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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 621-STJ

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO CIVIL

DIREITO À IMAGEM A Súmula 403 do STJ é inaplicável para representação da imagem de pessoa como coadjuvante em documentário

que tem por objeto a história profissional de terceiro. EVICÇÃO É dever do alienante transmitir ao adquirente o direito sem vícios, de forma que se caracteriza a evicção se existir

um gravame que impede a transferência do bem. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS É possível a aplicação do art. 528, § 7º do CPC/2015 para execuções iniciadas na vigência do antigo CPC.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Plano de saúde coletivo que mais se assemelha a um contrato individual e impossibilidade de rescisão unilateral

imotivada.

DIREITO PENAL

LEI MARIA DA PENHA Fixação do valor mínimo para reparação dos danos prevista no art. 387, IV, do CPP.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

EXECUÇÃO PENAL Unificação das penas não é considerado como sendo a data-base para a concessão de novos benefícios da execução

penal.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR

COMPETÊNCIA Civil que furta arma de soldado da Aeronáutica dentro de estabelecimento militar: crime militar.

DIREITO TRIBUTÁRIO

PIS/COFINS O valor pago a título de ICMS não deve ser incluído na base de cálculo do PIS/PASEP e COFINS.

DIREITO INTERNACIONAL

HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA A ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual na homologação de

provimento estrangeiro. Não cabe renúncia em processo de homologação de sentença estrangeira.

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DIREITO CIVIL

DIREITO À IMAGEM A Súmula 403 do STJ é inaplicável para representação da imagem de pessoa como coadjuvante

em documentário que tem por objeto a história profissional de terceiro

Ação de indenização proposta por ex-goleiro do Santos em virtude da veiculação indireta de sua imagem (por ator profissional contratado), sem prévia autorização, em cenas do documentário “Pelé Eterno”. O autor alegou que a simples utilização não autorizada de sua imagem, ainda que de forma indireta, geraria direito a indenização por danos morais, independentemente de efetivo prejuízo.

O STJ não concordou.

A representação cênica de episódio histórico em obra audiovisual biográfica não depende da concessão de prévia autorização de terceiros ali representados como coadjuvantes.

O STF, no julgamento da ADI 4.815/DF, afirmou que é inexigível a autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais bem como desnecessária a autorização de pessoas nelas retratadas como coadjuvantes.

A Súmula 403/STJ é inaplicável às hipóteses de representação da imagem de pessoa como coadjuvante em obra biográfica audiovisual que tem por objeto a história profissional de terceiro.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.454.016-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/12/2017 (Info 621).

Imagine a seguinte situação adaptada: No documentário “Pelé Eterno”, em uma das cenas é retratado o jogo entre os times do Santos e do Botafogo da Paraíba. Nesta cena, a produção do documentário utilizou um ator (dublê) para representar a imagem, semelhança e referência de Jair, o goleiro do Santos na época. Diante disso, Jair ajuizou ação de indenização por danos morais contra a produtora do documentário alegando que foi utilizada a sua imagem sem autorização. O autor invocou, para tanto, a súmula 403 do STJ, que tem a seguinte redação:

Súmula 403-STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

O debate, portanto, é saber se a utilização da imagem do indivíduo, ainda que realizada por meio de um ator (dublê), sem a devida autorização, em filme, serve de suporte ao pedido de reparação de danos materiais e compensação de danos morais, independentemente da comprovação de prejuízo. O STJ concordou com o pedido do autor? Há direito à indenização no presente caso? NÃO.

A Súmula 403/STJ é inaplicável às hipóteses de representação da imagem de pessoa como coadjuvante em obra biográfica audiovisual que tem por objeto a história profissional de terceiro. STJ. 3ª Turma. REsp 1.454.016-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/12/2017 (Info 621).

Não foi utilizada a imagem propriamente dita A imagem propriamente dita do autor da ação não foi exibida, considerando que foi utilizado ator profissional para representá-lo.

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Não houve propósito econômico ou comercial na cena Além disso, mesmo que se considere que essa representação cênica do mencionado fato importou na utilização, ainda que indireta, da imagem do autor, fato é que não se revela razoável concluir que sua inclusão no filme em discussão teve propósito econômico ou comercial. Com todo respeito à história pessoal e profissional do autor da demanda, não há nada que indique que a inclusão dessas brevíssimas cenas tenha incrementado de alguma maneira o valor comercial da obra. Tanto é assim que, acaso suprimidas as cenas e contada de outra maneira essa passagem da vida de Pelé, nada perderia a obra em seu conteúdo ou potencial de público. A própria obra em si consiste em documentário biográfico, sendo marcada, assim, mais por seu caráter histórico e de interesse social do que por eventual finalidade comercial. STF permitiu a realização de biografias sem autorização do biografado Por fim, cumpre anotar que o STF, no julgamento da ADI 4.815/DF, deu interpretação conforme à Constituição, sem redução de texto, aos arts. 20 e 21 do Código Civil no tocante à discussão relativa à divulgação de escritos, à transmissão da palavra, à produção, publicação, exposição ou utilização da imagem de pessoa em obras biográficas literárias ou audiovisuais. A conclusão do STF foi a de reconhecer ser inexigível a autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, sendo também desnecessária autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes). Confira trecho do acórdão:

(...) Ação direta julgada procedente para dar interpretação conforme à Constituição aos arts. 20 e 21 do Código Civil, sem redução de texto, para, em consonância com os direitos fundamentais à liberdade de pensamento e de sua expressão, de criação artística, produção científica, declarar inexigível autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, sendo também desnecessária autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes). STF. Plenário. ADI 4815, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 10/06/2015.

EVICÇÃO É dever do alienante transmitir ao adquirente o direito sem vícios, de forma que se caracteriza a

evicção se existir um gravame que impede a transferência do bem

Caracteriza-se evicção a inclusão de gravame capaz de impedir a transferência livre e desembaraçada de veículo objeto de negócio jurídico de compra e venda.

Caso concreto: foi vendido um carro, mas, antes que pudesse ser transferido à adquirente, houve um bloqueio judicial sobre o veículo. Foi necessário o ajuizamento de embargos de terceiro para liberação do automóvel, sendo, em seguida, desfeito o negócio. Neste caso, caracterizou-se a evicção, gerando o dever do alienante de indenizar a adquirente pelos prejuízos sofridos.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.713.096-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/02/2018 (Info 621).

