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O PEDAGOGO, OS PROFESSORES E A NOÇÃO DE INDISCIPLINA NA
ESCOLA: A CONSTRUÇÃO DE NOVAS POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS
Elenita Fátima de Oliveira Hallai1
Profª Drª Regina Cely de Campos Hagemeyer2
RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar as análises sobre o projeto desenvolvido pela autora e sua implementação durante o ano de 2011, como participante do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), da Secretaria de Educação do Estado do Paraná e em parceria com Universidade Federal do Paraná. O tema proposto refere-se ao problema definido como indisciplina, levantado por professores do Colégio Estadual João Bettega – Ensino Fundamental. Foram desenvolvidas as concepções sobre indisciplina com base em pesquisadores do tema: Franco, Aquino, Makarenko, Guimarães, Hagemeyer e Guattari. Na discussão da noção, considerou-se as novas influências culturais da sociedade atual, que implicaram na caracterização dos sujeitos que frequentam o colégio. Apresenta-se as metodologias de pesquisa qualitativa, baseadas em Lüdke e André, com a aplicação de questionário semi estruturado e análise documental e pesquisa-ação, com base em Thiollent. Na análise dos questionamentos e alternativas levantadas pelos professores pesquisados e participantes do GTR (previsto no PDE), destaca-se a relevância das novas necessidades e interesses dos alunos da escola atual, e são desmistificados aspectos definidos como indisciplina, explorando conceitos e novas possibilidades pedagógicas identificadas.
Palavras-chave: Indisciplina; Alunos da escola atual; Atuação docente
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� Graduada em Pedagogia pela Universidade do Oeste Paulista,1990, Pós Graduada pelas
Faculdades Integradas Espirita, 2007, Pedagoga no Colégio Estadual João Bettega, [email protected] 2
� Professora pós graduada em doutorado pela Universidade de São Paulo, 2006; atua na UFPR,
na graduação e pós graduação em Educação, nas áreas de currículo e formação de professores
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INTRODUÇÃO
O presente artigo expressa o processo vivido como pedagoga da escola
pública estadual, no processo de formação do Programa de Desenvolvimento
Educacional (PDE), e ao desenvolver o projeto proposto, de título: A in-
disciplina na escola atual: o pedagogo e a formação de vínculos positivos nos
processos de ensino e formação, o qual se refere ao trato e busca de
elementos investigativos e teórico-práticos para o desenvolvimento reflexões
coletivas com professores sobre os processos que qualificam como indisciplina,
problema como que pedagogos e professores se deparam na escola pública
atual.
Os estudos e pesquisas para o planejamento e aplicação do projeto
resultam de ações e atividades investigativas realizadas no Colégio Estadual
João Bettega, de Ensino Fundamental e Médio, no qual atuamos como
pedagoga, o que possibilitou problematizar questões e necessidades
apontadas por professores e problematizadas sobre o tema da indisciplina. As
características do referido Colégio são semelhantes às de outros
estabelecimentos e escolas públicas da rede estadual do Paraná, o que
possibilita discutir, levantar dados e buscar em autores pesquisadores e
estudiosos do tema, contribuições à organização dos alunos para uma
escolarização qualitativa, considerando a realidade cultural e social dos alunos
e da comunidade do referido estabelecimento .
O Colégio Estadual João Bettega – Ensino Fundamental e Médio está
localizado no Bairro Novo Mundo, em Curitiba, Paraná, à Rua Visconde do
Serro Frio, 2010. Em um contexto composto por profissionais e alunos de
diferentes características culturais e procedências, nos dois últimos anos,
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frequentes situações têm sido relatadas por professores sobre a indisciplina em
sala de aula. Os professores referem-se a mudanças no comportamento e
atitudes dos alunos, sendo que suas preocupações focalizam, sobretudo as
atitudes de desânimo, desinteresse pelas atividades da escola e
demonstrações agressividade, que segundo os professores, refletem-se em
fracasso escolar.
Para analisar as questões identificadas, considerou-se o contexto atual,
em que ocorre a educação escolar e os sujeitos presentes na escola
contemporânea. Como ponto de partida considerou-se a questão da
indisciplina apontada pelos professores, como processo ligado às relações
sociais entre alunos e professores na fase da escolarização, e suas
interferências nas aquisições de conhecimentos e valores. Tais processos
implicam em mudanças na organização do trabalho pedagógico escolar e na
formação de valores humano sociais nos alunos, questões que estão cargo
inicialmente dos pedagogos, mas que sem dúvida, se referem aos professores
que estão face a face com os estudantes em sala de aula.
Considerou-se o contexto cultural em que ocorre a educação escolar,
ao questionar aspectos como:- quem são os indivíduos presentes na escola
(situação econômica e social da comunidade e os interesses, atitudes e
motivações dos alunos) e as influências decorrentes da cultura da escola.
Buscou-se deixar espaço para possibilidades de novas questões a serem
consideradas, a partir da atitude aberta no questionário semi estruturado,
aplicado nos professores. Outra contribuição para a pesquisa realizada diz
respeito às discussões instigadas nos espaços virtuais, por professores que
participaram das atividades do projeto.
Os estudos sobre indisciplina, levaram em conta a transição histórica e
contextual atual, cujas mudanças rápidas e radicais em todas as áreas da vida
humana, influenciam as formas de ser, estar e se relacionar dos alunos, sendo
que novos valores, atitudes, interesses e motivações permeiam a vida de
crianças e jovens antes de entrar para a escola. Considera-se nessa
perspectiva, concepções que possam apoiar as reflexões sobre essas
influências nos fatores físico, biológico e mental dos alunos, cujas alterações
ocorrem desde a primeira infância até a vida adulta.
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A falta de tempo dos estudantes, professores e pais, e os novos
espaços educativos, de conhecimento e formação, interferem na função social
da escola hoje. Os novos padrões valorativos que orientam a vida dos jovens,
demandam discussões urgentes e um repensar coletivo e sistemático dos
educadores no processo pedagógico escolar. Na contextualização social e
cultural dos alunos da escola pesquisada, esses fatores teem instigado os
profissionais da escola a modificar suas práticas e atitudes em sala de aula.
