AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, COM PEDIDO DE TUTELA
ANTECIPADA CUMULADA COM PRECEITO COMINATÓRIO
IN LIMINE
Observação aos advogados antes de dar início a
peça – vide também, breves comentários
Especificar claramente o que ensejou ao nosso cliente o direito ao pagamento das prestações + VRG pela variação do INPC ao invés da variação do dólar norte americano. (liminares/decisões proferidas em ações coletivas ou individuais, autorização das próprias financeiras, entre outros)
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ......... VARA CÍVEL DA
COMARCA .............
___________ (qualificação e endereço), por seus
advogados infra assinados (doc. nº 01) vem a presença de Vossa Excelência, com
fundamento nos artigos 273 e 287 do Código de Processo Civil e na Lei nº
8.078/90, propor
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM
PRECEITO COMINATÓRIO IN LIMINE E COM
PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA ,
pelo procedimento comum ordinário, em face de ________(qualificação e
endereço), pelos fatos e fundamentos seguintes:
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DOS FATOS
1. O autor firmou com a instituição financeira ré,
em ___, o contrato de arrendamento mercantil nº_____, para aquisição do veículo
(especificar), para pagamento em ____ meses, com vencimento da 1ª parcela, no
valor de R$___, em ____ a ser quitado com a parcela antecipatória do VRG (valor
residual de garantia), no importe de R$____, valores corrigidos pela variação do
dólar norte americano à data do pagamento.
2. Devido a abrupta e imprevisível elevação da
cotação do dólar norte americano, o autor, não tendo mais condições de arcar com o
valor absurdo das prestações do referido contrato, ingressou, em ___, com a Ação
de Revisão de Cláusula Contratual com pedido de antecipação de tutela contra a ré
(processo nº......, com trâmite perante a .... Vara Cível desta Comarca), visando entre
outros, obter liminar para que a ré se abstivesse de cobrar a variação cambial sobre
as prestações vincendas, e para a quitação dos referidos valores, fosse transformado
a parcela de dólar para real, pelo valor da moeda estrangeira antes da crise cambial,
qual seja, R$ 1,21 (um real e vinte e um centavos), incidindo sobre os mesmos o
índice do INPC.
3. No referido processo foi concedida a liminar
requerida, para que a partir da parcela vencida em janeiro de 1999, o pagamento dos
valores – tanto do arrendamento, como do VRG antecipado – passasse a ser
realizado com base em parcelas calculadas de acordo com a variação do INPC.
4. O arrendatário, ora Autor, procedeu ao regular
adimplemento de suas obrigações até o termo final do contrato, em ....., com o
pagamento das últimas parcelas (arrendamento+VRG). Pretendeu legitimamente a
partir daí, a liberação da documentação relativa ao veículo arrendado. Não
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obstante, foi surpreendido com imposição descabida da arrendadora quanto à
necessidade do pagamento do valor residual, entendido este como a diferença
entre os valores pagos a partir de janeiro de 1999, com base na variação do
dólar.
5. Esse posicionamento se reveste de verdadeira
condição para a liberação do certificado de transferência do veículo. Tal imposição
não condiz, todavia, com a natureza do contrato de arrendamento mercantil,
inexistindo qualquer justificativa para a exigência prévia do pagamento do resíduo
para a entrega do certificado de transferência do bem arrendado,
consubstanciando o entendimento da arrendadora verdadeira confusão acerca das
situações retratadas.
DA NATUREZA DO CONTRATO DE
ARRENDAMENTO MERCANTIL –
CARACTERÍSTICAS
6. MARIA HELENA DINIZ, em seu "Tratado
Teórico e Prático dos Contratos", 2ª ed., vol. 02, pág. 389, nos apresenta o mais
preciso conceito de leasing, positivando que:
"... arrendamento mercantil, é o contrato pelo qual uma pessoa
jurídica ou física, pretendendo utilizar determinado equipamento,
comercial ou industrial, ou um certo imóvel, consegue que uma
instituição financeira o adquira, arrendando-o ao interessado por
tempo determinado, possibilitando-se ao arrendatário, findo tal
prazo, optar entre a devolução do bem, a renovação do
arrendamento, ou a aquisição do bem arrendado mediante um preço
3
residual previamente fixado no contrato, isto é, o que fica após a
dedução das prestações até então pagas ...".
