UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS
FACULDADE DE DIREITO
DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À PESQUISA JURÍDICA
RELATÓRIO DE PESQUISA
Análise da faculdade do juiz exigir depósito prévio ou caução ou fiança
para concessão de liminares em Mandados de Segurança
Professor: Ronaldo Lobão
Aluno:
SUMÁRIO
1 – Introdução............................................................................................. P. 032 – Desenvolvimento................................................................................... P. 042.1 – Análise do art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/09......................... P. 042.2 – Pesquisa Empírica............................................................................. P. 053 – Conclusão – Convergências Entre Teoria e Prática –
Os resultados Parciais.................................................................... P. 124 – Bibliografia............................................................................................P. 15
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1 – INTRODUÇÃO
Após elaboração do pré-projeto de pesquisa, como primeira avaliação da
disciplina, tentou-se seguir o cronograma de trabalho ali proposto. Ao início da
pesquisa, já se notou que, para procurar exaurir ao máximo o objeto e cumprir com
todos os objetivos propostos, não seria suficiente o tempo de meio semestre, sendo
objeto da avaliação consubstanciada neste relatório resultados parciais do esforço inicial
de pesquisa empreendido.
A ideia é que, diante das preliminares iniciais expostas neste relatório, se
possa aprofundar cada vez mais no objeto pesquisado, de modo a verdadeiramente se
chegar a respostas razoavelmente conclusivas.
Conforme se demonstrará adiante, este panorama parcial se mostrou mais rico
do que esperado quando da idealização do pré-projeto, reclamando novas perguntas e,
consequentemente, a busca de novas conclusões.
O método também se revelou incompleto, visto que este aluno olvidou de
observar no método empírico sua experiência pessoal como estagiário do Ministério
Público Federal. De fato, durante a realização dos trabalhos, a experiência cotidiana no
trato com processos judiciais envolvendo benefícios com suspeita de fraude, com
redação de minutas de pareceres para sugerir ao julgador soluções para o caso se
mostrou muito rica a dar subsídios que pudessem auxiliar na análise dos
questionamentos feitos no pré-projeto.
Para registrar estas experiências de modo que possam ser avaliadas, nos
anexos conterão algumas minutas por mim escritas.
Outro momento que se mostrou bastante esclarecedor foi a única entrevista
formal que pôde ser realizada: com o Procurador Regional da República, Dr. Rogério
Soares do Nascimento. O cenário por ele descrito, aliado à sua experiência no combate
aos crimes previdenciários, trouxe elementos históricos interessantes para a pesquisa.
No anexo constará original manuscrito dos apontamentos feitos na entrevista.
Aqui também serão relatadas conversas informais com alguns professores da
Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, as quais, por total falta de
registro, apenas serão mencionadas e não constarão dos anexos. Como este trabalho, a
princípio, possui um menor rigor científico, e as participações destes professores serão
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meramente ilustrativas para o desencadear das ideias, o que se crê é que qualquer
registro não será necessário.
Para sistematização do relatório, foi obedecida a ordem metodológica do pré-
projeto, de modo que o primeiro capítulo do desenvolvimento estabelecerá um resultado
parcial da análise do instituto em tela e o segundo relatará tanto as experiências pessoais
do aluno como a entrevista formal e as conversas informais acima descritas..
Por fim, a conclusão trará mais observações acerca do todo pesquisado, com
resumos dos resultados parciais, além de proposições a servirem como próximo passo
para aprofundamentos posteriores e a impressão pessoal do aluno quanto à experiência
da pesquisa.
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2 – DESENVOLVIMENTO
2.1. – ANÁLISE DO ART. 7º, INCISO III DA LEI Nº 12.016/09
Assim estatui o dispositivo em apreço:
“Art. 7. Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:(…)III – que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica”
No campo da dogmática, percebe-se a presença de dois institutos processuais:
o primeiro deles, inserido na primeira parte do inciso (“que se suspenda o ato(...), caso
seja finalmente deferida”), é a tutela de urgência, que tanto pode ser cautelar quanto
antecipatória, apesar deste aluno crer que, quando se suspende o ato impugnado, se
entrega liminarmente o bem da vida almejado quando da impetração, sendo, portanto,
apenas antecipatória. Na segunda parte do inciso (“sendo facultado exigir do impetrante
caução(...) pessoa jurídica”) encerra-se o instituto da contracautela.
