5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 1/8
Colecau
Scientia
Hist6ria da Cienciano Cinema 3
Hist6ria da Ciencia
no Cinema 3
Apollo 13 - Do desast re ao tr iunfo
T ha Is C yt in o q e M el lo F ora to
C i be l ie C e le s ti n o S i lv a
2001: uma odisseio no esoaco, na vida
humana e na ci,encia
A d il io J o rg e M a r. q IJ e s
Dialogos imaginados
G ra ci el a d e S o uz a O li ve r
Factum efatum: a c ienc ia aos olhos de
Jul io Verne e Georges Melies
A id a H e iz er
tvtarcos G onz alez
Betania Goncalves Figueiredo
Anny Jaokeline Torres Silveira
Orqanizacao
ARLiVM5NTVM
Editora
Quem Somas Nos?
R o dr ig o O so ri o P e re ir a
Quem Somos Nos?
o fenomeno cultural do "mist ic ismo
quant ico" no seculo XX
G u st av o R o dr ig u es R o ch a
o flo Perdido - (Man to Man)
f I~ h e l M i zr a hy C u p er sc h m id
B ru n a C a rv al ho d e O li ve ir a
A busca do elo perdido:
Praticas cient ff icas e questao racial na
Segunda meta de do seculo XIX
J ean Lui: N e ve s A b re u
Homo sapiens 1900: eugenia e ra! ;acomo alegorias cientff icas
A nd re M ov a
Dogue e composto 0Novo Mundo?
A Il Ii i [ ar o/i lla V im ie iro G om es
( V I ei l y A s s b ti i l ni v a le s
o Jardineiro P i el : p e sq u is a j a rm a c eu t ic a
e n tr e b e ne f ic io s e d es ca so s e ti co s
Rita de C a ss ia M a r qu e s
Vendendo a clenc ia no sert ao
V ale ri a M ora d o S il va
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 2/8
Todos os direitos reservaclos a
AR~VME'~ITVM Editora Ltcla.
© AutoresSurruuio
Este I ivro ou par te dele nao pode ser reproduzido
por qualquer meio sem a autor izacao da editora,
As ideias contidas neste livro sao de responsabilidade de seu autor
e nao expressam necessariamente a pos icao cia editora.
Apresetuaciu: ··.· , ,,, 7
C IF -B RA SIL C AT AL OG A< ;A O· NA ·F ON TE S IN Dl CA TO N AC IO NA L D O S E Dl TO RE S D E uvno, HJ
Apollo 13 - Do d e sa s tr e 0.0 triunfo
Thais Cyrino de Mello Forato
Cibelle Celestino Si[va 11H58
v.3
Historia da ciencia no cinema 3 I organizacao Betftnia Conealvcs Figueiredo, Anny
Iackeline Torr es S il vei ra . - Belo Horizonte, MG : Argvmeritvm, 2010.
2001: uma odisseia no espaco, na vida humana e na ciencia
Adilio JOIge M arques " 31
256 p. ; il.; - (Scienti a ; 12) Dialogos imaginados
Graciela de Souza Oliver 49 .uclui bihliografia
ISBN 978·85-98885-87·2
1. Ciencia - Historia, 2. Ciencia no cinema - Hist6ria e critica. 3. Filmes de ficcao
cient if ica - His toria e cri ti ca . I.Figueiredo, Betania Goncalves . I I. Silveira, Anny Iackeline
Torres. I II . Ser ie ,
Factum e fatum: a ciencia aos olhos de Julio Verne e Georges Melies
Aida Heizer
Marcos Gonzalez " .. 5910·1821. CDD: 791.435
CDU: 791.43·2 Quem Somas N6s?
Rodrigo Osorio Pereira 6927.04.10 07.05.10 018345
Carlos Alberto Filgueiras I UrR]Bernardo Jefferson de Oliveira I UrMG
Gilberto Hochman I FIOCRUZ
Maria Amelia Dantes I usrMaria de Fat ima Nunes I UN IVERSID AD E DE EVO RA - PO RTUG AL
Olival Freire I Ul"BA
Quem Somos N6s? - 0 [enomeno cultural do "misticismo
quantico" no seculo XX
Gustavo Rodrigues Rocha , 8.l
o El o Perdido - (Man toMan)
Ethel Mizrahy Cuperschmul
Bruna Carvalho de Oliveira 109
ARCiVME7NTVM
Editora Ltda.
