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NIRLYN KARINA SEIJAS CASTILLO

CURADORIA: HISTÓRIA E FUNÇÃO 

Salvador

2010

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

ESCOLA DE DANÇA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DANÇA

ESPECIALIZAÇÃO EM ESTUDOS CONTEMPORÂNEOSDE DANÇA 

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NIRLYN KARINA SEIJAS CASTILLO

CURADORIA: HISTÓRIA E FUNÇÃO 

Monografia apresentada paraavaliação final do curso de

Especialização em EstudosContemporâneos de Dança-PPGDança, da Escola de Dança daUniversidade Federal da Bahia.

Orientadora: Gilsamara MouraRobert Pires

Salvador, Bahia, Brasil

2010

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Porém, curadores são pessoas...

pessoas se envolvem,

se afetam com o gosto...

Como escolher coisas numa posição fronteiriça entre o gosto e parâmetros pré-estabelecidos?

Líria Morays, 2010.

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RESUMO

A pesquisa desenvolvida nessa monografia pretende aprofundar as reflexões

sobre o campo da curadoria em artes, visando compreender essa área deconhecimento e estabelecer um primeiro marco conceitual para propiciar oavanço de futuras pesquisas sobre o assunto. Para tanto, selecionaram-sealgumas fontes bibliográficas relacionadas com crítica, análises e curadoria emartes visuais e em dança. Foram consultados, também, links eletrônicos emlíngua portuguesa que tratassem dessa temática. Como estudo de caso, fez-sereferência a dois eventos nos quais a pesquisadora participou, que tratavam oassunto da curadoria.

Dessas fontes foram extraídas informações sobre o que se entende por

curadoria, quais são as qualidades e habilidades dos curadores e qual é afunção da curadoria em diferentes aspectos; realizou-se uma compilaçãodessas informações para elaborar o discurso que compõe a monografia. Todoo texto focou na idéia da curadoria em artes como um campo geral,entendendo que cada linguagem terá sua especificidade, mas que nessemomento era preciso entendê-lo de forma mais ampla.

A monografia ressalta e valoriza o papel do curador dentro do sistema dasartes, sendo que ele estabelece uma relação múltipla com o mercado(patrocínio, governo, mecenas), com os artistas, com o consumidor e com as

questões de seu tempo. O curador tem uma posição de articulador, que seapresenta como fundamental para o desenvolvimento das diferentes iniciativasartísticas que o campo da arte promove.

Palavras-chave: Curadoria. Função da curadoria. Curador. Artes. Indústriacultural. Sistema das artes. Instituição da arte. Crítica de arte.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.....................................................................................................6

PREFÁCIO...........................................................................................................9

CAPITULO I: APROXIMAÇÕES ENTRE CRÍTICA E CURADORIA.................10

CAPITULO II: QUEM É O CURADOR?.............................................................17

CAPITULO III: A FUNÇÃO DA CURADORIA....................................................23

CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........…………………......……….............38

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INTRODUÇÃO

Ao longo dessa monografia, estaremos registrando reflexões e

analisando  sobre o fazer da curadoria de arte, o que compreende, como semanifesta, quais as qualidades inerentes aos curadores, entre outras. Também

colocaremos alguns questionamentos sobre a relação que estabelecem os

curadores com a instituição da arte, os artistas, os espectadores e os

patrocinadores. Teremos que percorrer brevemente o surgimento da curadoria

e de um dos seus campos mais próximos, a crítica, a fim de podermos

compreender como nasce esse ofício e observar como tem se modificado até

os dias atuais.

Ao final deste texto, explicitaremos alguns aspectos e reflexões sobre a

função da curadoria, levantaremos questões e colocaremos pensamentos que

possam ajudar a pensar a curadoria em seus diferentes aspectos, que vão

desde o papel educativo em relação ao público não especializado, como

fomentadora de construção e organização de mostras artísticas, passandotambém, pela capacidade de criar e articular discursos curatoriais e, por fim, a

responsabilidade política frente ao seu meio local.

Estamos interessados em salientar a potência que as escolhas

realizadas pela curadoria têm para modificar ou, minimamente, refletir certas

realidades e concepções culturais que rondam o meio da cultura e das artes.

Por essa razão, a relação analítica com a própria materialidade da obra, que

também é um dos aspectos vitais da prática de um curador, não será

aprofundada nesse texto. Mas, devemos salientar que esse aspecto da prática

requer um estudo minucioso, pois vem a ser um dos pilares para a realização

de qualquer escolha curatorial.

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Agora, para aproximar-se ao universo da crítica e da curadoria, é

necessário (como já dissemos) compreender como esta aparece e como foi se

transformando no tempo. Ao falarmos de artes em geral, mesmo as artes

cênicas tendo acompanhado a evolução da história da humanidade, é nas

artes plásticas que encontramos uma maior sistematização de conhecimentos

e um acúmulo de produção impressa e acadêmica desta linguagem. É nas

artes plásticas e, posteriormente, nas artes visuais que aparece a função de

curador e do crítico de arte, e a partir dessa concepção, outras manifestações

artísticas têm começado a dialogar com o papel do curador. Em nossa

pesquisa, tem sido difícil levantar material bibliográfico e incluso outras fontes

de informação sobre o universo do curador em dança. A profissão do curador é

ainda muito incipiente no campo da dança, embora seja uma das atividades e

tarefas que muitos produtores, programadores e diretores de espaços teatrais

desenvolvem com bastante freqüência.

Mesmo nas artes plásticas, a formação do profissional e distribuição de

informação sobre o ofício do curador é escassa, mas fazendo alguns

cruzamentos e nos aventurando a criar trânsito e conexões, temos conseguido

traçar uma trajetória das artes em geral até a dança, especificamente, no intuito

de compreender algumas origens, nuances e reflexões sobre a tal profissão

que é nosso tema principal de pesquisa. Convido o leitor, então, a acompanhar

o trânsito das artes plásticas à dança, a fim de possibilitar a compreensão da

curadoria como uma área comum ao sistema das artes.

Dessa forma, é importante considerar mais um assunto que tem a ver

com a proximidade estabelecida desde sempre entre o curador, o crítico e o

teórico de arte. Essas três profissões, muitas vezes concentradas na mesma

pessoa e, portanto, muito contaminadas, estão presentes em todo nosso texto

dando indicadores da proximidade e da complexidade que as envolve dentro

do universo da arte e da relação entre o artista, a obra, o espectador e o

sistema cultural. Nos últimos tempos, essa profissão tem se misturado tambémcom a de produtor, gestor, programador, então é importante entender que se

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bem nós estamos focando na curadoria, esses pensamentos que serão

expostos aqui podem bem ser aplicados a outras áreas próximas e

compartilhadas por algumas.

Essa qualidade transitiva da profissão é uma particularidade dos

profissionais das artes. Quase nunca se exerce um só ofício nem uma só

função, estamos constantemente desenvolvendo vários papéis e nutrindo

nossas práticas com o pensamento e a ação. É claro, temos especialistas, e é

sobre a especificidade e a especialidade que nós estamos interessados em

aprofundar.