Buscou-se estabelecer um diálogo com 10 professores que estão à
frente do processo pedagógico do Colégio campo de pesquisa, sendo que os
temas abordados teem o objetivo de trazer de forma sistematizada, as análises
e algumas tomadas de posições a partir dos estudos e discussões realizadas. A
partir da sensibilização dos professores para as questões levantadas sobre o
tema, os estudos e pesquisas, foram discutidos com o apoio de produções dos
autores selecionados.
Em função das discussões e questionamentos, desenvolveu-se o
processo de tutoria de Grupo de Trabalho em Rede (GTR), previsto no projeto
PDE, que teve a participação de 12 professores. O grupo de participantes do
GTR é originário dos diversos municípios do Estado do Paraná, e como
modalidade à distância, tem como recurso a rede da Internet. Foram propostos
temas de reflexão e excertos de textos dos autores selecionados, e os
professores participantes trouxeram opiniões e questionamentos, contribuindo
com sugestões para a busca de coerência no trato da organização dos alunos
da escola atual para o ensino e a aprendizagem. A organização do material de
estudo, teve o apoio dos coordenadores do PDE, o que sem dúvida
acrescentou aprendizado que ampliou a atuação dos professores e do
pedagogo na área da informática.
Utiliza-se os termos disciplina - indisciplina, como termos que buscam as
causas culturais e relacionais presentes nos estudantes da escola atual, para
analisá-las, no sentido de construir ressignificações nas formas de organizar a
vida escolar dos alunos para a escolarização. Como na educação todas as
questões são processuais, prevê-se que este seja um tema a ser
constantemente reavaliado, o que pressupõe novas ações de continuidade.
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Nessa produção, o tema central indisciplina na escola, será tratado em
quatro aspectos fundamentais, que surgiram nos estudos e na pesquisa e que
indicam as questões que se pretende desenvolver nessa abordagem:
1- As noções de disciplina e indisciplina no contexto escolar
2- A necessidade de conhecer os sujeitos da escola atual..
3- As metodologias adotadas nas atividades propostas e na pesquisa
realizada
4- Causas e consequências da indisciplina: opiniões e questionamentos
dos professores pesquisados e participantes do GTR
5- As opiniões e questionamentos dos professores sobre as causas da
indisciplina
6 A cultura das mídias e influências em valores dos estudantes
7 - O pedagogo e a organização do trabalho pedagógico
8- Processos colaborativos e busca de alternativas para a questão da
indisciplina.
As noções de disciplina e indisciplina no contexto escolar: concepções e
posições adotadas
Para refletir sobre a indisciplina, parte-se da idéia de disciplina, aquela
vivida pela comunidade educativa, e que se expressa nas condições de
organização dos processos pedagógicos desenvolvidos pelos profissionais
para propiciar as aquisições de conhecimento e a formação de atitudes dos
estudantes. Importa considerar as motivações, interesses e estilo das relações
estabelecidas no meio escolar, para que os objetivos de ensino e formação dos
alunos com sucesso, sejam alcançados por todos, sem exceção.
O contingente significativo de alunos que busca a escola pública e nela
permanece está submetido a um tipo de disciplina gerada, por horários,
relações autoritárias, regras, sanções e castigos em situações ambíguas muitas
vezes. Em contrapartida, os problemas de saúde, emocionais e as dificuldades
na aquisição de conhecimentos, são aspectos indicados pelos professores e
alunos. Essas duas ordens de questões dizem respeito ao i nvestimento dos
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profissionais da escola, em momentos de análise e avaliação dos processos
desenvolvidos na escola, em função de que os alunos tenham uma
escolarização mais prazerosa e de sucesso na aprendizagem .
Vários autores, ao tentar aproximar-se de concepções que possam
apoiar o processo da disciplina escolar, tocam em fatores de organização dos
alunos para a aprendizagem. Froebel (2001), já ressaltava que a disciplina não
deveria ser controlada por castigos físicos e propunha que o professor levasse
a criança a internalizar a disciplina, para ser capaz de, sozinha, perceber e
avaliar seus atos. Vygotsky (1993), afirmava que o desenvolvimento dos alunos
numa escolarização bem organizada, levaria ao conhecimento real das noções
ensinadas e aos saltos qualitativos de aprendizagem. Franco (1986) e Aquino
(1996) referem-se à construção do processo escolar em direção à auto
disciplina, isto é, os autores tendem a comprovar que as regras impostas,
historicamente têm mostrado que a educação em suas várias formas, não pode
se resumir a imposições de fora para dentro, nas atividades educacionais.
Para Franco (1986), a disciplina reflete a própria organização da
escola, e é a organização de seus profissionais e dos alunos para a
aprendizagem, que dá exemplo aos alunos e conduz à auto disciplina. Para
Franco (1987), a escola não pode ser confundida com um ‘caos anárquico’
onde cada um faz o que quer e ao seu bel prazer. A escola cumpre um papel
social, no qual o principal objetivo é o de propiciar ao aluno formas para que
venha a fazer aquisições de conhecimento necessárias à sua formação, visão
de mundo e inserção social.
Franco (1986) ressalta ainda as opiniões sempre atuais de Gramsci
(1969), que entende o problema da disciplina como “a capacidade de
comandar a si mesmo, de se impor aos caprichos individuais, às veleidades
desordenadas, significando enfim, uma regra de vida”. Expressa a consciência
de uma necessidade livremente aceita, na medida em que é reconhecida como
necessária para que um organismo social qualquer, atinja o fim proposto.
Gramci (1968) enfatiza que os processos vividos no âmbito escolar, devem
levar em conta os limites e possibilidades dos alunos, nunca ultrapassando
suas capacidades, isto é, exigem esforço e concentração, mas precisam ser
dosados.
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Franco (1986), recorre ainda a Makarenko (1981), autor da Russia pós
revolucionária, que desenvolveu um processo educacional com 600 alunos
analfabetos e marginalizados, no qual obteve sucesso. Este autor afirma que “a
disciplina deve ser acompanhada da compreensão da sua necessidade”.
