FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS,
ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA
FACEF
AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO CONTEXTO
ECONÔMICO E SOCIAL DA REGIÃO DE FRANCA
MÁRIO FRANCISCO CHAGAS
FACEF
2000
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS,
ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS DE FRANCA
FACEF
AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO CONTEXTO
ECONÔMICO E SOCIAL DA REGIÃO DE FRANCA
MÁRIO FRANCISCO CHAGAS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, para obtenção de título de Mestre em Administração, área de concentração Gestão Empresarial, sob orientação do Prof. Dr. Orís de Oliveira
FACEF
2000
CHAGAS, Mário Francisco As cooperativas de trabalho no contexto econômico e social da região de Franca / Mário Francisco Chagas // Franca: 2000. 123 p. il. Orientador: Dr. Orís de Oliveira Dissertação de Mestrado – FACEF Programa de Mestrado em Gestão Empresarial. 1. Administração de empresas. 2. Cooperativismo de trabalho – Franca SP. 3. Terceirização. 4. Custos. I.T.
CDD 658.1147
Data: ___/___/___
Banca Examinadora Prof. Dr. Orís de Oliveira Prof. Dr._______________________________________________________ Prof. Dr._______________________________________________________
Este trabalho é dedicado à minha família.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, pela graça e misericórdia com que tem me distinguido, apesar de
mim mesmo. A SUA presença eu senti, principalmente nos momentos das maiores
dificuldades. Perdão SENHOR, por todos os meus desacertos.
Aos meus pais, ANTÔNIO e ANNA, porque além da vida e do amor,
herdei de vocês o respeito pelas outras pessoas, mesmo que não as entenda. Admiro-vos
pela perseverança e espírito de luta. Amo vocês!
A minha esposa LUCY, pelo amor, pela presença, incentivo, cuidado e
compreensão dedicados a mim nesses anos todos. Você deu nova dimensão à palavra
companheira. Amo você.
Aos meus filhos, EDUARDO HENRIQUE e FELIPE AUGUSTO, pelo
carinho e por compreenderem a minha constante ausência no lar. Tenho certeza que valeu
a pena... Amo vocês!
Aos meus irmãos. Vocês sempre estiveram comigo e são grandes
camaradas. À minha maneira, eu vos amo.
Ao Prof. Dr. ORÍS DE OLIVEIRA, meu orientador e fonte de muito saber.
Pela atenção, incentivo e confiança. Meu respeito e gratidão eternos.
E, ainda, a todos aqueles que, sabendo-o ou não, colaboraram na realização
deste trabalho.
Dar aos homens livres fé e conhecimento, criar e fortificar seu sentimento de
liberdade e de igualdade pelo conhecimento viril de suas responsabilidades, eis as
primeiras tarefas da educação cooperativa. Tarefas necessárias, mas ainda não
suficientes; Walter Scott relata que, um dia, tendo de utilizar os serviços de um
barqueiro, observou que a palavra ‘Fé’ estava escrita sobre um dos remos e a
palavra ‘Trabalho’ sobre o outro. Solicitado a dar uma explicação, o homem pôs-
se a manobrar vigorosamente o remo que se chamava ‘Fé’ e o barco começou a
girar sem cessar sobre si mesmo. ‘Vêde, agora, disse o barqueiro, que se meu
barco caminha é porque eu utilizo ao mesmo tempo ‘Trabalho’ e ‘Fé’.
O mesmo sucede com o barco cooperativo... Maurice Colombain
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................... 14
CAPÍTULO 1 – UM POUCO DA HISTÓRIA DO COOPERATIVISMO........................ 18
1.1 Considerações iniciais ............................................................................................... 18
1.2 Estrutura do trabalho ................................................................................................. 19
CAPÍTULO 2 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO BRASIL........................... 21
2.1 Conceituação ............................................................................................................. 21
2.2 Cooperativismo: gênese e evolução .......................................................................... 22
CAPÍTULO 3 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NA REGIÃO DE FRANCA .. 36
3.1 Cooperativismo no Brasil .......................................................................................... 36
CAPÍTULO 4 – AS TERCEIRIZAÇÕES E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO..... 44
4.1 As Cooperativas de Trabalho e a terceirização na região de Franca ......................... 44
CAPÍTULO 5 – AS COOPERATIVAS DE TRABALHO E A REDUÇÃO DE
CUSTOS DE PRODUÇÃO ................................................................................................ 72
5.1 As Cooperativas de Trabalho realmente proporcionam redução de custos para as
empresas?......................................................................................................................... 72
5.2 Mas afinal, o que são as pseudoperativas? ................................................................ 94
5.3 Qual a efetiva participação das Cooperativas de Trabalho na Terceirização? ......... 97
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 116
BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 120
SUMÁRIO DAS TABELAS
Tabela 1: Quanto Custa o Empregado 57
Tabela 2: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho 58
Tabela 3: Análise Comparativa de Encargos Empresa X Cooperativa de Trabalho 101
Tabela 4: Obrigações Empresário X Cooperado 103
Tabela 5: Relação de Incidência de Impostos Empresas X Cooperativas 105
Tabela 6 – Determinação do Fator K 108
Tabela 7: Componentes do Preço de Venda 109
Tabela 8: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho 112
Tabela 9: Cálculo de Valor de Serviço com Mão- de- Obra Própria 113
Tabela 10: Cálculo de Valor de Serviço com Mão-de-Obra Cooperativada 114
SUMÁRIO DOS QUADROS
Quadro 1: Características de cada forma de Terceirização ................................................ 52
Quadro 2: Relação Entre Empregado e Cooperado I....................................................... 104
Quadro 3: Relação Entre Empregado e Cooperado II...................................................... 104
RESUMO O advento de novas tecnologias, aliado à globalização mundial da economia, tem, por um
lado, permitido que muito mais pessoas em todo o mundo, tenham acesso a bens de
consumo que, até então, eram impensáveis. Por outro, tem ocasionado a extinção de postos
de trabalho em todas as áreas. Estes postos de trabalho nem sempre são reabsorvidos pela
economia. Assim, o mundo de maneira geral e o Brasil, em particular, tem experimentado
uma crise de empregos sem precedentes em toda história. O Brasil, premido por
circunstâncias políticas e dirigido, por mais de vinte anos, por governantes que
acreditavam que a reserva de mercado era fator de desenvolvimento interno, além de uma
inflação mensal que, não raro, aproximava-se dos três dígitos, demorou-se mais que os
países com maior grau de desenvolvimento para reagir e, só agora, esforça-se por
acompanhar o ritmo da economia mundial. Necessitando produzir com qualidade e custos
baixos, muitas empresas brasileiras perceberam que, na terceirização, estava a grande
possibilidade da realização desse mister, e, após várias tentativas para conseguir o menor
custo de produção, têm encontrado no cooperativismo de trabalho, uma forma de atingir
esses objetivos. O momento ainda é de transição, no que diz respeito ao ordenamento
jurídico desse relacionamento. Costumes arraigados há muitos anos e uma legislação
trabalhista que, na maioria das vezes, atribui muitos direitos aos trabalhadores, além de
sindicatos que temem perder representatividade e arrecadação, tem feito com que a
implantação do cooperativismo de trabalho, em nosso país, caminhe a passos muito lentos,
além do fato de grande parte do empresariado nacional ainda temer esse tipo de
contratação. Mas, mesmo de forma sutil, as Cooperativas de Trabalho se têm feito presente
em nossa economia, contribuindo para que as empresas que se utilizam de seus serviços
consigam atingir os seus objetivos e se mantenham competitivas nos mercados internos e
externos. Além desse fato, por si só muito importante, as Cooperativas de Trabalho, nas
suas mais variadas formas de atividades e especialidades, têm se apresentado como
alternativa de trabalho e emprego para um número sempre crescente de trabalhadores que
perderam seus postos de trabalho com carteira assinada e que encontram nessas empresas,
a forma de subsistirem e prosperarem. Cabe agora à legislação brasileira se adequar a estes
novos tempos, tornando-se mais flexível a esta realidade e proporcionando uma redução
dos custos do emprego, seja ele representado pelo trabalho formal tradicional, ou seja ele
representado pelo trabalho realizado pelas sociedades cooperativas, como forma de auxiliar
no processo de crescimento e desenvolvimento do nosso país.
ABSTRACT
The advent of new technologies, in alliance with worldwide economical globalisation, has
been permitting many more people around the world to access consumer goods than it was
thinkable, up to now. On the other hand, it has been causing the extinction of workstations
in all areas. These are not always reabsorbed by the economy. Thus, the world, in a general
manner, and Brazil, particularly, is going through an employment crisis without precedents
in the whole of History. Brazil, pressed by political circumstances and for more than
twenty years, managed by governors who believed that market reserves were an internal
development factor, besides a monthly inflation that, not rarely, surpassed three digits, took
longer than other, more developed countries to react, and now, has to strive in order to
follow the rhythm of world-wide economy. Needing to produce with quality and low costs,
many Brazilian companies realised that putting third parties in charge of production was
the great possibility of accomplishing this task. And, after many attempts to get to the
lowest production costs, they have been finding in labour cooperatives a way of reaching
these goals. It’s still a moment of transition in the juridical organisation part of this
relationship. Decade-old, deep-rooted customs plus a labour legislation which, in most
times, grants too many rights to the workers, and syndicates fearing to lose their “workers’
representative” position and income, are all making the installation of labour cooperatives
very slow; besides, most of the national businessmen are still apprehensive about this form
of contracting. However, even if in a subtle manner, the labour cooperatives are making
themselves present in our economy; helping the companies which employ their services to
accomplish their objectives and keeping themselves competitive in internal and external
markets. Beyond this fact, already very important alone, those cooperatives, in their most
diverse forms of activities and specialities, are presenting themselves as a working
alternative for an always growing number of workers who have lost their registered jobs
and find, in those enterprises, a way of subsisting and prospering. Now it’s up to Brazilian
legislation to adjust itself for this new time, becoming more flexible to reality, causing
employing costs to decrease for registered, traditional employment, and for the one
performed by labour cooperatives as well, in order to help in the growth and development
of our country.
RESUMEN El advenimiento de nuevas tecnologías, aliado a la globalización mundial de la economía,
por una parte, ha permitido que mucho más personas en todo el mundo, tengan acceso a
bienes de consumo que, hasta entonces, eran indispensables. Por otra parte, ha ocasionado
la extinción de puestos de trabajo en todas las áreas. Estos puestos de trabajo ni siempre
son reabsorbidos por la economía. Así, el mundo de forma general y Brasil, en particular,
tiene experimentado una crisis de empleos sin precedentes en toda la historia. Brasil,
llevado por circunstancias políticas y conducido, por más de veinte años, por gobiernos
que creían que la reserva de mercado era factor de desarrollo interno, además de una
inflación mensual que, no raro, se aproximaba de los tres dígitos, se tardó más que los
países con mayor grado de desarrollo para reaccionar y, solamente ahora, se esfuerza por
acompañar el rítmo de la economía mundial. Necesitando producir con calidad y bajos
costos, muchas empresas brasileñas notaron que, en la tercerización, estaba la gran
posibilidad de la realización de ese mister, y, tras varios intentos para lograr menor costo
de producción, ha encontrado en el cooperativismo de trabajo, una forma de alcanzar esos
objetivos. El momento aún es de transición, con respecto al ordenamento jurídico de ese
relacionamiento. Costumbres arraigadas hace muchos años y una legislación de trabajo
que, en la mayoría de las veces, atribuye muchos derechos a los trabajadores, además de
sindicatos que temen perder representatividad y arrecaudación, ha hecho con que la
implantación del cooperativismo de trabajo, en nuestro país, camine a pasos muy lentos,
además del hecho de gran parte del empresariado nacional todavía tema ese tipo de
contratación. Pero, aunque de forma sutil, las cooperativas de Trabajo se hace presente en
nuestra economía, contribuyendo para que las empresas que se utilizan de sus servicios
consigan alcanzar sus objetivos y se mantengan competitivas en los mercados internos y
externos. Además de ese hecho, por sí sólo muy importante, las Cooperativas de Trabajo,
en sus más diversas formas de actividades y especialidades, tiene presentado como
alternativa de trabajo y empleo para un número siempre creciente de trabajadores que
perdieron sus puestos de trabajo con contrato firmado y que se encuentran en esas
empresas, la forma de que subsistan y que prosperen. Cabe en ese momento a la legislación
brasileña adecuarse a esos nuevos tiempos, volviéndose más flexible a esa realidad y
proporcionando una reducción de los costos del empleo, sea representado por el trabajo
formal tradicional, o por el trabajo realizado por las sociedades cooperativas, como forma
de auxiliar en el proceso de crecimiento y desarrollo de nuestro país.
INTRODUÇÃO
Limiar do século XXI. O Brasil procura acertar o passo na dança da
economia globalizada, uma vez que se move completamente fora do compasso. A palavra
de ordem é redução dos custos de produção com melhoria sempre crescente da qualidade
dos produtos. Os consumidores passaram de simples figurantes, meros utilizadores das
mercadorias rotuladas de indústria brasileira, premidos que eram pela reserva de mercado
aos produtos nacionais, para os papéis de atores principais, ou de sua alteza, o
consumidor, agora comparados a quaisquer cidadãos de primeira classe, podendo adquirir
bens e serviços made in the world, ou fabricados em qualquer parte do mundo, como se
estes fossem produzidos em suas próprias cidades e que o parque produtivo mundial fosse
apenas uma indústria que ficasse próxima de seu bairro.
Naturalmente isso não se deu em um passe de mágica. As empresas
nacionais que não investiam há dezenas de anos na modernização de seus equipamentos
ficaram, algumas momentaneamente, outras de forma definitiva, completamente fora do
mercado, uma vez que não dispunham de tecnologia própria para competirem com as
similares importadas.
Após experimentar todo tipo de modernidade teórica, ditadas pelos papas da
auto-ajuda às empresas, representada pelos consultores, arautos da reengenharia
empresarial, neurolingüísticas e outros tantos, que com suas formulas milagrosas apenas
acordaram o Brasil para a necessidade de investirem em tecnologia, modernização de seu
parque industrial e requalificação de pessoal, com conseqüente eliminação de postos de
trabalho, o empresariado nacional viu-se em face, além disso, da necessidade de, também,
reduzir o custo com o seu pessoal produtivo.
Na busca de uma solução para o seu alto custo de produção, aqui, na
maioria das vezes, representado pelo custo dos encargos sociais e tributários, o Brasil
conheceu a terceirização, quando, geralmente, ex-empregados constituíam suas empresas
de prestação de serviços e iam prestar serviços, agora na forma de pequenos ou micro
empresários, aos seus antigos empregadores. A terceirização veio a ser a mãe da
quarterização, como define Queiroz1:
Genericamente e simplesmente intitulada
‘quarterização’, é quando o fornecedor de serviços
terceirizado, seja ele prestador, vendedor ou profissional
autônomo ou ainda uma empresa, terceiriza algumas das
atividades em benefícios de seu tomador. Isso acontece
quando ocorre a contratação de ‘outros’ terceiros, que
passam a fornecer ou executar serviços para, ou, nas
instalações de um determinado tomador, o qual já tem sob
contratação, um terceiro, que contrata e assume a
responsabilidade pela ‘quarterização’.
Essa fórmula tem dado certo até um certo ponto, uma vez que ao
terceirizado ou quarterizado é repassado o ônus do custo dos encargos sociais e tributários
e estes, naturalmente, os repassam aos seus tomadores.
Na busca pela solução desse problema, chegamos aos serviços prestados
pelas Cooperativas de Trabalho, que, com suas isenções legais tributárias, têm se
apresentado como uma alternativa capaz de suprir as necessidades das empresas, de
produzir com qualidade por um custo compatível com o mercado de economia globalizada.
É nesse momento que iniciamos o desenvolvimento de nosso trabalho, que
envolveu, além das pesquisas bibliográficas julgadas necessárias, também pesquisas de
campo, embora empíricas, envolvendo as empresas tomadoras de serviços de Cooperativas
de Trabalho bem como as mesmas e seus Cooperados, numa tentativa de entender como se
desenvolve esse relacionamento, tanto no âmbito das empresas tomadoras quanto no
âmbito das empresas prestadoras de serviços, além de um enfoque nos próprios
cooperados.
O que desperta o nosso interesse pela pesquisa deste assunto são,
especificamente, as Cooperativas de Trabalho. O que nos motiva é saber quanto o advento
dessa modalidade de cooperativismo veio efetivamente trazer de economia de custos para
as empresas utilizadoras de mão-de-obra cooperativada e quanto de alternativas de trabalho
e emprego ela oferece para uma legião de trabalhadores que tiveram e tem tido os seus
1 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de; Manual de Terceirização, São Paulo: Ed. STS, 1995, p.164.
postos de trabalhos extintos pelo advento de novas tecnologias e sistemas de produção.
Importa-nos saber qual o comportamento dessas empresas socioeconômicas quando
chamadas a participarem do processo produtivo, mesmo que em escala reduzida à região
que nos propusemos pesquisar e estudar.
Chama-nos a atenção, também, o comportamento e a formação cooperativa
desses novos homens, como são chamados os novos convertidos ao cooperativismo.
Interessa-nos saber suas atitudes e seus pensamentos, enfocando a situação de trabalhador
cooperante, ou seja, a perspectiva de ser o próprio patrão e operando coletivamente. Estará
ele preparado psicologicamente para essa nova fase da vida ou, como os judeus do Êxodo,
sonham com as panelas de carne dos egípcios, representadas pelo postos de trabalho com
carteiras assinadas? Sobre este assunto, certamente, iremos falar adiante e faz parte da
pesquisa que levamos a efeito junto a cooperadores da indústria da construção civil e da
indústria calçadista.
Desenvolvemos nosso trabalho confiados na integridade moral dos
trabalhadores cooperados e seus dirigentes. A todos consideramos probos. Motiva-nos,
sim, saber se as Cooperativas de Trabalho são verdadeiramente geradoras de alternativas
de postos de trabalho e não se, também e apenas e tão somente, elas estão servindo aos
interesses nem sempre claros daqueles que, de uma ou de outra forma, querem se
beneficiar das benesses governamentais com que as cooperativas são, do nosso ponto de
vista, merecedoras. Não pregamos e nem estimulamos o conflito. Não obstante, fazemos
menção a opiniões de pessoas contrárias ao cooperativismo de trabalho, respeitando-lhes
os seus pontos-de-vista.
Acessoriamente objetivamos verificar como elas têm contribuído na criação
de novos postos de trabalho em substituição aos que têm sido extintos nas empresas.
Procuramos ajudar as pessoas que vierem a ter contato com este trabalho a
se situarem no seu contexto e compreenderem a lógica de sua organização. Procuramos
mostrar, ainda, como as atividades de uma Cooperativa de Trabalho, às vezes, se
justapõem e complementam as atividades de uma empresa normal, que não uma sociedade
cooperativa. Não obstante, sempre que possível, buscamos situar o leitor dentro da nossa
lógica de condução do trabalho.
No desenvolvimento de nosso trabalho, a pesquisa bibliográfica transcorreu,
de certa forma, tranqüila, uma vez que a maioria dos historiadores do cooperativismo
bebem da mesma fonte de pesquisa. O mesmo não pode ser dito das pesquisas de campo,
que demandou entendimentos e trabalhos de convencimento das pessoas envolvidas com a
direção das cooperativas, bem como dos cooperados, que, de maneira geral, num primeiro
momento, se mostraram reticentes quanto a falar de suas atividades. Ao desenrolar das
atividades, no entanto, eles se mostraram bastante comunicativos e não se furtaram, em
geral, de responder as perguntas formuladas.
A pesquisa de campo se desenvolveu, num primeiro momento, com um
trabalho de contato com as Cooperativas de Trabalho e a descoberta de seus tomadores de
serviço. Num segundo momento, desenvolvemos os questionários, tanto das Cooperativas
quanto dos tomadores e, posteriormente, ao passo que recolhíamos os questionários,
complementávamos nosso trabalho com perguntas adicionais e ou colocações que os
mesmos faziam por ocasião do recolhimento dos materiais.
Entendemos que a hipótese formulada, quer seja, a economia de custos
realizada e o comportamento das empresas tomadoras e prestadoras desse serviços foram
contempladas e satisfeitas no seu desenvolvimento.
Enfim, apresentamos nossas conclusões parciais ao fecho de cada capítulo
na tentativa de demonstrar que os nossos objetivos se coadunam com o nosso esforço
metodológico.
CAPÍTULO 1 UM POUCO DA HISTÓRIA DO COOPERATIVISMO
1.1 Considerações iniciais
As Sociedades Cooperativas, nas suas mais variadas formas de apresentação
e exploração de atividades econômicas, têm se defrontado, no Brasil, de maneira geral,
com seus detratores, com aqueles que, por não se identificarem com sua filosofia ou por
não verem a possibilidade de muitos ganharem um pouco mais, com poucos ganhando
menos, uma forma de se praticar justiça social neste país, ou mesmo por má fé, atendendo
a interesses escusos de determinados segmentos de atividades, distorcem a imagem do
cooperativismo, procurando mostrar essas entidades como subterfúgios de más intenções.
Porém, para aqueles que, com seriedade e retidão de propósitos, vivem ou
estudam o cooperativismo, nele conseguem enxergar uma verdadeira fonte de inspiração
ao bem viver, ao compartilhar, ao responsabilizar pelo todo e pelo que seja comum. No
momento em que o homem consegue deixar de lado o seu eu, para pensar e viver
coletivamente, no exercício da cooperação pura e simples, na medida que a força
manipuladora e individualista do capital, que a muitos tem feito se desviarem de seus
propósitos é subjugada em benefício do coletivo, o homem passa a viver o cooperativismo
em sua forma mais pura.
Entendemos ser importante observar que não vemos o capital como um mal
em si mesmo. O capital é necessário nos nossos dias, aliás, como em todos os outros dias
antes dos nossos, como necessário o são o ar que respiramos, a água que bebemos ou o
alimento que diariamente ingerimos. Nem é nosso propósito fazer digressões sobre o
capital. Apenas o vemos como mola propulsora do mundo a catapultar, na maioria das
vezes, interesses individuais ou de grupos bem organizados e articulados, sobre interesses
coletivos. E como falar sobre cooperativismo sem falar sobre capital é praticamente
impossível, deixamos aqui nossa impressão sobre o mesmo. Aliás, é bom que se frise, a
primeira cooperativa nasceu após um ano inteiro de economia, para se formar o capital
necessário para a sua constituição e abertura, que fizeram um grupo de vinte e oito tecelões
na temporalmente distante (1844) Manchester, no bairro de Rochdale, distrito de
Lancashire, Inglaterra, batizada com o nome de Rochdale Equitable Pioneers/Society
Limited., ou Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale.
Certamente, aquelas pessoas, por mais que acreditassem em seus propósitos,
jamais poderiam vislumbrar a importância que teriam para a economia mundial no decorrer
dos séculos, podemos assim dizer, o advento do cooperativismo. O que fora idealizado
apenas com a pretensão de oferecer aos seus associados artigos básicos de primeira
necessidade e serviços outros de natureza econômico-social, veio a se transformar na boa
semente do cooperativismo. Mas, sobre isto, discutiremos no decorrer deste trabalho.
1.2 Estrutura do trabalho
Em decorrência dos objetivos que apresentamos, entendemos ser importante
separar este trabalho em cinco capítulos. Os capítulos 2 e 3 estão baseados na revisão da
literatura, quando procuramos, numa visitação histórica, entender as perspectivas das
primeiras pessoas que, voluntária ou involuntariamente, viriam provocar transformações de
vida e procedimentos de milhões de outras pessoas ao longo dos séculos.
O capítulo 4 é resultante de pesquisa e trabalho de campo, onde
apresentamos as cooperativas da região de Franca que atuam no segmento trabalho bem
como empresas que se utilizam da mão-de-obra oferecidas por estas entidades, além de
abordarmos certos aspectos relativos à terceirização da mão-de-obra. No desenvolvimento
dessas pesquisas, foi-nos reconfortante saber que muitas pessoas, mesmos que restritas ao
universo de nossa pesquisa, ainda sonham com aquele cooperativismo de princípios,
norteados na moral e na retidão de propósitos humanos.
No capítulo 5, abordamos, além do aspecto da terceirização e a atuação das
Cooperativas de Trabalho, com vistas a apresentar a redução de custos acarretada pelas
empresas que se utilizam das cooperativas dessa modalidade, os resultados das pesquisas
empíricas, embora de campo, levadas a efeito, bem como falamos a respeito das falsas
cooperativas que atuam no mercado.
Concluímos este trabalho fazendo uma reflexão final sobre as possíveis
contribuições gerais e específicas que o mesmo pode oferecer, esperando ter, de alguma
forma, realizado alguma contribuição àqueles que se interessarem pelo tema.
CAPÍTULO 2 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NO BRASIL
2.1 Conceituação
É certo que dificilmente conseguiríamos encontrar palavras que fossem
suficientes para descrever ou para definir o cooperativismo. Ousaríamos dizer que o
cooperativismo, pela sua face eminentemente prática, é a materialização da força na
fraqueza, é a riqueza que nasce da pobreza, é o fazer existir muito a partir do quase nada. É
a materialização da vontade. É a força da fé. É, sobretudo, a filosofia dando lugar à pratica.
Ou, quem sabe, é a coexistência nem sempre harmônica e nem sempre pacífica entre estas
duas grandes forças: filosofia cooperativista x prática do cooperativismo. Esta dificuldade
em definir o cooperativismo, ao invés de se apresentar como um problema, na verdade,
mostra a riqueza do tema em questão. Porém, como este trabalho não tem a pretensão ou a
preocupação de delimitar conceitos e tampouco definições últimas sobre cooperativas e
cooperativismo, vamos nos valer de conceitos preestabelecidos de autores consagrados, do
nosso ponto de vista, no conhecimento das filosofias e práticas cooperativistas.
Para dar continuidade ao relato histórico do cooperativismo e suas
evoluções, buscamos a definição conceitual do termo, entendendo-o suficiente para as
proposições desse trabalho:
Cooperativismo2: - Doutrina que tem por objetivo a
solução dos problemas sociais por meio da criação de
comunidades de cooperação. Essas comunidades seriam
formadas por indivíduos livres, que se encarregariam da
gestão da produção e participariam igualitariamente dos
bens produzidos em comum. Sua realização prática prevê
a criação de Cooperativas de Produção, Consumo e
Crédito.
2SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia, 1987.
O cooperativismo atual representa uma alternativa
entre o capitalismo e o socialismo, mas sua origem está
nas propostas dos chamados socialistas utópicos (...).
Mais tarde, em lugar de conteúdo socialista, a
cooperativa adquiriu características mais atenuadas de
reforma social, nas formulações de Beatrice Potter Webb,
Luigi Luzzatti e Charles Gide.
Ou de outro modo: grupo de pessoas que trabalham em comum, sem
objetivo de lucro, e não sujeitas à falência.
2.2 Cooperativismo: gênese e evolução
Para introduzir o leitor neste trabalho, que tem como tema o cooperativismo
no contexto socioeconômico da região de Franca, é inevitável remeter-nos ao vocábulo que
origina o termo cooperativismo; - cooperação – termo que a literatura pertinente confirma
a existência nas sociedades humanas desde eras remotas. Significando necessidade e meio
de sobrevivência para aqueles que, trabalhando reciprocamente, socializando idéias
individuais, esforçam-se continuamente para que ações coletivas configurem meios
capazes de alcançar propósitos e objetivos.
A concepção dada ao vocábulo cooperação não é prática dos nossos dias.
Cooperar e colaborar têm o mesmo significado3.
Quando revisitamos a história, identificamos manifestações do espírito de
cooperação vinculadas à condição humana.
3Cooperar: operar ou obrar simultaneamente: trabalhar em comum: colaborar. In FERREIRA, Aurélio
Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. p 177.
Em tempos e espaços diferentes, a cooperação sempre existiu nas
sociedades humanas como resultante de necessidades de sobrevivência, configurada como
agrupamento de pessoas que, trabalhando reciprocamente, consensuando idéias e agindo
num esforço coletivo e continuado, realizam seus objetivos.
A dinâmica da vida indígena, nos primórdios do nosso país, revela a prática
de dormitórios comuns e a caça – resultado de ação participativa – transforma-se em
alimentação para a tribo, é exemplo de cooperação mútua. Instigados pela lei da
sobrevivência, a tribo era mantida e evoluía na direção almejada por eles, que unidos,
partícipes, cooperadores entre si, definiam o modo de vida da raça indígena.
Outro exemplo pleno do sentimento de cooperação pode ser observado nas
tréguas nos campos de batalha, quando o soldado solícito se apressa em socorrer o
companheiro ferido em combate.
Assim, pode-se aferir que o sentimento de cooperação é próprio do humano
e se desenvolve no curso dos séculos da existência social consciente da humanidade,
sedimentado pelos milhares de anos de existência, penetrando indelevelmente no domínio
da vida econômica.
Em Benato4, as formas de associações econômicas estruturadas podem ter
inspirado as modernas cooperativas. Tiveram suas origens na antigüidade: os babilônios
teriam organizado associações de arrendamento de terras; os primeiros cristãos, com seus
ágapes, criaram uma forma primitiva de cooperativa de consumidores; os gregos e
romanos instituíram sociedades funerárias e de seguros para os pequenos artesãos sobre a
base de auxílio mútuo: “As organizações econômicas de mosteiros, onde a produção e o
consumo eram comuns, o que economicamente é caracterizado em uma espécie de
cooperativa, foram criadas na Idade Média pelos povos cristãos.”
Na agricultura, o labor se desenvolveu desde os primórdios, fundamentado
pelos preceitos cooperativos praticados pelos povos germânicos. A economia coletiva, o
espaço e a aplicação do espírito coletivo de associação podem ter sua origem no modo de
criação comum do gado, da utilização comunitária das pastagens, da floresta e do grupo de
pescadores organizados em associações de trabalho, nos moldes daquelas existentes nos
dias de hoje, e em vários países. Segundo o autor, foram descobertos vestígios de
camponeses agrupados, trabalhando na transformação do leite desde o princípio da Idade
Média nos Alpes suíços, italianos, franceses, bem como na Inglaterra. Na Armênia, uma
forma de leiteira cooperativa, que teve origens nos tempos pré-históricos, funciona ainda
hoje.
Assim, é possível depreender que os modelos de cooperativas modernas
podem representar resultado das experiências implementadas por cooperações antigas,
apenas com formas e objetos modificados para atender às necessidades da vida moderna,
contextualizados nos meios de produção capitalista que obrigam o trabalhador a se unir
para enfrentar problemas de mercado.
O marco histórico do movimento cooperativista formal data de 28 de
outubro de 1844, em Rochdale, Inglaterra, quando 27 homens e 1 mulher constituíram a
cooperativa denominada Rochdale Equitable Pioneers Society Limited. Cada cooperado
contribuiu com £ 1 (uma libra), e com esse capital abriram um armazém para fornecimento
dos alimentos. Calcularam que comprando em quantidades maiores, pagariam mais barato,
podendo assim fazer economia e não depender de outros armazéns que cobravam-lhes
muito caro.
A partir do exemplo de Rochdale, outros tipos de cooperativas começaram a
surgir pelo mundo. A título de ilustração, elencamos alguns exemplos, situados
temporalmente5:
1817 – William King organiza a primeira cooperativa de
consumo;
1820 – Organizada a Liga para a Propaganda da
Cooperação;
1830 – Contabilizado um total de 300 cooperativas:
1834 – Criada a Associação Lionesa An Commerce
Veridique, em Lyon - França;
1844 – Advento das primeiras cooperativas de crédito, na
cidade de Delitzsch;
1847 – 1848 – Aparecem as Reiffei seneanas –
Cooperativas de Crédito;
1864 – Criadas as Cooperativas de Crédito, denominadas
Bancos Populares, na Itália;
4 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 121. 5 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 121 et seq.
1883 – Wilhelm Haas funde as cooperativas de Reiffeisen-
Schulze/Delitzsch, na Alemanha.
A partir de 1883, outros pioneiros formaram outras cooperativas:
Lammenais, Buchez, Saint Simon, Fourier, Helleputte, são alguns deles.
No Brasil, a primeira cooperativa registrada oficialmente surgiu em 1891,
na cidade de Limeira, São Paulo – A Cooperativa dos Empregados da Companhia
Telefônica.
1894 – Criada a Cooperativa Militar de consumo no
Distrito Federal;
1895 – Criada a Cooperativa de Consumo de Camaragibe;
1897 – Criada a Cooperativa dos Empregados da
Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em Campinas,
São Paulo;
1932 – Primeira Lei Orgânica do Cooperativismo,
regulamentada pelo decreto n.º 22.239, de 19 de
dezembro;
1946 – Somam 810 mil cooperativas no mundo, reunindo
140 milhões de associados;
1962 – Cerca de 1/3 da população mundial estava
associada em cooperativas.
No Brasil, o cooperativismo começa a ser imprimido, principalmente, no
meio rural no final do século XIX. Os imigrantes alemães, italianos e japoneses que
ocuparam as regiões sul e sudeste do país contribuíram sobremaneira na consolidação do
cooperativismo por aqui.
Hoje, no Brasil, a prática cooperativista é regulamentada por leis especiais e
subordinada à Secretaria Nacional de Cooperativismo – Senacoop – órgão do Ministério da
Agricultura.
Em âmbito mundial, a entidade que coordena o movimento cooperativista é
a Aliança Cooperativa Internacional (ACI), com sede na cidade de Genebra, Suíça. Essa
associação não-governamental foi criada em 1985, tem por objetivo reunir, representar e
apoiar as cooperativas e suas correspondentes organizações.
Objetiva, ainda, a integração, a autonomia e o desenvolvimento do
cooperativismo. A ACI, pela primeira vez na sua história, é comandada por um
cooperativista não europeu. O brasileiro Roberto Rodrigues foi o primeiro homem da
América Latina a ocupar tão importante cargo no sistema cooperativista.
No contexto do cooperativismo americano, essa representação é feita pela
Organização das Cooperativas da América - OCA – que, fundada em 1963, integra as
representações de vinte países, inclusive o Brasil.
A representação do sistema cooperativista brasileiro cabe à Organização das
Cooperativas Brasileiras. A OCB é o órgão máximo do cooperativismo nacional e sua
função é defender os interesses das cooperativas perante o Estado.
A centralidade temática desse trabalho, o cooperativismo, é caracterizada
pela complexidade e extensão. É tratada, na maioria das vezes, por estudiosos que se
prendem à preocupação em explicar o que a doutrina cooperativista defende; o porquê da
defesa; quais os instrumentos analíticos que usa; e a contribuição da prática cooperativista
na interpretação da realidade socioeconômica, numa perspectiva de correção ou mudança
dessa realidade, ainda é matéria escassa nas obras publicadas que tratam do tema.
Assim, contrapor estudos que observam, decompõem, analisam,
reconstroem e explicam a atividade cooperativa, é tarefa que demanda extensas pesquisas
bibliográficas, reconhecendo ser urgentes e necessárias para a compreensão do papel do
cooperativismo no contexto das diversas economias.
O ideal associativista é forjado no início do século passado, a partir das
tentativas da classe trabalhadora em se livrar das opressões estatal e empresarial, voltadas
para a resolução dos graves problemas socioeconômicos e inspirados pela corrente liberal
dos socialistas utópicos.
Nessa época, generalizou-se a tradição de liberdade propagada por
Descartes, acreditando-se na possibilidade da atuação da vontade humana sobre a evolução
econômica, de tal modo que se poderia corrigi-la ou reformá-la. Àquele tempo, o segmento
intelectualizado difundia os ideais de justiça e fraternidade, embora a esperança na volta à
natureza (metafísica), tenha qualificado uma corrente de diversos pensadores de oposição
aos ideais conseqüentes da Revolução Francesa. O socialismo utópico reflete, ainda, outras
correntes de pensamento da época: o romantismo, a democracia e o naturalismo.
Neste cenário intelectual, somado às mais variadas conseqüências do
liberalismo econômico do início do século XIX, emerge o cooperativismo, configurando a
utopia e o desejo da classe trabalhadora em superar a miséria pela atitude do auxílio mútuo.
Dentre os socialistas utópicos, que de forma decisiva influenciaram o
cooperativismo, podem-se destacar Owen, Fourier, Buchez e Blanc, conforme descrição da
professora Pinho6, a saber:
Owen considera que o homem é resultado de seu meio
social: não é bom, nem mau por natureza. Para modificá-
lo, torna-se necessário modificar o meio social, mas de
forma pacífica, gradual e moderada, a fim de que
nenhuma parte do corpo político e nenhum indivíduo
sofram com a mudança...
Robert Owen (1771-1858) – de família de artesãos,
nasceu em Newton (País de Gales). Encarregado de
dirigir uma fábrica de fiação, introduziu várias inovações,
destacando-se, de tal forma, que dela se tornou co-
proprietário (firma Charlton Twist Co, em Manchester).
Casou-se com a filha do sócio (Dale). Com a compra de
uma fiação em New Lanarck (Escócia), pela sociedade,
coube a Owen dirigi-la. Realizou tão importantes obra
sociais que New Lanarck tornou-se centro de visitação e
de admiração da Europa, mas seu exemplo não era
imitado. E Owen acabou deixando a sociedade porque
seus sócios achavam suas inovações muito onerosas.
Para Owen, o lucro e a concorrência são os principais responsáveis pelas
injustiças sociais. O lucro supera o preço de custo, nesse sentido, representa perigo
permanente e causa principal das crises de superprodução ou de subconsumo. Na sua
experiência singular, Owen implantou benefícios sociais para os trabalhadores, debateu a
grande questão da distribuição de rendas nas sociedades humanas e defendeu a educação
como meio da promoção do homem.
6 PINHO, Diva Benevides, O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,
1982. p. 23.
François Marie Charles Fourier7 (1772 – 1837) – nasceu
em Besançon (França), filho de um negociante de tecidos.
Perdeu a herança que recebera de seu pai, quando Lyon
foi cercada pelas tropas da Convenção. Condenado à
morte, livrou-se com a queda do regime. Engajou-se no
serviço militar, mas deu baixa por motivo de saúde,
passando a trabalhar em um escritório comercial. Depois
montou um escritório de corretagem. Mais tarde recebeu
herança materna, o que lhe permitiu dedicar-se, por uns
tempos, aos trabalhos intelectuais. Tentou arranjar
capitalista para financiar a prática de suas idéias
associativistas, mas nada conseguiu. Solteirão de hábitos
rígidos, foi mutas vezes interpretado como maníaco.
Parecia não se preocupar com os acontecimentos
políticos da França, dedicando todas as horas de lazer à
reflexão sobre os problemas econômicos e sociais de seu
tempo.
Fourier imagina resolver os males sociais através de
falanstérios, unidades auto-suficientes que permitiriam
reformar toda a sociedade (...) é a peça principal da
reforma do meio social: substituir a onerosa e mesquinha
unidade doméstica ou familiar por grandes serviços
coletivos, (...), cria um ambiente de convívio espontâneo
entre os ricos e pobres, substitui a competição pela
cooperação, institui um microcosmo auto suficiente, etc...
Em Fourier há uma inter-relação entre os interesses do trabalhador, do
capitalista e do consumidor, de forma que cada um possa acumular em sua pessoa, todos os
interesses diversos.
As normas buchezianas, fundamentadas na premissa da constituição de um
capital indivisível e individual da propriedade coletiva dos associados e da valorização
moral das sociedades, estão baseadas na tese defendida por outro importante socialista
7 PINHO, Diva Benevides. Op. Cit. p. 25.
utópico – Buchez – que defende a associação cooperativa de produtores livres, de forma
pacífica e sem exploração.
Philippe Joseph Benjamin Buchez8 (1796 – 1865) –
jovem ainda, foi condenado à morte por haver sido um
dos fundadores da “Charbonnerie”, na qualidade de
empregado da administração parisiense. Perdoado por ter
pouca idade, dedicou-se aos estudos de Medicina.
Profundamente católico, colaborador do jornal
sansimoniano “Producteur” (1824), autor da História da
Revolução francesa (co-autoria com Roux) foi também
membro e Presidente da Assembléia Francesa.
Fundamentalmente, as cooperativas representariam a reunião de operários
de uma determinada categoria para colocar em comum suas poupanças, obter empréstimos,
produzir em comum, assegurar a todos igual salário e reunir as receitas líquidas em um
fundo comum.
O associativismo de Buchez traz, como marco, o conceito de capital social
inalienável, o que, segundo ele, garantiria a criação de um futuro melhor para a classe
operária. As cooperativas poderiam contratar mão-de-obra de não sócios, pelo prazo de
um ano, e, no final desse período, ficariam obrigadas a admiti-los no quadro de sócios, na
medida do necessário.
Finalmente, Louis Blanc, pensador socialista que tratou da questão social
como sinônimo de questão operária, defendia a intervenção do Estado como condição
necessária para que a associação operária assumisse a condição de transformadora do meio
socioeconômico.
Louis Blanc9 (1812 – 1882) – historiador, jornalista,
orador e político (colocado em evidência pela Revolução
de 1848).
Alguns autores o qualificam de agitador, que
conduziu os operários à Revolução de 1848 e imprimiu à
“questão social” o matiz de questão operária – caráter
8 PINHO, Diva Benevides. Op.cit. p. 27. 9 PINHO, Diva Benevides. Op.cit. p.29
que muitos consideram unilateral, mas que se conserva
desde esse movimento revolucionário.
Exigia Blanc ampla intervenção do Estado, para
que a associação operária pudesse modificar o meio
sócio-econômico. Condenou a livre - concorrência,
principal responsável pelos males e injustiças sociais,
nociva aos operários e também à burguesia. A livre -
concorrência determinou a separação entre os detentores
dos instrumentos de produção e aqueles que acionam
esses instrumentos com o seu trabalho. Daí, a necessidade
de criação de associações em que cada um seria co-
proprietário dos instrumentos de produção: o atelier
social ou a oficina social, composta de trabalhadores do
mesmo ramo de produção e de moralidade indiscutível.
Blanc entendia ser a livre concorrência a principal responsável pelas
injustiças sociais, porque determina a separação entre os proprietários dos meios de
produção e aqueles que operam esses instrumentos através de sua força de trabalho. O
meio de equacionar esta questão seria a criação do “atelier social ou oficina social”,
empreendimento em que cada sócio se torna co-proprietário dos instrumentos de produção,
compostos por trabalhadores do mesmo ramo de produção e com os mesmos valores
morais.
Em dezembro de 1843, data em que os vinte e oito tecelões do distrito de
Lancashire, na Inglaterra, reuniram-se para discutir e procurar possíveis soluções para os
seus problemas de sobrevivência e acabaram decidindo pela fundação de um armazém
cooperativo, ficou conhecida como o marco histórico do movimento cooperativista e os
objetivos que estimularam a constituição da cooperativa dos tecelões de Rochdale
passaram, ao longo dos anos, a serem fundidos e sistematizados em um contexto de
doutrina social.
A história nos revela que o modelo de cooperativa de consumo de Rochdale
é entendido pelos estudiosos do cooperativismo como símbolo do cooperativismo,
inclusive, permanecendo, como normas, aquelas elaboradas pelos vinte e oito tecelões,
para muitas experiências do mundo moderno.
O prédio ocupado pelos pioneiros, espaço onde iniciaram suas operações
cooperativistas de consumo, passou a abrigar o Museu da Cooperação, desde 1931.
Na evolução do planejamento cooperativo, desde os primórdios, há uma
difusão maior de contribuições francesas e inglesas, quer na fase precursora, ou na fase de
consolidação do cooperativismo rochdaleano.
Os pensadores desses dois países preocuparam-se com estudos
especulativos e doutrinários, sobre o tema, até a primeira metade do século XIX. Mais
recentemente, autores alemães e escandinavos imprimem um cunho mais pragmático em
suas obras.
O pensamento cooperativo na sua evolução, apresenta grande influência da
Escola de Nimes, de acordo com Pinho (1982, p. 33):
Surgiu casualmente por volta de 1886, em Nimes, pequena cidade ao sul da
França, onde algumas pessoas se reuniam com Charles Gide, jovem professor
universitário de Economia e Política, para discutirem problemas econômicos.
Charles Gide formula a teoria fundamentada na idéia de um cooperativismo
que tem no homem o seu maior objetivo. Para ele, o homem não é apenas o trabalhador,
mas também o consumidor, portanto, o cooperativismo não é exclusivo de trabalhadores e
sim, um movimento para expandir-se e atingir todas as camadas sociais.
Em Gide10, a união de consumidores em cooperativas culminaria com a
absorção de todas as atividades econômicas em três etapas sucessivas:
Constituição de cooperativas de consumo para a
venda de produtos alimentícios, vestimentas, artigo do
lar, etc...;
Do consumo passar-se-ia à fabricação de todas as
mercadorias distribuídas pela cooperativa de
consumo;
Buscar a exploração agrícola como instrumento de
abastecimento às cooperativas de consumo.
10 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 21.
Verticalizando assim a economia, o pensador Gide vislumbrava a obtenção
do preço justo sem a interferência do lucro, do dividendo e da transferência de
propriedade, variantes responsáveis pelos altos custos do bem ou produto.
O jovem professor de Economia Política da Universidade da França,
Charles Gide, divulgou teses definitivas para o movimento cooperativista. Defendeu a
idéia de que as raízes do cooperativismo são devidas ao pensamento de Fourier; que o seu
objetivo era a abolição da luta de classes, pela via da supressão do salariado, dos
intermediários do comércio e dos padrões de produção.
O II Congresso das Cooperativas de Consumo, realizado em Lyon, na
França, em 1886, aprovou as “doze virtudes” da doutrina cooperativista, enumeradas por
Gide11:
1 – Viver melhor – condição possível se a solução dos
problemas é coletiva;
2– Pagar a dinheiro – para evitar o endividamento que
gera dependência;
3– Poupar sem sofrimento – é prioritário o atendimento
das necessidades dos cooperados, antes de definir
como aplicar as sobras;
4- Suprimir os parasitas – eliminando atravessadores na
compra e venda de produtos e serviços;
5– Combater o alcoolismo – preocupação com a saúde
dos cooperados, incentivando o enfrentamento da
realidade com coragem, evitando os vícios;
6– Integrar as mulheres nas questões sociais –
valorização do conhecimento feminino acerca do
consumo, conseqüência da vivência doméstica;
7– Educar economicamente o povo – a educação como
valor para o desenvolvimento humano;
8– Facilitar a todos o acesso à propriedade através da
união de esforços;
11 PINHO, Diva Benevides, O pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,
1982. p. 33-34-35-36.
9– Reconstituir uma propriedade coletiva – forma
estratégica para o acesso à propriedade é investir em
um patrimônio coletivo
10– Estabelecer o justo preço – os preços são definidos
sem intenção especuladora; manter remuneração
conveniente para todo trabalhador cooperado;
11– Eliminar o lucro capitalista – materializar a
satisfação das necessidades do homem e não a
obtenção de lucros;
12– Abolir os conflitos – consciência de que todo
associado é dono e usuário da cooperativa.
As diretrizes cooperativistas divulgadas por Gide e aprovadas no II
Congresso das Cooperativas de Consumo, em 1886, pelos participantes, associados,
trabalhadores, professores e estudantes, sintetizam a doutrina cooperativista que
fundamenta e ampara os empreendedores cooperativistas até os nossos dias.
Os Pioneiros de Rochdale representam a síntese de perseverança e sucesso
na aplicação do conceito cooperar. Também influenciaram o desenvolvimento do
pensamento cooperativo da Escola de Nimes. Contudo, não podemos deixar de agregar a
importância da Aliança Cooperativa Internacional – ACI – neste capítulo.
O I Congresso Internacional de Cooperativismo, realizado em Londres, em
1895, fundou a Aliança Cooperativa Internacional – ACI . Desde a sua fundação, que, em
1995, comemorou um século de existência, a ACI reúne associados em todo o mundo para
debaterem sobre importantes questões para o fortalecimento da prática cooperativista.
Reunidos em congressos mundiais, adeptos do associativismo refletem sobre objetivos das
organizações, criam e sistematizam normas, princípios etc.
Todos os modelos cooperativistas, em princípio, obedecem às normas
fixadas pelos pioneiros de Rochdale, que têm a primeira redação datada de 1844, com
modificações posteriores. Hoje, as linhas orientadoras da prática cooperativista podem ser
entendidas assim12:
12 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 24, 25.
Adesão voluntária e livre;
Gestão democrática;
Participação econômica dos membros;
Autonomia e independência;
Educação, formação e informação;
Intercooperação;
Interesse pela comunidade
O ideal cooperativista está fundado em valores de ajuda mútua,
solidariedade, democracia e participação, traduzidos por princípios tradicionais que
configuram a sociedade cooperativa, quais sejam: o homem é o principal elemento, é
básico e essencial na doutrina cooperativista. Esse homem é sempre sujeito e agente nessa
sociedade. A democracia é exercida pelo voto em assembléia; o controle é essencialmente
dos cooperados que não podem transferir suas cotas a terceiros; não há intermediários; os
associados têm direito aos resultados proporcionalmente às operações; é uma sociedade
aberta a inserção de novos cooperados; valoriza o trabalhador enquanto produtor de bens e
serviços e enquanto ser humano; investe na política de preços justos; defende a integração
entre cooperativas diversas e, finalmente, o princípio da educação permanente tem como
objetivo preparar o homem para a vida e para o exercício da cidadania, capacitando-o para
atuação no mercado com visão empresarial e competitiva.
A adesão e entendimento da doutrina cooperativista nunca é imposta. O
exercício coletivo das normas e preceitos favorecem a absorção do ideário humanista, que
prima pela liberdade econômica, social e democrática.
Enquanto doutrina econômica voltada para o desenvolvimento do ser
humano, das famílias e da comunidade, o cooperativismo destaca fundamentos humanistas,
de liberdade, de igualdade, de solidariedade e de racionalidade.
Coerentemente com a doutrina, o cooperativismo adotou, como imagem
simbólica, a figura composta por um círculo que abraça dois pinheirinhos, numa alusão à
união e à coesão do movimento. O pinheiro representa a imortalidade - capacidade de
sobrevivência em terras inférteis e a fecundidade pela facilidade em multiplicar-se
continuamente, além da imagem de ascendência, pois se projetam para o alto, procurando
subir cada vez mais. O círculo é figura representativa do movimento eterno, não tem
horizonte final, sem começo nem fim.
Quanto às cores, pode-se resgatar o significado do verde como símbolo da
natureza e o amarelo ouro nos remete ao sol, fonte de energia e calor, retrata o princípio
vital da natureza, aconchegando o movimento ininterrupto da vida, colocada como
centralidade da evolução do homem.
O Congresso da Aliança Cooperativa Internacional13 de 1923 instituiu mais
um símbolo cooperativista, adotando o primeiro sábado de julho de cada ano, como o Dia
Internacional da Cooperação, data em que se comemora a confraternização de todos os
povos ligados ao cooperativismo.
13 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo: ICA, 1994. p. 25.
CAPÍTULO 3 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO NA REGIÃO DE FRANCA
3.1 Cooperativismo no Brasil
A Organização das Cooperativas Brasileiras, com base em dados
estatísticos de 1996, afirma que existem, no Brasil, cerca de 4000 cooperativas
administradas por aproximadamente 3 milhões de cooperantes, formadas para atender as
mais diversas necessidades e com atuação nos mais variados campos de atividade. A
seguir, citamos apenas as mais representativas14:
Cooperativas do Setor Agropecuário: são formadas por produtores rurais que buscam o
aperfeiçoamento do processo de produção; obtêm melhores preços para os seus
produtos, sem a intervenção do atravessador, vendem diretamente ao consumidor;
Cooperativas de Crédito: são aquelas que se propõem a conceder empréstimos aos seus
associados a juros mais baixos do que aqueles praticados pelas instituições financeiras
oficiais;
Cooperativas Educacionais: são constituídas por pais, alunos e professores que na
qualidade de associados formam escolas e centros de treinamento para terem acesso a
melhores condições de ensino;
Cooperativas de Trabalho: reúnem diversos profissionais para prestação de serviços a
terceiros.
A demografia cooperativista brasileira mostra a predominância desse tipo de
cooperativa nas regiões sul e sudeste. Até 1965, os trabalhadores cooperados
caracterizavam-se por mão-de-obra semi-qualificada ou operários braçais: transportadores
de carga, motoristas de caminhão, artesãos, pescadores artesanais e trabalhadores em
edifícios.
