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A EDUCAÇÃO COMO PROCESSO DE AQUISIÇÃO
DO CONHECIMENTO SISTEMATIZADO
Profª Rita de Cascia Aparecida de Souza Licks1
Para pensar e sentir, para saber e querer,
agir ou avaliar é preciso aprender,
o que implica o trabalho escolar.
Demerval Saviani
Cada época traz consigo peculiaridades e exigências impostas pela
sociedade, quais sejam econômicas, sociais, políticas ou culturais. Tais exigências
recaem sobre a escola cobrando desta uma postura diante das novas demandas.
Dos profissionais da educação são cobradas capacidades técnicas, relacionais,
novos modos de pensar e agir, bem como capacidade para enfrentar e mediar
situações conflituosas.
Cada sociedade, ao longo da História, idealizou uma escola que fosse capaz
de transmitir a cultura elaborada, de maneira sistematizada a seus membros. Ao
longo do tempo, porém, pode se perceber que a escola, instituição que deveria estar
a serviço da formação humana, encontra-se a serviço do atendimento dos interesses
de grupos detentores do poder econômico e político, que vão moldando esta escola
de acordo com os seus interesses, estejam estes nas esferas política ou econômica.
Todavia, a instituição escolar, conforme Saviani (2008a), não apenas sofre as
influências da sociedade como também a influencia, pois ao serem determinadas as
diretrizes que a educação deve seguir, ocorre também uma reação a essa
1 Material Didático elaborado sob orientação da Profa. Dra. Marta Sueli de Faria Sforni – Universidade Estadual
de Maringá.
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determinação, porquanto a educação também interfere na sociedade, atuando
inclusive, na sua transformação.
Para se pensar a educação de forma mais ampla e não apenas vinculada às
necessidades mais imediatas de cada momento histórico, é preciso perguntar:
Porque a educação é necessária ao homem? Quais seriam as finalidades da
educação?
Como instituição criada com a finalidade de transmitir a cultura, a escola
necessita sistematizar o conhecimento científico, de forma a torná-lo acessível ao
maior número de pessoas, graduando-o e dosando-o, conforme vai ocorrendo a sua
aquisição por parte dos alunos, ou de acordo com os níveis de ensino.
FINALIDADES DA EDUCAÇÃO
O homem é um ser epistêmico, isto significa que está sempre em busca do
conhecimento e também do conhecimento sobre o mundo e sobre si próprio e este é
um movimento contínuo. No empreendimento dessa busca, vai construindo,
elaborando e reelaborando o conhecimento, porém não o faz isso sozinho, mas
relacionando-se com os outros membros da sua espécie. Mas ele não faz essa
busca ao acaso, essa necessidade advém de uma base material. De acordo com
Saviani (2008a, p.11), “ao produzir continuamente sua própria existência, adapta a
natureza a si através do trabalho, diferentemente dos outros animais”. É necessário
compreender que, por trabalho, não se pode imaginar qualquer atividade, mas uma
atividade revestida de “uma ação intencional, visto que possui método ou ação
adequada em busca de uma finalidade específica”. Da necessidade de suprir e
manter a própria existência vai realizando descobertas, invenções, vai construindo e,
“produzindo-se historicamente”, segundo Nereide Saviani (2009), “através da
educação”. O conhecimento que é produzido por uma geração, não se perde, mas
acumula-se como experiência que é passada para as gerações mais novas. Até
certo nível de desenvolvimento da sociedade, essa experiência social
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(conhecimento) era menor e mais simples, o que permitia que fosse passado às
novas gerações durante a realização das atividades às quais estavam vinculadas.
Sem a necessidade de um local específico para se transmitir esse conhecimento.
Por exemplo, o homem foi produzindo conhecimento sobre a melhor época para o
plantio, a melhor forma de plantar, cultivar e colher determinados produtos. Esse
conhecimento era passado aos novos membros da espécie à medida que eles
passavam a observar e participar dessa atividade.
