Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB
Programa de Ps-Graduao em Memria: Linguagem e Sociedade
Pollyanna Viana Lima
Envelhecer com dependncia funcional:
memria de idosos longevos
Vitria da Conquista
Fevereiro de 2016
i
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB
Programa de Ps-Graduao em Memria: Linguagem e Sociedade
Pollyanna Viana Lima
Envelhecer com dependncia funcional:
memria de idosos longevos
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
graduao em Memria: Linguagem e Sociedade, da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Campus de Vitria da Conquista, como requisito
parcial e obrigatrio para obteno do ttulo de
Mestre em Memria: Linguagem e Sociedade.
rea: Multidisciplinaridade da Memria.
Linha de Pesquisa: Memria, Discursos e
Narrativas.
Orientadora: Prof Dr. Luciana Arajo dos Reis
Vitria da Conquista
Fevereiro de 2016
ii
L732e
Lima, Pollyanna Viana Lima Memrias do envelhecer com dependncia funcional: histria oral
de idosos longevos; orientadora Prof DSc Luciana Arajo dos Reis, - Vitria da Conquista, 2016. 116f.
Dissertao (mestrado em Memria: Linguagem e Sociedade). - Programa de Ps-Graduao em Memria: Linguagem e Sociedade
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2016.
1. Memria. 2. Idoso longevo. 3. Envelhecimento. 4. Longevidade 5. Atividades Cotidianas. I. Reis Arajo dos, Luciana. II. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. III. Programa de Ps Graduao em Memria: Linguagem e sociedade IV. Envelhecer com Dependncia Funcional: Memria de idosos longevos.
CDD
Ttulo em ingls: Aging with Functional Dependence: elderly memory oldest
Palavras-chaves em ingls: Memory. Elderly. Aging. Longevity. Daily Activities.
rea de concentrao: Multidisciplinaridade da Memria
Titulao: Mestre em Memria: Linguagem e Sociedade.
Banca Examinadora: Profa. Dra. Luciana Arajo dos Reis (orientadora); Profa. Dra. Lvia
Diana Rocha Magalhes (titular); Prof. Dr. Jos Patrcio Bispo Jnior (titular).
Data da Defesa: 17 de fevereiro de 2016
Programa de Ps-Graduao: Programa de Ps-Graduao em Memria: Linguagem e
Sociedade.
iii
iv
minha filha Lvia Fernanda
A meu esposo Vilmar Carvalho
minha me Alvair Viana Lima.
v
AGRADECIMENTOS
Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, porque cada pessoa
nica e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida
passa sozinha e no nos deixa s porque deixa um pouco de si e leva um
pouquinho de ns. Essa a mais bela responsabilidade da vida e a prova de
que as pessoas no se encontram por acaso.
Charles Chaplin
A realizao deste trabalho, que sintetiza a minha dedicao nos ltimos dois anos ao
mestrado, no teria sido possvel sem a magnnima colaborao de algumas pessoas, mas
tambm instituies a quem venho agora prestar meu agradecimento.
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), pela bolsa durante
todo o mestrado, mas tambm pelo apoio financeiro no auxlio dissertao. Obrigada por
acreditar no potencial desse estudo e possibilitar meus estudos em tempo integral!
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, pela oportunidade de aperfeioamento
profissional.
Profa. Dra. Luciana Arajo dos Reis, por sua orientao, dedicao, confiana,
infinita disponibilidade, afeto, escuta, amizade ao longo do curso, humanidade e por ser a
maior incentivadora da superao dos meus limites.
s coordenadoras do Colegiado do Programa de Ps-graduao Stricto Sensu em
Memria: Linguagem e Sociedade, Profa. Dra. Lvia Diana Rocha Magalhes e Profa. Dra.
Maria da Conceio Fonseca-Silva pela dedicao e empenho para que o programa mantenha
a excelncia.
Profa. Dra. Lvia Diana Rocha Magalhes e o Prof. Dr. Jos Patrcio Bispo Jnior
pelas contribuies na banca de qualificao.
Ao prof. Dr. Joselito Santos, que muito me incentivou na seleo de mestrado, me
dando apoio, indicando leituras e contribuindo com seus conhecimentos.
Aos meus orientadores das graduaes Prof. Dr. Jnio Santos e Prof. Dr. Stnio
Fernando Pimentel Duarte, por terem plantado sementinhas de incentivo e conhecimentos
durante a graduao.
Aos meus colegas do grupo de estudo pelo apoio de todas as horas, por nossas
discusses, mas tambm nossas conversas informais que nos descontraam e reduziam as
tenses.
vi
colega e amiga Tatiana Dias Casemiro Valena, verdadeira companheira de
pesquisa e estudo por seu apoio, amizade e incentivo em todas as horas.
A todos os colegas e professores da Ps-Graduao em Memria: Linguagem e
Sociedade pelo convvio e aprendizado, em especial ao professor Dr. Cludio Flix e o colega
Elton Quadros.
Aos funcionrios do Colegiado do Programa de Ps-Graduao em Memria:
Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, em especial a
Andria, Vilma e Tmara pela dedicao e apoio.
minha me, sempre amorosa, companheira, generosa, que abdicou boa parte do seu
tempo para cuidar da sua netinha para que eu pudesse me dedicar ao mestrado de forma
integral. Meu infinito agradecimento. Te amo muito!
Ao meu esposo por ser to importante na minha vida, por sempre acreditar em minha
capacidade, sempre estar ao meu lado, me dando foras e me fazendo acreditar que posso
mais que imagino. Seu companheirismo, amizade, pacincia, compreenso, amor
possibilitaram a efetivao do meu mestrado. Obrigada por ter feito do meu sonho o nosso
sonho!
minha pequena princesa, a ela devo uma enorme gratido por ter, na sua inocncia
de criana, entendido minha ausncia por muitas vezes durante esses dois anos e, mesmo
assim, me recebia sempre com o sorriso e carinho, o que em muito me fortaleceu e me fez
mais forte. Te amo! Essa conquista dedico a voc.
A minha irm Valria, meu cunhado Carlos Alberto e seus filhos, meus queridos
sobrinhos pelo apoio e pelo carinho de sempre.
minha amiga Ldia e seu namorado Rennan, que me deram muito apoio e incentivo
na seleo do mestrado.
Aos idosos, participantes do estudo e mesmo aqueles que no participaram at a fase
final e aos seus familiares pela calorosa recepo e disponibilidade. Meu eterno
agradecimento!
Finalmente a Deus por me amparar nos momentos difceis, me dar fora interior para
superar as dificuldades, me suprir em todas as minhas necessidades e por ter colocado pessoas
to especiais a meu lado, sem as quais certamente no teria dado conta.
vii
Idoso toda famlia tem algum.
Com um brilho especial nos olhos.
Nos lbios sbios conselhos.
Na voz a soma da cultura acumulada, muitas vezes desprezada.
Toda famlia tem algum que conspira com o universo, oraes pelos que ama.
Tm braos de msculos cansados, mas... Que no negam o conforto de um longo abrao.
Tm os ombros cansados, mas... No negam um carinho e mais um fardo.
Tm os ossos frgeis, mas... No negam um colo.
Precisam de ateno, de amor e compreenso.
E esto atentos a tudo, amam como ningum,
Sempre tentando compreender os filhos e netos.
Heloisa Abranho
viii
RESUMO
Com o envelhecimento da populao, h aumento da prevalncia das chamadas doenas
crnico-degenerativas, que exigem cuidados e tratamento contnuo. Essas doenas tornam o
idoso mais susceptvel a desenvolver a dependncia funcional, que se inicia com o surgimento
de um dficit no funcionamento corporal ou psicolgico, e, consequentemente, provoca
limitaes nas atividades dirias com interferncia na independncia e autonomia. A pesquisa,
que consistiu em um estudo exploratrio descritivo, com abordagem qualitativa,
fundamentado na Teoria da Memria, tomada como recurso analtico, visou analisar o
envelhecer com dependncia funcional a partir da memria de idosos longevos. A pesquisa foi
realizada em uma unidade de sade da famlia do municpio de Vitria da Conquista/BA,
cujos participantes foram cinco idosos com idade igual ou superior a 80 anos, de ambos os
sexos, que apresentavam dependncia funcional e condies mentais preservadas para
responder entrevista. Ressalta-se que a delimitao dos idosos seguiu o princpio de
saturao dos dados. Para a coleta, foi feita uma entrevista semiestruturada com base em um
roteiro predefinido e, para a anlise, foi utilizada a anlise de contedo temtico-categorial,
segundo Laurence Bardin, com auxlio da ferramenta computacional de suporte para anlise
dos dados qualitativos NVivo, verso 11.0. Do material emprico analisado, emergiram trs
categorias temticas: Memria do viver/envelhecer antes da dependncia funcional; Memria
do viver/envelhecer aps a dependncia funcional; e Repercusses psicossociais do
envelhecer com dependncia funcional: construindo estratgias de enfrentamento. Os
resultados analisados demonstraram que a memria do tempo vivido e experienciado de todos
os idosos foi reconstruda em uma coletividade, mediante a experincia do presente.
Constatou-se que as memrias dos idosos antes da dependncia funcional se concentraram em
um perodo de plenitude; em contrapartida, as memrias aps a dependncia se agruparam em
momentos de limite relacionados ao binmio envelhecimento-dependncia funcional,
evidenciando que a vida dos idosos vem sendo construda em dois momentos extremamente
distintos: as memrias do viver/envelhecer antes da dependncia funcional estavam
concentradas predominantemente nas relaes que envolvem o trabalho, sendo o grupo
familiar uma referncia fundamental para a reconstruo desse passado; e as memrias dos
idosos aps a dependncia funcional estavam carregadas de negatividade, sendo para eles a
finitude uma realidade prxima. Verificou-se ainda que a negatividade est relacionada aos
problemas que os idosos vm enfrentando, como as doenas, a dependncia, o medo, a
tristeza, a solido, a depresso e a reduo das relaes sociais e de apoio. Mas, por outro
lado, foram percebidas algumas estratgias de enfrentamento a esses problemas, como a
resilincia, a f, a espiritualidade e o apoio da famlia. Conclui-se, diante dos resultados, que
as memrias do envelhecer com dependncia funcional esto mais relacionadas a aspectos
negativos da vida, decorrentes das perdas e da presena de sintomas fsicos ou emocionais. A
dissertao est vinculada rea de concentrao Multidisciplinaridade da Memria e linha
de pesquisa Memria, Discursos e Narrativas. Fazendo parte do Projeto de Pesquisa
Memria, Envelhecimento e Dependncia funcional do Programa de Ps-Graduao em
Memria: Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, sob a
orientao da Profa. Dr. Luciana Arajo dos Reis.
