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Ponderações ao Instituto do Direito de Extensão: Singelas Notas à
Intervenção do Estado na Propriedade
Tauã Lima Verdan Rangel1
Resumo: Em uma primeira plana, o tema concernente à intervenção do Estado na
propriedade decore da evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo. Tal
fato deriva da premissa que o Ente Estatal não tem suas ações limitadas tão
somente à manutenção da segurança externa e da paz interna, suprindo, via de
consequência, as ações individuais. Nesta esteira, durante o curso evolutivo da
sociedade, o Estado do século XIX não apresentava essa preocupação; ao reverso,
a doutrina do laissez feire assegurava ampla liberdade aos indivíduos e considerava
intocáveis os seus direitos, mas, concomitantemente, permitia que os abismos
sociais se tornassem, cada vez mais, profundos, colocando em exposição os
inevitáveis conflitos oriundos da desigualdade, provenientes das distintas camadas
sociais. Quadra pontuar que essa forma de Estado deu origem ao Estado de Bem-
estar, o qual utiliza de seu poder supremo e coercitivo para suavizar, por meio de
uma intervenção decidida, algumas das consequências consideradas mais penosas
da desigualdade econômica. Abandonando, paulatinamente, a posição de
indiferente distância, o Estado contemporâneo passa a assumir a tarefar de garantir
a prestação dos serviços fundamentais e ampliando seu espectro social, objetivando
a materialização da proteção da sociedade vista como um todo, e não mais como
uma resultante do somatório de individualidades.
Palavras-chaves: Intervenção do Estado. Propriedade. Direito de Extensão.
1 Bolsista CAPES. Mestrando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Produziu diversos artigos, voltados principalmente para o Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito Administrativo e Direito Ambiental. E-mail: [email protected]
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Sumário: 1 Intervenção do Estado na Propriedade: Breve Escorço Histórico; 2
Direito de Extensão: Contornos Conceituais; 3 Admissibilidade do Direito de
Extensão; 4 Oportunidade do Exercício do Direito de Extensão
1 Intervenção do Estado na Propriedade: Breve Escorço Histórico
Em uma primeira plana, o tema concernente à intervenção do Estado na
propriedade decore da evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo. Tal
fato deriva da premissa que o Ente Estatal não tem suas ações limitadas tão
somente à manutenção da segurança externa e da paz interna, suprindo, via de
consequência, as ações individuais. “Muito mais do que isso, o Estado deve
perceber e concretizar as aspirações coletivas, exercendo papel de funda conotação
social”2, como obtempera José dos Santos Carvalho Filho. Nesta esteira, durante o
curso evolutivo da sociedade, o Estado do século XIX não apresentava essa
preocupação; ao reverso, a doutrina do laissez feire assegurava ampla liberdade aos
indivíduos e considerava intocáveis os seus direitos, mas, concomitantemente,
permitia que os abismos sociais se tornassem, cada vez mais, profundos, colocando
em exposição os inevitáveis conflitos oriundos da desigualdade, provenientes das
distintas camadas sociais.
Quadra pontuar que essa forma de Estado deu origem ao Estado de
Bem-estar, o qual utiliza de seu poder supremo e coercitivo para suavizar, por meio
de uma intervenção decidida, algumas das consequências consideradas mais
penosas da desigualdade econômica. “O bem-estar social é o bem comum, o bem
do povo em geral, expresso sob todas as formas de satisfação das necessidades
comunitárias”3, compreendo, aliás, as exigências materiais e espirituais dos
indivíduos coletivamente considerados. Com realce, são as necessidades
consideradas vitais da comunidade, dos grupos, das classes que constituem a
sociedade. Abandonando, paulatinamente, a posição de indiferente distância, o
Estado contemporâneo passa a assumir a tarefar de garantir a prestação dos
serviços fundamentais e ampliando seu espectro social, objetivando a materialização
2 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24 ed, rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011, p. 711. 3 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38 ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012, p. 661.
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da proteção da sociedade vista como um todo, e não mais como uma resultante do
somatório de individualidades.
