PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Rodrigo Antonio da Rocha Frota
Fontes do Direito Tributário:
reflexão sobre a vontade na enunciação normativa
DOUTORADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2012
Rodrigo Antonio da Rocha Frota
Fontes do Direito Tributário:
reflexão sobre a vontade na enunciação normativa
DOUTORADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Direito sob a orientação do Prof. Doutor Paulo de Barros Carvalho
SÃO PAULO 2012
Banca Examinadora
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Agradeço profundamente àquelas pessoas que me
acompanharam e me apoiaram nesta longa caminhada e para elas dedico este
trabalho. Aos meus pais, Maria Helena e Antonio, à minha amada esposa,
Isabella, aos meus caros professores, em especial ao meu orientador e amigo
Professor Paulo de Barros Carvalho, aos colegas de doutorado e amigos que
muito enriqueceram este estudo com as discussões e reflexões sobre o tema.
A todos, meu muito obrigado.
Rodrigo Antonio da Rocha Frota
Resumo
O presente trabalho trata da vontade como fonte do direito, em
especial do direito tributário. Para desenvolvê-lo foi necessário estudo do
direito como objeto da cultura e, neste sentido, como ato comunicacional,
estabelecendo a identidade entre o direito e a linguagem que o constitui.
Fase crucial foi estudar a teoria dos atos de fala de John Austin e
John Searle, permitindo entender o direito como ato performativo. Neste ponto
passou-se à analise da norma jurídica, sob o ponto de vista da linguagem,
envolvendo as visões: positivista, sintática, semântica e pragmática.
Feito este estudo, partiu-se para a análise das fontes do direito,
comparando os conceitos clássicos à visão lógico-semântica, bem como
separando o direito da fonte do direito.
A seguir trabalhou-se o discurso normativo do ponto de vista
formal, mas também semântico, interpretativo, além da aplicação da teoria dos
atos de fala ao discurso normativo, finalizado com o papel da prova nesse
discurso.
Por fim, a análise da vontade como requisito à construção da
realidade jurídica, passando pelo estudo de sua atuação no direito positivo, na
Ciência do Direito e no discurso normativo, para se deparar com a vontade
como fonte do direito e qual sua utilidade como ferramenta de análise jurídica.
Abstract
The present paper treats the will as source of law, particularly tax
law. To develop the paper it was necessary to study the law as a cultural object,
and in this sense, as an act of communication, establishing the identity between
law and language.
It was crucial to the study the speech acts theory of John Austin
and John Searle, allowing to understand the law as a performative act. At this
point we moved on to analyze the rule of law, from the point of view of
language, involving visions: positivism, syntactic, semantic and pragmatic.
After, came the analysis of sources of law, comparing the classical
concepts of the logic-semantic vision, and separating the law from the source of
law.
Then a study of legal discourse from the point of view of logic
analysis, but also semantic interpretation, and application of the theory of the
speech acts to the normative discourse, ending with the role of proof in this
discourse.
Finally, the analysis of will as a prerequisite to the construction of
legal reality, through it´s role in positive law, the science of law and legal
discourse, to face the will as source of law and how is it useful as a tool of legal
analysis.
Índice
Introdução
1. O direito como ato comunicacional 11
1.1. O direito como objeto cultural 11
1.2. O direito e a linguagem 14
1.3. A comunicação e o direito 18
2. A teoria dos atos de fala 26
2.1. John Austin 28
2.2. John Searle 34
2.3. A relação entre os atos de fala e o direito 38
3. Norma Jurídica: conceito e análise 42
3.1. A visão clássica do positivismo 43
3.2. A visão pragmática 46
3. 3. O constructivismo lógico-semântico e sua visão de norma 48
4. Direito x fontes do direito 56
4.1. Os conceitos clássicos de fonte do direito 58
4.1.1. Fontes de produção 59
4.1.2. Fontes de cognição 60
4.1.3. Fontes de conhecimento do saber jurídico 70
4.1.4. Fontes de informação do saber jurídico 71
4.2. O conceito de fonte trabalhado no costructivismo lógico-semântico 72
5. Análise do discurso normativo 79
5.1. Linguagem prescritiva x descritiva: direito posto x Ciência do Direito
80
5.2. O caminho da construção de sentidos 86
5.3. A construção de sentidos e a classificação das normas 91
5.4. O papel do ato de fala no discurso normativo 94
5.5. O discurso normativo como comunicação jurídica 98
5.6. A prova e a verdade no discurso normativo 102
6. A vontade como requisito à construção da realidade jurídica 107
7. Análise clássica da vontade no direito: uma visão crítica 116
7.1. A unicidade do direito posto 117
7.2. A Ciência do Direito e seus ramos 127
7.3. Direito privado e a vontade: problema de vício 136
7.4. Direito público e a legalidade 140
7.5. Legalidade e vontade 151
8. Análise da vontade como fonte do direito 161
8.1. Direito como comunicação 168
8.2. Fonte do direito: enunciação x enunciação-enunciada 173
8.3. Vontade na enunciação 174
8.4. Vontade na enunciação-enunciada 177
Conclusão 180
Bibliografia
8
Introdução
Nestes últimos anos tem se tornado premente um estudo
aprofundado do direito como discurso normativo, nas suas esferas semântica,
gramatical e pragmática. Uma análise do direito por esta ótica implica a revisão
de conceitos jurídicos clássicos e a verificação de sua aplicabilidade ao
constructivismo lógico-semântico do direito preconizado pelo Professor Lourival
Vilanova e difundido no Direito Tributário pelo trabalho do Professor Paulo de
Barros Carvalho e de seus discípulos, naquela que podemos chamar de Escola
de Direito Tributário da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Trabalho este desenvolvido no âmbito do giro linguístico,
movimento filosófico que busca o conhecimento através do estudo da
linguagem. Neste contexto trabalha o constructivismo lógico-semântico, que
estuda a estrutura formal da linguagem jurídica somada ao conteúdo valorativo
da norma.
O objetivo do presente trabalho é analisar o tema de fontes do
direito sob tal enfoque, assumindo um prisma teórico do giro linguístico e do
constructivismo lógico-semântico, verificando como as fontes podem se
coadunar com as premissas dessa visão revolucionária da Teoria Geral do
9
Direito, confrontando-a com as posições clássicas, para, a partir disto,
introduzir a discussão acerca da vontade como fonte do direito tributário.
Busca-se aqui relativizar a exclusão da vontade no Direito
Tributário, abordando, nesta perspectiva, a vontade verificada no próprio texto
normativo, seja pela simples existência deste, seja por ser passível de ser dele
depreendida, em decorrência das marcas nele encontradas. Posição que surge
do estudo do tema pelo prisma normativo-discursivo, bem como do tratamento
do conceito de legislador no discurso normativo.
A partir do tratamento da vontade no direito, passa-se a verificar
os limites da validade de uma norma, pela análise desta vontade marcada no
corpo do texto normativo pelo discurso do legislador em sentido amplo.
Para que o estudo seja viável, imprescindível percorrer os
caminhos da Teoria dos Atos de Fala, na figura dos dois principais autores
sobre o tema: John Austin e John Searle. É com este ferramental que se
pretende demonstrar a importância da vontade na enunciação normativa, em
perfeita congruência com o constructivismo lógico-semântico aplicado ao
Direito Tributário.
10
Esta é, aliás, a inovação pretendida, haja vista a posição clássica
de ser a obrigação tributária uma obrigação ex lege. O objetivo é trabalhar a
vontade na enunciação do discurso prescritivo e as marcas que ela deixa no
texto. Bem como verificar se estas marcas são suficientes para um controle de
licitude do discurso emitido ou não.
Com a análise da vontade do discurso normativo, pretende-se
verificar as possibilidades de vício apresentadas e seus efeitos no produto: a
norma. Mas para que isto seja possível é necessário fincar raízes nos
conceitos de direito e de norma. Adiantando-se, em conformidade com o
constructivismo lógico-semântico.
Busca-se aproximar tal linha de pensamento dos efeitos
pragmáticos da linguagem prescritiva do direito. O quê, no nosso entender,
configura uma inovação na teoria dos Professores Lourival Vilanova e Paulo de
Barros Carvalho.
Por fim, é relevante ressaltar que o estudo pretendido parte do
direito pátrio atual, evitando análises históricas, sociológicas, psicológicas ou
econômicas, para seguir nos caminhos da Dogmática Jurídica.
11
1. O direito como ato comunicacional
O termo direito tem diversas acepções e, por isso, traz consigo
uma multiplicidade de perspectivas de apreensão e abordagem por parte da
doutrina. Como ensina Lourival Vilanova1
, devido diversos pontos de vista, o
direito cognoscitivamente pode ser tido como uma realidade complexa. Seria
possível aprendê-lo sob uma ótica histórica, científico-filosófica, científico-
política, entre outras. Resultando nos estudos de história do direito, sociologia
do direito, política legislativa, antropologia jurídica, filosofia entre tantas outras
abordagens próprias.
Segundo o autor, a multiplicidade de enfoques sobre o direito só é
possível por ser ele um objeto cultural. Se fosse um objeto ideal, tal
multiplicidade não seja possível, dada sua indiferença ao tempo e ao espaço.
1.1. O direito como objeto cultural
Para entender porque o direito é um objeto cultural, há que se
perguntar primeiramente o que viria a ser objeto. Segundo Carlos Cossio2
1 Sobre o Conceito de Direito, in Escritos Jurídicos e Filosóficos, pág. 32.
, se
baseando nos ensinamentos da lógica proposicional, objeto seria qualquer
2 El derecho en el derecho judicial, Las lacunas Del derecho, La valoración judicial, pág. 27.
12
coisa que possa ser colocada como sujeito num juízo, ou seja: que possa
receber predicados, qualificações, características, etc. Por exemplo, no
enunciado: o céu é azul; “céu” é o objeto e “azul” seu predicado.
Seguindo este raciocínio, Cossio trabalha as categorias ônticas de
Edmund Husserl. Também neste sentido trabalha Paulo de Barros Carvalho3
,
que bem explica a classificação dos objetos do conhecimento acerca das
quatro regiões ônticas. São elas: objetos naturais, objetos ideais, objetos
culturais e objetos metafísicos.
Os objetos naturais são aqueles tidos por reais, pois possuem
suas existências determinadas pelo tempo e pelo espaço, estão sujeitos a
serem colhidos pela experiência, mediante enunciados constatativos, mas são
neutros de valor. São apreensíveis pela explicação, através de um método
empírico-indutivo.
Os objetos ideais são tidos por irreais, por lhes faltar uma
existência determinada pelo tempo e pelo espaço. Em decorrência disso não
são suscetíveis à experiência. E, assim como os objetos naturais, são
valorativamente neutros. Só podem ser conhecidos através da intelecção. Seu
método mais adequado, portanto, seria o racional-dedutivo.
3 Direito Tributário Linguagem e Método, págs. 14-18.
13
Os objetos culturais são reais, pois têm sua existência
determinada no tempo e no espaço, estão sujeitos a serem conhecidos pela
experiência e, diferente dos anteriores, são valorizados positiva ou
negativamente. Estão sujeitos ao conhecimento pela compreensão, através do
método empírico-dialético.
Por fim, os objetos metafísicos são reais, têm sua existência
determinada no tempo e no espaço, mas não estão sujeitos à experiência,
apesar de valiosos, positiva ou negativamente. Não são passíveis de serem
conhecidos por qualquer ato gnosiológico ou método de aproximação.
Esta perspectiva de ser o direito um objeto cultural, produzido e
modificado pelo ser humano, será nosso ponto de partida para a análise do
direito e em especial suas fontes. Haja vista a impossibilidade de ser
encontrado solto na natureza, de existir apenas na mente das pessoas, ou
mesmo de se acreditar nele sem que este possa ser comprovado ou
conhecido.
Colocada esta premissa, se torna possível analisar de uma
perspectiva da linguagem o direito tomado como direito positivo, o
ordenamento, entendido como sistema.
14
1.2. O direito e a linguagem
O direito posto, do ponto de vista positivista, é formado pelo
conjunto dos enunciados prescritivos emitidos pelos Poderes Legislativo,
Judiciário, Executivo e, por que não dizer, setor privado. Diga-se, aliás, o mais
fecundo e numeroso. Consubstanciado em objeto cultural, o direito é produzido
e modificado pelo homem.
Neste sentido, o direito, tomado como sistema, pode ser
analisado, como ensinou Hans Kelsen4
, segundo dois pontos de vista: estático
e dinâmico.
No primeiro, se percebe a derivação das normas superiores nas
inferiores, segundo um critério de hierarquia utilizado para explicar o sistema
jurídico estaticamente observado.
No segundo, o enfoque ocorre na produção do direito através da
positivação, onde a autoridade competente, através do procedimento
4 Teoria Pura do Direito, pág. 217.
15
adequado, pré-estabelecido em norma, produz nova norma, em conformidade
com a norma de superior hierarquia.
Em ambas as análises, evidencia-se a importância da linguagem
para o direito positivo. Sua realidade só poder ser tida, formada, criada e
propagada por enunciados articulados implicacionalmente, típicos das
estruturas normativas.
O direito como forma de linguagem possibilita ao legislador
absorver fatos sociais atribuindo-lhe consequências jurídicas, ou seja:
prescreve condutas criando relações jurídicas a partir do reconhecimento dos
fatos sociais. Para Kelsen5
o direito observa os fatos da vida social e sobre eles
impõe consequências jurídicas, segundo uma relação implicacional entre o
antecedente e um consequente. Tal relação só pode ser estabelecida pela
linguagem prescritiva do direito positivo.
Vilem Flusser6
5 Teoria pura do direito, pág. 4.
, ao explicar a construção da realidade pela língua,
propôs que os fatos do mundo componham um caos desorganizado, um sem
sentido. Quando o ser humano percebe estes fatos, cria linguagem para
entendê-los e ser capaz de explicá-los; conscientiza-se deles. Através da
consciência, cria a realidade.
6 Língua e realidade, pág. 131.
16
O mundo seria “aparentemente” caótico, mas, pela linguagem,
pode ser ordenado, constituindo a “realidade”. Haveria, assim, um mundo
“aparente” caótico e um mundo “real” ordenado. O espírito humano, segundo
Flusser, avançaria da “aparência” para a “realidade”.
Para que tal análise possa fazer sentido, Flusser esclarece: só é
possível o pensamento pela linguagem7
. É com a produção desta que se
organiza o caos, constituindo a realidade ao expor seus pensamentos.
A partir dos sentidos o homem entra em contato com o mundo
dos dados, enquanto a construção da realidade, a organização desses dados,
ocorre através da linguagem. Assim, ao ouvir, enxergar, tocar, sentir ou cheirar
o ser humano tem contato com o caos do mundo dos dados e através da
linguagem o organiza, criando sua realidade.
Não se esqueça: a linguagem pode ser um dado bruto, ser
perceptível e, a partir disso, articulado e interpretado até que se chegue ao
entendimento pela consciência daquele dado, dentro de uma dada perspectiva
focalizada pela pessoa8
.
7 Idem, pág. 40. 8 FLUSSER, Vilém, ob. cit., págs. 81 e 82.
17
Essa análise feita por Flusser é de suma importância para explicar
a visão de que o direito constrói sua própria realidade, separada da chamada
verdade real. O que reforça os fundamentos do movimento do giro-linguístico
de contestar a chamada verdade absoluta da filosofia analítica e exaltar a
verdade como construção linguística, em nome da qual se fala, como explica
Paulo de Barros Carvalho9
.
O direito cria sua própria realidade, através da linguagem, a partir
de autoridades estabelecidas que se utilizam de procedimentos pré-
determinados. Essa realidade jurídica não exclui as demais que possam ser
criadas a partir do contato sensível das pessoas com os acontecimentos
sociais, estes tidos por dados brutos. Antes, estabelece formas de absorção
destes pela realidade jurídica, mas é independente deles.
A ligação entre direito e linguagem é íntima. Mais do que isso, se
pode afirmar que, seguindo a linha de raciocínio exposta neste trabalho, há
verdadeira identidade entre direito e linguagem. O direito positivo pode ser tido
como um corpo de linguagem específica, aquela prescritiva de condutas criada
por autoridade competente dentro de procedimento adequado.
9 Direito Tributário – Linguagem e Método, Editora Noeses, 1ª Ed., São Paulo, 2008, pág. 159: “A cada
dia, com o cruzamento vertiginoso das comunicações, aquilo que fora tido como “verdade” dissolve-se
num abrir e fechar de olhos, como se nunca tivesse existido, e emerge nova teoria para proclamar, em alto
e bom som, também em nome da “verdade”, o novo estado de coisas que o saber científico anuncia”.
18
Assim, seguindo as lições de Flusser, temos que os enunciados
jurídicos são, formam, criam e propagam a realidade jurídica. Impossível falar,
portanto, em direito sem a linguagem que forma sua realidade.
1.3. A comunicação e o direito
O direito, como exposto acima, é formado, criado e propagado por
enunciados jurídicos: a linguagem; aquela verbal-escrita, na qual se estabilizam
as condutas intersubjetivas, objetivadas no universo do discurso. O
pressuposto do “cerco inapelável da linguagem”, como ensina Paulo de Barros
Carvalho10
, nos leva a uma concepção semiótica dos textos jurídicos, onde um
estudo que considere dimensões sintáticas ou lógicas, semânticas e
pragmáticas são instrumentos preciosos do aprofundamento cognoscitivo.
O direito positivo tomado como linguagem é fator integrante da
comunicação jurídica, criando sua realidade na conformidade das ideias de
Flusser. Mas a comunicação jurídica, para ser jurídica, deve antes ser tomada
como comunicação.
10 Direito Tributário: linguagem e método, pág. 162.
19
O termo comunicação é mais um daqueles dotados de
ambiguidade. Pode ser tido em diversas acepções. Naquela mais popular
designa a troca de mensagem entre emissor e receptor. Mas para um trabalho
científico será necessário buscar apoio, como já mencionado, na Semiótica,
ciência que estuda os signos, a fim de se precisar a acepção do termo.
A Semiótica, segundo Roman Jakobson11
, elenca seis elementos
essenciais da comunicação. São eles: remetente, mensagem, destinatário,
contexto, código e contato. O remetente envia a mensagem ao destinatário, a
qual para ser eficaz necessita de um contexto através de um código comum ao
remetente e ao destinatário, a partir de um contato ocorrido por um canal físico
e uma conexão psicológica entre os dois sujeitos da comunicação, que os
capacite para a comunicação.
Esta acepção de comunicação nos permite analisar o direito
positivo como ato comunicacional. O que na visão de Kelsen12
pode ser
explicado pela relação implicacional entre a conduta pretendida e o dever
jurídico a ela atrelado, o qual deve ser expresso em linguagem, ainda que por
vezes não em palavras, mas por gestos.
11 Linguística e comunicação, pág. 123. 12 Ob. Cit., pág. 6.
20
Gregório Robbles Morchòn13
também assimila estes
ensinamentos ao propor sua Teoria Comunicacional do Direito. Para ele o
direito é a forma mais relevante de organização social. Serve para regular os
conflitos na sociedade. Esta é formada não pelos indivíduos, mas pela
comunicação entre eles. O direito, nesta perspectiva, seria uma das formas de
comunicação.
Assim, temos por objeto o ordenamento jurídico pátrio, do ponto
de vista de sua linguagem. Em nossa perspectiva para estudar o ordenamento
é necessário o estudo da linguagem jurídica, através da qual aquele é
transmitido, constituído e modificado. Sem ela, seria impossível conhecer o
direito.
Aliás, o que seria conhecer o direito senão produzir linguagem a
seu respeito? Todo conhecimento se dá pela linguagem. É através dela que se
pensa e se comunica qualquer objeto. Neste sentido, assumimos que quanto
mais se produz linguagem sobre um objeto, mais se sabe dele.
Para Lourival Vilanova14
13 Teoría del derecho: fundamentos de teoria comunicacional del derecho. Volume I, págs 65 e segs.
, a linguagem pode ser expressada em
diversas direções, tratando de estados interiores do sujeito, situações e objetos
que compõem o mundo externo. Pode funcionar com fim cognoscitivo (a
14 As Estruturas Lógicas e o Sistema do Direito Positivo, pág. 39.
21
linguagem-de-objetos), como veículo de ordens, com o objetivo de alterar o
estado das coisas, como transmissora de perguntas, ou mesmo com finalidade
meramente expressional da alteração emocional do sujeito em função do trato
com os objetos. Assim, levando em consideração a multiplicidade das facetas
da linguagem, para fins da análise pela Lógica Clássica, apenas as estruturas
de linguagem expressivas de proposições são consideradas: asserções de que
algo tem tal propriedade (S é P). São suscetíveis de valores de verdade e
falsidade, verificáveis empiricamente por quem assuma uma atitude
cognoscente. É a atitude típica do cientista do direito em sentido estrito.
Tendo em mente que todo e qualquer conhecimento só pode
acontecer através da linguagem, torna-se indispensável refletir sobre o que
vem a ser o direito.
Já se concluiu que o direito é um objeto cultural. Produzido pelo
ser humano para possibilitar seu convívio em sociedade. Só pode ser
apreendido, conhecido, e transmitido através da linguagem. Sua função: a
regulação das condutas das pessoas na sociedade em que se inserem,
permitindo-as, obrigando-as ou proibindo-as.
22
Lourival Vilanova15
esclarece ser o direito um fenômeno histórico,
com origem e trajetória de evolução próprias, variando de acordo com
circunstâncias de tempo, lugar e cultura e, portanto, não pode ser estável, mas
mutável em conjunto com a sociedade que o organiza. O direito pode ser tido,
a partir dessas afirmações, um objeto cultural.
Segue esta linha de raciocínio Clarice von Oertzen de Araújo16
para quem o direito seria uma das diversas formas sociais institucionais
manifestadas pela linguagem. Esta constitui um campo maior que o direito,
mas seria apenas uma entre as instituições humanas resultantes da vida em
sociedade. Além disso, se caracteriza por ser o veículo utilizado pelo homem
para se comunicar.
Das diversas acepções do termo “direito”, pretendemos tratar de
duas delas: ordenamento e Ciência do Direito. Mas, independente da acepção,
terá sempre como significado um objeto cultural, criado, modificado e
desenvolvido pelo homem através da linguagem. Desta forma, reforce-se:
direito, sob nosso ponto de vista, é linguagem e só pode ser apreendido por
ela, criado através dela e por ela propagado.
15 Idem, pág. 33. 16 Semiótica do Direito, pág. 19.
23
Sem a linguagem não pode haver conhecimento sobre ele,
constituindo também a Ciência do Direito, sendo-a, criando-a e propagando-a.
O direito posto, nas palavras de Paulo de Barros Carvalho17, “é o
complexo de normas jurídicas válidas num determinado país”. Na mesma linha,
Maria Rita Ferragut, o entende como “... o conjunto de regras jurídicas gerais e
abstratas, individuais e concretas, existentes em determinado tempo e espaço
social”18, ou ainda: “(i) significações dos enunciados com conteúdo deôntico
incompleto e (ii) significações dos enunciados com conteúdo deôntico
completo”19
.
Conteúdo deôntico está relacionado com a prescrição da norma,
seu dever ser modalizado, passível de ser completado com os valores:
obrigatório (O), permitido (P) ou proibido (V). Será completo quando apresentar
sua consequência jurídica, caso das regras. Será incompleto quando não
apresentá-la expressamente, como no caso dos princípios.
O direito, tomado como ordenamento, é expresso por seus
enunciados prescritivos, a partir dos quais se obtém as significações, que
tomadas em conjunto, compõem um feixe de proposições prescritivas, com
17 Curso de Direito Tributário, São Paulo, pág. 02. 18 Presunções no Direito Tributário, pág. 16. 19 Idem
24
escopo de ordenar as relações intersubjetivas da vida em uma sociedade
determinada pelo tempo e espaço.
Organiza-se segundo um critério de especialidade, sob a ótica de
Tércio Sampaio Ferraz Jr.20 com suas normas de calibração, bem como de
processos de fundamentação e derivação, segundo os ensinamentos de Hans
Kelsen21
. Constitui um corpo de linguagem técnica prescritiva, formulada de
acordo com os critérios da Lógica Deôntica. Esta se difere da Lógica Clássica
por não estar atrelada ao ser e aos valores de verdade e falsidade, mas ao
conectivo dever ser, a partir dos valores de validade e invalidade.
