dos pequenos. É impossível
que este tema não se faça presente no cotidiano das crianças menores de sete anos, seja
em quaisquer circunstâncias, mas com muito mais ênfase nas escolas onde o mundo
letrado é excessivamente presente (STEMMER, 2007).
Devemos lembrar que além de injusta e inaceitável, essa é uma ação difícil de se
realizar em nosso cotidiano escolar pois as crianças “são ativas por natureza, não se trata
de motivá-las para que o sejam. O que desmotiva, o que dificulta a aprendizagem, é
impedir esses processos de organização da informação” (FERREIRO, 2007, p. 31), como
ainda fazem alguns professores, a maioria por falta de desconhecimento, queremos
acreditar.
E como alfabetizar e letrar sem parecer adiantar ou acelerar conhecimentos aos
pequenos? O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI,
composto por três volumes, parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais –
PCN’s, elaborados pelo Ministério da Educação, aponta seis objetivos para garantir o
trabalho com a Linguagem Oral e Escrita com crianças de quatro a seis anos, os
profissionais da educação infantil deverão ensejar práticas que permitam que seus alunos
sejam capazes de:
121
• ampliar gradativamente suas possibilidades de comunicação e expressão, interessando-
se por conhecer vários gêneros orais e escritos e participando de diversas situações de
intercâmbio social nas quais possa contar suas vivências, ouvir as de outras pessoas,
elaborar e responder perguntas;
• familiarizar-se com a escrita por meio do manuseio de livros, revistas e outros
portadores de texto e da vivência de diversas situações nas quais seu uso se faça
necessário;
• escutar textos lidos, apreciando a leitura feita pelo professor;
• interessar-se por escrever palavras e textos ainda que não deforma convencional;
• reconhecer seu nome escrito, sabendo identificá-lo nas diversas situações do cotidiano;
• escolher os livros para ler e apreciar (BRASIL, p. 131)
Considerando as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(BRASIL, 2010), evidenciadas pelo caráter prescritivo normativo de que se reveste
(diferentemente do RCNEI), as crianças deverão aprender a ler e a escrever a partir de
interações e brincadeiras, pois estes surgem como eixos norteadores das práticas
pedagógicas da Educação Infantil. Será brincando com seus pares que as crianças
participarão de uma cultura de leitura e escrita.
E ainda, em momentos de fruição literária, como revelam os textos introdutórios
relacionados à Educação Infantil, da Base Nacional Comum3. Este documento apresenta
campos de experiências e não conteúdos (como o RCNEI), para a pequena infância e
destaca a importância da aquisição e domínio da linguagem verbal, a partir da escuta, fala,
pensamento e imaginação. Essas aprendizagens poderão ser garantidas na vivência com
outras crianças, nas rodas de conversa, nos jogos de palavras, na exploração de parlendas,
rimas, canções.
Convivendo com a escrita, as crianças podem ler, refletir sobre a língua e até
produzir textos. Na leitura, além dos momentos de contação de histórias, dialogando
antes e/ou depois de serem contadas (analisando estratégias de leitura), a exploração de
outros gêneros textuais será significativa: a leitura e a escrita de uma poesia, um convite
de aniversário do amigo ou até mesmo da própria escola, convidando para algum evento
coletivo, um e-mail, uma cartinha, uma lista de ingredientes para fazer o lanche do dia.
3 Documento que propõe uma base nacional curricular comum. Formulado pelo Ministério da
Educação (MEC) em parceria com professores formadores, pesquisadores e representantes de
associações como União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e a
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped). Ainda se encontra em
fase de construção. A apresentação de sua versão final está prevista para junho de 2016.
122
“Os alunos devem ver na leitura algo interessante e desafiador, uma conquista capaz de
dar autonomia e independência. E devem estar confiantes, condição para enfrentar o
desafio e ‘aprender fazendo’” (SOLIGO, 2006, p.6). São essas experiências, e não a
obrigação, que proporcionam o ensino na educação infantil. Ensinar assim não é
proibido.
Na produção de textos, uma narrativa contando sobre o último passeio escolar
feito ao zoológico da cidade ou até sobre as férias. Nas rodas inicias das salas de educação
infantil, todas as crianças estão ávidas para contar o que fizeram em seus finais de semana.
Essa é uma ótima oportunidade para a escrita, a vontade e o desejo de socializar novidades
torna necessária, a vontade de escrever.
Mas como ler e escrever sem saber ler e escrever? Brincando de ler e escrever.
Leal e Silva (2010, p. 60) acreditam que na brincadeira “as crianças vivenciam situações
em que imitam o mundo adulto, e consequentemente, aprendem sobre a sociedade, sobre
as relações sociais e sobre o papel da linguagem nas variadas situações”.
Um bilhete pedindo silêncio para a turma ao lado, que está fazendo muito barulho
na hora da contação de histórias. Uma lista de adereços para uma festa de carnaval na
escola. Um cartão desejando Feliz dia dos Pais! Uma brincadeira de faz de conta.
Qualquer situação que esteja intimamente ligada à realidade, que faça sentido na
sociedade e na vida das crianças. Nada de famílias silábicas ou de escola sem textos.
Leitura e escrita com sentido, ampliando suas experiências de letramento.
Sobre a reflexão sobre a língua, Brandão e Leal (2010, p.23) pensam que “desde
cedo as crianças brincam com a sonoridade das palavras, aprendendo a manipular
unidades linguísticas” e que a partir das brincadeiras “podem começar a reconhecer
regularidades nas relações entre unidades sonoras e unidades gráficas” (BRANDÃO,
LEAL, 2010, p. 23).
Ainda para essas autoras, dois eixos de trabalho deverão nortear as estratégias de
trabalho com a escrita na Educação Infantil. O primeiro é a apropriação do sistema
alfabético de escrita, planejando atividades que promovam a compreensão do sistema de
escrita alfabético e o desenvolvimento da consciência fonológica, que consiste na
“capacidade de refletir conscientemente sobre as unidades sonoras da língua e de
manipulá-las de modo deliberado” segundo Gombert, 1990; Goigoux; Cèbe, Paor, 2004;
Freitas, 2004; Morais, 2006 (apud Morais e Silva, 2010, p. 74). E nesse trabalho, as
atividades realizadas no nível da palavra (composição e decomposição das palavras em
sílabas e letras, comparação de palavras quanto à presença de sílabas e letras iguais) e as
de análise fonológica são fundamentais.
123
O segundo é o letramento – organizando atividades que promovam aprendizagens
sobre diferentes gêneros discursivos orais e escritos que circulam socialmente e suas
características (finalidades, conteúdos, estilo e composição próprios, suportes,
destinatários e esferas de circulação). Destacando que esses dois eixos devem sempre
andar juntos na Educação Infantil.
Além disso, na prática de formação de leitores, a seleção de acervo de qualidade,
o desenvolvimento de projetos, a utilização da biblioteca escolar, o acesso e a valorização
ao livro são fundamentais para a construção de uma cultura leitora.
As atividades podem promover práticas de leitura e escrita significativas e
semelhantes às vivenciadas no contexto extraescolar, escrita e leitura pelas próprias
crianças, jogos que vivenciem a análise fonológica de palavras, pois para Morais e Silva
(2010, p.78) “as crianças pequenas gostam de brincar com as palavras e de envolver-se
em tarefas lúdicas que exploram, por exemplo rimas e aliterações”. Experiências que
estimulem os segmentos sonoros que estão no interior das palavras, brincadeiras que
agucem a identificação e escrita de letras e o reconhecimento global de certas palavras,
que estimulam a discriminação perceptual e coordenação viso motora.
Ser conhecedor das teorias e planejar práticas que promovam a vivência e a
interação das crianças com a leitura e a linguagem escrita, é possível e necessário. O
professor deve promover situações em que as crianças sintam necessidade de ler e
escrever pois segundo Soligo (2006, p.6) “uma prática de leitura que não desperte nem
cultive o desejo de ler não é uma prática pedagógica eficiente”. E ainda, para Coutinho
(2005, p.49) “para aprender a escrever é fundamental que o aluno tenha muitas
oportunidades de fazê-lo, mesmo antes de saber grafar corretamente as palavras: quanto
mais fizer isso, mais aprenderá sobre o funcionamento da escrita”. A escrita deve ser
ensinada não como habilidade motora, mas sim como uma atividade cultural complexa
(VIGOTSKI, 2007).
Com a difusão sobre a psicogênese da língua escrita no Brasil, os professores
passaram a conhecer os níveis de aquisição da escrita e aprenderam como avaliar seus
alunos. Isso é fundamental, mas não é suficiente para o desenvolvimento de um trabalho
pedagógico de alfabetização. Os professores devem principalmente garantir que as
crianças compreendam esse sistema de notação alfabética, como ele funciona. Elas devem
entender que:
1) que se escreve com letras, que as letras não podem ser inventadas,
que para notar as palavras de uma língua existe um repertório finito (26,
124
no caso do português); que letras, números e outros símbolos são
diferentes;
2) que as letras têm formatos fixos (isto é, embora p, q, b e d tenham o
mesmo formato, a posição não pode variar, senão a letra muda); mas,
também que uma mesma letra tem formatos variados (p é também P, P,
p, P, p, etc.), sem que elas, as letras, se confundam;
3) quais combinações de letras estão permitidas na língua (quais podem
vir juntas) e que posição elas podem ocupar nas palavras (por exemplo,
Q vem sempre junto de U e não existe palavra terminando com QU em
português);
4) que as letras têm valores sonoros fixos, convencionalizados, mas
várias letras têm mais de um valor sonoro (a letra O vale por /ó/, /õ/, /ô/
e /u/, por exemplo) e, por outro lado, alguns sons são notados por letras
diferentes (o som /s/ em português se escreve com S, C, SS, Ç, X, Z,
SC, SÇ, etc) (MORAIS, 2005, p.42).
Ou seja, toda essa compreensão é conceitual e complexa. Por isso, é necessário o
desenvolvimento de um trabalho sistemático e diário que leve os alunos a refletir sobre
essas propriedades do sistema notacional alfabético.
Para finalizar as discussões sobre alfabetização nesse capítulo, apresentamos os
sete desafios que Lerner (2002) pensou sobre a docência da leitura e escrita na escola.
Acreditamos que eles resumem todas as ideias imbuídas no ato de alfabetizar letrando,
até aquelas que estão além das letras. São eles:
O desafio é formar praticantes da leitura e da escrita e não apenas
sujeitos que possam "decifrar" o sistema de escrita, formar leitores que
saberão escolher o material para buscar a solução de problemas que
devem enfrentar e não alunos capazes apenas de oralizar um texto
selecionado por outro. É formar seres humanos críticos, capazes de ler
entrelinhas e de assumir uma posição própria frente a apresentada pelos
autores dos textos.
O desafio é formar pessoas desejosas de embrenhar-se em outros
mundos possíveis que a literatura oferece, dispostas a identificar-se
como semelhante ou a solidarizar-se com o diferente, capazes de
apreciar a qualidade literária.
O desafio é conseguir que os alunos cheguem a ser produtores de língua
escrita, conscientes da importância de emitir certo tipo de mensagem a
125
determinado tipo de situação social. É conseguir que as crianças
manejem com eficácia os diferentes escritos que circulam na sociedade.
O desafio é conseguir que a escrita deixe de ser na escola somente um
objeto de avaliação, para se constituir em objeto de ensino; é tornar
possível que todos os alunos se apropriem da escrita e a ponham em
prática, sabendo que é um processo constituído por operações de
planejamento, textualização e revisão.
O desafio é promover a descoberta e a utilização da escrita como
instrumento de reflexão sobre o próprio pensamento, como recurso
insubstituível para organizar e reorganizar o próprio conhecimento.
O desafio é, em suma, combater a discriminação que a escola opera
não só quando cria o fracasso escolar daqueles que não conseguem
alfabetizar, como também quando impede aos outros - os que
aparentemente não fracassam chegar a ser leitores e produtores de
textos competentes e autônomos.
O desafio é, combater a discriminação desde o interior da escola; é unir
esforços para alfabetizar todos os alunos para que tenham
oportunidades de se apropriar da leitura e da escrita como ferramenta
de progresso cognoscitivo e de crescimento pessoal (LERNER, 2002,
p.27-29)
A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE
PROFESSORAS A PARTIR DE SUAS
NECESSIDADES DE FORMAÇÃO
127
6 A FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORAS A PARTIR DE SUAS
NECESSIDADES DE FORMAÇÃO
Após a apresentação de nosso percurso metodológico, da discussão dos eixos
teóricos que sustentam nosso trabalho, das necessidades de formação apreendidas e de
nossa escolha como objetivo de formação, chegamos ao objetivo desse trabalho:
construir, junto aos professores da Educação Infantil/ Pré-Escola, conhecimentos para
uma formação contínua, que contemple as práticas pedagógicas de leitura e escrita com
crianças, a partir de suas necessidades de formação. Afim de comprovar a tese que uma
formação contínua para professores da Educação Infantil/Pré-Escola, que considere as
suas necessidades de formação, contribui na superação de dificuldades encontradas nas
práticas pedagógicas de leitura e escrita com crianças
A formação contínua planejada a partir das necessidades de formação das
professoras de Educação Infantil/Pré-escola foi intitulada de Ação didático-pedagógica
para construção de práticas de leitura e escrita na educação infantil/pré-escola, título do
próximo subcapítulo 6.1, que se segue.
6.1 AÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA PARA CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS DE
LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA
Da análise cuidadosa dos dados, emergiram tema, categorias e subcategorias
referentes à ação de formação contínua, organizadas a partir do quadro abaixo. Vejamos.
Quadro 3 - Categorias e Subcategorias da ação didático-pedagógica para construção de
práticas de leitura e escrita na Educação Infantil/Pré-escola
TEMA CATEGORIAS SUBCATEGORIAS
3 Ação didático-
pedagógica para
construção de práticas de
leitura e escrita na
Educação Infantil/Pré-
escola
3.1Conteúdo
Programático
3.1.1 Concepções de criança,
infância e cultura
3.1.2 Planejamento na Educação
Infantil/Pré-escola
3.1.3 Construção/elaboração de
atividades escolares
3.1.4 Alfabetização e Letramento
3.1.5 Psicogênese da Língua Escrita
3.1.6 O ensino da leitura
3.1.7 Produção de Textos
Fonte: a autora
128
A primeira categoria por nós considerada apresenta o conteúdo programático
dessa ação didático-pedagógica. Como conteúdos temos, portanto, as seguintes
subcategorias:
3.1.1 Concepções de criança, infância e cultura
3.1.2 Planejamento na Educação Infantil/Pré-escola
3.1.1.3 Construção/elaboração de atividades escolares
3.1.4 Alfabetização e Letramento
3.1.5 Psicogênese da Língua Escrita
3.1.6 O ensino da leitura
3.1.7 Produção de Textos
A primeira subcategoria que emerge de nossos dados 3.1.1 Concepções de
criança, infância e cultura aponta que as ações didáticas de cada professora ou professor
de Educação Infantil estão intrinsecamente relacionadas às concepções de criança,
infância e cultura que possuem. Como conceitos norteadores da prática docente,
acreditamos que momentos para discussão e reflexão sobre os mesmos devem ser
valorizados nas instituições de infância.
As Diretrizes Nacionais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(DCNEI), documento de caráter mandatório, publicadas em 2010 pelo Ministério da
Educação (MEC) definem a criança como,
Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas
cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva,
brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra,
questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo
cultura (BRASIL, p.12, 2010)
Já a Infância, para Kramer (2007) é entendida,
por um lado, como categoria social e como categoria da história
humana, englobando aspectos que afetam também o que temos
chamado adolescência ou juventude. Por outro lado, a infância é
entendida como período da história de cada um, que se estende, na
nossa sociedade, do nascimento até aproximadamente dez anos de idade
(KRAMER, 2007, p.13)
129
A partir do século XX, diversas transformações tecnológicas, científicas, éticas e
sociais interferiram no modo como a criança é concebida. Considerada sujeito de
socialização, de conhecimento e de criatividade, quebrando os conceitos de criança como
vítima, inocente, adulto em potencial ou adulto em espera, ela passa a ter a sua infância
reencontrada, cheia de sentimento, intuição, linguagens, lógica e corpo. Logo, as
instituições educacionais passaram a se configurar como espaços disseminadores e
organizadores de cultura, que permitem a construção da criança como ser social
(CAMPOS, 2012).
O texto de Sônia Kramer “A Infância e sua singularidade” de 2007, foi utilizado
texto aporte, afim de movimentar essa temática. Realizamos uma leitura compartilhada
do texto, abrindo espaço para o diálogo, na medida em que as dúvidas surgissem. Alguns
questionamentos foram apontados ao grupo, como uma maneira de motivar a discussão e
provocar reflexão. Não gostaríamos apenas de indagar os conceitos de criança, infância e
cultura, isoladamente, às professoras, gostaríamos de discuti-los de maneira
contextualizada, refletindo sobre a relação dos mesmos com a prática escolar de cada
professora.
Por isso, a leitura de Kramer (2007) foi fundamental. A autora suscita a articulação
desses conceitos com inúmeras ideias e questões, tais como: quem são as crianças e como
a sociedade as percebem, baseada na visão que é construída social e historicamente; sobre
o papel da infância na sociedade atual; o trabalho docente baseado no respeito às origens
de cada criança, dada a heterogeneidade/diversidade das populações infantis e as
contradições da sociedade; as especificidades e singularidades da infância: imaginação,
fantasia, criação, brincadeira como cultura, criança produtora dessa cultura, sujeito de
direitos; a cultura como elemento articulador entre educação infantil e ensino
fundamental; a escola como espaço de formação cultural, dentre outros.
Para orientar o grupo, imerso em tantas ideias, duas questões motivadoras foram
lançadas inicialmente. A primeira: de que infância nós estamos falando, já que “numa
sociedade desigual, as crianças desempenham, nos diversos contextos, papéis diferentes”
(Kramer, 2007, p.14)? E a segunda: como assegurar que a educação cumpra seu papel
social diante da heterogeneidade das populações infantis e das contradições da sociedade?
Ao iniciar pela primeira questão, temos conhecimento da infância da criança
protegida e a infância da criança desprotegida. A da que tem acesso diário à violência e a
da que só a presencia na televisão. A da que possui condição econômica favorável e a da
que não possui. São diversas as condições de infâncias que presenciamos atualmente e as
130
professoras têm conhecimento dessa diversidade quando falam sobre os alunos que
frequentam o CMEI,
Tem crianças aqui que o pai tem carro, eles têm Tv fechada, assistem
os desenhos do Discovery Kids (Firmeza)
Tem alguns que são carentes mesmo (Criatividade)
Aqui é bem variado, mas é mais classe média, por causa do nosso bairro.
Mas vem muitos de uma favela aqui perto (Humildade)
Tem uma criança aqui que o pai foi assassinado na frente dele. A gente
fica sem saber como agir. (Cuidado)
As docentes apontam a preocupação que possuem com os seus alunos que, apenas
com quatro ou cinco anos de idade, enfrentam situações difíceis em seu dia a dia. De
como são marcados por esse contexto violento e que a escola, muitas vezes, se torna o
“único local INFANTIL, onde ele pode ser criança” (Criatividade).
A partir da fala da professora Criatividade, refletimos sobre as concepções que
cada uma possui sobre criança, sobre infância. O que é ser infantil, o que é infância? O
que é ser criança? O que é uma criança pré-escolar? De qual infância nossos alunos fazem
parte? Será que todas são apenas seres ingênuos, dependentes e inocentes? As professoras
se posicionam:
Criança é um ser pensante, que já tem toda a sua bagagem de uma vida
tão curta. Então é um ser totalmente em transformação que está
raciocinando e muitas vezes a gente subestima né? (Humildade)
A criança pré-escolar é aquela que possui entre 4 e 5 anos, que possui a
sua vivência, sua realidade familiar, que gosta de brincar (Criatividade)
Infância é uma fase do desenvolvimento humano. E criança um ser,
sujeito de direitos, que está buscando conhecer esse mundo, se apropriar
dele (Paciência)
Compreendo a infância como período da história de cada um (singular),
a história de cada “UM” que nem sempre é humana. Infelizmente, digo
isso com propriedade e muita tristeza [...] já morei em favela. É um
direito da criança, que está sendo tolhido dela (Firmeza)
Infância é aquilo que as crianças brincam. Se elas não brincarem estão
roubando a sua infância e elas ficam adultos logo cedo, perdendo o que
há de melhor, que é a infância, que todos têm direito. No que eu entendi
é que tem várias formas de infância (Cuidado)
O grupo chega à conclusão que a infância não é igual para todas as crianças e
revela situações particulares de seus alunos. Nesse momento tenta relacionar a
131
heterogeneidade de suas turmas com as atividades propostas, refletindo porque agem de
maneiras tão diferentes. Destacaram que o professor deve ter o olhar sensível para essas
diferenças, pois enquanto uma aluna desenhava seu final de semana em casa brincando,
outro
desenhou uma pessoa com facas. Aí eu fiquei preocupada. Chamei ele
num cantinho, sozinha e perguntei: o que aconteceu? Criança brincando
com facas... É tão perigoso... Aí ele: mas o meu tio tem uma arma. A
polícia esteve lá em casa esse final de semana e levou ele preso
(Firmeza)
A professora Firmeza relatou que esse aluno passou a semana inteira agressivo,
batendo nos colegas, se recusando a realizar as atividades propostas, mas que através de
seu desenho ela pôde constatar que a infância daquele menino era bem diferente das
outras crianças de sua turma e por isso, adotou uma estratégia de compreensão e respeito
à sua situação.
