UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU – FURB
CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO – CCE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
TIAGO CONTESINI VINOTTI
PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA E PROFESSORES ALFABETIZADORES:
ENTRE DIÁLOGOS E SABERES
BLUMENAU
2011
TIAGO CONTESINI VINOTTI
PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA E PROFESSORES ALFABETIZADORES:
ENTRE DIÁLOGOS E SABERES
BLUMENAU
2011
Dissertação apresentada como requisito parcial
à obtenção do título de Mestre em Educação, ao
Programa de Pós- graduação em Educação,
Centro de Ciências da Educação, da
Universidade Regional de Blumenau – FURB.
Orientadora: Profa. Dra. Otilia Lizete de
Oliveira Martins Heinig
Aos meus pais, Ifigenia e Ademir
pelo apoio nunca negado e
confiança depositada.
E à Mari que soube me
mostrar o caminho do amor.
AGRADECIMENTOS
A DEUS em primeiro lugar, pela saúde, sabedoria, enfim, pela vida.
Aos meus pais, Ifigenia e Ademir, que sempre confiaram no filho.
Ao Vô Primo (in memorian) que infelizmente não desfrutará este momento.
A Marinaide, pela paciência, pelo amor, carinho, compreensão e por acreditar na minha
capacidade.
Ao Nério, Marise e Vanessa, que me permitiram entrar em suas vidas e sempre acreditaram
em mim.
Aos amigos queridos Laércio, Alinor e Abdul, pela companhia agradável durante este
período, que ficarão para sempre na memória.
À Prof. Otília, por confiar no seu orientando, pelas caronas, pelas conversas, orientações e
pela amizade criada.
Ao Prof. Osmar, por proporcionar discussões sempre em alto nível sobre futebol, e que
aceitou participar da banca de qualificação e da banca de defesa.
À Prof. Maristela, pela elegância nas colocações, e claro, pela sabedoria das mesmas.
Ao Prof. Lamar, que aceitou participar da banca de qualificação e da banca de defesa, além de
ser também um grande admirador do basquetebol.
Ao Prof. Isaac Ferreira, que tive o prazer de conhecer numa tarde de terça-feira, quando
esteve na Unifebe, e que aceitou o convite para a banca de defesa.
À Jociane, pela parceria nas orientações, pelas dicas, ideias.
Aos demais colegas do grupo/linha Linguagem e Educação.
Às secretárias do PPGE, pelo profissionalismo, sempre com o sorriso estampado no rosto.
A Vera da SDR/GERED, que disponibilizou os dados dos sujeitos num primeiro momento.
Ao casal de amigos Alisson e Ellen, que lá de São Paulo me ajudaram no Estado da Arte.
Aos sujeitos desta pesquisa, pela disposição, pelo comprometimento, pelo atendimento.
E àqueles que indiretamente ou mesmo diretamente participaram desta pesquisa, mas que
faltam à memória.
“Esse nosso grupo é maravilhoso!”
(Otilia)
RESUMO
Esta pesquisa, vinculada ao grupo Linguagem e Educação, do Programa de Pós-Graduação
em Educação/ Mestrado em Educação da Universidade Regional de Blumenau – SC, Brasil,
tem como tema central a relação entre Educação Física e alfabetização. A pergunta que
norteia esta pesquisa é: Quais as relações entre saberes docentes dos profissionais da
Educação Física e dos alfabetizadores acerca da alfabetização? O objetivo geral estabelecido é
compreender as interfaces dos diferentes saberes docentes que circulam nos anos iniciais no
que se refere à alfabetização e à Educação Física. Como objetivos específicos foram
estabelecidos: desvelar o discurso sobre a alfabetização que perpassa a fala dos sujeitos
professores de Educação Física e dos alfabetizadores; analisar as relações entre alfabetização
e Educação Física expressas nos discursos dos professores e nos documentos oficiais;
compreender a trajetória de construção de saberes docentes acerca do que é alfabetizar. Para
isso, elaborou-se uma entrevista narrativa que foi realizada com os sujeitos, professores
efetivos da rede estadual de ensino de Santa Catarina, selecionados a partir de critérios
previamente estabelecidos. Os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Propostas Curriculares
de Santa Catarina após o ano de 1998 constituem também objeto de pesquisa. Esta dissertação
é uma pesquisa qualitativa de cunho interpretativo e ancora-se no viés enunciativo, nos
estudos de Bakhtin, que compreende a linguagem e o sujeito como sociais e nos autores que
tratam da Educação Física, (Le Boulch; Barbanti; Betti) e sobre a alfabetização (Soares;
Kleiman). Os resultados apontam para: 1) desejo de uma maior aproximação entre as áreas; 2)
um discurso semelhante entre os professores; 3) há um silêncio quanto aos documentos
oficiais.
Palavras-chave: Educação Física. Alfabetização. Saberes Docentes. Sentidos. Diálogos.
ABSTRACT
This research is bound to the group of Language and Education, from the Education Post-
Graduation/Master Program in Education of the “Universidade Regional de Blumenau” – SC,
Brazil, it has as main theme the relationship between Physical Education and Beginning
Reading Instruction. The question that guides this research is: What the relationship between
of the professionals of Physical Education teacher knowledge and beginning reading
instruction tutors? The general objective established is understand the interfaces of the
different teacher knowledge that surrounds the initial years referring to beginning reading
instruction and Physical Education. The specific objectives were the following: unveil the
speech about the beginning reading instruction that passes through the speech of the subjects
Physical Education teachers and the beginning reading instruction tutors; analyze the
relationship between beginning reading instruction and Physical Education expresses in the
speech of the teachers and the official documents; understand the way of teacher knowledge
construction about what is literate. For that, a narrative interview was drew up that was
realized with the permanent subject teachers of “Santa Catarina” state net, selected from the
previously established criteria. The “Parâmetros Curriculares Nacionais” and the “Proposta
Curricular de Santa Catarina” after 1998 are also the object of research. This dissertation is a
qualitative research with interpretative focus grounded in the enunciative theory and in
Bakhtin‟s studies which understand language and the subject as social beings and the authors
that treats the Physical Education, (Le Boulch; Barbanti; Betti) and about literacy (Soares;
Kleiman). The results indicate for: 1) desire of a closeness between the fields; 2) a similar
speech between teachers; 3) there is a silence about the official documents.
Key words: Physical Education. Beginning Reading Instruction. Teacher Knowledge. Senses.
Dialogues.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 11
1.1 OS CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS: O ESTADO DA ARTE........................ 13
1.2 CONTORNOS METODOLÓGICOS.................................................................. 17
1.2.1 A BUSCA PELOS SUJEITOS............................................................................ 21
1.2.2 O INSTRUMENTO DE COLETA...................................................................... 23
2 A EDUCAÇÃO FÍSICA NO CONTEXTO HISTÓRICO E SUA
INTRODUÇÃO NO ENSINO NO BRASIL....................................................
25
2.1 EDUCAÇÃO FÍSICA – UMA HISTÓRIA EM POUCAS PALAVRAS........... 25
2.2 O QUE DIZEM OS PCN‟S SOBRE A EDUCAÇÃO FÍSICA........................... 33
2.3 A EDUCAÇÃO FÍSICA NA PROPOSTA CURRICULAR DE SANTA
CATARINA.........................................................................................................
38
3 ALFABETIZAÇÃO: ALGUNS SENTIDOS A PARTIR DE
DOCUMENTOS OFICIAIS.............................................................................
44
3.1 UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO........................................................... 44
3.2 ALFABETIZAÇÃO: ENTRE AS APRENDIZAGENS E AS PRÁTICAS
SOCIAIS..............................................................................................................
48
3.3 A ALFABETIZAÇÃO NOS PCN‟S................................................................... 57
3.4 A ALFABETIZAÇÃO NA PROPOSTA CURRICULAR DE SANTA
CATARINA.........................................................................................................
60
4 APROXIMAÇÕES DIALÓGICAS NO DISCURSO DOS
PROFESSORES.............................................................................................
65
4.1 O TEMPO DE SERVIÇO, A FORMAÇÃO DOCENTE E A
INTERDISCIPLINARIDADE............................................................................
66
4.2 O PAPEL DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA VOZ DOS SUJEITOS..................... 75
4.3 A ALFABETIZAÇÃO NAS MÚLTIPLAS VOZES.......................................... 86
4.4 ENTRE SILÊNCIOS E CONTRAPALAVRAS: SENTIDOS NA
DOCÊNCIA.........................................................................................................
92
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 95
REFERÊNCIAS............................................................................................................... 98
ANEXOS........................................................................................................................... 104
ANEXO A – Roteiro para a entrevista.............................................................................. 104
ANEXO B – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia – Universidade Regional de
Blumenau - FURB.............................................................................................................
107
ANEXO C – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia – Universidade do Vale do
Itajaí - UNIVALI...............................................................................................................
108
ANEXO D – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia – Centro Universitário de
Brusque - UNIFEBE..........................................................................................................
111
11
1 INTRODUÇÃO
Quando lemos em uma revista ou em um jornal, ou vemos na televisão, falando
sobre a Educação Física, nos reportamos ao esporte, ao rendimento, à dor causada pela
atividade física. Esquecemo-nos do principal: o papel da Educação Física na sociedade, a
formação de pessoas.
De forma semelhante, com a alfabetização, imediatamente nos vem ao pensamento o
aprendizado da escrita e da leitura. Crianças sentadas numa carteira, em salas superlotadas,
com uma professora muitas vezes mal remunerada, “tentando passar seus conhecimentos”
(sic). Mais uma vez, se esquece de um papel do processo de alfabetização, a formação de
cidadãos.
Depois de graduado em Educação Física pela FURB, começamos nosso trabalho
como professor de séries iniciais, substituindo um professor em licença numa escola estadual
perto de casa. Mas a graduação não ofereceu uma base sólida para o trabalho com essa faixa
etária. Apenas lampejos de atividades, e a alfabetização durante a graduação não era
discutida.
Desde então, trabalhamos com as séries iniciais, e essa paixão foi só aumentando,
pois sabemos que, como professores, podemos favorecer o desenvolvimento tanto motor,
quanto cognitivo dos pequenos. Desenvolver também o gosto pela atividade física e, além do
mais, levar diversão para os alunos, pois para eles, aula de Educação Física é o momento de
descarregar as energias, é o momento da brincadeira. Mas, como toda brincadeira, durante as
aulas, os objetivos são propostos e as crianças não entendem ainda o que está acontecendo
dentro delas e com elas. Essa experiência construída no diálogo entre a prática e a teoria,
levou-nos a perceber que as atividades propostas despertavam o interesse das crianças dentro
da sala de aula.
A trajetória como pesquisador começou apenas durante o Mestrado em Educação
pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Foi no mestrado que compreendemos que
escrever na academia não se faz de forma singular, mas sim no coletivo. Cada parágrafo, cada
frase tem sugestões dos colegas, uma vez que a cada produção escrita era vista por eles. Por
isso que decidimos por escrever esta dissertação em primeira pessoa do plural. Quando da
entrada no Programa, então, em conversas com a orientadora, decidimos pesquisar as áreas da
12
Educação Física e da alfabetização em conjunto. Para isso, precisávamos de uma pergunta de
partida, nosso primeiro caminho rumo ao norte; conversas, discussões, contribuições dos
colegas de turma, sem o que seria impossível fazer pesquisa, chegamos à seguinte pergunta:
Quais as relações entre saberes docentes dos profissionais da Educação Física e dos
alfabetizadores acerca da alfabetização?
O tema central da pesquisa estava então definido: as relações entre a Educação Física
e a alfabetização na voz dos docentes. É uma pesquisa de cunho qualitativo-interpretativo,
inserida na linha Linguagem e Educação do Mestrado em Educação da FURB. A escolha
desta linha se justifica porque nosso objeto de investigação são os discursos dos sujeitos,
através da linguagem e, consequentemente, suas práticas pedagógicas, sobre as áreas
anteriormente citadas.
Nossa pesquisa tem como objetivo central compreender as interfaces dos diferentes
saberes docentes que circulam nos anos iniciais no que se refere à alfabetização e à Educação
Física. Os objetivos específicos são: (1) desvelar o discurso sobre a alfabetização que
perpassa a fala dos sujeitos professores de Educação Física e dos alfabetizadores; (2) analisar
as relações entre alfabetização e Educação Física expressas nos discursos dos professores e
nos documentos oficiais e, (3) compreender a trajetória de constituição de saberes docentes
acerca do que é alfabetizar.
Na organização de nosso trabalho, dentro da introdução, apresentamos também o
Estado da Arte, ou seja, as pesquisas anteriormente feitas, a fim de procurarmos os
distanciamentos e as aproximações. Na sequência, apresentamos a metodologia, com o tipo de
pesquisa e os dados dos sujeitos entrevistados. No segundo capítulo, exibimos uma
contextualização da Educação Física, descrevendo sua inserção no currículo escolar. Além
disso, mostramos como a Educação Física é concebida pelos documentos oficiais por nós
utilizados: Parâmetros Curriculares Nacionais e a Proposta Curricular de Santa Catarina. No
terceiro, expomos uma breve história da alfabetização, além de dados teóricos sobre o tema.
Como no capítulo anterior, como é apresentada a alfabetização nos documentos oficiais. No
quarto, analisamos os dizeres dos sujeitos entrevistados. Sob o viés enunciativo do círculo de
Bakhtin; apoiamo-nos também nas teorias que envolvem a Educação Física e nas de
alfabetização. No quinto, trazemos, então, as considerações a respeito das análises dos
dizeres. Por fim, as referências e os anexos.
13
1.1 OS CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS – O ESTADO DA ARTE
Para esta pesquisa, remetemo-nos a uma busca de outras pesquisas realizadas
anteriormente, a fim de procurarmos os distanciamentos e as aproximações para, então,
conhecer o cenário de investigação. Muito pouco foi encontrado, o que nos dá, a principio,
uma ideia de que há poucas pesquisas envolvendo, em conjunto, as áreas da educação física e
da alfabetização.
Nossa busca partiu de três palavras-chaves: educação física, alfabetização e saberes
docentes. Essas palavras foram definidas com a intenção de selecionar os estudos que se
aproximassem de nossos objetivos ou que discutissem esses temas. Todas as investigações
encontradas estavam apenas no Banco de Teses e Dissertações da Capes, com exceção do
artigo de Souza e Peixoto (2006), que foi encontrado no site efdeportes.com.
Na ordem de apresentação das obras, neste trabalho, encontramos um artigo de
Souza e Peixoto (2006), cinco dissertações, de Santos (1994), Feijó (2005), Melo (2006),
Gramorelli (2007) e Correia (2007); e duas teses, de Arantes (1996) e Mello (1998).
Preferimos não fazer um corte temporal, devido a poucas pesquisas encontradas, utilizando
todas.
Souza e Peixoto (2006), com o artigo intitulado “A contribuição da Educação Física
para a alfabetização” teve como objetivo pesquisar a contribuição da Educação Física para o
processo de aprendizagem cognitiva no processo de alfabetização. Como metodologia, foram
selecionadas oito escolas de classe média do município de Niterói, no estado do Rio de
Janeiro, onde foram entrevistados um professor regente e um professor de Educação Física, de
cada escola, que atuavam na classe de alfabetização. Como conclusão, apontam que a
educação física escolar se destaca com singular importância para o crescimento do aluno
enquanto cidadão. Perceberam, a partir dos professores entrevistados, uma totalidade de
escolas conscientes do benefício de uma educação para a vida, pautada no amplo
conhecimento específico e de mundo. Encontraram escolas cientes da grande contribuição que
a Educação Física pode proporcionar para o desenvolvimento global da criança e para o
processo de aquisição de conhecimento cognitivo e expansão global. Concluem também que,
com um trabalho integrado da Educação Física no processo de alfabetização, essa etapa pode
14
até ser vista de forma rica e ampla. Este artigo se aproxima de nossa pesquisa pela
metodologia utilizada, mas se distancia por não analisar documentos oficiais.
A dissertação “O corpo em movimento e a alfabetização: proposta para um trabalho
corporal significativo” de Santos (1994) teve como objetivo contribuir para uma modificação
no lugar ocupado pelo corpo no cotidiano da escola e, em especial, para uma melhor
compreensão da relação corpo histórico-aprendizagem da leitura e escrita. Como
metodologia, entrevistou dez professores de Educação Física do pré-escolar, de escolas
particulares e públicas do Rio de Janeiro. Em conclusão, deixou uma proposta de trabalho,
com atividades que enfatizavam vários aspectos nos alunos, o que não é nosso caso. Como
aproximações, destacamos a metodologia utilizada, com entrevistas aos professores.
Feijó (2005) em sua dissertação “Oficinas do jogo: uma abordagem pedagógica
transdisciplinar nas séries iniciais do ensino fundamental”, teve como objetivo investigar o
potencial pedagógico de uma abordagem transdisciplinar através das Oficinas do Jogo nas
séries iniciais do Ensino Fundamental. A metodologia utilizada foi entrevista com as crianças,
orientadora, supervisora, diretora e com a professora de sala de uma escola de uma
comunidade carente de Florianópolis. Também foi utilizado o diário de campo. Como
conclusão, a autora obteve um avanço significativo no desenvolvimento da leitura, da escrita e
das noções lógico-matemáticas e percebeu, também, que as crianças participavam com muito
entusiasmo nas atividades e o notável crescimento das relações sociais dos alunos. Como
aproximações a sua pesquisa, podemos citar a entrevista, mas nosso estudo é voltado apenas
aos professores e se distancia por apresentar uma proposta de trabalho, inclusive com
sugestão de atividades, o que não é nosso objetivo.
A dissertação de Melo (2006), “Do letramento ao corpo em movimento: um estudo
sobre a educação física inserida numa proposta de educação popular”, teve como objetivo
entender o significado atribuído pelos participantes do Núcleo de Educação de Jovens e
Adultos (NEJA) de Palmeiras das Missões - RS “Ensinando e Aprendendo”, na disciplina de
Cultura e Lazer, à Educação Física no seu processo de letramento. A metodologia utilizada foi
a de grupo focal de seis pessoas, alunos do NEJA. Na conclusão da pesquisa, o autor destaca
que os adultos, em processo de alfabetização, queriam falar muitas coisas e sabiam realmente
daquilo de que mais necessitavam para que aprendessem, não apenas a ler e escrever, mas
para que pudessem alfabetizar-se letrando. Outro aspecto foi que a conscientização aconteceu
15
à medida que o trabalhador foi sendo exigido na sua totalidade. Este trabalho se aproximou do
nosso por tratar do letramento, o que também abordaremos.
Gramorelli (2007), com a dissertação intitulada “O impacto dos PCN na prática dos
professores de Educação Física”, teve como objetivo compreender como os professores de
Educação Física ressignificaram suas práticas educativas face às proposições dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, bem como, desvelar suas apropriações sobre as concepções da área,
objetivos do componente, conteúdos de ensino, orientações didáticas e formas de avaliação
propostos nesses documentos. Como metodologia, foi realizada uma revisão bibliográfica
sobre os temas relacionados à prática dos professores de Educação Física após a Lei de
Diretrizes e Bases 9.394/96 e os Parâmetros Curriculares Nacionais, na qual foi retomado o
contexto de elaboração desses documentos oficiais, bem como, desvelou-se o processo pelo
qual dialogaram com as concepções de ensino da Educação Física. Foi também realizada a
análise documental dos Parâmetros Curriculares Nacionais 3° e 4° ciclos Educação Física, a
qual indicou proposições diferenciadas para as práticas pedagógicas dos professores quando
comparadas àquelas historicamente construídas na área. Como conclusões, a autora revela que
os dados obtidos apontam para uma nova configuração das práticas em Educação Física
escolar, que passou a considerar conteúdos eleitos da cultura corporal e serem desenvolvidos
nos seus aspectos conceitual, procedimental e atitudinal. A modificação no entendimento de
avaliação nessa área de conhecimento também foi um fator importante, pois os participantes
acenaram para uma concepção formativa integrada ao processo de ensino e aprendizagem,
fato que se distancia dos simples testes físicos para mensurar e classificar alunos segundo
padrões de desenvolvimento motor. Este trabalho se aproxima do nosso por tratar das
questões relativas aos Parâmetros Curriculares Nacionais, pois serve de base para a discussão
da relação entre a Educação Física e a Alfabetização, porém, se distancia por não tratar do 1°
e 2° ciclos, que é o nosso lócus de estudo.