O direito, como ordenamento, é um corpo de linguagem
prescritiva. Contudo, ao analisar a Ciência do Direito se vê que esta tem aquele
como objeto de seu conhecimento, sendo sua função analisá-lo e descrevê-lo.
Sua forma de expressão é descritiva daquela, constituindo verdadeira
linguagem de sobrenível em relação ao ordenamento.
O propósito do direito como ordenamento é, por mais que pareça
um evidente pleonasmo, ordenar. Prescreve condutas intersubjetivas. Mas não
é só o direito que faz isto. Outros tipos normativos morais, religiosos, familiares
20 Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação, págs.159-162. 21 Ob. Cit., págs. 217-220.
25
também o fazem. Assim, genericamente, seria possível, em princípio, definir
norma como comando ou regramento de conduta.
O que distinguirá o direito dos demais tipos normativos será a
coercibilidade, a possibilidade de o Estado fazer cumprir suas normas através
da sua função judiciária. Kelsen22
trabalhou este conceito como coatividade.
O direito, como produto humano, só pode ser criado e difundido
pela linguagem. Esta por sua vez decorre de um ato de fala. Daí a importância
da análise do conteúdo do ato de fala, mas principalmente do ato de fala em si.
22 Ob. Cit., págs. 35 e segs.
26
2. A teoria dos atos de fala
A criação da realidade pela linguagem a partir do caos do
universo, explicada pela teoria de Vilém Flusser, como já mencionado acima,
explica a organização do caos pelo homem a partir do contato que este
mantém com aquele pela apreensão sensível.
A Bíblia traz no livro do Genesis um relato muito parecido,
segundo o qual Deus organiza o cosmo através de um ato de linguagem,
dando sentido ao mundo. O poder do Criador é exercido pela linguagem, que
tem um poder ilocucionário de organizar o mundo. É o caso do seguinte trecho:
“Deus disse: “Faça-se a luz”. E a luz foi feita. E viu Deus que a luz
era boa: e separou a luz e as trevas. Deus chamou à luz DIA, e às trevas
NOITE. Sobreveio a tarde e depois a manhã: foi o primeiro dia.” (1.3,5).
Esta força ilocucionária, contida em todo ato performativo, é
objeto de análise da chamada Teoria dos Atos de Fala, uma linha de estudos
da Filosofia da Linguagem.
27
A Teoria dos Atos de Fala surgiu com os estudos de John
Langshaw Austin entre o fim da década de cinquenta e o início da década de
sessenta. Posteriormente, estudiosos preocupados com a Pragmática da
Linguagem adotaram os pontos tratados por ela para explicar como a
linguagem pode ser utilizada a fim de obter certos resultados.
John L. Austin23, primeiro, John Searle24
, depois, entendiam ser a
linguagem uma forma de ação: o dizer seria também um fazer. A partir desta
idéia, desenvolveram estudos sobre diversos tipos de ações humanas
realizadas através da linguagem, através dos "atos de fala".
Para ser possível estudar a produção de atos normativos, através
da ação de enunciação da norma, visando a análise das fontes do direito
tributário, se revela imprescindível um estudo, ainda que breve, sobre estes
dois filósofos e sua Teoria dos Atos de Fala. A qual, como veremos, pode ser
perfeitamente aplicada ao direito, ao menos segundo a concepção do
constructivismo lógico-semântico.
23 How to do things with words, pág. 5. 24 Speech acts, págs. 22 e segs.
28
2.1. John Austin
A Teoria dos Atos de Fala, explicada por John Austin a partir de
um grupo de aulas na Universidade de Harvard em 1955 e posteriormente
publicadas em 1962 no livro How to do things with words, busca ir além do
significado e da significação dos termos utilizados, trabalhando o significado do
ato em si, por vezes em dissonância com o conteúdo da própria fala, em
circunstâncias determinadas. São os chamados atos performativos. O que
pode ser depreendido do título do livro de Austin.
A teoria se baseia na idéia de que o dizer pode ser analisado
separadamente do que foi dito pelo interlocutor, o falante. O dizer, para Austin,
seria transmitir informações, mas, além disso, uma forma de agir sobre o
interlocutor e sobre o mundo circundante.
Austin25
25 Idem, págs 5 e segs.
critica a posição de linguistas e filósofos de que as
afirmações só serviriam para descrever coisas ou fatos e sujeitas à valoração
de verdade e falsidade. Afirma que existem certas proposições que ao invés de
descrever realizam ações.
29
Distingue os atos performativos dos constatativos. Os primeiros
seriam os atos de dizer algo configurando situações fáticas. Seriam assim
denominados, pois em inglês o termo “to perform” significa realizar. Realizam a
ação, dentro de um contexto e segundo a intenção do locutor. Por exemplo: o
sim dito durante uma cerimônia de casamento, como ato de se casar; o
condeno ao pagamento de 10 salários, como ato de sentenciar; ou o ordeno
que entregue a arma, como ato de ordenar de um policial exercendo sua
função. Este tipo de enunciado não afirma, descreve, relata ou constata
qualquer coisa. Não se submete aos valores de verdade ou falsidade.
Os atos constatativos, a seu turno, teriam por objetivo, como seu
próprio nome diz, a constatação, o relato ou a descrição de um acontecimento
ou situação de coisas. Os filósofos da linguagem os chamam de afirmações,
descrições ou relatos. Por exemplo: eu nado diariamente, a Terra é redonda ou
o céu está azul hoje. Estes sim se submetem aos valores de verdade ou
falsidade.
Assim, dizer, falar, escrever, enfim: enunciar, só é possível
através de um ato de fala. O enunciado performativo realiza mais que o ato de
fala em si, a ação denotada pelo verbo contido neles, ou a conotação conforme
o contexto. Este é o foco do trabalho de Austin.
30
Porém, este ato performativo exige mais que o simples ato em si
para que seja eficaz, ou nas palavras de Austin26
, “feliz”. Para atender seu
objetivo, o ato de fala precisa atender a alguns pressupostos:
a) Deve existir um procedimento convencionalmente aceito com o
correspondente efeito convencionalmente atribuído. Esse procedimento deve
incluir o dizer de certos termos por determinadas pessoas em certas
circunstâncias.
b) As pessoas e as circunstâncias, em particular, para
determinado caso, devem ser aquelas apropriadas para a invocação do
procedimento adotado.
c) O procedimento deve ser executado por todas as pessoas
envolvidas, correta e
d) completamente.
26 Ibidem, págs. 14 e 15.
31
e) Quando, usualmente, o procedimento deve ser adotado por
quem tiver certos pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de
certa conduta consequente da parte de qualquer participante, então a pessoa
participante e envolvida no procedimento deve de fato ter aqueles
pensamentos ou sentimentos e os participantes devem ter o real intuito de
assim proceder.
f) Esses atos dentro do procedimento devem ser adotados pelos
participantes de forma subsequente uns aos outros.
Com base nesta ideia, passa Austin27
a trabalhar um critério
gramatical para enunciados performativos, a começar pelo verbo. Busca
demonstrar que este verbo seria apresentado na primeira pessoa do indicativo
na forma afirmativa e na voz ativa. Porém encontra sérios problemas, a
começar porque nem todo enunciado performativo se apresenta assim.
Se numa placa está escrito “proibido fumar”, se um professor diz a
um aluno “você está autorizado a sair” ou se um comunicado interno de uma
empresa avisa que “todos os funcionários estão convidados para a festa de
final de ano”, então os atos de proibição, autorização e convite que não utilizam
27 Ibidem, págs. 32 e segs.
32
a primeira pessoa do indicativo na forma afirmativa e na voz ativa: proíbo,
autorizo ou convido.
Da mesma maneira, Austin percebeu que nem todo enunciado,
utilizado na primeira pessoa do singular do presente do indicativo, na forma
afirmativa e na voz ativa, pode ser tido como performativo. São exemplos desta
situação: “eu nado”, “eu jogo polo aquático” ou “eu estudo direito”. Os atos de
nadar, jogar polo aquático e estudar direito não se realizam ao se enunciar tais
sentenças.
Outro problema encontrado é o fato de poderem existir
enunciados performativos sem que nenhuma de suas palavras esteja
relacionada ao ato que executam. São exemplos os enunciados: “cuidado, área
de passagem de animais”, “voltarei amanhã” e “saia”. Os quais equivalem,
respectivamente, a: “eu te advirto: cuidado, esta é uma área de passagem de
animais”,“eu prometo: voltarei amanhã” e “eu ordeno que você saia”.
Existe, no entanto, uma diferença entre estes enunciados no que
se refere à quão precisos são os atos performativos neles contidos. Diante
disto, Austin propõe a distinção: performativo explícito e implícito ou primário.
No primeiro caso, a performatividade seria explicitada no próprio enunciado,
como em “eu ordeno que você saia”. No segundo caso, a performatividade não
33
seria expressa de forma explícita, mas ao invés disso seria vaga ou implícita,
como em “saia”. Esta pode ser uma ordem, um pedido ou um conselho. Será
uma forma reduzida daquele explícito e dependerá do contexto em que se
insere para que seu conteúdo atinja a plenitude de significação.
Neste ponto, Austin28
constata que o enunciado performativo
primário (ou implícito) não é aplicável apenas aos atos performativos, mas
também aos constatativos. Conclui que a distinção entre estes dois tipos de
enunciados (constatativo e performativo) não resistiria a uma análise mais
profunda. Isto porque seria possível transformar qualquer enunciado
constatativo em performativo. Para tanto bastaria inserir a sua frente formas
verbais que representassem ações, por exemplo: declarar, afirmar, dizer, entre
outros. Como seria o caso em enunciados como estes: “(eu afirmo que) vai
chover”, “(eu afirmo que) o céu é azul”, “(eu declaro que) nado todos os dias”
ou “(eu digo que) aceito mais purê”.
Tendo todos os enunciados por performativos, uma vez que no
momento de sua enunciação realizam algum tipo de ação, Austin29
identifica
três atos que se realizam simultaneamente em cada enunciado: o locucionário,
o ilocucionário e o perlocucionário.
28 Ibidem, págs 83 e segs.. 29 Ibidem, págs. 101 e segs.
34
O ato locucionário é realizado pela enunciação da frase “eu
prometo que retornarei mais tarde”; Enuncia-se cada elemento linguístico que
compõe a frase. Ao mesmo tempo, o ato ilocucionário se realiza na linguagem,
ou seja: a enunciação em si do enunciado, configurando o ato em si da
promessa. Aquele que para obter o resultado pretendido deve passar pelos
seis requisitos de Austin. O ato perlocucionário, ao seu turno, não se realiza na
linguagem, mas pela linguagem, configurada no resultado desta por ameaça,
agrado ou desagrado.
Assim, a construção de Austin revoluciona os estudos linguísticos,
constituindo verdadeiro divisor de águas. Inaugura uma nova concepção da
linguagem: performativa e pragmática de seu uso. Rompe com os estudos
linguísticos caracterizados por uma concepção meramente descritiva da
linguagem, baseada na visão de que os enunciados seriam sempre
constatativos.
2.2. John Searle
John Searle30
30 Speech acts, págs. 31 e segs.
também trabalha estas noções sobre os atos de
fala e busca sistematizá-las. Para tanto, distingue cinco grandes categorias de
35
atos de linguagem: representativos, diretivos, comissivos, expressivos e
declarativos.
Os atos representativos demonstram a crença do locutor. Este se
propõe a se referir à verdade em sua proposição. Neste sentido: afirma,
assevera ou diz algo.
Os atos diretivos têm como objetivo fazer com que o destinatário
faça algo. Assim, ordena, pede ou manda o destinatário fazer ou deixar de
fazer uma determinada conduta.
Os atos comissivos estabelecem uma relação de
comprometimento entre o locutor e uma ação futura. O locutor promete ou
garante fazer algo ao destinatário da mensagem.
Os atos expressivos expressam os sentimentos do sujeito do
enunciado. Expressam seus sentimentos de agradecimento, desculpas, amor,
ódio, boas vindas etc.
36
Os atos declarativos tem por objeto a produção de atos numa
situação externa ao discurso. Assim, reconhecem uma relação como
casamento, batizado, paternidade etc.
Searle31
afirma que o ato de comunicação se realiza através de
um ato proposicional e um ato ilocucionário. O ato proposicional corresponderia
a conteúdo comunicado, enquanto o ato ilocucionário seria aquele que se
realiza pela enunciação em si da linguagem.
Porém, é relevante ressaltar que não há correspondência direta
entre conteúdo proposicional e força ilocucionária. Isto porque um mesmo
conteúdo proposicional pode ter diferentes significados. Assim, o enunciado:
“Pedro, trabalhe duro” pode, por exemplo, significar uma ordem, um pedido ou
um conselho.
Essa discrepância entre a estrutura sintática dos enunciados e o
seu significado permite estabelecer outra distinção, esta no interior dos atos de
fala: diretos e indiretos. O ato de fala direto seria realizado por meio de formas
linguísticas especializadas, típicas daquele tipo de ato. O ato de fala
indireto seria realizado indiretamente, por meio de formas linguísticas típicas de
outro tipo de ato.
31 Idem, pág. 25; e: Consciência e linguagem, pág. 233
37
Como exemplo do primeiro podem ser citados: a entonação típica
das perguntas, as formas imperativas usadas para dar ordens ou fazer
pedidos, expressões típicas como “por favor”, “por gentileza”, entre outras.
Assim como nos seguintes enunciados: “que dia é hoje?” como um ato de
perguntar, “entre!” como um ato de ordenar e “por favor, me passe o saleiro”
como um ato de pedir.
No caso dos atos de fala indiretos, busca o locutor dizer algo sob
a aparência de outro ato. Nesse sentido: “tem um cigarro?”, que significa um
pedido sob a aparência de uma pergunta ou “como está abafada esta sala!”,
cujo significado é um pedido, mas a aparência é de uma constatação,
buscando que o destinatário tome alguma providência para solucionar o calor,
como ligar o ar condicionado ou abrir as janelas.
Seria possível afirmar que o valor de pergunta e constatação é
"literal", e o valor de pedido, "derivado". Do que Searle32
conclui que no caso
dos atos de fala indiretos, quanto menor for sua convenção, mais se apoiará no
contexto para esclarecer seu significado, seu valor ilocucionário.
32 Consciência e linguagem, pág. 278.
38
O contexto, aliás, entrou pela Teoria dos Atos de Fala no foco dos
estudos linguísticos fornecendo importantes índices para a compreensão dos
enunciados. Percebe-se, portanto, que os atos de fala são fontes inesgotáveis
dos trabalhos linguísticos, seja na área da Pragmática, seja área da Semântica,
como na Linguística em geral.
2.3. A relação entre os atos de fala e o direito
Pelo exposto até aqui, se tem como premente relacionar a Teoria
dos Atos de Fala com o direito, seja o ordenamento ou a Dogmática Jurídica.
Tal relação, seguindo os ensinamentos de Austin, Searle e Vilanova, pode ser
claramente estabelecida pelas convenções necessárias aos atos performativos.
Estas convenções podem ser encaradas como as normas que
estabelecem a produção normativa, as chamadas normas de estrutura,
naquele sentido estabelecido por Kelsen33
, como as que estabelecem o
procedimento de produção, incluindo tanto o órgão criador da norma como seu
fundamento de validade, numa perspectiva hierárquica.
33 Ob. Cit., pág. 260.
39
Assim, relacionando os elementos de felicidade do ato de fala,
segundo Austin34
, com a estrutura do direito positivo, se tem:
a) Se para um ato performativo há de se ter um procedimento
convencionalmente aceito com o correspondente efeito convencionalmente
atribuído, que inclui o dizer de certos termos por determinadas pessoas em
certas circunstâncias, então o ordenamento estabelece as situações jurídicas e
os procedimentos a serem seguidos para que as normas possam ser criadas.
b) Se as pessoas e as circunstâncias estabelecidas para que em
determinado caso sejam elas as capazes de invocar o procedimento a ser
adotado, então as normas jurídicas estabelecem quem é o órgão e o
procedimento adequados a tanto, em seu sistema.
c) Se o procedimento deve ser executado por todas as pessoas
envolvidas, correta e completamente, então o direito assim o estabelece, como
forma de exteriorizar a vontade dos envolvidos, bem como seguir os
procedimentos de criação normativa no ordenamento.
34 Ob. Cit., págs. 14 e 15.
40
d) Se quando, usualmente, o procedimento deve ser adotado por
quem tiver certos pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de
certa conduta consequente na parte de qualquer participante, então a pessoa
participante e envolvida no procedimento deve de fato ter aqueles
pensamentos ou sentimentos e os participantes devem ter o real intuito de
assim proceder. O direito estabelece o procedimento para que os órgãos
emissores de normas o sigam, segundo um dever de moralidade ou adequação
aos fundamentos de validade deste procedimento.
e) Se os atos dentro do procedimento devem ser adotados pelos
participantes de forma subsequente uns aos outros, assim também determina o
direito para que a norma só seja criada ao final de todos os atos integradores
do procedimento estabelecido para a criação normativa.
Tomando por base a identidade entre os requisitos de felicidade
dos atos performativos e aqueles de validade expostos por Kelsen35
, mesmo
que com outras palavras, podemos afirmar que os enunciados normativos
consubstanciam verdadeiros atos performativos.
35 Ob. Cit., págs. 235 e segs.
41
O direito cria sua própria realidade pela linguagem, sendo esta
passível de análise pelos atos locucionários, ilocucionários e perlocucionários
do órgão competente para a produção dos enunciados normativos.
O ato locucionário, realizado pela enunciação do enunciado
normativo em si, o texto legal em sentido amplo. Ao mesmo tempo, o ato
ilocucionário que se realiza na linguagem pela enunciação em si do enunciado,
ou seja: o ato de prescrever condutas. O primeiro trata da enunciação do
enunciado, focando o enunciado, enquanto o segundo foca o ato enunciativo
em si. Concomitantemente, o ato perlocucionário não se realiza na linguagem,
mas pela linguagem, configurada no resultado desta por: permitir, proibir ou
obrigar.
42
3. Norma Jurídica: conceito e análise
Norma jurídica é conceito chave para o ordenamento jurídico e
para a Ciência do Direito. É a partir dela que se poderá enxergar o sistema
jurídico. Justamente por sua importância deve ser analisada com certo grau de
profundidade neste trabalho sobre fontes do direito.
Saber qual a relação e se há semelhança ou identidade entre as
normas jurídicas e as fontes do direito é fundamental ao desenvolvimento da
reflexão sobre o tema aqui tratado. Será necessária determinação clara do que
venha a ser norma, para ser posteriormente tratada, dentro do sistema de
referência aqui adotado.
Nesta análise, será trabalhada a norma pelo prisma do direito
posto, afastando qualquer estudo pré-positivista, para a partir do positivismo
ser traçado um estudo dentro dos limites do que Kelsen denominou de Teoria
Pura do Direito.
43
Afastando, portanto, visões sociais, psicológicas, jus naturalistas,
entre outras. As visões de norma das esferas do positivismo, do pragmatismo e
do constructivismo lógico semântico serão foco do presente capítulo.
3.1. A visão clássica do positivismo
O positivismo jurídico teve diversos expoentes. Muitos autores
seguiram as ideias do chamado Círculo de Viena. Porém, dois autores em
diferentes épocas tiveram um destaque especial na cultura jurídica brasileira.
São eles Hans Kelsen e Norberto Bobbio.
Hans Kelsen em sua Teoria Pura do Direito trata a norma de
maneira nobre, dignifica o direito ao tratá-lo como ciência autônoma da
sociologia, da psicologia, da antropologia e de tantas outras, trabalhando com
conceitos estritamente jurídicos.
Neste sentido, o tema norma jurídica é central em seu trabalho.
No qual desenvolve a ideia de que as normas seriam aquelas ordens
coercitivas da conduta humana36
.
36Ob. Cit., pág. 36.
44
Kelsen37
baseia esta noção de coercibilidade numa relação de
causalidade, não da causalidade natural, mas da implicação, pois a sanção ou
consequência são atributos conferidos aos atos jurídicos, os quais assim se
classificam em decorrência de sua eleição pelas normas jurídicas como tal.
Neste sentido, norma jurídica teria como sinônimo a sanção. Esta no sentido de
consequência jurídica.
Kelsen38
se preocupou com a estrutura da norma, antes mesmo
de existir uma Lógica Deôntica. Estabeleceu uma relação de causalidade, não
natural, mas induzida, através de uma formula: H→C; segundo a qual se H é, C
deve ser. Estrutura esta que foi aprimorada posteriormente pelos estudos
lógicos.
Aliás, seria muito difícil fugir desta estrutura implicacional, pois,
como é confirmado pela Lógica, por se tratar ainda de lógica proposicional: é
assim que se fundamenta formalmente o raciocínio humano. Mas este
fundamento, apresentado pela Teoria das Classes, só surgiu com o
desenvolvimento da Lógica Deôntica, que será mais bem tratada no
subcapítulo relativo ao pensamento do constructivismo lógico-semântico.
37 Idem, págs.4-10. 38 Ob. Cit., pág 4.
45
É característico das normas, das jurídicas em especial, se
expressarem por meio do conectivo “dever-ser”, segundo os valores de
validade e invalidade. O que difere as normas jurídicas das demais, nas lições
de Kelsen39
, é justamente sua coercibilidade: a possibilidade do Estado
sancionar quem as desrespeita.
Norberto Bobbio trabalha a norma jurídica em obra de tema
exclusivo, denominada Teoria da Norma Jurídica. Na qual analisa as
características interna e externa da norma jurídica.
Bobbio40
entende por norma as ordens de conduta, proposições
prescritivas. Separa o texto literal da norma, a partir de seus estudos de lógica.
Mas as normas jurídicas seriam diferentes em alguma medida.
Esta diferença, segundo Bobbio41, surgiria de um fator externo ao
critério formal da norma, a sanção. Para Bobbio42
, não há identidade entre o
dever ser e o ser, ou seja: não é por estar prescrita uma determinada conduta
que ela será seguida.
39 Idem, págs. 35 e segs. 40 Teoria da norma jurídica, págs. 69 e segs. 41 Idem., pág. 145. 42 Ibidem, págs. 152 e segs.
46
Tal fator externo dependeria da autoridade determinar o
cumprimento da norma e aplicar a sanção jurídica pelo seu descumprimento.
Bobbio43
visualiza que tão importante quanto a forma e o conteúdo normativo
seria o ato de aplicação da norma, fazendo-se cumprir e trazendo uma maior
eficácia.
Conclui-se que a norma jurídica, numa visão positivista, tem uma
estrutura formal decorrente da causalidade jurídica, um conteúdo depreendido
do texto, mas não encerrado por ele, e uma força decorrente de sua
institucionalização, o que confere autoridade aos órgãos produtores e
aplicadores dessa norma.
3.2. A visão pragmática
Uma análise da visão pragmática da norma no direito posto tem
no Brasil seu grande expoente em Tércio Sampaio Ferraz Jr., com estudos de
semiótica aplicados em sua teoria do direito, exposta na obra Introdução ao
Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação.
43 Ibidem, págs. 159-162.
47
Tércio Sampaio Ferraz Jr.44
define norma jurídica como
expectativa contrafática expressa através de proposições de dever-ser,
estabelecendo relações complementares institucionalizadas em alto grau entre
comunicadores sociais. Relações estas cujo conteúdo tem um sentido
generalizável conforme o grau de abstração.
Dessa definição tiram-se alguns elementos básicos à análise da
norma jurídica: a hipótese da norma, relacionada na expressão “expectativa
contrafática”; a prescrição normativa em si, na expressão “proposições de
dever-ser”; organizadas estruturalmente, pela expressão “relações
complementares”; promulgadas pelo ou fundamentadas no Estado, exposta em
“institucionalizadas em alto grau”, sendo esta a característica da juridicidade da
norma; e com um espectro amplo de pessoas a serem atingidas sem, contudo,
individualizá-las, segundo a expressão “generalizável conforme o grau de
abstração”.
O conteúdo normativo será constituído por situações hipotéticas,
as condições de implementação, e implicativas das respectivas consequências:
prescrições de ações ou relações jurídicas.
44 Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação, pág. 87.
48
Mas a visão pragmática repousa na preocupação de Tércio
Sampaio Ferraz Jr.45
com relação ao cometimento normativo, ou seja: a
relação institucionalizada entre autoridade e o sujeito ao qual a norma se
destina. Para o autor, esta relação tanto se expressa pelos conectivos do dever
ser (proibido, obrigatório ou permitido), expostos nas suas mais variadas
versões, como também por modos não verbais: um olhar ou um gesto. Mesmo
admitindo a prevalência das formas verbais no direito atual.