7. Segundo ORLANDO GOMES ("in" Contratos -
17ª ed., pág. 463), é
"dominante na doutrina mais recente o juízo de que o "leasing" é
um contrato autônomo, muito embora resulte da fusão de elementos
de outros contratos, mas não pode ser classificado como "contrato
misto", composto por prestações típicas da locação, da compra e de
outros contratos, porque tem causa própria ...".
8. São elementos jurídicos à sua caracterização a
existência de três pessoas necessárias à operação de leasing - a que vende os bens
(fornecedor), a que compra esse bem (arrendante) e a que detém a posse do bem
(arrendatário), sem o ter comprado. Ressalte-se que há a concessão de uso do bem
durante certo prazo, mediante o pagamento de uma renda, superior ao valor do uso,
porque ela poderá ser parcela do preço pelo qual será comprado referido bem.
9. É cediço que o arrendatário, findo o prazo do
arrendamento, tem tríplice opção:
exercer a opção de compra e adquirir os bem ;
devolvê-lo ao arrendante ou
prorrogar o contrato, mediante o pagamento de renda muito menor do que a do
primeiro arrendamento, porque neste as prestações foram estipuladas
considerando o valor de utilização de um bem novo.
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DA DISTINÇÃO ENTRE O
ARRENDAMENTO MERCANTIL E A
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – DA GARANTIA
NAS DUAS MODALIDADES CONTRATUAIS
10. Diferencia-se por completo o arrendamento
mercantil da alienação fiduciária: neste, o fornecedor vende ao consumidor que,
no mesmo instrumento, aliena a coisa fiduciariamente em garantia a uma
instituição financeira. Ressalte-se que na alienação fiduciária, a garantia do
alienante recai sobre o próprio bem. Desse modo, se não for paga a dívida, o
próprio bem dado em garantia no contrato de alienação fiduciária responderá
pelo débito, ficando sujeito o devedor a ação de busca e apreensão ou depósito,
conforme o caso.
11. Bastante distinta é a situação do arrendatário no
contrato de leasing. A garantia do pagamento das parcelas recai sobre o
patrimônio do arrendatário. Por essa razão admite-se, não raras vezes nessa
modalidade contratual, a substituição do bem (por outro mais moderno ou mais
novo) e até mesmo a transferência a terceiros.
12. E isso porque, como mencionado, NO
CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL, O PRÓPRIO BEM
NÃO É DADO EM GARANTIA. A garantia do pagamento advém
exclusivamente das condições peculiares à pessoa do arrendatário, ou seja,
inerentes à viabilidade de seu crédito, considerando que antes da celebração da
avença promove-se uma busca detalhada de informações a seu respeito. A
distinção entre os dois institutos é importantíssima e traz inúmeras conseqüências.
DAS OBRIGAÇÕES DOS
5
CONTRATANTES NO LEASING
13. A modalidade contratual retratada in casu
(leasing financeiro) nos permite considerar obrigações recíprocas entre as partes. O
ARRENDATÁRIO tem o DEVER de:
pagar os aluguéis na forma ajustada (computados o valor do bem e a
remuneração do seu uso);
manter os bens arrendados em bom estado de conservação;
responder pelos prejuízos que causar a referidos bens;
restituir os bens, ao final do contrato, se não pretender exercer a opção de
compra;
suportar os riscos e os encargos dos bens arrendados - inclusive seguro;
pagar ao arrendante todas as prestações relativas ao contrato, se pretender
rescindi-lo antes de seu termo final
14. O ARRENDANTE, por sua vez, tem o DEVER
de:
adquirir de outrem os bens para serem dados em arrendamento;
entregar ao arrendatário, para seu uso e gozo, os bens por ele indicados;
vender os bens arrendados, se o arrendatário optar pela compra e pagar o
preço residual;
receber as coisas de volta, se não houver compra final ou renovação do contrato;
renovar o contrato, se o arrendatário assim o desejar, mediante a fixação de novo
valor para as prestações (considerando a depreciação do bem)
15. A inexecução culposa por qualquer das partes,
bem como o advento de seu termo final, acarretam a extinção da avença, sem
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embargo das demais causas terminativas de qualquer outra modalidade contratual
por tempo determinado.
