OUTRAS (AS MUITAS) HISTÓRIAS SOBRE A FERROVIA EM PORTO
AMAZONAS (1950-1970).
Sofia Terezinha Kozlinski1
Rosangela Maria da Silva Petuba2
Resumo: O sistema ferroviário exerceu profunda influência na história da cidade de Porto Amazonas. Portanto, houve a necessidade de problematizar esse processo para que os alunos refletissem sobre os impactos que a ferrovia trouxe para a cidade, no aspecto social, político, econômico e cultural, despertando neles um olhar crítico-reflexivo. Os estudantes do terceiro ano, do nível médio, do Colégio Estadual Coronel Amazonas, em torno de trinta, foram divididos em equipes que realizaram pesquisas buscando diversas fontes documentais (fotos, documentos públicos e/ou privados, jornais, revistas entre outros), entrevistas semi estruturadas com a comunidade em geral, levantando de depoimentos do cotidiano da época e organizaram o resultado dessas pesquisas em forma de produção de textos e em seguida uma exposição, através de mural para toda a comunidade dos materiais didáticos e resultados obtidos. Espera-se com isso, que os alunos apropriem-se dos conhecimentos e possam a partir daí, refletir sobre Outras (As) Muitas Histórias da Ferrovia na cidade de Porto Amazonas. Palavras-chave: Porto Amazonas. Ferrovia. História local.
ABSTRACT: The rail system has had a profound influence on the history of the city of Porto Amazonas. Therefore, it was necessary to discuss the process for students to reflect on the impact that the railroad brought to the city, on the social, political, economic and cultural awakening in them a critical - reflective. Students of the third year , the average level , State College Colonel Amazon , around thirty , were divided into teams that conducted research seeking various documentary sources (photos , documents, public and / or private , newspapers , magazines, etc.) , interviews semi- structured interviews with the community at large , raising testimonies of everyday time and organized the results of this research in the form of text production and then an exposure through wall for the whole community , teaching materials and results . It is hoped that this, students are appropriating knowledge and may thereafter reflect on Others ( The ) Many Stories of the Railroad in Porto Amazonas .
INTRODUÇÃO
Para estudar o passado de um povo, de uma instituição, de uma classe, não basta aceitar ao pé da letra tudo quanto nos deixou a simples tradição escrita. É preciso fazer falar a multidão imensa de figurantes mudos que enchem o panorama da História e são muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os outros, os que apenas escrevem a História.
Sérgio Buarque de Holanda
1 Professora PDE Sofia Terezinha Kozlinski. Professora de História pela UEPG. Pós-graduada em
Educação Básica pelo IBEPEX. Professora do Colégio Estadual Coronel Amazonas – Ensino Fundamental e Médio e da Escola Estadual Olívio Belich – Ensino Fundamental. 2 Professora Orientadora Dra. Rosangela M. da Silva Petuba. Professora Adjunta do Departamento
de História da UEPG. Doutora em História Cultural pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
O sistema ferroviário exerceu profunda influência na história de Porto
Amazonas, portanto houve a necessidade de problematizar e refletir sobre os
impactos que a ferrovia trouxe para a cidade (1950–1970), nos aspectos: social,
político, econômico e cultural, despertando nos alunos um olhar crítico-reflexivo.
O projeto elaborado no primeiro semestre de 2012, como intenção de
pesquisa pretendeu desenvolver para além das expectativas oficiais, pois, através
da memória3 é que se constrói um passado nas vivências coletivas e individuais.
Através do diálogo entre teorias e evidências que se realizou no transcorrer
deste trabalho, foram elaborados conceitos na explicação histórica, desta forma
tornando-se impossível aceitar conceitos abstratos, acabados e universalizados.
Tornou-se fundamental recuperar a memória de trabalhadores anônimos, enfim
contar a história de outras formas, além da “memória oficial”, conservadora;
trabalhando as diferentes temporalidades, experiências compartilhadas, não apenas
nos locais de trabalho, bem como no seu dia a dia, fora dele e com os demais
sujeitos históricos.
Embora o passado enquanto tal não se modifique, a construção do
conhecimento se modifica de acordo com o modo pelo qual o historiador se vê no
presente, pensa o social e se insere nele, enquanto sujeito social e enquanto
pesquisador. Mas pensar o ensino como pesquisa neste caso, professor e alunos
estarão realizando uma reflexão e produzindo saber como sujeitos no duplo sentido:
sujeito social e sujeito do conhecimento. (VIEIRA, 2007, p. 65-66).
Na implementação da proposta didático-pedagógica os alunos perceberam
que são sujeitos históricos e que podem intervir no meio, trabalharam com várias
fontes históricas, problematizando-as e puderam perceber que a comunidade tem
muitas informações sobre o passado e que devem ser reconstruídas.
Os participantes do GTR (Grupo de Trabalho em Rede) contribuíram muito
dando sugestões, discutindo, analisando, refletindo e concluindo a importância deste
trabalho para a história do Município, da coletividade e destacaram dizendo que a
3 A memória é a matéria prima do historiador. É uma construção psíquica e intelectual que acarreta
uma representação seletiva do passado, que nunca é somente aquela do indivíduo, mas de um indivíduo inserido num contexto familiar, social, nacional. A história vivida de um lugar, de uma pessoa, um momento, um objeto arquitetônico, etc. podem transformar-se em um fundamento para o conhecimento do próprio cotidiano, onde a memória torna-se essencial para a ciência da mesma, podendo também por decorrência de ações ou simplesmente por acaso, essa história ser dissolvida na lembrança, esquecida. Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/historia-e-memoria-alguns-conceitos/43200/#ixzz2jNR4cc2w. Acessado em 31/10/2013.
implementação do projeto realizada serviria de exemplo para outros trabalhos de até
em outras cidades, desde que fazendo as devidas adequações de acordo com cada
realidade. Os professores cursistas do GTR destacaram a importância em se
trabalhar com várias fontes históricas, dando ênfase à história oral e a participação
dos alunos e da comunidade em geral como sujeitos históricos. Deram sugestões
para que os resultados obtidos com a implementação fossem publicados e ainda
relataram trabalhos que já realizam em suas escolas problematizando situações e
resgatando fontes das mais diversas.
