O TRECHO “CAMINHO DO COLONO” NO PARQUE NACIONAL DO IGUAÇU
Sonia Maria dos Santos MÜLLER1
Ana Paula Cazarotto CELLA1
Larissa DALMINA1
Ternise Cristina Wollmann RABAIOLLI1
abril/2009
RESUMO
Retrata-se parte da história da Estrada do Colono e sua importância na colonização do Oeste
Paranaense, assim como os conflitos socioambientais gerados pelo fechamento do trecho que
corta o Parque Nacional do Iguaçu, mais conhecido como Caminho do Colono. O objetivo
geral da pesquisa consiste em apresentar fatos que demonstrem as razões que corroboraram
com o histórico sucessivo de fechamentos e reaberturas do caminho, valendo-se de referências
bibliográficas para a contextualização. O tema instiga sobre um questionamento: o
fechamento do Caminho do Colono causou impacto econômico e social à região e contribuiu
para a preservação ambiental do Parque Nacional do Iguaçu? A resposta para essa questão
expressa argumentos verdadeiros em ambos lados do conflito. O processo de contínua evasão
populacional causado por dificuldades logísticas, principalmente de comércio, entre as regiões
Oeste/ Sudoeste do Paraná, antes ligadas pelo trecho dentro do parque, e os argumentos
ambientalistas de preservação marcam intensas discussões nas esferas pública e judicial.
Palavras-chave: Caminho do Colono, Oeste/ Sudoeste do Paraná, conflitos socioambientais. 1 Acadêmicas de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade Assis Gurgacz – FAG, Cascavel/PR
ABSTRACT
It’s shown part of the history of Colono Road and it’s importance for the colonization of West
Paraná, and also the social environmental conflicts generated at closure of the part of the road
that crosses the National Park of Iguaçu, known as Colono Path. The general objective of the
research consists on presenting facts which demonstrate the reasons that corroborated with the
successive historic of closure and reopening of the path, using bibliographic references to
create the context. The theme instigates about a question: did the closure of the Colono Path
caused a social and economic impact to the region and contributed to the environmental
preservation of Iguaçu National Park? The answer to this question expresses true arguments
on both sides of the conflict. The process of continual evasion of the population caused by
logistics difficulties, mainly commercial, between the West/Southwest regions of Paraná,
once connected by the road inside the park, and the environmentalist arguments for
preservation mark intense discussions on public and judicial sphere.
Keywords: Colono Path, West/Southwest of Paraná, social environmental conflicts.
INTRODUÇÃO
Este artigo propõe retratar e divulgar a significância histórica do trecho da Estrada do
Colono, conhecido como Caminho do Colono, situado dentro do Parque Nacional do Iguaçu,
na colonização e desenvolvimento das regiões Oeste e Sudoeste do Paraná, com a finalidade
de apresentá-la ao meio acadêmico, especialmente de Planejamento Urbano e Regional, e
oportunizar aprofundamento futuro de pesquisa no tema e abordagens variantes.
Com dados obtidos em pesquisas bibliográficas, por vezes inconciliáveis, pesquisou-se
os motivos do seu fechamento, sob dois enfoques conflitantes: ambiental e histórico-social,
com o objetivo de se compreender as razões que corroboraram com o histórico de
fechamentos e reaberturas presentes na maior parte da história do Caminho do Colono.
Apresentar as justificativas dos ambientalistas que apoiaram seu fechamento e, do outro
lado da discussão, os motivos dos que defendem sua reabertura, suscita um questionamento:
seu fechamento causou impacto econômico e social à região e contribuiu para a preservação
ambiental do Parque Nacional do Iguaçu?
O PNI E A ESTRADA DO COLONO
O Parque Nacional do Iguaçu (PNI), situado na porção Sudoeste/Oeste do Estado do
Paraná, foi criado em janeiro de 1939, pelo então Presidente da República Getúlio Vargas,
com área de pouco mais de 3.360 hectares. Após diversas desapropriações e decretos,
finalmente, em 1981 ocorreu a última alteração da área e limites do parque, perfazendo os
atuais 185.262 hectares. Apresenta seu espaço territorial subdivido em cinco municípios da
região Oeste do Estado do Paraná, demonstrados na tabela:
TABELA 01 – PARTICIPAÇÃO TERRITORIAL DOS MUNICÍPIOS NO PNI
Municípios Superfície
do
Município
% do
município
no PNI
% da área
do PNI
com o
município
Céu Azul 1.153,238 73,10 49,56
Foz do
Iguaçu
442,000 30,13 7,48
Matelândia 598,468 56,49 19,87
São Miguel
do Iguaçu
894,148 11,73 6,17
Serranópolis
do Iguaçu
447,000 60,30 16,92
Fonte: AIPOPEC – Adaptação OSTROVSKI.
