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IEFPCentro de Formação Profissional

Portefólio Reflexivo de Aprendizagem – Manuel Pereira

CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DE VILA REAL

CENTRO DE NOVAS OPORTUNIDADES

PORTEFÓLIO REFLEXIVO DE APRENDIZAGEM

AMARANTE

JANEIRO de 2011

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Eu, Manuel Fernando Carvalho Pereira, nasci a 2 de Fevereiro de 1974 e, segundo a minha mãe, nasci

por volta das duas horas da manhã. Foi um parto feito em casa, pois sou oriundo de uma aldeia e, como tal,

nessa época era absolutamente normal as crianças das aldeias de Portugal nascerem em casa com a ajuda de

uma auxiliar de parto que se designava parteira. Portanto, sou natural de Amarante, da freguesia de telões e

lugar de Todeia (mais precisamente lugar da fonte Todeia).

Meus pais, José Pinheiro Pereira e Maria Emília de Jesus Carvalho, provêem de famílias vizinhas e

tipicamente tradicionais dedicando-se ambas à agricultura que, na época era toda ela manual e de

subsistência, não tendo evoluído grande coisa ate aos dias de hoje…

Como contrapartida, logo desde muito cedo que e, que bem me recorde, fui instruído a praticar

pequenas tarefas do trabalho da terra que funcionava como m tipo de transferência de técnicas e

conhecimentos de pais para filhos e, como dizia o meu avô paterno, Joaquim pereira, “é de pequenino que se

torce o pepino” referindo-se que para aprender quanto mais cedo melhor. Teria eu à volta de 3 anos e já

acompanhava meus pais para os campos em que as brincadeiras não passavam de meras imitações deles no

trabalho do campo dado a inexistência de cresces ou infantários ou possibilidades financeiras para porem

alguém a tomar conta enquanto os pais trabalhavam. Minhas irmãs, uma mais velha um ano que eu, Maria

Adelina carvalho pereira, as outras duas mais novas 2 e 5 anos sucessivamente, Maria José Carvalho Pereira

e Elisabete Carvalho Pereira, passaram pela mesma situação à excepção de que a mais nova teve um parto

medicamente assistido, isto é, não nasceu em casa com a ajuda de uma parteira mas sim na maternidade do

hospital S. Gonçalo de Amarante. Foi assim a mesma rotina até ao meu primeiro dia de aulas, em que tive de

me adaptar ao meu agregado familiar conforme ele se iria formando, com certas birras pelo meio claro, alias

como é típico em qualquer criança desta faixa etária e que gostaria de salientar duas delas mais marcantes.

Uma delas foi quando saí de casa sem que dessem por ela com a minha irmã Zeza de apenas 3 anos de idade

e eu com 5 anos e meti-me ao caminho com ela em direcção a casa dos meus avos paternos, pois a minha

mãe fora com a mais velha deixando o meu pai a tomar conta de mim e da minha irmã temporariamente a

mais nova. Deixando-o adormecer, pois tratando-se de um dia de calor, talvez verão, era dado aos aldeões

fazer a cesta. Parti através de um caminho já decorado que me demoraria precisamente uma hora a percorrer

entre matas, campos e ribeiros, até chegar ao destino, a casa dos meus avós para onde tinha ido a minha mãe.

Estando eu quase no destino e meu pai correra desesperadamente no meu rasto e quando nos alcançou é

obvio como mais velho e apenas com cinco anos experimentei uns tabefes pela primeira vez das mãos dele.

Hoje entendo o seu desespero…a outra birras foi quando estava para nascer a minha irmã mais nova e, como

não havia hemogramas evoluídos e computorizados como os de hoje em dia, era difícil saber a probabilidade

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ao certo de ser rapaz ou rapariga e, como eu já tinha duas irmãs, pedia sempre à minha mãe que me

trouxesse um irmão desta vez. Ela dizia-me que sim claro, também não o sabia ao certo, mas quando nasceu

e veio do hospital, fui o primeiro querer conhecer o novo membro, e como tal tive uma ela pela terceira vez e

para meu desagrado na altura claro. Com o tempo aperfeiçoei-me a elas e adoro-as como é óbvio!

Ainda me recorda o meu primeiro dia de aulas como se fosse hoje! Como era difícil o contacto com

miúdos da mesma idade pelo meio ser pequeno e em que praticamente os miúdos que tinha para brincar lá

no lugar, quando não ia trabalhar para o campo, eram tudo meninas logo sentia-me um pouco solitário pois a

minha experiência com o comportamento de rapazes da mesma idade era praticamente nula, o que me

dificultou a aproximação com rapazes da classe, sentindo-me intimidado e muito envergonhado, não

sabendo como reagir as suas atitudes o que acabou por, nos primeiros meses, ser posto de lado. Foi frustrante

ao ponto de fazer birra de mão querer ir para a escola, mas não havia meias medidas por parte dos meus pais,

mais a minha mãe,”ou vais, ou levas”. Não tardou muito e na escola os conflitos surgiram novamente, desta

vez não com os colegas mas sim com a professora e com os meus pais. O assunto era a tendência de escrever

e de decidirem com que mão haveria de escrever, pois era canhoto e mais uma vez nem a professora Lídia

nem os meus pais o aceitariam com agrado, o que fez com que a uma dada altura tanto utilizar a mão

esquerda como a direita para escrever, prejudicando-me e muito na minha caligrafia, pois à vista de olhos só

com a direita, utilizando a esquerda (que é a actual) às escondidas. Tive dois anos com esta professora e, que

por razão ao horário muito contestado pelos meus pais pelo facto de ser de manhã e de tarde enquanto as

outras classes ou só teriam a manha ou a tarde e para eles era um transtorno pois ocupávamos muito tempo

na escola e era-mos precisos para ajudar a trabalhar na terra em casa, daí a transferência da 2ª classe para a 3ª

para outra professora, D.ª Sara, que só dava aulas da parte da manha, ficando a parte de tarde disponível para

trabalhar na terra. Praticamente não tinha muito tempo para trabalhos de escola em casa e, como tal, tinha a

capacidade de decorar a matéria nas aulas um pouco também com receio a esta Prof., pois era muito cruel e

severa com os alunos, chegando muitas das vezes espancar alguns até à exaustão. Foi horrível. No final das

aulas e após o almoço tratava de efectuar as tarefas que me estavam predestinadas … era bom aluno e apesar

de toda a intimidação nunca reprovei um ano.

Quando entrei para o primeiro ciclo (Escola Preparatória de Vila Cova da Lixa) a adaptação foi um

pouco embaraçosa devido à maior dimensão da infra-estrutura de ensino bem como o seu complexo

organizativo das várias disciplinas, muito diferente da simplicidade de ensino primário de onde vínhamos e

que estávamos acostumados. Apesar deste “aparato” todo foi me pais fácil a adaptação que no meu primeiro

dia de aulas primário. Já conhecia alguns colegas de turma, pois para facilitar a adaptação os alunos por

turmas eram seleccionados por localidades ou mesmas escolas primárias que frequentaram. Com o tempo e

aperfeiçoamento comecei por descobrir as disciplinas que mais me adaptava e interessava e as que menos me

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dava motivação. Matemática, ciências do ambiente, historia e educação visual e musical foram as que mais

se manifestavam como interessantes enquanto disciplinas como português e educação física regrediam. Mais

português, pois gostava de desporto, pois o problema não passava de uma frustração ao nível de balneários e

que eu, na altura, levava muito a sério pelo facto de ter de me despir juntamente com os restantes colegas

devido as susceptibilidades de que daí surgiam e começavam a perturbar me seriamente… como o meu

horário já se tornara maior logo o tempo disponível para o trabalho na terra era menor e como a mão-de-obra

era muito importante e indispensável acabava por me levantar muito cedo para trabalhar em casa antes de

efectuar uma caminhada de quase uma hora para o ciclo (uma vez dada a inexistência de passes e autocarros

escolares na zona onde vivia) e quando regressava dirigia-me novamente ao serviço, pois já contavam

comigo e se demorasse tempo a mais sabia perfeitamente que era castigado, muitas das vezes apenas com

um pequeno-almoço apressado e um almoço que entendia como o melhor do dia e que era atribuído na

cantina da escola. Hoje, e dada a crise que atravessamos, sei o quanto é importante essa refeição para os

actuais alunos, pois para muitos deles imagino que seja a única refeição quente que têm durante o dia… os

meus sábados e até domingos eram claro passados a trabalhar na dita “agricultura de subsistência” aliás que

era muito normal entre os vizinhos e que, nessa altura, os filhos eram “ gerados” para esse fim, logo quantos

mais melhor, em que o ensino era visto como segundo plano e só dado por ser obrigatório, não visto como

um futuro mas sim “um estorvo” que “prejudicava as crianças pondo-as malandras e preguiçosas” e que “ a

4ª classe chegava perfeitamente para saber ler e escrever”.

Quando acabei o ensino obrigatório, com uma media entre os 14 valores; os professores (mais a Dr.ª

Margarida minha directora de turma) aconselharam a minha mãe a dar-me uma oportunidade de seguir

estudos nos quais ela concordou embora com um pouco de indignação. Mudei de localidade de ensino e fui

matriculado na Escola Secundaria de Amarante.

Foi uma fase da minha vida muito perturbadora pois tinha 13 anos e entrava na puberdade da

adolescência, fase em que os meus colegas começavam a construir a sua própria personalidade ou a

imitarem, serem como os seus ídolos que na altura desconhecia existirem por não ter tão facilmente acesso à

informação como alguns que se achavam mais inteligentes com isso, transmitindo um certo atrito o que me

levada a sentir um complexo de inferioridade. Mas também por não saber que tipo de personalidade a

adquirir nem tão pouco que rumo tomar, pois interiormente sentia-me diferente já com alguns “fantasmas”

que se haveriam tornado maiores e sem saber como me livrar deles devido a serem assuntos muito tabus

nessa altura e de natureza muito pessoal em que era obrigado a esconder para não ser humilhado e também

para não fazer passar “vergonha” os meus pais e familiares. Mas que me perturbou e prejudicou

drasticamente e que reconheço ter sido um elo de viragem na minha vida muito importante com a

consciência que dali para a frente as coisas nunca iriam ser as mesmas pois começava a bloquear. Precisava

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de ajuda psicológica mas nos sabia a quem recorrer, com isso a escola aos poucos começava a ser um

“inferno” e como se não bastasse o apoio familiar era muito escasso. Não os culpo por isso, pois sempre fui

muito reservado em relação aos meus problemas o que me arrependo muito hoje. Se me tivesse aberto tenho

a certeza que tudo seria diferente, mas a minha cobardia foi maior, talvez devido ao meio envolvente ou se

devesse e muito à falta de informação por não haver tempo suficiente para o convívio. O preço a pagar foi

muito elevado. Não cheguei sequer ao 3º período nesse ano pois com negativa a quase todas as disciplinas e,

depois da “sentença” ditada pela minha mãe, não haveria remédio senão sair da escola pois” para andar a dar

cabo de dinheiro e a criar malandros isso não era vida” para logo a seguir “ aprender uma arte” e “ começar a

formar um pé-de-meia”, assim é que era dado para se “ tornarem homens no futuro”.

O meu primeiro trabalho, e logo após a desistência do secundário, foi como electricista de obras, como

ajudante do Sr. Joaquim Pereira, credenciado em instalações eléctricas para habitações. Com apenas 13 anos

vivia a experiência do trabalho fora de casa e com a convicção de que iria ganhar muito dinheiro para

comprar o que quisesse. Mas as coisas não seriam assim. Adaptei-me facilmente ao tipo de trabalho que me

era predestinado pelo patrão que era o mais pesado. Isto é, aquele que ele não queria fazer, tal como por

exemplo: abrir rasgos nas paredes e furos em placas maciças marcados por ele para a passagem dos tubos

onde iriam levar os fios eléctricos para a passagem da energia eléctrica com um ponteiro e maceta; fazer

valas na terra desde as casas até à baixada da EDP; etc. Comecei por me adaptar à linguagem calão muito

repugnante e ofensiva que era utilizada por todos os trabalhadores da construção civil e em que os “moços

de recados” ou “chega rebos”, como eram tratados os rapazes com a mesma idade e aprendizes, eram as

principais vitimas desses comportamentos e atrocidades por parte dos mais velhos, havendo por vezes

agressões físicas das quais eu também fui vitima por um trabalhador “trolha” numa obra quando me

esbofeteou.

Levantava-me cedo, por volta das cinco da manhã, para acabar de fazer o meu almoço preparado de

véspera, em que utilizava uma panela térmica para que aguentasse quente até à hora de almoço, e em seguida

fazia-me ao caminho andando uma hora a pé até chegar à casa do meu patrão para às 8 horas em ponto

começar o trabalho. Tudo isto par ganhar 12 contos na moeda antiga e fazer o trabalho que os grandes

rejeitavam. Quando recebia entregava todo o dinheiro à minha mãe para que ela mo guardasse para o que

fosse preciso. Passado um ano vi que estava a ser muito mal remunerado, explorado até, ao que com o

consentimento da minha mãe pedi ao patrão aumento o qual ele recusou. Então despedi-me.

Passado algum tempo, o Carlos Silva meu colega dos domingos à tarde, altura em que nos juntávamos

em grupo e íamos jogar à bola e conviver, falou-me que a carpintaria onde ele trabalhava, AMATEC, estava

a precisar de pessoal e que se eu quisesse, ele falava com o encarregado para me dar trabalho. Assim

aconteceu e fui trabalhar com ele mudando tanto de sector de actividade como de convivência entre os vários

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membros do colectivo fabril, onde as relações eram praticamente de carácter profissional ligado à área do

sector de actividade, respeitando desta forma as normas e regras impostas pela empresa. Foi uma experiência

muito agradável, não só pela organização e respeito mutuo em que todos éramos tratados de igual para igual

independentemente da tarefa que cada um desempenhava mas também pelo facto de haver pessoas que lá

trabalhavam já minhas conhecidas o que dava para sentir um ambiente de trabalho muito mais familiar e

respeitador. Trabalhei na empresa durante um ano e meio, começando como servente e acabando como

responsável da saída de materiais, tanto de matérias-primas como produto final para a carpintaria onde eram

transformados para venda ao consumidor final, consecutivamente.