Esta preocupação é o que se destaca na visão pragmática do
direito, a qual não afasta as outras dimensões da linguagem (gramática ou
sintática e semântica), tampouco distancia o direito da linguagem, mas
enaltece os resultados da comunicação e as diversas formas de atingi-lo.
3. 3. O constructivismo lógico-semântico e sua visão de norma
O constructivismo lógico-semântico compõe uma faceta do giro
linguístico, movimento doutrinário que enfatiza a linguagem no centro de sua
análise. O discurso, por este prisma, tem um papel de destaque; será analisado
mais adiante em capítulo próprio.
45 Idem, pág. 88.
49
Neste sentido o constructivismo lógico-semântico proposto por
Lourival Vilanova sofre influência do positivismo, trabalhado a partir do texto
positivado, com profunda reflexão das figuras da Lógica Deôntica, e se soma
ao culturalismo, através da aplicação dos valores ao conteúdo semântico das
proposições.
O direito positivo, tomado como sistema de linguagem,
consubstancia uma estrutura formal proposicional, onde o antecedente e o
consequente se relacionam através de um modal deôntico, dentro dos
parâmetros do que se convencionou chamar de Lógica Deôntica. Esta é a
ciência cujo objeto de estudo é a proposição prescritiva jurídica, formalizada
através de um processo de generalização.
No decorrer de seu estudo, Lourival Vilanova46 conseguiu
depreender uma fórmula básica da norma jurídica, a partir de seu núcleo, o
dever ser, podendo ser transcrita em linguagem formalizada na seguinte
estrutura D [F→C(S’,S”)]. Esta fórmula é explicada pelo próprio Vilanova47
: “se
se dá um fato F qualquer, então o sujeito S’ deve fazer ou deve omitir ou pode
fazer ou omitir conduta C ante outro sujeito S” – assim deve ser”.
46 As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, pág. 95. 47 Idem.
50
Tal visão estrutural da norma enfatiza uma grande diferença em
relação à norma em Kelsen48
.
, na qual o dever ser é aplicado ao consequente
“quando A é, B deve ser”. Em Vilanova, o conectivo é distribuído entre os todos
os elementos da proposição, estando em evidência no início da fórmula.
A norma jurídica, tomada como proposição prescritiva, pode ser
vista como a significação obtida da leitura dos textos do direito positivo, através
de um processo de percepção do mundo exterior. Estes enunciados normativos
podem ser expressos e implícitos, porém, a norma jurídica estará sempre
implícita nos textos positivados. Existindo a partir de uma construção de
sentido, extraída dos textos legais.
Este sentido, contudo, apresenta uma particularidade, qual seja: a
prescrição de condutas humanas. Sobre este sentido Vilanova49
escreveu não
ser a proposição jurídica descritora de fatos biológicos ou psicológicos da razão
da liberdade de ir-e-vir no espaço físico e social. Muito menos estabelece
qualquer relação entre esse movimento e os efeitos de causas físicas,
biológicas, psicológicas e sociológicas. A proposição jurídica estabelecerá,
diversamente, que existe uma relação entre o direito de ir-e-vir e o correlato
dever de não o impedir.
48 Ob. Cit., pág. 87. 49 Ob. Cit., pág. 69.
51
Estudando esta linguagem prescritiva, os lógicos, e antes deles
Hans Kelsen, perceberam que não poderiam se utilizar dos valores da Lógica
Clássica de verdade/falsidade nas proposições jurídicas, pois não se aplicam.
A estas devem ser aplicados valores de validade/invalidade, típicos da Lógica
Deôntica, criada justamente para explicá-las.
Vilanova50
evidencia o trabalho dos lógicos deônticos na
proposição jurídica ao escrever sobre o conectivo deôntico (dever ser) em
diferentes valências. Para ele, os functores “é obrigatório” (O), “é permitido”
(P)” e “é proibido (V)”, não pertencem à linguagem descritiva ou apofântica,
estudada pela Lógica Clássica, Alética ou Apofântica, mas à linguagem
prescritiva ou deôntica, estudada pela Lógica Deôntica. Se caracterizam por
serem relacionais, isto é: o sujeito S’ fica obrigado a fazer ou omitir conduta C
perante outro sujeito S”, assim como a proibição a permissão são relacionais.
Aplica-se, portanto, uma lógica diferente para o direito, em
oposição à lógica aplicada até então a qualquer proposição: a Lógica
Apofântica. Surge a partir da conclusão dos lógicos de que o modal deôntico é
irredutível ao apofântico, por qualquer que seja a operação lógica. Isto decorre
da sua natureza relacional, enquanto o modal alético é intrínseco ou extrínseco
à proposição, mas nunca relacional.
50 Idem, pág. 71.
52
Neste sentido, ensina Ricardo Guibourg51
: “Sin embargo, el
comportamiento de los operadores deónticos no es idéntico al de los
correspondientes aléticos. Los operadores “M” y “N” nos servían para calificar
proposiciones que describían estados de cosas. Vale la pena preguntarse qué
califican los operadores deónticos: cuáles son las “cosas” de las que decimos
que son obligatorias, permitidas o prohibidas. Hay una respuesta plausible: son
las conductas. De ellas predicamos la obrigatoriedad, la permisión o la
prohibición.”
Novamente se recorre às lições de Vilanova52
, para explicar que
o modal alético pode estar no interior da proposição, ou fora dela, num infixo ou
prefixo. Tal proposição é passível de ser expressa na fórmula clássica: “S é
necessariamente P”, “S é realmente P”, “S é possivelmente P”, “é necessário
que S é P”, “é contingente que S é P”, “é possível que S é P”. Todas essas
possibilidades de proposição apofântica se verifica estarem completas, sem
qualquer necessidade de modal. Sua estrutura sintática completa é a fórmula
“S é P”.
Esta análise lógica dos modais tem efeitos evidentes no estudo do
direito positivo. Estudar as relações jurídicas, em última análise, é estudar
como atuam os modais deônticos nas proposições prescritivas. Para tanto se
51 Lógica, proposición y norma, pág. 120. 52 Ibidem, pág. 72 e 73.
53
busca, mais uma vez, o pensamento de Vilanova53
, que ao tratar da relação
jurídica, seja em sentido amplo seja estrito, analisa o efeito de uma hipótese
fáctica sobre o que ele chama de um “dado-de-fato”. Assim ocorre a incidência
da hipótese, configurando o fato jurídico a partir da relação estabelecida entre
fato jurídico e sua eficácia, produzindo um plexo de efeitos. É a relação de
causalidade jurídica: constituída por norma jurídica. Somente a norma pode
constituir ou desconstituir esta relação.
Relação jurídica essa que, como salientado acima, pode produzir
um plexo de efeitos, dentre os quais os efeitos tributários surgidos a partir das
normas jurídicas tributárias. Neste campo, Paulo de Barros Carvalho é o
expoente do constructivismo lógico-semântico.
Se a hipótese, funcionando como “descritor”, anuncia os critérios
conceituais para o reconhecimento de um fato, o consequente, como
“prescritor”, nos dá, também, critérios para a identificação do vínculo jurídico
que nasce, possibilitando-nos saber quem é o sujeito portador do direito
subjetivo; a quem foi cometido o dever jurídico de cumprir certa prestação; seu
objeto: o comportamento que a ordem jurídica espera do sujeito passivo; e que
satisfaz, a um só tempo, o dever que lhe fora atribuído e o direito subjetivo de
que era titular o sujeito pretensor.
53 Causalidade e Relação no Direito, pág. 286.
54
Em seus trabalhos científicos, Paulo de Barros Carvalho,
seguindo os ensinamentos de Lourival Vilanova e amplamente influenciado por
Edmund Husserl, desenvolve tanto o estudo da Lógica Deôntica como da
Teoria dos Valores no campo de estudo do Direito Tributário, buscando sempre
a aplicação prática de seus conceitos.
Tomando por base os ensinamentos de Kelsen e de Vilanova
sobre a norma e sobre a causalidade, Paulo de Barros Carvalho54
busca, num
estudo eidético, a essência da norma tributária. Chega ao que se denomina de
Regra Matriz de Incidência Tributária, que como as demais normas é composta
de uma hipótese e um consequente. A hipótese apresenta três critérios:
material (constituído pelo núcleo verbal do evento), espacial (local de
incidência) e temporal (momento de incidência), enquanto o consequente é
composto por critérios pessoal (sujeito ativo, detentor do direito subjetivo e
sujeito passivo, quem tem o dever jurídico de recolher o tributo) e quantitativo
(base de cálculo e alíquota).
A versatilidade desse instrumento jurídico se apresenta em três
funções distintas: a) medir as proporções reais do fato, b) compor a específica
determinação da dívida, e c) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério
material da descrição contida no antecedente da norma.
54 Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência, pág. 80.
55
Quanto às relações jurídicas tributárias, são de dois tipos: as de
natureza patrimonial (tributárias estrito senso) e os vínculos que fazem irromper
meros deveres administrativos. As primeiras, previstas pela Regra Matriz de
Incidência. As outras ao seu redor. São estas que tornam possível
operacionalizar aquelas: são os deveres instrumentais. A norma que institui a
obrigação tributária em sentido estrito é chamada de regra matriz de incidência
tributária.
No direito tributário brasileiro, a Regra Matriz de Incidência (a
norma tributária) é matéria submetida ao regime de reserva legal, seguindo o
princípio da estrita legalidade tributária.
56
4. Direito x fontes do direito
Pelo exposto até aqui, é possível afirmar que o direito, no sentido
de direito positivo, é o conjunto de normas jurídicas válidas num determinado
país, expresso por linguagem. Esta é, forma, cria e propaga a realidade
jurídica, através dos enunciados jurídicos. Impossível falar, portanto, em direito
sem a linguagem.
Não é qualquer linguagem que compõe o direito positivo. Mas
apenas aquela constituída pelas proposições prescritivas, perpetuadas pelos
enunciados correlatos, de acordo com as lições da Lógica Deôntica.
O problema das normas serem válidas ainda é obstáculo a ser
transposto para que as proposições prescritivas componham o direito positivo.
Importante então entender o conceito de validade.
Será aqui adotado o entendimento de Paulo de Barros
Carvalho55
55 Curso de Direito Tributário, pág. 114.
, segundo o qual: uma norma será válida, num determinado sistema,
57
se pertencer a ele. É, portanto, uma relação de pertinencialidade entre a norma
jurídica e o sistema jurídico.
Neste sentido, o sistema jurídico indica quais os requisitos para a
produção normativa, seguindo as lições de Kelsen56
; uma norma não vale em
razão de seu conteúdo, mas porque é produzida na forma determinada, de
acordo com cada sistema.
Classicamente esta linguagem é tratada pelos autores como
“direito” e como “fonte do direito”. É o caso, por exemplo, de Celso Ribeiro
Bastos, que definiu fontes, tratando de fontes formais, como conjunto de
normas que compõe o direito.
Tal posição, como será demonstrada adiante, configura um
equívoco, ao menos sob o prisma do giro linguístico. Isto porque ou bem a
linguagem é o direito ou é sua fonte. Mas para trabalharmos esta diferença
precisamos entender o significado do termo “fonte do direito”.
Assim como tantos outros termos, “fonte do direito” sofre da
pluralidade de significados, até porque se pode falar em fonte do direito positivo
56 Ob. Cit., pág. 221.
58
e fonte da ciência do direito. E nesta perspectiva, cada ciência poderá ter suas
fontes.
Concorda com esta afirmação Tárek Moysés Mousallem57
, que
explica a multiplicidade de sentidos como tendo início na linguagem vulgar
empregada pela Ciência do Direito para designar origem, proveniência ou foco
criador do direito. Não se pode esquecer: o sentido metafórico da palavra
“fonte” ainda ajuda a aumentar sua pluralidade significativa.
A Ciência do Direito é também formada por um corpo de
linguagem, a qual são atribuídas fontes, ou é tida como tal em relação ao
direito positivo, dependo da linha de pesquisa, como será demonstrado
adiante.
4.1. Os conceitos clássicos de fonte do direito
No Brasil o tema das fontes do direito tem sido, em geral, mal
tratado pelos autores de cursos e manuais, que em sua grande maioria
acabam por trabalhar da mesma forma o direito posto e as fontes do direito.
57 Fontes do Direito Tributário, pág. 118.
59
Assim também pensa Moussallem58
, para quem sob o pretexto de
se realizar Dogmática Jurídica, o problema das fontes tem sido resolvido
recorrendo-se à lei, ao costume, à doutrina e à jurisprudência.
O problema parece ser mais um com base nos chamados
“fundamentos óbvios”, os quais, segundo os ensinamentos de Alfredo Augusto
Becker59
, seriam a principal vicissitude do Direito Tributário, tomado como
Ciência, pois tornam o estudo do direito míope e criam obstáculos praticamente
intransponíveis.
4.1.1. Fontes de produção
Também denominadas de fontes materiais ou substanciais. As
fontes do direito tomadas como fonte de produção seriam aqueles focos dos
quais emerge a legislação. A autoridade competente para emitir a norma.
Assim trabalham Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique
Pierangeli60
58 Idem.
ao tratarem das fontes de produção do direito penal no Brasil.
59 Teoria Geral do Direito Tributário, pág. 11. 60 Manual de Direito Penal Brasileiro, vol. 1, págs. 113 e 114.
60
Atribuem à União esta característica (ser fonte), com fundamento no artigo 22, I
da Constituição Federal. No mesmo sentido trabalha E. Magalhães Noronha61
.
Buscar a fonte de produção do direito é buscar o agente
competente para legislar (em sentido amplo) em dado campo do direito, no
caso sobre direito tributário. Em outras palavras é estudar a competência
tributária.
No dizer de Roque Antonio Carrazza62
, competência tributária é a
aptidão para criar tributos em abstrato. Mas salienta o autor: de acordo com o
artigo 150, I da Constituição Federal, deve ser exercida por lei.
4.1.2. Fontes de cognição
Fontes de cognição, também denominadas fontes do
conhecimento ou formais, são representadas pela própria legislação, no dizer
de Zaffaroni e Pierangeli63
. Utilizam este prisma de análise autores dos
diferentes ramos do Direito.
61 Direitro Penal, pags. 49-53 62 Curso de Direito Constitucional Tributário, pág. 505. 63 Ob. Cit., pág. 113 e 115.
61
No caso do direito tributário, pode-se citar Regina Helena Costa64
,
para quem: “Fontes do direito são os modos pelos quais o direito se expressa.”
Sua abordagem representa bem o que seria a fonte de cognição, partindo da
legislação para se ter contato com o direito, proporcionando conhecimento
sobre ele.
A autora ainda ressalta que a importância de seu estudo se
revela nas categorias de fontes jurídicas e nas distintas limitações de cada uma
delas. Isto porque trabalha fontes como sinônimo de tipos legislativos.
No mesmo sentido trabalha Hely Lopes Meirelles65
ao discutir as
fontes do direito administrativo. Também as entende como fontes de cognição,
e as elenca: lei, doutrina, jurisprudência e costumes.
Maria Helena Diniz66, ao tratar das fontes do direito civil, trabalha
a classificação de Kelsen67
64 Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional, pág. 35
, separando o conceito de fundamento de validade
daquele de fonte. No primeiro haveria uma relação material entre a norma
hierarquicamente superior e a inferior, enquanto no segundo seria tratada a
forma de produção normativa. Mas a autora acaba por aderir à teoria egológica
de Cossio, preferindo se apoiar no conceito de fonte formal-material, segundo o
65 Curso de Direito Administrativo Brasileiro, pág. 46. 66 Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do Direito Civil, pás 19-21. 67 Ob. Cit., pág. 221.
62
qual toda fonte formal contém implicitamente uma valoração, só apreensível
através da ideia de fonte material.
Assim, os autores da linha clássica têm como fontes do direito
tributário: a Constituição Federal, as leis, os tratados e as convenções
internacionais, os decretos e as normas complementares. Essas
compreendidas como os atos normativos expedidos pelas autoridades
administrativas, as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição
administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa, as práticas reiteradamente
observadas pelas autoridades administrativas e os convênios que entre si
celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Passa-se a tecer alguns comentários sobre cada uma das fontes
do direito tributário. De início pelo tratamento clássico, para só então analisar o
ponto de vista do constructivismo lógico-semântico.
A primeira é a Constituição Federal, que no ordenamento
brasileiro inaugura o sistema tributário nacional, regulando-o dos artigos 145 a
162. Estabelece as competências para instituição e modificação dos tributos e
as delimita através de imunidades e princípios. É tida pela linha clássica como
a principal fonte do direito tributário brasileiro.
63
Segundo Regina Helena Costa68
é peculiar o fato do direito
tributário pátrio estar tão largamente regrado na Constituição, quando
comparado ao de outros países, onde o regramento constitucional pouco ou
nada trata sobre ele, deixando o encargo à legislação infraconstitucional.
A Lei Complementar tem como papel fundamental exatamente
complementar o sentido da Constituição69. O faz através das normas gerais em
direito tributário, no que se refere a conflitos de competência e a regular as
limitações constitucionais ao poder de tributar, como assevera Paulo de Barros
Carvalho70
68 Idem, pág. 16.
. Esta posição dicotômica, adotada pelo autor, se afasta da chamada
linha comportada do direito tributário, que entende o papel da lei complementar
de maneira mais presa à literalidade do artigo 146, e seus três incisos.
Também chamada de teoria tricotômica.
69 “Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas; d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) I - será opcional para o contribuinte; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)” 70 Ob. Cit., págs 265-267.
64
Contudo, entender o papel da lei complementar pela teoria
tricotômica acaba por ser um contracenso à competência estabelecida na
própria Constituição. Permite um campo de atuação tão grande à União que
pouco sobraria aos entes competentes.
Já na posição dicotômica, a União poderia também tratar
amplamente dos tributos por lei complementar, mas com limitação, qual seja:
apenas na hipótese da norma geral dispor sobre conflitos de competência ou
regular as limitações ao poder de tributar.
A Lei Ordinária no direito tributário tem como papel principal o
tributo em si: sua criação e sua modificação, em especial sua majoração. É o
que disciplina o princípio da estrita legalidade tributária exposto no inciso I do
artigo 150 da Constituição Federal: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias
asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o
estabeleça;”
Os tratados e as convenções internacionais têm a força e a
hierarquia das leis internas, sendo absorvidos pela legislação pátria na
65
conformidade da Constituição Federal e do que estabelece o artigo 98 do
Código Tributário Nacional71
.
Os decretos, atos legislativos do chefe do executivo, são restritos
pelo conteúdo estabelecido pelas leis em função das quais são expedidos,
conforme o artigo 99 do mesmo diploma legal72
.
As chamadas “normas complementares” são tipos legislativos em
sentido amplo, compreendidos os assim estabelecidos no artigo 100 do Código
Tributário Nacional73
, a saber: os atos normativos expedidos pelas autoridades
administrativas, as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição
administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa, as práticas reiteradamente
observadas pelas autoridades administrativas e os convênios que entre si
celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
71 Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. 72 Art. 99. O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei. 73 Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos: I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas; II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa; III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas; IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.
66
A Doutrina, enquanto Ciência do Direito, também tida por parte
dos autores clássicos como fonte do direito, teria sua função psicológica de
induzir por argumentos de razão e autoridade científica o convencimento do
juiz. Contudo, do ponto de vista estrutural do direito, compõe um corpo de
linguagem totalmente diferenciado.
A Ciência do Direito é verdadeiro ramo da ciência e do
conhecimento; tem como escopo descrever seu objeto de análise, o direito,
através de uma metalinguagem descritiva, formulada segundo os valores da
Lógica Alética ou Clássica: verdadeiro e falso. Afinal, conhecer é descrever, ou
melhor, depreender características próprias do objeto em estudo.
Jurisprudência, outro termo dotado de ambiguidade, pode ser
entendida como Ciência do Direito, no conceito de Maria Helena Diniz74
, como
um julgado, ou mesmo como um conjunto de julgados que acata uma
determinada posição. O primeiro significado já foi tratado acima, e os outros
dois, pode-se afirmar que a doutrina os vê como fonte formal.
Assim, também a jurisprudência é vista por alguns doutrinadores
como fonte, devido a sua influência psicológica nos julgadores e demais
aplicadores do direito. Contudo, não vincula sistemicamente aqueles não
74 Compêndio de introdução ao estudo do direito, pág. 219.
67
envolvidos no processo julgado. Sua linguagem só se direciona aos
demandantes. Não se poderia falar dela como fonte do direito do ponto de vista
de sua produção.
Recentemente esta posição teve de ser revista em decorrência da
Emenda Constitucional nº 45, quando se passou a ser exigida a repercussão
geral pelo parágrafo 3º do artigo 102 da Constituição, como requisito de
conhecimento do recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal75
.
Mas é preciso esclarecer: a repercussão geral é um requisito à
análise do recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal. Uma decisão
tomada neste contexto, tem o condão de vincular as decisões de tribunais
inferiores, conforme determinado artigos 543-B e 543-C do Código de Processo
Civil, inseridos pela Lei nº 11.418/200676
75 “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...)
. O intuito claro é diminuir o número de
processos a serem analisados pelo Tribunal Supremo.
III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição. d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (...) § 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)” 76“Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
68
Assim, não se pode negar que uma decisão tomada em recurso
extraordinário, que tenha cumprido tal requisito, reconhecendo a repercussão
geral, insira norma no sistema, pois vincula a atuação dos tribunais inferiores.
§ 1o Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). § 2o Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). § 3o Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). § 4o Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). § 5o O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 1o Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 2o Não adotada a providência descrita no § 1o deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 3o O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 4o O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 5o Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o disposto no § 4o deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 6o Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 7o Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem: (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 8o Na hipótese prevista no inciso II do § 7o deste artigo, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008). § 9o O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.672, de 2008).”
69
Neste sentido, configura fonte do direito, se esta for encarada como fonte de
cognição pelo entender da linha clássica.
Dentro do tema jurisprudência, há de se analisar, ainda, se as
súmulas seriam consideradas fonte do direito. A súmula é um enunciado
emitido por um tribunal a fim de aplicar entendimento pacificado por ele ao
longo do tempo. Neste sentido, ensina Eduardo Marcial Ferreira Jardim77. É
disciplinada pelo artigo 479 do Código de Processo Civil78
. A súmula não teria
a princípio força vinculante das decisões, ficando adstrita a um direcionamento
interno do tribunal que a emitiu. Não seria fonte do direito. Isto antes de ocorrer
modificação na legislação, que alterou este quadro.
A súmula vinculante foi criada pela Emenda Constitucional nº 45,
que inseriu o artigo 103-A na Carta Constitucional79
77 Dicionário jurídico tributário, pág. 190.
e regulamentada pela Lei
78“Art. 479. O julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência. Parágrafo único. Os regimentos internos disporão sobre a publicação no órgão oficial das súmulas de jurisprudência predominante.” 79“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide Lei nº 11.417, de 2006). § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
70
nº 11.417/2006. Seu objetivo é vincular as decisões das cortes inferiores ao
tribunal que as edita. Neste caso, sob a ótica da doutrina clássica, a súmula
vinculante poderá ser fonte cognoscitiva do direito.
4.1.3. Fontes de conhecimento do saber jurídico
As fontes de conhecimento do saber jurídico seriam, como
asseveram Zaffaroni e Pierangeli80
, aquelas empregadas pelas ciências do
direito, em sentido amplo, para a elaboração de conceitos, dentre os quais
podem ser citados: a lei, dados históricos, jurisprudência, informação fática,
etc. O conceito envolve ideia muito ampla.
Estes dois autores, ao tratarem das fontes do direito penal,
ampliam as possibilidades para englobar qualquer situação que possa informar
o cientista das diversas áreas das ciências jurídicas, independentemente do
meio utilizado. Parecem buscar uma visão integral do objeto, na tentativa de
enxergar o objeto cultural direito como um todo.
80 Ob. Cit., pág. 113-115.
71
4.1.4. Fontes de informação do saber jurídico
As fontes de informação do saber jurídico são aquelas das quais
se obtém informações sobre o estado passado ou presente do saber jurídico.
São fontes as ciências do direito irrestritamente tomadas no trabalho de
Zaffaroni e Pierangeli81
, sendo irrestritamente tomadas por absorverem mais do
que o direito posto, toda a produção científica sobre o direito.