Quando analisado o dispositivo legal em tese, conforme observado ao longo
deste trabalho, não há como se afirmar categoricamente que a contracautela
representaria uma “igualdade de armas” no caso específico do mandado de segurança
em matéria de restabelecimento de benefícios suspensos por suspeita de fraude.
Tal instituto pode proporcionar a restauração do equilíbrio entre os litigantes
“perdida” com a concessão da medida liminar ou a perpetuação do desequilíbrio
remediado pela tutela de urgência. Da mesma forma, não se poderia afirmar que tal
faculdade facilitaria a concessão da medida em todas as hipóteses, seja por dar mais
segurança à relação processual, seja por afastar o perigo da irreversibilidade.
Isto porque o direito ao benefício da previdência social é direito fundamental,
previsto na Constituição da República, e verba de natureza alimentar, isto é, destinada a
satisfazer o princípio basilar da dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, bem
jurídico de alta importância. Mas não se pode esquecer que o princípio da solidariedade
e o princípio da proteção ao erário, derivado da supremacia do interesse público,
também são direitos fundamentais da comunidade. O que se percebe são dois valores
sociais muito caros ao brasileiro médio que, na presente hipótese, encontram-se em
tensão, o que retira a possibilidade de uma solução meramente etérea do caso.
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Sendo assim, faz-se mister avaliar os aspectos práticos envolvendo o tema.
Alguns deles serão extraídos da parte empírica da pesquisa, exposta a seguir.
2.2 – PESQUISA EMPÍRICA
Conforme dito na introdução, iniciou-se a pesquisa justamente pela parte
empírica, dela tentando estabelecer quais seriam os marcos teóricos relevantes. È de se
observar que, nos tópicos anteriores, os conceitos foram abordados de maneira genérica
e longe do objeto de pesquisa. Isto era necessário para entender tais marcos teóricos de
maneira neutra, sob o perigo, de, caso contrário, o presente trabalho ser argumentativo,
e não científico.
Em segundo lugar, foi valorizado o método indutivo nesta pesquisa, de modo
que os fatos abordados é que darão a tônica da aplicabilidade ou não dos conceitos
acima explicitados ao objeto, respondendo, ainda que muito superficialmente, aos
questionamentos propostos.
Inicialmente, buscou-se contrapôr casos concretos. Neste momento, foi de
grande relevo a experiência pessoal no estágio do Ministério Público Federal, no qual a
principal atividade é elaborar minutas de pareceres para os casos concretos. Para esta
pesquisa, destacam-se três pareceres de casos diversos: em um, chegou-se à conclusão
de que o benefício era flagrantemente fraudulento e, em outro, que não foi observado o
devido processo legal, sendo a discussão quanto à legalidade ou não da concessão algo
“de bastidores”. O terceiro enfrenta problema da tutela antecipatória de benefícios
previdenciários.
O primeiro caso, atinente ao processo nº 2008.51.01.805577-9, foi marcante
por ter sido o primeiro caso constatado de fraude minutado parecer. Vale citar as
constatações mais interessantes:
“Ao observado pelo Juiz de primeiro grau no trecho acima transcrito, soma-se o fato de que a ficha de fls. 107, da CRUZADOR S/A, não obstante tratar-se de vínculo supostamente iniciado com a Apelante aos catorze anos de idade, a foto a ele anexada traz uma S.M. Aparentando maturidade, parecendo inclusive mais velha que no registro de fls. 116, da DEPAVI, que teria sido feito quando a segurada tinha quarenta e quatro anos. Observa-se ainda, neste último, que as folhas anterior (fls. 115) e posterior (fls. 117) são referentes a filhas da Autora.(…)
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Não obstante, este contrato de trabalho causa mais estranheza a este órgão oficiante quando confrontado com a trajetória de vida da Autora sugerida pelo conjunto fático-probatório dos autos. Conforme documento de identidade acostado à inicial (fls. 10), a mesma nasceu em Manaus – AM, nada impedindo que esta estivesse laborando no Rio de Janeiro aos catorze anos. Contudo, esta cédula de identidade traz informações que dificultam esta conclusão: trata-se da primeira via da mesma, expedida em 05 de junho de 1985, no Espírito Santo, originada de certidão de casamento datada de 1968 e lavrada em Belém – PA.Corrobora o indício de S. estar residindo em Belém no final da década de 60 pelo menos até 1980 o teor da certidão de fls. 111, relativa à empresa DARIO ENGENHARIA, que não possuía filiais, da qual era sócia desde sua fundação, em 1976 (ano em que inclusive estaria supostamente trabalhando para a CRUZADOR S/A), juntamente com seu esposo, Dario Custódio de Souza (identificado às fls. 115 e 117)”.