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PREFÁCIO

A arte possui o que se costuma chamar de fecundidade, elatem a capacidade de dar origem, de propiciar algo que nãopreviu, de instigar o outro, o futuro, além de nos fazer rever opassado. Retomar o passado, seja por ruptura ou continuidade,se abrir para o que ainda virá, talvez uma nova tradição, paraser retomada, de um modo jamais pensado, é algo próprio daarte. (ALVES, 2010, p. 53) 

As obras de dança contêm um universo próprio de conhecimentos que

são organizados de determinada forma pelo autor, segundo a sua concepção

de mundo, tendo em conta uma série complexa de informações conscientes einconscientes. Desta forma, a obra vai ser o princípio de uma transmissão das

idéias, de um circuito comunicacional, reflexões, concepções do autor, que se

efetivará no momento em que outro, neste caso o espectador, se aproxima da

obra e assim se comunica com este corpo de informações do autor que vem

midiatizado pela obra de arte e pelo jeito que ela é mostrada. Seguindo esse

raciocínio, ver um espetáculo de dança, ou uma obra de artes visuais, ou um

concerto de música, tem a potência de constituir uma experiência que gera

conhecimentos devido à relação que se estabelece entre a construção que o

espectador faz a partir da materialidade da obra (que já vem respectivamente

processada pelo autor) e suas próprias idéias de mundo. Essa relação

estabelecida tem a potência de modificar, em maior ou menor grau, os

paradigmas e concepções de mundo que estavam previamente instaurados no

espectador antes da experiência de assistir uma obra de arte. 

Se a arte e o jeito no qual ela é apresentada, pode modificar uma

pessoa, pode modificar suas concepções, pode modificar pensamentos e

percepções, quer dizer que provavelmente ela pode modificar decorrências da

cultura, pode modificar o curso do seu tempo e pode colaborar na construção

do mundo no qual vivemos. Algumas questões se mostram inevitáveis: Como a

curadoria de arte se envolve nesse processo? Como pode potencializar essa já

dada capacidade da arte? 

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CAPITULO I: APROXIMAÇÕES ENTRE CRÍTICA E CURADORIA.

Critica e curadoria: profissões irmãs

A crítica pode ser considerada um prolongamento ou umtentáculo com o qual a arte tenta agarrar-se à sociedade,qualificando-se como uma atividade não totalmente contráriaou dessemelhante daquelas a que a sociedade dá créditocomo produtoras de valores necessários, tais como a ciência, aliteratura, a política, etc. (ARGAN,1995,p. 130) 

Se partirmos para a reflexão da citação acima e colocarmos, no mesmo

patamar, a curadoria tal citação continuaria a fazer sentido. Essa premissa

permite observar o quanto curadoria e crítica estiveram e estão entrelaçadas

na prática da instituição da arte1. No percurso do texto, veremos como essa

afirmação se estabelece e também começaremos a compreender o que estas

duas profissões compartilham ou não.

Tal como introduz o crítico de arte Giulio Carlo Argan, autor do livro “Arte

e crítica de arte” (1995), pode-se pensar a crítica e curadoria de arte como

duas profissões onde se permite um estudo sistemático das obras artísticas,

onde se geram avaliações de acordo com certos critérios, condições e recortes

e no qual se estabelece um discurso determinado que fala das obras em

relação a esse próprio estudo feito anteriormente.

A curadoria avança mais um nível e tem a tarefa de selecionar algumas

peças e organizá-las (seguindo alguns critérios dos quais versaremos em

breve) num determinado espaço de mostra, que poderá ser nas artes plásticas

uma galeria, um museu, uma feira, e nas artes cênicas, um festival, uma

programação temática, uma temporada de um espaço cultural, uma mostra,

1 Entendemos como instituição da Arte todo aquele sistema composto por teóricos, críticos, professores, artistas,

curadores, publico especializado que desenvolve sua carreira profissional do lado do decorrer da Arte e que decidemde certa forma os caminho que esta terá.

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dentre outras. Essa seleção responderá ao trabalho de estudo e

estabelecimento de critérios realizados anteriormente.

Essa relação de estudo e análise da arte que reúne crítica e curadoria,

faz com que elas compartilhem um território muito semelhante entre si, pelo

qual consideramos que tanto as questões da crítica, quanto as da curadoria

são importantes para a construção do nosso raciocínio.

A crítica apóia e acompanha o trabalho da curadoria, e ambos os papéis

se misturam em prol de descobrir o que há de interessante em certas obras e

como elas podem construir um universo de sentidos que apontam a questões

que interessam ao mundo onde serão apresentadas. Estas duas profissões

aparecem juntas, com o nascimento das exposições de arte e a necessidade

destes espaços de reunir pessoas estudiosas e especialistas que soubessem

valorar o que deve integrar esse espaço de exibição2. Estes profissionais

então, dentre outras coisas que serão colocadas subseqüentemente, estão

encarregados de reconhecer as obras de arte e analisá-las.

A tarefa da crítica contemporânea consiste, pois,substancialmente, em demonstrar que o que é feito como arteé verdadeiramente arte e que, sendo arte, se associaorganicamente a outras atividades, não artísticas e até nãoestéticas, inserindo-se assim no sistema geral da cultura.(ARGAN, 1995, p.130)

Além de valorar, a crítica nos seus escritos e a curadoria com as suas

seleções e montagens estabelecem uma passagem entre a obra e o universo

da cultura do tempo onde está sendo exposta, realizada ou revisitada. Assim

também terão a tarefa de servir como mediadores entre os artistas e suas

obras, o espaço de exibição e a percepção da obra por parte do espectador,

2 Estaremos utilizando o termo espaço de exibição, exposição, mostras de arte como sinônima, nos referindo aqualquer espaço (festival, galeria, feira) onde é posto em cena uma obra de arte. Sabemos que alguns termos são mais

aplicados numas linguagens artísticas que em outras mas utilizaremos aqui os termos como iguais em função de geraressa transitoriedade que todo o texto propõe entre a linguagem da plástica e a linguagem das artes cênicas.

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tendendo a orientar o gosto e criando relações e condições favoráveis para que

a experiência estética seja frutífera e consiga os melhores resultados possíveis

da aproximação obra-espectador.

A crítica e a curadoria dentro da estrutura de mostra artística estarão

sempre de mãos dadas, já que ambas, no seu fazer estão constantemente em

consonância com o estado das teorias de arte, tendências e saberes

específicos do momento histórico, conjugando as discussões da classe artística

com os próprios pontos de vista, ajudando a que a experiência estética seja

diferenciada de algum modo.

A crítica atua associando o que é próprio de cada artista e de cada obra

com a idéia global da arte, colocando sua missão num lugar além da própria

escolha, do próprio gosto. O crítico está comprometido com essa associação

em prol de evitar a arbitrariedade das apreciações. (ARGAN, 1995, p. 135)

Essa maneira de agir da crítica que também é partilhada pela curadoria,

é um dos principais papéis que cumprem esses profissionais da arte. Eles,

compartilhando o espaço com o artista e suas obras, tentam descobrir o que

dessa obra pode ser enlaçado com a cultura do momento. Essas personagens

se perguntam o que é interessante de ser explorado e explicitado da obra de

arte, sempre desde seu ponto de vista, mas tentando construir vias diretas de

comunicação entre a arte e a cultura contemporânea.

Essa relação de afinidade que a crítica e a curadoria mantêm, foi e

continua sendo na maioria dos espaços culturais de muita força e atrelamento.