Analisando a utilização de diversos enfoques sobre o termo
“ciência do direito”, Maria Helena Diniz82
enfatiza serem possíveis duas
abordagens, uma em sentido amplo, outra em sentido restrito. Enquanto
naquela poderia ser considerada qualquer ciência que tivesse o direito como
objeto, nesta há referência à Dogmática Jurídica, a qual atua sobre o direito
posto num determinado espaço e tempo (atual para o observador).
Neste sentido seria mais plausível a análise de fontes da Ciência
do Direito sob um olhar positivista, de modo que as fontes não fossem
sinônimos de objetos, mas caracterizadas pelas regras de sua produção.
81 Idem, pág. 113-115 82 Ob. Cit., págs. 218 e 219.
72
Assim, pode-se afirmar que, do ponto de vista das fontes
cognoscitivas, todas as formas normativas seriam consideradas fontes do
direito.
4.2. O conceito de fonte trabalhado no constructivismo lógico-
semântico
O constructivismo lógico-semântico, através do trabalho de Tárek
Moysés Moussallem83
, critica as posições até aqui expostas por apresentarem
confusão de objetos, seja na posição positivista de Kelsen, com a dualidade
“fontes formais” e “fontes materiais”, seja no caso das fontes da ciência do
direito, trabalhadas como fonte do conhecimento e de informação.
Tal crítica repousa na confusão da dualidade processo/produto.
As posições clássicas apresentadas neste trabalho sofrem deste vício, que
acaba por confundir mais do que explicar o fenômeno de criação de normas
jurídicas.
O trabalho do autor buscou evidenciar a diferença entre o
processo de produção da norma jurídica e seu conteúdo, partindo de conceitos
83 Ob. Cit., pág. 136.
73
típicos da filosofia da linguagem: enunciação, enunciado, enunciação-
enunciada e enunciado-enunciado.
A enunciação, para Moussallem84
, pode ser encontrada no plano
da facticidade social, compondo o ato da comunicação ou o processo
comunicacional entre dois ou mais sujeitos, com intuito de emitir um enunciado
jurídico. A enunciação como qualquer fato social pode se perder no tempo se
não for perpetuada através do que se chamará enunciação-enunciada.
O enunciado, como já tratado acima, neste trabalho, pode ser
encarado como o texto, o meio para que a comunicação possa ser expressa.O
enunciado pode ser tido como texto escrito, que possibilita a perpetuação da
comunicação, mas também como fala ou gesto que acaba por se perder no
tempo, inviabilizando sua posterior análise. Por isso há prevalência do
enunciado escrito no direito.
A enunciação-enunciada comporá o texto, deixando evidenciados
os dêidicos da enunciação, como lugar, tempo, sujeito emissor, sujeito
receptor, ideologia e, da mesma forma, vontade do emissor. Através das
marcas deixadas no texto se torna possível reaver importantes informações do
processo comunicacional normativo, possibilitando a análise de sua validade.
84 Idem, pág. 146.
74
O enunciado-enunciado é o texto, aquele referente ao conteúdo a
comunicar, afastando as marcas de sua enunciação. Dele serão extraídos os
conteúdos normativos a serem seguidos.
O estudo dessas categorias linguísticas possibilitou afastar a
confusão do processo com o produto. Admitindo serem fontes do direito as
enunciações, mas apreensíveis apenas através das enunciações-enunciadas.
O tratamento das fontes do direito apresentado por Tárek Moysés
Moussallem85
também foi adotado por Paulo de Barros Carvalho, que afastou
as categorias positivistas clássicas de fonte material e formal e passou a utilizar
a análise do discurso por entender, acertadamente, ser esta mais adaptável ao
constructivismo lógico-semântico.
Assim, Paulo de Barros Carvalho86
85 Ibidem, pág. 135.
assumiu o entendimento de
fontes do direito como focos ejetores de normas jurídicas, constituídos pelos
órgãos habilitados pelo sistema à produção de normas e pela atividade
desenvolvida por eles para chegar a este fim. A existência do órgão não é,
86 Curso de Direito Tributário, págs. 79 e 80.
75
portanto, suficiente para a análise das fontes, sendo necessária a verificação
de sua atividade segundo as normas estabelecidas no sistema jurídico.
Nesse processo produtivo, percebe Paulo de Barros Carvalho87
,
as normas se apresentam em duplas, sendo introduzidas umas por outras. As
normas introdutoras e as normas introduzidas compõe, em última análise o
direito positivo. As primeiras com o único condão de introduzir as outras no
sistema. Enquanto estas prescrevem condutas conforme depreendidas do
enunciado-enunciado.
A norma jurídica, nesta perspectiva, figura como linguagem
tipificada, uma proposição jurídica prescritiva, com alto grau de
institucionalização. Tal linguagem, como qualquer outra, é expressa através de
um ato de fala: um discurso. Este ato em si seria a fonte do direito, mas apenas
quando este ato de fala seguisse o procedimento jurídico de produção
normativa pela atuação da autoridade competente em dizer o direito.
Como afirma Paulo de Barros Carvalho88
87 Idem.
, os fatos absorvidos
pela ordem jurídica como necessários à enunciação, e não como enunciado,
formam o território das fontes do direito, permitindo que as fontes do direito
88 Idem, pág. 81.
76
sejam trabalhadas como algo diferente do direito posto. Afastando a confusão
entre o processo e o produto, típico das teorias clássicas expostas acima.
Seguindo este raciocínio, se percebe que as normas de
competência e as normas do procedimento legislativo, previstas no sistema,
incidem em fatos, que se tornam jurídicos. O que Lourival Vilanova89
denomina
como fontes do direito são aqueles fatos jurídicos criadores de normas. Em
suas palavras: “fatos sobre os quais incidem hipóteses fácticas, dando em
resultado normas de certa hierarquia”.
Frise-se: estes fatos a que alude Vilanova90 são aqueles
analisados do prisma da enunciação normativa, o processo, não do enunciado,
o produto; como enfatiza Paulo de Barros Carvalho91
.
Esta característica de processo da enunciação diz respeito à
dinâmica do sistema. Refere-se ao ato de fala. Enquanto a validade do produto,
pelo enunciado, se refere à derivação, numa visão estática do sistema jurídico.
Operação onde se coloca em evidência a mensagem, o produto, quando a
incidência da norma cria o fato jurídico.
89 Causalidade e relação no direito, pág. 24. 90 Idem. 91 Ob. Cit., pág. 83.
77
Desse modo, as normas que prescrevem quais condutas devem
ser tomadas pela autoridade para que a sua enunciação resulte no enunciado-
enunciado, assim como as marcas deixadas no enunciado de como foram
seguidas, compõe a norma introdutora. Enquanto a norma introduzida pode ser
extraída do enunciado-enunciado pelo intérprete no processo de interpretação,
produzindo a proposição prescritiva.
Nas palavras de Tárek Moysés Moussallem: “O fato produtor de
normas é o fato-enunciação, ou seja, a atividade exercida pelo agente
competente. Falamos em fato-enunciação porque a atividade de produção
normativa é sempre realizada por atos de fala”92
.
A verificação de validade de uma norma perante o sistema,
portanto, dependerá de uma análise de fundamentação dessa em outra norma
de superior hierarquia e do procedimento adotado na sua produção, passível
de se verificar através das marcas deixadas no texto instrumento introdutor
dela.
Esta é a lição de Tárek Moysés Moussallem: “A partir da
linguagem do veículo introdutor (enunciação-enunciada), reconstruímos a
linguagem do procedimento produtor de enunciados (enunciação), e realizamos
92 Fontes do Direito Tributário, pág. 150.
78
o confronto entre esta e a linguagem da norma de produção normativa
(fundamento de validade do veículo introdutor) para aferirmos se a produção
normativa se deu ou não em conformidade com o prescrito no ordenamento”93
93 Idem, pág. 152.
.
79
5. Análise do discurso normativo
Nos capítulos anteriores foi demonstrada a relação entre o direito
e a cultura, assim como a configuração do direito como objeto cultura,
modificável pelo homem no tempo e no espaço.
Também foi caracterizada sua forma de existir, sua construção e
sua propagação pela linguagem. Sendo esclarecido que este posicionamento
filosófico do giro linguístico encara assim seu objeto. Concluindo que como
linguagem o direito, por este enfoque, deve ser estudado.
Assim, como linguagem, o direito se mostrou um ato
comunicacional, permitindo a sua análise do ponto de vista do discurso, seja
por seu conteúdo, seja por sua elaboração, incluindo os limites de sua
abordagem. Limites expostos também em linguagem, deixando marcas no
enunciado daquele processo enunciativo.
Essa será a abordagem desse capítulo.
80
5.1. Linguagem prescritiva x descritiva: direito posto x Ciência do
Direito
Nos capítulos anteriores já ficou estabelecida a diferença entre a
linguagem do direito positivo e a linguagem da Ciência do Direito. Contudo é
importante seu tratamento no contexto do discurso, de seu conteúdo , de sua
forma, a que se pretende e por quem é propagada e como isto é feito.
A linguagem do direito positivo é primordialmente prescritiva.
Mesmo quando o legislador utiliza formas descritivas ou expressivas de
linguagem, estas são voltadas à imperatividade do ordenamento.
A Ciência do Direito apresenta linguagem descritiva daquela típica
do direito positivo. Da mesma forma, quando o cientista se utiliza de formas
inquisitivas ou prescritivas, estas são voltadas à descritividade típica da Ciência
do Direito. Constitui verdadeira linguagem de sobrenível, podendo ser tratada
como metalinguagem em relação ao ordenamento.
Para Paulo de Barros Carvalho: “Linguagem descritiva,
informativa, declarativa, indicativa, denotativa ou referencial é o veículo
adequado para a transmissão de notícias, tendo por finalidade informar o
81
receptor acerca de situações objetivas ou subjetivas que ocorrem no mundo
existencial. Apresenta-se como um feixe de proposições, afirmadas ou
negadas, que remetem o leitor ou o ouvinte aos referentes situacionais ou
textuais. É a linguagem própria à transmissão de conhecimentos (vulgares ou
científicos) e de informações das mais diferentes índoles, sendo muito utilizada
no intercurso da convivência social” 94
.
Justamente em função deste caráter informativo, referencial, é
que ressalta a possibilidade de verificação da assertiva frente à situação fática,
com valores de verdade/falsidade. Tão característico da ciência.
Já quanto à linguagem prescritiva, Paulo de Barros Carvalho
esclarece: “Linguagem prescritiva de condutas: presta-se à expedição de
ordens, de comando, de prescrições dirigidas ao comportamento das pessoas.
Seu campo é vasto, abrangendo condutas intersubjetivas e intra-subjetivas.
Todas as organizações normativas operam com essa linguagem para incidir no
proceder humano, canalizando as condutas no sentido de implantar seus
valores” 95
.
O legislador utiliza enunciados prescritivos na produção de leis,
numa linguagem técnica, através de um discurso natural com palavras e
94 Apostila de Lógica para o Curso de Mestrado em Direito da PUC-SP, pág. 17. 95 Idem, págs. 18 e 19
82
expressões de caráter científico. Mas nãoficam afastadas atecnias, lacunas
aparentes e aparentes contradições, que deverão ser sanadas no trabalho do
aplicador do direito. O qual precisará necessariamente interpretar o direito.
Assim entende Hans Kelsen96
.
É natural, numa democracia, a coexistência da pluralidade de
formação dos representantes populares no poder legislativo: quanto maior a
diversidade dos representantes, mais autêntica é a representatividade dos
diversos setores da comunidade. Em decorrência disto, não há que se falar em
rigor científico na atividade legislativa.
A democracia exige um preço a pagar do sistema jurídico. As
impropriedades, os erros, as atecnias, as deficiências e as ambiguidades dos
textos legais. Resta ao estudioso do direito sanar tais deficiências, buscando
construir um sentido mais apurado, produzindo ciência.
Esta interpretação feita pelo estudioso, poderá ter diferentes
naturezas, variando conforme a aplicação que for dada a ela. Um professor de
direito, no exercício da função, produzirá enunciados descritivos do
ordenamento. A seu turno, um magistrado, como intérprete legitimado, terá sua
interpretação expressa na função prescritiva. Produz normas a partir de outras.
96 Ob. Cit., pág. 387.
83
Em geral, produz a norma individual e concreta pela interpretação e
correspondente aplicação da norma geral e abstrata, num processo de
positivação.
A linguagem do cientista do Direito, mais do que técnica, é
científica. Seus enunciados descritivos são dotados da harmonia característica
da linguagem assertiva, passível de formalização nos moldes da Lógica Alética
ou Apofântica. Suas unidades são organizadas segundo critérios de identidade,
não contradição e terceiro excluído; próprios deste tipo de raciocínio.
Tanto a linguagem técnica como a científica utilizam vocábulos
especializados de um determinado ramo, no caso: o direito. Isto, apesar de
essencial, acarreta problematização ainda maior. Demanda um grande esforço
semântico.
A Teoria Geral do Direito não escapa do problema. Apenas com
os processos de generalização e abstração, típicos dos estudos lógicos,
poderá a problemática ser afastada. Até porque decorre do conteúdo
semântico, afastado pela lógica. No caso do direito posto: a lógica jurídica.
84
O papel do jurista, portanto, é analisar e depreender o sentido dos
enunciados, dentro do sistema jurídico em que se inserem. Se torna
importante, por isso, diferenciar o enunciado da proposição.
Paulo de Barros Carvalho define enunciado como: “o produto da
atividade psicofísica de enunciação. Apresenta-se como um conjunto de
fonemas ou de grafemas que, obedecendo a regras gramaticais de
determinado idioma, consubstancia a mensagem expedida pelo sujeito emissor
para ser recebida pelo destinatário, no contexto da comunicação” 97
.
E continua o professor ao comentar os ensinamentos dos lógicos
ingleses: “Para os ingleses, “oração” e “sentença” teriam o mesmo valor
semântico de “enunciado”, isto é, a expressão oral ou gráfica de uma
proposição, enquanto esta seria o conteúdo significativo que o enunciado
sentença ou oração exprimem.”98
Assim, percebe-se que o enunciado é a
expressão enquanto a proposição é ideia contida nela, seu sentido.
Como o direito positivo é formado não pelos enunciados, mas
pelas proposições prescritivas, depreendidas dos enunciados, dos quais
surgem interpretações diversas e, por conseguinte, diversas proposições, há
que se perceber que apenas algumas podem ser tidas como normas.
97 Ibidem, pág. 56. 98 Ibidem.
85
Enquanto o direito positivo disciplina o comportamento humano, o
convívio social, através de uma fórmula linguística prescritiva, de forma a
regular a conduta das pessoas nas relações intersubjetivas, a Ciência do
Direito estuda este feixe de proposições prescritivas, observando, investigando,
interpretando e, sobretudo, descrevendo, sempre segundo uma metodologia
predeterminada. Para tal, o cientista utiliza-se sobremaneira de uma linguagem
descritiva.
Nas lições de Lourival Vilanova: “Inseparáveis, mas discerníveis,
são os seguintes componentes do conhecimento: a) o sujeito cognoscente; b)
os atos de percepção e de julgar; c) o objeto do conhecimento (coisa,
propriedade, situação objetiva); d) a proposição (onde diversas relações de
conceitos formam estruturas)”99
.
O jurista, sujeito cognoscente, ao conhecer o direito positivo, seu
objeto de conhecimento, através de atos de percepção, executáveis pelos
sentidos (no caso a leitura ou o estudo), dos enunciados prescritivos, produz a
linguagem descritiva: uma linguagem de sobre nível, sobrelinguagem ou uma
metalinguagem em relação ao direito positivo. Àquela, esta se refere,
descrevendo-a como sistema empírico.
99 Ob. Cit., pág. 37.
86
As unidades do sistema do direito posto são as normas jurídicas.
Estas são depreendidas dos textos legais e interligadas cognoscitivamente
mediante relações de coordenação de funções e de subordinação hierárquica.
Este sistema de normas jurídicas de determinado país também se
denomina sistema empírico do direito positivo, uma vez que se destina a uma
região material, uma sociedade, historicamente determinada no espaço e no
tempo.
5.2. O caminho da construção de sentidos
O exame do ordenamento como sistema ressalta, desde logo, a
existência de lacunas, imprecisões e contradições entre as unidades do
conjunto. A função do intérprete é tentar impedi-las ou, ao menos, minimizar
seus efeitos de fato; de maneira que, ao descrever seu objeto o sistema do
direito como Ciência do direito solucione as aparentes lacunas, imprecisões e
contradições, buscando sempre a certeza e a segurança do sistema.
O ordenamento é uno, sua divisão, feita pela Ciência do Direito,
tem fim meramente didático. Claro é que o direito positivo é indissociável. No
87
caso do Direito Tributário, a Ciência do Direito busca estudar a instituição, a
arrecadação e a fiscalização de tributos.
A linguagem, neste sentido, não só fala do objeto (Ciência do
Direito), como participa de sua constituição (direito positivo). Se for verdade
que não há fenômeno jurídico sem prescrições escritas ou não escritas,
também é certo que não podemos cogitar de manifestação do direito sem uma
linguagem, idiomática ou não, que lhe sirva de veículo de expressão.
Mantenha-se presente a concepção pela qual interpretar é atribuir valores aos
símbolos, isto é, adjudicar-lhes significações e, por meio dessas, referências a
objetos.
Um dos alicerces que suportam tal construção reside na distinção
entre enunciados e normas jurídicas, com os diferentes campos de irradiação
semântica. Análise que pressupõe, como ensina Paulo de Barros Carvalho100
,
a aceitação de que a linguagem guarda quatro planos de significação a serem
trabalhados por todos aqueles dispostos a conhecer o sistema jurídico
normativo: S1) o conjunto de enunciados, tomados no plano da expressão; S2)
o conjunto de conteúdos de significação dos enunciados prescritivos; S3) o
domínio articulado de significações normativas; e S4) os vínculos de
coordenação e de subordinação que se estabelecem entre as regras jurídicas.
100 Curso de Direito Tributário, págs. 147-166.
88
A lei, em sentido amplo, nesta perspectiva, pode ser tida como o
texto, na sua dimensão de veículo de prescrições jurídicas. Constituição,
emenda constitucional, lei complementar, lei delegada, lei ordinária, medida
provisória, resoluções, decretos, sentenças, acórdãos, contratos e atos
administrativos, enquanto suportes materiais de linguagem deôntico-jurídica,
pertencem à plataforma da expressão dos textos prescritivos e, como tais, são
veículos introdutórios de normas jurídicas.
Este conjunto de textos legais que constitui a base empírica do
conhecimento do direito posto só pode ser apreendido pela intuição sensível,
pois, enquanto dados brutos. Já a norma jurídica, como juízo implicacional
construído pelo intérprete em função da experiência no trato com esses
suportes comunicacionais, compõe a realidade jurídica.
Os textos são formados por signos, criados pelo poeta de
Flusser101, que estabelece relação lógica entre o suporte físico, a significação e
o significado. Toda linguagem, como esclarece Vilanova102
, oferece esses três
ângulos de análise: compõe-se de um substrato material, de natureza física,
que lhe sirva de suporte; uma dimensão ideal na representação que se forma
na mente dos falantes (significação); e os objetos referidos pelos signos e com
os quais eles mantêm relação semântica (significados).
101 Ob. cit., págs. 144. 102 Ob. Cit., pág. 45.
89
É justamente desta forma que o direito se relaciona com os dados
da chamada “realidade social”, absorvendo relações entre signos e objetos
através da ação do poeta. O legislador, em sentido amplo, assim entendido
como juiz, particular, autoridade administrativa ou qualquer outro que crie
textos normativos, ao elaborar textos, estabelece uma relação linguística entre
texto e contexto, atribuindo-lhe significado pela linguagem. O problema é que
não são eles os únicos a estabelecerem tal relação.
Isto porque os enunciados linguísticos não contêm em si mesmos
significações, mas configuram objetos percebidos pelos nossos órgãos
sensoriais que, a partir de tais percepções, ensejam intra-subjetivamente as
correspondentes significações.
Esses estímulos desencadeiam em nós produções de sentido.
Vê-se, desde agora, que não é correta a proposição segundo a qual, dos
enunciados prescritivos do direito posto, extraímos o conteúdo, o sentido e o
alcance dos comandos jurídicos. De tais enunciados partimos para a
construção dos sentidos, no processo conhecido como “interpretação”.
É neste ponto que surgem as dúvidas quanto à significação dos
textos legais. Causam a própria aplicação do direito. Ao buscar o judiciário,
este interpreta a fim de aplicá-lo. Neste caminho, sua função é atribuir à norma
90
individual e concreta a prescritividade decorrente da interpretação
aparentemente final, haja vista também demandar interpretação. Esta é
inesgotável em essência, mas limitável pelo sistema.
Será sempre possível uma nova interpretação, num processo
infinito que em algum momento resulta na compreensão. Daí, continuarmos a
interpretar ou não é um ato de vontade, que dependerá das circunstâncias e
das necessidades de cada um. Circunstâncias estas criadas pelo ordenamento
para garantir a segurança jurídica, sob pena de se discutir eternamente
determinada demanda judicial.
A partir desta compreensão, através de um ato de vontade do
aplicador do direito, será possível a produção de nova linguagem constituindo o
fato jurídico e fazendo a norma incidir na realidade, sem, contudo, coincidir com
ela, pois a modifica.
Isto porque a compreensão do objeto sem a vontade de emiti-la,
resulta numa linguagem não comunicacional, mas interna ao ser humano.
Resta, assim, estranha ao direito, permanecendo no âmbito do pensamento,
como será abordado em item apropriado.
91
5.3. A construção de sentidos e a classificação das normas
O caminho de construção de sentidos da norma jurídica, através
de processo de positivação do aplicador do direito, leva a um questionamento
acerca de eventuais diferenças no discurso normativo, nos diferentes tipos de
normas. O quê só pode se dar pela classificação das normas em conformidade
com essas diferenças.
Como ensina Roque Antonio Carrazza103
, não existem
classificações certas ou erradas, mas úteis ou inúteis. Ao mesmo tempo a
teoria das classes ensina que para classificar é necessário um fator de
discriminação, que balize a separação dos elementos em duas classes. Cada
uma, por sua vez pode ser repartida em mais duas e assim consecutivamente.
Segue nessa mesma esteira o lógico Alfred Tarski104
103 Curso de Direito Tributário, pág. 528.
, ao tratar da
Teoria das Classes: “Diz-se frequentemente de uma função sentencial variável
livre que expressa uma determinada propriedade das coisas, uma propriedade
possuída por aquelas e somente aquelas, coisas que preenchem a função
104 Introduction to Logic and to the Methodology of Deductive Sciences , pág. 72. Tradução livre do trecho: “It is frequently said of a sentential function with on free variable that it expresses a certain property of things, – a property possessed by those, and only those, things which satisfy the setential function (the sentential function “x is divisible by 2”, for example, expresses a certain property of the number x, namely, divisibity by 2, or the property of being even). The class corresponding to this function contains as its elements all things possessing the given property, and no others”.
92
sentencial (a função sentencial “x é divisível por 2”, por exemplo, expressa uma
certa propriedade do número x, ou seja, divisibilidade por 2, ou a propriedade
de ser mesmo). A classe correspondente a esta função contém como seus
elementos todas as coisas que possuem a propriedade dada, e não outros”
Assim, para classificar as normas, é necessário um fator de
discriminação para o estabelecimento de duas classes. No presente estudo
elencam-se dois destes fatores, criando duas classes e em cada uma delas
duas subclasses. O primeiro diz respeito ao antecedente normativo e a
situação nele prevista, se abstrata ou concreta. O segundo se revela pela
atenção às pessoas atingidas pelo consequente normativo, se é aplicável a
todos ou apenas a alguns indivíduos: geral ou individual.
Isto possibilita a separação inicial em duas classes e cada uma
delas em mais duas, criando quatro classes normativas: a) abstratas e gerais;
b) abstratas e individuais; c) concretas e gerais; e d) concretas e individuais,
como ensina Paulo de Barros Carvalho105
.
As normas abstratas e gerais prescrevem para condutas abstratas
(futuras e incertas) consequências gerais. É o caso das leis, dos decretos, das
instruções normativas, que prescrevem condutas para todas ou grande parte
105 Direito Tributário: linguagem e método, pág. 140.
93
das pessoas que, se praticarem o evento previsto no antecedente normativo,
estarão sujeitas à aplicação do consequente. Para tanto passam por um
processo de individualização e concretização.
