História ou estórias do Paraná?
PROPOSTA DE FOLHAS SOBRE O TEMANARRATIVAS-LÍTERO HISTÓRICAS PARANAENSES: A
BUSCA DE UMA IDENTIDADE CULTURAL
IDENTIFICAÇÃO
NRE: Núcleo Regional Área Metropolitana Sul –Fazenda Rio GrandeNome do professor: Leslie Carlos Khervald de MouraColégio Doutor Décio Dossi, EFM.Disciplina: Língua Portuguesa/ Literatura. 1ª, 2ª e 3ª séries.
E-mail: [email protected]
HISTÓRIA OU ESTÓRIAS DO PARANÁ?
Conteúdo Estruturante: Discurso enquanto práticasocial
Conteúdo Específico: Narrativas Lítero-Históricasparanaenses
Título: Narrativas lítero-históricas paranaenses: abusca de uma identidade cultural
Relação interdisciplinar 1: HistóriaRelação interdisciplinar 2: Sociologia
“No combate, a imobilidade é a morte.” General Carneiro, líder da
resistência no cerco da Lapa.
História ou estórias do Paraná?
“O Paraná é um Estado típico desses que não têm um traço que faça dele alguma
coisa notável, nem geo-
graficamente como a Amazônia, nem pitorescamente
como a Bahia ou o Rio Grande do Sul. Sem uma linha vigorosa de história como São Paulo,
Minas e Pernambuco, sem uma natureza característica como o Nordeste, sem lendas de
primitivismo como o Mato Grosso e Goiás. Por isso o Paraná forma nessa retaguarda
característica de incaracterísticos. (...) O paranaense não existe! (...) O Paraná é um Estado
sem relevo humano”. (Brasil Pinheiro Machado)
Caso Pinheiro Machado I
O texto acima foi retirado de um artigo escrito por Brasil Pinheiro Machado,
publicado na revista A Ordem, do Rio de Janeiro. Seria um desabafo, uma crítica ou uma
constatação? Discuta oralmente em sala de aula, procurando justificar suas
afirmações
Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-1973), ilustre cidadão paranaense,
professor, político, escreveu em resposta as afirmações do Sr. Brasil Pinheiro
Machado, o seguinte: “O Sr. Brasil Pinheiro Machado (...) estudando o desnorteante
da União Brasileira, fixa instantâneos paranaenses, entrevistos não sei por que
prisma, que os torna negativos, mesquinhos, humilhantes e – sobretudo – falsos”.
Em seguida, faz uma bela defesa do nosso estado, realçando nossos
valores e significados, como o caldeamento das raças, o significado da terra, do
homem, as nossas lendas do primitivismo, nossa intelectualidade, terminando por
abordar a significação do Paraná: “(...) o Paraná é, sobretudo, o encanto da terra que
nos absorve, nos prende e nos fascina. É a terra única, de tantas gerações,
esquecida, quando a nossa preocupação era cantar a Marselhesa e ler Rousseau. É a
terra que venceu a nossa educação fictícia e estranha, e nos fez compreender que
temos de ser nós mesmos, criar uma expressão humana nossa, uma modalidade
nossa, uma civilização nossa.” (NETO).
Caso Pinheiro Machado II
E agora? Depois de ler outra opinião sobre o artigo de Pinheiro Machado,
escrita à mesma época por um político influente paranaense, a sua opinião inicial
sobre Brasil Pinheiro mudou? Ou foi reforçada?
Collégio Paranaguaense (1856)
Não existindo ainda na província do Paraná um estabelecimento que
proporcione aos paes de família os meios de darem a suas filhas uma educação que
esteja ao par de seus desejos e dos deveres que ellas serão chamadas a preencher
como mães de família, madame Taulois e suas filhas, madame Gabrielle Jeanne e
madame Eugenie V. Cadeae, se propõe a remover essa difficuldade, fundando na
cidade de Paranaguá um collegio de meninas que se abrirá no 1º de abril deste anno
de 1856. (...)