Com o decorrer do tempo, e com as modificações da arte e sua estrutura, a

instituição da crítica entendida como esse grupo de pessoas que agrega valor à

arte e assinalam o que é arte e o que não é, tem recebido muitosquestionamentos por parte dos artistas, sobretudo por acharem que na prática,

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muitas das funções que idealmente fazem parte do papel do crítico não

pertencem à realidade desse grupo de pessoas; se aponta a que nos últimos

tempos os críticos têm reduzido sua função a mera valoração embasada em

velhas e desatualizadas concepções do belo, de qualidade e de arte.

Nessas circunstâncias, o território da crítica tem passado da mão dos

críticos às mãos dos próprios artistas, recaindo “ sobre a curadoria a acusação 

do poder, deslocando, assim, o conhecido embate, que desde o surgimento da 

crítica de arte como atividade, no século XVIII, contrapõe os artistas à suposta 

independência dos críticos”. (FERREIRA, 2010, p.147)

Esse lugar de poder que agora parece recair mais sobre a curadoria,

pode ser ao mesmo tempo um poder transformador, onde o poder é utilizado

para aportar de maneira prática e concreta ao desenvolvimento de um

pensamento-conhecimento cultural em determinada região onde age, ou

(claro!) pode continuar com o caminho que a crítica tomou segundo os artistas.

De qualquer forma, a natureza da curadoria pode permitir uma transformação

tanto da atividade da própria crítica, quanto da prática artística e da relação

com os espectadores, pois ela estabelece outros nexos com as materialidades

das obras, suas apreciações, avaliações e localizações. (FERREIRA, 2010, p.

47) 

Estas primeiras reflexões sobre o fazer da critica e curadoria, serãoaprofundadas no decorrer do texto, salientando sempre que a relação de

proximidade entre estas duas áreas faz que muitas vezes essas profissões

sejam desenvolvidas pela mesma pessoa. Algumas competências são

partilhadas e muitos territórios mutuamente percorridos. Às vezes parecerá que

as duas figuras cumprem o mesmo papel frente à instituição de arte,

desenvolvendo ofícios diferentes.

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A Crítica e a curadoria na história

No século XVII, quando iniciaram os salões parisienses que eram

realizados ao ar livre e em hotéis até a aparição do Louvre, quem cuidava das

coleções privadas e quem fazia a montagem do salão era considerado como

curador. Nesse mesmo contexto, mas desenvolvendo outro ofício se deram os

primeiros passos para a aparição da crítica de arte. Esses salões de arte se

constituíam como espaços para a mostra de peças artísticas (geralmente artes

plásticas), onde os espectadores conseguiam as primeiras experiências

estéticas derivada da observação de uma quantidade considerável de obras.

Nessas salas o visitante percorria obra por obra, admirando-as e usualmentegerando opinião sobre elas.

Como ainda não se usavam os termos críticos e curadores, essa nova

prática de exibição gerava a necessidade de ter pessoas dedicadas a uma e

outra atividade. Nesse tempo o ofício do curador estava relacionado à pessoa

que cuidava do acervo e organizava as obras no salão. Em Paris, asexposições tinham a herança das mostras de curiosidades e acervos pessoais,

onde todas as coisas eram colocadas umas ao lado das outras, quase

ignorando o espaço entre elas. Para o momento o quadro era considerado uma

 janela para outro mundo, considerando-se obra só dentro do seu marco, pelo

qual pouco importava como estavam acompanhadas e em que ordem. As

obras eram dispostas em todas as paredes e no teto criando um verdadeiro

acúmulo de imagens.

Neste contexto, começa a se realizar, de maneira muito incipiente, a

reflexão estética sobre as obras, se começam a levantar questões, parâmetros

e critérios sobre a arte, inaugurando a prática crítica e posteriormente à

publicação de textos e apreciações que eram amplamente difundidas e que

constituirão posteriormente a literatura sobre arte. É claro nesse contexto que

as figuras do crítico e do curador virassem uma necessidade (mesmo que

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ainda não tivessem esses nomes) para a realização dessas mostras de arte,

estabelecendo sempre uma função de mediação na relação artista/obra/público

ao ser promotor das discussões que da experiência da sala de arte vão derivar.

Esta forma de exibição da arte fomenta a publicação e difusão de

documentos onde se partilham valorações, análises, apreciações das obras

expostas, semeando o antecedente da atual crítica de arte e fomentando a

discussão sobre o que dizer sobre uma obra.

El género adquiere una definición que nunca le abandonaría: lacrítica se propone como una consideración personal que valoralas obras y las compara, pero que también informa sobre suscontenidos. (BOZAL, 1996, p.20).3 

Quanto aos curadores, a evolução do ofício e suas necessidades se

deram sem pressa. A forma de organização (que dependia dessa figura que

hoje chamamos curador) atolada das obras dentro da sala foi mantida por

séculos, até a realização dos primeiros salões alemães e a chegada da

modernidade que revolucionaram nesse sentido da organização do espaço e

onde podemos dizer se começa a especializar o ofício curatorial.

Ampliou-se então a reflexão a respeito do modo de pendurar osquadros, de iluminá-los, de fazer o público circular da melhormaneira no espaço da exposição...De modo que, entre 1890 e1930, com a crescente valorização de cada agente em seu“ofício”, o mercado de arte já poderia ser considerado bastanteprofissionalizado. (RAMOS, 2010, p. 10)

Foram os curadores alemães quem começaram a pensar que cada obra

devia estar num contexto parecido à de sua criação inicial e para levar

cabalmente essa idéia, criaram salas especiais para colocar as obras de

acordo com tema, origem, período, luminosidade, etc. Isso demonstra um

3 O gênero adquire uma definição que nunca abandonaria: a crítica se propõe como uma consideração pessoal quevaloriza as obras e as compara, mais também informa sobre seus conteúdos . Tradução nossa.

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primeiro intuito de considerar que sala e obra pertenciam ao mesmo espaço,

evadindo a antiga crença de que a obra estava contida apenas dentro do seu

quadro. Dessa maneira, e tendo salas especiais para cada seção da

exposição, eles começaram a pendurar as obras de forma cartesiana, umas ao

lado das outras na linha visual do espectador e mantendo uma distância

considerável entre elas.

Foi também na Alemanha que apareceram chamados catálogos, que

eram guias impressos para que o espectador pudesse ter algumas referências

sobre a obra e o artista que estava visitando assim como o roteiro da

exposição, e às vezes algum artigo crítico e valorativo do que era mostrado.

Uma vez mais a conjunção entre a literatura crítica de arte e o ofício do curador

se vê atrelado na história.

Este pensamento sobre o local de exposição teve sua aproximação

maior ao sistema atual durante o principio do século XIX nos Estados Unidos,

onde alguns arquitetos e artistas europeus e americanos pensaram na criação

dos museus, galerias e teatros, praticamente como outras obras de arte. Sendo

que na pratica, às vezes podiam estabelecer-se com maior importância o

espaço de exposição que as próprias obras expostas. Uma das ultimas

inovações nesse sentido, foi a inclusão de painéis especiais para servirem

como paredes, localizados no meio das salas, permitindo um percurso mais

dinâmico pela exposição. (CINTRÃO, 2010, p. 41)

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CAPITULO II: QUEM É O CURADOR?

Para responder a pergunta quem é o curador, ou quem pode ser

curador, ou quem potencialmente viraria curador, ou o que é um curador,

temos decidido trazer vários comentários que consideramos valiosos para

pensarmos na figura do curador com certa clareza. Devemos pensar quais são

as qualidades que essa pessoa deve ter, quais ferramentas deve adquirir e

quais são as tarefas primárias da sua área.

