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A intertextualidade entre o cinema e a publicidade 1
André MORAES2
Ana Paula ANDRADE3
Universidade da Amazônia, Belém, PA
Resumo
Este artigo apresenta um estudo sobre a aplicabilidade da linguagem intertextual que a
publicidade se apropria em relação ao cinema. Serão estabelecidas, a partir dos
pensamentos de autores como Rogério Covaleski e José Luiz Fiorin, as classificações
intertextuais como a Citação, a Alusão e a Estilização Intertextual, com o intuito de que
haja uma melhor compreensão e definição de como esse processo intertextual, entre a
publicidade e o cinema, ocorre.
Palavras-Chave: cinema; publicidade; intertextualidade; referência.
Introdução
O presente trabalho tem por finalidade proporcionar uma análise sobre a maneira
como o cinema é utilizado enquanto ferramenta de referência para as produções
audiovisuais publicitárias, fazendo então com que ocorra a intertextualidade entre ambas.
Para o desenvolvimento desta análise utilizarei como principal recurso o livro chamado
“Cinema, publicidade e interfaces” do autor Rogério Covaleski, seguido de obras auxiliares
e determinados artigos acadêmicos que giram em torno deste tema.
Foram selecionados três comerciais de grande repercussão no Brasil, veiculados em
TV aberta e que correspondem às definições de intertextualidade abordada na obra de
Covaleski. O primeiro comercial a ser tratado será o da empresa Amortecedores Monroe,
veiculado no ano de 1986; o segundo será o comercial realizado pela Operadora Claro, de
2009; e o terceiro será o comercial veiculado em 2008 pela marca de cerveja Skol. A
escolha destes comerciais para serem assistidos e analisados detalhadamente se deu pelo
motivo de que, além de corresponderem às definições intertextuais do autor, eles
1 Trabalho apresentado no GP Publicidade e Propaganda do XVI Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicação,
evento componente do XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Acadêmico do 8º semestre do Curso de Comunicação Social pela Universidade da Amazônia. E-mail:
[email protected] 3 Orientadora do Trabalho. Professora do Curso de Comunicação Social pela Universidade da Amazônia (UNAMA). E-
mail: [email protected]
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exemplificam de forma clara e objetiva como os casos de Citação, Alusão e Estilização
Intertextual se diferenciam e se conceituam.
Cinema
Em 1895, na França, os irmãos Louis e Auguste Lumière inventaram o que hoje
todos nós conhecemos por cinema. Antecedendo este fato histórico, outras duas pessoas
chamadas: Louis-Jacques Daguerre e Joseph Nicéphore, nos primeiros anos do século XIX,
também fizeram uma invenção revolucionária para o mundo das artes e também da
indústria cultural mundial: a fotografia. A invenção de Daguerre e Nicéphore foi o pontapé
inicial para que os irmãos Lumière trouxessem à tona o cinema, partindo do princípio de
que a fotografia é a base para o mesmo.
Antoine Plateau, assim como diversos outros, foi uma peça fundamental quando
falamos no crescimento do cinema e no seu entendimento. Plateau conseguiu chegar à
conclusão de que é preciso uma sequência de algumas imagens fixas, mais precisamente
dez imagens por segundo, para que se possa ter uma ilusão de movimento. Com essa
descoberta, em 1832, Antoine Plateau, fez a criação do “Fenascitoscópio”, um objeto que
apresentava várias imagens de uma mesma pessoa em diversas posições, em um disco,
fazendo com que entrassem em movimento a partir da ação de rotação do objeto. Logo
depois Charles Émile Reynaud criou o “Praxinoscópio” que tinha como funcionalidade
fazer projeções de movimento. Para isso, eram colocados desenhos na parte interna inferior
do objeto, que tinha um formato de um tambor, onde no centro ficavam alguns espelhos.
Conforme o objeto girava os desenhos uniam-se ganhando movimentos bastante
harmoniosos. A partir de então cada vez mais foram surgindo novas ideais e invenções que
ajudaram com o papel de aprimoramento do cinema para chegar ao que conhecemos nos
dias atuais.