As normas abstratas e individuais prescrevem condutas para uma
pessoa ou um grupo de pessoas, que se praticarem o evento previsto no
antecedente normativo, estarão sujeitas à aplicação do consequente. Seria o
caso de uma consulta fiscal que quando realizada trata de situações futuras e
incertas, mas vincula o consulente e a administração tributária.
As normas concretas e gerais reconhecem determinado evento
como jurídico e prescrevem consequências para todas ou grande parte das
pessoas, que reconhecidamente praticaram o evento absorvido pelo direito no
antecedente normativo imputando consequências gerais. Estas são estruturas
típicas das normas introdutoras de outras normas no sistema.
As normas concretas e individuais absorvem o evento tipificado
como jurídico para atribuir um consequente a uma pessoa ou um pequeno
grupo de pessoas. Essas normas são o resultado da aplicação das normas
abstratas e gerais a um caso específico.
94
Em cada uma dessas normas o intérprete precisará passar pelos
quatro planos no caminho de construção de sentido, a fim de se chegar ao
momento no qual a reflexão para por um ato de vontade para a emissão de
outra linguagem; seja científica ou normativa.
Assim, a passagem da norma geral e abstrata para aquela
individual e concreta acontece por um processo de aplicação baseada na
interpretação para a positivação e, neste sentido, dependerá da aplicação de
um ato de vontade do aplicador para ser enunciada.
5.4. O papel do ato de fala no discurso normativo
Nas palavras de Tárek Moysés Moussallem: “O fato produtor de
normas é o fato-enunciação, ou seja, a atividade exercida pelo agente
competente. Falamos em fato-enunciação porque a atividade de produção
normativa é sempre realizada por atos de fala”106
.
Percebe-se a importância dos atos de fala tomados como fonte do
direito, no sentido de fonte de produção, na visão do construtivismo lógico-
semântico. Portanto, fonte de produção do discurso do direito positivo.
106 Ob. Cit., pág. 150.
95
Conclui-se ser plausível a afirmação de que os fatos-enunciação
podem ser encarados como atos de fala performativos, pois sua prática cria
normas para o sistema jurídico. Portanto, lhes são aplicáveis os elementos
característicos destes atos para alcançar sua efetividade, ou felicidade como
expressa por Austin107
, produzindo normas:
a) O ordenamento estabelece as situações jurídicas e os
procedimentos a serem seguidos para que as normas possam ser criadas, pois
para um ato performativo há de se ter um procedimento convencionalmente
aceito com o correspondente efeito convencionalmente atribuído, com a
correspondente formalidade.
b) As normas jurídicas estabelecem quem deve ser a autoridade
competente ou o órgão escolhido para efetuar o procedimento adequado para
a produção da norma, assim como a teoria dos atos de fala requer o
estabelecimento das pessoas e das circunstâncias para que em determinado
caso sejam elas as capazes a invocar o procedimento a ser adotado.
c) O procedimento estabelecido pelo sistema jurídico requer que a
pessoa ou todas as pessoas necessárias e competentes para o ato o
107 Ob. Cit., págs. 14 e 15.
96
pratiquem, assim como a teoria dos atos de fala requer a execução do
procedimento por todas as pessoas envolvidas, correta e completamente (é o
caso do ato legislativo).
d) Se, pela teoria dos atos de fala, quando, usualmente, o
procedimento deve ser adotado por quem tiver certos pensamentos ou
sentimentos, ou para a inauguração de certa conduta consequente na parte de
qualquer participante, então a pessoa participante e envolvida no procedimento
deve de fato ter aqueles pensamentos ou sentimentos e os participantes
devem ter o real intuito de assim proceder. O direito assim estabelece para que
os órgãos emissores de normas sigam os procedimentos, segundo um dever
de moralidade ou adequação aos fundamentos de validade deste
procedimento. Nos quais se pode incluir a vontade de produzi-los.
e) O direito determina: a norma só será criada ao final de todos os
atos integradores do procedimento estabelecido para a criação normativa. Da
mesma forma estabelece a teoria de Austin, segundo a qual os atos dentro do
procedimento devem ser adotados pelos participantes de forma subsequente
uns aos outros.
97
O ato de enunciação só será apreensível pelas marcas deixadas
no texto. Neste sentido afirma José Luis Fiorin108
que o linguista não opõe a
enunciação ao enunciado como o ato a seu produto, mas impossibilitado de
estudar diretamente o ato da enunciação, tenta identificar e descrever as
características desse ato no produto.
A partir da enunciação-enunciada o estudioso do direito terá
condições de conseguir algumas informações importantes deixadas no texto.
Contudo, surge a dúvida de saber se todas as informações sobre a enunciação
estarão enunciadas. Para afirmar isso, seria necessário saber quais seriam as
informações. Isto seria impossível, pois demandaria enxergar a enunciação
sobre todos os ângulos ao mesmo tempo.
Um exemplo seria saber se a discordância entre o enunciado e a
enunciação poderia ser extraída do enunciado. A resposta é dada por Fiorin109
,
para quem a discordância entre enunciado e enunciação não configuram
desacordo entre o conteúdo manifesto e a intenção comunicativa. Isto porque
as únicas intenções do sujeito apreensíveis são aquelas inscritas no discurso,
através da enunciação-enunciada. O conflito, corretamente analisado, seria,
então, aquele estabelecido entre a enunciação-enunciada e o enunciado-
enunciado.
108 As astúcias da enunciação, pág. 31. 109 Idem, pág. 39.
98
Este conflito justifica o presente trabalho, permitindo uma análise
jurídica dos atos que integram a enunciação, demarcados no enunciado pela
enunciação-enunciada. Assim, é de suma relevância o estudo de quais seriam
estes atos que levam ao ato de fala.
5.5. O discurso normativo como comunicação jurídica
O direito positivo, pelo olhar do giro linguístico, é um corpo de
linguagem, que constitui sua própria realidade. Seguindo um raciocínio
próximo, Flusser desenvolveu toda uma teoria da construção da realidade pela
linguagem. O sistema jurídico, neste sentido, absorve informação externa a seu
sistema e oferece respostas típicas. O direito pode, então, ser encarado como
linguagem. Criado, modificado e propagado pela linguagem. O que viabiliza
enxergá-lo como ato cultural, produzido e modificado pelo homem. Mas
também um ato comunicacional.
Relevante discutir se pode ser o direito uma forma de
comunicação. Para tanto, é necessária a análise dos ensinamentos de Roman
Jakobson110
110 Linguística e comunicação, pág. 123.
sobre os seis elementos essenciais da comunicação. São eles:
remetente, mensagem, destinatário, contexto, código e contato. O remetente
envia a mensagem ao destinatário, a qual para ser eficaz necessita de um
99
contexto e de um código comum ao remetente e ao destinatário, a fim de que a
mensagem possa fazer sentido. Mas esta mensagem precisa de um contato
ocorrido por um canal físico e uma conexão psicológica entre os dois sujeitos
da comunicação, que os capacite para a comunicação. Sem qualquer destes
seis elementos não há que se falar em comunicação.
Paulo de Barros Carvalho aprofundou o estudo da comunicação
e, sem afastar a lição deixada por Jakobson, apresentou uma teoria sobre as
etapas pelas quais deve passar o emissor e o receptor para que a
comunicação se estabeleça. Enfatiza neste estudo que antes da mensagem
existem fases tão importantes como o ato de fala em si para que a mensagem
seja emitida e recepcionada. Teoria esta apresentada, analisada e discutida no
Grupo de Estudo de Lógica Jurídica do IBET.
Este processo passa por nove etapas: dúvida, aporia, decisão,
estímulo, vontade, resistência, ato de fala, mensagem e recepção.
O emissor da mensagem apresenta num primeiro momento a
“dúvida” quanto ao que se falar. Este momento é crucial para dar início ao que
pode vir a ser o ato de fala. É uma fase introspectiva, mas relevante. A nosso
ver, contudo, não pode ser diretamente apreendida, pois só acontece no
100
intelecto do emissor, não sendo expressa na linguagem. Esta só existirá se a
dúvida for solucionada a favor da fala.
Para que isso ocorra, a “dúvida” é seguida da fase de “aporia”, na
qual são elencados argumentos a favor e contra o conteúdo da mensagem a
ser expressa, configurando uma fase reflexiva.
Pela “decisão”, o emissor escolhe o conteúdo que pretende emitir.
Neste ponto, o emissor sofre um “estímulo” externo que o induz ao ato de fala.
Com o “estímulo”, o emissor desenvolve a “vontade” de emitir o
ato comunicacional. A vontade seria aquela força que empurra o emissor a
produzir o ato de fala. Porém, é nítida a dificuldade de apreensão desta
vontade pelo direito, pelo menos numa primeira análise. Contudo, esta conduta
intrassubjetiva, que não teria importância para o direito, deixa necessariamente
marcas na mensagem, no texto: o enunciado. Tornando-se passível de ser
depreendida a partir deste enunciado.
Mesmo apresentando vontade de falar, o emissor precisa vencer
algumas “resistências” maiores ou menores: a timidez, o medo, a falta de
101
oportunidade de falar etc. Vencida esta fase, o emissor procede o ato de fala,
enviando a mensagem.
Enquanto isso, havendo um contato, através de uma conexão,
física e psicológica, entre o emissor e o receptor, este produz o ato de
“recepção”.
Assim, o processo comunicacional não configura apenas o ato de
fala em si, mas é certo que este ato é a objetivação da vontade do emissor.
Paralelamente, o processo de produção normativo, a enunciação, configura a
objetivação da vontade do legislador em sentido amplo.
Esse processo enunciativo não pode ser apreendido na
totalidade, pois é anterior ao direito, não é totalmente enunciado e, portanto, se
consubstancia em sua fonte. Mas como deixa marcas no enunciado normativo,
a enunciação-enunciada, permite ao intérprete do direito refazer este caminho,
com o intuito de verificar a licitude da produção normativa. Esta é a lição de
Fiorin111 e Moussallém112
.
111 Ob. CIt., pág. 38. 112 Ob. Cit., pág. 80.
102
Para Fiorin113
: “A enunciação enunciada compreende todos os
adjetivos e advérbios apreciativos e substantivos carregados de subjetividade,
os dêidicos etc. Enfim, todos os elementos que remetem à instância da
enunciação”.
Essa enunciação-enunciada, porém, não está às margens do
texto jurídico, do enunciado, como ensina Moussallém114
, mas vai além. É
passível de ser extraída do próprio corpo do texto, podendo ser depreendida do
próprio enunciado. Pois o que está enunciado é um só produto, extraindo-se
dele as significações que o intérprete for capaz de construir.
5.6. A prova e a verdade no discurso normativo
O discurso normativo se relaciona intrinsecamente com estes dois
termos: prova e verdade. Aparentemente, o discurso normativo, com o intuito
de regular as condutas intersubjetivas, absorveria a verdade através das
provas produzidas com referência a ela. Lembrando que a preocupação com a
multiplicidade de sentidos dos dois termos deve ser considerada.
113 Idem, pág. 37. 114 Ob. Cit., pág. 139.
103
Porém, há de se atentar para o fato do movimento do giro
linguístico ter quebrado os paradigmas tradicionais. Através de seu enfoque na
linguagem, contribuiu para o caminho do conhecimento em busca de maior
precisão dos estudos do direito. Adotou um corte metodológico nítido do direito,
se comparado a outros prismas, elegendo o método dogmático por excelência
para o estudo do direito, fundado em premissas sólidas. Escolheu a norma
jurídica como unidade do ordenamento e objeto central de sua atenção.
Esta precisão, como defende Paulo de Barros Carvalho115
,
decorre de uma preocupação típica do movimento de “escrever bem e
pensando”; tomando força na comunidade científica e gerando repercussões
interessantes às suas iniciativas.
Para o autor, a linguagem expressa a forma de ver e entender os
eventos do mundo, criando a realidade, em consonância com os pensamentos
de Fusser expressos em capítulos anteriores. Neste sentido, deixa para trás o
valor “verdade”, como verdade absoluta, buscando a relação entre o sujeito
cognoscente, o objeto e o próprio conhecimento, através do estudo da
linguagem, que seria a condição primeira para a apreensão do objeto.
115 Direito tributário: linguagem e método, pág. 159.
104
Com esta ideia em mente, é possível afirmar que o sujeito
cognoscente, ao produzir enunciados a respeito do objeto de seu
conhecimento, reduz a complexidade do objeto, pois só o enxerga sob o prisma
analisado. Sendo, portanto, parcial.
Pelo prisma jurídico, a linguagem prescritiva compreende a
maneira como o direito absorve as situações do mundo social pelo fenômeno
da tradução da linguagem factual para a linguagem jurídico-prescritiva.
Contudo, há que se lembrar de que a linguagem não toca o real,
mas dele se aproxima. Sendo necessária tanto para a produção da norma geral
e abstrata, como da geral e concreta, da individual e abstrata e da individual e
concreta. É através desta que se constitui, modifica e extingue um fato jurídico
em sentido estrito. Trabalhando a criação da realidade jurídica.
A criação da realidade jurídica pela constituição do fato jurídico
requer a utilização de linguagem competente. No caso, a linguagem das
provas. Sem ela não se terá fato jurídico, mas mero evento, independente de
ser considerado fato social, econômico, político etc.
105
Esta visão de prova como linguagem suscita a pergunta de poder
ou não ser considerada uma fonte do direito. A resposta é dada por Fabiana
Del Padre Tomé116
, que afirma ser isto possível. O que decorre de um
problema semântico típico da ambiguidade processo/produto, dentre tantas
outras acepções do termo prova.
A dualidade semântica de processo/produto permite tomar a
prova como a ação de provar, sendo seu resultado consubstanciado na
linguagem, conforme exposto acima.
Para a autora117
, tomar a prova no sentido de ação de provar
configura a produção de atos de fala ou enunciação destinada à constituição
dos fatos jurídicos. Compõe um objeto dinâmico, sendo cognoscível apenas
pelas marcas no enunciado. Neste sentido, tem-se a prova como enunciação-
enunciada. A qual será apreensível pelo intérprete na busca de reconstruir os
passos do processo de enunciação.
Assim, o direito cria sua própria realidade, pela linguagem
competente, absorvendo eventos pelo processo de enunciação e, com isso,
criando fatos jurídicos. A imputação causal da consequência jurídica segue o
116 A prova no direito tributário, págs. 68-70. 117 Idem, pág. 69 e 70
106
mesmo trâmite de positivação para estabelecer relações jurídicas pela norma
individual e concreta.
Para Paulo de Barros Carvalho118
, relação jurídica é o vínculo
abstrato, que por força de imputação normativa, faz com que uma pessoa (o
sujeito ativo) tenha o direito subjetivo de exigir de outra (o sujeito passivo) o
cumprimento de certa prestação.
O processo de enunciação cria o direito pela produção de
enunciados e, a partir deles, as proposições prescritivas, normas gerais e
abstratas, são construídas pelo intérprete e aplicador, que emite outros
enunciados, dos quais se extraem as normas individuais e concretas. Estas
prescrevem relações jurídicas em concreto. Individualizam os sujeitos ativos e
passivos, quantificando ou estabelecendo a prestação determinada. Tal
processo ocorre num contexto comunicacional.
118 Ob. Cit., pág. 830.
107
6. A vontade como requisito à construção da realidade jurídica
Como exposto acima, o giro linguístico trabalha o direito como
linguagem. Esta deve ter uma função específica: a função prescritiva. Com ela
é, cria e propaga a realidade jurídica.
Neste sentido, o direito é comunicação. Sua produção constitui
verdadeiro ato comunicacional e configura a enunciação da norma como um
ato de fala. Este ato tem significação na linguagem emitida, mas também no
ato em si. Daí a importância de buscar sentido neste ato: separar o direito das
fontes do direito.
A partir desta diferenciação torna-se possível um controle, quanto
à validade, do direito produzido. Buscando seu fundamento de validade numa
visão estática do direito. Mas também quanto à licitude de sua produção, num
prisma dinâmico.
Tal posição é de grande interesse do direito tributário, pois
possibilita ao administrado, passível de ser colocado na posição de sujeição
passiva pela norma tributária, controlar democraticamente os atos que o levam
figurar nesta posição.
108
Atos estes que podem ou não depender diretamente dos seus
próprios, como aqueles que produzam leis, decretos, contratos, lançamentos,
confissões etc.
Mas para que haja controle é necessária a objetivação dos atos
em linguagem, criando a realidade jurídica e absorvendo outros externos ao
direito para dentro de sua juridicidade, em conformidade com Flusser119 e
Vilanova120
.
Todos os atos anteriores àquele consubstanciado na fala da
linguagem jurídica só podem ser conhecidos através de sua representação por
ela. Neste sentido afirma Arthur Schopenhauer121
ser o mundo uma
representação, devido a impossibilidade do conhecimento da essência das
coisas, mas apenas de suas formas. Como exceção, para ele, a situação do
homem analisando sua vontade, pois esta seria externa a ele.
Schopenhauer122
119 Ob. Cit., pág. 131.
utiliza o termo representação como aquela dada
pelo homem aos objetos com que tem contato, sem ela não consegue
120 Causalidade e Relação no Direito, pág. 286. 121 O mundo como vontade e como representação, pág. 43 122 Idem, pág. 156.
109
conhecê-los. Mas isso o leva a conhecer apenas a representação, não o objeto
em si.
Schopenhauer123
ensina: “Ao sujeito do conhecimento que entra
em cena como indivíduo mediante sua identidade com o corpo, este corpo é
dado de duas maneiras completamente diferentes: uma vez como
representação na intuição do entendimento, como objeto entre objetos e
submetido às leis destes; outra vez de maneira completamente outra, a saber
como aquilo conhecido imediatamente por cada um e indicado pela VONTADE.
Todo ato verdadeiro de sua vontade é simultânea e inevitavelmente também
um movimento de seu corpo. Ele não pode realmente querer o ato sem ao
mesmo tempo perceber que este aparece como movimento corporal. O ato da
vontade e a ação do corpo não são dois estados diferentes, conhecidos
objetivamente e vinculados pelo nexo de causalidade; nem se encontram na
relação de causa e efeito; mas são uma única e mesma coisa, apenas dada de
duas maneiras totalmente diferentes, uma vez imediatamente e outra na
intuição do entendimento. A ação do corpo nada mais é senão o ato de
vontade objetiva.”
Deste ensinamento, tem-se que a vontade pode ser tomada como
objeto do conhecimento do próprio agente que indissociavelmente age
produzindo tal conhecimento. Contudo, pode ser observada no objeto, como
123 Idem, pág. 157.
110
vontade objetivada, por terceiro interessado em estudá-la. Este só a
apreenderá pela representação, sua forma objetivada. Diga-se: com limites, em
decorrência da perspectiva do observador.
Isto acontece em razão da vontade ser um conhecimento a priori
do corpo do próprio agente, enquanto a ação do corpo configura objeto do
conhecimento a posteriori da vontade.
Conclui-se, a partir das reflexões de Schopenhauer124
: as
decisões da vontade seriam simples ponderações da razão sobre o que se
quer, enquanto os atos de vontade configuram a pré-existência da decisão.
Através da reflexão, a vontade e o ato de vontade se diferenciam, mas sendo
efetivados configuram a mesma coisa.
Desta conclusão, se percebe que o termo “vontade” apresenta
pluralidade de sentidos, tão comum entre os termos essenciais ao presente
trabalho. A começar pela possível confusão processo/produto demonstrada.
A vontade, tomada como o querer agir em si, só seria apreensível
pela reflexão do próprio agente, mas o ato de vontade, objetivação daquela,
124 Idem, pág. 158.
111
pode ser apreendido por sua representação. No caso do direito isto se dá pelo
ato de fala, conforme explicado por Austin e Searle, e objetivado pela
linguagem produzida e apreensível pelo texto, através do contato sensível,
como leciona Flusser.
Este ato de vontade, tomado como simultâneo do ato de fala, está
contido entre os requisitos de efetividade dos resultados pretendidos pela
vontade para que a comunicação ocorra, o que Austin125
denomina “felicidade”.
Recordando, são os requisitos:
a) Deve existir um procedimento convencionalmente aceito com o
correspondente efeito convencionalmente atribuído. Esse procedimento deve
incluir o dizer de certos termos por determinadas pessoas em certas
circunstâncias.
b) As pessoas e as circunstâncias, em particular, para
determinado caso, devem ser aquelas apropriadas para a invocação do
procedimento adotado.
125 Ob. Cit., págs. 14 e 15.
112
c) O procedimento deve ser executado por todas as pessoas
envolvidas, correta e
d) completamente.
e) Quando, usualmente, o procedimento deve ser adotado por
quem tiver certos pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de
certa conduta consequente da parte de qualquer participante, então a pessoa
participante e envolvida no procedimento deve de fato ter aqueles
pensamentos ou sentimentos e os participantes devem ter o real intuito de
assim proceder.
f) Esses atos dentro do procedimento devem ser adotados pelos
participantes de forma subsequente uns aos outros.
Estes requisitos, quando relacionados ao direito, podem ser tidos
da seguinte forma:
a) Se para um ato performativo há de se ter um procedimento
convencionalmente aceito com o correspondente efeito convencionalmente
113
atribuído, que inclui o dizer de certos termos por determinadas pessoas em
certas circunstâncias, então o ordenamento estabelece as situações jurídicas e
os procedimentos a serem seguidos para que as normas possam ser criadas.
b) Se as pessoas e as circunstâncias estabelecidas para que em
determinado caso sejam elas as capazes de invocar o procedimento a ser
adotado, então as normas jurídicas estabelecem quem é o órgão e o
procedimento adequados a tanto, em seu sistema.
c) Se o procedimento deve ser executado por todas as pessoas
envolvidas, correta e completamente, então o direito assim o estabelece, como
forma de se exteriorizar a vontade dos envolvidos, bem como seguir os
procedimentos de criação normativa no ordenamento.
d) Se quando, usualmente, o procedimento deve ser adotado por
quem tiver certos pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de
certa conduta consequente na parte de qualquer participante, então a pessoa
participante e envolvida no procedimento deve de fato ter aqueles
pensamentos ou sentimentos e os participantes devem ter o real intuito de
assim proceder. O direito estabelece o procedimento para que os órgãos
emissores de normas os sigam, segundo um dever de moralidade ou
adequação aos fundamentos de validade deste procedimento.
114
e) Se os atos dentro do procedimento devem ser adotados pelos
participantes de forma subsequente uns aos outros, assim também determina o
direito para que a norma só seja criada ao final de todos os atos integradores
do procedimento estabelecido para a criação normativa.
Assim, o requisito da letra “e”, dos atos de fala, e da letra “d”,
desta relação com o direito, segundo o qual há necessidade do procedimento
do ato performativo deva ser adotado por quem tiver certos pensamentos e
sentimentos da parte de quem tenha a vontade de produzi-lo, pode ser
transportado para o direito como um requisito de eficácia da norma produzida.
Fiorin126
explica que existem fatos enunciativos em sentido lato e
em sentido estrito. Aqueles são compostos por traços linguísticos da presença
do locutor no seio do enunciado, configurando a subjetividade da linguagem.
Enquanto estes são as projeções da enunciação no enunciado, relativas à
pessoa, ao espaço e ao tempo, configurando a formalidade da enunciação.
Mas evidencia que ambos constituem a enunciação-enunciada.
Com relação à vontade, é possível afirmar que pode ser
visualizada na enunciação-enunciada, dentro do conceito de enunciação em
126 Ob. Cit., pág. 38.
115
sentido lato, pela simples objetivação dela no resultado, o enunciado; bem
como na enunciação em sentido estrito, como característica da pessoa do
locutor.
O locutor, falante ou emissor, é o sujeito capaz de produzir a
norma jurídica, através do ato de fala que representa a objetivação da vontade
dele.
116
7. Análise clássica da vontade no direito: uma visão crítica
A posição do giro linguístico de que o direito é formado por um
conjunto de proposições prescritivas dotadas de coercibilidade e válidas em
determinado país é, até certo ponto, revolucionária na Ciência do Direito. Do
mesmo modo é revolucionário o tratamento das fontes do direito como um
processo enunciativo. Ainda mais se dependente da vontade do emissor, a
autoridade competente para produzir determinada norma.
Assim, uma proposta como esta precisa analisar diferenças e
vantagens frente à posição dominante da linha clássica da doutrina sobre as
fontes do direito e, sendo assim, da análise da vontade na enunciação
normativa.
