OS PERIGOSESCONDIDOS
NOS ALIMENTOS
E COMO NOSPODEMOS PROTEGER
Os produtos mais comuns estão carregados de substâncias que provocamdoenças e podem levar à morte. Sete especialistas em nutrição, segurança e química
alimentar explicam o que é possível fazer para evitar os riscos
Por Susana Lúcio
maçã com que
engana a fome aK meio da manhã;
o peixe-espadagrelhado que
ao almoço,bolachas que
mastiga ao lanche ou o bife queguardou no frigorífico podem pare-cer inócuos e ate saudáveis. Mas,escondidos nestes alimentos, podemestar pesticidas, micropoluentes,aditivos e bactérias que, em últimainstância, podem levar à morte.
Não, não é exagero. O consumo de
carne contaminada em casa é a prin-cipal causa de mortalidade por infe
cão alimentar na Europa. Os aditivos
existentes nos doces que dá aos seus
filhos podem provocar alergias, hiperatividade e mesmo cancro. Os pei-xes predadores como o peixe espada e ou atum estão mais sujeitos à
contaminação por metais pesados do
que as espécies mais pequenas. Os
legumes e a fruta são muitas vezes
pulverizados por um verdadeirococktailáe pesticidas cu]os efeitos
não estão estudados: em 20Í7, foram
detetados vestígios destes produtostóxicos em 97% das mais de 84.000amostras analisadas pela Autoridade
Europeia para a Segurança Alimentar(EFSA). E cerca de 25% das culturas
no mundo estão contaminadas porsubstâncias tóxicas produzidas porfungos que podem ser cancerígenos.
Existem centenas de aditivos,
alguns necessários para conservaras características dos alimentos, e
foram estabelecidas doses diárias
admissíveis, consideradas seguras
pelas autoridades europeias e portu-guesas. Porém, há sempre um risco
no consumo de produtos com mui-tos aditivos. "Os estudos efetuados
nesta área têm alguns limites, umavez que se realizam em animais e a
extrapolação dos dados para o ho-mem não é completamente satisfa-
tória", avisa a Autoridade de Segu-
rança Alimentar e Económica(ASAE). Mais: "A dose diária admissí-vel pode ser ultrapassada, em resultado do crescente número de ali-mentos a que se podem adicionarum ou mais aditivos e, depois, da sua
combinação na dieta alimentar."Perante isto, o que devemos comer
A CARNEDEVE SER
AQUECIDANO FOGÃO E
NÃO NO MI-CRO-ONDASPARA ELIMI-
NAR ME-LHOR AS
BACTÉRIAS
A investigadorada Faculdade
de Farmácia daUniversidade
de Lisboa estu-da a presençade mercúrio na
populaçãoportuguesa
A MAIORIADOS CASOS
DE INFEÇÃOALIMENTAROCORRE EM
CASA DOSCONSUMI-
DORES
e como podemos evitar os riscos as-sociados aos diferentes alimentos? É
o que sete especialistas em nutrição,
segurança e química alimentar expli-cam à SÁBADO ao longo das próximas páginas, divididas em diferentes
categorias: carne, peixe, fruta c vege-tais, cereais e alimentos processados.
CARNEO GRANDE PERIGODAS INFEÇÕES EM CASAO O risco maior de contaminaçãonas carnes são as infeções por bac
terias, nomeadamente Listeria mo-
nocytogenes, que pode provocaraborto, meningite e até a morte.Mas, neste caso, a prevenção do
problema passa também pelo con-sumidor e não só pela produção do
alimento. "Por muitos cuidados quese tenha no abate, na desmancha e
na distribuição da carne e dos pro-dutos cárneos, se o consumidor não
transportar devidamente os alimen-tos para casa, se não os conservar
em temperaturas de real refrigera-ção cm casa (inferiores a 4 "O c se
não os cozinhar bem podem ocorrer
toxi-infeções alimentares", adverteà SÁBADO Teresa Letra Mateus,
professora da Escola Superior Agrá-ria do Instituto Politécnico de Vianado Castelo e membro do Departamento de Saúde Pública Veterináriado Instituto de Saúde Pública daUniversidade do Porto.