O termo “curador” (do latim curatore) diz respeito à função de zelar pelos

interesses dos que por si não o possam fazer, então o curador, ao pé da letra,

seria aquela pessoa que cuida dos interesses dos artistas, que mantêm a

comunicação fluída entre os artistas e os consumidores (espectadores,

colecionadores, fruidores), assim também tem o papel cuidar das obras e de

dirigir e organizar as mostras destas.

Mas, o trabalho do curador no mundo contemporâneo não se restringe

unicamente a essas ações, esta figura é muito mais complexa na prática e se

verificará por que. Pode-se iniciar explicando as principais qualidades que deve

ter (bem sejam inatas ou aprendidas) um curador ou um aspirante a curador no

nosso tempo. Cabe destacar, que consideramos essas qualidades também

aplicáveis aos críticos e em geral aos teóricos de arte.

Os curadores têm algumas características particulares que compreendem:

possuir um discurso crítico bem aguçado sobre seu tempo e a arte de seu

tempo, um saber sólido sobre a história da arte, uma facilidade de análise de

obras e situações, uma ampla capacidade de negociação, e uma ampla

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necessidade de conhecimento da área que está imbricado. Segundo Cristiana

Tejo4, jovem curadora pernambucana: 

O curador tem algo a dizer. E para isso tem que ter um pontode vista diferente, um posicionamento singular, um olhoprivilegiado, saber ouvir e saber ver. (...) cultivar uma escutacuidadosa dos artistas, ter abertura para o mundo, curiosidade,sólida formação humanística interdisciplinar, flexibilidade paralidar com vários tipos de situações e grande poder denegociação. É ainda importante viajar muito, para ver ao vivoas obras que estuda, falar línguas estrangeiras e ter umabiblioteca ampla e robusta. (TEJO, 2010, p. 156)

Estas, dentre outras são características que facilitam o fazer de umcurador. Quando Tejo coloca como primeiro ponto a questão do “algo a dizer” 

aponta a uma das idéias mais fundamentais a essa monografia, que tem a ver

com pensar a curadoria como um “dizer alguma coisa”, como um manifesto que

não só se gera através de algum texto que o curador possa publicar para

acompanhar sua mostra, se não que é um discurso que aparece na

materialidade da mostra artística tanto na organização das peças expostas ou

apresentadas, quando na própria escolha feita, e em cada obra em particular.

O curador deve se perguntar o que tenho para dizer e tomar as decisões

corretas para que esse algo a dizer se concretize, ou de maneira inversa o

curador deverá ver com um “olho privilegiado” o material que possui e se

perguntar o que pode ser dito com esses materiais, essas obras, essas

condições. Tentando sempre expor seu ponto de vista, seu posicionamentopolítico, seu pensamento para o mundo, o curador é uma figura com

qualidades e ferramentas particulares que tem algo para dizer.

4 Cristiana Tejo é coordenadora-geral de Capacitação e Difusão Científico-Cultural da Fundação Joaquim Nabuco. Foi

diretora do MAMAM, no Recife (2007-2008), e curadora do Rumos Artes Visuais do Itaú Cultural (2005-2006).Curadora da sala especial Paulo Bruscky na Bienal de Havana (2009).Participou de diversos júris como PrêmioMarcantônio Vilaça CNI-SESI (2006), Salão Arte Pará (2007), Salão de Arte do MAM-BA (2007) e Salão de Goiás(2006). Escreveu artigos para as revistas Artecontexto e Flash Art.É mestre em comunicação pela UFPE. Vive e

trabalha no Recife.  

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A mostra artística feita através de uma curadoria, deve demonstrar o

discurso do curador através das relações que o curador estabeleceu entre as

obras, assim como o discurso deve estar contido na própria materialidade dos

trabalhos escolhidos; essa é a verdadeira lógica do “dizer algo” de um curador.

O curador deve explicitar que tipo de relação está querendo propiciar com essa

curadoria, manifestando seu ponto de vista, articulando as peças apresentadas

com esse ponto de vista e garantindo que essas aproximações sejam

percebidas também pelo espectador.

Quanto ao curador, seu ofício de revelar camadas de

significação das obras em sua relação com outras obras econtextos particulares permanece, a meu ver, instrumento deconhecimento. (FERREIRA, 2010, p. 148)

É interessante considerar que as relações mais fecundas se dão de

maneiras oblíquas e não óbvias ou declaradas, deixando sempre um espaço

para a reorganização e ressignificação por parte de quem observa e vivencia.

Será a habilidade do curador a que consiga estabelecer um equilíbrio entre

esses diferentes aspectos, a fim de realizar uma mostra de sucesso. É por isso,

que serão precisas outras características além de ter algo a dizer, pois essa

forma obliqua de estabelecer relações, e as formas de concretizar uma mostra

artística dependerão de muitos outros aspectos que demandam noções

especializadas.

Deve-se pensar que um curador desenvolve uma tarefa de muitanegociação, de muita análise, de muita observação e muita escuta. Essas

qualidades todas devem estar totalmente apuradas e instauradas na

personalidade profissional dos curadores, pois são elas as que vão permitir

levar adiante o papel de mediador (que também temos falado anteriormente)

entre o mercado, os artistas, o mundo contemporâneo e os espectadores que

se espera seja realizado pelos curadores.

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As mostras de arte são resultado de um trabalho extremamente coletivo,

dado que envolve uma equipe de pessoas que trabalha em conjunto, sendo

que o curador (como zelador da qualidade artística e o discurso da mostra)

funciona como diretor e articulador dessa orquestra que deve soar de uma

determinada forma em função de explicitar sua missão dentro do meio da arte.

Nas exposições e (no caso da dança) nos festivais ou mostras, o curador

também desenvolve o papel do produtor e do gestor cultural, tendo que ter uma

incrível capacidade gestão para negociar com as mais diversas instâncias

institucionais (desde patrocinadores até artistas). Estabelecendo então uma

função mediadora entre o ofício curatorial propriamente dito (montagem,

seleção, analises) e toda a articulação e produção executiva de qualquer

evento de corte cultural.

A outra qualidade que é necessário salientar é a de que um curador

deve ser um estudioso tanto da história da arte e da cultura quanto da arte

contemporânea que se faz no seu tempo e região. Deve ser um pensador da

área na que se envolve e não sucumbir à tentação de só fazer circular aquilo

que gosta; muito menos quando se trata de dinheiro público. Este

conhecimento desenvolvido com o estudo sistemático das obras e os artistas

nos que está interessado farão que a seleção seja o resultado de uma reflexão

individual ou coletiva que envolve o gosto sim, mas que leva em contas as

relações que cada obra consegue estabelecer com a vida pública, o tempo da

arte, e as próprias lógicas de cada trabalho.

O curador exerce o direito à liberdade de pensamento, mas faz uso

público da sua reflexão sendo que esta deve estar em plena relação com a

história e a vida política. Por isso uma ampla consciência do tempo onde está

vivendo e das nuances dessa situação com a arte, permitem que o gosto seja

uma guia, mas não a única determinante para as eleições e decisões a serem

tomadas pelo curador. “Ele pensa além dos cânones, do estabelecido, e está 

sempre atento às entrelinhas” . (TEJO, 2010, p. 160) 

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Com toda essa complexidade concentrada na figura do curador, não é

por casualidade que este papel tenha sido desenvolvido “em caráter temporário 

por artistas, críticos, jornalistas, professores, historiadores, galeristas ou, de 

modo mais sistemático, por profissionais especializados em curadoria” .

