REPRESENTAÇOES DE TRABALHO E GÊNERO
NO BICO DO PAPAGAIO
Construindo o perfil da mulher trabalhadora tocantinense
Eliseu Riscaroli1
Resumo: O presente trabalho origina-se de uma pesquisa que foi realizada em 2010 na
região do Bico do Papagaio, que esta localizada no extremo norte do Estado de
Tocantins. Um lugar onde pouco se discute a questão da mulher trabalhadora na
perspectiva das diferenças de gênero. A região é espaço, sobretudo das quebradeiras de
coco babaçu, trabalhadores rurais, assentamentos, agricultores familiares, pescadores e
coletores. A coleta foi realizada com 160 mulheres, sendo vinte mulheres de cada
cidade, priorizando profissões distintas para atender a proposta do projeto de mapear as
diferentes atividades produtivas de mulheres tocantinenses e assim obter dados que
pudessem oferecer elementos para construção de um perfil dessa trabalhadora,
considerando sua renda, grau de escolarização, cor, idade, estado civil, e profissão
ocupada por estas personagens em 8 cidades dos 25 municípios que compõem a região,
sendo elas: Tocantinópolis, Axixá, Augustinópolis, Araguatins, São Bento, São Miguel,
Luzinópolis e Nazaré. Nossa hipótese se fundamenta na ideia de que na região do Bico
do Papagaio o trabalho das mulheres tem significativa importância na economia de
subsistência, na educação e no setor de serviços, uma vez que elas detêm a maioria dos
cargos nos empregos públicos e comércio, além do trabalho doméstico e serviços em
geral, sendo na maioria dos casos, a maior renda que sustenta a casa e seus habitantes.
Assim a intenção deste projeto foi de mapear as atividades produtivas das mulheres que
vivem na região do Bico do Papagaio, para que pudéssemos construir um perfil da
mulher trabalhadora que vive nesta região. Nesta perspectiva, ao construirmos o perfil
da mulher Tocantinense, também estaríamos questionando o perfil da sociedade em que
vivemos, quando pensamos a cerca dos valores sociais que construímos formando esta
1 Dr em educação pela UFSCar, Professor adjunto de Filosofia da Educação do Curso de Pedagogia do
Campus de Tocantinópolis da Universidade Federal do Tocantins. [email protected] blog pessoal
http://masculinidadesegenero.wordpress.com
rede de significados, a qual somos sujeitos ativos e passivos de construção e
ressignificação. Historicamente a mulher foi nomeada como sendo ajudante do marido
ou como sendo promotora de atividades não ligadas a produção e sim à reprodução do
sistema. Embora tenha crescido a presença delas na escola, ainda percebe-se que o
salario delas quando comparado aos dos homens, é cerca de 30 % menor ocupando as
mesmas funções, salvo quando o emprego é fruto de cargos em serviço publico cujo
ingresso se faz por meio de concurso publico. De certa forma foi dessa representação
que os ideais de cuidado e educação foram sendo transferidos a ela, já que estes papeis
eram desempenhados por ela na casa, no espaço privado. Isso ainda tem reflexo da fala
de Engels acerca de que na família o homem é burguês e a mulher o proletariado.
Palavras chaves: Trabalho, Gênero, Tocantins, Representações, Bico do Papagaio.
Introdução
Este artigo analisa o impacto das relações entre renda, escolarização e atividade
produtiva na vida social e econômica de mulheres residente na região conhecida como
Bico do Papagaio, norte do Tocantins. Assim, cremos poder construir o perfil dessa
mulher trabalhadora que vive, sobretudo da vida domestica trabalhadora publica da
educação ou na rede de serviços. São, em sua maioria, de descendência negra, ganhando
em média ate um salário mínimo, são solteiras e possuem ate três filhos, exercendo
funções de quebradeiras de coco, cabeleireiras, domésticas, funcionárias públicas,
professoras, micro empresarias e etc.
