Antonio Castelnou
A ARQUITETURA VERNÁCULA é fruto do
saber popular, que é transmitido por tradição
e de forma empírica.
Ela segue o caminho árduo de tentativas e
erros; de mudanças lentas em um processo auto-
adaptativo que garante a relação forma-contexto.
J. Richard Jackson Balloon Frame House
(1664, Portsmouth NH)
Habitação quilombola (Brasil)
Por sua vez, a ARQUITETURA OFICIAL muitas vezes ignora o contexto (clima, materiais, energia, etc.) e a
própria sociedade. Ela é fruto da divisão social do trabalho e de escolas com doutrinas explícitas, nascendo
de mudanças mais bruscas e individualistas, o que compromete a coerência forma-contexto.
Igreja (Chiloé, Chile)
Casa Bandeirista (São Paulo, Brasil)
Cracker House (Flórida, EUA)
Na fase em que está mais madura e não-
esgotada, a ARQUITETURA
VERNÁCULA fornece formas ideais, que estão ajustadas ao contexto,
clima, energia e condições ecológicas, as
quais podem ser reaproveitadas pelos
arquitetos.
Balcões em muxarabis
Talha em madeira
Ranch
O VERNÁCULO tem basicamente origem
local (arquitetura primitiva e regional), mas
pode vir a sofrer influências externas, as quais são absorvidas e
modificadas, resultando em recriações
(arquitetura colonial, espontânea e popular).
Casas paisanas (Colômbia)
É aquela que surge a partir do primeiro contato entre
povos primitivos e colonizadores, principalmente nos
locais que tiveram seu desenvolvimento atrasado
devido à momentânea falta de atrativos econômicos.
Podendo ou não serem realizadas pelos seus
próprios moradores, essas OBRAS ANÔNIMAS são
construídas com o material disponível no local, porém
copiando modelos alheios à sua cultura
(adaptações/ transformações), que muitas vezes
podem produzir novas soluções técnicas ou estéticas.
Na Era das Navegações, PORTUGAL e ESPANHA
antecederam as demais nações na exploração
colonial. Em 1494, o Papa Alexandre VI (1431-1503)
estabeleceu uma linha demarcatória entre as zonas reservadas à colonização de ambos países: o meridiano a 270 léguas além das ilhas de
Açores (Tratado de
Tordesilhas).
Enquanto os PORTUGUESES encontraram territórios pobres e inóspitos – ou populosos, como aqueles da Ásia – os
ESPANHÓIS colonizaram zonas mais adequadas, como os planaltos da América Central e Meridional, com impérios indígenas mais ricos e desenvolvidos, porém incapazes de
resistir à colonização européia.
Colonização Espanhola
Colonização Portuguesa
Tratado de Tordesilhas (1494)
Com base nas Leys Gernerales de las Indias, os colonizadores espanhóis ocuparam grandes
cidades ameríndias, descaracterizando-as
completamente.
Em outros casos, criaram conjuntos urbanos esparsos
no interior do continente americano, obrigando a população nativa a se estabelecer em novas
CIDADES COLONIAIS.
Vista geral de Tenochtitlán (Ciudad de México)
Plano Geral de Buenos Aires (Argentina)
Plaza Mayor
As fontes culturais do MUNDO LATINO-AMERICANO nunca
chegaram a se fundir definitivamente em uma
unidade completa e estável.
Na verdade, mesclaram-se em grau e forma variáveis, nas suas
diversas regiões, segundo o tempo e a situação geográfica
(folclore, religião, etc.).
ARQUITETURA COLONIAL ESPANHOLA
Barandas
Pátios internos
Muxarabis
CASA PAISANA: Habitação feita em bambu guadua, típica da região montanhosa central da Colômbia,
que é resultado da mescla de técnicas espanholas, indígenas e negras.
Esquemas do Arq. Oscar Hidalgo-Lopez
TEJUPAPE: Abrigo do período colonial brasileiro resultante do contato entre indígenas e colonizadores,
constituído de estruturas em taipa ou madeira, cobertas por
palha, com ou sem paredes.