Palavras-Chave: Memria. Idoso. Envelhecimento. Longevidade. Atividades Cotidianas.
ix
ABSTRACT
With the population aging, there is an increase in the prevalence of the so-called chronic and
degenerative diseases, which require constant health care and treatment. These diseases make
the elderly more likely to develop functional dependence, which starts with the onset of a
deficit in the bodily or mental functioning, and then it provokes limitations in daily activities
with interference on independence and autonomy. The research, which was a descriptive and
exploratory study, with a qualitative approach, underpinned by the Memory Theory, taken as
analytical resource, aimed to analyze the aging with functional dependence from the memory
of long-lived elderly. The research was held at a family health unity of the city of Vitria da
Conquista/BA, whose participants were five elderly aged 80 or over, both men and women,
who had functional dependence and mental conditions preserved to respond to the interview.
It is highlighted that the delimitation of the elderly complied with the principle of data
saturation. In order to perform the collection, it was performed a semi-structured interview
based on a predefined script and, to analyze the data, it was used the thematic-categorical
content analysis, according to Laurence Bardin, with the aid of the supportive electronic tool
for analysis of qualitative data NVivo, version 11.0. The analysis of the empirical material
gave rise to three thematic categories: Memory of living /aging before the functional
dependence; Memory of living/aging after the functional dependence; and Psychosocial
repercussions of the aging with functional dependence: building combative strategies. The
analyzed results have demonstrated that the memory of the lived and experienced time of all
elderly was rebuilt in a collectivity, through the experience of the present. It was found that
the memories before the functional dependence were concentrated in a period of fullness; in
contrast, the memories after the dependence were grouped in limit moments related to the
aging-functional dependence binomial, thereby indicating that the lives of the elderly have
been built on two extremely different moments: the memories of living/aging before the
functional dependence were predominantly concentrated in relations that involve the job, and
the family group was a fundamental reference for the rebuilding of that past; and the
memories after the functional dependence were filled with negativity, and, for them, the
finiteness is an imminent reality. Moreover, it was found that negativity is related to the
problems that the elderly are facing, such as diseases, dependence, fear, sadness, loneliness,
depression and decreased social relationships and support. Nevertheless, on the other hand,
some combative strategies were realized in relation to these problems, such as resilience,
faith, spirituality and family support. In light of the results, it is concluded that the memories
of the aging with functional dependence are more related to negative aspects of life, which
arise from the losses and the presence of physical or emotional symptoms.
Keywords: Memory. Elderly. Aging. Longevity. Daily Activities.
x
LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 1980 .......................................... 20
Figura 2 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 2010 .......................................... 21
Figura 3 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 2040 .......................................... 21
Figura 4 - Distribuio etria da populao por sexo e grupos de idade, Bahia -
2010/2030................................................................................................................. 22
Figura 5 - Distribuio etria da populao por sexo, segundo o municpio Vitria da
Conquista, Bahia - 2000/2010 .................................................................................. 23
Figura 6 - Localizao da Bahia no Brasil ............................................................................... 33
Figura 7 - Localizao de Vitria da Conquista na Bahia ........................................................ 34
Figura 8 - Organizao da anlise de contedo Bardin (2011) ................................................ 40
Figura 9 - Nuvem de palavras elaborada com base no Nvivo sobre viver/envelhecer antes
da dependncia funcional . Vitria da Conquista BA, 2015 ................................. 45
Figura 10 - Nuvem de palavras elaborada com base no NVivo sobre o viver/envelhecer
aps dependncia funcional. Vitria da Conquista BA, 2015 .............................. 58
Figura 11 - Nuvem de palavras elaborada com base no NVivo sobre as repercusses
psicossociais do envelhecer com dependncia funcional. Vitria da Conquista
BA, 2015 .................................................................................................................. 75
Quadro 1 - Caracterizao dos idosos longevos, participantes do estudo. Vitria da
Conquista/BA, 2015 ................................................................................................. 36
Quadro 2 - Resultados da anlise de contedo temtico-categorial, Vitria da Conquista -
BA, 2015 .................................................................................................................. 41
xi
LISTA DE ABREVIATURAS
AGA Avaliao Geritrica Ampla
BA Bahia
CNS Conselho Nacional de Sade
ESF Estratgia de Sade da Famlia
EUA Estados Unidos da Amrica
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IL idoso longevo
n. Nmero
PR Paran
QSR Qualitative Solutions Research Solues para Pesquisa Qualitativa
RN Rio Grande do Norte
SP So Paulo
TCC Trabalho de Concluso de Curso
UCLA University of California, Los Angeles
USF Unidade de Sade da Famlia
UESB Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
xii
SUMRIO
1 INTRODUO ............................................................................................................... 14
1.1 CONSIDERAES INICIAIS .......................................................................................... 14
1.3 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA DISSERTAO ............................................ 17
2 ENVELHECIMENTO, LONGEVIDADE E DEPENDNCIA FUNCIONAL ......... 18
2.1 ASPECTOS DEMOGRFICOS E EPIDEMIOLGICOS DO ENVELHECIMENTO
NO BRASIL ...................................................................................................................... 18
2.2 CONCEITOS QUE ENVOLVEM O ENVELHECIMENTO HUMANO ........................ 24
2.3 LONGEVIDADE E DEPENDNCIA FUNCIONAL: ASPECTOS
BIOPSICOSSOCIAIS ....................................................................................................... 26
3 PERCURSO METODOLGICO ................................................................................. 32
3.1 TIPO DE PESQUISA ......................................................................................................... 32
3.2 LOCAL DE PESQUISA .................................................................................................... 33
3.3 PARTICIPANTES DA PESQUISA ................................................................................... 34
3.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA ..................................................................................... 36
3.5 PROCEDIMENTOS ........................................................................................................... 38
3.6 ANLISE E INTERPRETAO DOS RESULTADOS .................................................. 39
3.7 MEMRIA COMO RECURSO ANALTICO .................................................................. 41
3.8 ASPECTOS TICOS DO ESTUDO .................................................................................. 41
4 O DESVELAR DA MEMRIA DE IDOSOS LONGEVOS COM
DEPENDNCIA FUNCIONAL .................................................................................... 43
4.1 MEMRIAS DO VIVER/ENVELHECER ANTES DA DEPENDNCIA
FUNCIONAL .................................................................................................................... 44
4.2 MEMRIA DO VIVER/ENVELHECER APS A DEPENDNCIA FUNCIONAL .... 57
4.3 REPERCUSSES PSICOSSOCIAIS DO ENVELHECER COM DEPENDNCIA
FUNCIONAL: CONSTRUINDO ESTRATGIAS DE ENFRENTAMENTO ............... 74
5 CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................... 84
REFERNCIAS ............................................................................................................... 88
APNDICES .................................................................................................................. 105
APNDICE A - Roteiro de entrevista ............................................................................. 106
APNDICE B - Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) ........................... 107
APNDICE C - Instrumentos de coleta de dados ........................................................... 108
xiii
APNDICE D - Caracterizao dos idosos (participantes do estudo) ............................ 109
ANEXOS ........................................................................................................................ 111
ANEXO A - Avaliao cognitiva (mini exame-estado mental/MEEM) questionrio
resumido do estado mental (PFEIFFER, 1974) ............................................................... 112
ANEXO B - Avaliao funcional (ndice de Barthel)..................................................... 113
ANEXO C - Avaliao funcional Escala de Lawton ................................................... 114
ANEXO A - Avaliao funcional Escala de Lawton ................................................... 115
14
1 INTRODUO
1.1 CONSIDERAES INICIAIS
O envelhecimento um fenmeno mundial que tem modificado a configurao da
pirmide etria e provocado alteraes sociais e econmicas. O nmero proporcional de
crianas, jovens, adultos e idosos forma a pirmide etria de um pas. O envelhecimento de
uma populao relaciona-se a uma reduo no nmero de crianas e jovens e a um aumento
na proporo de pessoas com 60 anos ou mais de idade. Assim, medida que as populaes
envelhecem, a pirmide populacional triangular substituda por uma estrutura mais
cilndrica (WHO, 2005).
No Brasil, este fenmeno comeou tardiamente e, diferente do que ocorreu em outros
pases, est progredindo de forma acelerada. Esse fato se deve em grande parte elevao
substancial da expectativa de vida dos brasileiros e queda da fecundidade, aliadas ao
aumento da qualidade de vida e melhorias no sistema de sade com tecnologias mais
avanadas (IBGE, 2013).
Com o envelhecimento da populao, h um aumento da prevalncia das chamadas
doenas crnico-degenerativas, que exigem cuidados e tratamento contnuo (VERAS, 2009).
Essas doenas tornam o idoso mais susceptvel a desenvolver a dependncia funcional, que
o resultado de um processo que se inicia com o surgimento de um dficit no funcionamento
corporal ou psicolgico e, consequentemente, provoca limitaes nas atividades dirias com
interferncia na independncia e autonomia (SEBASTIO; ALBURQUEQUE, 2011).
A independncia refere-se realizao de todas as atividades bsicas de vida diria de
forma independente (MORAES, 2012), enquanto a autonomia primariamente um
fenmeno que envolve independncia de ao, discurso e pensamento do indivduo. Ela prev
como fundamento o alcance amplo de direitos polticos, jurdicos, civis e humanos.
(PROCHET; SILVA, 2011).
O comprometimento da independncia e da autonomia uma das consequncias do
envelhecer com patologias crnico-degenerativas e implica nova ordem na vida cotidiana dos
idosos, que devem encontrar formas de ajustes e de adaptao para conviver com essa
condio. O envelhecer se caracteriza por transformaes importantes, que modificam as
biografias dos idosos, exigindo que elaborem novos arranjos pessoais, fsicos, corporais,
sociais e culturais para dar sentido s muitas histrias que devero experimentar e contar.
15
Por outro lado, o envelhecer tambm comporta a composio de um repositrio de
eventos que se estruturam durante toda a vida. Esse repositrio fornece aos idosos um
conjunto de experincias significativas, as quais se relacionam com as experincias de
convvio com os demais na teia social e relacional de seus viveres individuais e coletivos.