Esse aluno sempre chegava com sono na sala. A diretora me disse que
um dia passando pela BR, já de meia noite, viu a mãe dele e ele na
parada. Então como ele ia chegar cedo na escola na manhã seguinte?
Com muito sono como sempre. Essa mãe tem muitos problemas e ele
não possui rotina alguma. Então como criar uma rotina para ele na
escola? É muito difícil. É constante você olhar para ele... na hora da
saída, ele bota a mochila ali e arreia na mochila (dorme) (Firmeza)
Por isso, procuro ter sempre um olhar sensível aos problemas familiares
dos meus alunos e acredito que eles influenciam diretamente na nossa
prática. Eu tenho aluna por exemplo que mora em um único cômodo
com a mãe, não tem pai... É complicado (Firmeza)
Esses comentários encaminharam a segunda questão proposta: como assegurar
que a educação cumpra seu papel social diante da heterogeneidade das populações
infantis e das contradições da sociedade? A resposta é simples, mas complexa: o professor
necessita atuar considerando essa diversidade, sugere Kramer (2007). Se torna complexa
porque ainda nos assustamos com o tamanho das contradições da sociedade. A violência
é uma delas e faz parte da vida das crianças pequenas.
Por isso, as docentes adotam estratégias para enfrentar essa diversidade. A
professora (Criatividade) acredita que,
Enquanto escola devemos garantir o direito dessas crianças de serem
criança, de viver a infância e brincar, e também trazer a oportunidade
de conhecer novas coisas que muitos não têm acesso em casa, como
uma motoca, um parque, por exemplo (Criatividade)
132
A Base Nacional Curricular Comum, fundamentada nas Diretrizes Curriculares
Nacionais, garante a ideia de respeito à diversidade em sua segunda versão, pois apresenta
os direitos de aprendizagem e desenvolvimento, que se sustentam em relação aos
princípios éticos, definindo que crianças, adolescentes, jovens e adultos, sujeitos da
Educação Básica possuem o direito:
ao respeito e ao acolhimento na sua diversidade, sem preconceitos de
origem, etnia, gênero, orientação sexual, idade, convicção religiosa ou
quaisquer outras formas de discriminação, bem como terem valorizados
seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, reconhecendo-se
como parte de uma coletividade com a qual devem se comprometer
(BRASIL, 2016)
O texto também ressaltou as ideias do autor Walter Benjamim (1984 apud Kramer,
2007, p.16) sobre o “ser criança” e propôs quatro eixos para essa discussão:
1º A criança cria cultura, brinca e nisso reside sua singularidade;
2º A criança é colecionadora, dá sentido ao mundo, produz história;
3º A criança subverte a ordem e estabelece uma relação crítica com a tradição;
4º A criança pertence a uma classe social.
Implícita à compreensão da criança como produtora de cultura, existe a visão da
criança como ser ativo, que brinca, aprende e que por isso também produz. Conscientes
dessa premissa, os professores de Educação Infantil deverão planejar suas aulas afim de
garantir o espaço necessário para essa brincadeira e criação. É fácil dizer que acreditamos
em uma criança que pensa e é criativa, mas a nossa prática reflete nosso pensamento?
Oportunizamos momentos de produção de cultura em nossa escola? E de momentos de
brincadeiras?
A professora Firmeza sentiu necessidade de destacar o seguinte trecho da leitura
para discutir o que pensa sobre isso:
“Elas reconstroem das ruínas; refazem dos pedaços. Interessadas em
brinquedos e bonecas, atraídas por conto de fadas, mitos, lendas,
querendo aprender e criar, as crianças estão mais próximas do artista,
do colecionador e do mágico, do que dos pedagogos bem-intencionados
(Benjamin,1984, p.14 apud Kramer, 2007, p.16)” (Trecho destacado
por Firmeza)
133
Firmeza registra em seu diário:
Como vi o CMEI nesse trecho, os meus alunos construindo em ruínas e
refazendo pedaços literalmente de brinquedos quebrados e eu, uma
pedagoga bem-intencionada, me vestindo de Pintinho Amarelinho,
Dona Baratinha e levando para eles um pouco de mágica (Firmeza)
Refletir sobre essas questões permite o professor avaliar sua prática, como fez
Firmeza, ao acreditar que não oportunizava esses momentos aos seus alunos e resgatar na
memória uma vivência teatral, que nem pensava ser tão valorosa naquele momento.
Além disso, compreender a brincadeira como oportunizadora de aprendizagem e
como possibilidade de conhecimento, é o primeiro passo para se garantir o planejamento
temporal, material e espacial para essas vivências. As crianças brincam para conhecer o
mundo e se conhecerem também. Criam suas fantasias, imaginam e, nisso reside a sua
capacidade de superar as contradições e diversidades que vivenciam socialmente.
Eu observo, principalmente na turma do nível III, crianças de 4 e 5 anos,
é a ansiedade por brincadeira. Então isso vem ratificar a importância do
brincar em todas as atividades. É o lúdico! Se eles não percebem a
ludicidade eles dispersam, isso aí é muito forte que eu sinto. A
necessidade do brincar (Conhecimento).
Eles pensam muito em brincar, como ela disse, mais do que fazer a
atividade (Cuidado)
Ele faz a atividade se tiver o lúdico estampado, não é? E não lá no final
como um prêmio, se fizer brinca! (Conhecimento)
A brincadeira permite que a criança esteja em contato com sentimentos diversos
de frustração, motivação, alegria, tristeza e essa experiência com as próprias emoções é
o que as auxilia a se constituir como sujeito, na construção de sua personalidade
(VYGOTSKY, 2007). Por isso, não podemos pensar em uma escola da infância que não
priorize a brincadeira, até porque, segundo a BNCC, ela é um dos seis principais direitos
de aprendizagem que devem ser garantidos na Educação Infantil, juntamente ao
conviver, participar, explorar, expressar e conhecer-se (BRASIL, 2016). Vejamos:
Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e
tempos, com diferentes parceiros, adultos e crianças, ampliando e
diversificando as culturas infantis, seus conhecimentos, sua
imaginação, sua criatividade, suas experiências emocionais, corporais,
sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais (BRASIL,
2016, p. 62)
134
Inicialmente discutir os conceitos de criança e infância pareceu enfadonho e sem
significado para o grupo, porém a discussão sobre cultura articulou os mesmos às
discussões mais profundas sobre a criança como sujeito de direitos, trazendo à tona os
documentos oficiais como a aprovação da lei 8.069/90 – o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), que contribuiu para a construção da visão de uma criança cidadã,
ainda, a formulação de uma Política Nacional de Educação Infantil (BRASIL, 1994) pelo
Ministério da Educação e do Desporto (MEC). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), em 1996, aprovada com o objetivo principal de assegurar, na legislação
brasileira, uma educação de qualidade para a infância.
Os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI)
publicados em 1998, pelo MEC, que integrou a série de documentos dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, apesar de não ser considerado um documento legal de caráter
mandatório, possui valor legal, e “aponta metas de qualidade que contribuem para que as
crianças tenham um desenvolvimento integral de suas identidades, capazes de crescerem
como cidadãos cujos direitos à infância são reconhecidos” (BRASIL, 1998).
As Diretrizes Curriculares Nacionais Infantis DCNEI (BRASIL, 2009) de caráter
prescritivo normativo que versa sobre o direito ao desenvolvimento integral das crianças,
dentre outros,
[...], a proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve
ter como objetivo principal promover o desenvolvimento integral das
crianças de zero a cinco anos de idade garantindo a cada uma delas o
acesso a processos de construção de conhecimentos e a aprendizagem
de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à
liberdade, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e
interação com outras crianças. Daí decorrem algumas condições para a
organização curricular. (BRASIL, CNE/CEB. Parecer CNE/CEB Nº
20/2009. Revisão das Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil.
Brasília, 2009, fls. 07).
E ainda, atualmente, a Base Nacional Curricular Comum - BNCC, cuja finalidade
é orientar os sistemas na elaboração de suas propostas curriculares, que possui como
fundamento o direito à aprendizagem e ao desenvolvimento, sendo referência nacional.
É válido salientar, que somente em junho de 2015, no I Seminário
Interinstitucional para elaboração da BNCC, é que, a partir da Portaria n. 592, de 17 de
junho de 2015, é instituída uma Comissão de Especialistas para a Elaboração de Proposta
da Base Nacional Comum Curricular - BNCC. Ou seja, durante nossa ação de formação,
a BNCC, fortemente discutida entre os profissionais da infância, ainda estava em fase de
135
preparação, tendo sua 1ª versão disponibilizada em 16 de setembro de 2015, e a 2ª em 3
de maio de 2016. Porém, desde de sua preparação já ressalta que é um documento que
“vai deixar claro os conhecimentos essenciais aos quais todos os estudantes brasileiros
têm o direito de ter acesso e se apropriar durante sua trajetória na Educação Básica, ano
a ano, desde o ingresso na Creche até o final do Ensino Médio” (BRASIL, 2016).
A maioria das professoras não possuía conhecimento sobre a existência desses
documentos. E as que sabiam não compreendiam o que realmente cada um dizia e qual a
sua importância para a prática docente. Essa situação pode ser percebida quando
indagadas sobre o uso de documentos oficiais para o planejamento individual e/ou
coletivo. Vocês se utilizam de algum documento para planejar?
Eu busco livros (Firmeza)
Eu trabalho com coleções, com blogs de professoras (Criatividade)
Eu utilizo revistas como a Nova Escola. Tem o projeto da C&A, o
“Paralapracá” que nos oferecem livros para formação (Conhecimento)
Percebendo que a questão foi interpretada de modo diferente do esperado e
refazendo a pergunta: vocês utilizam algum documento oficial, lei, diretrizes para realizar
o planejamento? Todas responderam que não! A discussão contribuiu para a reflexão
sobre a relação que esses documentos possuem com o chão da escola, quando reforçam a
responsabilidade que o professor tem de garantir os direitos das crianças, expressos a
partir de documentos oficiais.
Partindo para a discussão de criança como colecionadora, que dá sentido ao
mundo e produz história; a professora Firmeza relembra o momento que seus alunos
estavam construindo um alfabeto, tendo como base rótulos de produtos.
Mais uma vez consigo enxergar a minha turma inserida nesse contexto.
Colecionamos juntos: tampinhas, rótulos, garrafas. E me lembrei de
uma aluna no meio do caminho para o CMEI, tirando do lixo uma caixa
vazia de suco KAPO, porque no nosso alfabeto dos rótulos estava
faltando preencher o “K”. Que atitude linda! Meu coração se enche de
alegria só de lembrar daquela caixa SUJA e do rosto dela iluminado de
felicidade, porque por causa dela, íamos completar enfim o alfabeto
(Firmeza)
Construir história é colecionar vivências, compreendendo o mundo a partir de sua
trajetória. “Esse processo de constituição dos sujeitos no mundo da cultura é o que
chamamos de educação – o fenômeno pelo qual a criança (mas também os jovens e
136
adultos) passa não apenas a absorver a cultura do seu grupo, mas também a produzi-la e
a ativamente transformá-la (BUJES, 2001, p.18)”. O fato de construir história posiciona
a criança no lugar daquela que pode mudar, daquela que “subverte a ordem e estabelece
uma relação crítica com a tradição”, terceiro ponto de discussão proposto por Benjamim
(1984).
Nele, o papel das linguagens como cinema, imagem e fotografia, por exemplo,
podem nos ajudar a compreender o olhar crítico e sensível das crianças, que muitas vezes
desvela o que já é comum aos olhos. Compreendê-las é o melhor caminho para ensiná-
las, pois “conhecer a infância e as crianças favorece que o humano continue sendo sujeito
crítico da história que ele produz (e que o produz)” (KRAMER, 2007, p.17) e isso não os
torna infantilizado, como podem pensar alguns, pelo contrário, torna-os conscientes de
sua atividade profissional, pois “a infância é, também a idade do possível. Pode-se
projetar sobre ela a esperança de mudança, de transformação social e renovação moral”
(KISHIMOTO, 2001, p.19).
Na semana da criança o CMEI foi abençoado e os alunos ganharam um
passeio para o Sweet Play (parque do Natal Shopping). No dia seguinte
construímos um texto coletivo e podemos constatar a importância do
passeio para todos (Firmeza)
Lembrei de quando as crianças foram ao cinema assistir: O pequeno
narigudo, com direito ao combo: pipoca e refrigerante (Firmeza)
O que realmente se torna mais qualitativo nesta experiência de formação é o fato
de que as professoras conseguem estabelecer correspondência entre a leitura realizada em
grupo e o seu dia a dia, como fez a professora Firmeza, tecendo considerações sobre o
trabalho na Educação Infantil, percebendo-se como oportunizadora de cultura para suas
crianças. Isso a fez sentir-se especial e valorizada como professora e a fez resgatar sua
própria infância, quando lembrou que, como não possuía condições financeiras, a sua
escola foi a primeira a oportunizar o contato com a cultura, visitando museus, cinemas e
como isso fez a diferença na vida dela.
Como estávamos presentes nesse momento externo do parque com as crianças,
foi notória a satisfação e a alegria daqueles que nunca haviam ido àquele shopping da
cidade, daqueles que nunca haviam frequentado um parque dentro de um shopping e
daqueles que compartilhavam daquele momento, junto com os seus colegas da escola. O
que mais chamou atenção foi que algumas crianças se comportaram de modo admirado,
outras temerosas com a entrada neste local, diferente da maneira natural com que muitas
137
outras, que estão acostumadas a frequentar esse ambiente, se comportavam naquele
momento, reforçando mais uma vez a ideia da diversidade das infâncias e das histórias de
cada criança, que tratamos anteriormente.
Sobre o fato de a criança pertencer a uma classe social, considerado o quarto ponto
proposto para discussão, discorremos sobre o fato de que elas “não formam uma
comunidade isolada, elas são parte do grupo” (KRAMER, 2007, p.17). São, portanto,
sujeitos sociais e devem ser respeitadas em seus direitos. Devem fazer parte dos diálogos,
consideradas em suas necessidades. Muitas vezes os adultos conversam sobre os seus
problemas como se as crianças não existissem ou então fizessem parte de uma classe
diferente da deles. Mas não, as crianças devem ser consideradas seres ativos,
principalmente na escola, onde devem ser ensinadas a pensar, a debater, a se opor.
A dificuldade reside justamente no paradoxo em que esse respeito aos direitos de
um sujeito vai de encontro às desigualdades sociais, que permite o trabalho infantil, por
exemplo. As condições de vida de muitas crianças as impendem de brincar, pois mesmo
pequenas já possuem a responsabilidade de prover sustento à família, de cuidar do irmão
mais novo ou então porque estão se tornando adultas mais cedo, influenciadas pela mídia,
pelos costumes de sua família, que não promovem o afeto ou as relações saudáveis. Como
enfrentar essa situação na escola?
Com certeza as crianças não são isoladas e nós professores podemos
constatar isso na nossa prática quando nos deparamos com crianças de
2 a 5 anos fazendo o quadradinho de 8 e cantando músicas de bandas
de forró totalmente inadequadas para uma criança. E o papel do
professor nesse momento é de grande empenho para resgatar essa
infância que eles têm direito. É uma relação delicada entre
escola/família, criança/adulto, onde envolvem costumes, valores,
hábitos de um grupo social (Firmeza)
A segunda subcategoria referente ao conteúdo programático poderá ser uma
estratégia para a superação desse paradoxo, pois diz respeito ao 3.1.2 Planejamento na
Educação Infantil/Pré-escola. Esse tema é recorrente nos trabalhos que investigam
necessidades/dificuldades de professores, como demonstram a análise dos dados iniciais
dessa tese e os dados finais de nosso trabalho de dissertação de mestrado, que tratou dos
professores principiantes (CAMPOS, 2012).
Durante a análise de nossos dados, agora em uma fase mais avançada da tese,
relacionado à temática da ação didático-pedagógica para construir práticas de leitura e
escrita na Pré-escola, podemos dizer que a subcategoria do planejamento perpassou todo
o percurso formativo. Em todos os encontros, a preocupação na organização dos novos
138
conhecimentos, na sistematização das reflexões e no desenvolvimento das aprendizagens
foi presente. Nos questionamos porquê.
Bem, falar de planejamento parece simples até porque a palavra é bem
disseminada em todos os campos da vida, seja profissional ou pessoal. Mas, para nós,
planejar é uma habilidade bem complexa pois envolve a ação e a relação de três conceitos:
conhecimento, organização e tempo.
Não adianta ser organizado e possuir tempo para planejar, se você não dispõe de
conhecimento sobre suas atividades, de como elas são e funcionam. Não adianta conhecer
e compreender tudo sobre educação e aprendizagem, ter tempo para sentar e planejar, mas
não ser organizado. A organização confere eixo aos seus pensamentos, estrutura suas
ideias. Na Educação é até fácil pensar em um professor assim: que estuda sobre avaliação,
possui tempo para realizá-la, mas por falta de organização não lembra onde registrou suas
últimas anotações, ou que utiliza mais de um caderno para as mesmas observações, não
as nomeiam, ou então não consegue saber a que aluno pertence cada registro realizado.
Não adianta ainda, possuir conhecimento, ser organizado, mas não dispor de o
mínimo de tempo para sistematizar tudo o que pensa e necessita, como acontece com
algumas professoras do CMEI:
No nosso caso o planejamento é uma hora no final do expediente à tarde
(Criatividade)
Nós trabalhamos sem planejamento, porque é uma hora por dia pra
tudo. E se você fala em parar, vamos supor hoje vamos fazer uma
reunião, vamos discutir o projeto político pedagógico [...] aí o pai já vai
lá na secretaria denunciar, dizendo que faz uma semana que não
trabalhamos. Então é muito complicado (Firmeza)
Na verdade, planejar é uma atividade que todos pensam que dominam, mas que
poucos realizam, pois como dissemos anteriormente, é complexa. Porém, é uma atividade
necessária e deveria ser intrínseca ao professor. O planejamento lhes garante segurança,
objetivo, flexibilidade de ações, direção e organização. “Essa situação coloca o professor
como autor consciente do seu trabalho: ele sabe por que está conduzindo a prática
pedagógica de uma maneira e não de outra” (BRASIL, 2006). Por isso, levantamos a
seguinte questão ao grupo: como se dá o planejamento para a prática pedagógica de
leitura e escrita na Educação Infantil/Pré-escola?
Primeiramente, devemos repetir que no ano de 2014, período de desenvolvimento
dessa formação com as professoras, a BNCC não estava construída, por isso, naquele
momento as DCNEI e o RCNEI eram os documentos que orientavam de maneira mais
139
clara, a prática de professores da Educação Infantil. Embora não possua caráter
mandatório, com as DCNEI, o RCNEI traça objetivos específicos para cada faixa etária
e possuí linguagem simples, de fácil compreensão inicial.
As professoras, embora tivessem conhecimento da existência desses documentos,
não os citaram quando indagamos sobre a utilização de documentos na construção do
planejamento de cada uma delas. Por isso, o registro da professora Paciência foi pertinente
ao momento daquela discussão, se questionando de onde partiria para planejar.
Vou partir de onde para planejar? (Paciência)
A escola possui um Projeto Político Pedagógico – PPP que, inclusive, menciona
e se direciona a partir do RCNEI, mas que estava em processo de construção em 2014.
Porém ele também não foi citado pelas docentes, quando o assunto foi o subsídio de
documentos para o planejamento. Inclusive a mesma professora registra após uma
discussão sobre a importância desse documento para a instituição que
“a sua revisão e atualização pela comunidade escolar, reflete a unidade
educacional”(Paciência)
Essa unidade diz respeito à um norte, que deve ser igual para todas, já que
trabalham na mesma instituição. No entanto, isso não quer dizer que trabalhem todas os
mesmos temas de estudo, por exemplo, mas garante que todas se baseiem pelos mesmos
princípios e documentos.
Essa situação de “não saber de onde se deve partir” nos deixaram preocupadas e
nos levou a trazer um texto, produzido pelo Ministério da Educação - MEC para o
Programa de formação de professores alfabetizadores, em 2006, intitulado
“Contribuições à prática pedagógica”, afim de discutir o planejamento para a prática de
leitura a escrita na Educação Infantil/Pré-escola, refletindo sobre a orientação para um
trabalho de qualidade, ancorado no que dizem as leis e os documentos.
Gostaríamos de deixar claro que a discussão dessa orientação seria apenas uma
sugestão e não a única e possível possibilidade de planejamento. Depois de conhecer os
caminhos desse planejamento específico, cada professora deverá ser capaz de decidir e
escolher a melhor maneira de se organizar profissionalmente em sua tarefa.
O RCNEI é apresentado a partir de uma estrutura curricular que contempla o
“desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e
social, complementando a ação da família e da comunidade” (LDB nº 9.394/96, art.29).
140
Esta estrutura curricular se baseia em dois âmbitos de experiência: da formação pessoal
e social da criança, trabalhados através da construção da identidade e autonomia, como
também do conhecimento de mundo, trabalhado através das múltiplas linguagens:
movimento, música, artes visuais, linguagem oral e escrita, natureza e sociedade e
matemática.