Abriga as Cataratas do Iguaçu e é considerado detentor de uma das maiores reservas da
Floresta Subtropical Úmida Temperada das Bacias do Paraná e Uruguai. Sua vasta extensão
cria ambiente propício ao desenvolvimento da fauna e flora local, o que desperta interesse de
visitação, além do belíssimo cenário das quedas-d’águas.
Tombado em 1986 pela UNESCO2 como Patrimônio Natural da Humanidade, o PNI foi
a primeira unidade de conservação brasileira a ser reconhecida pelo órgão da ONU3, devido
possuir amostra significativa dos ecossistemas primitivos pertencentes à floresta brasileira e
seu papel expressivo na conservação do meio ambiente.
A Estrada do Colono, no trecho que corta o PNI, chama-se Caminho do Colono e corre
sentido Norte-Sul, isolando 7.200 hectares do parque, hoje, entre os Municípios de
Medianeira e Serranópolis do Iguaçu (Oeste do Paraná) e Capanema (Sudoeste), totalizando,
aproximadamente, 17,6 km de extensão (ver ANEXO 01). A BR-465, mais conhecida como
Estrada do Colono ou BR-163, se estende por 250 quilômetros entre os municípios de Pato
Bragado, no Oeste, e Barracão no Sudoeste (JORNAL DO OESTE, 2000).
O caminho atravessava, sobre pequenas pontes, dois riachos maiores: o córrego
Capoeirinha e o Quilômetro Oito, ambos com nascente e foz no parque. “O pavimento era
primário, ensaibrado nos declives mais acentuados para que ninguém ficasse retido nos
períodos chuvosos”, conta Dallo, (1999, pg.101).
AS PRIMEIRAS DIVERGÊNCIAS
Acontecimentos históricos evidenciam que a estrada já existia anteriormente à criação
do PNI (OSTROVSKI 2002). A Coluna Prestes4 utilizou-se, como via de deslocamento do
Estado de Santa Catarina para o Paraná, de um caminho o qual se acredita ser o atual
Caminho do Colono. Dallo (1999, pg. 91) ratifica essa informação, contando que a Coluna
Prestes realmente passou por uma trilha primitiva da Estrada do Colono em 1924, observando
que “o que aconteceu é que criaram um Parque em cima da nossa Estrada, que não serviu só
para Prestes passar, mas também aos milhares de agricultores que colonizaram o Oeste
paranaense”. Dallo (1999) também afirma que essa estrada de chão foi largamente utilizada
pela população vinda do Sul do país para colonizar o Oeste paranaense.
Essa informação é contestada por Marin (2003, pg. 215) quando diz que “A colonização
de nossa região foi feita por cinco caminhos distintos, e nenhum pelo Parque”. Descreve que
os primeiros colonizadores vindos do Rio Grande do Sul, no começo do século XX, o fizeram
pelo rio Paraná, aportando em Santa Helena e que as outras frentes de colonização assim
chegaram:
A segunda e terceira foram quase simultaneamente, rio Tietê-Paraná até Guaíra, e
pela tropeira de Jaguaraíva-Guarapuava, mas se limitando aos Campos Gerais e à
entrada da mata. As outras duas frentes foram por Pato Branco [...], Laranjeiras ou
Chopinzinho – Catanduvas, estas foram o maior fluxo de migração que se possa
imaginar, e responsáveis pelo povoamento de todo o Oeste. (MARIN, 2003, pg.215)
O Jornal do Oeste (2000) publicou que a estrada foi aberta na mata virgem nos anos 30,
ou seja, antes da criação do PNI, e foi oficializada em 1954 pelo Departamento de Estradas de
Rodagem (DER), da Secretaria de Estado dos Transportes do Paraná.