Evicção A evicção ocorre quando: ­ a pessoa que adquiriu um bem ­ perde a posse ou a propriedade desta coisa ­ em razão de uma decisão judicial ou de um ato administrativo

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­ que reconhece que um terceiro possuía direitos anteriores sobre este bem ­ de modo que ele não poderia ter sido alienado. Após perder a posse ou a propriedade do bem, o adquirente (evicto) deverá ser indenizado pelo alienante por conta deste prejuízo. O fundamento desta indenização está no princípio da garantia. Logo, não interessa discutir se o alienante estava ou não de boa-fé quando vendeu o bem. Mesmo de boa-fé, ele terá a obrigação de indenizar o evicto. Veja como o Min. Luis Felipe Salomão definiu o instituto: “A evicção consiste na perda parcial ou integral da posse ou da propriedade do bem, via de regra, em virtude de decisão judicial que atribui o uso, a posse ou a propriedade a outrem, em decorrência de motivo jurídico anterior ao contrato de aquisição.” (REsp 1.332.112-GO). Evicção vem do latim evincere ou evictio, que significa algo como “ser vencido”. Na língua portuguesa existe o verbo “evencer”, que significa “promover a evicção de alguém”. A evicção representa um sistema especial de responsabilidade negocial. Veja como o tema já foi cobrado em prova: (Juiz TRF3 2016 banca própria) A evicção consiste na perda parcial ou integral da posse ou da

propriedade do bem, via de regra, em virtude de decisão judicial que atribui o uso, a posse ou a propriedade a outrem, em decorrência de motivo jurídico anterior ao contrato de aquisição. (certo)

(DPE/MS 2012) Maria vendeu um automóvel a Alfredo, alegando estar livre e desembaraçado de ônus. Porém, um mês após a tradição, o bem foi penhorado e arrematado por dívidas de Maria anteriores à venda. Em razão desse fato, assinale a alternativa correta. A) Não se operou a evicção, uma vez que a constrição do bem é posterior à alienação. B) Alfredo tem direito à restituição integral do preço que pagou em decorrência da evicção. C) Não pode Alfredo demandar pela evicção porque ela não subsiste para constrições judiciais. D) Alfredo terá direito a receber o preço que pagou se houver cláusula expressa para reforçar esse tipo de perda. Resposta: letra A

Exemplo João comprou um terreno de Bartolomeu. De repente, aparece Gilberto ajuizando uma ação reivindicatória contra João e afirmando que Bartolomeu não poderia ter vendido o terreno porque não lhe pertencia. A ação é julgada procedente e João perde o terreno. Personagens Na evicção, temos os seguintes personagens: • evictor: é o terceiro reivindicante do bem (ex: Gilberto); • evicto: é o adquirente do bem, que perdeu a ação movida pelo evictor (ex: João); • alienante: é o que transferiu o bem ao evicto, e por isso, deve responder pela evicção, indenizando-o (ex: Bartolomeu). Indenização devida em caso de evicção Após perder a posse ou a propriedade do bem, o adquirente (evicto) deverá ser indenizado pelo alienante por conta deste prejuízo. O valor da indenização englobará o preço pago pelo evicto na compra do bem e mais as outras despesas que ele comprove ter realizado. Segundo o art. 450 do CC, o evicto possui o direito de receber as seguintes quantias:

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• restituição integral do preço que pagou, com juros e correção monetária; • indenização pelos frutos que tiver sido obrigado a restituir ao evictor; • indenização pelas benfeitorias necessárias ou úteis não abonadas (art. 453); • indenização pelas despesas do contrato; • reembolso das custas judiciais e honorários advocatícios; • indenização pelos prejuízos que diretamente resultarem da evicção.

Veja o que diz o CC:

Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além da restituição integral do preço ou das quantias que pagou: I – à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir; II – à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que diretamente resultarem da evicção; III – às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele constituído.

O valor do preço do bem é calculado segundo a data da evicção (e não com base no dia da aquisição):

Art. 450 (...) Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do valor da coisa, na época em que se evenceu (no momento da perda e não na data da alienação), e proporcional ao desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.

Assim, por exemplo, se a pessoa comprou o bem por 200 mil reais, mas na data da evicção (anos mais tarde), a coisa valia 300 mil reais, este último valor é que deverá ser devolvido ao evicto. Qual é o prazo prescricional para esta ação de indenização baseada na evicção? 3 anos. A pretensão deduzida em demanda baseada na garantia da evicção submete-se ao prazo prescricional de três anos (STJ. 3ª Turma. REsp 1.577.229-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 8/11/2016. Info 593). Imagine agora a seguinte situação hipotética: João queria vender seu carro e, para tanto, deixou o automóvel no pátio da empresa AutoSeller, que trabalha com a intermediação de compra e venda de veículos seminovos. Rafaela foi até a empresa AutoSeller e se interessou pelo carro de João que estava ali exposto, decidindo comprá-lo. Rafaela entregou o dinheiro, no entanto, antes que conseguisse transferir o carro para o seu nome, houve um bloqueio judicial do veículo em razão de uma dívida de João. Diante disso, a AutoSeller foi obrigada a ingressar com embargos de terceiro tendo, depois de alguns meses, conseguido a liberação do bem. Ocorre que Rafaela desistiu do negócio, tendo a AutoSeller reembolsado a antiga adquirente. Nesse cenário, a AutoSeller ingressou com ação de cobrança contra João pedindo o ressarcimento dos danos sofridos, por intermediar a compra e venda de automóvel que foi bloqueado por ordem judicial, impossibilitando a transferência da propriedade e ensejando a resolução do contrato pela adquirente. A ação deverá ser julgada procedente? A empresa tem direito de ser ressarcida? Houve evicção neste caso? SIM.

Caracteriza-se evicção a inclusão de gravame capaz de impedir a transferência livre e desembaraçada de veículo objeto de negócio jurídico de compra e venda. STJ. 3ª Turma. REsp 1.713.096-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/02/2018 (Info 621).