Neste sentido, inclusive, o Ministro Luiz Fux, ao apreciar o Agravo
Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo N° 672.579/RJ, firmou
entendimento que “ainda que seja de aplicação imediata e incondicional a norma
constitucional que estabeleça direitos fundamentais, não pode o Ente Estatal
beneficiar-se de sua inércia em não regulamentar, em sua esfera de competência, a
aplicação de direito constitucionalmente garantido”4. Desta feita, para consubstanciar
a novel feição adotada pelo Estado, restou necessário que esse passasse a se
imiscuir nas relações dotadas de aspecto privado. “Para propiciar esse bem-estar
social o Poder Público pode intervir na propriedade privada e nas atividades
econômicas das empresas, nos limites da competência constitucional atribuída”5, por
meio de normas legais e atos de essência administrativa adequados aos objetivos
contidos na intervenção dos entes estatais.
Com efeito, nem sempre o Estado intervencionista ostenta aspectos
positivos, todavia, é considerado melhor tolerar a hipertrofia com vistas à defesa
social do que assistir à sua ineficácia e desinteresse diante dos conflitos produzidos
pelos distintos grupamentos sociais. Neste jaez, justamente, é que se situa o dilema
moderno na relação existente entre o Estado e o indivíduo, porquanto para que
possa atender os reclamos globais da sociedade e captar as exigências inerentes ao
interesse público, é carecido que o Estado atinja alguns interesses individuais. Ao
lado disso, o norte que tem orientado essa relação é a da supremacia do interesse
público sobre o particular, constituindo verdadeiro postulado político da intervenção
do Estado na propriedade. “O princípio constitucional da supremacia do interesse
público, como modernamente compreendido, impõe ao administrador ponderar,
diante do caso concreto, o conflito de interesses entre o público e o privado, a fim de
4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo N° 672.579/RJ. Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito administrativo. Servidor público. Adicional noturno. Regime de plantão semanal. Necessário reexame da legislação infraconstitucional. Análise do contexto fático-probatório. Impossibilidade. Incidência da súmula 279 do STF. Agravo regimental desprovido. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 29 mai. 2012. Publicado em 19 jun. 2012. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014. 5 MEIRELLES, 2012, p. 662.
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definir, à luz da proporcionalidade, qual direito deve prevalecer sobre os demais”6.
Mais que isso, o direito da supremacia do interesse público, na condição de bastião
orientador, sobretudo da intervenção do Estado na propriedade, direciona os
aspectos caracterizadores para a medida extrema a ser adotada pelo Poder Público,
de maneira a substancializar o direito da coletividade.
2 Direito de Extensão: Contornos Conceituais
Em linhas inaugurais, cuida anotar que o direito de extensão consiste no
direito do expropriado de reclamar que a desapropriação e a indenização alcancem
a integralidade do bem objeto da intervenção do Estado, quando o remanescente
restar esvaziado de seu conteúdo econômico. Jurisprudencialmente, “o direito de
extensão, que permite ao desapropriado reivindicar indenização de área não incluída
no ato declaratório, tem por consequência lógica a transferência da propriedade
inutilizada ao patrimônio do ente expropriante”7. Em mesmo sentido, Diógenes
Gasparini8 alicerçou entendimento que o expropriado poderá exigir que a
desapropriação alcance o restante do bem objeto da declaração expropriatória, dado
ter resultado inútil ou difícil a utilização autônoma desse remanescente. Ao lado
disso, cuida anotar que a desapropriação pode ser total ou parcial, conforme envolva
total ou parcialmente o bem a ser desapropriado.