A bactéria está presente no solo, na
água e nos alimentos dos animais e é
tolerada até valores considerados se-
guros pela EFSA. Em 2018, a investi
gadora foi autora de um estudo quedetetou a Listeria spp - o estudo nãoanalisou se a espécie era a Listeria —monocytogenes em 15% das
amostras de carne fresca de porco ede vaca.
A indústria usa processos tecnoló
gicos e aditivos
para a reduzir,
mas é nas cozi-nhas das famí-lias qué ela é
mais detetada. Segundos estudos re-cenres, a maioria dos casos de infe-
ção alimentar ocorre em casa dos
consumidores. "Um surto numa es
cola ou num hospital tem mais visi
bilidadc, já as toxi-infeçõcs no domi-cilio são difíceis de agregar, não tèmo mesmo impacto, sendo a maioriadas vezes subdiagnosticadas e sub-notificadas." Para a eliminar bastaconfecionar os alimentos a uma tem
peratura superior a 65 graus Celsius.
Mas mesmo que a tenha eliminado
quando cozinhou a carne, a bactéria
pode surgir novamente no frigorífico,se guardar as sobras para consumir
mais tarde. "A bactéria desenvolve-se em temperaturas baixas e quanto
mais tempo os alimentos ficam no
frigorífico, mais tempo a Listeria tem
para se desenvolver, podendo atingirfacilmente números capazes de pro-vocar doença."
Nada disto seria problemático se
o reaquecimento fosse feito a tem
peraturas apropriadas. "Hoje usa
se mais o micro-ondas c este nãoé tão eficaz quanto o fogão paraaquecer de forma uniforme a refei-ção e a temperaturas que eliminema bactéria."
A questão é que o perigo de conta
O maior risco de contamina-ção são as infeções por
bactérias como a Listeria
monocytogenes - podeprovocar aborto, meningite
e a morte
minação não se resume a uma infe-
ção alimentar. "A listeriose pode pro-vocar a morte por meningite e septi-cemia. E pode ainda provocar o
aborto." É mesmo a principal causade mortalidade por origem alimentarna Europa.
UM ESTUDOIDENTIFICOU
NÍVEIS DEMERCÚRIOELEVADOS
NO SANGUEDE RECÉM--NASCIDOS
A ESCOLHADE PEIXE
DEVE RECAIREM ESPÉCIES
PEQUENASCOMO A
SARDINHAOU O
CARAPAU
per capita Cada português ingerecerca de 56,5 kg por ano, quando amédia na União Europeia não passados 22,7 kg. Só a Islândia (91 kg/ano)e o Japão (65 kg/ano) consomemmais. São boas notícias porque o peixe é rico cm ácidos gordos polinsaturados, ómega 3 importantes para asaúde do sistema cardiovascular e
essenciais durante a gravidez para odesenvolvimento do feto.
Mas algumas espécies estão sujeitasà poluição que existe nos oceanos,nomeadamente a metais pesados
comocádmio, arsénio
e chumbo e a
poluentes orgâ-nicos persisten-tes (POP), estes últimos produzidossobretudo pela indúsrria e pela agricultura. A concentração de mefilmer
cúrio, a substância sintetizada do
mercúrio por bactérias, é o problemamais preocupante porque prejudicao desenvolvimento neurológico.
Mas não risque o peixe da sua listade compras. Há que saber esco-lher. Deve-se reduzir o consumo de
peixes predadores que se alimen-tam de outros peixes e assim acumulam mais mercúrio no organismo", explica à SÁBADO CristinaCarvalho, investigadora do Institutode Investigação do Medicamento daFaculdade de Farmácia da Univer-sidade de Lisboa.