Nessa perspectiva se ergue a memria, um conjunto remanescente de lembranas e imagens
que constituram sua trajetria de vida e os modelos representacionais em torno da velhice e
da dependncia funcional.
Partindo desse contexto, buscou-se responder seguinte questo: Como a memria
do envelhecer concebida pelo idoso longevo com dependncia funcional?. Para responder,
parte-se do pressuposto de que essa fase representa um perodo de mudanas corporais,
fsicas, biolgicas, fisiolgicas e emocionais relacionadas ao bem-estar fsico e mental. O
significado da velhice em torno dessas mudanas elaborado na conjuno dos esforos para
manuteno da resilincia e na preservao de capacidade de manuteno da vida na condio
de idoso. Conhecer os elementos da memria que compem esse cenrio foi a possibilidade
de compreender como o resultado das experincias de vida dos idosos possibilita explicar o
momento que experimentam.
Segundo Santos e Gico (2008), diante da velhice h todo um investimento simblico
que deve ser tomado em considerao, tendo em vista que a nfase biomdica para explic-la
mostra-se insuficiente. Para compreenso desse fenmeno, requer considerar que as vivncias
e experincias dos idosos os ajudam a compor a sua vida e a explic-la e que as suas
narrativas so repertrios tradutores de suas vises de mundo e de seus significados perante a
vida. Neste sentido, as memrias foram mobilizadas como subsdio para o estudo acerca da
dependncia funcional no envelhecimento um fenmeno apreendido em sua dimenso
qualitativa, considerando os aspectos socioeconmicos e culturais vivenciados pelos idosos,
cujos valores, ideologias, crenas esto relacionados ao processo do envelhecimento.
A estratgia de pesquisa para o estudo junto aos idosos encontrou apoio na memria
como recurso analtico, por possibilitar a construo e a reconstituio, por meio dos relatos
individuais ou coletivos, sob a forma de socializao de sentidos dos idosos como sujeitos de
valor. Essa socializao, segundo Bosi (1994), pode aprimorar a construo de um lugar em
que os idosos sejam valorizados e se valorizem e tambm pode ajudar a compreender
amplamente a sociedade hodierna e suas mudanas no decorrer do tempo. Enfim, escutar
relatos dos idosos foi um trabalho com memria, criador de novas possibilidades para o ser
que envelheceu.
16
A opo por pesquisar os idosos longevos com dependncia funcional partiu do
pressuposto de que essa fase da vida precisa ser mais explorada, pois so escassos os estudos
sobre a temtica. Alm disso, o modo de envelhecer pode ou no garantir o envelhecimento
saudvel e satisfatrio, o qual depende da maneira como cada indivduo organiza e vivencia
seu curso de vida, das circunstncias histrico-culturais, dos fatores patolgicos que podem
interferir na sua sade e dos fatores genticos e ambientais (COSTA, 2000, p. 23).
Frente a isso, poderamos dizer que se faz necessrio a velhice ser abordada de forma
ampla, uma vez que buscar perceb-la simplesmente segundo as caractersticas biofisiolgicas
desconsiderar os problemas ambientais, sociais, culturais e econmicos. Para tanto preciso
ter uma viso global do envelhecimento, como processo, e, dos idosos, como indivduos
(PAPALO NETO, 2011).
Diante do exposto, o estudo teve o intento de contribuir para melhor conhecimento do
envelhecer com dependncia funcional e subsidiar a implantao de polticas pblicas
direcionadas ao idoso longevo, com o intuito de promover uma assistncia adequada e que
atenda s reais necessidades de sade/doena. De tal forma, a pesquisa apresenta uma
abordagem temtica bastante relevante, haja vista se tratar de um estudo de compreenso do
envelhecer segundo o prprio idoso longevo, de valorizao dos seus saberes, instrumento
basilar de seu dilogo com as demais geraes.
Importante tambm salientar que, apesar de a pesquisa dar voz a cinco idosos,
acredita-se que o resultado seja representativo de um grupo social. Entende-se que, por causa
desse novo olhar, os atores envolvidos, direta ou indiretamente, com os idosos (profissionais
de sade, cuidadores, famlia, grupos sociais) possam ter uma compreenso melhor sobre o
significado do envelhecer com dependncia funcional para os idosos longevos e, dessa forma,
contribuir para um envelhecimento com sade, autonomia e, consequentemente, com
qualidade de vida.
Partindo desse entendimento e por ter vivenciado a temtica do envelhecimento, na
Graduao em Enfermagem, na disciplina Sade do Idoso, no Estgio Prtico em uma
instituio de longa permanncia para idosos e durante o processo de construo do Trabalho
de Concluso de Curso (TCC) em um Grupo de Convivncia para a Terceira Idade, surgiu o
interesse em realizar pesquisas voltadas a esse grupo da populao brasileira que apresenta
uma complexidade diferenciada dos demais, especialmente numa perspectiva qualitativa,
valorizando a experincia de vida dessa populao.
Nessa perspectiva, a presente dissertao tem por objetivo geral analisar o envelhecer
com dependncia funcional a partir dos relatos de memria de idosos longevos de uma
17
Unidade de Sade da Famlia (USF) de Vitria da Conquista. E como objetivos especficos:
trazer a baila s memrias do viver/envelhecer dos idosos longevos antes e depois da
dependncia funcional e examinar as repercusses psicossociais do envelhecer com
dependncia funcional.
1.3 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DA DISSERTAO
Para fins de organizao, esta dissertao, intitulada Envelhecer com dependncia
funcional: memria de idosos longevos, est estruturada em quatro captulos.
No captulo da introduo, encontra-se a contextualizao do objeto de estudo, que
abrange, de forma sucinta, o envelhecimento e a dependncia funcional e seu entrelaamento
com a memria. Encontram-se, tambm, a apresentao da questo norteadora, a trajetria
para escolha da temtica, a viabilidade do estudo e a sua importncia para a comunidade
cientfica e para profissionais de sade e, por fim, os objetivos da pesquisa. Essa parte inicial
contribuiu para situar a temtica e as proposies do estudo.
No segundo captulo, desenvolve-se o referencial terico e conceitual que consolida a
pesquisa, discutindo os aspectos do envelhecimento, da longevidade e da dependncia
funcional. Encontra-se dividido em trs subtpicos: a) Aspectos demogrficos e
epidemiolgicos do envelhecimento; b) Conceitos que envolvem o envelhecimento humano;
c) Longevidade e dependncia funcional: valorizao dos aspectos biopsicossociais. Esse
captulo permite apresentar um panorama do envelhecimento no Brasil, na Bahia e em Vitria
da Conquista e, ainda, conhecer alguns conceitos bsicos e discusses realizados nos ltimos
anos sobre o envelhecimento humano.
No terceiro captulo, descreve-se a metodologia, abordando o tipo, os sujeitos, com
sua caracterizao, o local da pesquisa, a coleta das informaes, a anlise e a interpretao
das informaes, assim como os aspectos ticos que envolvem o estudo.
No quarto e ltimo captulo, nomeado O desvelar da memria de idosos longevos com
dependncia funcional, so apresentados os resultados da anlise e a interpretao dos dados
empricos. Esse captulo est dividido em trs subcategorias: a) Memria do viver/envelhecer
antes da dependncia funcional; b) Memria do viver/envelhecer aps a dependncia
funcional; c) Repercusses psicossociais do envelhecer com dependncia funcional:
construindo as estratgias de enfrentamento.
Para finalizar so apresentadas as consideraes finais, as referncias, os apndices e
os anexos da pesquisa.
18
2 ENVELHECIMENTO, LONGEVIDADE E DEPENDNCIA FUNCIONAL
Neste captulo, apresentam-se as discusses sobre os temas envelhecimento,
longevidade e dependncia funcional, com intuito de fornecer, de forma sucinta, o referencial
terico que subsidiou o estudo. O captulo est dividido em trs partes, a saber: Aspectos
demogrficos e epidemiolgicos do envelhecimento; Conceitos que envolvem o
envelhecimento humano; Longevidade e dependncia funcional: aspectos biopsicossociais.
2.1 ASPECTOS DEMOGRFICOS E EPIDEMIOLGICOS DO ENVELHECIMENTO NO
BRASIL
Inmeros estudos demogrficos e epidemiolgicos tm demonstrado o crescente
aumento da populao idosa no mundo e, tambm, no Brasil, de modo que a longevidade
uma realidade do sculo XXI, com exceo de alguns pases africanos. Esse processo
resultado das conquistas sociais e polticas e da incorporao de novas tecnologias, como
assepsia, antibiticos, vacinas, quimioterpicos, exames complementares, entre outros
(CHAIMOWICZ, 2013). Todavia, conforme Papalo Neto (2011), foi ainda no sculo XX
que a longevidade apresentou uma verdadeira revoluo, mas, apesar dessa conquista da
humanidade, no ocorreram transformaes socioeconmicas que pudessem melhorar a
qualidade de vida dos idosos.
O processo de transio demogrfica no Brasil comeou ainda no sculo XX. A partir
dos anos de 1940 e 1950, houve um declnio expressivo da mortalidade, porm a fecundidade
se manteve em nveis extremamente altos. Como resultado, a populao ficou quase estvel e
jovem e, consequentemente, com rpido crescimento. No final da dcada de 1960, a
fecundidade reduziu-se, provocando o processo de transio da estrutura etria, surgindo
caractersticas de um pas envelhecido e com compasso de crescimento baixssimo
(CARVALHO; RODRGUEZ-WONG, 2008).
Quando um pas envelhece, suas caractersticas epidemiolgicas tambm passam por
transformaes. A transio epidemiolgica ocorre quando uma mudana nos padres de
morbimortalidade perceptvel, principalmente por declnio das doenas infecto-parasitrias e
aumento das doenas crnico-degenerativas. A reduo das taxas de mortalidade tem como
consequncia o aumento da expectativa de vida, embora esse dado sozinho no provoque o
aumento populacional. Este fato somente ocorre se as taxas de fecundidade e natalidade
19
carem, pois, assim, a populao de adultos aumenta levemente, o grupo etrio de jovens se
reduz e o das pessoas mais velhas aumenta em termos relativos.