Mapa do Brasil (Giácomo Gastaldi, 1550)
CALUJES: Choupanas ou palhoças, cobertas de palha ou bambu, que foram construídas por exploradores em regiões na
África, Oceania e Sudeste Asiático, para uso temporário.
IGREJAS DE MADEIRA DA ILHA DE CHILOÉ (CHILE): Construções anônimas feitas
por jesuítas com ajuda de nativos até o séc. XVIII, que chegaram a ser em número de 300,
restando hoje apenas alguns exemplares.
CASAS COLONIAIS DO LITORAL BRASILEIRO: Sobrados em pedra e cal
que copiavam a paisagem medievo-renascentista
portuguesa, com cobertura cerâmica, do séc. XVI
quintal
alcovas
sala loja tacaniça
Luz solar chuva
rua
Corte esquemático de um sobrado
Olinda PE
PAV. TÉRREO 1 Loja / Escravos 2 Corredor 3 Tacaniça / Cozinha PAV. SUPERIOR 4 Salão Nobre 5 Alcovas 6 Sala ou Varanda 7 Salas de Serviços 8 Depósito
SUPERIOR TÉRREO
Salvador BA
CASAS BANDEIRISTAS: Habitações em taipa com amplo telhado de barro e anti-alpendre, típicas do interior
de São Paulo entre os séculos XVII e XVIII.
Principais Bandeiras dos Séculos XVII e XVIII
Casa Bandeirista
Livros: - Morada Paulista (Luis Saia) - Cozinhas Etc. (Carlos Lemos) - Quadro da Arq, no Brasil (N. G. Reis Fo.)
1 2 3
4 5
5
5
5 5
Casa do Sítio do
Padre Inácio (Cotia SP)
CASA BANDEIRISTA
1 Anti-Alpendre
2 Quarto de Hóspedes
3 Capela
4 Sala Central
5 Aposentos
MISSÕES ou REDUÇÕES: Conjunto formado por casas,
colégio e igreja geralmente feitos em taipa ou pedra, típico da arquitetura jesuítica ibero-
americana realizada no centro-sul da América Latina, em
especial no Paraguai, PR e RS.
Ruínas de Santo Ângelo RS (Sete Povos das Missões)
PRINCIPAIS REDUÇÕES
No século XVII, os primeiros colonos norte-americanos
esforçaram-se em reproduzir sistemas convencionais
(pedra e tijolos), sendo a
CARPINTARIA aquele que se tornou o mais viável.
Baseada no repertório clássico inglês, esta
arquitetura de madeira foi adaptada às condições
climáticas do local, marcadas por invernos rigorosos e
verões quentes, o que produziu novas versões.
I-HOUSE: Casa colonial típica de Iowa, Illinois e Indiana – embora
apareça em outros Estados –, possuindo sempre dois andares,
cobertura em duas águas e planta retangular, com entrada na face maior, saliente ou não,
feita em madeira, tijolo ou pedra.
Séc. XVII
Séc. XVIII
SALTBOX HOUSE: Casa colonial derivada da I-House por possuir um anexo em madeira para depósito de sal, que se
desenvolveu na Nova Inglaterra, no nordeste dos EUA. Caracteriza-se pelo prolongamento do telhado em duas águas.
Séc. XVII
SHAKER HOUSE: Casa comunitária também da Nova
Inglaterra a partir do séc. XVIII, criada pelos puritanos
shakers, que atingiram seu ápice em 1840 com cerca de
6.000 membros.
Com base em pedra, era feita de madeira ou tijolos, possuindo entradas, corredores e quartos
independentes para os dois sexos, que compartilhavam apenas a sala de comer, mas
em mesas distintas.
CRACKER HOUSE: Casa colonial típica da Flórida e
Geórgia, de planta quadrada, feita toda em madeira (cedro e ciprestre), elevada do solo por pedras ou tijolos, e com grande varanda para amenizar o calor.
ARQUITETURA COLONIAL DO OESTE AMERICANO:
Surgiu principalmente a partir da ocupação dos territórios do oeste (Law Ordinance, 1786),
por meio de uma retícula orientada segundo meridianos e paralelos como norma universal para a colonização no séc. XIX.