Rua dos Caetes, 530 sala 1113 - Centra
Bela Harizonte. MG. Brasil
A busca do elo perdido: Praiicas cientificas e quest i io racial no . segunda
metade do seculo 'XIX
Jean Luiz Neves Abreu 121
Telefax: (31) 32129444
www.argvmentvmeditora.com.br
Homo sapiens 1900: eugenia e ra/fa como alegorias cieiuificas
Andre iVlota 131
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 3/8
Factum e fatum: a ciencia aas olhas de
julio Verne e Georges Melies
AIda Heizer
Marcos Gonzalez1
"0 santo admirou-se da maraoilha e disse:
~ Estimo muito, mas saiba que iruuneros homens tem.tentado vir a Luc. e bem
poucos 0conseguiram. 0 ultimo ue io de ru ro duma bala de canhno, nllm tiro
mal calculado. A bala passou pO' cima da Lua eficoi: rodando em redor dela.
Na o sei quemfoi essemaluco.
~ Eu. s ei ~ g r uo u Pedrinho. Foi urn personagem deJulio Verne, no romance Da
terra it L ua . V ov ojii nos leu is:w,"
(Monteiro Lobato. Coisas da Lua. Viagemao Ceu; 199.5: 25)
Capa d o Iivro V:iagem ao C e L L de Monteiro Lobato
1Agradecemos a Maria Esther Valente pela ind icacao do catalogo sobre a exposicao
de Julio Verne da Fundacion La Caixa de Barcelona.
59
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 4/8
Factum efauan: a c ienc ia aos olhos de Jul io Verne e Georges Melies
Jul io Verne (Nantes, 1828 - Amiens, 1905) e urn daqueles escri tores que
em qualquer roda de conversa suscit a as mais dife rentes opinioes e anal ises,
Nao e a toa que as pesquisas ern di ferentes paises analisam 0 conteudo e 0
alcance de sua obra, que nao cessa de ser reeditada (Milo, 1997: 2.085-
2.130).
No Brasil, 0 soci61ogo Gilberto Freyre, ern seu livro Ordem e Progresso
(19.59), afirmou que:
foram os romances de Julio Verne, muito l idos no lim do seculo passado
[XIX] e no comeco do atual [XX] por meninos e adolescentes brasileiros; e
talvez tenham concorrido para desenvolver em brasileiros da epoca 0gosto
pelas invencoes, a adrniracao pelas maravilhas tecnicas, 0entusiasrno pelos
halces e pela conquista do ar. (Freyre, 1959: 188)
A par te a ausencia de uma referencia explici t a ao perfi l dos mencionados
' leitores brasileiros ', dado que a maioria da populaoao hrasileira era analfabeta,
o fato e que a obra de Julio Verne faz parte do i rnagina rio coletivo e , apo iada
no tripe 'aventura, exploracao e conhecimento', convida 0 lei tor a viagens que
tern a especulacao como fio condutor.
Podemos afirrnar que 0ponto de par tida dos l ivros de Verne e a viagem por
terra, mar e ceu, Era preciso, segundo ele , via jar e sonhar para descobrir e
mudar. 0 his toriador e f i16sofoda ciencia frances Michel Serres (2007) chega
a a firrnar que Verne e urn escritor que nos ajuda a passa r da infancia it ado-
lescencia, ate porque 0 adolescente, segundo 0 filosofo, amadurece viajando.
Durante as viagens e possive l reconhecer que 0mundo e os homens mudarn.
Serres, ao responder a uma pergunta sobre Julio Verne te r sido urn dos nossos
grandes educadores, afirmou:
Durante quatro ou cinco geracoes, JUlioVerne desempenhou 0mesmo papel
do famoso livro Le TourdeFrancepar deux enfarus [Viagemde duas criancas
pela Fr anca] - romance que circulava nas familias e nas escolas francesas
e que mareou geracoes. A ideia do livro era propor uma iniciacao na vida
adulta por meio de uma viagem: "durante uma volta pela Franca, duascriancas exploradoras descobriram paisagens, geografia, beleza, conheciam
homens e mulheres, seus oficios", como outrora 0Telemaco de Fenelon 0
filho de Ulisses, que atravessou varies paises no mediterraneo em buses
de seu pai . (Serres , 2007: 12)
Seus analistas contemporaneos prornoviam, por vezes, uma rivalidade entre
Julio Verne eo cientis ta Louis Figuier (1819-1894) , ao afirmar que 0primeiro
60
AIda Heizer I Marcos Gonzalez
fazia urn romance cientifico, Segundo 0 periodico L e T em p s, em 1884, Verne
imaginava uma fabula mais ou menos fel iz em torno da qua l agrupava fatos,
documentos atrelados a hip6teses, ao contrar io de Figuier , que expunha osfatos
cientif icos e que pretenclia fazer uma "revolucao social" atraves da divulgacao
da oienc ia (Le Savant de Foyer, 1993: 18).