(MAKARENKO, 1981). Nessa perspectiva, é importante evidenciar que a
escola tem apresentado normas e sanções, as quais são elaboradas para que
toda a comunidade escolar obedeça. É importante observar no entanto, que em
qualquer grupo social, a heterogeneidade está presente, e que a planificação
para que todos sejam iguais, tem causado exclusão e passividade.
Para Hagemeyer (2010), a busca da igualdade na recepção e a partir
de oportunidades várias de aprender, é objetivo da escola democrática, que
difere da homogeneização nos processos de aquisição da aprendizagem, onde
as singularidades e interesses dos alunos não tido lugar, levando à
desmotivação para com os conhecimentos curriculares e ao corte de vínculos
importantes durante a escolarização pelos alunos.
A disciplina diz respeito às formas de uso do tempo e espaço físico da
escola, às atitudes de alunos, professores e demais profissionais que nela
atuam. Tais processos teem expressão para os alunos, se ocorrem de forma a
aproveitar os espaços da escola de forma prazerosa, participativa e em
momentos convenientes. Para Deleuze e Guattari (1995), são as experiências
reais vividas pelos indivíduos, que os fazem refletir sobre outros pontos de
vista, e sobre o “outro” social.
Guattari (1987), refere-se à mídia na sociedade capitalista e
globalizada, como modelizadora dos alunos para o consumismo e
individualismo, processos que teem formado as identidades e subjetividades
dos alunos. Propõe que se proporcione na escola atividades e experiências
alterativas, com a participação dos alunos de causas afirmativas raciais, de
gênero, e em defesa do meio ambiente, da dignidade social de mulheres, da
terceira idade e de crianças, que poderão levar os alunos a mudanças de
pontos de vista, levando à solidarização com as causas sociais, e na direção
de processos de auto formação.
A participação dos alunos das atividades escolares depende da
possibilidade de considerar suas vozes e opiniões, a cada projeto, atividade e
fase de seu desenvolvimento durante a escolarização. Dessa forma, o
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processo de consecução das ações organizativas da aprendizagem e da
formação humana, pressupõem momentos de avaliação coletiva com
professores, alunos e comunidade escolar, de forma democrática, coordenados
pelos pedagogos.
A necessidade de conhecer os sujeitos da escola atual
A hipótese levantada, sobre o desconhecimento dos professores das
novas configurações culturais de seus alunos, apareceu como questão inicial
nas reflexões sobre o tema. Pergunta-se assim, como ponto de partida das
atividades e da reflexão proposta nesse artigo, como os professores têm se
colocado no que se refere à questão: Os professores conhecem os alunos com
que trabalham? O esforço a ser investido na resposta a essa questão, toca em
novas e urgentes questões referentes à cultura e valores dos alunos que
adentram a cada ano nas escolas públicas atuais, de forma rotativa. Respondê-
la torna-se um aspecto fundamental para a busca de causas e alternativas para
o trato do que se define como indisciplina, visando uma organização qualitativa
da escolarização básica.
Para Hagemeyer (2006), a evolução da ciência e das tecnologias, bem
como as mudanças rápidas relativas a conhecimentos e valores, requer da
escola novas incumbências, que não poderão ser exercidas de forma neutra.
As novas tecnologias e a cultura das mídias de entretenimento (notadamente a
TV como publicidade, notícias, a internet, etc), interferem na formação das
identidades dos estudantes. São processos culturais que representam
evolução, mas em seus processos ditam também o individualismo,
consumismo e a massificação de opiniões e gostos em todas as áreas da vida
humana.
Essas influências tanto positivas como negativas a crianças e jovens,
têm sido detectadas pelos professores que se referem à vivência dos alunos
em espaços comuns de rua, de shoppings, e em formações culturais, como
tribos e redes sociais, as quais surgem como forma de pertencimento e
comunicação social, concorrendo com a escola nas aquisições de
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conhecimento e formação de atitudes. São processos culturais que ditam o
individualismo, consumismo e a massificação de opiniões e gostos em todas as
áreas da vida humana. Aos professores torna-se urgente conhecer esses
processos.
É importante ainda levar em conta que as alterações socioeconômicas,
sobretudo nas famílias de baixa renda, levaram a família ao mercado do
trabalho, também um número cada vez maior de mulheres. Tal situação
resultou na delegação de muitas funções educacionais e formativas para as
escolas e seus profissionais, o que significa muito mais do que parceria na
educação dos filhos. A educação/formação hoje, i nicia nas creches e continua
nas instituições escolares do ensino fundamental e médio, em que pese estar
este processo, permeado pelas novas interferências sociais e culturais
presentes na sociedade atual.
A partir de dados do Projeto político Pedagógico do Colégio Estadual
pesquisado, verifica-se que a diversidade cultural dos alunos, tem suas origens
nos processos de imigração dos primeiros moradores do bairro Novo Mundo,
no qual se situa a instituição, e que se estabeleceram naquela localidade. As
famílias como os Gritz, Levix, Dudeck, Schier e Gomes, originários da
Alemanha, Itália, Polônia e Espanha, tornaram-se tradicionais em Curitiba. O
nome “Novo Mundo” deve-se ao imigrante, polonês Alfredo Stengowski, e ao
espanhol Joaquim Font que ao se estabelecer na região, denominaram suas
casas comerciais de Velho Mundo e Novo Mundo, no ano de 1909. Hoje, as
influências comerciais dessas famílias tornaram o bairro residencial e
comercial, oferecendo infraestrutura básica à população contando com
farmácias, supermercados, lojas, agências bancárias, shopping, escolas,
clínicas médicas, transportes coletivos, tornando o bairro praticamente
independente do centro da cidade.