A dissertação “Letramento, alfabetização e trabalho do professor representados nos
PCNs”, de Correia (2007), teve como objetivo verificar de que forma a questão do letramento
e da alfabetização foi abordada nos Parâmetros Curriculares Nacionais e as representações
sobre o trabalho do professor em relação ao letramento e a alfabetização construídas nesse
documento. Os procedimentos metodológicos incluíram a contextualização sócio-histórica
interacional da produção dos PCNs, o levantamento de suas características globais, a seleção
de segmentos que abordam a questão do letramento e da alfabetização e a análise desses
16
segmentos nos níveis organizacional, enunciativo e semântico, a partir das categorias de
análise fornecidas pelo próprio quadro teórico-metodológico. Como resultados, a autora
apontou que o letramento é representado nos PCNs como produto de uma prática social
relacionada à leitura e escrita. Porém, o termo não é recorrente nos PCNs, não sendo tratado
como tema principal. Por outro lado, a questão da alfabetização foi tratada de forma mais
ampla, ora associada ao uso da linguagem em práticas de compreensão ativa, expressão e
comunicação, ora relacionada à aquisição da escrita alfabética. Conclui também que o papel
do professor, em relação à alfabetização, pode ser inferido quando se indicam as finalidades
das práticas de ensino e algumas das funções do professor, mas não são tematizadas as
diferentes fases possíveis do trabalho docente, nem o modo como ele deve desenvolver as
atividades e nem os procedimentos a serem adotados para alcançar as finalidades tão bem
explicadas. Enfim, o que se prescreve ao professor é um agir cognitivo, propondo-se que ele
assuma uma concepção de ensino-aprendizagem considerada inovadora e mais adequada
pelos PCNs, que é representada como se fosse a única possível e verdadeira. Este trabalho se
distancia de nossa pesquisa, pois nosso foco de estudo não é uma análise documental, neste
caso, dos PCNs, mas se aproxima por tratar das questões referentes à alfabetização e ao
letramento, tão presentes em nosso estudo.
Dentro do quadro de pesquisas na área, encontramos duas teses. A primeira, “A
educação física e o processo de alfabetização nas 1ªs séries do 1º grau”, de Arantes (1996),
teve como objetivo conhecer, ampliar e sistematizar dados relativos ao processo de aquisição
de leitura e de escrita, bem como compreender de que forma a Educação Física pode
favorecer o desenvolvimento de habilidades específicas requeridas na alfabetização e
contribuir para o desenvolvimento do ato gráfico e da aquisição de conceitos por parte da
criança. Metodologicamente foi um estudo exploratório descritivo, em que houve observações
em sala durante o ano letivo, registrando de forma sistemática e pormenorizada, em uma
escola pública e outra particular da cidade de São Paulo. Como conclusões da autora, a
atividade de Educação Física pode colaborar para o aprendizado da leitura e da escrita uma
vez que o movimento é capaz de levar o aluno à comunicação e à exposição de fatos e idéias.
As análises também revelaram que a escola pública e a privada não efetivam, na prática, as
possíveis articulações entre a disciplina de Língua Portuguesa e Educação Física. Nesse caso,
a pesquisadora compara os dois sistemas, público e privado, o que não é nosso objetivo, pois
trabalhamos apenas com a rede pública.
17
Mello (1998), em sua tese “Educação Física integrada à alfabetização (EFIALFA):
um método específico de ensino para a Educação Física nas turmas de alfabetização”, teve
como objetivo elaborar um método específico de ensino para a Educação Física, com a
característica fundamental de integrar Educação Física e alfabetização, dirigido ao trabalho
com crianças das turmas de alfabetização escolar. Como metodologia, utilizou a pesquisa-
ação em uma escola pública do Rio de Janeiro, em que o próprio pesquisador ministrava as
aulas. Como conclusão, o método contribuiu para a alfabetização das turmas, adotando uma
perspectiva lúdica para o trabalho pedagógico. Apontou também para a necessidade de um
tempo maior de aula. Distancia-se da nossa pesquisa por propor um método e pelo fato de não
entrevistar professores.
Com os termos pesquisados, podemos constatar que são poucas as pesquisas na área
da Educação Física em associação com a alfabetização, o que revela um distanciamento entre
essas duas áreas. Há também uma carência em pesquisas voltadas aos saberes dos professores
com relação à Educação Física e à alfabetização. É nesse contexto que se justifica a relevância
de nossa pesquisa, buscando compreender os saberes que cercam a prática dos sujeitos.
1.2 CONTORNOS METODOLÓGICOS
Nossa pesquisa se iniciou, como já relatamos, com elaboração de uma pergunta de
partida: Quais as relações entre saberes docentes dos profissionais da Educação Física e dos
anos iniciais acerca da alfabetização? Decorrente disso, o objetivo geral é compreender as
interfaces dos diferentes saberes docentes que circulam nos anos iniciais no que se refere à
alfabetização e à Educação Física.
Esta pesquisa é de cunho investigativo qualitativo o que “exige que o mundo seja
examinado com a idéia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista
que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nosso objecto de
estudo”. (BOGDAN e BIKLEN, 1994, p.49).
Está ambientada na região que abrange a 16ª Gerência de Educação (daqui em diante
GERED), da qual fazem parte 8 municípios: Brusque (a sede), Nova Trento, Guabiruba,
Botuverá, São João Batista, Canelinha, Major Gercino e Tijucas.
18
O mapa abaixo, que representa o estado de Santa Catarina, dividido com as 36
Secretarias Regionais, com destaque para 16ª GERED (local da pesquisa) tem o objetivo de
informar ao leitor a organização administrativa da educação do nosso Estado e destacar a
região investigada.
Mapa 1: Representação do estado de Santa Catarina
Mapa 2: Representação da área de abrangência da 16ª GERED
Fonte: Disponível em: <http://www.sc.gov.br/> Acesso em: 8 mar. 2010
Fonte: Disponível em: <http://www.sc.gov.br/sdr/brusque/mapamunicipios.htm.> Acesso em: 8 mar. 2010
Nosso objetivo era entrevistar um professor de Educação Física que trabalhasse com
os primeiros anos do Ensino Fundamental e uma professora alfabetizadora que também
lecionasse para os primeiros anos, de uma escola da rede estadual de cada cidade. A seguir,
apresentamos as escolas que compõem o quadro de escolas da rede estadual de ensino da 16ª
GERED.
19
Quadro 1: Relação de escolas da 16ª SDR
CIDADE ESCOLA
Brusque E.E.B. Dom João Becker
E.E.B. Feliciano Pires
E.E.B. Francisco de Araújo Brusque
E.E.B. Gov. Ivo Silveira
E.E.B. João XXIII
E.E.B. Mons. Gregório Locks
E.E.B. Osvaldo Reis
E.E.B. Padre Lux
E.E.B. Santa Terezinha
Guabiruba E.E.B. Prof. João Boos
E.E.B. Professor Carlos Maffezzolli
Botuverá E.E.B. Pe. João Stolte
Nova Trento E.E.B. Francisco Mazzolla
São João Batista E.E.B. Prof.ª Lídia Leal Gomes
E.E.F. Prof. Patrício Teixeira Brasil
E.E.B. São João Batista
Canelinha E.E.B. Bartolomeu da Silva
E.E.B. Profª Minervina Laus
Major Gercino E.E.B. Manoel Vicente Gomes
E.E.F. Prof. Tercílio Bastos
Tijucas E.E.B. Alexandre Ternes Filho
E.E.B. Cruz e Sousa
E.E.B. Dep. Valério Gomes
E.E.B. Prof.ª Olívia Bastos Fonte: Disponível em: <http://www.dataescolabrasil.inep.gov.br/dataEscolaBrasil/home.seam>. Acesso em: 29
set. 2009.
Os critérios para a seleção dos sujeitos foram dois: trabalhar com os primeiros anos e
ser efetivo no quadro funcional. Outro critério, inicialmente por nós elencado, foi o tempo de
serviço. A principio, os professores deveriam ter por volta de 20 anos de tempo de serviço,
pois, segundo Gonçalves (1995, p. 165), é a fase da serenidade,
situando entre os 15 e cerca dos 20-25 anos de actividade lectiva, esta fase
caracterizou-se, fundamentalmente, por uma acalmia, fruto de uma quebra no
entusiasmo anterior, mas também, e sobretudo, por um <<distanciamento
afectivo>> e por uma capacidade de reflexão que a tornam algo semelhante à
segunda etapa considerada.
Mas, em algumas situações, não foi bem o que encontramos. Em determinadas
escolas, havia professores ou em início de carreira como efetivos, ou admitidos em caráter
temporário. Havia também professores em licença, como também ocupando outros cargos. E
através dos contatos realizados, deparamo-nos com escolas ainda procurando professor para
20
assumir a vaga. Por isso, em alguns casos, entrevistamos professores perto dos 30 anos de
efetivo magistério e outros com 10 anos.
Figura 1: Etapas da carreira do professor
Fonte: Gonçalves (1995, p.163)
Gonçalves (1995, p. 164), conforme o quadro anterior realça então, essas outras
fases, como o início, em que há o choque do real; a fase da estabilidade, por volta dos 5-7
anos de experiência, em que a confiança é alcançada; a fase da divergência, entre 8-15 anos
de experiência, que se revela um desequilíbrio e a fase da renovação e do desencanto, já com
a experiência entre 31 e 40 anos, que mostra profissionais entusiasmados e desejando
aprender coisas novas ou saturados, impacientes, aguardando a aposentadoria.
Vale ressaltar, aqui, que classificações muitas vezes são relativas, pois a realidade
pode ser diferente ou o contexto em que foi realizada a classificação é também diferente
21
daquele que se pretende usar. Usamos esta classificação de Gonçalves (1995), para conceituar
as fases que um professor pode passar durante sua trajetória docente.
1.2.1 A BUSCA PELOS SUJEITOS.
Em um primeiro momento, precisávamos organizar os sujeitos, ter uma relação dos
professores das escolas para fazer as entrevistas. Entramos em contato, então, com a
responsável pelos Recursos Humanos da 16ª GERED, que ficou de entrar em contato com as
escolas e obter informações como idade, tempo de serviço e qual o campo de atuação, se era
professor de Educação Física ou professor alfabetizador. Feito esse pedido, recebemos os
dados dos professores, mas alguns itens estavam incompletos.
Devido à falta de alguns dados, ligamos diretamente para as escolas a fim de
completar o quadro. Após uma análise inicial dos dados obtidos, era necessário fazer uma
seleção dos sujeitos que obedeciam aos critérios anteriormente citados. Completado,
começamos a entrar em contato com os professores para marcarmos as entrevistas. Cabe aqui
salientar também, que a preferência era por professores que trabalhassem na mesma escola,
sendo que em apenas um município isso não foi possível.
Nossa série de entrevistas foi iniciada por Brusque, ainda no período de férias, com
uma professora alfabetizadora. Quanto à professora de Educação Física, da mesma escola,
esta não seguia a um dos critérios, que era de ter por volta dos 20 anos de tempo de serviço.
Mas como foi citada pela alfabetizadora, que realiza um trabalho em conjunto, optamos por
marcar a entrevista.
Algum tempo depois, já no mês de fevereiro, nos dirigimos até a cidade de
Guabiruba. Uma escola muito simpática, que até então nos era desconhecida. Entrevistamos a
professora alfabetizadora e quanto à professora de Educação Física, esta também não atendia
a um dos critérios, o de ter por volta dos 20 anos de tempo de serviço.
Ainda no mês de fevereiro, seguimos para Botuverá. Uma cidade cuja cultura de
escola não era conhecida até então, em que fomos muito bem recepcionados.
22
Nossa próxima cidade visitada foi Canelinha, também no mês de fevereiro,
precisamente na localidade de Serra do Moura. Nesta escola, o professor de Educação Física
não estava mais em sala de aula, sendo então assessor de direção. Como estava há pouco
tempo na função, decidimos então entrevistá-lo. E logo em seguida, entrevistamos a
professora alfabetizadora.
No final do mês de fevereiro, partimos em direção a Tijucas. Depois de entrevistar a
professora de Educação Física, algumas pessoas da direção nos indicaram outra professora
alfabetizadora, que pertence àquela escola, mas estava em atribuição de serviço em outra.
Seguimos para a outra escola e, enfim, entrevistamos a alfabetizadora. Com isso chegamos ao
fim do período de entrevistas.
Nas cidades de Major Gercino, São João Batista e Nova Trento, os professores não
seguiam aos critérios, como ser professor efetivo, ter por volta dos 20 anos de tempo de
serviço. Ou em alguns casos as escolas estavam sem professor de Educação Física, como
mencionado anteriormente.
Depois de todo o levantamento e das entrevistas, organizamos o quadro 02 no qual
apresentamos a lista final dos professores entrevistados. Por uma questão ética da pesquisa,
decidimos por deixar os sujeitos no anonimato, informando apenas por sujeito e um número
de identificação, para que as informações aqui citadas não causem qualquer tipo de transtorno
ou prejuízo. De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 77),
o anonimato deve contemplar não só o material escrito, mas também os relatos
verbais da informação recolhida durante as observações. O investigador não deve
revelar a terceiros informações sobre seus sujeitos e deve ter particular cuidado para
que a informação que partilha no local da investigação não venha a ser utilizada de
forma política ou pessoal.
23
Quadro 2: lista final dos professores entrevistados
I. S. FORM.(E.M.) GRAD. C. H. T. S. S. A. CID.
S1 Magistério Pedagogia 40h 31 anos 1º Brusque
S2 Magistério Educação
Física
30h 10 anos 1º, 2º,
3º, 4º
Brusque
S3 Magistério Pedagogia 40h 26 anos 2º Guabiruba
S4 Magistério Pedagogia 40h 28 anos 1º Botuverá
S5 Técnico Educação
Física
40h 25 anos 1º, 2º,
3º, 4º
Botuverá
S6 Científico Educação
Física
40h 18 anos 1º, 2º,
3º, 4º
Canelinha
S7 Magistério Pedagogia 40h 28 anos 1º, 2º Canelinha
S8 Magistério Educação
Física
40h 27 anos 1º, 2º,
3º, 4º
Tijucas
S9 Magistério Pedagogia 40h 30 anos 2º Tijucas
S10 Científico Educação
Física
40h 10 anos 1º, 2º,
3º, 4º
Guabiruba
Legenda: I. S. = Identificação do Sujeito; Form. (E.M.) = Formação no Ensino Médio; Grad. = Graduação;
C.H. = Carga Horária; T. S. = Tempo de Serviço; S. A. = Série que atua; Cid. = Cidade.
1.2.2 O INSTRUMENTO DE COLETA
Com o objetivo de compreender as interfaces dos diferentes saberes docentes1
(TARDIF, 2005) que circulam nos anos iniciais no que se refere à alfabetização e à Educação
Física, a entrevista é narrativa. Segundo Jovchelovitch e Bauer (2000, p. 95), “tem em vista
uma situação que encoraje e estimule um entrevistado a contar a história sobre algum
acontecimento importante de sua vida e do contexto social.” Em sua organização, a entrevista
contém uma pergunta aberta, que segundo Bauer e Gaskell (2002, p. 509), é uma “pergunta
colocada em um questionário, que fornece dados qualitativos, para investigar a estrutura
natural das respostas, com respeito a um tópico específico.”
No caso desta pesquisa, de acordo com as narrativas a partir da pergunta inicial,
outras perguntas foram feitas, para se alcançar o objetivo (anexo A). Para testar o instrumento,
houve a entrevista piloto. Como pergunta que desencadeou a entrevista, os professores foram
convidados a falar sobre o trabalho que realizam com seus alunos (como são suas aulas).
Partindo dos enunciados dos sujeitos, as questões seguintes tinham como meta alcançar em
1 De acordo com Tardif (2005, p. 36), “pode-se definir o saber docente como um saber plural, formado pelo
amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares,
curriculares e experienciais.” Discutiremos mais sobre os saberes docentes o capítulo 4.
24
suas falas indícios sobre o que entendiam a respeito da alfabetização, associando com
palavras. Como nossa pesquisa está voltada também para o campo da interdisciplinaridade,
optamos por questionar os sujeitos quanto à relação entre as duas áreas, se é existente. Ao
final, o sujeito então poderia comentar ou complementar o que foi dito anteriormente. Nesse
momento, aproveitam para falar sobre assuntos diferentes daqueles anteriormente
perguntados.
Com as entrevistas realizadas, a transcrição dos dados seguiu as convenções
sugeridas por Marcuschi, que diz que “não existe a melhor transcrição. Todas são mais ou
menos boas.” (1996, p. 9).
Quadro 3: Símbolos usados na transcrição, de acordo com Marcuschi (1996)
Pausas (+) ou (2.5)
Dúvidas (incompreensível)
Ênfase ou acento forte MAIÚSCULA
Alongamento de vogal ::
Comentários do analista (( comentário ))
Silabação - - - - -
Ponto de interrogação “ (aspas duplas)
Vírgula „ (aspas simples)
Repetições Reduplicação da letra ou sílaba
Pausa preenchida Eh, ah, oh, ih, ahm, etc.
Indicação de transcrição parcial … ou […]
Após a apresentação dos percursos metodológicos, dos sujeitos e do instrumento,
passamos para o próximo capítulo, no qual apresentaremos a Educação Física, seu contexto
histórico no Brasil e sua transformação em disciplina.
25
2 A EDUCAÇÃO FÍSICA NO CONTEXTO HISTÓRICO E SUA INTRODUÇÃO NO
ENSINO NO BRASIL
Neste capítulo procuramos descrever o processo histórico da Educação Física, como
se torna componente curricular obrigatório nas escolas e a visão que lhe é dada a partir dos
Parâmetros Curriculares Nacionais e na Proposta Curricular de Santa Catarina.
2.1 EDUCAÇÃO FÍSICA – UMA HISTÓRIA EM POUCAS PALAVRAS
Ao longo de sua história, a Educação Física, ou as várias formas de atividade física,
passaram por transformações para chegar às escolas, da forma que vivenciamos nos dias
atuais. Assim como os sujeitos da pesquisa tem suas histórias, a Educação Física, como
disciplina, ou mesmo como forma de atividade física, também possui a sua. Por isso,
apresentamos aqui, um pouco da história desta disciplina. Para um melhor entendimento, esta
seção será baseada em Betti (1991), que traz uma literatura mais atual a respeito da história.
A Educação Física é uma herança histórica e está presente na vida do homem ao
longo de sua história. Não a Educação Física que vemos nos dias atuais, mas formas de
atividades físicas, visando ao aperfeiçoamento para a caça e para a defesa. Com a civilização
grega, por volta de 1600 a.C., a Educação Física tomou formas mais de acordo com o esporte
e a qualidade de vida. Tanto é que foram criados os Jogos Olímpicos (776 a.C.), em que se
paravam até as guerras para dar lugar à confraternização entre os povos através do esporte.
(BETTI, 1991)
Segundo Betti (1991, p. 33),
desconsiderando-se a Antiguidade Grega, foi nas últimas décadas do século XVIII, e
em especial durante o século XIX, que a Educação Física experimentou um decisivo
impulso no sentido de sua sistematização e institucionalização como forma de
educação no mundo ocidental
26
A Educação Física começa a dar seus primeiros passos rumo à regulamentação,
durante o século XIX. Isso tudo na Europa, principalmente na Inglaterra, Alemanha, Suíça,
Dinamarca e França, devido ao desenvolvimento dos sistemas ginásticos. A elaboração desses
sistemas confunde-se com a fase do nacionalismo e do militarismo, ou seja, a consolidação
dos estados nacionais. Há também que se levar em conta o disciplinamento do corpo, como
forma de preparação para as guerras.
Os europeus perceberam, então, que era importante universalizar o esporte. Com
isso, o francês Pierre Fredy, ou mais conhecido como Barão de Coubertin (1863-1937), teve
participação decisiva na criação dos Jogos Olímpicos da Modernidade, que é o modelo
vigente na atualidade.
Paralelamente aos acontecimentos na Europa, a Educação Física é introduzida no
Brasil. Mas de acordo com nossos objetivos, não pretendemos nos ater muito à história da
Educação Física no Brasil, mas sim como ela foi introduzida no meio escolar, transformando-
se em disciplina obrigatória no currículo.