Segundo o magistério acurado de José dos Santos Carvalho Filho9, a
prática do direito de extensão tem assento na situação específica da desapropriação
6 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido em Recurso em Mandado de Segurança N° 27.428/GO. Administrativo. Servidor público. Determinação de abertura de conta corrente em instituição financeira pré-determinada. Recebimento de proventos. Possibilidade. Recurso ordinário improvido. Órgão Julgador: Quinta Turma. Relator: Ministro Jorge Mussi. Julgado em 03 mar. 2011. Publicado em 14 mar. 2011. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014. 7 PARANÁ (ESTADO). Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Acórdão proferido em Agravo de Instrumento Nº 510820-5. Agravo de Instrumento. Ação de desapropriação transitada em julgado. Posterior cancelamento do registro de propriedade da área remanescente. Inviabilidade. Direito de extensão dos desapropriados que implica na transferência da titularidade do domínio, face ao recebimento de indenização referente à área total. Limite objetivo da coisa julgada. Interpretação do artigo 37, do Decreto-Lei N.º 3.365/41. Recurso provido. O direito de extensão, que permite ao desapropriado reivindicar indenização de área não incluída no ato declaratório, tem por consequência lógica a transferência da propriedade inutilizada ao patrimônio do ente expropriante, independentemente deste comando não constar de forma expressa na decisão judicial transitada em julgado. Relator: Desembargador: Abraham Lincoln Calixto. Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível. Julgado em 09 jun. 2009. Disponível em: <https://www.tjpr.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014. 8 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 17 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 946. 9 CARVALHO FILHO, 2011, p. 809.
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parcial, quando a parte que excede àquela que pretende o Ente expropriante,
porquanto a área remanescente fica efetivamente inútil ou inservível para o
particular que sofreu a intervenção do Estado na propriedade. Assim, para evitar que
a situação de permanecer com a propriedade apenas da parte inútil, o expropriado
requer que a desapropriação e, por consequência, a indenização a ela seja
estendida, convertendo, dessa maneira, a desapropriação originalmente parcial em
total, com o escopo de compreender a parcela da propriedade que se tornou, em
razão de tal intervenção, inservível.
Ementa: Administrativo. Desapropriação. Direito de extensão. Decreto Nº 4.956/1903. Matéria fático-probatória. Súmula 07/STJ. 1. O direito de extensão ocorre quando o Poder Público invade parte de imóvel (desapropriação indireta), deixando a área remanescente de exercer qualquer atrativo em termos imobiliários, hipótese em que o expropriante deverá indenizar a totalidade do bem.2. Os critérios de aferimento do Direito de Extensão previsto no Decreto 4.956/1903 estão adstritos às instâncias ordinárias, ante a necessária análise do conjunto fático-probatório, atraindo a incidência da Súmula 07/STJ. 3. Recurso especial não conhecido10. Ementa: Administrativo. Desapropriação. Utilidade pública. Direito de extensão. Contestação. Possibilidade. 1. Direito de extensão é o que assiste ao proprietário de exigir que se inclua no plano de desapropriação a parte remanescente do bem, que se tornou inútil ou de difícil utilização. 2. "(...) o pedido de extensão é formulado na via administrativa, quando há a perspectiva de acordo, ou na via judicial, neste caso por ocasião da contestação. O réu, impugnando o valor ofertado pelo expropriante, apresenta outra avaliação do bem, considerando a sua integralidade, e não a sua parcialidade, como pretendia o autor. O juiz, se reconhecer presentes os elementos do direito, fixará a indenização correspondente à integralidade do bem. Resulta daí que é o bem, da mesma forma em sua integralidade, que se transferirá ao patrimônio do expropriante" (José dos Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 11ª edição, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2004, p. 723). 3. O direito de extensão nada mais é do que a impugnação do preço ofertado pelo expropriante. O réu, quando impugna na contestação o valor ofertado, apresenta outra avaliação do bem, abrangendo a integralidade do imóvel, e não apenas a parte incluída no plano de desapropriação. Assim, o pedido de extensão formulado na contestação em nada ofende o art. 20 do Decreto-Lei 3.365/41, segundo o qual a contestação somente pode versar sobre "vício do processo judicial ou impugnação do preço". Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público. 4. Recurso especial não provido11.