Como nosso interesse de formação era a leitura e escrita, pensamos ser
imprescindível o conhecimento das professoras acerca do documento como um todo e
depois, especificamente, sobre o módulo da Linguagem Oral e Escrita. Por isso as
docentes necessitavam saber o que o RCNEI estava exigindo sobre essas linguagens na
Pré-escola, para que, partindo desses objetivos, pudessem traçar o seu planejamento. No
que tange ao trabalho com essas linguagens, os profissionais da educação infantil deverão
ensejar práticas que permitam que seus alunos sejam capazes de:
• ampliar gradativamente suas possibilidades de comunicação e expressão, interessando-
se por conhecer vários gêneros orais e escritos e participando de diversas situações de
intercâmbio social nas quais possa contar suas vivências, ouvir as de outras pessoas,
elaborar e responder perguntas;
• familiarizar-se com a escrita por meio do manuseio de livros, revistas e outros
portadores de texto e da vivência de diversas situações nas quais seu uso se faça
necessário;
• escutar textos lidos, apreciando a leitura feita pelo professor;
• interessar-se por escrever palavras e textos ainda que não deforma convencional;
• reconhecer seu nome escrito, sabendo identificá-lo nas diversas situações do cotidiano;
• escolher os livros para ler e apreciar (BRASIL, 1998)
Conhecendo os objetivos propostos pelo RCNEI, foi importante também
compreender o que diziam as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
– DCNEI sobre o trabalho pedagógico na Educação Infantil, afinal esse documento possui
caráter mandatório. Por isso, realizamos a leitura atenta da estrutura do documento,
destacando as Práticas Pedagógicas da Educação Infantil, que devem ter como eixos
norteadores as interações e a brincadeira, além de garantir algumas experiências às
crianças, dentre as quais está a relacionada às situações de leitura e escrita:
141
- Possibilitar às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação com a
linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e
escritos (BRASIL, 2010, p. 25).
Com o conhecimento desses dois documentos, que orientam a prática do professor
de Educação Infantil/Pré-escola, as professoras necessitavam saber como iriam relacionar
todos aqueles objetivos e orientações com o dia a dia de sua prática, na construção dos
planos de aula. Essa ansiedade por saber como todos os conhecimentos iriam se efetivar
na prática eram constantes, por isso, os encontros passaram a ter como objetivo, além da
leitura e da reflexão das temáticas propostas, o desenvolvimento da autonomia das
docentes, encorajando-as a estabelecer relações entre as discussões, reflexões e práticas
pedagógicas, não esperando a resposta pronta para algumas questões.
Por isso, depois da leitura desses objetivos na lei e nos documentos, pensamos que
seria importante conhecer como as professoras pensam cada uma de suas aulas, como
realizam o seu planejamento.
As professoras nos relataram que, naquele ano, o tema para estudo da escola
“Escola em movimento: unindo saberes e práticas” foi proveniente da XIV Jornada de
Educação das Unidades de Ensino de Natal – JENAT, mas que “não é nada imposto, é
sugerido. Como os temas que eles lançam sempre são bons, a gente adere” (Firmeza). A
JENAT é um,
Evento realizado pela Prefeitura Municipal do Natal, por meio da
Secretaria Municipal de Educação, que congrega pesquisadores e
profissionais da educação que se propõem a discutir questões inerentes
ao processo de ensino-aprendizagem e às demandas educacionais que
se apresentam na sociedade contemporânea (PREFEITURA
MUNICIPAL DO NATAL, 2014)
A professora Conhecimento trabalhava com outro projeto: “Brinquedo de Sucata”
e revelou que quando inicia o ano, pensa no planejamento da seguinte forma:
Antes de receber a turma, eu sento e penso: nós vamos trabalhar
adaptação, eu não tenho em mente ainda nenhum projeto...(Paciência)
Mesmo na pré-escola vocês trabalham adaptação? (Formadora)
Sim. Adaptação, porque a Educação Infantil tem criança novata o tempo todo (Paciência)
142
Ela nos revela que no início do ano recebe os alunos sempre com brinquedos e
brincadeiras, e que pensa o planejamento de maneira semanal, a partir de um projeto.
Eu penso assim: até o dia do planejamento eu tenho tantos dias para
planejar (Paciência)
A preocupação reside justamente nesse planejamento como um todo, na
organização global da prática pedagógica. Se formos trabalhando semana a semana talvez
não tenhamos noção se iremos conseguir atingir todos os objetivos contemplados para
aquele ano. Por isso, conversamos com as docentes sobre se estruturarem a partir da
relação dos objetivos que encontramos nos documentos com os temas que pensam para
serem desenvolvidos na escola, calculando/prevendo um marco temporal. Quanto tempo
precisarei para desenvolver esse projeto? Um bimestre, um trimestre?
A professora Criatividade disse que pensou no tema “Copa do Mundo: uma
mistura de cores” a partir “da questão do movimento proposto pela JENAT”.
E dentro desse tema essa mistura de cores, eu pensei não só nas cores
em si das bandeiras, dos uniformes, dos.. Mas principalmente nas cores
das peles né, de trabalhar a questão das diferenças. Aí a partir desse
tema A gente escreve um projetinho com objetivos e tudo, e as
atividades a gente vai fazendo por semana (Criatividade)
Quando questionada sobre a situação de perceber que, durante aquela semana,
realizou muitas atividades de uma linguagem, em detrimento de outras, por exemplo,
Criatividade responde que
O tempo é corrido, mas eu acho que a gente tentar fazer um negócio
meio que, uma atividade que possa englobar várias coisas. Por exemplo,
um boliche que eu trago. Eu vou trabalhar os números, o movimento
em si: de como pegar a bola. E na roda a gente conversa sobre o jogo,
sobre os times. Manda pesquisa para a casa: quais os times que vão
jogar em Natal? Qual o nome do estádio? Vamos contar as letras da
palavra BRASIL, o nome de outras seleções...É assim, trabalhando
junto (Criatividade)
A professora Criatividade revela que se preocupa com o significado que os temas
de estudo possuem para a vida dos alunos, quando escolhe uma temática que faz parte da
vida das crianças, já que estávamos em ano de Copa do Mundo no país. E ainda que
pratica a ideia da interdisciplinaridade em seu planejamento, quando faz relação entre as
múltiplas linguagens em uma mesma temática. Porém, chega à conclusão que deve haver
143
uma organização mais definida dos objetivos e das linguagens durante um determinado
tempo.
Mas eu acho que falta isso mesmo, de deixar definido: hoje é
Matemática, amanhã vai ser isso..(Criatividade)
Na prática, o próprio RCNEI, destina um trecho de seu documento para as
orientações didáticas em leitura e escrita. Em relação à leitura, as professoras deverão
garantir às crianças,
• Participação nas situações em que os adultos leem textos de diferentes gêneros, como
contos, poemas, notícias de jornal, informativos, parlendas, trava-línguas etc.
• Participação em situações que as crianças leiam, ainda que não o façam de maneira
convencional.
• Reconhecimento do próprio nome dentro do conjunto de nomes do grupo nas situações
em que isso se fizer necessário.
• Observação e manuseio de materiais impressos, como livros, revistas, histórias em
quadrinhos etc., previamente apresentados ao grupo.
• Valorização da leitura como fonte de prazer e entretenimento.
Desenvolvendo:
• Situações em que as crianças estabelecem uma relação entre o que é falado e o que está
escrito (embora ainda não saibam ler convencionalmente).
• Situações em que as crianças precisam descobrir o sentido do texto apoiando-se nos
mais diversos elementos, como nas figuras que o acompanham, na diagramação, em seus
conhecimentos prévios sobre o assunto, no conhecimento que têm sobre algumas
características próprias do gênero etc.
E nas práticas de escrita, garantir às crianças:
• Participação em situações cotidianas nas quais se faz necessário o uso da escrita.
• Escrita do próprio nome em situações em que isso é necessário.
• Produção de textos individuais e/ou coletivos ditados oralmente ao professor para
diversos fins.
• Prática de escrita de próprio punho, utilizando o conhecimento de que dispõe, no
momento, sobre o sistema de escrita em língua materna.
• Respeito pela produção própria e alheia.
Desenvolvendo atividades de:
• Repetir palavras ou expressões literais do texto original;
144
• Controlar o ritmo do que está sendo ditado, quando a fala se ajusta ao tempo da escrita;
• Diferenciar as atividades de contar uma história, por exemplo, da atividade de ditá-la
para o professor, percebendo, portanto, que não se diz as mesmas coisas nem da mesma
forma quando se fala e quando se escreve;
• Retomar o texto escrito pelo professor, a fim de saber o que já está escrito e o que ainda
falta escrever;
• Considerar o destinatário ausente e a necessidade da clareza do texto para que ele possa
compreender a mensagem;
• Diferenciar entre o que o texto diz e a intenção que se teve antes de escrever;
• Realizar várias versões do texto sobre o qual se trabalha, produzindo alterações que
podem afetar tanto o conteúdo como a forma em que foi escrito.
A partir desses conhecimentos discutimos sobre o fato de agora ter a “faca e o
queijo na mão”. Conhecíamos os documentos, os objetivos, selecionaríamos os temas de
estudo, já sabíamos que tipos de atividades ou situações deveriam ser ensejadas com as
crianças, ou seja, as questões ligadas ao conhecimento. Agora faltava gerir a organização,
que de certa forma, é uma condição de vida de cada professor, já que possuem jornadas
de trabalho diferenciadas; juntamente com o tempo, que também é um fator que não
depende apenas delas, mas de um sistema gestor, no caso a Secretaria Municipal.
Se fôssemos desenvolver essa formação no ano de 2016, provavelmente,
tomaríamos como uma de nossas referências a Base Nacional Curricular Comum. Mesmo
ainda não publicada, a sua 2ª versão é fruto de participação da sociedade e de especialistas
que apresenta campos de experiências (o eu, o outro, nós; corpo, gestos, movimentos;
traços, sons, cores e imagens; escuta, fala, linguagem e pensamento; espaços, tempos,
quantidades, relações e transformações) e os seus respectivos objetivos de aprendizagem
para cada faixa etária, definidos a partir de direitos de aprendizagem e desenvolvimento
que devem ser garantidos às crianças. Em nosso caso, as crianças pequenas (assim
chamadas por estarem na faixa etária entre 4 anos a 6 anos e 2 meses) e que, portanto,
frequentam a Pré-escola.
Nesse sentido, poderíamos nos antecipar e já conhecer o que dizem os objetivos
de aprendizagem para as crianças pequenas referente ao campo de experiência Escuta,
fala, linguagem e pensamento:
- Registrar experiências pessoais ou atividades realizadas na escola em fotografias,
vídeos, desenho e escrita (convencional ou não);
145
- Inventar enredos para brincadeiras, histórias, poemas, canções, roteiros de vídeos e de
encenações, definindo os contextos e os personagens;
- Ditar textos orais ao/à professor/a, individualmente ou em grupo;
- Produzir suas próprias escritas, convencionais ou não, em situações com função social
significativa;
- Levantar hipóteses sobre textos escritos sobre as características da escrita: frases,
palavras, espaços em branco, sinais de pontuação e outras marcas, compreendendo que a
escrita é uma representação da fala.
E quais são os direitos de aprendizagem relacionados ao campo de experiência:
escuta, fala, linguagem e pensamento?
- Conviver com crianças e adultos, compartilhando situações comunicativas cotidianas,
constituindo modos de pensar, imaginar, sentir, narrar, dialogar e conhecer.
- Brincar com parlendas, trava-línguas, adivinhas, textos de memória, rodas, brincadeiras
cantadas e jogos, ampliando o repertório das manifestações culturais da tradição local e
de outras culturas, enriquecendo a linguagem oral, corporal, musical, dramática, escrita,
dentre outras.
- Participar de rodas de conversa, de relatos de experiências, de contação e leitura de
histórias e poesias, de construção de narrativas, da elaboração e descrição de papéis no
faz de conta, da exploração de materiais impressos, analisando as estratégias
comunicativas, as variedades linguísticas e descobrindo as diversas formas de organizar
os pensamentos.
- Explorar gestos, expressões, sons da língua, rimas, imagens, textos escritos, além dos
sentidos das falas cotidianas, das palavras nas poesias, parlendas, canções e nos enredos
de histórias, apropriando-se desses elementos para criar novas falas e enredos, histórias e
escritas, convencionais ou não.
- Expressar sentimentos, ideias, percepções, desejos, necessidades, pontos de vista,
informações, dúvidas e descobertas, utilizando múltiplas linguagens, entendendo e
considerando o que é comunicado pelos colegas e adultos.
- Conhecer-se, a partir de uma apropriação autoral da (s) linguagens, interagindo com os
outros, reconhecendo suas preferências por pessoas, brincadeiras, lugares, histórias.
Tendo em vista a importância e a orientação do planejamento para o
desenvolvimento de prática de qualidade na Educação Infantil/Pré-escola o parecer
CNE/CEB 7/2010 afirma:
146
O processo de planejamento deve ter caráter estratégico e se
desenvolver de forma sistemática em etapas articuladas nas UES. As
dinâmicas a serem estabelecidas devem favorecer a investigação sobre
o processo de desenvolvimento dos alunos, a análise e a elaboração por
parte dos educadores, sobre as mediações pedagógicas necessárias para
que, de fato, a aprendizagem se realize (BRASIL, 2010).
O item 3.1.3 Construção/elaboração de atividades escolares foi abordado no
decorrer de todo o processo de formação. A sua discussão surgiu desde o primeiro
encontro até o último e foi abordado a partir de três situações.
A primeira estava relacionada a ideia de “Protagonismo Infantil”. As professoras
coordenadoras, principalmente, apontaram uma forte preocupação com a autonomia das
crianças na feitura/construção das atividades. A segunda dizia respeito à construção de
atividades elaboradas pelas professoras para as crianças, como por exemplo as atividades
de sala e de casa. O uso de “coleções” e de atividades já prontas, muitas vezes
descontextualizadas, provocou o grupo a discutir sobre como então elaborar uma
atividade de leitura e/ou de qualidade na Pré-escola? E em terceiro lugar, a participação
da família na mediação das atividades de casa.
Como essa questão causou muita angústia, foi combinado com o grupo, que um
encontro próprio contemplaria a discussão dessas atividades, e que cada professora
apresentaria a aula observada pela formadora às colegas, em que elas mesmas fariam a
avaliação sobre a adequação e o contexto no qual aquela atividade foi desenvolvida.
É importante destacar que esse conteúdo programático não fazia parte, a priori, da
ação didático-pedagógica planejada pela formadora, foi construída, portanto, durante o
processo de formação. Isso revela mais uma vez, que as necessidades não estão ali, dadas,
esperando pelo pesquisador, elas podem surgir do contexto, de novas necessidades que
vão sendo desenhadas durante o contínuo da formação. Se trata, portanto, Segundo
Rodrigues e Esteves (1993, p.20) de um instrumento “menos técnico e mais pedagógico”
e por isso não pode se “reduzir a um questionamento externo ou a uma sondagem
estatística de preferências ou dificuldades”.
Bem, para falar de protagonismo infantil, as professoras Paciência e Humildade,
no papel de coordenadoras - apresentando essa visão geral do trabalho pedagógico,
desenvolvendo um olhar de quem “está de fora”, mas que está dentro, porque
acompanham todas as professoras e conhecem a realidade de cada turma - confessam que
se preocupam com os desenhos e pinturas “perfeitas”, com as atividades impecáveis que
recebem e percebem nas paredes da escola
147
É tudo muito perfeito para a criança. E a criança a gente sabe que não
tem essa capacidade de fazer aquela coisa tão perfeita. Vamos deixar de
trazer tanta coisa pronta e vamos deixar que a criança confeccione, que
a criança faça a atividade. Há essa dificuldade de deixar a criança fazer
(Humildade)
Essa ideia de autoria infantil é subjacente a concepção de criança e infância que
discutimos a pouco. O discurso reconhece a criança como sujeito histórico e crítico,
produtora de cultura, mas as práticas pedagógicas não refletem esse pensamento. Que
criança então queremos formar, se mal deixamos ela mesma, criar, produzir? A criança
pobre ou a criança rica? Nesse sentido, Moss (2007) apresenta dois conceitos atuais de
criança: a criança pobre (não no sentido de ser desfavorecida economicamente) e a criança
rica. A primeira apresenta uma condição carente, passiva, sem ação, necessitada de apoio.
A segunda é agente cidadã, membro do grupo, forte, inteligente, competente, capaz de
produzir desafios.
A professora reconhece que essa ação de compreensão da criança como ser
autônomo e capaz, também foi um processo difícil de ser elaborado por ela mesma, por
isso se coloca no lugar de suas colegas professoras, quando confessa que
tinha muita dificuldade de permissão desse protagonismo da criança,
tinha muita dificuldade de deixar a criança fazer aquela coisa do jeito
dela, eu não achava que aquilo era uma expressão, era como se eu
tivesse que moldar, eu tenho que direcionar aquilo ali. Para eu
compreender que não era dessa forma foi difícil pra mim (Paciência)
Esse assunto parece simples, mas é comum encontrarmos produções de crianças
que não foram feitas por elas. Mas, porque isso acontece? Uma hipótese levantada,
discutida junto aos professores se relaciona à vaidade profissional de cada professor.
Quando um professor expõe as atividades de seus alunos para o conhecimento de toda a
escola, de certa forma ele está expondo também o seu trabalho como docente. Então no
pensamento de alguns, as atividades perfeitas refletem alunos perfeitos e um professor
perfeito. Ele pode garantir a aprovação dos colegas, do coordenador e dos pais dos alunos.
Mas o nosso foco não são as crianças?
As professoras ficaram mexidas com esse assunto e discutiram por exemplo, sobre
as lembranças na escola, que muitas vezes, as professoras produzem para as datas
comemorativas, como o Dia das Mães, Natal, entre outros. A criança leva o objeto para
casa, mas pintou só o olho do Papai Noel. A professora fica satisfeita, os pais felizes e a
criança nesse momento passa a representar a criança pobre de Moss (2007) passiva, que
148
não pensa, não cria e não produz. Qual o papel da criança nesse contexto? Esse momento
de reflexão auxiliou as professoras a repensarem suas práticas.
É, não tinha parado para pensar sobre isso! (Cuidado)
Temos que prestar atenção em tudo o que está por trás do que fazemos
(Criatividade)
Partindo para o segundo ponto dessa discussão: a elaboração de atividades, as
professoras relatam que recorrem muito às “Coleções”, que são blocos de atividades já
prontas. Essa situação nos deixou incomodadas pelo fato da importância de desenvolver
atividades contextualizadas na escola. O que são atividades contextualizadas? São
aquelas que possuem sentido para a criança. Se o professor trabalhou naquele dia alguma
cantiga de roda, poderá enviar para casa uma atividade com o texto da cantiga para ser
lido ou para que se escreva palavras que estão faltando no texto, por exemplo. As
atividades descontextualizadas são como as que a professora Humildade presencia:
Se trabalha muito com a cópia. Essas atividades prontas não fazem as
crianças pensar. Por exemplo: vamos trabalhar o dia do índio, e essas
datas comemorativas que a gente bate muito em cima. Por que todas as
datas? Vai comemorar o índio, a árvore, tudo descontextualizado
(Humildade)
Aqueles cadernos com mil e uma atividades coladas. Aquele lápis
vermelho colocando ok para a escrita certa ou errada. Como assim
escrita certa ou errada? (Humildade)
Sabemos que a cópia não é uma prática de todo o mal, porém o objetivo a qual a
cópia se destina é o que realmente interessa. Em uma das observações realizadas, a
professora escrevia a letra de uma música, já trabalhada várias vezes no quadro e pedia
para que as crianças lessem, cantassem e depois realizassem uma atividade. O objetivo
da atividade era preencher as lacunas em branco da letra da música ao apreciá-la algumas
vezes. Na expectativa de vivenciar as crianças registrando sua escrita, exercitando a
escuta da sonoridade das palavras a partir da apreciação da música, aguardamos a
mediação da atividade.
A professora escreveu todas as palavras no quadro e pediu para que as crianças as
copiassem em suas atividades. Ela mesma escutava cada palavra da música, pausava o
som e no lugar de indagar as crianças e proporcionar o questionamento, oferecendo tempo
hábil para isso, se apressava em apontar a palavra correta para as crianças registrarem em
149
suas atividades. As crianças já tinham capacidade, naquele momento que dominavam a
maior parte da letra da música, de pensar sobre a escrita e sobre os sons das palavras. Esse
exemplo demonstra também a qualidade da mediação docente. A proposta da atividade
era boa, mas a condução poderia ter explorado mais o conhecimento das crianças.
Humildade acredita que trabalhar com atividades de coleções é bem mais cômodo,
pois a produção de atividades diária demanda muito tempo. Tempo esse que a maioria
não possui. Porém as professoras também revelam que a escola não possui máquina de
xerox para efetuar as cópias de atividades necessárias. Existe um único dia na semana em
que a diretora do CMEI vai à Secretaria do Município efetuar as cópias desejadas pelas
professoras. O problema é que a maioria não consegue pensar na atividade com uma
semana de antecedência, como revela Criatividade,
É tanto que muitas vezes eu nem faço atividade para enviar pela
diretora, acabo imprimindo em casa mesmo, por causa da história do
tempo que me atrapalha, às vezes eu não consigo antecipar como eu
vejo as colegas fazendo, tipo em Março já trouxe atividades pensando
no Dia das Mães, em Maio, sabe? (Criatividade)
A discussão girou em torno da questão: qual a finalidade real da atividade de casa
ou de sala? Uma simples questão nos provocou uma reflexão até pelas, aparentemente,
mais resistentes à mudança. Em uma conversa aberta foi colocado em questão o fato de
algumas professoras possuírem o planejamento baseado em projetos, com uma sequência
didática e outras não praticarem essa organização, o que influência na produção de uma
boa atividade escolar.