O início oficial da Educação Física no Brasil ocorreu, de acordo com Cantarino Filho
(1982 apud BETTI, 1991, p. 63), em 1851, com a Reforma Couto Ferraz. E ainda, conforme
Betti (1991, p. 63),
quando deputado, Luiz Pedreira do Couto Ferraz apresentou à Assembléia as bases
para a reforma do ensino primário e secundário no Município da Corte. Três anos
após, em 1854, já como Ministro do Império, expediu sua regulamentação, e entre as
matérias a serem obrigatoriamente ministradas no primário estava a ginástica, e no
secundário, a dança.
Em 1882, Rui Barbosa deu um parecer sobre o Projeto nº 224. Este projeto se
chamava Reforma do Ensino Primário e Várias Instituições Complementares da Instrução
Pública. Este projeto recomendava
a instituição de uma seção especial de ginástica na escola normal, a extensão
obrigatória da ginástica a ambos os sexos, na formação do professorado e nas
escolas primárias de todos os graus, inserção da ginástica nos programas escolares
como matéria de estudo, e equiparação, em categoria e autoridade, dos professores
de ginástica aos de todas as outras disciplinas. (BETTI, 1991, p. 63).
27
Mas a prática ou as seções de ginástica, como eram chamadas, se deu até os anos
1930. Era de exclusividade das escolas do Rio de Janeiro, enquanto município da corte
imperial e capital da República. Era estendida também às Escolas Militares.
No início do século XX, alguns estados reformularam seus sistemas de ensino. Com
isso, a Educação Física foi incluída nos currículos escolares, ainda sob denominação de
ginástica. Segundo Cantarino Filho (1982 apud Betti, 1991, p. 64),
foi na Reforma Sampaio Dória (1920), em São Paulo; Reforma Lourenço Filho
(1922-23), no Ceará; Reforma Carneiro Leão (1922-26), no Distrito Federal e em
Pernambuco (1928); Reforma Francisco Campos (1927-28), em Minas Gerais;
Reforma Anísio Teixeira (1928), na Bahia e Reforma Fernando de Azevedo (19280,
no Distrito Federal.
De 1930 até 1945, o país passou pela Era Getúlio Vargas, com a criação do Estado
Novo, período em que os militares eram os orientadores da Educação Física nas escolas.
Ensinavam ginástica com a intenção de formar homens fortes e disciplinados, com boa
aparência física e resistentes a doenças. Em 1937, o termo Educação Física era referenciado
no artigo 131 da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, que determinava de
caráter obrigatório o ensino da Educação Física.
Essa corrente militarista era tão exacerbada, que podemos perceber isso conforme
escreve Cantarino Filho (1982 apud Betti, 1991, p. 72), pois o “conteúdo de algumas matérias
do primário e secundário incluía marchas, evoluções militares, manejo de armas de fogo e
exercícios de tiro ao alvo.” Dessa forma, preparavam a nação para resistir aos dias de guerra.
Com essa preparação guerreira, o interesse do exército se voltava ao nacionalismo e a eugenia
(melhora e aperfeiçoamento da raça humana).
O método utilizado pelos militares era o francês. Nesse método “a Educação Física é
compreendida como o conjunto de exercícios cuja prática racional e metódica é suscetível de
fazer o homem atingir o mais alto grau de aperfeiçoamento físico, compatível com sua
natureza.” (BETTI, 1991, p. 75). Com isso, algumas formas de atividades foram propostas,
como jogos, em que eram levados em conta os movimentos instintivos que todo ser vivo é
levado a executar; os flexionamentos, movimentos com efeitos corretivos e localizados sobre
cada articulação e, consequentemente, os músculos que a comandam; os exercícios
educativos, a base para determinada aplicação; as aplicações, compreendidas em sete grupos
28
de exercícios (marchar, trepar, saltar, levantar e transportar, correr, lançar, atacar e defender-
se); os esportes individuais, exigiam, além das qualidades físicas, qualidades morais. (BETTI,
1991).
Após esta fase da história brasileira, veio o período de 1946 até 1968 para a
Educação Física. Foi, de acordo com Betti (1991, p. 89), que
neste período diminuíram consideravelmente as iniciativas oficiais na área. Contudo,
iniciou-se uma extensa reorganização de conceitos e a ascensão do fenômeno
esportivo, que levariam, no período seguinte, à formulação de um novo modelo para
a Educação Física no país.
Muitos fatos ocorreram naquele período, como a redução do número de sessões
semanais de Educação Física de três para duas e ainda a redução do tempo de duração de cada
sessão. Mas a principal mudança foi a inclusão da obrigatoriedade da Educação Física na Lei
de Diretrizes e bases da Educação Nacional em 1961 (LEI nº 4.024/61): “Art. 22. Será
obrigatória a prática da Educação Física nos cursos primário e médio, até a idade de 18 anos.”
(BRASIL, 1961).
Nesse período, tivemos uma Copa do Mundo realizada no Brasil e nossa seleção
conquistando dois títulos mundiais, em 1958 e 1962. Com isso, de acordo com Betti (1991, p.
96), “um importante papel é atribuído ao esporte. A competição estimula a união dos
participantes, desenvolve a solidariedade, a camaradagem e a lealdade, contribuindo para a
formação do caráter.”
Foi durante a Semana de Exposição de Métodos, da Associação dos Professores de
Educação Física de São Paulo que Musa (1946 apud Betti, 1991, p. 96),
propôs um método de Educação Física baseado no esporte, atendendo aos seguintes
objetivos e características: saúde, pela melhoria das condições psico-morfo-
fisiológicas; desenvolvimento intelectual, porque obrigava o aluno a raciocinar;
desenvolvimento moral, porque cria o hábito de vencer as dificuldades; é adaptável a
todas as idades e sexos, permite a execução de lições atraentes e o professor é
incentivado pelos resultados obtidos.
29
A isso podemos associar à máxima popular de que o esporte une os povos e, que
praticando esporte, podemos ter uma melhor qualidade de vida, sem riscos a doenças
cardiovasculares.
Assim como o Método Francês no período anterior, esse também teve um método
predominante, chamado de Método Desportivo Generalizado. Este visava a um aspecto lúdico
ao conteúdo esportivo. Podemos perceber, parafraseando Betti (1991, p. 97), que o jogo foi
compreendido como um meio privilegiado, em que este se apresenta como mais agradável
para os adolescentes, proporcionando prazer e alegria. Também, porque, jogando, o aluno
manifesta plenamente sua personalidade, visivelmente exacerbada em momentos de conflito;
descobre suas aptidões e gostos, adquire conhecimentos de si próprio, sabendo seus limites, o
que seu corpo pode suportar, exerce sua iniciativa e responsabilidade, ao assumir seus erros,
por exemplo, e ainda o trabalho cooperativo e coletivo, pois aí descobre que não pode fazer
tudo sozinho, tendo que ajudar e saber ser ajudado.
Entre 1969 e 1979, a Educação Física é assim caracterizada por Betti (1991, p. 100):
“o período assinalou a ascensão do esporte à razão de Estado e a inclusão do binômio
Educação Física/Esporte na planificação estratégica do governo.” Vale lembrar que esse
vínculo entre esporte e nacionalismo se estreita com a campanha da seleção brasileira de
futebol no México (1970), quando os políticos se aproveitaram da situação para ressaltar o
civismo. Em 1971, houve a reforma do ensino primário e médio, com a nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional, em que a Educação Física aparecia como obrigatória não
apenas para o ensino primário e médio, mas para todas as séries, conforme se observa na Lei
nº 5.692/71
Art. 7º. Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física,
Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos aos
estabelecimentos de 1º e 2º graus, observando quanto à primeira o disposto no
Decreto-Lei nº 869, de 12 de setembro de 1969. (BRASIL, 1971)
Nesse mesmo ano (1971), foi aprovado e divulgado o decreto nº 69.450/71
regulamentando que a Educação Física deveria ser desportiva e recreativa. A atividade escolar
regular deveria incluir também em seu currículo, atividades que aprimorassem o
desenvolvimento de forças físicas, morais, cívicas, psíquicas e sociais.
30
Nesse período, a Educação Física foi referenciada através da iniciação esportiva.
Esta, em seu programa, incluía a aptidão física, através dos mais variados esportes, sempre
buscando a melhora da condição física, ou o disciplinamento do corpo, buscando melhorar o
desempenho em todas as atividades ou esportes que o aluno praticasse. Isso sinalizava o valor
dado ao esporte, deixando de lado o pedagógico e evidenciando a aptidão física que
também é chamada de aptidão motora. Nos esportes e na educação física a dimensão
da aptidão física ou motora tem significado especial. Dependendo da situação e dos
valores (como saúde, rendimento, bem-estar, jovialidade, beleza, etc.) e de vários
contextos (ocupação, lazer) diferentes conceitos foram desenvolvidos. Todos esses
conceitos são baseados nos princípios gerais da capacidade de rendimento físico ou
da performance motora, mas eles diferem entre si na ênfase dos fatores que
determinam o rendimento (resistência, força, etc.) (BARBANTI, 2003, P. 45).
Para os alunos que possuem certa aptidão física, é oferecida uma prática esportiva,
uma iniciação no esporte, buscando a formação de atletas e a melhoria da qualidade de vida.
De acordo com Fernández, Saínz e Garzón (2002) a iniciação esportiva é quando há uma
ampliação dos modelos motores, dando ênfase às formas multidisciplinares de movimento.
Essas formas podem também ser chamadas de habilidades genéricas. Biomecanicamente
falando, seria o aprendizado dos movimentos em sua forma mais correta, excluindo os erros,
economizando a energia gasta durante a atividade. Ou seja, é a técnica desportiva, em que
cada esporte possui a sua específica, seu jeito de chutar ou lançar uma bola, por exemplo.
Também se faz uso da aplicação dessas técnicas, em situações de simulação de jogos. Isso,
permite ao atleta desenvolver a inteligência motora, ou seja, a tática individual, considerando
que cada atleta possui suas características, seu modo particular de realizar cada movimento.
Pode-se dizer que além da técnica utilizada em cada esporte, o atleta ainda busca um modo
próprio para cada movimento.
O esporte, então, era visto (e ainda é) como razão do Estado. Este se comprometia
com o investimento em instalações e infra-estrutura. Era gerido pela Política Nacional, que
considerava três possibilidades: dirigismo absoluto, liberalismo absoluto e sistema misto.
Segundo Betti (1991, p. 109),
O dirigismo absoluto caracteriza-se pela intervenção estatal em todas as etapas da
prática de atividades físicas, as quais tornam-se instrumentos políticos, e pelo forte
apoio ao esporte de alto rendimento com objetivo de projeção nacional nas
competições internacionais. O liberalismo absoluto delega aos indivíduos a opção
31
pelo uso das atividades físicas, interpretadas como meio educacional e de lazer, e a
ação estatal limita-se ao estabelecimento de uma infra-estrutura adequada. O sistema
misto procura compatibilizar as ações do governo e da iniciativa privada,
preservando a liberdade individual e a iniciativa estatal.
No período de 1980 até 1986, surgem novas idéias a respeito da Educação Física,
como diz Betti (1991, p. 116):
O período caracterizou-se por um questionamento da situação estabelecida nos
períodos anteriores, pela percepção de uma situação de crise no setor educacional, e
por uma radical mudança de discursos e de referências conceituais na Educação
Física, caracterizando uma verdadeira crise de identidade.
Politicamente, o país passava por um período de redemocratização, através do
governo do presidente João Batista Figueiredo, começando com a eleição dos governadores e
culminando com o fim do regime militar, com a conseqüente eleição para presidente no ano
de 1986. (BETTI, 1991)
Nessa época, o esporte e a ginástica perderam forças e o ensino da Educação Física
nas escolas começou a ficar precário. A competição esportiva deixou de ser valorizada. As
escolas passaram por diversos problemas, como a falta de espaço e instalações, quase não
existia Educação Física de 1º a 4º série e, quando praticada, era de forma deficitária. (BETTI,
1991).
Depois de algum tempo, em 1996, o país ganhou uma nova Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, Lei nº 9.394, que diz em seu artigo 26, parágrafo 3º, que “a educação
física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da Educação
Básica, ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa
nos cursos noturnos.” Posteriormente, em 2001, o Governo Federal institui uma Lei
complementar (nº 10.328) à Lei nº 9.394. Esta, então, sofreu algumas modificações e, no
artigo 26, parágrafo 3º, foi assim redigida: “a educação física, integrada à proposta
pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da Educação Básica, ajustando-se
às faixas etárias e a condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos.”
Dois anos depois, em 2003, de mesma forma, devido à Lei complementar (nº 10.793), a Lei nº
32
9.394 sofreu mais uma reformulação no artigo que trata da Educação Física, sendo ainda
acrescentados alguns incisos. Em seu artigo 26, parágrafo 3º, a Lei determina que
A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente
curricular obrigatório da educação básica, sendo sua prática facultativa ao aluno: I –
que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis horas; II – maior de trinta
anos de idade; III – que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em situação
similar, estiver obrigado à prática da educação física; IV – amparado pelo Decreto-
Lei nº 1.044, de 21 de outubro de 1964; V – vetado; VI – que tenha prole.
Para situar o leitor, este Decreto-Lei nº 1.044, disposto no inciso IV, informa sobre as
condições de saúde do educando, que por algum problema, pode ter que ficar fora da aula,
sem ser prejudicado.
Desde então, a Educação Física foi se organizando, principalmente a partir do ano de
1998 com a criação do CONFEF (Conselho Federal de Educação Física) e seus subseqüentes
regionais, os CREF‟s (Conselho Regional de Educação Física), e com perspectivas
curriculares voltadas à saúde, ao desenvolvimento do aspecto psicomotor e social do
educando.
Durante esse período da história da Educação Física no Brasil, pudemos perceber
que, em nenhum momento, a alfabetização foi tratada. O foco maior era o nacionalismo, o
esporte como a razão do estado, a formação de atletas-soldados. Não havia essa preocupação
com o aprendizado dos alunos, principalmente dos pequenos. Há também que se levar em
conta uma ausência, no registro histórico, do termo psicomotricidade, ou dos elementos que a
compõem, como lateralidade, consciência corporal, equilíbrio, coordenação motora, entre
outros. Os discursos construídos no fio da história situam o olhar da atualidade para o fazer
pedagógico das áreas em estudo nesta dissertação, permitindo compreender os ecos
(BAKHTIN, 2003) , as concordâncias e contrapalavras na voz dos sujeitos.
Após um breve histórico, iremos apresentar as orientações curriculares de acordo
com os PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) e das PCs-SC (Propostas Curriculares de
Santa Catarina).
33
2.2 O QUE DIZEM OS PCN‟S SOBRE A EDUCAÇÃO FÍSICA
Nesta seção, traremos de forma sucinta, o que os PCN‟s dizem a respeito da
Educação Física, apresentando seus objetivos, os blocos de conteúdos propostos e as formas
de avaliação. Sinalizamos, aqui, já termos conhecimento sobre o Parecer Nº 7/2010 do CNE e
da Resolução Nº 4/2010 do CNE, mas deixamos como documento base os Parâmetros, pois
com eles que os sujeitos da pesquisa tiveram maior contato e formação.
Parafraseando o que é proposto ao professor nos PCN‟s, o objetivo deste documento
é de auxiliar o professor na execução do seu trabalho, compartilhando o esforço diário de
fazer com que as crianças tenham domínio dos conhecimentos de que necessitam. Isto para
crescerem como cidadãos plenamente reconhecidos e conscientes do papel de cada um na
sociedade. (BRASIL, 1997a). Com isso, tem-se uma forma diferente de se olhar o sujeito,
dando mais oportunidades ao ensino da criança. Neste sentido,
[...] o propósito do Ministério da Educação e do Desporto, ao consolidar os
Parâmetros, é apontar metas de qualidade que ajudem o aluno a enfrentar o mundo
atual como cidadão participativo, reflexivo e autônomo, conhecedor de seus direitos
e deveres. (BRASIL, 1997a, p. 5).
Como está proposto nos Parâmetros, esse documento constitui um referencial de
qualidade para a educação no Ensino Fundamental. Isso se configura em uma proposta
flexível, a ser concretizada nas decisões regionais e locais sobre currículos e sobre programas
de transformação da realidade educacional empreendidos pelas autoridades governamentais,
pelas escolas e pelos professores. Ainda de acordo com o documento, os Parâmetros “[...]
podem funcionar como elemento catalisador de ações na busca de uma melhoria da qualidade
da educação brasileira, de modo algum pretendem resolver todos os problemas que afetam a
qualidade do ensino e da aprendizagem no País.” (BRASIL, 1997a, p. 13)
No que diz respeito à Educação Física, os Parâmetros apresentam uma proposta que
“procura democratizar, humanizar e diversificar a prática pedagógica da área, buscando
ampliar, de uma visão apenas biológica, para um trabalho que incorpore as dimensões
afetivas, cognitivas e socioculturais dos alunos.” (op. cit. p. 15). Isso vem ao encontro de que
a Educação Física propõe e o que apreendemos durante a graduação, que é um vasto número
34
de atividades que buscam não apenas o melhoramento do aspecto físico, mas a relações
afetivas, cognitivas, socioculturais, tão desenvolvidas durante as aulas, através das mais
variadas relações, professor-grupo, professor-aluno, aluno-aluno. Na interação professor-
grupo, o professor informa ou demonstra para todos os alunos; faz perguntas e dirige-se ao
grupo genericamente. Na interação professor-aluno, o professor experimenta estabelecer um
ponto de referência com um aluno apenas, ou formula uma pergunta a um aluno em particular.
Na interação aluno-aluno, o professor usa a resposta de um aluno para dirigir-se a outro aluno,
fazendo um comentário, ou pedir a um aluno que explique algo a um seu colega. Com isto, o
professor afasta-se simplesmente por momentos da aula para que ocorram as interações aluno-
aluno.
Para a Educação Física, não basta apenas a repetição de gestos, mas sim a construção
de conhecimentos relativos ao corpo e ao movimento pois, de acordo com os Parâmetros,
o processo de ensino e aprendizagem em Educação Física, portando, não se restringe
ao simples exercício de certas habilidades e destrezas, mas sim de capacitar o
indivíduo a refletir sobre suas possibilidades corporais e, com autonomia, exercê-las
de maneira social e culturalmente significativa e adequada. (BRASIL, 1997a, p. 33).
Com relação aos objetivos gerais da Educação Física no Ensino Fundamental,
espera-se que, ao seu final, 1) os alunos sejam capazes de participar de atividades corporais,
respeitando aos outros sem discriminação; 2) adotar atitudes de respeito mútuo, dignidade e
solidariedade; 3) conhecer, valorizar, respeitar e desfrutar da pluralidade de manifestações de
cultura corporal do Brasil e do mundo; 4) reconhecer-e como elemento integrante do
ambiente, adotando hábitos saudáveis de higiene, alimentação e atividades corporais; 5)
solucionar problemas de ordem corporal em diferentes contextos; 6) reconhecer condições de
trabalho que comprometam os processos de crescimento e desenvolvimento; 7) conhecer a
diversidade de padrões de saúde, beleza e estética corporal que existem nos diferentes grupos
sociais; 8) conhecer, organizar e interferir no espaço de forma autônoma. (BRASIL, 1997a).
A partir dos objetivos, são dispostos os critérios de seleção e organização dos
conteúdos. Nesses critérios, estão a relevância social em que a aprendizagem da cultura
corporal fornece à ampliação da interação sociocultural; as características dos alunos, em que
considera as diferenças entre as mais diversas regiões brasileiras; as características da própria
área, ao que os conteúdos são recortes dos conhecimentos específicos da Educação Física.
35
Esses recortes são provenientes dos saberes docentes, dando ao professor, a possibilidade de
expor seus conhecimentos advindos da formação profissional, além de saberes disciplinares,
curriculares e experienciais.
Os conteúdos, então, são dispostos em três grandes blocos: conhecimentos sobre o
corpo; esportes, jogos, lutas e ginásticas; atividades rítmicas e expressivas (BRASIL, 1997a,
p. 46). Os conhecimentos sobre o corpo envolvem práticas de anatomia, principalmente a
muscular e a óssea; de fisiologia, com o conhecimento das alterações que ocorrem durante as
atividades e ainda a bioquímica, que aborda os processos metabólicos e produção de energia.
Além disso, as habilidades motoras, que são fundamentais para outros blocos.