Já foi feita a análise das posições tradicionais acerca das fontes
do direito, tendo sido tratadas como: fontes de produção, fontes de cognição,
fontes de conhecimento do saber jurídico e fontes de informação do saber
jurídico. Tais posições foram criticadas logo após, ao serem trabalhadas as
fontes do direito pelo tratamento do constructivismo lógico-semântico.
117
A seguir pretende-se comparar algumas das abordagens
tradicionais da vontade entre si, mas para tanto precisam ser fixadas algumas
premissas quanto a como analisar as teorias, para que sejam úteis ao
raciocínio que se pretende demonstrar.
Parte-se de uma análise do direito posto quanto à unicidade, para
depois trabalhar a Ciência do Direito com seus ramos didaticamente
autônomos, então verificar como as diferentes abordagens enxergam a
vontade pela visão clássica.
7.1. A unicidade do direito posto
A análise aqui proposta de unicidade do direito posto tem como
premissa inicial ser o ordenamento formado por um conjunto de normas postas.
Posição adotada pelo positivismo de Kelsen127, e mais tarde absorvida por
Vilanova128
.
Posição esta que encara o direito mesclando duas questões
fundamentais, os aspectos lógico e axiológico. O aspecto lógico traz a forma ao
127 Ob. Cit., pág. 33. 128 Sobre o conceito do direito, in Escritos jurídicos e filosóficos., pág. 61.
118
direito, baseada na estrutura da norma jurídica. O aspecto axiológico traz
conteúdo semântico às normas.
Do aspecto lógico é possível encontrar uma única forma às
normas, caracterizadas por um conectivo deôntico modalizado, como ensina
Vilanova129
, em diferentes valências, através dos functores: “é obrigatório” (O),
“é permitido” (P)” e “é proibido (V)”; típicos da Lógica Deôntica.
Tais functores trabalham numa estrutura relacional, a qual pode
ser, segundo Vilanova130, exposta em linguagem formalizada: D [F→C(S’,S”)].
Esta fórmula é explicada pelo próprio Vilanova131
: “se se dá um fato F qualquer,
então o sujeito S’ deve fazer ou deve omitir ou pode fazer ou omitir conduta C
ante outro sujeito S” – assim deve ser”.
A essa estrutura formalizada da norma se soma seu conteúdo
axiológico, atribuído pela aplicação dos valores de determinada sociedade.
Neste sentido, o Professor Paulo de Barros Carvalho132
129 Idem, pág. 71.
explica: “Sendo objeto
do mundo da cultura, o direito e, mais particularmente, as normas jurídicas
estão sempre impregnadas de valor. Esse componente axiológico,
invariavelmente presente na comunicação normativa, experimenta variações de
130 As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, pág. 95. 131 Idem. 132 Ob. Cit., pág. 143 e 144.
119
intensidade de norma para norma, de tal sorte que existem preceitos
fortemente carregados de valor e que, em função do seu papel sintático no
conjunto, acabam exercendo significativa influência sobre grandes porções do
ordenamento, informando o vector de compreensão de múltiplos
segmentos”133
.
Para que isto se verifique, porém, existem algumas condições a
serem vencidas para que o conteúdo valorativo de uma norma possa ser
encarado como princípio. Afinal, segundo Miguel Reale: “Toda sociedade
obedece a uma tábua de valores, de maneira que a fisionomia de uma época
depende da forma como seus valores se distribuem ou se ordenam”134
.
Neste contexto é oportuno ressaltar os ensinamentos de Miguel
Reale135 de que os valores não configuram uma realidade idealizada, mas
antes, algo realizado pela própria experiência humana e que sofre alterações
através do tempo. Neste estudo elenca as características essenciais aos
valores: bipolaridade, implicação recíproca, referibilidade, preferibilidade,
incomensurabilidade, graduação hierárquica, objetividade, historicidade e
inexauribilidade136
.
133 Ob. Cit., pág. 143 e 144. 134 Filosofia do Direito, 1o vol., pág. 173. 135 Idem, pág. 189. 136 Ibidem.
120
Paulo de Barros Carvalho137
, seguindo as lições de Miguel Reale,
também labora os valores no direito. Enaltece o trabalho do eminente
professor, que desvincula os valores dos objetos ideais, obtendo êxito ao
proclamar a autonomia da Axiologia ou Teoria dos Valores.
Onde houver valor haverá o desvalor, como contraponto; os valores
positivos e negativos são correlatos. Sendo esta a característica da
bipolaridade. Por exemplo: bem e mal, bonito e feito etc.
Estes valores positivos e negativos implicam-se mutuamente, daí a
implicação recíproca. Só existe o bonito porque o feio existe e vice-versa.
Valores apresentam necessidade de sentido, uma tomada de
posição do ser humano em relação a algum objeto, por isso chamada de
referibilidade. O belo não existe em si, mas apenas em relação ao objeto que o
adjetiva.
A atribuição de valor pressupõe a preferência de um objeto em
relação a outro, apresentando-se em vetores que apontam numa determinada
137 Ob. Cit., pág. 177-179.
121
direção, para um fim determinado. É a característica da preferibilidade. O bem
é preferido em razão do mal. O bom em relação ao ruim.
Mas apesar dessa preferibilidade, os valores não podem ser
medidos objetivamente, pois são incomensuráveis. No entanto, a preferência
de um objeto em relação a outro leva à hierarquização dos valores, de modo a
se acomodarem escalonadamente. É a característica da hierarquia.
Os valores sempre requerem objetos da experiência para se referir,
assumindo objetividade. Ao referir o belo a um quadro, sua beleza se objetiva.
Nesse sentido, precisam de um suporte físico dado pelo objeto,
mas também do ser humano, que através de sua consciência individual ou
coletiva, às quais se referiram. Valores são construídos em uma dada cultura,
num tempo determinado, através do processo histórico-social, o que lhes
conferem historicidade.
Por fim, a inexauribilidade, exibida a cada vez que os valores são
atribuídos. Não se exaurem em cada atribuição, sempre excedendo os bens
em que se objetivam. Ainda que o belo seja atribuído a um objeto, este valor
122
ainda será passível de ser atribuído a outro. O objeto, assim, não o contém,
nem o aprisiona.
Mas Paulo de Barros Carvalho138
, ao trabalhar as características
dos valores lecionadas por Miguel Reale, ainda soma outra característica dos
valores: a atributividade. Refere-se à atividade de valoração dos objetos pelo
ser humano.
Assim, é possível afirmar que a norma apresenta uma estrutura
formalizada, mas também, como linguagem, atribui valores às condutas
humanas, como seu objeto. Requerendo-as, rejeitando-as ou sendo-lhes
complacente, como se percebe da análise de seus conectivos deônticos de
obrigatório (O), proibido (V) ou permitido (P).
Com base até aqui exposto, conclui-se que a posição do giro
linguístico, de que o direito é formado pelo conjunto de proposições prescritivas
dotadas de coercibilidade e válidas em determinado país, se baseia nessas
lições para determinar a unicidade formal e variação semântica. Mas não para
por aí.
138 Idem pág. 178.
123
A unicidade do direito também está fundada em sua perspectiva
sistêmica, seja estática, seja dinâmica. No primeiro caso, decorre do
fundamento único do sistema representado pela norma fundamental
kelseniana, enquanto no segundo, da possibilidade dinâmica do direito regrar a
produção do próprio direito. Assim também pensa Vilanova139
, para quem,
quando se fala em sistema se tem a reunião de elementos de um dado
conjunto e as relações entre eles por uma referência comum.
Isto é extremamente relevante, como lembra Paulo de Barros
Carvalho140
: um sistema é formado por um conjunto de elementos relacionados
entre si, com uma característica comum, uma referência determinada.
Para Marcelo Neves141
os sistemas podem ser classificados em
reais e proposicionais. Os primeiros são formados por objetos do mundo físico
e social, extralinguísticos, agrupados mediante laços constantes, como o
sistema solar. Enquanto os sistemas proposicionais são formados de
proposições, portanto linguagem.
Os sistemas proposicionais, por sua vez, subdividem-se em
nomológicos, os meramente formais, onde as partes componentes são
139 Ob. Cit., pág. 173. 140 Ob. Cit., pág. 171. 141 Teoria da inconstitucionalidade das leis, pág. 4.
124
entidades ideais, como na Lógica e na Matemática; e nomoempíricos, os
formados por proposições que com referência empírica.
Os sistemas nomoempíricos podem ser constituídos por
proposições descritivas, típicas dos enunciados científicos, ou prescritivas,
próprias de sistemas que se dirigem à conduta social, para alterá-la.
Analisando tal classificação, Aurora Tomazini de Carvalho142
esclarece que o critério para se classificar sistemas entre reais e proposicionais
é o linguístico. O primeiro composto por elementos do mundo natural e o
segundo pelo relato daquele. Porém, como propõe a análise dos objetos
apenas pela constituição de uma realidade linguística, para adequação ao giro
linguístico entende ser preciso propor outra classificação.
Assim, a autora143
afasta o critério linguístico para assumir o
critério comunicacional, pelo qual separa os sistemas entre aqueles em que a
linguagem pretende comunicar algo, daqueles em que esta linguagem, cujos
elementos, embora linguísticos, não visam a comunicação, mas permanecem
internos na mente humana.
142 Curso de Teoria Geral do Direito, pág. 127. 143 Idem, págs. 128 e 129.
125
Entre os sistemas comunicacionais separa os nomológicos dos
nomoempíricos. Estes se classificam em descritivos e não descritivos, pois a
comunicação não existiria apenas nas formas descritiva e prescritiva, mas
também, por exemplo, inquisitiva, como perguntas estruturadas destinadas a
testar conhecimentos. Assim, propõe que os não descritivos se subdividam em
prescritivos e não prescritivos.
Apesar da ressalva da classificação formulada por Marcelo
Neves, necessário entender que tomada a premissa de que todo conhecimento
só existe enquanto linguagem, pois toda percepção do mundo exterior só é
possível através desta, haveria a impossibilidade de absorver o conceito de
sistema real, no campo científico. Parece ser mais precisa a classificação de
Aurora Tomazini de Carvalho, dentro da perspectiva do giro linguístico.
As normas jurídicas formam um sistema, na medida em que se
relacionam de várias maneiras, segundo um princípio unificador. O direito
posto, assim, aparece no mundo integrado numa camada de linguagem
prescritiva. Contudo, é produto do homem para disciplinar a convivência social,
pertencendo à região ôntica dos objetos culturais, com fim no campo material
da conduta. Como lecionado por Paulo de Barros Carvalho144
.
144 Ob. Cit., pág. 175.
126
Porém, o sistema do direito positivo apresenta uma singularidade.
Apresenta a possibilidade de reprodução. Regulamenta a produção de normas
pelo próprio sistema. Normas estas dispostas hierarquicamente e regidas pela
fundamentação ou derivação.
Normas jurídicas que podem ser classificadas em regras de
comportamento e de estrutura. As regras de comportamento se dirigem
diretamente às condutas interpessoais, enquanto as regras de estrutura,
mesmo se dirigindo às condutas pessoais, são mais específicas quanto ao
assunto. Direcionam-se ao comportamento relacionado à produção de normas.
Neste sentido lecionam Paulo de Barros Carvalho145, Tácio Lacerda Gama146 e
Aurora Tomazini de Carvalho147
.
As regras de estrutura não estão fora do sistema, mas dele fazem
parte, conforme ensina Lourival Vilanova148
: “As normas que estatuem como
criar outras normas, isto é, normas-de-normas, ou proposições-de-proposições
não são regras sintáticas fora do sistema. Estão no interior dele”.
145 Ob. Cit., pág. 187. 146 Competência Tributária: fundamentos para uma teoria da nulidade, pág. 103. 147 Ob. Cit., pág. 352. 148 Ob. Cit., pág. 164.
127
O direito positivo, assimilando estas lições, pode ser tido como um
sistema comunicacional, nomoempírico, não descritivo e prescritivo. Nele a
racionalidade do homem é empregada com fim de direcionar a conduta
humana. O quê se dá através de linguagem técnica.
A Ciência do Direito, ressalte-se, não regula, mas descreve este
sistema, formando seu próprio. Apresenta-se como um sistema
comunicacional, nomoempírico e descritivo, vertido em linguagem científica.
Sistema esse que será melhor trabalhado no próximo subcapítulo.
7.2. A Ciência do Direito e seus ramos
Se, como exposto, o direito positivo pode ser definido como
complexo de normas jurídicas válidas num determinado país; a Ciência do
Direito pode ser definida o ramo da Ciência que estuda o direito positivo,
segundo um ponto de vista específico. Aquele de descrevê-lo na atualidade,
não se importando com visões históricas, sociológicas, antropológicas ou
políticas.
Cabe, portanto, a este ramo de estudo a descrição do complexo
normativo, ordenando-o, sistematizando-o, através de sua hierarquia e das
128
formas lógicas que entrelaçam as várias unidades do sistema jurídico positivo.
Sua função primordial é esclarecer o conteúdo de sua significação.
Assim, enquanto o direito positivo disciplina o comportamento
humano no convívio social, através de uma fórmula linguística prescritiva, a
Ciência do Direito estuda este feixe de proposições prescritivas, observando,
investigando, interpretando e, sobretudo, descrevendo, tendo sempre em vista
uma metodologia predeterminada. Para tal, o cientista utiliza-se sobremaneira
de uma linguagem descritiva.
Em relação ao direito positivo, a Ciência do Direito é uma
sobrelinguagem, uma metalinguagem, uma linguagem de sobre nível. Está
acima da linguagem do direito positivo, pois discorre sobre ela, descrevendo-a
como sistema empírico. Neste sentido, Lourival Vilanova149
.
Segundo o autor, aplicam-se a essas duas formas de linguagem,
a do direito positivo e a da Ciência do Direito, duas lógicas distintas: ao
primeiro, a lógica deôntica, referente à valência válido/não válido e à tripartição
dos modais obrigatório/permitido/proibido; à Ciência do Direito, a lógica alética
ou apofântica (é a lógica clássica), referente à valência verdade/falsidade.
149 Ob. Cit., pág. 78.
129
A linguagem do legislador é uma linguagem técnica, um discurso
natural com palavras e expressões de caráter científico. Contudo, a pluralidade
de formação dos representantes populares apresenta a possibilidade do
surgimento de atecnias e imperfeições; isso ao mesmo tempo em que, quanto
maior a diversidade dos representantes, mais autêntica é a representatividade
dos variados setores da comunidade social. Como esclarece Paulo de Barros
Carvalho150
.
É justamente em função da representatividade popular que
aparecem as impropriedades, os erros, as atecnias, as deficiências e as
ambiguidades comuns aos textos legais. As quais surgem em função de não
ser o legislador um técnico no assunto, mas um representante de seu
estamento social.
Já a linguagem do cientista do Direito, mais do que técnica é
científica. Suas proposições descritivas são dotadas de harmonia,
característica dos sistemas enquadrados no formato da lógica alética.
Organizam as unidades segundo critérios da identidade, da não-contradição e
do terceiro excluído, próprios do pensamento apofântico.
150 Ob. Cit., pág. 36.
130
Porém, as dificuldades com vocabulário especializado não
cessam no nível da linguagem científica. A solução aqui viria através de um
grande esforço semântico. Mas o problema persiste no nível da Teoria Geral do
Direito, ao qual se chega através de sucessivas generalizações. Só sendo
resolvido através de um processo de formalização extrema, típico da Lógica
Jurídica.
Assim, o problema semântico permanece no nível da linguagem
científica, que para permitir um maior aprofundamento e facilitar a
aprendizagem, apresenta didaticamente divisão em ramos de estudo.
Contudo, há de ser ressaltado, neste ponto, que se a divisão de
diversos ramos do direito, didaticamente útil, carece de possibilidade de ser
efetivada, a ponto de se falar em autonomia dos ramos do direito, pois se
referem ao mesmo e uno objeto, o direito positivo. Além disso, não há institutos
exclusivos de um ramo do direito.
A primeira classificação se dá entre o Direito Público e o Direito
Privado. Tem como fator de discriminação o tipo de relação jurídica que as
normas descritas por estes ramos da Ciência do Direito estudam. Leciona
Maria Helena Diniz151
151 Ob. Cit., pág. 256.
que o Direito Público estuda as normas que regem as
131
relações em que um dos sujeitos é o Estado, tutelando interesses gerais e
visando o fim social, perante seus membros ou outros Estados. O Direito
Privado, por sua vez, trata de relações entre particulares.
O Direito Público pode ser dividido em Interno e Externo. O Direito
Público Interno pode ser classificado em: Direito Constitucional, Direito
Administrativo, Direito Tributário, Direito Financeiro, Direito Processual, Direito
Penal, Direito Previdenciário e Direito Internacional Público.
Nesse sentido tem-se que o Direito Constitucional trata das
normas que regulam a estrutura básica do Estado, com relação a sua
organização, a sua divisão de poderes, suas funções e limites de seus órgãos
bem como das relações entre governantes e governados.
O Direito Administrativo, por sua vez, tem como objetivo as
normas referentes à atividade estatal, exceto o que se refere aos atos
jurisdicionais e legislativos, estudando a busca pelos fins sociais e políticos
através da organização dos atos do executivo.
132
Ao Direito Tributário compete descrever aquelas normas que
visam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de
tributos.
O Direito Financeiro o complementa. Estuda as normas que
tratam das receitas e despesas do Estado, organizadas de forma a atingir seus
fins sociais e políticos. Excetuando-se aquelas tratadas pelo próprio Direito
Tributário.
O Direito Processual trata das relações processuais jurisdicionais.
Estuda as atividades do Judiciário. Basicamente pode ser classificado em
Direito Processual Civil, que trabalha as normas processuais
instrumentalizadoras daquelas que regulam as relações civis, ou seja, entre
particulares na vida civil; e Direito Processual Pena,l que objetiva as normas
que instrumentalizam aquelas estudadas pelo Direito Penal.
O Direito Penal, por sua vez, estuda as normais penais, as quais
estabelecem crimes e contravenções, além das penas correlatas, de aplicação
estatal.
133
O Direito Previdenciário trata das normas que amparam os
trabalhadores, garantindo-lhes benefícios da previdência e da assistência
social.
O Direito Internacional Público estuda as normas disciplinadoras
das relações entre os diversos Estados e as Organizações Internacionais.
Na seara do Direito Privado a classificação se dá em: Direito Civil,
Direito Empresarial ou Comercial, Direito do Trabalho e Direito do Consumidor.
Contudo, é relevante ressalvar a atual publicização do Direito Privado em
decorrência cada vez maior do papel do Estado na vida do cidadão. Também
aqui deve-se apontar a existência de questão sobre a unificação entre o Direito
Civil e o Direito Empresarial, a partir da unificação da legislação pelo Código
Civil de 2002, mas ainda amplamente controvertida. É a lição de Maria Helena
Diniz152
.
O Direito Civil estuda as normas que regulam os direitos e
deveres de todos os indivíduos, enquanto assim entendidos, abrangendo
normas sobre capacidade, personalidade, relações familiares, sucessão etc.
152 Idem, pág. 257.
134
O Direito Empresarial ou Comercial trata das normas que
disciplinam a atividade do empresário e de qualquer pessoa, física ou jurídica,
destinada à finalidade econômica, desde que habitual e dirigida a resultados
patrimoniais.
O Direito do Trabalho estuda as normas que regem as relações
entre empregador e empregado, compreendendo normas sobre organização do
trabalho e produção.
O Direito do Consumidor estuda o conjunto de normas
disciplinadoras das relações do consumo existentes entre fornecedor e
consumidor, tutelando este frente aqueles em razão da desproporção de poder
econômico existente entre eles.
Tal classificação, segundo a própria Maria Helena Diniz153 pode
ser feita tanto no âmbito da Ciência do Direito como no direito positivo. Este
também é o entendimento de Paulo de Barros Carvalho154
, que estudando o
Direito Tributário, estipula duas formas de enxergá-lo.
153 Idem. 154 Ob. Cit., pág. 33.
135
Primeiramente, trata do direito tributário positivo, como ramo
didaticamente autônomo do direito, integrado pelo conjunto de proposições
jurídico-normativas que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição,
arrecadação e fiscalização de tributos.
Quanto à Ciência do Direito, salienta que a ela compete descrever
seu objeto, o direito positivo tributário, através de proposições declarativas,
permitindo ao cientista conhecer e entender suas articulações lógicas, bem
como seu conteúdo orgânico, dentro de uma concepção unitária do sistema
jurídico vigente.
Contudo, dada a unicidade do direito posto, conforme tratada no
item anterior, permite ao estudioso concluir ser esta visão de utilidade
meramente didática. A aplicação do direito posto não se dá por ramos, mas
pelo sistema como um todo. Isto porque não há texto sem contexto, logo para
haver a incidência de uma norma isolada, há necessariamente o trabalho de
todo o sistema, objetivado pelo aplicador por um ato de vontade concluído pelo
ato de fala, de enunciação normativa. No que pode ser chamado de uma
processo de positivação.
136
Segue o aplicador do direito neste percurso, não apenas os
quatro estágios interpretativos, como os requisitos da comunicação e do ato de
fala, consubstanciados na enunciação, objetivados na enunciação-enunciada.
Para analisar esta afirmativa, nos próximos dois subcapítulos
trataremos do sistema jurídico, entendido como ordenamento, em seu trabalho
de regrar as condutas, mas com ênfase na positivação, evidenciando a
incidência dentro das perspectivas do Direito Privado e do Direito Público, em
especial do Direito Tributário.
7.3. Direito privado e a vontade: problema de vício
O Direito Privado tomado como ciência, como visto no item
anterior estuda as relações jurídicas entre os indivíduos, sejam pessoas físicas
ou jurídicas.
Justamente por estudar as normas sobre relações entre
indivíduos, percebe o relevante papel da vontade, amplamente tratada na
juridicidade destas relações, em especial no ato jurídico e nos negócios
jurídicos.
137
Maria Helena Diniz155
enfatiza o papel da vontade na produção do
ato jurídico em sentido estrito, pois afirma que ele é a mera manifestação da
vontade do agente.
Pontes de Miranda156
trata a vontade na teoria dos atos jurídicos
como essencial, mas enfatiza que apenas a vontade manifestada é
reconhecida pelo direito. Aquela expressa na produção do ato jurídico em
sentido estrito. Ao direito não interessa a vontade internalizada do agente.
A visão de Pontes de Miranda coaduna com aquela elencada por
Austin, quando trata da “felicidade” dos atos performativos, enfatizando que
para que o ato obtenha o resultado pretendido é necessário que a vontade dos
participantes dele esteja de acordo com aquela expressa no ato de fato.
O direito presume, portanto, que a vontade expressa segue no
mesmo vetor da vontade interna do agente. Presunção esta que só pode ser
revertida por prova em contrário, o que demanda prova de manifestação em
sentido oposto àquela tomada no primeiro momento.
155 Teoria Geral das Obrigações, pág. 45. 156 Tratado de Direito Privado, vol. 2, pág. 395.
138
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho157
têm a vontade
como fonte mediata das obrigações, quando analisado o ato jurídico negocial.
Mas o Código Civil é mais amplo no tratamento da vontade. Em
seu artigo 3º158
, por exemplo, elenca a possibilidade de sua manifestação como
um dos requisitos à capacidade civil, ao tratar como absolutamente incapaz de
exercer pessoalmente os atos da vida civil as pessoas que não possam
exprimi-la.
A vontade também tem papel de destaque no ordenamento civil
quando o assunto é o negócio jurídico. O artigo 104159
do Código Civil exige
para a validade do negócio jurídico, agente capaz. Para ser capaz, o agente
precisa poder exprimir sua vontade.
Nesse sentido, os artigos 107, 110,111 e 112 do mesmo diploma
legal enaltecem o papel da vontade, regulando como ela deve ser expressa
157 Novo Curso de Direito Civil, vol. II, pág. 24. 158 “Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de dezesseis anos; II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.” 159“Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.”
139
para que o negócio jurídico seja válido. Não exige forma especial160, mantendo
sua forma expressa mesmo em contradição com a vontade reservada
mentalmente161. Reconhece o papel do silêncio quando a manifestação da
vontade não for necessária162, além da preferência da intenção à literalidade da
expressão da vontade163
.
Assim, percebe-se a intrínseca relação entre o Direito Privado e a
manifestação da vontade, como elemento essencial aos negócios jurídicos.
Tendo papel de destaque no ordenamento civil, como forma de garantir a
liberdade das pessoas ao praticarem atos da vida civil.