O presente artigo também poderá ser utilizado como material de pesquisa
após a sua conclusão, pois os alunos antes da implementação da proposta didático-
pedagógica não tinham acesso a esse tipo de informação.
Nas entrevistas, foi mantido o cuidado com a subjetividade de cada pessoa
que narrou os depoimentos, fazendo uma releitura do sujeito que a produziu.
Analisando as vivências dos trabalhadores, suas relações com a empresa e as
maneiras para estabelecer a figura do trabalhador ferroviário “ideal”, ou seja,
disciplinado para melhor atender aos interesses da empresa.
Problematizar nesse caso é dar voz aos sujeitos históricos. Nesse
procedimento o pesquisador interroga os agentes sociais a partir de suas
preocupações e de sua postura e se deixar interrogar por esses agentes. Através
desse diálogo o pesquisador vai formular ou reformular seus próprios conceitos,
verificar que outros agentes devem abordar e consequentemente, que registro
buscar. (VIEIRA, 2007, p. 43).
Como objetivos, foram levantados pelos alunos informações pesquisadas em
diferentes fontes documentais, realizadas entrevistas semi estruturadas4 com a
comunidade em geral, produção de fontes orais com depoimentos do dia a dia da
época dos antigos ferroviários, organização dos resultados obtidos com as
pesquisas e entrevistas em textos, murais e outros materiais didáticos
4 Na entrevista semi-estruturada, o investigador tem uma lista de questões ou tópicos para serem
preenchidos ou respondidos, como se fosse um guia. A entrevista tem relativa flexibilidade. As questões não precisam seguir a ordem prevista no guia e poderão ser formuladas novas questões no decorrer da entrevista (MATTOS, 2005). Mas, em geral, a entrevista seguirá o que se encontra planejada. As principais vantagens das entrevistas semi-estruturadas são as seguintes: possibilidade de acesso à informação além do que se listou; esclarecer aspectos da entrevista; gera de pontos de vista, orientações e hipóteses para o aprofundamento da investigação e define novas estratégias e outros instrumentos. (TOMAR, 2007). Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/conceitos-em-pesquisa-cientifica/10409/#ixzz2jSXfxfYW. Acessado em 31/10/2013.
confeccionados no decorrer das atividades da implementação da proposta didático-
pedagógica, referente o projeto anteriormente elaborado.
De acordo com as Diretrizes Curriculares, “o trabalho com um olhar local, é
um procedimento fundamental para perceber as fissuras nas estruturas sócio-
históricas e apontar caminhos que mapeiam as transformações estruturais que
ocorreram durante a constituição do processo histórico”. (DIRETRIZES
CURRICULARES DA EDUCAÇÃO BÁSICA – HISTÓRIA, 2008. p. 63). Sendo de
extrema importância para a formação do conhecimento. Diante disso, esse artigo
problematizou e refletiu sobre os impactos que a ferrovia trouxe para a cidade de
Porto Amazonas nas duas décadas.
Em 05 de janeiro de 1889, pelo Decreto nº 10.152, poucos meses antes da
Proclamação da República, foi concedida a “Compagnie Générale de Chemins de
Fer. Brésiliens,” que construía a ferrovia entre Curitiba e Paranaguá, o privilégio para
a construção, uso e gozo do prolongamento da respectiva via férrea até Porto
Amazonas, no Rio Iguaçu, com um ramal que, passando por Lapa, se dirigiria para o
Rio Negro. Com o advento da República houve a necessidade de um novo pedido,
atendido pelo Decreto nº 907 de 18 de outubro de 1890, assinado pelo General
Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório da República,
concedendo àquela “Compagnie,” privilégio para a construção, uso e gozo do
prolongamento da respectiva via férrea, de Porto Amazonas, no Rio Iguaçu, até
Ponta Grossa, passando por “Maria da Boca do Monte,” conforme antecedentes
históricos de Porto Amazonas. (PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO AMAZONAS,
2009).
O trajeto da estrada ficou assim constituído: saindo de Curitiba seguia até a
estação da Serrinha (atual Engenheiro Bley), de onde havia um entroncamento para
a Lapa, continuava sempre pelo lado da margem direita do Rio Iguaçu. Cruzava o
Rio dos Papagaios e ia à Restinga Seca e atingia o Rio Iguaçu, a cerca de doze
quilômetros acima do Porto, no local chamado Porto das Laranjeiras ou Porto
Laranjeira, onde hoje está a cidade de Porto Amazonas, em terras da Fazenda
Portão de João Conrado Bührer. O trecho da Serrinha à Restinga Seca foi
inaugurado no dia 1º de novembro de 1892, e consta a mesma data para o ramal até
o Rio Iguaçu. Em 1905 foi inaugurada uma estação ferroviária em Porto União da
Vitória, do lado direito do Rio Iguaçu, pois ainda não estava concluída a ponte que
serviria para a sua travessia. Este evento alterou o panorama sociocultural da
cidade, provocando a implantação imediata de uma variada rede de serviços para o
atendimento daqueles que passavam, então, a utilizar o trem como meio de
transporte. Até então, eram utilizados os vapores que faziam o transporte de carga e
de passageiros entre Porto Vitória e Porto Amazonas.
Em Porto Amazonas passavam os trens da Estrada de Ferro do Paraná, os
quais realizavam as baldeações em direção a Ponta Grossa e/ou Curitiba. Com a
inauguração da ponte provisória, em 1906, a estrada chega à cidade e, então,
inaugurada uma estação, a qual teve como primeiro agente o Senhor Egídio Piloto.