A falta de organização leva as professoras a procurarem atividades
descontextualizadas, como as que encontram em coleções, blogs. Essas fontes não são
proibidas, podem até ser úteis como orientação e apoio ao professor, no intuito de
produzirem a sua própria atividade, contextualizada com os saberes e práticas de sua
turma e escola.
O terceiro ponto diz respeito à preocupação das professoras com as atividades de
casa. Firmeza anuncia que os pais de seus alunos cobram que ela corrija as atividades de
escrita de seus filhos e que se ela não corrige os pais as acusam de não estarem exercendo
o seu trabalho de maneira adequada. Cuidado fala que as atividades enviadas para casa
muitas vezes são feitas pelos pais e/ou responsáveis.
Eu tinha uma aluna, que eu mandava dever para casa, ela fazia na sala
e eu via como ela fazia o nome dela e quando eu mandava para casa o
150
nome vinha a coisa mais linda. Aí eu dizia: fulana foi você quem fez
esse nome. E ela respondia: não foi minha avó (Cuidado)
Aí eu mandava um recadinho: deixe a aluna fazer o nome dela do jeito
que ela souber. Foi quando a mãe dela apareceu na escola e eu conversei
sobre isso pessoalmente com ela. Não deu uma semana a menina já
estava escrevendo o nome sozinha. Agora se a avó dela ficasse fazendo
ela nunca iria aprender (Cuidado)
Por esse motivo, propomos à direção da escola uma reunião/momento com os pais
dos alunos para conversarmos sobre a aprendizagem de leitura e escrita na Pré-escola.
Alguns, muito ansiosos, cobram excessivamente das professoras que seus filhos leiam e
escrevam ortograficamente antes mesmo de chegar ao 1º ano do Ensino Fundamental.
Nesse intuito de diálogo aberto, após consentimento da direção, enviamos um bilhete
(apêndice) questionando a melhor data e horário para esse momento, bem como as
principais questões que possuíam sobre a temática. A reunião aconteceria em dois turnos,
manhã e tarde.
Poucos pais estiveram presentes, mas o momento foi proveitoso, pois se orientou
a partir da devolução de questões que nos enviaram antecipadamente, via bilhete. Duas
perguntas definiram o início das discussões: as crianças precisaram sair alfabetizados da
Educação Infantil? Lendo e escrevendo alfabeticamente? Como posso orientar as
atividades de casa?
Alguns pais tentaram enveredar a discussão pelas insatisfações pessoais que
possuíam com as professoras. Percebendo que o objetivo da reunião não poderia ser de
apontamentos ou julgamentos, baseados na questão de culpar ou um ou outro, iniciamos
o diálogo ressaltando, em linhas gerais, o valor do professor da Educação Infantil.
Notamos, nesse momento, um forte embate entre escola e família. Tanto as
professoras já haviam sinalizado algumas insatisfações e cobranças dos pais quantos os
pais, agora, gostariam de fazer o mesmo. Esse momento se prestou, além de seus objetivos
inicias, a apaziguar os ânimos entre família e escola, demonstrando principalmente que a
instituição se preocupa com seu filho e que oportuniza momentos como esse (do diálogo)
em busca do melhor desenvolvimento e aprendizagem para os pequenos.
Além da valorização, informar aos pais que as professoras planejam e
sistematizam atividades, os deixou mais aliviados, pois para alguns responsáveis
presentes,
As crianças só brincam e lancham aqui no CMEI (Pai de aluno, 2014)
151
Para superar a dúvida sobre o fato de as crianças saírem da Educação Infantil lendo
e escrevendo, os documentos utilizados durante a formação contínua das professoras
foram socializados. Os pais conheceram o RCNEI e as DCNEI. Realizamos juntos, a
leitura dos objetivos do eixo Linguagem Oral e Escrita, para as crianças da Pré-escola, no
RCNEI, bem como a leitura sobre as experiências que deverão ser garantidas nas
“Práticas Pedagógicas da Educação Infantil” nas DCNEI.
Os pais ali presentes puderam perceber que em nenhum momento, os documentos
falam da obrigatoriedade da leitura e escrita alfabética de crianças ao deixar a Pré-escola.
Porém, isso não quer dizer que as professoras não deverão ensejar vivências e reflexões
sobre a leitura e a escrita, como apontam os próprios documentos.
Se eles não vão ensinar a ler e a escrever o que eles vão fazer então?
(Mãe de aluno do CMEI, 2014)
Foi difícil para nós, em apenas um encontro, conseguir que os pais superassem a
visão de assistencialismo que a Educação Infantil foi, e ainda é, marcada durante sua
história. Para Kuhlmann Jr. (2007) essas instituições nunca deixaram de ser educacionais,
apenas apresentavam projetos que formavam para a submissão. Além disso, os
preconceitos sociais foram reforçados por questões políticas necessárias, que defendiam
o atendimento em creche e pré-escola, apenas, para os mais necessitados.
Para a maioria dos pais a escola é local apenas de brincadeira, e que essa
brincadeira não possui valor, por isso subestimam a competência profissional dos
professores a todo o momento. De certa forma, a leitura desses documentos imprimiu
seriedade a profissão e indicou que o trabalho que as professoras praticam na escola, não
é qualquer trabalho, realizado de qualquer maneira. Há seriedade, comprometimento e
responsabilidade.
Acreditamos que se mais momentos como esse forem estabelecidos, a reflexão
sobre a valorização profissional e o reconhecimento das atividades desenvolvidas pelas
professoras serão maiores. Além disso, se faz importante que as docentes possuam o
conhecimento legal do que realizam em sala de aula, para que se amparem perante essas
situações constrangedoras de desprestígio profissional. Seguras do que fazem, poderão
até acolher esses pais de uma maneira melhor, superando o embate família x escola.
Ainda nesse encontro com os pais discutimos sobre o ensino das sílabas. Podemos
ensinar sílabas? Pode sim, mas não como treinamento (a família do B, BA, BE, BI, BO,
BU) de forma descontextualizada, como muitos de nós aprendemos, e sim considerando
152
a sílaba como uma parte que constitui uma palavra e que por isso é importante de ser
ensinada e aprendida.
Em seguida, realizamos a exposição de alguns tipos de escrita para que os pais
percebessem que há uma evolução de escritas (pré-silábicas, silábicas e alfabéticas).
Mesmo em um espaço de tempo tão curto, o importante não era que compreendem toda
a complexidade da Psicogênese da Língua Escrita, ali naquele momento, mas que
percebessem que antes de aprenderem a ler e a escrever convencionalmente, como tanto
desejam, existe um conhecimento sobre a língua que é construído desde muito cedo pelas
crianças.
Os pais das crianças com cinco anos estavam muito angustiados com o choque da
saída da Educação infantil para o Ensino Fundamental. Preocupavam-se se o filho “ia dar
conta ou não” de acompanhar a nova escola. Conversamos sobre essas angústias e
tentamos acalmar os pais discutindo sobre essa passagem, que é natural pois faz parte do
crescimento deles e que o mais importante era que eles pudessem ensinar os filhos a
pensarem e serem autônomos. Isso pode fazer com que sofram menos.
Sobre a mediação dos pais nas atividades de casa, realizamos uma dinâmica com
eles. Distribuímos uma atividade, realizada pela professora do nível IV, para completar
as letras que estavam faltando na palavra ALECRIM. Questionamos como cada mãe ou
pai, ali presentes, ajudaria seu filho a realizar a atividade. As respostas foram variadas:
- Diz as letras que estão faltando para o filho completar;
- Lê o texto todo e mostra a palavra ALECRIM, que está no texto. O filho copia.
- Pede para que ele identifique a palavra ALECRIM, sozinho no texto, e depois complete
as letras que estão faltando. Quando não consegue ela diz onde está a palavra ou dita as
letras.
- A mãe de uma menina que apresenta escrita silábico-alfabética diz que a faz pensar
sobre a presença de mais de uma letra em cada sílaba, quando a mesma só põe uma. Fala
o som das palavras e sílabas.
A maioria dos pais não ensinam as crianças a refletirem sobre a escrita.
Direcionam-se para a cópia ou dizem logo a letra correta, sem esperar ela pensar. Apenas
a última mãe que realiza a mediação a partir da reflexão da escrita. Em seguida,
demonstramos como seria uma mediação de atividade que ensina as crianças a pensarem
sobre o sistema alfabético.
153
Essa situação nos permitiu pensar em algumas orientações aos pais ao realizar a
atividade de casa com seu filho. Pontuamos os seguintes aspectos:
1- Rotina de horário e local
2- Disponibilidade de materiais
3- Perguntar do que se trata a atividade
4- Valorizar sempre o que a criança fez
5- Não exigir correção das atividades pelas professoras (elas vão avaliar a atividade, mas
não existe escrita certa ou errada nesse processo de construção).
6- Incentive a criança a escrever de modo independente, sem realizar cópias. Depois peça
para ela ler o que escreveu.
7- Responda quando a criança perguntar, como é C com A? É igual a CA.
Como produto desse encontro, decidimos construir orientações aos pais do CMEI
(apêndice) que possuíssem filhos na Pré-escola, para a mediação de atividades. A
vivência foi produtiva. Em encontro posterior com as professoras, relatamos o
desenvolvimento dos dois momentos da reunião de pais (manhã e tarde) e elas se
sentiram satisfeitas com a possibilidade de produzirmos orientações aos pais.
Falaram do desconforto em saber que alguns pais acreditam que os filhos só vêm
para a escola para brincar, mas compreendem a influência que a história da Educação
Infantil possui com esses depoimentos. E ainda, que são agentes de transformação
dessa visão empobrecida, na medida em que garantem que suas práticas estejam bem
fundamentadas nos documentos legais referentes à Educação Infantil e sejam
discutidas com todos no momento que acharem necessário, imprimindo segurança e
transparência ao trabalho realizado.
Os itens 3.1.4 Alfabetização e Letramento e 3.1.5 Psicogênese da Língua
Escrita foram discutidos a partir dos textos de Brandão e Leal (2010) “Alfabetizar e letrar
na Educação Infantil: o que isso significa?” e de Coutinho (2005) “Psicogênese da língua
escrita: o que é? Como intervir em cada uma das hipóteses? Uma conversa entre
professores”.
As discussões sobre a utilização da palavra alfabetização na Pré-escola são
condenadas por alguns estudiosos e tratada com naturalidade por outros. O princípio de
nosso diálogo foi no intuito de refletir sobre o papel da Educação Infantil na ampliação
das situações de leitura e escrita vivenciadas pelas crianças. Como os conceitos de
154
alfabetização e letramento consideram essas situações iniciamos uma discussão sobre os
mesmos.
Para mim a alfabetização é um processo de aprendizagem da leitura e
da escrita (Cuidado)
Letramento é quando tipo a pessoa sabe se “virar sozinha”. Pega
ônibus porque sabe a cor dele, mesmo sem saber ler. Ai eu não sei
assim como dizer bonitinho (Firmeza)
Sobre a pertinência dessas discussões as professoras falam que:
A maior dificuldade que eu percebo é na escrita. Eu tenho um aluno
com cinco anos que não conseguia fazer nenhuma letra. Então para
escrever o nome dele eu fiz uma ficha. Mesmo com essa ficha ele não
conseguia fazer, ele não fez nenhuma vez o nome dele (Criatividade)
Na Educação Infantil também é importante o aluno aprender a escrever
e a conhecer as letras não deixando isso apenas para o ensino
fundamental. Só que as pessoas não sabem que brincando também se
aprende. (Cuidado).
Alfabetizar e letrar pra mim não é uma coisa que tem que ser imposta
(Cuidado)
Cientes da importância desses conhecimentos nós apresentamos as ideias de
alfabetização e letramento, a partir das autoras Brandão e Leal (2010) ao grupo, mas não
de maneira conceitual, para que depois do encontro pudessem esquecer o que significam,
mas de modo relacionado às práticas pedagógicas alfabetizadoras ao longo da história.
O objetivo das autoras nesse texto foi o de “refletir sobre o papel da Educação
Infantil na ampliação do contato das crianças com o mundo da escrita” (BRANDÃO,
LEAL, 2010, p.13). Além disso, a escolha desse texto foi fundamental porque além de
orientar as práticas das professoras, apresentou possibilidades de atividades.
Em seguida, analisamos os caminhos para o trabalho com a leitura e a escrita na
Educação Infantil. As autoras apontam três caminhos, que discutimos inclusive no
subcapítulo 5.1 intitulado: “Leitura e escrita na pré-escola: é possível? Como?”. São eles:
- Caminho 1: “A obrigação da alfabetização”
- Caminho 2: “O letramento sem letras”
- Caminho 3: “Ler e escrever com significado na Educação Infantil”
Para que não sejamos repetitivos sobre as considerações já realizadas
anteriormente sobre cada ponto, vamos destacar como se deu esse momento durante a
formação.
155
Ao ler cada caminho proposto as professoras foram se identificando em um ou em
outro caminho. Foram compreendendo de fato, o que cada atitude em sala de aula,
representa. Nesse sentido, cada professora apresentou suas atividades realizadas em sala
de aula e as relacionaram aos caminhos citados. Além disso, uma pergunta motivadora
foi lançada: qual desses caminhos vocês acham mais pertinentes? Por quê? Todas citaram
que o caminho 3 seria o mais significativo.
Porque faz a crianças pensar (Criatividade)
Porque faz a criança aprender com significado (Cuidado)
Em seguida, pretendíamos assistir um vídeo no canal do Youtube sobre a
apropriação do sistema alfabético, mas por motivos técnicos ele não pôde ser exibido. Foi
direcionado então como atividade para casa. Algumas professoras assistiram e
registraram esse momento:
Assisti o vídeo em 12/11 às 22:00h... Em casa. E tudo que foi falado no
vídeo, inclusive pela autora do texto dessa aula: professora Marília de
Lucena, a professora formadora já havia contemplado em sua aula e foi
apenas reforçado com alguns exemplos práticos e trechos das aulas
aplicadas por professoras da Educação Infantil. (Firmeza)
O destaque também foi dado ao fato de que as crianças pudessem sair da Pré-
escola fazendo relação do som com a escrita, superando as escritas pré-silábicas. Nesse
sentido, trabalhar a sonoridade das letras e das palavras é fundamental nessas turmas.
Textos com rimas, parlendas, trava-línguas e aliterações colaboram com o professor nesse
objetivo.
Sobre a Psicogênese da Língua Escrita, o principal objetivo do encontro era
apresentá-la como conhecimento da língua e não como método de alfabetização. Além
disso, o grupo dialogou sobre o conhecimento das hipóteses de escrita a partir do texto de
Coutinho (2005) que exemplificava claramente como intervir, a partir desse
conhecimento.
A formadora deixou claro que, além de conhecer a psicogênese, se faz importante
saber o que fazer com esse conhecimento. E destacou que existem três tipos de
professores atualmente:
- O professor que não sabe o que é a Psicogênese da Língua Escrita;
- O professor que sabe, mas não aplica seu conhecimento em prática alguma e;
156
- O professor que compreende a Psicogênese, sabe avaliar os níveis de escrita, mas não
sabe como agir a partir dali para que seu aluno reflita sobre a escrita.
Refletimos sobre o fato de não querer ser nenhum desses professores.
Outros assuntos surgiram nesse encontro, como as dificuldades das salas cheias e
heterogêneas e a questão do tempo em que os alunos suportam ficar na mesa para realizar
uma atividade de escrita, que exige mais concentração. Uma sugestão para o atendimento
à todas as crianças, não priorizando apenas as que apresentam dificuldades, mas também
desfiando os mais articulados, foi a de construir uma tabela com os nomes de alunos a
serem atendidos por cada dia da semana.
Como as salas possuem uma média de 12 crianças, a cada dia a professora daria
uma atenção especial à, no máximo três crianças, o que é possível. Sentar ao lado, prestar
atenção nas hipóteses que possui sobre a escrita, os conflitos cognitivos que apresentam,
dentre outros.
Depois dessas discussões, uma amostra de escritas foi entregue às professoras, que
deveriam, individualmente: analisar, ordenar e socializar com o grupo o que pensou sobre
sua avaliação. A atividade foi bem demorada, mas todas se esforçaram em realizar da
melhor maneira possível. Ao final desse momento, apresentamos a Evolução das
conceitualizações sobre a escrita, segundo Emília Ferreiro, da autora Campelo (1990) que
foi utilizado para organizar o pensamento das professoras na ordenação das escritas. As
mesmas compreenderam que esse seria um conhecimento complexo e que nosso encontro
seria apenas um pontapé inicial para se aprofundarem nessas questões.
Durante a leitura do texto, bem como nos momentos de discussão assuntos como:
tarefas de mesa, correção de cadernos na Educação Infantil, os usos e funções da escrita,
contextualização das atividades, alfabetizar letrando, livros com letra bastão, letra
cursiva, cantinhos da leitura, o trabalho com as letras e o alfabeto e o sistema alfabético
como sistema notacional (representação), consciência fonológica x método fônico foram
lançados, e fizeram deste encontro o mais longo e participativo da ação formadora.
Concluímos esse encontro compreendendo que existe
“possibilidade de ensinar a escrita na Educação Infantil de forma
sistemática, incluindo aspectos relativos à apropriação do sistema
alfabético de escrita, sem desconsiderar os objetivos e as atividades do
eixo letramento, bem como outras necessidades relativas ao
desenvolvimento e vivências da infância” (Brandão e Leal, 2010, p. 21)
157
A subcategoria 3.1.6 O ensino da leitura foi iniciada a partir de uma leitura
deleite, com um texto de Rubem Alves, intitulado “Concertos de Leitura”. Em seguida, o
texto de Soligo (2006) tratou das estratégias de leitura: inferência, antecipação, seleção e
verificação. Uma estratégia de leitura, segundo Soligo (2006, p.4) “é um amplo esquema
para obter, avaliar e utilizar informação”.
Em seguida, depois da discussão sobre cada estratégia de leitura em particular
alguns textos na língua inglesa foram distribuídos entre as professoras. Eles possuíam
uma imagem e falavam sobre a biografia de um cantor famoso: Michael Jackson.
Questionamos as docentes sobre qual assunto tratava o texto. Todas revelaram que
não sabiam ler em Inglês, mas que sabiam que se trava de um texto que falava sobre a
vida de Michael Jackson. E voltamos a indagar: mas como vocês sabem que o texto fala
sobre isso? Pelo formato do texto e pela fotografia do cantor.
A expressão “formato do texto” estava relacionada a leitura do gênero textual
biografia e a leitura de imagem, no caso a do cantor Michael Jackson. Essa situação foi
iniciada para discutirmos, que mesmo antes de aprender a ler as crianças conseguem ler.
Mas como? Como você acabaram de fazer, acionando as estratégias de leitura, sem nem
perceber. Vocês selecionaram o nome e a imagem que já conheciam de “Michael
Jackson” e realizaram uma inferência, já que tentaram ler sem ao menos compreender a
língua inglesa. Segundo Soligo (2006, p. 5) inferência “é aquilo que lemos, mas não está
escrito. São adivinhações baseadas tanto em pistas dadas pelo próprio texto como em
conhecimentos que o leitor possui”, no caso das professoras um conhecimento de mundo,
já que conheciam o Rei do Pop.
Essa experiência foi importante para mostrar a importância do trabalho com os
gêneros textuais. Esse conhecimento pelas crianças do que é uma notícia, uma letra de
música ou uma poesia, dão subsídios para as crianças lerem, quando ainda não o fazem
convencionalmente, pois afinal ler vem antes de escrever. A professora Firmeza teve uma
ideia imediatamente e registrou em seu diário.
Pensei em uma aula sobre gêneros textuais mesmo e visualizei minha
sala, meus alunos em um círculo e no meio vários tipos de gêneros
textuais: uma bula de medicamento, uma receita culinária, uma “carta
para o Papai Noel”, uma lista de nomes... (Firmeza)
Além disso, as professoras deverão pensar em atividades que se utilizem de
mecanismos que permitam que as crianças “explorem” suas estratégias de leitura, como
oferecer textos conhecidos para a leitura, como as histórias dos contos de fada, que
158
possuam imagens, por exemplo, e peça para que leia o título. Com certeza ela vai ler, pois
irá reconhecer a história e realizará inferências, dentre outras estratégias para a leitura.
Após o término dessa reflexão a formadora tentou relacionar as aulas
ministradas/observadas pelas professoras em cada turma à sugestão de atividades de
leitura. As aulas observadas estavam relacionadas à produção de texto, ao trabalho com
a cantiga de roda “Alecrim”, e com a cantiga “A linda rosa juvenil”.
A música é forte aliada na aprendizagem da leitura. Nas turmas com as cantigas a
ideia é a de que primeiramente as crianças se apropriem da letra da música, apreciem
diversas vezes e, em seguida, com esse texto memorizado mentalmente, acesse o texto
escrito. Acompanhando a cantoria com a leitura do texto a criança é levada a perceber os
sons de algumas palavras. Se já forem maiores poderão fazer atividades que tenham a
letra da música com algumas palavras faltando, e ao apreciá-la é capaz de ler e registrar
as palavras que faltam.
Na atividade com produção textual, o objetivo é que as crianças possam ler o que
escreveram, refletindo sobre a função da escrita, sobre as letras e sobre os sons das letras.