Outro dos alguns objetos que foram criados a partir das invenções que tinham como
foco a projeção de movimentação de figuras foi o “Cinestocópio”, inventado por Thomas
A. Edison, também com o foco na projeção. Logo depois da invenção de Thomas A.
Edison, Louis e Auguste Lumière criaram o “Cinematógrafo”. A invenção dos irmãos
Lumière, foi a primeira que realmente foi considerada hábil para o cinema, pois além de
fazer a projeção, era um aparelho que também fazia a cópia e a filmagem das imagens.
Após este fato, o primeiro curta-metragem foi lançado com o nome “Sortie de L’usine
Lumière à Lyon”, no ano de 1895, que significa: Empregados deixando a Fábrica Lumière,
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continha 45 segundos de duração e o cineasta responsável foi Louis Lumière, assim
tornando-se o primeiro cineasta da historia, seguido de Thomas A. Edison, no mesmo ano,
com o curta “Vitascope”.
Segundo Ana Teberosky (2000), citada pelo professor Lindomar (2016), houve
muitos processos para que o cinema chegasse à proporção de projeção que encontramos nos
dias de hoje. A história confirma que há mais de cinco mil anos atrás os primeiros indícios
da busca do processo de projeção já começava a aparecer, já havia a necessidade de
registro, no oriente médio principalmente que já faziam alguns trabalhos de projeção de
sombras sobre a parede de diferentes figuras recortadas, que encorpavam o teatro de
marionetes.
Publicidade
A Antiguidade clássica é, a partir do descobrimento de tabuletas que foram achadas
em Pompéia, a época onde foram encontrados os primeiros sinais sobre o que consideramos
sobre publicidade. Na época, essas tabuletas eram utilizadas para realizar os anúncios dos
combates dos gladiadores, além de promoverem também as casas de banho que existiam
naquele período. Porém, além de haver o uso das tabuletas, o jeito mais utilizado para fazer
publicidade era o oral, que era realizado através dos denominados pregoeiro4. A publicidade
teve em seus primeiros anos, desde seu surgimento, sua prática voltada mais para o serviço
dos comerciantes, que não mediam esforços em gritos, gestos e vários outros modos para
chamar atenção. Neste período, também, surgiu a utilização de símbolos para que houvesse
a representação e identificação das coisas, pois como os comerciantes não davam nomes
aos seus estabelecimentos, utilizavam o uso de símbolos para poder identifica-los. Hoje,
esses símbolos, são denominados de logomarca.
No século XV, ocorreu um fato muito importante na história da publicidade através
da invenção da imprensa mecânica. Começaram a ser produzidos, antes mesmo da
fabricação de livros, os primeiros panfletos. Logo após, existem registros de que em 1482
foi realizada a impressão do primeiro cartaz, que levava um conteúdo de teor religioso. A
partir daí começaram a surgir vários outros tipos de folhetos, panfletos, cartazes em
diversas partes da Europa. Porém, as criações publicitárias daquela época não tinham
ousadia, as peças eram totalmente informativas, sem qualquer abordagem mais sedutora.
4 Pessoas que proclamam, que fazem propaganda de algo; anunciador, propagandista, proclamador.
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Voley B. Palmer foi o primeiro publicitário a abrir uma agência e que obteve vários
anunciantes, realizada aproximadamente no ano de 1841. John Wanamaker, na Filadélfia,
foi o responsável pela criação da primeira campanha publicitária que tinha como cliente
uma loja de roupas masculinas. Com o pontapé inicial dado por esta campanha, começaram
a aparecer as bandeirolas, os carros decorados pelas ruas e grandes painéis de divulgação
introduzindo mensagens cada vez mais.
O uso do cinema como intertextualidade para a publicidade
Quando falamos em publicidade percebemos que ao longo dos anos esta prática
passou a ser compreendida de diversas formas diferentes e consequentemente obteve uma
definição de seu sentido por vários autores. Como referência usada para definição neste
trabalho, a publicidade será descrita a partir do autor Rafael Sampaio que explica os termos,
em língua inglesa, relacionados à comunicação publicitária. Para o autor, existem dentro
desta comunicação três formas distintas de uso no desenvolvimento de uma divulgação, que
geralmente são confundidas em suas características: Advertising, Publicity e Propaganda.