No entanto, longe de ser um especulador , embora sem a preocupacao de seu
conte rraneo Figuier, que dividiu sua obra de acordo com seu publ ico, Verne
esc reveu seus Iivros com base nas p rati cas cienti ficas e na c isncia em vigor.
Indagado sobre as semelhancas de sua obra com a de seu contemporaneo
H. G. Wells, autor de G ue rr a do s m ur ul o s e O s p ri me ir os h om en s n a L ua , Verne
explicitou seu conceito de divulgacao:
Alguns de meus amigos tem me dito que sell.trabalho se pareee rnuito com
o meu, mas creio que se enganam. Eu me considero um escritor puramente
imaginative, digno dos maiores elogios, mas nossos metodos sao cornpleta-
mente difercntes. Minhas pretensas 'invencoes' sao idealizadas sabre uma
base de fates reais, u.tilizanclometodos e materia que nao ultrapassam os
limites dos conhecimentos tecnicos conternporaneos. Par outro lado, as cria-
goes do senhor Wells pertencem a uma epoca e urn gran de conhecimento
cientifico bastante adiante do presente, para nao dizer 0mais completamente
alem d os limites do possivel. Ni lo s6 elabora seus temas a par tir do reinodo imaginario como tambern os elementos que servern para construi-lo POI'
exemplo, em seu romance a s primeuos homens na Lua, ele apresenta uma
substancia antigravidade eompletamente nova, da qual nso conhecemos a
menor pis ta , a mais palida ideia desua preparacao, obtencao ou composicao
quimica real. (Perez, 2007)
E notavel 0 numero de ed itores (de revistas, livros, alrnanaques, enc i-
clopedias) e de organizadores de exposicces, congressos e conferenc ias, na
segunda metade do seculo XIX, na Franca, com propostas urgentes para que
seincorporassem no dia a dia das pessoas asnovidades da ciencia e da tecnica,
Alem disso, havia eviclente preocupacao com a circulacao dos resultados dos
andamentos dos estudos incluiclos no cotidiano dos praticantes das cienciasem diferentes t empos e espacos (Heizer, 2009).
o aspecto pedag6gico cia obra de Verne Se cleve, em grande parte, ao
projeto de seu editor, 0 qual apostou numa literatura didati ca com sucesso de
distribuicao, durante geracoes consecutivas.
Shapin (1990), em seus estudos sabre a relacao entre publico e ciencia,
ressalta que existe uma hist6ria clessa relacao que nao pode ser descon-
side r ada. Assim como out ros contemporaneos, Verne preocupava-se com a
61
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 5/8
AIda Heizer I Marcos Gonzalezactum efatum: a eiencia aos oll ios de Julio Verne e Georges M61ies
irnportancia de divulgar 0 que os prati cantes das c iencias faziam, bern como
os fundamentos de suas pra ticas, Podemos assim conceber sua obra como urn
projeto de divulgacao afinado com seu tempo, guardando as especif icidades
de seu trabalho.
Ospersonagens de Verne, confinados a urn balao ou a um submari.no, entre
outras caracterist icas , viviam num mundo reduzido aqueles espagos que, longe
de se rem limitadores, propic iavam que ali seus personagens explic ita ssem
valores, como a just ica e a preservacao da na tureza .
No caso especifico de Da terra a Lua (1864-1865), 0 personagem Impey
Barbicane, presidente do Gun Club, propoe que se dispare urn projet il t ripu-
lado que chegue a Lua ...