Neste parecer, foi abordada também a temática do devido processo legal no
âmbito da auditoria no INSS. O mais interessante é que, no caso em comento, a Autora
da Ação obteve liminar em mandado de segurança anterior, não obstante este ter sido
posteriormente denegado. Outra descoberta interessante é que, informando o CPF do
marido da segurada no sistema de informações processuais da justiça federal,
encontram-se uma ação ordinária e um mandado de segurança, ambos visando o
restabelecimento do benefício, propostos pelo mesmo advogado, com razões de decidir
do juiz muito parecidas. Mais informações deste parecer serão cotejadas com os dados
empíricos posteriores.
O outro processo, de nº 2005.51.10.002388-1, foi especialmente escolhido
pelo fato de que o que necessariamente está ali escrito não transparece todas as ilações
em sua feitura. O parecer acostado no anexo opinou pela confirmação da sentença de 1º
grau, entendendo violados o contraditório e a ampla defesa quando do procedimento
administrativo de revisão de benefício. Realmente, ali o segurado não teve oportunidade
de defesa, nem teve suas provas apreciadas na esfera administrativa.
Mas este não era o principal pensamento na ocasião da redação da peça.
Nestes autos, o autor da ação pleiteava a conversão de tempo de trabalho exercido sob
condições especiais em tempo comum para validar sua aposentadoria. Para tal, juntou
uma série de documentos, inclusive contemporâneos aos vínculos, telas dos cadastros
oficiais e cópias autenticadas de suas carteiras de trabalho.
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As provas trazidas eram idôneas e, apesar de em alguns momentos
contraditória em sua confrontação com os sistemas informatizados da Previdência
Social, eram, em sua maioria, complementares a estes e, de qualquer ótica que se
pudesse calcular o tempo de serviço do segurado, este tinha direito. Tal conclusão uma
tentativa de elaboração de tese pra abarcar, na demanda proposta, a análise da
legalidade do benefício. O problema é que isso não era possível, face à péssima redação
da petição inicial, que não dava margem a retirar dela pedido implícito desta natureza.
O terceiro parecer, exarado nos autos nº 2009.02.01.014901-5, foi um Agravo
de Instrumento interposto pelo INSS objetivando revogar uma antecipação dos efeitos
da tutela concedida em favor do segurado ordenando a implantação imediata de
benefício de aposentadoria rural por idade, com base nos documentos da inicial, estudo
social realizado pelo próprio Juízo e manifestação do Ministério Público em 1ª
instância. A grande peculiaridade deste caso é o fato da decisão não ter sido proferida
pela Justiça Federal, mas sim por Juiz Estadual no exercício de competência federal,
conforme permissivo do § 3º do art. 109 da Constituição Federal.
Este caso foi escolhido por ser um caso de deferimento da medida de urgência
em fase anterior à sentença tendo por objeto benefício previdenciário; além disso, o fato
de, neste processo estar evidenciada a boa-fé da Agravada, fato que, em verdade, por
mais incrível que possa parecer, dificulta a concessão da tutela antecipada, por um único
motivo: salvo comprovada má-fé, o benefício previdenciário é verba alimentar, não
podendo, nos casos de boa-fé, o INSS, caso saia vitorioso e a tutela seja revogada,
cobrar os valores recebidos pelo segurado, sofrendo a coletividade dano patrimonial
irreparável.
Tal característica fazia transparecer o perigo da reversibilidade, tratado
anteriormente, obstáculo à concessão da medida antecipatória. Todavia, nestes casos, o
mesmo não é aplicável. Para ilustrar o caso, transcreve-se a ementa abaixo:
“Previdenciário. Agravo de instrumento. Aposentadoria rural. Concessão de tutela antecipada pelo juízo “a quo”. Decisão fundamentada em prova documental e estudo social. “Dupla irreversibilidade”. Ponderação de interesses. Risco de falecimento antes do trânsito em julgado versus risco de lesão ao erário. Prevalência do primeiro. Pelo desprovimento do agravo”.