(SAMPAIO, 2003 apud COVALESKI, 2009).
Para Sampaio, estes três termos citados quando definidos e traduzidos para a língua
portuguesa se encaixam perfeitamente no conceito que temos sobre Publicidade e
Propaganda. Na definição do autor Rafael Sampaio (2003, p.27) Advertising é o anúncio
comercial, que visa divulgar e promover o consumo de bens; o termo Publicity é a
informação disseminada editorialmente sobre pessoas, produtos, serviços, empresas, entre
outros; e a Propaganda é disseminada de ideias, de cunho político, religioso ou ideológico.
Uma mensagem publicitária, para ser utilizada a partir de um contexto
cinematográfico, tem que ter seu uso detalhadamente planejado, pois o cinema possui
características que são consideradas bem próprias. O cinema é um veiculo que está
diretamente ligado com um público mais qualificado financeiramente, com um alto grau de
instrução, pelo viés do planejamento de mídia “é percebido como meio que confere status e
prestígio social, por ser expressão artística e cultural” (TAMANAHA, 2011, p. 76). Outro
ponto a ser levado em consideração, quando falamos de que a publicidade tem que ser bem
pensada antes de ser usada, é o fato de que o publico que será atingido pela publicidade não
será o público que apenas frequenta o cinema, mas, sim o público que assiste a aquele tipo
de filme, que se interessa por aquele tipo gênero e que também é o publico alvo do filme
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que será passado em todos os seus parâmetros. Ou seja, a inserção também tem que ser
pensada a partir do gênero do filme.
Um aspecto muito positivo enquanto investimentos publicitários no cinema é o fato
de que um filme é um meio que possui uma durabilidade indeterminada, podendo sim com
o passar dos anos ainda ter um efeito bem considerável sobre o público que o assiste.
Fazendo com que a mídia que se é inserida na produção cinematográfica tenha um alcance
grandioso. Um exemplo disso é a questão das “janelas de veiculação”. O filme, que
primeiramente, será exibido no cinema, depois passa a ser comercializado no formato de
DVD/BlueRay em vendas e locação, logo após é inserido na programação de canais
fechados e simultaneamente disponibilizados para downloads na internet e finalmente
chegando, por último, para ser exibido na TV aberta. Com o passar de todo este processo os
conteúdos publicitários inseridos nos filmes acabam alcançando um numero cada vez maior
de pessoas, podendo até alcançar públicos diferenciados, ainda podendo, também, ter um
alcance maior ainda contado com as possíveis reexibições.
O cinema é um ótimo potencializador de impactos quando falamos em publicidade,
pois quando as pessoas se prestam a ir assistir um filme em uma sala de cinema ou mesmo
no conforto de suas casas, a probabilidade delas ficarem especificamente e unicamente
focadas naquele meio de entretenimento é enorme. Ao contrário com o que ocorre com
outros meios, como, por exemplo, a TV. Uma pesquisa realizada por uma empresa que
trabalha na veiculação de comerciais em salas de cinemas, chamada Rain Digital, diz que
90% do público que está na sala tem sua atenção direcionada para o que se passa na tela.
Seguindo essa lógica, as inserções realizadas nos cinemas acabam não sofrendo a dispersão
que ocorre com os comerciais veiculados em TV, pois o conteúdo já é algo que tem relação
com o quê o público tem interesse.
O Super Bowl5, evento de futebol americano que ocorre nos EUA, é uma grande
referência quando falamos na ligação cada vez mais estreita entre o cinema e a publicidade.
O intervalo deste grandioso evento é considerado, hoje em dia, a janela mais cara e
valorizada da publicidade mundial, estima-se que o campeonato reúne uma audiência
gigantesca de 1,2 bilhões de pessoas que consequentemente leva a uma repercussão
mundial. Com este grande sucesso em que o campeonato do Super Bowl vem atingindo, fez
com que atraísse os olhares de grandes empresas para possíveis investimentos, e, claro, do
cinema não poderia ser diferente.