Conclui-se que mesmo sob outras premissas, a doutrina civilista
vem em grande parte reconhecendo a importância da manifestação da vontade
como fonte do direito e como ato necessário à formalidade dos negócios
jurídicos.
160 “Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.” 161“Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento.” 162“Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.” 163“Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.”
140
7.4. Direito público e a legalidade
O Direito Público, como visto acima, estuda as normas que regem
as relações nas quais um dos sujeitos é o Estado, tutelando interesses gerais e
visando o fim social, perante seus membros ou outros Estados.
Nesta relação com o Estado, sofre o cidadão com uma
desigualdade ínsita de forças. Aquele, com suas funções legislativas, judiciais e
executivas, exerce grande poder sobre a vida deste. Por isso Maria Sylvia
Zanella Di Pietro164
esclarece que o Direito Administrativo nasceu e se
desenvolveu com base em duas ideias opostas: proteção aos direitos
individuais e necessidade de satisfação dos interesses coletivos. Daí surgiu,
segundo a autora, a bipolaridade entre a liberdade do indivíduo e a autoridade
da Administração, apresentadas sob a forma de restrições e prerrogativas. As
restrições decorrem do princípio da legalidade, enquanto as prerrogativas da
supremacia do interesse público sobre o particular.
Para a autora165
164 Direito Administrativo, pág. 65.
, o princípio da legalidade e o controle da
Administração pelo Judiciário surgem com o Estado de Direito e constituem
verdadeira garantia dos direitos individuais. De acordo com a legalidade, a
165 Idem, pág. 67
141
Administração Pública só pode fazer o que a lei determina, como consta no
artigo 37 da Constituição Federal166
.
Seguindo essa linha de raciocínio, segundo a qual a legalidade é
uma garantia do cidadão, Fernando Facury Scaff167
defende ser a legalidade
uma interdição de proibição à realização da vontade de uma dada pessoa.
A legalidade ainda configura uma limitação da Administração
Pública no que concerne às contas públicas, tanto suas receitas como
despesas, no âmbito do Direito Financeiro. Configura relevante ponto de
controle pelo Tribunal de Contas que, conforme destaca Celso Ribeiro
Bastos168, constitui um dos principais fatores a serem verificados. Podendo ser
encarado como critério tanto do controle interno169 como do controle externo170
166“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” 167 Quando as medidas provisórias se transformam em decretos-lei ou notas sobre a reserva legal tributária, in Teoria Geral da Obrigação Tributária: estudos em homenagem ao Professor José Souto Maior Borges, pág. 215. 168 Curso de Direito Financeiro e Tributário, págs 88 a 94. 169“Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de: I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União; II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado; III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União; IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.” 170 “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
142
A importância da legalidade, como limitação da atuação estatal,
também se vê no Direito Tributário. Regina Helena Costa171 afirma estar a
legalidade fundada no primado da segurança jurídica e nas ideias de igualdade
e certeza. Trabalha com a classificação de legalidade genérica, extraída do
inciso II do artigo 5º da Constituição Federal172, e específica, extraída do inciso
I do artigo 150 da Carta Magna173
.
A primeira versa sobre: imposição de obrigações aos particulares,
proibição de comportamentos dos particulares, previsão de infrações e
cominação de penalidades. Em suma, tem seu conteúdo voltado à conduta do
particular.
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento; II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público; III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;” 171 Ob. Cit., pág. 74. 172“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;” 173“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;”
143
A legalidade específica em matéria tributária tem, como ensina a
autora174
, origem histórica na Carta Magna de 1215, expedida pelo rei da
Inglaterra, João Sem Terra, que assegurou a garantia de participação
parlamentar na criação de tributos.
Em nosso sistema, seu fundamento repousa no inciso II do artigo
150 da Constituição, como mencionado acima. Visa limitar a atuação dos entes
federativos, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, impondo forma
específica à criação e ao aumento de tributo, a lei em sentido estrito. É
complementada pelo parágrafo 6º175
do mesmo artigo, que também a exige
para a concessão de: subsídio, isenção, redução da base de cálculo, crédito
presumido, anistia ou remissão.
Assim, também em nosso sistema é necessária a participação
parlamentar, através de veículo específico, a lei.
Contudo, há que se verificar se outros tipos legislativos se
encaixam nestas disposições, a saber: lei delegada, medida provisória, decreto
e tratado internacional.
174 Ob.Cit., pág. 79. 175“§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993).”
144
A lei delegada e a medida provisória têm força de lei ordinária e
causam dúvidas ao intérprete quanto a atenderem ou não o princípio da estrita
legalidade tributária.
No caso das leis delegadas, ficam afastadas as matérias que
requeiram leis complementares, por força do artigo 68 da Constituição
Federal176
. Artigo que também exclui as matérias: a) organização do Poder
Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros, b)
nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais e c) planos
plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.
As medidas provisórias, instrumentos tão utilizados em nossa
legislação e combatidos pela doutrina, pois como lembra Scaff177
176“Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.
, têm origem
nos decretos-leis da época ditatorial, também têm força de lei e deveriam ser
utilizados em casos de relevância e urgência. Isto poderia dar a impressão de
§ 1º - Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º - A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º - Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.” 177 Ob. Cit., pág. 214.
145
que não coaduna com a imposição tributária, que salvo raríssimas exceções
não se encaixa nessas premissas.
Para Roque Antonio Carrazza178, a medida provisória configura
ato administrativo em sentido amplo, com algumas características de lei, que o
Presidente pode expedir em casos de relevância e urgência. Mas vencidos
estes dois requisitos gerais, existe a possibilidade de medidas provisórias
versarem sobre matéria tributária, como determina o parágrafo 2º do artigo 62
da Constituição Federal179
. Com a observação de que só podem produzir
efeitos a partir de sua conversão em lei.
No que se refere aos decretos, o parágrafo 1º do artigo 153 da
Constituição Federal180
178 Curso de Direito Constitucional Tributário, pág. 284.
estabelece poder o Presidente da República, atendidas
as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos
impostos sobre: importação de produtos estrangeiros; exportação, para o
exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; produtos industrializados; e
179 “Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001) (...) § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)” 180 “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar. § 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.”
146
operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores
mobiliários.
Nesse ponto há divisão doutrinária. Parte da doutrina,
representada por Hugo de Brito Machado181, entende ser este um caso de
exceção ao princípio da estrita legalidade, enquanto outra parte, representada
por Regina Helena Costa182
, não vê aí exceção. Isto porque haveria, no seu
entender, uma mitigação de intensidade, em razão da praticabilidade e da
extrafiscalidade dos impostos sob este regime.
Da mesma forma, o ICMS, imposto sobre a circulação de
mercadorias e prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal
e de telecomunicações, incidente sobre combustíveis e lubrificantes, com base
no inciso IV do parágrafo 4º do artigo 155 da Constituição Federal183
181 Curso de Direito Tributário, pág. 82.
, poderia
182 Ob. Cit., pág. 183 “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (...) § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (...) X - não incidirá: (...) b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica; (...) XII - cabe à lei complementar: (...) g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
147
escapar à estrita legalidade ou mitigar sua intensidade. Assim como no caso
da CIDE, contribuição de intervenção no domínio econômico, de que trata a
alínea “b” do inciso I do parágrafo 4º do artigo 177 da Carta Magna184
, passível
de alteração por decreto do Presidente da República.
Resta a análise dos tratados internacionais em matéria tributária.
Podemos afirmar que não há menção explícita a eles na Constituição, mas o
artigo 98 do Código Tributário Nacional185
h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b;
confere posição privilegiada aos
tratados, pois lhes dá força de lei, para alterar a lei e estabelecer o dever de
obediência pela legislação que sobrevenha. Quando tratarem de direitos e
(Incluída pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) (...) § 4º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) (...) IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, g, observando-se o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas por produto; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou ad valorem, incidindo sobre o valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em condições de livre concorrência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, b.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)” 184 “Art. 177. Constituem monopólio da União: (...) § 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) I - a alíquota da contribuição poderá ser: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) a) diferenciada por produto ou uso; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) b) reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)” 185“Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.”
148
garantias individuais, pelos parágrafos 2º e 3º do artigo 5º da Constituição186
,
têm força de emenda constitucional.
Podem, portanto, tratar de matéria tributária, mas sua amplitude e
hierarquia ainda são bastante discutidas. Machado187
não concorda com a
posição hierárquica privilegiada dos tratados e trabalha com ordens jurídicas
diversas, absorvendo o ditame do artigo 98 do Código Tributário Nacional como
uma impropriedade. O tratado não teria o condão de revogar lei interna, pois
caso seja denunciado o tratado, a lei anterior volta a poder ser aplicada.
Percebe-se de tudo isso a importância da legalidade para o
Direito Público, dada a quantidade de normas sobre o tema e de doutrinas que
as descrevem.
Mas a legalidade no Direito Tributário vai além do que fora até
aqui tratado, pois saber que a criação ou majoração de tributos deva ser feita
por lei não é suficiente à sua compreensão. Deve-se buscar saber quais os
186“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo)” 187 Ob. Cit., pág. 86.
149
elementos essenciais ao tributo para sua criação. Tema já mencionado neste
trabalho.
Paulo de Barros Carvalho188
esclarece ser matéria exclusiva de
lei, no contexto até aqui exposto, os elementos da sua Regra Matriz de
Incidência Tributária.
Assim, tomada a norma tributária em sentido estrito, a Regra
Matriz de Incidência Tributária, de autoria de Paulo de Barros Carvalho189
, que
como as demais normas é composta de uma hipótese e um consequente.
Onde a hipótese prescreve um evento em abstrato, representado por três
critérios: material (constituído pelo núcleo verbal do evento e seu
complemento), espacial (local de incidência) e temporal (momento de
incidência); ao ocorrer tal evento, se liga ao consequente por um conectivo
deôntico obrigacional que estabelece a relação jurídica tributária
consubstanciada por dois critérios: pessoal (sujeito ativo, detentor do direito
subjetivo e sujeito passivo, quem tem o dever jurídico de recolher o tributo) e
quantitativo (base de cálculo e alíquota).
188 Ob. Cit., pág. 208. 189 Ob. Cit., págs. 414-425.
150
Nesse sentido, é imprescindível tratar a obrigação tributária e
entender como surge. Segundo o artigo 113 do Código Tributário Nacional190, a
obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador, entendido
nos termos do artigo 114 do mesmo diploma legal191
como situação necessária
e suficiente à ocorrência desta obrigação.
Para Machado192, a obrigação tributária principal é uma obrigação
de dar, enquanto a acessória não envolve cunho patrimonial. Esclarece ainda
que apesar de no Direito Privado obrigação e crédito serem dois aspectos da
mesma relação, assim não acontece no Direito Tributário. Onde uma obrigação
ilíquida surge com a ocorrência do fato gerador e o crédito, através do
lançamento, é constituído para dar liquidez a ela. No mesmo sentido, em outros
termos, trabalha Carrazza193
.
Machado194
190“Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
ainda salienta que as obrigações podem ter três
naturezas distintas: legais (quando decorrerem de lei), contratuais (quando
surgirem de manifestação da vontade) e decorrentes de ato ilícito (nascem da
prática de um ato contrário ao direito). Nesse contexto, classifica a obrigação
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorrente da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.” 191“Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.” 192 Ob. Cit., pág. 122. 193 Reflexões sobre a obrigação tributária, págs 183-197. 194 Ob. Cit., pág. 125.
151
tributária como legal. No mesmo sentido entendem: Regina Helena Costa195,
Roque Antonio Carrazza196, Celso Ribeiro Bastos197, Ruy Barbosa Nogueira198
entre tantos outros.
Paulo de Barros Carvalho, trabalhando no prisma do giro
linguístico, acredita que este fato gerador seria a versão em linguagem
competente do evento ocorrido no mundo. Dando novos ares à teoria da
obrigação tributária. Não afasta a legalidade, mas enaltece a necessidade do
reconhecimento pelo direito de que o evento tenha ocorrido para lhes serem
atribuídas as consequências tributárias próprias. Esta posição possibilitará, no
próximo item, uma aproximação entre a legalidade e a vontade da autoridade
competente para produzir tal linguagem.
7.5. Legalidade e vontade
A legalidade e a vontade apresentam numa primeira vista uma
contradição entre si: ou o ato é baseado na legalidade ou na vontade. Neste
sentido trabalha Di Pietro199
195 Ob. Cit., pág. 191.
, pelo princípio da legalidade, a Administração
Pública só pode fazer o que a lei determina, enquanto no âmbito das relações
privadas o princípio correspondente é o da autonomia da vontade.
196 Ob. Cit., pág. 191. 197 Ob. Cit., pág. 192 198 Curso de Direito Tributário, pág. 142. 199 Ob. Cit., pág. 68.
152
Mas independente da linha de pesquisa, alguns autores
vislumbram a relacionalidade entre os conceitos, como Nogueira200
, para quem
a obrigação, no Direito Privado, para surgir precisa da manifestação da vontade
das partes, obrigação ex voluntate, mas para surgir a obrigação tributária
principal é essencial a manifestação da vontade da lei, pois configura uma
obrigação ex lege, ou seja: com fundamento em lei.
Heleno Taveira Torres201
enaltece a autonomia privada como
poder de criar normas válidas, atribuído constitucionalmente aos particulares,
pelo negócio jurídico, mas, ao mesmo tempo, ressalta ser diferente o campo e
a forma de aplicação da norma tributária. A qual não visa obriga, permitir ou
proibir o negócio jurídico, mas apresentar outro prisma para enxergá-lo e
atribuir-lhe efeitos tributários.
Esta visão coaduna com o giro linguístico, pois tem por objeto a
linguagem, interpretando-a e atribuindo-lhe sentidos, num processo
hermenêutico do direito positivado. Possível pela escolha de um método
dogmático, restritivo do conteúdo da realidade semântica difusa, fundando este
corte metodológico em premissas sólidas, como as do próprio giro linguístico.
200 Ob. Cit. Pág. 142. 201 Direito tributário e direito privado, pág. 131.
153
Uma dessas premissas é deixar de lado a concepção de verdade
absoluta da filosofia analítica e adotar o conceito de verdade como uma
construção linguística em nome da qual se fala.
Paulo de Barros Carvalho202
esclarece que a superação dos
métodos científicos tradicionais pelo movimento do giro linguístico deixou de
buscar puramente o valor da “verdade”, para assumir uma nova postura
cognoscitiva perante o que se entende por “sujeito”, por “objeto” e pelo próprio
“conhecimento”. A mudança de paradigma passou a exigir o próprio conhecer
da linguagem, condição primeira para a apreensão do objeto. Eis o resultado
desta transposição de sistemas referenciais. Uma vez estabelecidas as
fronteiras da nova visão científica.
Nessa perspectiva é que se analisa a relação entre legalidade e
vontade. Partimos dos pressupostos de legalidade expostos acima para
trabalharmos a vontade, dentro da legalidade. Sem perder de vista o Direito
Tributário.
Já foi apresentado o tratamento jurídico dos termos “legalidade” e
“vontade”, mas para entendê-los se faz necessário analisar qual o papel de
cada um desses termos na positivação do direito. Processo definido por Paulo
202 Ob. Cit., pág. 159.
154
de Barros Carvalho203
como sequência de atos ponentes de normas, dentro da
dinâmica do sistema, com percurso uniforme e direção hierárquica sempre
descendente.
Neste contexto, parece que a “legalidade” está para o ato de fala
como, nos termos de Austin204
, o procedimento convencionalmente aceito com
o correspondente efeito convencionalmente atribuído, que inclui o dizer de
certos termos por determinadas pessoas em certas circunstâncias, então o
ordenamento estabelece as situações jurídicas e os procedimentos a serem
seguidos para que as normas possam ser criadas.
A lei tributária estabelece os elementos da Regra Matriz de
Incidência Tributária, composta de uma hipótese e um consequente. A hipótese
prescreve um evento em abstrato, representado por três critérios: material,
espacial e temporal. Este evento, ao ser verificado, dá causa à aplicação do
consequente, formado por dois critérios: pessoal e quantitativo.
Contudo, o simples estabelecimento linguístico do que deva
ocorrer não faz com que aconteça. É imprescindível a atuação do ser humano
para aplicar a norma geral e abstrata pela construção linguística da norma
individual e concreta. Há, portanto, comunicação entre diferentes autoridades,
203 Derivação e positivação no direito tributário, vol. I, pág. XIX. 204 Ob. Cit., págs. 14 e 15.
155
sujeitos competentes para a produção de determinados atos previamente
regrados no processo de positivação. Aliás, com os ensinamentos de Austin
podemos afirmar que se as pessoas e as circunstâncias estabelecidas para
que em determinado caso sejam elas as capazes de invocar o procedimento a
ser adotado, então as normas jurídicas estabelecem quem é o órgão e o
procedimento adequados a tanto, em seu sistema.
A legalidade é aplicada tanto na norma de conduta, como na
norma de estrutura, para estabelecer por quem e como pode ser estabelecida a
norma. Segundo o que está estabelecido nela se encontra qual a vontade
relevante, pois se o procedimento deve ser adotado por quem tenha certos
pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de certa conduta
consequente na parte de qualquer participante, então essa pessoa deve de fato
ter aqueles pensamentos ou sentimentos, tendo o real intuito de assim
proceder.
O direito estabelece o procedimento para que os órgãos
emissores de normas o sigam, segundo um dever de moralidade ou adequação
aos fundamentos de validade deste procedimento. A vontade está sempre
presente no ato de fala, inclusive da norma. Só que no direito só interessa a
vontade manifestada, como visto acima.
156
Assim, estabelecida uma proximidade entre a legalidade e a
vontade passa-se no próximo capitulo a tratar a vontade como fonte do direito e
analisar quais as consequências que isto induz no sistema.
157
8. Análise da vontade como fonte do direito
O giro linguístico é, até certo ponto, uma revolução na Ciência do
Direito. Do mesmo modo é revolucionário o tratamento das fontes do direito
como um processo enunciativo, como descrito por Tárek Moysés Moussallem.
Propomos um passo a mais nessa teoria, ao analisar a vontade do emissor, a
autoridade competente para produzir determinada norma, como fonte do direito
dentro do que se convencionou chamar de enunciação normativa.
Assumimos no presente trabalho o enfoque de fontes do direito
proposto por Paulo de Barros Carvalho205
como focos ejetores de normas
jurídicas, constituídos pelos órgãos habilitados pelo sistema à produção de
normas e pela atividade desenvolvida por eles para chegar a este fim.
Da mesma forma, assumimos a posição do autor206
205 Curso de Direito Tributário, págs. 79 e 80.
quanto às
normas se apresentarem em duplas, sendo introduzidas umas por outras.
Ambas compõe o direito positivo. As primeiras com o único objetivo de
introduzir as outras no sistema. Enquanto estas prescrevem condutas conforme
depreendidas do enunciado-enunciado.
206 Idem.
158
Cabe agora, um breve estudo da multiplicidade de sentidos do
termo vontade, para situar a exposição dos demais pontos.
Podemos afirmar que a língua portuguesa utiliza pelo menos
cinco acepções para o termo “vontade”207
: faculdade de livremente praticar ou
deixar de praticar certos atos; firmeza moral, determinação; desejo, intenção;
capricho, veleidade; e necessidade física ou psíquica.
A partir dessas cinco acepções podemos trabalhar como o direito
regula sua produção e como absorve ou não tais acepções.
A vontade, como faculdade de livremente praticar ou deixar de
praticar certos atos, é a adotada pelo Código Civil208 ao tratar dos negócios
jurídicos, mas na sua forma manifestada, pois o direito não se interessa por
situações intrassubjetivas, como vista ao longo desse estudo. Como reconhece
também Pontes de Miranda209
ao tratar dos atos jurídicos em sentido estrito.
207 Grande Dicionário Larousse Cultural da Língua Portuguesa, pág. 919. 208“Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.” 209 Ob. Cit., pág. 395
159
A vontade, tomada como firmeza moral ou determinação, se por
uma lado parece de difícil apreensão pelo direito, é passível de se comparar
com a moralidade administrativa, expressa no caput do artigo 37 da
Constituição Federal210
como requisito dos atos da Administração Pública.
Nesse sentido leciona Hely Lopes Meirelles211
, ao afirmar que a
moralidade constitui pressuposto de validade de todo ato da Administração
Pública. Não se trataria da moral comum, mas da moral jurídica, entendida
como aquele conjunto de normas de conduta extraídos da disciplina interior da
Administração. Ressalva ainda o dever de atendimento, além do direito, à ética
da própria instituição.
A vontade, como desejo ou intenção, nos parece típica dos atos
jurisdicionais e dos atos administrativos que com base na análise da legislação
e dos fatos jurídicos, buscam produzir resultados intencionais. Daí a
necessidade de motivação das sentenças e dos atos administrativos.
No caso das primeiras, conforme determinação do artigo 458 do
Código de Processo Civil212
210 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
, que exige a fundamentação em que o juiz
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” 211 Ob. Cit., pág. 89. 212“Art. 458. São requisitos essenciais da sentença:
160
analisará as questões de fato e de direito. O que servirá de controle de sua
vontade.
No caso dos atos administrativos, Hely Lopes Meirelles213 lembra
que da interpretação conjunta do inciso XXXV do artigo 5º da Carta Magna214,
com a moralidade expressa no caput do artigo 37 do Texto Maior215
, surge o
entendimento de que a motivação lhe é essencial.
A vontade, como capricho ou veleidade, pode ser tomada como
pressuposto do abuso de direito, seja no âmbito civil, como disciplinado pelo
artigo 187 do Código Civil216, seja no campo do direito público, quando dará
ensejo à interposição do Mandado de Segurança, conforme o inciso LXIX do
artigo 5º da Constituição Federal217
I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
.
II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes Ihe submeterem.” 213 Ob. Cit., pág. 151. 214 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” 215 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” 216 “Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.” 217“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
161
Por fim, a vontade, tomada como necessidade física ou psíquica,
configura estado de necessidade, excluindo a ilicitude da conduta, conforme o
inciso I do artigo 23 do Código Penal218
.
Em todos estes sentidos de vontade, o agente, capaz de produzir
determinadas consequências jurídicas, dela precisa a fim de que o processo
enunciativo seja possível. Contudo, há de se ressaltar que a enunciação
relevante para que o direito enxergue sua fonte, possibilitando a recomposição
dos atos que levaram à enunciação, é apenas aquela enunciada.
8.1. Direito como comunicação
Aquilo que nos chega pela via dos sentidos, pela intuição
sensível, e que chamamos de “realidade”, é, na visão de Flusser219
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;”
, dado
bruto, que se torna real apenas pela língua, única responsável pelo seu
aparecimento.
218“Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - em estado de necessidade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - em legítima defesa;(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)” 219 Ob. Cit., pág. 40.
162
O mundo, nessa perpectiva, é “aparentemente” caótico, mas, pela
linguagem, pode ser ordenado, constituindo-se a “realidade”. Haveria, portanto,
um mundo “aparente” caótico e um mundo “real” ordenado. O espírito humano
avançaria da “aparência” para a “realidade”.
O território das condutas intersubjetivas, campo de eleição do
direito, sendo, como de fato pensamos ser, a realidade jurídica por excelência,
é construído pela linguagem do direito positivo, tomado aqui na sua mais ampla
significação. Quer dizer, o conjunto dos enunciados prescritivos emitidos pelo
Poder Legislativo, pelo Poder Judiciário, pelo Poder Administrativo e também
pelo setor privado.
São tais enunciados articulados na forma implicacional das
estruturas normativas e organizados na configuração superior de sistema, que,
podemos dizer, são, formam, criam e propagam a realidade jurídica.
Tomado o direito como linguagem que busca a comunicação
visando a prescrição de condutas, configura ato comunicacional. Seguindo os
ensinamentos da Semiótica, através das lições de Roman Jakobson220
220 Linguística e comunicação, pág. 123.
, pode-
se analisar os elementos que compõe esse agir. São seis os elementos
163
essenciais da comunicação: remetente, mensagem, destinatário, contexto,
código e contato.
O remetente envia a mensagem ao destinatário. Tal mensagem
para ser eficaz necessita de um contexto, mas também ser transmitida através
de um código comum ao remetente e ao destinatário. Porém, sem um contato
ocorrido por um canal físico e uma conexão psicológica entre os dois sujeitos
da comunicação, esta não se estabelece.
Paulo de Barros Carvalho, como mencionado, aprofundou tal
teoria quanto às etapas pelas quais deve passar o emissor e o receptor para
que a comunicação se estabeleça.