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O que o juiz deve fazer neste caso? O magistrado deverá determinar que as partes voltem a seu estado inicial, com a devolução do automóvel a João, a restituição do valor a Rafaela (compradora) e o ressarcimento dos danos que a AutoSeller experimentou. Há indenização mesmo o automóvel tendo sido, ao final, liberado? SIM. O fato de haver decisão judicial liberando o bem não elimina o direito da empresa de ser indenizada pelos prejuízos que sofreu. Isso porque ela teve que contratar advogado e fazer outras despesas para recuperar a posse do bem, além de ter tido que restituir os valores que haviam sido pagos pela adquirente. Neste caso, é possível falar em evicção mesmo não tendo havido “perda da coisa”? SIM. Tradicionalmente, fala-se que a evicção é a perda da coisa. No entanto, a Min. Nancy Andrigui explica que a evicção não se configura apenas com a “perda da coisa” em si, mas sim com a privação de um direito que incide sobre a coisa. Esse direito pode ser não apenas sobre a propriedade, mas também sobre a posse. Assim, ocorre a evicção quando há privação do direito de propriedade ou de posse sobre a coisa. E essa privação pode ser total ou parcial. A inclusão de um gravame sobre a coisa é um exemplo de privação parcial que incide sobre o bem. O fato de ter sido constituído um gravame sobre o bem, tornando necessário o ajuizamento de embargos de terceiro para que se pudesse obter a respectiva liberação evidencia que houve o rompimento da sinalagmaticidade das prestações. Isso porque pelo contrato, o alienante deveria ter transmitido o bem livre de qualquer restrição, sob pena de responder pela evicção. Em palavras mais simples, o alienante não cumpriu a sua parte da obrigação.

EXECUÇÃO DE ALIMENTOS É possível a aplicação do art. 528, § 7º do CPC/2015 para execuções iniciadas na vigência do antigo CPC

É possível a aplicação imediata do art. 528, § 7º, do CPC/2015 em execução de alimentos iniciada e processada, em parte, na vigência do CPC/1973.

A regra do art. 528, §7º, do CPC/2015, apenas incorpora ao direito positivo o conteúdo da pré-existente Súmula 309/STJ, editada na vigência do CPC/1973, tratando-se, assim, de pseudonovidade normativa que não impede a aplicação imediata da nova legislação processual, como determinam os arts. 14 e 1.046 do CPC/2015.

STJ. 3ª Turma. RHC 92.211-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/02/2018 (Info 621).

Imagine a seguinte situação hipotética: Em 2015, Lucas ajuizou execução de alimentos sob o rito do art. 733 do CPC/1973 pedindo a prisão civil do seu pai, devedor. Em 2016, já sob a vigência do novo CPC, o juiz determinou a prisão civil do executado, fundamentando sua decisão no art. 528, § 7º do CPC/2015, que preconiza:

Art. 528 (...) § 7º O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.

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O devedor impetrou habeas corpus alegando, dentre outros argumentos, que a decisão não poderia ter aplicado o art. 528, § 7º do CPC/2015 considerando que a execução teve início com o CPC anterior. O argumento do executado foi acolhido pelo STJ? NÃO.

É possível a aplicação imediata do art. 528, § 7º, do CPC/2015 em execução de alimentos iniciada e processada, em parte, na vigência do CPC/1973. STJ. 3ª Turma. RHC 92.211-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/02/2018 (Info 621).

O art. 528, §7º, do CPC/2015 apenas positivou o entendimento contido na Súmula 309 do STJ, publicada em 19/04/2006, de modo que a regra vigente à época do início da execução de alimentos já era a mesma. Veja o que diz o enunciado do STJ e confira que possui redação semelhante ao art. 528, § 7º do CPC/2015:

Súmula 309-STJ: O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.

Desse modo, o art. 528, § 7º do CPC/2015 é uma pseudonovidade normativa (DIDIER JR., Fredie. Eficácia do novo CPC antes do término do período de vacância da lei in Coleção grandes temas do novo CPC: direito intertemporal. Vol. 7. Coord.: Flávio Luiz Yarshell e Fábio Guidi Tabosa Pessoa. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 317/323). Ainda que assim não fosse, a teoria do isolamento dos atos processuais, expressamente adotada nos arts. 14 e 1.046 do CPC/2015, determina que a nova legislação processual deverá ser aplicada imediatamente, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas, não havendo, na hipótese, retroação da lei nova sob qualquer ótica e, assim, inexistente a violação de qualquer regra de direito intertemporal.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Plano de saúde coletivo que mais se assemelha a um contrato individual

e impossibilidade de rescisão unilateral imotivada

Não é válida a rescisão unilateral imotivada de plano de saúde coletivo empresarial por parte da operadora em face de microempresa com apenas dois beneficiários.

No caso concreto, havia um contrato coletivo atípico e que, portanto, merecia receber tratamento como se fosse um contrato de plano de saúde individual. Isso porque a pessoa jurídica contratante é uma microempresa e são apenas dois os beneficiários do contrato, sendo eles hipossuficientes frente à operadora do plano de saúde.

No contrato de plano de saúde individual é vedada a rescisão unilateral, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.701.600-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 06/03/2018 (Info 621).

Imagine a seguinte situação hipotética: SILVA ANDRADE ME, microempresa individual, possuía, há 20 anos, um contrato de plano de saúde coletivo com a INTERSAÚDE S.A.

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Determinado dia, a INTERSAÚDE notificou a microempresa dizendo que não tinha mais interesse em manter o contrato, fazendo a rescisão unilateral do pacto. Vale ressaltar que o contrato de plano de saúde coletivo beneficiava apenas duas pessoas, quais sejam, o titular da empresa e a sua esposa. Em razão da rescisão unilateral e imotivada, a beneficiária teve que interromper um tratamento de doença que fazia na época. A conduta da operadora de plano de saúde foi lícita? NÃO.

Não é válida a rescisão unilateral imotivada de plano de saúde coletivo empresarial por parte da operadora em face de microempresa com apenas dois beneficiários. STJ. 3ª Turma. REsp 1.701.600-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 06/03/2018 (Info 621).