Paralelamente à navegação, surgiu a ferrovia que encurtou os caminhos e facilitou a
comunicação com outras localidades. No dia 12 de março de 1915, o povoado foi
elevado à categoria de Distrito Administrativo, pertencente à Palmeira e, em 11 de
outubro de 1947, à categoria de município autônomo. A navegação entrou em
decadência devido à construção da rodovia do Xisto5 e da ampliação da estrada de
ferro do Paraná. A antiga ponte ferroviária sobre o rio Iguaçu testemunha essa
história.
No Paraná, particularmente, encontramos no episódio do Contestado e,
alguns anos mais tarde, na Revolução de 1930. A estrada de ferro foi amplamente
utilizada como meio de transporte pelas tropas militares nesses dois acontecimentos
e consequentemente, as suas estações se transformaram em pontos estratégicos
das tropas em ação. Em Porto Amazonas a chegada da estrada de ferro ocasionou
muitas mudanças na cidade e para a população (desmatamento, pessoas que
tiveram que sair de suas terras, local este por onde iriam passar os trilhos, miséria,
fome, incêndios em plantações, atividades que colocavam em risco a vida de muitos
trabalhadores, exploração da mão de obra, entre outros aspectos a serem
investigados por essa pesquisa).
Houve um movimento de imigrantes atraídos para a região, incentivados não
só pelo progresso6, (fuga da miséria, motivados pelo desemprego, perseguições,
5 Rodovia do Xisto ou PR-5, hoje BR-476 era tida como o eixo mais importante para a economia
paranaense. O trecho Curitiba, Lapa, São Mateus do Sul à União da Vitória (parte da rodovia estadual PR-5) onde continua em direção predominantemente a oeste até Barracão na fronteira entre Argentina, Paraná e Santa Catarina, iniciou-se a partir de um convênio realizado entre o DER e a Petrobrás, em 1962. A largura da estrada era de 14 metros, com uma extensão de 127 quilômetros. Para a Petrobrás, a importância da rodovia encontrava-se nas grandes reservas de xisto do Paraná, localizadas em São Mateus do Sul, onde aquela empresa estadual estava construindo uma usina piloto para industrialização do xisto piro betuminoso. Além de favorecer a indústria do xisto, a rodovia também favorecia o escoamento de toda a produção agrícola da região sul do Paraná. http://www.der.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=14, acessado em 12/07/2012. 6 (É somente associado à ideia de transformação mudança da, e não apenas na sociedade) que o
exploração dos patrões, fome, falta de acesso ao tratamento de saúde, educação
para os filhos, busca de espaço físico social alternativo), enfim por uma “vida
melhor”, mas também pela redistribuição, por parte do governo, das terras da antiga
Colônia Quito.
A estrada de ferro aliada à navegação já consolidada e em expansão com o
surgimento de um número cada vez maior de vapores favoreceu as atividades que
permaneceram em franco crescimento, até a década compreendida entre os anos
de 1940 e 1950 quando a população do sudoeste paranaense e das cidades da
Lapa, São Mateus do Sul e União da Vitória chegavam a Porto Amazonas pelos
vapores, sendo “redespachados” posteriormente para outras regiões através da
estrada de ferro.
Finalmente, no mês de julho de 1970 o transporte ferroviário foi totalmente
paralisado, desativando-se as instalações da Estação de Porto Amazonas. O último
bilhete de passagem foi vendido no dia 19 de julho de 1970, ficando totalmente
desativados os trens, sinos, apitos, lanternas, relógios, telefones, telégrafos, tudo
fazia parte do passado. A cidade estava sem transporte e a população se deslocava
em poucos carros particulares para as cidades vizinhas em busca de remédios,
hospitais, linhas de ônibus, agências bancárias, etc., convivendo com essa situação
crítica quase um ano7.
Com relação à “história oficial,” sabe-se que foi produzido conhecimento
sobre a cidade de Porto Amazonas e a ferrovia, tanto em livros como em sites da
internet.8 Ao contrário disso, o objetivo desse artigo é fora das expectativas oficiais,
buscando refletir e compreender as trajetórias de vida dos trabalhadores e de suas
experiências acumuladas, pois através da memória, é que se constrói um passado
nas vivências coletivas e individuais, fazendo uma releitura do sujeito que a produz,
onde os alunos participando deste processo, se realcem como sujeitos históricos e
conceito de progresso faz algum sentido. O que constitui progresso para alguns pode não sê-lo para outros. Devemos sempre perguntar: progresso para quem e sob que aspecto? Não existe progresso absoluto. A especificação dos valores tomados como medidas ou critérios de progresso são sempre necessários, porém não devemos cair na armadilha do relativismo total. A democratização, a abertura das sociedades, a emergência da livre iniciativa e do livre mercado se fazem acompanhar de desemprego e pobreza, de perda da disciplina social, de taxas estratosféricas de criminalidade e delinquência, de lutas de facções e ingovernabilidade, além de uma enxurrada de cultura de massa de baixa qualidade (...) http://samxyz.blogspot.com.br/2009/04/definicao-de-progresso.html, acessado em 10/07/2012.
7 PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO AMAZONAS. www.portoamazonas.pr.gov.br ; acesso em
01/03/2012. 8 Para maiores informações ver: MÜLLER, Jucilda Boscardin. História de Porto Amazonas,
1997, p. 26-27. E no site www.portoamazonas.pr.gov.br.
agentes de transformação na sociedade. Segundo (FENELON, 1999, p. 10),
Ao propor outra abordagem, buscamos refletir sobre o significado social das fontes, seus limites, indagando sobre as relações sociais, políticas e ideológicas inscritas no processo mesmo de sua produção e preservação (…) considerando que elas expressam sujeitos históricos, inseridos ativamente numa complexa rede de relações e acontecimentos e num intrincado jogo de pressões e limites que é preciso problematizar.