5 Final do Campeonato da Liga Nacional de Futebol Americano, ocorrido nos Estados Unidos.
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Pela sua enorme visibilidade e, como já dito anteriormente, por ser hoje o veiculo
mais caro da publicidade mundial, uma inserção de 30 segundos no Super Bowl custa por
volta de três milhões de dólares. Essa prática acabou sendo nomeada de “O jogo dentro do
jogo”, pela sua característica de atingir uma enorme quantidade de pessoas. Dentre as
inúmeras inserções publicitárias que já ocorreram neste evento muitas delas foram
originadas ou influenciadas pelas produções cinematográficas, seja se apropriando da
história do filme ou usando a figura dos personagens protagonistas dos filmes como forma
de adquirir mais sucesso.
O cinema, entre vários motivos, passa a ter um valor muito grande e atrativo para a
publicidade, pois sabemos que seu apelo sentimental é algo muito eficaz e sempre acarreta
das mais diversas emoções em longo prazo, onde se cria lembranças em cada pessoa
alcançada, podendo ser trazida à tona de diversas maneiras como uma referência emotiva. A
memória do telespectador é algo que funciona com um enorme repertório de referências e
isso acontece em todo o lugar do mundo. Em algum momento essas referências irão
aparecer independentemente de quanto o tempo passe.
A publicidade essencialmente apropria-se de vários conceitos para que possa utilizar
uma melhor maneira de se comunicar com o seu target6 e para que isso ocorra, a
publicidade, obtém uma relação não só com o cinema, mas com as artes em geral. A
música, a pintura, a dança, o teatro e todo o tipo de expressão artística acabam servindo
como elementos para que a prática publicitaria se desenvolva. Assim, as produções
cinematográficas aparecem como referências principalmente nas produções para a
televisão.
Estas apropriações artísticas que ocorrem para a publicidade, desde o seu
planejamento até sua produção, faz com que o impacto no público almejado seja mais
eficaz, pois torna a comunicação mais natural, com uma linguagem que faça um diálogo
mais persuasivo e convincente, sempre estabelecendo a proximidade das produções
publicitárias com as expressões artísticas. O uso de técnicas linguísticas acaba sendo
bastante usado e, algumas vezes, esse uso passa a ser exagerado, a exemplo da linguagem
conotativa e a presença de polissemias e figurativizações.
Sem dúvidas, na publicidade vemos a todo o momento a busca por novas
inspirações e isto é algo corriqueiro neste ramo. Para que haja a concretização de grandes e
6“Target ou público alvo nos remete a ideia de alvo, rumo, direcionamento, ponto de convergência, foco,
centro. E nessa linha segmento, bem especifico de publico alvo, para o qual a veiculação deve ser dirigida, ou
quem um veiculo atinge mais intensamente.” (VERONEZZI, 2002, p. 196)
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complexas campanhas, pequenas ou até mesmo apenas uma peça publicitária, existe três
passos que, teoricamente, precisam ser realizados para a efetivação dos mesmos. São eles: o
briefing7; as pesquisas em relação ao produto; e o acervo cultural dos profissionais que irão
desenvolver o trabalho. Que são as informações adquiridas na convivência e pesquisas de
vários âmbitos no decorrer da vida, seja escolar, universitário, familiar ou qualquer outro.
Não é de hoje que podemos perceber que o cinema é um dos movimentos artísticos
mais importantes e de grande serventia como referencial de ideias para a publicidade, ele
está sempre abastecendo o acervo de conteúdo inspirador que é utilizado para a concepção
de uma comunicação desejada. Existem diversos exemplos de produções publicitárias para
a TV que têm em sua origem referências cinematográficas, a partir de trechos de filmes ou
até mesmo se apropriando de uma história inteira.
A criação de publicidade para tevê também, atualmente, vai muito além de
escalar um ator para dar seu testemunho sobre o produto, anunciando diretamente
ao telespectador, falando à câmera, como ocorria nos primórdios da televisão.
