Waldir Beividas – USP – Elementos I - Fonética
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FONÉTICA / (FONOLOGIA) Jean Dubois et alii – Dictionnaire de linguistique. Paris: Larousse, 1973. “Fonética” [p. 373 ss.] “A fonética estuda os sons da linguagem na sua realização concreta, independentemente de sua função linguística (V. fonologia). ‘O que caracteriza particularmente a fonética é o fato de ela excluir por completo qualquer relação entre o complexo fônico estudado e sua significação linguística... A fonética pode portanto ser definida: a ciência da face material dos sons da linguagem humana’ (N. Trubetzkoy).” [p. 373] Fonéticas: Geral: estuda o conjunto das possibilidades fônicas do homem, através de todas as línguas naturais. Comparativa: Estuda os sons de duas ou mais línguas. Histórica: acompanha a evolução dos sons no transcurso da história da língua; Descritiva: estuda um dado momento dessa evolução. Dois ramos tradicionalmente distintos da fonética: 1) a fonética articulatória (=fisiológica), que estuda os movimentos dos órgãos fonadores durante a emissão da mensagem; 2) a fonética acústica (=física), que estuda a transmissão da mensagem pelas vibrações do ar e o modo como estas atingem o ouvido do receptor. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- (“Fonologia”) [estudaremos à parte depois da fonética. Convém dar uma olhada na definição p. 375 ss. “A fonologia é a ciência que estuda os sons da língua do ponto de vista da sua função no sistema de comunicação linguística. Estuda os elementos fônicos que distinguem, numa mesma língua, duas mensagens de sentidos diferentes (a diferença fônica da inicial nas palavras brasileiras bata e pata, a diferença de lugar do acento nas palavras italianas an’cora “ainda” e ‘ancora “âncora”, etc.) e os que permitem reconhecer uma mesma mensagem através de diferentes realizações individuais (vozes diversas, pronúncias diferentes, etc.). Ela se diferencia, nisso, da fonética, que estuda os elementos fônicos independentemente de sua função na comunicação.” Tradicionalmente são reconhecidos 2 grandes campos na fonologia: 1. a fonemática: estuda os fonemas, os traços SEGMENTAIS distintivos que os compõem, as regras que presidem à sua combinação na cadeia da fala. As duas operações da fonemática são a segmentação e a comutação {cf. Benveniste – “Os níveis da análise linguística”, mesmas operações postuladas para a determinação dos níveis} 2. a prosódia: estuda os traços SUPRA-SEGMENTAIS, que acompanham a realização de dois ou mais fonemas e que também têm função distintiva: o acento, o tom. Fonologias: Geral: estuda os principais sistemas fonológicos do mundo e as leis gerais de seu funcionamento; Contrastiva: estuda as diferenças de sistemas fonológicos entre duas ou mais línguas; Sincrônica: estuda o sistema fonológico num determinado estado da LN; Diacrônica: estuda as mudanças fonológicas na passagem de um estado a outro de uma LN.
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O advento da fonologia como ciência linguística esteve ligado ao desenvolvimento do estruturalismo linguístico na primeira metade do séc. XX. Saussure, inaugurando conceitos gerais como língua e fala, sistema, valor, etc. Depois, o Círculo linguístico de Praga, especialmente com Jakobson e Trubetzkoy. Apresentação de suas teses durante o Primeiro Congresso internacional de linguística (Haia, 1928).
Sobre FONÉTICA, livro da profa. Thaïs Cristófaro Silva: Fonética e Fonologia do Portuguêrs. São Paulo, Contexto, 2007.
“A fonética é a ciência que apresenta os métodos para a descrição, classificação e transcrição dos sons da fala, principalmente aqueles sons utilizados na linguagem humana.” [Thaïs, p. 23] Fonéticas: Articulatória: estudo da produção da fala do ponto de vista fisiológico e articulatório (é o objeto da primeira parte do livro da profa. Thaïs). Auditiva: estudo da percepção da fala. Acústica: estudo das propriedades físicas dos sons da fala, a partir de sua transmissão do falante ao ouvinte. Instrumental ou experimental: estudo das propriedades físicas da fala, com o apoio de instrumentos laboratoriais.