No entanto, conforme o homem vai ampliando o conhecimento sobre a
realidade, esse saber torna-se mais complexo, e a sua apropriação não é mais
possível apenas por meio da observação e participação na atividade em que ele
está inserido. Voltando ao mesmo exemplo acerca do conhecimento agrícola, o
homem buscou formas para se produzir mais e melhor, no menor tempo. Um dos
conhecimentos que produziu foi a criação de técnicas que permitem a modificação
genética das plantas, é possível modificar geneticamente frutas para que se
mantenham frescas por mais tempo, cereais que tenham maior teor vitamínico. Mas
o fato de alguém observar o cultivo dessas frutas ou desses cereais não faz com
que ele domine esse conhecimento, já que ele não é facilmente captado pelos
sentidos. Os conhecimentos acerca dessa técnica envolvem outros conhecimentos
biológicos, químicos e físicos, que não são captados a olho nu.
Para dominar essas técnicas são necessários momentos especiais de
aprendizagem, locais que tenham como função transmitir esse conhecimento às
novas gerações. Ou seja, é preciso que haja uma instituição social exclusivamente
voltada para essa finalidade – escolas e universidades.
Com esse exemplo, queremos destacar que a transmissão cultural de uma
geração a outra, ou seja, a educação, sempre existiu e ela é a responsável pelo
desenvolvimento da humanidade, pois caso não houvesse essa transmissão, cada
homem começaria sua vida “da estaca zero” e a humanidade estaria ainda na Idade
da Pedra. Então, a transmissão cultural é algo que acompanha o homem desde os
primórdios de sua existência. Já a escola, não. A escola somente passa a ser
necessária quando a aprendizagem dos conhecimentos já produzidos não pode ser
feita de forma direta pela observação e participação na atividade em que ele está
presente. À medida que os conhecimentos (a cultura) tornam-se mais complexos,
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mais elaborados, faz-se necessário um local específico para ensinar e aprender.
Esse local passa a ser o lócus principal da transmissão cultural de uma geração à
outra.
Outros exemplos podem ser pensados para ilustrar essa situação. Pensemos
na forma de comunicação entre as pessoas. Enquanto a forma de comunicação era
apenas oral, bastava conviver com as pessoas que compartilhavam a mesma língua
para que houvesse a transmissão dessa forma de comunicação. No entanto, a
situação muda com o surgimento da linguagem escrita, pois ela é mais complexa
que a linguagem oral, não se aprende a escrever apenas mediante a observação e a
participação em situações que envolvem a atividade escrita. Basta observar que
vivemos em uma sociedade em que há escrita em tudo, no entanto, isso não é
suficiente para que todos dominem esse código. Para aprender a escrita faz-se
necessário um tempo e uma intervenção orientada para essa aprendizagem, faz-se
necessário uma instituição que exerça essa função de transmitir esse conhecimento
às novas gerações.
O surgimento da escola, como instituição, vem em resposta à necessidade do
homem de transmitir aos seus pares e às gerações vindouras, todo conhecimento
produzido.
Essa é a finalidade geral da escola, porém, ela nem sempre foi destinada a
todos, nem igual para todos. Como ela é responsável pela transmissão do
conhecimento, nas sociedades divididas em classes sociais, sempre houve um
controle sobre quem merecia ou deveria ter acesso ao conhecimento e a quais
conhecimentos. Por exemplo, mesmo que a sociedade já se comunicasse via
linguagem escrita, o que pressupunha que todos os membros das novas gerações
pós-criação dessa forma de comunicação poderiam e deveriam ter acesso a esse
conhecimento, isso não acontecia, pois apenas algumas pessoas dominavam esse
código, o que conferia a esses, maior poder sobre os demais. Isto é, nas sociedades
de classe, o conhecimento não é distribuído igualmente, mas é utilizado como mais
um instrumento de poder para a manutenção da sociedade.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado a outros conhecimentos. Há grande
conhecimento científico produzido e que poderia e deveria ser transmitido a todos,
no entanto, isso não acontece. Assim, a modificação genética das plantas,
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recorrendo ao exemplo já citado, não fica nas mãos da população, dos agricultores,
mas é transmitido apenas àqueles que têm acesso a boas escolas e universidades e
que depois colocam o seu conhecimento a serviço das grandes empresas que
comercializam sementes, herbicidas ou a própria produção agrícola, ampliando seu
poder sobre a produção agrícola de regiões, países e até continentes. Como
exemplo dessa prática pode-se citar a transgenia aplicada às sementes.