Estamos a falar de animais de
maior porte como o peixe espadapreto, o atum (fresco), o espadarte,o cação e os da família dos tuba-rões como a tintureira e o anequim."O atum enlatado é de outra espé-cie e tem 10 vezes menos mercúrio
que o vendido fresco", garante a
investigadora.A escolha deve recair em espécies
pequenas como a sardinha, o cara-
pau, a sarda e nos peixes produzidosem aquacultura, como a dourada e o
salmão, onde a alimentação é maiscontrolada e que são ricos em ácidos
gordos ómega 3.
O problema d mais premente nasmulheres grávidas. "E uma altura em
que não devem deixar de comer pei-xe porque o ómega 3 é muito impor-tante para o desenvolvimento do
feto", mas também em que o risco O
PEIXEOS RISCOS PARAGRÁVIDAS E CRIANÇASO Portugal c o terceiro pais no mun-do onde se consome mais pescado
Inovações parareduzir os riscosOs cientistas estão a
desenvolver novas técnicaspara minimizar o uso de
aditivos e pesticidas
Alta pressãoSubmetem-se os alimentos
a pressões muito elevadas,
geradas pela água, que
terar significativamente os
alimentos. Usados nos sumos, es-
tuda-se a sua aplicação na fruto
fresca fatiada.
destroem os micróbios sem ai
Embalagens ativasSão recipientes com agentes debiocontrolo, como bactérias, que
absorvem gases ehumidade de modo a
conservar os alimentos.
BacteriófagosSão vfrus inofensivos para
os humanos que destroem cer-tas bactérias como Listeria spp.
sem eliminar outros micro-
-organismos presentes nosalimentos e que são benéficos.
NanoencapsulaçãoUso da nanotecnologia para en-
capsular nutrientes, comovitaminas, que são libertados de
forma controlada paraserem totalmente absorvidaspelo intestino. Permite ainda
abrandar a oxidação e
aumentar o tempo de
prateleira dos produtos.
O de contaminação do bebé pormercúrio é muito maior porqueeste é transmitido tanto pela pla-centa, como pelo leite materno.
A presença do metal nos oceanosdeve-se à poluição humana, sobre-tudo mineração c várias outras in-dústrias, mas também a fenómenos
naturais, como o desgasto natural da
crosta terrestre, e está presente emzonas vulcânicas, como a ilha da Madeira. Foi aqui, onde o consumo de
peixe espada c espadarte domina a
gastronomia, que a investigadora en-controu números preocupantes.
"Fizemos um estudo com mais de500 mulheres grávidas, recolhemos
amostras de sangue c no cordão um-bilical dos bebés quando nasceram e
verificámos que em 30% delas a pre-sença de mercúrio no sangue supe-rava o limite máximo definido pelaOMS, 10 microgramas por litro", ex-plica a investigadora. Durante a realização do estudo, que foi submetido
para publicação no Journal ofToxicology and Environmental Health as
mulheres foram informadas sobre as
espécies de peixe que não deviamconsumir e nas amostras do cordãoumbilical os valores de mercúrio não
eram tão elevados. "Notámos umamodificação de hábitos alimentares edevemos continuar a informar a po-pulação." Um estudo anterior esti
mou em 28% o número de mulheres
em risco em Portugal Continental.
As crianças também são um gru-po de risco e o consumo destes
peixes predadores deve ser evita-da especialmente nos primeirosanos de vida. As mulheres queplaneiam engravidar não devemcomer mais do que uma refeiçãodestes peixes por mês.
Segundo o Plano de Colheitas de
Amostras da ASAE, em 2017, foramdetetados valores superiores cm 8%das amostras de pescado analisadas.