Não que esta solução criativa ainda hoje não caiba perfeitamente às necessidades
de alguns anunciantes, em dadas situações; vide a longeva e já emblemátiva
figura do garoto-propaganda Bombril, encarnado pelo ator Carlos Moreno há
mais de três décadas. Mas, como em tudo na vida, é necessário evoluir, e assim
também o fizeram a criação e a produção de comerciais para tevê. (COVALESKI,
2009, p.17)
Em contrapartida ao cinema ser a fonte de inspiração para a publicidade, algo muito
curioso ocorreu no ano de 1986. A agência Carden and Cherry, localizada no EUA, criou o
personagem chamado Ernest P. Worrell, que foi estrela de diversas campanhas
publicitárias, assim, obtendo um grande sucesso e uma grande repercussão na época. Logo
o personagem fez com que o olhar cinematográfico se interessasse por ele. E a partir
daquele interesse foram produzidos diversos longas-metragens, assim, também, como uma
serie de TV estrelada pelo personagem interpretado pelo ator Jim Varney.
As interfaces dentro da publicidade sempre estiveram presentes, essa prática apesar
de ser mais estudada e notória atualmente, não é uma exclusividade do tempo em que
vivemos. Desde as primeiras aparições da publicidade, essas interfaces sempre foram um
modo de chegar às saídas mais criativas na elaboração de campanhas ou peças avulsas para
a divulgação de marcas, empresas, produtos e vários outros tipos de serviços.
Consequentemente essas referências normalmente retiradas a partir de produções artísticas,
como também de situações cotidianas, tornou-se uma atividade frequente, porém em alguns
7 É um conjunto de informações ou uma coleta de dados passados em uma reunião para o desenvolvimento de
um trabalho.
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casos não há um reconhecimento tão claramente dos publicitários responsáveis pelo
trabalho em admitir o uso das referências.
Com tantas produções artísticas realizadas através dos anos em diferentes âmbitos e
tantas influências culturais que acabam se moldando no decorrer do tempo, a originalidade
total de uma produção publicitária desapareceu. Tudo o que é executado hoje é procedente a
alguma realização já feita anteriormente, podendo ser abordado de diversas formas, seja a
contradição de uma ideia, uma ratificação ou até mesmo um discurso sendo repetido. Por
isso, tudo acaba sendo recriado. A lógica é de que sempre são unidas duas ou mais ideias,
que talvez já tenham sido originadas de mais outras ideias, para que haja uma nova criação.
(FIORIN, 1994 apud COVALESKI, 2009).
A intertextualidade refere-se sobre a introdução de um determinado texto em outro
texto já existente, dentro desse conceito ainda podemos observar duas outras características
decorrentes à concepção de intertextualidade, a polêmica e a contratual. Quando falamos
em intertextualidade polêmica, estamos falando sobre algo que se opõe à ideia do texto
original, muitas vezes representada por paródias. A intertextualidade contratual é
reconhecida como uma paráfrase que tem o objetivo de apresentar uma explicação
enaltecendo e acentuando o texto original. (FIORIN, 1994 apud COVALESKI, 2009).
O autor José Luiz Fiorin, além de estabelecer as características das
intertextualidades contratuais e polêmicas, também, discorre sobre particularidades que
caracterizam outras categorias dentro da amplitude que há quando falamos sobre
intertextualidades. Dentre essas categorias estão a citação, a alusão e a estilização.
Citação Intertextual
Levando em consideração todas as fantásticas e multifacetadas funções que um texto
pode ter, desde a retenção de inúmeros tipos de códigos até a habilidade de criar novas
mensagens e traduzir outras, a definição de uma citação intertextual se dá pela referência
literal de um texto ao outro. Quando se é realizada uma produção cinematográfica e essa
produção alcança uma boa audiência, há grandes chances de este filme causar algum tipo de
citação, podendo ser originada a partir de alguma cena importante de grande
representatividade e visibilidade, que ultrapasse os limites culturais, de tempo e que seja
perdurável no imaginário da audiência. (FIORIN, 1994 apud COVALESKI, 2009).