Modalidades de planos de saúde O art. 16, VII, da Lei nº 9.656/98 prevê que existem três modalidades de planos de saúde: a) individual ou familiar; b) coletivo empresarial e c) coletivo por adesão. Plano de saúde individual O plano de saúde individual é aquele em que a pessoa física contrata diretamente com a operadora ou por intermédio de um corretor autorizado. A vinculação de beneficiários é livre, não havendo restrições relacionadas ao emprego ou à profissão do usuário em potencial (art. 3º da RN n. 195/2009 da ANS). Planos de saúde coletivo O plano de saúde coletivo é aquele contratado por uma empresa, conselho, sindicato ou associação junto à operadora de planos de saúde para oferecer assistência médica e/ou odontológica às pessoas vinculadas às mencionadas entidades, bem como a seus dependentes. São dois os regimes de contratação de planos de saúde coletivos: b) o coletivo empresarial, o qual garante a assistência à saúde dos funcionários da empresa contratante em razão do vínculo empregatício ou estatutário (art. 5º da RN nº 195/2009 da ANS); e c) o coletivo por adesão, contratado por pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, como conselhos, sindicatos, cooperativas e associações profissionais (art. 9º da RN nº 195/2009 da ANS). Nos contratos de plano de saúde coletivo, portanto, a relação jurídica de direito material envolve uma operadora e uma pessoa jurídica que atua em favor de uma classe (coletivo por adesão) ou em favor de seus respectivos empregados (coletivo empresarial). Estipulação em favor de terceiro O contrato de plano de saúde coletivo caracteriza-se como uma estipulação em favor de terceiro, em que a pessoa jurídica figura como intermediária da relação estabelecida substancialmente entre o indivíduo integrante da classe/empresa e a operadora (art. 436, parágrafo único, do Código Civil). Isso porque a estipulação do contrato de plano de saúde coletivo ocorre, naturalmente, em favor dos indivíduos que compõem a classe/empresa, verdadeiros beneficiários finais do serviço de atenção à saúde. Regulamentação da rescisão dos planos de saúde O art. 17-A, § 6º da Lei nº 9.656/98 autorizou que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) editasse normas regulamentando as hipóteses de rescisão dos contratos de plano de saúde.

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Rescisão em caso de plano de saúde coletivo A ANS, cumprindo essa determinação do legislador, editou Resolução Normativa autorizando que a operadora do plano de saúde faça a rescisão unilateral e imotivada do contrato coletivo, desde que: a) o contrato contenha cláusula expressa prevendo a possibilidade de rescisão unilateral; b) o contrato esteja em vigência por período de pelo menos 12 meses; c) haja a prévia notificação da rescisão com antecedência mínima de 60 dias. Rescisão em caso de plano de saúde individual No caso de plano de saúde individual, a própria Lei nº 9.656/98 reservou um tratamento mais restritivo para eventual rescisão. O art. 13, parágrafo único, II, da Lei previu o seguinte:

Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação. Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: (...) II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; e

Voltando ao caso concreto: Como o plano de saúde da SILVA E ANDRADE ME era um plano de saúde coletivo, em tese, seria possível a rescisão unilateral mediante a simples notificação prévia. No entanto, o STJ entendeu que, no caso concreto, havia um contrato coletivo atípico e que, portanto, merecia receber tratamento como se fosse contrato individual. Isso porque a pessoa jurídica contratante é uma microempresa e são apenas dois os beneficiários do contrato e hipossuficientes frente à operadora do plano de saúde. A Lei dos Planos de Saúde pensou nos planos coletivos como sendo aquele ajuste no qual há uma população (grupo de pessoas) vinculada a uma pessoa jurídica, seja por vínculo empregatício/estatutário, seja por vínculo profissional, classista ou setorial. Ora, a contratação por uma microempresa de plano de saúde em favor de dois únicos beneficiários não atinge o escopo da norma que regula os contratos coletivos, justamente por faltar o elemento essencial de uma população de beneficiários. Desse modo, o STJ entendeu que a rescisão unilateral e imotivada feita pelo plano de saúde coletivo representou abuso de direito, devendo, portanto, ser aplicadas as regras do plano individual a fim de corrigir essa situação abusiva.

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DIREITO PENAL

LEI MARIA DA PENHA Fixação do valor mínimo para reparação dos danos prevista no art. 387, IV, do CPP

Importante!!!

Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória.

CPP/Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido.

STJ. 3ª Seção. REsp 1.643.051-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 28/02/2018 (recurso repetitivo) (Info 621).

A sentença penal condenatória, depois de transitada em julgado, produz diversos efeitos. Um dos efeitos é que a condenação gera a obrigação do réu de reparar o dano causado:

Código Penal Art. 91. São efeitos da condenação: I — tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

A sentença condenatória, inclusive, constitui-se em título executivo judicial:

Código de Processo Civil Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado;

Assim, a vítima (ou seus sucessores), de posse da sentença que condenou o réu, após o seu trânsito em julgado, dispõe de um título que poderá ser executado no juízo cível para cobrar o ressarcimento pelos prejuízos sofridos em decorrência do crime. Art. 387, IV, do CPP O art. 387, IV, do CPP prevê que o juiz, ao condenar o réu, já estabeleça na sentença um valor mínimo que o condenado estará obrigado a pagar a título de reparação dos danos causados. Veja:

Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: IV — fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719/2008)

Desse modo, se o magistrado, na própria sentença, já fixar um valor certo para a reparação dos danos, não será necessário que a vítima ainda promova a liquidação, bastando que execute este valor caso não seja pago voluntariamente pelo condenado. Veja o parágrafo único do art. 63 do CPP, que explicita essa possibilidade:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

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Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. (Incluído pela Lei nº 11.719/2008).

O STJ analisou a aplicação do art. 387, IV, do CPP nas sentenças proferidas em casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar. Vejamos as principais conclusões: O art. 387, IV, do CPP trata apenas de prejuízos materiais ou ele também poderá ser utilizado para danos morais? O juiz, na sentença criminal, poderá condenar o réu a pagar indenização à vítima por danos morais? SIM. O art. 387, IV, do CPP abrange tanto danos materiais como morais. Nesse sentido:

O juiz, ao proferir sentença penal condenatória, no momento de fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração (art. 387, IV, do CPP), pode, sentindo-se apto diante de um caso concreto, quantificar, ao menos o mínimo, o valor do dano moral sofrido pela vítima, desde que fundamente essa opção. STJ. 6ª Turma. REsp 1.585.684-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016 (Info 588).

Isso porque o art. 387, IV, não limita a indenização apenas aos danos materiais e a legislação penal deve sempre priorizar o ressarcimento da vítima em relação a todos os prejuízos sofridos. Para que seja fixado o valor da reparação, deverá haver pedido expresso e formal do MP ou do ofendido? SIM. Para que seja fixado, na sentença, o valor mínimo para reparação dos danos causados à vítima (art. 387, IV, do CPP), é necessário que haja pedido expresso e formal, feito pelo parquet ou pelo ofendido, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1688389/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/03/2018). É necessário que o MP ou o ofendido, ao fazer o pedido, apontem o valor líquido e certo pretendido? NÃO. Não é necessário que o Ministério Público ou a vítima quantifique o valor mínimo que pretende ver fixado. Basta que seja pedida a fixação de valor mínimo a título de reparação do dano causado pelo crime, sem necessidade de mencionar uma quantia líquida e certa. Assim, por exemplo, basta que o MP diga: juiz, fixe a quantia mínima de que trata o art. 387, IV, do CPP. Não é necessário que diga: Excelência, fixe R$ 20 mil a título de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração. Para a fixação do valor da reparação, é necessária a produção de provas dos prejuízos sofridos? DANOS MATERIAIS: SIM. Em caso de danos materiais, o juiz somente poderá fixar a indenização se existirem provas nos autos que demonstrem os prejuízos sofridos pela vítima em decorrência do crime. Dessa feita, é importante que o Ministério Público ou eventual assistente de acusação junte comprovantes dos danos causados pela infração para que o magistrado disponha de elementos para a fixação de que trata o art. 387, IV do CPP. Vale ressaltar, ainda, que o réu tem direito de se manifestar sobre esses documentos juntados e contraditar o valor pleiteado como indenização. Nesse sentido:

A fixação da reparação civil mínima também não dispensa a participação do réu, sob pena de frontal violação ao seu direito de contraditório e ampla defesa, na medida em que o autor da infração faz jus à manifestação sobre a pretensão indenizatória, que, se procedente, pesará em seu desfavor. (...) STJ. 5ª Turma. REsp 1236070/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/03/2012.

DANOS MORAIS: NÃO. Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral independentemente de instrução probatória.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12

A humilhação e a dor que geram dano moral decorrem, inequivocamente, da situação de quem é vítima de uma agressão verbal, física ou psicológica, na condição de mulher. Assim, não há razoabilidade em se exigir instrução probatória para comprovar o dano psíquico, o grau de humilhação, a diminuição da autoestima da vítima. Isso porque a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo ao valor da mulher como pessoa e à sua própria dignidade. A única prova que se exige é a de que houve o crime porque, uma vez demonstrada a agressão à mulher, os danos psíquicos dela resultantes são evidentes e nem têm mesmo como ser demonstrados. O dano moral é, portanto, considerado como in re ipsa. Resumindo:

Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória. STJ. 3ª Seção. REsp 1.643.051-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 28/02/2018 (Info 621).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

EXECUÇÃO PENAL Unificação das penas não é considerado como sendo a data-base

para a concessão de novos benefícios da execução penal

Importante!!!

Mudança de entendimento!

A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal.

Assim, não se pode desconsiderar o período de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração disciplinar, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta disciplinar grave. Se isso for desconsiderado, haverá excesso de execução.

STJ. 3ª Seção. REsp 1.557.461-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/02/2018 (Info 621).

Situação hipotética 1: Em 04/04/2010, João praticou o crime A. Em 05/05/2011, João praticou o crime B. Em 2012, João foi condenado a 6 anos pelo crime A, tendo recebido o regime inicial semiaberto. Não houve recurso, tendo ocorrido o trânsito em julgado em 06/06/2012, iniciando-se a execução penal. Em 2013, João, após cumprir 1/6 da pena, foi para o regime aberto. Ocorre que, em 2014, sobreveio a condenação pelo crime B, tendo ele recebido a pena de 2 anos. Houve trânsito em julgado em 07/07/2014. Diante disso, o juiz unificou as duas penas: 4 anos que faltavam para cumprir a pena do crime A + 2 anos do crime B. João já estava no regime aberto, mas, como a pena unificada somou 6 anos, ele teve que regredir para o regime semiaberto.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13

A data-base para a concessão dos benefícios da execução penal (ex: progressão) era 06/06/2012 (trânsito em julgado do crime A). Indaga-se: com a unificação das penas, essa data-base foi alterada? A data-base passou a ser o dia do trânsito em julgado do crime B? NÃO. A unificação das penas não altera a data-base para a concessão de novos benefícios da execução penal. Isso porque a LEP não prevê essa alteração, devendo ser considerado todo o tempo que o apenado já cumpriu de pena, ou seja, todo o tempo em que ele já ficou preso.

A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal. STJ. 3ª Seção. REsp 1.557.461-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/02/2018 (Info 621).

Assim, no exemplo acima, ao se calcular o prazo para que João obtenha nova progressão de regime, deverá ser levado em consideração todo o período em que ele está preso, ou seja, desde 06/06/2012. Assim, ele irá cumprir o requisito objetivo ao completar 1/6 da pena unificada contado desde 06/06/2012. Situação hipotética 2: Em 04/04/2010, Pedro praticou o crime A. Em 2012, Pedro foi condenado a 6 anos pelo crime A, tendo recebido o regime inicial semiaberto. Não houve recurso, tendo ocorrido o trânsito em julgado em 06/06/2012, iniciando-se a execução penal. Em 2013, Pedro, após cumprir 1/6 da pena, foi para o regime aberto. Em 05/05/2014, Pedro praticou o crime B. O processo pelo segundo delito (crime B) ainda está tramitando. Mesmo assim, isso irá interferir na execução penal relativa ao crime A. Haverá a regressão do sentenciado, na forma do art. 118, I, da Lei nº 7.210/84:

Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;

Vale ressaltar que, para que haja a regressão com fundamento neste art. 118, I, da LEP não é necessário o trânsito em julgado quanto ao novo crime cometido, bastando a sua prática. Este é o entendimento pacífico do STF e do STJ.

Súmula 526-STJ: O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato.

Desse modo, imagine que, em 07/07/2014, mesmo antes de haver condenação pelo crime B, o juiz já determinou que Pedro sofra a regressão de regime. Vale ressaltar que, com o cometimento do novo crime, há prática de falta grave, o que significa a interrupção do prazo para a progressão de regime, nos termos da súmula 534 do STJ:

Súmula 534-STJ: A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração.

Em 08/08/2015, Pedro é condenado pelo crime B a uma pena de 4 anos, havendo trânsito em julgado. A data-base para a nova progressão em favor de Pedro era 05/05/2014 (data do cometimento da falta grave). Indaga-se: com a unificação das penas, essa data-base foi alterada? A data-base passou a ser o dia do trânsito em julgado do crime B (08/08/2015)? NÃO. A unificação das penas não altera a data-base para a concessão de novos benefícios da execução penal. A LEP não prevê essa alteração.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14

A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal. STJ. 3ª Seção. REsp 1.557.461-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/02/2018 (Info 621).