(ALVES, 2010, p.44)

Um curador, transita e tem características compartilhadas com todos

esses profissionais, pois é uma atividade que envolve noções conceituais,

reflexão, engajamento ideológico, atividades que podem ser associadas à

atividade crítica; envolve, sobretudo nas artes visuais, a arquitetura, montagem,

design de interiores, iluminação; envolve o setor educativo e didático assim

como a publicação e editoração, tarefas provenientes da área da educação e a

teoria da arte; e por último também envolve funções de captação de recursos,

platéia, parceiros, contabilidade, execução de orçamentos, todas tarefas da

área de produção e gestão.

Assim, compreende-se porque a curadora Cristiana Tejo aponta tantas e

tão amplas qualidades em um curador. Essa é a prática da curadoria pelo

menos em instituições culturais com orçamentos reduzidos para a contratação

de uma grande equipe de profissionais preparados para desempenhar e velar

pelo desenvolvimento desse tipo de iniciativas culturais.

Existe outra característica que o curador contemporâneo deve possuir, etem a ver com a capacidade de defender os verdadeiros fins da arte na frente

do mercado com o qual negocia. O curador deve impedir que os conteúdos das

obras tanto quanto o conteúdo da exposição sejam regidos somente pelo

mercado. “Uma de suas funções é rever continuamente a hierarquia forjada

 pelo “consenso” do circ uito e contribuir para o assentamento de valores que 

nem sempre coincidem com os do mercado ”. (ALVES, 2010, p. 45) 

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Não deve simplesmente sucumbir à lógica da instituição cultural, ele

precisa ser um pesquisador de alto nível que consiga criar um diálogo que

preserve os verdadeiros conteúdos das mostras e continue estabelecendo um

diálogo “saudável” com os consumidores. Para isso, ele precisará saber 

negociar com a mídia e com os capitais para que a qualidade seja priorizada

antes do mercado massivo ou “espetacular”: 

O aspirante [a curador] deve ficar sempre atento para não sedeixar seduzir pelos atalhos e nem ceder à pressão domercado. Deve ainda ser rigoroso na obtenção deconhecimento e aberto para o novo, para o que se transforma.Deve equilibrar as leituras com a experiência direta com a arte.

Deve ser honesto com as questões que o move e fiel aosartistas que o inspira. Deve ser experimental sem resvalar empirotecnias que ferem a integridade das proposições artísticas.(TEJO, 2010, p. 163)

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CAPITULO III: A FUNÇÃO DA CURADORIA

Três práticas intelectuais: a informação contrastável,

a solidariedade apoiada na compressão dos conflitos interculturais

e a dúvida.

Canclini, 2008

A curadoria trabalha em diferentes aspectos duma mostra artística.

Dependendo dos objetivos e condições da mostra, o curador percorre variasinstâncias e períodos de trabalho, geralmente um primeira instancia tem a ver

com o estabelecimento desses objetivos e essas condições da mostra, a

escolha dos artistas (que acontece de formas muito diversas), o estudo e

ordenação do material, a negociação com todos os envolvidos, e poder-se-ia

dizer que tudo esse trabalho tem um eixo transversal que tem a ver com a

constante implantação das relações entre a cultura, obra, tempo, ponto de

vista, aposta política, do qual viemos versando nos anteriores capítulos.Tentaremos observar alguns aspectos de alguns desses ambientes onde o

curador age, tratando não de pensar sobre as metodologias se não sobre as

funções do curador em esses campos.

Sua função frente ao espectador não especializado.

(...) Uma visita a uma exposição é sempre um percursocorporal e não somente visual (...) o visitante, se deslocando noespaço, experimenta uma forte experiência. Ele participaativamente de um processo de produção de sentido. E oespaço em si mesmo torna-se, então, produtor de efeitos desentido. (REBOLLO, 2008, P. 52)

Se a gente vive no/com o corpo, quer dizer que toda experiência na vida

passa inevitavelmente pelo corpo e acomoda-se nele com arranjos dinâmicos.

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Assistir uma mostra de arte é uma experiência de vida, em conseqüência

também passa no/com/pelo corpo. A vida é um percurso corporal, assim

também as experiências dentro dela, e então também a vivencia de se

presenciar uma obra de arte.

Às vezes, ainda persiste a velha idéia do receptor e transmissor de

informação como funções que mudam de ativo a passivo e que só podem se

exercer uma das duas funções cada vez: ou somos transmissores ou somos

receptores. Este tipo de pensamento há alguns anos está em discussão e esta

sendo desacreditado, devido a diferentes novas descobertas na área de

cognição, comunicação,  neurociência e estudos da percepção, onde se tem

determinado que não seja possível poder exercer só uma função cada vez. Nós

somos constante e simultaneamente receptores e transmissores; a experiência

é uma construção, um diálogo, entre nós e o outro (textos, contextos e

subtextos).

Pensando nisto, podemos pensar que quando visitamos uma exposição,

uma mostra, um espetáculo, estamos vivenciando universos de informação que

atravessam o corpo, fazendo de esta visita uma viagem no tempo e no espaço

onde constantemente estamos construindo sentidos racionais e irracionais.

Transitar este espaço-tempo nos faz ter uma experiência profunda que

influi na percepção de maneira contundente e dialoga com nossas antigasconcepções de mundo, paradigmas, idéias, conhecimentos, (processo que se

dá com todos os tipos de experiências que temos na vida), promovendo em

nós, novas construções, novos tecidos de informação que proporcionam novas

lógicas de pensamento e ação para nossas vidas. Portanto, o curador deve

considerar isso na hora de convocar o público não especializado.

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Partindo da idéia antes exposta, o curador deve pensar como tornar

essa experiência estética o mais contundente possível para o espectador. É o

curador quem constrói o espaço/tempo da mostra artística de um jeito

diferenciado e fica tendo uma responsabilidade ética e estética (vários outros

campos inclusos) na mediação entre as obras e o receptor.

O curador tem uma função social de aproximar públicos não

especializados da arte, para isso há de criar estratégias diversas em prol de

dissipar os preconceitos e estereótipos dos quais a arte vem sendo

acompanhada. Um deles é a idéia do receptor passivo ou da arte que só age

no universo da racionalidade (ou pelo contrário só no território da emoção). Ele

evita uma postura arrogante agindo como mediador entre as obras e o público

não especializado ao qual se deve, suscitando diversas experiências que

apontam ao entendimento do campo de conhecimento proposto pela mostra.

Dessa forma, quando pensamos a função do curador frente ao

espectador, começamos a pensar em seu valor como educador, como

facilitador, como promotor de certo ponto de vista, e mediador do conhecimento

(entendido de forma integral) contido nas obras de arte e os espectadores.

Assim, a mostra artística na “sua dimensão eminentemente pública requer que

na relação com o espectador a informação vise à educação, porém como 

repasse de conhecimentos, sem desprezar jamais o encontro como experiência 

estética” . (FERREIRA, 2010, p. 139)

Então, o trabalho do curador será o de facilitar o entendimento ao

espectador presente nas escolhas que as mostras artísticas, festivais, salões e

feiras, apresentando-se como espaços para aproximações da arte e seus

instáveis paradigmas, permitindo um espaço para a interpretação da arte no

seu tempo, com as suas preocupações atuais, estando sempre em ligação com

as problemáticas culturais (no amplo espectro) do homem contemporâneo.