De acordo com a autora, recuperar a memória dos trabalhadores anônimos
enfim, contar a história de outras formas, além da “memória oficial9,” trabalhando as
diferentes temporalidades, experiências compartilhadas, não apenas nos locais de
trabalho bem como, seu cotidiano fora dela e com os demais sujeitos históricos.
As fontes orais são únicas e significativas, por causa do seu enredo, ou seja, do caminho nos quais os materiais da história são organizados pelos narradores para contá-la. Por meio dessa organização cada narrador dá uma interpretação da realidade e situa a si mesmo e aos outros, e são nesse sentido que as fontes orais se tornam significativas para nós. (KHOURY, 2001, p. 79–104).
Outro recurso utilizado foi o trabalho com escritos sobre a ferrovia. Entre eles
utilizamos o poema “Sobre os Trilhos”, de Jurandir Bianco, (BACH, 2008).
Os trens vinham de São Paulo,
Daquelas bandas de lá.
Durante a viagem passavam,
Pelo norte do Paraná.
Passando em Ponta Grossa,
Depois do Caracará.
Em Palmeira, muitos namorados,
Aguardando o trem chegar.
9 A memória apóia-se sobre o “passado vivido”, o qual permite a constituição de uma narrativa sobre
o passado do sujeito de forma viva e natural, mais do que sobre o “passado apreendido pela história escrita” (HALBWACHS, 2004: p.75). Em Halbwachs, a memória histórica é compreendida como a sucessão de acontecimentos marcantes na história de um país. O próprio termo “memória histórica” desta forma seria uma tentativa de aglutinar questões opostas, mas para entender em que sentido a História se opõe à Memória, para Halbwachs, é preciso que se atenha à concepção de História por ele empregada. Acessado em 31/10/2013.
Através desta estrofe, foi questionado sobre o percurso dos trens, destacando
Ponta Grossa como ponto estratégico, também a socialização e possíveis encontros
entre as pessoas.
O trem seguindo o carril
E o maquinista imponente,
Cada passagem de nível,
Aquele apito estridente.
Pare, olhe, escute e passe,
A placa avisando a gente,
Ainda tem os distraídos,
Que cometem acidentes.
Foi problematizado o papel do maquinista e seu destaque, o barulho
estridente, o tipo de sinalização que existia, acidente que ocorriam durante a
passagem dos trens e consequentemente, os riscos.
Na viagem o guarda-freio,
Vai cuidar da segurança.
O foguista pondo lenha,
A Maria Fumaça avança.
Nos cruzamentos um apito
É fogo na vizinhança,
Pois ela jogava brasas
Muitos metros de distância.
Pôde-se indagar sobre a segurança, a fonte de energia utilizada para
impulsionar os trens, os muitos cruzamentos existentes e os possíveis incêndios que
ocorriam desde fagulhas que caíam nas roupas dos passageiros, vindo a danificá-
las, até brazidos que saíam da caldeira pelas chaminés e acabavam atingindo
campos secos, principalmente.
Dentre outros, problematizou-se o contexto histórico, as diferentes atividades
desenvolvidas pelos trabalhadores, a hierarquia presente, a vestimentas, profissões,
como a comunicação era realizada, os trabalhos perigosos, os sentimentos
envolvidos, as condições sociais, econômicas e culturais da população.
A partir das imagens abaixo, referentes à ferrovia, foram problematizadas
outras questões como sendo a primeira ponte de ferro na cidade (figura 1),
construída em 1957, como referencial arquitetônico por sua beleza e também por ser
uma forma de ligação para outros lugares. Verificando que na época havia uma
empresa de engenharia, “Machado da Costa,” na década de 1940, que construía
pontes na cidade e, para várias outras regiões do Brasil e o tipo de crescimento que
trouxe e que grupos sociais foram beneficiados. Os alunos confeccionaram maquete
e tiraram várias fotos.
Figura 1. Ponte de Ferro
Disponível em: HTTP:/WWW.portoamazonas.pr.gov.br/pontedeferro.jpg. Acessado em 12/05/2012.
Verificou-se que a Ponte dos Arcos situada a 8 km (divisa com o município de
Balsa Nova) projetada pelos engenheiros da Empresa Machado da Costa e
construída pelos seus funcionários, onde existem oito arcos, é uma vista privilegiada
e possui uma arquitetura deslumbrante, a ponte faz a ligação férrea entre os
municípios de Porto Amazonas e Balsa Nova, localizada sobre o Rio dos Papagaios
que deságua no Rio Iguaçu, havendo grandes possibilidades de exploração do
turismo ecológico, pois se encontram localizadas no meio ambiente.
Daí houve a possibilidade de pesquisa a partir desses locais. Foi
confeccionada maquete da referida ponte e os alunos tiraram várias fotos, onde
podemos encontrá-las em anexo.
Figura 2. Ponte dos Arcos
Disponível em: http://i.ytimg.com/vi/7Y2ANxK2FIc/0.jpg Acessado em 12/05/2012.
MALHA FERROVIÁRIA
Disponível em: http://www.estacoesferroviarias.com.br/pr-cur- pgro/mapas/ptamazonas_mapa.jpg Acessado em: 27/04/2013
Os alunos confeccionaram um mapa a partir da imagem acima citada, em
papelão, ampliando e localizando a malha ferroviária em Porto Amazonas e os
pontos próximos a cidade, incluindo o Rio Iguaçu, antes navegável por embarcações
fluviais, desta forma levando os alunos a identificarem a trajeto que antes o trem
realizava pela cidade e o trajeto feito nos dias de hoje.