A população pertence a diversos níveis socioeconômicos e culturais,
sendo que o Colégio atende a alunos, em sua maioria, com idade entre 10 e 20
anos. A maior parte dos alunos é pertencente a níveis que podem ser incluídos
em médio e baixo, e uma pequena parcela, cujas famílias possuem
escolaridade básica e Ensino Fundamental. A renda familiar da comunidade
oscila entre R$ 300,00 (trezentos reais) e R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos
10
reais), sendo que as famílias são compostas de três a seis pessoas. Nos dados
do PPP, uma média 70% das pessoas da comunidade possuem moradia
própria, sendo que 80% do total dos alunos, moram a uma distância inferior a 1
(um) quilômetro da Escola. A preferência da escolha por este Colégio se dá
pela sua proximidade à moradia e ainda pelo fato de que oferece um bom
ensino, segundo os depoimentos de parte dos pais.
Esses dados, que identificam a comunidade e as origens dos alunos,
são importantes para o trabalho pedagógico nas escolas públicas, mas não são
suficientes para fazer um diagnóstico criteriosos dos alunos. Conhecer no
entanto, não significa fazer pré-julgamentos sobre os alunos, mas constatar os
interesses, avanços e dificuldades que apresentam, para que se possa planejar
a sequência da aprendizagem na escolarização. Essa constatação, coloca aos
professores a necessidade de critérios de análise das aprendizagens de todos
os alunos, para que sejam acompanhados nas aquisições propostas para cada
série e área de ensino, antes mesmo do planejamento anual e bimestral.
Verifica-se, como já se observou, que todos os anos recebe-se um
novo contingente de alunos no colégio pesquisado, os quais trazem consigo
novas culturas, vivências e costumes. Constata-se que embora os alunos
estejam dentro de um patamar aquisitivo médio, parte destes apresenta baixo
poder aquisitivo, e na sociedade são marginalizados social e economicamente,
o que significa analisar essas influências em suas aprendizagens e formação
humana no trabalho curricular docente.
Por outro lado, o ingresso de alunos de todos os pontos do estado e do
país, indica que a diversidade cultural com que se trabalha, deve ser
considerada tanto nas dificuldades que apresentem na escolarização, como na
busca de formas para identificar novas habilidades e interesses que
apresentam como integrantes um determinado grupo cultural. Os novos grupos
culturais e sociais que surgem na vida social de crianças e jovens, são
aspectos que permeiam a formação de valores ético sociais dos alunos.
As metodologias adotadas: atividades propostas e pesquisa realizada
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As propostas do Projeto de Implementação sobre a Indisciplina, foi um
dos temas apresentados aos profissionais do Colégio Estadual João Bettega -
Ensino Fundamental e Médio, na Semana Pedagógica de julho de 2011.
Durante a exposição, o corpo docente manifestou interesse na implementação
do projeto, sendo que a equipe da Direção do Colégio e Equipe Pedagógica e
de professores participou dessa decisão.
A proposta inicial de estudo sobre os textos utilizados na elaboração do
projeto, baseados em autores selecionados nos estudos com a orientadora da
UFPR, foi de que ficassem à disposição dos interessados, na sala dos
professores. Foram programados também encontros para leitura dos textos,
com tempo para análises e discussões que ocorreriam durante as horas -
atividade. Propôs-se também uma sondagem com os professores, para a
vivência de um processo de reflexão e busca de alternativas e novos olhares
sobre o processo que definiram como indisciplina escolar, analisando as
questões levantadas sobre os alunos no próprio cotidiano do Colégio .
A fundamentação da proposta de pesquisa e intervenção pedagógica
pautou-se na pesquisa qualitativa, por meio da aplicação de questionário semi
estruturado em 10 professores, e análise bibliográfica e documental,
procedimentos com base em LÜDKE e ANDRÉ (1987). Tendo em vista que a
autora e pesquisadora é pedagoga do quadro de funcionários do Colégio e que
a situação problema para a elaboração do projeto de intervenção partiu da
realidade vivenciada, optou-se pelo procedimento de pesquisa – ação.
Essa modalidade é definida por Thiollent (1985), como pesquisa de base
empírica concebida e realizada em estreita associação, com uma ação ou a
resolução de um problema coletivo, no qual os pesquisadores e participantes
representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo. Nos depoimentos citados nessa abordagem, utiliza-
se somente as iniciais dos nomes dos professores para preservar suas
identidades. Quanto aos professores participantes do grupo de GTR, será
utilizado um nome fictício, com o mesmo objetivo.
Os artigos e textos referentes à in-disciplina, de autoria de Aquino
(1996), Franco (1986), Guimarães (1996), Passos (1996), Garcia (2000),
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Hagemeyer (2006), bem como a sistematização no Caderno Temático3
elaborado em função do projeto, serviram de embasamento para as discussões
entre os participantes, que ocorreram em horas/atividade do período da manhã
e nas Reuniões Pedagógicas do 2º semestre de 2011.
Os temas a serem discutidos versaram sobre aspectos do Caderno
Temático, a partir dos estudos e pesquisas do projeto, levando em conta os
temas relacionados a seguir:
1. O que é indisciplina na escola atual?
1.1 Por que os alunos de hoje não respeitam mais os profissionais da
educação como faziam os adolescentes da era passada?
2. O uso pedagógico da Internet: interesses e motivações dos alunos em
colaboração favorecem a produção do conhecimento.
3. Disciplinamento e relações de poder: negociação de regras e limites.
Para analisar as opiniões, dados, propostas dos professores, foram
levados em conta os questionamentos, opiniões, concepções e posturas dos
professores, que foram agrupados em temas que visam esclarecem as questões
da indisciplina na escola, desenvolvidos a partir de temas que se seguem.
Causas e consequências da indisciplina: opiniões e questionamentos dos
professores pesquisados e participantes do GTR
Para os professores pesquisados, a indisciplina parece estar referenciada
aos problemas de desmotivação dos alunos com os estudos, à falta de
estrutura familiar e de perspectivas de futuro para crianças e jovens. Por outro
lado, constataram que os alunos demonstram formas individualistas de ver a
vida e acham que o mundo deve girar em torno de si.