A opcao de Verne foi ressalt ar a teoria da nebulosa primit iva que explica
a formacao do sistema solar. Essa concepcao teve per base as ide ias do mate-
matico Simon Laplace (1749-1827) e sua concepcao cosmog6nica (1796) do
universo. Ao afirmar a hipotese da nebulosa primi ti-
va, Verne se propos a explicar, atraves das leis da
natureza, osfen6menos celes tes, convencido que
estava da inexistencia, nessas explicacces , do
principio da causalidade, e tambem do plano
divino (La Caixa, 2005). Verne se apropriou
das teorias de cientistas como 0 citado La-
place (Geymonat , 1982: 283), entre outros,
e mais: "Julio Verne fez passar a maioria
de seus her6is pela total idade dos espacos
do mundo e pela totalidade do saber. Da
geometria a mecanica, da mecanica a fisica,
desta a astronomia" (Serres, 2007: 61).
Porern, inspirado em Verne, outro art is-
t a frances mostrari a, com nova linguagem,
uma maneira, talvez, ainda rnais ludica - na
verdade, feeri ca - de vel' a cienc ia.
Na celebre sessao de 28 de dezembro de 1895,no Salon Indien, porao do Grand Cafe do Boulevard
Foto do escritor Julio Vernedes Capucines, entre osconvidados a ass is ti r as vis tas
captadas pelo cinematografo dos irrnaos Lumiere, estava Georges Melies. Num
disco gravado em 1937, ele conta que duvidava da qualidade do truque ao
vel ' a simples fotografi a projetada do portae de uma fftbri ca, mas, ao fina l da
projecao, defmira 0que viu como "urn truque extraordinario", Imediatamente
se inte ressou por ter acesso a urn disposit ivo semelhante (Ezra, 2000).
No final do evento, Me:lil~sinsistiu para que Antoine lhe vendesse urn exem-
62
plar do cinematografo, chegando a oferecer por ele dez mil f rancos suicos, Mas
Antoine recusou, alegando tra tar-se de uma curiosidade cientifi ca sem valor
comercial. E provavel que osLumiere nao quisessem seu invento cientif ico em
uma feira de ilusoes (Costa, 1997). Diante da recusa, George foi ao atelie de
Wi lliam Paul, em Londres, e la adquiriu e adaptou urn modelo semelhante de
camera fei to por outro fabricante. Em poucos rneses, comecou a realizar f ilmes
que sintetizavam sua experiencia de ilusionismo de palco com as possibilidades
tecnico-express ivas do entao novo meio (Tietzmann, 2007) .
Desde pequeno, Georges fazia car icaturas de professores e amigos , shows
de marione te que ele mesmo construira corn papel cartao, e tambem apre-
sentacoes de magica.
Aos 23 anos, foi pa ra Londres estudar ingles, mas ocupou a maior pa rte do
tempo ass is tindo a shows de i lusionismo. Em seu retorno a Paris, foi forcado
a trabalhar em uma das fahricas de sapatos do pai, 0que 0 levou a aprender
elementos da mecanica, Ao se aposentar, em 1886, seu pai passou os nego-
cios da familia para os filhos. George vendeu sua parte na firma, abrindo,
no mesmo ano, sua propria companhia , a Sta r Film. Adqui riu ainda 0 Teatro
Hobert -Houdin, reaherto ao publico em 1888.
Os primeiros filmes de Melies (1896) captavam a 'realidade', como 0
faziam os irmaos Lumiere. Mostravam eventos i solados, como cenas de rua ,
que depois eram exibidas entre os atos dos shows de atracoes que promovia
em seu teatro, e encantavam a plateia. Mas, no ambiente boemio da Belle
Epoque, t eatros de a tracoes concorriam com magicos, misticos e cabares,
como 0Moulin Rouge (Costa, 1997) .
Urn dia, quando George estava f ilmando 0 t rafego de veiculos em frente a
Casa de Operas de Paris, sua camera enguicou. Ele a consertou e continuou
as fi lmagens, mas, quando viu 0 resultado, notou que alguns objetos sumiam
e reapareciam na tela. Um 6nibus se transformava em um carro Iunerario,
urn hornell. em uma mulher, etc. Nos momentos em que a camera estava en-
guicada, 0 t rafego e ospedestres continuavam se movimentando, mas, como 0
filme nao continuou rodando por urn tempo, parecia que os objetos e pessoas
mudavam ins tantaneamente. Quando percebeu que este ' acidente' poder ia serreproduzido em Iabora toric, ele comecou a real izar uma serie de fi lmes com
peqllenos "truques'" de imagem.