Como servente fiz de tudo um pouco, percorrendo toda a maquinaria, o que me fez ver o

funcionamento e a utilidade das matérias-primas na confecção do produto final bem como a sua utilidade nas

diversas áreas para as quais eram predestinadas, com mais relevo e utilização na construção civil. Passei pela

experiência de ver como um simples tronco de madeira retirado de uma árvore era cortado na secção da

serração por máquinas designadas de serriot e serra de fita, depois o homem que é designado “o riscador”

marcava as tábuas daí extraídas para que dali fosse extraído as peças descritas num documento designado

por “plano” ou “projecto”, que acompanhava a obra desde aí até ao final da confecção. Era responsável logo

à partida pela qualidade do produto final bem como o seu custo, pois dependia logo aí a qualidade porque a

madeira praticamente é composta por duas partes, borne e cerne, em que o cerne tem mais qualidade e

resistência do que o borne, logo seria destacado para peças mais adequadas a sofrerem resistências maiores

bem como diferenças de temperatura, pelo seu custo porque o aproveitamento e encaixe das peças na tábua

iria provocar um menor desperdício de matéria-prima, logo uma maior rentabilidade.

Em seguida passariam para uma serra de disco ou de fita nas quais eram recortadas pelos traços

marcados pelo riscador e assim a obtenção das peças, depois e organizadamente eram passadas para a

gorlopa ou plaina para retirar a espessura necessária e logo após lixadeira para alisar a superfície. Outras

eram levadas para uma máquina de conjunto de fresas que exercia várias funções designada como

moduladora que depois de ajustada e calibrada às condições do plano as peças sairiam como o descrito e

exigido. Tratando-se de peças mais rigorosamente trabalhadas, estas seriam encaminhadas para o mestre da

“tópia”, maquina esta que servia para fazer os modelos com feitios mais elaborados e incapazes de serem

feitos em qualquer outra máquina, que funcionava com um jogo de fresas tecnicamente expostas umas sobre

as outras de forma a elaborarem na madeira o feitio com as medidas exigidas o dito plano. Depois de tudo

isto o material avançava para o 3º sector que era onde se encontravam os mestres carpinteiros e que

montavam e davam os últimos retoques nas diversas peças, dando-lhe forma, antes de estas se dirigirem para

o armazém como produto final / acabado. No armazém rectificavam-se, dando-lhe tipo um controlo de

qualidade antes destas se dirigirem para o cliente / consumidor final. Ganhava o ordenado mínimo nacional

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com todos os benefícios estipulados por lei fazendo com que eu criasse uma pequena independência

económica dando apenas vinte contos à minha mãe para gastos de casa e o restante serviria para meter no

banco e uma parte para as minhas borgas de domingo à tarde, pois comecei a aprender o caminho para as

diversões da moda na época e que era novidade devido ao seu recente aparecimento que era as discotecas.

Começaram a surgir as pequenas extravagâncias tipo beber uma cerveja com amigos, fumar um

cigarro oferecido por um “amigo “ mais velho e também o vicio sentido e criado pela adrenalina do convívio

juntamente com a excitação e emoção de reencontrar da próxima vez aquela pessoa que nos criou uma

espécie de ilusão de óptica ou chamado de “amor à primeira vista,” muito embora não passasse disso, pois

não havia contacto verbal sequer, apenas uma espécie de telepatia e troca de olhares mas que nos faziam

deslumbrar e motivar para que a próxima vez seria melhor e mais real. O que a maior parte das vezes não

acontecia, acabando por desmoronar e retomar a sensação noutro “horizonte”. Que mundo lunático aquele…

mas o “fantasma” do “eu mesmo” continuava a assombrar-me, dificultando a construção da minha própria

identidade / personalidade, interiorizando para mim os meus problemas tornando-me um pouco egocêntrico

para mim próprio e sendo actor de uma personalidade criada por mim em função daquilo que os outros

queriam que eu fosse.

As coisas na empresa começaram a sentir os efeitos burocráticos e a má gestão, levando a que os

pagamentos dos ordenados começassem a ser retardados o que me levou a pensar mudar e procurar algo

mais credível quando já estavam dois ordenados em atraso. Apresentei a carta de despedimento e fui tirar um

curso de formação profissional como cortador de calçado, subsidiado pelo Centro de Formação Profissional

de Felgueiras. A AMATEC duraria apenas mais um ano depois da minha saída …

Influenciado por um primo meu, Manuel Pereira Castro, e contrariando a vontade da minha mãe, pois

iria ganhar muito pouco e durante meio ano que era a duração da formação e que trabalhar numa fabrica de

calçado não era trabalho para homens porque não se aprendia uma arte na vida. Tirei o curso de cortador de

calçado, manual e mecânico, onde a média final compensou pelo esforço, 16 valores. Foi positivo e

compensador porque além de aprender as diversas técnicas aplicáveis no sector de actividade compreendi a

importância da organização, higiene e segurança no local de trabalho… tratando-se de um curso tirado no

decorrer da minha adolescência e como a durabilidade do curso era curta, não dei importância às ideias

“fantasmagóricas” e alusivas criadas pela mente, evitando contactos mais comprometedores com os colegas,

embora a vontade em alguns casos ditasse o contrario.

Com esta experiência começava a compreender a importância dos estudos e a falta que poderiam fazer

num futuro próximo, daí começasse a pensar numa forma de prosseguir os estudos sem que com isso

deixasse para trás a oportunidade de ganhar dinheiro. Como se tratava de um curso de meio ano e com

estágio de mais meio ano numa empresa por eles escolhida, acabei por estagiar numa fábrica portuguesa,

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“Suze,” localizada em Pinhal Basto na Lixa. Cumpri os requisitos exigidos pelo Centro e pela entidade

empregadora, trabalhando um pouco mais do que o prazo estipulado. Nesta altura matriculei-me na Escola

Secundaria de Amarante que fica retirada da minha casa 14 km e no sentido contrário do meu trabalho que

ficava a uns 8 km de minha casa, num curso por unidades capitalizáveis para a concretização do 9º ano de

escolaridade, em regime pós laboral. Tirei carta de motorizada e com as minhas poupanças consegui

comprar uma que me estava na mente e que era um pouco dispendiosa, 340 contos, o que era muito dinheiro

para quem ganhava pouco mais de 60 contos. Tratava-se de uma marca Yamaha de modelo RZ que era

muito divulgada e apetecível naquela época pela minha geração. Sendo assim, começava um novo ciclo da

minha vida em que trabalhava de dia e estudava de noite. O tempo começava a ser escasso e aproveitado ao

segundo pois não havia tempo a perder e era uma correria desde as 6.30 horas da manha até à uma do dia

seguinte, hora em que me deitava, todos os dias de segunda a sexta-feira. Passado algum tempo e logo após

o primeiro período enfraqueci físico/psicologicamente não só pelo cansaço daí resultante mas também

devido a factores emocionais originados pelos meus “fantasmas”, ficando doente, e como se não bastasse e

devido ao frio que se fazia sentir à noite nesta época do ano em que o pára-brisas da motorizada era o meu

próprio corpo, acabei por juntar à depressão uma grande gripe que me levou a desistir de estudar nesse ano,

tendo feito apenas algumas unidades.

Nesse mesmo ano o meu avô, Joaquim Pereira, faleceu vítima de um cancro facial mais popularmente

designado de “zona”. Foi muito duro para mim pois tratava-se da pessoa mais carinhosa que tive na vida até

aquela data, passei muito tempo a conviver com ele e com a minha avó, Ana De Sousa Pinheiro, sua esposa

e meus avós paternos.

Era a minha segunda casa pois com as condições precárias em que viviam: não tendo agua canalizada

era preciso todos os dias acartar água de um fontanário público para casa num cântaro de plástico, ou por

vezes dois para ser mais rápido. O pão era cozido às fornadas num forno de barro embutido na cozinha e

aquecido a lenha enquanto o pão depois de ser moído num moinho a água nas margens do rio santa Natália,

que atravessava por ali perto, levedava dentro de uma gamela e depois de quente o forno era limpo com uma

pá de chapa e um “varredouro” muito parecido com as modernas esfregona. Deitava-se o pão ao forno com

uma medida que era uma bacia de barro em que a minha avó o batia três ou quatro vezes gesticulando com o

“ alguidar” para cima em que o naco de massa levantava e caía novamente na bacia para ficar bem

concentrada antes de ser exposta na pá do forno que era feita em madeira e através dela levar o naco de

massa para uma parte do forno já aquecido que depois de cozido se chamaria de broa. Uma fornada era feita

de 5 a 6 broas, tapando a porta de metal em seu redor com bosta de boi ou farinha de trigo amassada para o

vapor quente não sair pelas frinchas da porta e desta forma manter o calor concentrado no forno para a

cozedura da massa. A casa era feita em pedra basáltica e muito fria de Inverno que a minha avó mantinha

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quase todo o dia a lareira acesa com dois potes de ferro, um de cada lado da lenha que ardia e aquecia assim

os recipientes para a utilização de água quente e para fazer a “ceia” deles e minha muitas vezes.

Fora de casa havia uma espécie de “quinteiro” onde eram expostos os detritos e desperdícios não

utilizados para cozinhar e que apodreciam de frente à casa dando origem a estrume que era utilizado para a

produção de produtos hortícolas por eles criados ali perto num campo por detrás da casa. Havia também

mato que servia para confortar as cortes dos animais, tanto dos coelhos como de um touro porcos e galinhas

que criavam, etc. Por este motivo eles alem de neto era também uma espécie de criado pois sempre que era

preciso e quase todos os dias tinha de passar por casa deles para saber se estava tudo bem e se queriam ou

precisavam de alguma coisa. Fiz isso desde os meus oito anos até à morte do meu avô, quando tinha 17 anos,

perto de fazer 18. A falta e a perda do meu avô comoveram-me! Não estava preparado. Também por ainda

não ter passado antes por esta sensação, embora real parecia não o ser, pois a idealização que tenho dele faz

com que continue presente mesmo nos dias de hoje, inconformado com tal perda.

Mal conclui os meus 18 anos inscrevi-me na escola de condução Sampaio com Sede na cidade da Lixa.

Fomos os dois irmãos mais velhos (eu e a minha irmã Lina) pois era mais fácil, tirávamos dúvidas e

utilizávamos o mesmo meio de deslocação. O apoio era mútuo logo a rapidez com que as aulas de instrução

e os referidos exames foram finalizados pelos, dois num tempo máximo de apenas 3 meses, com sucesso

para nós os dois.

Fui trabalhar para a Rieker Shoes, empresa sedeada em Tutteligem, na Alemanha e que tinha uma filial

PCL (produção de calçado da Lixa) perto de minha casa e onde trabalhava a minha irmã mais velha. Como

tinha tirado o curso de cortador profissional tirado praticamente dois anos antes no centro de emprego de

Felgueiras. E como a procura de mão-de-obra qualificada por esta empresa multinacional era muito

procurada, fui imediatamente admitido. Os ordenados eram conforme as categorias e como já possuía a

categoria de cortador de 2ª categoria, dado pela empresa Suze onde trabalhei e estagiei antes. Acabei por

beneficiar do ordenado dos demais colegas que já trabalhavam há muitos anos na empresa e que possuíam a

mesma categoria, criando desta forma um pouco de revolta com um pouco de inveja à mistura. Adaptei-me

facilmente ao modo de funcionamento e as exigências pretendidas pela empresa, achando-as fantásticas no

ponto de organização, qualidade e higiene e segurança no trabalho, muito diferente do modo de trabalhar e

dos critérios de produção das empresas nacionais. A organização era a chave do sucesso que esta empresa

apostava, pois só nesta repartição trabalhavam mais de 900 pessoas, na sua maioria mulheres, do total de três

no território nacional – Lixa; Felgueiras; Guimarães.

Foi nesta altura, logo após o recenseamento e inspecção militar, que fui chamado a cumprir o serviço

militar obrigatório. Tinha eu 20 anos. Fui dado como apto e destacado para o ramo da armada portuguesa e a

unidade onde acabaria por ter a fase de recrutamento seria na Escola De Fuzileiros Do Vale Do Zebro, no

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Barreiro que fica situada no estuário do rio Tejo. A recruta é de longe a fase mais dramática desgastante e

aterrorizadora de todo o serviço militar pois os instrutores, todos fuzileiros. Não poupavam ninguém tanto a

nível físico como a nível psicológico mesmo sabendo-se que o grau de dificuldade adaptativa diferia de

recruta para recruta em que eram postas à prova os extremos de cada um porque entendia-se que em caso de

conflito militar real cada militar dependeria da sua agilidade física e mental de forma a poder superar todos

os traumas daí derivados, tornando-se no seu principal aliado para a sobrevivência. A duração obrigatória

por lei era de apenas quatro meses em que o período de recruta seria de apenas 3 semanas, seguido do

juramento de bandeira e cumprir o restante tempo do serviço obrigatório numa unidade por eles destacado e

que no meu caso acabou por ser na base naval da marinha no Alfeite, na margem sul do Tejo. Apesar do

esforço físico e do carácter psicológico da recruta que era idêntica à dada pelos recrutas candidatos à

especialidade de fuzileiro até que gostei e até fiz boas provas tendo no final o convite dos meus instrutores

para que optasse por tirar o curso de fuzileiro e seguisse a carreira militar, pois “ tinha um bom potencial ”,

coisa que não me chamou a atenção devido a eu achar haver falta de candidatos para tal o objectivo politico

deles seria angariar os possíveis candidatos através do destacamento obrigatório destes para escolas especiais

como esta para depois seleccionarem os melhores e tentarem alicia-los a assinarem um contracto que

permitiria a entrega destes ao curso por um período mínimo de dois anos, sem direito a desistências, daí eu

achar um absurdo.

Nunca fui a favor do serviço militar obrigatório por achar que além de ser muito dispendioso ao Estado

e dificultar a vida profissional dos jovens era inútil para os dias de hoje e principalmente para uma nação

como Portugal em que os únicos vizinhos como fronteira terrestre eram a Espanha, fácil de chegar a acordos

bilaterais. O regime de voluntariado é o mais acertado, pois só vai quem se sentir capaz e que tenha paixão

por isso, o que acabou por acontecer pouco tempo depois na constituição com a alteração desta lei. Ainda há

muito que fazer para que os três ramos das forças armadas consigam uma boa coordenação e entendimento

entre si, capazes de criarem apenas uma única força de intervenção muito mais especializada, menos

dispendiosa e com técnicas mais inovadoras e cooperativas, dando desta forma um maior desempenho com

resultados mais eficientes para aquilo que chamamos hoje em dia de “ o novo tipo de conflito e guerra” da

era moderna que é “ o terrorismo”.

