Planificação das aulas – 14ª e 15ª Regência1
Data: 13 e 18 Fev. 2014
Ano: 10º
Turma: A Aula nº 43 e 44
Horário: 16h15-17h30 e 8h20-9h35 (75 min.)
Professora Estagiária: Joana Dias
«Neste mundo, e até também fora dele, nada é possível pensar que possa ser
considerado como bom sem limitação a não ser uma só coisa: uma boa
vontade. Discernimento, argúcia de espírito, capacidade de julgar e como
quer que possam chamar-se os demais talentos do espírito, ou ainda
coragem, decisão, constância de propósito, como qualidades do
temperamento, são sem dúvida a muitos respeitos coisas boas e desejáveis;
mas também podem tornar-se extremamente más e prejudiciais se a
vontade, que haja de fazer uso destes dons naturais e cuja constituição
particular por isso se chama carácter, não for boa.»
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Edições 70, p. 21-22
(Fonte da imagem: http://joildo-alexandre.blogspot.pt/2011/07/o-conceito-etica-racional.html)
1 Decidimos elaborar uma planificação que englobasse as duas regências, devido ao facto de se apresentarem em sequência, incidindo sobre os mesmos conteúdos.
1
Tema II – A AÇÃO HUMANA E OS VALORES
3. Dimensões da ação humana e dos valores.
3.1. A dimensão ético-política – análise e compreensão da
experiência convivencial.
3.1.3 A necessidade de fundamentação da moral – análise
comparativa de duas perspetivas filosóficas.
Aulas Uma
Objetivos Gerais
1. Identificar as principais áreas e problemas da Filosofia.
(Henriques, Vicente, & Barros, 2001, p. 9)
2. Reconhecer distintos sistemas de valores e diferentes
paradigmas de valoração. (Henriques, Vicente, & Barros, 2001,
p. 9)
3. Identificar e clarificar de forma correta os conceitos nucleares
relativos aos temas/ problemas propostos à reflexão do
programa. (Henriques, Vicente, & Barros, 2001, p. 10)
4. Analisar a conceptualidade sobre a qual assenta um texto,
identificando os termos ou conceitos nucleares do texto,
explicitando o seu significado e as suas articulações.
(Henriques, Vicente, & Barros, 2001, p. 10)
Objetivos Específicos
1. Reconhecer a existência de diferentes modos de entender a
moralidade;
2. Distinguir éticas deontológicas e éticas consequencialistas;
3. Compreender a ética kantiana como um exemplo de ética
deontológica;
2
4. Compreender os conceitos nucleares da ética deontológica de
Kant: boa vontade; dever; máximas; imperativo categórico;
imperativos hipotéticos; liberdade; autonomia; heteronomia;
dignidade.
Conteúdos
boa vontade; dever; máximas; imperativo categórico; imperativos
hipotéticos; liberdade; autonomia; heteronomia; dignidade.
Estratégias
1. Para ambas as regências recorremos à utilização de uma
apresentação em PowerPoint.
14ª Regência:
2. Apresentação de quadro com diferentes modos de entender a
moralidade;
3. Distinção entre éticas deontológicas e éticas consequencialistas;
4. Introdução do filósofo Immanuel Kant através da sua biografia2;
5. Breve referência aos conceitos kantianos de boa vontade e
dever;
6. Visualização de um vídeo: Justice – Pense na sua intenção –
uma aula em Harvard ministrada pelo filósofo-político Michael
Sandel. A visualização do vídeo contará com algumas pausas
sendo acompanhada de um guião por nós elaborado3;