DA DECISÃO LIMINAR PROFERIDA NA
AÇÃO REVISIONAL
16. Como se verifica dos elementos acostados,
relativos à Ação Revisional proposta pelo autor contra a ré, houve a concessão de
liminar para autorizar o autor a proceder o pagamento das parcelas vincendas, a
partir de janeiro de 1999, com base na variação do INPC, até o termo final do
contrato.
17. Cabe aqui ressaltar que a questão relativa a
diferença entre a variação cambial e a variação do INPC, conhecido como resíduo,
conforme liminar concedida, ficou assim decidida: “ficando a questão relativa ao
resíduo dos contratos de leasing, para apreciação quando proferida sentença na
ação revisional”. É certo, ainda, que até o presente momento não foi proferida a
referida sentença.
DA EXIGÊNCIA DESCABIDA IMPOSTA
PELA ARRENDANTE PARA A LIBERAÇÃO
DO VEÍCULO ARRENDADO
18. Diante disso, NÃO HÁ COMO
PREVALECER A IMPOSIÇÃO DO RESÍDUO pretendido pela arrendante.
Considerando:
- a natureza e as características dessa modalidade contratual;
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- que o arrendatário deu fiel cumprimento às obrigações relativas ao
contrato, quer relativamente à integral quitação do arrendamento, quer no
que diz respeito ao VRG – pago antecipadamente;
- que o BEM objeto do contrato NÃO REPRESENTA GARANTIA À SUA
EXECUÇÃO,
- que é obrigação da arrendante, com o termo final do contrato, vender o bem
arrendado, estando o arrendatário optando pela compra uma vez já pago o
preço residual;
- a liminar concedida na ação revisional proposta pelo autor, no que diz
respeito ao pagamento do resíduo, pois tal questão somente será objeto de
apreciação quando proferida sentença, o que ainda não ocorreu ...
19. NÃO SE JUSTIFICA - de modo algum - a
exigência da instituição financeira relativa ao pagamento do resíduo NESSA FASE,
exsurgindo o direito do Autor de pleitear a imediata liberação do documento relativo
à transferência do veículo, ainda que assinalada eventual ressalva no tocante ao
pagamento da diferença entre os valores das parcelas pagas com base no INPC e a
variação cambial, diante do que for decidido na esfera da ação revisional, em
definitivo.
20. Apenas não se pode compactuar com o
inadimplemento do contrato por parte da arrendadora, que se recusa a dar
guarida à decisão judicial e insiste na obrigatoriedade imediata do pagamento
do resíduo, mesmo não tendo havido ainda decisão quanto a esta matéria.
21. Se o Autor desse causa a inadimplemento
contratual, sem dúvida buscaria a arrendadora reintegrar-se na posse do bem. Mas
cumprindo o arrendatário com todas as obrigações advindas do contrato, pretende a
arrendadora furtar-se à sua parte nas obrigações, mediante imposição ainda
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descabida e ilegal, deixando de realizar obrigação a seu cargo, qual seja, de entregar
ao interessado o documento liberatório do veículo. Ressalte-se – mais uma vez –
que o veículo não é garantia, quer ao cumprimento do contrato, tampouco ao
pagamento do RESÍDUO (isso se este receber o crivo do Judiciário!)
DO DIREITO
22. Esta situação de fato, contrária à Lei, ao
previsto em contrato e ao anteriormente determinado, merece e deve ser rechaçada.