O ensino abrangerá: - leitura, escripta, grammatica nacional, língua
francesa e ingleza, elementos de arithmetica, princípios geraes de historia e
geographia universal com desenvolvimento especial concernente á historia sagrada, e
historia e geographia do Brazil, musica, canto, piano, dansa, desenho, pintura e
prendas domesticas, comprehendendo todos os trabalhos de agulha, tapeçaria,
bordados e crochet. (...)
As meninas que dormirem no collegio devem trazer: - sua roupa e um
vestido preto para irem á missa, roupa de cama, colchão e travesseiro, um espelho,
pente fino, dito de alizar, escova de dentes, dita de unhas, banha para o cabelo e
sabonete.
Paranaguá, 20 de março de 1856. (Anúncio retirado do jornal O
Dezenove de Dezembro, 1856).
SUGESTÕES DE ATIVIDADES:
01 - Bento Munhoz da Rocha afirma que foi importante romper com a nossa
educação estranha e fictícia. Considerando essa afirmação e após a leitura
do texto sobre a escola para meninas em Paranaguá, é possível compreender qual
era a principal influência de que ele estava falando? Por que era estranha?
02 - Analisando o atual ensino da História e Literatura no Paraná, é correto
afirmar que ainda hoje a Educação no Paraná recebe influências externas? Ou
já temos uma tradição própria e destacamos os textos e os autores do nosso
estado?
03 - Você concorda com a opinião de Bento Munhoz da Rocha, quando afirma
que nós paranaenses precisamos aprender a ser nós mesmos, a criar uma
expressão humana nossa? Em sua opinião, como isso pode ser feito?
04 - O colégio do anúncio acima era apenas para meninas. Nota-se, claramente,
que a sociedade da época tinha uma visão diferente sobre a mulher. Discuta
em sala alguns avanços que a sociedade conquistou nos últimos anos com
relação à participação e valorização da mulher, bem como discuta alguns
avanços que ainda precisam ser conquistados.
05 - Sugestão de atividade de pesquisa: Você percebeu como a nossa língua
está em constante evolução? O modo de falar e de escrever dos paranaenses
sofreu muitas alterações através do tempo. Assim como alguns usos e costumes.
Converse em casa com seus pais ou avós sobre algumas mudanças que eles
considerem significativas entre a época deles e de seus antepassados e o
momento atual. Anote em seu caderno e traga essas informações para
apresentação em sala, contribuindo, desta forma, para valorização de sua própria
história e para enriquecer o estudo sobre o assunto.
ALGUNS VERSOS SOBRE O PARANÁ
Pinheiro Machado era paranaense, natural de Ponta Grossa, onde nasceu em
1907. Note a importância dos seguintes versos que ele escreveu sobre os paranaenses da
sua região, num poema que fala sobre a fundação de sua terra natal, Ponta Grossa. Neste
poema, o autor fixa retratos das gentes, dos costumes e de visões de época:
(...)
O brasileiro nortista que chegava
Dizia que aquilo não era Brasil
Que aquilo era uma aldeia russa.
Que o verdadeiro Brasil estava lá no Amazonas
Lá no nordeste
Lá no sertão de Canudos
Onde os homens eram de bronze
O ano todo era verão
E as casas todas tinham só linhas curvas
Que não podia ser Brasil onde houvesse geada até o meio-dia
Onde em vez de caboclo meio bronze mulato,
Andassem polacos fazendo berganhas de porco e plantando mandioca
Onde os bandoleiros em vez de usarem a roupa de couro dos cangaceiros
E cantarem modinhas tristes de negros e índios
Usassem bombachas largas e boleadeiras e cantassem (meu Deus!) em castelhano.
Só que o brasileiro do norte que chorava a desbrasilidade do sul
Não notou que quando parava o seu fordinho na estrada esburacada
E apeava para pedir água ou comprar fruta na chacrinha em frente
O polaquinho
O russinho
O alemãozinho
O italianinho
Nascido ali
traduzia o pedido do viajante pro pai e do pai pro viajante
Numa língua igualzinha à dos caboclos de cor de bronze amulatado
Sem regra de gramática portuguesa, graças a Deus!