Livro Elementos II p. 19 - item 8 – Mecanismos de produção de segmentos consonantais e vocálicos
Todas as línguas naturais possuem vogais e consoantes. Segmento vocálico = um som produzido sem obstrução da passagem da corrente de ar. Segmento consonantal = um som produzido com algum tipo de obstrução nas cavidades supraglotais, de maneira que haja obstrução total ou parcial da passagem da corrente de ar, podendo haver fricção ou não. Segmento semivogal ou glide = combina características de ambos os precedentes. Parâmetros articulatórios para a identificação de segmentos consonantais:
1. Qual o mecanismo da corrente de ar?
A corrente de ar pode ser pulmonar, glotálica ou velar. No português, os segmentos consonantais são sempre produzidos com a corrente de ar PULMONAR.
2. A corrente de ar é ingressiva ou egressiva?
No português, é sempre egressiva. O francês inclui segmentos produzidos com a corrente de ar ingressiva, com valor de interjeição: oui pronunciado “para dentro”. [Há algumas interjeições brasileiras ingressivas (Tst! Tst! Tst! – sentido de reprovação com movimentos horizontais da cabeça ou apenas Tst! Indicando algo como decepção: Tst! Caramba que chato!] Ou então sons para fazer o cavalo andar.
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3. Qual o estado da glote?
Glote: espaço entre as cordas vocais. Vozeado (=sonoro) quando as cordas vocais vibram, Desvozeado (=surdo) quando não vibram. Uma descrição fina mostraria, na verdade, um continuum que leva do vozeado ao desvozeado, passando por graus intermediários de vozeamento. Para a descrição do português, serve a oposição privativa. Ex. /f/ vs /v/. 4. Qual a posição do véu palatino?
Segmento oral (úvula levantada, o ar não tem acesso à cavidade nasal) VS segmento nasal (úvula abaixada, há ressonância também na cavidade nasal). Ex. lá vs. lã; o fonema /l/ emitido continuamente (oral) e o fonema /n/ emitido da mesma maneira (nasal).
{ENTRA AQUI: FIG. Da página 13 de Elementos II: estudar bem as partes de localização dos órgãos articuladores. Atentar bem para a arcada alveolar [alvéolo: pequena cavidade)]} 5. Qual o articulador ativo?
O articulador ativo se movimenta em direção ao articulador passivo. São: o lábio inferior, a língua, o véu palatino e as cordas vocais.
{FIG. Da p. 15 de Elementos II } 6. Qual o articulador passivo?
São articuladores passivos: o lábio superior, os dentes superiores e o céu da boca (palato). O véu palatino tem a peculiaridade de poder entrar como articulador ativo (segmentos nasais) ou passivo (segmentos velares). [Att. Lugar ou ponto de articulação são duas expressões para a mesma localização bucal da produção dos fonemas]. Estudar bem os nomes dos pontos/lugares de articulação. Eles são decisivos para a classificação das consoantes
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Lugar/ponto de Articulação ↓
Exemplos Artic. ATIVO Artic. PASSIVO
Bilabial pá, boa, má lábio inferior lábio superior
Labiodental faca vá
lábio inferior dentes incisivos superiores
Alveolar dado, sapa, zero, nada, tato
ápice da língua alvéolos
Alveopalatal chá já
parte anterior da língua parte medial do palato duro
Palatal banha palha
parte média da língua parte final do palato duro
Velar casa gata rata (carioca)
parte posterior da língua
palato mole (véu palatino)
Glotal rata (pronúncia de Belo Horizonte)
músculos ligamentais da glote
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7. Qual o grau e natureza da estritura (=abertura), ou seja, qual o MODO OU MANEIRA de articulação?
Posição assumida pelo articulador ativo em relação ao passivo, indicando como e em que grau a passagem da corrente de ar pelo aparelho fonador é limitada nesse ponto. Para o português:
Modo/maneira de Articulação ↓
Exemplos Descrição
Oclusiva pá, tá, cá bar, dá, gol
Obstrução completa da passagem da corrente de ar. Ressonância oral apenas.
Nasal má nua banho
Obstrução completa da passagem da corrente de ar. Ressonância oral e nasal simultaneamente.
Fricativa fé, sapa, chá, vá, zero, já, rata (pronúncia de Belo Horizonte)
Aproximação dos articuladores, produzindo fricção durante a passagem central da corrente de ar. Obstrução parcial.
Africada tia (pron. tchia) dia (pron. djia)
Obstrução completa seguida de fricção, sempre no mesmo lugar de articulação.
Tepe ou Vibrante Simples
cara brava
O articulador ativo toca rapidamente o passivo. Ocorre uma breve obstrução.
Vibrante (Múltipla) Orra, mano! O articulador ativo toca algumas vezes o passivo. Ocorre vibração.