Elas precisam aprender que podem escrever do seu jeito, mas que esse jeito não é de
qualquer jeito.
Por fim, refletimos sobre o pensamento de Soligo (2006, p. 6) que diz que “uma
prática de leitura que não desperte nem cultive o desejo de ler não é uma prática
pedagógica eficiente”. Por isso, o encontro foi finalizado com a sugestão de um “cantinho
da leitura” em que as crianças pudessem ter acesso livre e fácil aos livros quando
sentissem desejo de ler, pois nas observações foi constatada a ausência desse acesso à
leitura. Em algumas turmas os livros ficavam guardados no armário e pertenciam ao
acervo pessoal das professoras. Também foi importante pensar sobre a ampliação no
repertório de histórias que as crianças tem acesso, e por isso, de tempos em tempos deve-
se modificar os livros que ficam nesses espaços de leitura.
O item 3.1.7 Produção de Textos foi debatido a partir das seguintes questões:
porque produzir textos coletivamente? Crianças pequenas são capazes de produzir textos
escritos? Por que, afinal a produção textual, deve fazer parte dos objetivos didáticos
traçados para a Educação Infantil?
Como subsídio utilizamos o texto de Girão e Brandão (2010) “Ditando e
escrevendo: a produção de textos na Educação Infantil” para responder essas questões. A
professora Cuidado, inicialmente, acreditava que as crianças de sua turma, na faixa de
três e quatro anos, não teriam condições de produzir textos. Porém, após nossas
discussões apontou em seu diário de aula que,
159
a produção escrita com significado faz parte para a criança aprender a
ler e escrever. Não é porque as crianças não sabem grafar
convencionalmente que não possam produzir um texto (Cuidado)
Isso significa que sua concepção sobre produção de texto na Educação Infantil foi
modificada e que respondeu a segunda questão proposta. Uma das conversas que
modificaram o pensamento da professora Cuidado, estava no esclarecimento de quais
textos estávamos falando: um convite feito aos colegas da sala para um aniversário, um
bilhete para a turma do horário contrário, reclamando de alguns brinquedos quebrados
que apareceram na sala em comum, ou então uma carta à diretora da escola, reivindicando
que conserte o balanço quebrado do parque. Ou seja, produzir textos a partir de situações
que as crianças percebam a necessidade de escrever, compreendendo que a escrita tem
uma função, a de comunicar algo a alguém.
Escrever é uma atividade complexa, e elas só sentirão vontade de escrever quando
sentirem uma necessidade inadiável de resolver um problema, conhecer algo novo,
expressar seus sentimentos, dentre outros. Por isso respondemos a próxima questão, que
é a dos objetivos para a Educação Infantil. A produção textual está presente como tal por
oportunizar o contato das crianças com a cultura escrita, afinal os textos fazem parte de
nossas vidas.
Retornando à primeira pergunta sobre a produção de texto coletivo essa se torna
uma rica oportunidade para as crianças refletirem sobre a leitura e a escrita. O professor
inicia sendo o escriba, aquele que escreve, e as crianças vão construindo o texto de modo
que todas vão observando a maneira como o professor registra. Refletem sobre o tempo
que levamos para falar, que é diferente do tempo que levamos para escrever. Pensam
sobre a letra ou a palavra que o colega disse a professora para registrar, percebem a
estrutura do texto, de acordo com o gênero textual previamente escolhido e assim também
podem sistematizar conhecimentos de um estudo, de uma pesquisa, um passeio ou de algo
que queiram registrar. A professora poderá fazer questionamentos; eu quero escrever a
palavra JANELA, como eu posso começar a escrevê-la?
Por fim, o grupo afirma que oportuniza poucas situações de produção de textos
com seus alunos pois pensava ser um conhecimento muito avançado para as crianças da
Pré-escola. E que, a partir de então, vão pensar em mais produção textual com as crianças,
contemplando diversos gêneros textuais, como afirma Firmeza,
160
Tenho procurado formas para cada vez mais inserir gêneros textuais na
minha prática (Firmeza)
Sobre a conclusão e avaliação de nosso curso de formação contínua, que
inicialmente, no planejamento da pesquisa, dissemos que se daria a partir de uma
avaliação formativa contínua, pudemos ter acesso aos registros realizados pelas docentes
em diários de aula, à reflexão sobre a construção de práticas e planejamentos durante
toda a formação, bem como o diálogo compartilhado.
O registro em diário de aula das professoras foi de grande valia. A cada
encontro, os conhecimentos, comentários, reflexões e apontamentos iam sendo anotados,
de modo que ao retomar a leitura de todos esses diários, pudemos verificar o quanto as
professoras refletiram sobre suas práticas e até sobre suas vidas, já que o professor é um
ser completo, constituído de valores profissionais e pessoais. Vejamos os registros da
professora Firmeza,
Obrigada professoras, por oportunizarem esse momento que para mim
não é apenas de formação, é também uma forma de voltar ao meu
passado e refletir sobre a vida. (Firmeza)
Apesar de ter acabado de concluir uma especialização [...] e ter lido uma
pilha de textos para construção do meu artigo, não me recordo ter lido
algo tão interessante como esse texto que acabo de ler (Firmeza)
Essas escritas foram realizadas após a leitura do texto que versava sobre infância
e que mexeu com as experiências pessoais da professora, pois ao longo de suas anotações
registrou questões relacionadas aos seus alunos e à sua própria infância. Nessa vivência
até colou uma fotografia antiga, que mandou restaurar, de seu pai a segurando quando
criança. A fotografia, ela destacou, “é a única que temos juntos”.
Minha infância foi tipo pobre e o pouco acesso que tive a cultura foi
oportunizado pela escola. Tudo eu devo à minha querida escola, onde
tive vários professores que fizeram parte da minha vida/
memória/valores até hoje (Firmeza)
Lendo esse texto vejo que os desafios enfrentados por mim hoje são
históricos e também consigo enxergar uma luz no fim do túnel
(Firmeza)
Talvez essa informação não tenha relevância para sua tese, porém eu
queria compartilhar com vocês e nesse momento (não nesse), no
momento do rascunho eu me emocionei e chorei muito (Firmeza)
161
Na maioria das vezes, um trabalho que tem como objetivo promover reflexão não
pode garantir que haja de fato reflexão, até porque a reflexão é um aspecto muito subjetivo
para ser avaliado. De certa forma os diários nos deram a certeza que houve reflexão, que
houve aprendizagem, porque esses pensamentos e sentimentos foram registrados a partir
da escrita, o que nos possibilitou uma análise profunda de cada registro. Percebam a
reflexão da professora que discorda do que diz o autor no texto, imprimindo o seu lado
firme, mas também engraçado a alguns registros,
E discordo das ideias de Charlot. Aliás: quem é Charlot? Em mais de
20 anos desde que concluí o Magistério que leio teóricos na área de
Educação e nem mesmo na graduação li NADA que ele/ela tenha
escrito (Firmeza)
Espera aí...Vou pesquisar. Descobri Bernard Charlot e antes de
pesquisar vi que no texto diz sociólogo e homem. Afffff. Só podia ser
homem! (Firmeza)
A mesma professora, após a leitura individual de um trecho do texto, que
inclusive transcreveu e destacou em seu diário, falando sobre o medo de pais e professores
estabelecerem regras, fazer acordos, de lidar com as crianças no diálogo e na autoridade,
desabafa, refletindo sobre o seu próprio comportamento diante daquela afirmação
Querido diário, apenas você me compreende, é assim mesmo que me
sinto: ora controlo, ora regulo, ora sequer intervenho (Firmeza)
A professora Criatividade destacou em sua avaliação sobre a formação o
sentimento de medo que sentiu ao saber que a formadora propôs observações em sala de
aula:
Pensando em todo o processo de formação que nos foi proporcionado,
hoje vejo que tivemos uma boa oportunidade de refletir sobre nossa
prática. No início confesso que tive medo (risos). De cara pensar em
estudar é ótimo, mas saber que vai ser observada assusta. A primeira
observação foi bem difícil pra mim. Aquela sensação de ter alguém
olhando tudo o que estava fazendo (Criatividade)
Porém, confessou que com o passar do tempo e observando a maneira como o
retorno dessas observações foi exposto durante a formação, foi ficando mais tranquila e
segura. Além disso, acrescentou que,
162
A cada leitura gostei de poder aprender coisas novas, remexer nos
conceitos antigos, construir novos! (Criatividade)
Achei que a formação como um todo foi muito importante para repensar
minha prática na Educação Infantil e poder reavivar minha criatividade
no trabalho com meus alunos (Criatividade)
Deixou como sugestão o seguinte comentário,
Penso que a observação deveria ser por mais tempo antes da formação
em si, porque muitas atividades têm continuidade e não puderam ser
observadas (Criatividade)
E agradeceu pela oportunidade da formação,
Só tenho a agradecer pela oportunidade e tenho certeza que minha
turma de 2015 terá grandes ganhos por causa de mudança na prática
depois desse momento especial de estudo! (Criatividade)
Esses registros nos deixam comovidas e felizes ao fim de um trabalho complexo
como o de uma pesquisa-ação. Porém ainda gostaríamos de uma avaliação concreta sobre
a prática das professoras. Fomos percebendo ao longo das observações e socialização de
atividades nos encontros de formação que as práticas foram sendo ressignificadas e
proporcionaram a reconstrução de práticas e planejamentos por parte das docentes.
Durante todo o seu diário de aula a professora/coordenadora Humildade, avaliou
o grupo e a dinâmica da prática escolar como um todo. Vejamos:
Percebe-se a inquietação das professoras em apresentar suas práticas
desenvolvidas em sala de aula. Demonstram entusiasmo em suas falas
e isso reflete nas atividades desafiadoras que propuseram aos alunos
(Humildade)
A formação foi muito importante porque comecei a fazer atividades que
despertam a satisfação nos alunos (Humildade)
Um dos desafios é o de conseguir adaptar uma prática pedagógica
voltada para atender às necessidades das crianças, buscando refletir e
analisar a linguagem escrita, sem a pretensão de alfabetizar as crianças
pequenas, ao contrário, proporcionando-lhes vivências relacionadas às
práticas sociais de leitura e escrita (Humildade)
Encontro proveitoso, pois o envolvimento das professoras é
evidenciado nas atividades realizadas em sala de aula. Produção de
textos escritos na parede, leitura compartilhada em voz alta, realizada
pelas crianças (Humildade)
163
A formação veio contribuir para acalmar com nossas inquietações
(Humildade)
Atividades envolvendo músicas e movimentos, brincadeiras com
parlendas, canções rimadas, poemas que brincam com os sons das
palavras, despertando assim as crianças para os sons das palavras
(Muito bom de sentir e ver) (Humildade)
Os comentários da professora realmente nos dizem, com esse olhar diferenciado
de quem observa o grupo de docentes, que a formação provocou mudanças práticas e reais
e nesse sentido, podemos afirmar que, além de comentários sobre a importância da
formação, temos a garantia que houve reflexão e ressignificação das práticas pedagógicas
em leitura e escrita na Educação Infantil.
Diante do diálogo compartilhado, podemos dizer que também avaliamos e
percebemos a qualidade de nossa formação a partir das falas em todo o desenvolvimento
da formação e também a partir de uma avaliação coletiva, realizada oralmente no último
dia da formação. A professora Cuidado revelou em um de nossos encontros que
nunca imaginou que criança com idade dos meus alunos pudessem
chegar ao nível que eles chegaram, escrever palavras e textos como eles
escrevem [...] Eu pensei que nós da Educação Infantil éramos apenas
para ensinar o alfabeto, as vogais, o nome deles e nunca me preocupava
em ensinar a eles a pensar a escrita, a ler (Cuidado)
E registrou seu pensamento no diário de aula. Além disso, apontou no último dia
da formação os pontos positivos e negativos que considerou:
“Ponto positivo”: fazer com que os professores voltem a estudar e
aprender junto com os alunos;
“Ponto negativo”: a formação foi feita em pouco tempo, ainda tinha o
que aprender mais. (Cuidado)
A questão do tempo realmente foi um item apontado por todas nesse momento
final de avaliação coletiva. Se considerarmos que nunca seremos completos e que sempre
teremos algo para aprender, o tempo da formação deverá ser infinito. Não se acaba nessa
formação, ela apenas abre caminhos para outras aprendizagens, se consolidando como
formação contínua, pois nem todas as necessidades de formação relacionadas às práticas
de leitura e escritas foram superadas somente nessa formação. Ainda existem
dificuldades/necessidades complexas e que precisarão de mais estudos, auto formação e
outras formas de formação contínua...
164
O que eu senti dificuldades foi a de aceitar de não corrigir as atividades.
Ainda sinto necessidade de corrigir, parece que não estou avaliando as
atividades que os alunos fizeram (Cuidado)
Em nosso último encontro, compartilhamos com o grupo o agradecimento real e
profundo de desenvolver a formação contínua no CMEI Estela Campelo. Realizamos a
leitura de um texto de Paulo Freire (1996, P.102-103) sobre a profissão professor, pois
percebemos sutilmente, durante muitas vezes, que a falta de valorização profissional por
parte da sociedade como um todo, afetava a vida daquelas professoras, influenciava a
vontade de buscar mais na profissão. A professora Paciência, por exemplo, participou
pouco de nossos encontros, justamente por estar frequentando, nos mesmos horários, sua
segunda graduação em Direito, procurando por esse “mais”. A professora Firmeza traz
em suas falas uma mãe que dizia que ela deveria ser professora, porque ganha pouco mas
não falta trabalho.
Ao finalizarmos a leitura a professora Cuidado se emociona ao lembrar o quanto
já foi discriminada por ter escolhido essa profissão e por achar que muitas vezes não é
capaz. O texto de Freire é adequado, justamente por falar que não podem desistir de lutar.
Todas as professoras decidiram falar sobre a felicidade que tiveram em aprender, e se
emocionaram por estarem se sentindo mais importantes.
As aprendizagens foram inúmeras e respondendo ao comentário da professora
Firmeza que diz em seu diário “não saber o que a formadora aprende com os formandos”,
listamos algumas dessas aprendizagens, que envolveu verdadeira admiração pelo trabalho
desenvolvido na escola pública brasileira. Com as professoras do CMEI Maria Estela
“Sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade contra o
autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de
direita ou de esquerda.
Sou professor a favor da luta constante contra qualquer forma de discriminação, contra a
dominação econômica dos indivíduos ou das classes sociais.
Sou professor contra a ordem capitalista vigente que inventou esta aberração: a miséria na
fartura.
Sou professor a favor da esperança que me anima apesar de tudo.
Sou professor contra o desengano que me consome e imobiliza.
Sou professor a favor da boniteza de minha própria prática, boniteza que dela some se não
cuido do saber que devo ensinar, se não brigo por esse saber, se não luto pelas condições
materiais necessárias sem as quais meu corpo, descuidado, corre o risco de se amofinar e
de já não ser testemunho que deve ser de lutador pertinaz, que cansa, mas não desiste”.
FREIRE (1996, p.102-103)
165
Costa Holanda Campelo, aprendemos que a docência para construir práticas de leitura e
escrita na Educação Infantil/Pré-escola:
- Envolve superação de dificuldades materiais e espaciais,
- Envolve a atenção à vida familiar das crianças,
- Envolve espírito de coleguismo entre os pares,
- Envolve a alegria de aprender a cada dia,
- Envolve encantamento na aprendizagem de cada criança: é o nome que escreve, é a
palavra que consegue lê,
- Envolve principalmente amor às crianças e à profissão.
Por isso, somos gratas à escola pela oportunidade de ensinar e aprender,
reafirmando o que diz Paulo Freire (1996), que não há docência, sem discência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
167
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pesquisar necessidades de formação de professoras da Educação Infantil não se
constituiu em tarefa simples. Embora o trabalho com necessidades formativas seja atual
e relevante, na medida em que é reconhecido em dois importantes decretos legais,
relacionados à política para a formação dos profissionais da Educação (são eles o decreto
de nº 6.755 de 29 de janeiro de 2009 e o de nº 8.752, de 9 de maio de 2016) há quem
enuncia que investigar necessidades de formação profissional parece simplesmente óbvio.
No intuito de desconstruir esse discurso de caráter simplista, este trabalho de tese
nos conduziu por um caminho complexo e desafiador a partir da investigação de
necessidades de formação e nos levou até o desenvolvimento de uma formação contínua
para professoras de Educação Infantil, partindo da questão: que conteúdos devem compor
um curso de formação contínua orientado por Necessidades da Formação Docente de
professoras da Educação Infantil/ Pré-Escola?
A justificativa para a pesquisa nasce da preocupação com o Plano Nacional de
Educação – PNE (2014-2024). No início da pesquisa, as metas direcionadas à formação
de professores nos motivaram durante o percurso investigativo desta tese. Porém, desde
o início do ano de 2016, ou talvez até antes mesmo, portanto, com a escrita da tese em
andamento, a situação política do país tornou a nossa “esperança de dias melhores” em
“dias de dúvidas e incertezas”.
Um quadro de possível desmonte da educação pública do país é real e poderá
desconstruir nosso Plano Nacional. Essa situação é resultado de um contexto amplo de
medidas antidemocráticas governamentais: como a perda da exclusividade da exploração
do Pré-sal e como a aprovação da PEC 55, que reduz os gastos com Educação e Saúde
por vinte anos, dentre vários outras.
Se as metas do PNE não forem cumpridas, como foram planejadas para o período
de dez anos, o desenvolvimento dos índices de aprendizagem de leitura e escrita das
crianças do nosso país estará ameaçado. A partir da Avaliação Nacional da Alfabetização
- ANA (2014), verificou-se que 22,21% dos alunos estão no nível mais baixo de leitura,
E ainda que, apenas 11,2% de crianças brasileiras que estudam em escola pública
possuem o nível esperado de proficiência em leitura, que é o nível quatro. Na escrita, a
avaliação retrata que apenas 9,88% das crianças possuem aprendizagem adequada para
o fim do ciclo de alfabetização e na matemática, 25,15%.
168
Apresentamos os dados da ANA -2014, porque os mesmos refletem os caminhos
trilhados pelas crianças da pré-escola até o final do primeiro ciclo de alfabetização, no 3º
ano. Como não há avaliação da aprendizagem de leitura e escrita na pré-escola, podemos
ter dimensão da aprendizagem das crianças quando elas chegam no ensino fundamental,
onde possui avaliações governamentais. Se não houver investimento para formação
contínua de professores, durante vinte anos, como prevê a PEC 55, por exemplo, esses
percentuais poderão cair ou deixar de evoluir, o que não almejamos.
Finalizando essa discussão política e apresentando alguns dados estatísticos sobre
a educação brasileira, sentimos a necessidade de compreender a colaboração do nosso
trabalho à sociedade, mapeando o conhecimento sobre nossas temáticas na pesquisa:
necessidades de formação, formação contínua e a leitura e escrita.
Assumimos essa pesquisa como “estado da arte” e, a partir da mesma, verificamos
que, no cruzamento das três temáticas em bancos de dados diversos de nossas bibliotecas
e sites acadêmicos, encontramos apenas um trabalho de tese de doutorado, relacionado a
temáticas das necessidades formativas. Ainda assim, o trabalho discutia sobre EJA, o que
nos fez concluir a escassez de pesquisas que versem sobre necessidades de formação na
Educação Infantil e as possíveis contribuições de nossa pesquisa.
Após esse levantamento de dados, no intuito de atingirmos o objetivo desta tese,
de desenvolver um curso de formação contínua orientado por Necessidades da Formação
Docente de professoras da Educação Infantil/ Pré-Escola, necessitamos trilhar nosso
percurso investigativo.
Tomamos empréstimos à Abordagem Qualitativa de Pesquisa, e às metodologias
de Estudo de caso e de Pesquisa ação. Essas escolhas nos permitiram analisar um objeto
em particular – no caso as necessidades de formação de um grupo de professoras de
Educação Infantil/Pré-escola, para partimos para o objetivo mais amplo de desenvolver
um curso de formação contínua.
Diante dessas escolhas metodológicas pudemos constatar que as necessidades que
as professoras vivenciavam no cuidado e educação das crianças estavam relacionadas: ao
planejamento de atividades didático-pedagógicas; ao desenvolvimento da prática
pedagógica nos eixos da leitura, da escrita, da linguagem matemática e das múltiplas
linguagens; ao apoio à própria formação docente; na compreensão do pensamento de
crianças pré-escolares; no atendimento individualizado, sobre regras e limites, a todas as
crianças, particularmente, aquelas com necessidades educacionais especiais; na relação
família x escola; na melhoria da utilização de espaços físicos inadequados e na melhoria
da prática pedagógica, apesar da escassez de materiais.
169
Mesmo cientes das necessidades de formação das professoras, acreditamos que,
para tentar atingir nosso objetivo deveríamos realizar uma discussão sobre as bases das
necessidades de formação. Por isso, promovemos um diálogo entre alguns autores
clássicos das teorias sobre necessidades formativas e sobre a formação contínua de
professores, deixando claro as ideias que sustentam nossa pesquisa.
Nas reflexões teóricas sobre as necessidades de formação contínua dos
professores, percebemos que as necessidades de formação se manifestam do desejo de
atender as demandas sociais e da preocupação com o sucesso das ações de formação. Mas
que possui uma polissemia de sentidos e fins. Que se prestam, inclusive, a subsidiar cursos
de formação contínua, por elucidar objetivos de formação.