CEREAISTOXINAS NATURAIS E
IMPOSSÍVEIS DE ELIMINARO Um dos riscos que poderão não
ser visíveis para o consumidor é a
presença de toxinas produzidas porfungos que podem contaminar vá-rios alimentos, incluindo produtos
agrícolas. "As micotoxinas são sub
stâncias naturais que se desenvol-vem nos alimentos quando ocorremcondições ideais de humidade e
temperatura", explica à SÁBADO
Paula Alvito, investigadora do Insti-tuto Nacional de Saúde Doutor Ri-cardo Jorge (INSA).
Os bolores que se desenvolvem nafruta e no pão podem conter micotoxinas e estas podem ser detetadas
nos campos, durante a colheita, no
armazenamento e no transporte dos
alimentos. "É um problema mundial,estima-se que cerca de 25% das cul-
As alfaces e o efeitodos medicamentosOs cientistas investigam apassagem do paracetamol dosolo e da água para alimentos
Para além dos pesticidas.foram detetados resíduos defármacos corno paracetamol c
ibuprofeno, ainda que em con-
centrações baixos, em solos e
águas subterrâneas. "Osfárma-cos são excretados e vão pa-rar às águas residuais", exp li-
ça a professora Cristina Delerue--Matos do instituto Superior de
Engenharia do Porto. As esta-
ções de tratamentos de águasresiduais não têm capacidadepara eliminar estes mícropoluen-:es e podem aparecer nos ali-
mentos. A cientista coordenauma equipa que está a avaliar
em laboratório o nível de toxici-
dade, usando plantas como a al-
face, e a desenvolver técnicas
que permitam a sua remoção.
Os peixes de maior portealimentam-se de outros mais
pequenos e assim acumulammais mercúrio no organismo
PaulaAlvito
A investigadorado InstitutoNacional de
Saúde DoutorRicardo Jorge
analisa a
presença demicotoxinas
nos cereais e
na fruta
turas estejam contaminadas", diz a
investigadora. São substâncias tóxi-
cas que se desenvolvem sobretudo
em climas semitropicais e tempera-dos e que resistem ao processamentoindustrial. Por essa razão, é ainda im-possível eliminá-los por completodos alimentos.
O problema é que das centenasde micotoxinas existentes, algu-mas têm efeitos tóxicos comoperturbações nos sistemas diges-tivos, renais e imunitário e podemmesmo provocar cancro. Segundoa Agência Internacional de Invés
tigaçâo em Cancro, da Organização Mundial de Saúde, as mais
perigosas são as aflatoxirias e as
ocratoxinas.O trigo, o milho, a cevada, o sorgo e
o arroz são alguns dos cereais onde
podem surgir as aflatoxinas. Váriosestudos concluíram que estas subs-tâncias podem provocar cancro, no-meadamente, no fígado. O problematambém foi detetado em Portugal.Em 2017. um estudo do INSA, publi-cado em 2017, analisou 83 amostrase encontrou micotoxinas em 96%dos cereais de pequeno-almoço,50% das farinhas infantis, 50% das
bolachas, 40% das fórmulas infantis e
19% dos leites UHT. Mas todos os va-
lores estavam abaixo dos limitesmáximos permitidos pelas Comissão
Europeia, valores estes que foramdeterminados por vários estudos
toxicológicos através dos quais foramdefinidas doses diárias toleradas porquilograma de peso corporal, consideradas seguras.
A ASA£ realiza programas de con
DulceRicardo
A engenheiraalimentar daDeco realizouestudos quedetetaram
pesticidas emazeite c vinho
SE COMER-MOS SEMPREOS MESMOSALIMENTOSPODEMOS
ESTAR MAISEXPOSTOS
ÀS TOXINAS
PãoOs bolores que se desenvol-vem no pão podem contermicotoxinas que provocam
perturbações no sistema¦, digestivo, renal e imunitário
trolo nacional para verificar se os
teores encontrados não ultrapassamos valores máximos permitidos por
lei. E foi criado o Sistema de Aler-ta Rápido para a AlimentaçãoHumana e Animal através do
qual os países europeus são
notificados quando são detetadosalimentos com valores superioresaos legislados. No ano passado, aASAJi fez 12 notificações sobre a en-trada no País de produtos com valo-
res superiores aos permitidos de
aflatoxinas, a maioria de produtosimportados.