Nos pases em desenvolvimento, como o caso do Brasil, o incremento
socioeconmico, a urbanizao e, principalmente, a introduo de antibiticos, as vacinas e
outras conquistas da medicina foram os responsveis pela queda da mortalidade no final dos
anos de 1940 e 1950. Entretanto, ainda nesse perodo a taxa de natalidade permaneceu alta.
Somente a partir do final da dcada de 1960 e 1970, com a introduo dos mtodos
anticoncepcionais e o movimento feminista, as taxas de fecundidade despencaram. O
resultado gerou baixas taxas de natalidade e mortalidade, crescimento discreto da populao
total e aumento progressivo da populao de idosos, com consequente envelhecimento
populacional.
Alm desses fatores, importante destacar que a industrializao, a migrao, as
mudanas no estilo de vida, a introduo da mulher no mercado de trabalho pode ser tambm
responsveis pelo envelhecimento populacional.
Vale ressaltar que o envelhecimento um fenmeno mundial, mas ocorre
diferenciadamente para cada pas ou regio. Nos pases desenvolvidos, houve uma transio
demogrfica gradual em um longo perodo de tempo. Em contrapartida, nos pases em
desenvolvimento, como o Brasil, as transformaes foram rpidas, intensas e alarmantes
(PAPELO NETO, 2011). Esse panorama explica o fato de o desenvolvimento
socioeconmico e cultural, para os idosos que vivem em pases desenvolvidos, ser uma
realidade mais ntida, enquanto, no Brasil, em razo das condies em que ocorreu esse
processo, as repercusses negativas ainda so muito grandes e nos mais diversos setores da
sociedade.
O Brasil tem contribudo muito para uma escala global de pas envelhecido. Sua
populao total de 190 755 799 habitantes, sendo que desses, 20.590.597 so idosos com 60
anos ou mais (IBGE, 2010a). Conforme a mesma fonte, pessoas de 20 a 59 anos so a
maioria, totalizando 107.242.036 habitantes. Esse dado demonstra que esses adultos de hoje
sero em poucos anos idosos. Dessa forma, os dados confirmam a constatao anterior de que
o Brasil caminha para ser um pas envelhecido. Nota-se que esses dados representam um
quadro de envelhecimento muito relevante com projees de que, em poucas dcadas, a
populao idosa exceda a populao jovem, portanto alterar ainda mais a estrutura etria da
populao.
As pirmides etrias seguintes (Figuras 1, 2, 3), que compreendem os anos de 1980,
2010 e a projeo para 2040, demonstram as transformaes pelas quais o Brasil tem passado
20
no que diz respeito ao perfil etrio da populao e projeo futura.
Na Figura 1, apresenta-se a distribuio etria da populao brasileira por sexo em
1980. Ao observ-la, possvel perceber que a maioria da populao de crianas e jovens, o
que d o formato triangular ao grfico.
Figura 1 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 1980
Fonte: IBGE, 2013a.
A Figura 2, apresenta a distribuio etria da populao brasileira, por sexo, em 2010.
Observa-se que a base da pirmide comea a ter um estreitamento, em especial na faixa etria
que compreende as crianas, enquanto o topo da pirmide est se alargando. Assim, a
pirmide vai deixando o formato triangular, apresentado na Figura 1, e vai se tornando
levemente cilndrica. Ainda possvel inferir, ao se observar a Figura 2, que a populao
brasileira considerada ainda jovem, porm vai se tornando adulta, visto que esta a faixa
etria de maior crescimento populacional nesse perodo. Assim, a pirmide etria que outrora
(Figura 1) apresentava uma base larga, consequncia de uma fecundidade elevada, passa a
assumir um desenho diferente com o aumento da expectativa de vida da populao brasileira.
21
Figura 2 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 2010
Fonte: IBGE, 2013a.
Como se pode ver, a Figura 3 apresenta a projeo da distribuio etria da populao
brasileira, por sexo, em 2040. Ao observar a figura, percebe-se que a base da pirmide se
estreitou completamente enquanto o topo est se alargando. Essas mudanas significam que a
populao de crianas, de adolescentes e a de adultos tambm diminuiu, enquanto a de idosos
aumentou reflexo de uma realidade brasileira na qual a taxa de fecundidade vem diminuindo
desde a dcada de 1970 e a expectativa de vida s tem aumentado (IBGE, 2010b). Portanto,
possvel definir que a populao do Brasil em 2040 ser considerada uma populao madura.
Figura 3 - Distribuio etria da populao por sexo Brasil, 2040
Fonte: IBGE, 2013a.
22
Fazendo uma anlise da evoluo etria no Brasil, representada nas trs Figuras,
possvel constatar que, comparando os perodos de tempo, existe uma diminuio acentuada
da populao jovem e, em contrapartida, um elevado aumento da populao adulta e idosa.
Essa constatao fica ntida na projeo para a dcada de 1940, com base na qual se estima
que, em vinte anos, a populao idosa triplique.
Deve-se salientar que o quantitativo de idosos no Brasil passou de 3 milhes, em 1960,
para 20 milhes em 2008 um aumento bastante expressivo que chega a quase 700% em
menos de 50 anos. A cada ano, 650 mil novos idosos so introduzidos na populao brasileira
(VERAS, 2009). Conforme projees do IBGE, a populao idosa do Brasil deve chegar a
58,4 milhes, ou seja, 26,7% do total da populao em 2060 (BRASIL, 2012).
Em conformidade com o que vem acontecendo no Brasil, no que tange estrutura
etria, na Bahia (SEI, 2013), ocorrer uma mudana no perfil da pirmide etria entre 2010 e
2030 (Figura 4), em consequncia do processo de declnio da fecundidade em conjunto com
as mudanas na migrao e mortalidade no decorrer do perodo considerado.
Figura 4 - Distribuio etria da populao por sexo e grupos de idade,
Bahia - 2010/2030
Fonte: SEI, 2013.
Quando se concentra a anlise na cidade de Vitria da Conquista, percebe-se um
cenrio bastante parecido com a realidade brasileira e baiana. A Figura 5 apresenta uma ntida
inverso do crescimento da populao conquistense: enquanto em 2000, a base da pirmide,
que representa a populao de crianas e jovens, estava mais alargada, ou seja, o crescimento
23
populacional foi maior nessas faixas etrias, no ano de 2010, a base comeou a se estreitar e
haver um discreto aumento da populao adulta e idosa, o que caracteriza, para projees
futuras, uma populao envelhecida, haja vista a realidade brasileira, baiana e tambm
conquistense de reduo da taxa de natalidade e aumento da expectativa de vida ao nascer.
Figura 5 - Distribuio etria da populao por sexo, segundo o municpio
Vitria da Conquista, Bahia - 2000/2010
-8,0 -6,0 -4,0 -2,0 0,0 2,0 4,0 6,0 8,0
0-4
5-9
10-14
15-19
20-24
25-29
30-34
35-39
40-44
45-49
50-54
55-59
60-64
65-69
70-74
75-79
80-84
85-89
90-94
95-99
100 +
Homens 2000 Homens 2010 Mulheres 2000 Mulheres 2010
Fonte: IBGE, 2013a.
Conforme o Censo Demogrfico (IBGE, 2010a), o municpio de Vitria da Conquista
em 2010 tinha uma populao de, aproximadamente, 306.866 habitantes, sendo que, desses,
30.158 eram idosos e, entre os idosos, cerca de 4.192 eram longevos, logo tinham idade acima
de 80 anos. Esses dados reafirmam o quanto h uma proximidade entre a realidade
conquistense, baiana e brasileira, no que diz respeito ao envelhecimento da populao.
Esse nmero alarmante de pessoas com 60 anos ou mais um desafio para rgos
governamentais e tambm para toda a sociedade, especialmente no que diz respeito s
questes socioeconmicas e, em especial, de sade. Essa realidade deve, sem dvida, ser
encarada com preocupao e ser abordada de forma ampla.
Outro dado muito interessante o crescimento do nmero dos muito idosos, j que no
somente est aumentando o nmero de idosos, mas esses idosos esto envelhecendo, ou seja,
passando dos 80 anos (CAMARANO; KANSO; MELO, 2004). Essa populao de idoso
longevo deve ser valorizada, uma vez que o grupo etrio que mais vem crescendo no Brasil
porque a mortalidade dos idosos jovens (de 60 a 74 anos) vem caindo de maneira progressiva.
24
Estimativas consideram que, em 2030, representaro 21% dos idosos, ou 2,7% dos brasileiros,
passando a contar, assim, com 5,5 milhes de octogenrios (CHAIMOWICZ, 2013).
Outro dado a ser visto com importncia a expectativa de vida. Os nmeros de
projeo do IBGE indicam que a esperana de vida ao nascer, que, em 2013, chegou a 71,3
anos para homens e 78,5 anos para mulheres, em 2060, deve atingir 78,0 e 84,4 anos,
respectivamente (IBGE, 2014). Esse dado refora, alm do aumento da expectativa de vida, o
processo de feminizao da populao idosa.
2.2 CONCEITOS QUE ENVOLVEM O ENVELHECIMENTO HUMANO
No h uma marca exata para a transio da fase da vida que pode definir uma pessoa
como idosa. Fala-se em [...] processos biolgicos, aparncia fsica, surgimento de doenas
crnicas, perda de capacidades fsicas e mentais e de papis sociais, nascimento de netos,
entre outros (CAMARANO, 2008, p. 130). No entanto, de acordo com esse autor, a
demarcao do incio complexa, pois envolve questes sociais, econmicas, regionais,
culturais, tnicas e de gnero.
Conforme a Poltica Nacional do Idoso e o Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003, 2010),
considerado idoso o indivduo com 60 anos ou mais. uma classificao baseada na
preconizao da Organizao Mundial de Sade, a qual institui que, para os pases
desenvolvidos, uma pessoa idosa com 65 anos e, para os pases em desenvolvimento, como
o Brasil, acima de 60 anos. Esse conceito baseado na idade cronolgica um tanto
limitante, pois coloca o idoso numa homogeneidade, sem considerar as trajetrias de vida de
cada indivduo, as condies econmicas, de gnero e raa, ou seja, no considera outras
dimenses s quais o sujeito est exposto. Todavia, a demarcao mais usual e necessria
pelo fato de facilitar benefcios, polticas pblicas e, tambm, pesquisas.