O período de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração disciplinar não pode ser desconsiderado, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta grave. Assim, no exemplo acima, ao se calcular o prazo para que Pedro obtenha nova progressão de regime, deverá ser levado em consideração todo o período em que ele está preso desde a prática da falta grave (07/07/2014 – data em que houve a interrupção por força de lei). Assim, ele irá cumprir o requisito objetivo ao completar 1/6 da pena unificada contado desde 07/07/2014. Não há alteração na data-base, seja o novo crime anterior ou posterior ao início da execução da pena Se o crime foi anterior ao início da execução (situação 1), a superveniência do trânsito em julgado da condenação enseja apenas a adequação da pena e o ajuste do regime, observando-se a detração e a remição, ou seja, o apenado não perde o tempo de pena cumprido. O tempo de pena efetivamente cumprido deve ser levado em consideração para a concessão de benefícios da execução, não havendo se falar, portanto, em novo marco interruptivo. Assim, caso o crime cometido no curso da execução tenha sido registrado como infração disciplinar, seus efeitos já repercutiram no bojo do cumprimento da pena, pois, segundo a jurisprudência consolidada do STJ, a prática de falta grave interrompe a data-base para concessão de novos benefícios executórios, à exceção do livramento condicional, da comutação de penas e do indulto. Portanto, a superveniência do trânsito em julgado da sentença condenatória não poderia servir de parâmetro para análise do mérito do apenado, sob pena de flagrante bis in idem. De igual forma, se o crime foi praticado após o início da execução (situação 2), a superveniência do trânsito em julgado da condenação também só pode ensejar a adequação da pena e o ajuste do regime. Isso porque a prática de crime durante a execução da pena é considerada falta grave, o que acarreta a regressão de regime de cumprimento da pena e a interrupção do prazo para obtenção dos benefícios da execução, fixando-se, nesse momento, a nova data-base. A superveniência do trânsito em julgado não pode ser novo marco interruptivo, sob pena de um mesmo fato repercutir duas vezes sobre a execução, sem que haja justificativa plausível, em evidente excesso de execução. O delito praticado antes do início da execução da pena não constitui parâmetro idôneo de avaliação do mérito do apenado, porquanto evento anterior ao início do resgate das reprimendas impostas não desmerece hodiernamente o comportamento do sentenciado. As condenações por fatos pretéritos não se prestam a macular a avaliação do comportamento do sentenciado. Havendo nova condenação, há unificação das penas, mas sem alteração da data-base para os novos benefícios Se o reeducando está cumprindo pena e surge uma nova condenação, haverá a soma ou unificação das penas. É o que prevê o art. 111, parágrafo único da LEP:

Art. 111 (...) Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime.

Não existe, contudo, previsão legal de que o simples fato de ter havido a unificação das penas signifique que deverá haver alteração da data-base para novos benefícios. Não existe determinação legal nesse sentido. Assim, haverá a unificação, mas sem nova interrupção do tempo necessário para a obtenção de progressão de regime, por exemplo.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR

COMPETÊNCIA Civil que furta arma de soldado da Aeronáutica dentro de estabelecimento militar: crime militar

Compete à Justiça Militar processar e julgar o crime de furto, praticado por civil, de patrimônio que, sob administração militar, encontra-se nas dependências desta.

Caso concreto: civil furtou, dentro de estabelecimento militar, pistola que estava na posse de soldado da Aeronáutica.

Fundamento: art. 9º, III, “a”, do Código Penal Militar.

STJ. 3ª Seção. CC 145.721-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 22/02/2018 (Info 621).

Imagine a seguinte situação hipotética: João conseguiu entrar no Parque de Material Aeronáutico de São Paulo e dali subtraiu uma pistola Taurus 9mm, pertencente à Força Aérea Brasileira e que estava na posse de um soldado, que se distraiu. Qual foi o crime praticado por João e de quem é a competência para julgá-lo? João praticou o crime de furto qualificado (art. 240, § 5º, do CPM), devendo ser julgado pela Justiça Militar. Competências da Justiça Militar Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes militares, assim definidos em lei (art. 124 da CF/88). A lei que prevê os crimes militares é o Código Penal Militar (Decreto-Lei 1.001/1969). • No art. 9º do CPM são conceituados os crimes militares em tempo de paz. • No art. 10 do CPM são definidos os crimes militares em tempo de guerra. Assim, para verificar se o fato pode ser considerado crime militar, sendo, portanto, de competência da Justiça Militar, é preciso que ele se amolde em uma das hipóteses previstas nos arts. 9º e 10 do CPM. Art. 9º, III, a, do CPM No caso concreto, está configurado o crime militar, nos termos do art. 9º, III, “a”, do CPM:

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: (...) III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar;

Compete à Justiça Militar processar e julgar o crime de furto, praticado por civil, de patrimônio que, sob administração militar, encontra-se nas dependências desta. STJ. 3ª Seção. CC 145.721-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 22/02/2018 (Info 621).

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16

DIREITO TRIBUTÁRIO

PIS/COFINS O valor pago a título de ICMS não deve ser incluído na base de cálculo do PIS/PASEP e COFINS

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) não compõe a base de cálculo para a incidência da contribuição para o PIS e a COFINS.

STF. Plenário. RE 574706/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/3/2017 (repercussão geral) (Info 857).

STJ. 1ª Turma. REsp 1.100.739-DF, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 27/02/2018 (Info 621).

Os chamados PIS e COFINS são duas diferentes “contribuições de seguridade social”, instituídas pela União. Atualmente, o PIS é chamado de PIS/PASEP. PIS/PASEP O sentido histórico dessas duas siglas é o seguinte:

PIS: Programa de Integração Social.

PASEP: Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público. O PIS e o PASEP foram criados separadamente, mas desde 1976 foram unificados e passaram a ser denominados de PIS/PASEP. Segundo a Lei nº 10.637/2002, a contribuição para o PIS/Pasep incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. COFINS Significa Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. A COFINS (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) é uma espécie de tributo instituída pela Lei Complementar 70/91, nos termos do art. 195, I, “b”, da CF/88. A COFINS incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil (art. 1º da Lei nº 10.833/2003). Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa "XX" (vendedora de mercadorias) é contribuinte de PIS/COFINS. Com as mercadorias vendidas em maio, o total das receitas auferidas pela empresa no mês foi R$ 100 mil. O fisco cobrou o PIS/PASEP e COFINS com base nesse valor (alíquota x 100 mil = tributo devido). A empresa não concordou e afirmou que dos R$ 100 mil que ela recebeu, ficou apenas com R$ 75 mil, considerando que R$ 25 mil foram repassados ao Estado-membro a título de pagamento de ICMS. Em suma, para a empresa, a quantia paga a título de ICMS não pode ser incluída na base de cálculo do PIS/PASEP e COFINS. A tese da empresa foi acolhida pelo STF? SIM. O ICMS não deve ser incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS.