Voltando um pouco na História, sabemos que durante a Idade Média, a
destinação da escola era para aqueles homens que dispunham de tempo ocioso,
visto que não necessitavam trabalhar para se manter, conforme Saviani (2008b). A
escola, portanto era destinada para poucos, e apenas como modalidade de
educação complementar, pois a principal modalidade de educação era o trabalho,
que era a ocupação da maior parte da população que necessitava garantir sua
sobrevivência e a de seus senhores, lavrando e cultivando a terra,
conseqüentemente, se educando nos limites do seu trabalho.
Com o advento da era moderna, os meios de produção mudaram e o homem
começou a estabelecer outras relações de trabalho. A terra, que até então, era o
principal meio de produção passa a dividir espaço com a cidade e a indústria,
surgindo então um novo agrupamento de pessoas que vai migrando do campo para
as cidades.
Com tal migração e o advento das cidades, as relações humanas vão
começando a se estabelecer em outras bases, pautadas nas exigências comerciais
e industriais. Nessa nova organização do trabalho, há necessidade de que alguns
conhecimentos sejam de posse de todos. A educação, que até então era um
privilégio para poucos, torna-se uma exigência, surgindo então uma escola básica
de caráter universal, visando à socialização de conhecimentos básicos como o
domínio da leitura, a escrita e a aritmética. O que era até então, um privilégio de
poucos, passa a ser uma necessidade, pois se faz necessário disseminar o
conhecimento para um número maior de indivíduos, para que esses possam atuar
como trabalhadores e consumidores nessa nova ordem social.
Pode-se afirmar que a escola como instituição fundamental para a
transmissão de conteúdos mais complexos para todos os homens, não cumpre essa
função em todo o seu significado, a sua ação passa a ser regulada, controlada pelo
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Estado, e esse atende aos interesses da classe que mantém o poder econômico.
Assim, a escola acaba por atender às necessidades de produção de mão de obra e
de reprodução dos ideais da classe que detém o poder político e econômico.
Ao observarmos isso, percebemos que quando falamos em escola, há duas
formas de abordá-la: a) do ponto de vista do desenvolvimento humano de forma
geral, atendendo ao significado social com que foi criada; b) do ponto de vista dos
interesses econômicos e políticos de uma classe social que está no poder,
atendendo o que a sociedade de classes espera da escola.
A perspectiva que se tem para a formação que a escola deve oferecer não é a
mesma para A e B. Daí porque disputam no meio educacional diferentes propostas:
educação para o empreendedorismo; educação voltada para a cultura local;
educação tecnológica; educação para o desenvolvimento da criatividade, para a
solidariedade, para a cidadania, para a preservação do meio ambiente, para o
acolhimento social... e também propostas educacionais voltadas para a apropriação
de conhecimentos por todos os sujeitos em nível e qualidade igual para todos, como
direito a participação de cada um no que foi produzido por toda a humanidade. Cada
uma destas propostas defende uma função para a escola, sendo que a maior parte
delas defendendo novas funções para a escola que se distanciam daquela que seria
o seu significado social mais amplo. Muitas das defesas de que a escola deve
assumir novas funções está dirigida à escola pública, a escola para a população
trabalhadora com menor poder aquisitivo, pois a escola da elite continua sendo
aquela que procura trabalhar com os conteúdos clássicos das ciências, oferecendo
uma formação científica e cultural ampla.
Pelo exposto até aqui é possível dizer que há “a escola” com a sua função
geral e há “o que se faz com a escola” no interior da sociedade de classes.
Trataremos, neste texto, da escola de um modo geral, daquela que não tem
compromisso com a reprodução dos interesses e necessidades da classe que detém
o poder econômico e político, mas que tem compromisso com o desenvolvimento de
todos os homens de forma geral.
Nessa perspectiva de formação, a educação deve ser responsável pela
socialização do saber elaborado e o local privilegiado para que isso ocorra é a
escola, pois para a maioria da população, é na escola que se pode ter o acesso ao
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conhecimento elaborado cientificamente, pois segundo Nereide Saviani, “a
especificidade da educação escolar” estaria em “sistematizar o conhecimento,
possibilitando sua apropriação, e isso exige raciocínio, método, regularidade,
sistematicidade, próprios do pensamento científico teórico”. (Saviani, 2003, p.93),
Quais seriam, portanto, as finalidades da educação?
As finalidades da educação, conforme a autora, não se restringem ao âmbito
da aquisição de conhecimentos pura e simplesmente, mas transcendem esses
limites, pois à medida que o homem adquire conhecimentos sobre o mundo e sobre
si próprio, vai adquirindo uma melhor compreensão do mundo, superando
superstições, preconceitos, conjugando seus interesses com os da coletividade.