Apesar de o envelhecimento ser comum a todos os seres vivos animais, no ocorre de
forma igual para todos. O envelhecimento pode ser compreendido como um processo natural,
de diminuio progressiva da reserva funcional dos indivduos senescncia , o que, em
condies normais, no costuma provocar qualquer problema. No entanto, em condies de
sobrecarga, como doenas, acidentes e estresse emocional, pode ocasionar uma condio
patolgica que requeira assistncia senilidade (BRASIL, 2003).
Neri (1999) vai alm desse conceito quando sugere que a velhice e o envelhecimento
so realidades heterogneas, isto , variam conforme os tempos histricos, as culturas e
subculturas, as classes sociais, as histrias de vida pessoais, as condies educacionais, os
25
estilos de vida, os gneros, as profisses e as etnias, entre outros aspectos que configuram as
trajetrias de vida dos indivduos e grupos. Portanto, o processo de envelhecimento ocorre de
maneira singular e complexa, varia para cada pessoa e depende de fatores biolgicos,
psicolgicos e sociais (VIEIRA, 2012).
Vrios termos vm sendo utilizados para caracterizar a pessoa que j passou dos 60
anos de idade, entre eles se destacam: envelhecimento, velhice, terceira idade e idoso. Apesar
de parecer de fcil explicao, esses termos so bastante complexos e requerem uma distino
entre si, pois podem apresentar conotaes que suavizam ou agravam os efeitos na sociedade.
Envelhecimento, conforme Manzaro (2013, p. 1), deve ser entendido como um
processo natural da vida que traz consigo algumas alteraes sofridas pelo organismo,
consideradas normais para esta fase. Nesse sentido envelhecemos desde o momento em que
nascemos.
A velhice a ltima fase do processo de envelhecer humano, pois no um processo
como o envelhecimento, antes um estado que caracteriza a condio do ser humano
(SANTOS, 2010, p. 1037). O termo velhice carregado de preconceito e era muito usado para
designar as pessoas mais pobres. Era entendida como a decadncia fsica e invalidez,
momento de descanso e quietude no qual imperavam a solido e o isolamento afetivo.
Conforme Silva (2008, p. 161), com a introduo da expresso terceira idade, a
velhice comeou a ser vista de outra forma:
Passa a significar o momento do lazer, propcio realizao pessoal que
ficou incompleta na juventude, criao de novos hbitos, hobbies e
habilidades e ao cultivo de laos afetivos e amorosos alternativos famlia.
Assim, a expresso terceira idade sugere a fase da aposentadoria e do envelhecimento
com qualidade de vida. A expresso foi criada na Frana em 1962 com a introduo da
poltica de integrao social com o intuito de transformar a imagem da velhice, promovendo
uma separao entre os jovens velhos e os mais velhos.
Idoso, termo mais adequado para o indivduo que j passou dos 60 anos de idade, um
conceito que tambm foi criado na Frana, em 1962, com o intuito de substituir os termos
velho e velhote. Nesse mesmo perodo, o estilo de vida das camadas mdias comea a se
disseminar para todas as classes de aposentados, que passam a assimilar as imagens de uma
velhice associada arte do bem viver (SILVA, 2008, p. 163). Logo depois, o vocbulo idoso
foi tomado no Brasil em documentos oficiais. Assim, o idoso o sujeito do envelhecimento,
26
um termo menos estereotipado e mais apropriado para pessoas acima de 60 anos (PEIXOTO,
1998).
2.3 LONGEVIDADE E DEPENDNCIA FUNCIONAL: ASPECTOS BIOPSICOSSOCIAIS
O grupo populacional de idosos compreende uma faixa etria to extensa que preciso
dividi-la em segmentos. Os idosos jovens so os de idade igual ou superior a 60 anos at a
faixa etria de 69 anos; e os que passaram de 80 anos so os mais idosos ou idosos longevos
(CAMARANO; KANSO; MELO, 2004). Na pesquisa optou-se por usar o termo idoso
longevo.
Concorda-se com Veras (2004) quando ele diz que difcil assinalar uma pessoa como
idosa fazendo uso apenas da idade cronolgica. Apesar disso, utilizou-se, na pesquisa, esse
critrio, por questes particulares, pois era preciso delimitar o corpus. Acredita-se que essa
definio um tanto generalista, pois, como j se mencionou, o processo de envelhecimento e
a velhice dependem dos mais diversos fatores: socioculturais, polticos e econmicos, em
interao dinmica e permanente com a dimenso biolgica e subjetiva dos indivduos
(ASSIS, 2004, p. 11). Assim, mesmo utilizando o critrio idade, no so desconsiderados os
demais; pelo contrrio, necessrio assinal-los neste captulo e diluir nas discusses do
captulo seguinte.
Para Norberto Bobbio (2004), existem trs tipos de velhice: a cronolgica, a qual no
leva em considerao as caractersticas do indivduo; a burocrtica, que corresponde ao acesso
aos benefcios, como aposentadoria e passe livre; e a subjetiva, que depende do sentir de cada
um, das caractersticas singulares de cada indivduo.
Para Simone de Beauvoir (1990), a velhice acontece conforme o contexto social que o
sujeito viveu ou vive; desse modo, no existe uma velhice, h, sim, velhices, ou seja, a velhice
masculina e feminina, a dos ricos e dos pobres, a do intelectual, a do funcionrio burocrtico e
a do trabalhador braal. Corroborando a afirmao de Beauvoir, Zimerman (2000, p. 19)
afirma que velho aquele que tem diversas idades: a idade do seu corpo, da sua histria
gentica, da sua parte psicolgica e da sua ligao com a sociedade. Nesse sentido, os
aspectos sociais vo interferir de forma contundente na maneira como cada indivduo ir
envelhecer.
pensando nessa heterogeneidade que se salienta a complexidade de pensar o
processo de envelhecer por outros prismas, como o social e o psicolgico. Acredita-se que
27
necessrio haver essa discusso, pois na esfera do social e do psicolgico que as
consequncias do envelhecer sero sentidas com maior intensidade.
Em todos os ciclos da vida, o indivduo constri saberes e experincias que so
acumulados e do s trajetrias de suas vidas caractersticas prprias para a construo de sua
identidade quando idoso, por isso afirma-se que os fatores sociais e psicolgicos interferem
no processo de envelhecer do indivduo. No se quer, assim, descartar o j provado
envelhecimento biolgico, claro e ntido, com deteriorao dos rgos, reduo de
funcionalidades corporais, diminuio gradativa da possibilidade de sobrevivncia e
alteraes na aparncia fsica. Deseja-se apenas salientar a importncia do social e do
psicolgico, associados ao biolgico, para o processo de envelhecer.
Concorda-se com Mendes et al. (2005), para quem os conflitos psicolgicos e sociais
apressam as deterioraes relacionadas ao processo de envelhecimento e para quem a
habilidade pessoal de encontrar significado para viver pode ter influncia nas alteraes
biolgicas e de sade que acometem o idoso. Verifica-se, portanto, que o papel social do
idoso de extrema importncia para o processo de envelhecimento e para a consolidao do
significado de seu envelhecer.
Conforme foi mencionado anteriormente o aumento da expectativa de vida uma
realidade no Brasil, assim como o aumento da ocorrncia de doenas crnico-degenerativas.
Essas doenas tm, na maioria das vezes, como grande consequncia, a incapacidade, o que
torna o envelhecimento humano um tanto contraditrio, considerando que, ao mesmo tempo
em que h o desejo de viver muito, existe a angstia de viver com doenas e dependncia
(MINOSSO et al., 2010). Ressalte-se que Embora a velhice no seja sinnimo de doena, na
idade mais avanada h maior risco de comprometimento da capacidade funcional, com
consequente perda de autonomia e independncia (LEMOS; MEDEIROS, 2002, p. 892).
Segundo estudo, existe um expressivo aumento da dependncia funcional quando o
idoso passa dos 80 anos de idade. No que diz respeito ao Brasil, a dependncia geralmente
aumenta em torno de 5% na faixa etria de 60 anos e, para aproximadamente, 50% para
aqueles com 90 anos ou mais (BRASIL, 2003). Esse dado demonstra que, com o avanar da
idade, a suscetibilidade ao desenvolvimento de incapacidades extremamente maior quando
se compara com os idosos mais jovens.
A dependncia est associada fragilidade, ou seja, vulnerabilidade em relao ao
ambiente. Um idoso dependente precisa de ajuda constante para as atividades bsicas da vida
diria. Entretanto, a dependncia no um estado irreversvel, pois tanto pode evoluir como,
tambm, ser reduzido (PAPELO NETO, 2011).
28
Os idosos acima de 80 anos so o grupo da populao que mais tem crescido no
mundo (LEVY, 2001) e, tambm, um grupo singular e distinto dos idosos jovens, quando
considerada a prevalncia de doenas e o grau de dependncia funcional, fatores que
interferem na capacidade funcional do indivduo, tornando-o mais vulnervel a agravos de
sade e doenas (SOUZA; SKUBS; BRETS, 2007). Esses idosos apresentam caractersticas
fisiolgicas, psicolgicas, sociais e econmicas particulares e com diferenas importantes
dentro do prprio grupo.
As diferenas, porm, so particulares a cada pessoa e dependem do contexto social e
cultural em que cada idoso est inserido, assim como do grau de autonomia e independncia
na realizao das atividades cotidianas (FERRARI, 2002). Autonomia significa liberdade e
capacidade de o indivduo agir por conta prpria, incluindo aspectos de comportamento,
decises e cursos de ao. Difere da independncia, que definida como a habilidade de
executar funes relacionadas vida diria (ANSAI; SERA, 2013, p. 190).
Estudo realizado pela University of California, Los Angeles (UCLA), evidencia que o
estado funcional tem impacto na expectativa de vida de idosos e comprova que um idoso de
75 anos independente tem uma expectativa de vida cinco anos maior do que o idoso da
mesma idade com dependncia para atividades bsicas da vida diria. Essa mesma pesquisa
sugere que a expectativa de vida de um idoso dependente de 75 anos similar de um idoso
de 85 anos independente (IOSHIMOTO, 2010).
Convm mencionar que, para muitos idosos, em especial os longevos, as perdas
sucessivas de autonomia e controle provocam sentimentos de ansiedade, tristeza, medo e a
necessidade de adaptao a um novo estilo de vida. Todavia, entende-se ainda que, com o
envelhecimento, os sujeitos, por reaes adversas e compensatrias diante das perdas
decorrentes do processo, constroem mecanismos de compensao. Assim, a velhice depende
da histria de vida de cada indivduo, por isso assume um carter subjetivo (COSTA, 2000).