No âmbito do esporte, são aqueles dotados de regras oficiais e tem o caráter
competitivo, organizados em federações regionais, nacionais e internacionais. Os jogos, em
que se incluem as brincadeiras regionais, os jogos de salão, de mesa, de tabuleiro, de rua e as
brincadeiras infantis, podem ter envolvidas uma maior flexibilidade em suas regulamentações
e levam em conta as condições materiais (instrumentos utilizados nas aulas) e espaciais (os
locais para realização das atividades). Podem ser competitivas, cooperativas ou recreativas.
As lutas devem ser tratadas especialmente, pois os alunos podem levá-las ao extremo. São
realizadas mediante técnicas de desequilíbrio, contusão e imobilização. As ginásticas
envolvem técnicas de trabalho corporal, como preparação para alguma modalidade, como
relaxamento, manutenção ou recuperação da saúde.
As atividades rítmicas e expressivas envolvem danças e brincadeiras cantadas. A
diversificação das atividades varia de acordo com a região. De acordo com os PCN‟s, “por
meio das danças e brincadeiras, os alunos poderão conhecer as qualidades do movimento
expressivo como leve/pesado, forte/fraco, rápido/lento, fluido/interrompido, intensidade
duração e direção.” (BRASIL, 1997a, p. 53). Esses elementos são fundamentais para a
coordenação motora, agilidade, percepção espaço-temporal, entre outras. Com isso, tende-se a
deixar os alunos propensos a conhecer técnicas de execução de movimentos, serem capazes
de construir coreografias e valorizar as diversas modalidades de danças.
Após a apresentação dos conteúdos, são dispostos os critérios de avaliação. Para os
Parâmetros, a avaliação “deve ser algo útil, tanto para o aluno como para o professor, para que
ambos possam dimensionar os avanços e as dificuldades dentro do processo de ensino e
aprendizagem e torná-lo cada vez mais produtivo.” (BRASIL, 1997a, p. 55)
36
As avaliações são tradicionalmente resumidas a testes de força, resistência e
flexibilidade, mas se deve levar em conta a individualidade biológica, em que cada aluno tem
sua capacidade mais ou menos desenvolvida.
Trataremos agora, mais especificamente, do ensino e aprendizagem da Educação
Física no primeiro ciclo, que engloba o primeiro e segundo anos, que é onde se concentra
nossa pesquisa.
Durante a passagem pela educação infantil, a criança desenvolve várias
competências. Chegando à escola, a criança já possui uma série de conhecimentos sobre o
corpo e sobre os movimentos. Cada uma conforme o seu amadurecimento biológico, fruto de
estímulos anteriores ou não. A escola, como instituição formadora, e neste caso, os
professores de Educação Física, devem fornecer estrutura e suporte para que cada criança,
cada aluno, tenha seu desenvolvimento tanto motor como psicológico trabalhado de forma
prazerosa, pois, conforme afirmam os Parâmetros (1997, p. 59), “cabe à escola trabalhar com
repertório cultural local, partindo de experiências vividas, mas também garantir o acesso a
experiências que não teriam fora da escola.”
É também nessa fase que os jogos começam a ser organizados por regras mais
definidas, se tornando mais coletivos, sendo uma das melhores formas de se trabalhar o
espírito coletivo e a cooperação entre todos. Isso está presente nos objetivos da Educação
Física para o primeiro ciclo, diferentemente dos objetivos da Educação Física para o ensino
fundamental. Espera-se que, ao término do primeiro ciclo, segundo os Parâmetros (1997, p.
63), os alunos sejam capazes de participar de diferentes atividades corporais, conhecer
algumas de suas possibilidades e limitações corporais; conhecer, valorizar, apreciar e
desfrutar de variadas manifestações de cultura corporal presentes no cotidiano; organizar
autonomamente alguns jogos, brincadeiras ou outras atividades corporais simples.
Em relação aos conteúdos de Educação Física voltados ao primeiro ciclo, tende-se a
privilegiar os jogos cujas regras sejam as mais simples. Jogos com essa característica, fazem
com que as crianças tornem seus movimentos mais qualificados, com uma melhor
aprendizagem. Deve-se levar em conta também, como denomina o documento, a diferença
entre “meninos e meninas” (BRASIL, 1997a, p. 64). Os conteúdos devem evidenciar
atividades em que os meninos levem vantagem, como jogos com bola, corrida, força. E
atividades em que as meninas tem mais facilidade, como brincadeiras cantadas, ou que
envolvem equilíbrio, ritmo e coordenação.
37
Os PCNs, como diretrizes, apresentam limitações, pois o que é dado como verdade
no que está escrito? Há que se levar em conta a voz do professor e o contexto de cada escola,
pois é nessa situação que o professor consegue desempenhar seu trabalho, e sabe do que seus
alunos são capazes e precisam aprender. Pois se, por um lado, um documento oficial, como os
PCNs, diz que deve haver diferença no trabalho entre meninos e meninas, criando uma
generalização; por outro lado, nossa pesquisa aponta que, dando voz ao professor e
considerando o contexto no qual os sujeitos estão inseridos, pode se fazer da Educação Física
não apenas uma disciplina escolar, mas um espaço de trocas de experiências, ou seja, de
socialização.
No cotidiano escolar há um contraponto em relação ao que diz o documento, ou seja,
não há a separação entre meninos e meninas. Ambos os gêneros praticam as mesmas
atividades, com a mesma intensidade, e as mesmas regras. Mas também pode haver momento
em que haja espaço disponível, e os alunos tenham a disponibilidade de praticar atividades
físicas, como jogos desportivos, pode vir a ocorrer uma separação entre os gêneros. A mais
comum seria o voleibol para as meninas e o futebol para os meninos. Em muitos casos, os
próprios alunos sugerem este tipo de dinâmica, mas cabe ao professor saber o momento de
realizar ou não. Por experiência própria, esse tipo de situação ocorre com freqüência nos anos
finais do ensino fundamental e no ensino médio.
Mesmo sendo gêneros diferentes, com aptidões físicas diferentes, as atividades
devem oferecer uma variedade de movimentos executáveis para os alunos. Esses movimentos
são capazes de desenvolver nos alunos as capacidades físicas, e conforme os Parâmetros,
devem abordar a maior diversidade possível de possibilidades, ou seja, correr, saltar,
arremessar, receber, equilibrar objetos, equilibrar-se, desequilibrar-se, pendurar-se,
arrastar, rolar, escalar, quicar bolas, bater e rebater com diversas partes do corpo e
com objetos, nas mais diferentes situações. (BRASIL, 1997a, p. 64)
Isso está presente nas mais diversas atividades que a Educação Física proporciona.
Jogos e brincadeiras que utilizem a ocupação também devem ter lugar de destaque nas aulas.
Quanto aos critérios de avaliação de Educação Física para o primeiro ciclo, o
professor deve levar em conta se o aluno possui segurança em seus movimentos, se possui
medo para tentar e arriscar. É também observado o comportamento do aluno diante das
38
atividades, se respeita as regras e a organização, participando adequadamente das atividades.
Outro item é a interação, a relação entre os alunos, com respeito às diferenças, durante as
atividades, se aceita ajudar os que tem mais dificuldades e se esse deixa ser auxiliado.
Neste documento, não há posicionamento quanto à alfabetização nas aulas de
Educação Física. O que há, como na história da disciplina no Brasil, é apenas um valor ao
esporte, aos jogos e às danças. Não há orientação sobre o trabalho da educação física nas
séries iniciais.
Para completar a reflexão sobre os documentos oficiais, passamos agora a falar sobre
a PC-SC (Proposta Curricular de Santa Catarina). O que o documento traz a respeito da
Educação Física, com suas concepções, formas de avaliação e conteúdos, entre outras
informações.
2.3 A EDUCAÇÃO FÍSICA NA PROPOSTA CURRICULAR DE SANTA CATARINA
Nesta seção, discutiremos a respeito das propostas curriculares de Santa Catarina a
partir de 1998, tendo em vista que foram as últimas elaboradas, sendo portanto, as mais
recentes. Os documentos que aqui apresentaremos são: Proposta Curricular de Santa Catarina:
Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio: Formação docente para educação infantil e
séries iniciais, do ano de 1998; Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil,
Ensino Fundamental e Médio: Disciplinas curriculares, também do ano de 1998; Diretrizes 3:
Organização da prática escolar na educação básica, do ano de 2001; Proposta Curricular de
Santa Catarina: Estudos temáticos, do ano de 2005.
A Proposta Curricular: Formação docente para educação infantil e séries iniciais é
um documento que é resultado de anos de trabalho por um grupo multidisciplinar, formado
por educadores da rede estadual de ensino. Segundo o próprio documento, “o ser humano é
entendido como social e histórico.” (SANTA CATARINA, 1998a, p. 12). Este conhecimento,
que é produzido no decorrer do tempo, é patrimônio coletivo, e deve ser socializado. Esse é
um dos eixos norteadores da Proposta Curricular, a socialização. Socializar a riqueza
intelectual, o conhecimento.
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Quanto aos fundamentos teórico-metodológicos do ensino de Educação Física, a
Proposta apresenta que “a Educação Física escolar vem se constituindo como prática
pedagógica, a partir de diferentes interesses e concepções pedagógicas.” (SANTA
CATARINA, 1998a, p. 153). O que revela um movimento na constituição do que,
inicialmente, não era uma disciplina, mas que foi sendo construída pela cultura pedagógica,
como as demais disciplinas. O movimento continua e novas confirmações vão surgindo, e a
disciplina, atualmente, contempla vários aspectos na formação do aluno, tanto fisiológicos,
como cognitivos e sociais. Com isso, podemos nos remeter à primeira seção deste capítulo,
que discorre sobre os desafios pelos quais a Educação Física passou para ser reconhecida
como componente curricular do processo educacional.
O movimento humano, através dos jogos, da dança, da ginástica e do esporte,
visando à melhoria da qualidade de vida, é o objetivo da Educação Física dentro da Proposta.
Para isso,
necessário se faz superar a supremacia da visão tecnicista, ainda presente na ação
pedagógica dos profissionais da área, e direcioná-la para uma práxis centrada na
reflexão, compreensão e superação da realidade, através da apropriação do saber
científico e de sua reelaboração. (SANTA CATARINA, 1998a, p. 153).
A Educação Física visa à formação do cidadão, formador de opiniões, critico,
participativo, transformador, levando em conta a socialização. Devido a seu caráter
interdisciplinar, “a Educação Física escolar deve interagir com as demais disciplinas.” (op. cit.
1998a, p. 153).
Aliada à função social presente nas atividades relacionadas ao movimento, através
dos jogos, dança, esporte e ginástica, está a ludicidade. Esta “deve permear toda a atividade e
estar presente em todos os temas, por ser uma das mais importantes características da
Educação Física escolar” (SANTA CATARINA, 1998a, p. 154). Entende-se, aqui, o lúdico
como uma atividade associada a diferentes manifestações como jogos e brincadeiras, em que
os participantes desenvolvam características como espontaneidade, criatividade, imaginação,
prazer, alegria e divertimento. Isso tudo associado à dimensão corporal, através de
movimentos e atividades que estimulem o indivíduo para o desenvolvimento corpóreo.
(GONZÁLEZ e FENSTERSEIFER, 2005).
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Na Proposta Curricular de Santa Catarina – disciplinas curriculares, a Educação
Física também traz o movimento humano aos temas (jogos, dança, esporte e ginástica). Com
isso, “os temas jogo e esporte serão abordados constituindo-se numa influência basilar para os
demais – ginástica e dança – que também integram a ação educativa exercida pela Educação
Física no âmbito escolar” (SANTA CATARINA, 1998b, p. 219).
É numa perspectiva histórica que os temas da educação física devem estar presentes,
constituindo, assim, uma produção histórica do conhecimento. Com isso, há a possibilidade
de mudar as regras, produzindo novos jogos e atividades, em que a produção coletiva, a
convivência e os interesses dos alunos sejam favorecidos. Outra perspectiva visa ao
desenvolvimento do aluno como ser social, o movimento humano, e a seleção dos conteúdos a
metodologias como meio educacional. Outro ponto destacado é em relação à postura do
professor. Esta
deve ser a de um pesquisador incansável, com profundo conhecimento específico e
uma visão de totalidade. É nesta visão de totalidade que se deve situar a
especificidade dos conteúdos da Educação Física, que além de ter um fim
motivacional específico e um significado próprio, deverá constituir-se num meio,
para que o aluno se produza, no coletivo, enquanto cidadão. Desta forma, a aula de
Educação Física passa a ser um espaço mais criativo, tanto para os alunos como para
os professores, oportunizando a produção individual e coletiva. (SANTA
CATARINA, 1998b, p. 220).
Isso conceitua a aula de Educação Física como um espaço de criatividade. O
professor tem a oportunidade de trabalhar o lado social e coletivo, com atividades que
valorizem o aluno como ser humano, que pensa, que age, que tem sentimentos.
Outro aspecto, contemplado na Proposta, é em relação à corporeidade. Segundo o
documento, “é a presença no mundo via corpo que sente, que pensa, que age, corpo que, ao
expressar-se na história, traz suas marcas desvelando-as.” (SANTA CATARINA, 1998b, p.
221). Para entendermos a corporeidade, há alguns itens que a caracterizam. Um deles é a
linguagem. Esta é exemplificada em gestos e na postura, ou seja, a linguagem corporal. A
historicidade também é parte integrante da corporeidade, ou seja, ao longo de sua história, o
homem foi aperfeiçoando os movimentos, como andar, correr, arremessar, saltar, entre outros.
A intencionalidade faz entender que os movimentos podem ser controlados, voluntários,
reflexivos, racionais ou conseqüentes. E, por último, o significado/sentido, pois os
41
movimentos possuem um significado (objetivo) com características específicas e regras
definidas. Quanto ao sentido, este é particular, como o interesse no movimento que pode ser
competitivo, de trabalho ou de lazer.
Quanto aos temas da Educação Física, um deles apresentado é o jogo. É jogando que
a criança demonstra suas habilidades, se socializa, usa sua criatividade para criar situações e
se organizar. Jogando, podemos perceber o tipo de personalidade e atestar a predisposição ao
esporte. Para a Proposta Curricular, o jogo
é considerado uma atividade em que a criança se exercita e se distrai, de forma
alegre e quase sempre prazerosa, proporcionando liberação de energias acumuladas,
além de contribuir para o desenvolvimento de aspectos importantes na formação da
personalidade. (SANTA CATARINA, 1998b, p. 224).
Outro tema tratado no documento é o esporte. Segundo a Proposta, o esporte escolar
pode ter um fim educativo. Para isso, se faz necessário os professores serem críticos quanto ao
trabalho da produção de valores morais nos alunos. Valores como enfatizar sempre que não
jogamos contra, mas sim com, e que derrota e vitória são fatores interdependentes, que ambos
caminham juntos. (SANTA CATARINA, 1998b)
Nessa perspectiva, o esporte deve ser encarado como competição saudável, visando
sempre à integração, ao jogo limpo, ou seja, à conduta adequada durante a prática esportiva,
sem agressões, buscando honestidade e lealdade, além do respeito ao adversário. É através do
esporte que ocorre a integração do forte com o fraco, do mais com o menos habilidoso. De
acordo ainda com a Proposta, pode-se diferenciar o jogo/brincar do esporte, mesmo tendo
características constitutivas semelhantes. Podem ser diferenciados pela maior ou menor
flexibilidade e intencionalidade ao trabalharem regras, espaços, tempo e resultados. O
jogo/brincar possui e nele deve ser enfatizada algumas particularidades como a criatividade, a
expressão, a espontaneidade, a parceria, entre outras. Ao contrário do esporte, que tem em sua
natureza a busca constante pela perfeição do gesto almejando sempre o resultado. Por isso, o
esporte não pode ser considerado como um meio para o desenvolvimento e aprendizagem do
aluno. (SANTA CATARINA, 1998b).
Outro documento de ordem estadual, Diretrizes 3: organização da prática escolar na
educação básica, define os fundamentos e a essência da organização curricular da Educação
42
Básica da rede pública. No que tange à abrangência da Educação Física, o documento tem o
objetivo de subsidiar a prática pedagógica quanto aos conceitos essenciais da disciplina.
Ao apresentar o mapa conceitual, o documento coloca em destaque quatro campos
conceituais que se tornam essenciais para a educação física: relações socioculturais, tempo,
espaço e relações com a natureza. Dentro desses campos, se apresentam o jogo, a ginástica, a
dança e o esporte, que fazem parte do grande grupo da corporeidade e movimento. Dentro dos
jogos, se encaixam os jogos tradicionais, de faz de conta, de construção, pré-esportivos e
dramatização. A ginástica engloba a formativa, a olímpica e a rítmica. A dança possui como
atividades os brinquedos cantados, cantigas de roda, atividades rítmicas, linguagem gestual,
expressão corporal, danças folclóricas, danças populares, modernas e clássicas e danças de
salão. O esporte tem como ênfase os ensinamentos de atletismo, handebol, basquetebol,
voleibol, futebol, tênis de mesa, entre outros.
Como disposto na Proposta Curricular, o documento das diretrizes apresenta
características do movimento humano, como a linguagem, a historicidade, a intencionalidade,
o sentido/significado, o desenvolvimento de habilidades e competências. Essas habilidades e
competências são asseguradas pela Educação Física através da capacidade de entender o que é
ser corpo, a partir das vivências da cultura corporal, da qualidade de vida, da capacidade de
compreender o funcionamento bio-anátomo-fisiológico, do conhecimento da cultura de
movimento e da construção e reconstrução das manifestações culturais. (SANTA
CATARINA, 2001).
A Proposta Curricular de Santa Catarina: Estudos temáticos (2005) não trata
diretamente da Educação Física como nos outros documentos, mas faz referência ao jogo e à
brincadeira. O jogo, que estimula a relação com diferentes parceiros, que favorece a
comunicação por meio de diferentes linguagens,
é ferramenta para a criação da fantasia, necessária a leituras não convencionais do
mundo. Abre caminho para a autonomia, a criatividade, a exploração de significados
e sentidos. Esta atividade atua, também, sobre a capacidade da criança de imaginar e
representar, articulada com outras formas de expressão. São os jogos, ainda,
instrumentos para aprendizagem de regras sociais. (SANTA CATARINA, 2005, p.
53).
43
A brincadeira, quando de forma sadia, de forma lúdica, favorece vários aspectos,
desde os afetivos até os psicomotores. É brincando que a criança usa a imaginação, cria
situações ou traz situações do real para o imaginário. Por isso, o
afeto, motricidade, linguagem, percepção, representação, memória e outras funções
cognitivas estão profundamente interligados, quando a criança brinca. A brincadeira
favorece o equilíbrio afetivo da criança e contribui para o processo de apropriação
de signos sociais, criando condições para uma transformação significativa da
consciência infantil, por exigir das crianças formas mais complexas de
relacionamento com o mundo. (SANTA CATARINA, 2005, p. 53).
Diferentemente da seção anterior, quando tratamos dos Parâmetros Curriculares
Nacionais, nesta, a respeito das Propostas Curriculares de Santa Catarina, há uma
preocupação maior com a criança em si. Há uma ênfase ao jogo, tanto desportivo quanto o
jogo como brincadeira, como lúdico. Não tratam diretamente do termo alfabetização, nem de
uma possível relação entre as áreas, que é objeto de nossa pesquisa. Mas deixam saber, nas
entrelinhas, que os temas discutidos levam a um desenvolvimento tanto corporal quanto
cognitivo no aluno.
Apresentamos a seguir, alguns conceitos acerca da alfabetização e do letramento e o
que porventura, os documentos oficiais podem trazer sobre os temas, com o objetivo de
compreender as teorias que envolvem esses dois temas para, depois analisar juntamente com
os enunciados dos sujeitos.
44
3 ALFABETIZAÇÃO: ALGUNS SENTIDOS A PARTIR DE DOCUMENTOS
OFICIAIS
Quando pequenos, sentados naquelas carteiras enormes, mal entendíamos o que
fazíamos naquele lugar. Nossos pais certamente tinham o desejo de ver seus filhos
alfabetizados. Tal palavra era tão complicada para nós, que preferíamos dizer que a gente
queria aprender a ler e escrever. Claro, queríamos brincar também. Mas ler e escrever seria
para a vida toda. E hoje, adultos, percebemos o quão importantes foram para nós aqueles
momentos em que a mão tremia, ou quando gaguejávamos para ler o boi baba. Percebemos
também que fomos nos alfabetizando ano após ano, com palavras novas. Mas o que é essa tal
da alfabetização que tanto nos intrigava quando pequenos? Neste capítulo, procuramos
discorrer sobre a alfabetização, apresentar conceitos e como ocorre, além de um breve
histórico de sua introdução no Brasil. Também apresentamos, de tal forma como a Educação
Física, como ela é abordada nos documentos oficiais (leiam-se PCN e Propostas
Curriculares).
