O naufrgio em Camilo Pessanha
221
Revista da Faculdade de Letras Lnguas e Literaturas, II Srie, vol. XXIII, Porto, 2006 [2008], pp. 221-232
O NAUFRGIO EM CAMILO PESSANHA*
NGELA CARVALHO
[Para Schopenhauer] certo que aquilo que o es-pectador v o prprio passado, na medida em que pde tornar-se espectador e aprender a gostar da sabedoria da situao que se alheou da vida. Porm, o que ele v encontra-se tambm no futuro sua frente enquanto inevitabilidade que emerge da vida que um mar cheio de recifes e remoinhos. Ele evita-os com cuidado e pru-dncia, embora saiba que justamente o sucesso de todo o esforo e arte de abrir caminho que o leva ao ponto em que o seu naufrgio inevitvel. Ele sabe que assim, com cada passo, ele aproxima-se do maior, total, inevi-tvel e irremedivel naufrgio, que navega exactamente em direco a ele, em direco morte. Esta no s o objectivo final da fadiga, ela pior que todos os recifes que conseguimos evitar.
Hans Blumenberg, Naufrgio comEspectador (1979: 84-5)
* Trabalho realizado no mbito da disciplina Temas de Literatura Portuguesa,
do Curso de Especializao em Ensino do Portugus Lngua Estrangeira (ano lectivo
de 2006/2007), sob a orientao do Prof. Doutor Pedro Eiras.
NGELA CARVALHO
222
Considerando a produo potica de Camilo Pessanha e reflectin-
do, em particular, sobre a mecnica do naufrgio enquanto evaso,
este artigo apresenta um conjunto de hipteses e, em alguns casos,
concluses sobre o tema. Utilizei como corpus de anlise a Clepsydra
na edio de Antnio Barahona. Optei por esta edio, uma vez que
respeita a de 1920, sobre a qual Camilo Pessanha se expressou do
seguinte modo sua editora Ana de Castro Osrio: no quero deixar
de agradecer-lhe, penhoradissimo, a publicao da esquecida Clep-
sydra e os cuidados da disposio (que como eu proprio o faria) e
da ortographia. (1921: 83).
Porque s poder existir naufrgio onde haja viagem martima,
comeo por considerar que a vida apresentada enquanto viagem no
Soneto de Gelo (1887: 94-5), desde que aceitemos que, na primeira
estrofe, bero possa ser entendido como barco. Para essa interpre-
tao abona o facto de encontrarmos ao longo do poema vocbulos
que se relacionam com o tpico do martimo (farol, batel, lenho
e afundir). Esta metfora j tinha sido dada a lume anteriormente,
sendo que na viso de Pascal [, a] metfora do embarque contm
a sugesto de que a vida significa que se est j no mar alto, onde,
para alm de salvao ou declnio, no h qualquer soluo, no h
qualquer reserva (Blumenberg, 1979: 33). semelhana de Pascal,
tambm para Pessanha no h salvao, sendo o naufrgio a nica
realidade. Para o poeta, o naufrgio tanto pode ser desejado como
indesejado, sendo ainda visto como simples inevitabilidade, como
tentarei explicitar de seguida.
No poema Ao meu corao um peso de ferro (1893: 50-1), a
morte por afogamento surge como desejvel nos trs ltimos versos
(E um leno bordado Esse hei-de o levar,/ Que para o molhar
na gua salgada/ No dia em que enfim deixar de chorar) , podendo
at ser entendida como um projecto suicida. Essa ideia est presente
j na primeira estrofe e nos vv. 7-8 da mesma composio potica:
O naufrgio em Camilo Pessanha
223
Ao meu corao um peso de ferroEu hei-de prender na volta do mar.Ao meu corao um peso de ferro Lan-lo ao mar.
()Marujos, erguei o cofre pesado,
Lanai-o ao mar.