10 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido no Recurso Especial Nº 617.503/RS. Administrativo. Desapropriação. Direito de extensão. Decreto Nº 4.956/1903. Matéria fático-probatória. Súmula 07/STJ. Relator: Ministro Luiz Fux. Órgão Julgador: Primeira Turma. Julgado em 27 abr. 2004. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico em 14 jun. 2004, p. 183. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014 11 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido no Recurso Especial Nº 986.386/SP. Administrativo. Desapropriação. Utilidade pública. Direito de extensão. Contestação. Possibilidade. Relator: Ministro Castro Meira. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em 04 mar. 2008. Publicado
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Com destaque, o fundamento jurídico do direito de extensão encontra
alicerce na concepção de desapropriação parcial, pois deixa para o particular
expropriado uma parte do bem que se torna, concretamente, desprovida de
conteúdo econômico, traduzindo, em tal cenário, uma verdadeira desapropriação
total, só que despido do pagamento indenizatório concernente à parte que
remanesce da intervenção do Estado na propriedade. “E essa parte remanescente,
embora sofra o esvaziamento do conteúdo econômico se tomada isoladamente, terá
como merecer avaliação patrimonial, às vezes até significativa, se tomada em
conjunto com a parte desapropriada”12. Em último degrau, admitir que o expropriado
permaneça com a área remanescente inservível é o mesmo que proceder a uma
desapropriação indireta da área que subsiste, sem que haja, contudo, o pagamento
da competente verba indenizatória.
Doutro viés, considera-se que a desapropriação constitui um direito do
Ente expropriante, assegurado, inclusive, no Texto Constitucional13, bem como
resguardado como direitos e deveres individuais14 para o cidadão, refletido na justa
indenização a ser paga pelo Ente expropriante. Entretanto, a permissão contida na
Carta de 1988 não autoriza que o Poder Público, ao proceder à intervenção do
Estado na propriedade, pratique abuso do direito concedido. Ora, há que se
no Diário da Justiça Eletrônico em 17 mar. 2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014 12 CARVALHO FILHO, 2011, p. 809. 13 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. [omissis] §3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. §4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: [omissis] III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. 14 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [omissis] XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;
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reconhecer que configuraria claramente abusiva a desapropriação que deixasse,
para o expropriado, parte de sua propriedade que, isoladamente, nada
representasse no mundo econômico. Há que se frisar, oportunamente, o argumento
justificador do direito de extensão para o particular expropriado.
Em termos normativos, cuida assinalar que alguns doutrinadores
sustentam a inexistência do direito de extensão no quadro normativo concernente à
desapropriação, eis que tanto o Decreto-Lei Nº 3.365, de 21 de junho de 194115, que
dispõe sobre desapropriações por utilidade pública, quanto o Decreto-Lei N° 4.812,
de 08 de outubro de 194216, que dispõe sobre a requisição de bens imóveis e
móveis, necessários às forças armadas e à defesa passiva da população e dá outras
providências, fazem qualquer menção expressa ao aludido direito. “Segundo esses
autores, a área remanescente poderia ser indenizada a título de compensação, não
como resultado do direito de extensão”17.
Contundo, a interpretação mais alinhada é aquela apregoa a permanência
do direito de extensão. No revogado Decreto Nº 4.956, de 09 de setembro de 1903,
que aprova o regulamento de consolidação e modificação do processo sobre as
desapropriações por necessidade ou utilidade pública, consagrava tal direito, de
maneira expressa, na redação do artigo 1218. Entrementes, a lei de regência não fez
nenhuma menção ao direito de extensão; contudo, cuida anotar que o artigo 4319 do
diploma em comento, não revogando expressamente o decreto ora mencionado. Em
turno diverso, inexiste qualquer disposição que guarde incompatibilidade com o
antigo decreto, no que concerne, pontualmente, ao direito de extensão. “Conclui-se,
15 BRASIL. Decreto-Lei N° 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. 16 BRASIL. Decreto-Lei N° 4.812, de 08 de outubro de 1942. Dispõe sobre a requisição de bens imóveis e móveis, necessários às forças armadas e à defesa passiva da população e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. 17 CARVALHO FILHO, 2011, p. 810. 18 BRASIL. Decreto N° 4.956, de 09 de setembro de 1903. Approva o regulamento de consolidação modificação do processo sobre as desapropriações por necessidade ou utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 12. Os terrenos ou predios, que houverem de ser desapropriados, sómente em parte, si ficarem reduzidos a menos de metade de sua extensão, ou privados das serventias necessarias para uso o gozo dos não comprehendidos na desapropriação, ou ficarem muito desmerecidos da seu valor pela privação de obras e bemfeitorias importantes, serão desapropriados e indemnisados no seu todo, si assim requererem os seus proprietarios (dec. n. 353 de 1845, art. 25; de n. 1664 de 1855, art. 12 n. 2). 19 BRASIL. Decreto-Lei N° 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 43. Esta lei entrará em vigor 10 dias depois de publicada, no Distrito Federal, e 30 dias nos Estados e Território do Acre, revogadas as disposições em contrário.