Seu primeiro "filme de truque" foi A mulher que desaparece, no qual co-
locava uma moca sentada em uma cadeira, a cobria com um pano, parava
a filmagem, retirava 0 pano para mostrar que a moca havia sumido, parava
2 0 que Melies via nos seus "truques cinematog raficos" nao difere muito do que hoje
cliamamos de eieitos especiais no cinema.
63
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 6/8
Factum efruum: a ciencia aos olhos de JUlio Verne e Georges Melies
novamente a f ilmagem e fazia a moca reaparecer como urn esqueleto .
Melies fez filmes sobre atualidades, dramaticos, fantasiosos, cornerciais,
rel igiosos e de terror, elaborando desde 0 rote iro a te a producao. Projetava e
ilustrava a maioria dos cenar ios, ~composicoes inspiradas em uma ' rnaquina-
r ia teatral ' muito diferente dos sistemas de montagem que van se desenvolver
mais tarde (Barbosa, 2007) .
Ao perceber que ser ia necessario uma localidade para realizar seus f ilrnes ,
oonstruiu 0 primeiro atelie da Europa Estudio, em Montreuil , em 1897 - este
era fei to de vidro, 0 que permi ti a util izar ilu rninacao na tura l e fez de Mel ies
o primeiro europeu a uti lizar este t ipo de ilurninacao. Alem disso, Melies foi
o primei ro a uti li zar 0 recurso da exposicao mult ipla de negat ivos, do pro-
cesso de pintura sobre a pe licula pa ra conseguir f ilmes 'coloridos'; a erial ' as
tecnicas de fade in (quando a imagem surge do preto] e do fade out (quando
a imagem vai desaparecendo); a produz ir esquetes e story boards; 0 primeiro
nu no cinema ... (Marcolin, 2009).
Mel ies real izou magica defronte da camera, mas era princ ipa lmente na
sala de edicao que ele acrescentava as novas tecnicas cinematogra ficas que
agregaram ao cinema caracteres tanto espetaculares quanta motivantes. Desco-
briu novas tecnicas de efeitos especiais, como a dupla exposicao (que consistia
em filrnar, rebobinar 0 f ilme e f ilmar pOI 'cima), a superposicao de imagens
e stop-motion, entre outras.
Urn dos seus f ilmes mais ambiciosos foi fei to em 1899, chamado 0 caso de
Dreyfus, e com ele iniciava-se uma fase narrativa em que a historia prosseguia
cena apos cena, valendo-se de var ies efeitos especiais por ele criados .
Aproveitando sua experiencia ate ali, Melies deu vida, ern 1902, a Le
Voyage dans la Lurie (Viagem a Lua). Era um curta-metragern de 15minutos,
o primeiro f ilme de f iccao cientif ica do cinema, e tambem 0 mais cam criado
ate entao: 10 mil frances franceses."
o f ilme foi inspirado nao apenas numa peca adaptada por Adolfo Dennery
a part ir do Iiv ro de Julio Verne (Da Terra a Lua), mas tarnbem na obra de H.
G. Wells (Osprimeiros homens na Lua) (Cunha, 2009). Inaugurava, segundo
ele proprio, 0 genero dos filmes "fantasticos".
3 Sabe-se que Melies tambern leve como grande colaoorador de sua obra 0 ilustrador
Robida, que criava maquetes e desenhos elaborados para os seus fi lmes,
4 0 equivalente a mais ou menos cem mil reais (moeda brasi le ira],
64
AIda Heizer I Marcos Gonzalez
Ofilme
Viagem a Lua, com 0 total de 12 pIanos, se inicia com uma reuniao na
Academia de Astronomos da Franca. Os acadernicos, usando trajes de traba-
Iho rnuito semelhantes as vestes de fe iti ce iros, di scutem os planes para uma
viagem iLua, chegando a usar a violencia pa ra resolver uma cont roversia ,
An tes de embarcar na capsula, que seri a lancada pOI' urn canhao em direcao
ao sateli te , eles trocam as ves tes pOI 'roupas de expedicao. Apos pousarem no
'OUlO' da Lua - uma das imagens mais farnosas cla h istoria do cinema - eles
se deparam com exuberante na tureza, mas sao atacados pelos selenit as, urn
povo primitivo, em nada amistoso. Os cientis tas sao capturados, mas ao f inal
conseguern escapar a golpes de bengalas e guarda-chuvas que, gracas a tee-
nicas de trucagem cinematografica, fazem explodir os selenitas . Eles fogem,
ernpurrando a capsula do alto de urn penhasco da Lua ... e caem na Terra,
no mar . A capsula e resga tada do fundo do mar e os cient ista s sao recebidos
como herois.