Outro fator nos mostra que, das que recebem mais de dois salários mínimos,
grande parte estão cursando alguma graduação ou já são formadas, o que nos leva a uma
discussão a partir de Frigoto com a teoria do capital humano que discorre sobre a força
de trabalho como valor de troca em função do grau de escolaridade, isto é, quanto maior
for a sua escolarização maior será a sua renda o que nos dá uma relação muito
significativa entre teoria e pratica a partir dos dados coletados. Isso corrobora com a
reflexão de Bourdieu acerca do capital cultural institucionalizado que o individuo
amealha para ascender a outra ‘classe’.
Desse modo, esta pesquisa tentou mapear as atividades produtivas dessas
mulheres no norte do estado de Tocantins, para que pudéssemos construir o perfil dessa
mulher trabalhadora nos evidencia uma sujeita ativa que tem se tornado cada vez mais
autônoma e conquistado espaços ate então ocupado pelo sujeito do sexo masculino.
Contudo, a importância de tornar visível o perfil da mulher que vive nesta
região, e como essa relação entre trabalho, escolarização e renda tem influenciado seu
modo de vida, vai além da reflexão de Frigoto (2001) que enfatiza que a escola tem
contribuído para a reprodução da divisão capitalista do trabalho, pois sua organização
reproduz aspectos das relações de dominação e submissão da esfera econômica.
Por sua vez, para Hesíodo, o trabalho é a base da justiça entre os homens. Um
não perdura sem o outro pois a fome é companheira do ocioso. Ao contrario de Homero
que outras atividades que não a fatalidade do trabalho ocupa os homens.
Mas o autor também destila seu preconceito na questão de gênero:
“nem mulher de insinuadas ancas te engane a mente palreando
provocante com o olho em teu celeiro; quem em mulher confia,
em ladrões esta confiando” (v 373 a 375).
Mulher e trabalho
Se a observação de Engels foi pertinente ate pouco tempo, por razoes diversas
somente ela não consegue mais explicar essa correlação, senão vejamos:
A família individual moderna está baseada na escravidão
doméstica, transparente ou dissimulada, da mulher (...) é o
homem que, na maioria dos casos, tem de ser o suporte, o
sustento da família, pelo menos nas classes possuidoras, e isso lhe
dá uma posição de dominador que não precisa de nenhum
privilégio legal específico. Na família, o homem é o burguês e a
mulher representa o proletariado. (ENGELS, 2000, p.80.).
No século XXI o homem não tem mais predominância exclusiva acerca da
dominação da mulher. É bem verdade que, neste processo de produção do mundo, a
mulher produz e reproduz as relações econômicas, sociais e simbólicas tanto quanto o
homem.
Segundo Oliveira (1999), a expressão “mulher trabalhadora” ainda precisa de
ênfase, para ser mais significativa, quando se trata das relações de trabalho dentro desta
sociedade mantenedora de padrões masculinizados.
Para Bruschini e Rosemberg, as mulheres sempre exerceram alguma atividade,
executavam inúmeras tarefas em bem estar da família cotidianamente. O progresso
material dependia tanto da esposa quanto do marido. Nas famílias mais pobres o
trabalho da mulher significava a diferença entre a total privação e a subsistência. Com a
revolução industrial no século XIX o trabalho passou a ser dividido em duas esferas, a
domestica e a produção, cabendo ao homem o trabalho extra lar, isto é o produtivo, pelo
qual começou a receber salário, e a mulher coube principalmente a realização de tarefas
mais elementares ligadas a reprodução, sem remuneração. A ideologia se encarregou de
naturalizar essa divisão sexual do trabalho com a mistificação do papel de esposa e mãe
na medida em que casa e família passaram a ser a mesma coisa, naturalizando o
trabalho domestico como algo que deve ser feito de graça, por isso, mesmo a mulher
participando da produção continua sendo responsável pela execução dos afazeres
domésticos, o que lhe dá uma sobrecarga de dupla jornada de trabalho.