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) não compõe a base de cálculo para a incidência da contribuição para o PIS e a COFINS. STF. Plenário. RE 574706/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/3/2017 (repercussão geral) (Info 857).

A inclusão do ICMS na base de cálculo das referidas contribuições sociais leva ao inaceitável entendimento de que os sujeitos passivos desses tributos faturariam ICMS, o que não ocorre.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17

O ICMS apenas circula pela contabilidade da empresa, ou seja, tais valores entram no caixa (em razão do preço total pago pelo consumidor), mas não pertencem ao sujeito passivo, já que ele irá repassar ao Fisco. Em outras palavras, o montante de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte porque tais valores são destinados aos cofres públicos dos Estados-Membros ou do DF. Dessa forma, a parcela correspondente ao ICMS pago não tem natureza de faturamento (nem mesmo de receita), mas de simples ingresso de caixa. Por essa razão, não pode compor a base de cálculo da contribuição para o PIS ou a COFINS. Qual a posição do STJ sobre o tema? O STJ possuía entendimento consolidado em sentido contrário, mas, diante da decisão do STF em repercussão geral, teve que se curvar à posição do Supremo. Assim, o STJ decidiu que:

Em adequação ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS. STJ. 1ª Turma. REsp 1.100.739-DF, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 27/02/2018 (Info 621).

Concursos Penso que a explicação acima seja suficiente para a grande maioria dos concursos (Juiz, MP, Defensoria, Procuradoria etc.). No entanto, se você estuda para concursos fiscais, é importante ler o acórdão na íntegra para se aprofundar no tema.

DIREITO INTERNACIONAL

HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA A ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de

interesse processual na homologação de provimento estrangeiro

A ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual na homologação de provimento estrangeiro.

Ex: Juan, cidadão equatoriano, ajuizou, no Equador, ação de indenização contra uma empresa norte-americana. A justiça equatoriana condenou a empresa a pagar indenização em favor do autor. Juan ingressou, então, com pedido de homologação desta sentença estrangeira no Brasil. Vale ressaltar que Juan não tem domicílio no Estado brasileiro. Neste caso concreto, a sentença não envolve partes brasileiras ou domiciliadas no país, tampouco a lide originária se refere a fatos ocorridos no Brasil, nem a sentença homologanda impôs qualquer obrigação a ser cumprida em território nacional. Deste modo, a ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual do requerente.

STJ. Corte Especial. SEC 8.542-EX, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 621).

A decisão proferida pelo Poder Judiciário de um país produz efeitos em outro Estado soberano? A princípio não, porque uma das manifestações da soberania é o fato do Poder Judiciário do próprio país ser o responsável pela resolução dos seus conflitos de interesses. Assim, a princípio, uma decisão proferida pela Justiça dos EUA ou de Portugal, por exemplo, não tem força obrigatória no Brasil, considerando que, por sermos um país soberano, a função de dizer o direito é atribuída ao Poder Judiciário brasileiro.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18

Pode ser necessário, no entanto, que uma decisão no exterior tenha que ter eficácia no Brasil. Como proceder para que isso ocorra? Em regra, para que uma decisão proferida pelo Poder Judiciário de outro país possa ser executada no Brasil é necessário que passe por um processo de “reconhecimento” ou “ratificação” feito pela Justiça brasileira. A isso chamamos de homologação de sentença estrangeira. Veja o que diz o CPC/2015 sobre o tema:

Art. 961. A decisão estrangeira somente terá eficácia no Brasil após a homologação de sentença estrangeira ou a concessão do exequatur às cartas rogatórias, salvo disposição em sentido contrário de lei ou tratado.

Assim, a lei ou tratado internacional poderá facilitar ou dispensar a homologação de sentença estrangeira ou a concessão do exequatur. Ex: a sentença estrangeira de divórcio consensual produz efeitos no Brasil, independentemente de homologação pelo STJ (§ 5º do art. 961 do CPC 2015). Segundo a doutrina: “O processo de homologação de sentença estrangeira visa aferir a possibilidade de decisões estrangeiras produzirem efeitos dentro da ordem jurídica nacional” (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. São Paulo: RT, 2008, p. 489). “Uma vez homologada, a sentença poderá produzir os mesmos efeitos de uma sentença nacional” (PORTELA, Paulo. Direito internacional público e privado. Salvador: Juspodivm, 2010, p. 562). Como é feita a homologação de sentença estrangeira? Em regra, a homologação de decisão estrangeira será requerida pela parte interessada por meio de ação de homologação de decisão estrangeira. Exceção: o Brasil poderá firmar tratado internacional dispensando a propositura desta ação.

CPC/2015. Art. 960. A homologação de decisão estrangeira será requerida por ação de homologação de decisão estrangeira, salvo disposição especial em sentido contrário prevista em tratado.

No Brasil, quem é o órgão competente para análise e homologação de sentenças estrangeiras? O Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, “i”, da CF/88). Onde estão previstas as regras para a homologação de sentenças estrangeiras?

em tratados internacionais firmados pelo Brasil;

nos arts. 960 a 965 do CPC 2015; e

nos arts. 216-A a 216-X do Regimento Interno do STJ.

Art. 960. (...) § 2º A homologação obedecerá ao que dispuserem os tratados em vigor no Brasil e o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

Feitos estes esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética: Juan, cidadão equatoriano, ajuizou, no Equador, ação de indenização contra Chevron Corporation, empresa norte-americana. A justiça equatoriana condenou a empresa a pagar indenização em favor do autor. Juan ingressou, então, com pedido de homologação desta sentença estrangeira no Brasil. Vale ressaltar que Juan não tem domicílio no Estado brasileiro.

