EDUCAÇÃO INFANTIL: SUBESTRATÉGIA METACOGNITIVA DE
PLANEJAMENTO
BATISTA, Giovani de Paula – PUCPR [email protected]
GUENO, Renata – UFPR
PORTILHO, Evelise Maria Labatut – PUCPR [email protected]
Eixo Temático: Didática: Educação da Infância
Agência Financiadora: CNPQ e Fundação Araucária Resumo Este trabalho faz parte da pesquisa “Aprendizagem e Conhecimento na Ação Educativa” realizada em uma Escola da Rede Municipal de Ensino de Curitiba. A sua finalidade é apresentar os resultados da análise realizada sobre o uso da subestratégia metacognitiva de planejamento das crianças de Educação Infantil. A análise dos dados se deu baseada em estudos sobre o processo de aprendizagem e metacognição, fundamentada principalmente em autores como Flavell (1999); Perredeau (2009); Portilho (2009); Pozo (2005); Claxton (2005); Schenk (2011); Trivinõs (1987). O instrumento utilizado foi uma entrevista semi-estruturada com perguntas metacognitivas de planejamento, aplicada em 90 crianças do Maternal III (3 a 4 anos) e Pré (4 a 5 anos), após a realização do desenho da professora. Os resultados demonstram que a subestratégia de planejamento é utilizada em mais da metade dos alunos participantes. Essas estratégias se desenvolvem com o tempo, uma vez que as crianças mais novas as empregam menos. Se as professoras e as educadoras tomarem consciência do momento do desenvolvimento em que as crianças se encontram, acredita-se que possam contribuir para a construção de aprendizagens mais significativas. Palavras-chave: Aprendizagem. Metacognição. Planejamento. Educação Infantil.
Introdução
A Educação Infantil é uma etapa escolar fundamental para o desenvolvimento de
habilidades e estratégias que visem aprendizagens significativas.
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A aprendizagem é um processo resultante da interação do sujeito com o meio, numa
seqüência de modificações evolutivas e constantes, que produzem uma mudança real e
observável no organismo.
Se desde a infância, a criança for estimulada a refletir no que faz e como faz, acredita-
se que os seus resultados tenham mais sentido.
A metacognição, isto é, o aprender a aprender, pode ser um dos caminhos que
favoreçam a tomada de consciência e a auto-regulação das crianças diante das atividades que
desempenham.
Este trabalho, parte integrante da pesquisa “Aprendizagem e Conhecimento na Ação
Educativa”, propõe como objetivo a análise da subestratégia metacognitiva de planejamento
utilizada pelas crianças da Educação Infantil na elaboração dos desenhos da representação da
professora.
Da aprendizagem à metacognição
Na perspectiva interacionista, o processo de aprendizagem é resultado da interação
entre o sujeito aprendiz e o objeto da aprendizagem. Para os adeptos desta concepção, a
interação dinâmica entre genes e meio ambiente, é chamada de “GxA” (SCHENK, 2011,
p.27).
David Schenk afirma que “as próprias construções genéticas são influenciadas por
outras informações. Os genes são constantemente ativados e desativados por estímulos
ambientais, nutrição, hormônios, impulsos nervosos e outros genes” (p. 28 e 29). Isso muda o
que está posto no senso comum, quando se refere à hereditariedade como algo
necessariamente inato. Portanto, o que hoje está sendo discutido e valorizado na psicologia
cognitiva é a dimensão processual da aprendizagem.
Ignácio Pozo (2005), interacionista construtivista, salienta que a aprendizagem
humana se distingue da aprendizagem animal no momento da tomada de consciência. Ele
explica este processo em níveis, cuja complexidade é crescente:
A aprendizagem humana pode, de fato, ser abordada em diferentes níveis de análise (comportamento, informação, representação e conhecimento) que implicam uma complexidade crescente, uma vez que cada um deles, segundo a lógica da integração hierárquica de sistemas, exige dos níveis anteriores ou, melhor ainda, os re-descreve num nível hierárquico novo (POZO, 2005, p.14).
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Com base no autor, a aprendizagem pode ser observada a partir de diferentes níveis de
análise, indo do mais simples ao mais complexo. Do comportamento, chega-se a aquisição de
informação, que por sua vez leva a representação e ao conhecimento. Entretanto, é somente
nos níveis mais elevados, como a construção de representações e conhecimentos que a
aprendizagem adquire seu significado realmente humano.