Sobre a formação contínua foi importante conhecer suas especificidades, e em
quais aspectos se difere da formação inicial. Além disso, saber que a mesma possui fins
estabelecidos, que podem estar relacionadas à heterogeneidade e aos interesses
profissionais de seu público: professores em diferentes ciclos de desenvolvimento, e
também à velocidade de informações e exigências do mundo globalizado, que gera, além
de mal-estar docente, dificuldades na construção e estruturação de um currículo coerente.
Ademais, compreender as ações políticas no Brasil e os atuais programas de
formação contínua, vigentes, bem como as ações locais de nossa universidade na oferta
de variados cursos pelo PROFOCO, nos tornaram cientes que muito vem sendo feito pela
formação contínua no Brasil, principalmente em nosso Estado, que apresentou no período
entre 2011 e 2013, mais de 4.000 alunos concluintes de cursos de especialização,
aperfeiçoamento e capacitação.
As discussões sobre formação ainda nos fizeram compreender que a escola deverá
ser o centro da formação contínua. E que os aspectos: profissionalismo, reflexão, pesquisa
e auto formação podem contribuir com a transformação dos saberes em uso, em ação,
atingindo, portanto, o maior objetivo da formação contínua.
Cientes da ideia de transformar esse saber em uso, vivenciamos a escolha, junto
às professoras, de uma necessidade de formação para que se tornasse objetivo de nosso
curso de formação. Esse momento nos revelou a necessidade com a temática da Leitura
e Escrita.
Nossas discussões teóricas sobre o trabalho com essa dupla na Educação Infantil
se basearam em uma assunção de práticas que contemplam sim, o ensino e a
aprendizagem dessas linguagens. As crianças precisam ampliar seus contatos com a a
leitura e a escrita. Não queremos e nem devemos antecipar conhecimentos com atividades
sistematizadas de correspondência fonema-grafema, mas sugerimos que os profissionais
170
da Educação Infantil repensem suas práticas sobre o ensino dos princípios do sistema
notacional alfabético e sobre a produção de textos e gêneros textuais.
No mesmo capítulo, apresentamos três caminhos de destaque para o trabalho com
leitura e escrita, observados pelas Brandão e Leal (2010) nas escolas do Brasil, são eles:
“a obrigação da alfabetização”, “o letramento sem letras” e o “ler e escrever com
significado na Educação Infantil”. Defendemos o terceiro caminho como o que mais se
aproxima de nossas ideias, pois acreditamos que as crianças podem ler, refletir sobre a
língua e produzir textos na pré-escola.
No entanto, o capítulo levanta uma crítica feita aos documentos RCNEI (1998) e
as DCNEI (2010) e até à primeira versão da BNCC (2015). Todos parecem querer
“esconder” que poderá haver ensino e aprendizagem da língua na Educação Infantil, se
camuflando em práticas de interações, brincadeiras, deixando o trabalho com a notação
alfabética muito “solta”. Na prática das escolas, sabemos que há um planejamento
direcionado às vivências com a língua, porém o currículo que assuma essa postura parece
estar sendo maléfico as crianças. Nós discordamos. E assim como Morais (2015),
acreditamos que esse entendimento só aumenta a distância entre as crianças de camadas
inferiores das crianças da classe média em diante.
Enfim, com essas discussões clarificadas, chegamos à nossa pesquisa-ação: o
curso de formação contínua orientado pela necessidade Leitura e Escrita. Após a análise
dos dados, baseados na Análise de Conteúdo de Bardin (2011) e Franco (2003), além das
observações realizadas inicialmente nas salas de aulas das professoras, através da
frequência de questões, dúvidas e palavras recorrentes, pensamos em uma ação intitulada:
Ação didático-pedagógica para construção de práticas de leitura e escrita na Educação
Infantil/Pré-escola.
Os procedimentos metodológicos da formação foram organizados em sessões
reflexivas de leitura, observação participante e articulação teoria-prática, desenvolvidos
em observações e encontros quinzenais. Somente a temática do primeiro encontro foi
pensada a priori, todas as outras foram pensadas no decorrer da formação, somadas a
frequência relatada acima. Por exemplo: construção/ elaboração de atividades. De tanto a
palavra e as questões sobre atividades escolares aparecerem nas entrevistas, elas foram
destacadas como um possível conteúdo a ser abordado na formação. Porém, somadas as
dúvidas frequentes de, praticamente todos os encontros e conversas anteriores à
formação, elegemos essa temática para nosso curso.
Vale a pena destacar, o que pode não ter ficado claro no texto, que ao fim do curso,
percebemos que quase todas as necessidades investigadas inicialmente, na primeira etapa
171
da pesquisa, foram contempladas na formação contínua, tais como: planejamento,
atividades didático-pedagógicas; formação docente; pensamento de crianças pré-
escolares; atendimento individualizado, regras e limites, relação família x escola; como
utilizar melhor os espaços físicos inadequados e como planejar vivências com escassez
de materiais. Como as temáticas de matemática, e crianças com necessidades especiais
possuem amplas especificidades, não conseguiríamos abrangê-las no período de tempo
suficiente para imprimir qualidade ao trabalho.
Nesse sentido, apresentamos os conteúdos programáticos da formação (segunda
etapa da pesquisa): concepções de criança, infância e cultura; planejamento na Educação
Infantil/Pré-escola; construção/elaboração de atividades escolares; alfabetização e
letramento; psicogênese da língua escrita; leitura e produção de textos.
Considerando os aspectos científicos que exigem um trabalho acadêmico, algumas
particularidades do trabalho não puderam ser expostas anteriormente. Mas aqui
encontramos espaços para falar da felicidade e alegria que foi realizar essa pesquisa.
Desde o acolhimento como pesquisadora na escola, passando pela conquista da confiança
para observar as aulas de cada professora, até a motivação das professoras e da própria
pesquisadora em todos os encontros de formação. Quanta evolução!
Como é satisfatório percebemos que podemos influenciar a vida de alguém, para
melhor. No início da formação, uma professora especificamente muito desmotivada,
chegou durante o curso, a dizer que queria tentar outra profissão. Ao final dessa ação, a
mesma docente prestou concurso para ser professora de nossa universidade e ainda passou
na primeira fase das provas. Nós verdadeiramente não temos noção de como nossas ações
se ramificam na vida, não só profissional, mas pessoal, de cada um.
Esses sentimentos, vivenciados pelas professoras e pela pesquisadora deram
fôlego à toda a pesquisa. Somos admiradores das práticas dessas professoras que mesmo
sem condições externas, e muitas vezes pessoais, se fizeram presente nos encontros,
motivadas a aprender. Essa disposição a aprender foi o que nos incentivou até a conclusão
dessa pesquisa, até mesmo na etapa mais complexa, de sua escrita final.
A avaliação, como processo contínuo da formação, realizou-se a partir de registros
em diários de aula, reconstrução de planejamentos e práticas e do diálogo compartilhado
nos encontros de formação. A ação formadora foi bem avaliada pelas professoras,
destacando-se um progresso evidente nos conhecimentos teórico-metodológicos, além da
superação de dificuldades no planejamento, nas práticas de leitura e escrita com crianças
e na construção de ‘atividades para casa’.
172
Os resultados do trabalho, portanto, confirmam a tese de que uma formação
contínua para professores da Educação Infantil, que considere as suas necessidades de
formação, contribui na superação de dificuldades encontradas no desenvolvimento da
prática pedagógica com crianças.
REFERÊNCIAS
171
REFERÊNCIAS
ALARCÃO, Isabel. Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001.
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia, LEITE, Tânia Maria Rios. Explorando as
letras na Educação Infantil. In: BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi, ROSA, Ester
Calland de Sousa. Ler e escrever na Educação Infantil: discutindo práticas
pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia. Conceituando alfabetização e letramento. In:
FERRAZ, Carmi Santos; MENDONÇA, Márcia. Alfabetização e Letramento:
conceitos e relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
ALMEIDA, Maria Júlia de Paiva. Análise de necessidades de formação: uma prática
reveladora de objetivos da formação docente. 2014.Tese (Doutoramento em Educação).
Programa de Pós-Graduação em Educação. UFRN, Natal, 2014.
AMARAL, Arlene de Paula Lopes. Formação continuada de professores: reflexões
sobre a participação no pacto nacional pela alfabetização na idade certa. Caderno
Cedes. nº 95, volume 35 – formação continuada e práticas formadoras, em janeiro-abril
de 2015.
ANDRÉ, Marli Eliza D.A de. Etnografia da Prática Escolar. Série Prática Pedagógica.
Campinas: Papirus, 2014.
ANDRÉ, Marli; SIMÕES, Regina H.S.; Carvalho, Janete M.; Brzezinski, Iria. Estado
da Arte da Formação de Professores no Brasil. Educação & Sociedade, ano XX, nº
68, Dezembro/99.
ARCE, Alessandra; MARTINS, Lígia Márcia. Quem tem medo de ensinar na
educação infantil: Em defesa do ato de ensinar. Campinas, SP: Editora Alínea, 2007.
AURELIANO, Francisca Edilma Braga Soares. O Programa pró-letramento e a
formação de alfabetizadores: repercussões nas concepções e práticas de professores
cursistas. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em
Educação. UFRN, Natal, 2012.
BARBOSA, Tatyana Mabel Nobre; NORONHA, Claudianny Amorim. Linguagens e
práticas escolares: leitura, literatura e escrita. Natal, EDUFRN, 2014. Coleção
CONTAR – Linguagens e Educação Básica.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.
BAUER, Adriana. Formação continuada de professores para alfabetização: avaliação de
impacto do Programa Letra e Vida. 34ª Reunião Anual da ANPED – Educação e
Justiça Social. GT 08 - Formação de Proessor. Natal/RN. 2011.
BAUER, Martin W., GASKELL, George. Pesquisa Qualitativa com texto: imagem e
som: um manual prático. 8. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
172
BAUER, Martin W; AARTS, Bas. A construção do corpus: um princípio para a coleta
de dados qualitativos. In: BAUER, Martin W., GASKELL, George. Pesquisa
Qualitativa com texto: imagem e som: um manual prático. 8. ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2010.
BCG – The Boston Consulting Group; IAS – Instituto Ayrton Senna. Formação
continuada de professores no Brasil: acelerando o desenvolvimento dos nossos
educadores. 2014
BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação Qualitativa em Educação: uma
introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto, 2013.
BORDEST, Suíse Monteiro Leon. et. al. Educação Ambiental Mediando Sentidos e
Interpretações. Estudos De Caso. Disponível em:
http://www.5iberoea.org.br/artigos/i_fichatrabalho. Acesso em 12 fev. 2016.
BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi; LEAL, Telma Ferraz (Org.). Alfabetizar e letrar na
Educação Infantil: o que isso significa? In: BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi; ROSA,
Ester Calland de Sousa (Orgs.). Ler e escrever na Educação Infantil: Discutindo
práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. Cap. 1, p. 13-31.
BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi; LEAL, Telma Ferraz, NASCIMENTO, Bárbhara
Elyzabeth Souza. Conversando sobre textos na alfabetização: o papel da mediação
docente. Número 90, Volume 33 – Alfabetização em Foco, em maio-agosto de 2013.
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. M1U10T5 –
Contribuições à prática pedagógica – 5. In: Programa de formação de professores
alfabetizadores. Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. M1U3T9 – Amostras
de escrita para análise. In: Programa de formação de professores alfabetizadores.
Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. M1U7T8 – Soligo,
Rosaura. Para ensinar a ler. In: Programa de formação de professores
alfabetizadores. Brasília, DF, 2001. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Programa de
formação de professores alfabetizadores. Brasília, DF, 2001. Módulo I, II, III.
(Coletânea de Textos).
BRASIL. BASE NACIONAL CURRICULAR COMUM – BNCC. 2ª versão revista.
Proposta Preliminar. Abril de 2016.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CEB nº 20/2009. Revisão das
Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil. Brasília, 2009.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei Federal nº 8.069\1990. Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Santa Maria: Editora Pallotti,
2003.
BRASIL. LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/96
173
BRASIL. MEC/CNE. Resolução CNE/CP nº 1/2002. Diretrizes Curriculares
Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior,
curso de licenciatura e de graduação plena. Câmara de Educação Básica. Brasília, 18
de fevereiro de 2002.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, vols.
I, II e III, 2001.
BRASIL. Plano Nacional de Educação (PNE) 2001-2010. Lei n. 10.172, de 9/1/2001.
Estabelece o Plano Nacional de Educação. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jan.
2001.
BRASIL. Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024. Lei nº 13.005, de 25 de
junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras
providências. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2014.
BRASIL. Política Nacional de Educação Infantil. Ministério da Educação. Secretaria
de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, 1994.
BUJES, Maria Isabel Edelweiss. Escola infantil: Pra que te quero? In: CRAIDY,
Carmem Maria & KAERCHER, Gládis Elise P. da Silva. Educação infantil: Pra que te
quero? Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.
CAMPELO, Maria Estela Costa Holanda. Alfabetizar crianças: um ofício, múltiplos
saberes. Tese (Doutorado em Educação) Natal, 2001, 257p. Centro de Ciências Sociais
Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.
CAMPELO, Maria Estela Costa Holanda. Evolução das conceitualizações sobre a
escrita, segundo Emília Ferreiro (1990). 2013. 4ª versão.
CAMPELO, Maria Estela Costa Holanda. Oportunizar/obstar a alfabetização da criança:
afinal em que consiste a mediação do professor? In: Anais do II Colóquio Franco-
brasileiro Educação e Linguagem, vol. 2. Natal: EDUFRN, 1996, p.186-194.
CAMPELO, Maria Estela Costa Holanda. Psicogênese da língua escrita: referência
fundamental para a compreensão do processo de alfabetização. Revista Educação em
Questão, Natal, v. 53, n. 39, p. 4-9, set./dez. 2015.
CAMPOS, Rebeca Ramos. Necessidades de formação de professoras principiantes
da educação infantil/pré-escola. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-
Graduação em Educação – PPGEd. UFRN. 2012.
CANDAU, Vera Maria Ferrão. Formação continuada de professores/as: questões e
buscas atuais. Revista Novamerica. nº 122. Formação do Educador. 1996. Rio de
Janeiro.
CANDAU, Vera Maria Ferrão. Ser professor/a hoje: novos confrontos entre saberes,
culturas e práticas. Revistas Eletrônicas. Educação. Porto Alegre.2014
CHARLOT, Bernard. A mistificação pedagógica: realidades sociais e processos
ideológicos na Teoria da Educação. Rio de Janeiro: Zahar. 1979.
174
COUTINHO, Marília Lucena. Psicogênese da língua escrita: o que é? Como intervir em
cada uma das hipóteses? Uma conversa entre professores. In: MORAIS, Artur Gomes;
ALBUQUERQUE, Eliana; LEAL, Telma Ferraz. Alfabetização: apropriação do sistema de escrita alfabética. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p.47-69.
D’HAINAUT, L. L’interdiscplinarité et l’integratión. Programmes d’etudes et
éducation permanente. Paris: Unesco, pp 205-233. 1979.
DOURADO, Luis Fernando. (Org.). Plano Nacional de Educação (2011-2020):
avaliação e perspectivas. 2.ed.Goiânia: Editora UFG; Belo Horizonte: Autêntica
Editora, 2011.
EDWARDS, Carolyn. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia
na educação da primeira infância/Carolyn Edwards, Lella Gandini, George Forman;
trad. Dayse Batista. Porto Alegre: Artmed, 1999.
ENGEL, G. I. Pesquisa-ação. Educar em Revista, nº. 16. 2000. Universidade Federal
do Paraná. Paraná. Brasil. 2000.
ESTEVE, José M. Mudanças Sociais e Função Docente. In: NÓVOA, Antônio.
Profissão Professor. 2.ed. Porto: Porto, 1999, p. 93-124.
ESTRELA, Albano. Formação contínua de professores: uma exigência para a formação
educacional. In: POPKWEITZ, Thomas. S; NÓVOA, António. Reformas educativas e
formação de professores. Lisboa: Educa, 1992.
FAZENDA, Ivani. Metodologia da Pesquisa Educacional. 12.ed. São Paulo: Cortez,
2010.
FERREIRO, Emília, TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
FERREIRO, Emilia. Com todas as letras. São Paulo. Cortez Editora. 14 ª edição. 2007.
FERREIRO, Emilia. Cultura escrita e educação: conversas de Emilia Ferreiro com
José Antonio Castorina, Daniel Goldin e Rosa María Torres. Tradução Ernani Rosa.
Porto Alegre: Artmed, 2001.
FERREIRO, Emilia. O Ingresso na escrita e nas culturas do escrito: seleção de textos
de pesquisa. Tradução de Rosana Malerba. São Paulo: Cortez, 2013.
FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
FLICK, Uwe. Introdução à pesquisa qualitativa. 3.ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
FORBES, Jorge. Você quer o que deseja? 5ª ed. Rio de Janeiro: Best Seller, 2005.
FRANCO, Maria Laura Puglisi Barbosa. Análise de Conteúdo. Brasília: Plano Editora,
2003.
175
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1967.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.
São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura).
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
GARCIA, Carlos Marcelo. A Formação de Professores: Novas Perspectivas Baseadas
na Investigação Sobre o Pensamento do Professor. In: NÓVOA, Antônio. Os
Professores e a sua Formação. Publicações Dom Quixote. Lisboa. 1995.
GATTI, Bernardete A. Formação plena para os professores. Fundação Carlos
Chagas: Difusão de Ideias. Dezembro/2006.
GATTI, Bernardete A; BARRETO, Elba Siqueira de Sá. Professores do Brasil:
impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009.
GHEDIN, E.; FRANCO, M. A.S. Introdução. In: PIMENTA, S. G., GHEDIN, E. &
FRANCO, M. A. S. (Orgs). Pesquisa em educação: Alternativas com objetos
complexos. São Paulo: Edições Loyola, 2006.
GIRÃO, Fernanda Michelle Pereira; BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi. Ditando e
escrevendo: a produção de textos na Educação Infantil. In: BRANDÃO, Ana Carolina
Perrusi, ROSA, Ester Calland de Sousa. Ler e escrever na Educação Infantil:
discutindo práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
GIROUX, Henry. Los profesores como intelectuales. Piados: Barcelona. 1990. p. 171-
178.
GOMES, Romeu. A análise de dados em pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M. C.
S. Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1998.
HAUTRIVE, Giovana Medianeira Fracari, BOLZAN, Doris Pires Vargas.
Aprendizagem da docência alfabetizadora no contexto da surdez. 36ª Reunião Anual
da ANPED – Sistema Nacional de Educação e Participação Popular: Desafios para
as Políticas Educacionais. GT 08 - Formação de Professor. Goiânia/GO. 2013.
HUBERMAN, Michäel. O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA,
Antônio. Vidas de Professores. Porto: Porto, 2007.
IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios. Taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos
ou mais de idade, por sexo - Brasil - 2007.
IMBERNÓN, Francisco. La formación y el desarrollo professional del profesorado:
Hacia uma nueva cultura profesional. 3.ed. Barcelona: Graó, 1998.
IMBERNÓN, Francisco. REVISTA NOVA ESCOLA. Gestão Escolar. Edição 014.
Junho/Junlho 2011.
176
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo
Escolar da Educação Básica 2013: resumo técnico. Brasília: O Instituto, 2014.
JOSSO, Marie-Christine. Experiências de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação.
5. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
KRAMER, Sônia. A Infância e sua singularidade: In: BEAUCHAMP, J; PAGEL,
Sandra D; NASCIMENTO, Aricélia R. do. (Orgs). Ensino Fundamental de nove
anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos. Brasília: MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Básica, 2007, p.13-23.
KUHLMANN JR. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. 4.ed. Porto
Alegre: Mediação, 2007.
LEAL, Telma Ferraz Leal, SILVA, Alexsandro da. Brincando, as crianças aprendem a
falar e a pensar sobre a língua. In: BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi, ROSA, Ester
Calland de Sousa. Ler e escrever na Educação Infantil: discutindo práticas
pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
LEAL, Telma Ferraz Leal; FERREIRA, Andrea Tereza Brito. Formação continuada e
ensino da escrita: análise de estratégias formativas utilizadas no programa Pró-
Letramento. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Volume 92. Número 231.
maio/ago. 2011
LEAL, Telma Ferraz; GOIS, Siane (Orgs.). A oralidade na escola: a investigação do
trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.
LEITE, Teresa Maria de Sousa dos Santos. Necessidades de Formação Contínua de
Professores em Relação à Integração dos alunos com necessidades educativas
especiais no sistema regular de Ensino. Lisboa, 1997, 254 p. Dissertação de Mestrado
em Ciências da Educação. Universidade de Lisboa.
LERNER, Delia. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. 2002.
LIBERALI, Fernanda Coelho. Formação Crítica de Educadores: questões
fundamentais. Taubaté, SP: Cabral Editora e Livraria Universitária, 2008.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Prática Escolar: do erro como fonte de castigo ao erro
como fonte de virtude, 1999. Disponível em: PDF
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_08_p133-140_c.pdf. Acesso em:
10/09/2015.
LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli Elisa D. Afonso. Pesquisa em Educação: abordagens
qualitativas. São Paulo: EPU, 1986, 99 p. (Temas Básicos de Educação e Ensino).
MALGLAIVE, Gerard. Ensinar Adultos. Porto: Porto Editora, 1995.
MASLOW, A.H. A theory of human motivation. Psycologhical Review, 50: 390-6,
1943.