A maquete da estação ferroviária de Porto Amazonas foi confeccionada em
isopor, pelos alunos e auxiliada pelo Sr. Agenor Rodrigues Paes, um membro da
comunidade que desenhou uma planta tamanho normal da estação ferroviária
buscando uma maior aproximação detalhada de como era na época. A maquete foi
construída com teto removível e com divisórias e detalhes pesquisados que faziam
parte da construção, onde os alunos puderam reconstruir o ambiente que pessoas
iam e vinham com pagagens e mercadorias, verificando como era o dia a dia dessas
pessoas.
A Empresa Machado da Costa (1936 – 1965) instalou-se em Porto Amazonas
em 1º de outubro de 1936 até 1940, procedeu a levantamentos, projetos de reforços
da oficina, aquisição de maquinários, ferramentas, construção de uma casa para o
Dr. Machado da Costa, uma casa para o chefe de escritórios, alojamento para os
solteiros e o prédio dos escritórios, formando então a equipe pioneira do serviço de
reforço de pontes, através de um contrato assinado com a RFFSA. Em 1953, a
Empresa foi transformada em Sociedade Anônima, passando a denominar-se
“Machado da Costa S.A. Empresa de Engenharia”, e criada uma filial no Rio de
Janeiro.
Tornou-se feriado em Porto Amazonas devido ao prefeito Sr. Alcides Gomes
da Costa ter usado a data para homenagear em 1963 o Engenheiro Oscar Machado
da Costa, esta data também é a de seu sepultamento, ele faleceu no dia 30 de
outubro, com 69 anos de idade.
Considerado o maior especialista brasileiro na construção de pontes, e que
ultimamente estava empenhado na projeção e execução de cinco viadutos, fiscalizou
obras da ponte internacional Brasil – Argentina.
Por todas essas questões levantadas acreditamos que recorrer ao uso de
vestígios e fontes históricas nas aulas de história pode favorecer o pensamento
histórico e a iniciação aos métodos de trabalho do historiador. A intenção do trabalho
com documentos em sala de aula é a de desenvolver a autonomia intelectual
adequada, que permite ao aluno realizar análises críticas da sociedade por meio de
uma consciência histórica. (BITTENCOURT, 2004.)
O impacto das atividades realizadas pelos alunos foi de que todos
participaram ativamente, perceberam que a comunidade possui muito
conhecimentos e materiais a respeito do assunto, se viram como sujeitos da história,
investigadores de um cotidiano que não vivenciaram, mas que acharam muito
importantes. Conhecimentos que não tinham anteriormente, mas com o passar das
atividades foram notando a importância de se trabalhar com várias fontes históricas,
as problematizações que até então não tinham ainda realizado. Com as produções
de textos através das entrevistas realizadas, os alunos passaram a ter um novo
olhar da história, como dinâmica, do papel do historiador e sua intervenção, a
preservação da memória individual e coletiva e sobre a importância em se
problematizar tais documentos e situações.
Como a redação deste artigo é resultado de todo o processo de
implementação da proposta didático-pedagógica, exporemos em linhas gerais as
principais etapas deste processo.
Primeiramente, foi realizada reunião com a direção, equipe pedagógica e
professores do colégio onde foi exposto o projeto e proposta de implementação para
terem conhecimento de sua intervenção pedagógica e posteriormente, reunião com
os alunos do terceiro ano do ensino médio para apresentação, discussão e reflexão
do mesmo onde foram divididos em equipes.
Realizou-se pesquisa qualitativa10, buscando diversas fontes documentais
(fotos, documentos públicos e/ou privados, jornais, revistas entre outros), onde as
fontes escritas foram analisadas com cuidado, pois, esta contém versões e juízos de
valores que devem ser considerados.
Entrevistas semi estruturadas foram realizadas com a comunidade em geral,
dando abertura para outros relatos que foram necessários e enriqueceram o
presente trabalho, onde o entrevistador pôde fazer as intervenções necessárias.
Foram realizadas produções de fontes orais com depoimentos do dia a dia e a
organização dos dados. As fontes orais foram utilizadas para recuperar a experiência
vivida pelos trabalhadores ferroviários a partir de seus relatos sobre o seu modo de
vida dentro e fora de seu local de trabalho. A intenção foi a de recuperar na fala dos
10 Verifica uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre
o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em números (MINAYO, 2007). A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso de métodos e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave. É descritiva. Os pesquisadores tendem a analisar seus dados indutivamente. O processo e seu significado são os focos principais de abordagem (LAKATOS ET AL, 1986). Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/conceitos-em-pesquisa- cientifica/10409/#ixzz2jSWYH8s2. Acessado em 31/10/2013.
sujeitos o que não estava registrado em nenhum documento escrito, ou que estava
registrado de outra forma. Depois de realizadas as entrevistas foram analisadas,
observando sempre como cada pessoa entrevistada narrava um fato, atribuía
significados e reações no ato da interlocução.
Foi realizada a produção de textos referentes às problematizações realizadas
sobre as imagens, o poema, da busca de informações junto à comunidade e sobre
as entrevistas onde os alunos registraram sobre Outras (As muitas) Histórias da
Ferrovia na cidade de Porto Amazonas bem como, expuseram através de mural para
toda a comunidade com o objetivo de divulgação e socialização dos materiais
didáticos e resultados obtidos.
A exposição aconteceu para a comunidade no final do mês de junho de 2013,
nas dependências do Colégio Estadual Coronel Amazonas – Ensino Fundamental e
Médio, durante o dia todo, onde as outras turmas e de outros turnos bem como a
comunidade escolar, pais e demais membros da comunidade tiveram acesso ao
material produzido.
RESULTADOS
Na problematização do poema “Nos trilhos do trem”, os alunos concluíram
que: “a cidade de Porto Amazonas” é um referencial de pontos turísticos, como a
Ponte de Ferro, a Ponte dos Arcos, Caiacanga, cachoeiras, etc. A Ponte de Ferro
(conhecida como Ponte Preta), é um importante referencial arquitetônico, feita pela
Empresa Machado da Costa que trouxe para a cidade grande crescimento na
exportação de materiais, sendo beneficiada grande parte da população que veio a
crescer e na geração de emprego.