Não se pode permanecer inerte diante de tamanha ilegalidade, sendo inadmissível
perquirir a arrendadora acerca do pagamento do resíduo, pois não houve solução
quanto à matéria. A instituição financeira somente poderia ficar adstrita a essa
interpretação, não sobrepondo seus interesses ao já reconhecido e determinado pelo
Judiciário, em verdadeiro crime de DESOBEDIÊNCIA, plenamente configurado em
suas intenções.
23. Tendo o Judiciário afastado a necessidade do
pagamento do resíduo, até decisão final na ação revisional mencionada,
desmerece amparo a exigência de seu pagamento, o que conduz,
induvidosamente, uma vez comprovados os pagamentos, à determinação de que
a arrendadora leve a efeito a contraprestação devida pelo adimplemento do
arrendatário, sem imposição alguma, mesmo que haja ressalva quanto a
EVENTUAL PAGAMENTO DO RESÍDUO, se for o caso e no momento
oportuno. Atitude discrepante dessa não tem lugar em nosso ordenamento
jurídico e no ESTADO DE DIREITO atual.
24. Logrando o Autor efetuar o pagamento da
última prestação de seu contrato de arrendamento mercantil, mister que a instituição
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arrendadora lhe entregue o certificado de transferência do veículo, devidamente
preenchido, assinado e com firma reconhecida.
25. A alegação de que o Autor ainda não liquidou
por completo sua obrigação é despicienda. Se o arrendatário efetuar o pagamento
da diferença em razão do dólar, estará RENUNCIANDO a um direito
JUDICIALMENTE ASSEGURADO de pagar as parcelas de seu contrato pela
variação do INPC, somente. Tal exigência da instituição financeira mostra-se
abusiva e violadora do comando judicial em total desrespeito aos consumidores,
mostrando-se necessária a adoção de medidas rigorosas para coibir mais esse abuso
contra a Justiça e os consumidores.
26. No sentido de ser injustificável a postura da
arrendadora, merece destaque o argumento de que mesmo sobrevindo decisão
desfavorável aos consumidores naquele feito, “a empresa de leasing poderá cobrar
judicialmente as diferenças devidas”.
DO ENTENDIMENTO JÁ FIRMADO PELO
JUDICIÁRIO A RESPEITO DA MATÉRIA -
PRECEDENTE – JUSTIÇA ESTADUAL DO
RIO DE JANEIRO
27. Do mesmo modo, em decisão lapidar, a Justiça
do Estado do Rio de Janeiro, por decisão de 07 de abril de 2000, proferida pelo
ilustre Juiz de Direito da 2a Vara de Falências e Concordatas do Rio de Janeiro, DR.
LUÍS FELIPE SALOMÃO, examinado pedido análogo, emitiu posicionamento
acerca da necessária antecipação da tutela - deferida naqueles autos - para o fim
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específico de viabilizar a transferência do veículo em nome dos arrendatários,
aduzindo que:
“De fato, a antecipação da tutela no caso em exame levou em conta o
que dispõe o art. 84 do CDC: “Na ação que tenha por objeto o cumprimento
da obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz concederá a tutela específica da
obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático
equivalente ao do adimplemento”.
Comentando o dispositivo invocado, o renomado KAZUO WATANABE
esclarece: “O legislador deixa claro que, na obtenção da tutela específica da
obrigação de fazer ou não fazer, o que importa, mais do que a conduta do
devedor, é o resultado prático protegido pelo direito. E para a obtenção dele,
o juiz deverá determinar todas as providências e medidas legais e adequadas
ao seu alcance, inclusive, se necessário, a modificação do mundo fático, por
ato próprio e de seus auxiliares, para conformá-lo ao comando emergente da
sentença. Impedimento da publicidade enganosa, inclusive com o uso da
força policial, se necessário, retirada do mercado de produtos e serviços
danosos à vida, saúde e segurança dos consumidores, e outros atos mais quer
conduzam à tutela específica das obrigações de fazer ou não fazer”.