Ao relatar as dificuldades dos alunos na aquisição de conhecimentos
observada em suas aulas, os professores atribuem as causas da indisciplina a
atitudes de desinteresse, como não prestar atenção às aulas; não realizar
3 : “A in-disciplina na escola atual: O pedagogo e a formação de vínculos positivos nos
processos de ensino e formação (2011).
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atividades propostas ou tarefas de casa; preferências dos alunos por conversas
entre os grupos ou distração com música ouvida em celulares.
Os professores relatam que os alunos ausentam-se por vezes durante
um período de aulas e ao retornarem ficarem alheios aos conteúdos e
atividades de sala de aula. Referem-se às atitudes de depredação do
patrimônio escolar, roubos ou danificação dos espaços e mobiliários escolares,
entre outros. Pode-se considerar que suas preocupações são pertinentes, na
medida em que constatam a fragilidade do processo de aprendizagem que
apresentam, observando a indisposição ou desinteresse de boa parte dos
alunos para a aprendizagem e atividades escolares.
Indicam como demonstrações de indisciplina, as conversas paralelas, o
uso constante do celular em sala (os alunos ’driblam’ os olhares dos
professores e desobedecem as orientações da pedagoga), o excesso de faltas.
Referem-se às agressões verbais e físicas entre os alunos, e ressaltam o
crescimento da violência entre alunas e alunos.
Para uma das professoras (Z.A.T)., a indisciplina “é uma forma de
infringir os combinados ou de não respeitar o ambiente escolar em que se
encontram; por outro lado, quando os alunos não querem estudar ou aprender
e se juntam para atrapalhar a aula, prejudicam seus colegas que querem
aprender”. Para outro professor (S.M.M), “a indisciplina é o comportamento que
prejudica o bom andamento de uma determinada situação de aprendizagem,
que pode ser isolada ou promovida por um determinado grupo”. Preocupam-se
com as atitudes dos alunos e alertam que a formação oferecida pela escola
torna-se deficitária, uma vez que ao sair da escola não estarão preparados (as)
para ingressar numa faculdade ou ter uma profissão inicial.
Quase todos os professores responderam que tentam resolver os
problemas em sala de aula, lembrando os “combinados” do início do ano ou
bimestre, ou “apaziguando brigas dos alunos” e quando não conseguem
resultado, encaminham os “indisciplinados” para a pedagoga ou direção da
escola. Uma professora mencionou que elaborou um projeto (que reunia alunos
e professores para conversarem sobre os motivos que causavam a indisciplina
e as suas possíveis soluções), para melhorar o problema de disciplina em suas
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aulas. Abandonou a ideia, devido ao desinteresse e à desmotivação do grupo
de alunos.
Os professores lamentaram a falta de participação dos pais na escola,
deixando de participar ativamente da vida dos estudantes, e observam que
fogem do espaço escolar, em função dos turnos de trabalho para a garantia da
sobrevivência da família. Alguns projetos são elaborados para que os pais
estejam presentes nos processos escolares dos filhos, no entanto, os
professores atestam que são sempre os mesmos que frequentam a escola.
Todos os professores reivindicam maior suporte teórico metodológico
em sua formação inicial e continuada, para os enfrentamentos da indisciplina
na escola. Para a maioria dos professores, na tarefa de tratar os problemas
disciplinares e a organização dos alunos para a aprendizagem, precisam contar
com o trabalho do pedagogo, como organizador dos processos de ensino e
formação dos alunos.
As influências de um novo contexto: cultura das mídias e influências em
valores dos estudantes
Na fase do projeto definida como de sensibilização para com o
conhecimento dos alunos, foram utilizados os filmes “Escritores da Liberdade”
e “O Preço do Desafio”, que retratam situações de indisciplina escolar,
analisando a realidade sociocultural das periferias e com olhares e atitudes
diferentes por parte de professores e pedagogos. Os argumentos levam à
reflexão pelos alunos sobre seus atos e a mudar suas opiniões e
comportamentos em relação aos professores, a si mesmos, à escola, aos seus
projetos de vida.
Para os professores, as mudanças do mundo atual têm forte influencia na
formação dos alunos. Referem-se à mídia que oportuniza informações de todos
os tipos para os alunos, e observam que há facilidades aos adquirir com
facilidade na sociedade atual. Para M.S.V., professora do Quadro Próprio do
Magistério do estado do Paraná (QPM) há 21 anos, as condições de compra de
celulares, computadores, TV e outros meios de comunicação a preço baixo e de
forma parcelada, fazem com que diversas faixas da população tenham acesso
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aos diversos artefatos da mídia. Os acontecimentos mundiais, os conhecimentos
de diversas áreas, as informações variadas e as redes sociais, permeiam a
formação da maioria dos alunos. Com isso, a escola perde o seu papel de
propiciadora única de conhecimento e de informação e para os professores
concorre com a mídia nessa função.
Para outra professora pesquisada, A.T.T., de nível PSS, e que atua há 4
anos na rede pública, a mídia está intimamente ligada à educação, porém a
velocidade com que conquistou o mundo, não é mais a mesma que está
presente nas escolas públicas, e depende de verbas estatais. Declara a
professora, “as mídias mais comuns na escola são a TV e o vídeo cassete, e é
só comparar os recursos da mídia na escola aos aparelhos celulares que os
alunos trazem e com os quais operam diariamente, para constatar o quanto a
escola caminha a reboque da evolução das tecnologias”.
Dessa forma, as opiniões dos (as) professoras(es) dividiram-se: algumas
colocaram que há favorecimento na aprendizagem a partir dos artefatos da
mídia, que traz atualização aos alunos sobre o que ocorre tanto no mundo,
propiciando a comunicação com pessoas e colegas, por meio das redes sociais,
tão utilizadas. Parte do grupo, no entanto manifestou-se de forma contrária,
indicando que os alunos, não têm discernimento suficiente para filtrar as boas e
más informações que estão disponíveis na mídia, bem como não conseguem
dosar a quantidade de horas que passam na Internet. Este hábito constante faz
com que deixem de se relacionar com a família, dedicar-se a atividades e
trabalhos escolares, relacionar-se com os colegas, afastando-se do convívio
humano social, para viver mais tempo no mundo virtual.