Partindo do princípio que a citação intertextual é a adaptação de fragmentos de um
texto em outro, exemplificarei este conceito através da utilização da obra “O Pecado Mora
ao Lado (The Seven Year Itch)”, que foi tido como referência em uma publicidade
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veiculada no ano de 1986, tendo como anunciante a empresa Amortecedores Monroe. No
comercial há a participação da estrela hollywoodiana Marilyn Monroe que em certo
momento faz a citação da cena de maior sucesso do filme mencionado acima. Na cena,
Marilyn tem o vestido levantado enquanto passava por cima da saída de ar da estação de
trem. A personagem gosta tanto daquela sensação que resolve esperar o próximo trem
passar para que possa sentir mais uma vez a corrente de ar e, consequentemente, ter o seu
vestido levantado novamente com a força do vento. O comercial faz um trocadilho entre o
nome da empresa com o da atriz, reforça a ideia do slogan “Famoso no mundo inteiro”
expressando que ambas são famosas no mundo inteiro e começa a fazer comparações entre
o produto e a atriz “Todo mundo vibra com ela, ninguém vibra com ele. Boa de curvas e de
retas, bom de curvas e de retas. O sonho dos mecânicos, o sonho dos mecânicos.”.
(COVALESKI, 2009).
Figura 1 – Frame do comercial dos Amortecedores Monroe
A obra clássica O Pecado Mora ao Lado, lançada no ano de 1955, é uma produção
dirigida por Billy Wilder considerado do gênero de comédia romântica, conta a história do
personagem Richard Sherman, interpretado pelo ator Butch Bernad, um profissional na
edição de livros que é deixado em casa enquanto sua mulher e filho viajam. Sentindo-se
solitário, Sherman, é surpreendido com a chegada de uma nova vizinha, interpretada por
Marilyn Monroe, que trabalha como modelo e nutri um sonho de se tornar atriz. Uma
mulher jovem, linda e atraente que acaba deixando a cabeça de Sherman bastante confusa.
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Figura 2 - Cartaz oficial do Filme “O Pecado Mora ao Lado”.
Alusão intertextual
Neste ponto encontramos uma nova característica da intertextualidade que podemos
considerar, em relação à citação, uma maneira mais suave de realizar o uso de referências
cinematográficas na publicidade. A alusão também faz o uso de alguma obra originada do
cinema, porém diferentemente da citação não utiliza fragmentos do filme, faz as referências
apropriando-se da estrutura original, mas sempre substituindo alguns objetos de cena por
outros, podendo ser utilizada tanto na forma contratual quando na forma polêmica.
(FIORIN, 1994 apud COVALESKI, 2009).
Essa característica é mais frequente dentro do cinema do que se imagina, diversas
obras apropriam-se de outras para ter referências, principalmente quando estão identificadas
num mesmo gênero. E isso ocorre também quando falamos da publicidade, que faz essa
apropriação nos mais diversos comerciais de diferentes segmentos e anunciantes. (FIORIN,
1994 apud COVALESKI, 2009).
Para representar o processo de alusão intertextual usarei como exemplo o vídeo da
campanha para apresentar a promoção da operadora Claro em parceria com a rede
Cinemark no ano de 2009. Essa união consistia na possibilidade do cliente Claro ser
beneficiado com até 50% de desconto na entrada do cinema em qualquer dia e em qualquer
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estabelecimento da Cinemark. A parceria realizada entre a agência AlmapBBDO e o diretor
Fernando Meirelles fez com que houvesse a introdução do personagem icônico do filme
Cidade de Deus, Dadinho, vulgo Zé Pequeno, junto com sua fala fortemente repercutida,
que foi adaptada para uma forma menos grosseira que a original, tornando-se “Dadinho é o
carpaccio8. Meu nome agora é Zé pequeno, pô!”. No vídeo, há uma representação de um
encontro de mafiosos em que são apresentados para um chefão e, em seguida, surge a figura
do Zé Pequeno. Logo após, em off, entra o locutor para que haja uma explicação da
publicidade “Você vai ver tanto filme que vai até juntar Máfia com filme nacional”.
(COVALESKI, 2009).
Figura 3 – Frame da cena do comercial da Operadora Claro.
O filme Cidade de Deus, lançado no ano de 2002, levando os nomes na direção de
Fernando Meireles e Katia Lund, conta a história de um garoto, interpretado pelo ator
Alexandre Rodrigues, chamado Buscapé, morador da Cidade de Deus, no Rio de Janeiro,
que busca uma vida diferente da que a maioria dos rapazes moradores da favela consegue.