A partir de 1965, é possível identificar a presença de outros profissionais,
inclusive técnicos especializados que se reuniram em cooperativas, buscando solucionar os
principais problemas do mercado de trabalho.
Pode-se exemplificar o modelo de cooperativa de trabalho pela forte
presença das UNIMED’s – Cooperativa de Serviços Médicos e Hospitalares, que, desde
1967, quando foi realizada a primeira experiência, em Santos/SP, vem obtendo sucesso
empresarial, reunindo grande número de profissionais da área da saúde e ampliando,
sistematicamente, a abrangência e número de usuários.
Com as transformações do mercado de trabalho, conseqüência de fatores
como globalização, a descentralização produtiva, a informática e a automação dos meios
de produção, verifica-se uma explosão das taxas de desemprego estrutural, da eliminação
de inúmeras profissões em decorrência do incremento tecnológico, principalmente. A
tendência é aumentar o índice de natalidade das cooperativas de trabalho, como alternativa
de emprego produtivo e requalificação do trabalhador.
Interessante observar que, na área rural, a cooperativa de trabalho não tem
conseguido mobilizar a população, não obstante a sua importância para a melhoria da
qualidade de vida dos trabalhadores volantes, a partir do pressuposto da ajuda entre
cooperativistas. Pinho15 enumera dois fatores responsáveis pelo número reduzido de
cooperativas de trabalho na zona rural:
Primeiro, a instabilidade geográfica dos
trabalhadores volantes, muitas vezes, determinada pelo
próprio tipo de trabalho que define sua localização para
atender as demandas das safras e entressafras, somadas
às adversidades climáticas dificultam a inserção em
qualquer tipo de associação; em segundo lugar, a não
qualificação da mão-de-obra exige um processo de
mudança programada capaz de criar condições de auto-
sustentação das cooperativas de trabalho.
14 BENATO, João Vitorino Azolin, O ABC do Cooperativismo, São Paulo – 1994. p. 103 et seq. 15 PINHO, Diva Benevides, O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro, São Paulo: CNPq,
1982. p. 146.
Alexandre Nery de Oliveira16, eminente jurista, Juiz do Trabalho e
Presidente da 1a. Junta de Conciliação e Julgamento de Brasília/DF, à época, (1998) assim
se posiciona quanto a definição de Cooperativas de Trabalho:
As Cooperativas de Trabalho detêm, como
associados – cooperativados, trabalhadores que,
dispensando a intervenção de terceiro qualificados como
patrões, dispõem-se a contratar determinados serviços
relacionados a suas profissões ou ofícios, em razão do
conjunto, seja por trabalho de todos, seja por trabalho de
grupos, em prol do bem comum geral. Neste sentido, seria
efetivamente ilógico imaginarmos a caracterização dos
associados – cooperativados como empregados da
cooperativa, eis que, numa caracterização social de
empresa, é exatamente aquela em que os patrões são os
próprios trabalhadores, em repartição dos benefícios e
dos prejuízos da associação, em modo similar às
sociedades comerciais, mas, em distinção a estas,
baseando-se o produto aferido no próprio trabalhador e
não no trabalho de outros (empregados).
O próprio Aurélio, limitando-se ao enfoque do verbete, salienta ser
cooperativa a “sociedade ou empresa constituída por membros de determinado grupo
econômico ou social, e que objetiva desempenhar, em benefício comum, determinada
atividade econômica.
• Cooperativas de Produção : são aquelas que se propõem a organizar a produção dos
bens, tarefas que não podem prescindir da participação dos cooperantes, em todo
processo administrativo, técnico e funcional da empresa.
• Cooperativas de Saúde: O atendimento pertinente à área da saúde é valorizado por um
grupo de cooperados que também pode ser formado por usuários desses serviços, tendo
como meta prestar atendimento à população a preços mais acessíveis que aqueles
oferecidos pela iniciativa privada.
16 Revista Ponto de Encontro, in Cooperativas de Trabalho, Abril/Maio 1998, p. 4.
• Cooperativas de Consumo: são aquelas organizadas para garantir melhores condições
de compras de alimentos, roupas, medicamentos etc...
A análise sobre sobrevivência e prosperidade dessa modalidade de
cooperação tem demonstrado que, no Brasil, o índice de mortalidade dessas associações é
elevado, acompanhado pelas cooperativas do setor de crédito cooperativo. As cooperativas
brasileiras de consumo apresentaram certa prosperidade até o início da década de 60.
Declinaram logo em seguida, em conseqüência da supressão do benefício tributário de que
gozavam, representado pela isenção do ICM; à rápida descapitalização provocada pela
inflação acentuada nos períodos entre 63 a 79 e 79 a 81; e, mais recentemente, a grande
disseminação das grandes redes de supermercados que operam com grandes recursos
financeiros, modernas técnicas de marketing, racionalização administrativa e linhas
especiais de crédito, tornando a concorrência com as cooperativas de consumo,
insuportável.
Cooperativas Habitacionais: organizadas para viabilizar a compra ou construção da
casa própria, a estrutura cooperativista habitacional representa um segmento estanque
no contexto cooperativista brasileiro, graças ao seu caráter transitório, de duração
limitada, já que as experiências vividas até aqui, na sua grande maioria, focam a sua
ação até a entrega das chaves das unidades habitacionais construídas. Sua finalidade
seria preenchida, se após o recebimento da unidade, as cooperativas permanecessem
com vistas a administrar os conjuntos habitacionais, a organizar a vida comunitária de
seus moradores no que diz respeito ao consumo, lazer educativo, ajuda solidária e
outros.
Assim, essas cooperativas têm deixado de lado o caráter educativo no
sentido coletivo dos seus associados.
Criadas com base na legislação que reformulou a organização bancária e
instituiu o BNH – Banco Nacional da Habitação – em 1964 - as cooperativas habitacionais
vivem na dependência de recursos financeiros para que possam executar suas metas, além
de terem, de alguma forma, de se ajustar para atender a pressupostos das políticas públicas
de habitação. Em média, mantêm suas atividades no período que varia entre dois e quatro
anos.
Cooperativas de Mineradores: torna sócios trabalhadores que executavam a extração, a
manufatura e a comercialização de minérios, garantindo-lhes alternativa de trabalho
autônomo.
Cooperativas de Prestação de Serviços : caracterizadas por aquelas que prestam as mais
diversas formas de serviços de acordo com o interesse e a necessidade dos seus
associados.
Esses campos de aplicação e atuação do ideário cooperativista,
apresentados anteriormente, demonstram a absorção das diretrizes determinantes da
doutrina em áreas específicas. No entanto, existem associações cooperativistas
denominadas especiais, ou seja aquelas que podem manter, no seu quadro de associados,
crianças, adolescentes, portadores de deficiências ou outros grupos que precisam ser
tutelados e têm como meta o desenvolvimento e a integração social de seus associados.
No Brasil dos anos 50, aparecem as primeiras iniciativas de coesão e
representação necessárias à aglutinação de interesses comuns com a constituição da
UNASCO – União Nacional das Associações Cooperativas. No entanto, divergências
entre grupos internos da UNASCO, resultaram na criação da ABCOOP – Associação
Brasileira de Cooperativas.
Essa divisão foi mantida até 1969, quando representantes governamentais
empenharam-se na instalação de diálogo em todos os níveis e em todo país, visando à
integralização das duas correntes representadas pelas duas entidades. O resultado desse
movimento está na criação da OCB e OCEs – Organização das Cooperativas Brasileiras
e Organização das Cooperativas Estaduais, respectivamente. A OCB tem como missão
reunir todas as tendências cooperativistas, no desempenho de suas atribuições; foi
concretizada oficialmente durante o VI Congresso de Cooperativismo, realizado entre 2 e
6 de dezembro de 1969, em Belo Horizonte/MG.
A Lei 5 764 de dezembro de 1971 implanta juridicamente o Sistema OCB,
sua sede definitiva em Brasília foi instalada em meados de 1972. A referida Lei estabelece
que vinte pessoas ou mais podem constituir uma cooperativa singular em qualquer
segmento econômico, ou seja, em qualquer atividade humana. Três ou mais cooperativas
singulares podem constituir uma central ou uma federação de cooperativas, entendidas
como de segundo grau, nas quais cada cooperativa singular tem um voto, independente do
capital integralizado, admitindo-se o voto proporcional.
Todas as cooperativas singulares, centrais, federações e confederações têm
direito a voto e elegem a diretoria e o conselho fiscal da Organização das Cooperativas do
Estado – OCE -, considerando-se o voto proporcional na eleição. Cabe a OCE representar
todos os segmentos do cooperativismo no seu Estado e prestar serviços às filiadas, de
acordo com os interesses e necessidades das mesmas.
As Organizações das Cooperativas do Estado, OCEs, órgãos de
representação do cooperativismo estadual, devem ser filiadas à Organização das
Cooperativas Brasileiras – OCB -, órgão técnico consultivo, sem finalidade lucrativa,
estruturado pela Lei n.º 5 764/71, com os seguintes atribuições17:
manter a neutralidade política e indiscriminação racial, religiosa e social;
integrar todos os ramos das atividades cooperativistas;
manter registro de todas as sociedades cooperativas que integram a OCB;
manter serviços de assistência geral ao sistema cooperativista quanto à
estrutura social, aos métodos operacionais e à orientação jurídica, através de
pareceres e recomendações;
denunciar práticas nocivas ao desenvolvimento cooperativista;
opinar em processos que lhe sejam encaminhados;
organizar setores consultivos especializados para atender às demandas do
cooperativismo;
fixar política da organização com base nas proposições de seus órgãos
técnicos;
exercer outras atividades inerentes à sua condição de órgão representativo e
de defesa do sistema cooperativista e;
manter relações de integração com as entidades congêneres do exterior e
suas cooperativas.
A OCB coordena e presta serviços no âmbito nacional, visando apoiar o
movimento cooperativista nas seguintes áreas18:
Banco de Dados – dispõe de informações básicas para defesa dos interesses
da base;
Educação/Capacitação Cooperativista – através de processos reflexivos
permanentes que levem a decisões conscientes e democráticas;
Treinamento – busca capacitação profissional para todos os envolvidos no
Sistema Brasileiro de Cooperativismo;
17 PINHO, Diva Benevides – O Pensamento Cooperativo e o Cooperativismo Brasileiro – São Paulo: CNPq,
1982. p. 160. 18 BENATO, João Vitorino Azolin – O ABC do Cooperativismo – São Paulo: ICA, 1994. p. 111.
Audiconsultoria – assessorar e instrumentalizar dirigentes, conselheiros,
fiscais e associados;
Comunicação – divulgar as políticas, as diretrizes e as metas do
cooperativismo brasileiro, assim como as novas experiências no setor e
difundir propostas e conquistas para o público, em geral, visando ao
reconhecimento do cooperativismo como instrumento com condições de
ajudar nas soluções de problemas sociais e econômicos;
Assessoria Jurídica – orientar-se e as OCEs sobre assuntos relacionados à
legislação em vigor;
Assessoria Parlamentar – subsidiar representantes políticos na defesa dos
interesses do sistema cooperativista.
Além das organizações criadas especificamente para defesa do sistema,
existem, no país, instituições universitárias que vêm contribuindo no desenvolvimento de
recursos humanos especializados, inclusive em nível de pós-graduação, como na
UNISINOS em São Leopoldo/RS. Cursos de Graduação em Contabilidade e
Administração de Empresas que têm em seu currículo a disciplina de Contabilidade de
Sociedades Cooperativas são bastante comuns no Brasil, bem como em cursos técnicos
equivalentes a segundo grau. A cidade de Franca, os possui nos dois níveis, ou seja,
acadêmico e escola técnica.
Historicamente, o cooperativismo, desde sua implantação no Brasil, contou
com o apoio do governo que manifestou seu amparo através da legislação. O primeiro
decreto que mencionava o cooperativismo é de 6 de janeiro de 1903, de n.º 799,que
permitia, aos sindicatos a organização de caixas rurais de crédito e cooperativas de
produção e consumo.
A utilidade das cooperativas é reconhecida pelo decreto n.º 1 637 de
05/01/1907. Em 19 de dezembro de 1932, o Decreto 22 239 apresenta as características
das cooperativas e consagra as postulações doutrinárias do sistema cooperativista.
Revogado em 1934, foi restabelecido em 1938, novamente revogado em 1943, ressurgiu
em 1945, permanecendo em vigor até 1966.
A partir de 1966, o cooperativismo foi submetido ao centralismo estatal,
disposto em decretos, o que causou a perda de muitos incentivos fiscais e estado de
liberdade já conquistados.
A Lei n.º 5 764 de 16 de dezembro de 1971, que define o regime jurídico
das cooperativas, sua constituição e seu funcionamento, além do sistema de representação
e órgãos de apoio, constitui, até hoje, o amparo legal para viabilização do sistema
brasileiro de cooperativismo.
CAPÍTULO 4 AS TERCEIRIZAÇÕES E AS COOPERATIVAS DE TRABALHO
4.1 As Cooperativas de Trabalho e a terceirização na região de Franca
A cidade de Franca se localiza na região nordeste do Estado de São Paulo.
Município com cerca de 300 mil habitantes (dados da Prefeitura Municipal), conhecido
internacionalmente, num primeiro momento, pela exploração da mão-de-obra infantil na
execução dos trabalhos das fábricas de calçados e produtos afins, sua principal mola
propulsora econômica.
Num segundo momento, ficou conhecida pela capacidade de engajamento
de sua população no combate e conseqüente eliminação do trabalho infantil. Esta bandeira
tem sido hasteada e defendida por uma instituição não governamental formada e dirigida
por empresários da cidade ligados ou não à área calçadista, denominada Instituto Pró-
Criança. Esta organização serve hoje de modelo para o Brasil. Outras cidades paulistas já
utilizam este modelo de engajamento e de trabalho na modalidade de franquia do nome
para levar a filosofia de trabalho e os ideários do Instituto Pró-Criança a outras regiões do
Estado. Paralelamente a isso, diversos segmentos da sociedade se envolvem na tentativa
árdua da prevenção e da eliminação dos riscos a que estão sujeitas crianças de e em
situação de rua, procurando evitar o uso de drogas e a prostituição infantil. Louvem-se,
nesse segmento, os trabalhos desenvolvidos pelo Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente de Franca, que têm sido utilizados como modelo e referencial
para instituições semelhantes.
Outro importante segmento econômico da cidade e da região de Franca é a
agricultura, que se baseia, principalmente, na cultura do café e pecuária de leite,
representando, esta, a segunda bacia leiteira do estado e, aquela, a principal fonte de cafés
do tipo exportação do estado e uma das mais importantes do Brasil.
Como poderemos observar, no transcorrer deste capítulo, o surgimento das
Cooperativas de Trabalho em Franca foi uma decorrência natural da necessidade de as
fábricas se ajustarem aos novos tempos, à era da economia globalizada, em que o preço de
venda não era mais o custo de produção acrescido dos impostos e da margem de
contribuição do fabricante e sim, o menor custo de produção possível, comparado com o
preço da concorrência.
Consideramos importante deixar registrado o que entendemos por custo,
segundo os conceitos utilizados e definidos por alguns autores. Sá19 define Custo como
“investimento para que se consiga um bem de uso ou de venda; o mesmo que gasto,
despesas; aplicação de meios para a produção”. Ainda nesta sua obra, citando outras
definições e outros autores, temos as seguintes definições para o termo:
“Por custo se entende o conjunto dos valores gastos
por uma empresa para advir a venda de um produto, de
uma mercadoria de serviço”. (Masi apud Sá,1983, p.
101).
“O custo é ‘um produto de despesas efetivamente
suportadas e variadamente reunidas em ordenado
complexo’”. (Zappa apud Sá,1983, p. 101).
“Tem-se a noção geral do custo dos produtos,
mercadorias ou serviços, quando se pensa na quantidade
daqueles produtos, mercadorias e serviços”. (Onida apud
Sá, 1983, p.101).
“Com a palavra custo designa-se, ordinariamente,
no campo contábil, o total dos ônus ou despesas
sustentadas para obtenção de um dado produto ou
serviço”. (Amodeu apud Sá, 1983, p. 101).
“Custos são gastos (a vista ou a prazo) com serviços
ou mercadorias destinados à obtenção de um lucro”.
(Jackson apud Sá, 1983, p. 101).
19 SÁ, Antônio Lopes de; Dicionário de Contabilidade, São Paulo: atlas,1983, p. 106-107.
“O custo aziendal de produção é aquele que se
determina na azienda: esse é, necessariamente, um custo
monetário, uma soma, isto é, de preços despendidos para
obter a oferta dos serviços, dos esforços e de quanto é
necessário para a atuação do processo produtivo”
(D’Ippolito apud Sá, ano, p.101).
Os autores são mais ou menos concordes na
definição de custo, situando-o sempre como dispêndio;
“doutrinariamente, isto não é absolutamente correto
porque o conceito de despesa se confunde com o de saída
numerária e nem todo custo se opera mediante saída de
dinheiro”. (Sá, 1983, p. 101).
Como podemos verificar, não há discordância entre os conceitos defendidos
pela Escola Italiana de Contabilidade e o consagrado autor nacional Antônio Lopes de Sá,
discípulo daquela escola. Este buscou apenas complementar os pensamentos daquela,
enriquecendo ainda mais o tema. Em sua obra, são citados mais de 100 tipos de custos,
variando conforme suas aplicações. De maneira particular, interessa-nos sua definição de
Custo de Produção:
Momento do custo que reúne o custo das matérias
diretas, o custo da mão-de-obra direta, o custo das
despesas gerais da produção.
É o custo que alguns autores denominam Custo
Contábil; tal custo não está capacitado a produzir todos
os informes de que uma empresa necessita para a sua
administração; todavia, forma sua base.
O custo de produção reúne elementos especiais ou
diretos e gerais ou indiretos.
Os especiais são: matéria-prima e mão-de-obra
(diretos). Os gerais são as despesas gerais de produção,
que podem ser fixas e variáveis.
O controle do custo de produção depende da
Organização dos Armazéns (de matérias), da
Organização do Pessoal (Serviço de Pessoal e lotação
certa por serviço), Organização da Produção (seções
definidas e anotações em todas as frases), Organização
Administrativa etc”.(Sá, 1983, p. 106-107).
Semelhantemente a outras atividades econômicas, as fábricas de calçados
têm sofrido, ao longo dos últimos anos, a concorrência dos produtos importados, não só no
mercado interno, mas também nos mercados internacionais, onde historicamente,
predominavam os consumidores europeus e norte-americanos.
Os produtos originários da Ásia, principalmente, forçaram os empresários
francanos a se modernizarem, como aliás têm feito com outros produtos e em outras
regiões, como por exemplo, os têxteis na região paulista da cidade Americana, que fizeram
os empresários do setor aposentarem teares com mais de quarenta anos de uso em favor de
teares eletrônicos e equipamentos de alta tecnologia, devolvendo, dessa forma, o tecido
brasileiro ao mercado interno e internacional.
Com a cidade de Franca não foi diferente. Depois de perderem os mercados
internos e externos para calçados de fabricação chinesa, o empresariado francano se
mobilizou na tentativa de se contextualizar com as novas regras de mercado ditadas pela
globalização da economia mundial.
Assim, baixar custo a qualquer preço e aumentar a qualidade final de seus
produtos têm sido a tônica nos últimos cinco anos no setor calçadista de Franca. Nesse
sentido, merece registro o esforço envidado pela Associação Comercial e Industrial da
cidade, promovendo palestras, seminários, workshops e outros com vistas a manter o
empresariado local no mesmo diapasão dos mercados mundiais quanto às técnicas de
produção e à comercialização.
Guardadas as peculiaridades de cada caso, o mesmo acontece na agricultura,
na área de construção civil, educação etc. Cada segmento econômico procura ajustar-se aos
novos tempos.
Através de pesquisas empírica e informal que levamos a efeito junto aos
sindicatos representativos das classes patronal e dos trabalhadores, pudemos apurar que, no
caso específico da indústria de calçados, a mudança de mentalidade tem sido drástica.
Empregados com vinte e cinco ou trinta anos de trabalho foram e têm sido
sistematicamente demitidos e orientados a prestarem serviços a estas mesmas fábricas às
quais serviram por longos períodos de suas vidas.
As atividades fabris, no todo ou em parte, foram terceirizadas e estes
funcionários orientados no sentido de constituírem empresas de prestação de serviços, as
chamadas bancas, que são contratadas, às vezes formalmente, para prestarem os serviços
que, antes, faziam com suas carteiras assinadas.
Sobre o assunto, Faria20, assim se manifesta:
Seja qual for a perspectiva adotada com o impacto
da globalização, o fato é que está em curso uma nova
etapa de internacionalização do capitalismo, onde as
culturas nacionais indicam uma cultura, movida pela
aproximação entre povos e civilizações, vinculada ao
aperfeiçoamento da tecnologia e da economia.
As grandes corporações mundiais praticamente
passaram a operar em todos os países, decidindo sobre
quase tudo o que afeta a vida do ser humano, mudando a
forma de trabalho – de localizado para globalizado, onde
não existem mais fronteiras. Isso leva a compra de
matéria-prima em qualquer lugar do mundo, onde ela seja
melhor a um menor custo, à instalação de fábricas nos
países onde a mão-de-obra seja mais barata e os impostos
cobrados sejam menores, não importa qual o lugar do
planeta, é a venda da mercadoria para o mundo inteiro.
Na cidade de Franca, no que diz respeito à adoção da prática da
terceirização, no momento em larga escala, diferentemente do mencionado na obra de
Rinaldi (Apud Faria, 1999, p.131), que discorrendo acerca do façonismo, aborda a
experiência da fábrica Samello. Hoje, o sistema de prestação de serviços tem sido
amplamente aceito e utilizado. Num primeiro momento, houve um certo velado regozijo
por parte dos fabricantes. Acreditavam alguns terem reinventado a roda das relações do
trabalho, transferindo para seus terceirizados todo o ônus dessas relações, mesmo que estes
mesmos ônus estivessem incluídos no valor da fatura emitida pelas empresas terceirizadas
20FARIA, Maria Ester Braga, A experiência cooperativa dos sapateiros francanos: um desafio para o futuro,
1999, Unesp, p. 32.
de seus ex-funcionários. O não ter que tratar com o pessoal da fábrica gerava um certo
conforto.
No caso de Franca, o termo banca, está perfeitamente definido por Faria21
“É importante esclarecer que a expressão banca,
para a indústria calçadista, refere-se à instância
subcontratada pela fábrica para realizar frações do
processo de produção do calçado, principalmente a
costura mecânica (pesponto) e a costura manual das
partes superiores. Desta forma, a expressão banqueiro(a)
é o(a) proprietário(a) da banca.
A boa convivência durou até a primeira ação trabalhista movida pelos
empregados das bancas. Um bom número de fabricantes não atentaram para o que a justiça
denomina responsabilidade solidária. Como não dispunham de meios para saldar suas
obrigações trabalhistas (muitas bancas contratavam sem registro em carteira), os
fabricantes tomadores do trabalho dessas empresas foram chamados à responsabilidade,
envolvendo-se na lide como utilizadores deste trabalho em suas atividades - fins, ou seja, o
fabrico e a comercialização de calçados. As duas Juntas de Conciliação e Julgamento da
Delegacia do Tribunal Regional do Trabalho, em Franca, acumularam muitos processos
trabalhistas, envolvendo o mesmo tipo de demanda. Isto pode ter sido decorrente de
projetos mal elaborados de terceirização, quem sabe ocasionado por uma falta de mudança
de mentalidade administrativa, conforme preconiza Queiroz22:
Para iniciar qualquer projeto de terceirização, as
empresas precisam mudar o seu comportamento e sua
postura empresarial e também a sua estratégia, nas
futuras atitudes.
Esta mudança vai proporcionar uma evolução,
permitindo o desenvolvimento empresarial com
prosperidade e segurança na perenização dos negócios.
Sem as mudanças para a modernidade as
organizações fenecem e desaparecem.
21 FARIA, Maria Ester Braga, A experiência cooperativa dos sapateiros francanos: um desafio para o futuro,
1999, Unesp, p. 131.
Não é nossa intenção, neste trabalho, discorrer sobre este assunto
especificamente. Mas consideramos importante deixar registrado este fato porque ele
denota quanto o fabricante francano, de modo geral e dado ao seu próprio perfil, de ex-
empregado de fábrica, estava despreparado para este novo tipo de relacionamento. Ainda,
neste tópico, e para facilitar o entendimento dos leitores que vierem a tomar contato com
este trabalho e como forma de enriquecê-lo, trazemos algumas definições e impressões
acerca de terceirização, até a inclusão da prestação de serviços por parte das Cooperativas
de Trabalho, como forma de serviços terceirizados. Queiroz23 assim define terceirização:
É uma técnica administrativa que possibilita o
estabelecimento de um processo gerenciado de
transferência, a terceiros, das atividades acessórias e de
apoio ao escopo das empresas que é a sua atividade-fim,
permitindo a estas concentrarem-se no seu negócio, ou
seja, no objetivo final.
É uma metodologia de motivação e fomento à
criação de novas empresas, possibilitando o surgimento
de mais empregos.
Incentiva o surgimento de micro e médias empresas
e ainda o trabalho autônomo, possibilitando também a
melhoria e incremento nas empresas existentes no
mercado, com ganhos de especialidade, qualidade e
eficiência.
É o processo da busca de parcerias, determinado
pela visão empresarial moderna e pelas imposições do
mercado. Não mais poderemos passar para os preços os
elevados custos. Isto tem feito com que os empresários se
preocupem com a qualidade, competitividade, agilidade
de decisão, eficiência e eficácia que acabam resultando
na manutenção dos clientes e consumidores.
22 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de, Manual de Terceirização, São Paulo: STS, 1995, p. 03 23 QUEIROZ, Carlos Alberto R. S. de. Op. cit., p. 31.
Considera o autor que a terceirização possibilita a desburocratização,
proporciona um alívio à estrutura organizacional da empresa, melhora a qualidade na
prestação de serviços, contribuindo, de maneira decisiva, para a melhoria do produto final,
trazendo especialização na prestação de serviços.
Como decorrência da implantação dos projetos de terceirização, as empresas
obtêm ganhos variados, iniciando-se na eficácia empresarial, com aumento de sua
flexibilidade, agilidade decisória e administrativa, simplificando a organização, além de
incrementar a produtividade. Destaca o autor que um dos principais ganhos para as
empresas se situa na economia dos seguintes recursos: humanos, materiais, instrumental,
de equipamentos, econômicos e financeiros.