Num tempo em que a Franca p6s-napole6nica e ra a segunda maior po-
tencia colonial no mundo, so perdendo para a Ingla te rra de Wells, Viagem it
Lua pode ser l ido como urn "romance imperial" tecnocientifico closconfl itos
coloniais da epoca (Ryu, 2007).Nao 6 itoa que a paisagem lunar de Melies e tropical, com cachoeiras
exuberantes, cogumelos gigantes e seres inteligentes que lembram macacos
ferozes. 0 :6lme ia ao encontro tamhem das expectativas de novas conquis tas
cientihcas que marcararn 0 inicio do seculo XX. Esperava-se urna crescente
evolucao no campo da cieneia, dando cont inuidac le as iniciadas no seculo
ante rior. A conquista do espaco sempre foi para a humanidade urn dos seus
grandes objet ivos , mas , especialmente naquela epoca, em face das alteracces
sofr idas pela astronornia no seculo XIX - de uma ciencia voltada principal-
mente para os planetas e seus movimentos, para uma ciencia dinamica que
visava aouniverso estelar e a f is ica dos corpos nele existentes. 0 sonho de uma
ciencia prospera e a perspeetiva de novas deseobertas eienti:6eas fizeram surgir
a ficcao c ient ifi ca como forma de mostra r a projecao do futuro da c ienc ia.Cerea de um terce dos filmes de Melies apresentam a temat ica onirica, 0
fetichismo e tambem muito abordado e havia, acirna de tudo, 0lado 'espetaculo'
do cinema. A cenografia e a maquiagem apareciam, e os efeitos nao eram
suti s, mas feitos para ser notados. 0 papel de diabo, que e le proprio gostava
de representar , fala pOl ' s i de seu pensarnento anarquico: "desconcertante,
desorganizador de toda a ordem artistica vigente, e abrindo caminho para
urna nova forma de conhecimento" (Araujo, 1995: 240).
65
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 7/8
Factum efatum: a ciencia aos olhos de Julio Verne e Georges Melies Alda Heizer I Marcos Gonzalez
Os "truques" tecnologiccs eram seu grande chamariz! Com passes de
magica cinematograf ica cada vez mais complexes , Melies atraiu a atencao dos
espectadores e construiu um caminho que 0 Ievaria ao sucesso. Viagem a Luateve uma tiragem excepcional para a epoca, tendo sido produzidas cerca de
200 copias, 0 que fez de sua Star Films a lider do mercado c inematogra fico
mundial , antes de Patte .
Em suma, a especulacao, em Verne , manipula 0factum, que nos ehegou
como 'fato', algo reeonhecido por todos, que nao da margem para muita
especulaoao, para provocar 0 imaginario do lei tor com os sentidos originais
da pa lavra, "fe ito, a<;ao, faeanha, empresa" (Houai ss, 2001). Fazer do gosto
pela ciencia e pelo conhecimento 0 veiculo de viagens fantast ic as e urn mote
narra tivo tao fasc inante que influenc iou esc ritores como Monte iro Lobato e
cientis tas como Rober t Goddard, urn dos engenheiros da equipe internacional
que criou 0 Sputnik (Brake & Hook, 2007).
Em caminho oposto, no entanto, estava M6lies, cuja especula<;ao se baseava
no fatum, "predicao, destine" em seu sentido original, que viria a dar em
fee ("fada" , no frances do inicio da Idade Media) e, :finalmente, em "feer ico" ,
aquilo que pertence ao mundo da fantasia . Melies fez do saber cient ifico urn
tema para a alegoria que, mais tarde, se transformaria num inf luente fen6meno
do entretenimento popular: a nc<;ao cientifica cinernatografica.
Sendo assirn, qual 0melhor caminho para se divulgar a eiencia? A de Verne,
inspirada na 'verdade ' ci ent ifi ca, ou a de Mel ies, que esta mais interessado
em seus aspectos l ir icos , em suas 'mentiras '?
CUNHA, M. B. D. & Giordan, M. A imagem da ciencia no cinema. Quimica
Nova na Escola, v. 31, n. 1 , 2009. .