Por viver em um lugar conhecido como um dos mais perigosos da cidade, Dadinho se vê
aterrorizado com a possibilidade de se tornar um delinquente. Então, o protagonista, se vê
diante de dois caminhos, seguir seu sonho tornando-se um fotógrafo ou viver à margem da
lei.
8 É um prato feito a partir de carne ou de peixe cru, cortado em fatias finas, e é comumente servido como um
aperitivo.
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Figura 4 – Frame da cena do filme “Cidade de Deus”.
Estilização intertextual
Assim como na alusão, a estilização pode ser caracterizada independente da
intertextualidade usada, entre contratual e polêmica ambas são permitidas. Este processo
corresponde à utilização estrutural da obra influente podendo ser abordada tanto em planos
de conteúdo da obra, quanto nos de enquadramento. Este aspecto tem a tarefa de reproduzir
vários tipos de características, conteúdos discursivos e de formas a partir da referência
tomada. A estilização, segundo Bakhtin (1990), é a adaptação de referências absolvidas de
textos anteriores para um novo texto que traz consigo a inovação de um novo significado.
(FIORIN, 1994 apud COVALESKI, 2009).
Esta relação textual, por ser bem sutil algumas vezes, depende bastante da percepção
e do reportório adquirido pelas pessoas que visualizam uma produção estilizada. Como
exemplo para este tópico, será usado o comercial da Skol, de 2008, produzido pela agência
F/Nazca Saatchi & Saatchi, denominado Ultimate Fight, que apresenta os elementos de
estilização intertextual tendo como texto de referência o filme Matrix. Na publicidade, um
homem está sentado na cozinha de sua casa, enquanto folheia uma revista e toma
tranquilamente sua Skol. Logo após, ele se sente ameaçado com algo, que a princípio não
dá para visualizar, e salta atacando esta coisa. Este é o momento exato quando a cena
congela e a câmera dá uma volta ao redor da cozinha efetuando o plano todo com o homem
parado no ar. Quando a ação retorna, o homem dispara o golpe em um mosquito, pelo qual,
de alguma maneira, se sentia ameaçado ao beber sua cerveja. E por fim, em off, surgia a
assinatura “Quem bebe Skol é louco por Skol”.
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Figura 5 – Frame da cena do comercial da Skol “Ultimate Fight”
O filme Matrix (1999), dirigido pelas irmãs Lana e Lilly Wachowski, baseia-se na
realidade de um futuro próximo onde há um sistema superinteligente fazendo com que
milhões de pessoas sejam enganadas sobre o que na verdade é a realidade, fazendo-os parte
de um sistema artificial, chamado Matrix. Tendo como o principal intuito manipular corpos
e mentes para adquirir energia. Thomas Anderson, interpretado por Keanu Reeves, mesmo
sem querer, convencerá a todos que pode ser o tão aguardado Neo, no qual é o único ser
capaz de enfrentar Matrix e guiar as pessoas novamente à realidade.
Figura 6 – Frame da cena do filme “Matrix”.
Considerações finais
A partir das exemplificações obtidas no decorrer deste trabalho conseguimos
perceber o quanto a criação publicitária usufrui de diversas manifestações artísticas e
textuais no intuito de realizar produções criativas, inteligentes e atraentes. Levando em
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consideração, principalmente, o cinema como forma intertextual totalmente indispensável
na execução de novas produções para o mercado.
Contudo, a criatividade mesmo tendo toda sua importância nas publicidades
veiculadas por todo o mundo, não é unicamente suficiente. Precisa haver uma necessidade
para que ocorra a efetivação da intertextualidade, isso se dá a partir de eventuais e
estudadas oportunidades que podem ocorrer e que conceba uma conveniência do uso da
linguagem intertextual para a publicidade.
Com os conhecimentos através dos estudos da área da comunicação publicitária,
compreendemos as ferramentas para elaboração de conteúdos do mesmo cada vez mais em
evidente crescimento, isso faz com que haja diversas possibilidades de criação para os
produtores e idealizadores das peças. Essas possibilidades, também, permitem que o uso da
intertextualidade não seja realizado de forma inadequada, deixando transparecer uma
produção que faz a utilização forçada e descabida de intertextos.
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