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PANORAMA DAS UNIDADES DE CONSERVAONA FAIXA DE FRONTEIRA BRASILEIRA: UMA
CARACTERIZAO
Letcia Nascimento Vimeney
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
INTRODUO E OBJETIVOS
A questo ambiental teve um crescimento tanto de importncia local quanto
global especialmente a partir da segunda metade do sculo XX. Discusses que vo desde a
extino de espcies at as mudanas climticas fizeram com que houvesse um aumento da
preocupao ambiental nas agendas estatais e internacionais, na medida em que a proteo
da natureza representa tambm a proteo de recursos naturais que garantem a
continuidade do desenvolvimento econmico. A noo de biodiversidade emerge nesse
contexto, sendo a preservao da diversidade de espcies a meta que se tornar recorrente
nas polticas nacionais, apontando para o carter cientfico e geopoltico que passa a
envolver a questo. Ao redor do mundo, se torna comum a definio de reas destinadas
proteo da natureza: diversos pases passaram a contar com sistemas de reas protegidas,
cada um com particularidades em sua legislao, objetivos e estratgias de manejo. No
Brasil, apesar de o primeiro Parque ter sido criado em 1937, a sistematizao dessa poltica
vem somente nos anos 2000, por meio da Lei do Sistema Nacional de Unidades de
Conservao (SNUC). Constam na Lei n 9985 as doze categorias de Unidades de
Conservao (UCs) e as principais diretrizes que devem reger o manejo e gesto dessas
reas.
Na regio da Faixa de Fronteira brasileira, em particular, esse processo de
criao e implementao de reas protegidas envolvido por controvrsias entre os
diversos atores da sociedade civil, dos governos, foras armadas e organizaes
ambientalistas. Essa controvrsia baseada no fato de que a incidncia das Unidades de
Conservao nessa regio continuamente apresentada como um fator de vulnerabilidade
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para a soberania nacional entre os setores mais nacionalistas ou como uma interdio de
acesso aos recursos naturais por atores locais e regionais. Alm disso, em muitos casos, a
criao de Unidades de Conservao pelo governo nessa regio - que ainda representa uma
fronteira de ocupao no Pas - seguiu a estratgia de criao de zonas-tampo para
impedir a apropriao de terras.
Sendo assim, para um maior embasamento das discusses em torno dessas
controvrsias, necessrio que o conhecimento sobre esse conjunto de Unidades seja
aprofundado. O objetivo geral desse trabalho vem a ser, portanto, realizar uma
caracterizao da situao atual das Unidades de Conservao na Faixa de Fronteira
brasileira (regio definida segundo a Lei 6.634 de 2/5/1979 como a faixa de 150 km de
largura a partir do limite internacional do territrio) - especialmente no que se refere aos
instrumentos de gesto e efetividade de seu manejo.
Especificamente, esse panorama visa a abranger trs principais dimenses,
realizando uma caracterizao: a) biogeogrfica, principalmente pelos biomas protegidas
pelas Unidades, b) institucional, analisando tanto a distribuio das Unidades pelas
categorias e grupos do SNUC quanto os instrumentos de gesto implementados - como
Plano de Manejo, Conselho Gestor, situao fundiria-, e c) socioeconmica, explorando
possveis conflitos a partir dos diferentes usos da terra.
METODOLOGIA
Conceitual
O termo reas protegidas refere-se abordagem mais generalizante quando
tratamos de pores do territrio delimitadas com objetivos de proteo e/ou conservao
da natureza. Essa definio ganha destaque especialmente pela iniciativa desenvolvida pela
Internacional Union for Conservation of Nature (IUCN) para elaborao de um sistema
internacional que categorizasse esses espaos dedicados conservao. Assim, o conceito
desenvolvido para reas protegidas define-se como reas do espao terrestre e/ou
martimo especialmente dedicadas proteo e manuteno da diversidade biolgica e dos
recursos naturais e culturais a ela associados, manejadas por meios oficiais ou outros meios
efetivos (IUCN, 1994, p. 7).