3.1 UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO
Em nosso país, o ensino da leitura e da escrita na fase inicial da escolarização das
crianças, ou em nosso contexto a alfabetização, passou a ser assim chamado a partir do século
XX. (MORTATTI, 2004).
De acordo com a autora, a face mais visível na história da alfabetização está nos
métodos. Estes geraram uma disputa desde o final do século XIX, com temas relacionados
com “antigas” e “novas” explicações a um mesmo problema: a grande dificuldade que se tem
diante da alfabetização de crianças, especialmente na escola pública.
Assim como nossa autora-base, Mortatti (2004), para este momento de
contextualização histórica da alfabetização, dividiremos em quatro situações a descrição desse
processo.
45
Em um primeiro momento, até o final do Império, o ensino no país carecia de
organização, sendo, as poucas escolas existentes na época, instaladas em salas adaptadas,
abrigando alunos de todas as idades. Para o ensino da leitura, o material era precário, mesmo
sendo produzido na Europa. Seu início era através das chamadas “Cartas de ABC”, que eram
lidas e depois copiadas em documentos manuscritos.
De acordo com a autora, eram utilizados, durante essa época, métodos de marcha
sintética (da “parte” para o “todo”): da soletração (alfabético), partindo do nome das letras;
fônico (partindo dos sons correspondentes às letras); e da silabação (emissão de sons),
partindo das sílabas. O ensino, então, era iniciado apresentando as letras e seus nomes, ou
seus sons, ou as famílias silábicas. Reunidas as letras ou seus sons em sílabas, ou ainda
conhecidas as famílias silábicas, partia-se para o ensino de palavras formadas com essas
letras, ou sons, ou sílabas, sendo, portanto, ao seu final, ensinadas frases isoladas ou
agrupadas. O ensino da escrita era restrito à caligrafia e ortografia, através de cópias, ditados e
formação de frases.
Em 1876, foi publicada em Portugal, a Cartilha Maternal ou Arte da Leitura, escrita
pelo poeta português João de Deus. A partir daí, o que se viu foi uma divulgação do “método
João de Deus”. De acordo com a autora, o método “baseava-se nos princípios da moderna
lingüística da época e consistia em iniciar o ensino da leitura pela palavra, para depois
analisá-la a partir dos valores fonéticos das letras.” (MORTATTI, 2004, p. 06).
A partir de 1890, tem-se, então, um segundo momento na história do processo de
alfabetização no Brasil, com a implementação da reforma da instrução pública no estado de
São Paulo. Didaticamente falando, essa reforma estava baseada nos novos métodos de ensino,
com o então novo e revolucionário método analítico para o ensino da leitura. Este método
sofria forte influência da pedagogia norte-americana, baseando-se em princípios didáticos
oriundos de uma nova concepção, com um caráter biopsicofisiológico.
Até 1920, era dada ênfase na discussão sobre os métodos do ensino inicial da leitura,
uma vez que o ensino da escrita era entendido como uma questão de caligrafia e do tipo de
letra a ser usada, que dependia de treino, mediante exercícios de cópia e ditado. Nesse
período, também começou a ser utilizado o termo alfabetização, em referência ao ensino
inicial da leitura e da escrita.
De acordo com Mortatti (2004, p. 08)
46
o ensino da leitura envolve enfaticamente questões didáticas, ou seja, o como
ensinar, a partir da definição das habilidades visuais, auditivas e motoras da criança
a quem ensinar, o ensino da leitura e escrita é tratado, então, como uma questão de
ordem didática subordinada às questões de ordem psicológica da criança. (Grifos da
autora)
Em um terceiro momento, a partir da década de 1920, a utilização do método
analítico sofreu resistências por parte dos professores, devido principalmente a uma
“autonomia didática”, que era proposta pela “Reforma Sampaio Dória”. Os professores
começaram, então, uma busca por novas propostas de solução para os problemas do ensino e
da aprendizagem iniciais da leitura e da escrita.
O método analítico continuou a ser utilizado por seus defensores, extenuando sua
eficácia. Mas havia uma busca para a conciliação dos dois tipos básicos de métodos de ensino
da leitura e escrita, e então passou-se a utilizar métodos mistos (analítico-sintético), que
diziam ser mais rápidos e eficazes. A disputa entre os defensores dos dois métodos foi sendo
gradativamente contida, e com isso começou uma discreta manifestação pela implantação do
método global (de contos). A tendência para este novo método se deu através da
disseminação, repercussão e institucionalização das então novas e revolucionárias
bases psicológicas da alfabetização contidas no livro Testes de ABC para
verificação a maturidade necessária ao aprendizado da leitura e escrita (1934),
escrito por M. B. Lourenço Filho. (2004, p. 09) (Grifos da autora)
Através do ponto de vista exposto no livro, era dada certa importância tanto ao
método de alfabetização, que passou a ser relativizada, secundarizada e considerada
tradicional, quanto à permanência da função instrumental do ensino e aprendizagem da
leitura, em que era enfatizada a simultaneidade do ensino, entendida como habilidades
visuais, auditivas e motoras.
Até o final da década de 1970, de acordo com a mesma autora,
funda-se uma outra nova tradição no ensino da leitura e da escrita: a alfabetização
sob medida, de que resulta o como ensinar subordinado à maturidade da criança a
quem se ensina; as questões de ordem didática, portanto, encontram-se subordinadas
às de ordem psicológica. (2004, p. 10) (Grifos da autora)
47
E num quarto momento, partindo do início da década de 1980, começou a ser
questionada a urgência de novos métodos, com propostas de mudança na educação, a fim de
se enfrentar o fracasso da escola na alfabetização das crianças. Com isso, teve início um
pensamento construtivista sobre a alfabetização. Este apresentava uma revolução conceitual,
propondo um abandono das teorias e práticas tradicionais, desmetodizando o processo de
alfabetização e questionando a utilização das cartilhas.
Começa, então, uma disputa entre os adeptos do construtivismo e os defensores dos
tradicionais métodos, das tradicionais cartilhas e do tradicional diagnóstico do nível de
maturidade com fins de classificação dos alfabetizandos. Em relação aos métodos e cartilhas
de alfabetização, resultaram na produção de cartilhas construtivistas ou sócio-construtivistas
ou construtivistas-interacionistas. De acordo com a autora, mais recentemente, os livros de
alfabetização também sofreram tal modificação, tanto em indicações oficiais, quanto nas
estantes dos professores. Muitos destes alegam ter apenas para consultas, em momentos de
preparação de aula. Também no ensino e aprendizagem de modelos de leitura e escrita
apresentados pelas cartilhas, mesmo com os professores dizendo seguir uma linha
construtivista ou interacionista, e seus alunos acabam por não utilizarem diretamente esse
instrumento em sala de aula. (MORTATTI, 2004)
Nesse momento, então, o discurso institucional sobre o construtivismo e as propostas
de concretização decorrentes de certas apropriações da teoria construtivista, tornam-se
hegemônicos. “E tem-se, hoje, a institucionalização, em nível nacional, do construtivismo em
alfabetização, verificável, por exemplo, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs),
dentre tantas outras iniciativas recentes” (MORTATTI, 2004, p. 11) (Grifos da autora).
Há também uma corrente que busca a desmetodização da alfabetização, baseando-se
em quem aprende e como aprende a língua escrita, criando um consenso ilusório de que a
aprendizagem independe do ensino, além de um certo silenciamento a respeito de ordens
didáticas.
Também na década de 1980, há um aumento no pensamento interacionista em
alfabetização, que gradativamente vai sendo discutido e gerando disputas entre seus
defensores e os do pensamento construtivista. Aos poucos, essas disputas foram se
48
aglutinando à medida que certa apropriação do interacionismo foi sendo conciliada com certa
apropriação do construtivismo.
Após um breve histórico da introdução da alfabetização no Brasil, passamos a uma
conceituação desse processo, além das informações contidas nos Parâmetros Curriculares
Nacionais e nas Propostas Curriculares de Santa Catarina.
3.2 ALFABETIZAÇÃO: ENTRE AS APRENDIZAGENS E AS PRÁTICAS SOCIAIS
Em meados dos anos 1980 se dá, simultaneamente, a invenção do letramento no
Brasil, na França, nos Estados Unidos, na Inglaterra e em Portugal. Entretanto, o contexto e as
causas dessa emersão das práticas sociais de leitura e de escrita são essencialmente diferentes
em países em desenvolvimento como o Brasil e em países desenvolvidos como a França, os
Estados Unidos e a Inglaterra. Nos países desenvolvidos, constatou-se que, embora
alfabetizada, a população não dominava as habilidades de leitura e escrita. No Brasil, o
movimento foi contrário: o despertar para a importância e necessidade de habilidades para o
uso competente da leitura e da escrita tem sua origem vinculada à aprendizagem inicial da
escrita. Os conceitos de alfabetização e letramento se mesclam, se confundem. (SOARES,
2003c)
Em nosso país, a discussão do letramento surge enraizada no conceito de
alfabetização, o que tem levado a uma inadequada e inconveniente fusão dos dois processos,
com prevalência do conceito de letramento, o que tem conduzido a um certo apagamento da
alfabetização, levando a uma desinvenção desta.
O neologismo reinvenção, segundo Soares (2003c), pretende nomear a perda da
especificidade do processo de alfabetização que parece vir ocorrendo na escola brasileira ao
longo das últimas décadas. As causas para essa perda de especificidade podem ser:
implantação do sistema de ciclos e o princípio da progressão continuada. Porém, a causa
maior da perda da especificidade pode estar relacionada à mudança conceitual a respeito da
aprendizagem da língua escrita, que se difundiu a partir dos anos 1980, com o construtivismo.
É inegável que, na área da alfabetização, esses estudos trouxeram muitas contribuições,
49
porém, conduziram a alguns equívocos que podem explicar a desinvenção da alfabetização e a
perda de especificidade desse processo.
A mesma autora salienta que, em primeiro lugar, privilegiou-se a faceta psicológica
da alfabetização e obscureceu-se a faceta lingüística-fonética e fonológica. Em segundo lugar,
trouxe uma conotação negativa para o conceito de método de alfabetização, remetendo
métodos com os tipos tradicionais de métodos sintéticos e analíticos. Além disso, trouxe o
falso pressuposto de que apenas através do convívio intenso com a cultura escrita que a
criança se alfabetiza. Defender a especificidade do processo de alfabetização não significa
dissociá-lo do processo de letramento. No entanto, atualmente parece que as crianças estão
sendo letradas na escola, não alfabetizadas. É o que se considera a reinvenção da
alfabetização, em que volta a ser um processo autônomo, independente do letramento e
anterior a ele.
Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, nos quadros das atuais
concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas da leitura e da escrita, a
entrada da criança (e também do adulto analfabeto) se dá simultaneamente por esses
dois processos: pela aquisição do sistema convencional de escrita - alfabetização, e
pelo desenvolvimento de habilidades de uso desses sistema em atividades de leitura
e de escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita - letramento.
(SOARES, 2003c, p. 12) (Grifos da autora)
Na concepção atual, a alfabetização não precede o letramento, os dois processos são
simultâneos, o que talvez até permitisse optar por um ou outro termo. A conveniência, porém,
em conservar os dois termos parece estar em que, embora designem processos
interdependentes, indissociáveis e simultâneos, são processos de natureza fundamentalmente
diferente, envolvendo conhecimentos, habilidades e competências específicos, que implicam
formas de aprendizagem diferenciadas e, consequentemente, procedimentos diferenciados de
ensino. Assegurados esses pressupostos, a reinvenção da alfabetização revela-se necessária,
sem se tornar perigosa.
Entretanto, é importante pensar na alfabetização como um processo escolar e social,
mas sem atribuir a ela uma carga salvacionista. No texto “Reflexões sobre a história da
alfabetização: panorama, crítica e pressupostos”, Graff (1995) discute os mitos em torno do
processo de alfabetização. Por meio de dados históricos, o autor buscou desmistificar a crença
de que a alfabetização está diretamente atrelada ao processo de desenvolvimento social e
50
econômico. Essa crença, baseada nos princípios liberais e pós-iluminista, da sociedade
moderna, serve para disfarçar outros problemas de ordem social e econômica. Constrói-se, por
meio de suposições, no imaginário popular, o mito de que a alfabetização consiste na solução
para todos os problemas socioeconômicos, e que o desenvolvimento seria, naturalmente, uma
consequência. No decorrer dessa discussão, o autor argumenta que essa crença é em parte
construída, pelas confusões de definição, faltando uma definição consistente sobre o que é
alfabetização, sendo preciso reconceituá-la. Para isso, defende a necessidade de trazer à tona
as contradições, as continuidades e descontinuidades, desde o surgimento da história da
escrita e da história da leitura. No ocidente, resgatar desde a época clássica, com as cidades-
estado, onde foi criado o alfabeto grego até o processo moderno, onde a alfabetização passou
a ser vista como educação de massa.
Por meio da pesquisa histórica, Graff (1995) afirma que o que contribuiu para que a
alfabetização saísse dos domínios do estado (necessidade burocrática), da Igreja (pregação
religiosa) e do comércio, foram as reformas religiosas, tanto católicas quanto as protestantes,
lideradas por Lutero. As reformas luteranas encabeçaram a primeira campanha em prol da
democratização da alfabetização. Em muitos exemplos, citados pelo autor, em períodos
diferentes da história, a alfabetização se realizava mais na esteira da leitura do que da escrita.
Pode ser citado aqui o caso da Suécia, em que o clero recebia a incumbência de “guardiães da
leitura”. Em um processo de parceria entre a Igreja e o Estado, que aprovava leis, em que
obrigavam os cidadãos a aprenderem a ler como condição para exercerem alguns direitos
civis, como por exemplo, o direito de poderem se casar. Um rígido controle era exercido por
meio de testes domiciliares, como o exame anual de leitura, realizado pelo clero. Isso mostra
que nem sempre a escola esteve à frente do processo de alfabetização, uma vez que esse
processo era realizado em casa pelas mulheres e controlado pela Igreja.
São vários os mitos que Graff (1995) busca desmistificar. Além dos já citados, como
o processo de alfabetização não se configurar como a solução milagrosa para resolver todos
os problemas sociais e econômicos, que em alguns momentos da história a alfabetização
esteve relacionada à ação da leitura e não da escrita, que o processo de alfabetização nem
sempre aconteceu no espaço escolar, há outros, como: a complexidade de uma sociedade não
depende diretamente do processo de alfabetização, outras sociedades com alto nível de
organização se desenvolveram sem precisar dessa tecnologia; em outros momentos da história
a alfabetização não tinha todo o poder que hoje lhe é atribuída. Era vista como um
51
conhecimento não associado com poder e riqueza, sendo concebida com uma atividade sem
prestígio e sem status social. Por fim,... Nas palavras de Graff (1995, p. 52), a “alfabetização
não é o único problema. Ela também não é a única solução”.
Das questões mais abrangentes que foram apresentadas até aqui, passa-se a um
aspecto para Kleiman (2001), de que há uma dicotomia entre a imagem que se faz das
professoras alfabetizadoras e o que estas realmente são no desempenho de suas funções.
Chama a atenção a representação social2 da professora alfabetizadora que geralmente é vista
como um sujeito com sérias falhas nas suas capacidades de ler e escrever. Além disso, pinta-
se o retrato da alfabetizadora como uma mulher que não é muito competente naquilo que deve
fazer no exercício de sua profissão. Esse é um desenho feito por alguns e que circula também
no meio acadêmico, pois, segundo a autora, lamenta-se que nas próprias universidades, em
cursos de Pedagogia e Letras, há o desinteresse pelas atividades de leitura e escrita. Dessa
forma, comenta-se que a professora alfabetizadora não pode ser considerada uma boa
representante da cultura letrada.
A autora argumenta ainda que os estudos sobre a extração social da alfabetizadora e
seu letramento mostram que, no Brasil, a grande maioria das professoras de educação básica é
de família de baixa escolaridade. Além disso, não é raro que a alfabetizadora seja a primeira
alfabetizada em sua família e o diploma que a professora consegue é resultado do esforço
coletivo da família para ascensão social. Lembra-se aqui o que Graff (1995) apresenta como o
mito da alfabetização.
Essa representação da professora alfabetizadora está também relacionada com as
leituras realizadas por ela. Isso porque há quem considere letrada apenas aquela pessoa que é
leitora fiel dos clássicos da literatura. Dessa forma, as leituras mais simples, mais populares e
de maior circulação passam a ser consideradas como leituras ilegítimas e incapazes de auxiliar
uma pessoa em seu processo de letramento.
Kleiman (2001), contudo, argumenta sobre a necessidade de questionar as
concepções de letramento que estão implícitas nas avaliações que se fazem sobre a professora
2 Por representações sociais, de acordo com Moscovici (1978, p. 181), “entendemos um conjunto de conceitos,
proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso de comunicações interpessoais. Elas são o
equivalente, em nossa sociedade, dos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem também ser
vistas como a versão contemporânea do senso comum.”
52
alfabetizadora. Assim, a questão do letramento da professora está relacionada às práticas
situadas de leitura e escrita necessárias para e no seu trabalho. Com isso, considera-se que o
letramento da professora correlaciona-se ao contexto em que está inserida. A autora completa
dizendo que essa perspectiva é importante em um país como o Brasil, em que os mitos da
alfabetização (GRAFF, 1995) dominam o pensamento sobre a leitura e a escrita.
A partir disso, Kleiman (2001) compreende que o letramento da professora
alfabetizadora não é um problema se este passa a ser definido de uma forma mais ampla,
levando em consideração também as instituições familiares e de trabalho, observando, assim,
de onde essa professora veio, como se formou e quais habilidades precisa dominar no meio
em que trabalha. A autora fala também de quão apropriado é desenvolver programas
fortalecedores, através de uma “pedagogia culturalmente sensível” (ERICKSON, 1987 apud
KLEIMAN, 2001, p. 51), às práticas discursivas dos alunos da professora como também
programas de formação culturalmente sensíveis, integrando aquilo que se sabe sobre as
práticas discursivas da professora.
A autora revela também ser indispensável uma redefinição dos programas de
formação. Essa reforma, todavia, deve estar baseada nas análises feitas sobre as práticas de
letramento no local de trabalho da professora, considerando as exigências de comunicação na
sala de aula. No âmbito de discussões mais amplas, pode-se mais uma vez, entrar no mérito da
discussão da dicotomia entre teoria e prática nos cursos de formação. O que se necessita para
o desenvolvimento da profissional, alfabetizadora, é observar e analisar o contexto em que ela
está inserida e as habilidades que necessita desenvolver para a obtenção de sucesso em seu
trabalho diário. Volta-se, assim, o olhar para a comunidade em que a professora está inserida
para compreender a necessidade, ou não, das leituras dos clássicos ou de leituras mais básicas.
Kleiman (2001), então, compreende que as professoras alfabetizadoras precisam saber quais
as práticas de letramento que são exigidas no local em que trabalham e que a avaliação do
trabalho dessa professora deve considerar essas práticas.
Em outro texto de Kleiman (1995), a autora revela que a criança pode ser
considerada letrada, mesmo que ainda não saiba ler e escrever. O letramento pode ser
definido, então, como um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema
simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos. Esta
compreensão de letramento se distancia parcialmente da apresentada no início da seção no
que tange às práticas sociais, mas se aproxima por entender o letramento como um fenômeno
53
que extrapola o mundo da escrita tal qual ele é concebido pelas instituições que se encarregam
de introduzir formalmente os sujeitos nesse mundo. Pode-se afirmar que a escola preocupa-se,
não com o letramento, prática social, mas com apenas um tipo de letramento, a alfabetização,
o processo de aquisição de códigos.