O legislador, portanto, pretendeu que a tutela liminar fosse a mais
completa e efetiva possível.
Assim, a quitação do contrato – sob ressalva de que poderá haver
resíduo, se e acaso revogada a liminar -, com a liberação dos bens, é
corolário lógico e complementa a liminar anteriormente deferida, já
confirmada em segunda instância ...”.
....................
“Não haverá, como se tentou argumentar, irreversibilidade do
provimento antecipado com a medida que ora se autoriza.
Por outro lado, o art. 19 do mesmo diploma legal autoriza aplicação
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subsidiária do CPC. No caso, a parte que interessa é a referente à
antecipação da tutela disciplinada pelo art. 273 e parágrafos do CPC.
HUGO NIGRO MAZZILI (in “A Defesa dos Interesses Difusos em
Juízo”, RT, 7a Edição, preleciona que “... a tutela antecipada se traduz
numa medida liminar em processo principal, com satisfação imediata do
direito pretendido – solução semelhante às liminares no mandado de
segurança e nas ações possessórias”- grifei
Também a lição de NELSON NERY JÚNIOR e ROSA NERY (in “CPC e
Legislação Processual Civil extravagante em vigor”, RT, 1994) é no mesmo
sentido: “a possibilidade de serem concedidas, por exemplo, cautelares
satisfativas, está expressamente admitida pela norma sob comentário” (nota
ao art. 273 do CPC).
É conveniente assinalar, ainda, no campo da legislação aplicável à
espécie, que o Código do Consumidor prevê a tutela cautelar (art. 84 e
parágrafos), com inteira pertinência na hipótese em apreço, diante do que
dispõe o art. 117 do CDC.
Assim colocada a questão, percebe-se que a liminar anteriormente
concedida garantiu aos consumidores o pagamento das prestações
contratuais referentes aos arrendamentos mercantis, baseados na variação
do INPC”.
......................
“Nesse passo, é evidente que a questão ainda não teve sentença de
mérito ... mas tal situação não é impeditiva para o deferimento do que ora se
postula.
Com efeito, como já foi remarcado, a antecipação da tutela, máxime em
casos de ação civil pública em que se maneja direito coletivo, deve ser
integral, de sorte a impedir danos maiores aos consumidores.
Com efeito, as empresas rés, se vencedoras na demanda poderão
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executar o resíduo, cumprindo integralmente o contrato, na forma em que ele
foi pactuado.
Não se vislumbra irreversibilidade quando a questão será resolvida, de
qualquer forma, no cumprimento do contrato e em perdas e danos.
Lembre-se, como assinalou o MP às fls. 5445, que o tempo causa
desvalorização dos bens ... perdendo as empresas o interesse em recuperá-
los, em muitos casos.
Ao revés, irreversível será a situação para o consumidor condenado a
manter um bem em sua posse, sem dele poder dispor, mesmo tendo cumprido
integralmente o contrato, consoante decisão confirmada pelo E. Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Portanto, não há impedimento legal e, ao contrário, buscando
complementar a liminar anteriormente concedida, obtendo-se a completa
tutela específica, adotando o juízo providências que assegurem o resultado
prático equivalente a integral satisfação da liminar, acolho o pedido de fls. ...
e determino que as empresas rés emitam documento de quitação, constando
ressalva de cobrança referente a eventual saldo devedor, para todos os
consumidores que já tenham pago ou venham a pagar todas as prestações
ajustadas em seus contratos de arrendamento mercantil. O não
cumprimento, comprovado nos autos da medida ora determinada ensejará
aplicação da multa fixada às fls. ..., sem prejuízo de outras sanções e
medidas necessárias a sua efetivação”.