O desejo de morte equivale a um desejo de anulao, nomeada-
mente das penas do amor que acompanham o sujeito potico no
seu exlio. Embora em nenhum momento do poema seja dito que o
enunciador est a vivenciar uma experincia de exlio, podemos adi-
vinh-lo com base na circunstncia de o sujeito potico realizar uma
viagem martima e levar consigo as penas do amor. De acordo com
o enunciador, o que distingue o exilado dos outros seres humanos o
facto de para aqueles as penas do amor serem nefastas, notando-se
em alguns versos de Pessanha um mau pressgio quanto s conse-
quncias que essas penas podem trazer: Quem vai embarcar, que vai
degredado/ As penas do amor no queira levar (vv. 5-6). Nisto
apoio a convico de que o enunciador se encontra discursivamente
em contexto de exlio, pois no caso do sujeito de Ao meu corao
um peso de ferro percebemos que so precisamente essas penas que
o conduzem ao desejo de morte uma morte como evaso, como
fuga dor e existncia.
Esta ideia corroborada por duas passagens de cartas de Camilo
Pessanha. A primeira endereada a Alberto Osrio de Castro: Sabe
que eu tambem ando por esses mares fra sempre a escolher o melhor
logar da minha sepultura?// No fundo do mar? (s/d: 48). A outra foi
dirigida a Carlos Amaro e escrita a bordo do navio que levou o poeta
de regresso a Macau em 1909:
NGELA CARVALHO
224
Sabe o que eu agora desejaria? No chegar ao meu stio nunca Ir assim, a bordo de um navio, sem destino. Veja como o destino varia. Nos ltimos dias de Lisboa, o terror que verdadeiramente me oprimia era este mar morto da viagem, entre dois abismos to distantes um do outro, e no fundo de cada um dos quais a minha alma perpetuamente agoniza (cit. in Lencastre, 1984: 114).
o que Barbara Spaggiari j tinha observado, referindo que Deste
modo, nas suas poesias, ora deseja vaguear para sempre no mar sem
uma meta, ora anseia, pelo contrrio, por um naufrgio (1982: 35).
Nos anteriores perodos epistolares, vemos tambm reafirmada a ideia
de que o sujeito de enunciao se encontra em exlio permanente.
A morte figurada como indesejada est patente no Soneto de
Gelo, onde o sujeito potico declara abertamente querer um resto
de batel, um lenho que lhe permita no se afundir. Estas tbuas
de salvao aparecem-nos como metfora da f, ausente porque de-
sejada, inatingida porque procurada:
Ingnuo sonhador as crenas doiroNo as vs derruir, deixa o destinoLevar-te no teu bero de bambino,Porque podes perder esse tesoiro.
Tens na crena um farol. Nem o procuras,Mas bem o vs luzir sobre o infinito!...E o homem que pensou, foi um precito,Buscando a luz em vo sempre s escuras. (Pessanha, 1887: 94-5, vv. 1-8)
Este poema apresenta uma dicotomia entre a busca activa da f
e a quietude dos que j a possuem. No que diz respeito primeira,
conduzir perda de valiosas crenas, no caso de estas j existirem,
ou condenao ao no alcance das mesmas, no caso de estas ainda
no existirem. A aco amaldioa tambm o homem que ousou pensar,
O naufrgio em Camilo Pessanha
225
buscando a luz em vo sempre s escuras. Este sujeito, que deseja
a f que no tem, est condenado a naufragar, embora faa tudo para
o evitar. A quietude dos que j possuem a f apresentada como
nica soluo para no perder esse tesoiro. O ingnuo sonhador
dever unicamente deixar-se levar pelo destino, vida fora, se no
quiser perder o farol que luz sobre o infinito. O ingnuo sonhador
no procura essa luz e por isso mesmo que a v luzir.