A Ponte dos Arcos tem uma arquitetura deslumbrante, com uma vista
privilegiada, faz divisa com Balsa Nova, fazendo a ligação férrea, através do
percurso realizado entre os trens por São Paulo, Ponta Grossa, Cará-Cará e
Palmeira. Na área da ferrovia ocorreram acidentes constantes por falta de
sinalização, e também os incêndios, por conta das brazas que saíam das caldeiras
dos trens. A comunicação era realizada oralmente e visualmente, geralmente usando
os lampiões e apitos. Todos os ferroviários usavam uniformes de cor azul escuro e
cap. A população antiga entrava em euforia quando o trem chegava trazendo e
levando pessoas.
Relembrando histórias de antigamente
Com: Leopoldo Novaki Aluna: Liana Ramos
Ele, um homem já vivido, conta um pouco da história da ponte de ferro que
permaneceu como referência da ferrovia em Porto Amazonas, construída em 1940,
entre muitas outras nas regiões do Brasil, pela empresa construtora de pontes
metálicas Machado da Costa, que já não existe mais. Porto Amazonas cresceu muito
com a ferrovia e depois de desativada no município muitas pessoas foram embora.
Os trens realizavam um percurso como Curitiba, Ponta Grossa, Porto Amazonas,
conta ele. O barulho do trem não era tão incomodativo como muitas pessoas
falavam. Contou também que ocorriam acidentes onde passava o trem, como a
pegar fogo na beira da ferrovia e nas roupas das pessoas também. A fonte de
energia utilizada primeiramente era a lenha e depois o diesel. Suas vestimentas
eram roupas normais e depois de um tempo, uniformes. Máquinas e seus
companheiros se comunicavam pelo telégrafo. Não tinha muita segurança no
trabalho como tem hoje e nesse tempo eles eram uma classe pobre e trabalhadora.
Encerra assim seu Leopoldo.
Várias gerações em ferrovia com Leopoldo Novaki, entrevista realizada pela
aluna Liana Ramos.
Seu Leopoldo contou que a ferrovia ajudou a crescer a cidade, pois muitas
famílias vieram morar para cá, teriam emprego. Diz que a cidade antes era um
vilarejo e depois cresceu. Mas logo depois que a ferrovia foi desativada, mais da
metade das pessoas que para aqui vieram, foram embora.
Seu pai era ferroviário e tinha que ir à Curitiba para receber seu pagamento e
neste dia aconteceu um acidente, onde alguns vagões caíram no rio, mas seu pai
não se machucou. Comentou que vinha pelo trem: madeira, erva-mate, milho,
mantimentos e pessoas. Em 1950 não existia caminhão na localidade, então o trem
era encarregado pelo transporte local. Seu Leopoldo sabe muitas histórias, pois seu
pai, tios e primos também eram ferroviários, hoje todos já falecidos. (Fez referências
ao ano de 1938 aproximadamente).
Contou que não tinha privilégio nenhum a trabalhar na ferrovia, a necessidade
financeira era muito também e tempos depois começavam a atrasar os pagamentos.
Na ferrovia fazia de tudo um pouco, inúmeras atividades, levando-o a ser ferroviária
era a necessidade de ajudar a família, pois a vida não era fácil, embora houvesse
muito trabalho naquele tempo. Começou a trabalhar aos 18 anos, já tinha o papel de
servente. Diz que trabalhou de 25 a 30 anos aproximadamente. Naquele tempo
moravam em uma chácara e seu pai trabalhava muito, passava dois a três dias fora
de casa.
Entrevista relacionada sobre o senhor Vergilho Gonçalves, já falecido, as
informações foram repassadas pelo seu neto e posteriormente, seu bisneto, que
começou a trabalhar ajudando na construção da ferrovia com 17 anos. Tornou-se
operário braçal e depois passou a ser guarda freios. Tinha 48 anos quando caiu de
cima de um trem e sua perna foi cortada entre os trilhos. Seu trabalho era muito
perigoso, pois tinha que correr em cima dos vagões, levando a ficar um ano
internado e passando a usar uma perna de pau.
O filho do senhor Vergilho Gonçalves, já falecido, as informações foram
repassadas pelo seu filho e neto, que começou a trabalhar com 17 anos, era
turmeiro, carpia a linha e fazia reparos nos trilhos. Com tempo, trabalhou na estação
ferroviária e aprendeu a telegrafia. Mais tarde, foi trabalhar como bombeiro que
fornecia água para a locomotiva. Disse que o trem passava pela Restinga Seca para
Palmeira, carregava erva mate e madeira. O trem de passageiros tinha um vagão de
bagagens (encomendas), um vagão dormitório para viagens longas, vagão
restaurante, tinha classe A e B. A primeira classe tinha bancos estofados espaçosos
e os vagões de segunda classe os bancos eram de madeira, não tinham luxo algum.
Todos os vagões possuíam banheiro com lavatórios. Uma viagem de Porto
Amazonas à Curitiba durava três horas e meia, isto quando não havia acidentes com
os vagões de carga. Conta de um acidente grave que ocorreu com um trem
passageiro, tombando em uma curva perto do rio e os vagões foram parar na
cachoeira. Muitos feridos, não houve mortos, isto ocorreu no Km 209 a 3 km de
Porto Amazonas, era uma curva muito forte.
A aluna Valéria Gandin entrevistou seu avô o senhor Otávio de Mello onde
disse que a ponte de ferro é considerada um referencial arquitetônico em Porto
Amazonas por sua aparência geométrica. Foi construída pela Companhia Brazyl
Railway Company, em 1911.
A empresa de Engenharia Machado da Costa realizava seus trabalhos pelo
Brasil inteiro. O transporte de erva-mate e madeira trouxe progresso para a cidade.