Desse modo, Segundo Bruschini e Rosemberg, para compreender a relação entre
mulher e trabalho deve se levar em consideração duas questões fundamentais: a) deve se
incluir formas não monetarizadas de participação na produção social, entre elas as
atividades ditas não produtivas e a B) é a participação da mulher em atividades
produtivas extra lar. Além disso, se ela é casada e tem filhos, não estudou, isso pode
dificultar a saída dela para o mercado de trabalho. Sendo solteira poderá trabalhar e
ampliar sua renda familiar. Se a família tem maior poder aquisitivo optarão por manter
seus filhos mais tempo na escola e contam com auxilio domestico remunerado, assim
suas mulheres poderão exercer atividades produtivas extra lar, enquanto as famílias
pobres mantém suas mulheres em casa e os filhos são acionados mais cedo para o
mercado de trabalho, abandonando com isso a escola.
Além disso, percebemos que as mulheres ‘donas de casa’, além de não ter ou
quando tem renda muito baixa, possuem baixa escolarização, o que se diversifica
quando percebemos as domesticas, geralmente, jovens, solteiras com ensino médio
concluído ou em curso, provavelmente estão inseridas neste modo de produção por esta
limitação da escolaridade, pois as mulheres de grau escolar mais elevado se inserem em
ocupações mais técnicas e cientificas principalmente no magistério publico municipal
ou estadual.
Geralmente as ocupações ligadas ao sexo feminino são de baixo prestígio, baixa
remuneração por estarem essencialmente carregadas de preconceito e por isso ser
consideradas atividades auxiliares sem muito valor econômico.
Também percebemos uma alteração relevante quando a separamos por cor, as
negras ocupam atividades mais inferiorizadas, ligadas ao campo, a costura, ao cuidado,
possuem baixos salários e baixa escolarização, as pardas divergem um pouco com
funções mais ligadas ao funcionalismo publico magistério, pequena empresa, mas
também nos trabalhos domésticos e na área do campo. Já as brancas ultrapassam as
pardas no quesito salário, são mais facilmente encontradas nas profissões liberais como
dentista, contadora e menos no campo, ou como domesticas, ou vendedoras, e assim
menos mulheres de baixa escolarização.
Aqui, percebemos a cor como um fato histórico, que desapropriou mulheres e as
desfavoreceu de posses e escolarização, o que acarreta desastrosamente em condições
desfavoráveis no acesso aos bens culturais e propriedade. O que nos faz pensar na
condição dessas mulheres a partir da escolarização, quando nos deparamos com o não
acesso de um determinado grau escolar como um grande determinante da condição
social dessas mulheres trabalhadoras, assim como de sua atividade (re)produtiva.
Se considerarmos os setores produtivos, segundo dados da Pnad 2005, teremos,
em números totais o seguinte quadro no Brasil, considerando a questão de gênero.
Quadro 01 – Emprego por setor segundo o sexo - 2005
Setor % de mulheres
Artigos de vestuário 83,6%
Comercio, serviço prestado as famílias 75,2%
Indústria têxtil 70,3%
Serviços privados não mercantis 66,7%
Administração publica 59,2%
Indústria diversa 55,4%
Comercio e instituições financeiras 50.2%
Fabricação de calçados 46.3%
Farmacêuticos e perfumarias 42.3%
Produtos alimentares 38.9%
Comercio 38.1%
Comercio e comunicações 35.1%
Comercio, serviços prestas a empresas 34.7%
Papel e gráfica 27.3%
Aluguel de imóveis e comercio 24.0%
Fonte: PNAD 1995-2005. Org. Castilho. 2007.