2 United Nations Educational Scientific and Cultural Organization. . A Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura promove a cooperação internacional nas áreas de atuação, desde 1945. (Nota das
autoras) 3 Organização das Nações Unidas. Existe desde 1945 com a finalidade de preservar a paz através da cooperação
internacional e da segurança coletiva. (Nota das autoras) 4 Movimento político-militar, liderado por Luis Carlos Prestes e Miguel Costa, que deslocou-se pelo interior o
país pregando reformas políticas e sociais. (Nota das autoras)
Marin (2003 pg. 217) apregoa que o leito da Estrada do Colono foi aberto ilegalmente
em 1954 por máquinas das colonizadoras de Medianeira e Matelândia, que precisavam trazer
serrarias, com a finalidade de fornecer madeira para as casas dos trabalhadores e praticar a
extração/exportação da madeira: “Por isso esta estrada não é dos colonos, eles já estavam
aqui, vieram muito antes.”
Outra fonte, o site Ambiente Brasil, assegura que a estrada foi aberta legalmente pelo
Governo do Paraná com a intenção de favorecer a colonização da região Oeste.
O CONFLITO
A travessia pela estrada, no momento da colonização, era a melhor alternativa de
circulação para os que migravam do Sul do país para a região Oeste paranaense, bem como
para o fluxo de máquinas e mercadorias. Todo o entorno do parque era completamente
coberto pela floresta nativa e existiam apenas dois municípios e seus poucos habitantes. O
impacto ambiental era muito menos significativo. Mas a substituição da vegetação natural por
terras cultivadas e a urbanização crescente do entorno, visto que hoje existem 128 municípios
na região do PNI, produziram processos que alteraram significativamente a dinâmica do eco-
sistema local. Particularmente, relativo ao PNI, Salamuni (2002) declara que:
A Estrada do Colono fragmenta o Parque em dois ambientes podendo gerar
impactos no ambiente físico, bem nos componentes bióticos. A depender da resposta
que o sistema apresente – fato ainda não avaliado – é possível, inclusive, a não
sustentabilidade de alguns destes ambientes nas vizinhanças da estrada.
(SALAMUNI, 2002, pg.317)
As transações comerciais entre os municípios de Medianeira, Serranópolis do Iguaçu e
Capanema solidificaram-se, tornando o caminho indispensável para a viabilidade econômica
dos negócios. Os principais produtos comercializados são agrícolas (soja, milho e trigo) e o
suíno, fortificando, na realidade local, as parcerias comerciais entre as regiões Sudoeste e
Oeste do Estado do Paraná (OSTROVSKI 2002). Moradores locais alegam prejuízos ao
desenvolvimento econômico da região, causados pelo isolamento em relação ao pólo regional
de Foz do Iguaçu, devido ao aumento do percurso, no transporte de cargas e pessoas. Através
da Estrada do Colono o trajeto entre Capanema e Foz do Iguaçu perfaz 98 km, enquanto que,
pela via oficial que passa por Santa Tereza do Oeste, a distância aumenta para 220 km (DIAS,
2006).
No aspecto social, emotivamente, o Caminho do Colono constituiu para os pioneiros e
descendentes, moradores da região Oeste, um elo com sua terra natal, suas tradições, seus
costumes, amigos e familiares. Cândido (2007) demonstra, através de duzentos e oito
entrevistas realizadas com moradores do entorno da Estrada do Colono, que 33,7% destes
acreditam que esse fechamento ocasionou o distanciamento das famílias que moram nas
cidades vizinhas, assim como das que residem no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.
Tendo como aliados órgãos nacionais e internacionais de proteção à natureza,
divulgando o Caminho do Colono como um corpo estranho inserido em área de preservação,
os ambientalistas buscam por intermédio da justiça o seu fechamento (OSTROVSKI 2002).
O site World Twitch (June, 2001), que promove discussões ambientais, divulga que a
divisão do PNI e o trânsito de automóveis no seu interior “provocam danos ambientais
irreparáveis”. Cita a morte de animais por atropelamento e caça, além de confirmar que o uso
do Caminho do Colono certamente vai “provocar alteração do volume de água, de intensidade
de luz, contato com microorganismos estranhos, contaminação do ambiente por agrotóxico e
chumbo de gasolina.” O site também noticia que a “UNESCO exigiu providências imediatas
ameaçando inclusive retirar o título de Patrimônio da Humanidade” doado ao PNI. “O
interessante é que na Argentina o mesmo Parque possui 4 estradas federais e ninguém se
importa com isso”, indigna-se Dallo (1999, pg. 143).