Retroflexa mar (pronúncia caipira) porta
A ponta da língua se encurva em direção ao palato duro.
Lateral lá palha sal (pronúncia gaúcha)
O articulador ativo toca o passivo e a corrente de ar é obstruída na linha central do trato vocal. Expulsão do ar por ambos os lados da obstrução.
Convenções para a ordem de notação dos segmentos consonantais. Via de regra, para a notação dos segmentos consonantais destaca-se primeiro os modos de articulação, em seguida o ponto/lugar e por fim o vozeamento, oralidade ou nasalidade: exemplos:
Modo/maneira de articulação Lugar/ponto de articulação Vozeamento
→ → →
[p] Oclusiva bilabial desvozeada
[b] Oclusiva bilabial vozeada
[m] Nasal Bilabial vozeada
Atenção: estudar bem esta tabela, a ponto de decorar as três classificações: modo/maneira; ponto/lugar e vozeamento
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Tabela fonética consonantal
Articulação
↓Modo/ Ponto/→
↓ Maneira Lugar →
Bila-bial Labio- dental
Dental ou
Alveolar
Alveo- palatal
Palatal Velar Glotal
Oclusiva
desvozeado vozeado
Africada
desvoz voz
Fricativa
desvoz voz
Nasal
Desvoz Voz
Tepe
desvoz voz
Vibrante
desvoz voz
Retroflexa
desvoz voz
Lateral
desvoz voz
Exemplos mais corriqueiros
= tia (carioca) = dia (carioca) – diz - disse
= chá – acha = já – hoje – haja – jogo - juca
= mar, carta, rato (fala carioca – desv.) ɣ= carga (fala carioca – velar - vozeada)
= rata, marra, mar, carta (BH – glote) = carga (BH – glote vozeada)
= a) banha (nhá) b) banha (baiano)
= cara, prata, mar carta (não caipira) = rata, marra (vibrante)
= mar, carta, porta, carga (caipira) = sal, salta ( um pouco puxado para o
« l ») ou (mais puxado para o « u ») = malha, calha, palha, família (com o lha bem pronunciado)
ou (com o « i » mais pronunciado, tipo: malia, calia, familia)
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VOGAIS - DESCRIÇÃO DOS SEGMENTOS VOCÁLICOS Confira o item 8.2 de Elementos II p. 22 e ss. Três critérios para a descrição: (i) a posição da língua em termos de altura; (ii) a posição da língua em termos de anterior/posterior; (iii) o arredondamento ou não dos lábios. Primeiro critério: ALTURA DA LÍNGUA Dimensão vertical ocupada pela língua dentro da cavidade bucal, variando de um ponto alto a um ponto baixo, e passando por diferentes alturas intermediárias. Ou seja: maior ou menor proximidade da língua em relação ao palato. Quatro níveis de altura suficientes para a descrição das vogais do português:
ALTURA DA LÍNGUA
Alta vi
jacu
Média-alta fez
avô
Média-baixa ɛfé
ɔ avó
Baixa lá
Segundo critério: ANTERIORIDADE/POSTERIORIDADE DA LÍNGUA Posição do corpo da língua na dimensão horizontal durante a articulação do segmento vocálico. A divisão da cavidade bucal se faz em três partes: anterior (= palatal), central e posterior (= velar).
ANTERIORIDADE/
POSTERIORIDADE
anterior central posterior
Alta vi
jacu
Média-alta fez
avô
Média-baixa ɛ fé
ɔ avó
Baixa lá
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Terceiro critério: ARREDONDAMENTO DOS LÁBIOS Lábios estendidos ou arredondados
ARREDONDAMENTO
não-arredondada arredondada
Alta vi
jacu
Média-alta e fez
avô
Média-baixa ɛ fé
ɔ avó
Baixa lá
ARTICULAÇÕES SECUNDÁRIAS DAS VOGAIS 2. DESVOZEAMENTO Em português, ocorre em vogais não acentuadas em final de palavra. Ex.: pata, sapo, bote.
Transcrição: ɐ-ʊ-ɪ 3. NASALIZAÇÃO
Em português: ã – ẽ – ĩ – õ – ũ Att. Fazer cuidadosamente os exercícios solicitados ao final do capítulo de fonética no livro Introdução II. Alguns sites para exercícios: http://www.fonologia.org/fonetica_consoantes.php http://www.alfabetofonetico.com.br/alfabeto-fonetico-internacional
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