7. Tarefa para a próxima aula – “exemplo do merceeiro” presente
na Fundamentação da Metafísica dos Costumes como forma de
2 Ver ‘Biografia’ em Anexos.3 Ver ‘Guião de aula em Harvard’ em Anexos.
3
pensar a diferença entre ação por dever e ação conforme ao
dever.4
8. Distribuição de uma espécie de glossário como forma de
explicitação dos termos kantianos essenciais.5
15ª Regência:
2. Recapitular a aula anterior: distinguir ação por dever e ação
conforme ao dever;
3. Recuperar o conceito de boa vontade;
4. Introduzir o conceito de máximas como antecipação ao
imperativo categórico;
5. Distinguir imperativos categóricos e imperativos hipotéticos –
leitura do manual na página 125 (“texto 4 de J. Rachels”6);
6. Apresentação da fórmula de imperativo categórico – leitura do
texto “Imperativo categórico 1: universalize a sua máxima”7 e
manual na página 127;
7. Apresentar a ética kantiana como uma ética formal;
8. Recuperar e aprofundar alguns conceitos já abordados no vídeo –
dignidade, autonomia e heteronomia;
9. Apresentar um esquema-síntese sobre a vontade face à autonomia
e heteronomia;
10. Leitura do texto “É incorrecto mentir a um assassino?”8;
11. Abordar algumas objeções à ética kantiana;
12. Elencar os méritos da ética kantiana;
13. Sugestão do vídeo Three Minute Philosophy – Immanuel Kant
[disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=xwOCmJevigw];
14. Elaboração de uma parte da ficha de trabalho (a outra parte ficará
para os alunos realizarem como tarefa de casa).9
4 Ver ‘Tarefa para a próxima aula’5 Ver ‘Explicitação de alguns termos kantianos’ em Anexos.6 Ver ‘texto 4’ em Anexos.7 Ver ‘Imperativo categórico 1: universalize a sua máxima’ em Anexos.8 Ver ‘É incorrecto mentir a um assassino?’ em Anexos.9 Ver ‘Ficha de trabalho’ em Anexos.
4
Recursos
1. Computador;
2. Projetor;
3. Quadro branco;
4. Textos selecionados10;
5. Guião de Aula em Harvard;
6. Tarefa para casa.
7. Ficha de trabalho.
Avaliação
Avaliação elaborada através da observação da participação dos
alunos em contexto de sala de aula e através das suas respostas à ficha de trabalho.11
Fundamentação científica
As presentes aulas incidem sobre um subponto programático referente ao estudo da
dimensão ética e moral do agir, a saber, a necessidade de fundamentação da moral.
Note-se, por isso, que se recorre a duas perspetivas diferentes (éticas deontológicas e
éticas consequencialistas). O que faremos nestas sessões será particularizar uma dessas
perspetivas – ética deontológica de Immanuel Kant.
O programa da disciplina de Filosofia transparece uma clara preocupação não só com as
competências específicas de problematização, conceptualização, argumentação, mas também, e
de modo mais transversal, reconhecer distintos sistemas de valores e diferentes paradigmas de
valoração, e, identificar e clarificar de forma correta os conceitos nucleares relativos aos temas/
problemas propostos à reflexão do programa.
Os objetivos acima referidos consolidam-se com um progressivo aprofundamento do
estudo acerca da ação humana e valores, ou seja, no modo como analisando em detalhe a ação
moral e o seu contributo para a constituição do ser moral, importa uma fundamentação ética
10 Os textos seleccionados, bem como os restantes recursos em formato de papel, surgem em Anexos.11 Ver grelha de avaliação em Anexos.
5
radical e esclarecedora que ilumine a prática normativa e ultrapasse a subjetividade da ação
humana, para que esta possa evoluir.
A ética kantiana, do período moderno do pensamento filosófico, chega até aos nossos
dias, como uma das grandes tradições éticas - «Sus escritos sobre ética se caracterizan por un
incondicional compromisso con la libertad humana, con la dignidade del hombre y con la
concepción de que la obligación moral no deriva ni de Dios, ni de las autoridades y comunidades
humanas ni de las preferencias o deseos de los agentes humanos, sino de la razón.» (Cortina,
1986, p. 253)
Na Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785) Kant estabelece os princípios
sintéticos a priori da razão prática, a faculdade que produz os juízos práticos.
O filósofo inicia a obra referida, tecendo algumas considerações sobre uma vontade boa,
essa vontade é o único bem que o ser humano possui sem limitações. Uma vontade boa é-o em si
mesma, ou seja, intrinsecamente, e brilha como uma jóia. O que nos diz este autor é o seguinte:
ainda que não consiga vencer as suas intenções, ainda que os seus esforços não consigam
alcançar o que ambiciona, a vontade boa continua brilhando porque ela vale por si mesma.
Limites físicos ou sociais não diminuem a boa vontade, uma vez que é o seu querer que a torna
boa. Por isso, o seu valor é igual em qualquer pessoa, manifeste-se ela numa pessoa muito
vulnerável ou numa pessoa com grande capacidade de realização. O filósofo alemão diz-nos,
também, que não foi para procurar a felicidade que os seres humanos foram dotados de vontade,
para alcançar a felicidade os instintos seriam até mais eficientes. Uma vontade boa é, antes, a
«condição de possibilidade de todos os outros bens». (Kenny, 1999).