No trabalho a pesquisa evidencia principalmente uma feminilização das
atividades produtivas, sendo elas, professoras, atendente, domestica lavradora e outras,
mas também aparecem profissões ditas masculinas ou de poder como a de dentista,
contadora e vereadora. Há empresarias, no entanto estão ligadas a produção ou venda de
roupas, produtos alimentícios, onde podem gerir um negocio e ter melhores salários
com baixa escolarização.
Se considerarmos a jornada de trabalho no período de 1995/2005, temos o
quadro que segue. Muito embora os últimos dados do relatório da Organização
Internacional do Trabalho 2012 mostre que as mulheres trabalham cerca de 10 dias a
mais que os homens e que as mulheres negras sofrem mais com desemprego, mesmo
considerando maiores taxas de escolarização.
Quadro 02 – Jornada de trabalho media dos empregados com mais de 10
anos de idade, por sexo e setor selecionado – 1995/2005 – horas semanais. Setor 1995 2005
Masculino Feminino Masculino Feminino
Agropecuária 44.1 33.4 42.0 31.6
Siderurgia e metalurgia 44.2 41.5 44.1 40.0
Material elétrico e eletrônico 43.2 42.8 43.6 41.9
Madeira e mobiliário 45.2 37.4 44.9 40.0 +
Indústria têxtil 43.3 38.0 44.4 31.0
Fabricação de calçados 43.6 42.6 43.8 43.2 +
Produtos alimentares 47.5 39,5 45.1 35.7
Indústrias diversas 42.4 38.2 41.7 32.5
Comercio 46.2 39.3 45.8 39.6 +
Comercio, serviço prestado a famílias 46.0 39.9 43.3 37.2
Comercio, serviço prestado a 43.6 38.5 42.7 38.7 +
empresas
Administração publica 40.6 33.1 39.7 34.0 +
TOTAL 44.8 37.5 43.7 36.9
Fonte: PNAD 1995-2005. Org. Castilho. 2007.
+ indica aumento no numero de horas
O conceito de gênero avançou nessa compreensão limitadora do aparato
biológico na perspectiva de superar essa ideologia impregnada em nossos valores
culturais, explicando as diferenças que há entre os sexos. E para que haja melhoras
significativas na organização do trabalho produtivo é preciso haver uma reestruturação e
adequação do mercado que incorporem as necessidades das trabalhadoras na garantia de
seus direitos e promovam igualdade de oportunidade entre homens e mulheres.
Alguns dados gerais mostram como o Tocantins tem se comportado em relação
aos demais estados da federação quando o assunto é o produto interno bruto; macro
setor de atividade; índice Gini; principal setor de ocupação; taxa de alfabetização; de
analfabetismo funcional; anos de escolarização entre outros, considerando o relatório da
OIT 2012.
Quadro 03 – Dados gerais do Tocantins
Aspecto Econômico 2004 2009
PIB 24º 24º
RENDA PER CAPITA 6.556 11.278
MACRO SETOR - EXTRATIVISMO 73,2% 81,1%
INDICE GINI (Região norte) 0,539 0,523
SETOR ONDE MAIS SE OCUPARAM PESSOAS
MAIORES DE 16 ANOS NO TOCANTINS
37,5
(serviços)
39,9
(serviços)
TAXA DE FREQUENCIA LIQUIDA (06 A 14 ANOS E
ENSINO FUND. E MEDIO, RESPECTIVAENTE)
33,5%
ENSINO MEDIO
93,2 55,2
(E.F E.M)
TAXA DE ALFABETIZAÇAO (total) 82,8% 86,5%
TAXA DA ANLFABETISMO FUNCIONAL (total) 32,6% 25,2%
NUMERO MEDIO DE ANOS DE ESTUDOS (H E M) 5,7 6,4 6,8 7,8
Fonte: relatório OIT. 2012. IBGE. PNAD.