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Outro momento da confecção desta pesquisa foi a entrevista com o Dr.
Rogério José Bento Soares do Nascimento, Procurador Regional da República.
Conforme dito anteriormente, o roteiro da entrevista, bem como os apontamentos
originais manuscritos constarão do anexo ao presente trabalho. Para complementá-la,
também integra o anexo peça de informações da Juíza Federal Dra. Valéria Caldi
Magalhães, Titular da 8ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, nos autos do Conflito
de Competência 2008.02.01.018737-1, que sintetiza e comprova a parte histórica dos
depoimentos do Procurador da República.
Dr. Rogério atuou direta e exclusivamente no combate aos crimes
previdenciários por aproximadamente 7 anos, de 1992 a 1999 e, após, foi promovido à
2ª Instância, acompanhando o desenrolar dos fatos como órgão revisor.
O que se notou da entrevista é o alto conhecimento da conjuntura e a rica
experiência pessoal dele. A partir desta conversa, outros questionamentos
complementares surgiram, e serão expostos na conclusão. Vários dos objetivos do pré-
projeto foram por ele abordados, permitindo que os resultados parciais estimados
fossem melhor estudados.
A conversa se dividiu em dois momentos: o primeiro foi uma abordagem
histórica acerca dos crimes previdenciários no final da década de 80 e início da de 90 e
os esforços para o seu combate, além dos principais fundamentos dos pedidos judiciais
de restabelecimento (mandados de segurança e ações ordinárias); num segundo
momento, ele externa suas sensações acerca da visão dos juízes federais quanto à
temática, fundado na convivência com estes quando em 1ª instância.
Antes de iniciar a abordagem histórica, Dr. Rogério sintetizou como os
processos são classificados durante a persecução penal: a 1ª classificação diz respeito a
fraudes com origem na mesma unidade (por exemplo, o posto Méier, que é inclusive
destacado nas informações da Dra. Valéria); a 2ª são os chamados “processos satélite”,
isto é, processos de segurados em que não foi encontrado envolvimento a mais na
quadrilha de fraude além do benefício que usufrui; a 3ª ser refere à modalidade de
fraude. Em relação à 2ª classificação, a 1ª e 3ª são chamados “processos-mãe”.
Após, caracterizou a quadrilha clássica como um grupo composto de
servidores com cargos de chefia, servidores da área de conferência e habilitação de
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benefícios e intermediários, que eram, em sua maioria, despachantes e advogados,
encarregados de cooptar beneficiários para alimentar o esquema.
Iniciou a abordagem histórica evidenciando que a fraude à previdência sempre
existiu, isto porque a previdência no Brasil se iniciou de maneira fragmentária e foi se
estruturando com o passar dos anos a partir da década de 60, encontrando sua unificação
e racionalização na Constituição de 1988.
Foi devido ao trabalho da Constituinte e, posteriormente, do Poder Legislativo
que promulgou a Lei do Regime Geral (Lei nº 8.213/91) em unificar e estruturar a
Previdência Social que o então reestruturado INSS, bem como o Ministério Público e a
Polícia Federal começaram a perceber as fraudes, inicialmente detectando as chamadas
“grandes fraudes”, como a da Sra. Georgina, integrante de uma quadrilha formada
maciçamente por advogados que, em conluio com procuradores federais do INSS e um
juiz, supervalorizavam indenizações de acidentes de trabalho para embolsar a diferença
entre o efetivamente devido ao segurado e o excesso fraudulento.
A partir deste momento, em 1992, quando Waldir Peres assumiu a presidência
do INSS, iniciou-se um trabalho de fiscalização da concessão de benefícios, baseados na
tese de que parte do chamado “rombo da previdência” era a sangria provocada pelos
benefícios irregulares. Foi a época das chamadas “inspetorias”, comandadas por José
Inácio Pereira da Silva, adjetivado pelo Dr. Rogério como “muito trabalhador, mas
muito autoritário”.
O trabalho das inspetorias consistia em detectar a irregularidade e suspender o
benefício. Ocorre que tudo era feito sem qualquer instrução probatória, sem dar
oportunidade de defesa ao segurado. Ato contínuo, as falhas da inspetoria ocasionavam
inúmeros restabelecimentos fundados da inobservância do devido processo legal.