Kant considera que uma ação moral só poderá ser uma ação por dever. Agir por dever
implica a existência de uma vontade boa que impulsione a ação moral humana, em oposição às
inclinações e desejos do Homem. O filósofo em análise distingue três tipos de ações – ações
contrárias ao dever, ações conformes ao dever e ações por dever. Na perspetiva kantiana apenas
atuamos moralmente quando agimos por dever. Agir por dever é agir por reverência à lei moral,
uma lei que o Homem pelo facto de ser dotado de razão, impõe a ele próprio - «Dever é a
necessidade de uma ação por respeito à lei» (Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes,
2007, p. 31).
A lei que Kant nomeia trata-se do imperativo categórico: «… devo proceder sempre de
maneira que eu possa querer também que a minha máxima se torne uma lei universal» (Kant,
6
Fundamentação da Metafísica dos Costumes, 2007, p. 31). O filósofo distingue dois tipos de
imperativos. Por um lado, os imperativos hipotéticos manifestam-se na forma de condição - «Se
queres X, então terás de fazer Y». Por outro lado, os imperativos categóricos surgem na forma de
respeito à lei em si mesma - «Deves fazer X, sem mais».
O conceito de máximas é igualmente importante no estudo da ética kantiana, porque as
máximas são princípios subjectivos da ação. É nelas que se revelam os motivos dos agentes. Por
esta razão, é decisivo conhecer as máximas de uma ação para podermos concluir se os agentes
têm uma motivação moral ao realizá-la, e assim avaliar moralmente a ação.
O filósofo alemão considera que o imperativo categórico é único, no entanto, pode ser
formulado de mais do que uma forma. Deste modo, oferece uma formulação complementar do
imperativo categórico: «Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na
pessoas de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como um
meio. (Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, 2007, p. 69)
Esta formulação complementar que Kant nos oferece traz-nos a visão do filósofo acerca
do valor de sermos pessoas. O autor sublinha que no reino dos fins, tudo tem um preço ou uma
dignidade. Se algo tem um preço, isso significa que pode ser trocado por qualquer outra coisa. O
que tem dignidade, não pode ser trocado por nada. Diz-nos ainda, que a moralidade e a
humanidade, enquanto capaz de moralidade, são as únicas coisas que possuem dignidade. Esta
dignidade, que Kant nos fala, é o respeito pelas pessoas simplesmente pelo fato de serem pessoas,
únicas, irrepetíveis, diferentes de todas as outras. Somos seres racionais, capazes de agir
autonomamente, de acordo com uma lei que impomos a nós próprios, como tal, merecemos
respeito.
Para terminar, resta-nos dizer que «as palavras de Kant ecoaram ao longo do século XIX e
ainda emocionam muitas pessoas hoje em dia» (Kenny, 1999).
Fundamentação didático-pedagógica
As presentes aulas constituem uma sequência, são duas aulas, uma após a outra, na turma
A do décimo ano.
A primeira aula inicia o estudo da perspetiva de Immanuel Kant acerca da moralidade.
Apresentar um autor com a sua biografia é importante, no caso do filósofo germânico é essencial,
pois a forma como foi educado exerceu uma influência considerável na sua vida e na sua obra.
7
De modo a introduzir um subponto, e tendo em conta a necessidade de motivar os alunos
e alunas para a ética deontológica de Immanuel Kant, consideramos o uso de um vídeo de uma
aula em Harvard leccionada pelo filósofo-político Michael Sandel, adequado como ponto de
partida do estudo de um filósofo que, num primeiro olhar, pode surgir algo complexo.
Elaboramos um guião de acompanhamento ao vídeo, como forma a não deixar os alunos e alunas
abandonados na sua visualização e, também, auxiliá-los na compreensão do mesmo.
Este é o contexto que antecipa o rigor necessário a uma série de conceitos que a ética
kantiana nos incumbe.
Recorremos aos recursos acima mencionados e, com base no princípio da diversidade de
recursos referido pelo Programa da disciplina de Filosofia, utilizamos ainda a leitura e análise de
um conjunto de textos selecionados. A leitura de textos assume especial importância no ensino da
filosofia, é através dos textos que os alunos e alunas contactam com o que foi pensado pelos
autores. Desta forma, os textos permitem-lhes pensar com e, ao mesmo tempo, pensar a partir de,
ou seja, pensar com os textos e a partir dos textos. Esta nossa escolha parece ir ao encontro do
sugerido pelo Programa da disciplina - «o exercício pessoal da razão implica alteridade, ou seja,
que pensar é pensar com ou pensar a partir de».