Conforme Saviani (2008a, p.15), “é a exigência de apropriação do
conhecimento sistematizado por parte das novas gerações que torna necessária a
existência da escola”. Para além das expectativas e pressões da sociedade, tal
necessidade é ainda melhor justificada no sentido de que não basta a existência de
qualquer escola ou educação, mas uma educação organizada a partir da
sistematização do conhecimento e uma escola em que os alunos possam, contando
com bons professores, ir além dos limites do senso comum, tornando-se sujeitos da
própria aprendizagem.
Para que esta escola seja possível, torna-se necessário refletir sobre o
currículo, a própria escola e a atividade docente. Para se alcançar os resultados
pretendidos de promoção humana e social, via escolarização, que são os ideais de
quem compartilha dessa perspectiva de formação, é preciso reflexão, discussão e
principalmente, estudo.
CONHECIMENTO OU INFORMAÇÃO?
Quando nos deparamos com esses dois vocábulos inseridos nos mais
diversos tipos de texto, sejam eles escritos ou não, percebemos que há uma quase
involuntária aceitação de um pelo outro, como se estivéssemos tratando de
sinônimos. Ao aprofundarmos, porém, um pouco mais o significado de ambos,
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percebemos que informação nada mais é do que “esclarecimento” ou “explicação”,
enquanto conhecimento está definido como “ciência”.
A informação não nos garante discernimento, pois o crescente acesso a ela,
muitas vezes feito de maneira aleatória ou sem critérios, significa muitas vezes que a
sociedade e seus movimentos, apenas estão mais expostos, o que não deixa de ser
positivo, se considerarmos que podemos perceber as várias nuances dessa
sociedade, porém sem o conhecimento, não se pode discernir a respeito dos limites
existentes entre o real e o que pode ser objeto de manipulação.
Partindo dessas definições, de imediato pode-se perceber que, a existência
da escola não pode prestar-se a apenas informar e esclarecer. Essa existência não
pode justificar-se senão pelo seu propósito de tornar o conhecimento acessível a
todos, uma vez que a informação, atualmente, já é acessível mediante os mais
diferentes meios e em “tempo real”.
O papel da escola como responsável pela transmissão dos conhecimentos
revela uma tarefa importantíssima e até urgente, qualificar os profissionais que nela
atuam. É na capacitação destes profissionais que reside a maior urgência, afinal, o
aumento vertiginoso de conhecimentos a que a humanidade teve acesso nas últimas
décadas, traz novas proposições e desafios para a educação.
A escola, local onde o currículo ganha forma, deve considerar o contexto
histórico e político, pois segundo Sacristan (2005, p.15) “o currículo é uma práxis.
Ele traz em seu arcabouço os anseios da sociedade, as suas práticas, a sua história
e seus costumes.” Diante dessa afirmação, impõe-se a necessidade de selecionar-
se o que é mais importante ensinar, sem perder a referência da totalidade, e sem
correr o risco de apegar-se a temas sem relevância para o aprendizado. Há que se
definir ainda, sob que concepções de mundo, de homem e de sociedade é que se
vai interpretar o fenômeno educativo, conforme já afirmamos anteriormente.
Berman, apud Saviani (1998, p.100), afirma que “as disciplinas acadêmicas
reconsideradas inspiram muita esperança nos programas escolares, especialmente
porque capacitam a pessoa a compreender o conhecimento futuro, bem como o
passado e o presente”.
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Portanto, por mais que atualmente várias informações estejam disponíveis,
para poder interagir com elas, de forma esclarecida, é necessário que o sujeito
tenha conhecimentos mais profundos e esses não são adquiridos de forma simples,
mas por meio de uma sólida formação escolar.
SABER POPULAR E SABER ESCOLAR
O saber popular é resultado da necessidade de se resolver os problemas
cotidianos, portanto não traz, necessariamente, na sua gênese o planejamento
sistematizado ou o estudo. Esse saber vai acontecendo na medida em que vão
surgindo as situações, seguindo a ordem dos acontecimentos. A espontaneidade é
uma de suas principais características, ou seja, conforme as experiências vão tendo
resultados positivos ou negativos são incorporados ou não ao cotidiano e
repassados de um indivíduo para outro e de uma geração para a outra,
sucessivamente.
