Portugal, um país de solos diversos mas pobres!
O papel das pastagens biodiversas na sua
recuperação e uso sustentável.
David G. Crespo, Fertiprado, Lda., Vaiamonte, Portugal
Ano Internacional dos Solos, Coloquio «Biodiversidade dos solos»
INIAV, Oeiras, , 13 de Outubro de 2015
O SOLO: Definição, valor e riscos
SOLO- Formado por partículas minerais e orgânicas, agua, ar e organismos vivos • É suporte fundamental da vida terrestre, pois nele se produz a maior parte da biomassa vegetal
usada como alimento para o homem e outros seres vivos, ou aproveitada sob forma de madeira e outras fibras, incluindo a produção de bioenergia.
• Tem uma função importante na regulação do ciclo da água e dos nutrientes, além de constituir um enorme reservatório de carbono
• Existe uma grande diversidade de solos, variáveis nas suas características e capacidade de uso. Por isso, o seu uso deve ser feito de acordo com as suas características
• A formação do solo é lenta- mais de 100 anos por cm de espessura
• A sua degradação pela erosão, causada pela agua ou vento pode ser rápida. As chuvas, caindo em solos nus ou pouco revestidos e declivosos, podem causar a perda de muitas toneladas de solo/ha em poucas horas. .
Outros riscos: - Perda de matéria orgânica por oxidação, provocada pela excessiva mobilização;
- Compactação por meios mecânicos ou pisoteio animal, que afecta o ciclo da agua, impedindo a sua infiltração e favorecendo o seu escorrimento, causador de erosão; - Salinização pela rega com agua carregada de sais, num processo que embora lento no tempo, termina com resultados catastróficos - Deslizamento de terras em zonas de grande declive, causados pelas chuvas sobre solo com um revestimento vegetal enfraquecido; - Desertificação, causada por uma grave alteração do ecossistema, derivada de mudança climática acentuada ou da acção directa do homem.
Todavia, a degradação do solo depende sobretudo do uso que o homem faz dele. Um uso adequado pode levar à recuperação da sua produtividade sustentável!
Carta geológica (68 formações)
Fonte: Estrutura Ecológica Nacional, ISA, em revisão.
Carta de solos (10 unidades na
classificação da FAO, 50 unidades na do SROA)
OS SOLOS DE PORTUGAL SÃO DIVERSOS ...
DECLIVES (%) ESPESSURA (cm)
… Mas, na sua maior parte declivosos, …
... delgados,…
… pobres em nutrientes, ácidos, e por vezes mal drenados! Fonte: Estrutura Ecológica Nacional (ISA),
Disponibilidade em nutrientes pH (H2O)
Risco de encharcamento
pH
Características gerais do solo e clima em Portugal
Com grandes variações: – 2500 a 3200 horas de sol/ano
– Chuva anual <400 – >2500mm, 85% no período Outono/Primavera
– Temperaturas moderadas no Inverno, elevadas no Verão
Excelente clima para leguminosas!
Grande diversidade de solos com predomínio dos: • Ácidos
• Pobres em matéria orgânica - 0,5 to 1,5%
• Pobres em fosforo
• Delgados e pedregosos , declivosos
• Deficiente drenagem
• Susceptíveis à erosão
Necessário melhorar as condições do solo, encontrando as melhores soluções de uso para cada caso!
Clima dominante de caracter Mediterrâneo
Pluviosidade e uso da terra em Portugal
34,70%
27,30%
16,90%
8,40%
7,50% 5,20%
Forestry
Permanent pastures
Agro-silvo-pastoral
Permanent crops
Temp. forage crops
Annual Cash crops
Fonte: INE, 2011
Politicas erradas degradaram ecossistemas e solos:
1. Cereais altamente subsidiados, e a sua mecanização levaram à destruição de muitos montados; excesso de adubação azotada e de herbicidas, e encurtamento de rotações degradaram … ... pastos naturais,
e terras, conduzindo ao abandono…
… seguido de invasão de arbustos e … fogo destrutivo!
2. Subsídios da PAC às vacas aleitantes muito superiores aos dos pequenos ruminantes, provocou uma redução gradual dos ovinos nos montados, e a sua substituição por bovinos, com graves consequências para o ecossistema, sobretudo se não se cuidar de lhes proporcionar melhores e mais abundantes recursos pratenses e forrageiros….
Morte dos sobreiros/azinheiras em montados pastoreados por bovinos, com recurso a grande quantidade de concentrados. ECONOMIA DEBIL, MONTADO E AMBIENTE EM GRANDE RISCO!