Naquele momento, a estratégia de combate aos crimes previdenciários
consistia em denunciar a quadrilha juntamente com os segurados pelo crime de
peculato(art. 312 do CP), chegando um processo a ter 50 Réus, fato que facilitava a
impunidade, pois a ação penal não conseguia prosseguir devido ao grande número de
acusados.
Num segundo momento, num esforço de melhorar o trabalho das
“inspetorias”, foi criada a “auditoria permanente” do INSS no Governo FHC, instruindo
melhor os servidores, sanando as nulidades nos procedimentos de revisão. Ocorre que o
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Poder Judiciário não percebeu isso de pronto. Obedecendo a “lógica do modelo”,
continuaram ordenando o restabelecimento, somente percebendo as falhas das decisões
dadas em massa quando estas foram amplamente reformadas em 2º grau.
A partir desta conscientização, reduziu-se consideravelmente o número de
restabelecimentos e drasticamente o número de tutelas de urgência em processos dessa
natureza. Nesse momento histórico, a estratégia de combate às fraudes na seara penal
também mudou, adotando a configuração atual. Por uma questão de estratégia, os
segurados eram denunciados separadamente da quadrilha, aplicando-se a eles uma
construção teórica que desclassificou o crime por eles cometido para “estelionato
previdenciário” (art. 171 com a majorante do § 3º do CP), aplicando a “participação de
menor importância” (art. 29, § 2º do CP) de modo a que eles pudessem usufruir do
benefício de suspensão condicional do processo, que estipulava, em uma de suas
condições, a renúncia ao benefício1.
Num momento posterior, a auditoria começou a utilizar os cadastros oficiais
para a revisão de benefícios (CNIS, RAIS, dentre outros), o que gerou uma nova onda
de restabelecimentos, sob o fundamento de que tais cadastros não eram confiáveis.
Neste momento, foi criada uma força-tarefa composta por Policiais Federais,
Procuradores Federais do INSS, Auditores e Procuradores da República para investigar
e coibir as fraudes. Houve a realização, durante este momento, de um profundo trabalho
de inteligência e contra-inteligência, detectando-se modus operandi, maior incidência,
etc. Foi nesta época que descobriram que as quadrilhas eram montadas de fora do INSS,
por políticos da alta esfera de governo.
Na opinião do Dr. Rogério, somente se pode dar idoneidade às informações
contidas nos bancos de dados eletrônicos a partir de 1994, quando se solidificou a
informatização da administração fazendária e se reestruturou a DATAPREV.
Acerca da opinião dos Juízes Federais, o Procurador da República ponderou
que, inicialmente, devido aos inúmeros pleitos de revisão no valor dos benefícios, a
Justiça Federal, ao ponderar os valores e bens jurídicos envolvidos na questão do
restabelecimento, se inclinava pela preponderância do caráter alimentar do benefício,
por ter uma visão de uma previdência “caótica e injusta”.
1 Para mais esclarecimentos, vide informações da Dra. Valéria Caldi no Anexo. 11
A partir do trabalho desenvolvido pela força-tarefa, este panorama mudou: os
julgadores começaram a ver o INSS como vítima, e no esforço de se modernizar e se
organizar, fazendo-os tender mais à proteção ao erário.
A última parte da pesquisa empírica foram conversas informais com alguns
professores da Faculdade de Direito da UFF, notadamente os Professores Carlos
Vargas, que se recusou a dar entrevista, alegando que o mais apto a dá-la seria um
professor de direito previdenciário; e a Professora Priscila Seifert, que deu uma
interessante contribuição ao projeto, sugerindo um critério de distinção para aplicação
da contracautela baseado na capacidade econômica do impetrante.
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3 – CONCLUSÃO - CONVERGÊNCIAS ENTRE TEORIA E PRÁTICA – OS
RESULTADOS PARCIAIS
De início, ressalta-se que a pesquisa empírica não foi ampla o suficiente para
que se pudesse considerar qualquer conclusão obtida como efetivamente demonstrada,
de modo que neste tópico serão feitas considerações que, não obstante possam ser
enunciados, são apenas parciais e superficiais. Seu maior objetivo é servir de ponto de
partida para um aprofundamento posterior.