Sugestões de atividades:
01 É possível identificar no poema de Pinheiro Machado idéias que
“aparentemente” contradizem seu primeiro artigo sobre o paranaense?
Explique:
02 Por que até a nossa geografia era considerada “estrangeira”?
03 A partir da leitura do poema, relacione outras diferenças culturais entre os
paranaenses e os habitantes de regiões mais ao norte do Brasil e as discuta
em sala.
04 Observe com atenção a repetição do diminutivo nos substantivos polaquinho,
russinho, alemãozinho, italianinho? Algumas gramáticas apenas informam que
o uso do diminutivo e do aumentativo é para indicar grau. A intenção do autor,
neste caso, era chamar a atenção apenas para o tamanho dos personagens?
Ou o diminutivo pode ser usado para expressar outros significados?
05 De acordo com o poema, é possível afirmar que aqueles personagens
paranaenses, apesar de tantas diferenças, tinham uma unidade com os demais
brasileiros? Explique que unidade era essa e qual a sua importância.
06 - A partir da leitura do poema, pode-se subentender que os Paranaenses foram
criando um modo próprio de falar o português? Discuta com seus colegas sobre as
variantes regionais da fala. O paranaense tem um modo característico de falar o
português? Existe uma variante mais correta do que outra?
Caso Brasil Pinheiro Machado III
Você percebeu como não é difícil tomar-se uma versão da história por aquilo
de fato aconteceu na história. Caso ficássemos apenas com a primeira impressão
sobre Pinheiro Machado, ou até com a segunda, poderíamos estar cometendo uma
grande injustiça. E agora? Após conhecer um pouco mais sobre esse cidadão
paranaense? Você manteria sua primeira opinião?
AFINAL: É história ou estória?João Guimarães Rosa (1908-1967), escritor mineiro, utilizou o termo estória em
seu livro Primeiras estórias para referir-se aos contos de ficção que escreveu.
Algumas estórias dos contos poderiam de fato ter sido verdadeiras, ou seja, histórias.
Alguns personagens do seu livro, até pouco tempo, com certeza ainda existiam em
carne e osso pelo grande sertão. Mas para a literatura ficcional não importa se o fato
aconteceu historicamente. O que importa é que ele seja verossímil, ou seja,
acreditável. Por isso gostamos de ouvir e ler até as estórias que na vida real seriam
impossíveis. Acreditamos nelas. Deixamo-nos enredar.
David Carneiro, historiador paranaense, escreveu o livro A história do incidente
Cormoran, (1950) em que tenta esclarecer, um século depois do ocorrido, o episódio
do combate entre o navio cruzador inglês e a fortaleza da Barra, em Paranaguá. O
que tudo indica é que o Cormoran estava em perseguição a possíveis navios
negreiros em mares paranaenses. Na introdução explicativa do livro, Carneiro faz uma
reflexão sobre história. Segundo David Carneiro, sobre o caso do Cormoran, faltava
“aquilo que hoje se denomina crítica histórica (...) Ninguém se afastou do fato para
analisar causas, nem biografias. Ninguém sequer ventilou com imaginação, as
conseqüências prováveis do combate (...)” Em seguida, reconhece a dificuldade para
“encher todas as lacunas apontadas”. Afirmando seu desejo de apenas colocar nas
mãos do público as poucas bases documentais que conseguiu, derivando, segundo
suas palavras: “em comentário e em relato, o que daqueles elementos pude sacar”.
(CARNEIRO, 1950)
Sugestões de atividades:
01 - O verbo sacar, utilizado por David Carneiro ainda é utilizado hoje em dia, ou é um
arcaísmo, ou seja, uma palavra que caiu em desuso?
02 - David Carneiro chegou a afirmar que a imaginação seria importante para ajudar a
esclarecer a história. Você concorda com isso? Explique em que medida a imaginação
e criatividade podem ser usadas em benefício da história.