"Não há contaminação zero",
salienta a investigadora Paula Alvito."Mas a situação está controlada." Aúnica forma de evitar problemas de
saúde é ter uma alimentação diversificada. "Se comermos sempre os
mesmos alimentos podemos estar
mais expostos às toxinas."
O problema é inerente à agricultura, mas foi ignorado até ao século
passado. Foi em 1962, quandomorreram cerca de fO.OOO peruscm Londres que se descobriram as
micotoxinas a ração à base de
amendoins estava contaminadacom aflatoxinas. "As micotoxinas
sempre existiram, mas nós nãotínhamos em termos analíticos ca
pacidade para as deterar."As micotoxinas controlam-se se se
respeitarem as boas práticas agrícolas: o momento em que se colhe o
produto, o tempo que fica a secar,como é feito o transporte e o arma-zenamento. "Há investigação a de-correr para desenvolver produtos
que mitiguem o desenvolvimentodos fungos."
FRUTAE VEGETAISBOLORES E COCKTAILSDE PESTICIDASO A fruta também pode ser conta-minada por micotoxinas. "Entre as
toneladas de frutos que são usados
para fazer sumo, pode haver frutos
estragados ou com partes podresonde se desenvolvem fungos quepodem produzir toxinas", explica a
investigadora Paula Alvito. O
O A patulina ca mico toxina quepode contaminar maçãs - e estar
presente nos sumos -. pêras, pêsse-
gos, cerejas e uvas. Segundo a lARC(International Agency for Research
on Câncer), esta micotoxina pode terefeitos tóxicos no sistema nervoso eno sistema imunológico. Em 2016, a
patulina foi detetada em Portugal so-bretudo em pêras e maças num es-tudo que analisou 50 amostras defruta durante o processo de fabricode sumos. Realizado pelo INSA, o es-tudo Avaliação dos Teores de Patuli-na em Sumos de fruta durante o
Processamento Industrial concluiu
que os valores encontrados estavamabaixo do permitido pela lei, pelo
que se concluiu que havia "qualida-de no processo industrial".
Esta micotoxina também podedesenvolver-se na fruta que temem casa. Se tiver peças de frutacom bolor, o melhor é deitá-la fora.Mesmo a parte que aparenta estarcomestível pode estar contaminadacom micotoxinas.
Outro contaminante presente nafruta e nos vegetais são os pesticidase há vestígios destes produtos tóxi-cos usados para eliminar parasitasem quase todos eles. No seu últimorelatório, em 2017, a EFSA detetou
vestígios de pesticidas em 97% das
84.341 amostras analisadas, entre
bananas, beringelas, brócolos, crvilhas, sumo de laranja e pimento. A
maioria dos valores encontradosestava abaixo do limite máximo de
resíduos definidos. Mas foramdetetados valores superiores em5,6% de produtos provenientes de
países fora da Europa e em 1,7% de
produtos europeus.Estes vestígios dentro dos limites
foram estudados e considerados
seguros, mas mais uma vez, isso foifeito individualmente para cada pes-ticida. "O problema é que em vez de
um pesticida encontrámos cinco. Háum efeito-cockta/íque não está estu-
dado", alerta Dulce Ricardo, enge-nheira alimentar da Deco, "E é difícil
estudar os efeitos que a ingestão si-multânea pode ter na saúde." Foramdetetados mais de 774 pesticidas di-ferentes e em 28% das amostras, so-bretudo nas uvas, bananas, passas e
pimentos, foram encontrados vários
na mesma peça.Se as boas práticas agrícolas fo-
rem respeitadas - fazer a colheitana altura apropriada após o uso do
pesticida - os vestígios são meno-res. "Os produtores usam menos
quantidade de pesticida, mas estão
a usar mais variedade numa só
cultura, porque é mais fácil obteruma rentabilidade boa."
