2
Noites Insones
Tito Ferré
3
Copyright © 2013 por Tito Ferré
Todos os direitos reservados ao autor
Projeto, texto, revisão, diagramação e capa:
Tito Ferré
1ª edição / Fevereiro 2013
São Paulo/ SP
Gênero I – Poesia – Literatura Brasileira
4
Índice
Insônia 05
Nuvens 06
Miopia 07
Liquidação 08
Gentrificação 09
Desnorteados 10
Se A Gente Sabia 11
E Eu... 12
Brazuca 13
Sombrio 14
Evolução 15
Tem Dias 16
Uma Das Metas 17
Por Onde Andam As Rosas? 18
Ode Ao Descaso 19
Noite Adentro 20
Mestre Bituca 21
O Vale Encantado 22
Cibele 23
Caetanear 24
Paty 25
Redescobrimento 26
Medidas 27
Rimas Gentílicas 28
Ali 29
Transição 30
5
Insônia
2 da manhã
Ainda acordado
Penso no amanhã
Outro dia virado
3 da madrugada
Um livro tentei ler
Cabeça agitada
Não deixa entreter
A cada meia hora
Eu apago tudo
O sono demora
A posição eu mudo
Já passou das quatro
E meu olho mais aberto
Saio do meu quarto
Ainda mais desperto
Quase cinco e meia
Fumo um cigarro
O dia já clareia
Já ouço som de carro
Seis, hora de ir pra rua
Amanhece com neblina
Ainda vejo a lua
Insônia é rotina e amanhã continua...
6
Nuvens
Correção prediz tá errado
Sugestão algo a ser melhorado
A tendência da crítica é destrutiva
Conselho bem dado mente reflexiva
Ocupar não é invadir
Só falar é nunca ouvir
Não só rotina que traz depressão
Felicidade não é apenas uma ilusão
Desapego não é só material
Nem todo dia será especial
As nuvens se movem com o vento
A gente se molda com o tempo
7
Miopia
Armação vazia
Lentes sem contato
Escuros são os olhos
De relance ilusórios
À vista as lágrimas
Parcelando ilusões
A vista das páginas
Ditando emoções
Retida na retina
Imagem embaçada
Nebulosa neblina
Traz junto trovoada
Armação da retina
Lentes embaçadas
Atenção distraída
A vista das páginas
A visão combalida
O espasmo latejante
Na palavra recém lida
A verdade agoniante
Parcelando lágrimas
Nebulosas ilusões
Vazias e caídas
Ditando os trovões
8
LIQUIDAÇÃO!
O pacotão da economia
Venha logo freguesia
Semana de promoção
Aproveite o saldão
Tudo em liquidação
Pague um, leve dois
Temos tudo em ração
Para alimentar os bois
Aceitamos cartão
Descontos à vista
Pegue seu talão
Faça sua lista
É só esta semana
Não deixe acabar
Se você está sem grana
Também podemos emprestar
(Com juros embutidos no armário, não se livrará mais de nós otário!)
9
Gentrificação
O Pinheirinho
A Rua Helvetia
Tudo limpinho
Pela estética
O invasor
O usuário
A morte, a dor
O réu primário
Novo centro
Velhos problemas
Desenvolvimento
E seus dilemas
Proibição
Da resistência
Demolição
Da residência
A prefeitura
Os governantes
A ditadura
E seus flagrantes
10
Desnorteados
Qual seu norte?
O que te guia?
Se ficasse sem rumo
Qual caminho seguiria?
Se perdesse o chão
A cabeça, a razão
Se ficasse sem cais
Encontraria então a paz?
Qual sua sorte?
O que vivia?
Pra que tanto consumo?
Pra que tanta mixaria?
Se perdesse o cartão
O dinheiro, o talão
Ficasse sem nada mais
Voltaria de novo à raiz?
Qual seu forte?
Em quem confia?
Se dissesse “agora sumo”
Em qual porta bateria?
Se perdesse um irmão
Um parente, uma paixão
Se ficasse tanto faz
De mudar será capaz?
11
Se A Gente Sabia
Se a gente sabia
Tudo ia
Terminar
Pra que fechar os olhos
Ocultar sonhos
Se fechar
Se a gente sofria
Não cabia
Encarar
Se a gente sorria
Não sabia
Disfarçar
Se a gente sabia
Tudo ia
Terminar
Porque a gente um dia
Fingia
Se amar
12
E eu...