EZRA, E. Georges Melits: the birth of the auteur. Manchester: Manchester
Univ~i ty Press, 2000. (French film di rec tors)
FREYRE, Gilberto. O r d em e P ro g re ss o, v. 2. Rio de Janeiro: Iose Olympio
Editora, 1959.
GEYMONAT, Ludovico. Kant e opere di Kant. In: Storia del pensiero filosofico,
v, 2. Mi lao : Carzant i, 1982.
HEIZER, AIda . Cienc ia para todos. A exposicao de Paris de 1889 ern revist a.
Reuista de Historic e Estudos Culturais Feni», jul-ago-set, 2009.
HOUAISS, A. Dicionario eletronico Houaiss da lingua portuguesa, 200l.
LA CAIXA. jules Verne. Viajar, viajar, viajar:., Barcelona: La Caixa , 2005.
Catalogo de exposicjto.
LE SAVANT DE FOYER. Louis Figuier et la Vulgarisation Scienti fique au
X I X i : siecle. Montpellier: Carre D'Art Bibliotheque, 1993. Catalogo de
exposicao.
LOBATO, Monteiro. Viagem ao Ceo: Sao Paulo: Brasi liense, 1995.
MARCOLIN, N. Cinema exibido. Pesquisa Fapesp Online, 2009.
MILO, Danie l. Les Classiques scolaires. In: Pie rre Nora (org.). Les lieux des
memoires Paris: Quarto/Gall imard, 1997.
PEREZ, Ariel. J u le s V e rn e: pai dafi . .q:ao cientifica? Mundo Verne, 1. 8·11,2007.
Disponivel em http://jv.gilead.org.il/Mundo Verne/MV1p.pdf.Acessado em
10102/2010.
RYU , J. H . Reality & effict: a cultural history of visual efficts. College of Arts
and Sciences : Georgia State Universi ty , 2007.
SERRES, Michel. jul io Verne: a c ienc ia e 0 homem contemportineo (dialogos
corn jean-Paul Dekiss). Rio de .T aneiro: Ber trand Brasi l, 2007.
Referencias Bibliognijicas
ARAlno, 1 . Me li es . In: A. Labaki (ed.). Folha conta 100 anos de cinema:
e n so i os , r e se nh as , entrevistas. Rio de Janeiro : Imago , 1995.
BARBOSA, S. K. Breve analise cia hist6ria do cinema do comeco do seculo
XX. Itaoessia. 1: 9, 2007.
RENSBERGER, Boyce. Urn grande salto para lugar nenhum. Caderno MAIS.
Folha de S. Paulo. Domingo, 19/07/2009.
BRAKE, Mark &HOOK, Neil. Rocketry, f ilm and fiction: the road toSputnik.
Physics Education, special feature: Space Flight, 42 (4), pp. 345-350, jul.
2007.
COSTA, R .. Os olhos e 0 cinema. Mimesis e onomatopeia, BOCC/Biblioteca
Online de Cienc ias da Comunicacao, 1997.
66 67
5/14/2018 Factum e Fatum:a ci ncia aos olhos de Julio Verne e Georges M li s - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/factum-e-fatuma-ciencia-aos-olhos-de-julio-verne-e-georges-melies 8/8
Factum efaium: a ciencia aos olhos de Jul io Verne e Georges Melles
FICHA TECNICA
Viagem it Lua
Le Voyage Dans La Lune, Franca, 1902, Ficyao Cientifica, 14 min.
PHODU(,Ao: Star Films
D IHE <, :AO , ROTE IRO E ED I < ,:A o :Georges Melies
FOTOGHAF ' JA : Michaut e Lucien Tainguy
D IRE <, :AO DE ARTE : ClaudelF IGUR INO: Jeanne d'Alcy
ESTRE IA : 4 de Outubro de 1902
F OR MA T OS I D U RA < ,: AO : 14 min (16 fps) ou 8 min (25 fps)
ELENCO : Bleuette Bernon (mulher na Lua), Brunnet, Farjaut, Kelm (astr6nomos),
Henri Delannoy (capitao do foguete), Georges Melies (prof. Barbenfouillis),
entre outros.
(IMDb, the Internet Movie Database, http: / /www.imdb.com). 0 filrne esta dis-
ponivel no Youtube: http://www.youtube.com/watch?v=7Kpnb13tn58
68
Top Related