177
MASLOW, A.H. Motivation and personalitty. New York, Harper, 1954.
MIGNOLO, Walter D. Novas reflexões sobre “Ideia da América Latina”: a direita, a esquerda e a opção descolonial. Caderno CRH, v.21, n.53, p. 239-252 (2008).
MIRANDA, Marília G.de. O professor pesquisador e sua pretensão de resolver a
relação entre teoria e prática na formação de professores. In: O papel da pesquisa na
formação e na prática dos professores. Campinas: Papirus, 2006, p.129-143.
MONTAIGNE, Michel de. Os ensaios. Tradução de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo:
Companhia das Letras, 2010.
MONTEIRO, Maria Lourdes. Las necessidades formativas de los professores como
enfoque de la formación em servicio: análisis de uma investigación. Revista de
Investigación Educativa. 5 (9). 1987, p. 7-31.
MORAIS, Artur Gomes de, SILVA, Alexandro da. Consciência fonológica na
Educação Infantil: desenvolvimento de habilidades metalinguísticas e aprendizado da
escrita alfabética. In: BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi, ROSA, Ester Calland de
Sousa. Ler e escrever na Educação Infantil: discutindo práticas pedagógicas. Belo
Horizonte: Autêntica Editora, 2010.
MORAIS, Artur Gomes de. Se a escrita alfabética é um sistema notacional (e não um
código), que implicações isso tem para a alfabetização? In: MORAIS, Artur Gomes de;
ALBUQUERQUE, Eliana Borges C. de; LEAL, Telma Ferraz (Org.). Alfabetização:
apropriação do sistema de escrita alfabética. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
MORAIS, Artur Gomes de. Base Nacional Comum Curricular: que direitos de
aprendizagem relativos à língua escrita defendemos para as crianças na educação
infantil? Revista Brasileira de Alfabetização. Revista Brasileira de Alfabetização –
ABAlf. Vitória, ES, v. 1, n. 2, p. 161-173, jul./dez. 2015.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez;
Brasília, DF : UNESCO, 2003.
MOSS, Peter. Reconceitualizando a infância: crianças, instituições e profissionais. In:
MACHADO, M. L. de A. (org.) Encontros e desencontros em educação infantil. São
Paulo: Cortez, 2002.
NATAL. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal de Meio Ambiente e
Urbanismo. Natal e sua Região Metropolitana / Secretaria Municipal de Meio
Ambiente e Urbanismo. Natal (RN): Setor de Pesquisa e Estatística, SPE, 2006.
NÓVOA, Antônio. Formação de professores e profissão docente. In: NÓVOA, Antônio.
Os Professores e a sua Formação. Publicações Dom Quixote. Lisboa. 1995.
NÓVOA, Antônio. Matrizes Curriculares. Entrevista concedida à Revista Salto para
o Futuro /TV Brasil. Realizada em 13/09/2001. Disponível em:
http://tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=59. Acesso em: 06
jan. 2016.
178
NÚÑEZ, Isauro Beltrán; RAMALHO, Betânia Leite. A profissionalização da
docência: um olhar a partir da representação de professores do ensino fundamental.
Revista Iberoamericana de Educación. ISSN: 1681-5653. Nº 46/9. 2008.
OLIVEIRA, Luciana Ribolli de. Educação continuada: um estudo sobre participantes
dos programas letra e vida e ler e escrever. 36ª Reunião Anual da ANPED – Sistema
Nacional de Educação e Participação Popular: Desafios para as Políticas
Educacionais. GT 08 - Formação de Professor. Goiânia/GO. 2013.
OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação Infantil: Fundamentos e Métodos. 3 ed. São
Paulo: Cortez, 2007.
PADILHA, P. R. Planejamento Dialógico: como construir o projeto político
pedagógico da escola. São Paulo: Cortez, 2001.
PARRAT-DAYAN, Silvia. Como enfrentar a indisciplina na escola. São Paulo:
Contexto, 2008.
PEC 241-55/2016. Proposta de Emenda à Constituição. Brasília, 15 de Junho de
2016.
PÉREZ GÓMES, Angel. O pensamento prático do professor. A formação do professor
como profissional reflexivo. In: NÓVOA, António (Org.). Os professores e a sua
formação. 2. ed. Lisboa: Dom Quixote, 1995. p. 93-114.
PERRENOUD, Philippe. Formação Contínua e Obrigatoriedade de Competências na
Profissão de Professor. In: Sistema de Avaliação Educacional, n.30, São Paulo: FDE,
1998, p.205-251 (Séries Ideias).
PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2007.
PINEAU, Gaston. A auto formação no decurso da vida. Centro de Educação
Transdisciplinar. CETRANS. 1985. Disponível em:
http://forumeja.org.br/files/autopineau.pdf. Acessado em: 01/09/2016.
POPKEWITZ, T.; PEREYRA, M. Práticas de reforma na formação de professores em
oito países: esboço de uma problemática. In: NÓVOA, A.; POPKEWITZ T.
(Org.). Reformas educativas e formação de professores. Lisboa: Educa, 1992. p. 11-
41.
POPKEWITZ, Thomas S. Profissionalização e formação de professores: algumas notas
sobre a sua história, ideologia e potencial. In: NÓVOA, Antônio. Os Professores e a
sua Formação. Publicações Dom Quixote. Lisboa. 1995.
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO - PPP. Centro municipal de Educação
Infantil (CMEI) Professora Maria Estela Costa Holanda Campelo (nome fictício).
Natal/RN. 2011.
PRÓ-LETRAMENTO. Programa de Formação Continuada de Professores dos
Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental: alfabetização e linguagem. – ed. rev. e
179
ampl. Incluindo SAEB/Prova Brasil matriz de referência/ Secretaria de Educação Básica
– Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.
RABELO, Clotenir Damasceno. Papel do município e relações federativas: atuação de municípios cearenses na política de formação continuada de alfabetizadores. 2014.
Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação.
UFRN, Natal, 2014.
RODRIGUES, Ângela; ESTEVES, Manuela. A análise de necessidades na formação
de professores. Porto: Porto, 1993.
RODRIGUES, Maria Ângela Perpétua. Análise de Práticas e de necessidades de
formação. Ciências da Educação, 50. Direção Geral de Inovação e de desenvolvimento
curricular. Lisboa. 2006.
RODRIGUES, Maria Ângela. Análise de práticas e de necessidades de formação.
Lisboa: direção geral de inovação e de desenvolvimento curricular, 2006. (Ciências da
Educação; 50).
ROMANOWSKI, J.; ENS, R. As pesquisas denominadas do tipo “estado da arte”
em educação. Diálogo Educacional, Curitiba, v. 6, n. 19, p. 37-50, set./dez. 2006.
ROSADO, Cristine Tinoco da Cunha Lima. Vozes não silenciadas de alfabetizandos
jovens e adultos e suas repercussões na formação docente. 2013. Tese
(Doutoramento em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação. UFRN,
Natal, 2013.
SANTOS, Adele Guimarães Ubarana. NÃO É QUE EU SEI SER PROFESSORA!
Formação continuada e construção do currículo da Matemática para o ciclo de
alfabetização. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação
em Educação. UFRN, Natal, 2013.
SANTOS, Carmi Ferraz; ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia. Alfabetizar
letrando. In: FERRAZ, Carmi Santos; MENDONÇA, Márcia. Alfabetização e
Letramento: conceitos e relações. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
SANTOS, G. T.; ROSSI, G.; JARDILINO, J. R. L. Orientações metodológicas para
elaboração de trabalhos acadêmicos. 2 ed. São Paulo: Gion Editora, 2000.
SCHÖN, Donald A. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA,
Antonio. Os professores e sua formação. 2.ed. Lisboa: IIE/D. Quixote, 1995
SEMESP - Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior. Mapa do Ensino Superior
no Brasil. 2015.
SOARES, Magda Becker. Alfabetização e Letramento. São Paulo: Contexto, 2003.
SOARES, Magda Becker. Aprender a escrever, ensinar a escrever. In: A magia da
linguagem. Rio de Janeiro: DP&A:SEPE, 1999.
SOARES, Magda Becker. Letramento em texto didático: o que é Letramento e
Alfabetização. In: SOARES, Magda Becker. Letramento: um tema em três gêneros.
Belo Horizonte: Autêntica, 1996, p. 27-60.
180
SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica,
2003.
SOARES, M. Alfabetização e letramento na Educação Infantil. In: Revista Pátio Educação Infantil, ano VI, n. 20, Porto Alegre: Artmed, jul./out.2009.
SPINOZA, Baruch de. Ética. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2007.
STEMMER, Maria Regina Goulart S. Linguagem Infantil: oralidade, escrita e gêneros
do discurso In: ARCE, Alessandra; MARTINS, Lígia Márcia. Quem tem medo de
ensinar na educação infantil: Em defesa do ato de ensinar. Campinas, SP: Editora
Alínea, 2007.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes,
2002.
TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O Ofício de professor: histórias, perspectivas
e desafios internacionais. 5. ed.- Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.
THERRIEN, J., & NÓBREGA-THERRIEN, S. Os trabalhos científicos e o estado da
questão: reflexões teórico-metodológicas. Estudos em avaliação educacional, v.15,
n.30, jul.-dez. 2004.
THEOBALDO. Maria Cristina. Sobre o “Da educação das crianças”: a nova maneira
de Montaigne. 2008. Tese (Doutorado em Filosofia). Programa de Pós-graduação em
Filosofia da USP. Universidade de São Paulo. São Paulo.
THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. 18.ed. São Paulo: Cortez, 2011.
TRIPP, David. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa,
São Paulo, v. 31, n. 3, set./dez. 2005, p. 443-466. Tradução de Lólio Lourenço de
Oliveira.
UBARANA, Adélia Dieb. Em que contextos aprenderam a ensinar os professores
que propiciam aprendizagens pertinentes à alfabetização? 2011. Tese
(Doutoramento em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação. UFRN,
Natal, 2011.
VIEIRA, Giane Bezerra. Alfabetizar letrando: investigação-ação fundada nas
necessidades de formação docente. 2010. 331 f. Tese (Doutoramento em Educação).
Programa de Pós-Graduação em Educação, UFRN, Natal, 2010.
VIGOTSKY, L.S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos
psicológicos superiores. 7.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
YIN, Robert K. Estudo de caso: Planejamento e Métodos. Tradução: Daniel Grassi.
Porto Alegre: Bookman, 2001.
ZABALZA, Miguel A. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e
desenvolvimento profissional. Porto Alegre: Artmed. 2004.
181
ZABALZA, Miguel A. Qualidade em educação infantil. Tradução Beatriz Affonso
Neves. Porto Alegre: Artmed, 1998.
ZEICHNER, K. Beyond the divide of teacher research and academic research. Teachers and teaching: Theory and Practice, v. 1, n. 2, p. 153-172, 1995.
ZEICHNER, Kenneth M. Para além da divisão entre professor-pesquisador e
pesquisador acadêmico. In: GERALDI, Corinta M.; FIORENTINI, Dario & PEREIRA,
Elisabete M. (orgs.) Cartografia do trabalho docente: professor(a)-pesquisador(a).
Campinas, Mercado de Letras? ABL, 1998.
APÊNDICES
183
APÊNDICES
PROTOCOLO DE REGISTRO DOS ENCONTROS DE FORMAÇÃO
Entrevista coletiva semiestruturada com as professoras (apêndice) – dia 17 de setembro de 2014
Início – 13h término - 15:30h
Objetivos
- Destacar critérios para a escolha da temática para a formação-ação
- Apresentar, em linhas gerais e iniciais, a importância do conhecimento sobre os documentos legais que
sustentam a Educação Infantil
- Apresentar e ler a categorização resultante dos dados das entrevistas (coletiva e individuais) e observações
iniciais
- Discutir sobre o percurso metodológico da formação-ação
- Refletir sobre a escolha da grande temática para a formação-ação
- Esclarecer questionamentos sobre certificação e resultados da pesquisa
- Definir as datas dos próximos encontros
- Agendar novas observações
Metodologia
- Leitura compartilhada das categorias
- Conversa sobre a fidelidade da categorização
- Reflexão de uma temática/necessidade de formação que seja significativa para a escola e para as professoras
respeitando os documentos legais que sustentam a Educação Infantil
- Definição da grande temática pelo grupo: Escrever e Ler na Pré-Escola
- Esclarecimentos sobre a certificação de uma pesquisa-formação
- Discussão sobre o conhecimento da pesquisa pela Secretaria de Educação
- Distribuição de cronograma para ajustes de datas
Observações
Inicialmente havíamos pensado em uma eleição para definição da grande temática de formação-ação, relacionada
às necessidades de formação. Após as observações realizadas em sala de aula, anteriores a esse encontro, pudemos
perceber que havia um dos temas que se constituía como base para todos os outros a serem esclarecidos. As
professoras se mostraram favoráveis à essa reflexão e à temática escolhida para a formação.
184
Primeira sessão reflexiva – dia 01 de outubro de 2014
Início – 13h término - 17:30h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo referente ao encontro anterior
- Esclarecer orientações para a construção de um diário de aula
- Discutir os conceitos de criança, infância e cultura
- Dialogar sobre a criança que está no planejamento da escola
- Relacionar a leitura de texto com a prática e com o planejamento das professoras
- Ajustar informações para o próximo encontro
Metodologia
- Leitura compartilhada do texto: KRAMER, Sônia. A Infância e sua singularidade: In: BEAUCHAMP, J; PAGEL,
Sandra D; NASCIMENTO, Aricélia R. do. (Orgs). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão
da criança de seis anos. Brasília: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Básica, 2007, p.13-23
- Diálogo entre a leitura compartilhada em pontos significativos para as professoras
- Discussão sobre temas suscitados pelo texto: criança, infância, cultura
- Relação constante com as situações práticas do dia a dia escolar
- Realização de questão sobre o estudo do texto relacionada à prática: as atividades realizadas na escola contemplam
a cultura que a criança está inserida?
- Fechamento da próxima data para o encontro de formação
Observações
A discussão do texto foi proveitosa na medida em que as professoras relacionavam a leitura do texto às situações
de suas práticas na escola e às crianças da turma. Além das temáticas gerais do texto, como criança, infância e
cultura, outras foram suscitadas como: a escola como espaço de ser criança, o desaparecimento da infância e o papel
do professor na formação da criança crítica. Além disso a questão realizada estimulou a reflexão das que estavam
presentes ao perceberem que tudo o que produzem na escola está coberto de sentidos e significados, por isso, como
professoras, devem estar atentas aos seus planejamentos.
185
Segunda sessão reflexiva - dia 13 de outubro de 2014
Início – 13:00h término - 17:30h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo do encontro anterior
- Orientar as professoras na construção de um diário de aula: necessidade de esclarecer as explicações
anteriores
- Apresentar e discutir os conceitos de alfabetização e letramento segundo as autoras Brandão e Rosa (2010)
- Analisar caminhos para o trabalho com a leitura e a escrita na Educação Infantil
- Apresentar e dialogar sobre os registros de observações, de cada turma, estabelecendo relação com o texto
- Esclarecer o papel das observações para a pesquisa
- Realizar questão dirigida sobre o estudo que possua relação direta com a prática escolar
- Apreciar vídeo sobre Alfabetização/ Apropriação do Sistema Alfabético
- Definir data para o próximo encontro de formação
Metodologia
- Diálogo Inicial: dúvidas sobre a construção do diário de aula
- Leitura compartilhada do texto: 1.2: BRANDÃO, Ana Carolina P; LEAL, Telma Ferraz. Alfabetizar e
letrar na Educação Infantil: o que isso significa? In: BRANDÃO, Ana Carolina P; ROSA, Ester Calland de
S. (Orgs). Ler e Escrever na Educação Infantil: discutindo práticas pedagógicas. Belo Horizonte:
Autêntica Editora,2010, p.13-31.
- Discussão sobre três caminhos possíveis para esse trabalho: a obrigação da alfabetização, o letramento
sem letras e ler e escrever com significado na Educação Infantil
- Relação dos registros de observação com os caminhos possíveis mencionados pelas autoras do texto
- Questão sobre o estudo: qual desses caminhos vocês acreditam que seja o mais pertinente? Por quê?
- Agendamento para o próximo encontro
Observações
As questões sobre o estudo sempre dinamizam o grupo, às vezes cansado, outras vezes tímido, com receio
de se expor. A cada encontro, o grau de intimidade vai se afinando e a fala vai ficando mais solta. Além do
que foi planejado, vieram à tona discussões sobre as atividades enviadas para casa, dúvidas sobre cópia,
letra maiúscula e cursiva, cobrança dos pais da escola e a história de vida de cada professor.
186
Terceira sessão reflexiva – dia 28 de outubro de 2014
Início – 8h término - 12:00h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo do encontro anterior
- Marcar data para reunião com os pais
- Conversar sobre importância do planejamento alicerçado nos objetivos para leitura e escrita na Educação
Infantil/Pré-escola de acordo com os documentos oficiais, como o RCNEI, chamando atenção para os gêneros
textuais
- Apresentar a psicogênese da língua escrita como conhecimento da língua e não como método de alfabetização
- Dialogar sobre o conhecimento das hipóteses de escrita e como intervir diante de cada uma delas
- Analisar, ordenar e socializar amostras de escritas individualmente. BRASIL, Ministério da Educação.
Secretaria de Educação Básica. M1U3T9 – Amostras de escrita para análise. In: Programa de formação de
professores alfabetizadores. Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
- Socializar algumas atividades construídas a partir das observações realizadas
- Apreciar vídeo no Youtube/ Alfabetização – apropriação do sistema alfabético – Parte 1 (13:13 min) Aula da
professora Solange (9 min). Parte 2 (7:58)
Metodologia
- Leitura compartilhada do texto 1.3: BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica.
M1U10T5 – Contribuições à prática pedagógica – 5. In: Programa de formação de professores
alfabetizadores. Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
- Relacionar a discussão sobre planejamento (texto 1.3) com a segurança do trabalho pedagógico em relação a
escola e aos pais
- Leitura compartilhada do texto 1.4: COUTINHO, Marília Lucena. Psicogênese da língua escrita: o que é?
Como intervir em cada uma das hipóteses? Uma conversa entre professores. In: MORAIS, Artur Gomes;
ALBUQUERQUE, Eliana; LEAL, Telma Ferraz. Alfabetização: apropriação do sistema de escrita alfabética.
Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p.47-69.
- Análise e ordenação individual das amostras de escritas pré-selecionadas pela pesquisadora
- Socialização da atividade a partir da leitura do texto 1.4
- Apresentar atividades e escutar opinião das colegas sobre sua construção, referente a aula que a pesquisadora
observou
- Apreciação do vídeo (situações práticas em uma sala de alfabetização) como forma de confirmar ou não as
questões discutidas durante o encontro
Observações
Não houve tempo para a socialização das atividades das professoras, nem para a conclusão da atividade de
ordenação e socialização das amostras de escritas. Por questões técnicas, o vídeo também não foi apreciado, mas
ficou como atividade de casa para as professoras, a ser discutido no encontro seguinte. Durante a leitura do texto,
bem como nos momentos de discussão assuntos como: tarefas de mesa, correção de cadernos na Educação
Infantil, o trabalho com limites e regras (ser firme e doce), os usos e funções da escrita, contextualização das
atividades, alfabetizar letrando, livros com letra bastão, cantinhos da leitura, o trabalho com as letras e o alfabeto
e o sistema alfabético como sistema notacional (representação) foram lançados e fizeram deste encontro o mais
longo e participativo.
187
Quarta sessão reflexiva – dia 13 de novembro de 2014
Início – 13h término - 17:00h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo do encontro anterior
- Realizar uma introdução motivacional sobre a valorização do professor
- Reforçar a importância da construção do diário de aula
- Apresentar um quadro sobre a evolução das conceptualizações sobre a escrita, como material de estudo para
realização da atividade de ordenar amostras de escritas – Texto 1.5: CAMPELO, Maria Estela Costa Holanda.
Evolução das conceitualizações sobre a escrita, segundo Emília Ferreiro (1990). 2013. 4ª versão (já que o
tempo do encontro anterior foi insuficiente)
- Auxiliar as professoras na ordenação e socialização das amostras de escritas. BRASIL, Ministério da Educação.
Secretaria de Educação Básica. M1U3T9 – Amostras de escrita para análise. In: Programa de formação de
professores alfabetizadores. Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos).
- Continuar a leitura do texto 1.2 a partir da página 21, evidenciando a parte prática que sugere atividades para
cada nível de conceptualização da escrita
- Socializar atividades (já que não houve tempo no encontro anterior)
- Ajustes para o próximo encontro
Metodologia
- Início com diálogo de motivação dos professores
- Reforçar a importância do diário de aula como fonte de consulta pessoal de estudos posterior à pesquisa
- Apresentação do texto 1.5 (quadro sobre a evolução das conceitualizações sobre a escrita)
- Cada professora socializará como ordenou suas amostras de escritas e irá comparar com a das colegas, em
seguida, a pesquisadora apresentará a lista correta de ordenação
- Momento para dúvidas e esclarecimentos sobre a atividade
- Seguir com a leitura do final do texto 1.2, específico para aplicação de ideias de atividades em cada nível de
conceptualização da escrita
- Socializar e dialogar sobre as atividades construídas pelas professoras
- Conversar sobre a data do próximo encontro
Observações
A “pré-pauta” de cada encontro é uma maneira de organizar a formação antecipadamente. O pesquisador elenca
o que planejou para a aula. Porém ela quase que, inevitavelmente, se modifica. Existe um norte, mas que não se
fecha. Na verdade, a aula de hoje se enriqueceu com as discussões sobre: consciência fonológica x método
fônico, atividades com alfabeto e os seus objetivos, além das exigências dos pais em relação ao visto nos
cadernos, tema que persiste em quase todos os encontros. As professoras se sentem pressionadas. Ainda não
conseguimos socializar as atividades das professoras e estão se sentindo angustiadas, esse momento não poderá
faltar no próximo encontro. Em relação à socialização das observações, não tivemos um momento específico
para isso, porém o planejamento desse encontro, bem como as pausas estratégicas no texto para as discussões
elaboradas pela pesquisadora mantinha relação intrínseca com o que fora observado.