Mais resultados das politicas que levaram a uma má utilização do solo: Erosão: um grande flagelo em muitos dos nossos solos! A chuva intensa e/ou prolongada, caindo em solos declivosos, nus ou pouco revestidos, podem causar a perda de muitas toneladas de solo/ha em poucas horas. (Fotos de Eugénio Sequeira)
Erosão em solos revestidos por:
S
Adaptado de: C. Alexandre / Protecção do solo na UE e em Portugal
Cereais Pastagem permanente
QUAL A SOLUÇÃO PARA O APROVEITAMENTO SUSTENTÁVEL DAS TERRAS MARGINAIS? -
Pastagens permanentes biodiversas e ricas em leguminosas complementadas por forragens anuais (PBRL&FBRL)
Fundamentos: Região mediterrânea é Centro de Origem de um grande numero de espécies de leguminosas pratenses e forrageira; a maioria destas espécies têm sementes duras
Leguminosas - capazes de fixar altas quantidades de N, ricas em proteína, ingestão elevada Biodiversidade – confere maior adaptação às variações de solo e clima, aumentando a produtividade e a persistência
Sistema::PBRL pastoreadas todo o ano, ocupam a maior parte da superfície forrageira; FBRL, para corte e
conservação, ocupando as melhores terras, eventualmente pastoreadas no Outono/Inverno, colmatam períodos de escassez quantitativa ou qualitativa das PBRL..
65-80% da superfície forrageira (SF) com PBRL utilizada em pastoreio
20-35% da SF com FBRL para corte e conservar, pastoreio eventual
UM MODELO EFICIENTE DE MELHORAMENTO DE PASTAGENS E CULTURAS FORRAGEIRAS DESENVOLVIDO PELO AUTOR A PARTIR DE 1965, NA EMP, ELVAS, COM:
- Elevada produção e qualidade da erva com base no uso de misturas biodiversas ricas em leguminosas
- Azoto necessário fixado pela simbiose Rhizobium /leguminosa (75-150 kg N/ha/ano)
- Baixo custo de estabelecimento e manutenção
O que são PBRL&FBRL?
Constituídas por misturas de varias espécies/cultivares de leguminosas, gramíneas
e/ou outras, anuais e perenes, de origem mediterrânea
• Formuladas de acordo com as características do solo (pH, textura, profundidade,
drenagem, etc.), clima (chuva anual e sua distribuição, temperaturas mínimas), e tipo de animais utilizadores
•Em cada mistura entra um largo número de espécies/cultivares, normalmente entre 10
e 20 nas pastagens permanentes, e 6 a 10 nas forragens anuais, escolhidos entre mais de 50 espécies e 150 cultivares. Algumas espécies contêm taninos condensados e possuem baixa capacidade metanogénica.
•As sementes de cada espécie de leguminosa que entra na composição de uma mistura
são previamente inoculadas com Rizóbio especifico a fim de maximizar a fixação simbiótica de N.
ESPECIES MAIS USADAS: Leguminosas anuais (sem ou com poucas sementes duras)
L. luteus L. albus
T. suaveolens T. incarnatum T. alexandrinum
Lathyrus spp.
P. sativum
T. squarrosum
L. angustifolius
V. villosa V. sativa
Leguminosas anuais de re-sementeira natural (c/sementes duras)
O. sativus
Medicago spp (9)
T. isthmocarpum
T. subterraneum (3ssp)
T. hirtum
O. compressus
T. resupinatum
B. pelecinus
T. vesiculosum T. michelianum
T. glanduliferum
Leguminosas perenes(com dormencia estival ou raiz profunda)
L. corniculatus H. coronarium T. fragiferum T. pratense T. repens
O. viciifolia M. sativa L. pedunculatus T. ambiguum
Gramíneas anuais
D. glomerata F. arundinacea L. L. perenne Ph.aquatica Bromus spp.
Outras- ricas em taninos e/ou sais minerais
Gramíneas perenes- com raízes profundas ou dormência estival
L. multiflorum A. strigosa A. sativa Triticumxsecale
P. lanceolata C. intybus S. minor
Associações entre plantas e microorganismos do solo Contribuem para melhorar a nutrição das plantas e a produção de forma sustentável Entre os microorganismos destacam-se os rizóbios e as micorrizas , que podem ser inoculados
Rhizobium
Micorrizas
Resposta a 2 processos de inoculação de sementes com rizóbio
Sem inocular Inoculação c/micorriza
Alguns pontos importantes para o sucesso das P&FBRL: 1 - Fertilização racional: -de acordo com a análise de terra 2- Sementeira cedo no Outono: temperatura do solo >12ºC; ideal>16 º C.
Fertilização: autosuficiente em N, mas requerendo
outros macro-nutrientes, particularmente P , eventualmente
tambem K, Ca, S, Mg, ou micro-nutrientes (Mo, B, Zn, Mn,
Cu, Fe, Co).