Outros ganhos empresariais citados pelo autor estariam no melhor
gerenciamento de seu fornecedores, agora especializados, na administração da qualidade
dos serviços prestados, uma estrutura básica leve e ágil, permitiria a reutilização produtiva
dos espaços, os investimentos seriam carreados para a atividade-fim, os trabalhos de
supervisão estariam mais envolvidos no produto e preocupada com a qualidade,
proporcionando resultados competitivos.
Comentando sobre os efeitos da globalização e a concorrência mundial
sobre a indústria calçadista francana, quando esta se depara com a sua pior crise e ao fato
de esta indústria não ser diversificada, assim se posiciona, Faria (1999, p. 13, 14):
Esse processo de terceirização apresenta várias
formas e/ou estratégias de associações para
externalização de atividades que visam redução de custos,
via precarização das condições de emprego, mesmo
comprometendo a qualidade do serviço prestado. Com o
avanço da terceirização, vê-se, hoje, o surgimento, em
grande escala, de ‘cooperativas de trabalho’ (grifo
nosso), onde trabalhadores se unem e montam uma
cooperativa, porque eles sabem fazer e têm a tecnologia
de como fazer.
Várias são as formas de terceirização, cada uma envolvendo variado grau de
risco na sua implantação e execução. O quadro a seguir demonstra algumas delas:
Quadro 1: Características de cada forma de Terceirização
Forma Atuação Tecnologia Resultado Execução Funções da Exclusividade Posição do Riscos legais Atividade-fim tomador trabalhistas Desverticalização Fora do Criação e De- Produto Independente Passa, exceto a tec- Somente de produto Avalia a qualidade Nenhum
Tomador senvolvimento Próprio do tomador nologia básica
Prestação de Serviço Dentro do Execução Somente Depende de Não pode passar Não pode depender Avalia o resultado Se exclusivo,
Tomador Serviços Instruções sim
Venda de Serviços Fora do Processo e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente de tipo de Avalia a qualidade Se exclusivo,
Tomador Operação Serviços Especificações nologia básica Serviço sim
Nomeação de Fora ou Execução Somente Depende de Dentro não, fora sim Não pode depender Avalia o resultado Se exclusivo, sim
representante Dentro Serviços Instruções
Concessão de marca Fora do Execução e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente da marca Avalia o resultado Nenhum
Tomador venda Serviços Especificações nologia básica e audita a operação
Locação de mão-de-obra Dentro do Não tem Não tem Supervisão do Não pode passar Não pode depender Supervisiona a Se exclusivo ou
Tomador Tomador mão-de-obra + 3 meses, sim
Franquia Fora do Execução e Somente Depende de Passa, exceto a tec- Somente da marca Avalia o resultado Nenhum
Tomador venda Serviços Orientação e nologia básica e produto e audita a operação
Treinamento
Fonte: Queiroz, 1994, p. 45.
Comentando sobre os estágios da terceirização no Brasil, Faria (1999)
destaca o fato de o Brasil ainda centralizar o seu processo de terceirização nas atividades
mais simples e está erroneamente enfocada para a redução nos custos, redução no quadro
de funcionários e diminuição dos benefícios, diferentemente de outros países, onde o que
se busca é a aliança estratégica entre empresas, objetivando obter flexibilidade e
especialização, aliadas à economia de escala e à sinergia dos recursos. Nesse caso, as
empresas, juntas, conseguem fazer mais com menos, gerando mais oportunidades com
recursos menores.
O empresariado nacional, no que diz respeito à terceirização, esta focado no
estágio conhecido como dumbsourcing, ou seja, estágio preliminar do processo, onde as
atividades se concentram nas mais tradicionais e mais fáceis de serem passadas para
terceiros. Como exemplo, cita Faria (1999): serviços administrativos gerais (refeitório,
segurança, manutenção, limpeza, algumas áreas tradicionais de recursos humanos, serviços
médicos, jurídicos etc.). Em outros países, o processo de terceirização já se encontra num
estágio bem mais avançado, entendido como smartsourcing, onde a aliança estratégica é o
objetivo, juntando-se os esforços e recursos tecnológicos, para manufatura de produtos
com melhor qualidade, gerando a competitividade necessária para concorrer no mercado
consumidor.
Segundo o autor, a terceirização, no Brasil, começa a sair do estágio
preliminar, mas muito lentamente, porque ainda prevalece o interesse exclusivo, das
empresas, em terceirizar para economizar. O desafio que se apresenta às empresas
brasileiras, caso queiram ter sucesso numa economia globalizada, será, sem dúvida,
caminhar do atual estágio para o smartsourcing, onde a estratégia é o interesse, a sinergia
de recursos é um meio e a competitividade é o objetivo e isto somente será alcançado
através de um processo de planejamento, onde a terceirização esteja incluída como uma
das formas adequadas no processo econômico do mundo moderno.
Produzindo com pessoal próprio, os custos operacionais do tomador
relativos à mão-de-obra, no caso o empresário que ainda não terceirizou suas atividades,
são, basicamente, os seguintes, segundo Queiroz (1994, p. 125, 129):
• Salário diretos
• Encargos
• Legais
• Sociais
• Salários indiretos
• Alimentação subsidiada
• Transporte subsidiado
• Assistência médica subsidiada
• Seguro de vida subsidiado
• Auxílios sociais diversos
• Rotatividade da mão-de-obra
• Demissão
• Admissão
• Recrutamento
• Seleção
• Treinamento
• Acidentes de Trabalho
• Estabilidade da Lei 8 213/91 – Art.118
• Socorro médico emergência
• Perda de qualidade
• Perda de produtividade
• Perda material
• Danos a equipamentos e instrumentos
• Remuneração dos primeiros 15 dias de afastamento
• Segurança do trabalho
• EPI
• EPC
• Uniformização
• Controles administrativos de pessoal
• Tempo de supervisão
• Ociosidade da mão-de-obra
• Imobilizados
• Sucateamento de equipamentos e instrumentos
• Instalações físicas
• Seguros gerais
• Materiais de consumo
• Energia
• Absenteísmo
• Justificativas médicas
• Justificativas por mérito
• Contencioso trabalhista
• Acréscimo de mão-de-obra para substituições
• Ausências generalizadas
• Ausências por acidente no trabalho
• Folgas
• Saída antecipada
• Atrasos
• Descanso legal
• Custos gerais invisíveis
• Apoio à burocracia
• Status funcionais
• Embutidos
Assim, quando terceiriza, o tomador pretende transferir para o parceiro
terceirizado os seguintes custos:
• Quando implantada a terceirização
• Acidentes no trabalho
• Remuneração dos 15 dias iniciais de afastamento
• Estabilidade da Lei 8 213/91 – Art. 118
• Socorro médico emergencial
• Recrutamento
• Seleção
• Admissão
• Demissão
• Treinamento
• Supervisão
• Segurança no trabalho
• EPI
• EPC
• Uniformização
• Controles administrativos de pessoal
• Ociosidade da mão-de-obra
• Acréscimo de mão-de-obra – substituições
• Materiais de consumo
• Absenteísmo
• Mão-de-obra para picos de trabalho
• Equipamentos
• Instrumentos
• Ferramentas
• Custos invisíveis
Existe diferença entre os autores nacionais quanto ao custo efetivo da mão-
de-obra no Brasil. Para fins de comparação, ilustramos com os quadros a seguir:
Para de Queiroz (1999, p. 130-131) o quadro abaixo representa
adequadamente o custo do empregado no Brasil.
Tabela 1: Quanto Custa o Empregado
QUANTO CUSTA O EMPREGADO % sobre a folha de salários Grupo A – Encargos Sociais básicos Discriminação das verbas Horista % Mensalista % 1 – Previdência Social 20,00 20,00 2 – Salário Educação 2,50 2,50 3 – Incra 0,20 0,20 4 – Sesi 1,50 1,50 5 – Senai 1,00 1,00 6 – Seguro Acidentes 3,00 3,00 7 – FGTS 8,00 8,00 8 – Sebrae 0,60 0,60 Total Grupo A 36,80 36,80 Grupo B – Custo extra-salarial que sofre incidência do Grupo A 1 – Repouso Semanal Remunerado 17,64 2 – Feriados e Dias Santificados 3,73 3 – Férias 13,33 13,35 4 – Auxílio/Acidente de Trabalho 1,57 1,57 5 – Licença Paternidade 0,18 0,18 6 – Licença Maternidade 0,86 0,86 7 – Gratificação de Natal 11,22 8,95 8 – Aviso Prévio Trabalhado 1,13 1,13 Total grupo B 49,66 26,04 Grupo C – Custo extra-salarial que não sofre incidência do Grupo A 1 – Indenização de 40% do FGTS 4,78 4,03 2 – Aviso Prévio Indenizado 2,23 2,23 Total Grupo C 7,01 6,26 Grupo D – Incidências cumulativas Horista Grupo B (49,66) x Grupo A (36,80) = 18,27 Mensalista Grupo B (26,04) x Grupo A (36,80) = 9,58 Totais 111,74 78,68 Fonte: Queiroz, 1994, p. 130.
Os índices de custos da construção civil, no Brasil, divulgados pela Revista
Construção24, estão apresentados na tabela seguinte:
Tabela 2: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho
Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho (%) Horistas(1) Mensalistas(2) A1 Previdência Social 20,00 20,00 A2 Fundo de Garantia por Tempo de Serviço 8,00 8,00 A3 Salário Educação 2,50 2,50 A4 Serviço Social da Indústria (Sesi) 1,50 1,50 A5 Serviço Nacional de Aprendizagem Indústrial (Senai) 1,00 1,00 A6 Serviço de Apoio a Pequena e Média Empresa (Sebrae) 0,60 0,60 A7 Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) 0,20 0,20 A8 Seguro contra os Acidentes de Trabalho (INSS) 3,00 3,00 A9 Seconci Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário (aplicável a todas as empresas constantes do lll grupo da CLT - art.577) 1,00 1,00 A Total dos Encargos Sociais Básicos 37,80 37,80 B1 Repouso Semanal e Feriados 22,90 B2 Auxílio-enfermidade (*)0,79 B3 Licença Paternidade (*)0,34 B4 13o. Salário 10,57 8,22 B5 Dias de chuva / Faltas justificadas/acidentes de trabalho/ Greves/falta ou atraso na entrega de materiais ou serviços na obra/outras dificuldades (*)4,57 B Total dos Encargos Sociais que recebem as incidências de A 39,17 8,22 C1 Depósito por despedida injusta 40% sobre [A2 + (A2xB)] 4,45 3,46 C2 Férias (Indenizadas) 14,06 10,93 C3 Aviso Prévio (Indenizado) (*)13,12 (*)10,20 C Total dos Encargos Sociais que não recebem as incidências Globais de A 31,63 24,59 D1 Reincidência de A sobre B 14,81 3,11 D2 Reincidência de A2 sobre C3 1,05 0,82 D Total das Taxas das Reincidências 15,86 3,93 Vale transporte (**) C.N-(S.0,06).100 S Refeição Mínima (café da manhã) (**) (C.N)-(((S/30).22).0,01.100 S Refeições (**) C.N.0,95.100 S Seguro de vida e acidentes em grupo (**) C.100 S Percentagem Total 124,46 74,54
24 Encargos Sociais in Construção São Paulo, nº. 2735, 10/07/2000, p. 142.
Notas:
(*) Adotado
(**) Itens que devem ser calculados segundo o
critério de cada empresa. As fórmulas consideram os
seguintes itens: C = Custo médio de condução (unit) ou
refeição (unit) ou seguro (custo mensal); N = Número
médio de conduções ou refeições (mês); S = Salário médio
nominal (mês).
Vale Transporte: Considerada dedução de 6%
sobre o salário mês, pois os empregadores obrigam-se a
custear apenas o excedente a esse percentual;
Refeição Mínima: Considera dedução de 1% sobre
o salário/hora por dia útil trabalhado, relativo ao custeio da
refeição mínima por parte do trabalhador;
Refeições: Considerado um limite mínimo de 95%
para os custos subsidiados pelos empregadores;
Dias úteis: foram considerados 22 dias por mês.
Observações:
1) As taxas de leis sociais e riscos do trabalho
para horistas estão consideradas e calculadas de modo a
exprimir as incidências e reincidências dos encargos
sociais e a percentagem total é a adotada em nossas tabelas
de composições de preços para orçamentos (TCPO), ou
seja, é a taxa que incide sobre as horas normais
trabalhadas (de produção).
2) As taxas de leis sociais e riscos do trabalho
para mensalistas estão consideradas e calculadas de modo
a exprimir as incidências e reincidências dos encargos
sociais e percentagem total adotada incide sobre a folha de
pagamento.
3) Após o cálculo dos custos diretos, há
necessidade de uma previsão dos custos indiretos
envolvidos na administração do negócio da empresa
executante. Tal previsão geralmente é feita com base na
aplicação da taxa de BDI - Benefícios e Despesas
Indiretas.
Como vemos, esses diferenciais são representativos, em especial num
momento em que redução de custos e aumento de qualidade nas atividades econômicas são
uma exigência do cada vez maior do mercado globalizado. Assim, essas diferenças
percentuais, quando se trata de otimizar custos, podem representar fator decisivo nas
concorrências e tomadas de preços não só na área da construção civil, mas das atividades
econômicas em geral.
Centramos o nosso trabalho no custo da indústria da construção civil, que,
por ser uma atividade que recebe um grande volume de trabalhadores dos quais não se
exige necessariamente muita qualificação, envolve um grande número de pessoas,
distribuídas nas diversas atividades próprias desse tão importante segmento econômico,
tais como pedreiros, serventes, eletricistas, encanadores e outros afins e cuja atividade é,
também, uma catalisadora de demandas trabalhistas.
Em nossas pesquisas e também decorrente de nosso labor profissional,
observamos que, na atividade da construção civil, a terceirização é bastante comum. Os
contratos fechados entre construtores e tomadores são repassados para empreiteiros, e
muitas vezes, para subempreiteiros que, normalmente, são os executores dos trabalhos de
construção. Quanto mais se abre o leque na distribuição dessas responsabilidades, maiores
as dificuldades de uma fiscalização eficiente por parte dos tomadores, bem como maiores
são as possibilidades da contratação de trabalhadores sem carteira de trabalho assinada,
abrindo-se as portas para as ações trabalhistas verificadas no decorrer da execução das
obras e, principalmente, ao final delas.
Queiroz, (1994, p. 137) alerta para os aspectos de como a terceirização se
encaixa na legislação brasileira, principalmente aqueles relacionados com a elaboração dos
contratos de prestação de serviços, pois mais valem os pressupostos que cercam a relação
do que os eventuais documentos assinados a respeito. Recomenda o autor que se evite a
subordinação aos terceiros, sendo este o principal fator com o qual deveremos nos
preocupar. Para assegurar-se, será necessário definir o tipo de contrato a ser estabelecido
com o parceiro, como segue:
• Prestação de serviços
• Concessão
• Trabalho temporário
• Venda de serviços
• Representante
• Franquia
Uma vez definida a forma da relação, a preocupação deve ser centrada na
forma a ser adotada na gestão do contrato e como o tomador vai relacionar-se com o
prestador na administração dos serviços. Devem-se redobrar os cuidados para se evitar a
supervisão do prestador. Caso se configure a direção ou fiscalização fica caracterizada a
subordinação e, com ela, o vínculo empregatício é presumido. Explica Queiroz (1994, p.
138):
Para evitar essa conotação é necessário que o
tomador se conscientize de que deve apenas e tão-somente
avaliar os resultados qualitativos e quantitativos dos
serviços prestados e nunca controlar a execução.
Perante a legislação trabalhista, o tomador de
serviços prestados é subsidiariamente responsável para os
recolhimentos previdenciários e trabalhistas. Poderá,
entretanto, evitar assumir diretamente a responsabilidade,
dependendo do seu comportamento na administração do
contrato.
Todo o cuidado deve ser tomado visando evitar problemas na contratação da
terceirização dos serviços. Outra recomendação de Queiroz (1994, p. 139) é:
Que no contrato de prestação de serviços conste
apenas indicação de quais são os serviços a serem
executados, onde e quando devem ser desempenhados.
Jamais defina como eles devem ser feitos.
Que o reajuste do preço no contrato não seja
baseado em índices salariais ou outros utilizados pelo
tomador para administrar os seus negócios.
Diz-nos, ainda, o autor em uma referência à Constituição Federal em seu
artigo 5.º, inciso XXXVI, que assim se expressa: A Lei não prejudicará o direito
adquirido, ou ato jurídico perfeito e a coisa julgada; que “o contrato perfeito forma um ato
jurídico legal”. Os trabalhos realizados pelas empresas prestadoras de serviços são lícitos e,
portanto, podem ser contratados, conforme previsto no artigo 1 216 do Código Civil, que
sumariamente diz, todas as espécies de serviços ou trabalho lícito, material ou imaterial
pode ser contratado mediante retribuição.”
Os arts. 442 e 444 da CLT citam: “o contrato individual de trabalho é um
acordo correspondente a uma relação empregatícia “ e “as relações de trabalho podem
ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo que não contravenham à
legislação trabalhista”.
O art. 3o da CLT “considera empregado toda pessoa física que prestar
serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante
salário”.
O art. 2o.da CLT diz que “considera-se empregador a empresa que assume
riscos econômicos, assalaria, admite e dirige a prestação pessoal de serviços”. No seu
parágrafo 2o, diz que “a empresa de prestação de serviços que estiver subordinada a um
grupo industrial, comercial ou outros, a relação de emprego se estabelece com a empresa
principal”.
O art. 461 da CLT define que “somente haverá a equiparação salarial se a
diferença ocorrer dentro da mesma empresa e localidade”.
Art. 461. CLT – Equiparação salarial – empregado de prestadora de
serviço de mão-de-obra – paradigma – “mesmo empregador – não configuração”.
Equiparação salarial. Empregado de prestadora de serviços. Torna-se
passível de rescisão, a sentença que defere a empregado de empresa prestadora de mão-
de-obra equiparação salarial com empregado da tomadora dos serviços. O trabalho não
pode ser considerado como prestado à mesma empresa, como exige o citado Art. (Ac do
2o. Gr do TRT – R – MV no mérito AR 23/91 – Rel. Juiz Elio Eulálio Grisa – J. 27.11.91.
Requerente: Montreal Engenharia Ltda – ementa oficial.
O art. 5o da Constituição Federal, no item XXXVI, diz que “a lei não
prejudicará ato jurídico perfeito”. O art. 170 do mesmo diploma legal assegura a livre
iniciativa, livre concorrência, a busca do pleno emprego e o livre exercício de qualquer
atividade econômica independente de autorização de órgãos públicos”.
A Lei 5 085 de 27/08/66 reconhece ser possível a contratação de mão-de-
obra avulsa, quando o trabalhador estiver vinculado a entidade de classe, como:
sindicatos, associações reconhecidas e cooperativas,(grifo nosso). A entidade é
intermediadora da mão-de-obra, sendo aquela que deverá ser contratada, para colocar a
mão-de-obra à disposição do contratante, (tomador de serviços), sendo também quem
recebe do tomador a remuneração do trabalhador vinculado, repassando-lhe o valor
devido. Esta é a única alternativa na área das empresas privadas, para a locação de mão-
de-obra fora a Lei 6 019/74.
O Decreto 357 de 07/12/91, reconhece o trabalhador avulso como
contribuinte da previdência social e, naturalmente beneficiário do INSS.
O art.82 do Código Civil preceitua que “o ato jurídico é válido quando há o
agente capaz, objeto lícito e forma prevista na lei, ou que esta não proíba”.(Queiroz,
1994. p. 139 -140)
A taxa de natalidade das Cooperativas de Trabalho tem crescido
significativamente nos últimos anos. É difícil não encontrarmos uma atividade em que a
mão-de-obra cooperativada não esteja presente. Apenas a título de ilustração, temos hoje,
no Brasil, serviços que são prestados em áreas totalmente distintas, que vão desde aqueles
requeridos por Resorts luxuosos até hotéis mais simples, de trabalhos prestados na
agricultura a trabalhos realizados por cooperativas de jornalistas.
Existem registros de cooperativas formadas por professores que prestam
serviços às escolas onde antes eram funcionários registrados. As cooperativas de trabalho
na construção civil são bastante comuns, sendo que uma delas serviu de referência para
este nosso trabalho como um estudo de caso. Uma atividade bastante conflituosa na área
trabalhista e que hoje também utiliza mão-de-obra de trabalhadores contratada das
Cooperativas de Trabalho é o segmento de Consórcios.
No Estado de São Paulo, conhecemos dois casos e que, embora recentes,
demonstram o sucesso da idéia dos Pioneiros de Rochdale. Sediada no município de São
Paulo, a Coopecon, segundo seu diretor Alexandre Janciauskas, em entrevista à revista
Sistema de Consórcios25, a Cooperativa está intensificando os trabalhos de vendas de cotas
de consórcio da marca Ford, atua no Estado de São Paulo em 18 pontos-de-venda e já
possui cerca de 200 cooperados. Nelson Botter, sócio da Copervenco, que atua no mesmo
segmento, e em entrevista à mesma revista, disse que, através da cooperativa, tem
condições de oferecer um trabalho diferenciado de venda de cotas de consórcio porque
consegue manter a fidelidade dos vendedores, que são, em última análise, patrões de si
mesmos.
A mesma iniciativa já esta sendo implementada em Franca. Existe um
movimento formado por vendedores de cotas de consórcios, ligados, por prestação de
serviços, na modalidade de vendedores autônomos, a três administradoras, duas com sede
na cidade e uma com escritório de representação, no sentido de constituírem a sua
cooperativa e, assim, desenvolverem o seu trabalho de forma mais segura, tanto para eles
próprios quanto para os seus tomadores. Temos acompanhado e orientado o
desenvolvimento desse trabalho no que diz respeito ao seu ordenamento jurídico e a sua
constituição e quanto à instrução aos associados em potencial, procurando conscientizá-los
quanto aos aspectos legais de uma cooperativa, seus direitos e, sobretudo, os seus deveres.
Há uma expectativa, por parte dos mesmos, de que, até o final do ano 2000, a sua
cooperativa esteja constituída e em pleno funcionamento.
O que não queremos ver repetida é a experiência malograda da Arco-Íris –
Cooperativa Francana de Produção de Calçados Ltda., motivo do trabalho apresentado
por Faria (1999) e já citado neste nosso trabalho, quando deixa bastante clara a falta de
educação para o cooperativismo, tanto por parte dos associados, quanto por parte do
presidente da Arco-Íris.
Em Franca e região, área que delimita este trabalho, existem, pelo menos,
oito cooperativas de trabalho em atividade em áreas bastantes distintas, daí excluídas a
Unimed, Uniodonto e Cooperativa de Taxistas, sejam de carros ou motocicletas. Para
exemplificar, citamos o exemplo da Arco-Íris – Cooperativa Francana de Produtores de
Calçados, mencionada no parágrafo anterior, formada por maioria de ex-funcionários de
uma grande e tradicional fábrica de calçados de Franca e que, após meses seguidos de
prestação de serviços àquele tomador, os seus associados, insuflados por um ex-diretor, à
época, e orientados por advogados do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de
Calçados da cidade, segundo declarações de um ex-cooperado e que não quis fazer parte da
ação, por, ainda segundo palavras do mesmo, acreditar no sistema cooperativo, houve por
bem entrar com uma reclamação trabalhista coletiva contra o seu contratante, reclamando
verbas como, diferenças de salário, férias, décimo terceiro salário e demais reflexos, numa
clara afronta à legalidade.
25 Sistema de Consórcios, in Cuidados com a terceirização, Maio-Junho/2000, p. 16.
Pior para o cooperativismo, pois suas pretensões lograram êxito, mesmo que
parciais, conforme cita Faria (1999, p. 151.)
A princípio nem todos os cooperados aceitaram
acionar a empresa, por não confiar na causa. No entanto,
aos poucos, o número foi aumentado, chegando a totalizar
22 (vinte e duas) pessoas. O processo foi iniciado e, antes
de completar um ano, ainda sem uma decisão final da
justiça, a empresa chamou os sapateiros cooperados e fez
a eles uma proposta de acordo, onde pagariam 50% do
valor da causa. Nesse momento, eles aceitaram o acordo e
cada um recebeu um valor variável entre R$ 2 500,00 e
R$ 3 000,00.
A legislação trabalhista do Brasil, no entendimento do julgador desta ação,
deu-lhes acolhimento e considerou legítimas as pretensões dos autores da ação. Como diz a
máxima no meio jurídico, de que todo bom acordo é melhor que uma boa demanda, a
empresa, pagou, através de acordo, parte das pretensões dos cooperados sapateiros.
O cooperativismo de trabalho na área de calçado, especificamente, sofreu
um duro golpe, caindo no mais completo descrédito e ainda hoje sofre os reflexos dessa
insana atitude, ao nosso entendimento.
A Coopershoes - Cooperativa Francana de Shoemakers, criada à mesma
época para prestar serviços na área de produção de calçados, só há poucos meses iniciou as
suas atividades. A Cooperativa de Técnicos Agropecuários e Afins da Região de Franca –
UNIATA – que como seu nome sugere, destina-se à prestação de serviços à área de
agricultura em geral, encontra-se em atividade. A Cooperativa do Trabalhador Autônomo
de Franca desenvolve uma atividade mais genérica, ou não especializada. Presta todo tipo
de serviço de que se tenha necessidade, inclusive o de movimentação de carga,
conservação e manutenção de edifícios, em geral, serviços de pedreiro e eletricista e afins.
A Cooperativa Regional dos Trabalhadores Rurais Autônomos e de Serviços Avulsos –
COOPEI – também presta serviços à agropecuária. Existe em Franca, ainda, a Cooperativa
da Costureiras de Calçados e Afins.