Um olhar mais apurado no relatório, vamos perceber que pelo índice Gini a
renda per capita diminuiu em todas as regiões de 2004 para 2009. Considerando a
questão particular da escolarização, temos: homens com 81,7 e mulheres com 83,9 para
o ano de 2004; e homens com 85,1 e mulheres com 87,9 para 2009. Os negros em
ambos os casos são o grupo que menos se beneficia dessa politica, conforme dados do
IBGE 2010:
0
10
20
30
40
50
60
Fundamental Medio Superior EJA
branca
preta
parda
Fonte: IBGE censo demográfico. 2010.
Da educação da mulher trabalhadora
A trajetória da mulher brasileira nos evidencia em que momento ela foi inserida
na educação e quais foram as condições que propiciaram sua inserção, então a partir dos
dados do Ministério da Educação no período de 1996 a 2003, faremos um breve
histórico da mulher trabalhadora na educação.
No Brasil a educação feminina de classe alta foi principalmente nos lares, mas já
no século XIX a escola publica oferecia o ensino misto, no entanto os pais dificultavam
sua inserção no ensino regular e se eram inseridas logo que aprendiam a ler e escrever
eram retiradas para não estragar um futuro brilhante que lhe destinavam, o casamento.
Pois, o estudo em excesso era considerado um empecilho ao casamento.
A educação no final do século XIX tinha um caráter voltado mais para os
afazeres domésticos e o cuidado com o marido e os filhos, somente nos anos seguintes
no inicio do século XX foi oportunizado às mulheres um ensino com ideias positivistas
e republicanas, principalmente pela atuação e pressão do movimento feminista nesse
período frente ao governo, para que lhes garantissem educação plena, depois vieram
outros movimentos que se formaram para dar direito à educação a todos inclusive aos
pobres a fim de acabar com analfabetismo no Brasil, pressionado principalmente pelos
países externos, foi se constituindo leis que garantissem educação para todos.
De modo geral a mulher se torna maioria no processo de escolarização depois
dos 30 anos, quando em tese já passou pelo casamento e deu a luz aos filhos. Não raro,
sua entrada ou a volta para o ensino médio e universidade é motivo de separação,
provocando com isso o aumento dos lares chefiados pelas mulheres.
QUADRO 04
Comparativo de evolução de escolaridade por sexo
ANOS DE ESTUDO Masculino Feminino
1995 2005 1995 2005
0 a 7 anos 69.0% 58.4% 50.8% 38.5%
8 a 11 anos 23.4% 29.2% 38.2% 43,2%
12 anos ou mais 7.3% 11.3% 10.4% 17.3%
Fonte: PNAD (1995-2005). Org. Castilho. 2007.
Para visualizarmos melhor a entrada da mulher na educação em nossa região,
vamos utilizar os dados do Ministério da Educação (2006). A inscrição na educação
infantil no período de 1996-2003 é maior do sexo masculino com 52,2% e 48% de
mulheres na região norte.
De acordo com a analise desse período a região Norte do país, a qual se insere o
Tocantins, possui um maior numero de meninos matriculados não só na educação
infantil, mas também há um crescente aumento na inscrição do ensino médio. Já no
ensino médio as matriculas de meninas cai em relação aos meninos no país de modo
geral, mas na região norte há uma quantidade significativa de meninas matriculadas de
54,9% frente aos meninos que estão com 45,9%.
Na graduação neste período de 1996-2003 nas regiões norte e nordeste foram as
que mais cresceram principalmente na região norte referente a matriculas de mulheres.
Também é possível verificar que as mulheres eram maioria na graduação no país, assim
como na docência universitária com mestrado e doutorado no âmbito da educação e as
áreas que titularam mais mulheres mestres e doutoras foram humanas e saúde. Havendo
um acréscimo de mulheres economicamente ativas, mesmo os homens ainda sendo
maioria na produção remunerada. Ainda na região norte as mulheres são referência na
família e em relação aos anos de estudo e salário.