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portanto, que inocorreu a revogação expressa ou tácita e, desse modo, é de se
admitir que continue em vigor o dispositivo da lei antiga, que previa o referido
direito”20, consoante já assinalou Carvalho Filho.
Há que se salientar, ainda, que, após a edição do Decreto Nº 4.956, de 09
de setembro de 1903, outras legislações previram, expressamente, o direito de
extensão. A exemplo do exposto, é possível mencionar a Lei Nº 4.504, de 30 de
novembro de 1964, que dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências,
em seu artigo 19, §1º21, faz menção direta ao instituto em análise. Igualmente, a Lei
Complementar Nº 76, de 06 de julho de 1993, que dispõe sobre o procedimento
contraditório especial, de rito sumário, para o processo de desapropriação de imóvel
rural, por interesse social, para fins de reforma agrária, contempla, expressamente,
esse direito em seu artigo 4º22.
3 Admissibilidade do Direito de Extensão
Em arrimo ao esposado até o momento, quadra evidenciar que o direito
de extensão foi instituído e admitido para a desapropriação normal, ou seja, aquela
que, atendendo os requisitos constitucionais e legais, tem o seu procedimento
iniciado por declaração de utilidade pública ou de interesse social. “Não é inviável,
porém, que o Estado proceda à desapropriação indireta de área privada deixando
para o proprietário uma área remanescente inservível”23. Conforme o
Desembargador Wellington Pacheco Barros já decidiu, é interessante assinalar que
“o direito de extensão ocorre quando o Poder Público invade parte do imóvel,
20 CARVALHO FILHO, 2011, p. 810. 21 BRASIL. Lei Nº. 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 19. A desapropriação far-se-á na forma prevista na Constituição Federal, obedecidas as normas constantes da presente Lei. §1° Se for intentada desapropriação parcial, o proprietário poderá optar pela desapropriação de todo o imóvel que lhe pertence, quando a área agricultável remanescente, inferior a cinqüenta por cento da área original, ficar: a) reduzida a superfície inferior a três vezes a dimensão do módulo de propriedade; ou b) prejudicada substancialmente em suas condições de exploração econômica, caso seja o seu valor inferior ao da parte desapropriada. 22 BRASIL. Lei Complementar Nº 76, de 06 de julho de 1993. Dispõe sobre o procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo de desapropriação de imóvel rural, por interesse social, para fins de reforma agrária. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014. Art. 4º Intentada a desapropriação parcial, o proprietário poderá requerer, na contestação, a desapropriação de todo o imóvel, quando a área remanescente ficar: I - reduzida a superfície inferior à da pequena propriedade rural; ou II - prejudicada substancialmente em suas condições de exploração econômica, caso seja o seu valor inferior ao da parte desapropriada. 23 CARVALHO FILHO, 2011, p. 811.
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deixando a área remanescente de não aproveitável, hipótese em que o expropriante
deverá indenizar a totalidade do bem”24.
A indagação existente repousa na discussão em saber se é possível o ex-
proprietário exercer o direito de extensão. O entendimento compactuado por José
dos Santos Carvalho Filho25 apresenta resposta positiva para tal indagação,
porquanto o fundamento apontado para o mesmo direito de extensão em caso de
desapropriação normal, ou seja, haveria a perda indireta da propriedade sem a
correspondente indenização. O único aspecto diferenciador descansaria na forma
pela qual vai ser formulado o pedido, e isso porque apresenta perfil diverso das
ações judiciais referentes à desapropriação normal e à desapropriação indireta.