Embora necessários, os pesticidassão químicos tóxicos responsáveis
por problemas graves como redu-
ção na fertilidade, cancro, altera
ções do sistema imunitário e doen-
ças degenerativas do sistema
nervoso, segundo a ASAE.
E não é só na fruta e nos vegetais
que se podem encontrar. Em 2018, a
Deco analisou a presença de pesti-cidas em 24 marcas de azeite vir-
gem extra e detetou resíduos emcinco. "Nenhum no limite máximo",
assegura Dulce Ricardo. Antes, em2015, foram estudados 325 vinhos,
incluindo 75 portugueses. "Cerca de
70% dos vinhos continham pestici-das, mas no limite permitido."
Os vegetais, como a alface, tam-bém podem estar contaminados,como revelou um estudo da Decoem 2007. "Analisámos 90 amostrasincluindo fruta, alface, beringela e
uvas", diz Dulce Ricardo. "Cinco
marcas atingiram os limites máximos
permitidos de pesticidas."
Nuno DiasO engenheiro
químico da
Deco defendeque os aditivos
que geramsuspeitas
deviam ser
proibidos
EM 2018,A DECO
ENCONTROURESÍDUOS DEPESTICIDASEM CINCO
MARCAS DEAZEITEVIRGEMEXTRA
O investigador Sebastião Rodri-
gues do Centro de Toxicogenómicae Saúde Humana da Faculdade de
Ciências Medicas da UniversidadeNova de Lisboa, confia nos limites
impostos pela lei e salienta que nemtudo o que é natural é saudável."Lembro-me do caso de um agricul-tor americano que criou uma varie-dade de alho-francês resistente aos
insetos para usar menos pesticidas.Ao fim de três anos, as autoridades
registaram uma série de interna-mentos hospitalares de pessoas quetinha ingerido esse alho-francês - a
planta produzia toxinas para se
proteger dos Insetos.'Comer fruta sem pesticidas é pos-
É POSSÍVELCOMER LE-GUMES SEMPESTICIDAS:DEVE-SE LA-VAR BEM OSAUMENTOS
EM ÁGUACORRENTE
Corantes e conservantespodem provocar cancro
10 aditivos perigosos
Carmosína (E122), usado
em sopas, refrigerantes, pastelaria,delícias do mar e ovas de peixe.
Azul patenteado V (E131),encontrado em aperitivos,bebidas alcoólicas e decoraçõesde pastelaria.
Verde S (E142), usado em ge-leias, frutos cristalizados,
gelados, doces e sopas.
margarinas, queijo curado, queijofundido aromatizado o cercais.
Anato (El6ob), incluído em
Negro PN (E151), adicionado a
sopas, temperos, condimentos e
bebidas alcoólicas.
Dióxido de titãnio (E171).mineral encontrado empastilhas e drageias.
Prata (E 174), metal adicio
nado a licores e decoraçãode chocolate.
Dióxido de enxofrevkid&lJ), presente em salsi-
chas frescas, milho doce emba-lado em vácuo e em sumo de
lima e limão.
sível. "O ideal era que os alimentos
chegassem ao consumidor sem
qualquer vestígio." Para evitar a sua
ingestão, deve lavar bem os ali-mentos frescos em água corrente."É mais seguro descascar a fruta,mais isso implica perder a fibra queestá na casca."
PROCESSADOSOS ALIMENTOSCOLORIDOSQUE ENVENENAMO Fritos de milho, bebidas alcoóli
cas, bolos coloridos, refrigerantes,molhos, bolachas e refeições preparadas são alimentos cada vez mais
populares, mas que escondem um
perigo - são os que mais aditivos
concentram. A maioria destas subs
tâncias é usada para conservar os
alimentos, mas também são adictonados adoçantes, intensificadores desabor e corantes que, em excesso,
podem ser prejudiciais para a saúde.