DA INADMISSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA
DE DEPÓSITO PRÉVIO DO VALOR
RELATIVO AO RESÍDUO
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28. Os argumentos e o direito aqui deduzidos são
suficientes para afastar – de plano – seja efetivado depósito prévio do valor em
discussão (resíduo). Posto que a liminar concedida na ação revisional relegou a
questão de eventual pagamento do resíduo, para a época da sentença, e assim
inadmissível perquirir antecipadamente sobre referido valor, que não há de ser,
tampouco, objeto de depósito específico prévio.
29. Assim, a liberação do veículo, s.m.j., com a
entrega do documento relativo à transferência, preenchido, assinado e com firma
reconhecida, não pode ser condicionada a fator algum, seja porque não há decisão
judicial a respeito do valor do resíduo, seja porque, se devido (por absurda ilação!),
poderá ser objeto de oportuna cobrança pela instituição financeira, que não tem
como garantia desse pagamento o próprio veículo, dada a natureza do contrato.
30. O que não se pode admitir é que Autor, mesmo
após ter efetuado o pagamento de todas as parcelas – com fulcro no comando
judicial - não possa regularizar a situação cadastral do veículo, legitimamente.
31. Entendimento contrário aponta para a hipótese
de situações “esdrúxulas”, como ilustrado pela Defensoria Pública Geral do Estado
do Rio de Janeiro, no processo 99.001.017980-0, a cargo do Dr. ANDRÉ LUIS
MACHADO DE CASTRO, citando parecer do Promotor de Justiça MARCOS
MASELLI GOUVÊA nos autos, in verbis:
“Imagine-se a hipótese, por exemplo, de alguém que já tiver pago
todas as prestações, nos termos da liminar, sofrer algum sinistro:
estando o carro em nome da arrendadora, será ela quem receberá a
indenização. Premido por desvantagens desse tipo, é natural que,
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com o tempo, ninguém mais se interesse pela liminar concedida
nestes autos”
32. Nem se alegue, ainda, não ter havido decisão
definitiva nos autos da ação revisional, devendo ser aguardada a sentença que
apreciará a questão relativa ao resíduo para somente depois ser reconhecido qualquer
direito em face à quitação do débito. Ora, se assim for, nada evitará às arrendadoras
deixar que a situação atual se prolongue no tempo, talvez durante anos a fio, porque
só em sede de liminar nada poderá ser garantido ao consumidor. Inúmeros
consumidores acabarão por sucumbir às exigências da Ré, alguns quem sabe,
devolvendo o veículo por não terem mais condição de mantê-lo ou mesmo assinando
propostas abusivas de parcelamento do resíduo ...
33. Verificando-se, então, que o direito do Autor é
extreme de dúvida, pois está sendo obstada a transferência do veículo em seu nome,
tem incontestável direito a que a arrendadora tome as providências necessárias à
entrega do documento de transferência devidamente preenchido, assinado e com
firma reconhecida, sem embargo de posterior discussão acerca dos valores relativos
ao RESÍDUO, a ser ainda objeto de decisão.
DO PEDIDO DE CONCESSÃO DA TUTELA
ANTECIPADA
34. Dispõe o Código de Processo Civil em seu
artigo 273, "in verbis":
“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total
ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial,
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desde que, existindo prova inequívoca, se convença da
verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação;”
35. Não há que se questionar, no caso sub judice,
acerca da presença dos pressupostos que autorizam o deferimento da tutela
antecipada. Os requisitos da antecipação da tutela, insculpidos no art. 273, do CPC,
consistentes na prova inequívoca e verossimilhança, que se traduzem, conforme a
doutrina e jurisprudência, no conceito de probabilidade, estão sobejamente
atendidos.
36. A posse do veículo atualmente pelo arrendatário
não se caracteriza como viciada, precária, ou contaminada de má-fé, tampouco a
postura e exigência da arrendadora encontra uma razão jurídica, nada justificando a
negativa na liberação do veículo.