O saber popular é assistemático, portanto independe de método e é conferido
pela familiaridade que se tem com os objetos, geralmente é conhecimento adquirido
no meio familiar. Esse conhecimento é resultado de suposições e de experiências
pessoais.
Ao determos a atenção nos enunciados e nas afirmações resultantes desse
tipo de saber, verificaremos que se referem à experiência imediata sobre os
fenômenos observados ou mesmo sobre os acontecimentos, o que lhes confere
grande limitação, pois dificilmente podem ser generalizados. Geralmente vinculado a
conhecimentos fragmentados e voltado para a solução de situações de ordem
prática e imediatas, apresenta baixo poder de crítica o que contribui para manter o
sujeito que dele lança mão para explicar os acontecimentos, como um expectador
passivo da realidade, incapaz de interferir nesta.
O poder de revisão e de crítica do senso comum é frágil e contribui, segundo
Köche (1997, p.27), para elevar a sua dependência das crenças e convicções
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pessoais. Pode-se afirmar, portanto, que a aceitação do senso comum, ou saber
popular, dificulta a revisão de conceitos, perdurando a ponto de impedir certos
avanços científicos, como se tem visto através da História.
O saber escolar por sua vez, é fruto do trabalho científico.
O conhecimento científico como um bem da humanidade, não é plenamente
acessível a todos. Possui as especificidades próprias de cada ramo da Ciência, bem
como história e metodologias próprias. Como Ciência, seria inacessível para a
imensa maioria, se levarmos em consideração que cada ser humano traz consigo
inclinações próprias para essa ou aquela área do conhecimento, uns possuindo
grande facilidade para as ciências exatas enquanto outros seriam mais inclinados
para as ciências humanas. Assim, para tornar a ciência acessível a todos é
necessário dar a ele um tratamento didático, transformá-lo em saber escolar.
O saber elaborado, segundo Saviani (1998, p.59), “deve ser devidamente
dosado e seqüenciado (convertido em “saber escolar”) deve ser socializado,
mediante um processo pedagógico metódico, sistemático, que inclui as experiências
do cotidiano sem a elas se restringir”.
Pode-se afirmar, em suma, que esse é o trabalho docente: dosar, seqüenciar
o saber, e devido à natureza desse trabalho, não pode prescindir da reflexão
permanente, tanto teórica a respeito da área do conhecimento que lhe é pertinente,
quanto da reflexão a respeito da sociedade, do seu tempo e de seus alunos.
Em síntese, uma escola que tem como finalidade a formação integral dos
estudantes, tem o compromisso com o conhecimento e não apenas com a
informação, com o conhecimento científico e não com o saber popular ou de senso
comum. Esses são os conteúdos fundamentais que a escola não pode perder, caso
não queira perder a sua função de promover o desenvolvimento dos alunos. Mas é
preciso pensar também em como tornar esse conhecimento acessível aos alunos.
Segundo Sforni (2010, p.101) “a abordagem histórico cultural tem oferecido
subsídios para a compreensão do papel da aprendizagem escolar como promotora
do desenvolvimento psíquico dos estudantes”, parecendo-nos essa a principal,
quando não única, via de acesso à formação humana. Nessa concepção considera-
se que o aluno só pode ser sujeito da sua aprendizagem se estiver em situações de
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interação que promovam essa possibilidade de formação, ou seja, o aluno não é o
único responsável pela sua aprendizagem, mas a mediação do professor é essencial
para que ela ocorra.
Pensar o currículo e refletir sobre a atividade docente, são atividades
inerentes ao trabalho pedagógico. Para alcançar os resultados pretendidos de
promoção humana e social, via a escolarização, que, como já afirmamos, são os
ideais de todos aqueles que compartilham da idéia de essa e a função da escola
pública, necessário se faz a reflexão, a discussão e principalmente, o estudo.
Selecionamos alguns textos que podem auxiliar o coletivo escolar a estudar,
refletir e buscar caminhos para a atuação profissional que caminhe na direção de
uma educação que cumpra essa finalidade.