No final da apresentação em PowerPoint é sugerido um vídeo para que os alunos e alunas,
se tiveram oportunidade, assistirem em casa. O vídeo em questão é falado em inglês, um inglês
um pouco rápido até. No entanto, o domínio do inglês na turma em questão é elevado, seria
interessante que pudessem visualizar o mesmo, pois trata-se de um resumo da filosofia moral de
Kant, em três minutos, e de forma humorística.
Os conteúdos leccionados devem ser postos em prática, para que o docente possa
compreender se os discentes assimilaram e consolidaram os conhecimentos. O foco principal de
uma aula são os alunos e a sua aprendizagem. Como forma a verificar essa aprendizagem,
sugerimos a elaboração de uma ficha de trabalho sobre os conteúdos leccionados. A ficha de
trabalho surge composta por um número extenso de exercícios, exercícios esses que necessitam
de algum tempo de reflexão. Como tal, os alunos e alunas poderão efectuar uma parte dessa
mesma ficha na sala de aula, ficando a outra parte como tarefa para ser realizada em casa.
8
Bibliografia
Professor:
Amorim, C., & Pires, C. (2013). Clube das Ideias. Porto: Areal Editores.
Cabral, R. (1989). Logos: enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia. Lisboa: Verbo.
Cortina, A. (1986). Ética mínima: introduccion a la filosofia practica. Madrid: Tecnos.
Henriques, F., Vicente, N. J., & Barros, d. M. (2001). Programa de Filosofia 10º e 11º Anos (Ministério da Educação ed.). Ministério da Educação.
Kant, I. (1984). Crítica da Razão Prática. Porto: Edições 70.
Kant, I. (2007). Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Edições 70.
Kenny, A. (1999). História Concisa da Filosofia Ocidental. Temas e Debates.
Rachels, J. (2004). Elementos de filosofia moral. Lisboa: Gradiva.
Singer, P. (1995). Compendio de Ética. Madrid: Alianza Editorial.
Singer, P. (2000). Ética Prática. Lisboa: Gradiva.
Alunos:
Amorim, C., & Pires, C. (2013). Clube das Ideias. Porto: Areal Editores.
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Anexos
Biografia
mmanuel Kant nasceu em Königsberg, em 1724, e morreu na mesma cidade, em 1804. A
sua longa vida decorreu, portanto, durante o século XVIII. Foi fortemente marcado pela
educação religiosa – era Pietista, uma seita da Igreja Luterana. Esta seita defendia
valores como o carácter sagrado do trabalho, da verdade, do dever e da oração como meios
de aliviar o homem da dureza da vida. O facto de ter sido
educado numa família e num colégio com estes valores permite-
nos entender o carácter forte e determinado de Kant. Também,
por isso, se entende a sua autodisciplina, a sua ilimitada
autoconfiança e que tenha sido a razão, e sempre a razão, a
determinar as suas ações e a conferir ordem à sua vida e à sua
obra. Além disso, foi influenciado pelas leituras das obras de
Rousseau, um filósofo francês, que defendia o respeito pelos
direitos naturais nos quais se deveria educar uma sociedade,
para que fosse virtuosa.
I
Pontualmente, às sete da tarde, Kant dava um passeio
com uma hora de duração. Diz-se que era tão pontual, que mais do que um cidadão de
Königsberg acertava o relógio ao vê-lo passar.
Só numa ocasião pôs de lado o passeio diário. A leitura do Emile, de Rousseau,
cativou-o de tal forma que esqueceu, ou talvez tenha sacrificado, o seu passeio para o poder
acabar. De regresso, lia avidamente os jornais da tarde ou dedicava-se à leitura sobretudo
de publicação recente. Pontualmente, às dez da noite ia deitar-se. Dormia exatamente sete
horas.
A obra de Kant fecha o século XVIII. A sua parte moral pretende fazer valer a
liberdade, que foi um dos grandes ideais desse período da História. Com o século XVIII,
começa um período muito importante na história da filosofia que é conhecido pelo nome de
Iluminismo.
O Iluminismo é uma corrente ideológica, fundada em ideais como a Razão, a Ciência e
a Educação, fatores de progresso, capazes de conduzir o homem à felicidade na Terra.