Os dados também mostram que parte dessas alunas estudou em escolas privadas,
voltadas para baixo custo na área de humanas e sociais, o que nos faz pensar a condição
da mulher, concordando com Hirata (2007) que diz, “as mulheres são mais pobres, mais
precárias, mais desempregadas, mais sujeitas a violência. Elas tem menos acesso as
novas tecnologias da informação e da comunicação, menos acesso a formação
profissional e técnica, embora desfrutem mais da educação hoje do que no passado.”
E com tudo isso, fica fácil entender por que estão nestas áreas de atuação e no
ensino privado, pois sua condição de gênero e de raça/etnia tem um peso histórico de
desvalorização e preconceitos que estão agregados na cultura e nos valores que tecemos
ao longo dos anos que fazem refletir no modo de vivencia da mulher hoje e que
precisam ser questionados e reconstruídos.
Construindo o perfil da mulher Tocantinense
A região norte do Tocantins chamado Bico do Papagaio pelo seu formado
geográfico, e onde direcionamos nossa pesquisa para construir o perfil da mulher
tocantinense foi um lugar de luta e enfrentamento como a Guerrilha do Araguaia e luta
pela terra nos anos de 1980 cuja presença de padre Josimo teve seu expoente máximo.
Das 160 mulheres entrevistadas, a maioria, são de origem negra, não possuem
um companheiro, estudaram até o ensino médio, sua faixa salarial é de até um salario
mínimo, possuem casa própria, com faixa etária de 20 a 40 anos de idade. Além disso,
79 (49,3%) possuem em media 03 filhos, o que percebemos um crescente controle de
natalidade, sem deixar de mencionar que 45 (28,12%) não possuem filhos.
GRAFICO I
GRAU DE ESCOLARIDADE
0
5
10
15
20
25
30
35
40
não declarou
analfabeta
ensino fund
ensino medio inc
ensino medio
ensino tecnico
graduada
Nos questionários, as mulheres responderam a escolarização de nível
fundamental de ate o quinto ano e de até o nono ano, sendo que o primeiro corresponde
a 26 (16,25%) e o segundo a 12 (7,5%), e no quadro acima enquadramos ambos como
nível fundamental apenas, assim como as que responderam que estavam com graduação
em andamento e com nível técnico incompleto, aqui estão representadas como sendo do
nível médio e desse modo deixar mais conciso o nosso quadro representativo.
Mesmo em regiões mais remotas, o acesso à educação tem se configurado num
diferencial a maioria dos brasileiros, em particular as mulheres. Se no ensino
fundamental elas ocupam menor proporção das matriculas, no ensino médio e superior
elas já são a maioria. É bem verdade que quanto mais idade tem o jovem do sexo
masculino, mais propenso a entrar no mercado do trabalho, assim, eles deixam a
carreira de estudante para trabalhar e assim colaborar com a renda da família.
Mesmo ascendendo a um nível de maior escolaridade isso não garante as
mulheres um salario equivalente.
GRAFICO 2
RENDA
0
10
20
30
40
50
60
70
até 1 salário
de 1 a 2 salários
de 2 a 5 salários
de 5 a 10 salários
não declarou
Quanto a renda familiar, apenas 65 (40,62%) disseram que o marido possui
renda, tendo em vista que, 70 (43,75%) responderam possuir um companheiro, e 53
(33,12%) serem as únicas provedoras da casa. O que se percebe é um numero
significativo de mulheres com autonomia social e econômica provedoras do seu lar.
Sobretudo em carreiras ligadas ao funcionalismo publico municipal, percebe-se que a
grande massa recebe cerca de dois salários mínimos. No setor privado a diferença
salarial entre homens e mulheres, segundo dados nacionais chega a ser de 40%.