Existem grandes possibilidades de exploração do turismo ecológico no Município,
pois temos o Rio Iguaçu, outros rios menores, cachoeiras, campos, morros, etc.
O percurso realizado pelos trens na nossa região era de Curitiba/Ponta
Grossa, passando por Porto Amazonas. As pessoas se encontravam na estação
para ver o trem passar, comprar jornais. A praça estava sempre cheia, saíam da
missa e logo após poderiam ver a chegada do trem.
Os trens “P” carregavam pessoas e os “mistos” carregavam cargas. Eram
quatro trens “P” Curitiba/Ponta Grossa, Ponta Grossa/Curitiba, passando por aqui. O
trem “P” passava às 4 horas da tarde e seguia para Curitiba. O “Misto” passava às 6
horas da manhã de Ponta Grossa para Curitiba. O trocado vinha da Restinga ao
Ramal. Vendiam bandejas de fruta da época (butiá, jabuticaba, etc.) na estação, e
café e lanche no botequim. Tinha sinalização onde passava carros com placas. O
guarda-chaves mudava de linha e cruzamentos. Não havia muitos acidentes, às
vezes encalhavam e tombavam, mas geralmente os de cargas.
As profissões que existiam eram a de maquinista, que era o chefe, ele
pilotava o trem e comandava os seus horários. O foguista (que colocava a lenha na
caldeira do trem), manobreiro, guarda-chaves, guarda-freios (cuidava com
segurança quando o trem precisasse parar), telegrafista, agente de estação, via
permanente (manutenção). Na estação grande havia conferente (das passagens e
mercadorias).
Cada funcionário tinha um uniforme, boné, roupa cinza e a agente roupa azul
marinho. O boné era azul marinho e vermelho com o emblema da rede. O nome da
ferrovia era Viação Paraná/Santa Catarina, depois passou a ser Rede Ferroviária
Federal. Não existiam caminhões de entrega, então vinham os caixeiros viajantes
que faziam os pedidos e mandavam as encomendas pelo trem.
A professora Jucilda B. Müller foi entrevistada e fez referência que a praça
municipal, do centro do Município, pertencia a rede ferroviária e desempenhou um
papel social aos domingos, sendo ponto de encontro entre pessoas que iam viajar,
chegavam de viagem e que se estendia durante o dia todo. Vendedores ambulantes
que ficavam na plataforma; meninos que ajudavam a carregar as bagagens para
ganhar uns trocos. Defuntos que chegaram a serem trazidos em um vagão
específico. Transportava-se também madeira, erva mate, diesel, estruturas metálicas
e matérias primas utilizadas na Empresa Machado da Costa, animais e até o circo.
Havia também os carros de bois que ajudavam no transporte de mercadorias que
chegavam pelo trem. Havia banheiros próximos à estação ferroviária, também um
armazém que servia como depósito de mercadorias. Hidrantes que abasteciam os
reservatórios de água que alimentavam as caldeiras. Madeiras nas laterais da
estação que eram utilizadas para aquecer a água das caldeiras e uma caixa de água
grande que depositava água de vinha do lajeado, através de uma bomba,
construídas pela empresa ferroviária da época. Com o fim da ferrovia muitas
pessoas foram embora e o município ficou isolado, sem meios de transporte, sem
empresa de ônibus para ir até a cidade vizinha.
O aluno André Ângelo produziu texto referente à problematização das
perguntas referentes às figuras 1 (Ponte de Ferro) e a 2 (Ponte dos Arcos) com o
seguinte:
A arquitetura da Ponte de Ferro é uma forma que não é mais feita e projetada
e construída pela Empresa e Engenharia Machado da Costa. Entre outras
construções realizadas pela referida empresa destacam-se projetos e a ponte sobre
o Rio Paraná, e em 1920, a ponte sobre o Rio Doce, em Catalina, no Espírito Santo.
Quanto às possibilidades de exploração do turismo ecológico no Município,
fez menção que existem possibilidades, desde que houvesse um maior investimento
e interesse dos que estão no comando político. Poder-se-ia explorar melhor as áreas
em torno do rio e também locais como o Cristo, o morro do Simeão, o Perao do
Corvo, “Biquinha”, etc.
Ponta Grossa passou a ser ponto estratégico na época da ferrovia, pois a
cidade era sede de grandes oficinas e escritórios de companhias ferroviárias e silos
que secavam grãos que seriam escoados para outros locais.
Existiam diferentes tipos de apitos, conforme o tipo de vagão que iria chegar
era tido como sinalização a princípio. Depois placa de pare olhe e escute.
As pessoas se viam felizes e entusiasmadas diante do barulho estridente do
trem, era o som da vida de Porto Amazonas, as pessoas sentiam seus corações
batendo mais forte. Aconteciam a acidentes, mas na maioria era com animais,
porque dormiam em cima dos trilhos. Acidentes com pessoas aconteciam, mas não
eram freqüentes.
Os ferroviários eram tidos como uma classe média alta. As condições
econômicas eram regulares. Ficavam até três dias sem ver a família.
Entre acidentes da ferrovia dois se destacaram: um senhor que vinha da Nova
Restinga estava chegando à curva do quilômetro 215, o trem pegou o senhor
Aristides Teixeira, ele estava em uma vagonete, o trem o atropelou.
Outro acidente foi com o Senhor Leandro Rodrigues Paes que atravessou no
cruzamento da estrada de ferro com a rua XV de Novembro e não viu o trem se
aproximar, batendo com força e vindo a falecer no local.
A manutenção da malha ferroviária era realizada por funcionários, chamados
turmeiros, tinha também o maquinista (que comandava o trem, era chefe do
comboio), o ajudante, o guarda freios, o chefe de trem. Na estação tinha o guarda
chave (que vigiava a chegada dos trens e também manobrava as chaves do trilho
para o desvio do trem), o guardião, chefe de estação, telegrafista, o foguista, o
carvoeiro, o mecânico, assim existia uma hierarquia.