Centenas destes aditivos podemprovocar reações alérgicas e hipera-tividade em crianças. Sobre outros há
suspeitas de que podem ter efeitos
cancerígenos: c o caso da sacarina(E954). "É um substituto do açúcarusado em refrigerantes que foi asso
ciado a cancro da bexiga em estudos
com animais", explica à SÁBADO
Nuno Dias, engenheiro químico da
Deco. Entretanto foram realizados
outros estudos que obtiveram resul-tados inconclusivos. "São estudos O
Foram detetadas micotoxinas,substâncias tóxicas produzidas
por fungos, que podem provocarinflamação intestinal
D com limitações porque os animaisrém uma esperança de vida menor
que a dos humanos. E também por-que não avaliam nos animais outras
doenças, como a depressão."A indústria só pode incluir quanti-
dades limitadas de aditivos, chama-das doses diárias admissíveis, determinadas pela ErSA após testes toxi-
cológicos com animais. Mas. tal
como acontece com os pesticidas(ver textos seguintes), também aquinão é conhecido o efeito cumulativodo consumo de aditivos. "Se consumir muitas vezes um alimento comaditivos posso ultrapassar esse va-lor seguro", explica o engenheiroquímico da Deco. O risco é aindamaior nas crianças: "Elas correm
especial risco, porque têm um bai
xo peso corporal."Pior: não são conhecidos os efei
tos da mistura de vários aditivos
num alimento. "Só quando se notamdeterminadas reações c que se elaboram estudos sobre a mistura de
aditivos", crítica Nuno Dias. Foi o queaconteceu em 2007, quando a Universidade de Southampton, no ReinoUnido, investigou a relação entre do-ces com corantes Ingeridos porcrianças e a desordem por défice de
atenção c hiperatividade. Os investi-
gadores analisaram o comportamento de 300 crianças, entre os 3 e os 8
anos, após a ingestão de alimentos
com os corantes tartrazina (E102), oamarelo de quinoleína (E104), ver-melho Allura AC (E129), vermelhocochonllha A (E124), Carmosina(E122). Amarelo-sol TCE (E110) e oconservante benzoato de sódio.
O estudo, publicado na revista Lan-cet. concluiu que aqueles aditivos,
presentes cm refrigerantes, gomas e
biscoitos, aumentavam "significativãmente" os comportamentos hipe-rativos e de défice de atenção. Os
cientistas consideraram mesmo quea proibição poderia reduzir cm 30%os casos de hiperatividade no ReinoUnido. A ErSA voltou a estudar os
corantes, mas não os proibiu. "Consi-
derou se haver limitações no estudo
britânico e, em vez de os proibir, tor-nou obrigatório incluir no rótulo dos
produtos a frase "podem causar efei
tos negativos na atividade e atençãodas crianças'", diz Nuno Dias. Ainda
Os refrigerantes têm '
corantes e conservan-ites que podem levar ,
á formação de benze-
no, uma substância
cancerígena
OS ADITIVOSPARA TOR-NAR A COR
DOS ALIMEN-TOS MAISATRATIVA
PODEM PRO-VOCAR ASMAE URTICÁRIA
assim, a medida gerou resultados.
"Alguns produtores deixaram de usar
os corantes para não terem de incluir
essa frase." Não é o caso de algumasmarcas de gomas.