Diversos pases, entretanto, desenvolveram seus sistemas nacionais de reas
protegidas utilizando terminologias distintas. No Brasil usa-se o termo Unidades de
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Conservao, definidas a partir da Lei n 9985 do ano 2000 como espao territorial e seus
recursos ambientais, incluindo as guas jurisdicionais, com caractersticas naturais
relevantes, legalmente institudo pelo Poder Pblico, com objetivos de conservao e limites
definidos, sob regime especial de administrao, ao qual se aplicam garantias adequadas de
proteo. O Sistema Nacional de Unidades de Conservao divide essas reas em doze
categorias, separadas em dois grupos (Proteo Integral e Uso Sustentvel), cujos objetivos
de conservao e diretrizes de manejo se diferenciam entre cada uma delas.
O recorte espacial definido por esse trabalho constitui-se na Faixa de Fronteira
brasileira, regio definida segundo a Lei 6.634 de 2/5/1979 como a faixa de 150 quilmetros
de largura a partir do limite internacional do territrio. Assim, foram consideradas as
Unidades de Conservao (UCs) inseridas nos municpios que constituem essa regio.
Operacionalizao
Para a elaborao do panorama das Unidades de Conservao na Faixa de
Fronteira foi necessria a construo de um banco de dados com informaes relativas s
reas que constam no Cadastro Nacional de Unidades de Conservao (CNUC) nos
municpios que constituem a Faixa. Uma das dificuldades metodolgicas desse processo a
incompatibilidade dos dados disponibilizados pelas diferentes instituies, especialmente
no que tange existncia ou no de determinadas Unidades. Algumas UCs so
mencionadas tanto na bibliografia disponvel quanto em bases de dados de rgos locais,
porm no se encontram no CNUC. Assim, diante da impossibilidade de confirmao do
mbito de existncia dessas Unidades (como por exemplo por meio do seu Decreto de
Criao), decidiu-se por considerar aquelas registradas no Cadastro Nacional.
Essa base de dados conta com informaes relativas s trs dimenses
abordadas, como exemplificado por meio do Quadro I. Os dados relativos a essas variveis
foram preenchidos a partir da pesquisa em diversas fontes de dados, como o Cadastro
Nacional de Unidades de Conservao (CNUC), os sites institucionais do Instituto Chico
Mendes de Conservao da Biodiversidade (ICMBio), o banco de dados disponibilizado
online pelo Instituto Socioambiental (ISA), as instituies estaduais e municipais
responsveis pela gesto das unidades, alm de notcias publicadas pela mdia local e
nacional.
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Quadro 1: Exemplo do banco de dados
Cabe destacar que o presente trabalho no abrange todas as variveis
levantadas, j que a extenso da anlise possvel de ser realizada com algumas delas
demandou a segmentao desse estudo. Esses casos sero aqui abordados dentro de cada
dimenso a que a varivel pertence.
Diante da divergncia que muitas vezes foi encontrada entre as informaes
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disponibilizadas pelas diferentes fontes, somente incluram-se os dados que foram passveis
de confirmao (no caso da divergncia, por exemplo, relativa ao Plano de Manejo somente
considerou-se sua existncia quando foi encontrada a publicao oficial de sua criao).
A partir das variveis disponveis no banco de dados, foram confeccionados
grficos e quadros comparativos para visualizao e anlise das informaes encontradas.
RESULTADOS
A despeito da dificuldade de obteno de dados, os resultados preliminares
apontam para a existncia de 204 unidades de conservao na Faixa de Fronteira, que
representam cerca de 11% do universo de Unidades de Conservao no Brasil. Os dados
foram trabalhados principalmente por meio de grficos, divididos pelas dimenses da
matriz da pesquisa.
Dimenso biogeogrficaA principal varivel que caracteriza essa dimenso o bioma abrangido pelas
Unidades de Conservao. A Amaznia protegida por mais da metade dessas reas (57%
das unidades), enquanto a outra metade abrange Unidades no Cerrado, Pantanal, Pampa e
Mata Atlntica (Grfico 1). Esse dado vai se relacionar de maneira muito prxima
distribuio das Unidades ao longo dos arcos da Faixa de Fronteira (Norte do Amap at
Rondnia-, Central Mato Grosso e Mato Grosso do Sul- e Sul Paran, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul), distribuio essa que melhor analisada pelas variveis da dimenso
Institucional, a seguir.