Os professores comentaram que o acesso às mídias não ocorre ainda
com todos os alunos. No entanto, reconhecendo a mídia como evolução
tecnológica, preocupam-se com o acesso indiscriminado à Internet por crianças
e adolescentes, sem encaminhamento ou acompanhamento de pais e (ou)
professores, tornando problemática a formação dos alunos e sua educação
dentro e fora da escola. Para os professores, os pais precisam ser envolvidos
nas formas de acesso de seus filhos à Internet, juntamente com a escola.
O professor (C.F), que atua há 14 anos na rede pública estadual do
Paraná, afirma que “vive-se uma época em que tanto a formação quanto a
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informação estão sob a responsabilidade da escola, mas talvez a escola não
saiba como construir esse processo.”
Foi possível observar que os professores pesquisados buscaram leituras,
filmes e que conversavam frequentemente a respeito do tema da indisciplina,
contribuindo com ideias e sugestões para o trabalho com os alunos, visando
conseguir sua maior organização e interesse, tanto nos encontros, como em
conversas com seus pares e com os pedagogos.
A possibilidade aberta aos grupos de trabalho a partir dos textos
postados a partir no portal do PDE, trouxe a participação de professores, que
enriqueceram as discussões sobre o tema da indisciplina escolar. Constatou-se
por meio dos estudos e reflexões, que a questão da indisciplina dos alunos
ocorre com frequência em outras escolas e municípios do estado do Paraná,
sendo que as opiniões dos participantes coincidem com o que vivenciamos no
Colégio Estadual “João Bettega”.
Ressalta-se alguns depoimentos como o da professora Everly (2011),
comentou sobre os alunos com que sua escola trabalha: [...] nossos alunos
são de classe D e E e muitos são criados sozinhos, alguns complementam a
renda da família, como vendedores ambulantes, ajudantes de construção ou
em atividades ilícitas. Caminham também sozinhos, onde eles próprios são o
limite para si mesmos. Ao chegarem à escola depara-se com um mundo de
regras dos quais não estão familiarizados: o uso do uniforme, o horário de
entrada e tolerância para atrasos, a organização e limpeza do ambiente escolar
e seu próprio material...seu mundo está muito distante! Por outro lado temos
alunos com comprometimentos físicos: que não enxergam bem ou não ouvem,
como fome e problemas emocionais: carentes de atenção e afeto, carentes de
limites. Com dificuldades de aprendizagem e deficiência intelectual. Por outro
lado temos professores com visão unilateral onde só existe o seu mundo e não
conseguem "chegar até o aluno" (Everly ,2011).
A participante do grupo GTR Fernanda menciona sua pouca
experiência na rede pública, pois lecionava há 5 anos na rede particular, cuja
realidade era composta por alunos cuja situação econômica familiar, era bem
estruturada e que as turmas eram compostas por uma quantidade menor de
alunos em sala de aula, cerca de 10 a 15 alunos, o que por si, já propiciava um
17
ambiente menos favorável a indisciplina. Atualmente a referida professora
ministra aulas de Inglês na rede pública e “[...] é extremamente cansativo tentar
ensinar o conteúdo para crianças da rede pública, pois as mesmas têm outros
interesses além de aprender os conteúdos. Mesmo se utilizando da música e
de termos comuns, tanto no inglês quanto no mundo da internet, os alunos não
se motivam, parece que eles têm um mundo só deles e dificultam a “entrada”
do professor, considerando este último como um inimigo”.
Sobre a estrutura escolar ao enfrentar aspectos antagônicos do dever e
do fazer cumprir as normas, a professora participante do GTR, Silviane (2011),
fez considerações importantes, as quais apresentam ponderações sobre a
indisciplina e alguns fatores que impedem seu cumprimento nas escolas: “... os
professores agravam a indisciplina em sala de aula, à medida que muitos
deles não cumprem as regras da escola, não ajudam sua fiscalização. Os
acordos de início do ano acabam não tendo sucesso pelo descompromisso de
muitos educadores, ao mesmo tempo que alguns docentes chamam a Equipe
Pedagógica para resolver problemas que poderiam ser resolvidos por eles, ou
colocam os alunos para fora da sala de aula sem motivo relevante”.
Para a professora, essas atitudes levam os professores a gradativamente
perder sua autoridade perante o grupo. No entanto, a professora sente que
não se pode culpabilizar somente os professores pela indisciplina em sala de
aula. Para ela, esta questão “é também reflexo da sociedade em que se está
vivendo, onde a maioria das nossas crianças e jovens não têm limites claros e
são educados para somente o prazer”.
O pedagogo e a organização do trabalho docente com respeito à
disciplina escolar
Oportunizar as condições para a participação de todos na organização
dos processos de aquisição de conhecimento e formação na escola, minorando
o que se define como indisciplina, é papel do pedagogo escolar. Ao pedagogo
cabe sistematizar com os professores o conhecimento e o diagnóstico sobre os
alunos e a comunidade escolar interna e externa.
18
A promoção de condições para que os alunos sejam eles: crianças,
adolescentes ou adultos, “não se frustrem diante de suas aspirações de
interiorização dos conhecimentos de forma metódica e como instrumentos a
partir dos quais, será possível conferir uma nova qualidade à suas
aprendizagens”, tem o objetivo de formar para a busca de seus direitos e
interesses na sociedade (SAVIANI, 1985, p. 31).
A revisão da formação de professores e pedagogos nos cursos de
Pedagogia precisa considerar a preparação de profissionais aptos à
compreensão e desenvolvimento de processos colaborativos para a melhoria
da escolarização nas escolas brasileiras, o que demanda comprometimento
com a transformação dos indivíduos, a partir de uma visão crítica a respeito
das mudanças por que passa a sociedade.