188
Quinta sessão reflexiva – dia 24 de novembro de 2014
Início – 13h término - 16:00h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo do encontro anterior
- Perguntar às professoras se estão tendo dificuldades de escrever no diário de aula
- Oferecer um retorno ao grupo sobre a reunião com os pais
- Compartilhar as observações das aulas e atividades construídas pelas professoras
- Indicar mais uma vez, o vídeo sobre Alfabetização, para as que ainda não apreciaram
- Ler a crônica de Rubem Alves “Concertos de Leitura” como leitura deleite
- Refletir sobre o trabalho com a leitura na Educação Infantil
- Compreender algumas estratégias que as crianças utilizam ao ler
- Apresentar possibilidades de atividades de leitura na Educação Infantil/Pré-escola
- Ajustar data para o próximo encontro
- Indicar textos para leitura mais aprofundada: Existe vida inteligente no período pré-silábico? Thelma Weisz
Verdades e mentiras sobre a cópia.
Metodologia
- Conversa sobre a construção dos diários de aula
- Apresentar o encontro com os pais da escola nos períodos da manhã e da tarde. Sugerir uma “Orientação de
Atividades” para encaminhar aos pais
- Cada professora contará a aula que realizou durante a observação da pesquisadora ao grupo. As colegas
poderão fazer comentários durante essa apresentação
- Diálogo sobre a importância do vídeo sobre Alfabetização que o CEEL produziu, já que as professoras pedem
ideias para realizar em sala de aula e o vídeo aborda a prática concretamente
- Realização de leitura deleite para iniciar a temática sobre “Leitura na Educação Infantil”
- Leitura compartilhada do texto 1.7, BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica.
M1U7T4 – Soligo, Rosaura. Para ensinar a ler. In: Programa de formação de professores alfabetizadores.
Brasília, DF, 2006. Módulo 1. (Coletânea de Textos), com momentos de pausa para dúvidas ou comentários
- Relacionar as aulas dadas pelas professoras em cada turma à sugestão de atividades de leitura
- Decisão, com o grupo, de data para fechamento e avaliação da formação
Observações
Iniciar esse encontro com a apresentação e discussão das atividades de cada professora em grupo foi muito
motivador. Discutimos além do previsto: o acompanhamento individual do aluno e crianças com dificuldade na
fala. As observações realizadas pela pesquisadora estão sendo aceitas com mais naturalidade, já que perceberam
que não há o intuito de constrangimento coletivo e sim de crescimento profissional e desenvolvimento das crianças.
189
CMEI LIBÂNIA MEDEIROS
Sexta sessão reflexiva – dia 03 de dezembro de 2014
Início – 13h término - 17:30h
Objetivos
- Assinar a lista de frequência
- Ler o protocolo do encontro anterior
- Realizar questões para o grupo responder coletivamente: porque produzir textos coletivamente? Crianças
pequenas são capazes de produzir textos escritos? Por que, afinal a produção textual, deve fazer parte dos objetivos
didáticos traçados para a Educação Infantil?
- Pensar junto ao grupo situações em que a produção de texto se faça presente, relacionando com as aulas que estão
vivenciando atualmente
- Ler texto de fechamento da formação intitulada: ação didático-pedagógica para construção de práticas de leitura
e escrita na Educação Infantil/Pré-escola (FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, São Paulo, Paz e Terra, 1996,
p. 102-103)
- Pedir que as professoras avaliem o curso oralmente, expressando-se perante o grupo e apontando as contribuições
à prática pedagógica
- Pedir que as professoras avaliem o curso, por escrito, em seus diários de aula, destacando aspectos positivos e
negativos da formação
- Agradecer à equipe pela confiança e acolhida da pesquisadora
Metodologia
- Na leitura do protocolo, esclarecer possíveis dúvidas que ficaram no encontro anterior
- Cada professora realiza a leitura de uma parte do texto 1.8: GIRÃO, Fernanda Michelle Pereira; BRANDÃO,
Ana Carolina Perrusi. Ditando e escrevendo: a produção de textos na Educação Infantil. In: BRANDÃO, Ana
Carolina Perrusi, ROSA, Ester Calland de Sousa. Ler e escrever na Educação Infantil: discutindo práticas
pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010. Quando alguém sentir necessidade de fazer algum
comentário, haverá uma pausa para esse momento.
- Diálogo sobre as questões feitas a partir do estudo do texto. O pesquisador realiza a questão e aguarda as respostas
das professoras
- Momento para relacionar as respostas das questões anteriores às práticas escolares vivenciadas ultimamente
- Leitura do texto de Paulo Freire para sistematizar o significado da profissão professor e realizar o fechamento da
formação
- Avaliação oral sobre o percurso de formação na escola
- Pedido para a avaliação escrita no diário de aula
- Momento de satisfação e agradecimento à equipe
Observações
Este dia foi muito proveitoso, as professoras se envolveram com ideias de atividades e as coordenadoras já
apontavam diferenças no dia a dia da escola: protagonismo infantil nas atividades, exposição das produções das
crianças, leitura compartilhada em sala de aula. As dúvidas surgiram sempre no momento de relacionar o estudo
dirigido do texto às aulas e atividades para as crianças. A avaliação da formação foi positiva. Durante a leitura do
texto de Paulo Freire houve muita emoção do grupo. Muitas contaram de sua trajetória na Educação e falaram das
lutas travadas no dia a dia na escolha da profissão.
190
BILHETE DE REUNIÃO COM PAIS DO CMEI
Caros pais e/ou responsáveis,
Após o recebimento de algumas respostas à circular enviada definimos a
seguinte data e horário para nosso encontro:
Data: 19/11/2014 (QUARTA-FEIRA)
Horário: Manhã – 10:00h às 11:00h Tarde – 15:00h às 16:00h.
Local: sala de aula onde os filhos estudam.
Lembrando que essa reunião/conversa tem o objetivo de esclarecer
possíveis dúvidas dos senhores em relação ao processo de alfabetização de
seus filho(a)s. Neste dia, as crianças têm aula normalmente. Essa é uma
iniciativa do CMEI Maria Estela Costa Holanda Campelo na tentativa de
estabelecer uma parceria família/escola.
Rebeca Ramos Campos
Doutoranda do Programa de Pós Graduação em Educação – UFRN
BILHETE DE REUNIÃO COM PAIS DO CMEI
Caros pais e/ou responsáveis,
Após o recebimento de algumas respostas à circular enviada definimos a
seguinte data e horário para nosso encontro:
Data: 19/11/2014 (QUARTA-FEIRA)
Horário: Manhã – 10:00h às 11:00h Tarde – 15:00h às 16:00h.
Local: sala de aula onde os filhos estudam.
Lembrando que essa reunião/conversa tem o objetivo de esclarecer
possíveis dúvidas dos senhores em relação a aprendizagem sobre leitura e
escrita de seus filho(a)s. Neste dia, as crianças têm aula normalmente. Essa é
uma iniciativa do CMEI Maria Estela Costa Holanda Campelo na tentativa de
estabelecer uma parceria família/escola.
Rebeca Ramos Campos
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação - UFRN
191
CMEI MARIA ESTELA COSTA HOLANDA CAMPELO
TURNO VESPERTINO
Olá! Me chamo Rebeca Campos e estou desenvolvendo, junto ao CMEI
Estela Campelo, uma pesquisa de doutorado pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN, no período de Agosto a Dezembro de 2014. Um dos
objetivos deste trabalho é oferecer um curso de formação aos professores dos
níveis III e IV, com a temática “Leitura e Escrita na Pré-Escola”.
Considerando a importância da parceria família/escola nesse processo de
alfabetização pela criança, convido os senhores pais e/ou responsáveis a
participarem de uma reunião/conversa para dialogarmos sobre possíveis
dúvidas que surgem neste momento: Como ensinar as atividades de casa às
crianças? Com que idade a criança realmente deve estar alfabetizada? Entre
outras.
Agradeço e parabenizo os pais interessados nessa proposta. Essa é uma
tentativa de contribuir com o ensino e aprendizagem das crianças desse CMEI.
Abaixo sugestões de melhores datas, horários e outros possíveis
questionamentos para nosso encontro.
DATA
HORÁRIO
QUESTIONAMENTOS
192
C R O N O G R A M A D E F O R M A Ç Ã O N O
C M E I M A R I A E S T E L A C A M P E L O
OBJETIVO:. desenvolver, junto aos professores da Educação Infantil/ Pré-Escola, conhecimentos para uma
formação contínua, que contemple as práticas pedagógicas de oralidade, leitura e escrita com crianças, a partir
de suas necessidades de formação.
SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO
D S T Q Q S S
1 2 3 4 5 6
7 8 9 10 11 12 13
14 15 16 17 18 19 20
21 22 23 24 25 26 27
28 29 30
D S T Q Q S S
1 2 3 4
5 6 7 8 9 10 11
12 13 14 15 16 17 18
19 20 21 22 23 24 25
26 27 28 29 30 31
D S T Q Q S S
1
2 3 4 5 6 7 8
9 10 11 12 13 14 15
16 17 18 19 20 21 22
23 24 25 26 27 28 29
30
D S T Q Q S S
1 2 3 4 5 6
7 8 9 10 11 12 13
14 15 16 17 18 19 20
21 22 23 24 25 26 27
28 29 30 31
ENCO NTROS DAT AS
1° ENCONTRO: ESCOLHA DA TEMÁTICA PARA FORMAÇÃO 17/09/2014
2° ENCONTRO: 01/10/2014
3° ENCONTRO: 16/10/2014
4° ENCONTRO: 29/10/2014
5° ENCONTRO: 12/11/2014
6° ENCONTRO: 26/11/2014
7° ENCONTRO: FECHAMENTO DA FORMAÇÃO 03/12/2014
193
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
GUIA DE ENTREVISTA COLETIVA SEMIESTRUTURADA DIRECIONADA AOS
PROFESSORES Objetivo: Caracterizar a criança que frequenta a escola;
Investigar as necessidades de formação de professores que atuam na Educação
Infantil/Pré-Escola;
Entrevistador: Rebeca Ramos Campos
Entrevistado(a):
Recurso: gravador para registro de áudio; diário de campo.
Blocos Objetivos específicos por bloco
Questões orientadoras
Aspectos introdutórios
. Apresentar os objetivos da
entrevista.
. Motivar os entrevistados.
. Garantir a confidencialidade dos
dados.
. Exposição do objetivo da pesquisa.
. Diálogo sobre justificativa e trajetória do
trabalho.
. Destaque para importância da implicação dos
sujeitos nesse estudo.
A criança pré-escolar
. Perceber o que os professores
conhecem sobre a criança pré-
escolar.
. Quem é a criança pré-escolar? Caracterize-a
As crianças que
frequentam o CMEI
. Caracterizar as crianças que
frequentam o CMEI
. Quem são as crianças que frequentam o
CMEI?
Documentos oficiais e
a organização da
prática pedagógica na
Educação Infantil/Pré-
Escola
. Investigar se os professores
conhecem e executam os
documentos oficiais que norteiam
a Educação Infantil do nosso país.
. Em relação aos documentos oficiais... Vocês
os conhecem, executam?
. Se sim, possuem alguma dificuldade nessa
execução?
. Se não, possuem interesse em conhecê-los?
. Como eu devo educar e cuidar das crianças na
pré-escola?
. Como se desenvolve o planejamento de
vocês?
194
. Investigar como os professores
organizam sua prática pedagógica
na Educação Infantil/Pré-Escola.
. Vocês se norteiam por algum documento?
. Como vocês avaliam se o aluno está
aprendendo?
Necessidades de
Formação dos
Professores
. Incitar discussão sobre a
formação de professores na
Educação Infantil.
. Conhecer as necessidades de
formação dos professores.
. Compreender a relação da
necessidade como algo que se
deseja.
. A formação dos professores de Educação
Infantil pode ser a mesma dos demais
profissionais?
. Se vocês fossem chamadas a opinar sobre o
conteúdo programático de um curso de
formação contínua para professores de
Educação Infantil, o que sugeririam?
(Temáticas)
. Que autores vocês poderiam destacar?
. O que é necessário para ser um bom professor
de educação infantil/pré-escola?
Expectativas quanto à
formação
. Conhecer o que os professores
esperam quanto à formação
oferecida pela pesquisadora.
. Considerando a relação teoria/prática, como
vocês acreditam que essa formação poderia
contribuir com o trabalho de vocês?
195
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Pós-Graduação em Educação - PPGEd
Centro de Educação - CE
“AÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA PARA CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS
DE LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL/PRÉ-ESCOLA”
MODELO DE LISTA DE FREQUÊNCIA – 00/00/2014
1. ______________________________________________________________________
2. ______________________________________________________________________
3. ______________________________________________________________________
4. ______________________________________________________________________
5. ______________________________________________________________________
196
BILHETE DE ORIENTAÇÃO AOS PAIS SOBRE
AS ATIVIDADES DE CASA (PÓS-REUNIÃO)
Caros pais e/ou responsáveis,
No encontro realizado no dia 19/11/2014, nos turnos vespertino e matutino,
dialogamos sobre alguns pontos sobre a aprendizagem de leitura e escrita das crianças,
bem como os seus desdobramentos nas atividades de casa, foram eles:
- Valorização da Educação Infantil como lugar de brincadeira e aprendizagem;
- Documentos que norteiam o trabalho dos professores na Educação Infantil;
- Objetivos da Educação Infantil para Leitura e Escrita;
- Orientações aos pais para realização das atividades de casa.
Sobre as atividades de casa nós orientamos aos pais que:
- Estabeleçam um local apropriado e um horário rotineiro para realizar a atividade. Em
frente à televisão, sentado(a) na cama ou, em um momento que esteja com muito sono, a
atividade não será proveitosa;
- Disponibilizem os materiais antes de começar a atividade: lápis, borracha, cola, tesoura
etc. Interromper a atividade para fazer isso pode atrapalhar a concentração da criança, que
se dispersa facilmente;
- Sempre perguntem do que se trata a atividade antes de ler para elas. As professoras
sempre explicam a atividade antes de ir para casa;
- Valorizem sempre o que a criança fez. Comentários e elogios tornam a criança mais
segura para se arriscar nos desafios da leitura e da escrita;
- Não exijam correção das atividades pelas professoras (elas irão avaliar a atividade
enviada para casa e registrar em seus cadernos pessoais, pois nesse momento não existe
escrita certa ou errada, o que existe é um processo de construção, em que o erro é
considerado importante para a criança avançar em seus pensamentos sobre a língua). Por
isso, se vocês escrevem no lugar da criança ou ditam as letras, sem ajudá-la a construir
essa escrita, a professora não consegue identificar como vai ajudá-la em sala de aula,
deixem elas escreverem de modo independente. Porém, independente, não quer dizer de
qualquer jeito, sem orientação, para isso:
• Oralize (fale) as palavras para ela escutar os sons e depois perguntem que letras ela
poderia utilizar para escrever aquela palavra. Se ela perguntar “Como é que eu
escrevo MA?”. Escreva e fale outras palavras que comecem ou terminem com o som
“MA”.
• Disponibilize um alfabeto que esteja ao seu alcance nos momentos da atividade,
dessa maneira poderá consultá-lo quando surgirem as dúvidas “Como é o ‘M’
mamãe?”, você poderá mostrá-la;
• Incentive a criança a escrever sem realizar cópias, depois peça para ela ler o que
escreveu, dessa maneira você a ensina a pensar/refletir sobre o seu processo de
leitura e escrita.
Além disso, as professoras estão disponíveis para esclarecer quaisquer dúvidas
que surgirem durante esse processo, pois acreditam na relação escola-família como fator
de desenvolvimento.
Rebeca Ramos Campos
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação – UFRN
197
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
Pós-Graduação em Educação - PPGEd
Centro de Educação – CE
Orientações para a construção do Diário de Aula
• O que são Diários de Aula?
“Documentos em que os professores e professoras anotam suas impressões sobre o que
vai acontecendo em suas aulas”. Zabalza (p.13, 2004).
“Utilizado como recurso para registrar o andamento da aula e também voltado para a
pesquisa e avaliação dos processos didáticos”. Zabalza (p.15, 2004).
• Como fazer um Diário de Aula? Zabalza (p.144, 2004).
- Solicitação: documentar o processo de aulas, escrevendo suas impressões sobre a
formação e sentimentos que vai experimentando ao longo da atividade (Descritivo e
Reflexivo).
- A periodicidade: Quinzenal.
- A quantidade: O necessário para expressar a sua visão sobre a formação.
- O conteúdo: Textos, evolução das aulas, reflexões, impressões pessoais, comentários.
- A duração: 01 Outubro de 2014 à 03 de Dezembro de 2014.
Referência
Zabalza, Miguel A. Diários de aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento
profissional. Tradução Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2004.
198
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN
CENTRO DE EDUCAÇÃO - CE
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGEd
QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO DOS PROFESSORES
1 – Nome:______________________________________________________________
2- Sexo: M ( ) F ( )
3- Faixa Etária:
( ) 15 a 20 anos
( ) 21 a 30 anos
( ) 31 a 40 anos
( ) 41 a 50 anos
( ) mais de 50 anos
4- Faixa salarial:
( ) 1 salário mínimo
( ) 2 salários mínimos
( ) 3 salários mínimos
( ) 4 salários mínimos
( ) mais que 4 salários mínimos
5- Escolaridade:
- Ensino Médio:
Magistério?
( ) Sim ( ) Não
( ) Outro(s)____________________
- Ensino Superior:
Concluído?
( ) Sim ( ) Não
Qual (is)?________________________
Ano de conclusão/previsão: _________
199
-Pós-graduação:
Especialização: ( ) Sim ( ) Não ( ) Em andamento
Se sim, ou se em andamento, em que área?
______________________________________________________________________
6 - Tempo de serviço como professor: _______________________________________
7 - Tempo de experiência na Educação Infantil/Pré-Escola: _______________________
8 - Tempo de serviço no CMEI: _____________________________
9 - Turmas que leciona no CMEI: ____________________________
10 – Turnos que leciona no CMEI: ___________________________
11 - Vínculo Empregatício:
Estado Município Outros vínculos
( ) Efetivo ( ) Efetivo ( ) Efetivo
( ) Estagiário ( ) Estagiário ( ) Estagiário
( ) Serviço Prestado ( ) Serviço Prestado ( ) Serviço Prestado
( ) Outro ( ) Outro ( ) Outro
Obrigada!
200
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN
CENTRO DE EDUCAÇÃO - CE
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGEd
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Prezado participante,
Convidamos você para participar de uma pesquisa de doutorado sob a
responsabilidade da pesquisadora Rebeca Ramos Campos. A mesma tem como objetivos:
investigar as necessidades de formação contínua de professores que atuam na Educação
Infantil/Pré-Escola e desenvolver, a partir dessas necessidades, conhecimentos para
educar/cuidar de crianças.
Sua participação é voluntária e se dará por meio de questionário, entrevistas
semiestruturadas (individuais e coletivas) e encontros de formação audiogravados,
posteriormente transcritos. Esta pesquisa não oferece nenhum risco aos seus participantes.
Você não terá nenhuma despesa e também não receberá nenhuma remuneração. Os
resultados do estudo serão analisados e publicados em eventos e veículos científicos, mas
sua identidade não será divulgada, sendo guardada em sigilo.
A Pesquisa será realizada no próprio Centro Municipal de Educação Infantil –
CMEI. Se depois de consentir sua participação quiser desistir de continuar participando,
tem o direito e a liberdade de retirar seu consentimento em qualquer fase da pesquisa,
independente do motivo e sem nenhum prejuízo a sua pessoa.
Se aceitar participar, estará contribuindo para prática pedagógica na Educação
Infantil/Pré-Escola desta instituição, bem como para a reflexão da prática realizada por
outras escolas que oferecem educação pré-escolar.
Para qualquer outra informação sobre esse estudo, você poderá entrar em contato
com a pesquisadora pelos telefones (84) 99418-4860 ou (84) 2020-4882.
201
Consentimento Pós–Informação
Eu_____________________________________________________________, fui
informada sobre os objetivos da pesquisa e porque a pesquisadora precisa da minha
colaboração, compreendendo toda a explicação. Por isso, eu concordo em participar da
pesquisa, sabendo que não vou ser remunerada por isso e que posso sair quando quiser.
A pesquisadora Rebeca Ramos Campos e sua orientadora Maria Estela Costa Holanda
Campelo poderão utilizar as informações obtidas pelas entrevistas e encontros de
formação para publicar e desenvolver trabalhos científicos na área de Educação. Este
documento é emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pela
pesquisadora, ficando uma via com cada um de nós.
______________________ Natal, _____ de____________ de 2014
Assinatura do participante
________________________________
Assinatura do Pesquisador Responsável
Top Related