Depois de ter acabado o serviço militar obrigatório, com classificação de 2º grumete, e de ter vivido

todas as experiências daí resultantes, tal como: - viajar de comboio entre Campanha e Santa Apolónia; ter

conhecido a capital Lisboa e todos os seus bairros entre eles o famoso Rossio que tinha sofrido uma grande

catástrofe anos antes e que se encontrava em fase de reconstrução devido a um grande incêndio; o estilo de

vida lisboeta bem como todo o seu multiculturalismo tão diferente daquilo que estava acostumado no norte,

pois tratava-se de uma cidade muito cosmopolita onde diferentes etnias conviviam mutuamente integrando-

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se no elenco “alfacinha” embora surgisse de parte a parte um certo grau de desconfiança; a localização e

relevo em que se encontra situada a capital, tendo como fundo o belo estuário do Tejo, visto de uma

perspectiva muito mais abrangente quando se sobe o famoso elevador de santa Justa; as aventuras vividas

com colegas de tropa dos diversos cantos do país e com outros jovens que gostavam do convívio e “emoções

fortes” vividas na noite lisboeta, mais propriamente Alcântara e o famoso Bairro Alto; etc; – voltei para o

meu posto de trabalho na multinacional Rieker Choes que me aguardava, pois cumprir serviço militar de

regime obrigatório dava direito a reivindicar o posto de trabalho antecedente, sem quaisquer alterações no

contracto de trabalho pela entidade patronal empregadora.

Esforcei-me e sempre fui o mais profissional possível, dando o meu melhor naquilo que me era

exigido e com isso fui bem recompensado pela empresa e muito acarinhado pelos colegas, pois gostava de

criar um bom ambiente de trabalho em meu redor e com isso impedir o aparecimento de atrito e divergências

que pudessem prejudicar ou desmoralizar membros da equipa de trabalho, e com isso serem penalizados pela

empresa, pois tinha a noção e a convicção de que todas aquelas pessoas estavam ali por um objectivo que era

a obtenção da sua própria sustentabilidade porque este tipo de empresas nunca paga salários muito mais altos

dos que os estipulados por lei, embora cumpram com todos os requisitos exigidos nela, pois expandem-se

por outros países sempre à procura de exploração mão-de-obra barata e com incentivos a investimento

estrangeiro aliciantes e credíveis, beneficiando com isso de uma maior margem de lucro nas exportações e

tendo com isso uma maior competitividade da marca a nível do mercado internacional.

Depois de cumprir o serviço militar obrigatório e retomar o trabalho resolvi comprar carro. Tinha de

ser muito bem pensado pois sabia que não tinha dinheiro que chegasse para um carro novo mas também não

confiava em carros de segunda mão. Comecei por pensar uma forma de comprar um carro novo mas

económico e com características de qualidade de marca e de concessão de crédito o mais aliciantes possíveis.

Esperei algum tempo e foi então que surgiu uma excelente oportunidade de negócio da Renault Gest cá em

Amarante que nesse ano na compra de qualquer veículo novo com entrada de metade do valor comercial e

com o restante a pagar por mensalidades durante dois anos, a taxa de juro seria de 0% nas mensalidades. Eu

aproveitei e comprei uma Renault Clio 62cv 1900 de cilindrada e com um consumo, em gasóleo, de seis

litros / cada 100 km em média. O meu objectivo era ter um meio de deslocamento mais acessível às adversas

condições climatéricas, pois como os meus pais não possuíam de nenhum tipo de veículo motorizado que me

pudessem emprestar ou ate mesmo financiar, tive que optar por comprar um conforme as minhas

possibilidades pois o único que possuía era a motorizada e praticamente andava sempre constipado devido as

molhas e diferenças de temperatura que apanhava, limitando-me nas deslocações e desta forma não podendo

progredir com os meus objectivos que eram de continuar a frequentar a escola e prosseguir os estudos em

regime nocturno, ou mesmo tirar uma formação mais qualificada noutro local mais distante de casa, pois

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vivia num meio rural em que não havia qualquer tipo de transporte público ou outro meio de deslocação a

não ser os nossos próprios meios.

Aos 22 anos fui chamado pelo centro de emprego e formação profissional de Felgueiras para dar início

ao 62º curso de modulação na área do calçado, no qual 3 anos antes eu me teria inscrito com a intenção de

me qualificar melhor nesta área. Resolvi tira-lo por iniciativa própria, apesar de ficar para mim um pouco

dispendioso pois no total o custo das “propinas” seria de 480 contos, com uma duração de dois anos, em

regime pós laboral em que no fim do trabalho passava por casa para tomar banho e jantar à pressa para

depois percorrer 12km até ao Centro de Formação, todos os dias de segunda a sexta, com os gastos daí

provenientes a meu encargo. Este curso foi bom para eu ter o conhecimento muito mais aprofundado e

detalhado da constituição e confecção do calçado bem como a sua organização desde a modulação (em que

através de um formato de pé constituído em polyester concentrado, designado por “fôrma”, se envolvia toda

ela em papel vegetal para que se pudesse passar as linhas do modelo desenhado numa folha de papel

convencional, formato 2D, para o papel vegetal envolto na “fôrma”, formato 3D, dando-lhe as respectivas

compensações necessárias para que desta forma o modelo se ajustasse ao pé e, logo após, a extracção dos

moldes com a retirada do papel vegetal da fôrma; formato 3D, para cima de um papel mais expeço como

cartão ou cartolina extraindo desta forma os respectivos moldes do modelo e voltando a dar aos moldes as

compensações necessárias apropriadas para o processo de confecção, formato 2D. Depois da extracção dos

moldes em cartão estes eram testados e experimentados com a obtenção das peças na matéria-prima exigida

no modelo através do corte manual, passando em seguida para a costura, montagem e acabamento, para

verificar a necessidade de algum reajuste nos moldes antes destes passarem para a fase de construção

metálico em que eram escalados para todos os tamanhos, de homem ou senhora, designada por “colecção” e

que depois de pronta ficava muito dispendiosa financeiramente, o que era uma responsabilidade muito

grande deixar os moldes de cartão bem ajustados antes destes passarem para o pantógrafo que é a maquina

que procede ao escalamento dos referidos moldes em todos os tamanhos na escala pretendida para depois

serem entregues à empresa responsável pela transformação destes moldes em cartão para moldes em metal,

”aço”, que depois são utilizados na produção ou corte mecânico por maquinas conhecidas como balancé na

produção em massa, ou em grandes quantidades. Este processo designa-se por elaboração e reajuste de

protótipos.) para o corte (“manual” quando se trata de pequenas quantidades de pares de calçado ou

“mecânico” quando se trata de elevado numero de pares.) em que era obtidas as principais peças

constituintes do sapato através das matérias-primas como peles de animais mais propriamente bovino ovino

caprino e suíno, já tratadas em curtumes, e materiais sintéticos. Em seguida era dada uma preparação e

controle de qualidade antes de estas entrarem numa nova secção de produção, a costura. Na preparação as

peças já cortadas (obra) eram faceadas, (consistia em retirar parte da espessura no local das peças que

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sofriam junção ou eram sobrepostas na costura, para que disfarçasse desta forma o volume e não

prejudicasse o conforto de modo a não magoar o pé) igualizadas, (consistia na retirada de espessura em todas

as peças de forma a garantir apenas uma espessura uniforme por todo o sapato) timbradas, (levando um

timbre da marca através de um molde aquecido que a maquina pressionava sobre a peça em pele)

referenciadas, (em que todas as peças levavam um numero característico para serem identificadas na costura

e que permitia não haver trocas delas de um sapato para outro, sendo que apenas se procedia à junção das

mesmas conforme o numero determinado na referencia) e controlo de qualidade, sucessivamente (em que se

procedia a uma primeira inspecção, peça por peça, para verificar se havia existência de qualquer tipo de

defeito e, caso houvesse, eram remetidas ao trabalhador responsável e mencionado nas fichas técnicas que

acompanhavam a obra em todo o seu percurso para proceder à sua substituição). Na costura eram precedidas

todas as junções das peças através de máquinas de costura apropriadas e com linhas adequadas ao calçado,

de forma a obter a parte do sapato sem a sola, designado por “corte”, pronto para sofrer um pequeno controlo

de qualidade antes de ser enviado para a secção da montagem. Nesta terceira secção era feita a junção do

“corte” à respectiva sola de forma a concluir o formato completo do sapato (o processo consistia na

montagem do corte na forma, reajustando-o a esta ao máximo para que seja eliminados qualquer folga,

permitindo uma maior adesão posteriormente do sapato ao pé, através de maquinas apropriadas “ maquina

de enformar” em que as fôrmas e os respectivos cortes circulavam por um transportador electrónico que

circulava por toda a área de montagem. Em seguida eram expostos a uma temperatura capaz de manter o

ajustamento definitivo ao pé com a ajuda de uma maquina designada de forno. Logo após seguiam para a

lixadeira que retirava que retirava a epiderme (flor da pele) exposta na base da fôrma para que a adesão com

a cola (de material: PU (poliuretano). borracha; cortiça; sola couro; etc.) fosse 100% fiável. Depois de

colocada a cola manualmente com um pincel / trincha (devido a uma adesão mais uniforme pela superfície

em causa), tanto no corte como na sola, era feita a junção da sola com o corte e depois do tempo suficiente

para a unificação seriam dados os últimos retoques antes de se proceder à extracção da fôrma e concluir a

montagem. por ultimo tínhamos o acabamento com o ultimo controlo de qualidade antes do calçado ser

embalado e prosseguir para o armazém onde era encaixotado em tarifas e enviado para as respectivas

distribuidoras. Este processo de formação era dado no curso de modulação, em que se dividia por varias

disciplinas organizadas com tempo horário conforme a sua importância para o curso em si: corte; costura;

montagem e acabamento; higiene e segurança no trabalho; contabilização de matérias – primas e calculo;

desenho; modulação. Sendo que a disciplina com maior numero de horas seria sem duvida a de modulação.

É claro que a entidade empregadora via esta situação com bons olhos e mostrou desde logo interesse

em apoiar-me para me familiarizar ao máximo com todo o processo de desenvolvimento e técnicas criadas

na empresa, bem como as exigências pretendidas em todas as secções de forma a poder adquirir

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conhecimentos suficientes para que o meu processo de aprendizagem fosse o mais eficiente possível, ao qual

fiquei muito agradecido pelo apoio dado pela gerência. Trabalhei em todas as máquinas existentes na

fábrica, ficando com uma ideia mais precisa da importância dada aos pormenores técnicos na confecção bem

como a programação das máquinas para a concretização das mesmas.

Muito rapidamente foi reconhecido o meu profissionalismo bem como o interesse de aprender e a

vontade de progredir na carreira com uma enorme ambição. Como tal fui convidado a dar formação numa

nova unidade que tinham aberto na Eslováquia por um período de dois meses na qual eu aceitei de imediato.

Foi uma experiência agradável a nível pessoal como profissional, alem da remuneração ter sido muito

convidativa. Era a primeira vez que saia do país para conhecer outro e também a primeira vez que andava de

avião. No início estava com um pouco de receio deste meio de transporte mas a ansiedade de conhecer

outros “mundos” fez-me superar o medo. Como das primeiras vezes da vida foi excelente, fantástico, com

emoções ao rubro, pois era-mos um grupo seleccionado entre os melhores trabalhadores da empresa e

aqueles que mas se adequavam a esta missão e que o convívio entre nós era fantástico. Ajudava-mos

mutuamente no que sabia-mos para superar alguma dificuldade que encontrava-mos e apesar de ser o mais

novo membro desta”tripulação” era o que mantinha uma postura mais tranquila, tipo como se de algo

habitual se tratasse, sabendo que a experiência era de igual para todos. Esta aposta por parte da Rieker

deveu-se muito ao facto de logo após a desintegração da ex. URSS por parte da Checoslováquia e desta em

dois estados independentes, Republica Checa e Eslováquia em que o primeiro beneficiou da grande parte dos

recursos existentes deixando o segundo com uma carência intolerável para a sociedade, a Eslováquia

candidatou-se à CEE que é a actual União Europeia (EU) cativando desta forma todo o tipo de investimento

por parte da vizinha Alemanha, pois tratava-se de um pais com o ordenado mínimo 3 vezes inferior ao nosso

e com um potencial de mão-de-obra qualificada muito superior ao português. Abrindo-se as portas de

confiança que estavam um pouco apagadas devido as adversidades e atrocidades dos dois grandes conflitos

que foram as duas grandes guerras mundiais e que ambos foram protagonistas sendo também palcos de

guerra, embora em contextos diferentes, para apostarem em força lucrando com isso despesas de transporte

devido à sua proximidade e encargos remuneratórios com os trabalhadores, pois a mão-de-obra era muito

apetecível. O único inconveniente seria mesmo ter de ultrapassar as divergências culturais, pois os valores

comunistas (marxistas) da sociedade eslovaca, ainda estavam bastante enraizados o que chocava com os

valores capitalistas da sociedade investidora e em que mais uma vez na história, os portugueses funcionam

como ponte de ligação para o bom sucesso da globalização (da implementação e funcionamento desta

multinacional neste novo pais do Leste Europeu). A grande dificuldade encontrada foi a linguística,

ultrapassada através gestos em que para ensinar precisava de efectuar o trabalho na presença atenta dos

aprendizes e corrigindo pormenores quando estes começavam a exercer funções. Nem sempre era fácil

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devido à política do país que subsidiava os seus cidadãos que não trabalhassem com um rendimento mínimo

quase igual aquele que iriam receber na empresa o que lhes permitia uma liberdade de integração e quando

lhes apetecia faltar ou por outra razão deixar o trabalho faziam-no sem dar qualquer tipo de justificação à

entidade patronal, pois ganhavam praticamente o mesmo e a lei permitia-o. Era uma desorganização total e

por isso tínhamos de ser muito pacientes com eles para que estes se dedicassem e adaptassem ao trabalho de

forma a não se sofrer desistências. No final do dia voltávamos para a nossa casa, comum aos portugueses,

para organizarmos as nossas tarefas básicas do dia-a-dia em que todos se ajudavam mutuamente tal como:

arrumar e limpar a casa; ir às compras num supermercado local; ajudar no jantar; etc. Vivíamos em

comunidade e no final do jantar aproveitávamos para dar um passeio a pé pela localidade e conhecer um

pouco da sua cultura e ao mesmo tempo discutir os problemas que surgiam na empresa com cada um de nós.