Para propulsionar o desenvolvimento do Paraná foram construídas várias estradas
asfaltadas que ligam todos os pontos do Estado, porém, o trajeto oficial de deslocamento do
Oeste ao Sudoeste paranaense aumenta o percurso em, aproximadamente 120 km. Outra
opção é a utilização de estradas da Argentina.
O IBAMA5, em 1981, edita o Plano de Manejo
6 do PNI, definindo como um dos
principais objetivos interditar o Caminho do Colono, desde que houvesse um acordo com os
municípios vizinhos ao parque (OSTROVSKI 2002). Esse objetivo não se concretizou nos
cinco anos subseqüentes, devido à inexistência de medidas para que houvesse o cumprimento
do Plano de Manejo.
O Plano de Manejo do Parque Nacional do Iguaçu, produzido para o período de 1982 a
1986, que deveria sofrer revisão periódica a cada cinco anos, considera que o parque possui
três usos conflitantes: O Hotel Cataratas, a Rodovia das Cataratas e o Caminho do Colono.
Apenas este último teve restrição aplicada.
O órgão então responsável pelo parque, IBDF–Instituto Brasileiro de Desenvolvimento
Florestal7, apresentou negativa para o plano de asfaltamento do trecho dentro do PNI proposto
pelo Governo Estadual, que executava obras de pavimentação em todo o percurso da rodovia,
reafirmando os objetivos apresentados no Plano de Manejo. Os municípios próximos,
entretanto, manifestaram-se a favor dos planos rodoviários. O DER, então, apresentou um
projeto para atender os dois interesses, o de preservar o parque e o de asfaltar a estrada:
[...] o projeto atende a sinuosidade da Estrada existente [implantando] de ambos os
lados uma cerca alambrada com tela galvanizada [...] com 2m de altura útil. O
projeto prevê, ainda, um moderador de velocidade de veículos com a construção de
sonorizadores e lombadas em pontos convenientes distanciados a cada 3 km. Para a
preservação da fauna, deverá ser implantada nos cursos d’água [...] uma passagem
para animais, sob obras de arte especiais, [...] formando corredores de ligação entre
ambos os lados do parque [...] com o propósito de impedir a saída dos animais para o
corpo da Estrada. (IBAMA Apud BONASSA, 2004, pg. 14)
Entra no conflito a entidade ambientalista ADEA- Associação de Defesa e Educação
Ambiental8, que se coloca a favor do fechamento da estrada para melhor preservação do PNI.
Estes fatos motivaram um membro do Partido Trabalhista Brasileiro, a apresentar, em
julho do ano de 1986, Noticia Criminis e Denúncia contra o ato do DER. Mesmo com o
indeferimento deste pedido, no dia quatro de setembro do mesmo ano, o Juiz da 1ª Vara da
Justiça Federal, determinou o fechamento imediato da BR-163 no trecho que corta o PNI. A
liminar é cumprida oito dias após a determinação Federal e no dia doze de setembro
interditou-se o Caminho do Colono.
Tal situação provocou revolta na população da região e no mês seguinte surge a
AIPOPEC-Associação de Integração Comunitária Pró-Estrada do Colono, entidade formada
pelas prefeituras, câmaras municipais, associações comerciais e industriais, sindicatos e
entidades comunitárias de mais de 40 municípios do Oeste e Sudoeste do Paraná, com a
5 Atual IBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. (Nota das autoras)
6 Documento técnico que, com base nos objetivos de uma unidade de conservação, define seu zoneamento,
orienta e controla o manejo de seus recursos. (Nota das autoras) 7 Autarquia Federal sucessora do atual IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis. (Nota das autoras) 8 Primeira organização ambientalista, sem fins lucrativos do Estado do Paraná, criada em 1974. (Nota das
autoras)
finalidade de representá-los judicialmente promovendo ações que mobilizem e sensibilizem
autoridades para reabertura da estrada. Seu foco é promover a integração comunitária
regional, estadual e interestadual com postura de neutralidade política. Também propõe
defender e preservar os recursos ecológicos de todo o PNI, assim como denunciar as
agressões nele feitas.
Em 1987 os municípios organizados requereram, perante a Justiça, prova pericial de que
o asfaltamento da estrada do colono, segundo os moldes propostos pelo DER-PR, através do
Projeto da Estrada Parque Regional, seria prejudicial ao parque. O pedido foi concedido,
entretanto, devido ao não pagamento dos honorários periciais, determinados de
responsabilidade do Estado do Paraná pela Justiça, os trabalhos de perícia não foram
concluídos (BONASSA, 2004).