Os aditivos usados para tornar a cordos alimentos mais atrativa, nomea-damente os sintéticos, podem provocar ainda reações alérgicas comocrises de asma, urticária, lacrimejo,eczema e choque anafilático. Há co-
rantes, como o Amarante (E123) queforam banidos nos tstados Unidos e
na Rússia devido a estudos queapontam para possíveis efeitos can-
cerígenos, mas que são permitidosna União Europeia. A EFSA conside
rou que os estudos não eram conclu-
sivos, mas reduziu a dose diária ad
ODoces
As gomas e os bolos de
pastelaria coloridos contêmvários aditivos que estão as-sociados a comportamentos
hiperativos
|\ missível de 0,8 mg/kg para O.ls%\ mg/kg. Para além dos doces, os
corantes surgem ainda em%\ conservas de frutos verme-W\ lhos. peixe fumado, nas deli¦I cias do mar e queijo fundidoMi aromatizado.H |á a Deco defende que ai
H guns aditivos deviam ser reti-¦ rados do mercado. "QuandoU há dúvidas, a EFSA devia proi-K bir o seu uso."K Para alem dos corantes, há ouW tros aditivos sobre os quais re-
caem suspeitas. Muitos conservan-
tes, necessários para evitar a deterio
ração dos alimentos, estão associados a reações alérgicas c alguns es-tão associados a efeitos cancerígcnos. É o caso do benzoato de sódio
quando associado com o ácido as-córbico ou vitamina C e usados so
bretudo em refrigerantes. "Desco-briu-se que em determinadas condi-
ções estas duas substâncias podemlevar à formação de benzeno, umquímico cancerígeno", salienta NunoDias. O hidrocarboneto. libertadotambém pelos tubos de escape dos
automóveis e pelo fumo dos cigarros,forma-se dependendo da luz e da
temperatura. Em 2005, a agência de
segurança alimentar norte--americana encontrou 10 amos-
tras em 200 com níveis supe-\ riores aos considerados segu-
j. ros (5 partes por bilião).
7 O ideal seria seguir umadieta sem aditivos, "mas isso
é impossível no mundo de hoje".A melhor forma de se proteger é ler
a lista de ingredientes e escolher os
produtos com menos aditivos. Porlei, estas substâncias têm de estarmencionadas por classe, se são
conservantes ou corantes, e pornome ou número. "Mas os Es quasedesapareceram dos rótulos porqueos consumidores associam-nosmais a substâncias a evitar."
A nutricionista Mafalda Rodriguesde Almeida defende uma alimenta
ção livre de aditivos e há 12 anos
que a pratica. "O meu problema é
não se saber a relação entre aditivos
presentes em vários alimentos. Acho
que todos os dias vou exceder adose diária que a EFSA diz ser segu-ra", argumenta. "Ninguém fala de
doses seguras em cenouras porquenão têm toxicidade."
Prefere produtos naturais e frescos,
como a fruta da época "porquetem os nutrientes que necessitamos
para essa altura do ano" -, vegetais,as massas frescas e o pão sem aditi-vos. "O pão deve ter apenas farinha,sal e fermento, não uma lista de vá-rias linhas de ingredientes." Evita as
bolachas, os cercais de pcqucno-al-moço e as leguminosas enlatadas,
por terem excesso de sal.
São escolhas que acabam por ser
mais dispendiosas. "Alocamos muito
pouco do nosso orçamento para ali-
mentação, apenas 11 a 15%", defende."Penso que se torna mais económico
a longo prazo porque podemos evi-tar uma série de patologias associa-
das à alimentação."Para o investigador do Centro de
Toxicogenómica e Saúde Humanada Faculdade de Ciências Médicas daUniversidade Nova de Lisboa, Sebas-
tião Rodrigues, o problema são os
hábitos alimentares. "É o consumoexcessivo dos produtos e não dos
aditivos que provocam problemas de
saúde. Até o consumo excessivo de
frutose [açúcar da frutal pode levar a
um fígado gordo e à diabetes." O
MafaldaRodrigues
deAlmeida
É nutricionistae defende uma
alimentaçãolivre de aditivos
e rica em ali-
mentos frescos
SebastiãoRodriguesInvestigador noCentro de Toxi-
cogenómica eSaúde Humanada Faculdade
de CiênciasMédicas da Uni-
versidade Nova
MUITOSCONSERVAN-
TES ESTÃOASSOCIADOSA REAÇÕESALÉRGICASE A EFEITOSCANCERÍGE-
NOS
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