37. Ressalte-se que o que se pretende in casu, é a
LIBERAÇÃO DO VEÍCULO e não do AUTOR! Ou seja, não se pretende nesta
ação, discutir a exoneração do pagamento do resíduo; o que se vislumbra é a
inadmissibilidade de sua exigência prévia antes de proferida decisão a respeito da
matéria no âmbito da ação revisional, na remota hipótese de vir a ser determinado
seu pagamento. E é cediço que tem a instituição financeira a seu dispor
mecanismos suficientes para fazer valer a decisão judicial que eventualmente lhe
seja favorável.
38. Por outro lado, tendo o Autor pago todas as
parcelas, como lhe facultava o comando judicial, o que não se pode admitir é o
descumprimento daquela decisão, causando-lhe inúmeros prejuízos. Pagou todas as
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prestações, inclusive os valores residuais e agora não pode fazer jus ao direito que
lhe assiste, em ver transferida a propriedade em seu nome, por ato absolutamente
desprovido de consistência jurídica. Não pode ficar o Autor à mercê da instituição
financeira, sabidamente mais forte, emergindo flagrantemente dessa situação o
desequilíbrio contratual que evidentemente não foi previsto pelo arrendatário quando
da celebração do contrato. Cumprindo com sua parte na avença, não pode ser
atingido por exigência posterior infundada e em desconformidade com o decidido
pelo Judiciário no âmbito da ação revisional, que favorece integralmente sua
legítima pretensão.
39. É permitido afirmar, com convicção, portanto,
encontrarem-se presentes os requisitos que autorizam a antecipação da tutela
pretendida, sob a análise da existência de prova inequívoca e do juízo de
verossimilhança, consubstanciados na evidente probabilidade do direito, a ser
resguardado ab initio, presentes os elementos de prova trazidos aos autos, que
demonstram - inequivocamente – o fundado receio de causar prejuízo ao Autor a
conduta maliciosa da Ré, que faz descaso da determinação judicial que relegou a
questão sobre a eventual cobrança do resíduo, relativo a diferença entre o dólar e o
INPC, à sentença de mérito da ação revisional.. Criou a instituição financeira
situação excepcional não prevista na referida ação de revisão de cláusula contratual.
40. Pontifica o festejado jurista CÂNDIDO
RANGEL DINAMARCO in "A Reforma do Código de Processo Civil", 3ª ed.,
Malheiros Editores, 1996, p. 145, que:
“...aproximadas as duas locuções contraditórias contidas no art.
273 do CPC (prova inequívoca e convencer-se da
verossimilhança) chega-se ao conceito de probabilidade, portador
de maior segurança do que a mera verossimilhança.
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Probabilidade é a situação decorrente da preponderância dos
motivos convergentes à aceitação de determinada proposição,
sobre os motivos divergentes.”
41. No mesmo diapasão posiciona-se a
jurisprudência, senão vejamos:
"ANTECIPAÇÃO DA TUTELA – PRESSUPOSTOS - A
antecipação da tutela pressupõe prova inequívoca, convincente da
verossimilhança da alegação de fundado receio de dano
irreparável ou de difícil reparação, ou que fique caracterizado o
abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do
réu (art. 273 do CPC), ausente no caso". (TJDF – AI 7.805/97 – 4ª
T. – Rel. Des. JAIR SOARES – DJU 20.08.1997)
42. O atendimento do pleito do Autor não acarreta
prejuízo à Ré, que poderá – desde que reconhecido o direito ao resíduo objeto de
discussão – valer-se dos mecanismos adequados à sua exigência. Enquanto não
reconhecido, contudo, por decisão transitada em julgado, a subsistência desse
direito, não cabe à arrendadora impor o pagamento prévio do valor do resíduo, pois
subsistiu – na esfera da ação revisional – SOMENTE A OBRIGATORIEDADE DO
PAGAMENTO DAS PARCELAS DEVIDAS PELO ARRENDAMENTO + VRG
pela VARIAÇÃO DO INPC – até o termo final do contrato, o que efetivamente foi
observado pelo Autor.