Após quatro anos do fechamento, em 1990, ocorre o apogeu quanto à polêmica
“Caminho do Colono”. Inúmeros desdobramentos pró e contra a reabertura chamaram a
atenção do Governo Federal e a primeira manifestação contrária é a do Ministro do Meio
Ambiente do Governo Collor que afirmou estar disposto a fazer de tudo para evitar que a
estrada fosse reaberta. Ao contrário, o então Governador do Estado do Paraná, Álvaro Dias,
afirma estar empenhado em conseguir na Justiça a reabertura da estrada, considerando-a
imprescindível para a região. Mediante o sufrágio do Governador, o Juiz da Vara de Justiça
Federal de Foz do Iguaçu-PR, manifestou que não colocaria obstáculos à reabertura, o que
motivaria realização de novas manifestações favoráveis.
A AIPOPEC, em reunião realizada em maio de 1990, movida pelas declarações de
apoio recebidas, acatou a sugestão de realizar um movimento popular pró Parque Nacional do
Iguaçu, marcado para 15 de junho, conseguindo chamar a atenção no âmbito nacional,
reunindo cerca de 30 mil pessoas. Várias autoridades, como o Governador do Paraná, Álvaro
Dias, e o Governador de Santa Catarina, Cassildo Maldaner, Deputados Federais e Estaduais,
Prefeitos e Vereadores de toda a região participaram da manifestação.
A medida não surtiu efeito. O então juiz federal da 1ª Vara no Paraná, cinco dias após a
grande manifestação, proferiu sentença mantendo-a em caráter definitivo. Em 1997, a
AIPOPEC apresentou proposta para a integração do parque com a região:
Na proposta, o Parque era concebido como “a face morta dos municípios” que lhe
fazem divisa [...] “alienado de sua geografia”[...], a AIPOPEC propunha uma
revitalização ampla, de forma a integrar o Parque às necessidades da região, nos
aspectos econômicos [...], culturais [...], políticos [...], ambientais (centros de
pesquisa, educação e restauração ambiental, conservação de solos, destino adequado
de resíduos, corredores de biodiversidade). [...] o que tornaria todas as propostas
viáveis seria a Estrada aberta, “dentro de uma visão moderna do desenvolvimento
sustentado”, onde a Estrada tornar-se-ia um “benefício efetivo para o Parque
Nacional e para toda a região” [...] todos os impactos ambientais seriam
devidamente controlados.(BONASSA, 2004, pg. 16).
Ao mesmo tempo em que isso foi proposto, a Associação pediu a reabertura da estrada e
deu suporte à primeira invasão da Estrada do Colono, que ocorreu no dia oito de maio do
mesmo ano. Teve, ainda, o apoio de Deputados e Prefeitos dos municípios integrantes da
AIPOPEC. Com isso, o Presidente do Tribunal Regional Federal, derrubou liminar que
mantinha a estrada fechada e autorizou o uso do caminho. Ostrovski conta que cerca de 30
homens realizaram o cascalhamento e patrolamento do caminho.
A situação manteve-se por pouco tempo, até meados de junho, quando foi proposta pelo
IBAMA uma revisão do plano de manejo do PNI, para a inclusão do uso da estrada, se a
mesma fosse desocupada em noventa dias. Entretanto, o plano não foi revisto, ao invés disso
foi elaborado um estudo por engenheiro responsável apontando os impactos provocados pelo
uso da estrada no ambiente circundante. A AIPOPEC reagiu contra esse estudo e iniciou-se
nova manifestação popular, desta vez comandada pelo MAP-Movimento Amigos do Parque9.
Ostrovski (2002, pg. 117) conta que em junho de 1999, criou-se extensiva campanha de
incentivo à população lindeira para o envio de 40 mil cartas ao então Presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso, “contando a história da ocupação do Oeste paranaense e a
importância histórica do Caminho do Colono para a colonização e a manutenção de uma
sustentabilidade econômica regional.” Em novembro de 2000 a estrada é legalmente reaberta:
[...] atendendo a uma decisão do Supremo Tribunal Federal que permitia o uso da
Estrada a partir do dia 14 de novembro, enquanto se aguardava um novo julgamento.
Esta decisão era provisória e não anulava o despacho judicial de julho de 1997, do
Superior Tribunal de Justiça, que determinou o fechamento. (BONASSA, 2004, pg.