No poema Singra o navio. Sob a gua clara (1899: 32-3), o nau-
frgio surge como a constatao de um facto, analisado consciente
e metodicamente, revelando-se como uma inevitabilidade. O sujeito
potico distancia-se desde o incio da imagem que observa: Impe-
cvel figura peregrina,/ A distncia sem fim que nos separa! (vv. 3-4).
Essa impecvel figura peregrina est [funda], sob gua plana (v. 8),
a uma distncia sem fim que [os] separa, o que est de acordo com
a observao de Ester Lemos, segundo a qual O olhar de Pessanha
no parece abranger a realidade em superfcie, consider-la de cima.
O mar, de que tanto se fala na Clepsidra, raramente olhado na
extenso: mais fcil perscrutar-se-lhe o fundo. (1956: 25).
Esta ideia de olhar em profundidade surge-nos tambm no poema
Chorai arcadas (1900: 60-1), na terceira estrofe: Se se debruam,/
Que sorvedouro!... (vv. 14-5). Chegamos assim a uma outra ideia, a
de sorvedouro, de abismo, causa de todo o naufrgio e consequente
runa. Em Singra o navio. Sob a gua clara esta profundidade de
abismo sondada, reconstruda, comparada. Devemos todavia recordar
a advertncia final do sujeito potico cores virtuais que jazeis
subterrneas (1916: 72-3) , como se nesse ltimo poema quisesse
extinguir algum vestgio de esperana que pudesse ter deixado em
textos anteriores: Abortos que pendeis as frontes cor de cidra, ()//
Cessai de cogitar, o abysmo no sondeis.// () Adormecei. No sus-
pireis. No respireis. (vv. 6; 10; 15). a afirmao taxativa da nsia
de aniquilamento, j enunciada na composio potica com que abre
NGELA CARVALHO
226
Clepsydra e em que se manifesta claramente o desejo de evaso, si-
lenciosa, por anulao: Oh! Quem pudesse deslizar sem rudo!/ No
cho sumir-se, como faz um verme (1916: 9; vv. 3-4). Tambm no
poema Ao meu corao um peso de ferro essa ideia tinha j sido
anunciada, ainda que de forma mais atenuada. No fundo, trata-se da-
quilo a que Barbara Spaggiari se referiu nestes termos: O passado est
povoado de saudades, o futuro escorre lentamente para o oceano
do Aniquilamento. Tal condio existencial do homem no pode ser
seno imutvel (1982: 45).
A imagem observada, encerrada na profundidade da sepultura
martima, uma imagem de runas da vivncia humana (Seixinhos
da mais alva porcelana) (v. 5), runas do mundo natural (Conchinhas
tenuemente cor de rosa) (v. 6), que fora da anlise consciente do
sujeito potico (E a vista sonda, reconstrui, compara) (v. 9) se reve-
lam uma imagem ilusria: flgida viso, linda mentira! (v.11). O
sujeito potico desfaz o seu engano e com ele faz a macabra descoberta
de que afinal estava perante vestgios humanos. A sua percepo traiu-o
inicialmente, levando-o a confundir o cor-de-rosa das unhinhas com o
das conchinhas e a brancura dos dentinhos com a dos seixinhos.