Far West Wood Architecture
Salt Lake City, Utah (1875)
Oklahoma City OK (1889)
Portland OR (1879)
Salt Lake City UT (1875)
Denomina-se BALLOON FRAME a técnica norte-
americana em carpintaria, baseada em um tramado de madeira, que é coberto por
tábuas horizontais e internamente com
revestimentos leves, deixando-se uma câmara de ar isolante e pequenas
aberturas. Foi bastante típica nas construções
coloniais dos EUA.
Parson Capen House (1683, Topsfield MA)
Arquitetura Colonial Holandesa
Willemstad (Curaçao)
Chattel House Georgetown (Barbados)
Maison Créole Fort-de-France (Martinica)
Arquitetura Colonial Britânica
Kingston (Jamaica)
É aquela que nasce organicamente, utilizando-se
do material fornecido pelo entorno mais próximo
(natural ou artificial) e de acordo com as técnicas
experimentadas empiricamente. Trata-se de uma forma de apropriação
do meio, apresentando diferenças quando este é
rural ou urbano. No Brasil, 11 milhões de pessoas vivem em favelas.
FAVELAS: Núcleos de habitações precárias e agregadas, geralmente improvisadas na periferia urbana.
Favela da Rocinha (Rio de Janeiro)
Favela de Paraisópolis (São Paulo SP) – Foto de Tuca Vieira (2007)
CORTIÇOS ou CABEÇAS-DE-PORCO: Habitações coletivas que surgem a partir da ocupação irregular de imóveis ou
terrenos vazios, como miolos de quadra (cortiço de quintal). Em geral, são o resultado do aluguel de cômodos ao longo de
corredores ou em torno de pátios abertos em áreas urbanas.
Cabeça-de-Porco era um cortiço carioca que surgiu em 1858 no centro da cidade e foi demolido em 1895.
Estima-se que no Brasil 300.000 vivam em cortiços
QUILOMBOS ou MOCAMBOS: Conjunto de moradias precárias situadas fora de centros urbanos,
que historicamente surgiram como refúgios de escravos nas
matas. Atualmente, abrigam também minorias brancas e indígenas em todo o país.
Recebem denominações distintas nos países latino-americanos:
Cumbes (Venezuela)
Palenques (Colômbia eCuba)
Maroons (Jamaica)
Marrons (Haiti)
Cimarrones (Outros países)
Quilombo dos Palmares PE
(1650/95)
Hoje, no Brasil há aproximadamente 150 comunidades
quilombolas tituladas, mas se
estima haver cerca de 1.500
em processo de regulamentação.
A população seria mais de 100.000.
PRINCIPAIS
ASSENTAMENTOS ou CAMPOS: Conjuntos de tendas
ou barracos realizados por grileiros, posseiros ou refugiados
para uso temporário. Em geral, são feitos de materiais leves ou
recicláveis, os quais podem acabar se tornando permanentes,
conforme a situação.
Moradia de Sem-Terra
PARÂMETRO ARQUITETURA
ERUDITA
ARQUITETURA
VERNÁCULA
ACEITAÇÃO Imposta Espontânea
VALORES Hipocrisia Autenticidade
ENERGIA Esbanjadora Conservadora
MATERIAIS Alóctones Autóctones
SISTEMA Concentração Disseminação
DESENVOLVIMENTO Inovação (invenção) Evolução (forma ideal)
IDEOLOGIA Acadêmica Empírica
PRODUÇÃO Individualista Coletiva
QUADRO COMPARATIVO
APOSTILA – Capítulo 05.
GUIMARAENS, D.; CAVALCANTI, L. Arquitetura kitsch: suburbana rural. Rio de Janeiro: Paz & Terra,1982.
MAHFUZ, E. Tradição & invenção. In: REVISTA AU. São Paulo: n. 12, ano 3, jun./jul. 1987.
MAY, J. Architettura senza architetti. Milano: RCS, 2010.
ROHDE, G. M. Arquitetura espontânea no Rio Grande do Sul. In: BERTUSSI, P. I. et al. A arquitetura no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.
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