Tratava se de uma cidade chamada Comarno nas proximidades do rio Danúbio e fronteiriça com Hungria.

Era verão. O calor ensurdecedor e abafado do dia era compensado com ar fresco e calmo da noite. Os dias

eram longos e às 23horas locais ainda eram dia o que dava tempo suficiente para uma bela digressão pós

laboral pela cidade. Aos fins-de-semana alugávamos um mini autocarro e viajávamos pelo país e países

fronteiriços, conhecendo quatro belas capitais do centro e leste europeu, em que o ponto geográfico onde nos

situávamos era bastante estratégico, pois as distancias em que se encontrava entre as capitais visitadas eram

muito semelhantes. Bratislava, Budapeste, Praga e Viena são belas e exóticas, muito distintas entre si apesar

das proximidades, ligadas praticamente entre si por um grande canal de comunicação, o 2º maior da Europa,

o rio Danúbio. Apesar da imensa beleza que cada uma delas tinha para oferecer, a que mais me marcou foi

sem dúvida Budapeste, devido ao relevo na qual se situa, “onde a obra feita pelo homem encaixa como uma

luva na obra criada pelos deuses” criando uma beleza impar e soberba onde o rio Danúbio banha as suas

belas margens “sendo o espelho que reflecte tal beleza aos deuses como oferenda”. As pessoas eram muito

individuais, com uma expressão facial séria mostrando indiferença perante a nossa presença e a tudo o que

as rodeava. Era uma população fria, talvez pelos problemas vividos na sua história e ainda recente, pois teria

sido um pais invadido pela Rússia e recentemente tornado independente, talvez por isso em fase de

recuperação do seu autonomíssimo e patriotismo.

Voltava para Portugal com uma ideia mais real do mundo e mais forte psicologicamente. Retomava a

minha vida normalmente, trabalhava como polivalente na empresa e no horário pós laboral recomeçava o

curso de modulação. Pouco tempo depois fui novamente convidado pela empresa a ir trabalhar

temporariamente para a sede da Rieker localizada na cidade de Tuttelingen na Alemanha ocidental, para

proceder a ajuda na elaboração dos protótipos da nova colecção que se avizinhava e que se preparava para

expor os modelos na grande feira internacional do calçado em Frankfurt. Gostei muito da experiencia e

como tal era convidado sempre que necessário. Fiquei maravilhado pela forma inovadora como os

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moduladores e modelistas procediam à elaboração e criação dos modelos em que utilizavam apenas o

computador através de um programa designado “cad-cam” em que processava o formato do sapato em 3d e

que em Portugal ainda não era utilizado, embora já se ouvia falar dele, substituindo desta forma o processo

convencional / tradicional em que se utilizava uma “forma” na qual se sobrepunha papel vegetal para a

criação do modelo. Já nesta altura na repartição portuguesa onde trabalhava (P.C.L.) começaram a surgir os

primeiros agouros em relação ao futuro desta unidade, pois começava-se a especular acerca da sua

durabilidade pois constava-se a sua transição para a Eslováquia, paradoxalmente para a mesma unidade onde

estivera um ano antes a ditar os meus conhecimentos. Não tardaram 2 meses para que probabilidades se

convertessem em realidades começando a surgir os primeiros despedimentos de uma forma hierárquica,

começando nos menos qualificados profissionalmente e naqueles em que o contrato estava a termo incerto.

Notava-se revolta e desmotivação por parte do pessoal afectivo, pois saberiam que mais cedo ou mais tarde

acabaria por chegar a sua vez, o que acabou por acontecer meio ano depois, sem que antes houvesse uma

manifestação geral, parando a produção, não deixando sair a maquinaria e reivindicando os seus portos de

trabalho, mas foi sol de pouca dura. A gerência acabou por ceder um pouco e chegou a um consenso com a

classe trabalhadora, esclarecendo desta vez qual o motivo, que era devido a melhores oportunidades de

negócio e que como se tratava de uma empresa representada por accionistas onde o que realmente interessa

são os lucros da empresa (e quanto mais melhor) não havendo retorno. Prometeram e deram mais 50% do

direito de indemnização por trabalhador e que seriam seleccionados ate que só resultassem os melhores, pois

haveria uma outra firma alemã que trabalhava só com qualidade e alta gama e que esses melhores seriam

transferidos directamente para ela, contando os anos de casa feitos mas sem direito a qualquer tipo de

indemnização. Dito e feito e não tardou um ano para as coisas levarem esse rumo. No meu caso estaria para

continuar a trabalhar na empresa mas teria de me deslocar para a cede na Alemanha mas entretanto ainda me

faltava concluir o curso de modulação e nesta altura cheguei a um acordo com o gerente “Ralf” que seria

indemnizado pelos anos de trabalho efectuados que eram de 6anos e assim que concluísse o curso voltaria a

entrar, sendo feita a minha transferencia nessa altura, mas quando me dirigi para proceder à retoma do

contracto nada disto se sucedeu, pois o gerente com um ar triste e reprimido dirige-se a mim dizendo:

-senhor pereira é com muita pena minha que não possa integrar novamente a empresa Rieker pois o

seu profissionalismo excede todas as expectativas. Mas o que se trata aqui são problemas burocráticos com a

sua situação nos quais os seus colegas souberam do seu regresso e contestaram perante nós dizendo que se o

Fernando vier trabalhar novamente depois de ser indemnizado então nesse caso também teriam esse direito,

reivindicando tal facto.

Ora como eu não tinha a mesma capacidade de hoje para pensar simplesmente entendi aquilo como

uma desculpa ou algo assim, na qual vim a descobrir que não se tratava desta minha convicção e que estava

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errado., bastava apenas devolver o dinheiro recebido da indemnização e teria o emprego garantido, mas nem

tão pouco me ocorrera tal ideia e nem o pessoal amigo e familiares com quem desabafei tão angustiante

facto me conseguiram ajudar a decifrar este paradoxo/enigma. Desiludido depois de tanto esforço em vão e

pela “traição” dos meus camaradas de trabalho revoltei-me comigo mesmo, olhando para o meu futuro num

sentido irrisório e obscuro e como se não bastasse o facto de tanta dedicação á profissão deixando de lado as

tentações biológicas que, como em qualquer ser humano, actuavam sobre o meu organismo. Já se ouvia em

casa as indirectas relacionadas com factores matrimoniais tipo “- eu com a tua idade já estava casada e com

filhos. Já tratava de uma vida”, confrontando-me com episódios vividos nas casas da vizinhança mas que tão

pouco se importavam com aquilo que realmente me chamava a atenção e que era totalmente o oposto de

tudo aquilo para o qual me tentavam alertar. Sentia como se me estivessem a empurrar para o abismo, o que

despertou totalmente em mim os “fantasmas”que me assombraram outrora no passado, fazendo me sentir

“entre a espada e a parede” pois de tabus se erguia a sociedade em meu redor em que aquilo que para mim

era real teria de abdicar para adoptar uma realidade que não era a minha, mas sim aquela que os outros me

queriam impingir. Assim sendo, e sem forças para lutar, lá tive de me transformar num bom actor, deixando

de viver a minha vida em função daquilo que os outros queriam que eu fosse, evitando desta forma ferir

susceptibilidades e rejeição por parte dos amigos e desgostos sociais, até mesmo descriminalização por parte

da família que era tradicional e como se não bastasse muito conservadora e religiosamente orgulhosa. Não

tardou muito tempo e criara sobre mim uma enorme depressão, pois sentia-me como um zombie (morto-

vivo) em que as pessoas mais chegadas viam isso com naturalidade pensando tratar-se mais de uma mera

fase da vida do que um problema grave de saúde. Todos os fins-de-semana à noite e também algumas noites

da semana passava no convívio com “amigos”em que nos reuníamos no fim do jantar num bar chamado

“Mitos Bar”, conversando coisas sem nexo, tipo: futebol; mulheres; sexo; vida alheia; etc. Conversas estas

acompanhadas por muita cerveja e tabaco, disparatando-se por vezes, havendo troca de agressões verbais e

distúrbios físicos. Era um ambiente esquizofrénico, onde não se aprendia nada de útil para a vida em que o

excesso de confiança reinava o que levava a haver muita intromissão na vida pessoal uns dos outros,

causando conflitos e retaliações, criando desrespeito e invadindo a liberdade de cada um. Era uma “pura lei

da selva” em que os mais fracos submetem-se aos caprichos dos mais fortes. Eu observava tudo aquilo com

indiferença, embora interpretando-o como exemplo a não seguir, evitando contacto e aproximação com

algumas pessoas e seleccionando de uma forma complementar outras que me diziam algo mais. Alguns

meses depois as pessoas que me eram mais chegadas começaram-se a aperceber de certos comportamentos

em mim, os quais haveria adoptado nesse ambiente e que tão pouco me apercebera, achavam que me estava

a tornar mais agressivo e com atitudes diferentes, censurando-me. A minha família, não vendo com bons

olhos tal liberdade e mudança, empurrou-me para um novo trabalho, tratando-se de uma loja de

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electrodomésticos pertencente a um tio meu: Electro S. Gens “ empresa em nome individual pertencente a

José Moreira Carvalho” irmão mais novo da minha mãe e que estava a precisar de um ajudante a tempo

inteiro.

Comecei a trabalhar com o meu tio no final do ano de 1996 como trabalho temporário e com uma

remuneração acordada entre nós pois não queria correr o risco de me empregar definitivamente sem saber as

hipóteses de eu me adaptar. No fundo ele não queria compromissos burocráticos. Queria e precisava de uma

pessoa a tempo inteiro e não queria assumir os direitos estipulados por lei e exigidos à entidade empregadora

para com um funcionário normal, não descontando para a segurança social ou outro e outros direitos

adjacentes a um contrato normal. Sentia-me como um clandestino, como um emigrante ilegal dentro do

próprio país. Embora discordasse não tinha alternativa, a situação em casa estava descontrolada e os ânimos

exaltavam-se, não havendo a desculpa de não ter trabalho pois o membro da família teria proposto trabalho

como de uma “obra de caridade” se tratasse, mostrando pena de mim perante a família quando o objectivo

dele era a exploração. Tratava-se de uma pequena loja de electrodomésticos situada num meio muito pouco

urbano em que os principais clientes eram da periferia, na sua maioria aldeões. Para se perceber melhor a

relação que eu tinha com o meu tio temos que recuar no passado: o meu tio era o irmão mais novo de cinco

irmãos “vivos” pois eram nove no total, mas devido ao grande numero de mortalidade infantil que se fazia

sentir na época por falta de meios médicos e condições de acesso aos hospitais existentes porque não

existiam estradas de acesso nem meios de transporte em que o único recurso quando alguém adoecia, como

foi o caso dos dois primeiros filhos da minha avó, eram transportados de carro de bois por caminhos

adversos em terra e monte num estado lastimável até ao hospital mais perto em que, segundo a versão da

minha avó que ainda é viva com 96anos e está aos cuidados da minha mãe na casa onde vivo, demoravam

cerca de quatro horas no mesmo percurso que hoje se faz em 20 minutos, sem hipóteses de sobrevivência

para muitas delas, como aconteceu com os meus dois tios mais velhos que chegaram lá já sem vida. Como

família rural naquela época tudo era manual onde a mão-de-obra era indispensável, logo as famílias bastante

numerosas, começando desde muito cedo a trabalharem no campo, sem domingos e feriados, recorrendo aos

vizinhos quando era para serviços mais longos em que se empregava mais gente para os concretizar tipo

colheitas de cereais como a ceifa de trigo, milho e centeio bem como o linho, azeite, vinho, etc. Ajudavam-

se mutuamente em que a remuneração paga era com a troca de favores dos mesmos dias entre eles. No final

do dia e quando a” serviçada” acabava e depois de muito cansaço, pois entravam em “profia” para cativarem

a atenção de quem pretendiam, bailavam e cantavam musicas tradicionais da época que era folclore, sendo

este o único momento de lazer e diversão entre os aldeões. Tive a oportunidade de verificar este

comportamento e assistir a algumas destas “atitudes antigas” quando me comecei a aperceber da minha

existência, talvez com 3 ou 4 anos, e acompanhava os meus pais para casa dos meus avós para os ajudarem

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nas ditas “serviçadas” organizadas por eles onde se juntava a família toda e vizinhos para realizarem as

tarefas e no final cantavam e dançavam. Parecia uma festa! Depois dos meus 6 anos já não era apenas um

mero observador mas sim um membro permanente nas tarefas, mais aos fins-de-semana, feriados e férias

escolares, utilizando o corpo como meio de transporte dos produtos enquanto os mais velhos colhiam. Foi

também uma fase de mudanças de comportamentos e atitudes laborais. Ainda bem me lembro das primeiras

retroescavadoras a galgarem os montes e a alargarem os caminhos de acesso á aldeia completamente isolada

de quaisquer tipo de progresso em que se ouvia a opinião e comentários dos meus avós e gentes da mesma

facha etária, e que os novos lhes davam uma enorme atenção como se de algo grave estivesse para acontecer:

-este mundo está perdido; isto é o fim do mundo; estão a fazer isso para nos roubar a terra, etc. Mas foi “sol

de pouca dura” e um ano ou dois depois já só viam vantagens e aproveitavam-nas com receio conforme elas

começavam a surgir como as primeiras máquinas agrícolas como tractores e as respectivas alfaias. Tinha 11

anos quando o meu avô, pai da minha mãe, faleceu de doença prolongada devido a um tombo mal corado e o

meu tio, irmão mais novo da minha mãe, teve que assumir o papel dele e manter a propriedade a produzir,

pois era o único irmão solteiro e a viver na casa e teria 20 anos. Foi então desde aí que comecei a ser uma

espécie de criado dele quando precisava de ajudas mais básicas em que um só não era suficiente tipo: guiar e

tanger os bois quando era necessário utilizar para lavrar a terra ou transportar algo; cegar erva com uma

foucinha ou gadanha que servia como alimento para o gado; apanhar escribar e ensacar azeitona para depois

transportar para o engenho; etc. Ele pedia a minha ajuda aos meus pais e estes, claro, ofereciam-me para o

ajudar com pena dele, sempre que era necessário. Tornou-se uma pessoa muito egocêntrica e desde logo

optou por tirar um curso por correspondência de electrónica, associado a reparações de televisores e rádios,

através da “Ocidental schools” trabalhando na terra de dia e dedicando-se ao curso às noites. Quando eu

ficava em casa da minha avó, observava a dedicação e motivação dele para concretizar o curso o mais

rapidamente possível, pois ele queria mostrar que era muito mais além do que aquilo que lhes era

predestinado pelos meus avós maternos que era trabalhar a terra. Ele não se conformava com a ideia de ser

pobre e, apesar de viver numa casa muito antiga e degradada em que as paredes eram feitas de pequenos

pedaços de rochas metamórficas como xisto que deixavam trespassar pelas frinchas entre elas nas paredes as

condições adversas do inverno que se fazia sentir muito rigoroso nesta região quase transmontana, em que

tábuas de madeira em bruto faziam as divisões da casa bem como a divisão no soalho entre as cortes do gado

e os quartos fazendo com que o cheiro dos dejectos e estrume dos animais bovinos inundassem os quartos

por cima e em que o calor que estes libertavam funcionavam como excelentes aquecedores para ao quartos

se manterem quentes durante o inverno, apesar disto ele era muito vaidoso preocupando-se muito com a sua

imagem, apesar da inexistência de casa de banho, apenas uma porta a céu aberto virada para os campos onde

os membros da casa evacuavam quando necessário, quase ao lado da cozinha que era a lenha em que o tecto

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os ripados que seguravam as telhas, bem como por toda a casa. “Foi nesta casa que eu deixei de acreditar no

Pai Natal aos oito anos em que fiquei lá essa noite e depois de algumas preces pus um dos meus sapatos à

lareira e de manha quando acordo tinha lá dentro uma batata. Ele e a minha avó riam-se com o meu espanto

e reacção dizendo que o pai natal não deixou presente porque eu me tinha portado muito mal, mas logo me

apercebi que isso não fazia sentido e logo vi que isso não passava de uma treta e nunca mais acreditei.”Acho

que ele foi uma pessoa muito visionária no futuro, acreditando no curso para concretizar o seu sonho, pois

tratava-se de uma época de grandes progressos tecnológicos e informativos em que as redes eléctricas

começavam a invadir as casas por todo o lado e logo a seguir a procura dos electrodomésticos como

televisores e equipamento de conservação e congelação de alimentos, dando-se uma espécie de “bum”nesses

anos. Foi então que ele se lançou no comércio e reparação de televisores, começando os primeiros anos em

casa e mais tarde, quando conheceu a sua esposa e com a iniciativa e apoio dela e esta estando na faculdade a

tirar a licenciatura em contabilidade, abriu uma pequena loja de electrodomésticos e assistência em

reparações de televisores e rádios. Com tanta procura e tão pouca concorrência ele não teve grandes

dificuldades em se estabelecer e logo ganhou muito dinheiro em poucos anos, pois estipulava o preço que

queria sendo a margem de lucro muito grande, havia pouco conhecimento por parte da população em que ter

um televisor era um bem de luxo logo vender e instalar o televisor a preto e branco para apanhar um só canal

montando uma antena e passar fio até onde ela iria funcionar ainda maior era o lucro pois levava o que

queria ao cliente e não precisava de declarar o serviço prestado perante as finanças. Nas reparações ganhava

o que queria pois a ignorância das pessoas era grande, as garantias quase inexistentes, na concorrência

apenas vendiam logo quando era necessário prestar assistência técnica enviavam os televisores para técnicos

especializados em grandes cidades como no porto em que as reparações dos televisores ficavam caríssimas

pois tinha que ganhar o vendedor o transportador e o técnico que as reparava mas mesmo assim compensava

pelo seu valor comercial que era exorbitante pois cada televisor novo a preto e branco em media ultrapassava

os 100 contos de reis nessa época, agora imagine-se o quanto não tirava um técnico como o meu tio por cada

televisor que prestava assistência nessa altura e em que se baseava no valor de reparação no mínimo uma

terça parte do valor actual do aparelho e com a vantagem de os componentes electrónicos que constituíam

esses equipamentos serem muito mais simplificados que os de hoje em dia. Usufruiu muito da vantagem de

ser uma terra de gente que emigrou à procura de novas e melhores oportunidades de vida, principalmente em

França, e em que quando acabou o benefício do estado português aos emigrantes em que lhes davam 30% de

juros se estes depositassem suas poupanças em bancos nacionais logo estes começaram por investir essas

poupanças em grandes casas feitas cá na sua de origem e onde nasceram e tinham as suas raízes e através

delas gostando-se de mostrar e exibir perante os seus conterrâneos, começando uma nova era em Portugal, a

era da construção civil. Com isto e devido às novas exigências que mostravam ter estes emigrantes em que

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nas suas casas queriam tudo do bom e do melhor e mais moderno que houvesse a nível de tecnologia de

equipamento e electrodomésticos em relação ao vizinho do lado logo não se importavam de pagar mais por

isso e logo uma mais-valia para o meu tio lucrar com esta situação jogando a seu favor e sem se preocupar

muito pois não necessitava de investir em publicidade nem em qualquer outro tipo de propaganda pois os

clientes “choviam-lhe” à porta. Também beneficiou do facto das mulheres de outrora serem camponesas ou

domesticas encontrarem-se empregadas e praticamente independentes dos ordenados dos maridos o que as

levava a terem de comprar electrodomésticos com o seu dinheiro para encurtar o tempo dedicado aos

trabalhos de casa uma vez que se tornava complicado sem a ajuda destes equipamentos. Foi então que no

final do ano 1996 e com “pena” de mim, ele oferece e propôs trabalho à minha mãe para mim… comecei por

trabalhar nas entregas de equipamento novo e reparado ao domicilio bem como proceder ao seu

levantamento quando necessário, em que nos designados “momentos/tempos mortos” ocupava-me em

organizara parte de vendas bem como a parte de reparações que ficavam no mesmo espaço da loja e apenas

dividida por uma estante metálica expositora de televisões novas e em que por vezes mais parecia uma

garagem de sucata que uma loja de venda e reparações de electrodomésticos devido à sua péssima

organização, em que por vezes estavam equipamentos para reparar em cima ou junto com os novos que eram

para vender o que criava um aspecto horrível, pois os clientes de outrora que lhes deram muito dinheiro a

ganhar começavam a escassear pois ou estavam já servidos ou começavam a fugir para um novo tipo de

concorrência, as grandes superfícies e lojas de franchising que começavam a ganhar terreno em força e de

uma forma agressiva para os pequenos retalhistas tradicionais, sem hipóteses de competição para muitos

deles habituados a ganharem fortunas noutros tempos já por mim referidos neste documento, e como se não

bastasse surgiam os primeiros problemas com o desemprego em massa que começava a recorrer por partes

de grandes empresas que recorriam a outros países de mão-de-obra barata para continuarem a ser

competitivas no mercado. Como o trabalho era uma espécie de acordo em que não havia horário fixo e

trabalha aos sábados todo o dia para ganhar 100 contos mensais, trabalhando uma média de 60h por semana

e sem descontos ou direitos a usufruir, continuei à procura de um trabalho mais credível que me

possibilitasse um pouco de tempo para a minha vida pessoal e melhores condições. Entretanto e enquanto

não surgia trabalhava com ele, evoluindo a nível de conhecimentos de funcionamento dos equipamentos de

electrodomésticos que por ali passavam e se reparavam: observada como era constituído o interior dos

televisores que ali se reparavam bem como se descobriam as suas avarias, mas o meu tio mostrava um pouco

de insegurança quando lhe fazia perguntas técnicas e logo me respondia;” -não tens que fazer?” o que me

indignava imenso pois conhecia-o muito bem e sabia muito do sei carácter egotista em que só ele era

inteligente e os outros todos burros. Foi então que se lembrou de me por a reparar maquinas de lavar roupa e

loiça bem como montagens de anteras e respectivas instalações e pequenos electrodomésticos sem grandes

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complexidades electrónicas como os televisores por exemplo. Adaptei-me com facilidade em pouco tempo

começou a fazer assistência técnica ao domicílio, mudando e sentindo o comportamento do mercado em que

as vendas começavam a cair a pique teria que começar a virar-se para as reparações que começavam a

ganhar terreno pois a era das vendas em passa e começava a era das reparações. Mas havia muito para fazer

naquela loja, pois a desordem reinava e com uma concorrência cada vez mais competitiva só teria duas

hipóteses: ou evoluía ou ficava pelo caminho. Falava com ele sobre vários factores a ter em conta e que

seriam avantajosos para a empresa evoluir e, embora fizesse de conta que não me ouvia, algum tempo depois

lá acabava por fazer mas de uma forma orgulhosa em como se a ideia tivesse sido dele e apesar de lha ter

dado fazia de conta que já a tinha em mente há muito tempo, só para não me dar o braço a torcer (razão).

Estava-lhe sempre a dar ideias pois, e apesar deste mau feitio dele, sempre lhe tive uma grande admiração e

sentia-me orgulhoso de ele ser da minha família e o que mais queria era que ele progredisse, pois esse facto

dava-me muita motivação e não me importava de saber que estava a ser utilizado e explorado por ele.

Utilizado pelo facto de ter trabalhado com 900 pessoas na sua esmagadora maioria mulheres praticamente

todas das redondezas e potenciais clientes para ele, pelo facto de ser novo e saber comunicar e cativar os

clientes e em que ele tinha um certo grau de dificuldade em se exprimir e muito pouco sentido de

sensibilização pois tinha-se habituado muito ao tempo das “vacas gordas” e achava ele que não tinha de

progredir pois na mente dele eram os clientes que precisavam dele e não o contrario. Ele tinha o curso

técnico tirado por correspondência e evoluiu para aquilo tornando-se um técnico muito bem especializado,

mas isso só não chegava, pois faltavam-lhe outras bases porque apenas possuía a 3ª classe que nem

correspondia ao ensino obrigatório da sua época e em que eu muitas vezes o incentivava para completar

estudos à noite pois sabia que ele tinha potencial para isso. Quando se tratava de reparar equipamentos de

refrigeração como arcas congeladoras frigoríficos e outros, tinha que os levar a reparar a um técnico de

Paredes: perdendo tempo, pois o percurso de ida e volta era de aproximadamente 50km; tinha custos

acrescidos a nível de gasóleo e portagens para não falar do desgaste do veículo; era demorado para o cliente

pois como se tratava de um tipo de equipamento de conservação de alimentos quase que era visto como um

equipamento de primeira necessidade, logo o cliente ficar demasiado descontente com a demora pois só se

iria buscar o equipamento reparado quando houvesse outro para levar a reparar com a ideia de se evitar fazer

viagens vazias, o que por vezes demorava meses para desespero do cliente; muitas vezes chegava ao técnico

para levantar o produto e ainda tinha que esperar e o dia não se tornava rentável; etc. Enquanto esperava

observava o técnico e logo dei a ideia ao meu tio de se fazer aquele tipo de reparação ali pois iria trazer

vantagens ao qual ele me respondeu: -o trabalho que tens não te chega? Fiquei indignado com a atitude dele

e foi então que aproveitei uma proposta de trabalho como monitor de ensino de trabalhos práticos relativos

ao calçado na Escola Profissional de Felgueiras em que tinha como objectivo acompanhar os alunos que

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estavam na área de estilismo na elaboração prática dos seus protótipos bem como na correcção e alterações

necessárias na sua produção e criação.

O contracto correspondente ao ano lectivo 1997/1998 consistia em acompanhar os alunos no processo

de aprendizagem laboral para que estes e após completarem o 12º ano de escolaridade e não quisessem

prosseguir estudos tivessem uma base que lhes permitisse integrar o mercado de trabalho, mais propriamente

no sector da industria do calçado, com uma visão mais ampla e alargada de forma a diminuir a dificuldade,

integração e adaptação ao mercado do trabalho. O contrato era de 10 horas semanais a recibos verdes, não

dando para os gastos que tinha para as deslocações e almoços levando-me a ter um trabalho extra de

cobertura que foi continuar nas reparações de electrodomésticos, chegando a um acordo com o meu tio que

não via a ideia com bons olhos mas aceitou. Gostei de dar o meu contributo na preparação daqueles alunos,

pois via neles um grande empenho em saber e aprender as várias etapas da constituição do protótipo criados

por cada um, notando-se a ansiedade de vê-lo realizado como se de uma obra de arte se tratasse. Também

sentiam um grande à-vontade perante mim, pois viam-me mais como um colega do que propriamente um

monitor, “um amigo “, sem que isso os levassem a faltar-me ao respeito pois eram alunos muito responsáveis

e educados. Foi uma experiencia de vida muito agradável em que senti verdadeiramente útil para a sociedade

e onde criei laços de amizade que ainda hoje perduram. Acabei por deixar o ensino na Escola Profissional

De Felgueiras no final desse ano lectivo, pois os nº de horas pagas não eram o suficiente para garantir a

minha subsistência com muita pena minha, continuando o trabalho como técnico de reparação, vendas e

assistências de electrodomésticos bem como seus derivados na empresa Electro S.Gens.

Comecei aqui um grande percurso da minha vida que duraria 10anos, apesar das divergências sentidas

devido a atitudes e comportamentos de repressão que eram instaurados sobre mim por parte do meu tio e

mãe para que deixasse de pensar noutro tipo de futuro e que pudesse ver aquele como a única alternativa e

oportunidade de vida: “sentia-me como uma espécie de animal feroz nas mãos deles e que precisava de ser

domado a seu belo prazer” sem que com isso a minha opinião não interessasse para nada, apenas o meu

corpo, como se de um objecto se tratasse, “ uma marioneta” nas suas mãos, em que sentimentos eram vistos

como lamechices de pessoas fracas e vulneráveis como se me conhecessem intimamente e em que as

conclusões daí tiradas os assustassem perante o meio social onde estávamos inseridos ao ponto de quererem

mudar a minha mente para que não caísse no ridículo e, com isso, a família não se envergonhasse,”caísse na

má-língua do povo”, ficando indiferentes ao facto de isso me poder perturbar e criar infelicidade, pois o que

contava era uma aparente estabilidade, confundindo hipocrisia com realidade, podendo com isso “taparem o

sol com a peneira”. Contudo adaptei-me ignorando certas superstições e agouros, não me deixando

influenciar por isso, dedicando-me aquilo que achava que era importante: profissionalismo e conhecimento

geral. Dediquei-me ao trabalho revolucionando e debatendo certos pormenores que deveriam ser alterados

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para tornar o local de trabalho organizado e mais competitivo de forma a poder dinamizar o serviço para

garantir uma maior satisfação e rapidez ao cliente bem como um maior proveito e rentabilidade para a

empresa. Nesse percurso de tempo que aí trabalhei empenhava-me em simplificar o meu trabalho alargando

conhecimentos nos pedidos de reparações de equipamento electrónico conforme estes iam evoluindo para

poder ser o mais polivalente possível possibilitando ao cliente um maior leque de actividades de serviços

prestados, em que estes ficavam mais satisfeitos aumentando o grau de confiança na relação cliente/empresa.