18).
Um ano após a reabertura, o exército, o Comando de Operações Táticas (COT) da
Polícia Federal, da Polícia Florestal e IBAMA promoveram o fechamento da Estrada,
entrando em confronto direto com a população invasora. Ainda, em 4 de outubro de 2003,
ocorreu a terceira invasão da estrada, que durou poucos dias, devido ao temor de um novo
confronto com a polícia. Assim o local foi ocupado pela Polícia Militar para que não houvesse
mais invasões.
Dias (2007) menciona na proposta do Plano Diretor para Capanema que o fechamento
da Estrada do Colono acabou com uma das principais fontes de renda da população. A estrada
também foi de extrema importância para a cidade de Medianeira, ajudando no
desenvolvimento local através da facilidade de acesso que proporcionava. Na proposta para o
Plano Diretor de Medianeira, Dias (2007) afirma que o fechamento da estrada criou: “[...] um
déficit econômico negativo para o município”. Outro município prejudicado foi Serranópolis
do Iguaçu, que se originou da junção de dois distritos rurais de Medianeira, possuindo
características basicamente agrícolas. A maior parte do município encontra-se na Zona de
Transição10
do Parque Nacional do Iguaçu. Assim, a cidade recebe através da Lei
complementar n°59/51, que institui o pagamento aos municípios que possuam áreas de
conservação no seu território ou que sejam influenciadas por essas áreas, pagamento do
Governo do Estado do Paraná, o que, segundo Bonassa (2004), representou 70% do
orçamento da prefeitura de Serranópolis do Iguaçu em 2002.
Em publicação pertinente ao conflito, o Jornal do Oeste (2000), relatou conclusões do
estudo elaborado pelo professor e economista Ademir Clemente, da Universidade Federal do
Paraná (UFPR):
[...] conclui que as duas regiões perderam cerca de 4 bilhões de reais com o
fechamento da rodovia e a cidade de Capanema teve sua população reduzida de 32
mil para 18 mil habitantes, devido ao seu isolamento. A produção de frangos e
suínos também caiu drasticamente na região [...] Capanema perdeu 250 empresas e
327 milhões de dólares em riquezas entre os anos de 1987 e 1995, enquanto no
mesmo período Planalto e Pérola do Oeste perderam 100 milhões de dólares cada
uma. No Oeste, os municípios que mais perderam foram Medianeira, Missal, Santa
Helena e São Miguel do Iguaçu. (J. DO OESTE, 12/mar/2000, pg. 12)
Dallo (1999) cita em sua publicação os parques cortados por estradas que Dr. Kit
Abdala11
conta ter atravessado:
9 Com sede em Curitiba e presidida naquela ocasião por João José Bigarella. (Nota Bonassa)
10 Também denominada zona de amortecimento: é o entorno de uma Unidade, onde as atividades humanas estão
sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade.
(Nota Bonassa) 11
Médico e consultor internacional da JHPIEGO (Johns Hopkins Program for International Education in
Gynecology and Obstetrics) para os países da África, Ásia, Caribe e América Latina. (Nota Dallo)
Na Tanzânia, por exemplo, o fabuloso Serengeti Park, [...], tem uma estrada que o
atravessa por mais de 500 Km; as crateras de Ngorongoro têm uma estrada de mais
de 280 Km; o Parque Kilimanjaro, mais de 300 Km; o Parque Selous é atravessado
por mais de 700 Km; o Parque Tsavo, no Quênia, tem uma estrada de mais de 500
Km; o Grand Cannyon, [...], o Yosmite, o Yellow Stone e centenas de outros
parques famosos são atravessados por centenas de quilômetros e nem por isso
destruíram seus Parques. (DALLO, 1999, pg.52)
Um exemplo de estrada versus preservação no Estado do Paraná é o caso da Rodovia
PR-410, conhecida como Estrada da Graciosa, nascida da antiga rota dos tropeiros em direção
ao litoral do Estado. Desce a serra atravessando 20 Km dentro da Mata Atlântica e limita dois
importantes parques estaduais: o Parque Estadual da Graciosa e o Parque Estadual Roberto
Ribas Lange. Em 1993, parte do trecho foi declarada pela UNESCO como Reserva da
Biosfera da Mata Atlântica (MAPA VIVO, 2007).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Acredita-se que esse capítulo da história (ver APÊNDICE 01) ainda não foi encerrado,
pois, ainda hoje, percebe-se uma população motivada, apenas aguardando novos estímulos
que a leve a promover movimentos pró-reabertura Estrada do Colono.