Pimenta (2001) propõe que um profissional atue na Pedagogia Escolar
adquirindo teorias e conhecimentos sobre diversas práticas, cujas dimensões
englobem a gestão educacional, entendida numa perspectiva democrática,
especialmente no que se refere ao planejamento, à administração, à
coordenação, ao acompanhamento, à avaliação de planos e de projetos
pedagógicos. Na rede estadual de ensino, o termo professor pedagogo passou
a ser utilizado, com a lei complementar nº 103/2004 que delibera sobre o plano
de carreira dos professores da Rede Estadual de Educação Básica, no capítulo
III, que trata dos conceitos fundamentais desse profissional, que se torna
organizador pedagógico e professor (Proposta, SEED, 2009).
Para que se possam exercer essas funções a escola, o profissional
pedagogo necessita dedicar-se ao estudo e à pesquisa constante sobre a
educação e os processos pedagógicos em que atua, sendo que articulará os
processos educativos, levando em conta as questões contextuais e culturais do
mundo contemporâneo. Freire (1987) afirma que cabe ao pedagogo participar
nas mudanças que o conhecimento educacional demanda, de maneira
sistemática, atendendo a pressupostos epistemológicos seus ou do seu
entorno, de forma dialética, o que torna a profissão educacional pedagogo um
ato político. Tais funções implicam na inclusão dos processos curriculares da
escola aos movimentos sociais e afirmativos, visto que tais movimentos
19
interferem diretamente no ensino, formação e emancipação dos alunos no
processo da escolarização, como propôs Guattari (1987).
Na concepção de Libâneo (2000), a atuação do pedagogo escolar
aprimora o desempenho dos professores na sala de aula, e auxi lia as análises
que fazem das situações de aprendizagem, com base nos conhecimentos
teóricos, ou seja, na vinculação entre as áreas do conhecimento pedagógico e
o trabalho em sala de aula (LIBÂNEO, 2000). Para Morin (2001, p.10) o
espectro de atuação do pedagogo é cada vez mais amplo considerando-se a
velocidade com que ocorre a transformação tecnológico-sócio-cultural da
civilização atual.
Professores e processos colaborativos na busca de alternativas para a
indisciplina
Após os estudos em grupo, as professoras que participaram do projeto
aplicado no Colégio Estadual João Bettega, compartilharam da ideia de que os
profissionais que atuam junto com os alunos no colégio pesquisado, devem dar
o passo inicial para minimizar os problemas de indisciplina. Ressalta-se que o
tema despertou momentos de discussões significativas e verdadeiras entre
todos os participantes, os quais passaram também a trazer textos e sugestões
de leituras sobre questões fundamentais sobre as quais passaram a refletir em
função das propostas do projeto.
Uma das professoras do GTR, Silviane, falou sobre “os acordos de
início do ano que acabam não tendo sucesso pelo descompromisso de muitos
educadores, ao mesmo tempo que alguns docentes chamam a Equipe
Pedagógica para resolver problemas que poderiam ser resolvidos por eles, ou
colocam os alunos para fora da sala de aula sem motivo relevante”. Parece que
a indisciplina tem a ver com as atitudes dos professores , mas não podem no
entanto ser atribuídas somente a eles.
Nos textos e filmes com o qual tomaram contato, analisaram que a
atitude que instiga a mudança no comportamento dos alunos, é a postura do
professor diante das situações qualificadas como indisciplina. Ao invés de
combater o problema como se esse fosse um inimigo, o professor se
20
conscientiza de que ele próprio faz parte de uma sociedade que se modifica, e
que sua formação racional técnica e de regras autoritárias precisam ser
questionadas, para dar lugar a novas atitudes em sala de aula. De outro ponto
de vista, conhecer os alunos, seus interesses por determinados temas, buscar
momentos de diálogo sobre seus filmes preferidos, dificuldades, entre outras
questões que apresentam em seu desenvolvimento, tende a aproximar
professores e alunos nas atividades escolares.
Os professores começam a compreender as novas questões
analisadas e reivindicam interlocução e cursos, rodas de conversa,
depoimentos de autores e profissionais pedagogos e professores com
experiências exitosas e que possam dar suporte aos seus enfrentamentos no
trabalho com os alunos da escola básica atual.
Em geral os professores referiram-se às inovações do mundo
contemporâneo, mais atrativo para os alunos, sendo que a escola perde para
seus processos. A professora ( S.M.M.), sugere “que se priorize o que de bom a
sociedade atual traz para as atividades curriculares, e dessa forma se busque o
interesse dos alunos por novos conteúdos curriculares, como parte dos
conhecimentos e da formação dos alunos de hoje”.
Os professores sentem que necessitam em sua formação, de processos
de inclusão digital e inserção da mídia em seus trabalhos e metodologias
curriculares. A possibilidade de utilizar os recursos da mídia na escola e os
fatores que levam a incorporá-la na realização do trabalho pedagógico e
formativo, aparece nos depoimentos da professora S.M.M, que tem 16 anos de
trabalho na rede pública em Curitiba-PR. A professora afirma que “os alunos já
chegam ‘cantando’ as músicas que estão na mídia, muitas vezes sem saber o
significado das letras”. Para a professora, o professor deve interagir com o
mundo de fora da escola para trazê-lo para dentro da sala de aula, com uma
leitura mais pedagógica e com o olhar da pesquisa.
A partir do momento que o profissional professor passa a acreditar que
é possível auxi liar os alunos a encontrar pontos de convergência entre os
conhecimentos e interesses do mundo atual com os conhecimentos da escola,
o ambiente escolar se tornará um espaço tempo para o aluno, sujeito da
aprendizagem, levando-o a constatar que professores e meio escolar são uma
21
continuidade de sua socialização. No entanto estas convergências só poderão
ser detectadas, a partir dos encontros entre os próprios professores, entre
escolas, na formação de parcerias de estudo e pesquisa, nas quais os alunos
também precisam ter lugar.
Ao reconhecer a necessidade de formação inicial e continuada, os
professores indicaram alguns motivos para essa formação: levar os alunos a
deter os conteúdos escolares sem que se perca tempo com disciplinamento;
atuar com conhecimento e discernimento, ao invés de simplesmente pedir para
que o aluno se retire da sala de aula; saber como lidar com os novos e
inusitados problemas que surgem em sala de aula; domínio das discussões
técnicas, filosóficas e culturais sobre as mídias; atividades que oportunizem
condições a todos os alunos para a construção de valores humanos na escola
e nas relações sociais no mundo atual.