A ênfase dessa análise, apresentada no Grupo de Estudo de
Lógica Jurídica do IBET, é dada ao fato de que antes da mensagem existem
fases tão importantes como o ato de fala em si, para que a mensagem seja
emitida e recepcionada.
Esta análise é feita sobre o longo processo de comunicação,
partindo de atividades mentais dos sujeitos até a recepção da mensagem,
164
passa por nove etapas: dúvida, aporia, decisão, estímulo, vontade, resistência,
ato de fala, mensagem e recepção.
No início surge a “dúvida” quanto ao que falar e se deve ser
falado. Este momento é crucial para começar o procedimento do que pode vir a
ser o ato de fala. Configura uma fase introspectiva, mas de suma relevância.
Porém, não pode ser diretamente apreendida pelo observador, pois acontece
no intelecto do emissor, não sendo expressa na linguagem. Resultado esse
que só existirá se a dúvida for solucionada a favor da fala.
A segunda fase é da “aporia”, na qual são elencados pelo sujeito
emissor os argumentos a favor e contra a mensagem e o conteúdo a ser
expresso, configurando uma fase reflexiva.
A “decisão” permite ao emissor escolher o conteúdo que pretende
emitir. Neste ponto, o emissor sofre um “estímulo” externo que o induz ao ato
de fala.
Com o “estímulo”, o emissor desenvolve a “vontade” de emitir o
ato comunicacional. A vontade, neste sentido, seria aquela força que empurra o
emissor a produzir o ato de fala. Assim como nas outras fases internas do
165
intelecto do emissor, é nítida a dificuldade de apreensão desta vontade pelo
observador ou mesmo pelo receptor, pelo menos numa primeira análise.
Contudo, esta conduta intrassubjetiva assume intersubjetividade através de sua
manifestação. A partir do quê permite a análise por terceiros, pois deixa
necessariamente marcas na mensagem, no texto. Tornando-se passível de ser
depreendida.
Mesmo apresentando vontade de falar, o emissor precisa vencer
algumas “resistências” maiores ou menores: a timidez, o medo, a falta de
oportunidade de falar etc. Vencida esta fase, o emissor procede o ato de fala,
enviando a mensagem.
Não se pode esquecer que durante todo este processo, há um
contato entre o emissor e o receptor, através de uma conexão, física e
psicológica, produzindo o ato de “recepção”.
Assim, o processo comunicacional não configura apenas o ato de
fala em si, mas pode ser também tido como a objetivação da vontade do
emissor. Paralelamente, o processo de produção normativo, a enunciação,
configura a objetivação da vontade do legislador em sentido amplo.
166
Esse processo enunciativo não pode ser apreendido na
totalidade, pois é anterior ao direito, não é totalmente enunciado e, portanto, se
consubstancia em fonte do direito. Mas como deixa marcas no enunciado
normativo, a enunciação-enunciada, permite ao intérprete do direito refazer o
caminho, com o intuito de verificar a licitude da produção normativa. Esta é a
lição de Fiorin221 e Moussallém222
.
Neste sentido, a produção do direito pressupõe o ato de fala que,
ao ser realizado, emite linguagem; a qual não só constitui o direito, mas fala
dele, consubstanciando seus dois sistemas: ordenamento e Ciência do Direito.
Sendo certo que não se imagina a manifestação do direito sem linguagem,
idiomática ou não, seu veículo de expressão. Também o é a interpretação. Pois
atribui valores aos símbolos, suas significações e, por elas, estabelece
referências a objetos.
Esse processo enunciativo pressupõe interpretação da norma de
superior hierarquia, fundamento de validade da norma de hierarquia inferior,
como limite material a tratar no conteúdo daquela recém-produzida.
Esse processo interpretativo, tomado do ponto de vista interno do
sistema, para aplicá-lo no caso concreto, configura aquela atividade tida por
221 Ob. CIt., pág. 38. 222 Ob. Cit., pág. 80.
167
Paulo de Barros Carvalho223 como positivação. Quando o aplicador do direito
assume a figura de poeta em Flusser224
numa atitude ponente de normas.
Um dos alicerces que suportam esta construção figura na
diferença entre enunciados e normas jurídicas, com os diferentes campos de
irradiação semântica.
Seguindo a premissa da unicidade do texto jurídico-positivo, pode-
se alcançar os quatro subsistemas pelos quais se locomovem obrigatoriamente
todos aqueles que se dispõem a conhecer o sistema jurídico normativo: a) o
conjunto de enunciados, tomados no plano da expressão; b) o conjunto de
conteúdos de significação dos enunciados prescritivos; c) o domínio articulado
de significações normativas; e d) os vínculos de coordenação e de
subordinação que se estabelecem entre as regras jurídica. Como leciona Paulo
de Barros Carvalho225
.
A lei, vista sob certo ângulo, representa o texto, na sua dimensão
de veículo de prescrições jurídicas. Constituição, emenda constitucional, lei
complementar, lei delegada, lei ordinária, medida provisória, resoluções,
decretos, sentenças, acórdãos, contratos e atos administrativos, enquanto
suportes materiais de linguagem prescritiva, configuram veículos introdutórios 223 Ob. Cit., pág. XIX. 224 Ob. Cit., pág. 144. 225 Ob. Cit., págs. 181 e segs.
168
de normas jurídicas, constituindo a base empírica do conhecimento do direito
posto. Já a norma jurídica é juízo implicacional, construído pelo intérprete, em
decorrência da atividade humana no trato com os suportes comunicacionais.
É preciso atentar que o discurso produzido pelo legislador, em
sentido amplo, é passível de redução a uma norma jurídica, cuja composição
sintática é constante: um juízo condicional que associa a realização de um
acontecimento eventual previsto no antecedente, e passível de ser absorvido
faticamente por linguagem adequada, à uma consequência. Tal associação
ocorre pela atuação dos conectivos deônticos: obrigatório, permitido e proibido.
O direito, portanto, manifesta-se invariavelmente pela linguagem,
seja ela escrita ou não escrita, configurando um sistema de signos utilizado
para a comunicação, com função de conteúdos prescritivos voltados para o
setor específico das condutas intersubjetivas.
8.2. Fonte do direito: enunciação x enunciação-enunciada
Tárek Moysés Moussallem226
226 Ob. Cit., pág. 136.
trabalha a produção normativa, sob
a ótica do giro linguístico, a partir da ação de fala, ou seja, a partir da
169
enunciação. Enfatiza a separação dos conceitos de direito e fontes do direito,
criticando as posições clássicas baseadas na dualidade “fontes reais ou
materiais” e “fontes formais”, defendida por Ruy Barbosa Nogueira227
.
O autor buscou evidenciar a diferença entre o processo de
produção da norma jurídica e seu conteúdo, partindo de conceitos típicos da
filosofia da linguagem: enunciação, enunciado, enunciação-enunciada e
enunciado-enunciado.
A enunciação, para Moussallem228
, pode ser encontrada no plano
da facticidade social, compondo o ato da comunicação ou o processo
comunicacional entre dois ou mais sujeitos, com intuito de emitir um enunciado
jurídico. A enunciação, como qualquer evento social, pode se perder no tempo
se não for perpetuada através do que se chamará enunciação-enunciada.
O enunciado, como já tratado neste trabalho, pode ser encarado
como o texto, o meio para que a comunicação possa ser expressa. O
enunciado pode ser tido como texto escrito, que possibilita a perpetuação da
comunicação.
227 Ob. Cit., págs 47 e 48. 228 Idem, pág. 146.
170
A enunciação-enunciada comporá o texto, deixando evidenciadas
as marcas da enunciação, como lugar, tempo, sujeito emissor, sujeito receptor,
ideologia e, em nossa opinião, vontade do emissor. Através das marcas
deixadas no texto, se torna possível reaver importantes informações do
processo comunicacional normativo, possibilitando analisar sua validade.
O enunciado-enunciado é o texto, aquele referente ao conteúdo,
afastando as marcas de sua enunciação. Dele serão extraídos os conteúdos
normativos a serem seguidos.
O estudo dessas categorias linguísticas possibilitou ao autor que
se afastasse da confusão do processo com o produto, admitindo serem as
fontes do direito as enunciações, mas que estas só poderiam ser apreensíveis
através das enunciações-enunciadas.
Para Eurico Marcos Diniz de Santi229
229 Decadência e prescrição no direito tributário, pag. 67.
, a enunciação configura
fonte de produção, enquanto a enunciação-enunciada configura fonte de
cognição. Isto porque com a enunciação se tem os fatos juridicizados por
normas de produção jurídica, idôneos para dar origem a novas unidades.
Enquanto as fontes de cognição seriam os documentos legais que funcionam
como veículos oficiais de mensagem jurídica.
171
Mas não concordamos com a posição deste autor, pois tomada a
premissa do giro linguístico de que o direito é linguagem, sua fonte deve ser
algo diferente da linguagem, consubstanciando os atos que levem a sua
produção. Enquanto na enunciação-enunciada não se abrangeria o veículo
introdutor de normas jurídicas, papel realizado pelo enunciado, mas as marcas
deixadas nele daqueles atos que levaram a sua efetiva emissão.
Concordamos com Paulo de Barros Carvalho230
, quando afirma
serem os fatos absorvidos pela ordem jurídica como necessários à enunciação,
e não como enunciado, aqueles que formam o território das fontes do direito. O
que nos permite trabalhar as fontes do direito como algo diferente do direito
posto. Afastando a confusão entre o processo e o produto, típico das teorias
clássicas expostas acima.
Seguindo este raciocínio, se percebe que as normas de
competência e as normas do procedimento legislativo, previstas no sistema,
incidem em fatos, que se tornam jurídicos. Estes fatos são aqueles analisados
do prisma da enunciação normativa, o processo, não do enunciado, o produto;
como enfatiza Paulo de Barros Carvalho231
.
230 Idem, pág. 81. 231 Ob. Cit., pág. 83.
172
Para Tárek Moysés Moussallem232
, o fato produtor de normas é o
fato-enunciação, aquela atividade exercida pelo agente competente, realizada
por atos de fala. Contudo apenas com a enunciação-enunciada é possível o
controle da enunciação, pois sem as marcas deixadas no texto pelo processo
enunciativo, não há como controlá-lo.
Neste sentido surgem dúvidas quanto à verificação da validade de
uma norma e sua relação com a enunciação. Podemos afirmar que tal relação
só pode acontecer com a enunciação-enunciada, dada sua perpetuação pela
forma escrita no texto jurídico.
A validade de uma norma quanto ao sistema dependerá de uma
análise da fundamentação desta em outra norma de superior hierarquia, além
do procedimento adotado na sua produção, passível de se verificar através das
marcas deixadas no texto instrumento introdutor da norma.
Concordamos com Tárek Moysés Moussallem233
232 Fontes do Direito Tributário, pág. 150.
, quando afirma
que a partir da enunciação-enunciada é possível reconstruir a linguagem da
enunciação, para realizar o confronto da enunciação-enunciada com o
fundamento de validade do enunciado e aferir se ocorreu em conformidade
com o prescrito no ordenamento.
233 Ob. Cit.,, pág. 152.
173
8.3. Vontade na enunciação
Todo ato pressupõe uma vontade de produzi-lo. A enunciação
engloba, nos paradigmas do giro linguístico, todo processo que leva ao ato de
fala. Esta é a lição de Paulo de Barros Carvalho ao apresentar sua análise
deste ato, com as nove fases: dúvida, aporia, decisão, estímulo, vontade,
resistência, ato de fala, mensagem e recepção. Diga-se, englobando etapas
intrassubjetivas e intersubjetivas.
A vontade na enunciação consta do conjunto das condutas
intrassubjetivas, predecessora, mas essencial ao ato de fala. Como ensina
Schopenhauer234
, a vontade pode ser tomada como objeto do conhecimento do
próprio agente, que indissociavelmente age produzindo tal conhecimento.
Contudo, pode ser observada no objeto, como vontade objetivada, por terceiro
interessado em estudá-la. Este só a apreenderá pela representação, sua forma
objetivada. Diga-se: com limites, em decorrência da perspectiva do observador.
A vontade é essencial à realização do ato, mas pode ser viciada,
na produção de um ato quando se pretendia a prática de outro. Resta saber se
tal situação interessa ao direito ou não. O que já foi objeto de análise neste
234 Ob. Cit., pág. 157.
174
trabalho, quando tratadas as diversas acepções de vontade pelo direito. A
conclusão foi de que em muitos casos tal vontade é relevante, mas apenas
quando manifestada. Diga-se enunciação-enunciada.
Mas o ato de fala, conforme vislumbrado por Austin, requer que
haja uma correlação entre a vontade interna e aquela manifestada, no decorrer
dos atos que levam ao ato performativo, para que ele se efetue.
8.4. Vontade na enunciação-enunciada
A vontade na enunciação-enunciada é a aquela manifestada. Mas
deve, conforme exposto até aqui, corresponder à vontade interna para que o
ato de fala performativo se efetive, como é o caso das normas jurídicas.
Nesse sentido, a discrepância entre as vontades a interna e a
manifesta gera uma incongruência entre o ato realizado e o pretendido,
levando à ineficácia e à invalidade. Aquela em razão da natureza
comunicacional do direito. Esta, eventual, em razão das normas que
prescrevam os atos que levam à produção normativa, relegando o problema à
matéria de prova.
175
A prova no caso teria por objetivo não a vontade em si, pois não
mensurável pelo direito, mas a manifestação desta vontade. Frise-se: a
vontade interna não será conhecida enquanto não manifestada.
Logo, a vontade relevante ao direito é aquela manifestada no
enunciado jurídico: a enunciação-enunciada. A partir daí, poderá o jurista
buscar as informações relevantes ao direito para verificar a adequação da
vontade manifesta ao fundamento de validade e às normas de estrutura,
reguladoras da produção normativa.
A vontade interna só pode ser conhecida, segundo as lições de
Schopenhauer235
, pelo sujeito do conhecimento que trata da própria. Quando
observada por terceiro só pode ser conhecida por sua objetivação, no caso, o
enunciado. Isto acontece em razão da vontade ser um conhecimento a priori do
corpo do próprio agente, enquanto a ação do corpo configura objeto do
conhecimento a posteriori da vontade.
Cabe aqui estabelecer se há um lugar específico no texto para
que a vontade seja expressa.
235 Ob. Cit., pág. 157.
176
Nas lições de Tárek Moysés Moussallem, a Lei Complementar 95
de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre elaboração, redação, alteração e
consolidação das lei, prescreve em seus artigos 3º, inciso I236, 4º237 e 6º238
as
partes do enunciado em que a enunciação-enunciada pode figurar. Tais
dispositivos elegem a parte preliminar das leis, compreendendo a epígrafe, a
ementa, o enunciado do objeto e a indicação do âmbito de aplicação das
disposições normativas. Compreendendo as particularidades de cada uma,
como: a epígrafe apresenta a identificação da lei, enquanto o preâmbulo indica
o órgão ou instrumento para a prática do ato.
Embora a indicação geográfica no enunciado das marcas da
enunciação seja útil, não são as únicas marcas que podem ser extraídas. Do
enunciado pode-se também extrair valores da autoridade competente, que
levaram tal autoridade a decidir enunciar a norma daquela forma, configurando
assim a vontade. Esta sucede a decisão e o estímulo externo, para enunciar a
236 “Art. 3o A lei será estruturada em três partes básicas: I - parte preliminar, compreendendo a epígrafe, a ementa, o preâmbulo, o enunciado do objeto e a indicação do âmbito de aplicação das disposições normativas; II - parte normativa, compreendendo o texto das normas de conteúdo substantivo relacionadas com a matéria regulada; III - parte final, compreendendo as disposições pertinentes às medidas necessárias à implementação das normas de conteúdo substantivo, às disposições transitórias, se for o caso, a cláusula de vigência e a cláusula de revogação, quando couber.” 237“Art. 4o A epígrafe, grafada em caracteres maiúsculos, propiciará identificação numérica singular à lei e será formada pelo título designativo da espécie normativa, pelo número respectivo e pelo ano de promulgação” 238 “Art. 6o O preâmbulo indicará o órgão ou instituição competente para a prática do ato e sua base legal.”
177
norma a partir dos valores eleitos, deixando de fora aqueles preteridos. É o
caso do preâmbulo da Constituição239
.
Neste caso os valores eleitos foram: a garantia dos direitos
sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade, a justiça, a fraternidade, a pluralidade, a
harmonia, o rechaço dos preconceitos, a paz e a religião.
8.5. Vontade na análise da validade
A validade, nas lições de Paulo de Barros Carvalho240
, não
constitui propriedade ou atributo que qualifica a norma jurídica, mas se realiza
no vínculo entre a proposição normativa, considerada na sua inteireza lógico-
sintática, e o sistema do direito posto. Ser norma é pertencer ao sistema.
239“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.” 240 Ob. Cit., pág. 114.
178
Segue o mesmo raciocínio Eurico Marcos Diniz de Santi241
, para
quem definir validade implica a identificação da forma, momento, local e
autoridade competente para a produção normativa.
A vontade compõe a análise feita pela autoridade competente,
seja no caso do livre convencimento do juiz, ou mesmo naquele ato
administrativo plenamente vinculado, pois ambos exigem, como exposto,
motivação. O que deixa marcas quanto à vontade manifesta.
Tárek Moysés Moussallem242
ressalta: “A partir da linguagem do
veículo introdutor (enunciação-enunciada), reconstruímos a linguagem do
procedimento produtor de enunciados (enunciação), e realizamos o confronto
entre esta e a linguagem da norma de produção normativa (fundamento de
validade do veículo introdutor) para aferirmos se a produção normativa se deu
ou não em conformidade com o prescrito no ordenamento”.
No modelo kelseniano, como já exposto no presente trabalho, é
considerada norma válida aquela produzida por órgão credenciado pelo
sistema e na conformidade com o procedimento também previsto pela
ordenação total. Ao lado de um critério de dedutibilidade lógica da norma no
241 Ob. Cit., pág. 68. 242 Ob. Cit.,, pág. 152.
179
sistema. Ingressará no ordenamento a norma que se adequar a tais requisitos,
de forma a estabelecer o conceito de validade da norma jurídica.
Contudo, a norma entra no sistema e, apenas quanto contestada
judicialmente, terá tais requisitos avaliados. De forma que a norma é criada
jurídica e só depois pode deixar a relação de pertinencialidade, de acordo com
os meios estabelecidos em dado sistema. E mesmo nesta hipótese permanece
válida para o período anterior a sua revogação, ab-rogação ou declaração de
inconstitucionalidade.
Nesse contexto, a vontade tomada naquelas cinco acepções
trabalhadas no início deste capítulo, quais sejam: faculdade de livremente
praticar ou deixar de praticar certos atos; firmeza moral, determinação; desejo,
intenção; capricho, veleidade; e necessidade física ou psíquica; pode figurar
como requisito legal à enunciação de uma determinada norma jurídica. Mas
mesmo não sendo assim eleita, figura como fonte do direito sob o prisma dos
atos de fala.
Tomada a vontade como requisito do ato de fala jurídico, cabe a
análise da efetivação performativa da norma, caracterizada pela eficácia. Mas
também cabe a análise da vontade como requisito de validade da norma,
quando assim requerida pelo direito.
180
Conclusão
A partir do que foi exposto no presente trabalho chegou-se às
seguintes conclusões:
I – O direito configura ato comunicacional, caracterizado pela
prescrição de condutas, expresso numa estrutura sintática própria e com
conteúdo semântico variável.
2 – O direito positivo apresenta relação íntima com a linguagem,
sendo vistos pelo giro linguístico como sinônimos.
3. – A linguagem constrói a realidade jurídica, sendo, criando,
modificando e propagando o direito, com o intuito de regrar condutas
intersubjetivas.
4 – O direito é criado por um ato de fala, consubstanciado num
ato performativo, apresentando-se em três esferas: o ato locucionário
(realizado na enunciação da frase), o ato ilocucionário (realizado pela produção
181
do ato que se pretende produzir com a enunciação da frase) e o ato
perlocucionário (configura o resultado da linguagem utilizada nos demais)..
5 – O direito como ato comunicacional figura no campo de estudo
da Semiótica, permitindo a análise dos elementos desta comunicação:
remetente, mensagem, destinatário, contexto, código e contato.
6 – Mas também analisando fases anteriores à intersubjetividade,
começando pela dúvida, aporia, decisão, estímulo, vontade, resistência, ato de
fala, mensagem até a recepção da mensagem pelo destinatário.
7 – O direito como ato comunicacional pode ser analisado,
portanto, como ato de fala performativo. Precisa cumprir as seis fases de
“felicidade” estabelecidas por Austin para que produza os efeitos desejados:
a) Deve existir um procedimento convencionalmente aceito com o
correspondente efeito convencionalmente atribuído. Esse procedimento deve
incluir o dizer de certos termos por determinadas pessoas em certas
circunstâncias.
182
b) As pessoas e as circunstâncias, em particular, para
determinado caso, devem ser aquelas apropriadas para a invocação do
procedimento adotado.
c) O procedimento deve ser executado por todas as pessoas
envolvidas, correta e
d) completamente.
e) Quando, usualmente, o procedimento deve ser adotado por
quem tiver certos pensamentos ou sentimentos, ou para a inauguração de
certa conduta consequente da parte de qualquer participante, então a pessoa
participante e envolvida no procedimento deve de fato ter aqueles
pensamentos ou sentimentos e os participantes devem ter o real intuito de
assim proceder.
f) Esses atos dentro do procedimento devem ser adotados pelos
participantes de forma subsequente uns aos outros.
8 – O direito ao percorrer as etapas descritas nos itens 5, 6 e 7,
acaba por percorrer o caminho da positivação.
183
9 – A positivação pressupõe intertextualidade entre normas gerais
e abstratas, gerais e concretas, individuais e abstratas, e individuais e
concretas.
10 – O caminho da positivação começa pela interpretação
normativa, que tende ao infinito, pois é inesgotável.
11 – Contudo a interpretação não leva sempre à positivação,
sendo também utilizada pela Ciência do Direito.
12 – Há independência entre os sistemas normativos e científicos.
13 – As fontes do direito podem ser analisadas sob diversos
ângulos, mas se analisadas a partir do giro linguístico deverão tomar por base
a diferença entre o processo de produção normativa e o produto: a norma.
14 – As fontes do direito tratadas por essa ótica englobam os
processos enunciativos: a enunciação normativa. Mas só são apreensíveis pelo
intérprete através da enunciação-enunciada.
184
15 – O direito tomado como ato comunicacional e analisado
segundo a teoria dos atos de fala tem como elemento integrante da enunciação
a vontade, que ser tida como fonte do direito.
16 – A vontade pode ser analisada, quanto interna, apenas pelo
agente que a detém, mas quando externalizada, por outros observadores, pois
é objetivada em seu produto.
17 – A objetivação da vontade no direito só pode ser analisada
através do enunciado, mais precisamente da enunciação-enunciada, pois a
vontade integra a enunciação e sua manifestação só ocorre quando enunciada.
18 – A vontade, materializada na enunciação-enunciada, e objeto
de análise pelo intérprete do ato de fala do direito, apresenta-se em cinco
acepções que são trabalhadas pelas normas como requisitos à produção do
direito: faculdade de livremente praticar ou deixar de praticar certos atos;
firmeza moral, determinação; desejo, intenção; capricho, veleidade; e
necessidade física ou psíquica.
185
19 – A vontade pode ser critério de análise de eficácia da norma,
mas também de validade, a depender do requisito estabelecido pelo próprio
direito. Nesse sentido pode ser provada quando manifesta. Mas impossível
averiguar a vontade interna do agente. Cabe a prova apenas quanto a sua
manifestação.
20 – A aplicação da norma tributária também demanda o exercício
da vontade da autoridade para produzi-la, sendo fase integrante do processo
enunciativo da norma jurídica.
21 – A enunciação-enunciada pode estar contida em alguns
pontos geográficos do texto jurídico, mas também é passível de ser
depreendida do próprio enunciado, não havendo uma separação fixa.
22 – O presente trabalho logrou êxito ao refletir sobre o papel da
vontade com fonte do direito, estabelecendo, em consonância com uma análise
do direito como linguagem, seu foco de aplicação. A vontade pode ser
elemento para configurar a validade de alguns atos jurídicos quando for
expressamente estabelecido, mas quando o direito não for expresso quanto a
seu papel, a vontade serviria para analisar a eficácia das normas produzidas
sob sua égide.
186
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