Quando o Caminho do Colono foi fechado interrompeu-se o fluxo comercial, quase que
por completo entre as regiões Oeste/Sudoeste. A consequente e consecutiva queda nas trocas
comerciais e na arrecadação de impostos são reflexos da inviabilidade de certas transações
econômicas devido à nova distância imposta, pois, se antes, a ligação de pontos comerciais
que não ultrapassava cem quilômetros, em questão de dias, muda para mais de duzentos e
cinqüenta. Essa nova realidade econômica produz efeito negativo que se espalha por toda uma
extensa rede de ligações e interconexões, devido a um estreito nível de interdependência
regional.
Viu-se neste tema a oportunidade de contextualizar uma situação de aplicabilidade da
Política de Desenvolvimento Urbano e Regional para o Estado do Paraná (PDU), que tem
como proposta organizar um sistema de planejamento que apóie programas, projetos e ações
que visem a melhoria das condições de vida e ampliação das oportunidades de geração de
emprego e renda.
Se o fechamento torna-se inevitável e irreversível, deve-se discutir obras
compensatórias a estas regiões, que venham a suprir as lacunas deixadas pela falta
de ligação. [...]. Preservar as populações locais e evitar migrações é um fator
importante que deve ser considerado. (OSTROVSKI, 2002, pg.144)
Não se pode negar que se, por um lado, o fechamento trouxe prejuízos econômicos e
sociais às regiões próximas à estrada, peculiarizadas por processos de contínua evasão
populacional e desempenho socioeconômico, por outro, certamente promoveu o
desenvolvimento daquelas regiões lindeiras à rodovia que circunda o parque, devido ao
aumento de oportunidades motivadas pela nova logística, agora obrigatória.
Compreende-se as exacerbadas reações dos ambientalistas quando se analisa o que se
passava na época: o Governo Estadual executava obras de pavimentação em todo o percurso
da rodovia e planejava adentrar o trecho do PNI com os mesmos padrões rodoviários. Previam
o tráfego de cargas de grande porte e maior velocidade dos veículos, o que, necessariamente,
corrigiria e alteraria aclives e curvas do traçado original.
Na esfera ambiental, não se tem conhecimento bibliográfico de medidas que
promoveram maior preservação ao parque senão aquelas realizadas pela população a favor da
reabertura da estrada. Não faltaram propostas de uso racional e equilibrado do Caminho do
Colono, dentro de uma consciência preservacionista da população local, principalmente a do
Sudoeste do Estado, condenada ao isolamento.
Para essas questões sempre haverá, para ambos lados do conflito, argumentos relevantes
e verdadeiros que sinalizam os ânimos movedores da discussão. A lei impera: sensata ou
insensata; adequada ou inadequada; tolerante ou intolerante; racional ou irracional; mas,
certamente, polêmica.
REFERÊNCIAS
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OSTROVSKI, Dalésio. Análise dos impactos sócioambientais motivados pelo caminho do
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SALAMUNI, Riad (in memorian); Salamuni, Eduardo; Rocha, Luiz A.; Rocha, Ana L. O
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<http://www.worldtwitch.com/spvs.html> Acesso em: 08 fev.2009
APÊNDICE 01 – QUADRO HISTÓRICO DA ESTRADA DO COLONO
DATA ACONTECIMENTO
28/7/1916 Decreto nº 653 prevê a desapropriação de uma área de 1008 ha para reserva legal.
1924 A Coluna Prestes passou por uma trilha que afirmam ser o Caminho do Colono.
20/10/1930 Decreto Estadual nº 2.153, ampliou a área para 3.360,90 ha.
10/1/1939 Decreto Federal nº 1.035, assinado por Getúlio Vargas, cria-se o Parque Nacional do Iguaçu.
1940 Concretiza a criação do Caminho do Colono, surgindo como um dos elementos que facilitam a inserção da região Oeste do Estado do Paraná na economia regional e nacional.
1942 Cria-se infra-estrutura básica para a manutenção do parque, com Residência oficial, a Administração, Hotel das Cataratas, além das casas dos funcionários estando o parque apto à visitação publica.