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A arte apresentada, não está fora do campo de percepção do

espectador não especializado, mas sim precisa (no mais complexo dos casos)

de uma mediação planejada e contínua que crie uma aproximação entre as

poéticas da arte e as bases de conhecimento (no amplo sentido da palavra

conhecimento) que cada espectador traz para a experiência estética; fazer

essa vinculação é o trabalho da curadoria.

O curador sabe que a exposição, por via da interpretação dovisitante, favorecerá a reapropriação das obras de arte,enquanto objetos culturais, (...), o visitante poderá construiruma vivência a partir de cada obra e da exposição como umtodo, criando um lugar próprio para ele na história e na cultura

(REBOLLO, 2008, p.46).

Ao pensarmos assim, o espaço de mostra constitui um local/tempo para

a transmissão e articulação dum corpo de informações que ativa sempre

discussões em diferentes níveis de profundidade, que transitam o campo

cultural próprio do espectador frente aos campos da história, crítica e estética

da arte, campos da política, ideologia, epistemologia, etc. “A exposição de arte 

se projeta para o público como um “teatro”, oferecendo a oportunidade de

vivências e experimentações”   (REBOLLO, 2008, p. 47) dos mais diversos

campos de conhecimentos e das mais diversas percepções e sensações que

se derivam da experiência estética e que levam à reflexão do espectador frente

às sugestões que as mostras artísticas propõem.

O curador nessa relação de mediador deve evidenciar quanto há, nessamostra, do seu próprio pensamento, fazendo que esta comunicação curador-

espectador seja também um diálogo bem atrelado e bem sucedido, levando em

conta que a realização de um festival ou exibição, se configura também como

uma criação do curador, onde ele conjuga as conclusões de suas análises, a

natureza e materialidade própria das obras escolhidas, e seus próprios aportes

éticos, estéticos, ideológicos e compositivos.

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A função do curador na organização da mostra

A principal missão do curador, a meu ver, é criar métodos eformas de apresentar um determinado grupo de obras (ouobjetos, documentos, etc), de maneira de facilitar acompreensão do espectador, buscando acessar todo equalquer tipo de público. (Cintrão, 2010, p. 41)

Se pensarmos que a principal tarefa de um curador é a de coordenar a

organização da mostra artística (tanto em nível conceitual quanto operativo), a

forma como essa mostra se apresenta, a sua programação, a escolha e ordem

de apresentação das obras, é o diferencial para este espaço potencializaroutros assuntos ou não. É nessa montagem da grade programática (artes

cênicas e musicais), ou na montagem da sala ou museu (plásticas e visuais)

que o curador consegue expressar seu ponto de vista. Cada escolha reflete os

objetivos, as condições e as ideologias da curadoria. No melhor dos casos, a

organização do espaço-tempo5 faz que o espectador perceba a clareza da

informação que está em jogo, tanto das obras como unidades de sentido,

quanto da exposição como unidade de conteúdos e sentidos culturais.

Seja estabelecendo relações formais ou conceituas entre aspeças expostas, seja localizando-as de forma estratégica noespaço, a disposição das obras pode resultar numa exposiçãoeficaz, onde os diálogos propostos facilitam a compreensãodos objetos expostos, ou num labirinto de idéias onde ovisitante se sente perdido (CINTRÃO, 2010, p. 15)

Esse trabalho de elaborar a programação de uma mostra de arte

demanda muita sabedoria por parte dos curadores, como já dissemos antes; a

curadoria implica um forte empenho no estudo da arte e da cultura e um

aguçado sentido na contemporaneidade. Esse estudo gerará a necessidade de

pensar detidamente nas relações (qualidade, tipo de relação) que se

estabelecem entre uma obra e outra, a ordem em que elas serão assistidas e

5 Espaço no caso das artes plásticas, visuais ou exposições onde o percurso do espectador contempla deslocamentono espaço como condição principal; tempo ou programação no caso das artes temporais como a música ou as artescênicas.

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que outro tipo de atividades ou objetos podem acompanhar essa programação,

para evitar interferências desnecessárias ou inclusive contradições não

premeditadas entre as obras e seus espectadores. 

Por outro lado, é importante que o curador seja muito cuidadoso com a

negociação entre os patrocínios e os desejos pessoais, pois a boa

programação não se estabelece só pela variedade e quantidade de obras

expostas, se não pela qualidade do espaço onde elas estão programadas,

dando sempre chance às obras de se apresentarem de maneira contundente (e

também dilatada, se for preciso) e possam, em conjunto com o pensamento

curatorial, construir conhecimento. (BRAGA, 2010, p. 65)

Na promoção de questionamentos e discursos

É da arte que a instituição cultural irá recolher sua inteligênciae os sentidos de sua atuação. (ALVES, 2010, p. 46)

A curadoria deve ampliar o campo de visão. Partindo das obras e sua

materialidade deve sempre gerar inquietações, leituras e sentidos, que podem

ser produzidos perfeitamente pelas obras por separado, pois elas não são

simplesmente parte de um todo, mas que pela junção e colocação de umas

peças com outras, essa relação engrandece a possibilidade de diálogo entre as

obras, os artistas e os espectadores, num espaço propiciado pelo ponto de

vista do curador.

Nesse contexto, é importante salientar que o curador cumprindo também

o papel do crítico, sem deixar de colocar seu ponto de vista, precisa manter o

trabalho em sua condição primordial de ser também abertura para o mundo.

(ALVES, 2010, p.47). Deve poder reconhecer no trabalho o que realmente

propõe e a partir disso compor e expor seu ponto de visão, deixando o trabalho

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se expressar (encontrar outro verbo) e tecendo com ele um novo discurso

ampliado na mostra como um todo.

Essa seleção e organização feita para a mostra artística têm a potência

de mobilizar o senso, e de dotar de sentido os espaços e as obras, o papel da

curadoria é a de potencializar essa experiência estética para que ocupe os

mais diversos campos da percepção e do conhecimento. Ela estabelece uma

“sintaxe”6, onde a escolha e a programação determinam relações de

concordância ou discordância que potenciam a vivência estética. A curadoria

pode provocar sentidos gerais que surgem dessas relações que suscita entre

as obras.

Assim também, a prática curatorial tem uma natureza de laboratório

onde, além de misturar e experimentar combinações e mediações da atividade

artística no sentido individual e também no sentido coletivo, criam-se bases

para questionamentos das tendências artísticas contemporâneas, trajetórias de

artistas, documentação e teorias da arte. A mostra artística e sua curadoria

tornam-se um espaço para repensar o que se fez, o que está sendo feito e o

que se fará dentro da arte contemporânea.

Guardando caráter autoral exige, ao lado de enfoques teóricose pesquisas específicas, imaginação e criação, e, assim, amarca da subjetividade, como bases de seu caráter ensaístico,

em que se explicitam conceitos articulando a construção desentidos e discursos. Trata-se, assim, de um trabalhoexperimental. Uma experiência fundada em uma reflexãoteórica cuja hipótese se concretiza na realidade, enquantointeração com a arte, mediação entre a obra, espaço expositivoe público. (FERREIRA, 2010, p. 139)

6

No dicionário Houaiss aparece: (1) componente do sistema linguístico que determina as relações formais queinterligam os constituintes da sentença, atribuindo-lhe uma estrutura; (2) parte da gramática que estuda as palavrasenquanto elementos de uma frase, as suas relações de concordância, de subordinação e de ordem.