Do total de mulheres que possuem alguma renda, 20 (12,5%) são aposentadas,
em sua maioria como lavradora com até um salário mínimo e não chegaram a concluir o
ensino médio, além disso, algumas exercem alguma atividade produtiva para
complementar a renda familiar. Outras 12 (7,5%) são donas de casa e, das que exercem
alguma carreira profissional, percebemos que são atividades consideradas socialmente
femininas que, segundo Fonseca (2000), diz que a feminilidade esta constituída mais
para o exercício dos afetos do que da razão. Também percebemos que a maioria das
mulheres com renda a partir de dois salários mínimos possui nível superior, o que nos
leva pensar, que para ter uma melhor renda, é preciso que tenha um maior nível de
escolarização. Segundo Frigoto (2001) essa prática esta aplicada a teoria do capital
humano que é a força de trabalho, mais o nível de escolaridade para a ascensão de
maiores rendas.
GRAFICO 3
PROFISSAO
0
5
10
15
20
25trabalhadora rural
domestica
comerciaria
cabeleireira
vendedora
empresaria
autonoma
funcionaria publica
gerente
professora
contadora
dentista
Para Bruschini e Rosemberg:
“São as mulheres chefes de família aquelas que,
proporcionalmente, estão inseridas em maior número em
atividades produtivas. Inúmeras pesquisas indicam que a situação
das chefes de família esta intimamente associada a condições de
extrema pobreza. Obviamente, pressionadas pela necessidade de
ganhar a vida e sustentar a família, e não contando com o apoio
financeiro do esposo, são forçadas a ingressar no mercado de
trabalho, onde quer que este lhe abra oportunidade.” (pg. 14).
As profissões são diversas e percebemos a potencialidade da mulher de exercer
diferentes cargos e funções independente de sua escolarização, no entanto percebemos,
que a escolarização influência nos tipos de profissões exercidas e no nível de renda que
ela recebe. Como sabemos, há profissões que só podemos exercer a partir de
comprovação formal de nível de escolaridade que determinada a profissão a ser
exercida, no entanto há profissões que oscilam entre médio e superior como a de
professor, como aparece no quadro a cima, nos demonstrando uma certa flexibilidade na
administração das instituições educacionais.
É fato que há uma relação entre o grau de escolaridade, trabalho e renda dos
indivíduos sociais. Segundo Frigoto (2001) a teoria do capital humano propõe uma
equidade social entre os sujeitos produtivos, sugerindo inclusive a pensarmos que
independente do seu sexo, cor e classe social, podemos ascender financeiramente, tendo
a educação como elemento de valor de troca e distribuição de renda, isto é, quanto
maior for a sua escolaridade, maior será a sua renda.
Mas as relações sociais possuem exceções e são mutáveis como podemos
verificar ao longo da história e percebemos que entre elas, há mulheres que ascenderam
profissionalmente, sem necessariamente frequentarem uma universidade, além do
número elevado de mulheres provedoras, o que lhes dá um papel diferenciado ao
estabelecer relações de poder com a sociedade e os grupos que nela disputam espaço e
poder.
Considerações Finais
Ao discutirmos Gênero, precisamos compreender a relação de poder que há
entre os sexos, assim como suas representações culturais e sociais de como ser mulher e
de como ser homem, de como isso é transmitido as novas gerações, então percebemos
que, de acordo com os dados da pesquisa, as mulheres exercem atividades consideradas
socialmente femininas, que segundo Fonseca (2000), diz que a feminilidade está
constituída mais para o exercício dos afetos do que da razão.
O que configura o perfil das mulheres do norte tocantinense como uma mulher
jovem de cerca de 30 a 40 anos, com cerca de 3 filhos menores, que cursaram até o
ensino médio, recebem ate dois salários mínimos, tem casa própria e ocupam funções
mais elementares na cadeia de produção. Figuram também nas atividades relacionadas
ao cuidado e a educação.