Um dos exemplos de progresso deu-se quando um cliente, Sr. Oliveira, emigrante em França e com uma

propriedade em Trás-os-Montes, decidiu comprar umas máquinas de ar condicionado em França e instala-las

cá na sua casa pedindo se eventualmente nós o poderíamos desenrascar no serviço de montagem do

respectivo equipamento ao qual, e de uma forma irónica, o meu chefe lhe respondeu que fosse pedir que as

montasse a quem lhas tinha vendido. Ora já se sabia que ele as tinha trazido de França, e quanto mais o

homem tão regateou qualquer tipo de preço ou custo pelo trabalho prestado apenas querendo ser servido,

quanto mais nós ainda não vendíamos esse tipo de equipamento e com muita indignação da minha parte pois

estávamos numa era revolucionaria em que começara a haver uma procura em massa e em que o preço

datado, devido as suas características vantajosas e também devido à lei do mercado em que a procura era

maior que a oferta, rondava os 1200 euros por uma maquina normal de 12.000 BTUs incluindo o trabalho e

instalação, o que rendia uma margem 2/3 de lucro para a empresa que as vendesse e instalassem, ou seja,

uma media cada de 800 euros por este tipo de maquina, em que eu já viria a sugerir em ter pois só traria

vantagens para a empresa, logo não tinha razão alguma de nomear o sitio onde as teria comprado ao cliente

dando-lhe com isso a entender indirectamente que ficou ofendido por este as ter comprado noutro lado. Foi

então que, e na presença de ambos, me ofereci para as montar e resolver-lhe o problema ao qual e

surpreendente o meu chefe (tio) riu-se e sarcástico extorquiu:”- mas tu vais instala-las? Nunca fizeste

nenhuma instalação? Nem sequer tens tempo porque não te dou dia nenhum para isso, nem ao sábado pois

há mais que fazer. Ganha juízo pah…” ora como já se trabalhava na refrigeração e frio, também com

iniciativa de minha parte e passando-se um episódio semelhante embora noutras perspectivas, em que o

sistema de funcionamento do ar condicionado era idêntico ao funcionamento das máquinas de frio, não via

nenhum entrave ou dificuldade acrescida em resolver a situação a não ser alguns pormenores técnicos que

bem se poderiam superar. Foi então e de uma forma repentina à provocação do chefe que me comprometi a

instalar-lhe as máquinas num domingo caso ele aceitasse e estivesse interessado no qual ele aceitou e

contente por este gesto dizendo: “- claro que sim! Vamos já este domingo!” e também ele respondendo à

provocação:”- temos de dar oportunidade a juventude que quer trabalhar. Quem sabe não te levo comigo

para França e montamos lã um negocio destes?! Isso lã dá dinheiro…” Ora é evidente que estava com um

pouco de receio pois tão pouco tinha visto uma a funcionar, mas através do manual de instrução lã consegui

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por termo ao problema, compensando-me muito bem no final do serviço, alem de me ficar obrigado. Foi

então que eu propus sociedade ao meu tio nas condições de entrar com metade do valor da aquisição de

máquinas para comercializar, instalando-as eu sozinho e no final dividia-mos o lucro dai eminente pelos

dois. Ele aceitou. Mandou vir o material e eu pedi-lhe contas ao qual ele me respondeu com um tom amargo

e indelicado:”- eu sociedade contigo? Não faço sociedade com canalha. Sociedades só com a minha mulher e

mesmo assim só na cama.” e eu:”- mas então o que foi que combinamos? Não tem palavra? e sendo assim

quem é que lhas vai instalar?” ele:”- instala-las tu pois é para isso que te pago. Fazes aquilo que eu quiser e

que te mandar fazer. E para isso que aqui estás.” Foi um choque. Parecia que não reconhecia esta pessoa pois

o olhar, atitudes e palavras quando se dirigia a mim dava para pressentir, deixando mesmo transparecer ódio,

raiva, uma espécie de inveja de mim e eu interrogava-me do porque disso…”- o que foi que eu fiz?”.

Depois disto as coisas modificaram-se e nunca mais foram as mesmas: procurei só trabalhar as horas

propostas por lei, as 40 semanais, pois também não tinha tempo para mais porque resolvi voltar a prosseguir

estudos em regime pós laboral na Escola Secundaria da Lixa, retomando no 8º ano e com horário diário das

19.00 horas às 24.00, coincidindo na primeira hora com o horário de trabalho (09.00 às 19.00) levando-me

desta forma a pedir o estatuto de trabalhador-estudante e entrega-lo à entidade empregadora ao qual ele me

respondeu:”-anda meu menino que vais num lindo caminho. E a partir de agora quem faz as leis aqui sou eu

e isto não te serve de nada. Se pensas que vais ter o que aqui exige estas muito mal enganado. Ou fazes

aquilo que eu quero e como quero ou arranjo-te a despedir por justa causa. Não levas direitos nenhuns,

apenas te ofereço uns patins…” em que só me tinha de submeter pois pensava na altura e com o pessoal a

queixar-se com falta de trabalho e também a pressão e angustia vivida por aqueles que desesperadamente

tentavam arranjar um causavam sobre mim um efeito de medo que contrastava com a revolta que sentia por

dentro por me sentir bloqueado e pressionado a abandonar os estudos. Contudo não desisti e apesar do

grande esforço e cansaço do dia-a-dia ainda tinha que levar com certas atitudes dele como ex. o facto de me

mandar fazer assistências ao domicilio quase em cima da hora e com o pretexto de que o cliente só se

encontrava em casa nesse momento, embora soubesse da sua intenção que era pôr-me nervoso ao ponto de

me provocar pois sentia nele que lhes dava gozo este tipo de atitudes para comigo como se me quisesse dar a

mostrar que era muito superior a nível de inteligência rindo-se esforçadamente quando eu regressava já

tarde, em que por vezes já tinha perdido as duas primeiras aulas. Chegou mesmo a querer controlar-me aos

fins-de-semana, começando por frequentar os locais onde me reunia com alguns amigos e que funcionava

tipo ponto-de-encontroe aos poucos dando-se ao conhecimento com eles para poder fazer perguntas ao meu

respeito como se eu já namorava, se tinha muitas gajas, para onde é que ia quando não me encontrava

naquele local, etc. sentia-me perseguido só queria saber para depois no local de trabalho provocar-me, pondo

em causa certas amizades que tinha bem como comportamentos de amizade que tinha com amigas minhas e

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que ele confundia com relações amorosas. Alem de frustrante começava a sentir esta atitude dele perante

mim como uma atitude doentia, levando-me a pensar que por vezes ele queria viver a vida através de mim,

como se utilizasse o meu corpo como isco para atingir os seus fins. Isso deveu-se ao facto e a partir que

evoluiu a nível de informática, pois já não queria fazer mais nada a não ser estar à frente do monitor, tendo o

Paulo (colega de trabalho) a orientar-lhe a parte técnica a nível de linha castanha (sector que engloba todo o

tipo de equipamento com uma complexidade electrónica superior ex. televisores, rádios, vídeos, etc.) e eu no

resto que seria a linha branca, venda e orçamento de equipamentos, assistência e transporte ao domicílio,

instalações de todo o tipo de antenas, etc. O computador foi um instrumento pelo qual se tinha maravilhado,

trazendo vantagens e desvantagens para a empresa. Começou por me pedir ajuda na fase de iniciação pois

não tinha bases de informática mas depois e com Internet instalada ele transformou-se num cibernauta

assíduo e quase a tempo inteiro, começando a progredir para um caminho de economia paralela, pois queria

mostrar e exibir a sua inteligência com programas que sacava da net e que conseguiam ler as eproms dos

chips de memória dos descodificadores da tv cabo e através do ird e da boxkays conseguia pô-los a

funcionar sem que o cliente gastasse qualquer tipo de mensalidade, ficando com um premio pelo seu

trabalho que era pedido ao cliente, não compensatório pelo ponto de vista em que punha em risco toda a

empresa, exigindo-me o trabalho de instalação em casa dos clientes, pondo-me como cúmplice nesta

actividade. Embora contrariado ele não tinha alternativa e para além do receio que sentia da ilegalidade tinha

de cumprir as ordens dadas pelo patrão com medo das represálias e sanções que ele ameaçava fazer caso eu

não cumprisse, o que me levava a ter níveis elevados de stress. Usava o mesmo sistema para desbloqueio de

telemóveis.

Nesta época estava já conturbado com uma situação emocional que se alastrava com o tempo no qual e

sem saber porquê eu teria mergulhado e não sabia como sair dela ou mesmo gerir. o caso remonta com o

conhecimento e convívio do meu leque de amigos que daí resulta um triangulo amoroso com as duas pessoas

que mais adorava e que as considerava como os meus melhores amigos. Alem de nunca se ter chegado à

prática sexual as coisas evoluíam para contornos obsessivos e desgastantes em que a minha amiga era

apaixonadíssima por mim e eu apaixonadíssimo pelo meu melhor amigo sem nunca lho dizer que este

mostrava ter ciúmes da minha amiga e acabavam mesmo por não se suportarem, estando constantemente em

conflito um com o outro que mais parecia um combate entre eles sendo eu o troféu. Foi então que aproveitei

uma viagem a paris com ela, em que ficamos hospedados em casa da sua mãe em Meson Làfite,

departamento 78, e embora sabendo que ela iria com outra intenções pois queria mais de mim do que aquilo

que eu lhe poderia dar, acabei por lhe dizer toda a verdade no regresso, confessando lhe os meus sentimentos

e tendência sexual ao qual reagiu muito mal não querendo acreditar, odiando-me por isso mas depois voltou

à normalidade. Senti-me aliviado e de consciência tranquila pois não aguentava a pressão dela sobre mim

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por muito mais tempo contrastando com aquilo que sentia. Em relação ao Nuno foi diferente. Embora

sabendo das escolhas dele, que eram mulheres, eu amava-o silenciosamente sem nunca lho ter dito, pois o

medo de o perder como amigo seria insuportável para mim mas que acabou por acontecer mais tarde,

quando ele assumiu um namoro e por mais que tentasse manter as aparências não conseguia. Magoava-me

muito em vê-lo com a namorada e sem saber como digerir a situação simplesmente abandonei o local de

encontro e com isso todo o grupo de amigos, dedicando-me só e simplesmente aos estudos e trabalho. Foi

muito difícil e ainda hoje sinto a falta, pois foi como se de um momento para o outro todos os meus amigos

tivessem morrido e embora o desertor tivesse sido eu a dor e revolta em mim era maior. Nesta altura o meu

tio tentava saber porque é que eu não aparecia, pois pensava que teria sido devido à Beta me abandonar e

como me via ao domingo fechado no quarto a estudar e durante a semana deprimido no trabalho lá pensou

que andasse desgostoso e como uma empresa de fornecedores lhes tinham oferecido uma vagem de uma

semana ao Brasil ele acabou por ma oferecer a mim, fazendo-lhe companhia. Aceitei com a convicção de

que ele me queria ajudar a entrar numa fase de recuperação psicológica mas estava enganado. Pois foi tudo

muito bem até descobrir que o que ele pretendia era utilizar-me mais uma vez como isco para satisfazer suas

necessidades fisiológica em que se aproveitou da minha juventude e talvez do facto de eu ser uma pessoa

bastante apresentável e desejável pelas pessoas com quem convivia e de alguma forma lhe chegava aos

ouvidos. Foram umas ferias que me ajudaram a ficar mais perturbado ainda pois o local para onde fomos era

uma estancia turística balnear e tropical do nordeste brasileiro com uma cidade chamada Fortaleza, em que

havia muita oferta de prazer sexual por parte de mulheres, que exploravam as paradisíacas praias para

exibirem seus corpos aos turistas que por ali passassem com o objectivo de angariar dinheiro, pois notava-se

uma concorrência entre elas sem precedentes em que cada uma cuidava do corpo e embelezava-se de forma

a atrair e a ser mais bem sucedida que a outra para conseguirem seus objectivos que era irem para o hotel

com os turistas que ali se deslocavam de todos os cantos do mundo aos milhares em busca de prazer sexual.

Foi então que me apercebi que era usado por ele como trunfo de engate para ele poder chegar a mulheres

mais novas e mais belas possíveis e logo em seguida as levar para o hotel onde estávamos instalados,

parecendo uma espécie de t2 em que dividíamos entre os dois casa de banho, sala e uma pequena cozinha,

tendo cada qual o seu quarto. Como desde sempre tentei encobrir de todos aqueles que me eram próximos e

familiares a minha tendência sexual com medo de represálias e susceptibilidades daí adjacentes e como não

contava com aquele tipo de ambiente para o qual ele me arrastou mais na expectativa de ter certezas sobre

esse facto a meu respeito, comecei por ansiar o regresso o mais rapidamente possível devido ao stress que se

passou num episodio em que ele consegue arrastar duas para o hotel, o que não era muito difícil e propôs

sexo em grupo os quatro no qual eu não aceitei mas para manter os factos e ele ficar a saber o mesmo a meu

respeito levei a que me estava predestinada por ele para o meu quarto e abri o jogo com ela, a qual entendeu

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perfeitamente e respeitou. A partir desse momento passei o resto do tempo na presença dela, imitando um

namoro, pois estava consciente que iria voltar ao mesmo episódio com ele pois não se fartava de procurar

novas mulheres no tempo em que lá esteve. Foram as férias mais frustrantes da minha vida e por isso as

baptizei por “uma semana de prisão no paraíso”.