03 - Por outro lado, quando um texto é uma narrativa literária ficcional (estória) de
fundo histórico, há condições mais favoráveis de se preencher lacunas da história com
imaginação? Explique:
04 - Sugestão de pesquisa: Entre outras questões, era vergonhoso para o Brasil um
navio negreiro como o Cormoran ser perseguido em águas nacionais quando a
escravidão já vinha sendo abolida na maior parte do mundo. A escravidão em nosso
estado é um entre outros assuntos ainda não bem esclarecidos sobre nossa história.
Tem sido este um tema bastante explorado pelos nossos escritores? Ou continua
sendo uma incógnita, um tema pouco compreendido? Pesquise sobre esse tema. Em
seguida, traga as informações sobre os textos que encontrar para discussão em sala.
Conhecendo um pouco mais nossa própriahistória.
Nas próximas páginas, vamos refletir sobre a importância do
conhecimento da nossa própria história. Apresentaremos trechos de algumas
narrativas lítero-históricas paranaenses. Elas são textos importantes em que se
podem buscar alguns indícios de nossa formação cultural, social, política e
econômica.
NARRATIVA LITERÁRIA HISTÓRICA; UMACRÔNICA ANTIGA
Os primeiros relatos sobre a nossa terra não foram feitos por moradores
daqui. Ainda não existia o Estado do Paraná. O primeiro relato conhecido é o da
viagem de Álvar Nuñes Cabeza de Vaca, numa época em que os moradores desta
terra viviam em tribos e não dominavam a escrita. Estes primeiros europeus a pisar
em solo paranaense utilizaram os peabirus, nome pelo qual eram conhecidos os
caminhos de índios, entre 1541 e 1542. De acordo com os relatos, essa viagem foi
iniciada na então Ilha de Santa Catarina, em 29 de março de 1541. Com 250
homens de armas, 36 cavalos, alguns índios, Cabeza de Vaca seguiu pelo rio
Itapocu, atravessou a serra do mar, à margem oriental de Campo do Tenente,
chegando ao Iguaçu nas proximidades de Araucária. Quando passou por aqui, as
terras teoricamente pertenciam à coroa espanhola. Denominou-as, primeiramente,
de “Província de Vera”. Seguiu viagem para o norte em direção aos rios Ivaí e
Piquiri, chegando à foz do Iguaçu. Espanhóis foram, então, os que primeiro viram e
relataram sobre nossa terra e nossa gente.
(...) quando já terminavam os mantimentos, quis Deus que chegassem ao que
chamam de Campo, (região acima da serra do mar) onde estavam as primeiras
povoações (...) cujos senhores principais se chamavam Añiriri, Cipoyay e
Tocanguanzu. Quando esses índios souberam de sua chegada saíram para
recebê-los, carregados com muitos mantimentos e muito alegres, demonstrando
grande prazer com a sua vinda. (...) o Governador também os recebeu com grande
prazer e amizade e, além de pagar-lhes o preço que valiam, deu aos índios
principais muitos presentes, inclusive camisas (...) Esses índios pertencem à tribo
dos guaranis, são lavradores que semeiam o milho e a mandioca duas vezes por
ano, criam galinhas e patos da mesma maneira que nós na Espanha, possuem
muitos papagaios, ocupam uma grande extensão de terras e falam uma só língua.
Mas também comem carne humana e tanto pode ser dos índios seus inimigos, dos
cristãos ou dos seus próprios companheiros de tribo.