17/5/1944 Decreto Lei Federal nº 6.506, desapropria-se para utilidade publica as terras situadas no Estado do Iguaçu, as quais foram incorporadas ao parque.
14/6/1944 Decreto nº 6.587, incorpora a esta reserva área pertencente ao Patrimônio da União, atingindo como limite Leste o Rio Gonçalves Dias; e ao Sul o Rio Iguaçu; e ao Norte a rodovia Iguaçu – Cascavel; e ao Oeste o Rio São
João.
1954 A estrada foi oficializada pelo DER.
1/12/1981 Decreto nº 86.667, fixa os novos limites, esclarecendo divisas até então em discussão.
1981 Primeira medida proferida contra o funcionamento do Caminho do Colono, quando o IBAMA edita o Plano de Manejo do PNI, definindo como principal objetivo interditar a estrada BR-163.
1986 O Estado do Paraná inicia as obras de asfaltamento da BR-163, com projeto para asfaltar o trecho Caminho do Colono.
4/9/1986 A 1a Vara da Justiça Federal determina o fechamento imediato da BR-163 no trecho que corta o Parque Nacional do Iguaçu.
12/9/1986 O Juiz Dr. Milton Luiz Pereira concretiza o fechamento da estrada.
16/9/1986 O Procurador geral do Estado do Paraná solicitou ao Presidente do Tribunal Federal de Recursos, a revogação da liminar, tendo o TFR confirmando a decisão em primeira instância mantendo a estrada fechada.
24/5/1990 A AIPOPEC reúne 30 mil pessoas em um movimento popular pró Parque Nacional do Iguaçu.
nov/93 O STR deu provimento ao recurso interpostos pelos municípios lindeiros ao PNI, restabelecendo o direito à elaboração de provas e perícias.
24/4/1997 Os integrantes da AIPOPEC reuniram-se em Brasília com diretor do IBAMA, entregando o projeto de revitalização do parque e consequentemente de reabertura da estrada.
8/5/1997 Cerca de 2000 agricultores montam acampamento no Parque Nacional do Iguaçu.
12/5/1997 Liberam a passagem de veículos pela estrada.
12/5/1997 A AIPOPEC protocola no Tribunal Regional Federal um pedido para que seja derrubada a liminar eu fechou o caminho.
13/5/1997 Ocorre uma mobilização que reuniu cerca de 40 mil pessoas, restabelecendo a ligação entre as duas regiões.
15/5/1997 Realizou-se assinatura entre o IBAMA e a AIPOPEC, prevendo a desocupação do parque e a formação de uma comissão para estudar alterações no Plano de Manejo da reserva.
26/5/1997 O presidente do TRF, Pedro Máximo Paim Falcão, derruba a liminar que mantinha fechada a estrada.
19/6/1997 O Ministro do Superior Tribunal da Justiça determina novo fechamento do Caminho do Colono, alegando que Paim Falcão não tinha competência para julgar o mérito.
27/6/1997 Foi decidido que o Caminho do Colono será fechado por três messes, para que o IBAMA promova estudos para um novo Plano de Manejo.
12/1/1998 Como o prazo de três messes expira sem que o IBAMA promova os estudos, populares voltam a abrir a estrada.
jun/99 Cria uma intensiva campanha de incentivo a população lindeira, enviando 40 mil cartas ao presidente Fernando Henrique Cardoso, contando a história e a importância do Caminho do Colono para a colonização e a
manutenção econômica regional.
2/12/1999 A Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior da Câmara aprova o parecer, que define o Caminho do Colono como Zona de Uso Intensivo do PNI.
30/02/2000 Os peritos concluíram que os impactos causados ao meio ambiente serão bem menores que os grandes benefícios que ela trará aos municípios e a população.
1/6/2000 A Comissão do Meio Ambiente da Câmara dos Deputados aprova a abertura do Caminho do Colono, permitindo o uso intensivo do Caminho do Colono.
13/6/2001 Cumpre-se a liminar da Juíza Marga Ingá Tessler do Tribunal Regional Federal da 4a Região de Porto Alegre, de fechamento do caminho, sendo que o pedido havia sido feito há mais de um ano e meio, no mês de Janeiro de 2000.
13/6/2001 Mobilização realizada para o fechamento efetivo da estrada contou com a chegada no local de seis ônibus, oito viaturas, dois helicópteros e caminhões com homens da Policia Federal, apoiados pelo exército, para efetuar a
dinamitação do percurso.
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