Nesse mesmo sentido Neri (2001, p. 4) assim analisa:
A incapacidade para o desempenho de atividades instrumentais de vida
diria no significa necessariamente impedimento para a continuidade do
funcionamento cognitivo e emocional. Alm disso, os idosos so capazes de
ativar mecanismos de compensao para enfrentar perdas em funcionalidade,
quer lanando mo de recursos tecnolgicos e de apoios sociais e
psicolgicos quer valendo-se do controle exercido sobre o comportamento
de outras pessoas.
Portanto, o maior desafio na ateno pessoa idosa conseguir contribuir para que,
apesar das progressivas limitaes que venham ocorrer, elas possam redescobrir
29
possibilidades de viver sua prpria vida com a mxima qualidade e autonomia possvel. Essa
possibilidade aumenta na medida em que a sociedade considere o contexto familiar e social e
consiga reconhecer as potencialidades e o valor das pessoas idosas. Logo, parte das
dificuldades das pessoas idosas est mais relacionada a uma cultura que as desvaloriza e
limita (BRASIL, 2003).
Salienta-se que essa desvalorizao est muito relacionada a um modelo capitalista
que fez com que a velhice passasse a ocupar um lugar marginalizado na existncia humana,
na medida em que a individualidade j teria os seus potenciais evolutivos e perderia ento o
seu valor social (MENDES et al., 2005, p.24). Diante dessa dinmica, Moreira (2012) afirma
que os ambientes sociais instituem quais so as representaes exercidas pelos indivduos,
assim a velhice est relacionada ao momento de distanciamento da vida ativa, ou seja, tempo
de se aposentar. Nesse contexto Mendes et al. (2005), salienta que:
Na vida do homem, a aposentadoria muitas vezes acontece como uma
descontinuidade. H uma ruptura com o passado, o homem deve ajustar-se a
uma nova condio que lhe traz certas vantagens, como o descanso, lazer,
mas tambm graves desvantagens como desvalorizao e desqualificao
(MENDES et al., 2005, p.424).
A desvalorizao e desqualificao apontada por Mendes et al. (2005) est muito
relacionada ao papel social do trabalho, pois este visto com uma centralidade na vida das
pessoas e a base de sustentao scio-econmica do prprio sustento e o da famlia
(MOREIRA, 2012). Assim, aposentar-se em uma sociedade competitiva, que valoriza a
produo e o consumo, significa a perda de um importante papel, e tambm de um espao
social reconhecido e valorizado. Esse fato pode levar a uma situao de desajustamento,
isolamento e at marginalizao (FERNANDES; ZORDAN, 2012, p.7).
Alm da viso como improdutivo o idoso perde, por vezes, a posio de comando e
deciso. As relaes entre pais e filhos modificam-se, o filho que antes era mandado passa a
ter um papel social de comando diante dos seus pais. Essa inverso de papis possibilita a
dependncia do idoso diante do seu ambiente social (MENDES et al., 2005).
Diante do brevemente exposto, fica claro que analisar o envelhecer demanda muito
mais do que caracteriz-lo numa perspectiva puramente biofisiolgica e cronolgica como
etapas estticas da vida. Requer uma compreenso holstica do idoso como ser social e
tambm psicolgico. Para isso, a ateno abrangente a pessoa idosa uma vivel conduta dos
profissionais das mais diversas reas do conhecimento que visam dar conta da complexidade
do processo de envelhecimento, bem como a velhice como uma etapa desse processo.
30
A ateno abrangente sade da populao idosa comeou a ocorrer a partir da dcada
de 1930 com a pesquisadora Marjory Warren, como ponto de partida para a avaliao
multidimensional/interdisciplinar, com uma sobreposio dos limites biolgicos e maior
importncia avaliao do estado funcional. Essa avaliao abrangente inclui a histria
clnica, o exame fsico, uma abordagem ampla do estado funcional e mental, dos fatores
socioeconmicos, da colaborao do paciente e da famlia (COSTA; MONEGO, 2003).
A avaliao do idoso deve levar em conta fatores intrnsecos, como a gentica, e
extrnsecos, como o estilo de vida. Esses fatores, sem dvida, levam a mudanas no processo
de envelhecimento, com diminuio da manuteno do equilbrio homeosttico, da
capacidade de reserva, de defesa e de adaptao, tornando mais vulnervel a qualquer
estmulo, seja ele traumtico, infeccioso ou psicolgico (BRASIL, 2003). Como
consequncia, o idoso passa a ter maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de doenas e
tambm alta possibilidade de mortalidade.
Por esse raciocnio, concorda-se com a afirmao de Papelo Neto (2011) de que a
maneira correta de avaliar um idoso a Avaliao Geritrica Ampla (AGA), que centraliza a
ateno nos problemas, definindo o estado funcional e a qualidade de vida. Para que isso
ocorra de forma coerente e produtiva, faz-se necessrio uma equipe interdisciplinar que
envolva profissionais das mais diversas reas, com destaque para geriatras, enfermeiros,
fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, assistente social, nutricionistas, entre outros.
A avaliao multidimensional/interdisciplinar define deficincias, incapacidades e
desvantagens apresentadas pelo idoso, com o intuito de planejar o cuidado e o
acompanhamento em longo prazo (RUBESTEIN; RUBESTEIN, 1998).
Os idosos longevos esto entre os grupos de idosos mais susceptveis a se tornarem
dependentes. Quando vivem sozinhos, so mulheres, solteiras ou vivas, vivem isolados, ou
moram com um cnjuge com incapacidade moderada, com limitao econmica, sem filhos,
residem em abrigo ou casas de repouso, essa susceptibilidade aumenta ainda mais (BATISTA
et al., 2008).
Conforme Levy (2001), a avaliao multidimensional do idoso se inicia com a reviso
da sade fsica, habilidade funcional, sade mental, apoio social e adequao ambiental.
Na avaliao multidimensional, so avaliados alguns parmetros, tais como: equilbrio e
mobilidade; funo cognitiva; deficincias sensoriais; condies emocionais (presena de
sintomas depressivos); disponibilidade e adequao de suporte familiar e social; condies
ambientais; capacidade funcional (atividades da vida diria e atividades instrumentais da vida
diria), estado e risco nutricional (COSTA; MONEGO, 2003).
31
A avaliao do estado funcional esteve em destaque durante a pesquisa no momento
de avaliao dos idosos quanto dependncia funcional. A avaliao da capacidade funcional
consiste em avaliar a capacidade do idoso diante das atividades bsicas e complexas da vida
diria. A primeira se relaciona a banhar-se, vestir-se, transferir-se, ter continncia e alimentar-
se (MINOSSO et al., 2010), enquanto a segunda refere-se a usar o telefone, preparar
refeies, fazer compras, controlar o dinheiro, arrumar a casa, tomar medicamentos, caminhar
ou utilizar meios de transporte (LAWTON; BRODY, 1969). Idosos que necessitam de ajuda
de outro para realizar essas tarefas de forma parcial ou total so considerados dependentes
totais ou dependentes parciais.
importante ressaltar que, na avaliao da capacidade funcional, devem-se levar em
conta os desvios, principalmente aqueles relacionados ao gnero e condio
socioeconmica, como um homem cozinhar ou um idoso usar o telefone, haja vista que essas
duas situaes diferem de um idoso para outro, conforme a sociedade ou a condio
econmica em que se encontram.
Ante a heterogeneidade do processo de envelhecimento e as influncias de diversos
fatores que podem acometer os idosos e as famlias, a avaliao da capacidade funcional um
desafio profissional de sade a ser enfrentado. preciso suplantar a abordagem clnico-
curativa, em benefcio de uma atuao multiprofissional e interdisciplinar, com vistas a
manter a autonomia e a independncia dos idosos e a possibilitar o envelhecimento ativo com
qualidade de vida e apoio das famlias e dos cuidadores (AIRES; PASKULIN; MORAIS,
2010).
32
3 PERCURSO METODOLGICO
Para Gil (2008, p. 49), A formulao do problema, a construo de hipteses e a
identificao das relaes entre variveis constituem passos do estabelecimento do marco
terico ou sistema conceitual da pesquisa. Mas, para que o problema adquira o significado
cientfico se faz necessrio o confronto da viso terica do problema com os dados da
realidade. Ento, preciso definir o delineamento da pesquisa, ou seja, construir uma proposta
de pesquisa que seja vivel e adequada ao alcance dos objetivos j construdos.
Descobrir a melhor forma para a proposta de pesquisa o primeiro ponto de partida de
um pesquisador, o que torna instigante e, ao mesmo tempo, um desafio a ser cumprido. Pensar
em uma metodologia que possa dar conta da problemtica ento ponderar se no final vai dar
certo, de modo que o objetivo proposto seja alcanado. Criar um roteiro, que una o conjunto
de etapas e informaes e, tambm, a base filosfica, que organiza a ao do pesquisador,
uma tarefa complexa que requer uma metodologia adequada.
Conforme Gerhardt e Slveira (2009), metodologia o estudo da organizao, dos
passos a serem percorridos para concretizao de uma pesquisa e se preocupa com a validade
do caminho selecionado para consecuo do objetivo da pesquisa. No se deve confundir
metodologia com teoria, muito menos com os procedimentos, que so os mtodos e tcnicas.
A metodologia vai alm da exposio dos procedimentos, ela sugere a escolha terica
realizada pelo pesquisador com o intuito de abordar o objeto de estudo.
Nos pontos que se seguem sero apresentados todos os procedimentos metodolgicos
utilizados para a construo da pesquisa: o tipo, os sujeitos, o local, a coleta das informaes,
a anlise e interpretao dos resultados.
3.1 TIPO DE PESQUISA
A pesquisa consistiu em um estudo exploratrio descritivo com abordagem qualitativa.
Os estudos exploratrios proporcionam maior familiaridade com o tema, no intuito de
constituir hipteses. E o estudo descritivo objetiva a descrio das caractersticas da
populao do estudo, com vistas a levantar opinies, atitudes e crenas dos sujeitos (GIL,
2008).