Texto 1:
Para que servem as escolas? Michael Young
O autor indica ser o questionamento que dá título ao texto, algo comum a
professores e pais de alunos, porém as razões e pontos de vista da família e dos
educadores não são as únicas justificativas para tal questionamento, afinal, desde a
década de 1970, sociólogos e educadores questionam a escola expondo uma visão
negativa a respeito da mesma. Young discorre sobre a escola enquanto instituição
cujo propósito específico é garantir a aquisição do conhecimento científico, sendo
tal propósito negligenciado pelas decisões políticas, pesquisadores e sociólogos da
educação. Demonstra como a escola vem sendo objeto de adequação às
necessidades econômicas que pressionam por resultados, por metas. Faz
importante esclarecimento sobre o conhecimento, cuja transmissão é
responsabilidade da escola, destacando esse conhecimento como poderoso,
diferenciado, portanto do “conhecimento dos poderosos”. Tal diferenciação remete a
uma ligação entre as expectativas emancipatórias associadas à expansão da
escolaridade e a oportunidade que as escolas dão aos alunos de adquirir o
“conhecimento poderoso”, o que raramente é acessível em casa.
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Texto 2:
Apropriação de instrumentos simbólicos: implicações para o desenvolvimento
humano.
Marta Sueli de Faria Sforni
Maria Terezinha Bellanda Galuch
As autoras oferecem dados importantes sobre os resultados dos exames
oficiais de avaliação, como Prova Brasil, SAEB e PISA, cuja análise aponta para
uma preocupação antiga de educadores e pesquisadores de que a escola brasileira
não tem garantido satisfatoriamente o acesso aos conhecimentos sistematizados. O
baixo desempenho dos alunos, a despeito de ser um incômodo para a sociedade,
não indica uma compreensão a respeito do impacto social de uma escolarização de
baixo nível. Para as autoras, tais resultados são reveladores, pois indicam estarem
em conformidade com as demandas imediatistas da sociedade capitalista, pois o
baixo rendimento escolar dos estudantes está vinculado diretamente com o ensino
que lhes tem sido oferecido nas instituições escolares.
Texto 3:
A função docente e a produção do conhecimento
Demerval Saviani
O autor relaciona a produção do conhecimento nos alunos ao domínio do
conhecimento pelo professor. Se almeja-se que os alunos aprendam conceitos
matemáticos, o domínio desses conhecimentos matemáticos são necessários ao
professor.
Enfatiza que o professor não apenas necessita dominar os conhecimentos
específicos de sua disciplina, mas também dominar os processos e as formas por
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meio dos quais tais conhecimentos se produzem no âmbito do trabalho pedagógico
que é desenvolvido no interior da escola.
Saviani destaca as duas modalidades básicas de conhecimento necessário
para que o professor cumpra sua função docente: o conhecimento curricular e o
conhecimento dos processos, das formas, através dos quais os conhecimentos
curriculares vão sendo produzidos, de acordo com a seqüenciação e dosagem.
Acrescenta ainda como questão essencial na formação do educador, além do
domínio dos processos pedagógicos, ou seja, das formas como os conhecimentos
são organizados e trabalhados na escola, o conhecimento dos fundamentos da
educação, ou saber pedagógico, que são conhecimentos produzidos pelas ciências
da educação e sintetizados nas teorias educacionais que definem, segundo sua
época e seu contexto, as diretrizes da tarefa educativa.
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REFERÊNCIAS
KÖCHE, José Carlos. Fundamentos de metodologia científica: teoria da ciência e prática da pesquisa. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 1997
SACRISTAN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3 ed. Porto Alegre, Armed, 2005.
SAVIANI, Demerval. Pedagogia Histórico-Crítica. 10 ed. Revista. Campinas, SP. Autores Associados, 2008a.
________________. História das Idéias Pedagógicas no Brasil. 2 ed. Campinas, Autores Associados, 2008b.
SAVIANI, Nereide. Saber Escolar, Currículo e Didática: problemas na unidade conteúdo/método no processo pedagógico. 2. Ed. Campinas, SP. Autores Associados, 1998.
SFORNI, Marta Sueli de Faria. Perspectivas de formação, definição de objetivos, conteúdos e metodologia de ensino: Aportes da Abordagem Histórico Cultural. Cadernos Pedagógicos SEED. Organização do Trabalho Pedagógico. Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná, 2010.
YOUNG, Michael. Para que servem as escolas? Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n.101, p. 1287-1302, set/dez. 2007. Disponível em <HTTP://www.cedes.unicamp.br>
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