Algumas destas cooperativas operam com mais atividades que outras, como
é o caso, citando agora um exemplo muito positivo, da Coopertraf –Cooperativa de
Trabalho de Profissionais em Carga e Descarga de Mercadorias e Trabalhadores Braçais
de Franca. Opera com atividades de movimentação de cargas, em geral, e agrega cerca de
trinta associados,junto aos quais tivemos oportunidade de desenvolver parte de nossos
trabalhos de pesquisa de campo. Incluímos esta cooperativa em nosso trabalho de campo
porque, além de ser a que desenvolve maior volume de atividades durante o ano, pareceu-
nos, segundo nosso entendimento, ser administrativamente melhor estruturada e a coleta de
dados e informações fluiu com facilidade e muita transparência, o que, do ponto de vista
administrativo, é fator de credibilidade não só para a Cooperativa, mas também, para sua
diretoria.
Esta Cooperativa foi constituída em 28 de setembro de 1998 e, na opinião
de seus cooperados, ela representa o sustentáculo de suas atividades profissionais não só
por dela fazerem parte, mas, sobretudo, porque, segundo suas opiniões, as empresas
tomadoras de seus serviços, com o passar do tempo, foram perdendo o medo de contratar
esta prestação, de estarem incorrendo no risco da vinculação trabalhista.
Anteriormente à existência da cooperativa, os trabalhadores, auto-
denominados chapas, iam para os pontos oferecerem o seu trabalho a quem deles lograsse
mister. Era muito comum o trabalhador passar dias sem desenvolver nenhuma atividade e,
consequentemente, obter algum dinheiro para seu próprio sustento e o de sua família.
Segundo suas próprias palavras, eram dias de intensas dificuldades. Não que elas não
existam mais, pelo simples advento da Cooperativa. O que ocorreu é que, com a
Cooperativa, não existe mais aquela competição entre os trabalhadores pelo melhor ponto
e, mesmo no ponto, a competição por ver quem conseguiria pegar este ou aquele caminhão
que parasse no local e que estivesse precisando dos serviços de um chapa.
A conseqüência disso, como já mencionamos, era que, muitos trabalhadores
não conseguiam trabalhos por dias a fio, acarretando dificuldades financeiras e de
sobrevivência para os envolvidos e seus familiares.
Outra conseqüência danosa era o uso da bebida alcoólica, freqüente e
bastante comum entre os trabalhadores dessa categoria, segundo os mesmos. “Como não
conseguia trabalho, batia o desespero e uma branquinha sempre aparecia um amigo para
pagar”, confessa meio sem jeito, Pedro (nome fictício), no decorrer de nossa entrevista. E
ele continua: “A mulher não podia nem olhar para a gente. Os filhos olhavam e já saiam
de perto, por medo de apanhar. A tristeza por não ter, muitas vezes, o que comer e o que
dar para os filhos, aumentavam o desespero. Aí a gente saía outra vez e ia para o boteco
perto de casa, na esperança de encontrar quem pagasse mais uma para podermos
esquecer aquilo tudo. Bebia mais uma ou duas, voltava para casa e batia na mulher. Nos
filhos também, se chorassem ou reclamassem de alguma coisa”.
Este depoimento pode ser bastante comum, mas, infelizmente, reflete o que
acontece, ainda hoje, em muitos lares e muitas famílias, não só no Brasil.
Muitos dos entrevistados, nesta cooperativa, têm depoimentos semelhantes.
O que os aliviava, de certa forma, segundo alguns dos entrevistados, era a cesta básica de
alimentação que alguns recebiam de instituições beneficentes, normalmente ligados a
igrejas evangélicas e seitas espiritualistas, bastante comuns e atuantes em Franca.
Quando perguntados sobre o que mudou, com a abertura da Cooperativa,
muitos são enfáticos: “Tudo”. Respondem. E um detalhe que nos chamou a atenção está
novamente voltado para o uso de bebida alcoólica. “Aqui na Cooperativa, apareceu com
cheiro de cachaça, não trabalha. Volta para casa e, só no dia seguinte quando estiver bom
e se tiver serviço, trabalha”.
Segundo o Sr. José Abrile, Presidente da Coopertraf, eles realizam uma
espécie de rodízio na distribuição do trabalho, de modo que, havendo serviço, todos
possam trabalhar o maior número de dias possíveis na semana. É um sistema semelhante
ao adotado pelo Sindicato dos Movimentadores de Carga, não só de Franca, mas de outras
localidades onde existem e operam a locação de mão-de-obra. Entendem que é uma forma
justa e democrática de efetuarem a distribuição de serviço entre seus membros e
associados.
Quando perguntados sobre o relacionamento com a família, muitos se
emocionam às lágrimas. Pedro, muito desembaraçado agora, fala com entusiasmo. “A
mulher agora está mais feliz. Não apanha mais. Os filhos nos olham sem medo no rosto.
Como ela também costura sapatos (em Franca é muito comum a costura manual domiciliar
de calçados, quando, muitas vezes, toda a família se envolve na atividade), fica mais fácil
tocar a vida e cuidar dos meninos”. Pedro tem quatro filhos, entre 3 e 10 anos de idade.
No período em que desenvolvemos este trabalho, entre os meses de maio e
junho de 2000, a cidade de Franca atravessava relativa calmaria na área de produção de
calçado. Por calmaria, deve-se entender que as fábricas estavam com seus setores
produtivos em franca atividade. A conjugação desses fatores, segundo nosso entendimento,
pode estar proporcionando este aspecto favorável, não só no relacionamento entre os
cooperados, mas, inclusive, nas atividades da Cooperativa.
Informa-nos o Sr. José Abrile, da Coopertraf, que o rendimento mensal
médio dos associados é de cerca de dois salários mínimos, hoje algo por volta de trezentos
reais. Considerando-se que é uma época de pouco trabalho, em que a cafeicultura,
importante atividade econômica da região se encontra em trabalho de preparo para
colheita, o rendimento é considerado satisfatório, pela maioria deles. Aliado à renda
familiar, aqueles associados que quiseram responder a esta parte do questionário disseram
que sobrevivem com cerca de quinhentos reais mensais.
Como medida reguladora de suas atividades e relacionamento internos, a
Coopertraf possui um Regulamento Interno, que, entre outras, regulamenta a ingestão de
bebidas alcoólicas por parte de seus associados, em período de serviços, o qual, de forma
sucinta, transcrevemos26:
1. A Cooperativa, para efeitos jurídicos, passou a
funcionar a partir de 28/09/1998;
2. Não existe vínculo empregatício entre os Cooperados
e a Cooperativa, portanto, se o Cooperado vier a sair
ou a ser desligado da Cooperativa, nem a Cooperativa
deverá pagar nada a ele, tampouco ele deverá pagar
nada à Cooperativa;
3. O Cooperado só será escalado para o trabalho, desde
que a Cooperativa tenha recebido propostas de
trabalhos;
4. Se não existir proposta de trabalho para a
Cooperativa, também não existirá nenhum
impedimento para que o Cooperado seja livre;
5. Haverá um critério de escala de serviços por parte da
Cooperativa, procurando não deixar nenhum
Cooperado prejudicado, desde que haja serviços no
decorrer da semana;]
6. Não será aceito nenhum Cooperado trabalhar em
nome da Cooperativa, depois de haver ingerido
bebidas alcoólicas;
26 COOPERTRAF, Regulamento Interno, Franca/SP.1998. p. 2.
7. Será mantido junto à Cooperativa, um livro de pontos
para que todo o Cooperado possa assinar no horário
de chegada e saída;
8. Sempre que as normas da Cooperativa não forem
seguidas corretamente, será convocada, através da
Diretoria, uma Assembléia Geral Extraordinária, na
sede da Cooperativa, para os devidos ajustes.
Este documento é assinado por todos os associados que venham a ingressar
na Cooperativa, de modo que no futuro não aleguem ignorância quanto aos procedimentos
internos da Cooperativa.
Para que possa desenvolver suas atividades, a Cooperativa conta com uma
sede, localizada em ponto bastante favorável na cidade e que foi cedida pela Prefeitura, na
modalidade comodato, inclusive com telefone instalado. O compromisso dela para com a
municipalidade é a manutenção do local em condições de uso e higiene, devendo ser
evitado o uso de palavreado não condizente, já que as proximidades do local é área de
intenso trânsito de pessoas. Existe um acordo verbal com a prefeitura de que, a qualquer
tempo em que esta precisar das instalações, a Cooperativa deverá devolvê-las nas mesmas
condições em que a encontrou, razão pela qual o Sr. Abrile disse não efetuar grandes
melhorias no recinto. Parte dessas instalações são usadas como refeitório pelos associados,
que trazem suas refeições pela manhã, de modo que possam esquentá-las e tomá-las em
um local com um mínimo de privacidade e conforto.
Como medida de divulgação e marketing, mesmo que institucional, a
Coopertraf, segundo seu Presidente, Sr. Abrile, num primeiro momento, desenvolveu um
trabalho do tipo boca a boca, junto às empresas para as quais prestavam serviços na
condição de avulsos, os chamados chapas. Com a sua constituição e instalação, este
trabalho passou a ser feito por telefone e através da entrega de panfletos junto às empresas.
A Coopertraf, hoje, tem uma posição relativamente tranqüila. Possui uma
carteira de clientes que a procura sempre que tem necessidade de seus trabalhos. Nem por
isso descansa na conquista. Segundo sua diretoria, a Cooperativa está sempre em contato
com seus clientes e procura sempre descobrir clientes potenciais. São clientes da
Coopertraf empresas tradicionais da cidade de Franca, algumas muito conhecidas em todo
Brasil, como faz questão de frisar o Sr. Abrile, numa demonstração clara de que as
empresas, em geral, e os sindicatos, em particular, já não vêem com tanta reserva a atuação
das cooperativas de prestação de serviços.
Mencionamos aqui os sindicatos porque, segundo informação da
Cooperativa, estes têm se mostrado contrários ao surgimento e à implantação das
Cooperativas de Trabalho, segundo seus entendimentos, por eliminarem contribuições
financeiras e representatividade que os sindicatos julgam ser de sua alçada.
Como remuneração à Cooperativa, cada cooperado, por ocasião do
recebimento de sua prestação de serviços, tem descontado de seu pagamento uma parcela
correspondente a vinte por cento de seus vencimentos e que são destinados ao custeio das
despesas com a estrutura administrativa da Cooperativa, permitindo, assim, a sua
manutenção e sobrevivência. A maioria dos associados concorda com este percentual.
Sabem que ele é necessário para a sobrevivência da Cooperativa e para as suas próprias.
No que diz respeito a benefícios, a Coopertraf ainda não os proporciona aos
seus associados. Sua diretoria entende que, no mínimo, as contribuições ao INSS deveriam
ser pagas pela Cooperativa ao Associado, mas isto ainda não foi possível. Um plano de
saúde mais abrangente, como Plano de Saúde UNIMED, no momento é apenas uma meta
que esperam atingir. Pretendem, com a consolidação da Cooperativa, que parte do valor
retido pela mesma seja utilizada como um pagamento ou distribuição de sobra ao final do
ano, numa clara alusão ao décimo terceiro salário, ainda enraizada no inconsciente de
todos.
Em geral, a Cooperativa consegue trabalho todos os dias, mesmo que não
para todos os associados. Aqueles que não trabalham em um determinado dia, fazem parte
de uma lista preferencial para o dia seguinte, conforme já mencionado, fazendo-se
funcionar, então, o sistema de rodízio. Mesmo assim, a maioria daqueles que não
conseguem trabalho no dia, permanece nas instalações da Cooperativa, na esperança de vir
a trabalhar e/ou para conversar, estar à disposição e ser visto. Naturalmente, isso não é
obrigatório.
Todos registram suas presenças em um Livro de Presença mantido em local
de fácil acesso, nas instalações da Cooperativa. Aqueles que optam por não permanecerem
na Cooperativa e que, se eventualmente conseguem algum trabalho de natureza dos
oferecidos pela Cooperativa, fazem questão de trazerem os 20% cobrados pela mesma,
como se o trabalho fora oferecido por esta. Do nosso ponto de vista, dá-se aí o que
chamamos de fidelidade do cooperado para com a sua cooperativa.
Em média, cada associado trabalha três dias por semana, nesta época do
ano em que as atividades não são intensas. Segundo os cooperados da Coopertraf, hoje, em
razão da existência da Cooperativa e por dela fazerem parte, em média, eles trabalham
50% mais dias que quando faziam ponto, na condição de chapas, em variados locais da
cidade e nas rodovias que dão acesso à cidade. Desse modo, consideram a Cooperativa
como muito importante para suas vidas, mas entendem que ela ainda pode melhorar muito
sua condição de agenciadora de trabalho para os cooperados, otimizando sua prestação de
serviços através de maior divulgação da mesma.
Entendem também que as falsas cooperativas, denominadas fraudoperativas
ou gatoperativas, têm prejudicado o desenvolvimento e o trabalho das Cooperativas
verdadeiras. Sobre estas pseudo-cooperativas falaremos num tópico à parte.
Os cooperados têm esperança de que as empresas, com o passar do tempo,
percam o receio de contratar os seus serviços e esperam ainda que as empresas deixem de
fazê-lo apenas para aqueles trabalhos de natureza eventual (atividades meio), passando a
fazê-lo também nas suas outras tarefas diárias (atividades fim), como acontece, por
exemplo, entre outras, na Coopercivil – Cooperativa de Trabalhadores na Construção
Civil de Ituverava, que faz parte de nossa pesquisa de campo e de quem falaremos
oportunamente.
Um dado que nos chamou muito a atenção foi o fato de nenhum cooperado
ter demonstrado interesse em fazer parte do quadro de funcionários ou ser contratado por
quaisquer das empresas para as quais prestam serviços ou outras. A maioria dos que se
manifestaram sobre este assunto disse que se sente mais à vontade trabalhando na
Cooperativa ou mesmo que, se nelas não estivessem, não se dariam bem como empregados
registrados.
CAPÍTULO 5 AS COOPERATIVAS DE TRABALHO E A REDUÇÃO DE CUSTOS
DE PRODUÇÃO
5.1 As Cooperativas de Trabalho realmente proporcionam redução de
custos para as empresas?
Em nossos contatos com as empresas tomadoras dos serviços da Coopetraf,
separamos as empresas pesquisadas em dois grupos, considerando os seus portes, para os
padrões de Franca. Consideramos, para os fins a que se destinam este trabalho, os seus
faturamentos e número de empregados. Assim, empresas com mais de 100 funcionários e
cujo faturamento se situa acima de R$ 1 800 000,00, foram consideradas como de grande
porte. As, com faturamento e número de funcionários inferiores, foram consideradas como
de pequeno porte.
No grupo de empresas de pequeno porte, após a tabulação dos dados obtidos
em nossa pesquisa, pudemos verificar que, em média, o custo, na contratação da mão-de-
obra cooperativada não é levado em conta como fator de tomada de decisão. O que conta,
efetivamente, é a necessidade de a tarefa ser realizada. Se a empresa necessita efetuar uma
entrega de mercadoria comercializada, ou o caminhão precisa ser carregado ou
descarregado, ela telefona para a Cooperativa e pede um número de trabalhadores de
acordo com a necessidade e o volume do serviço a ser realizado. Como o valor do serviço,
normalmente, é tabelado, essas empresas apenas se preocupam em que a tarefa seja
executada adequadamente.
Quando inquiridas sobre a qualidade do trabalho realizado pelo pessoal da
cooperativa, responderam que é boa, mas que não têm muita preocupação com isso porque
sempre contratam a cooperativa e o trabalho, além de não interferir em seus negócios, é
bom. Nenhuma empresa declarou indicar este ou aquele trabalhador cooperativado para
realizar suas tarefas. Confiam esta responsabilidade à própria Cooperativa. Todos os
trabalhos realizados são na área de produção.
Inquiridos sobre se e quanto suas empresas estavam reduzindo custo, três
empresas não souberam ou não quiseram responder. Duas entendem que a redução de
custo na área específica é da ordem de até 5% e que, em termos globais de redução de
custos, disseram que até 2%.
Disseram ainda que os trabalhadores da Cooperativa são eficientes e
dedicados e que, em média, são mais dedicados que o pessoal próprio da empresa. Não se
registraram conflitos ente o pessoal próprio e o da Cooperativa, quando da realização de
tarefas conjuntas, na empresa ou fora dela. Apenas uma empresa mostrou interesse na
contratação e efetivação de pessoal da Cooperativa para seus próprios quadros, quando e se
houver necessidade, e nenhuma delas realiza supervisão direta das tarefas realizadas pelos
trabalhadores cooperativados. 60% delas tomam o serviço da cooperativa até duas vezes
por semana.
Nenhuma das empresas disse acompanhar a remuneração desses
trabalhadores por parte da Cooperativa e nenhuma delas teve problemas trabalhistas
relacionados com esta tomada de serviços, mas todas declararam já ter tido este tipo de
problema com outros trabalhadores eventuais, não ligados à Cooperativa. Todas esperam
que a legislação trabalhista brasileira se adeqüe a esta nova modalidade de relacionamento
capital x trabalho e que, com a sua popularização, ele seja amplamente aceito.
Nenhuma das empresas teve quaisquer questionamentos civis ou trabalhistas
decorrentes dessa tomada de serviços, sendo assim, concluímos que talvez tenha sido este
o motivo de todas recomendarem este tipo de prestação de serviços para outras empresas,
além de, no futuro, aceitarem discutir este tema novamente.
A conclusão dessa pesquisa com empresas de pequeno porte é que, embora
elas sejam tomadoras assíduas de mão-de-obra cooperativada e não ter a redução de custos
como fator determinante dessa contratação, elas o fazem também porque, necessitando de
mão-de-obra de natureza eventual e não precisando ter um ou mais funcionários ociosos
aguardando o momento de realizá-las, contratar a Cooperativa é fator de tranqüilidade
quanto a possíveis questões trabalhistas, o que normalmente acontece quando se contrata
trabalhadores avulsos, de caráter eventual. Estas empresas tomam esta prestação de
serviços porque se sentem, de certa forma, seguras quanto ao fato de não estarem
incorrendo em algum ilícito penal.
A seguir, transcrevemos os resultados das pesquisas levadas a efeito junto às
empresas de grande porte de Franca e, como já apresentamos, neste trabalho, assim
consideradas aquelas com número de funcionários a partir de 100 e/ou faturamento a partir
de R$ 1 800 000,00.
Os números apresentados por estes tomadores também são significativos,
uma vez que esta opção pode implicar, muitas vezes, a redução de seu quadro de
funcionários. Nenhuma das empresas pesquisadas admitiu, abertamente, haver estimulado
seus ex-funcionários a se organizarem em Cooperativas de Trabalho ou aventado a
hipótese de, em estes se organizarem em Cooperativas, voltarem a prestar serviços para a
empresa, mas sabemos, pela leitura do trabalho de Faria: (1999, p. 133)
Os sapateiros francanos foram estimulados, através
do Sindicato da Indústria de Calçados de Franca, (grifo
nosso) a optar por trabalhos cooperativos, da mesma
forma que aconteceu no ‘Vale dos Sinos’ – no Rio Grande
do Sul. Assim, no início de 1996, deu-se o começo de um
movimento na cidade, com a finalidade de organizar e
instalar duas Cooperativas de Trabalho – ‘Arco Iris
Cooperativa de Calçados Ltda.’ e a Cooperativa
Francana de Shoemakers, conforme noticiado no jornal
‘Diário da Franca’, de 25 de abril de 1996, p. 51.
Destacando que elas (as cooperativas) seriam constituídas
por ex-funcionários e/ou sapateiros desempregados.
Como o Sindicato da Indústria é o órgão representativo da classe patronal,
podemos inferir que tal fato tenha acontecido. No entanto, queremos deixar observado que
as Cooperativas, objeto de nosso trabalho, não prestam serviços à industria de calçados em
suas atividades-fim, portanto, o que afirma Faria pode realmente não ter acontecido nessas
empresas.
Como resultado das pesquisas nessas empresas, temos informações bastante
próximas às de pequeno porte. Destaque-se o fato de que estas empresas estão
profundamente preocupadas em reduzir custos e, mesmo sendo a contratação de mão-de-
obra da Cooperativa destinada às suas atividades meio e terem caráter eventual, sempre
que podem, negociam com a Cooperativa uma redução no valor do serviço a ser
desenvolvido.
Todas as empresas pesquisadas consideraram a qualidade do serviço
prestado, como muito bons e dentro de suas expectativas. Como nas empresas de pequeno
porte, nenhuma disse indicar este ou aquele trabalhador para realizar determinadas tarefas.
Igualmente confiam às mesmas ao bom senso das pessoas encarregadas dessa distribuição,
por parte da Cooperativa.
No aspecto de redução de custo, mesmo considerando a eventualidade da
prestação, essas empresas nos informaram que têm os seus custos específicos reduzidos em
cerca de 12%. Como o custo operacional dessas atividades influem diretamente no valor de
seus estoques, quando do recebimento de matérias-primas e nas despesas com vendas,
quando da realização do negócio, disseram que, a economia global de custos na atividade é
de cerca de 2,5 a 3,0%.
Como podemos observar, estes números são bastante próximos aos das
empresas de pequeno porte. No entanto, há que se considerar que aquelas não têm uma
preocupação acentuada com o fator custo, enquanto estas exercitam um controle mais
efetivo e rigoroso sobre este item.
As tarefas, na maioria dos casos, são realizadas no ambiente das empresas.
Este fato, segundo suas declarações, não causam embaraços no relacionamento com os
funcionários da empresa, mesmo quando da sua realização conjunta. Nenhuma delas
demonstrou interesse em contratar empregados oriundos da Cooperativa, quando e se
houver necessidade de contratação.
Estas empresas declararam não efetuar supervisão direta dos trabalhos
desenvolvidos pela Cooperativa, mas declararam que, ao término das tarefas, verificam a
qualidade dos serviços realizados e todas tomam os serviços da Cooperativa pelo menos
duas vezes por semana.
Com exceção de uma empresa, as demais declararam jamais ter tido
problemas de ordem trabalhista com a utilização de mão-de-obra cooperativada e todas,
como as de pequeno porte, esperam que a legislação brasileira pertinente ao assunto seja
flexibilizada para que as atividades das Cooperativas de Trabalho possam ser expandidas.
Perguntadas sobre se indicariam este tipo de prestação para outras empresas, nenhuma se
mostrou contrária a fazê-lo.
A empresa que teve problemas com esta contratação junto à Justiça do
Trabalho, segundo suas declarações, foi obrigada a firmar junto ao Tribunal Regional do
Trabalho da 15ª Região, sediado em Campinas (SP) um Termo de Compromisso, onde se
comprometia a não mais contratar trabalhadores pelo sistema de Cooperativas de Trabalho.
A conclusão a que chegamos, analisando-se os dados fornecidos pelas
empresas de grande porte não foi diferente das de pequeno, a não ser pelo detalhe da
preocupação com a redução de custo na área de produção, mesmo que o trabalho
desenvolvido pelos cooperados da Coopertraf o sejam em atividades meio. Estas empresas,
no entanto, demonstraram maior conhecimento das implicações legais e mesmo
administrativas dessa contratação e têm a redução de custos como fator principal na
contratação da mão-de-obra cooperativada.
Importante notar que todas essas empresas, as de pequeno e grande portes,
citadas nos parágrafos imediatamente anteriores, não utilizam a mão-de-obra cooperativada
em suas atividades-fim. Antes de trazermos e comentarmos os resultados obtidos com as
empresas que se utilizam dessa prestação nas suas atividades fim, queremos abrir um
espaço, neste trabalho, para comentarmos sobre as Cooperativas de Trabalho abertas com
a finalidade específica de fraudar a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
Para que não restem dúvidas sobre Cooperativas de Serviços e Trabalho, se
é que dúvidas ainda restem, vamos voltar à definição do que seja Cooperativa de Trabalho,
seus objetivos, surgimento no Brasil, sua formação e organização social e administrativa.
Vamos também compará-las com outras empresas não cooperativas, com destaque aos
aspectos dos encargos sociais para as empresas, além de outros temas relevantes e que,
esperamos, venham enriquecer este trabalho.
Desde sua gênese, passaram-se cerca de 156 anos em que o cooperativismo
cresce e se consolida, nos mais diversos aspectos da atividade humana, notadamente em
seu sentido econômico. A antiga idéia e os ideais que nortearam os Pioneiros continuam os
mesmos desde a fundação da primeira Cooperativa, em Rochdale, Inglaterra, em 1844.
Sabemos que os 28 artesãos que haviam perdido os seus postos de trabalho para as
primeiras máquinas modernas da nascente revolução industrial (tudo a ver com as
modernas técnicas robóticas de nossos dias), e por essa mesma revolução, foram
incentivados a buscar alternativas que lhes permitissem sobreviver, criaram a primeira
Cooperativa que se tem notícia no mundo e sua atividade era focada na atividade têxtil.
Como bem define Queiroz27
27QUEIROZ, Carlos Roberto S.R. de, Manual da Cooperativa de Serviço e Trabalho, 1997. P. 14.
A iniciativa tinha bom fundamento: o da
participação de todos para o bem comum deles. Foi
criada uma entidade para assistir os seus sócios e
intermediar as suas profissionalidades, negociando as
suas atividades com os eventuais tomadores de serviços.
Depois de alguns anos, a primeira Cooperativa já contava
com 1.400 associados.
O crescimento foi vertiginoso. Na Europa, em 1881,
já existiam aproximadamente 1.000 Cooperativas com
mais de 550.000 associados.
Tem-se notícia de que a primeira Cooperativa de
Serviços e Trabalho surgiu na França, também
influenciada pelo mesmo motivo que levaram os ingleses
de Rochdale a formar a sua Cooperativa.
Queiroz (1997, p. 14) nos historia o Cooperativismo de Trabalho
escrevendo que este aportou na América nas primeiras décadas do século XX e que,
especificamente, no Brasil, em 1932. O Decreto Federal n.º 22 239/32 o consolidou em
nosso país. Assim é que o artigo 24 desse Decreto definia bem o que era, naquela época,
Cooperativa de Trabalho:
“Cooperativa de Trabalho aquelas que, constituídas
entre operários de uma determinada profissão ou ofício,
ou de ofícios vários de uma mesma classe, têm como
finalidade primordial melhor os salários e as condições de
trabalho pessoal dos seus associados e, dispensado a
intervenção de um patrão ou empresário, se propõem a
contratar obras, tarefas, ou serviços públicos ou
particulares, coletivamente por todos ou por grupos de
alguns”.
Esse Decreto, especificamente o seu artigo 24, vigorou incólume até 1966,
quando definitivamente revogado pelo advento do Decreto-Lei de n.º 59/66. A Lei 5 764
promulgada em 16/12/71 disciplina a formação de Cooperativas, sejam quais forem as suas
naturezas, até hoje.