O processo de aprendizagem pode ser comparado a uma árvore. A raiz seria
representada pelos conhecimentos prévios, os quais se consolidam dentro de cada pessoa a
partir das experiências vividas (tronco e galhos). Estes conhecimentos com o tempo são
modificados ou acrescentados pelas situações que a vida apresenta (ventos, chuvas, geadas
etc), e como resultado desta mudança, se adquire novas informações e representações (folhas
que brotam), que futuramente se tornarão conhecimentos novos.
Para que o processo de aprendizagem ocorra de forma eficiente e controlado pela
pessoa é necessário que ela conheça a sua própria maneira de aprender. Claxton (2005) afirma
que o fato de conhecermos as nossas próprias mentes – e este conhecer se refere a ter
consciência das nossas fragilidades e potencialidades, conduzindo-nos a avaliação e a
administração da nossa aprendizagem – isto nos torna bons aprendizes.
Portanto, para que a criança se torne um bom aprendiz é necessário ajudá-la a
identificar os caminhos que utiliza na hora de aprender, isto é, favorecer o conhecimento das
estratégias metacognitivas.
Metacognição
Os estudos metacognitivos iniciaram na década de 70 com Flavell, psicólogo
cognitivo. Para ele a metacognição:
Em geral é definida ampla e livremente, como qualquer conhecimento ou atividade cognitiva que toma como seu objeto, ou regula, qualquer aspecto de qualquer iniciativa cognitiva. Ela é chamada metacognição porque seu sentido essencial é cognição “acerca da cognição (FLAVELL, 1999, p. 125).
A metacognição pode ser entendida como o conhecimento que a pessoa tem sobre os
seus processos cognitivos assim como, a regulação e o controle dos mesmos, ou seja, a
metacognição é a consciência da própria cognição.
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Quando a criança realiza uma ação, ela utiliza um conjunto de atividades ou técnicas,
chamadas de estratégias cognitivas. Por sua vez, as estratégias metacognitivas são aquelas que
regulam tudo o que está relacionado com o conhecimento, decidindo quando e como utilizar
esta ou aquela estratégia.
As estratégias metacognitivas possibilitam o conhecer-se e o regular-se. O conhecer-se
se refere ao conhecimento e as reflexões que a pessoa realiza sobre a sua própria mente,
podendo assim regular e controlar esse conhecimento em diferentes situações.
Estas estratégias, para Portilho (2009), não podem acontecer sem estarem calcadas nos
mecanismos de planejamento, controle e avaliação. E ainda, “a possibilidade do sujeito para
elaborar suas próprias ações de regulação é, sem dúvida, a apropriação mais significativa do
conhecimento” (p. 109).
Antes de iniciar uma determinada tarefa é importante que a criança seja orientada,
primeiramente, a planejar as suas atividades cognitivas, para logo em seguida controlar ou
monitorar a execução das mesmas, e por último realizar a avaliação dos resultados que foram
obtidos na atividade comparando-os com os objetivos iniciais.
Perraudeau (2009) explica que ao colocar em funcionamento a subestratégia
metacognitivas de planejamento, a criança pode organizar a tarefa partindo da análise das
informações que serão utilizadas de acordo com as características e exigências da situação, o
que permite utilizar uma estratégia eficaz. Quando realiza a atividade de controle, ela pode
verificar se as estratégias adotadas na fase de planejamento estão corretas levando a resultados
planejados anteriormente.
Metodologia
A presente pesquisa se utilizou da abordagem qualitativa, que segundo Triviños (1987)
se baseia em: um ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como
instrumento chave, é sempre descritiva, se preocupa com o processo e não simplesmente com
o resultado, analisa os dados indutivamente e a preocupação essencial é o significado da
pesquisa (p.128-130).
A pesquisa foi realizada em um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI), da
Rede Municipal de Curitiba/PR, sendo desenvolvida no período de julho a novembro de 2010,
no período diurno. Atualmente, o CMEI tem capacidade para 840 crianças em até 36 turmas,
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funcionando em dois turnos: manhã, tarde, sendo o turno da tarde o mais procurado. A
clientela, em sua maioria, tem nível socioeconômico médio, com famílias constituídas de pais
jovens que trabalham em jornadas de 40hs semanais.
Participantes
Neste estudo foram considerados como participantes 90 alunos, sendo 57 do Maternal
III (3 a 4 anos) e 33 do Pré (4 a 5 anos).
As turmas de MIII eram compostas por 16 crianças e as turmas de Pré eram compostas
por 28. Tanto nas turmas de Pré e de MIII havia uma professora e uma educadora. A
professora trabalhava com a sua turma quatro horas, já a educadora permanecia com a mesma
durante o período integral.