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19

Esta sentença estrangeira deverá ser homologada no Brasil? O que decidiu o STJ? NÃO. De acordo com o “princípio da efetividade”, todo pedido de homologação de sentença alienígena, por apresentar elementos transfronteiriços, exige que haja algum ponto de conexão entre o exercício da jurisdição pelo Estado brasileiro e o caso concreto a ele submetido. Neste caso concreto, a sentença não envolve partes brasileiras ou domiciliadas no país, tampouco a lide originária se refere a fatos ocorridos no Brasil, nem a sentença homologanda impôs qualquer obrigação a ser cumprida em território nacional. Deste modo, a ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual do requerente. Isso porque o interesse de agir se encontra vinculado à necessidade e à adequação da prestação jurisdicional, ou seja, quando a tutela tiver a potencialidade de trazer ao autor alguma utilidade, que não lhe seria outorgada sem a intervenção estatal, assim também quando for apta a satisfazer concretamente sua pretensão. Aplicando tais conceitos ao procedimento homologatório, a doutrina afirma que o interesse de agir estará presente sempre que “o provimento postulado seja apto e adequado a produzir algum resultado útil ao autor, proporcionando-lhe determinada vantagem em sua esfera subjetiva de direitos. É sempre bom lembrar que, em virtude da autonomia de que goza o juízo delibatório, essa utilidade deve ser valorada à luz do procedimento pedido ao juiz no processo de homologação, não no processo estrangeiro já encerrado” (ABBUD, André de Albuquerque Cavalcanti. Homologação de sentenças arbitrais estrangeiras. São Paulo: Atlas, 2008, p. 108). Em suma:

A ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual na homologação de provimento estrangeiro. STJ. Corte Especial. SEC 8.542-EX, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 621).

HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA Não cabe renúncia em processo de homologação de sentença estrangeira

É inadmissível a renúncia em sede de homologação de provimento estrangeiro.

STJ. Corte Especial. SEC 8.542-EX, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 621).

Imagine a seguinte situação hipotética: Juan, cidadão equatoriano, ajuizou, no Equador, ação de indenização contra Chevron Corporation, empresa norte-americana. A justiça equatoriana condenou a empresa a pagar indenização em favor do autor. Juan ingressou, então, com pedido de homologação desta sentença estrangeira no Brasil. Antes que o pedido fosse julgado pelo STJ, Juan apresentou petição requerendo a renúncia da homologação da sentença estrangeira. Vale ressaltar que a Chevron já havia sido citada e apresentado contestação. O Ministro Relator intimou a Chevron para que se manifestasse sobre o pedido de Juan e a requerida afirmou que não cabia renúncia no presente caso e que ela era contrária ao requerimento, desejando que a homologação fosse apreciada pelo STJ. O pedido de renúncia formulado por Juan deve ser acolhido? NÃO.

É inadmissível a renúncia em sede de homologação de provimento estrangeiro. STJ. Corte Especial. SEC 8.542-EX, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/11/2017 (Info 621).

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Informativo 621-STJ (06/04/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20

A homologação consiste em “ato formal de órgão nacional a que se subordina a aquisição de eficácia pela sentença estrangeira” (MORAES, Guilherme Peña de. Homologação de sentença estrangeira à luz da jurisprudência do STF. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 15). A homologação é, portanto, apenas um pressuposto de eficácia da decisão alienígena (estrangeira) no território nacional. Homologa-se a decisão estrangeira a fim de permitir a sua posterior execução. Desse modo, a homologação de sentença estrangeira tem caráter meramente processual, sem correlação direta com o direito material veiculado na ação original. A renúncia, ao contrário da desistência, implica a impossibilidade de repropositura da ação, uma vez que a parte dispõe (abdica) do próprio direito material em que se funda a ação. Desse modo, não se pode renunciar no procedimento de homologação de sentença estrangeira porque não se está discutindo a existência do direito material. E Juan poderia pedir a desistência do processo de homologação da sentença estrangeira? SIM. Seria, em tese, possível a desistência do processo homologatório. Vale ressaltar, no entanto, que, como a requerida já havia sido citada, para que houvesse a desistência era necessária a sua concordância. É o que prevê o art. 485, § 4º do CPC/2015:

Art. 485 (...) § 4º Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação.

Por que o réu deve consentir com o pedido de desistência da ação? Porque o réu que apresentou contestação, assim como o autor, também tem direito a uma sentença de mérito. Na contestação, o réu formula pedido(s) e, portanto, tem o direito de ver esse(s) pedido(s) apreciado(s) pelo juízo. O conceito de tutela jurisdicional deve levar em consideração não apenas o ponto de vista do autor, que movimentou a máquina judiciária, mas também o do réu, que quando contesta a ação, está buscando essa tutela, só que em sentido contrário àquele que busca o autor. Assim, o processo não pode ser entendido simplesmente como um modo de exercício de direitos do autor, mas como um instrumento do Estado para o exercício de uma função sua, qual seja, a jurisdição. A discordância do réu quanto à desistência da ação deve ser fundamentada: Se o réu não quiser concordar com a desistência, deverá apresentar ao juízo um motivo justificável, sob pena de sua conduta ser considerada como abuso de direito. Desse modo, se a recusa do réu em aceitar a desistência for infundada (sem um motivo razoável), o juiz poderá suprir a sua concordância e homologar a desistência. Vamos relembrar: o autor, depois de ter proposta a ação, pode desistir? • Se o réu não tiver apresentado defesa: o autor pode desistir normalmente. • Se o réu tiver apresentado defesa: o autor só pode desistir com o consentimento do réu (§ 4º do art. 485). • Se já houver sentença: o autor não pode desistir, nem mesmo com o consentimento do réu (STJ).

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EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) A Súmula 403/STJ é inaplicável às hipóteses de representação da imagem de pessoa como coadjuvante

em obra biográfica audiovisual que tem por objeto a história profissional de terceiro. ( ) 2) Caracteriza-se evicção a inclusão de gravame capaz de impedir a transferência livre e desembaraçada de

veículo objeto de negócio jurídico de compra e venda. ( ) 3) É possível a aplicação imediata do art. 528, § 7º, do CPC/2015 em execução de alimentos iniciada e

processada, em parte, na vigência do CPC/1973. ( ) 4) É válida a rescisão unilateral imotivada de plano de saúde coletivo empresarial por parte da operadora

em face de microempresa com apenas dois beneficiários. ( ) 5) Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação

de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida com a especificação da quantia e desde que tenha havido instrução probatória. ( )

6) Segundo o entendimento atual do STJ, o marco inicial para a contagem dos benefícios da execução, em razão da prática de novo delito, corresponde à data do trânsito em julgado da última condenação. ( )

7) A alteração da data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal. ( )

8) Compete à Justiça Comum processar e julgar o crime de furto, praticado por civil, de patrimônio que, sob administração militar, encontra-se nas dependências desta. ( )

9) O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) compõe a base de cálculo para a incidência da contribuição para o PIS e a COFINS. ( )

10) A ausência de jurisdição brasileira conduz necessariamente à falta de interesse processual na homologação de provimento estrangeiro. ( )

11) É inadmissível a renúncia em sede de homologação de provimento estrangeiro. ( ) Gabarito

1. C 2. C 3. C 4. E 5. E 6. E 7. C 8. E 9. E 10. C 11. E