As Cooperativas têm crescido e se desenvolvido em todo o mundo,
procurando sempre as melhorias profissionais e sociais dos trabalhadores. Ainda segundo
Queiroz (1997), dados computados desde 1936 mostravam que, naquela época, elas eram
cerca de 236 000 e se desenvolviam rapidamente de tal forma que 30 anos depois, em
1966, já eram 575 000, num crescimento de 140%. Após 27 anos, num crescimento de
47%, em 1993, passaram a ser 850 000. Hoje já passaram de 1 000 000.
Existem, no Brasil, mais de 1 700 Cooperativas de Serviços e Trabalho e
que congregam mais de 1 500 000 Cooperados. O Estado de São Paulo detém cerca de
53% do total dessas Cooperativas. Mais de 60% das Cooperativas em atividades e 77% do
número de Cooperados desenvolvendo atividades de fornecimento de serviços
especializados.
Estes números, informados por Queiroz (1997), são bastante significativos,
principalmente nesse delicado momento pelo qual a economia de nosso país atravessa,
sendo obrigado, por força da globalização mundial da economia, a ofertar produtos com
ótima qualidade a custos baixos, uma tendência mundial, portanto, mas que, por força do
fechamento da economia e do mercado, que nos foram impostas pelos governantes
militares de 1964 a 1985, fez com que o Brasil perdesse competitividade, mercados e,
podemos até dizer, esqueceu-se de produzir com qualidade a custos competitivos.
O autor divulga os resultados de uma pesquisa levada a efeito no Brasil com
500 empresas, na região centro-sul do país, que se utilizam de mão-de-obra de
trabalhadores cooperativados. Os resultados obtidos publicados na imprensa foram os
seguintes:
• 92,5% vêem como uma boa opção para terceirizar
• 12,2% afirmam que reduz o investimento na mão-de-obra
• 19,1% observaram um aumento na qualidade dos serviços
• 9,3% acham que é uma boa opção para quem procura trabalho
• 8,6% opinam que desenvolvem serviços especializados com
profissionais capacitados
• 5,8% observaram que não há os encargos trabalhistas tradicionais
• 5,8% afirmaram que aumentou a produtividade
• 65,4% observaram que vai crescer a terceirização com
Cooperativas.
Normalmente, as Cooperativas são contratadas para desenvolverem a
terceirização na área de serviços de apoio.
Atualmente, das Cooperativas constituídas em São Paulo, 70% são de
Serviços e Trabalho.
Poderíamos entender os objetivos das Cooperativas de Serviços e Trabalho
pela sua própria definição. Mas entendemos ser insuficiente tal definição pela alta nobreza
dos objetivos verdadeiramente alcançados. Assim, tomamos por empréstimo a definição de
objetivos propostos por Queiroz (1997, p. 28, 29)
a) Melhoria da renda de seus associados
conseguindo valorizar o trabalho e obtendo melhor
negociação com referência à remuneração. Atuando como
um todo, o sistema cooperativo fiel aos seus princípios,
desenvolve o excedente gerado pelo trabalho coletivo aos
seus associados, na mesma proporção da quantidade e da
qualidade do trabalho prestado. As sobras não
privilegiam o capital, mas o trabalho na medida correta
da sua contribuição. Essas sobras se caracterizam como
uma remuneração adicional aos cooperados.
b) Incrementos nas condições do trabalho na
medida em que a cooperativa transforma trabalhadores
em empresários determinando, em conjunto e de forma
democrática, as regras da atuação da cooperativa. Os
direitos são garantidos pelo estatuto de tal forma que
garante ao associado a possibilidade da ação civil,
quando qualquer direito estatutário tiver sido violado. A
assembléia Geral é o órgão cooperativo decisor dos
destinos da Cooperativa. Os direitos sociais são
estatutários visando resguardar a predominância do
trabalho sobre o capital.
c) Melhorar a promoção dos trabalhadores, pois
estes ao adquirirem o “status” de empresários tornam-se
auto gestores de suas próprias atividades. A praxe
solidária demanda a restrita obediência aos princípios
cooperativos, sendo o mais importante o da “livre
adesão”. Esta deverá ser consciente, voluntária, sem
constrangimentos ou pressões, sob pena de não existir a
caracterização da sociedade cooperativa. Os cooperados
precisam conhecer os seus direitos e deveres e terem uma
clara noção das obrigações associativas.
O autor ainda destaca a importância de os Cooperados estarem motivados
para o desenvolvimento de determinada atividade cooperada para um tomador, para que os
trabalhos sejam prestados de forma eficiente e com resultados eficazes, e isto somente será
possível se não houver interrupção ou a flutuação da mão-de-obra cooperada.
Ensina-nos Ferreira28 que as cooperativas surgiram há mais de 150 anos na
Inglaterra, formada por pessoas com recursos financeiros escassos e que se reuniam, sem
objetivar lucros mas, juntando seus esforços, procuravam satisfazer suas necessidades
básicas.
Outra importante definição é de Mendonça29, que assim define as
cooperativas:
São institutos modernos, tendentes a melhorar as
condições das classes sociais, especialmente dos pequenos
capitalistas e operários. Elas procuram libertar essas
classes da dependência das grandes indústrias por meio
da união das forças econômicas de cada um; suprimem
aparentemente o intermediário, nesse sentido, as
operações ou serviços são realizados ou prestados aos
próprios sócios e é exatamente para esse fim que se
organiza a empresa cooperativa: diminuem despesas, pois
que, representando o papel do intermediário, distribuem
os lucros entre a própria clientela associada; em suma,
28 FERREIRA, Waldemar, Tratado de Direito Comercial, Saraiva: São Paulo, 1960, p. 503. 29 CARVALHO de Mendonça, Tratado de Direito Comercial Brasileiro, Freitas Bastos: Rio de Janeiro,
1959, vol. 4, título 7, p. 241.
concorrem para despertar e animar o hábito da economia
entre os sócios.
Muito vigorosa a definição de Carvalho de Mendonça. Se o autor nos
permitisse, apenas faríamos um pequeno reparo em sua brilhante citação: substituiríamos o
termo lucro, que em Cooperativas não se aplica, pelo termo sobra, que é o que se verifica
nas sociedades cooperativas, que, sendo uma sociedade de pessoas e não de capital, não
objetivam o lucro. Mais que semântica, esta é uma questão conceitual.
Discorrendo sobre o objetivo da Cooperativa, assim se manifesta Cavalcante
Júnior30:
O objetivo da cooperativa é, através da união de
esforços e capital, propiciar benefícios aos cooperados,
mediante a distribuição de lucros na proporção do
trabalho prestado pelos sócios, dentro do espírito de
mútua ajuda. Há nas sociedades cooperativas uma
duplicidade nas funções de empregado e patrão, porque
ambos realizam simultaneamente o trabalho de execução
e de direção com repartição dos lucros entre os sócios.
Novamente a idéia de lucro, segundo o nosso entendimento, utilizado de
forma diferenciada. Bem sabemos que a intenção do autor quanto a essa referência, é que
se tratam de sobras, mas reiteramos e estendemos a Cavalcante Júnior, a observação que
fizemos a Carvalho de Mendonça quanto à utilização do termo. Destaca Cavalcante Júnior
que a primeira normalização das cooperativas no Brasil se deu com a promulgação da Lei
1 637, em 1907, que em seu artigo 10 disciplinava:
As sociedades cooperativas que poderão ser
anônimas, em nome coletivo ou em comandita, são
regidas pelas leis que regulam uma dessas formas de
sociedades, com as modificações estatuídas na presente
lei”, o que foi regulamentado pelo Decreto n.º 22 239/32.
30 CAVALCANTE JÚNIOR, Ofhir, A Terceirização das relações laborais, LTr: São Paulo, 1996, p. 64.
Sabemos que, hoje, as sociedades cooperativas são regidas pela Lei
n.º 5 764/71. Muito já se falou sobre essa lei, neste trabalho, mas retornamos ao seu artigo
4º, para novamente falarmos sobre a definição de cooperativas: “sociedade de pessoas,
com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência,
constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades
pelas seguintes características:”. A seguir, a Lei elenca onze itens que caracterizam as
sociedades cooperativas, os quais entendemos ser importante transcrevermos:
I – adesão voluntária, com número ilimitado de
associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de
serviços;
II – variabilidade do capital social, representado
por quotas-partes;
III – limitação do número de quotas-partes do
capital para cada associado, facultado, porém, o
estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se
assim for mais adequado para o cumprimento dos
objetivos sociais;
IV – inacessibilidade das quotas-partes do capital a
terceiros, estranhos à sociedade;
V – singularidade de voto, podendo as cooperativas
centrais, federações e confederações de cooperativas, com
exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo
critério da proporcionalidade;
VI – “quorum” para o funcionamento e deliberação
da Assembléia Geral baseado no número de associados e
não no capital;
VII – retorno das sobras líquidas do exercício,
proporcionalmente às operações realizadas pelo
associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia
Geral;
VIII – indivisibilidade dos fundos de Reserva e de
Assistência Técnica, Educacional e Social;
IX – neutralidade política e indiscriminação
religiosa, racial e social;
X – Prestação de assistência aos associados, e,
quando prevista nos estatutos, aos empregados da
cooperativa;
XI – área de admissão de associados limitada às
possibilidades de reunião, controle, operações e prestação
de serviços.
Como podemos perceber através do item VII das características das
sociedades cooperativas, o termo utilizado é sobras e não lucros, como insistem alguns
autores.
SAAD (Apud Cavalcante Júnior, 1996, p. 681) destaca que a “atividade
centenária das sociedades cooperativas é largamente utilizadas em países de estágio
econômico avançado, estando plenamente incorporados à realidade jurídica, social e
econômica desses povos .“
A presença desse elemento novo nas relações laborais no Brasil criou
celeumas de toda sorte. Poderes de vida e de morte sobre o trabalho a ser executado que
eram atribuídos aos patrões foram, a partir da entrada em cena das Cooperativas de
Trabalho, delegadas aos empregados, agora travestidos de empregadores, ou de patrões,
como bem podemos dizer, uma vez que donos de seus próprios negócios. Criou-se uma
relação triangular envolvendo a sociedade, o cooperado e o cliente. Assim se manifesta
Cavalcante Júnior (1996, p. 65) quanto a esse relacionamento:
Essa triangularização, nem sempre bem utilizada e
às vezes mal-interpretada, tem sido objeto de críticas e até
mesmo de decisões judiciais preconceituosas porque
partem da premissa, equivocada, de que há fraude no
momento em que antigos empregados de empresas
desvinculam-se destas para formar cooperativas e prestar
serviços ao antigo empregador, o que não pode ser
adotado como verdade absoluta e muito menos como
regra, pois haverá necessidade de, em cada caso,
examinar a situação verificando a existência de fraude.
O que não se pode admitir é que haja o
engessamento da economia e o comprometimento de
postos de trabalho pela resistência, muitas vezes
injustificada, de certo segmento doutrinário e da
jurisprudência, que, contrariamente à tendência mundial
da desconcentração das atividades empresariais, continua
preso ao mito do emprego típico.
A Lei 8 949/94 é o ordenamento jurídico que regulamenta a terceirização da
prestação de serviços por parte das sociedades cooperativas. Essa Lei acrescentou ao artigo
442 da CLT, o seguinte parágrafo: “Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade
cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e
os tomadores de serviços daquela.”
Uma parte do Poder Público, aqui representado pelo Ministério do Trabalho,
observando a necessidade de impor disciplina e fiscalizar a contratação de mão-de-obra por
parte das empresas tomadoras de serviços de sociedade cooperativas, editou a Portaria
GM/MTb n.º 925, de 28/09/95 (DOU 29/09/95), que, em total desrespeito à Lei 5 764/71 e
à Carta Magna de 1988, avocou para si o direito e a competência a seus fiscais de
realizarem levantamentos físicos com a finalidade de detectar a existência de requisitos da
relação de emprego entre a empresa tomadora e os cooperados, nos termos do artigo 3º da
CLT.
Destacamos, novamente a opinião de Cavalcante Júnior (1996, p. 66) quanto
a esta postura do Poder Público:
Com efeito, a Portaria em tela é de uma ilegalidade
que, para dizer o mínimo, assusta qualquer operador do
Direito, primeiro porque se arreda da missão institucional
do órgão administrativo conferindo poderes aos fiscais do
trabalho de, examinando a situação, decidir acerca da
existência de relação de emprego, matéria da exclusiva
alçada do Judiciário trabalhista (At 114, CF) e segundo
porque tenta, em verdade, revogar a Lei, onde está dito,
com todas as letras, inexistir vínculo de emprego entre as
cooperativas e seus associados, o que não pode ser aceito.
O procedimento do Ministério do Trabalho
demonstra que há segmentos do Poder Executivo que
laboram contra o desenvolvimento econômico, apeando-se
em premissas falsas para editar Portarias ilegais que
prejudicarão em sem-número de iniciativas no sentido de,
através da terceirização das relações de trabalho, criar
novos empregos.
Como podemos ver, a idéia do Cooperativismo de Trabalho não é recente.
Não se trata aqui de definir modismos ou aventuras, mas, apenas, de reafirmar uma idéia e
a existência de uma instituição que existe e funciona sesquicentenariamente. Se é que se
necessite de alguma reafirmação. Abusos existem, não os podemos negar. Mas considerar
as Cooperativas de maneira geral, fraudulentas, nos parece um abuso de poder e de
autoridade que vai além do permitido à magistratura. Benato31, aborda este assunto ao
criticar, de forma veemente, a ingerência do Poder Judiciário na vida das Cooperativas de
Trabalho. Diz-nos o autor:
...Há uma Lei datada de Dezembro de 1971, a 5 764,
que disciplina, orienta e determina o ‘modus operandi’
das cooperativas.
Não é uma Medida Provisória, não é um Decreto-
Lei, não é uma simples Portaria. É uma LEI. Sancionada
em 16 de dezembro de 1971 pelo então Presidente Emílio
Garrastazú Médici. A própria Constituição promulgada
em 1988 não a anulou; pelo contrário, comprometeu mais
ainda o Poder Público através do § 2º do Art. 174.
A Justiça do Trabalho, no entanto, bem como alguns
magistrados do Ministério Público entendem ser a C.L.T.
- Consolidação das Leis do Trabalho – a única verdade
intransigente de defesa do trabalhador. Ora, bem o
sabemos, que o trabalhador não é apenas o assalariado.
Trabalhador é, também, quem contrata o assalariado.
31 BENATO, João Vitorino Azolin, Cooperativa de Trabalho, o Gigante Acorda, 1997. P. 39-42.
A C.L.T. não entende e não compreende esta
bilateralidade. Outorga ao assalariado todos os
benefícios e ao trabalhador empregador o ônus e as
obrigações.
O autor continua em sua sanha defensiva das Cooperativas de Trabalho,
citando o fato que, a partir da década de 80, com o início do processo de globalização da
economia, em que as empresas buscaram a produtividade através da tecnologia e muitos
trabalhadores perderam seus empregos e, a partir desse episódio, valem-se da experiência
de cooperativistas militantes no desenvolvimento profissional individual para a
implantação das Cooperativas de Trabalho, citando exemplos de Unimed’s, Uniodontos,
Unipsicos, Processamento de Dados, Condutores de Veículos e outras, tanto urbanas
quanto rurais. Ele continua:
O volume assustou os detentores da verdade
celetista e aos sindicatos, que até então, nada faziam aos
seus filiados. Entenderam eles que tal crescimento viria
prejudicar interesses comuns, bem como dificultar a
aplicação do dogma celetista. Movimentaram-se e outros
oportunistas se agregaram ao movimento, principalmente,
advogados trabalhistas, juizes classistas e outros juizes
trabalhistas.
Criaram o anti-cooperativismo desprezando a Lei
número 5 764/71 e a Carta Magna.
A eles pouco valia tem que mais de 30% (trinta por
cento) dos assalariados brasileiros não possuem carteira
profissional. A eles pouco valia tem que o mercado
informal mantém ativados 45% (quarenta e cinco por
cento) da população ativa brasileira. A eles pouco valia
tem que 80% (oitenta por cento) dos trabalhadores
brasileiros percebem um salário mínimo pelo seu
trabalho.
Benato (1997,p. 40) faz outros comentários. Segundo ele, sindicatos e
advogados, bem como certo juizes, são contra as Cooperativas de Trabalho porque estas
confrontam os sindicatos inoperantes e alienantes, neutralizando a indústria das demandas
trabalhistas. O autor cita como relevante o fato de as Cooperativas existirem muito antes
dos sindicatos e da C.L.T. e que esta conduta de oposição ocasionou e tem ocasionado
prejuízos a milhares de famílias, principalmente as da zona rural, teoricamente mais
influenciáveis. Segundo suas palavras, ... nem Stalin e Hitler em seus desmandos
praticaram tanta arbitrariedade. E o Poder Executivo, o solidário e co-responsável
constitucional pelo incremento do cooperativismo, cruza os braços e prefere
emudecer.(Benato, 1997, p. 40-41) Diz o autor, que a arbitrariedade dos ‘defensores’ do
assalariado chegou ao ponto de o Ministério do Trabalho editar um Manual de
Cooperativas, que o contribuinte pagou, em que os erros cometidos pela autora vão da
citação de artigos suprimidos da Lei 5 764/71, através da Constituição de 1988, a apelos
contidos no Artigo 24º, do Decreto 22 239/22, já revogado. Ainda segundo Benato (1997,
41-42), nesse emaranhado de conceitos e indagações contidos no Manual, a autora, Dra.
Ruth Beatriz V. Vilela, Secretária da Fiscalização do Trabalho à época, 1997, outorga
poderes de Agente de Inspeção do Trabalho para verificar se a Cooperativa atende a todos
os requisitos da Lei 5 764/71, dentre os quais destaca que o agente deverá observar:
“1) Se a Cooperativa atende ao princípio da Dupla Qualidade
preconizados pelo artigo 4º da Lei 5 764/71;
2) Se a Cooperativa atende ao Princípio da Redistribuição Pessoal
Diferenciada.
O autor zomba do Manual de Cooperativas quando diz que “será necessário
editar um novo Manual para explicar e interpretar o Manual de Cooperativismo editado
pelo Ministério do Trabalho” Pede ainda que o Poder Público fiscalize com firmeza e
personalidade os desvios da Lei e que unam competência e capacidade para atender os três
vocábulos que imprimem a vinculação trabalhista, citando:
Subordinação: Não queirais estatui o conceito que
em sendo o sócio da cooperativa um trabalhador
autônomo, não poderá ele ter subordinação para com a
sociedade. Sua subordinação não é individual e, sim,
coletiva por ser a sociedade, uma sociedade de pessoas.
Não poderá haver subordinação do cooperado ao
tomador do serviço.
Pessoalidade: Individualidade profissional do sócio
que pode executar o trabalho.
Eventualidade: Há contratos que dispensam o
período de trabalho. Nem sempre, portanto, a
eventualidade é sintoma de vínculo.
A existência destas três situações, senhores agentes
do Ministério do Trabalho, é suficiente para constatar o
vínculo empregatício.
A ausência de uma delas, descaracteriza o vínculo.
Esta expressão é milenar e persiste quando se quer
identificar a verdade e relegar a mentira”.
O assunto é controverso. Se por um lado, temos que uma parte do Poder
Público incentiva a organização e a criação de Cooperativas, de outro temos que, alguns
legisladores entendem o assunto de maneira diferente e são manifestamente contra a
atuação das Cooperativas como agenciadoras de trabalho profissional. A Constituição de
1988, em seu art.174, parágrafo 2.º, apoia a criação de Cooperativas, vejamos:
Art.174 – Como agente normativo e regulador da
atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da Lei,
as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,
sendo neste determinante para o setor público e indicativo
para o setor privado.
Parágrafo 2.° - A Lei apoiará e estimulará o
cooperativismo e outras formas de associativismo.
Podemos observar, então, que há uma clara tendência a se conceder às
Cooperativas um tratamento, no mínimo, diferenciado, para não dizermos preferencial.
Existem notícias de que, em razão da reforma administrativa perpetrada pelo governo
federal, algumas entidades do governo têm incentivado seus ex-funcionários a organizarem
Cooperativas de Serviços e Trabalho.
A Constituição do Brasil exige Leis a favor do cooperativismo. Alguns
Estados da Federação, notadamente os da região sul, já desenvolvem ações específicas de
incentivo ao Cooperativismo há muito tempo. A Constituição do Rio Grande do Sul, em
seu artigo 163, diz o seguinte:
Art. 163 – incumbe ao Estado a prestação de
serviços públicos, diretamente ou através de licitação, sob
o regime de concessão ou permissão, devendo garantir-
lhes qualidade.
Parágrafo Primeiro – Na hipótese de privatização
de empresas públicas e as sociedades de economia mista,
os empregados terão preferência em assumi-las sob a
forma de Cooperativas.
Como contrários às Cooperativas de Trabalho, além de parte do Poder
Público e como já dissemos, temos uma parte da mídia, no caso a escrita, que comumente
volta ao assunto quando se trata da divulgação e dados negativos relacionados ao
cooperativismo. A título de ilustração, o jornal Folha de São Paulo32,, em publicação de 18
de janeiro de 1998, critica de forma bastante expressiva a perda, por parte dos
trabalhadores, dos benefícios garantidos pela C.L.T., em razão de estarem fazendo parte de
Cooperativas de Trabalho e não mais estarem trabalhando com suas carteiras assinadas.
O articulista desenvolveu o seu trabalho de reportagem nas cidades de Fortaleza, no Estado
do Ceará, Brasília/DF e em Araraquara, Estado de São Paulo. Diz o autor na introdução de
sua reportagem:
Há uma esperteza perversa sendo cometida contra
os direitos trabalhistas de uma multidão de brasileiros.
Entre 2,5 milhões e 3 milhões de cidadãos, pouco menos
de 10% da população economicamente ativa do país, já
trocaram o trabalho assalariado com carteira assinada e
direitos trabalhistas consagrados – como repouso
semanal remunerado e as férias ao final de 12 meses
32 Folha de São Paulo: Cooperativas deixam 2,5 mi sem direitos. 18/01/98 p.12 e13.
ininterruptos de trabalho – por vínculos autônomos com
empresas intermediados por ‘cooperativas de ocasião’.
Estas cooperativas são fundadas com o fim
específico de servir a determinadas empresas. Criadas sob
a Lei das Cooperativas, que transforma os sócios destas
entidades em autônomos, tais “cooperativas de ocasião”
são contratadas por empresas, por prefeituras do interior
e até por hospitais para prestar serviços específicos.
Contratando-as, as empresas ou prefeituras não
pagam impostos ou contribuições sociais sobre o salário
de seus funcionários – transformados em cooperados –
nem estão obrigadas a respeitar princípios fundamentais
da legislação trabalhista como as férias após 12 meses de
trabalho, repouso semanal remunerado, licenças
maternidade e paternidade ou depósito no Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
A reportagem cita a região nordeste do Estado de São Paulo, onde 45 mil
trabalhadores nas colheitas de laranja foram obrigados a se dobrar aos contratos de
trabalho por meio de Cooperativas, não podendo contar, então, com os direitos trabalhistas
descritos pelo autor, segundo o qual, na região sudeste do Brasil existem mais de 100 mil
trabalhadores da indústria da construção civil nestas condições.
O autor assim se expressa, quando se refere às Cooperativas e Trabalho da
região nordeste do Brasil:
No Nordeste, a novidade está mais disseminada. Na
Paraíba e em Alagoas tenta-se reerguer o parque
industrial têxtil e ali criar pólos de fabricação de sapatos
tendo por base a contratação de trabalhadores por
cooperativas. No Ceará, tais contratações são de uma
naturalidade absurda. (grifo nosso) O maior hotel
“resort” do litoral cearense, o “Praia das Fontes Park
Hotel”, não tem nenhum empregado na sua folha de
pagamentos. Todos os seus funcionários pertencem a uma
cooperativa criada sob medida para os serviços do
empreendimento.
A cooperativa que serve ao hotel cearense, chamada
Coosert (Cooperativa dos Profissionais em Serviços
Turísticos do Ceará), cresceu tanto que há uma semana
assinou um contrato com a prefeitura de Beberibe (a 80
km de Fortaleza) onde fica o hotel: seus cooperados serão
responsáveis pelo serviço de limpeza urbana e de
ajardinamento do município e pela manutenção do
hospital municipal.
Assim, o tesouro de Beberibe exime-se de fazer
concurso público para contratar funcionários e passa a
ter servidores sem direito a férias, a 13.º salário, a
repouso semanal remunerado ou a recolhimento do FGTS.
Todo um polo de indústrias de calçados no Ceará, cujos
produtos são destinados à exportação, foi montado sob o
regime das cooperativas de trabalho. Outros municípios,
além de Beberibe, já se preparam para contratar
funcionários públicos por meio de “cooperativas de
ocasião”.
“Isto é uma perversidade absurda. Foi um erro
imperdoável do Congresso aprovar uma lei explicitando
na C.L.T. (Consolidação das Leis Trabalhistas) que o
trabalhador contratado por uma empresa sob o guarda-
chuva de uma cooperativa não teria vínculos com seu
empregador”, protesta Almir Pazzianotto, Ministro do
Tribunal Superior do Trabalho (TST). ‘Ou foi pouco caso
com a legislação trabalhista ou foi pura
irresponsabilidade’, diz.
O atual Ministro do TST já foi Ministro do Trabalho do Brasil em governos
anteriores e quando se refere à nova redação do artigo 442 da C.L.T., quer enfatizar o fato
de que trabalhadores contratados pelas empresas, através de Cooperativas de Trabalho, não
têm nenhum vínculo empregatício, tampouco direitos trabalhistas, com a Cooperativa ou
com as empresas que as contratam.
Esta nova redação do artigo 442 da C.L.T. foi elaborada a pedido do M.S.T.
Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, em razão do grande número de ações
trabalhistas que passou a sofrer por parte de ex-militantes que alegavam vínculo de
trabalho e emprego com o movimento, pleiteando o pagamento de direitos trabalhistas pelo
trabalho desempenhado nos assentamentos em regime de cooperativas.