As alterações do meu estado de comportamento começaram-se a sentir desde essas férias. Dava a

sensação que iria explodir por dentro, pois qualquer coisa me irritava: qualquer tipo de barulho ou ruído por

mais baixo que fosse causava-me demasiada irritação e actuavam nos meus ouvidos que mais pareciam

foguetes a estoirarem dentro da minha cabeça; até a voz das pessoas quando se dirigiam a mim e por mais

baixo que falassem as sílabas das palavras eram latidos no meu cérebro. Entrava numa fase de depressão e

esgotamento nervoso mas não sabia. As pessoas que coabitavam comigo mais diariamente só diziam que não

andava bem, e a família achava que seria uma espécie de bruxaria que me tinham feito. Dirigir-me par o meu

local de trabalho diariamente tornava-se num tormento pois as represálias por parte do meu chefe tinham

aumentado de nível e demonstrava agora a sua intenção que era aproveitar esta fase fraca da minha vida para

me actuar no psicológico com o objectivo que eu me despedisse e desta forma não me poder indemnizar

pelos anos do trabalho: meteu mais um funcionário que estaria lá por conta de uma escola profissional a

estagiar, em que era eu que o tinha de ensinar e como se não bastasse ainda vinha com a conversa que ele

seria o meu substituto; descobri que dos 10 anos em que lã trabalhei, ele só me teria descontado 4 anos no

valor do ordenado mínimo nacional, alegando que o valor acima seria prémio, o que era mentira; depois de

dez anos de ser viço alegava que o trabalho não era bem feito pegando por tudo e por nada para me levantar

a voz e me provocar; de manhã quando chegava cumprimentava toda a gente e passava por mim e fazia de

conta que não me conhecia, dando a entender que estava ali a mais; ridicularizava-me e inferiorizava-me de

frente aos clientes chamando-me de incompetente; acusava me de negligencia no trabalho e irresponsável

nesse ultimo ano de trabalho; como se não bastasse e como ia todos os domingos lã casa pois tinha e tem lã a

mãe dele; continuava sempre a enviar-me já tarde para casa dos clientes mais para que eu ficasse nervoso

pelo facto de ter aulas a seguir e já não ir a tempo das primeiras; enchia os ouvidos aos meus pais inventando

coisas a meu respeito para que em caso de eu sair ele ficar sempre muito bem visto; etc, etc…. Passava o

tempo a provocar-me e antes que acontecesse algo de maior que era uma razão para me poder despedir por

justa causa, eu disse basta e fiz-lhe a vontade. Então propôs-me que assinasse um documento a dizer que

nada mais lhe devia e em troca me daria o fundo de desemprego e claro, nestas circunstâncias não me

restaram grandes alternativas se não aceitar, pois já considerava aquilo um inferno que propriamente um

local de trabalho.

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Não lhe perdoei tal facto e ainda hoje não lhe dirijo a palavra, pois havia formas mais democráticas

para solucionar o problema o qual eu me teria proposto a negociar, mas na verdade o que ele queria era jogo

de poder em que eu seria a sua cobaia.

Vim para casa. Ajudava os meus pais no que fosse preciso e aproveitava para colocar as ideias no

lugar, mas não estava a ser nada fácil encarar toda esta situação. Sentia-me vazio e inútil na vida. Foi quando

fui à descoberta do “eu mesmo”, precisava de me identificar com alguma coisa pois não me parecia com

nada. Foi então que me deixei levar mais pelas emoções do que pelas razões, contrariando os meus

princípios ideológicos que me foram embutidos pelo meio envolvente, pondo de lado o preconceito, agindo

com naturalidade ao instinto sem pensar nas consequências daí envolventes, comecei a envolver-me

sexualmente com homens que aparentemente me atraíam, iniciando-me com 32anos e descobrindo o prazer

real que tantos anos estava camuflado na minha mente e apenas auto-satisfeito através de uma imaginação,

por vezes doentia. Foi então que entrei numa era de um ciclo vicioso entrelaçado na constante procura de

sexo e experiencias sexuais com diferentes pessoas, experimentando e realizando diversas fantasias,

parecendo que nunca estava satisfeito e que nunca parava de procurar e quanto mais melhor. Comecei-me a

aperceber de que isto não era normal e na realidade o que procurava era o desprezo pelo meu corpo, tendo

atitudes de alto risco mas embora sabendo e tendo conhecimentos das consequências daí originarias, estava

nem aí para isso. Até que um dia apanhei um susto e preocupado recorri a ajuda medico-psiquiatrica,

mantendo-me acompanhado até hoje pelo Dr. Miguel Ângelo Bragança psiquiatra do hospital do s. João do

Porto. Só me arrependo de não ter procurado ajuda mais cedo pois de certeza que o sofrimento seria muito

menos doloroso.

Na mesma altura que deixei de trabalhar com o meu tio, fui viver (dormir) às noites para casa de uma

senhora vizinha (Milinha Moreira) que tinha ficado viúva recentemente e tinha medo de ficar sozinha de

noite na casa, embora tivesse cinco filhos estes não lhe podiam satisfazer seu pedido pois estavam todos

casados e nas suas próprias casas, e como não me interessava estar num lado ou noutro acabei ter pena da

senhora e lã ia eu dormir em casa dela todas as noites, claro, sem confusões, eu dormia num quarto e a

senhora noutro. A casa ficava a uns 100 metros da dos meus pais e de frente, porta com porta, ficava a casa

da minha tia Ana, irmã mais velha da minha mãe, ao lado a casa da minha prima Odete, filha da minha tia

Ana. Sendo assim comecei a conviver mais com a minha tia, prima e marido (Jorge) do que propriamente

com os meus pais e irmãs, pois sentia-me muito acarinhado pelas duas e apesar das divergências que havia

as irmãs (mãe e tia) que desde sempre se arrastou com elas, eu mantinha-me neutro nas suas guerras. Como

passava muito tempo em casa da minha tia em que quase sempre me chamava para lá jantar com eles, pois

fazia sempre o jantar melhorado para a filha e genro quando estes vinham do trabalho, comecei por sentir um

à vontade em desabafar a minha vida com a minha prima Odete que já andava a algum tempo a tentar puxar

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por mim. Então um dia em Março de 2008 abri-me com ela contando-lhe o motivo de ser gay e não ter

assumido nem falado disso com ninguém, expondo-lhe também o episódio que tinha passado com o meu ex

chefe, também tio dela, bem como a minha situação financeira. Ela, Odete Carvalho da Fonseca, ao saber

que tinha 50000 euros no banco, na altura depositados no balcão do Barclays em Amarante, comprometeu-se

de imediato a esclarecer que o marido, Jorge Emanuel Balão Mendes, teria uma proposta a fazer-me de um

investimento seguro e rentável.

Eles estavam separados por conveniência devido a uns problemas burocráticos que surgiram quando a

minha prima concorreu a um projecto financiado pelo IFADAP que consistia na construção de estufas para a

produção de flores e também para facilitar um empréstimo bancário cedido só no nome dela para a

construção de uma habitação no terreno de frente à casa da sua mãe e lhe fora predestinado em partilhas,

pois não o conseguiria com o seu estado civil como casada devido ao nome manchado do marido Jorge em

que tinha trabalhado numa instituição bancária e ouve um desvio de capital e, segundo ele, foi acusado

injustamente por essa instituição financeira o que o levou a apresentar a sua demissão por orgulho e não o

contrario daquilo que diziam a seu respeito. Estão como divorciados mas continuam como casados a

viverem na mesma casa. Ela tem uma loja de flores, “Florista Da Lixa”, e ele, sócio e dono de uma agência

imobiliária cita em Bonfim na cidade do Porto, “Nortimoveis”.

Foi então que começaram os dois a falar comigo a respeito de poder pôr o dinheiro a render bastante

bem e que consistia num empréstimo de 50000 euros efectuado à casa de penhor do Porto, em que esta por

sua vez o utilizava para comprar ouro usado ou fiar dinheiro penhorando a peça de ouro quatro ou cinco

vezes mais valiosa que o montante emprestado e por um determinado período de tempo que caso esse ouro

não pudesse vir a ser resgatado pelo respectivo dono, seria derretido e compactado em barras de ouro, sendo

estas a caução do investimento, rendendo mensalmente e por um período de 10 meses 750euros/mês, fora os

compromissos empréstimo sobre o valor dos 50000 euros que eram da total responsabilidade deles em que

assumiriam os juros sobre o empréstimo daí provenientes para com o banco Santander Totta, beneficiando

ainda da mais-valia sobre as aplicações desse valor nessa conta no banco em que ele próprio procederia a

aplica-lo de forma mais rentável que seria 60% desse montante e4m acções e os restantes 40% numa conta a

prazo a 3meses renovável. Mas acima de tudo o que mais me pediram foi sigilo absoluto porque, segundo

eles, as pessoas da família não iriam entender este tipo de negócio. Como estava de pé a traz a estes factos

ainda hesitaram, mas eles os dois pressionavam-me dizendo para aproveitar e que este investimento seria

apenas até Maio ao final de Maio de 2008, que era seguro pois trabalhava-se em pareceria com um dos

melhores bancos da actualidade, nomeando mesmo pessoas que conhecia-mos em comum como ex. a Rosa

esteticista que tem a loja de cosméticos praticamente ao lado da loja de flores da minha prima na Lixa. Para

me mostrar confiança e credibilidade e exibia os seus “dotes”de conhecimentos bancários, afirmando mesmo

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que só não foi bem sucedido porque o tinham tramado, jurando mesmo pelos filhos que não teve nada a ver

com o golpe bancário onde trabalhou, dizendo que eu podia confiar nele e que assumia todas as

responsabilidades sem medo.

Depois de tanta lavagem cerebral e também o facto de psicologicamente estar debilitado devido aos

estudos, carência de amizades e familiar, resolvi confiar. Foi então que em Maio de 2008 ele abriu uma

conta só em meu nome no Balcão Santander Totta, cito na praça Júlio Dinis, Boavista, Porto, pedindo-me

que fizesse o depósito em dinheiro nessa conta e assim fiz: levantei o dinheiro em numerário do Barclays de

Amarante e depositei-o nessa conta no Balcão Santander Totta do Alto-Da-Lixa. Uma semana depois ele

apareceu-me com o contracto do banco para eu assinar juntamente com quatro cheques que, segundo ele,

teria de os assinar em branco juntamente com o contracto para a casa de penhor poder usufruir do montante

do empréstimo levantando a quantia pedida através desses mesmos cheques. Ora, como confiava nele e não

muito ciente da realidade acabei por os assinar em branco, pois não estava à espera de ele aparecer com

cheques emitidos pelo banco no meu nome sem que eu os tivesse requisitado e nem ele me tinha falado tão

pouco nos tais cheques. E agora pergunto-me: como conseguiu ele isto? - Como é que se pode utilizar desta

forma o nome de alguém?

Como dispunha de acesso à internet comecei a procurar a minha possível alma gémea, virtualmente,

uma vez que fisicamente seria quase impossível pois a homofobia do meio ainda prevalecia, dificultando a

felicidade de quem a procurara neste contexto, pois o medo de cair no ridículo seria maior. Foi então que

conheci o Dércio Nicolau Maia Pontes, natural de Vila do Conde, freguesia de Azurara e, após vários

episódios e conversas virtuais, acabei por me apaixonar por ele. Foi então que começou todo o enredo de um

drama que nunca imaginei que me viesse acontecer de tão trágico que foi: A conversa e contacto com o

Dercio arrastava-se deste Agosto de 2008, quando trabalhava como carteiro na estação dos CTT de Vila Meã

Amarante a cumprir um contracto de dois meses referente à substituição dos carteiros que entravam de

férias. Nessa altura tinha requisitado o computador portátil referente ao programa e-escola, usufruindo da

internet para comunicar com o Dercio e em que conversa puxa conversa e com o recorrer do tempo senti-me

envolvido e apaixonado por ele: falava-me das viagens que tinha feito pelo mundo e principalmente as

ultimas que tinham sido em Itália; da família em que adorava a mãe e odiava o pai por este não aceitar a sua

tendência sexual; dos irmãos principalmente do irmão mais novo (Rafael) que apenas tinha seis anos mas

que era muito parecido com ele; desgostos e desilusões amorosas do seu passado; etc. Quando acabei o

contracto no CTT, resolvi conhece-lo pessoalmente e desde logo superou todas as minhas expectativas a

nível físico e psicológico. Em Dezembro desse mesmo ano ele pede-me emprestado 400 euros alegando

estar desempregado e que precisava para reaver umas coisas e uma bicicleta que tinha em casa de um amigo

em Lisboa que tinha estado em Itália com ele e que lhe barricou os tais ditos objectos devido a esse valor de

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divida que tinha perante ele, ameaçando-o constantemente de que procederia à sua venda para saldar a divida

caso não a resolvesse o mais rápido possível. Fiquei um pouco de pé a traz na situação e sem saber o que

fazer recorri à minha prima Odete para me dar uma opinião e desde logo desabafei com ela aquilo que se

estava a passar comigo em relação ao Dercio para que a opinião dela fosse mais precisa e correcta. Depois de

me ter ouvido e aparentemente surpreendida com tais factos, chegando mesmo a afirmar que nunca lhe tinha

passado tais factos a meu respeito pela cabeça, aconselhou-me a arriscar pois “não se pode mandar no

coração”, mas que ficasse com um comprovativo de divida. Transferi-lhe 400 euros. Uma semana mais tarde

já estava a conhecer a família toda dele. Era uma família cheia de problemas financeiros e familiares.