43. Isto posto e presentes os requisitos
autorizadores da concessão de tutela antecipada, merece esta ser deferida, inaudita
altera pars, a fim de determinar à Ré que efetue a entrega do certificado de
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transferência do veículo a fim de que o Autor possa providenciar sua transferência
junto ao Detran, obtendo certificado de propriedade em seu nome, sem embargo de
eventual pagamento do resíduo relativo à diferença entre o pagamento regular pelo
INPC e a variação pelo câmbio norte-americano, considerando a decisão definitiva a
ser proferida na ação revisional anterior.
44. De qualquer modo, o Autor, desde já,
PREQUESTIONA discussão a respeito de toda a matéria tratada nos autos, quer no
que diz respeito ao previsto na Carta Constitucional, quer relativamente a violação
de Lei Federal, para fins de eventual interposição de recursos extremos.
DA COMINAÇÃO LIMINAR DE MULTA
45. A não concessão da tutela antecipada infligirá
ao Autor o inconveniente, irreparável, de que apenas ao final da ação
revisional, que já leva mais de ano, e que por óbvio não tem previsão de solução
final, possa vir a ter transferida a propriedade do veículo pelo qual pagou –
regularmente – as parcelas devidas. esse tempo de sua vida e o cumprimento
integral da avença – como determinado – e até com o pagamento antecipado do
valor residual, não podem ser perdidos...
46. Encontrando-se presentes os requisitos que
permitem a concessão de LIMINAR, diante da legislação em vigor, bem como dos
elementos de prova trazidos aos autos, com a observância - oportuno tempore - do
que for decidido quanto ao pagamento do resíduo, pede seja determinado – de plano
- a entrega do certificado de transferência do veículo devidamente preenchido,
assinado e com firma reconhecida, assegurando-se o resultado prático da
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TUTELA ANTECIPADA com a aplicação de MULTA DIÁRIA no caso de
descumprimento do comando judicial, nos termos do artigo 287 do Código de
Processo Civil, o que não será demais pedir a Vossa Excelência, com todas as
medidas legais e adequadas ao alcance do provimento antecipatório.
DO PEDIDO
47. Diante de tudo quanto foi exposto,
considerando todos os elementos trazidos aos autos, a relevância na fundamentação
do pedido, que ampara o DIREITO inquestionável do Autor, não merecendo
guarida a negativa da arrendadora na entrega da documentação requerida e
observando, sobretudo, o já decidido a respeito do RESÍDUO exigido, cuja eventual
cobrança está postergada por decisão judicial, tendo o Autor cumprido regularmente
com as obrigações necessárias ao cumprimento do contrato, PEDE:
a. seja liminarmente e inaudita altera parte
deferida a tutela antecipada, para compelir a Ré a emitir documento de quitação
das parcelas pagas, constando – se for o caso – ressalva de cobrança de eventual
saldo devedor, efetivando, ainda, a entrega ao Autor do Certificado de
Transferência do veículo descrito, devidamente preenchido, assinado e com firma
reconhecida.
Tal providência se justifica, sem embargo de
eventual cobrança do valor residual (na improvável hipótese de prosperar a tese de
seu pagamento na ação revisional) devendo, ainda, ser cominada pena pecuniária
de um salário mínimo por dia, para o caso de descumprimento do comando judicial;
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b. a citação da Ré, na pessoa de seu representante
legal, para, querendo, apresentar contestação no prazo legal, sob pena de revelia;
c. seja, após regular processamento da ação,
julgado procedente pelo mérito o pedido, tornando definitiva a tutela
antecipada deferida nos autos, se for o caso, condenando-se a Ré a transferir a
propriedade do veículo descrito, mediante a entrega:
de documento de quitação do débito: parcelas do arrendamento +
VRG;
do certificado de transferência do veículo, devidamente preenchido,
assinado e com firma reconhecida,
d. a condenação da Ré no pagamento dos ônus da
sucumbência.
48. Protesta provar o alegado pôr todos os meios de
prova em direito admitidos.
49. Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00, para
efeitos de alçada.
Termos em que,
P. Deferimento.
Local/data
Advogado
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