4 Oportunidade do Exercício do Direito de Extensão
No que concerne à desapropriação normal, o pedido de extensão é
estruturado na via administrativa, quando é verificável perspectiva de acordo com o
Ente expropriante, ou na via judicial, em razão da apresentação de contestação. O
réu, ao impugnar o valor ofertado pelo expropriante, apresenta avaliação distinta em
relação ao bem, considerando a sua integralidade, e não a sua parcialidade, como
pretendia originalmente o autor. O magistrado, ao reconhecer a presença dos
elementos de direito, estabelecerá indenização correspondente à integralidade do
bem. Decorre de tal premissa que é o bem, da mesma forma em sua integralidade,
que se transferirá ao patrimônio do Poder Público expropriante. É compartilhado, por
alguns doutrinadores, o entendimento que perdidas essas oportunidades, há que
24 RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Acórdão proferido em Apelação Cível Nº 70012909560. Apelação Cível. Constitucional, Administrativo e Processual Civil. Usina de Dona Francisca. Desapropriação. Ação de extensão de desapropriação c/c indenização e lucros cessantes. - Direito de extensão. Não ocorrência. Danos causados à profissão do autor. Indenização devida. Aplicação do art. 37, § 6º da CF/88. Procedência na origem. Parcial provimento à apelação. 1 - Direito de Extensão. O direito de extensão ocorre quando o Poder Público invade parte do imóvel, deixando a área remanescente de não aproveitável, hipótese em que o expropriante deverá indenizar a totalidade do bem. 1.1 Todavia, a inaproveitabilidade da área em que se pretende a aplicação do direito de extensão, não restou configurada, porquanto antes da desapropriação era utilizada para a moradia do autor e sua família, natureza essa mantida mesmo após a desapropriação do restante das áreas pertencentes ao autor. Provimento. 2. Indenização dos danos causados às atividades do autor. Os danos causados ao autor relativamente às atividades de táxi e aproveitamento de salão deverão ser indenizados, porquanto causados em virtude da obra realizada pela CEEE. Apelação provida em parte. Relator: Desembargador Wellington Pacheco Barros. Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível. Julgado em 19 abr. 2006. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em 14 set. 2014. 25 CARVALHO FILHO, 2011, p. 811.
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considerar como tendo o proprietário expropriado renunciado o seu direito, não
podendo, por consequência, reclamar a respeito.
Ora, há que se salientar que se o fundamento do direito de extensão
repousa na inviabilidade da perda indireta da propriedade sem o pagamento da
correspondente verba indenizatória, não é crível simplesmente considerar a
ocorrência da renúncia do direito. Em tal cenário, não é possível considerar a inação
como sinônimo de renúncia. “Desse modo, ainda que não exercido o direito nesses
momentos, tem o prejudicado ação de indenização contra o expropriante para lhe
ser restaurado o direito atingido pela desapropriação parcial, a menos que, como é
óbvio, já tenha se consumado a prescrição”26. Assim, é possível dizer que foi
exercido, ainda que indiretamente, o direito de extensão.
No que concerne à desapropriação indireta, será distinta a forma pela
qual é exercido o direito de extensão. Como o interessado já perdeu a propriedade
diante do fato consumado da incorporação do bem ao patrimônio público, deverá o
expropriado formular o pedido de extensão ao momento em que propõe a ação
indenizatória contra o expropriante. Em tal cenário, requererá a condenação do réu
ao adimplemento da verba indenizatória que compreenda não apenas a parte
efetivamente expropriada, como também aquela que permaneceu como
remanescente inaproveitável. Contudo, inexiste obstáculo para que seja formulado
pedido em ação diversa, desde que não tenha transcorrido lapso temporal suficiente
para acarretar a sua prescrição.
26 CARVALHO FILHO, 2011, p. 811.
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REFERÊNCIA:
BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil.
Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em 14 set. 2014.
BRASIL. Decreto N° 4.956, de 09 de setembro de 1903. Approva o regulamento de
consolidação modificação do processo sobre as desapropriações por necessidade
ou utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set.
2014.
BRASIL. Decreto-Lei N° 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre
desapropriações por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em 14 set. 2014.
BRASIL. Decreto-Lei N° 4.812, de 08 de outubro de 1942. Dispõe sobre a
requisição de bens imóveis e móveis, necessários às forças armadas e à defesa
passiva da população e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 14 set. 2014.
BRASIL. Lei Complementar Nº 76, de 06 de julho de 1993. Dispõe sobre o
procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo de
desapropriação de imóvel rural, por interesse social, para fins de reforma agrária.
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