Se o transporte fluvial foi importantíssimo à cidade, a ferrovia deu
continuidade ao ritmo acelerado do desenvolvimento, o pátio da estação ferroviária
estava sempre movimentado, carregando e descarregando mercadorias dos
armazéns proporcionando emprego à população. Com o fim da ferrovia a população
diminuiu e o desemprego aumentou.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por não existir nenhum trabalho escrito com levantamento de informações
junto à comunidade sobre a ferrovia em Porto Amazonas (1950 – 1970) surgiu uma
necessidade de sabermos e resgatarmos sobre esta parte da história da cidade para
que as nossas e as futuras gerações tenham conhecimento e que fique registrado
para que não se perca no tempo. Desta forma se fez necessário o registro de tais
informações que poderá ser utilizado para dar continuidade de pesquisa bem como
material de apoio para ser utilizado em sala de aula por outros professores, pois
consta muito sobre a memória e a história de vida de muitas pessoas.
Na abordagem qualitativa encontrava-se a história de vida e serviu para
captar o que acontece na intersecção entre o individual e o social e permite que
elementos do presente interajam com elementos do passado. É um olhar
retrospectivo na vida e permite uma visão total do conjunto tornando possível uma
visão mais aprofundada do momento passado (SOARES, 1994).
Ocorreu grande participação de toda a comunidade escolar, alunos do 3º ano
e de outras turmas, todos curiosos com o que estava sendo trabalhado e até
professores de outra escola auxiliavam dando dicas, informações para ajudar na
produção e a enriquecer o trabalho. Também a comunidade participou dando
entrevistas, repassando informações, emprestando fotos sobre a ferrovia e as
pontes construídas pela Empresa Machado da Costa. Na Construtora Roca fomos
muito bem atendidos e se colocaram à disposição para o que precisássemos, onde
conseguimos fotos e principalmente, da Ponte dos Arcos logo que foi construída.
Os alunos, a comunidade e os antigos ferroviários sentiram-se sujeitos da
história, bem como agentes de transformação. Verificaram a importância da história
oral e das demais fontes históricas em uma pesquisa. A comunidade pode constatar
durante e na apresentação do que foi produzido que pôde auxiliar dando
informações e percebendo que são detentoras de saberes que não estão nos livros
e que são de grande valia no resgate da memória histórica.
Schraiber11 (1995, apud MINAYO, 1992) “conceitua a pesquisa decorrente de
história oral como testemunho pessoal do sujeito pesquisado. Às vezes, para a
pesquisa, pode ser importante saber de fonte pessoal sobre o trabalho, práticas e
vivências para estimular pensamentos sobre questões como a tecnologia, a
qualidade da intervenção técnica, o papel social da prática ou o significado do
desenvolvimento científico e profissional. Esta produção de narrativas constitui-se
em rica experiência da perspectiva da pesquisa científica”.
Sobre o trabalho do historiador Halbwachs (2006),
Afirma que ele deve partir da busca dos detalhes que se somará a conjuntos que resultará, por sua vez, em uma soma de conjuntos onde nenhum fato é menos importante que outro. Desta forma, geraria a visão mais imparcial possível do todo. O historiador procura dar um significado às ações humanas e convertê-las em uma experiência exclusiva que possa delinear um novo futuro através do prestígio do presente.
Como professora participante do PDE 2012, no transcorrer deste processo
pude rever minha metodologia, certos conceitos, concepções/teorias e posturas em
sala de aula e a relação no dia a dia com meus alunos.
A relação com os alunos do 3º ano tornou-se muito próxima, sempre curiosos com as fotos da época, buscando tirar fotos atuais e que tivessem relação com o _______________ 11 SCHRAIBER, L. B. Pesquisa qualitativa em saúde: reflexões metodológicas do relato oral e produção de narrativas em estudo sobre a profissão médica. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 29, n. 1, p. 63-74, 1995.
trabalho. Sempre conversando com pessoas que poderiam ser referencial para se
conseguir mais informações. Muito participativos com as atividades propostas e
sempre fazendo comentários sobre as tidas “novidades” sobre tudo o que se
relacionava com a ferrovia, seja documentos, fotos, as entrevistas, na produção de
textos e quanto às maquetes os próprios alunos as confeccionaram mesmo não
fazendo parte da implementação.
Quanto aos impactos da ferrovia em Porto Amazonas foi problematizado com
os alunos o conceito de trabalho e com as leituras e levantamento de informações
realizadas puderam constatar que muitas pessoas não usufruíram deste “progresso”,
e sim uma minoria da elite local, e que a ferrovia gerou empregos, trouxe
desenvolvimento para a cidade na época, mas que haviam problemas relacionados
a incêndios, as difíceis condições de trabalho, os acidentes, e demais assuntos
levantados no transcorrer deste trabalho.
No mural confeccionado foram colocadas fotos, mas não de forma expositiva,
mas sim buscando problematizar, ver que informações estas fotos estavam
transmitindo. A comunidade escolar parabenizou e na biblioteca escolar consta o que
foi produzido de material, sempre buscando durante todo o trabalho uma
aproximação com a realidade e buscando fazer o melhor para mostrar todos os
materiais obtidos e produzidos.
Os alunos puderam constatar qual é o papel da história no ensino e as
diferentes formas que podemos trabalhar algo de forma dinâmica, prazerosa e que
realmente produza conhecimento e possam como cidadãos de fato, conhecer sua
história e transformar a realidade local.
Durante todo o processo de implementação da proposta didático-pedagógica
e que resultou na produção deste artigo, foram coletados documentos, fotos antigas
e recentes relacionados à ferrovia em Porto Amazonas e que para quem desejar ter
acesso e/ou manter contato me coloco a disposição através do e-mail
REFERÊNCIAS
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