O tipo de abordagem qualitativa foi escolhido pelo fato de priorizar o ponto de vista e
os sentidos construdos pelos sujeitos, focalizando a realidade de maneira aberta, flexvel e
contextualizada, alm de favorecer o acesso riqueza dos69 dados descritivos. Trata-se de
33
uma anlise de casos concretos em suas peculiaridades, utilizando expresses e atividades das
pessoas em seus contextos locais (FLICK, 2009). Assim, a pesquisa qualitativa parte da
noo da construo social das realidades, est interessada nas perspectivas dos participantes,
em suas prticas do dia a dia e em seu conhecimento cotidiano em relao ao estudo
(FLICK, 2009, p. 16).
3.2 LOCAL DE PESQUISA
O estudo foi realizado em uma Unidade de Sade da Famlia (USF), localizada na
zona urbana do municpio de Vitria da Conquista Bahia. A escolha desse local para a
realizao da pesquisa se deu em virtude de ser um espao em que possvel encontrar o
sujeito de investigao. Alm do mais, um dos campos de estgio da Universidade Estadual
do Sudoeste da Bahia (UESB).
O municpio de Vitria da conquista est localizado na mesorregio do Sudoeste da
Bahia e dista de Salvador (capital do estado) cerca 517 km, sendo essa a distncia de
conduo (DISTNCIAS DE CIDADES, 2015). A Figura 6 permite visualizar essa
localizao, pois destaca o estado da Bahia no Brasil; j a Figura 7 evidencia o municpio de
Vitria da Conquista na Bahia.
Figura 6 - Localizao da Bahia no Brasil
Fonte: IBGE1, 2015.
34
Figura 7 - Localizao de Vitria da
Conquista na Bahia
Fonte: IBGE1, 2015.
O municpio de Vitria da Conquista tem uma populao total de 315.884 habitantes.
Dispe de 7 Unidades Bsicas de Sade; 33 Unidades Bsicas de Sade da Famlia, sendo 16
na zona urbana e 17 zona rural. Conta ainda com 27 equipes do Programa de Sade da
Famlia na zona urbana e 17 zona rural, totalizando 44 equipes (PMVC, 2015).
Vale ressaltar que A Sade da Famlia entendida como uma estratgia de
reorientao do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantao de equipes
multiprofissionais em unidades bsicas de sade (BRASIL, 2012). A base desse programa
est nas aes voltadas promoo da sade, preveno, recuperao, reabilitao de doenas
e agravos mais frequentes e, ainda, manuteno da sade (BRASIL, 2012).
3.3 PARTICIPANTES DA PESQUISA
Os participantes da pesquisa foram cinco idosos com idade igual ou superior a 80 anos
(idosos longevos), de ambos os sexos, cadastrados em uma Unidade de Sade da Famlia da
zona urbana do municpio. A escolha dos idosos foi independente de cor, raa e grupo social,
porm todos tinham dependncia funcional e apresentavam condies mentais preservadas.
Achavam-se cadastrados na USF, aproximadamente (por ser um dado no oficial, mas
informado pelos Agentes Comunitrios de Sade), 46 idosos acima de 80 anos. Foi possvel
visitar apenas 34 desses 46 idosos, em razo da dificuldade de acesso a eles, por motivos
1 Disponvel em: .
http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=293330&search=bahia|vitoria-da-conquistahttp://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=293330&search=bahia|vitoria-da-conquista
35
diversos. Entre os que foram visitados, 16 eram funcionalmente dependentes, assim definidos
com base nos testes realizados (ndice Barthel e Escala de Lawton), e 18 apresentavam
capacidade funcional preservada. Dos 16 idosos dependentes funcionalmente, 2 faleceram na
semana em que foi dado incio s entrevistas, e 1 idoso faleceu aps a realizao da entrevista
(arquivada). Restaram 13 idosos; destes, apenas 9 apresentaram condies cognitivas
preservadas para responder entrevista com base na avaliao do Mini-exame do Estado
Mental (pontuao 24 pontos).
Dos 9 idosos, 1 idosa, em um primeiro momento em que foi marcada a entrevista,
adoeceu e foi internada. Aps a alta, foi agendada nova entrevista, porm ela no apresentava
condies para responder s perguntas, pois se encontrava extremamente debilitada. Duas
semanas depois, foi agendada nova entrevista; porm, como o estado de sade da idosa
piorava, foi descartada a possibilidade de agendar outro momento em razo do tempo
disponvel para a coleta dos dados.
Foi dado incio as entrevistas, sendo que em 5 entrevistas houve saturao dos dados,
ou seja, apresentou-se redundncia de informaes. Segundo Thiry-Cherques (2009, p. 21),
A saturao designa o momento em que o acrscimo de dados e informaes em uma
pesquisa no altera a compreenso do fenmeno estudado. Desse modo, foi interrompida a
coleta de dados quando se constatou que no estava havendo mais elementos novos para
contribuir com a teorizao esperada, ou seja, nada de novo estava sendo compreendido nas
entrevistas (FONTANELLA et al., 2011).
Como critrio de incluso no estudo foram adotados: ter idade superior a 80 anos,
possuir condies mentais, segundo a avaliao do MEEM (pontuao > 24 pontos);
apresentar dependncia funcional de acordo com a avaliao do ndice de Barthel e a Escala
de Lawton. J como critrio de excluso: no est presente no domiclio aps duas visitas e
dificuldade de acesso ao domiclio.
No Quadro 1, so apresentadas as principais caractersticas sociais, econmicas e
epidemiolgicas dos participantes. Salienta-se que esta caracterizao no fora estabelecida
como um dos objetivos da pesquisa, contudo, entendeu-se que, conhecendo os respondentes
do estudo, tornava-se possvel nortear as discusses posteriores.
36
Quadro 1 - Caracterizao dos idosos longevos, participantes do estudo. Vitria da
Conquista/BA, 2015
PERFIL
IDOSO SOCIOECONMICO EPIDEMILGICO
IDL 1
Feminino 87 anos
Viva
Mora com a filha
Analfabeta
Aposentada com um salrio mnimo
Foi trabalhadora rural
Catlica
Patologias
Hipertenso e Osteoporose
Sequelas
Deambulao prejudicada
IDL 2
Feminino 80 anos
Casada
Mora com o cnjuge e com a filha
Ensino Mdio completo
Aposentada com um salrio mnimo
Foi professora e vice-diretora
Evanglica
Patologias
Hipertenso, Osteoporose, Artrose, Problema
de coluna e Cegueira
Sequelas
Deambulao prejudicada, dores constantes e
dificuldade para enxergar
IDL 3
Masculino 93 anos
Casado
Mora com a cnjuge e a neta
Alfabetizado
Aposentado com um salrio mnimo
Foi ferreiro
Catlico
Patologias
Hipertenso, Cardiopatia, Doena Renal
Crnica, Atrofia Muscular
Sequelas
Deambulao prejudicada e dores constantes.
IDL 4
Masculino 83 anos
Vivo
Mora com a neta
Ensino Fundamental I completo
Aposentado com 1 salrio mnimo
Foi mecnico
Esprita Kardecista
Patologias
Hipertenso, Trombose Pulmonar, Gastrite e
Cncer de prstata
Sequelas
Deambulao prejudicada
Dispositivo definitivo para eliminaes
vesicais (sonda) e dores constantes
IDL 5
Masculino 93 anos
Casado
Mora com a cnjuge e a filha
Ensino Fundamental 1 completo
Aposentado com 1 salrio mnimo
Foi delegado e motorista
Evanglico
Patologias
Hipertenso Arterial Sistmica Cardiopatia e
Artrose Degenerativa (h 10 anos)
Sequelas
Deambulao prejudicada
Uso de marca-passo
Dificuldade de se expressar
Fonte: Dados da pesquisa
3.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA
Os instrumentos para coleta de dados so apresentados em trs etapas. Para a primeira
etapa, foram escolhidos trs instrumentos j validados para definir se os idosos se
enquadravam no perfil do estudo (estado cognitivo preservado e classificado como
dependente funcionalmente). Para tanto, foram utilizados o Mini-exame do Estado Mental
37
(FOLSTEIN; FOLSTEIN; MCHUGH, 1975), o ndice de Barthel (MINOSSO et al., 2010) e a
Escala de Lawton (LAWTON; BRODY, 1969).
Para avaliao do estado mental, foi aplicado o Mini-exame do Estado Mental de
Pfeiffer (FOLSTEIN; FOLSTEIN; MCHUGH, 1975), composto por dez perguntas, o qual
avalia quatro parmetros: memria a curto e longo prazo; orientao; informaes do
cotidiano; e capacidade de clculo (ANEXO A). A pontuao seguiu o seguinte critrio: 30 a
26 pontos (funes cognitivas preservadas); 26 a 24 pontos (alterao no sugestiva de
dficit) e 23 pontos ou menos (sugestivo de dficit cognitivo). Esse Mini-exame do estado
mental possibilitou a excluso dos idosos que no apresentavam cognio para responder s
perguntas da entrevista.
Para a avaliao da dependncia funcional, foi aplicado o ndice de Barthel (ANEXO
B) e aplicada a Escala de Lawton (ANEXO C). O ndice de Barthel utilizado para avaliar a
capacidade funcional e se compe de dez atividades: alimentao, banho, higiene pessoal,
vestir-se, intestinos, bexiga, transferncia para higiene ntima, transferncia - cadeira e cama -,
deambulao e subida de escadas (MINOSSO et al., 2010). Conforme o escore
correspondente soma de todos os pontos obtidos, considerado independente o indivduo
que atingir a pontuao total, isto , 100 pontos. Pontuaes abaixo de 50 indicam
dependncia em atividades de vida diria (MINOSSO et al., 2010).
A Escala de Lawton utilizada para avaliar a capacidade funcional, de modo que
rene atividades mais complexas imprescindveis para uma vida social mais autnoma, como:
telefonar, efetuar compras, preparar as refeies, arrumar a casa ou cuidar do jardim, fazer
reparos em casa, lavar e passar a roupa, usar meios de transporte, usar medicao e controlar
finanas particulares ou da casa. Nessa escala, a primeira resposta significa sempre
independncia; a segunda, dependncia parcial ou capacidade com ajuda; e a terceira
dependncia. Ressalta-se que a pontuao mxima de 27 pontos (LAWTON; BRODY,
1969).