Instrumentos
Como instrumento de pesquisa foi utilizado às perguntas metacognitivas aplicadas
após o desenho da professora. Das sete questões elaboradas, para este estudo as duas
referentes à subestratégia de planejamento foram selecionadas: antes de você começar o
desenho, o que você pensou? E como você escolheu começar o seu desenho?
A aplicação do instrumento se deu da seguinte forma: as crianças receberam uma folha
em branco e lápis de cor. Logo em seguida, foi solicitado que desenhassem a sua professora.
Após a realização do desenho, elas eram chamadas uma a uma acompanhadas pela professora
ou pela educadora, para a aplicação do questionário com as perguntas metacognitivas.
Resultados
A pesquisa qualitativa prevê nas questões abertas, o levantamento de categorias, que
por sua vez, foram discutidas à luz dos autores estudados.
As respostas nas duas questões selecionadas foram categorizadas por proximidade ao
objetivo proposto na tarefa, que era conhecer a maneira como as crianças utilizam a
subestratégia metacognitiva de planejamento.
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Para a pergunta - antes de você começar o desenho, o que você pensou, o gráfico 1
descreve a média em relação às estratégias utilizadas pelos alunos de Maternal III. Do total de
alunos participantes desta turma, 20% pensou em objetos diversos como: cruz, bola, etc.; 5%
em algum familiar; 32% na professora ou educadora; 17% em elementos da natureza como:
água, nuvem, etc.; e 13% no próprio desenho. Os que não sabiam ou não definiram o que
pensou totalizou 13%.
Gráfico 1: Antes de você começar o desenho, o que você pensou? – MIII Fonte: Dados da Pesquisa
De acordo com os dados, percebe-se no gráfico 1 que 45% das crianças do MIII que
relataram que antes de começar o desenho pensou na professora/educadora (32%) e no
desenho propriamente dito (13%), apresentaram a subestratégia de planejamento porque a
resposta está diretamente relacionada com a atividade proposta. Porém, 55% das crianças do
MIII, pensou em objetos (20%), na familia (5%) em elementos da natureza (17%), aliados aos
que não souberam responder (13%) parece se distanciar do que foi solicitado. De acordo com
Flavell (1999), a criança nessa fase “pode produzir certas estratégias, embora ela não possa
evocar e usar espontaneamente a mesma estratégia em particular ” (p. 129). Desta forma
entende-se que uma parte significativa das crianças do MIII, não apresenta ainda a
subestratégia de planejamento adequada para a tarefa ou não consegue falar sobre ela, o que é
próprio para a faixa etária em que elas se encontram.
O gráfico 2, referente a pergunta - E como você escolheu começar o seu
desenho?, indica que 25% das crianças optaram por começar o desenho fazendo algum
objeto como, um avião, boneca, carro, etc.; 16% não souberam dizer por onde começou a
atividade; 47% optaram por começar o desenho pela professora ou pela educadora; 7%
iniciaram pelos elementos da natureza como, sol, lua etc.; e 5% das crianças começou o
desenho escolhendo a cor que iria utilizar.
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Gráfico 2: Como você escolheu começar o seu desenho? – MIII
Fonte: Dados da Pesquisa
Em relação a como as crianças do MIII escolheram começar o seu desenho, pode-se
verificar no gráfico 2, que 47% das crianças relataram começar o seu desenho pela professora/
educadora (47%), o que indica que elas apresentam a subestratégia de planejamento de
acordo com a atividade proposta. E que 53% disseram começar o seu desenho pelos
elementos da natureza (7%), objetos diversos (25%) ou pela cor, (5%) juntamente com as
respostas indefinidas (16%), denotando apresentar atitudes de fuga com relação ao
planejamento ou falta de compreensão da pergunta.
A seguir, apresenta-se dois desenhos das crianças do Maternal III referentes as
diferentes respostas:
Figura 1: Desenhos da professora realizados pelos alunos do Maternal III: não possui relação com a consigna.
Fonte: Dados da Pesquisa
Figura 2: Desenhos da professora realizados pelos alunos do Maternal III: possui relação com a consigna
Fonte: Dados da Pesquisa
1
2
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Como podemos observar nos gráficos e nos desenhos, nesta fase do desenvolvimento,
a metade das crianças do MIII apresentam a subestratégia de planejamento adequadas para a
idade. O que está de acordo com a opinião de Flavell (1999) no momento em que o autor
afirma que “ as crianças tem diversas maneiras de adquirir informações sobre como, quando e
onde usar uma estratégia em particular ” (p.213). Portanto pode-se verificar que as crianças
nestas idade utilizam de estratégias que estão de acordo com a atividade.