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A realização da mostra artística se configura (como apontamos antes)

como uma “outra” criação do curador, onde ele conjuga conclusões de suas

análises, os quais estarão em relação com o objetivo da mostra e algumas

outras coisas ressaltantes, a natureza e materialidade própria das obras

escolhidas, seus próprios aportes criativos, éticos, estéticos, ideológicos e

compositivos, configurando um espaço para a defesa de ideias e apostas

políticas curatoriais que versam sobre as obras, sobre o status da arte, sobre a

contemporaneidade.

Dessa maneira, a mostra artística constitui um espaço/tempo para a

transmissão e articulação dum corpo de informações que ativa sempre

discussões em diferentes níveis de profundidade, que transitam tanto o campo

cultural próprio do espectador versus curador quanto os campos da história,

crítica e estética da arte.

Na idéia de produzir discursos, a curadoria estabelece um objetivo, um

tema, uma questão para ordenar sua informação. “Na verdade, há pouco ou 

nenhum sentido na curadoria e na crítica que não possui embasamento 

histórico e teórico. Apesar disso, a experiência direta com o trabalho de arte 

 jamais pode ser desprezada ou eclipsada pela teoria” . (ALVES, 2010, p. 44) 

Por isso, o processo de escolher o embasamento teórico, pode ser

anterior ou posterior ao estudo das obras, pois essa questão pode vir dopróprio conjunto de obras ou pode vir antecipadamente para a abertura de uma

convocatória ou pesquisa das obras, tentando um equilíbrio entre a

materialidade e os objetivos das próprias obras, e o objetivo conceitual da

exposição. Esse objetivo geralmente será mediado também por outro tipo de

condições econômicas, políticas, estruturais que dão marco às escolhas. De

qualquer forma, é importante pensar que a curadoria estabelece um objetivo e

algumas condições específicas para cada mostra, criando com isso um pré-

discurso e uma finalidade daquele espaço expositivo. (REBOLLO, 2008, p. 49)

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Agora, falando de condições, esta forma de criar discursos e

questionamentos tem tanto a ver com o sistema geral da arte como com a idéia

local da produção e da vida em determinado país, cidade, bairro, etc. Não é o

mesmo questionamento que pode ser produzido na América Latina e na Índia,

nem o mesmo em Belém do Pará e na cidade de La Paz (Bolívia). Por

exemplo, Cristiana Tejo aponta que:

Em São Paulo, ser curador de arte contemporânea é alimentarum sistema minimamente estruturado que anda com certadesenvoltura à parte das pressões políticas e ainda buscandoequilíbrio com a esfera econômica. No Nordeste, significaromper com estruturas arraigadas de clientelismo, paternalismo

e coronelismo político, combater o arrefecimento da posturacrítica de ponta, reverter o resultado da depauperação doscentros de pesquisa, ressignificar a relação com o passado e atradição, fornecer novas linhas de força da história da arte localsem ser localista e contribuir para o suporte da criação artísticaexperimental e o adensamento crítico local. (TEJO, 2010, p.162)

Seguindo essa idéia das diferenças contextuais, o curador para poder se

posicionar frente a isso, deve ser um estudioso da sua instituição artística e dasua sociedade, estar sempre antenado às questões sócio-políticas e sempre

colocar um posicionamento com essas referências, pois mesmo que a arte

possua algo de universal, alguns de seus questionamentos perpassam por

assuntos locais que só poderão ser bem entendidos nesse meio.

O curador assim como o artista, não está acima da realidade política: a 

sua liberdade não é de modo nenhum imunidade, antes se realiza 

precisamente na força e na clareza das suas intervenções. (ARGAN, 1995, p.

45). O curador deve pensar muito bem a quem está dirigindo o seu discurso,

como aporta esse discurso a determinada realidade, e em que âmbito está

atuando pois, por exemplo, um festival internacional reflete sobre a

complexidade das relações culturais, revelando o potencial da pluralidade, e as

relações multiaxiais, explorando uma nova idéia de cultura globalizada; masuma mostra local num bairro em situação de risco pode possibilitar discussões

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sobre a violência, a responsabilidade social, as diferenças de oportunidades,

promovendo sempre o diálogo entre uns artistas e outros e entre alguns

públicos e outros.

É fundamental pensar o espaço da mostra de arte como um possível

espaço de confronto, diálogo, confluência e reflexão sobre onde estamos e

para onde queremos ir. Nesse sentido, espera-se que o curador saiba

relacionar as lógicas das obras de artes com a história da arte e o contexto da

sua realização com outros trabalhos de arte que constituam um campo de

conhecimento que esteja dentro da discussão atual. 

Esta na moda (não por superficialidade, senão por necessidade) fazer

arte-política, tendo um forte posicionamento sobre as questões de nosso

tempo, assim mesmo a curadoria e a crítica devem exercer um fim político que

ajude a construir campos de conhecimento, responsabilidades sociais,

reflexões sobre as atuais estruturas e apoio aos movimentos que tentam

vislumbrar novas formas de pensamento, organização e vida. O curador

escolhe, tendo em conta qual será sua contribuição, e aposta para a arte do

seu tempo:

Deste modo, o crítico aproxima-se e, freqüentemente, associa-se aos artistas, faz parte dos seus grupos, participa da sua“política”, colabora na definição de programas e na elaboraçãodos manifestos, inicia e conduz polêmica; e, enquanto ajuda os

artistas a esclarecer e enunciar as suas poéticas, incita a levarsua pesquisa até o máximo nível intelectual. (ARGAN, 1995, p.138)

Não teremos espaço nessa monografia, para aprofundar esse aspecto,

mas é indispensável salientar a grande responsabilidade política que um

curador tem com referência à arte e à sociedade de seu tempo. A posição

ideológica do curador se transfere a todas suas escolhas, a todas suas

organizações, a todas suas ações. O curador tem o papel de estudar e depois

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decidir o que será mostrado em determinado espaço; ele dirige a orquestra dos

pensamentos que as obras comunicam.

Conhecer bem o meio onde se apresentará a exposição, ter uma

posição sobre o que é necessário de ser apresentado e estabelecer o que

queremos promover nesse meio, são elementos fundamentais para gerar uma

mostra artística que mobilize o senso comum dos espectadores para uma

determinada direção. É importante pensar no que faz falta em nosso espaço e

pensar como a curadoria de arte pode apontar para essas reflexões.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o decorrer da monografia temos vislumbrado alguns pontos e

concepções gerais sobre o fazer do curador. Tais idéias são um ponto departida para pensar e para refletir sobre a curadoria e os aspectos que ela

envolve. Realmente são apenas aproximações que poderão nutrir e oferecer

novos frutos a novos questionamentos, estudos de campo, reflexões sobre

nossas próprias praticas, etc.

Por ser um campo de conhecimento tão praticado, mas ao mesmotempo tão pouco sistematizado, foi impossível no curto espaço dessa

monografia, aprofundar algumas reflexões e questionamentos que surgiram e

promoveram a realização dessa pesquisa. Fez-se absolutamente necessário,

estabelecer um marco teórico que pudesse explicar do que queríamos falar e o

que abordar, quando convocamos a palavra curador de arte ou curadoria em

arte.

À medida que a pesquisa bibliográfica ia avançando, algumas idéias

tornavam-se mais claras e, ao mesmo tempo, se complexificavam.