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Grfico 1: UCs por bioma abrangido.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao
Dimenso institucional
Na dimenso institucional, a matriz foi dividida entre as variveis referentes
legislao e implementao e gesto. No primeiro tema, as variveis incluem a
categoria e o grupo do SNUC a que pertence a Unidade, alm da sua data de criao e se
houve alterao de seus limites. Dentre as 204 reas, aparecem 11 categorias das 12
propostas pelo SNUC (somente a Reserva de Fauna no figura na Faixa de Fronteira).
Constitui-se um universo em que mais da metade das Unidades so do grupo de Uso
Sustentvel (Grfico 2). Em relao s datas de criao, possvel que se analisem os
perodos em que mais foram criadas Unidades no pas, porm esse estudo dimensiona-se
alm dos objetivos especficos do presente trabalho. Da mesma forma, o processo de
ampliao ou reduo dos limites de Unidades de Conservao gera anlises que se inserem
em uma etapa posterior a essa primeira caracterizao panormica.
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Grfico 2: Distribuio das UCs por Grupo.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao
Dentro do tema de Implementao e Gesto, foi analisada primeiramente a
distribuio espacial das Unidades pelos arcos da Faixa de Fronteira e dentro da prpria
Faixa (Grfico 3). O Arco Sul o que conta com menos Unidades, respondendo por 19% do
universo dessas reas na Faixa, enquanto que os Arcos Central e Norte tm 40 e 41%
respectivamente. Essa distribuio reflete os padres de maior preservao na Regio
Amaznica em relao ao resto do pas, rea que hoje representa ainda a fronteira de
expanso econmica brasileira. Nesse sentido, cabe ressaltar o carter polmico da
implementao dessas reas de proteo, j que envolvem uma srie de interesses distintos
entre os agentes envolvidos. Por um lado, h uma preocupao da criao das Unidades de
Conservao com o princpio primeiro da preservao desse ecossistema que vem sendo
ameaado pelo avano do agronegcio do Centro-Oeste. Em escalas mais locais, porm, as
Unidades se tornam um empecilho para os governos municipais e populaes que se
beneficiam dos setores de extrao dos recursos da floresta. H, ainda, os interesses das
populaes tradicionais e indgenas, que muitas das vezes no vo ao encontro da
instituio dessas reas de proteo.
A menor representao das Unidades no Arco Sul, por sua vez, se justifica pelos
maiores ndices de urbanizao dessa regio, cujos ndices de desmatamento j suprimiram
a maior parte da vegetao original.
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Grfico 3: Distribuio das UCs por Arcos da Faixa de Fronteira.
Fonte: Ministrio do Meio Ambiente
Das 204 Unidades, somente 31 esto na linha fronteiria; nessas, h uma
distribuio mais equilibrada entre as reas de cada grupo (nas demais Unidades h uma
prevalncia das reas de Uso Sustentvel) (Grfico 4).
Grfico 4: UCs por Grupos segundo posio na Faixa de Fronteira.
Fonte: Ministrio do Meio Ambiente
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J em relao distribuio espacial dos grupos de categorias pelos Arcos da
Fronteira, podemos destacar que no Arco Norte h uma predominncia de Unidades de Uso
Sustentvel (69% das 84 Unidades desse Arco), enquanto no Arco Sul o padro inverso
(52% das 38 unidades so de Proteo Integral); o Arco Central repete o padro de
distribuio do Arco Norte (67% so Unidades de Uso Sustentvel). Cabe ressaltar,
entretanto, a relatividade desses dados, j que o nmero de Unidades de Conservao
bem distinto em cada Arco.
Quadro 2: Grupos das UCs por Arco da FF
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao; Ministrio do Meio Ambiente.