É gente muito amiga, mas também muito guerreira e vingativa. (...) Aos 29
do mês de novembro o governador partiu (...) caminhando duas jornadas, a 1° de
dezembro chegou a um rio que os índios chamam de Iguaçu, que quer dizer
água grande. (Atingiram esse rio na região de Tindiqüera, atual Araucária). (...) aos
três dias de dezembro chegaram a um outro rio que os índios chamam Tibagi, que
era todo ladrilhado, com lajes grandes e bem formadas como se ali tivessem sido
colocadas pelo homem. (Próximo de Ponta Grossa). (...) dia 19 chegaram a um
povoado de índios guaranis, que vieram recebê-los muito contentes, trazendo suas
mulheres e filhos, além de muitos mantimentos como galinha, batata, pato, mel,
farinha de milho e farinha de pinheiro, que produzem em grande quantidade, porque
há pinheiros tão grandes por ali que quatro homens com os braços estendidos não
conseguem abraçar um. (...) aos quatorze dias do mês de janeiro, chegaram a um
rio muito largo e caudaloso que se chama Iguaçu. É um rio muito bom, de bastante
pescado e muitas árvores na ribeira. (...) é muito povoado (...), estando ali a gente
mais rica de todas estas terras. São lavradores e criadores, além de ótimos
caçadores e pescadores. Entre suas caças estão os porcos selvagens, veados,
antas, faisões, perdizes e codornas. (...) Também colhem muitas frutas e mel. (...)
Toda a sua gente é muito amiga e com muito pouco trabalho poderão ser trazidos
para a nossa fé católica. (...) Tendo deixado os índios do rio Piquiri muito contentes,
o governador seguiu o seu caminho (...) por onde passavam, os índios cantavam e
dançavam e sentiam maior prazer quando as velhas se alegravam, pois são muito
obedientes a estas, o mesmo não se dando com relação aos velhos. (...) o
governador comprou algumas canoas dos índios e embarcou com oitenta homens
rio Iguaçu abaixo (...) mas (...) era tão forte a correnteza que as canoas corriam com
muita fúria. Logo adiante do ponto onde haviam embarcado o rio dá uns saltos por
uns penhascos enormes e a água golpeia a terra com tanta força que de muito longe
se ouve o ruído. (...)
Na presente narrativa há apenas história?
As narrativas de Cabeça de Vaca, sem dúvida são narrativas históricas.
Seriam também literárias? Fábio Campana, que fez o prefácio da edição do livro
Cabeza de Vaca - comentários, da Coleção Farol do Saber, 1995, caracteriza assim
a presente narrativa: “São evidentes as influências de leituras da época, das novelas
bizantinas aos livros de cavalaria. Um belo texto. Nada que lembre os fastidiosos
relatórios oficiais. Cabeza de Vaca não escreveu para agradar o Rei, mas para dar
testemunho, realista e pungente, de sua vida, sua época, seus tormentos.” Na
literatura nacional esse estilo é classificado como Literatura de Informação. Nela se
inclui toda a literatura (aqui significando um conjunto de textos escritos) dos
cronistas da época sobre o Brasil, como a famosa carta de Pero Vaz de Caminha,
que é considerada a carta de achamento (nascimento) do Brasil.
Existe uma diferença fundamental entre o fato histórico e o relato do
mesmo fato. A diferença é que o fato aconteceu apenas num dado momento no
passado. O que vem até nós são as versões do fato, ou, em alguns casos, uma
única versão do fato. A narrativa lítero-histórica, no entanto, continua acontecendo,
a cada nova leitura. E continua gerando novas leituras sobre os mesmos fatos. Bem
como novas dúvidas, novas interpretações. Quando o narrador diminui a
objetividade, colocando suas impressões pessoais, suas dúvidas, seus temores,
fantasias, e, principalmente, utilizando a linguagem de forma criativa, passa mais
para o campo da ficção, ou, como quis Guimarães Rosa, para o campo estória.
Uma intriga entre Cabeza de Vaca e os padres da expedição.