Pastadas durante todo o ano com encabeçamentos ajustados à
produção de erva.
3. MANEIO:
Construção e manutenção de um banco de sementes
Pastoreio intensivo no Verão Regeneração natural após as primeiras chuvas de Outono
Características das PBRL
- Mais produtivas e de excelente qualidade, com elevada ingestão, equilibradas em proteina/energia /minerais, contendo taninos condensados, ácido @-linolénico y vitaminas, com um papel importante na saúde animal e na qualidade do leite e da carne (ricos em Omega 3, Vitamina E, etc.) - Baixos consumos de energia fóssil: longa duração; estabelecidas com mobilização mínima do solo; utilizadas em pastoreio durante todo o ano; 65-80 % dos minerais contidos nas plantas são devolvidos ao solo através dos excrementos animais; por isso a sua manutenção necessita apenas de pequenas quantidades de fósforo (eventualmente também potássio). - Fotossíntese eficiente devido ao maior índice de área folhear e variados ângulos de intercepção da luz. - Maior absorção de nutrientes dos solo, devido a um sistema radicular mais denso e profundo. - Alem disso: Mais fertilidade e vida no solo, controlo da erosão , maior infiltração da agua no solo, menos inundações, melhor qualidade da agua, controlo dos arbustos invasores e dos fogos, melhores paisagens, maior biodiversidade do ecossistema, menor dependência de alimentos concentrados (importados, caros e com uma elevada pegada de carbono).
0,42
1,03
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
NP SBLRPP
Fonte: Projecto Agro 87 - "Pastagens Biodiversas Ricas em Leguminosas: uma alternativa sustentável para o uso de solos marginais”
Dry matter yields
CAPACIDADE DE CARGA (CN/ha/ano) (Media de 3 anos em 6 campos)
PRODUÇÂO DE ERVA, DE LEGUMINOSAS E DE MATÉRIA SECA DIGESTÌVEL (t MS/ha)
(Medias de 3 campos em 2 anos)
PRODUÇÂO, QUALIDADE E CAPACIDADE DE CARGA DAS PBRL (SBLRPP) Vs. PASTOS NATURAIS (NP)
Biodiversidade orientada: Chave para a adaptação às condições do solo e resiliência
às alterações climáticas (seca, inundação) Características determinantes: Plantas anuais: dureza seminal, duração do ciclo vegetativo, adaptação a condições do solo e clima
Plantas perenes: profundidade da raiz, dormência estival, adaptação a condições do solo e clima
ADAPTAÇÃO DE ALGUMAS ESPECIES ANUAIS DE RESEMENTEIRA NATURAL, USADAS NA COMPOSIÇÃO DE PBRL, A DIFERENTES PADRÕES DE CHUVA SEGUNDO A VARIAÇÃO DO COMPRIMENTO DO CICLO VEGETATIVO E A DUREZA SEMINAL DE ALGUNS DOS SEUS CULTIVARES (resultados obtidos na Herdade dos Esquerdos, Vaiamonte)
Germ.-floração Intervalo (dias) Grau de dureza
dias entre + precoce e +tardia seminal (0-10)
-Trifolium subterraneum (111-189)- 78 1-6
-Trifolium michelianum ( 128-187)- 59 4-6
-Trifolium resupinatum (161-196)- 35 3-4
-Trifolium vesiculosum (180-208)- 28 6-9
-Trifolium isthmocarpum (185-209)- 25 6-8
-Medicago polymorpha (114-184)- 70 6-9
-Medicago scutellata (104-133)- 29 7-9
-Ornithopus compressus (134-184)- 50 4-8
-Ornithopus sativus ( 148-191)- 43 1-6
-Biserrula pelecinus (133-184)- 51 7-9
ADAPTAÇÃO À SECURA Persistência (após 6 anos) de algumas espécies perenes
em sequeiro, no campo experimental da Fertiprado (Herdade dos Esquerdos, Vaiamonte)
Pluviosidade média - 590 mm, variando no período 2007-2013 de 303 to 726 mm
Leguminosas 2007 (nº de cvs. testados)
2013 (%
sobreviventes)
Gramíneas
2007 (Nº de cvs. testados)
2013 (%
sobreviventes)
Medicago sativa 16 100 Phalaris aquatica 4 100
Trifolium ambiguum 1 100 Festuca arundinacea 27 93
Trifolium fragiferum 2 50 Dactylis glomerata 17 70
Lotus pedunculatus 2 50 Lolium perenne 25 4
Lotus tenuis 3 33
Lotus corniculatus 4 25
Trifolium repens 13 0
ADAPTAÇÃO AO ENCHARCAMENTO
Exemplos de espécies resistentes: -Leguminosas: Lotus pedunculatus, Trifolium fragiferum, T. isthmocarpum, T. resupinatum, T. michelianum, T. subterraneum spp. yanninicum.