O professor, por outro lado, precisa de autonomia para desenvolver
suas iniciativas, falar sobre suas opiniões e projetos. Tais projetos só terão
credibilidade a partir da pesquisa. Para o professor não há tem tempo para a
pesquisa com métodos sistemáticos. O que se sugere, é que o professor
inicialmente, passe a pesquisar utilizando a internet, as redes sociais e os
artigos de pesquisadores, sobre situações que não domina e que se torna um
problema em sala de aula, já que as situações inusitadas de crianças e jovens
do mundo atual impõem a construção de novos conhecimentos.
Esse não é um processo fácil e para uma perspectiva de resultados
satisfatórios para professores, pais e alunos, torna-se importante saber que
este é um processo a médio e a longo prazo, e nesta abordagem foram
sugeridos os primeiros passos, que já foram dados. A continuidade cabe a
professores e pedagogos que coletiva e individualmente pesquisem,
planejem atividades, projetos, buscando novas relações geradas por novos
critérios valorativos, sendo que a idéia da justiça social e da dignidade
humana são valores que conduzem e dão suporte à formação de futuros
cidadãos .
Considerações Finais
22
A avaliação final de todo o processo, desde a escolha do tema do
projeto desenvolvido, passando pelas pesquisas, elaboração do Caderno
Temático, estudo de Grupo Trabalho em Rede (GTR), na implementação do
projeto, superou nossas expectativas. A dinâmica adotada pela Universidade
Federal do Paraná, a partir da orientação do projeto, em parceria com a
Secretaria de Estado da Educação, proporcionou momentos de construção de
conhecimento sobre o trato da indisciplina dos alunos na escola básica
contemporânea, como busca de organização de processos de auto disciplina
da escola e de investimento dos professores na reflexão e pesquisa sobre as
problemáticas apontadas.
A participação dos professores nas atividades propostas, propiciou
oportunidades de formação, que se constituiu em contribuição às suas
trajetórias profissionais, notadamente no tema explorado. Destaca-se também,
a promoção de maior intimidade dos professores com as habilidades de
informática, seu manuseio e operacionalização, buscando uma inclusão digital
que revertesse à atuação dos professores nos processos de ensino e
aprendizagem.
Ao identificar as questões evidenciadas durante o processo, observa-
se que a maioria dos professores acredita que exigindo a ordem, poderia
controlar o comportamento e o desinteresse dos alunos em suas aulas. No
entanto, a forma como as aulas têm sido ministradas, mostrou que há
dificuldades de se captar o interesse e motivações dos alunos, o que implica
em conhecer os alunos, suas culturas, seus interesses para contemplá -los nas
atividades escolares.
Rego (1996, p.96) argumenta que “o comportamento indisciplinado não
resulta de fatores isolados [...], mas da multiplicidade de influências que
recaem sobre a criança e o adolescente ao longo de seu desenvolvimento”.
Vasconcellos (2009) chama a atenção para o fato de que alguns professores
acreditam que a indisciplina está no indivíduo e não nas relações,
desconsiderando o contexto que a produziu.
Se não se refletir sobre acultura dos alunos e suas novas
conformações na sociedade atual, que expressa os interesses, dificuldades e
23
necessidades dos alunos, não se pode detectar o que instigará as
aprendizagens dos alunos da escola atual, e quais as formas de tratar a
formação de valores e atitudes. Conhecer os sujeitos que frequentam a escola
proporciona a visibilidade necessária aos professores sobre as formas de
utilização do tempo/ espaço escolar. A discussão de um diagnóstico sobre os
alunos, suas culturas, interesses, dificuldades, fornece elementos para planejar
atividades e processos de avaliação.
Nos sujeitos que ingressam no processo de escolarização, a
heterogeneidade está presente, e a planificação para que todos sejam iguais,
tem causado exclusão e passividade. Para Hagemeyer (2010), a busca da
igualdade na recepção de conhecimentos, a partir de oportunidades várias de
aprender, é objetivo da escola democrática, mas difere da homogeneização no
espaço escolar, no qual a aquisição da aprendizagem, significa considerar os
ritmos, interesses e singularidades dos alunos e precisam ter lugar.
Atribuir a indisciplina escolar somente às faltas e atitudes de
desinteresse e agressividade observadas nos estudantes, não resolve os
problemas gerados pela chamada indisciplina na escolarização. Retomar as
teorizações e experiências de autores como Gramsci (1968) e Makarenko
(1981), teve o objetivo de reafirmar que na escola, a simples obediência que se
exige habitualmente não é sinal de uma boa disciplina, o que indica a busca da
auto disciplina, isto é, processo construído de dentro para fora dos indivíduos
nas relações estabelecidas na escola. Por outro lado, a atividade escolar, de
aquisição de conhecimentos, implica em concentração, esforço, e investimento
de tempo, criatividade e estabelecimento de conexões entre conhecimentos e
noções apreendidas.
O foco da indisciplina não está unicamente no aluno, no professor, ou
nos pais, mas é processo que diz respeito a toda a comunidade escolar. As
possibilidades de trabalho coletivo, onde pais, alunos e professores e
comunidade escolar se sentem valorizados, teem voz e participam das
decisões sobre o ambiente e o processo pedagógico, tende a elucidar e
superar as problematizações da indisciplina na escola atual.
Os conteúdos curriculares são também formativos e as atividades
docentes precisam extrapolar a sala de aula, considerando que as mudanças
culturais e sociais do mundo atual, demandam atitude constante de pesquisa
24
sobre as novas necessidades dos alunos na escolarização. Cabe a professores
e pedagogos, buscar retomar conceitos relativos aos valores ético sociais, sob
novas perspectivas sociais e culturais nas atividades escolares, o que significa
também o investimento em formação inicial e continuada, que retome a função
social docente diante da função social da escola básica contemporânea.
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