José Carlos de Souza, Promotor de Justiça na cidade paulista de Catanduva
(a 350 km de São Paulo) diz, na reportagem citada da Folha de São Paulo:
Quem contrata mão-de-obra barata das
cooperativas precisa se cuidar melhor. O vínculo
empregatício não ocorre apenas pelo contrato de
trabalho, mas sim por diversos tipos de relação: Quem
paga o salário? Quem dá ordens no empregado? Quem
determina o ritmo da atividade produtiva do funcionário?
Quando fica caracterizado que se falsifica uma
cooperativa apenas para burlar o Direito do Trabalho e
não recolher direitos sociais, impostos e taxas sobre
trabalho assalariado, o contratador da cooperativa terá
que pagar como um empregado normal.
O repórter menciona o Deputado Aloysio Nunes Ferreira que, tendo votado
favoravelmente ao projeto em 1995, considera agora que cometeu um erro e já redigiu,
apresentou e aprovou na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei retirando da C.L.T. o
artigo 442. Apresenta ainda declarações de vários trabalhadores que se dizem prejudicados
por terem que adotar o regime de trabalho através das Cooperativas de Trabalho, como se
de fato, fossem obrigados a tal proceder.
Mas nem todos os tomadores de mão-de-obra preferem a utilização da mão-
de-obra cooperativada. A Grendene, dona de sete fábricas de calçados somente no Estado
do Ceará, diz achar o sistema de mão-de-obra cooperativada desleal e que prefere pagar os
direitos dos trabalhadores a contrata-los através das cooperativas. Sua sede em Farroupilha
(RS) tem 600 funcionários e a empresa diz ter recebido incentivos do governo do Ceará
para sua transferência para aquele Estado. A reportagem não menciona quanto recebem os
trabalhadores com registro em carteira no Rio Grande do Sul e quanto recebem seus
patrícios cearenses. Na opinião de Rudimar Dalonder, Diretor de Produção Geral da
Grendene, que responde pelas unidades fabris do Ceará, esse tipo de relacionamento não
vai dar certo:
Não acredito na lisura das cooperativas que estão
servindo aos nossos concorrentes no Ceará. Preferimos
pagar os direitos trabalhistas de todos os empregados,
mesmo onerando a folha de pagamento em 100%, a
depender de cooperativas de trabalho formadas por
ocasião. Isso vai dar errado. Acho desleal concorrer com
indústrias que recorrem ao modelo de cooperativas. Elas
acabam tendo um custo menor que o nosso.
Dalonder faz menção a várias outras empresas no Ceará que utilizam mão-
de-obra das cooperativas, conseguindo, por conseqüência, oferecer produtos com custos
mais baixos que os seus. No Estado do Ceará, somente para atender ao setor calçadista,
existem cerca de 3 500 trabalhadores cooperativados.
A Justiça Trabalhista brasileira, inicialmente, considerava a empresa
tomadora dos serviços como responsável, a priori, pelos recolhimentos dos encargos legais
trabalhistas, no que diz respeito aos empregados das empresas prestadoras. Assim, caso as
empresas prestadoras de serviço deixassem de recolher os encargos sociais de sua
responsabilidade, decorrentes do labor de seus empregados, estes, em uma lide trabalhista,
viriam a ser cobrados das empresas tomadoras dos serviços.
5.2 Mas afinal, o que são as pseudoperativas?
As cooperativas verdadeiras são aquelas constituídas, operacionalizadas e
fundamentadas na Lei 5 764/71.
Queiroz (1997, p. 69) reconhece haver um certo abuso na interpretação do
art. 442 da CLT e assim se manifesta:
‘O art. 442 – § único da CLT diz que qualquer que
seja o ramo da atividade e não qualquer que seja o modo
de execução dos serviços. O entendimento correto desta
afirmativa é fundamental para avaliarmos qual seria a
atitude correta na relação entre Cooperativa e Cooperado’.
Todas aquelas cooperativas que se valem da lei, mas, na prática, funcionam
ou operam ao arrepio da Lei, são consideradas como pseudocooperativas. Em outras
palavras, o modo como a cooperativa opera é o fator determinante de sua legalidade. Os
serviços que vierem a ser executados por essas Cooperativas devem ser de tal modo que
não deixem dúvidas quanto à lisura e à legalidade da cooperativa.
Utilizando-nos de uma definição de Queiroz (1997, p.119), Fraudoperativa:
É a Cooperativa criada anomalamente, ou seja,
organizada única e exclusivamente com a intenção de
simular uma situação pseudolegalizada, apenas para se
aproveitar de uma oportunidade, para tirar vantagens
econômicas de uma determinada ocasião’.
O autor destaca ser a típica cooperativa formada de maneira impositória,
compulsória, na maioria das vezes, conduzidas por pessoas sem quaisquer escrúpulos que,
por força do convencimento, induzem os trabalhadores a fazerem parte de uma cooperativa
de trabalho, mas não lhes desvendam o que seja realmente uma cooperativa, seus direitos e
obrigações. Na verdade, esses trabalhadores são induzidos a assinarem muitos papéis e
documentos dos quais não têm conhecimento ou são incapazes de discernir sobre suas,
importâncias, e grau de riscos que correm, a partir daí.
Geralmente, são prepostos de tomadores dos serviços da Cooperativa que
estão por trás dessas organizações, os quais, segundo temos notícias, assumem o papel de
procuradores dos cooperados e por eles decidem segundo seus próprios interesses e os de
seus tomadores. São os chamados donos da Cooperativa, perpetuando-se na sua direção, na
intenção de controlá-las sempre e manterem as suas fontes de rendimento e o interesse dos
tomadores.
Outra forma de Cooperativa fraudulenta são aquelas denominadas
Gatoperativa ou Coopergato. São Cooperativas de altíssimo risco, muito parecidas com as
Fraudoperativas. Geralmente constituídas por chefes de turma, atendem aos interesses dos
mesmos e dos tomadores dos serviços. São mais atrevidos e não dissimulam suas
condições. Existem aqueles que se consideram donos da Cooperativa e nela colocam seus
próprios nomes, como por exemplo CooperDaniel, CooperCarlos etc.
O trabalho de convencimento dos trabalhadores para que dela participem é
feito por processo de dissimulação e ilusão da boa fé dos trabalhadores, aos quais são feitas
promessas que, certamente, não serão cumpridas. Esses gatos não esclarecem
suficientemente os associados no momento de seus ingressos e estes acabam assinando
documentos dos quais, também, não conhecem o teor ou a finalidade. Quando descobrem
que caíram em armadilhas, já estão de tal forma envolvidos que, muitas vezes, mal
conseguem voltar aos seus locais de origem.
Estas Cooperativas normalmente contratam esses trabalhadores fora de seus
locais de atuação, transportando-os para os locais onde os trabalhos serão desenvolvidos,
acomodando-os em situações subumanas. Queiroz (1997, p. 122) também as cita em seu
trabalho:
As ‘fraudoperativas’, as ‘gatoperativas’ e as
‘coopergatos’ surgem com mais freqüência na área
agrícola, onde a simplicidade e a desinformação do
trabalhador é mais comum. São também encontradas nas
áreas urbanas, principalmente nos projetos de
terceirização das áreas mais simples.
Tanto na ‘fraudoperativa’, quanto na
‘gatoperativa’, os trabalhadores não são informados a
respeito de seus direitos e obrigações como Cooperados,
proprietários quotistas das sociedade que formaram. Não
sabem o que é ser Cooperado, nem o que é uma
Cooperativa de Trabalho.
Em uma como em outras, os ‘donos’ das
Cooperativas de risco controlam as atividades dos
Cooperados e a sua remuneração. Dessa relação
procuram tirar a maior vantagem possível, pagando aos
trabalhadores cooperados nos limites que lhes interessam,
embolsando a maior parte da remuneração.
Certamente, nessas Cooperativas, os cooperados não exercem os seus
direitos de votar e serem votados, que são os direitos básicos do cooperativismo, quanto
mais participarem do rateio das sobras e outras vantagens próprias do sistema.
Normalmente, tudo é feito de forma a que não questionem os destinos da sociedade, que na
verdade, são ditados e dirigidos ao sabor do interesse dos tomadores e dos gatos que os
arregimentam e induzem.
No desenvolvimento deste nosso trabalho, no contato com as diversas
Cooperativas de Trabalho, pudemos verificar que, de maneira geral, os seus dirigentes
estão sinceramente imbuídos de boas intenções, no que diz respeito à legalidade e ao
funcionamento dessas Cooperativas.
O que eles buscam, de maneira geral, é o bem estar de seus associados e
possibilidades de mantê-los com trabalho a maior parte dos dias.
Esta também é a razão pela qual optamos por escolher, para estudo de caso e
a finalidade a que nos propomos neste trabalho, a Coopertrataf e a Concivil, uma vez que,
segundo nosso próprio entendimento, eles se nos apresentaram com transparência,
facultando-nos o acesso aos seus livros fiscais e contábeis, bem como facilitando as
entrevistas com os demais associados não diretores.
Dizer que as demais Cooperativas da cidade e região, abrangidas por nossa
pesquisa são ou não arremedos de Cooperativa ou têm finalidade precípua de burlar a
legislação e escapar da carga tributária fiscal e social imposta às demais empresas não
Cooperativas, está além do nosso alcance e foge dos objetivos a que nos propomos.
É muito provável que das Cooperativas que entrevistamos, existam aquelas
que se prestam a tais torpezas, mas não emitiremos aqui juízo de valor no que diz respeito
às mesmas. Ficaremos com o exemplo já mencionado neste trabalho, da Cooperativa Arco-
Íris, que tendo, segundo nossa compreensão, e por termos prestado assessoria profissional
aos seus associados quando de parte do seu funcionamento, em princípio entendemos ser
ela uma Cooperativa cujos componentes eram probos e que os mesmos não se desviariam
dos princípios estabelecidos no cooperativismo. Do nosso ponto de vista, sentimos que
houve injustiça para com o tomador de seus serviços, que teve que se curvar à imposição
da Lei, que o obrigou a reconhecer o vínculo trabalhista, impondo, ainda, sanção
pecuniária ao tomador em favor dos cooperados da mesma.
Reiteramos aqui o fato de que nem todos os cooperados foram favoráveis a
tal procedimento. Lamentamos muito a atitude tomada pelos cooperados e a decisão
proferida pela Justiça, mas entendemos que esta julga segundo a Lei e que aquele era um
momento, ainda que bastante recente tal fato, desfavorável ao cooperativismo e que o
julgador julgou segundo lhe pareceu correto e devido.
5.3 Qual a efetiva participação das Cooperativas de Trabalho na
Terceirização?
Já vimos, neste trabalho, que, no Brasil, existem mais de 1 700
Cooperativas de Serviços e Trabalho e que estas congregam mais de 1 500 000
Cooperados. Desse montante, o Estado de São Paulo detém aproximadamente 53% dessas
Cooperativas. Sabemos, ainda, que mais de 60% das Cooperativas e 77% do número de
Cooperados desenvolvem atividades de fornecimento de serviços especializados.
Estes números, por si só muito expressivos, não representam,
verdadeiramente, o número de cooperativas existentes e, conseqüentemente, o número de
trabalhadores envolvidos. Estimativas não oficiais da Organização das Cooperativas do
Estado de São Paulo – OCESP - dão como certa a existência de um número pelo menos
15% maior que os do registro oficial, uma vez que muitas cooperativas, uma vez
constituídas, não realizam o seu registro junto àquele Órgão.
Na região de Franca, nosso universo de estudo e pesquisa, constatamos a
existência de 8 cooperativas de Trabalho, excetuando-se, como já dissemos, a Unimed,
Uniodonto e as de Taxistas, de carros ou motocicletas. Destas, apenas 4 se encontram em
situação regular junto à OCESP. Se extrapolarmos esse número para todo o Estado,
observaremos que o resultado será diferente. Como sabemos que nem todos os municípios
do território do Estado contam com Cooperativas de Trabalho, vamos manter os números
estimados pela OCESP, por uma questão de conservadorismo.
Também vimos que a taxa de natalidade das Cooperativas de Serviço e
Trabalho apresenta uma tendência muito forte de crescimento. Mas esse crescimento
somente se realizará com a flexibilização de mão-de-obra na prestação de serviços
qualificados. Não que a fórmula tenha se esgotado, ou seja, que a prestação de serviços não
qualificados tenha se exaurido pelo excesso de Cooperativas nesse segmento. O que
pudemos verificar é que as empresas, ainda receosas da contratação, aguardam uma maior
definição da lei, no que diz respeito ao risco de estarem infringindo algum preceito legal ou
mesmo quanto à responsabilidade solidária, respeitante ao recolhimento de impostos.
Chegamos a essa conclusão com base em pesquisa informal que levamos a efeito junto a
10 empresas do setor de calçados e construção civil na cidade de Franca. Destas, as
empresas ligadas à construção civil são as mais receosas. Quanto à flexibilização, cita
Queiroz (1997, p. 132, 133):
Existem algumas condições favoráveis em termos
operacionais e econômicos, na flexibilização da mão-de-
obra, valendo-se das Cooperativas. Uma delas é a
possibilidade de alternância, na substituição de
trabalhadores cooperados, sem que a atividade sofra a
solução de continuidade e também sem os
comprometimentos da eficiência do processo operacional.
Ou seja, substitui-se um trabalhador por outro, que vai
desempenhar as atividades com a mesma eficácia. Ocorre
mais agilidade na movimentação da mão-de-obra.
Considerando-se que a atividade cooperada tem
relação civil e não trabalhista, a remuneração do
trabalhador cooperado poderá ser maior do que a do
empregado, uma vez que não existem os encargos normais
de uma vinculação empregatícia. Assim sendo, o
numerário que deveria ser deslocado para pagar as
contribuições trabalhistas, poderá gerar melhor
remuneração do Cooperado prestador de serviço. As
Cooperativas de Serviços e Trabalho apenas recolhem
para a previdência social a alíquota de 15% sobre o
montante da remuneração paga ao Cooperado, ou poderá
optar pelo índice de 20% sobre o salário-base de
contribuição.
Na verdade, o INSS, através da Ordem de Serviço n.º 209/99, alterou estes
dispositivos. Hoje, o tomador de serviços das Cooperativas de Trabalho tem que recolher,
a título de encargos incidentes sobre a mão-de-obra dos trabalhadores cooperativados, o
percentual de 15% sobre o valor do serviço prestado, ou seja, sobre o valor da Nota Fiscal
emitida pela Cooperativa, o tomador recolhe, em Guia da Previdência Social – GPS –
específica, este percentual, onerando um pouco mais o valor de sua contratação. Isto,
porém, não afeta significativamente os custos da empresa, se comparamos com outro tipo
de terceirização, quer seja, aquele realizado por empresas outras não Cooperativas,
mormente porque aquelas incluem no valor de suas prestações, todos os impostos que lhe
são impingidos pela atual legislação, a saber, ISS, PIS, COFINS, Contribuição Social e
Imposto de Renda.
Acrescente-se, a isso, o valor do encargos sociais para aquelas que possuem
empregados e temos aí a inviabilização da terceirização via sociedade não cooperativa.
O fato de o Cooperado não fazer parte de sindicatos facilita, em muito, as
negociações de valores no momento da contratação ou mesmo de renovação de contratos,
sendo que estas podem ser conduzidas diretamente pela Cooperativa, que os representa.
Não há aqui nenhuma preocupação com Convenção ou Acordo Coletivo a que se deva
obedecer.
Na verdade, o Cooperado recebe proporcionalmente ao volume dos serviços
que venha a executar para a Cooperativa. Em geral, segundo opinião expressa pelas
empresas tomadoras, a mão-de-obra da cooperativa é melhor qualificada e especializada
que a da própria empresa. Isso se explica pelo fato de, sendo o Cooperado um trabalhador
autônomo, ele precisa estar sempre melhor preparado para ser competitivo na sua
atividade. As Cooperativas, além disso, lançam mão do FATES (Fundo de Assistência
Técnica, Educacional e Social) para fazer o treinamento e a requalificação de seus
Associados. Esta é a opinião de Queiroz (1997).
Os tomadores de mão-de-obra das Cooperativas entendem que existe uma
sensível otimização econômica e financeira, uma vez que o dispêndio para remunerar a
mão-de-obra via terceirização em Cooperativas é menor e não ser esta uma relação regida
pela CLT e sim, pelo Código Civil, dispensando o tomador dos recolhimentos tradicionais
de uma relação trabalhista.
A respeito deste assunto, Queiroz (1997, p. 134) opina:
Entretanto, e lamentavelmente, temos observado
muitas interpretações nas atividades das Cooperativas,
completamente equivocadas, imaginando que estas são
sociedade mútuas de profissionais que se prestam para
serem utilizadas com meios para obter-se economia de
curto prazo, nas folhas de pagamento e como forma para
apenas reduzir os encargos legais e sociais. Engana-se,
redonda e rotundamente, aqueles que assim pensam.
Considerar as Cooperativas de Serviços e Trabalho
apenas como instrumento para serem usadas com essa
finalidade pelos tomadores dos seus serviços é um risco
enorme para estes, em termos operacionais e legais,
podendo inviabilizar os resultados de um processo
terceirizada e ainda levar as empresas tomadoras às
barras dos tribunais trabalhistas, devido a
comportamentos inadequados e incoerentes que os
tomadores assumem nessas condições.
A seguir, apresentamos quadros comparativos de encargos sociais legais
incidentes sobre as empresas, em geral, e sobre as empresas cooperativas, para que
tenhamos a oportunidade de verificar as vantagens e as desvantagens, do ponto de vista da
economia de tributos, e, por conseqüência, a economia de custos na contratação de serviços
terceirizados junto àqueles tipos de sociedades.
Tabela 3: Análise Comparativa de Encargos Empresa X Cooperativa de Trabalho
Tipo Empresa Cooperativa Diferença Encargos Legais % % % INSS 20,00 0,00 5,00 Salário-Educação 2,50 0,00 2,50 INCRA 0,20 0,00 0,20 SESI/SESC 1,50 0,00 1,50 SENAI 1,00 0,00 1,00 Seguro Acidente 3,00 0,00 3,00 FGTS 8,00 0,00 8,00 SEBRAE 0,60 0,00 0,60 Total do Grupo A 36,80 0,00 36,80 Encargos Provisionais Férias 8,33 0,00 8,33 Abono de 10 dias 2,75 0,00 2,75 1/3 Constitucional 2,75 0,00 2,75 Auxílio Acidente do Trabalho 1,67 0,00 1,67 Licença Paternidade 0,18 0,00 0,18 Licença Maternidade 0,86 0,00 0,86 13º Salário 8,33 0,00 8,33 Aviso Prévio Trabalhado 1,13 0,00 1,13 Total do Grupo B 26,00 0,00 26,00 Custos de Quitação Multa do FGTS - 40% 4,03 0,00 4,03 Aviso Prévio Indenizado 2,23 0,00 2,23 Total do Grupo C 6,26 0,00 6,26 Incidência Cumulativa Grupo B x Grupo A 9,56 0,00 9,56 Custos Adicionais Taxa de Administração Cooperativa 20,00 -20,00 Total Custos Adicionais 20,00 -20,00 Total Geral Final 78,62 20,00 58,62 Fonte: Queiroz, 1997, p. 53, 54.
Observações
a) As cooperativas retêm encargos de 20,00%.
b) A diferença favorável às cooperativas é de 58,62%.
c) Nas cooperativas, a renda é melhor.
Podemos notar que existe uma vantagem considerável para o sistema
cooperativo quando analisamos os custos de encargos incidentes sobre a folha de
pagamento em comparação com as empresas não cooperativas. A simples observação
visual do quadro apresentado nos permite vislumbrar que as empresas Cooperativas levam
grande vantagem sobre as demais empresas. Isto, de certa forma, é até natural, uma vez
que as sociedades Cooperativas operam com seus próprios associados, que, nesse
momento, são, se é que podemos assim dizer, seus próprios empregados, eis que trabalham
para a sociedade das quais, em última análise, são proprietários.
Não podemos nos esquecer, entretanto, de que, caso a Cooperativa venha a
ter funcionários registrados, os encargos sociais que se obrigará a recolher serão
exatamente os mesmos das empresas em geral. Claro que não se justificaria que a
Cooperativa tivesse empregados registrados, a não ser aqueles, se for o caso, que prestam
serviços de natureza administrativa à sociedade, ou trabalhos outros que fujam à
especialidade da Cooperativa. Nada obsta, porém, que mesmos estes profissionais façam
parte do quadro associativo.
Tabela 4: Obrigações Empresário X Cooperado
Empresário paga Cooperado paga
PIS 0,65% PIS 0,00
INSS pró-labore 20,00% INSS remuneração 0,00
ISS integral 3,00% INSS autônomo 20,00%
IRPF acima de R$ 1800,00
27,50% IRPF acima de R$ 1800,00
27,50%
Empresário paga Cooperado paga
IRRF integral 1,50% IRRF diluído Variável
Outros 15,00% Outros 0,00
INSS de Empregados 20,00% INSS de Empregados 0,00
Empregado (piso sindical) Cooperado (remunerado geralmente
em 30% a mais) Remuneração 500,00 Remuneração 650,00 INSS 9,00% 45,00 INSS Autônomo 20% na
classe 05 132,83
UFM 0,00 01 UFM anual: 12 12,50 IFR 0,00 IRRF diluído Recebe R$ 455,00 Recebe R$ 504,67
Observação: A tabela foi elaborada pelo autor, porém com dados extraídos do livro
Manual da Cooperativa de Serviços e Trabalho. Queiroz, 1997, p. 57-58.
Exemplo em que o Empregado recebe R$ 500,00 e o Cooperado R$ 650,00.
Naturalmente, a contribuição do Cooperado para com o INSS é livre. Ele não se obriga a
efetuar a sua contribuição na classe 5, aqui citada apenas para se manter a paridade entre
os valores recebíveis e descontos efetuados.
Quadro 2: Relação Entre Empregado e Cooperado I
Desvantagens Vantagens o empregador controla a mão-de-obra é valorizada é remunerado no piso é melhor remunerado é subordinado é sócio da cooperativa e independente não tem participação tem a sua quota valorizada recebe e cumpre ordens tem o arbítrio das suas ações
Fonte: Queiroz, 1997. p. 56-57.
As Cooperativas cobram uma taxa de administração que incide sobre o valor
da remuneração paga a cada um dos seus Cooperados, em razão da prestação de serviços
por parte destes à sociedade, cujo percentual é variável e estabelecido em Assembléia
Geral. Esse valor é necessário para fazer face às despesas a que a Cooperativa se obriga em
razão de sua própria sobrevivência, que poderíamos chamar de Despesas Administrativas e
são representativas do custo de sua estrutura operacional.
Caso a Cooperativa possua algum setor que, além de prestar serviços aos
Cooperados, também o faça para terceiros, por decisão da Assembléia Geral, a renda
auferida poderá ser destinada ao custeio da estrutura operacional. Isto ocorrendo, o
Cooperado não precisará pagar à sua Cooperativa a taxa de administração. O normal é que
o resultado das operações com terceiros seja integralmente destinado ao FATES.
Queiroz (1997) enumera algumas outras vantagens entre ser empresário ou
cooperado:
Quadro 3: Relação Entre Empregado e Cooperado II
Cooperado Empresário Cooperativa administra Administra sozinho Cooperativa desenvolve Desenvolve sozinho Cooperativa investe Investe sozinho Cooperativa compra equipamentos Compra sozinho Cooperativa treina via FATES Desenvolve treinamento sozinho Cooperativa busca clientes Procura clientes sozinho Não vai à falência. É dissolvida Vai à falência Responsabilidade diluída com demais Assume responsabilidade total Atua em Cooperação Atua sozinho Cooperativa gera renda Busca renda sozinho
Fonte: Queiroz, 1997, 57-58.
A Lei 5 764/71 dispõe, em seus artigos 11, 12 e 13 sobre o montante da
responsabilidade dos cooperados para com a sociedade e perante terceiros. O Estatuto
Social da Cooperativa deve prever este montante. Em caso de omissão por parte do
Estatuto, entende-se que a responsabilidade dos sócios é ilimitada. Não obstante, em
havendo dolo no procedimento da Cooperativa, a Justiça poderá determinar que essa
responsabilidade seja aumentada, obrigando aos sócios que respondam pelo dano causado
a terceiros ou à sociedade, bem como sua indenização.
Não poderíamos encerrar este tópico sobre comparativos sem abordarmos o
aspecto dos impostos federais e municipais incidentes sobre as empresas prestadoras de
serviços e as Cooperativas de Trabalho. Assim, apresentamos, a seguir, um quadro em que
são demonstrados os valores de impostos incidentes sobre estas e aquelas empresas:
Tabela 5: Relação de Incidência de Impostos Empresas X Cooperativas
Tabela comparativa de Impostos incidentes para as Empresas em geral e para as Sociedades Cooperativas Imposto Incidente Empresas em Geral Sociedades Cooperativas % sobre faturamento % sobre faturamento PIS 0,65 0,00 Cofins 3,00 0,00 Contribuição Social 1,08 0,00 Imposto de Renda 4,80 0,00 ISS 3,00 0,00 Total 12,53 0,00 Observação: Tabela elaborada pelo autor.
Cremos não haver dúvidas sobre o que seja mais interessante para o
tomador de serviços, através de terceirização, mas, se alguma dúvida ainda persistir com
relação ao assunto, cremos que a tabela acima, combinada com as demais, deixa o mais
céptico dos empresários convencido de que realmente o sistema cooperativo é mais
econômico, do ponto de vista de se economizar custos de produção, quando se pretende
terceirizar partes ou o todo de uma atividade econômica.
Não estamos, evidentemente, querendo induzir o leitor a acreditar que o
cooperativismo só possui vantagens, ou que o sistema represente uma panacéia a curar
todos os males das relações de trabalho existentes no Brasil. Isso ele deduzirá por si. Ou,
até, eventualmente, o seu contrário. O que nós concluímos, em decorrência de nossas
pesquisas de campo e observações efetuadas, é que quem se utiliza dos serviços prestados
pelas sociedades Cooperativas, consegue obter uma significativa redução de seus custos de
produção.
Tomando-se a Tabela 5, isoladamente, que trata da incidência de impostos
sobre as atividades das empresas prestadoras de serviços, podemos observar que a carga de
impostos incidentes diretamente sobre o faturamento das empresas não cooperativas pode
significar fator de decisão entre empresas uma e outra, quando concorrentes à prestação de
serviços. Os 12,53% (Doze Inteiros e Cincoenta e Três Centésimos por Cento) a que as
Cooperativas não estão sujeitas, definitivamente as credenciam a ter melhores preços que
as demais empresas.