«Kant, filho de um artesão, foi enterrado como um rei. No dia do funeral a vida na
cidade parou. O caixão foi seguido por milhares de pessoas, enquanto tocavam os sinos de
todas as igrejas. Os cronistas dizem que nunca se vira nada assim em Königsberg. É difícil
explicar essa espantosa eclosão do sentimento popular… Para os seus conterrâneos, Kant
10
tinha-se transformado num símbolo dos ideais da Revolução Norte-Americana e da
Revolução Francesa. Eles vinham portanto demonstrar a sua gratidão ao mestre dos direitos
do homem, da igualdade perante a lei, da cidadania mundial, da paz universal – e,
possivelmente, o mais importante, da emancipação pelo conhecimento… Não seria exagero
dizer que o tema da sua vida foi a luta pela liberdade espiritual».
Karl R. Popper
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Guião de aula em Harvard
Justice – Pense na sua intenção
[Disponível em: http://www.youtube.com/watch?
v=YSDyD1kEn6I]
Questões para orientação:
1. De que assunto trata o livro Fundamentação da Metafísica dos Costumes? (Minuto 02:28)
2. De onde resulta a ideia do indivíduo ser sagrado para Kant? (Minuto 03:10)
3. O que significa sermos autónomos? (Minuto 03:35)
4. De acordo com Kant o que significa sermos livres? (Minuto 07:59)
5. Por oposição a sermos autónomos, o que significa agir com heteronomia? (Minuto 08:35)
12
6. Em que é que consiste o respeito pela dignidade humana? (Minuto 11:12)
7. O que oferece valor moral a um ato? (Minuto 14:10)
8. Qual é a intenção que conta para a moralidade? (Minuto 18:15)
Tarefa para a próxima aula (18 Fev. 2014 [3ªfeira])
«É na verdade conforme ao dever que o merceeiro não suba os preços ao
comprador inexperiente, e, quando, o movimento do negócio é grande, o comerciante
esperto também não faz semelhante coisa, mas mantém um preço fixo geral para toda a
gente, de forma que uma criança pode comprar em sua casa [mercearia] tão bem como
qualquer outra pessoa. É-se, pois, servido honradamente; mas isso ainda não é bastante
para acreditar que o comerciante tenha assim procedido por dever e princípios de
honradez; o seu interesse assim o exigia; mas não é de aceitar que ele além disso tenha tido
uma inclinação imediata para os seus fregueses, de maneira a não fazer, por amor deles,
preço mais vantajoso a um do que a outro. A ação não foi, portanto, praticada nem por dever
nem por inclinação imediata, mas somente com intenção egoísta.»
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Edições 70, 2007, p. 27
1. Partindo do exemplo merceeiro e da leitura do manual na página 124
explique porque Kant não considera a ação do merceeiro, de não subir os
preços, uma ação moral (por dever).
Explicitação de alguns termos kantianos
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Autonomia: é o poder que o ser dotado de razão e liberdade possui de ditar a si mesmo a
lei a que deve submeter-se.
Categórico: o que vale, sem qualquer condição prévia.
Dever: obrigação de agir por puro respeito à lei moral (racional).
Hipotético: o que está submetido a uma condição. Exemplo: “se queres conservar os
dentes em bom estado, lava-os todos os dias”. Lavar os dentes depende da condição: querer
manter os dentes em bom estado.
Máxima: é uma regra subjetiva da ação. Por exemplo: vou respeitar todas as pessoas que
encontro.
Razão prática: faculdade humana que produz os raciocínios práticos.
Universalizável: que pode tornar-se universal, isto é, que pode valer para toda a gente.
Uma máxima é universalizável quando deve poder valer não só para mim, mas para toda a
gente.
Vontade boa: é a vontade autónoma, que age por puro respeito ao que a razão estabelece
como bom.
14
Texto 4 [do manual]
«Kant assinalou que a palavra dever é frequentemente usada em sentido não moral. Por
exemplo:
1. Quem quiser tornar-se um jogador de xadrez melhor deve estudar os jogos de Garry
Kasparov;
2. Quem quiser ir para a faculdade de direito deve inscrever-se nos exames de acesso.
Grande parte da nossa conduta é governada por tais «deves». O padrão é: temos um
determinado desejo (ser jogadores de xadrez melhores, ir para a faculdade de direito);
reconhecemos que um certo percurso nos ajudará a obter o que desejamos (estudar os jogos
de Kasparov, fazer a inscrição para os exames de acesso); e por isso concluímos que
devemos seguir o plano indicado.