Associados às práticas, apresentamos os eventos de letramento. Em uma pesquisa de
Heath (1982), que foi realizada em três comunidades dos Estados Unidos, temos na primeira
comunidade, Maintown, um exemplo de letramento com um grupo de professores que
desenvolvem com seus filhos, famílias de classe média, várias regras para o letramento, como
decorar o quarto dos filhos com personagens de histórias infantis, verbalização dos conteúdos
de livros e dos personagens, comparação do mundo real com personagens dos livros. As
crianças são, então, motivadas a inventar histórias e os adultos pedem para as crianças lerem
para eles. Tudo seguindo as idades apropriadas. Percebeu-se que com essas regras e pelos
cuidados que eles devem ter com os livros, depois de adultos, eles têm um grande fascínio
pela literatura.
Na segunda comunidade, Roadville, quando as crianças vêm do hospital para casa, já
tem o berço com objetos e outros brinquedos. Os pais incentivam a leitura de seus filhos
através de livros infantis que são comprados a todo momento, como também outros tipos de
brinquedos. As crianças são educadas a base de estímulos. São encorajadas a entender o que
há nos livros e quando acertam recebem incentivos. Porém, não há um encorajamento para
relacionar isso ao mundo real. Pode-se perceber, então, três fases: na primeira, são
introduzidas partes do livro, o alfabeto, cores e formas; na segunda, os adultos tentam divertir
as crianças através da leitura e, na última, há uma apresentação de exercícios como montar e
recortar, tudo relacionado ao que foi visto nos livros. Mas percebe-se um declínio pelo
interesse em leitura nas séries finais dos anos iniciais. (HEATH. 1982).
Na terceira comunidade, Trackton, de origem negra, as crianças vêm do hospital e
são inseridas em um mundo adulto. Não há berços, só cadeiras ou sofá. Os filhos costumam
dormir até certa idade com os pais. Não recebem brinquedos o tempo todo, só no Natal.
Brincam normalmente com utensílios de casa e estão o tempo todo ouvindo os adultos
falando. Elas começam a falar repetindo o que os adultos falam. Na primeira fase, chamada de
repetição, elas imitam a fala dos adultos. Na segunda fase há repetição com variação, em que
as crianças manipulam pedaços de conversa que elas ouvem e emendam a outros pedaços. A
terceira fase é a participação. Nela, as crianças entram na conversa dos adultos para chamar
54
sua atenção. Quando estão na terceira fase, há muito esforço e elas já conseguem se
comunicar imitando muitos sentimentos: raiva, tristeza, choro.
O letramento, então, pode ser dividido em dois modelos. Um deles é o autônomo e o
outro o ideológico. O modelo autônomo pressupõe que há apenas uma maneira de o
letramento ser desenvolvido. É o modelo que hoje em dia é prevalente na nossa sociedade. O
ideológico afirma que as práticas de letramento, no plural, são social e culturalmente
determinadas. No modelo ideológico, as práticas de letramento são aspectos não apenas da
cultura, mas também das estruturas de poder numa sociedade. As práticas de letramento
mudam segundo o contexto. (STREET, 2003). Uma das características do modelo autônomo é
a correlação entre a aquisição da escrita e o desenvolvimento cognitivo. Outra é a
dicotomização entre a oralidade e a escrita. E outra característica se dá com a atribuição de
poderes e qualidades intrínsecas à escrita, e por extensão, aos povos ou grupos que a possuem.
O modelo que determina as práticas escolares é o modelo autônomo de letramento,
que considera a aquisição da escrita como um processo neutro, que, independentemente de
considerações contextuais e sociais, deve promover aquelas atividades necessárias para
desenvolver no aluno a capacidade de interpretar e escrever textos abstratos, dos gêneros
expositivo e argumentativo, dos quais o protótipo seria o texto tipo ensaio.
Street (2003) também referencia os modelos autônomo e ideológico do letramento.
Para o autor, o letramento é um conjunto de habilidades técnicas uniformes a serem
transmitidas aqueles que não as possuem. O modelo autônomo funciona com base na
suposição de que em si mesmo o letramento terá efeitos sobre outras práticas sociais e
cognitivas. O letramento é dado de modo neutro, sendo seus efeitos sociais experimentados
apenas posteriormente.
Está associado também a uma abordagem técnica, a partir da qual as pessoas
precisam saber aprender a decodificar as letras e depois poderão fazer o que desejarem com o
recém-adquirido letramento. Associa-se também ao progresso, à civilização, à mobilidade
social, como decorrências naturais dele. Torna-se, então, uma prática de cunho social e não
meramente uma habilidade técnica e neutra.
O modelo ideológico, para Street (2003), oferece uma visão com maior sensibilidade
cultural das práticas de letramento, na medida em que elas variam de um contexto para outro.
Esse modelo parte de premissas diferentes das adotadas pelo modelo autônomo, propondo por
55
outro lado, que o letramento é uma prática de cunho social. O modelo ideológico então, parte
da premissa de que práticas variáveis de letramento são sempre enraizadas em relações de
poder, e que as aparentes inocências e neutralidades das regras atuam para disfarçar as
maneiras de manter esse poder através do letramento.
A apresentação do letramento como sendo autônomo é apenas uma das estratégias
ideológicas empregadas em associação no trabalho no campo do letramento, que em realidade
disfarça a maneira em que a abordagem supostamente neutra efetivamente privilegia as
práticas de letramento de grupos específicos de pessoas. Nesse sentido, o modelo autônomo
mostra-se profundamente ideológico. Ao mesmo tempo, o modelo ideológico consegue
perceber as habilidades técnicas envolvidas, por exemplo, na decodificação, no
reconhecimento das relações entre fonemas e grafemas e no engajamento nas estratégias nos
níveis de palavras, sentenças e de textos.
Para Street (2003), os novos estudos do letramento representam uma nova tradição
em se considerar a natureza do letramento, focalizando não muito a aquisição de habilidades,
como em abordagens dominantes, mas, ao contrário, sobre o que significa pensar.
As práticas de letramento mudam e novas práticas são frequentemente adquiridas por
meio de processos da aprendizagem informal e construção de sentidos. A observação
etnográfica local, sensível ao letramento, pode indicar uma variedade rica de práticas de
letramento em comunidades consideradas por agências externas como iletradas, que
marginalizam e negam a experiência local.
Quanto ao letramento escolar, podemos associar com uma pedagogia culturalmente
sensível. Para Erickson (1987, 1996),
é um tipo de esforço especial empreendido pela escola capaz de reduzir a dificuldade
de comunicação entre professores e alunos, desenvolver a confiança e prevenir a
gênese de conflitos que rapidamente ultrapassam a dificuldade comunicativa,
transformando-se em amargas lutas de identidade entre alguns alunos e seus
professores. (Trad. de Bortoni, 2001, p. 82)
A prática da pedagogia culturalmente sensível prevê o respeito às características
socioculturais e individuais dos alunos. É na escola que a criança terá a oportunidade de
vivenciar experiências de sucesso. Os professores tendem a se preocupar mais com seus
56
alunos, respeitando-os, mas não deixando de ser academicamente exigentes. È na escola
também que aos alunos sejam ensinados conteúdos relevantes e que tragam implicações na
sociedade dominante. Também é desejável incluir a primeira língua dos alunos na sala de
aula. E além do mais, a escola não está num vácuo, e sim inserida num contexto, que deve ser
valorizado. (OSBORNE, 2001).
Na maioria das vezes, letramento e escolarização se dão simultaneamente, uma vez
que a escola é, em quase todas as sociedades, a principal agência de letramento.
A linguagem, seja qual for a sua modalidade de comunicação é, por natureza,
polifônica, incorporando o diálogo com vozes outras que as do enunciador.
A partir dos estudos sobre alfabetização e letramento discutidos nessa seção, pode-se
afirmar que a alfabetização e o letramento são dois processos distintos, mas interligados, em
que é preciso desinventar a alfabetização (SOARES, 2003c), ensinando o aluno a codificar e
decodificar o código escrito (o alfabeto), para que ele domine o uso dessa tecnologia (a
escrita) e assim possa se comunicar verbalmente e realizar a atividade de leitura. Além disso,
é preciso desenvolver as habilidades de uso dessa tecnologia, para que as crianças participem
ativamente das práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita, para que elas sejam
letradas.
Ao participar de um evento de letramento (HEATH, 1982), mesmo que a criança não
tenha o domínio do código escrito (esteja alfabetizada), ela já é considerada letrada, visto que
está imersa em um contexto em que a escrita permeia as atividades, ela já consegue entender
que determinadas ações só podem ser realizadas de acordo com as regras pré-estabelecidas,
como, por exemplo, quando a criança ainda não sabe ler, mas lhe é solicitado que conte uma
história e ela inicia a sua fala com “Era uma vez...”.
Sendo a escola uma agência responsável pelo desenvolvimento do letramento, ela
pode fazê-lo tanto no modelo autônomo quanto no modelo ideológico, isso dependerá do foco
que é dado ao processo de leitura e escrita. Se a escola admite que só há uma maneira de
aprender a escrita e a impõe, ela desenvolve o letramento autônomo, já se ela aborda a leitura
e a escrita como práticas que são determinadas pela cultura e pelo contexto local, ela
desenvolve o letramento ideológico.
Diante dessas reflexões, compreendemos que a alfabetização não pode estar
dissociada do letramento. Por isso, para esta pesquisa, alfabetização é o processo de aquisição
57
do código escrito, que inicia com o reconhecimento das letras e termina no momento em que a
criança compreende e se faz compreender por meio da escrita. E o letramento é um processo
que caminha ao lado da alfabetização, mas que nunca termina, pois acontece sempre que as
práticas de leitura e escrita são desenvolvidas de acordo com a cultura e o contexto local da
escola, considerando-se a função social da escrita.
3.3 A ALFABETIZAÇÃO NOS PCN‟S
Nesta seção, apresentaremos, de forma sintética, o que os PCN‟s disponibilizam a
respeito da alfabetização, trazendo seus objetivos, os blocos de conteúdos propostos e as
formas de avaliação. Neste caso, para o ensino fundamental, que é o foco da nossa pesquisa.
De forma semelhante aos Parâmetros Curriculares Nacionais de Educação Física, o
documento de Língua Portuguesa também faz uma breve apresentação do objetivo dos PCN‟s,
que é de auxilio ao professor no decorrer do seu trabalho, para garantir que as crianças tenham
domínio dos conhecimentos linguísticos que são necessários. Após a introdução, nos é
apresentado o foco da área de Língua Portuguesa:
o domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para a participação social efetiva,
pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa
e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz
conhecimento. Por isso, ao ensiná-la, a escola tem a responsabilidade de garantir a
todos os seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos, necessários para o exercício
da cidadania, direito inalienável de todos. (BRASIL, 1997b, p. 15)
Para o Ensino Fundamental em sua totalidade, o documento apresenta como
objetivos gerais da Língua Portuguesa, 1) expandir o uso as linguagem em instâncias privadas
e utilizá-la com eficácia em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos.
2) Utilizar diferentes registros, inclusive os mais formais da variedade lingüística valorizada
socialmente. 3) Conhecer e respeitar as diferentes variedades linguísticas do português falado.
4) Compreender os textos orais e escritos com os quais se defrontam em diferentes situações
de participação social. 5) Valorizar a leitura como fonte de informação. 6) Utilizar a
linguagem como instrumento de aprendizagem. 7) Valer-se da linguagem para melhorar a
58
qualidade de suas relações pessoais. 8) Usar os conhecimentos adquiridos por meio da prática
de reflexão sobre a língua. 9) Conhecer e analisar criticamente os usos da língua. (BRASIL,
1997b).
Após os objetivos, o documento apresenta os conteúdos que estão divididos em três
eixos: língua oral (usos e formas); língua escrita (usos e formas); análise e reflexão sobre a
língua. (BRASIL, 1997b, p. 43).
O primeiro eixo, através da expressão oral do aluno, busca desenvolver essa
capacidade, mas que depende da escola constituir-se em um ambiente e acolha a vez e a voz,
as diferenças e as diversidades. O segundo eixo permite ao aluno construir seu conhecimento
sobre os diferentes gêneros presentes na escola e em outras esferas, sobre os procedimentos
mais adequados para lê-los e escrevê-los e sobre as circunstâncias de uso da escrita. O terceiro
eixo visa a uma melhor capacidade de compreensão e expressão, em situações de
comunicação tanto escrita como oral por parte do aluno. Nisso se inclui a capacidade humana
de refletir, analisar, pensar sobre fatos e os fenômenos da linguagem e a propriedade que a
linguagem tem de poder referir-se a si mesma, de falar sobre a própria linguagem.
Na sequência dos eixos, são apresentados os critérios de avaliação. O documento
salienta que não podem, de forma alguma, ser tomados como objetivos, pois isso poderia
significar uma queda na oferta de ensino, podendo gerar posteriormente uma não garantia de
conquistas das aprendizagens consideradas como essenciais. (BRASIL, 1997b). O documento
compreende que os critérios devem ser
por um lado, como aprendizagens indispensáveis ao final de um período; por outro,
como referências que permitem ser comparados aos objetivos do ensino e ao
conhecimento prévio com que o aluno iniciou a aprendizagem – a análise dos seus
avanços ao longo do processo, considerando que as manifestações desses avanços
não são lineares, nem idênticas. (BRASIL, 1997b, p. 97)
Com isso, deve-se buscar/identificar por que o aluno teria dado as respostas que deu
às situações ou problemas que lhe foram propostos, sendo instrumento de avaliação de
aprendizagem do processo. Devem também ser tomados em conjunto com os objetivos que
orientaram o ensino oferecido ao aluno.
59
De forma semelhante ao capítulo anterior, na perspectiva dos PCNs, trataremos agora
do ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa no primeiro ciclo, que engloba o primeiro e
segundo anos, que é a faixa em que se concentra nossa pesquisa. De acordo com a nova
nomenclatura, presente no Parecer 7/2010 do CNE, o primeiro ciclo compreende as faixas
etárias de 6, 7 e 8 anos, correspondendo respectivamente ao 1º, 2º e 3º anos, sendo chamado
então de ciclo da infância.
Ao longo dos anos em que esteve frequentando a Educação Infantil, a criança foi
tendo contato com as mais variadas formas de escrita. Entrando no primeiro ano, os
conhecimentos lingüísticos serão aprofundados e ampliados. Sendo assim, a criança assimila
os sentidos atribuídos pela cultura às coisas, ao mundo e às pessoas, através da mediação da
linguagem. Seria, então, “possível aprender, tanto sobre a linguagem verbal quando sobre as
práticas sociais nas quais ela se realiza, por meio da troca interpessoal.” (BRASIL, 1997b, p.
101). O documento nos dá a importância de uma prática educativa fundamentalmente apoiada
na interação grupal, que de certa forma só se materializa no trabalho em grupo, não
significando necessariamente a mesma coisa.
Quanto aos objetivos da Língua Portuguesa para o primeiro ciclo, espera-se que os
alunos sejam capazes de, progressivamente, compreender o sentido nas mensagens orais e
escritas de que é destinatário direto ou indireto; ler textos dos gêneros previstos para o ciclo;
utilizar a linguagem oral com eficácia; participar de diferentes situações de comunicação oral;
produzir textos escritos coesos e coerentes; escrever textos dos gêneros previstos para o ciclo;
considerar a necessidade das várias visões que a produção do texto escrito requer. (BRASIL,
1997b, p. 103).
Nos conteúdos de Língua Portuguesa para o primeiro ciclo, de acordo com o
documento, deve-se propor aos alunos que leiam e escrevam, ainda que não ortograficamente,
pois o foco está na escrita alfabética. Estes conteúdos se baseiam em valores, normas e
atitudes, de forma que se espera que os alunos os adquiram ou os desenvolvam. Também se
baseiam nos gêneros discursivos, em concordância com a aprendizagem através da
diversidade textual, especificando gêneros adequados para o desenvolvimento da linguagem
oral e da linguagem escrita (BRASIL, 1997b, p. 105).
Quanto aos critérios de avaliação para o primeiro ciclo, de acordo com o documento,
o aluno deve ser capaz de narrar historias conhecidas e relatos de acontecimentos, mantendo o
encadeamento dos fatos e sua sequência cronológica, ainda que com ajuda; demonstrar
60
compreensão do sentido global de textos lidos em voz alta; ler de forma independente textos
cujo conteúdo e forma são familiares; escrever utilizando a escrita alfabética, demonstrando
preocupação com a segmentação do texto em palavras e em frases e com a convenção
ortográfica. (BRASIL, 1997b, p. 121).
Procuramos, nesta seção, apresentar de que forma os Parâmetros abordam a temática
da alfabetização, a inserção do aluno no mundo da leitura e da escrita. Desde os conteúdos
propostos, aos temas tratados, e ainda aos critérios de avaliação. Convém salientar também,
que são apenas orientações, tendo cada professor seu modo particular de conduzir suas aulas.
O que nos faz uma alusão ao construtivismo, que de acordo com Correia (2007, p. 20), “a
alfabetização passou a designar a aquisição [...] da leitura e da escrita, simultaneamente;
processo esse entendido como individual, resultante da interação do sujeito com o objeto de
conhecimento.” Isso é o que está indicado nos PCNs. Atualmente, com uma ênfase muito
maior em alfabetização e letramento, um termo mais adequado seria aprendizagem da escrita,
sendo necessária a presença de um mediador, ou seja, a intervenção de um sujeito mais
experiente. Sendo assim, a alfabetização e o letramento não se dissociam, mas que é preciso
compreender cada processo.
A seguir, traremos de que forma é tratada a alfabetização pelo documento da esfera
estadual, a Proposta Curricular de Santa Catarina.
3.4 A ALFABETIZAÇÃO NA PROPOSTA CURRICULAR DE SANTA CATARINA
Na Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil e Ensino Fundamental:
Formação docente para a Educação Infantil e Séries Iniciais (1998), no capítulo que abrange a
alfabetização, é enfatizada a formação do professor reflexivo. De acordo com a Proposta, a
ação reflexiva do professor é “um processo que implica em atitudes que não podem ser
impostas. Dependem da maneira de encarar e responder aos questionamentos e desafios da
prática pedagógica.” (SANTA CATARINA, 1998a, p. 101). Na perspectiva da ação-reflexão-
ação, o professor, de acordo com Schön (2000 apud STEUCK, 2010, p. 160),
é capaz de refletir sobre a sua prática e encontrar soluções diante de situações para
as quais não há regras prontas a serem aplicadas. Forma-se, assim um profissional
61
autônomo capaz de agir em momentos imprevisíveis. Esse profissional também terá
maior autonomia em sua prática para decidir aquilo que lhe serve como auxílio e o
que não lhe é tão útil.
A alfabetização é apresentada como um espaço de trocas, interlocuções e interações,
a partir do que os alunos possam incorporar, articular, contestar e produzir sentidos e
significados e que considerem o diálogo. Segundo Bakhtin (1997, p. 123),
o diálogo, no sentido estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma das formas,
é verdade que das mais importantes, da interação verbal. Mas pode-se se
compreender a palavra “diálogo” num sentido amplo, isto é, não apenas como a
comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação
verbal, de qualquer tipo que seja.
Dessa forma, o professor tem a possibilidade de criar espaços em sala de aula nos
quais todos possam ter poder de decisão e iniciativa. A nosso ver, as inter-relações são
possíveis através da convivência das crianças, com trabalhos em conjunto, aperfeiçoando o
respeito aos ritmos individuais de aprendizagem. Nestes espaços, acontece o encontro dessas
múltiplas vozes sociais, baseadas no cruzamento de dizeres que constituíram e constituem a
formação do ser humano. Também podemos chamar de heteroglossia, ou seja,
o encontro sociocultural dessas vozes e a dinâmica que aí se estabelece: elas vão se
apoiar mutuamente, se interiluminar, se contrapor parcial ou totalmente, se diluir em
outras, se parodiar, se arremedar, polemizar velada ou explicitamente, e assim por
diante. (FARACO, 2003, p. 56)
A alfabetização, na Proposta Curricular de Santa Catarina: Educação Infantil, Ensino
Fundamental e Médio: Disciplinas curriculares (1998), é compreendida como apropriação de
muitas vozes. Este conhecimento constitui-se através das produções humanas, históricas e
culturalmente elaboradas e apropriadas pelos sujeitos, através de interações sociais, nas quais
o aluno busca a compreensão de si, do outro e do mundo. Para esta compreensão, de acordo
com a Proposta,
62
a alfabetização constitui-se numa atividade interativa, interdiscursiva de apropriação
de diferentes linguagens produzidas culturalmente. Dentre elas situa-se a escrita
como um artefato presente em todas as atividades das sociedades letradas. (SANTA
CATARINA, 1998b, p. 35).