Mas t-lo-ia realmente trado a sua percepo ou estamos perante uma
ars inveniendi [arte da inveno] (Benjamin, 1928: 194) por parte
do sujeito potico? Vai tambm nesse sentido aquilo que scar Lopes
refere em Pessanha, o Quebrar dos Espelhos:
Pessanha sabe, de um saber tcnico, operativo, oficinal, de poeta, que a poesia no se limita a exprimir uma realidade pre-viamente definida; pelo contrrio, ope-se s estruturas do senso comum, convidando-nos a um salto em direco a novas estruturas de compreenso e valor. (1970: 130)
A esta ideia j fez tambm referncia Barbara Spaggiari em O Sim-
bolismo na Obra de Camilo Pessanha, quando aludiu forma como
o autor olhava o mundo:
O naufrgio em Camilo Pessanha
227
[analisava] os aspectos fenomnicos da realidade e [sondava] as relaes ntimas implcitas nas coisas, tendo sempre a conscincia da interveno racional e emotiva do eu na percepo do mundo. () [Para Pessanha] a tarefa da poesia evocar a realidade, no s reproduzindo-lhe a beleza exterior mas tambm captando a trama densa de relaes que liga cada parte do universo ao todo. (1982: 44)
No podemos contudo dissociar o olhar de Camilo Pessanha sobre
a realidade do que isso trouxe de relevante sua escrita, notando,
como Barbara Spaggiari o fez, que As categorias perceptivas fundem-
-se e subvertem-se na sinestesia (ibidem: 49), oferecendo a realidade
os seus fragmentos cortantes para construir correlaes e analogias,
smbolos e metforas, em que as coordenadas espaciais se anulam,
as referncias historico-biogrficas se tornam fugazes, contornos, tons
e cores adquirem uma fluidez que se transmite ao ritmo do verso
(ibidem: 48-9).
Retomando ainda os vestgios humanos, note-se que estes apa-
recem como fruto de naufrgios, perdies, destroos, como
runas de runas, do mesmo modo que no poema Chorai arcadas
surgem os : Lemes e mastros/ E os alabastros/ Dos balastres!
(vv. 18-20) ou as Urnas quebradas!/ Blocos de gelo (vv. 21-2),
no respeitando estas turbaes sequer o repouso alm-vida. No So-
neto de Gelo encontra-se ainda um resto de batel deriva no mar.
Penso que ser til indagar o que so realmente estas runas, uma
vez que, ao contrrio do que se podia pensar, no representam o fim
de nada, no so o momento de anulao da matria, mas antes a
mineralidade a que a vida, por decomposio () regressa (Lopes,
1970: 131) e a reorganizao pela referida ars inveniendi. Sobre este
assunto refere Paula Moro que:
NGELA CARVALHO
228
se pensarmos na Lei de Lavoisier, segundo a qual na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma, perceberemos que se perde um corpo olmpico para que a gua ganhe maior densidade ao integrar a matria em decomposio (2004: 248).
Contrastando com a violncia patente em verbos como partir,
desengastar, despedaar, quebrar, derruir, afundir e arrebatar
que do conta de processos conducentes runa , temos a calmaria
to temida na carta anteriormente citada e de novo invocada no poema
Singra o navio. Sob a gua clara: Na fria transparncia luminosa/
Repousam, fundos, sob a gua plana. (vv. 7-8). A ideia de morte est
sempre presente, tanto pela aco violenta como pela ausncia de
aco, o que conduz constatao enunciada j por Erstrato:
As inclinaes do nimo fazem e destroem tudo. Se a razo dominasse o mundo nada aconteceria nele. Costuma-se dizer que os nautas tm um receio extremo da calmaria e que s desejam vento, embora se exponham ao perigo de uma tempestade. Os movimentos do nimo so, no caso dos homens, os ventos que so necessrios para pr tudo em movimento, apesar deles por vezes provocarem tempestades e outras intempries. (cit. in Blumenberg, 1979: 49)
Chegamos assim ideia de inevitabilidade a que j me referi an-
teriormente. Uma inevitabilidade que do mesmo modo que o sujeito
potico espectador de naufrgios pode vir a servir de espectculo
a outro eu ou a si mesmo (cf. Soneto de Gelo), utilizando a mesma
configurao de Schopenhauer, referida por Hans Blumenberg, [da]
identidade do sujeito humano [que se decifra] perfeitamente nas duas
posies, na do nufrago e na do que contempla. (Blumenberg, 1979:
81). Do meu ponto de vista, o sujeito potico da Clepsydra enquadra-se
bem no sentimento do sublime (ibidem: 82) em que O espectador
[se] ultrapassa na reflexo e passa a espectador transcendental (ibid.),
sentindo-se ao mesmo tempo indivduo abandonado ao acaso [e]
O naufrgio em Camilo Pessanha
229
sujeito eterno e tranquilo do conhecimento (ibid.). Neste ponto im-
pe-se invocar Goethe, que, ultrapassando a metfora do naufrgio,
chega metfora da ausncia de vestgios das rotas traadas no mar
(ibid.: 77), preconizando que:
do mesmo modo como a gua, que afastada passagem de um barco, conflui novamente atrs dele, tambm o erro, que foi banido por espritos superiores para se afirmarem, se impe muito rpida e naturalmente depois da sua passagem. () A frmula mais curta para esta experincia que na realidade, o absurdo preenche o mundo (ibid.: 78).