E eu fechado em minha solidão
Perdi o sorriso e a razão
Perdi a vontade de conviver
Com coisas pequenas não vou me entreter
E eu que fecho os olhos para o sol
Sempre ando olhando pra baixo
Consumindo meu formol
Não sei mais onde me encaixo
E eu que antes vivia
Agora aceito resignado
Perdi minha alegria
Optei pelo lado errado
E eu que já não vejo
Obviedades a minha frente
Não tenho mais desejo
Não quero mais ser gente
E eu que desisti
De pelo menos tentar
Ainda estou aqui
Parado no mesmo lugar
13
Brazuca
Brazil com Z, Z de Brazuca
Carnavalesca?
Filhos da P....
Brazil com Z
A copa é deles, a conta é nossa
Brazil com Z fica entalado
Tatu-Bola
Rotulado
Brazil com Z, Z de vergonha
Amijubi, Zuzeco, Fuleco
Que coisa medonha
Brazil com Z, Brazuca, Brazuca
Atirem de bazuca
Nestes filhos da p...
Pimba na gorduchinha
Kick the little fat
A copa não vem sozinha
Traz junto o confete
14
Sombrio
Outra noite chegou sem pedir licença
O sol repousou e acabou a crença
Período sombrio de almas perdidas
Espíritos vazios evitam subidas
Luz de esperança
Riso de criança
Calafrio noturno
Mudança de turno
Ativa mediunidade
Em espíritos alheios
Que buscam claridade
Livrar-se dos receios
Quando falta a luz, a morte em seu capuz
Assusta o perdido, sem fé e iludido
Enquanto o desperto vaga descoberto
Não teme o escuro e fica mais seguro
Mantém a mente sã em corpo ereto
15
Evolução
O voo do pterodátilo anunciava a chegada
Do período jurássico
Longa primavera dourada
Intervalo meteórico entre duas gerações
Discutem os teóricos acerca de ilusões
Eram enormes as pegadas e era inútil segui-las
Neste chão de terras pisadas
Há várias construções erguidas
Vasto solo próspero
Onde tudo evolui
Nada é inóspito
Tudo se conclui
Nova era polar
Corrigirá erros
E então recomeçar
Cheia de segredos
Não somos tão espertos quanto pensamos
Consideramo-nos eretos, mas curvados ainda andamos
16
Tem Dias
Tem dias,
Que o céu escurece,
Que o sangue enrubesce,
E a mente adormece
Sem a gente perceber
Tem dias,
Que a fala entorpece,
Que a fogueira aquece,
E a gente entardece
Sem a mente esvaecer
17
Uma Das Metas
Ser um doce bárbaro
Ser um gentle giant
O espectro de amor
Que envolve a revolta
O amor luta e não se acomoda
E também é escudo na fraqueza
A verdade é a meta
Diuturnamente caçada
Às vezes cinza como a cidade que habito
Outras vezes ela surge
Na calada da noite sem nuvens de lua cheia
No raio de sol refletido no pingo da chuva
18
Por Onde Andam As Rosas?
Por onde andam as rosas?
Aonde é que elas estão?
Se eu não vê-las florir estagnarei numa só estação.
Por onde andam as rosas?
Para onde olho eu só vejo concreto.
Por que tudo unicolor?
Porque não multicolor? Politonal!
Por que tanta rigidez?
E afinal, por onde andam as rosas?
Está acabando a beleza. Está cessando a prosa.
Alguém, por favor, por onde andam as rosas?
Sem elas não há amor, as tardes são desgostosas.
Eu clamo, eu imploro, por onde andam as rosas?
Só restam espinhos de plantas venenosas.
Eu desisto... ...Por onde andam as rosas?
(Suspiro)
A busca é aflita, a busca é dolorosa.
19
Ode Ao Descaso
É pau, é pedra é barro e lama
É o morro descendo
Vai-se a vida e cama
É rico, é pobre
No mesmo balaio
É o povo que sofre
Sempre feito de otário
É Maria, é José
Invadindo terreno
Não é por má fé
Constituir lar pequeno
A encosta que desce
Estatística aumenta
O que resta é a prece
Após outra tormenta
É o descaso público
Invadindo o verão
Tsunami de lama
Não é chuva é monção
20
Noite Adentro
Na madrugada
Calada
Vento é canção
No escuro
Vendado
Tato é visão
Na neblina
Nebulosa
Tempo é tentação
Na noite fria
Chuvosa
Gotas de ilusão
21
Mestre Bituca
É preciso ter gana
Vontade de vencer
Não deixar se abater
A cada derrota
É preciso ter raça
Para poder superar
Cada obstáculo
Que quer nos derrubar
É preciso ter força
Para se reerguer
Após cada tombo
E voltar pra luta
É preciso ter
Sempre
Esta estranha mania
De ter fé na vida
É preciso ter luz
Para iluminar
Tanta gente
22
O Vale Encantado
O vale encantado
Dos animais carentes
Dos lares expulsados
Um vale encantado
Das portas e batentes
Dos seres enjaulados
O vale premiado
Entregue aos clientes
Já desapropriados
Um vale inanimado
Atordoa os doentes
Já desorientados
O vale encantado
No sonho desta gente
Transborda alagado
23
Cibele
Cibele era gaúcha e foi morar no Paraná,
foi em Cornélio Procópio que eu fui a encontrar.