A escrita, então, é constituída por um sistema particular de signos e símbolos, em que
busca representar os sentidos e significados de relações estabelecidas entre sujeitos. Engloba
habilidades de representar fonemas em grafemas, habilidades cognitivas, motoras, de
ortografia, de pontuação adequada. (SOARES, 2003a)
É necessária uma continuidade, pois a linguagem escrita tomará boa parte da vida
escolar dos alunos. Assim vão interagindo com o professor, com diferentes conhecimentos, e
a linguagem escrita nas mais diversas manifestações. Conforme está na Proposta,
ao olharmos a escrita como um processo que dá continuidade à
aprendizagem/desenvolvimento na linguagem das crianças, não podemos mais
aceitar que na prática pedagógica ocorra uma ruptura entre o que as crianças são
capazes de fazer ao ingressar na escola e os objetivos que esta se propõe a trabalhar
no ensino da língua. (SANTA CATARINA, 1998b, p. 36).
É esta continuidade que garante ao aluno um bom processo de alfabetização. Sem
essa ruptura, o aluno tem mais vontade, é melhor estimulado. Professores que estão mais
tempo na escola, como é o caso dos sujeitos de nossa pesquisa, conseguem fazer um trabalho
de continuidade, e por isso são necessárias políticas públicas que considerem esses aspectos.
Retomando o que diz a Proposta Curricular, a alfabetização é um processo que não
envolve apenas o professor e o aluno. Vai muito mais além disso, pois envolve toda a
sociedade da qual fazem parte, tanto na escola, como em casa. Pais, funcionários escolares,
vizinhos, fazem parte do processo de alfabetização. Assim, de acordo com a Proposta, deve-se
considerar a alfabetização como sendo um processo interdiscursivo que pressupõe ações
compartilhadas no cotidiano da sala de aula, priorizando a mediação com o outro pela palavra.
Isto significa que, no dia-a-dia escolar, professores, alunos, pais e os demais envolvidos
interagem nesse processo. (SANTA CATARINA, 1998b).
Para o processo de alfabetização, são vários os auxílios que o professor tem à mão.
Conforme a Proposta, a tipologia textual deve ser a mais variada possível, com
63
histórias infantis, os nomes/apelidos das pessoas e das coisas, os nomes
científicos/populares das plantas e das coisas, poesias, textos coletivos e individuais
produzidos pelos alunos da classe ou por outros alunos, jornais, bulas de remédio,
rótulos, lendas, adivinhas, parlendas, músicas, textos informativos, relatórios de
pesquisa e experiências. (SANTA CATARINA, 1998b, p. 37).
A escola se torna um local de práticas discursivas, sendo um local que possibilita aos
alunos participar de várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita. O letramento
escolar, para Signorini (1995 apud ROJO, 2000, p. 7), “tem subprodutos específicos [...] que o
letramento em outras esferas comunicativas talvez não apresente ou apresente em maior
grau.”
Em relação às Diretrizes 3 (2001), apresentaremos apenas os conceitos científicos
essenciais. De acordo com o documento, são três os eixos norteadores: fala/escrita,
leitura/escritura, análise lingüística. Dentre esses eixos, temos o texto, que é a unidade da
linguagem em uso. A dialogia, em que cada sujeito é complemento necessário do outro. O
discurso, efeito de sentido produzido entre os interlocutores. Textualidade: coerência/coesão,
o que faz de um texto não uma sequência de frases, mas um texto completo, com sentido, com
uma introdução, um desenvolvimento e uma conclusão. Há também a intertextualidade, onde
um texto remete a outro texto, com abertura e completude. A interdiscursividade, que é a
relação entre os diferentes discursos. A polissemia, que trata da multiplicidade significativa da
língua. E por último, a polifonia, que são as vozes de que se constitui a língua. (SANTA
CATARINA, 2001, p. 31)
Na Proposta Curricular de Santa Catarina: Estudos temáticos, a alfabetização é
apresentada em conjunto com o letramento. Neste documento, a linguagem faz parte do
processo. Segundo Amorim (2004, p. 97), “não há linguagem sem que haja um outro a quem
eu falo e que é ele próprio falante/respondente; também não há linguagem sem a possibilidade
de falar do que um outro disse.” É essa troca de enunciados que deve ter lugar na sala de aula,
onde todos têm suas contribuições, com a participação de todos os envolvidos neste processo.
Essa troca de linguagens, entre um que sabe mais e outro que sabe menos, mas tem
sua forma de se comunicar, pode ser levada em conta pelo professor. Podemos nos remeter
aqui à pedagogia culturalmente sensível, em que a escola pode empreender um esforço para
diminuir as dificuldades de comunicação entre alunos e professores. Desenvolve, assim, uma
64
determinada confiança e previne uma origem de conflitos entre identidades entre alunos e
professores.
Para Kleiman, (1995, p. 18), “a oralidade é objeto de análise de muitos estudos sobre
letramento.” De acordo com a Proposta,
as crianças, ao chegarem à Escola sem o domínio do código escrito padrão,
manifestam-se oralmente pelos seus dialetos e nem sempre se vêem acolhidas, em
razão do distanciamento de sua variedade lingüística e da falta de compreensão dos
educadores das diferenças entre oralidade e escrita. (SANTA CATARINA, 2005, p.
20).
Conforme Bakhtin (1990 apud KLEIMAN, 1995, p. 29), “a linguagem, seja qual for
sua modalidade de comunicação é, por natureza polifônica, incorporando o diálogo com vozes
outras que as do enunciador.”
Nas Propostas Curriculares de Santa Catarina, o termo alfabetização é mais presente,
há um enfoque maior. Porém, não há relações estabelecidas com a Educação Física. O que há,
são temáticas voltadas apenas para a aprendizagem do código escrito e da habilidade de
leitura, mas nada que sugira uma parceria entre as áreas.
A seguir apresentaremos os dados, relacionados com as teorias da educação física e
da alfabetização, buscando compreender nos discursos dos professores a relação existente
entre essas duas áreas.
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4 APROXIMAÇÕES DIALÓGICAS NO DISCURSO DOS PROFESSORES
As palavras da língua não pertencem a ninguém, mas ao mesmo tempo nós as
ouvimos em determinadas enunciações individuais. Nós as lemos em determinadas obras
individuais, e aí as palavras já não tem expressão apenas típica, mas expressão individual
externada com maior ou menor nitidez, sendo determinada pelo contexto singularmente
individual do enunciado. (BAKHTIN, 2003). Como as palavras não pertencem a ninguém,
isso pressupõe “um olhar de fora, isto é, um eu posicionado do lado de fora em relação ao
outro para poder enformá-lo esteticamente. (FARACO, 2003, p. 23).
De acordo com este autor, “compreender não é um ato passivo (um mero
reconhecimento), mas uma réplica ativa, uma resposta, uma tomada de posição diante do
texto.” (2003, p. 42) As ciências humanas constituem uma forma de saber dialógico, e estão
diante de textos que não são coisas mudas, mas a expressão de algum sujeito.
A atividade científica, então, em qualquer área, produz um texto, sendo, portanto,
uma atividade dialógica. Nas ciências humanas, nas quais nos ancoramos, há sempre dois
sujeitos, o que analisa e o analisado. Ou seja, “o intelecto contempla textos, isto é, conjuntos
de signos (verbais ou não), produtos de um sujeito social e historicamente localizado.”
(FARACO, 2003, p. 42)
Nas ciências humanas, na medida em que o objeto é o texto de alguém, há uma
relação sujeito/sujeito e, por trás desse texto, há sempre uma visão de mundo diferente do
outro, há um universo completamente diferente de valores com que se interage. As ciências
humanas estão apoiadas sobre a significação, trabalhando com a compreensão e não com a
explicação. A compreensão leva a um entendimento sobre o possível, pois envolve uma
questão de pluralidade.
Para analisarmos e discutirmos os discursos dos sujeitos participantes desta pesquisa,
relembramos os objetivos específicos, que são: (1) desvelar o discurso sobre a alfabetização
que perpassa a fala dos sujeitos professores de Educação Física e dos alfabetizadores; (2)
analisar as relações entre a alfabetização e Educação Física expressa nos discursos dos
professores e nos documentos oficiais; (3) compreender a trajetória de constituição de saberes
docentes acerca do que é alfabetizar. Após esta breve apresentação dos objetivos,
apresentamos a forma como serão organizados os dizeres.
66
Neste momento, levamos em consideração quem fala, de onde fala e para quem
falam os sujeitos de nossa pesquisa. A análise está dividida em 4 eixos. No primeiro,
trataremos do (1) tempo de serviço e formação docente e da interdisciplinaridade, levando em
conta, nos dizeres dos sujeitos, suas experiências e vivências ao longo da carreira, e como a
interdisciplinaridade está inserida nos contextos escolares, através de seus enunciados. Em
outro eixo de análise, (2) discutiremos a respeito do papel da Educação Física, para os
professores alfabetizadores e para os professores de Educação Física, e se há alguma
diferença entre os enunciados, afinal, são professores de áreas diferentes. Da mesma forma,
no eixo seguinte, (3) apresentaremos o papel da alfabetização, tanto para os professores de
Educação Física, quanto para os professores alfabetizadores. E, por último, questões a
respeito do silêncio dos sujeitos. O silêncio que denota um diferendo é aquele das frases que
estão em sofrimento, por não acontecerem. (AMORIM, 2004)
Dentro desses eixos, temos as categorias de codificação. Estas, de acordo com
Bogdan e Biklen (1994, p. 221), “constituem um meio de classificar os dados descritivos que
recolheu [...], de forma a que o material contido num determinado tópico possa ser
fisicamente apartado dos outros dados.” Essas categorias serão analisadas conforme o
contexto em que nossos sujeitos estão inseridos. Este contexto, este auditório e a situação
enunciativa de que fazem parte os sujeitos, obrigam o discurso interior a realizar-se em uma
expressão exterior definida, que se insere de forma indireta num contexto não verbalizado da
vida corrente, que se amplia pela ação, pelo gesto ou pela resposta verbal. (BAKHTIN, 1997).
A enunciação é, então, determinada, a partir da situação social mais imediata e o meio social
mais amplo, através do seu próprio interior. (op. cit. p. 113). Para situar nosso leitor,
conforme acordado anteriormente na metodologia, os sujeitos serão enumerados,
simplificando a retomada das categorias durante as análises. E ao final do dizer, serão
identificados quanto à área em que atuam e ao tempo de serviço.
4.1 O TEMPO DE SERVIÇO, A FORMAÇÃO DOCENTE E A
INTERDISCIPLINARIDADE
Nesta seção, recortamos partes das entrevistas em que os sujeitos falam sobre o
tempo de serviço e sua formação, em que relatam momentos vividos ao longo da trajetória
67
docente. E, num segundo momento, traremos uma discussão dos enunciados acerca da
interdisciplinaridade. Decidimos por discutir a interdisciplinaridade nesta seção, pois se
analisarmos em outros aspetos adiante tratados, muitos dos professores tiveram disciplinas
semelhantes durante a formação, no curso de Pedagogia ou de Educação Física. Isso não
justifica que durante este período tiveram idéias de interdisciplinaridade, mas que essas
disciplinas, aliadas à prática, inclinam os professores a um movimento interdisciplinar. Para
Fazenda (2002, p. 15), o pensar interdisciplinar “parte da premissa de que nenhuma forma de
conhecimento é em si mesma exaustiva. Tenta, pois, o diálogo com outras fontes do saber,
deixando-se irrigar por elas.” Levamos em conta, aqui, a perspectiva enunciativa, pois ao
“processo de expressão do ato realizado e do evento singular em que tal ato é concretizado, a
palavra deve ocorrer em sua inteireza” (FARACO, 2003, p. 27). Isso nos faz compreender
aspectos concreto-palpáveis, entendidos através da morfossintaxe e da fonologia, aspectos
semântico-conceitual e aspectos axiológicos, ou seja, o tom avaliativo.
(S5): [...] depois de um longo tempo de trabalho a gente ganhou experiência [...]
(Ed. Física – 25 anos)
(S8): [...] levando em tempo o tempo de serviço né [...] desde que comecei a
trabalhar [...] depois de vinte e sete anos de de trabalho [...] (Ed. Física – 27 anos)
(S4): [...] eu com bastante tempo de serviço né [...] pra gente que é alfabetizadora
que é professora há MUITOS anos [...] (Alf. – 28 anos)
(S3): [...] eu tenho muitos anos de serviço [...] (Alf. – 26 anos)
(S1): [...] é assim ó mesmo eu tendo TRINTA e um anos de serviço’ eu me preparo
todos os dias então eu leio’ eu vejo o que rendeu no dia anterior pro dia seguinte[...] eu
assim já faz trinta anos eu não sento nem pra faze chamada [...] meu marido assim meu
DEUS né trinta TRINTA anos que tu trabalha com primeiro aninho [...] (Alf. – 31 anos)
(S2): [...] eu trabalho aqui nessa escola de educação básica [...] há dez anos [...]
(Ed. Física – 10 anos)
A formação do professor supõe trocas, experiências, interações sociais,
aprendizagens, ou seja, um sem fim de relações. Ninguém se forma no vazio. O professor,
tendo acesso ao modo como cada pessoa se forma, leva em conta a singularidade da sua
história, além de um modo singular de agir, reagir e interagir com seus contextos. O percurso
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de vida é, então, um percurso de formação, no sentido de ser um processo de construção de
saberes. Este processo de desenvolvimento pode ser considerado como uma dinâmica, que vai
ao longo da vida profissional, construindo a identidade de uma pessoa. É neste processo em
que a própria pessoa vai se reconhecendo, ao longo de sua história, se formando, se
transformando, em interação. (NOVOA, 1995).
Essa identidade não se constitui em um dado adquirido, uma propriedade ou um
produto. A identidade, na profissão, se constrói com lutas e conflitos. É um espaço também de
construção de maneiras de ser e de estar dentro da profissão. Seria, então, mais conveniente
falar em processo identitário, mesclando a dinâmica que caracteriza a maneira como cada um
se sente e se diz professor. A identidade é, então, dividida em pessoal e profissional. A
pessoal se constrói através de um sistemas de múltiplas identidades, encontrando sua riqueza
na organização dinâmica dessa diversidade. Já o processo de construção da identidade
profissional, não é estranho em relação à função social da profissão e do profissional, à
cultura do grupo de pertença profissional e ao contexto sociopolítico em que se desenrola.
(NOVOA, 1995).
Professores com certos anos de trabalho, como se percebe no enunciado de S1,
adquiriram experiências, vivências, que os tornam diferenciados. Sociologicamente, pode-se
dizer que este tempo de serviço do professor modificou sua identidade, pois trabalhar não é
somente fazer alguma coisa, às vezes a mesma todos os dias, mas sim fazer alguma coisa de si
mesmo, consigo mesmo. (TARDIF, 2005) Há que se levar em conta o fato de S1 citar seu
tempo de serviço em tom mais alto, “TRINTA anos”, revelando uma entonação expressiva.
Para Bakhtin (2003, p. 290), “a entonação expressiva é um traço constitutivo do enunciador.”
Segundo o autor, uma palavra pronunciada de forma isolada, com determinada entonação
expressiva, já não pode ser considerada uma palavra, mas sim um enunciado. O significado de
dada palavra não pode ser compreendido como apenas uma palavra da língua, mas sim como
uma “ativa posição responsiva” (BAKHTIN, 2003, p. 291), que revela um estímulo para a
ação, neste caso, a ação de ensinar por “TRINTA anos”. Dessa forma, como comentado
anteriormente, a entonação expressiva não pertence à palavra, mas sim ao enunciado.
Cada um dos sujeitos passou por fases, escolas e situações diferentes. Conforme
podemos perceber nos dados dos sujeitos (ver quadro 02), alguns deles estão há quase trinta
anos no ensino. Nesse tempo no magistério, ao que tudo indica, passaram por fases no ensino,
as chamadas tendências pedagógicas. Até o ano de 1985, havia uma corrente favorável à
69
pedagogia liberal, composta pelas tendências tradicional, renovada progressivista, renovada
não-diretiva e tecnicista. A pedagogia liberal, de acordo com Libâneo (2009, p. 21), “sustenta
a idéia de que a escola tem por função preparar os indivíduos para o desempenho de papéis
sociais, de acordo com as aptidões individuais”.
Por volta dos anos 90, foi dada ênfase à pedagogia progressista. Esta era composta
das tendências libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos. De acordo com Libâneo
(2009, p. 32), “são tendências que, partindo de uma análise crítica das realidades sociais,
sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educação.” Não cabe a corrente
progressista institucionalizar-se numa sociedade capitalista, transformando-se, então, em um
instrumento de luta dos professores.
Em uma conversa informal, antes da entrevista, com S5, este comentava que os
professores podem ter muita teoria, ter lido vários livros, mas é a experiência, a prática, a
vivência de cada dia em sala de aula, que faz o professor trilhar seus caminhos. E confirma
essa posição, quando na entrevista diz que “[...] depois de um longo tempo de trabalho a
gente ganhou experiência [...]”. Essa experiência “tem origem, portanto, na prática cotidiana
dos professores em confronto com as condições da profissão [...] Nesse sentido, o docente é
não apenas um prático mas também um formador.” (TARDIF, 2005, p. 52). Pela conversa que
tivemos antes da gravação, este nos informou já ter trabalhado em outras escolas, ou seja, essa
experiência de que nos fala, não diz respeito apenas à realidade escolar em que está inserido,
mas que traz consigo ao longo de sua trajetória, realidades diferentes, em comunidades
completamente distintas, dão ao professor visões que auxiliam na sua percepção de mundo.
Essa constituição múltipla do sujeito nos remete ao dialogismo que, para um enunciado, é um
acontecimento e não uma simples experiência psíquica, nem uma relação dialógica.
(AMORIM, 2004)
Ainda sobre os saberes experienciais, podem ser definidos como “o conjunto de
saberes atualizados adquiridos e necessários no âmbito da prática da profissão docente e que
não provém das instituições de formação nem dos currículos. Estes saberes não se encontram
sistematizados em doutrinas ou teorias.” (TARDIF, 2005, p. 48).
É com esta experiência que o professor é visto como parte da escola. Muitas vezes,
suas idéias, seu conhecimento, podem ser levados em conta. Há uma cultura, em nossa região,
de que o professor com mais tempo de casa tem alguns privilégios. Como exemplos, podemos
citar a escolha das salas no início do ano, a escolha das turmas, entre outros. Mas esse
70
privilégio, de estar há alguns anos na mesma escola, pode favorecer em outro sentido. Se é um
professor efetivo em determinada escola há alguns anos, este sabe dos problemas da
comunidade. Há também alunos que por alguns anos freqüentaram suas aulas, tomando
conhecimento sobre ele e sua evolução, e nos momentos de reunião escolar, estas informações
sobre o aluno podem ser expostas para que se resolvam algumas situações. É o que nos
apresenta Tardif (2005, p. 56), que
se uma pessoa ensina durante trinta anos, ela não faz simplesmente alguma coisa, ela
faz também alguma coisa de si mesma: sua identidade carrega as marcas de sua
própria atividade, e uma boa parte de sua existência é caracterizada por sua atuação
profissional. Em suma, com o passar do tempo, ela vai-se tornando – aos seus
próprios olhos e aos olhos dos outros – um professor, com sua cultura, seus ethos,
suas idéias, suas funções, seus interesses, etc. (Grifos do autor)
De forma dialógica, através dos anos de serviço dos sujeitos, podemos identificar os
saberes pedagógicos. Durante anos, os professores passaram por diversas concepções
pedagógicas, por diversos métodos de ensino. Quando S1 diz que “eu me preparo todos os
dias então eu leio’ eu vejo o que rendeu no dia anterior pro dia seguinte”, revela uma
tradição, uma rotina que é mantida durante seus anos de serviço. Ou seja, mostra que a
professora em questão revela uma preocupação com o ensino, com a qualidade das suas aulas,
se preparando todos os dias. Como o sujeito em questão tem 31 anos de serviço, tende-se a
uma idéia de que este teve contato com as mais variadas situações de ensino. Quando S1
enuncia que se prepara “todos os dias”, revela também uma temporalidade, a uma eternidade
de suas ações. Para Bakhtin (1993), essa eternidade é tão abundante no pensamento
participativo da vida, que não funciona como conceito puramente teórico. Pelo contrário, isso
está vivo no pensamento devido a certos momentos do sentido valorativo.