Trata-se daquilo a que Pessanha chama um destino invencvel e
absurdo. (cit. in Lencastre, 1984: 110). O absurdo que desencadeia
muito do desespero do poeta a mortalidade da condio humana,
como j foi notado por scar Lopes no artigo Pessanha, o Quebrar
dos Espelhos. Na confuso entre as noes de espao e de tempo
podemos sentir uma tentativa de evaso da contingncia de finitude da
vida humana, juntamente com uma referncia implcita mineralidade,
podendo servir de exemplo a distncia-tempo e a distncia-lonjura
da figura peregrina do poema Singra o navio. Sob gua clara. A
tentativa de Pessanha de se evadir contingncia da finitude da vida
humana passa tambm pelo ensaio de anulao do tempo presente,
aspecto j notado por Ester de Lemos em A Clpsidra de Camilo
Pessanha, onde chamou a ateno para o facto de o sujeito potico
da obra no entender o tempo da mesma forma que Bergson o en-
tendeu, como une succession dtats dont chacun annonce ce qui
suit et contient ce qui prcde (cit. in Lemos, 1956: 46).
Tambm Maria Jos de Lencastre o apontou em nota missiva de
30 de Abril de 1894, que o poeta dirigiu a Alberto Osrio de Castro,
referindo que uma das suas mais evidentes preocupaes era a corrente
temporal, revelando um grande desejo de abandono ao instante a
NGELA CARVALHO
230
que Ester de Lemos chamaria de deslizar contnuo e a que Pessa-
nha j se tinha referido nestes termos em carta anteriormente citada:
Sabe o que eu agora desejaria? No chegar ao meu stio nunca Ir
assim, a bordo de um navio, sem destino..
Jos Bento observou algo de semelhante no artigo Outra vez o
tema da gua na poesia de Camilo Pessanha: A nsia de aniquila-
mento, que um dos temas mais insistentes da poesia de Pessanha,
poder ser satisfeita pelo mar (1984: 16).
Em concluso, este naufrgio a que fui fazendo meno, o abis-
mar-se, uma das diversas vias de atingir a morte. Morte esta que
em certo momento surge como uma tentativa de evaso de Camilo
Pessanha do absurdo da finitude da condio humana atravs do nau-
frgio e da runa como pontos de partida para uma outra existncia
(cf. Singra o navio. Sob gua clara). Contudo, no poema cores
virtuais que jazeis subterrneas, como j referi anteriormente, temos
uma postura do sujeito potico que no deixa qualquer margem
esperana, desejando unicamente o aniquilamento. O desejo de morte
nesse mesmo sentido pode ser complementado pelo contributo de
Joo Camilo, que se referiu existncia e morte na obra potica de
Camilo Pessanha da seguinte forma:
a existncia, dado que tudo est destinado a desaparecer, acaba por impor-se definitivamente como uma viagem ou caminho sem sentido porque sem meta definida (). A partir destas constata-es, o poeta levado a desejar a morte, que pe fim s iluses e s desiluses, que elimina todas as tenses, que restabelece um estado de equilbrio absoluto semelhante quele que precede a existncia (1985: 68).