Para a pergunta - antes de você começar o desenho, o que você pensou, o gráfico 3
descreve a média em relação às estratégias utilizadas pelos alunos de Pré. Do total de alunos
participantes desta turma, 9% relataram que antes de iniciar o desenho pensou em algum
objeto como: caminhão, carro etc; 42% na professora ou na educadora; 14% em elementos da
natureza como, árvore, oceano; 19% no desenho propriamente dito e 16% não souberam no
que pensou.
Gráfico 3: Antes de você começar o desenho no que você pensou? - Pré Fonte: Dados da Pesquisa
Conforme o gráfico 3 pode-se verificar que 61% dos alunos do Pré que pensaram na
professora/educadora (42%) e no desenho (19%) antes de começar a tarefa apresentam a
subestratégia de planejamento mais adequadas para a atividade em relação à turma de MIII.
Isto ocorre, segundo Flavell (1999), porque “à medida que as crianças crescem e ficam mais
experientes, elas se tornam mais ativas em iniciar o uso de estratégias em uma variedade de
situações” (p.199). Portanto, verifica-se um progresso no uso da subestratégia de
planejamento das crianças do MIII para o Pré.
O gráfico 4, referente a pergunta - E como você escolheu começar o seu desenho?,
indica que 9% das crianças começaram a realizar a tarefa pelos elementos da natureza como:
céu, sol, lua etc; 10% com objetos como: botão e lápis; 60% desenhou a professora ou a
educadora e 21% não definiu o que pensou.
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Gráfico 4: Como você escolheu começar o seu desenho? – Pré Fonte: Dados da Pesquisa
Como se pode observar no gráfico 4 os alunos do Pré utilizaram a subestratégia de
planejamento com mais eficiência que os do MIII, antes de iniciarem o desenho da professora.
Esta melhora ocorre porque nessa idade os alunos possuem uma maior capacidade de
elaboração estratégica. De acordo com Flavell (1999), “crianças mais velhas têm maior
probabilidade do que as mais jovens não apenas de construir elaborações sem ajuda externa,
mas também de recuperá-la para auxiliar na recordação e de transferi-las para outra tarefa”
(p.201). Portanto, pode-se constatar que a subestratégia de planejamento utilizada por uma
criança se desenvolve com o tempo devido a sua experiência em diferentes atividades, o que
faz com que ela tenha melhores resultados.
A seguir, apresenta-se dois desenhos das crianças do Pré referentes as diferentes
respostas:
Figura 3: Desenhos da professora realizados pelos alunos do Pré: não possui relação com a consigna.
Fonte: Dados da Pesquisa
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Figura 4: Desenhos da professora realizados pelos alunos do Pré: possui relação com a consigna.
Fonte: Dados da Pesquisa
Considerações Finais
O presente estudo demonstra aspectos relacionados à subestratégia de planejamento
utilizadas por alunos de Maternal III e de Pré antes de começar o desenho da professora.
Pode-se constatar que as crianças do Pré apresentam a subestratégia de planejamento
em maior número do que a turma de MIII. Uma das justificativas para tal resultado pode estar
no fato delas terem um conhecimento mais específico em relação à atividade proposta, uma
vez que estão um ano a mais na escola.
Se as professoras e as educadoras tomarem consciência do momento do
desenvolvimento em que as crianças se encontram, acredita-se que possam contribuir para a
construção de aprendizagens mais significativas.
REFERÊNCIAS
CLAXTON, Guy. O desafio de aprender ao longo da vida. Porto Alegre: Artmed, 2005. FLAVELL, John H.; MILLER, Patrícia H.; MILLER, Scott A. Desenvolvimento cognitivo. Porto Alegre: Artmed, 1999. PERRAUDEAU, Michel. Estratégias de Aprendizagem: como acompanhar os alunos na aquisição dos saberes. Porto Alegre: Artimed, 2009. PORTILHO, Evelise. Como se aprende? Estratégias, estilo e metacognição. Rio de Janeiro: Wak, 2009.
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POZO, Juan Ignacio. Aquisição do conhecimento: quando a carne se fez verbo. Porto Alegre: Artmed, 2005. SCHENK, David. O gênio em todos nós: por que tudo que você ouviu falar sobre genética, talento e QI está errado. Rio de Janeiro Zahar, 2011. TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.
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