Conhecemo-nos por acaso, eu bêbado ela no bar.
A briga, a sinuca, o carro, chamei ela pra dançar.
Mais pra lá que pra cá, dois pra lá dois pra cá.
Eu e tu tudo rodar, direto pro segundo andar.
Cibele descabelou-se e então resolvemos fugir
Quando a noite acabou não tínhamos mais pra onde ir
O marido influente deputado, quando soube da história
ficou revoltado. Ordenou aos capangas e ao delegado.
Vivo ou morto queria me ver enforcado
Cibele eu abandonei, ainda vive com o deputado, mas um
apelido nele eu deixei: Deputado Cornélio Coitado.
Cibele às vezes ainda me liga, mas não piso mais naquela
cidade.
Uma noite não vale uma vida, uma noite só deixa
Saudade.
24
Caetanear
Saber caetanear
É ser eterna criança
Nesta vida só brincar
Ter em si mais confiança
É saber ser forte
Demonstrando fraqueza
As lágrimas conforte
No sorriso há beleza
É querer um abraço
Para tudo esquecer
Curtir cada passo
Na arte de crescer
É iluminar com sorrisos
O caminho alheio
Dividir o lanche
Na hora do recreio
Querer caetanear é aproveitar a vida
Viver para amar e amar a sua vida
25
Paty
Era a Paty, Paty com ípsilon
Saia de tarde e causava frisson
Era a Paty, Paty com ípsilon
Ainda criança passava batom
Era a Paty, Paty com ípsilon
Como era doce, feito bombom
Era a Paty, Paty com ípsilon
Brilhava de noite num efeito neon
Era a Paty, Paty com ípsilon
Dançava tão linda aquele som
Era a Paty, Paty com ípsilon
Era meu acorde e era meu tom
Era a Paty, Paty com ípsilon
O sol reluzia em seu olho marrom
Era a Paty, Paty com ípsilon
Ela era a dona do meu coração
(E como era bom!)
26
Redescobrimento
Se Cabral chegasse hoje ele viria de avião
Terra a vista com desconto, tudo em liquidação
Trocaria I-pad com índios, mandaria e-mail ao rei:
“De fartura há indícios, mas esmolas eu doei.”
Anchieta cobraria dizimo para rezar a primeira missa
Catequizaria nossos índios para uma era omissa
Se Cabral chegasse hoje dançaria axé em Porto Seguro
Beberia com estudantes e transaria no escuro
Se o rei vier pra cá nunca mais retornará
Junto a ele enriquecerei e virarei deputado, ó pá.
Se Cabral chegasse hoje estaria atrasado
Preso no aeroporto com seu voo cancelado
27
Medidas
Metros quadrados
Cúbicos, redondos
Cem Hectares
Dez mil Ares
Quinhentas milhas
Quatorze jardas
Vinte litros
Algumas jarras
Treze gigas
Dezoito polegadas
Três vivas
Dezesseis toneladas
Quinze dedos
Poucos centímetros
Doze medos
Nove milímetros
28
Rimas gentílicas
Um monge piemontês naturalizado estremenho.
Podou os ipês mostrando desdenho.
A mineira Isadora era marianense.
A viagem demora, mas ela convence.
El ratón, aquele andino, era santiaguino.
E não desgrudava do vinho vinhamarino.
Da Dalmácia vem o dálmata, é croácio ou croata?
Fuga guantanameira para a paz pantaneira.
Aquele francês provençal, de pai picardiano.
Da cabeça bate mal e parece ser insano.
Em plena praça moscovita, avistei um Cossovano.
Com seu ódio bizantino do império romano.
29
Ali
Roda gigante
Roda distante
Roda o instante
Dimensionando
Despachando
Especulando
Indelével
Indescritível
Indomável
Cruzado
Direto
Oposto
Do lado
De dentro
Do rosto
30
Transição
Aqueles minutos, já deitado
Precedem o sono relaxado
Quando a mente sai do corpo
Flui naturalmente o pensamento absorto
Ainda acordado, mas quase dormindo
A gente atordoado se pega refletindo
Pensando no dia, pensando na vida
No aconchego do colchão
Travesseiro de meditação
Aquele silêncio antes de apagar
Revela-nos as respostas
Aquela calmaria
Pura tranquilidade
Entre o mundo onírico
E a realidade
Top Related