Kant chamou a isto «imperativo hipotéticos» porque nos dizem o que fazer desde que
tenhamos os desejos relevantes. (…) Uma vez que a força de obrigatoriedade do «deves»
depende de termos ou não o desejo relevante, podemos escapar à sua força renunciando
simplesmente ao desejo. (…)
Em contraste, as obrigações morais não dependem de desejos específicos que possamos
ter. A forma de uma obrigação moral não é «Se queremos isto ou aquilo, então devemos
fazer isto ou aquilo». Os requisitos morais são, ao invés, categóricos: têm a forma «Deves
fazer isto e aquilo, sem mais». A regra moral não é, por exemplo, que devemos ajudar as
pessoas se nos importamos com elas ou se temos outro objetivo que possamos alcançar ao
auxiliá-las. A regra é, pelo contrário, que devemos ser prestáveis para as pessoas
independentemente dos nossos desejos e necessidades particulares. É por isso que, ao
contrário dos «deves» hipotéticos, não se pode evitar as exigências morais dizendo,
simplesmente, «mas isso não me interessa».
J. Rachels, Elementos de Filosofia Moral, Gradiva, 2004, pp. 175-176.
Imperativo categórico 1: universalize a sua máxima
Kant designa a primeira versão de fórmula da lei universal: «Age apenas segundo
uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal». Por
«máxima» Kant entende uma regra ou princípio que proporciona a razão para a sua ação. Na
verdade, está a dizer que devemos agir apenas segundo princípios que poderíamos
universalizar sem contestação. Para perceber o que Kant quer dizer com este teste
notoriamente abstrato, consideremos uma questão moral concreta: será que alguma vez é
correto fazer uma promessa que sabe não poder cumprir?
Suponha que necessito urgentemente de dinheiro e lhe peço um empréstimo. Tenho perfeita
consciência de que não conseguirei pagá-lo nos tempos mais próximos. Seria moralmente
admissível conseguir o empréstimo fazendo a falsa promessa de devolver o dinheiro
15
rapidamente, uma promessa que sei que não posso cumprir? Seria uma falsa promessa
compatível com o imperativo categórico? Kant afirma que não, obviamente que não. A forma
que tenho de ver se a falsa promessa se coaduna ou não com o imperativo categórico é
tentando universalizar a máxima segundo a qual estou prestes a agir.
Qual é a máxima neste caso? Algo do género: «Sempre que alguém precisar muito de
dinheiro, deverá pedi-lo emprestado e prometer restituir o dinheiro, mesmo sabendo que
não poderá fazê-lo». Se tentasse universalizar esta máxima e, ao mesmo tempo, agir de
acordo com ela descobriria uma contradição, afirma Kant. Se toda a gente fizesse falsas
promessas sempre que precisasse de dinheiro, ninguém acreditaria nessas promessas. Na
verdade, não haveria sequer promessas; a universalização da falsa promessa abalaria essa
instituição. Mas então seria inútil, mesmo irracional, tentar obter dinheiro através de
promessas. Isto demonstra que fazer falsas promessas é moralmente errado, contrário ao
imperativo categórico.
Algumas pessoas consideram esta versão do imperativo categórico de Kant pouco
convincente. A fórmula da lei universal tem algumas parecenças com o hábito que aqueles
adultos chatos têm de disciplinar as crianças que passam à frente na fila ou falam quando
não é a vez delas: «E se toda a gente fizesse isso?» Se toda a gente mentisse, ninguém
poderia confiar na palavra de ninguém, e todos sairíamos prejudicados. Se é isso que Kant
está a dizer, está no fundo a formular um argumento consequencialista – rejeitando a falsa
promessa não por princípio, mas sim pelos seus eventuais efeitos ou consequências
prejudiciais.
Foi, nem mais nem menos, John Stuart Mill quem lançou esta crítica a Kant. Mas Mill
não percebeu o objetivo de Kant. Para Kant, perceber se posso universalizar a máxima da
minha ação e continuar a agir de acordo com ela não é uma forma de especular sobre
possíveis consequências. É um teste para ver se a minha máxima está de acordo com o
imperativo categórico. Uma falsa promessa não é moralmente errada por, como é óbvio,
abalar a confiança social (embora o possa fazer). É errada porque, ao fazê-la, estou a
privilegiar as minhas necessidades e desejos (neste caso, de dinheiro) acima dos de toda a
gente. O teste da universalização remete para um pressuposto moral importante: é uma
maneira de confirmar se a ação que estou prestes a empreender coloca os meus interesses
e circunstâncias especiais à frente dos de todos os outros.