No nos podemos contudo esquecer do contexto histrico-tem-
poral e literrio em que Camilo Pessanha se insere, dado que a sua
obra a eles no alheia, mesmo se o seu conceito de poesia [est]
O naufrgio em Camilo Pessanha
231
desvinculado dos ditames da moda do tempo. A poesia para ele o
reflexo de um modo de ser e de viver, antes de ser a aplicao volun-
tria de teorias literrias ou filosficas (Spaggiari, 1982: 40). Todavia,
e apesar de as reaces perante o momento de crise sentido no fim
do sculo XIX terem sido diversas, houve uma resposta comum dos
intelectuais da poca: a fuga. pois nesse contexto que nos surge a
Clepsydra, por um lado como um testemunho da sua poca, por outro
como um monumento esttico autnomo e de grande beleza.
Bibliografia
1. Activa
1887, Soneto de Gelo, in Gazeta; ed. ut.: Clepsydra, ed. de Antnio Ba-rahona; Lisboa, Assrio & Alvim, 2003, pp. 94-5.
1893, Ao meu corao um peso de ferro; ed. ut.: ibidem, pp. 50-1.
1899, Singra o navio. Sob gua clara; ed. ut.: ibidem, pp. 32-3.
1900, Chorai arcadas; ed. ut.: ibidem, pp. 60-1.
1916, Eu vi a luz em um pas perdido; ed. ut.: ibidem, p. 9.
1916, cores virtuais que jazeis subterrneas; ed. ut.: ibidem, pp. 72-3.
1921, [Carta a Ana de Castro Osrio]; ed. ut.: Cartas a Alberto Osrio de Castro, Joo Baptista de Castro e Ana de Castro Osrio, ed. de Maria Jos de Lencastre; [Lisboa], Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1984, p. 83.
s/d, [Carta a Alberto Osrio de Castro]; ed. ut.: ibidem, pp. 48-50.
2. Passiva
BENTO, Jos 1984, Outra vez o tema da gua na poesia de Camilo Pessanha, in Persona,
n. 10, Porto, Centro de Estudos Pessoanos, pp. 12-16.
NGELA CARVALHO
232
CAMILO, Joo 1985, Sobre a abulia de Camilo Pessanha, in Persona, n.os 11-12, Porto,
Centro de Estudos Pessoanos, pp. 67-70.
LEMOS, Ester de 1956, A Clpsidra de Camilo Pessanha, Porto, Livraria Tavares Martins.
LENCASTRE, Maria Jos de 1984, Notas, in Camilo Pessanha, Cartas a Alberto Osrio de Castro, Joo
Baptista de Castro e Ana de Castro Osrio, [Lisboa], Imprensa Nacional Casa da Moeda, pp. 91-117.
LOPES, scar 1970, Pessanha, o Quebrar dos Espelhos, in Ler e Depois; ed. ut.: AA. VV.,
Homenagem a Camilo Pessanha, org. Daniel Pires; Macau, Instituto Portugus do Oriente / Instituto Cultural de Macau, 1990, pp. 128-136.
MORO, Paula 2004, Camilo Pessanha lendo Clepsydra, in Retratos com Sombra. Antnio
Nobre e os seus contemporneos, Porto, Caixotim, pp. 239-251.
SPAGGIARI, Barbara 1982, O Simbolismo na Obra de Camilo Pessanha, Lisboa, Instituto de Cultura
e Lngua Portuguesa Ministrio da Educao e das Universidades.
3. Geral
BENJAMIN, Walter 1928, Ursprung des deutschen Trauerspiels; ed. ut.: Origem do Drama Trgico
Alemo, Lisboa, Assrio & Alvim, 2004.
BLUMENBERG, Hans 1979, Schiffruch Mit Zuschauer. Paradigma einer Daseinesmetapher; ed.
ut.: Naufrgio com Espectador. Paradigma de uma metfora da existncia, Lisboa, Vega, 1990.
Top Related