Quando a mãe dele (Maria de Fátima Viena Araújo Maia Lopes Pontes) soube que eu estava a tratar de

investir num projecto de vinha no terreno do meu pai, financiado pelo IFADAP como jovem agricultor,

começou desde logo a falar em projectos que poderiam ser bem sucedidos naquela zona como um

restaurante em que dizia que era um cozinheira profissional e que com a idade que tinha (51) era-lhe muito

difícil arranjar emprego mas que tinha um amigo toc (Carlos Martins) que a informou sobre candidaturas a

trabalhador por conta própria através do IEFP, mas só precisava de eu sócio financiador para ter acesso ao

projecto, implorando-me que a ajudasse e logo começou a desvendar-me os seus problemas: estava

desempregada; tinha os filhos todos em casa a viver com ela sem trabalho; tinha um filho e um neto menor a

seu encargo: o marido pouco mais ganhava que o salário mínimo nacional e não ajudava muito em casa,

apenas armava confusões e que só ainda não se tinha divorciado porque não tinha dinheiro para isso e ele

não assinava; o crédito da casa já estava atrasado em vários meses; com o desespero para manter a vida

familiar optou por recorrer a créditos de consumo a varias instituições como citibank cetelem jumbo credifin

mas que se estavam a esgotar pois os juros já tinham ultrapassado o valor dos empréstimos e as citações

enviadas por essas instituições ameaçavam com penhoras de bens; com o desespero teria já tentado o

suicídio por varias vezes e só não o fez ultimamente pelo filho menor de 6 anos (Rafael). Depois disto tudo

não consegui ficar indiferente e optei em ajudar aquela família no que pudesse. Foi então que resolvemos ir

falar com uma pessoa avaliadora de projectos, Dr.ª Ana Isabel “ unignosis”, indicada pelo namorado (toc

Carlos Martins) para ver as probabilidades e através do estudo de mercado do local já programado bem

como as possibilidades de eu vir a ser sócio de uma empresa e continuar com o projecto que tinha em mente,

sem que ambos interferissem. As perspectivas foram bastantes positivas e crentes ao que resolvemos avançar

com um plano de sociedade. Como tinha investido as minhas poupanças no negócio proposto pelo meu

primo e como o contrato seria de 10 meses resolvi falar com a minha mãe e pedir-lhe que me emprestasse

conforme fosse precisando até fins de Maio desse ano ao qual já lho retribuía. Minha mãe ficou hesitante e

perplexa mas como sabia da existência do meu dinheiro emprestou. Foi um projecto orçamentado em

130000 euros em que o IEFP, devido a criação de postos de trabalho e criação de iniciativa local, participaria

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com 65000 que seria entregue em 3 tranches, e onde eu me comprometia a ajuda-la como sócio investidor

pois ajudei no processo de divórcio e ela tinha a casa à venda dizendo que quando a vendesse me entregaria

a parte dela da sociedade que seriam 40% do valor das cotas em seu nome, estando as restantes no meu e que

era o mínimo do numero de cotas exigido pelo centro de emprego para ter acesso ao apoio em que o

documento de inicio de actividade exigido e elaborado seria no nome dela.

Como tinha conhecimento de equipamento e obras optei por negociar ao máximo, pedindo orçamentos

a varias empresas dos diversos sectores negociando no final com as que apresentavam melhor propostas e

condições de pagamento, uma vez que se tratava de uma obra feita de raiz para a criação de um restaurante

take-away com esplanada na marginal com vista para o mar uma vez que se tratava de um local na primeira

linha de praia nas Caxinas em Vila Do Conde, zona balnear e muito procurada de verão por turistas.

Quando chegou a inauguração, em Maio de 2009, já eu tinha investido uns 35000 euros sendo grande

parte pedida à minha mãe. A partir desse momento a sociedade começou a retroceder e aquela pessoa que

me tinha implorado por ajuda se transformava no oposto em que tudo ali lhe pertencia, expulsando me do

restaurante dizendo que só me tinha de dar satisfações ao final do ano quando fosse a repartir os lucros,

aproveitando-se do facto de ter o cargo de gerência para fazer o que bem entendesse. Foi um choque e

desesperado recorri ao meu primo Jorge que me orientasse nas burocracias pois foi a pessoa que mais

depressa me recorreu uma vez que tinha a imobiliária e estaria mais por dentro das leis, orientando me

melhor desta forma. A sociedade teria que levar um fim à nascença e enquanto não se chegava a um

consenso entre advogados eu trabalhava no porto na imobiliária do meu primo Jorge estipulando angariações

de imóveis. Em Junho desse ano é emitido o contrato de concessão de incentivos e enviado para o

restaurante em carta registada e aviso de recepção tendo a gerente tomado conhecimento e para espanto dela,

pois não contava, teria que ser assinado por ambos os sócios, o que lhe dificultou os planos pois teria

afirmado que aquele dinheiro era só dela e que só me daria o que investi no restaurante quando bem

entendesse. Quase que me obrigava a assinar o contrato com a condição de o dinheiro cair numa conta só em

nome dela e que ela se comprometia a utiliza-lo como bem entendesse sem que me pudesse dar satisfações.

Ora logo vi que aquele documento emitido pela doutora Manuela Cerqueira, advogada dela e da firma, não

tinha nexo algum e que nunca me iria comprometer com o estado pondo o meu nome em causa, sujeito

desde logo a ficar sem o dinheiro que já tinha investido na sociedade e perante o estado com aquele que seria

financiado. Tentei me informar com a contabilista (Dr.ª Ana Isabel), com o meu advogado (Dr. Nelson

Magalhães) e com o técnico do IEFP da Povoa de Varzim responsável pela aprovação do projecto (Dr. Melo

Ferreira) para que de uma forma o mais acertada possível se desse continuidade ao projecto mas desta vez só

em meu nome em que abdicaria do meu projecto inicial do IFADAP para tomar conta deste (FEDER) em

que se eliminaria a dele a promotora Maria de Fátima ficando eu como único promotor do projecto uma vez

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que também me encontrava inscrito no centro de emprego com desempregado. A conclusão foi tirada e logo

me criaram perspectivas de que isso seria possível a nível da legislação e por parte do Dr. Melo que disse à

frente da minha contabilista que não via nenhum inconveniente por sua parte nem por parte do cento de

emprego em relação a isso na parte técnica ou jurídica mas que iria enviar o parecer da situação ao

departamento de aprovação jurídica da região Norte com cede em Matosinhos, junto ao AKI. Como o

objectivo da minha sócia era deitar a mão ao dinheiro, não lhe interessando o trabalho, começava a acumular

dividas atas de dividas no restaurante tendo eu sido avisado pelo senhorio que ao terceiro mês de renda por

pagar iria proceder a uma ordem de despejo e eu como fiador que estava mencionado no contracto de

arrendamento é que iria assumir com todos os gastos daí eminentes. Também os credores se queixavam com

a falta de pagamentos das respectivas mensalidades, pois tinha passado cheques pré-datados eu meu nome

pessoal e desde logo à expulsão fui aconselhado a dar esses mesmos cheques como extraviados no banco

pois contava em liquidar e resgatar a quantia que teria investido no negocio proposto com o meu primo e

tendo recentemente pedido mais 25000 euros à minha mãe que seria para fazer face a essas despesas que

iriam vencer pois o resgate estava do dinheiro estava atrasado, fui aconselhado pelo meu primo a depositar

também esse dinheiro no negocio juntando ao que lá tinha pois e segundo ele, o negocio estava imparável

com casas de ouro a abrir por todo o lado e que se juntasse mais esse valor o rendimento mensal seria de

1100 euros/mês, coisa que achava estranho pois ainda não tinha recebido nenhuma remuneração sobre esse

valor mas no qual ele afirmava que o iria receber todo junto e que renderia juros sobre esses juros e para

estar confiante dizia ele: “- como o dinheiro que vais receber do centro de emprego mais o que vais receber

de juros nas mensalidades não te vais preocupar em aguentar com as despesas mensais do restaurante, uma

vez que tu serás o único dono dele. Ora, começava a entrar numa fase de desespero sem saber em quem

confiar e vendo-o como a pessoa mais próxima para esse fim confiei nele e mais uma vez entreguei-lhe em

mão esse valor. Em Julho desse ano e farta de ser chateada pelos credores que ameaçavam caso não pagasse

e com a diminuição de clientela devido a falta de interesse e higiene no local de trabalho, fecha a porta do

restaurante aconselhada pela advogada, pondo um letreiro ”fechado para férias”não pagando qualquer

serviço nos três meses que lá esteve, acumulando dívidas em tudo que era parte, deixando um prejuízo

superior a 12000 euros sem contabilizar os danos causados por encerrar a porta devido a má imagem e

reputação. Ameaçado que estava com o senhorio de ordem de despejo apressei-me a falar como o meu

advogado o qual me aconselhou tentar negociar com ela pois estaria perto de perder tudo e uma vez que iria

ficar com o projecto do centro de emprego em meu nome não havia razão para tentar negociar e foi então

que se arranjou uma marcação de urgência entre nós e os advogados no qual tive que, segundo ela e a sua

advogada, indemniza-la pelo seu trabalho que me exigiu 2000 euros mais documento assinado como

saudação de divida pessoal que ela tinha perante mim no valor superior a 3000 euros em que na altura mos

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pedia com justificação de que quando vendesse a casa que mo devolveria com juros. Ainda falei em ver

como estava a situação no restaurante e depois fazia-mos contas ao que ela respondeu de imediato ou era

assim ou seguiria para tribunal. Pois só eu é que perdia e ela comprava a justiça contra mim com dinheiro

que extorquiu do restaurante e com o que me pertencia. Nessa altura o Miguel Ribeiro Caetano, da empresa

Contrastes com a qual teria passado cheques pré-datados já teria emitido um cheque sem cobertura duas

vezes no banco com o intuito de me prejudicar pois sabia que com duas entradas seguidas este seria enviado

ao banco de Portugal e logo deixava de ter crédito em qualquer instituição financeira pois seria dado como

corrupto o que acabou por acontecer com o meu nome, impossibilitando me de pedir ajuda se necessário.

Acordei com a sócia e comprei-lhe então ao cotas pelos 5000 euros, negociei em pagar aos credores assim

que recebesse o as tranches do fundo, abdiquei do projecto de vinicultura para tomar conta daquele, assumi

todos os prejuízos e danos causados pela sócia que excediam os 12000 euros quando tomei posse em Agosto

de 2009. Foi então que começou o jogo de especulação, ameaças e perseguições por um lado credores e

fornecedores e por outro eu a querer uma resposta mais precisa por parte do centro de emprego que tardava a

dar-ma e também com o meu primo que lhe sugeri reaver o dinheiro que lhe tinha dado para juntar ao

negócio pois iria precisar dele no qual ele dizia que sim mas primeiro tinha de falar com um tal de Alberto

Ribeiro em que dizia ser o responsável da aplicação. Entretanto o centro de emprego exige-me o contracto

de concepção de incentivos enviada e decepcionado pela sócia e que o teria de entregar assinado ou por

assinar de forma o departamento jurídico poder chegar a um consenso, pois sem ele nada feito, mas não era

eu que o tinha e sim ela fugindo sem paradeiro e incontactável foi impossível pedi-lo e desde logo se alertou

o Dr. Melo para esta gravidade. O cerco começava a apertar pois a luz ao fundo do túnel estava cada vez

mais pequena. Em Outubro de 2009 tive uma ameaça de morte por parte do Miguel Caetano na qual ainda

recorre. Trabalhava de segunda a domingo, de manha à noite, apenas descansando de noite e sem poder ver a

minha família, para garantir ao menos as despesas básicas e necessárias do restaurante de forma a mantê-lo

em actividade. Chegou-se Janeiro de 2010 e como já tinha pedido 10000 euros emprestados a amigos que

viram o meu desespero e para calar por um pouco o Miguel Caetano, vim-me forcado em ameaçar ir a PJ do

porto apresentar queixa sobre o negocio para o qual o meu primo me teria empurrado e os ânimos

começaram se a exaltar e acabei mesmo por apresentar queixa e logo de seguida e orientado pele agente da

PJ exigi um documento de divida do valor total investido no qual ele apresenta-me o tal Alberto ribeiro e que

seria ele a assinar o termo de divida de 76200 euros no total, feito no escritório da imobiliária dele no

Bonfim. Desesperado pedia lhe o dinheiro e este prometia que seria esta semana e passaram-se semana a traz

de semana, eu dizendo o mesmo aos credores pois contava que fosse verdade, e até hoje nada. No caso do

centro de emprego veio-me uma resposta desfavorável quase um ano depois, em Maio de 2010, juntamente

também entregue uma carta do Sr. Adriano da empresa Modernofrio a notificar processo em tribunal e o

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qual possuía reserva de propriedade do respectivo equipamento e pois não esperaria mais nem se acreditava

já no que lhe dizia. Esgotado tanto fisicamente como psicologicamente, não via alternativa se não em

entregar o respectivo equipamento e com a ajuda da doutora Marlene, advogada que depois de saber o que se

estava a passar ofereceu-se para me ajudar na dissolução da empresa, bem como tratar de burocracias sociais

como pedido de inserção social bem como protecção jurídica pois estava desesperado e sem dinheiro. No dia

que se encerrou o restaurante e fizeram o levantamento do equipamento tentei o suicídio e lancei me ao mar

de um rabina e se não fosse alguém que viu hoje estaria noutro mundo. Depois fui internado durante 3

semanas na unidade de psiquiatria do hospital de S. João. Meus pais foram contactados pelo hospital e

levaram-me para casa. Fiz de tudo o que estava a meu alcance para manter o restaurante mas quanto mais

batalhava mais problemas surgia. Era como se algo espiritual me quisesse dizer que o me3u caminho não era

aquele e que não valia a pena tentar por esse lado. O Dercio virou costas aquando à mãe e desde logo vim a

descobrir que eles os dois só me queriam dar o golpe, como tinham feito em casa de um casal de idosos de

classe social alta, sem filho ou filha, em que apenas contavam com os serviços prestados da Fátima que

trabalhava como domestica e bem remunerada. Segundo o senhor Marinho, ela seria a herdeira da casa após

a morte do casal se não fosse o desfalque de 150000 euros que ela e o filho Dercio cometeram ao

falsificarem as suas assinaturas em cheques que desviaram e que só três meses mais tarde se aperceberam.

Segundo ela acusou o próprio filho e que nunca soube de nada. Esse dinheiro foi gasto pelo filho em

digressões pelo mundo e, segundo eles, não durou um ano. Também soube que tinha sido auxiliar de acção

educativa num infantário e que dera um desfalque de 10000 euros e desde logo o infantário teve de encerrar.

Não sei se mereci isto tudo, nem tão pouco sei como é que me envolvi desta forma, só sei que sofri e ainda

sofro com tudo isto e pus pessoas que eu gosto e quero muito que é a minha família em sofrimento também e

já lá vão sete meses à espera de justiça que tarda em chegar, deixando quem sofre impaciente e ao mesmo

tempo com entrave de se dedicar refazer a vida, começando do zero ….

Vivo um dia de cada vez como se fosse o último.

Penso nos porquês de isto e daquilo, das motivações e desilusões ao longo da vida e vejo que tudo é

importante pois faz-nos ver doutro prisma que o funcionamento e desempenho de todas as actividades que

nos rodeiam e nos são prestáveis fica muito há quem daquilo que se perspectiva, dando-me a perceber que na

generalidade tudo encaminha para a entropia.

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