Outra característica desta pesquisa foi a possibilidade de ver que na prática a
teoria do capital humano, que segundo Frigoto (2001) é a força de trabalho, mais o nível
de escolaridade para a ascensão de maiores rendas, tem influenciado nas relações
sociais e econômicas sobre o trabalho, na medida em que podemos perceber (Ver tabela
I) que a maioria das mulheres de nível superior, correspondem aos mais altos salários,
mas as relações sociais possuem exceções e são mutáveis como podemos verificar ao
longo da história. Então percebemos que entre elas há mulheres que, mesmo com baixa
escolaridade, ascenderam profissionalmente, sem necessariamente frequentarem uma
universidade, além do número elevado de mulheres provedoras do lar, cujo trabalho
constitui a fonte exclusiva de renda, muito embora as relações de poder estabelecidas
entre elas e a sociedade ainda mantenham representações mais no sentido de ajuda do
que de trabalho sociologicamente falando, sobretudo se ela é parte integrante de uma
família, com filhos, esposo.
Contudo, ao construirmos o perfil da mulher Tocantinense, também pudemos
revelar o perfil da sociedade que vivemos, quando pensamos a cerca dos valores sociais
que construímos formando esta rede de significados, a qual somos sujeitos ativos e
passivos de construção e ressignificação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BRASIL, Ministério da Educação. Trajetória da Mulher na Educação Brasileira
1996-2003. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira. Brasília, 2006.
BRABO, Tania S. A. Marcelino. Gênero, educação, trabalho e mídia. São Paulo.
Ícone. 2010.
BRUSCHINI, Maria Cristina A e ROSEMBERG, Fúlvia. A mulher e o trabalho.
Trabalhadoras do Brasil. Fundação Carlos Chagas, Editora Brasiliense. São Paulo.
1980.
CARVALHO, Maria E. P. & PEREIRA, Maria Z. da C. Gênero e Educação –
múltiplos olhares. Joao Pessoa. EdUFPB. 2003.
CASTILHO, Marta Reis. Brasil: Evolução do emprego feminino entre 1995-2005.
UFF/IGTN. 2007.
CATANI, Denise B. [et al]. Docência, memoria e gênero: estudos sobre formação.
São Paulo. Escrituras. 2003.
ENGELS, F. A origem da Família, da propriedade e do Estado. São Paulo: Escala
2000.
FONSECA, Mara Galli. Gênero subjetividade e trabalho. Editora Vozes, Petrópolis,
RJ, 2000.
FRIGOTO, Gaudêncio. A produtividade da escola improdutiva: Um (re) exame das
relações entre educação e estrutura econômica-social e capitalista. 6º Edição, Editora
Cortez, São Paulo, 2001.
GUIMARÃES, Jose Ribeiro Soares. Perfil do Trabalho Decente no Brasil: um olhar
sobre as unidades da federação. Brasília OIT. 2012.
HESIODO. Os trabalhos e os dias. Trad: Mary de Camargo N. Lafer. São Paulo.
Iluminuras. 2002.
HILLESHEIM, Betina. Trabalho doméstico – o serviço de sempre. IN gênero e
cultura: questões contemporâneas. Porto Alegre. EdiPUCRS. 2004.
HYPÓLITO, Álvaro M. Trabalho docente, classe social e relações de gênero.
Campinas. Papirus. 1997.
HIRATA, Helena. As novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos
de pesquisa. V. 37. 2007
LISBOA, Teresa K. Gênero, classe e etnia – trajetória de vida de mulheres migrantes.
Florianópolis. EdUFSC. 2003.
NOGEUIRA, Claudia M. A feminização do mundo do trabalho. Campinas. Autores
Associados. 2004.
OLIVEIRA, Elionora Menicucci. A mulher, a sexualidade e o trabalho. Editora CUT,
São Paulo. 1999.
PENA, Maria V. J. Mulheres e trabalhadoras. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 1981.
PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da historia. Trad: Viviane ribeiro.
Bauru. EdUSC. 2005.
TOURAINE, Alain. O mundo das mulheres. Trad: Francisco Moras. Petrópolis. Vozes.
2007.
Top Related