M. J. Sandel, Justiça. Fazemos o que devemos?, Presença, 2011, pp. 127-130.
É incorreto mentir a um assassino?
Kant adota uma posição muito dura em relação à mentira. Na obra Fundamentação a
mentira é dada como principal exemplo de comportamento imoral. Mas suponha que um
16
amigo estava escondido em sua casa e um assassino batia à porta à procura dele. Não seria
correto mentir ao assassino?
Kant afirma que não. O dever de dizer a verdade prevalece independentemente das
consequências.
Benjamin Constant, um filósofo francês contemporâneo de Kant, discordou desta
atitude inflexível. O dever de dizer a verdade aplica-se, afirmava Constant, apenas a quem
merece a verdade e, seguramente, esse não é o caso do assassino. Kant respondeu que
mentir ao assassino é incorreto, não porque o prejudique, mas porque viola o princípio do
direito: «A honestidade em declarações que não podem ser evitadas é o dever formal do
homem para com todas as pessoas, por grande que seja o prejuízo que isso lhe possa causar
ou a qualquer outra pessoa».
Como é óbvio, ajudar um assassino a cometer a sua má ação é um prejuízo «muito
grande». Mas lembre-se de que, para Kant, a moralidade não tem que ver com as
consequências, tem que ver com o princípio. Não pode controlar as consequências da sua
ação – neste caso, dizer a verdade – uma vez que as consequências estão ligadas à
contingência. Tanto quanto sabe, o seu amigo, temendo que o assassino estivesse no seu
encalço, já se esgueirou pela porta dos fundos. A razão pela qual tem de dizer a verdade,
afirma Kant, não é o facto de o assassino ter direito à verdade, ou de uma mentira o
prejudicar. É o facto de que uma mentira – qualquer mentira – «viciar precisamente o
fundamento do direito… Ser verdadeiro (honesto) em todas as declarações é, portanto, um
mandamento sagrado e incondicional da razão que não permite subterfúgios de nenhuma
espécie».
Parece uma posição estranha e extrema. Com certeza não temos o dever moral de dizer a
um soldado nazi que Anne Frank e a sua família estão escondidas no sótão. (…)
M. J. Sandel, Justiça. Fazemos o que devemos?, Presença, 2011, pp. 141-142.
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Ficha de trabalho (com a sugestão de correção)
Parte I
1. Considere a imagem e respetiva legenda.
Prisioneiros do campo de concentração de Buchenwald (abril de 1945). Na Segunda
Guerra Mundial, durante a ocupação alemã, os pescadores holandeses e dinamarqueses
transportaram clandestinamente nos seus barcos, para países aliados ou neutrais (como a
Inglaterra ou a Suécia), milhares de foragidos judeus. Por vezes, os barcos de pesca com
refugiados a bordo eram intercetados por barcos-patrulha nazis. Quando isto acontecia, os
pescadores mentiam e obtinham autorização de passagem, seguindo depois viagem com os
judeus perseguidos. Com esta ação evitaram que muitos judeus fossem aprisionados e
mortos nos campos de concentração e extermínio nazis.
1.1. Do ponto de vista de Kant, a ação dos pescadores é moralmente admissível?
Fundamente.
1.2. Se agir moralmente significa agir de acordo com uma lei que imponho a
mim mesmo, o que me garante que todos irão escolher a mesma lei moral?
Se o imperativo categórico é produto da minha vontade, não será possível
que pessoas diferentes escolham imperativos categóricos diferentes?
Justifique.
Cenários de resposta
1.1. Não. Kant adota uma posição muito dura contra a mentira. O dever de dizer a verdade
prevalece sempre, independentemente das circunstâncias particulares e das consequências.
18
1.2. Quando determinamos o imperativo moral a seguir – diz Kant -, não escolhemos
enquanto pessoas particulares, mas sim como seres racionais. A lei moral não depende de
cada um de nós enquanto indivíduos com interesses e desejos. Isto significa que, enquanto
seres racionais, se nos abstrairmos dos nossos interesses e desejos chegaremos à mesma
conclusão, ou seja, a um imperativo categórico (incondicional), universal e absoluto.
2. No conjunto de itens 1 a 8, selecione apenas as opções que permitem obter
afirmações possíveis de serem subscritas por Immanuel Kant.
1. O João afirma que age moralmente ao recusar-se a copiar nos testes. Fá-lo porque
considera que terá menos prejuízos com esta atitude, já que um zero e a vergonha
por que passaria seriam sempre piores do que um mau resultado conseguido num
teste feito sem recorrer à fraude.