Sobre esse dado, importante perceber que a representao das Unidades de
Uso Sustentvel no Arco Norte especialmente justificada pela predominncia das Reservas
Extrativistas na regio. Essa categoria d conta das reas protegidas destinadas
preservao das fontes de subsistncia de populaes tradicionais que vivem do
extrativismo vegetal, o que explica que elas apaream basicamente na Regio Amaznica do
Pas. Por outro lado, no Arco Central, as Reservas Particulares de Patrimnio Natural so
responsveis pela quantidade de Unidades de Uso Sustentvel e espelha a expressividade
da propriedade privada nessa regio do Pas.
Em relao s esferas responsveis pela gesto dessas reas, somente 3% so
geridas por rgos municipais e mais da metade so da esfera federal (Grfico 5). Sobre
esse dado, ressaltamos que, ao longo do trabalho de pesquisa, diversas Unidades
municipais que no figuram no CNUC foram levantadas a partir de bibliografia e de mdias
locais (blogs, sites de instituies e dos rgos municipais, jornais). Assim, a pouca
expressividade dessa esfera demonstrada por esse estudo justificada pelo fato de que
muitas reas protegidas geridas pelo poder municipal no se enquadraram na legislao do
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SNUC e, portanto, no fizeram seu registro no Cadastro Nacional.
Grfico 5: UCs por esfera de gesto.
Fonte: Ministrio do Meio Ambiente
J em relao existncia de instrumentos de gesto, percebe-se que mais de
70% das Unidades no contam com Plano de Manejo (Grfico 6). Esse dado torna-se
bastante relevante quando lembramos que a Lei 9.985 estabelece a obrigatoriedade de um
Plano de Manejo para todas as Unidades (Captulo IV, artigo 27). nesse Plano de Manejo
que devem constar todas as normas referentes gesto, administrao e utilizao tanto
dos limites internos da rea protegida quanto da sua zona de amortecimento. No Plano so
estabelecidas tanto as aes de manejo referentes aos recursos naturais quanto
necessidade de infraestrutura fsica (instalaes, nmero de funcionrios, acessos
Unidade). Assim, conclui-se que a ausncia do Plano de Manejo dificulta ou mesmo impede
uma sistematizao nas aes relativas gesto da Unidade.
O Plano de Manejo, ao regulamentar todas as normas da Unidade de
Conservao, deve contar com a participao da sociedade civil, visto que a sociedade que
vai se beneficiar da visitao e/ou da utilizao da Unidade, bem como de seus servios
ambientais. A Lei do SNUC, nesse sentido, prev que o Plano seja elaborado conjuntamente
com os Conselhos Gestores da Unidade. Os Conselhos so presididos pelo chefe da Unidade
e se constituem de representantes dos rgos pblicos e representantes da sociedade civil,
visando garantir a dita participao na regulamentao da rea protegida.
Para a Faixa de Fronteira, em relao s Unidades que devem contar com um
Conselho Gestor (excetuam-se as Reservas de Patrimnio Privado Natural, cuja existncia de
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Conselho facultativa), 39% ainda no o implementaram (Grfico 6). Isso significa que,
nessas Unidades, a sociedade civil est excluda dos processos decisrios de
regulamentao e gesto das reas, assim como indiretamente dos mecanismos de
fiscalizao.
Grfico 6: Existncia de Plano de Manejo e Conselho Gestor.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao; Instituto Socioambiental
Os dados referentes situao fundiria das Unidades foram extrados
exclusivamente do Cadastro Nacional de Unidades de Conservao. Alm da predominncia
da situao de no-regularizao, pertinente que se destaque a ausncia de dados
referentes essa varivel no Cadastro (Grfico 7).
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Grfico 7: Situao fundiria.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao
Em relao varivel recursos humanos, os dados relativos ao nmero de
funcionrios das Unidades so referentes a anos distintos. A presena de funcionrios
dentro de uma Unidade um dado importante para anlise da efetividade da gesto, visto
que h Unidades sobre as quais podemos dizer que existem somente perante a Lei, posta a
ausncia absoluta de funcionrios para conduzir sua gesto. So os denominados parques
de papel. Porm, para desenvolver uma metodologia mais adequada de anlise desses
dados, haveria necessidade da compatibilidade das datas.