-Gramíneas: Holcus lanatus, Phalaris aquatica, Festuca arundinacea,
Lolium perenne
Todavia, as PBRL e as FBRL não só se adaptam às variações do solo e clima, mas têm também um efeito mitigador na mudança climática através da redução dos gases de efeito estufa:
1. O sequestro de anidrido carbónico atmosférico no solo: As PBRL podem sequestrar 3-12 t of CO2/ha/ano na camada de 0-10 cm do solo,
e 50-60% dessa quantidade na camada de 10-20 cm, os valores mais baixos verificam-se nos solos com pastos mais velhos, com um teor em matéria organica acima de 4%.
As FBRL, ainda que menos eficientes no sequestro de carbono (por serem anuais e usadas principalmente por corte para produzir forragem conservada), se semeadas com mobilização mínima do solo, podem também sequestrar quantidades significativas de CO2 atmosférico.
2. A substituição de adubos azotados pela fixação simbiótica de N atmosférico (leguminosa /Rhizobium):
Cada kg de N prodzido industrialmente envolve uma emissão de 8 kg CO2 para a atmosfera. As PBRL, quando comparadas com pastos naturais, podem aumentar a fixação de N de 60-135 kg de N/ha/ano, o que corresponde a uma redução de emissões de CO2 variando de 480 a 1080 kg/ha/ano.
Sequestro de carbono no solo através das PBRL:
• Raízes mortas (a maioria das espécies são anuais de re-sementeira) • Caules senescentes , folhas, e pasto não consumido • Excrementos dos animais
• Elevam o nível da matéria orgânica do solo (MOS), aumentando-lhe a fertilidade e actuando como sumidouro de carbono
Alguns resultados de sequestro de carbono na camada superficial de solo de 0 a 10 cm: (SBLRPP vs. NP)
Tipo de Variação Sequestro
mobilização Média Médio
do solo Anual de Carbono
(%/ano) (t CO2/ha/ano)
2001 2002 2003 2004
Mobilização Natural 1,10 1,20 1,20 1,33 0,08 2,38
Tradicional PBRL 0,55 0,83 1,14 1,60 0,35 10,42
Mobilização Natural 0,84 1,06 1,10 1,45 0,20 5,95
Mínima PBRL 0,80 1,40 1,54 2,08 0,43 12,80
Matéria Orgânica do Solo (%)
Evolução
Tipo de
pastagem
Fonte: Projecto Agro 74, Portugal.
Variação espacial do carbono orgânico no solo de um montado revestido com uma PBRL de 26 anos de idade , em 2 camadas (0-10 e 10-20 cm), com o aumento da distancia ao tronco das arvores (Fonte: Projecto Valmont, 2008)
Some Results on Carbon Sequestration
Tipo de
pastagem
Idade da
pastagem
(anos)
MOS
%
MOS
aumento
%
Equiv.CO2
Sequestrado
t/ha/ano
Ano de
Estabelecimento 0 0.95 -
PBRL 15 3.87 2.92 6.03
PBRL 30 4.37 3.42 3.53
PN 30 2.95 2.00 2.06
INFLUÊNCIA DA IDADE DA PASTAGEM NO SEQUESTRO DE CARBONO
COMPARAÇÃO DE PBRL COM PASTAGEM NATURAL (PN)
(CAMADA DE SOLO DE 0-10 cm)
FONTE: Adaptado do Projecto FCT (PTDC/AGR-102369/2008), Portugal
A CONCLUIR: De 1966 até hoje foram estabelecidos mais de meio milhão de ha de
PBRL, dos quais a quase totalidade em terras marginais degradadas, não só em Portugal, mas também em Espanha e Itália, das quais a maior parte persiste, apesar de terem já suportado vários anos de secas prolongadas, mostrando assim uma elevada RESILIENCIA ÀS VARIAÇÕES CLIMÁTICAS, bem como a algumas incorrectas acções de manejo. TAIS PASTAGENS SÃO RESPONSAVEIS PELA RECUPERAÇÃO DE MUITOS MILHARES DE HECTARES DE SOLOS POBRES, ao mesmo tempo que contribuem para mitigar os efeitos do aquecimento climático através do sequestro anual de mais de 2 Mt de CO2, contribuindo assim para mitigar os efeitos do aquecimento global.
N.B. – A pastagem da foto foi estabelecida em 1979, num solo muito pobre em matèria orgânica e nutrientes, encontrando-se ainda hoje em excelentes condições de produtividade, não obstante ter suportado já 4 grandes secas.
Muito obrigado
pela vossa atenção!!!
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