Se, por outro lado, considerarmos a parte incidente sobre a folha de
pagamento, conforme demonstrado na Tabela 3, que é o comparativo Empresa x
Cooperativa de Trabalho, ou seja, os 58,62% (Cincoenta e Oito Inteiros e Sessenta e Dois
Centésimos por Cento) que as empresas Cooperativas têm como vantagem sobre as
demais, poderemos verificar, então, que terceirizar, via Cooperativas de Trabalho, é a
solução mais racional e econômica que se poderia encontrar.
Numa demonstração bastante simples de composição de preço de venda,
podemos notar a significância dessa economia. Vamos imaginar, por hipótese, duas
empresas, sendo uma Cooperativa de Trabalho e a outra uma empresa não cooperativa, que
estejam concorrendo à mesma prestação de serviços e a cuja prestação, do ponto de vista
da qualidade técnica, número de pessoas envolvidas no processo e prazos de execução,
sejam equiparadas. A execução das tarefas se dá no estabelecimento do tomador, o que
implica a não incidência de outros gastos gerais de fabricação, como energia elétrica, água,
depreciações de equipamentos, entre outros.
Neste exemplo, utilizaremos o conceito de Mark Up ou coeficiente K na
determinação do Preço de Venda desse serviço, amplamente aceito na área administrativa e
de larga utilização pelas empresas. Apenas para compreensão do leitor, temos, por
definição, que coeficiente K ou Fator K, é um fator multiplicador que, aplicado sobre o
custo do produto ou serviço, gera o respectivo preço final.
Também queremos deixar registrado que, neste contexto, existem três
elementos: o preço final, o custo e o Fator K. Como o preço final resulta da multiplicação
do custo pelo fator ou coeficiente K, todos os elementos constitutivos do preço final
estarão embutidos no custo do serviço ou no Fator K.
A mensuração de custo e o estabelecimento do Fator K, em empresas de
serviços, envolvem fundamentalmente os mesmos conceitos e procedimentos utilizados
nas indústrias. Desse modo, temos que o mark up é um índice multiplicador que, aplicado
ao custo do produtor, fornece o Preço de Venda, sendo que normalmente integram o mark
up os seguintes elementos: PIS, COFINS, ICMS, Comissões, Despesas Administrativas,
Custos Fixos de Fabricação (quando se utiliza o sistema de Custeio Direto) e Lucro.
Estabelecemos, para efeitos deste trabalho e até porque de uso consagrado
na administração, as seguintes premissas na determinação da expressão para o cálculo do
Fator K:33
a) o preço de venda engloba o custo e todos os elementos que integram o mark up;
b) O custo é estabelecido em quantidade de unidades monetárias;
c) Os elementos que integram o mark up são estabelecidos em termos de porcentagem do
preço de venda;
d) O custo, em termos de porcentagem do preço de venda, corresponde à diferença entre
100% (preço) e a porcentagem dos elementos do mark up.
Assim, temos, por definição, que o custo é determinado pelo preço de
venda, deduzidos todos os elementos, em termos percentuais, que fazem parte do mark up,
a saber:
CUSTO = PV – PIS – COFINS – ISS – COM – DA – DF – DV – DI – L
Onde:
CUSTO= Porcentagem do custo sobre o PV
PV= 100% do preço de venda
PIS= Porcentagem desse tributo sobre o PV
COFINS= Porcentagem desse tributo sobre o PV
ISS= Porcentagem desse tributo sobre o PV
COM= Porcentagem de comissões sobre o PV
33 Revista IOB, Temática Contábil e Balanços, 1999.
DA= Porcentagem de Despesas Administrativa sobre o PV
DF= Porcentagem de Despesas Financeiras sobre o PV
DV= Porcentagem de Despesas Fixas de Vendas sobre o PV
DI= Porcentagem de Custos Fixos de Fabricação sobre o PV
L= Porcentagem de Lucro desejado sobre o PV
A partir dessas premissas, o K é deduzido facilmente:
% Custo X R$ PV = R$ Custo
PV = R$ Custo dividido pelo % Custo
PV = R$ Custo x 1 dividido por % Custo
Ou seja,
K = 1 dividido por % Custo
Exemplo de determinação do Fator K aplicável à situação proposta:
Tabela 6 – Determinação do Fator K
Elementos Porcentagem sobre o PV Preço de Venda 100,00% (-) ISS 3,00% (-) PIS/COFINS 3,65% (-)IRPJ/Contrib.Social 5,88% (-) Desp. Administ./Financeiras 5,00% (-) Lucro 10,00% (-)Custo 72,47% Fator K (1/0,7247) 1,3799 Fonte: Tabela elaborado pelo autor, com dados extraídos da Revista IOB, Temática Contábil e
Balanços, 1999.
No nosso exemplo, citamos as despesas e tributos próprios das atividades de
prestação de serviços, não considerando eventuais retenções pela fonte pagadora incidentes
sobre a Nota Fiscal, para apenas considerá-la no final. As Despesas Administrativas e
Financeiras, bem como o Lucro, foram definidos de forma aleatória. O Custo foi
encontrado por eliminação, subtraindo-se, de 100,00% (PV), os valores percentuais
correspondentes às despesas e aos impostos.
Passando agora, definitivamente, para os aspectos de aplicação prática desse
critério de determinação do Preço de Venda, temos a tabela, a seguir, que pretende
demonstrar, de forma comparativa, as vantagens proporcionadas pelas empresas
cooperativas sobre as empresas não cooperativas decorrentes da diferente forma de
tributação entre umas e outras. Entendemos ser importante esta demonstração porque,
numa tomada de decisão por parte da empresa tomadora, em que se leve em conta apenas o
fator preço, já que as demais condições são idênticas, fique demonstrado em quais
elementos componentes de custo e preço de venda as cooperativas efetivamente levam essa
pretendida vantagem:
Tabela 7: Componentes do Preço de Venda
Tabela Comparativa de Elementos que compõem o Preço de Venda de Serviços com utilização do Fator K Empresas em Geral x Cooperativas de Trabalho
Elementos Empresas em Geral Cooperativas de Trabalho Preço de Venda 100,00% 100,00% ISS 3,00% 0,00% PIS/COFINS 3,65% 0,00% IRPJ/Contrib.Social 5,88% 0,00% Despesas Adm/Financ. 5,00% 5,00% Lucro/Sobra 10,00% 10,00% Custo 72,47% 85,00% Fator K 1,37988133 1,176470588 Preço de Venda 24 647,44 18 352,94 ISS 739,42 0,00 PIS/COFINS 899,63 0,00 IRPJ/Contrib.Social 1 449,27 0,00 Despesas Adm/Financ. 1 232,37 917,65 Lucro/Sobra 2 464,74 1 835,29 Custo 17 862,00 15 600,00 Observação: Quadro elaborado pelo autor.
Como podemos observar, em tese, a empresa Cooperativa, mantendo-se o
atual regime de tributação desse tipo de sociedade, sempre oferecerá o melhor Preço de
Venda, que, no caso do tomador de serviços, inverte-se, passando a ser o seu Custo de
Produção.
No exemplo em tela, a Cooperativa remunera os seus Associados com um
valor 30% maior que a empresa não cooperativa, mantendo-se, dessa forma, o critério
estabelecido na tabela 4. Além disso, a Cooperativa manteve os mesmos 10% de Sobra que
a empresa não cooperativa, proporcionando, com isso, um incremento nos rendimentos do
Cooperado, mesmo se considerarmos que em números comparativos, 10% de R$ 24
647,44 será sempre maior que 10% de R$ 18 352,94.
Não podemos nos esquecer de que o Lucro, no caso da empresa não
cooperativa, vai para o proprietário, ou empreendedor, palavra designativa do detentor do
capital nas empresas, de uso recente na Ciência da Administração de Empresas, enquanto
na Cooperativa, as Sobras vão ser distribuídas aos associados na proporção direta da
fruição dos serviços prestados.
Por outro lado, o valor atribuído ao Custo dos Serviços na Tabela 7, já
contempla o diferencial remuneratório das partes envolvidas, quer sejam, os valores que
serão recebidos pelos Cooperados e pelos funcionários, que, no caso, receberão R$ 10
000,00, decrescidos da contribuição ao INSS descritos na Tabela 3. Sobre esta base de
cálculo, incidirão os encargos sociais descritos no Tabela 3, elevarão o Custo da folha de
salários da empresa prestadora para R$ 17 862,00.
Na Cooperativa, este valor é representado por R$ 15 600,00, que
representam os R$ 10 000,00 acrescidos de 30% que a Cooperativa remunera a mais que a
empresa não cooperativa, acrescidos dos encargos incidentes sobre as atividades das
empresas Cooperativas, também descritos na Tabela 3.
Vale lembrar que sobre o valor da Nota Fiscal de Prestação de Serviços,
emitida pela Cooperativa, incide, de acordo com a OS-209/99, do INSS, 15% a título de
contribuição à Seguridade Social, que vão onerar os custos do tomador de serviços. Este
fato faz com que os custos do tomador, até então no valor de
R$ 18 352,94, se elevem em R$ 2 752,94, passando a R$ 21 105,88.
Em termos percentuais, a economia de custos na mão-de-obra realizada
contratando-se uma empresa Cooperativa será de 14,37% sobre uma empresa não
cooperativa.
Isto posto, trataremos a seguir, daquelas empresas que se utilizam da mão-
de-obra cooperativada em suas atividades-fim. Das também dez empresas contatadas,
apenas duas quiseram falar sobre o assunto. Ambas atuam no segmento da construção
civil, apesar de trabalharem nichos diferentes desse mercado. Enquanto uma atua na
construção de quaisquer tipos de edificações, como casas residenciais, edifícios comerciais
e galpões para indústrias, a outra se especializou na construção e incorporação imobiliária
de condomínios, habitacionais ou não. Importante salientar que nenhuma delas executa
obras de grande porte, assim entendido a construção e manutenção de rodovias, viadutos,
hidroelétricas, portos e aeroportos.
Como exercem suas atividades na mesma região, isto implica que, na
maioria das vezes, contratam mão-de-obra de uma mesma Cooperativa e, como suas
atividades são bastantes similares, escolhemos a empresa mais antiga e com maior volume
de metros quadrados construídos, além de possuir o maior valor de faturamento anual, para
este nosso estudo de caso.
Esta empresa, até a adoção da contratação de mão-de-obra cooperativada,
adotava um critério misto de contratação, ou seja, parte de seus trabalhadores eram
funcionários próprios, com registros em carteira e parte eram contratados junto às
empreiteiras de mão-de-obra.
Assim, a empresa contratava pedreiros, azulejistas, eletricistas, encanadores,
pintores e demais serviços especializados junto às empreiteiras. Os serventes (mão-de-obra
não especializada) eram de seu próprio quadro de pessoal.
Com o advento da mão-de-obra cooperativada, a contratação continua sendo
mista, porém, agora, a empresa não trabalha com pessoal de empreiteiras e sim, com
pessoal da Cooperativa, além de seus próprios serventes.
Tabela 8: Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho
Taxas de Leis Sociais e Riscos do Trabalho A Encargos Sociais Básicos (%) A1 Previdência Social 20,00 A2 Fundo de Garantia por Tempo de Serviço 8,00 A3 Salário Educação 2,50 A4 Serviço Social da Indústria (Sesi) 1,50 A5 Serviço Nacional de Aprendizagem Indústrial (Senai) 1,00 A6 Serviço de Apoio a Pequena e Média Empresa (Sebrae) 0,40 A7 Instituto Nacional de Colon. e Reforma Agrária (Incra) 0,20 A8 Seguro contra os acidentes de trabalho (INSS) 3,00 A9 Seconci Serviço Social da Indústria da Construção e do Mobiliário (aplicável a todas as empresas constantes do lll grupo da CLT – art. 577) 1,00 Total de Encargos Sociais Básicos 37,60 B Encargos Sociais que recebem as incidências de A B1 Repouso semanal e feriados 22,53 B2 Férias 14,74 B3 Auxílio Enfermidade (*)0,83 B4 Licença Paternidade (*)0,36 B5 13º Salário 11,08 Total de Encargos Sociais que recebem as incidências de A 49,54
C Encargos Sociais que não recebem incidências globais de A C1 Depósito por despedida injusta 10% sobre [A2 + (A2xB)] 4,78 C2 Aviso Prévio Indenizado (*)13,75 Totais Encargos Sociais que não recebem incidências globais de A 18,53
D Taxas das Reincidências D1 Reincidência de A sobre B 18,63 Total das Taxas das Reincidências 18,63 E Dias de chuva e outras dificuldades E1 Dias de chuva e outras dificuldades 1,50 Total Dias de chuva e outras dificuldades 1,50 PERCENTUAL TOTAL 125,80 Fonte:TCPO9, 1993, p. 10.
Com dados fornecidos pela empresa, elaboramos Tabelas demonstrativas
comparativas da economia de custos realizada com a utilização desse tipo de contratação.
Para efeitos de fornecimento de orçamentos e determinação do preço de venda, a empresa
se utiliza da tabela TCPO934, de uso consagrado por parte das empresas do ramo de
construção civil, cuja tabela de composição das Taxas de Leis Sociais e Riscos do
Trabalho estão contidas no Tabela 8 e transcritas na página anterior, para melhor
entendimento do leitor:
Num exemplo prático de cálculo de custo de partes de uma construção,
podemos observar a economia realizada, utilizando-se diferentes contratações de mão-de-
obra. Nesse exemplo, trata-se da execução de Bandejas Salva-vidas c/ tábuas de pinho e
temos a seguinte composição de custos para sua execução:
Tabela 9: Cálculo de Valor de Serviço com Mão- de- Obra Própria
Tabela de cálculo de custo para execução de bandeja salva-vidas por metro e total - mão-de-obra própria
Código Descrição de Aplicações Unid Qtde. Vlr. Unit Vlr.Total Necessidade de Aplicação 125 01.01.11 Mão-de-Obra de Carpinteiro H 3,00 1,92 5,76 01.01.12 Mão-de-Obra de Ajudante de Carpinteiro H 2,50 1,59 3,98 Soma de Mão-de-obra 9,74 02.10.26 Viga de Peroba de 6x12cm M 3,50 3,68 12,88 02.10.37 Tábua de Pinho de 1x12cm de 2ª M2 1,60 10,40 16,64 02.10.38 Pontalete de pinho de 3x3cm de 2ª M 3,50 2,05 7,18 02.65.02 Chumbador de 3/8 PÇ 3,00 0,86 2,58 02.65.69 Prego 18x27 KG 0,40 2,14 0,86 Soma de Materiais 40,13 Leis Sociais 125,80% 12,25 Sub-Total 62,11
CUSTO TOTAL 7.764,08
Fonte: TCPO9
34 TCPO9, Tabelas de composições de preços para orçamentos. Ed. Pini. São Paulo, 1993.
Tabela 10: Cálculo de Valor de Serviço com Mão-de-Obra Cooperativada
Tabela de cálculo de custo para execução de bandeja salva-vidas por metro e total – mão-de-obra cooperativada
Código Descrição de Aplicações Unid Qtde. Vlr. Unit Vlr.Total Necessidade de Aplicação 125 01.01.11 Mão-de-Obra de Carpinteiro H 3,00 2,50 7,50 01.01.12 Mão-de-Obra de Ajudante de Carpinteiro H 2,50 1,59 3,98 Soma de Mão-de-obra 11,48 02.10.26 Viga de Peroba de 6x12cm M 3,50 3,68 12,88 02.10.37 Tábua de Pinho de 1x12cm de 2ª M2 1,60 10,40 16,64 02.10.38 Pontalete de pinho de 3x3cm de 2ª M 3,50 2,05 7,18 02.65.02 Chumbador de 3/8 PÇ 3,00 0,86 2,58 02.65.69 Prego 18x27 KG 0,40 2,14 0,86 Soma de Materiais 40,13 Leis Sociais - parte da empresa 125,80% 5,00 Leis Sociais - parte da cooperativa 15,00% 1,72 Sub-Total 58,33
CUSTO TOTAL 7 290,98 Observação: tabela adaptada, elaborada pelo autor, com base em tabela da TCPO9
A análise comparativa das Tabelas 09 e 10 permitem visualizar a economia
de custos realizadas pela empresa quando da realização de uma determinada tarefa, que, no
caso, não integrará o produto final da construção, mas que onera sensivelmente estes
mesmos custos.
Neste exemplo, mantivemos o critério utilizado no Tabela 7, no que diz
respeito à remuneração de 30% pagos a mais para os trabalhadores cooperativados, além
dos 15% de encargos sociais que, no caso, incidem sobre o valor da Nota Fiscal de
Prestação de Serviços emitida pela Cooperativa. A economia verificada, em termos
percentuais, foi de 6,09%.
Quando aplica este mesmo critério para a prestação de serviços, por parte
das empreiteiras, a empresa consegue melhorar um pouco mais o seu desempenho, uma
vez que, caso viesse a contratar mão-de-obra das empreiteiras, sobre o valor da prestação
que estas lhe fariam, iriam acrescentar ao valor do serviço, a sua rentabilidade e os
impostos incidentes sobre a Nota Fiscal, que, de acordo com a Tabela 7, é de 27,53%.
Assim, combinando as Tabelas 5, 10 e 13, temos que a economia de custos total realizada
será da ordem de 21,44.
O efetivo gerenciamento da composição de custos realizado pela empresa
permitiu que esta tomasse a decisão pela utilização da mão-de-obra cooperativada em
razão, sobretudo, da economia oferecida por esta relação de trabalho, que tem lhe
permitido oferecer imóveis com preços mais acessíveis aos seus clientes e/ou, melhorar a
sua margem de rentabilidade.
A empresa considera que este sistema de relacionamento tem melhorado o
seu desempenho global e, como as empresas que utilizam a prestação de serviços em suas
atividades meio, também espera uma maior flexibilização da legislação para terceirizar
completamente as suas atividades via Cooperativas de Trabalho.
Entendemos que, caso as empresas façam um bom gerenciamento eficaz de
seus centros de custos, como define Iudícibus35
É a menor fração de atividade ou área de
responsabilidade para a qual é feita a acumulação de
custos (Horngren, 1972, p. 691).
Centros de Custo podem coincidir com
Departamentos, mas em alguns casos um departamento
pode conter vários centros de custo. Por exemplo, um
departamento de beneficiamento pode ter apenas um
supervisor, mas podem existir várias linhas de
beneficiamento. Para cada linha poderíamos criar um
centro de custo à parte e avaliá-lo separadamente.
A noção inicial de contabilidade por
responsabilidade dimensionou os centros de custo com a
maior ou menor facilidade de ser responsável em poder
controlar os custos de seu centro de custo.
35 IUDÍCIBUS, Sérgio de. Contabilidade Gerencial. 6ª ed. São Paulo: Ed. Atlas, 1998, p.267.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciarmos o estudo que levamos a efeito, neste trabalho, tencionávamos
alcançar dois objetivos, que classificamos como principal e acessório. O objetivo principal,
era mensurar quanto o advento das Cooperativas de Trabalho proporcionam de redução de
custos de produção aos seus tomadores e o objetivo acessório era saber sob que condições
os Cooperados participantes das Cooperativas de Trabalho se agregavam para esse tipo de
relacionamento.
No desenvolvimento do nosso trabalho, tivemos oportunidade de conhecer o
pensamento e a motivação dos Pioneiros do Cooperativismo, formado por tecelões
desempregados da comunidade de Rochdale, cidade de Manchester, Inglaterra, por volta
dos anos de 1843, 1844. Vimos que estes trabalhadores perderam seus postos de trabalho
para os modernos teares a vapor da época, que proporcionavam maior produtividade às
tecelagens a um custo muito mais competitivo.
Pudemos acompanhar, mesmo que de maneira superficial, o
desenvolvimento do cooperativismo pelo mundo, o pensamento das diversas correntes
ideológicas do cooperativismo e o entendimento de seus mentores quanto a esta nova
modalidade de relacionamento socioeconômico. Vimos aí que o cooperativismo não
nasceu unânime. Por mais que os seus pensadores acreditassem na idéia do
desenvolvimento via cooperação mútua, cada um tinha, em geral, a sua própria forma de
ver e entender esse nascimento e desenvolvimento.
Este fato, ao invés de enfraquecer a nascente doutrina, pelo contrário,
pudemos ver que proporcionou o seu fortalecimento e ampliou o seu entendimento.
Inglaterra e França, no cooperativismo de consumo, Alemanha e Itália com o
cooperativismo de crédito, países com culturas díspares e com convivência nem sempre
harmoniosa, no caso específico de Inglaterra e França, puderam então desenvolver as suas
sementes do cooperativismo, calcados em suas próprias culturas. O que prevaleceu foi a
idéia, foi a intenção cooperadora, foi o sentido de união e fortalecimento através dessa
idéia.
No Brasil, o cooperativismo só chegou bem mais tarde. Apenas no final do
século XIX, através de uma elite pequena pensante que a considerava que o
cooperativismo seria uma forma de se alavancar o progresso, agora sem contar com a mão-
de-obra escrava e uma forma de equilíbrio entre patrões e empregados.
Vemos aí que os motivos de criação e implantação do cooperativismo se
deram por motivos muito diferentes: enquanto na Europa o cooperativismo surge como
uma reação da classe operária aos problemas socioeconômicos criados pelo capitalismo e
pela nascente modernização industrial e como uma reação à livre concorrência, em nosso
país a motivação foi praticamente inversa, numa tentativa da classe dominante de impor
um novo tipo de relacionamento que lhes proporcionasse, já naquela época, estarem, de
certa forma, sendo mantidos pelo governo, em substituição à mão-de-obra escrava,
recentemente abolida pela Princesa Isabel e sua Lei Áurea, sobejamente conhecida de
todos nós brasileiros.
Se quiséssemos encontrar a razão para as dificuldades que o cooperativismo
sempre encontra em nosso país, quem sabe não esteja aí um fato bastante significativo: o
de as Cooperativas de Trabalho no Brasil muitas vezes nascerem para atender a interesses
de segmentos econômicos e/ou de pessoas ou grupos interessados apenas em seu próprio
bem estar.
Na região de Franca, área do nosso objeto de estudo, o cooperativismo de
trabalho nasceu pelas mesmas vias tortas da imposição. Sutil e velada, mas imposição. É
interessante ressaltar que mesmo não tendo sido a forma adequada, prevaleça a intenção
mater dos Probos Pioneiros de Rochdale e que o cooperativismo de trabalho possa
definitivamente aqui se estabelecer e proporcionar desenvolvimento social e econômico
para todas as partes envolvidas.
Com as pesquisas e os estudos de casos que realizamos, encontramos, em
Franca, o cooperativismo de trabalho em uma situação ainda um tanto quanto incerta, do
ponto de vista dos trabalhadores cooperativados, quanto à sua sobrevivência e
consolidação. Se por um lado, os participantes acreditam na idéia e, dos entrevistados, não
houvesse quem manifestasse desejo de voltarem às panelas de carne egípcia representados
pelas carteiras de trabalho assinadas, que fizemos menção no intróito do nosso trabalho,
por outro prevalecem costumes como férias e décimo-terceiro salário, que sempre eram
citados pelos mesmos, numa clara demonstração, do nosso ponto de vista, de que muitos
deles, mesmo não se manifestando, prefeririam a segurança de, ao final do mês, contar com
o seu pagamento. Muitos têm consciência de que este tipo de relacionamento está
caminhando para a inexistência.
Do ponto de vista da conscientização para o cooperativismo, observamos
que este é um fator que não os preocupa tanto neste momento, mas estamos certos de que,
tal qual ocorreu na Cooperativa Arco-Íris, objeto de estudo de Faria, já mencionado em
nosso trabalho, com o tempo, esta conscientização virá, em decorrência de seus
crescimentos e amadurecimentos para o cooperativismo e, a partir daí, a preocupação com
o exercício pleno de suas prerrogativas e obrigações.
De parte dos tomadores dos trabalhos das Cooperativas, há, de maneira
geral, um certo temor de estarem incorrendo em ilícitos, causado pelo posicionamento
inconstante da Justiça do Trabalho no que diz respeito à atividade cooperativa. Se, de um
lado, à Justiça compete zelar pela aplicação das leis, de outro, está a possibilidade de
impedir ou, de certa forma, atrapalhar o desenvolvimento econômico das empresas e, por
conseqüência, do país, no entendimento amplo, geral e irrestrito de que todas as
Cooperativas de Trabalho são inidôneas. Assim, entendemos que cada caso deva ser
analisado e julgado isoladamente, como acreditamos verdadeiramente fazer a Justiça.
O estudo de caso que levamos a efeito permitiu-nos verificar que às
empresas, em maior ou menor grau, variando-se conforme os seus portes e ao destino que
dão à utilização do trabalho cooperativado, é proporcionada a possibilidade de realizarem
redução de custos e/ou despesas operacionais.
Esta economia de custos não está perfeitamente quantificada para as
empresas de pequeno porte, que, no geral, apenas estimam o seu percentual, com base na
empiria. As empresas de grande porte, mesmo não utilizando os trabalhos da Cooperativa
em suas atividades-fim, conseguem mensurar suas economias de forma sistemática, em
razão dos efetivos controles que exercem sobre os seus centros de custos e resultados,
conforme definidos por Iudícibus e já mencionados neste trabalho.
Apesar do caráter eventual dessa prestação, de maneira geral, há uma
esperança de um consolidar desse relacionamento, dependendo, conforme constatado, do
posicionamento da Justiça do Trabalho quanto ao entendimento desse assunto.
As empresas de construção civil, que utilizam a mão-de-obra cooperativada
em suas atividades-fim, conseguem, conforme demonstrado através das Tabelas
comparativas de encargos e das declarações das mesmas, realizar uma economia
significativa de custos. Essa economia, se por um lado não aumenta, num primeiro
momento, a oferta de emprego, até porque não se aumenta o número de empregados na
realização de uma tarefa pelo simples fato de a mão-de-obra ser mais barata, por outro, tem
proporcionado às empresas a possibilidade de produzirem com custos mais acessíveis,
oferecer imóveis a preços mais convidativos ou, em última análise, aumentarem as suas
margens de contribuição, ou os seus lucros.
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