De 6 a10 de janeiro foram cruzados muitos povoados de índios
guaranis, sempre acontecendo o mesmo tratamento. O que passou a
acontecer de diferente, no entanto, era que os padres Bernaldo de Armenta e
Alonso Lebrón passaram a ir na frente para receberem os mantimentos,
fazendo com que, quando o governador chegava, os índios não tivessem mais
nada para entregar-lhe, com o que ficavam muito frustrados. Diante das
freqüentes queixas que começaram a acontecer, o governador os advertiu para
que não fizessem mais isso, nem tampouco continuassem a carregar índios
inúteis, conforme vinham fazendo. Apesar das advertências, eles continuaram
com o mesmo procedimento e o governador só não os expulsou por causa do
serviço que prestavam a Deus e a Sua Majestade. Mesmo assim, voltou a
adverti-los, o que fez com que decidissem abandonar a comitiva e seguir por
outro caminho, através de outros povoados. O governador, no entanto,
mandou busca-los de volta, o que foi a salvação dos mesmos, pois certamente
não conseguiriam sobreviver sozinhos por onde haviam se metido.
Hora de contar estória: A versão dos padres nunca foi contada.
Imagine que um dos mesmos fez um relatório à Igreja apresentando sua versão dos
fatos. Em primeira pessoa, construa essa narração.
Sugestões de atividades:
01 No livro As guerras dos índios Kaigang, Lúcio Tadeu Mota questiona a tese
dos colonizadores do Paraná de que o Estado era desabitado. Até os mapas
oficiais eram construídos sem demarcar os núcleos de povoações indígenas. A
narrativa de Cabeza de Vaca confirma a crítica de Lúcio ou reafirma o senso
comum sobre os vazios demográficos? Explique:
02 Por que os padres tinham o costume de “carregar índios inúteis”, segundo
afirmou Cabeza de Vaca? Quais eram as “boas intenções” dos padres jesuítas?
Eram as mesmas dos colonizadores?
03 A partir das observações do autor sobre a cultura nativa do Século XVI,
discuta em sala sobre: a) alguns valores sociais, em relação à família,
sociedade; b) alguma tecnologia básica da época, entendida aqui como
conhecimento aplicado para resolução dos problemas da comunidade.
04 A famosa catarata da Foz do Iguaçu tem 64 metros de altura e 2471 metros
de largura. Se Cabeza de Vaca e seus comandados chegaram até ela, foram os
primeiros homens brancos a observá-la. É possível suspeitar disso a partir do
texto? Por quê?
05 Cabeza de Vaca narra em terceira pessoa a sua própria história, ao invés de
preferir a costumeira primeira pessoa, mais comumente usada nestes casos.
Construa uma hipótese sobre o que motivou Cabeza de Vaca a narrar em
terceira pessoa os acontecimentos que vivenciou. Existe alguma vantagem
nisso.
06 Os primeiros contatos entre europeu e índio, narrados aqui, não estão um
pouco romantizados, ou seja, não teriam sido idealizados? Essa descrição da
relação entre o branco e o índio é a que perdurou pela história? Ou teríamos aí
uma boa dose de estória?
07 Indios brasileiros em corpo europeu: é o que as pinturas e desenhos da época
revelam. Por quê?
08 É um rio muito bom, de bastante pescado e muitas árvores na ribeira. (...) é
muito povoado (...), estando ali a gente mais rica de todas estas terras.”
Considerando a descrição acima, sobre a povoação às margens de um dos rios
mais importantes do Brasil, o Iguaçu, reflita sobre o que aconteceu com as
populações indígenas. Eram ricas? Por quê? Quais eram os valores de riqueza?
O que aconteceu com a riqueza dos nossos antepassados?
Referências bibliográficas:
BETTES, Maristella Della Giacoma / ARAÚJO, Adelice. Colégio Estadual do
Paraná: acervo da pinacoteca. Curitiba. Imprensa Oficial, 2002.
CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1975.
CARNEIRO, Davi. A História do incidente Cormoran. Curitiba. Papelaria Universal,
1950.
MOTA, Lúcio Tadeu. As guerras dos índios Kaigang: a história épica dos índios
Kaigang no Paraná. Maringá. 20. Ed. EDUEM – Editora da Universidade Estadual de
Maringá, 1994.
MURICY, Andrade. O símbolo à sombra das araucárias: memórias. Conselho
Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais, 1976.
Top Related