Na segunda etapa, construda pelo prprio pesquisador, foram constitudos os dados
sociais, demogrficos, econmicos e epidemiolgicos. Para constituir a terceira etapa, com o
intuito de buscar compreender a memria dos idosos sobre o envelhecer com dependncia
funcional, foi escolhida entrevista semidirigida como tcnica, considerada de excelncia na
investigao social.
Pode-se definir entrevista como a tcnica em que o investigador se apresenta
frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obteno
38
dos dados que interessam investigao. A entrevista , portanto, uma forma
de interao social. Mais especificamente, uma forma de dilogo
assimtrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se
apresenta como fonte de informao (GIL, 2008, p. 109).
A apreenso das experincias dos depoentes tem como pressuposto a dimenso da
oralidade no mbito de propiciar a aproximao do pesquisador com as memrias do
envelhecer com dependncia funcional. Para a evocao das recordaes dos idosos, foi
utilizada a linguagem, um instrumento extremamente coletivo e socializador da memria
(HALBWACHS, 2006). Assim, o idoso, ao verbalizar essas recordaes, transformou a sua
memria em uma memria social. Isso ocorre porque as recordaes dos idosos referem-se a
acontecimentos vivenciados em contextos sociais, pois a memria, alm de ser mediada pelos
contextos sociais, estruturada por eles Halbwachs (2006).
3.5 PROCEDIMENTOS
As entrevistas foram realizadas depois da confirmao da dependncia funcional, com
base nos testes citados anteriormente, e da aceitao dos idosos longevos em participar da
pesquisa. As entrevistas ocorreram na casa do idoso, no perodo de janeiro a maro de 2015,
em horrio agendado, com a manuteno do silncio e total concentrao do pesquisado e do
pesquisador.
Todas as entrevistas foram gravadas com a autorizao prvia do pesquisado e
ocorreram em um tempo mximo de uma hora, um tempo considerado adequado, que requer,
do entrevistado, uma concentrao bastante relevante e, do entrevistador, uma tenso
constante.
Ademais vale destacar que, antes de realizar a entrevista, houve um primeiro encontro
(informal) com o entrevistado, para que fosse construdo um esquema da entrevista. Assim,
baseado nos elementos colhidos, elaborou-se um roteiro de perguntas (APNDICE A), sobre
as quais o entrevistado esteve o tempo todo ciente. No decorrer da entrevista, contudo, o
roteiro sofreu algumas alteraes, pela necessidade de avaliar se era procedente ou se seria
preciso acrescer ou, mesmo, eliminar algum questionamento, para que o objetivo da pesquisa
fosse alcanado (TOURTIER-BONAZZI, 2006, p. 234).
Outra questo importante deixar claro que, mesmo em interao, as interferncias do
pesquisador foram mnimas, pois era o momento de expresso do pesquisado, de modo que
ele se sentisse vontade para abordar as mais diversas situaes (SILVA; BARROS, 2010).
39
Ressalte-se ainda que foi extremamente indispensvel criar uma relao de confiana entre
informante e entrevistador (TOURTIER-BONAZZI, 2006, p. 234). Essa relao conduziu a
um bom resultado final da pesquisa.
3.6 ANLISE E INTERPRETAO DOS RESULTADOS
Os depoimentos foram transcritos, posteriormente entrevista, pelo prprio
entrevistador exatamente como foram narrados. Destaca-se que foi uma preocupao
constante a fidelidade ao texto gravado, no sentido de dar ateno ao contedo e menos
forma, compreendida como estilo.
Foi aplicada a anlise de Contedo de Laurence Bardin, que um conjunto de tcnicas
de anlise das comunicaes (BARDIN, 2011), de modo que possibilitasse a interpretao dos
dados e que se desenvolvesse de acordo com tcnicas refinadas (FLICK, 2009). Existem
diversos tipos de tcnicas para o desenvolvimento da anlise de contedo; optou-se pela
temtico-categorial, que funciona com o desmembramento do texto em categorias. Realizar
uma anlise temtica desvendar os ncleos de sentido. O critrio de categorizao nesse
caso semntico, ou seja, valoriza o significado das palavras, frases, pargrafos, manifestados
por meio da linguagem dos sujeitos. Ela rpida e eficaz e se aplica a significados manifestos
e simples (BARDIN, 2011).
Para auxiliar no manejo dos dados e na organizao da anlise de contedo temtica,
foi usada a ferramenta computacional de suporte para anlise dos dados qualitativos NVivo,
QSR NVivo9, verso 11.0. QSR uma sigla para Qualitative Solutions Research
Solues para Pesquisa Qualitativa (QRS INTERNATIONAL, 2013). Vale ressaltar que todo
o procedimento de interpretao foi exclusivo da pesquisadora, j que o software no efetua a
interpretao.
A organizao da anlise ocorre em torno de trs polos, que, na verdade, so as etapas
que definem o trabalho, as quais se apresentam descritas na Figura 8:
1. Pr-anlise a fase de organizao do material a ser analisado com o objetivo de
torn-lo operacional. Inicialmente realiza-se uma leitura flutuante, isto , comea-se
a conhecer o texto; em seguida, escolhe-se o documento; depois, so estabelecidas
hipteses e objetivos; e, por ltimo, so construdas a referenciao dos ndices e a
elaborao de indicadores.
2. Explorao do material consiste na explorao do material com a definio de
categorias e a identificao das unidades de registro e das unidades de contexto nos
40
documentos. Vale ressaltar que esta a fase da descrio analtica, pois diz respeito
ao corpus submetido a um estudo aprofundado, orientado pelas hipteses e
referenciais tericos.
3. Tratamento dos resultados, inferncia e interpretao nesta etapa, sucedem o
adensamento e o destaque das informaes para anlise, culminando nas
interpretaes inferenciais. Portanto, o momento da intuio, da anlise reflexiva
e crtica.
Figura 8 - Organizao da anlise de contedo Bardin (2011)
Fonte: Bardin, 2011
O trabalho de organizao e anlise dos dados permitiu o delineamento de um quadro
com base em categorias, com vistas a reunir elementos, ideias ou expresses (MINAYO,
2009). importante enfatizar que os temas apresentados nas categorias no foram, em
nenhum momento, impostos pelo roteiro de entrevista; eles foram extrados dos relatos dos
idosos. Assim, a categorizao, no caso da pesquisa, teve como norteadores, de todo o
processo de anlise, o objetivo geral e os objetivos especficos, mencionados na introduo
deste texto, mas, principalmente, os dados empricos coletados na pesquisa.
Os resultados da anlise se encontram organizados no Quadro 2, onde esto
representadas as trs categorias encontradas.
41
Quadro 2 - Resultados da anlise de contedo temtico-categorial, Vitria da Conquista - BA,
2015 CATEGORIZAO
CATEGORIAS
1. Memria do viver/envelhecer antes da dependncia funcional
2. Memria do viver/envelhecer aps a dependncia funcional
3. Repercusses psicossociais do envelhecer com dependncia funcional: construindo estratgias de
enfrentamento
Fonte: Dados da pesquisa
3.7 MEMRIA COMO RECURSO ANALTICO
Trs foram os campos de estudo tericos que consideramos importantes nesta
pesquisa: envelhecimento, dependncia funcional e memria. As discusses sobre
envelhecimento e dependncia funcional serviram como aporte terico para compreender o
envelhecer com dependncia funcional. Em contrapartida a abordagem da memria foi
utilizada como recurso analtico, ancorada em Maurice Halbwachs (2006), com especial
destaque aos conceitos de memria coletiva e memria individual, tornando-se, para tanto, um
recurso hermenutico, ou seja, se converteu em instrumento de interpretao
(MONTESPERELLI, 2004). Atravs dos discursos produzidos pelos idosos longevos foi
possvel mobilizar as memrias e assim alcanar o objetivo desse estudo. Desse modo, as
recordaes dos idosos foi o fio condutor para compreender o envelhecer com dependncia
funcional
3.8 ASPECTOS TICOS DO ESTUDO
Antes do incio dos procedimentos, o projeto foi submetido aprovao do Polo de
Educao Permanente da Secretaria Municipal de Sade de Vitria da Conquista e do Comit
de tica em Pesquisa da Faculdade Independente do Nordeste, com parecer de aprovao n
759.441. Todos os participantes tiveram pleno conhecimento do estudo e dos objetivos,
assinando, para tanto, um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APNDICE B) de
acordo com a Resoluo do Conselho Nacional de Sade (CNS) n. 466/12 para pesquisa com
seres humanos (BRASIL, 2013). Aos participantes da pesquisa foi garantido em
conformidade com as exigncias ticas para a realizao de uma pesquisa o absoluto sigilo
quanto a sua verdadeira identidade e a total fidedignidade ao contedo das informaes
concedidas. O nome dos participantes foi alterado para preservar o anonimato e garantir a
confidencialidade. Os idosos foram identificados com as letras IL (idoso longevo), seguidas
42
da numerao de 1 a 5. Todo o processo de pesquisa foi descrito e todos os participantes
foram informados do modo e local de acesso aos dados finais do estudo.
43
4 O DESVELAR DA MEMRIA DE IDOSOS LONGEVOS COM DEPENDNCIA
FUNCIONAL
Cada palavra e cada frase emitidas pelos idosos estavam carregadas de recordaes e
memrias do tempo vivido e experienciado em uma coletividade. Ao relembrarem o seu
passado, reconstruram a sua vida; porm, essa reconstruo no possibilitou reviver o
passado da mesma maneira, pois o ponto de vista atual transformou as recordaes com a
experincia do presente. A memria uma construo realizada no presente com base nas
vivncias e experincias ocorridas no passado. Origina-se dos testemunhos de grupos em uma
determinada poca (HALBWACHS, 2006).
O ato de escutar permitiu uma reflexo sobre a trajetria de vida do idoso,
principalmente a partir da dependncia funcional, reconstruda com a perspectiva atual, dando
novos significados. Assim, os idosos expressaram o passado que marcou, que est vivo e que
capaz de viver na conscincia do grupo que mantm (HALBWACHS, 2006, p. 102).
A partir dos relatos dos idosos longevos, foi construda uma abordagem holstica da
pessoa em sociedade, com o intuito de problematizar as questes que envolvem o
envelhecimento e a velhice, pois se entende que o idoso tem um potencial transmissor de
memrias; desse modo, coloca-se em posio privilegiada no compartilhamento de memrias,
com uma funo indispensvel na compreenso de quem somos e de nossas materialidades e
subjetividad
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