Diversos aspectos ligados infraestrutura, presentes no CNUC, poderiam
complementar o estudo realizado nessa dimenso: no Cadastro esto presentes inmeros
dados relativos estrutura de transportes, comunicao, energia, saneamento bsico e
estruturas fsicas. Uma metodologia para cruzamento de todos esses aspectos poderia ser
desenvolvida em um estudo posterior, porm na medida em que a maioria das Unidades
no conta com esses dados, no haveria a preciso desejada na anlise.
Dimenso socioeconmica
Essa dimenso se desdobra no tema Conflitos de uso, que vai abranger
variveis que apontam para conflitos gerados pelos diferentes usos da terra por diferentes
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atores que se incluem no processo de criao e gesto de uma Unidade.
A varivel populao indica a existncia ou no de moradores no interior das
UCs, o que pode apontar uma potencialidade para a gerao de conflitos a partir do
momento em que os objetivos de proteo buscados pela criao da Unidade vo de
encontro ao uso da terra dado pela populao que habita aquela rea. importante
destacar que em relao a esse aspecto (presena de moradores no interior da UC), as
normas de cada categoria diferem em relao ao grau de interdio, quer se trate de
moradia ou mesmo de visitao e pesquisa. Mesmo no grupo de Proteo Integral, a
ocupao humana permitida nas categorias Monumento Natural e Refgio de Vida
Silvestre. No grupo de Uso Sustentvel, todas as categorias permitem a ocupao, algumas
delas restringindo essa ocupao s populaes tradicionais. Em tais UCs, os objetivos de
conservao devem ser compatibilizados com os usos necessrios ocupao desses
moradores. Quando tratamos da ocupao humana ilegal, entretanto, nos referimos
quelas categorias que no permitem a presena de moradores. Em alguns casos, as UCs
sofrem com a invaso de agentes interessados na extrao de recursos e na agropecuria;
em outros, h conflitos entre populaes que tradicionalmente habitavam o local e passam
a ter sua ocupao proibida pela implantao posterior da Unidade de Conservao.
Assim, dentre as 12 categorias do SNUC, as Estaes Ecolgicas, os Parques e as
Reservas Biolgicas so as 3 que no admitem presena de populao humana em seu
interior. As Florestas, as Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento
Sustentvel admitem a presena somente de populaes tradicionais. Assim, para a Faixa de
Fronteira, no primeiro grupo mais restritivo observou-se que 15 Unidades ainda registram
ocupao irregular em seu interior (Grfico 8).
J dentre as Unidades que permitem a ocupao por populaes tradicionais, 28
tm ocupao no interior, sendo que 5 delas tm ocupao por populaes no-tradicionais
(irregular) (Grfico 9).
Cabe destacar que em ambos os casos h uma ausncia significativa de dados
no Cadastro Nacional, comprometendo uma anlise mais precisa sobre essa varivel.
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Grfico 8: Ocorrncia de ocupao humana irregular no interior das UCs.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao
Grfico 9: Ocupao humana em UCs restritas a populaes tradicionais.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservao
Em relao varivel Visitao alarmante o fato de que somente 16 Unidades
contem com os dados registrados no CNUC. Assim, a indisponibilidade de dados de 92% das
UCs impossibilita a anlise dessa varivel.
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A varivel proprietrio se aplica s RPPNs, j que essa categoria de UC
constitui-se em propriedades privadas. A anlise do registro do proprietrio no CNUC
permite, muitas vezes, analisar se aquela UC est inserida em uma propriedade voltada
agropecuria, minerao ou mesmo se foi criada com fins eminentemente tursticos. Essa
varivel, assim como as variveis que tratam da sobreposio de uma UC com outras e/ou
com Terras Indgenas e a varivel que destina-se ao levantamento de presses sofridas pela
Unidade, resultou em estudos mais especficos que no se inseriram no escopo do presente
trabalho.