2. Um cidadão que ajuda a capturar um assassino em série faz o que é moralmente
correto, quer o seu motivo seja o dever, quer seja a esperança de ser recompensado
pelos riscos que correu.
3. Os magnatas que, como Bill Gates, doam em vida (ou em testamento) parte da sua
fortuna fazem o que é correto, mas não agem moralmente se a sua ação visar
sentirem-se bem consigo mesmos e com os outros.
4. Michael Bloomberg, um dos homens mais ricos dos Estados Unidos e presidente da
câmara de Nova Iorque, agiu moralmente ao assumir o compromisso de doar uma
boa parte da sua fortuna, uma vez que pretende ensinar aos seus filhos o valor do
dinheiro.
5. Agem moralmente as pessoas que são caritativas quando o fazem sem nenhum outro
motivo de vaidade ou interesse, mas apenas porque reconhecem o dever de ajudar
outros seres humanos, agindo unicamente com base nesse dever.
6. Agem moralmente as pessoas que são caritativas sem nenhum outro motivo de
vaidade ou interesse, mas apenas pelo prazer em espalhar alegria à sua volta e se
poderem alegrar com o contentamento dos outros.
7. É moralmente irrelevante o motivo que leva a Rita a auxiliar os seus colegas na
organização do estudo para os testes, uma vez que os ajuda a conseguir melhores
resultados, coisa que não seria possível sem a sua preciosa colaboração.
8. Um cidadão que ajuda a capturar um assassino em série faz o que é moralmente
correto se, e apenas se, o seu motivo for o dever, mesmo com prejuízo dos seus
interesses, entre eles, o risco que corre ao fazê-lo.
Parte II
19
1. Leia o texto seguinte.
Texto A
Conseguimos portanto mostrar, pelo menos, que, se o dever é um conceito que deve ter um significado e conter uma verdadeira legislação para as nossas ações, esta legislação só se pode exprimir em imperativos categóricos, mas de forma alguma em imperativos hipotéticos.
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Atlântida, 1960, pp. 61-62.
1.1. Distinga imperativo categórico de imperativo hipotético, considerando o texto A.
Cenário de resposta
1.1. Na resposta, são referidos os aspetos seguintes:
– o imperativo categórico exprime a lei moral sob a forma de dever;
– só as ações praticadas em obediência ao imperativo categórico, por puro respeito à lei,
têm valor moral; o imperativo categórico ordena sem condições;
– o imperativo hipotético ordena mediante condições. Neste caso, as ações são praticadas
em função de inclinações, ou como condição para se atingir uma finalidade extrínseca,
pelo que não têm valor moral.
(Exercício retirado da prova escrita de 2012)
2. Leia o texto seguinte.
Ficaria eu satisfeito de ver a minha máxima (de me tirar de apuros por meio de uma promessa não verdadeira) tomar o valor de lei universal (tanto para mim como para os outros)? E poderia eu dizer a mim mesmo: – Toda a gente pode fazer uma promessa mentirosa quando se acha numa dificuldade de que não pode sair de outra maneira? Em breve reconheço que posso em verdade querer a mentira, mas que não posso querer uma lei universal de mentir; pois, segundo uma tal lei, não poderia propriamente haver já promessa alguma (…). Por conseguinte, a minha máxima, uma vez arvorada em lei universal, destruir-se-ia a si mesma necessariamente.
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Atlântida, 1960
2.1. Explique, a partir do exemplo do texto, por que razão o ato de mentir nunca é
moralmente permissível, segundo Kant.
Cenário de resposta
20
2.1. A resposta integra os seguintes aspetos, ou outros considerados relevantes e
adequados:
- identificação das condições de moralidade de um ato, segundo Kant;
- articulação entre máxima, universalidade e lei moral;
- aplicação da lei moral kantiana ao exemplo do texto.
Alunos Correção dos conteúdos
Coerência do discurso
Pertinência Objetividade
Afonso Lopes
Afonso Cachim
Afonso Soares
Bárbara Leal
Beatriz Sá
Benedita VianaDiana Diogo
Diogo Landau
Eduardo Serra
Filipe Cruz
Francisco Xav.
Francisco Dua.
Gonçalo FreitasHenrique S.
Inês Madureira
Inês Cruz
Mafalda Fer.
Mafalda Mogas
21
Grelha de avaliação da participação
Turma: 10ºA Data: 18 Fev. 2014
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