Efetivamente, foi constatado que benefícios não podem ser suspensos
unicamente com base nos cadastros oficiais. As pessoas que hoje se aposentam
começaram a trabalhar em meados da década de 60, período em que o CNIS não
alcança e o PIS não era informatizado. Também, conforme dito anteriormente, os dados
obtidos apontam para a não-confiabilidade das informações obtidas nos bancos de dados
anteriores a 1994, além do caráter eminentemente complementar e enunciativo destes.
Nos dias Atuais, a Auditoria tem se mostrado melhor aparelhada que em
tempos anteriores, mas por inúmeras vezes ignoram as alegações do segurado,
forçando-o a recorrer ao Judiciário.
Ao reverso, é assustador o número de benefícios fraudulentos e a sofisticação
das falsidades perpetradas. É fato público e notório que milhões de reais dos cofres
públicos são perdidos por desvio de verbas da seguridade social mediante
aposentadorias e pensões falsas.
Tais motivos levam ao primeiro resultado parcial: não obstante toda a
conjuntura dos crimes previdenciários, sua essência de direito fundamental, aliado às
falhas ainda cometidas pela fiscalização, torna possível, e aqui não se analisa o prisma
puramente legal, mas sob a idéia de justiça social, a concessão de liminares em
mandado de segurança visando restabelecimento de benefício suspenso ou cancelado
por indícios de fraude na sua concessão.
Outro fundamento que torna possível a liminar é o fato que esta, enquanto
medida antecipatória, é reversível, tendo em vista que, caso comprovada a ilegalidade
do benefício, o segurado tem elidida sua presunção de boa-fé, permitindo a cobrança
dos benefícios recebidos indevidamente.
Um segundo resultado a que se chega é que a exigência de contracautela não
necessariamente causa desequilíbrio na relação entre impetrante e INSS, tendo, porém,
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dupla face: pode tanto alcançar a “igualdade de armas” quanto não. Nesse sentido, a
efetividade do acesso à justiça pode restar ameaçada tanto pela exigência como pela
não-exigência, ou ainda, quando possível a caução, o juiz, por falta de hábito ou por
aversão a aquela, pode acabar indeferindo a liminar, e este fato, certamente,
compromete a efetividade do acesso à justiça, visto que talvez a mesma seja o maior
fundamento das medidas de urgência.
Outro resultado que se obteve é que não há como, no presente estágio da
pesquisa, apontar qualquer tese ou solução padronizada (sim ou não acerca da exigência
de caução para concessão da liminar): a possibilidade tanto da concessão da liminar
quanto da necessidade da contracautela devem ser apuradas caso a caso, pois tudo
dependerá da capacidade do Impetrante de comprovar de plano seu direito.
O resultado anterior gerou um novo questionamento: quais os fatores que
balizariam, numa situação complicada, a exigência da caução de modo a realizar a
efetividade do acesso à justiça? No atual desenrolar do estudo, levantou-se dois fatores:
um da entrevista do Dr. Rogério, que é justamente a influência da conjuntura do
combate aos crimes previdenciários no imaginário do juiz, e o outro da conversa
informal com a professora Priscila, qual seja, a capacidade econômica do Impetrante.
A delimitação destes fatores gerou mais questionamentos, que no presente
momento, não podem nem de longe ser respondidos: Como estes fatores atuariam na
prática? Quais seriam os resultados?
Pensa-se, diante de todo o trabalhado, que imediatamente, estes seriam os
objetivos mais próximos a serem investigados num futuro aprofundamento, de modo
que, como exaustivamente salientado, esta pesquisa não explora todas as facetas do
objeto, nem esgota as exploradas aqui.
Por fim, admite-se que, diante de toda a ambição esboçada no pré-projeto,
apenas uma pequenina parte pôde ser aqui satisfeita. Da mesma forma, ante o costume
profissional de escrever argumentativamente, foram muitas as dificuldades de agir
cientificamente, sendo este trabalho o mais gratificante e desafiador do semestre letivo.
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4 – BIBLIOGRAFIA
1_ CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à Justiça. Edição única. Sérgio Antônio
Fabris Editor. Porto Alegre: 1978, Reimpresso em 2002).
2_ THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Volume
II – Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de
Urgência. 44ª Ed. GEN-Forense, Rio de Janeiro: 2002).
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