CONCLUSES
At esse ponto, os resultados nos levaram s concluses preliminares de que
uma maior efetividade no cumprimento dos objetivos de conservao nessas reas ainda
exigir um grande esforo relativo aos instrumentos de gesto e manejo. Apesar de a Lei n
9985 ter preenchido a lacuna que o Pas tinha referente regulamentao do processo de
criao e gesto de reas protegidas, o que se observa que sua existncia no garantiu o
cumprimento efetivo das diretrizes que ela prope. A partir da bibliografia existente,
percebemos que, de maneira geral, esses problemas observados na Faixa de Fronteira
repetem o padro das reas protegidas do resto do Pas. A criao de Unidades de
Conservao sem uma real implementao das mesmas faz com que elas existam somente
no papel, impedindo um real cumprimento das diretrizes de preservao dos ecossistemas
e permitindo que ainda sejam frequentes as ocorrncias de ilcitos ambientais dentro de
seus territrios.
Apesar de as deficincias de gesto nessa regio repetirem o padro registrado
no resto do Pas, infere-se que essas lacunas, quando associadas posio perifrica da
Faixa de Fronteira no espao brasileiro, criam uma especificidade da problemtica nessa
rea. Nesse sentido, a prxima etapa desse estudo configura-se no levantamento de
presses e ameaas s Unidades na Faixa de Fronteira, objetivando analisar a existncia de
padres entre a ocorrncia de ilcitos ambientais e a posio fronteiria dessas Unidades.
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PANORAMA DAS UNIDADES DE CONSERVAO NA FAIXA DE FRONTEIRA BRASILEIRA: UMA CARACTERIZAO
EIXO 5 Meio ambiente, recursos e ordenamento territorial
RESUMO
A criao de reas protegidas dedicadas conservao da natureza intensificou-se medida que
uma gama de questes ambientais cresceu em importncia nas pautas internacionais e na agenda
nacional. Sua implantao na regio de fronteira brasileira em particular segue controversa para
diversos atores da sociedade civil, dos governos, foras armadas e organizaes ambientalistas.
Sua incidncia na faixa de fronteira brasileira continuamente apresentada como um fator de
vulnerabilidade para a soberania nacional entre os setores mais nacionalistas ou como uma
interdio de acesso aos recursos naturais por atores locais e regionais. Mas esse conjunto to
diverso de unidades de conservao muito pouco conhecido de fato.
Assim, o presente trabalho pretende preencher esta lacuna traando um panorama das Unidades
de Conservao situadas na Faixa de Fronteira brasileira. Est em curso a construo de uma
base de dados com informaes relativas sua localizao, extenso, criao, gesto e
categorizao, bem como sobre a incidncia de presses e ameaas. Esto sendo pesquisadas
diversas fontes de dados, como o Cadastro Nacional de Unidades de Conservao (CNUC), os
sites institucionais do Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade, o banco de
dados disponibilizado online pelo Instituto Socioambiental, as instituies estaduais e municipais
responsveis pela gesto das unidades, alm de notcias publicadas pela mdia local e nacional.
A despeito da dificuldade de obteno de dados, os resultados preliminares apontam para a
existncia de 204 unidades de conservao na Faixa de Fronteira, que representam cerca de 11%
do universo de unidades de conservao no Brasil. Dessas unidades, 57% so de gesto federal,
enquanto 40% so geridas por rgos estaduais e apenas 3% por rgos municipais. Em relao
aos grupos classificados pelo SNUC, a maioria das UCs so de Uso Sustentvel (64%, enquanto
36% so de Proteo Integral). A Amaznia protegida por mais da metade dessas reas (57%
das unidades), enquanto a outra metade abrange unidades no Cerrado, Pantanal, Pampa e Mata
Atlntica. Mais de 70% delas no contam com Plano de Manejo, o que aponta uma falha bastante
significativa nas estratgias de gesto dessas reas. Em relao s presses levantadas, o
desmatamento a mais recorrente: mais de 26% das Unidades apresentaram ocorrncias. Em
sequncia ao desmatamento aparecem incidncias de incndios/queimadas, extrao ilegal de
madeira, caa e pesca ilegais e ainda minerao/garimpo.
Palavras-chave: Unidades de Conservao; Faixa de Fronteira; gesto ambiental.
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