Entendimentos deste campo de estudo demandam um estudo minucioso sobre

o saber curatorial (pelo menos a arte que se faz dentro de instituição de arte e

que depende dos espaços de exibição organizados pelo curadores). Tal

complexidade aponta para a dificuldade em tornar-se um curador e poder

exercer este papel, levando em consideração todas essas questões que foram

colocadas como premissas dentro da monografia.

No momento que começamos a pensar que a curadoria faz parte do

processo de criação de conhecimento dentro do sistema artístico e com isso

pode contribuir com a construção e desenvolvimento da cultura, começamos a

pensar na importância de chamar a atenção a essa profissão, pois não adianta

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apenas apresentar boas estruturas de exposição, bons recursos econômicos

para investimento cultural (este muito longe da realidade latino-americana, em

muitos casos), bons discursos artísticos e materialidades nas obras, se não

temos um sistema de distribuição, difusão e mediação destes e dos campos da

“recepção”, percepção, consumo.

É fundamental levar em consideração que a curadoria, como parte do

sistema, é indispensável para garantir uma boa comunicação entre as

diferentes esferas que transitam pela Cultura e pela Arte. O papel do curador é

central, nodal, vital, pois garante a qualidade e profundidade das trocas entre

as obras que se mostram e seus consumidores, cuidando dos interesses dos

artistas e negociando com os interesses do mercado.

O curador (idealmente) organiza, reúne e salienta as preocupações

artísticas do seu tempo e com essa atitude se mantém dentro do âmbito da

contemporaneidade; é um estudioso que “ cutuca ”  as questões dos artistas e

coloca as questões que são importantes de ser pensadas à luz. Ele olha o

escuro e leva à luz o que tem ficado na escuridão. 7 

Mas, este curador do qual temos versado durante toda a monografia

existe de fato? As dificuldades curatoriais em nossos países são infinitas,

inclusive porque é extremamente difícil ter um sistema artístico bem

estruturado que permita aprofundar os estudos de cada campo e que permitaum nível de diálogo relevante entre os diferentes atores para conseguir os

melhores resultados. Não deve ser por casualidade que, durante quase dois

séculos, a prática da curadoria se manteve sem muitas mudanças e sem

muitas inovações. A curadoria parece estar no último estágio de importância

dentro da cadeia produtiva, pois é um trabalho conceitual, ideológico e

operativo complexo que exige, de um bom profissional, todo seu tempo. Na

dança é comum ver esse trabalho feito pelos produtores e promotores dos7 Usando o pensamento do Giorgio Agamben.

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espaços, que, sem ferramentas específicas, para exercer a curadoria, estão

presos às diretrizes do mercado, da moda e da produção.

Quantos profissionais dedicados à curadoria possuem todas essas

características necessárias para o bom desenvolvimento da prática curatorial?

Um curador necessita ter um discurso crítico de seu tempo, conhecimento de

História da Arte, capacidade analítica apurada, reconhecer tendências e

linguagens artísticas que estuda; deve possuir ainda, habilidade para a

negociação com os artistas, público e patrocínios; deve ter algo a dizer, um

objetivo, uma missão para aquilo a que se propõe; saber ouvir e ver; ter uma

formação interdisciplinar; uma biblioteca generosa; manejar várias línguas;

poder exercer os papéis de gestor, produtor, educador, criador; não embasar

suas escolhas no mero gosto pessoal, entre outras características que

conseguimos levantar com a bibliografia utilizada neste trabalho e com a

experiência. Não são poucas as qualidades. Como podem os curadores se

aproximar deste ideal, será que dedicando sua especialidade a este campo de

conhecimento? Como fazer curadoria dessa forma, sem orçamentos

adequados? Como atrair, nos nossos países (com tantos problemas de acesso

à cultura), os públicos não especializados?

Estes e outros questionamentos aparecem quando lemos essa

monografia e refletimos sobre o assunto. Podemos aqui, encontrar os marcos

conceituais, alguns ideais e caminhos, que nos ajudam a estabelecer um

prisma de visão crítica acerca do tema.

Neste final de texto, apontamos o que seria uma futura  discussão: a

impossibilidade de se fazer curadoria sem um posicionamento político frente ao

nosso meio local. Qualquer ação na curadoria compreende um agir político. A

escolha e a organização conformam um discurso. É o curador que deve

estabelecer os objetivos, a missão e inclusive o meio social aonde vai se inserirdeterminada mostra (quer dizer, ele escolhe o público alvo), a fim de poder ser

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claro no seu posicionamento e sua contribuição por pequena que pareça ao

campo da cultura e das artes.

Enfim, concluímos convocando uma frase da curadora Cristiana Tejo

que diz respeito à dificuldade, mas também à possibilidade desse campo ainda

tão inóspito:

Como fazer tudo isso, depende de cada um. Agora o que talvezsirva para todos pode ser resumido numa corruptela do ditobíblico: tempo de plantar, tempo de colher. Tempo, tempo,tempo. (TEJO, 2010, p. 163)

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REFERÊNCIAS

Bibliografia

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ALVES, Cauê. A curadoria como historicidade viva. In: RAMOS, Alexandre(org.) Sobre o ofício do curador. Porto Alegre, Zouk Editora, 2010, p. 43-58.

ARGAN, Giulio Carlo. Arte e crítica de arte. Lisboa. Editorial Estampa, 1995.

BANES, Sally. Writing Dancing: in the age of postmodernism. Hanover. 

University Press of New England, 1994.BRANT, Leonardo. Mercado cultural. São Paulo, Editorial Escrituras, 2001 

CANCLINI, Néstor. Latino-americanos à procura de um lugar neste século.São Paulo. Editorial Iluminuras, 2008.

CINTRÃO, Rejane. As montagens de exposições de arte: dos Salões de Parisao MOMA. In: RAMOS, Alexandre (org.) Sobre o ofício do curador. PortoAlegre, Zouk Editora, 2010, p. 15-41.

FERREIRA, Glória. Escolhas e experiências. In: RAMOS, Alexandre (org.)Sobre o ofício do curador. Porto Alegre, Zouk Editora, 2010, p. 137-147.

REBOLLO GONÇALVES, Lisbeth. Exposição e crítica - Um enfoque emduas direções. Dentro de Arte, Critica e Mundialização. São Paulo.Imprensaoficial/ABCA, 2008.

TEJO, Cristiana. Não se nasce curador, torna-se curador. In: RAMOS,Alexandre (org.) Sobre o ofício do curador. Porto Alegre, Zouk Editora, 2010,p. 149-163.

Artigo em meio eletrônico

MORAYS, Liria. Sem Título. Jornadas de discussão e reflexão sobre

curadoria- PID. Salvador-BA, 2010. Disponível em:

http://www.pidbahia.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=86

%3Ajornada-de-discussao-e-reflexao-sobre-curadoria-pid&lang=pt  . Acessoem: 28 out 2010.

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Links eletrônicos

http://www.mundoanuncio.com/anuncio/especializacao_em_arte_critica_e_cura

doria_sao_paulo_capital_sao_paulo_1176011975.html 

http://www.gridccsp.org/blog/2009/12/18/entrevista-com-alexandra-itacarambi-

curadora-de-danca-do-ccsp/  

http://www.pidbahia.com.br/index.php?option=com_content&view=category&lay

out=blog&id=46&Itemid=64&lang=pt 

http://idanca.net/lang/pt-br/2010/08/02/panorama-sesi-tem-curadoria-compartilhada/15864