Podemos relatar também, momentos da entrevista com S1 em que cita momentos de
sua prática, que tem influência de correntes pedagógicas. Por exemplo, quando diz “[...]eu
circulo o tempo inteiro’ procuro assim eu exijo né quando deu é deu mas eu trabalho muito
assim com guache com pintura ah aí eles RELAXAM né às vezes eu direciono às vezes na
hora eles vão criar né eu deixo essa liberdade [...]. Desse modo, Tardif (2005, p. 37) explica
que
71
os saberes pedagógicos apresentam-se como doutrinas ou concepções provenientes
de reflexões sobre a prática educativa no sentido amplo do termo, reflexões racionais
e normativas que conduzem a sistemas mais ou menos coerentes de representação e
de orientação da atividade educativa.
Cada um de nossos sujeitos, em suas respectivas áreas, tem seus conhecimentos.
Fazendo uma relação com o S4, que nos diz que “é professora há MUITOS anos”, supõe-se
que durante esse tempo teve acesso ao conhecimento. Não apenas aqueles absorvidos na
graduação, aqueles advindos de cursos de especialização e de cursos de formação. Ou seja,
cada professor é especialista naquilo que faz, tem os conhecimentos necessários para
determinada área. Esses saberes, chamados de disciplinares, de acordo Tardif (2005, p. 38),
são saberes que correspondem aos diversos campos de conhecimento, aos saberes de
que dispõe a nossa sociedade, tais como se encontram hoje integrados nas
universidades, sob a forma de disciplinas, no interior de faculdades e de cursos
distintos.
O saber do professor é plural, adicional e heterogêneo, pois envolve conhecimentos
diversos no exercício do professor. É proveniente de fontes variadas, e também de natureza
variada. Pode-se dizer ainda que o saber do professor é temporal, quando adquirido no
contexto da carreira.
Um outro ponto que nossos sujeitos também enunciam, é em relação a
interdisciplinaridade. Estes dizem:
(S5): [...] ela ainda é trabalhada muito distante entre o professor de educação física
e o professor de sala de aula (2) com certeza se ela tivesse mais um vamos dizer assim fosse
mais perto os dois trabalhando junto [...] o que mais precisaria eu acho é uma maior
integração entre professores do chamado primário ahm primeiro ciclo de primeira a quarta
série e o professor de educação física [...] (Ed. Física – 25 anos)
(S7): [...] eu acho que a gente tem que trabalhar sempre em conjunto né’ que
professor de educação física e:: e:: alfabetizadora tanto aula de artes’ educação física’ tem
que trabalhar em conjunto [...] (Alf. – 28 anos)
(S9): [...] com certeza temos que ter uma parceria professor de sala professor de
educação física [...] (Alf. – 30 anos)
72
(S4): [...] trabalhadas na educação física num trabalho conjunto [...] (Alf. – 28
anos)
(S1): [...] mais esses outros são MAIS assim em parceria com a educação física [...]
eu e a e a e a [...] a gente tem uma parceria assim assim bem legal [...] (Alf. – 31 anos)
(S10): [...] também no sentido dos ((incompreensível)) é: esqueci a palavra’ a
interdisciplinaridade [...] (Ed. Física – 10 anos)
Em primeiro lugar, precisamos definir o que é disciplina. Pode ser definida como
uma categoria que organiza o conhecimento científico, que institui nesse conhecimento a
divisão e a especialização do trabalho. Mesmo estando engajada a um conjunto científico
amplo, uma disciplina, de forma natural, tende à autonomia pela delimitação de suas
fronteiras, pela linguagem que é utilizada, pela técnica da qual é elaborada ou utilizada, e
pelas teorias que lhe são peculiares. (MORIN, 2005).
Dentro do ambiente escolar, conforme já vivenciamos, há alguns projetos em que há
uma união entre as disciplinas. Dependendo da situação, unem-se a Matemática com a
Geografia, ou a História com a Língua Portuguesa, entre outras, buscando sempre
aproximações entre os alunos e os conhecimentos de cada área. Quando há este diálogo entre
as disciplinas, conforme os enunciados de S7 e S4 “conjunto” e S9 e S1 “parceria”, dizemos
então, que há uma interdisciplinaridade.
Antes de conceituar a interdisciplinaridade, apresentamos um conceito de
interdisciplinar, que de acordo com Barbanti (2003, p. 347), é o “que é comum a duas ou mais
disciplinas ou ramos do conhecimento.” Pelo que nossos sujeitos apresentam, tem em seus
anseios essa relação comum entre várias disciplinas. Segundo eles, esse trabalho integrado
traria bons resultados no processo de alfabetização das crianças.
A interdisciplinaridade, de acordo com Morin (2005, p. 50),
pode significar que diferentes disciplinas encontram-se reunidas como diferentes
nações o fazem na ONU, sem entretanto poder fazer outra coisa senão afirmar cada
uma seus próprios direitos e suas próprias soberanias em relação às exigências do
vizinho. Ela pode também querer dizer troca e cooperação e, desse modo,
transformar-se em algo orgânico.
73
Compreendemos, nos dizeres dos sujeitos como uma forma de auxílio, partindo do
pressuposto de que os sujeitos professores alfabetizadores precisam mais dos „serviços‟ da
Educação Física, do que o caminho inverso. Tem-se a impressão de que em aula de Educação
Física não há necessidade da escrita. Em contrapartida, os sujeitos professores de Educação
Física defendem que o caminho inverso também contribui para a prática escolar de
alfabetização, ou seja, se houver uma ruptura da parceria, o trabalho interdisciplinar torna-se
desvinculado.
Para Fazenda (2002, p. 17), a interdisciplinaridade “parte do princípio de que
nenhuma forma de conhecimento é em si mesma racional. Tenta, pois, o diálogo com outras
formas de conhecimento, deixando interpenetrar por elas.” Ou seja, fundamenta-se que um
projeto interdisciplinar consegue captar a profundidade das relações entre as áreas de ensino,
caracterizando a intensidade das trocas entre os sujeitos participantes.
Tratada por alguns sujeitos como integração (S5), parceria (S9; S1) e conjunto (S7;
S4) nos leva a uma tendência de que a Educação Física, numa proposta de auxílio, de
parceria, pode resultar numa ajuda no que diz respeito ao processo de alfabetização da
criança. Para Fazenda (1996), a integração pode estar relacionada, formalmente, com as
disciplinas, levando a uma visão parcial e não de totalidade dos saberes. Para que se possa
haver interação de forma produtiva com o contexto na qual os alunos se inserem e com o
conhecimento adquirido ou que futuramente será adquirido, é preciso haver um constante
contato entre as dúvidas e os limites dos saberes. É a partir disso que acabam surgindo novas
e diferentes formas e atitudes para o conhecimento. Ao longo desses anos de serviço, os
sujeitos sabem da importância desse trabalho em conjunto, não apenas envolvendo a
Educação Física, mas Artes, como mencionada pelo S7, dentre outras. Temos, então, a
multidisciplinaridade ou polidisciplinaridade que, segundo Morin (2005 p. 50), “constitui uma
associação de disciplinas em torno de um projeto ou de um objeto que lhes é comum. As
disciplinas são chamadas para colaborar nele, assim como técnicos especialistas são
convocados para resolver esse ou aquele problema.” Neste caso, as relações que se
estabelecem entre uma disciplina e outra são praticamente imperceptíveis, em que se formam
um sistema de um só nível e de objetivos únicos. De acordo com Fazenda (2002, p. 31),
“quanto à multi ou pluridisciplinaridade, implicando apenas a integração de conhecimentos,
poderiam ser consideradas etapas para a interdisciplinaridade.”
74
Já a transdisciplinaridade tem características cognitivas que atravessam as
disciplinas. São redes complexas de inter, poli e transdisciplinaridade que operam e
desempenham um papel fecundo na história das ciências. (MORIN, 2005, p. 51). Mas há uma
tendência para que as disciplinas se fechem e não se comuniquem umas com as outras. Cada
disciplina, em primeiro lugar, pretende fazer reconhecer a sua soberania territorial e, desse
modo, confirmar as fronteiras em vez de destituí-las. Para Fazenda (2002), o nível
transdisciplinar seria o mais alto das relações iniciadas nos níveis multi, pluri e
interdisciplinares.
Além de se tratar de uma utopia, apresenta uma incoerência básica, pois a própria
idéia de uma transcendência pressupõe uma instância científica que imponha sua
autoridade às demais, e esse caráter impositivo da transdisciplinaridade negaria a
possibilidade do diálogo, condição sine qua non para o exercício efetivo da
interdisciplinaridade. (2002, p. 31) (Grifos da autora)
Mesmo com os professores expressando através dos seus discursos um desejo acerca
da interdisciplinaridade, muitos ainda tratam a relação da Educação Física com a
alfabetização um tanto quanto distante.
(S7): [...] vai me ajudar lá na quadra [...] LÁ na quadra lá na educação física [...]
eu vô lá fora trabalhar com eles [...] (Alf – 28 anos)
(S3): [...] lá na educação física [...] mas ele na sabe fazê LÁ [...] (Alf – 26 anos)
(S1): [...] vamo fazê isso lá fora [...] (Alf – 31 anos)
(S2): [...] TRAGO PRA QUADRA porque sou professora de educação física [...] (Ed.
Física – 10 anos)
Entende-se nesses enunciados, que há um certo distanciamento dentro da própria
escola. Dá-nos a impressão de que cada professor tem o seu espaço. Quando S7, S3, S4 falam
no “lá”, essa palavra representa distância. Mas vale ressaltar o contexto em que foram
entrevistados esses três sujeitos, que foi em sala de aula. Por mais que os espaços escolares
sejam próximos, a distância compreendida nos discursos permanece.
De acordo com Neves (2000, p. 257), “os advérbios de lugar fóricos referem-se a
circunstâncias, mas em si não exprimem uma indicação circunstancial substancial.” O “lá”
75
como advérbio de lugar, nos faz refletir na importância de cada espaço escolar para o
professor. Para o professor de sala, dizer “lá na quadra”, pode não significar nada. Mas por
trás desse discurso, podem estar inferências negativas a respeito do trabalho do professor de
educação física. “Lá na quadra”, se acontecer alguma coisa, é problema do professor, ou cada
um com seu espaço, alfabetizador na sala, professor de educação física na quadra.
Mas aí entram em confronto todos os enunciados anteriormente citados a respeito da
interdisciplinaridade. Se professores almejam esta prática interdisciplinar, talvez seria no
discurso o ponto de partida para a mudança. Ao invés de citar o “lá”, poderiam utilizar um
discurso mais aproximador, exaltando as qualidades de um trabalho em conjunto.
Discurso semelhante se observa com sujeitos da Educação Física, ao dizerem “trago
pra quadra” (S2). Dá-nos a ideia de que professor de educação física só trabalha na quadra,
mas e os outros espaços, como ficam, e o trabalho dentro de sala de aula, ou mesmo a
pesquisa de termos relacionados com a Educação Física nos laboratórios de informática
presentes na escola. Há um discurso de cada professor tem seu espaço, e de lá ninguém tira,
ninguém mexe.
Como anteriormente mencionado, talvez para se mudar os discursos com relação à
interdisciplinaridade, precisa-se mudar primeiro as atitudes, começando pelo discurso,
encurtando os espaços, aproximando os trabalhos.
4.2 O PAPEL DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA VOZ DOS SUJEITOS
Neste eixo da análise, trataremos, num primeiro momento, do papel da Educação
Física na voz dos sujeitos professores da disciplina. Abordaremos aspectos centrais
comumente associados à prática da Educação Física. Nosso objetivo aqui é compreender e
analisar como a prática é compreendida pelos próprios professores da disciplina, revelando-se
uma visão daquilo que escolheram como profissão. Num segundo momento, analisamos os
termos relativos à Educação Física, mas que são enunciados pelos sujeitos professores
alfabetizadores.
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Como poderemos compreender, através dos dizeres dos sujeitos citados a seguir, há
um conhecimento por parte de ambos, professores de Educação Física e professores
alfabetizadores, quanto ao ensino da Educação Física.
(S5): [...] o aluno aprende seus movimentos também torna ele um pouco mais ÁGIL
na no aprendizagem na aprendizagem na sua alfabetização [...] (Ed. Física – 25 anos)
(S8): [...] a importância da das qualidades física na alfabetização como lateralidade
como coordenação como tempo esPAço noção de tempo espaço [...] (Ed. Física – 27 anos)
(S6): [...] a coordenação motora trabalha-se a visualização’ trabalha-se o equilíbrio
né [...] (Ed. Física – 18 anos)
(S10): [...] lateralidade e saber que lado que é o direito que lado que é o esquerdo
ahm eles terem noção espacial então onde eles estão localizados ahm a consciência corporal
[...] (Ed. Física – 10 anos)
(S7): [...] na quadra né trabalhando a lateralidade [...] (Alf. – 28 anos)
(S9): [...] trabalha junto coordenação motora” se trabalha na educação física [...]
(Alf. – 30 anos)
(S4): [...] sempre voltado pra esse lado também do lado psicomotor que vai
desenvolvendo todo o corpo [...] (Alf. – 28 anos)
(S3): [...] noção de espaço tempo lá na educação física [...] tempo espaço visomotor
[...] parte motora grossa [...] (Alf. – 26 anos)
Ao analisarmos esses registros, reportamo-nos ao papel da Educação Física para os
alunos da alfabetização. É recorrente, no meio da Educação Física, termos enunciados pelos
sujeitos como lateralidade (S8; S10; S7), consciência corporal (S10), coordenação (S8; S6),
equilíbrio (S6), noção de tempo espaço ou noção espacial (S2; S10). Conforme enuncia S8,
esses elementos fazem parte de um grande grupo, chamado de qualidades físicas. Há outros
termos relacionados, como força, potência, etc., mas estes não foram citados. Se os sujeitos
enunciam que tem uma preocupação com o desenvolvimento dos alunos, tendem a um
favorecimento dessas qualidades em suas aulas.
Esses termos (lateralidade, equilíbrio, coordenação, etc.) são parte integrante de todo
o conjunto, chamado psicomotricidade. Conforme Barreto (1997; 1998 apud BARRETO,
77
2000, p. 32), as principais funções psicomotoras são o esquema corporal, a imagem corporal,
o tônus da postura, a dissociação de movimentos, as coordenações ou motricidades ampla e
fina, a organização espacial e temporal, o ritmo, a lateralidade, a direcionalidade, o equilíbrio,
o relaxamento, e a relaxação. Conforme podemos depreender dos dizeres dos sujeitos, a
Educação Física pode influenciar no processo de alfabetização. Isso se os termos citados,
como a lateralidade, a consciência corporal, entre outros, forem instigados ou na linguagem
do profissional de Educação Física, forem trabalhados, desenvolvidos de forma proveitosa nos
alunos durante as aulas.
A psicomotricidade ou educação pelo movimento pode ser vista como um meio para
o desenvolvimento. Nas crianças, é orientada para as experiências motoras em que os alunos
são expostos, levando a oportunidades numerosas e variadas de experiências corporais. Para
um conceito mais correto sobre a psicomotricidade, Le Boulch (2008, p. 58) diz que
a educação psicomotora deve ser considerada uma educação de base no Ensino
Fundamental. Ela condiciona todos os aprendizados desde a Educação Infantil: esses
não podem ser bem conduzidos se a criança não for levada a tomar consciência de
seu corpo, a se lateralizar, a se situar no espaço, a controlar o tempo, se ela não
adquirir habilidade suficiente e coordenação de seus gestos e movimentos. A
educação psicomotora deve ser privilegiada desde a mais tenra idade; e conduzida
com perseverança, pois ela permite prevenir certos problemas serem difíceis de
serem controlados quando já estão instalados.
Portanto, a educação psicomotora é a educação da criança através de seu próprio
corpo e de seus movimentos, levando em consideração a idade, a cultura corporal, a
maturação e os interesses da criança. A passagem de um nível inferior para outro superior é
feita de maneira gradativa e levando em consideração o ritmo individual. A educação
psicomotora utiliza, de certa forma uniforme, as funções motoras, cognitivas, perceptivas,
afetivas e sociomotoras.
Quando os sujeitos se referem à lateralidade, conforme enunciam S8 “a importância
da das qualidades física na alfabetização como lateralidade”; S10 “lateralidade e saber que
lado que é o direito que lado que é o esquerdo”; S7 “trabalhando a lateralidade“; se
reportam a uma compreensão teórica do termo, o qual significa que cada lado do corpo tem
seus movimentos, amplamente diferenciados pelos hemisférios cerebrais. Alguns possuem
maior desenvolvimento no lado esquerdo, outros no lado direito. Podemos, então, conceituar a
78
lateralidade como “a consciência de que o corpo tem dois lados distintos que podem se mover
independentemente. É um componente da consciência corporal.” (BARBANTI, 2003, p. 363).
A lateralidade é uma vertente do comportamento psicomotor da criança que, em seu
conjunto, apresenta uma série de implicações neurológicas, biológicas e pedagógicas. Quando
a criança apresenta dominância lateral com certo nível de maturação, terá movimentos mais
precisos.
A consciência corporal, de acordo com Barbanti (2003, p. 126), é o “reconhecimento,
identificação e diferenciação da localização do movimento e dos inter-relacionamentos das
partes corporais e do todo.” Desenvolvendo um estímulo corporal nas crianças, pode auxiliá-
las a reconhecerem seus elementos corporais, sabendo com qual parte do corpo devem
movimentar, fazendo com que reconheçam os membros e outras partes corporais.
De modo particular, a coordenação motora, quando enunciada pelos sujeitos, remete-
nos a alguns conceitos. Um deles é o de coordenação, em um âmbito mais geral, que “é o
controle temporal, espacial e muscular de movimentos simples ou complexos que surge em
resposta a uma tarefa extrema ou a objetivos mediados sensorialmente. É um processo de
organização dos movimentos.” (BARBANTI, 2003, p. 135). Esses movimentos simples ou
complexos são organizados dentro de fases do processo de aquisição da coordenação. Não há,
na literatura consultada, uma regra quanto à ordem de aquisição, se uma determinada fase é
pré-requisito para a seguinte. Portanto, apresentaremos em ordem da coordenação rústica para
a coordenação fina.
Como primeira fase, a coordenação motora rústica dos movimentos, é comumente
chamada de coordenação grossa. De acordo com Barbanti (2003, p. 136), “se caracteriza por
uma execução defeituosa e não econômica do movimento, conduzindo a um rápido cansaço.”
É nessa fase que se tem a aquisição da sequência básica do movimento, com esse ainda sendo
impreciso.
A segunda fase do processo da coordenação motora é a coordenação fina do
movimento. Nesta etapa, segundo Barbanti (2003, p. 135), “os movimentos supérfluos
desaparecem, não há excessos e há uma sensação subjetiva de deslizamento, de fluidez, e de
crescente facilidade de execução e com ela a satisfação e alegria do movimento executado.”
Nessa fase, é que ocorrem as correções, o refinamento e a diferenciação do movimento.
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A terceira fase é chamada de coordenação finíssima do movimento. É durante esta
etapa que “os movimentos [...] se distinguem por sua maior velocidade, segurança e precisão.
São fluidos, „soltos‟, e parecem fáceis, naturais e sem esforço.” (BARBANTI, 2003, p. 135).
É quando ocorre a automatização dos movimentos. Nessa fase, a criança tem um maior
controle sobre suas ações, e para realizar qualquer movimento tem um nível maior de
facilidade.
O equilíbrio, também citado pelos sujeitos, é de forma constante desenvolvido
durante as aulas nas mais diversas atividades. Em nossa prática, como exemplos de atividades
que desenvolvem o equilíbrio, a criança pode estar segurando uma bola com uma das mãos,
equilibrando-a, como também alguma atividade que só possa usar apenas uma perna, ou
atravessando um banco sueco. O equilíbrio, segundo Barbanti (2003, p. 213), é o
estado de um sistema cujo movimento não muda ou estado em que a soma das
forças que agem sobre o corpo é igual a zero. Quando o corpo está estacionário o
equilíbrio é estático; quando ele estiver com velocidade constante o equilíbrio é
dinâmico.
O equilíbrio envolve um controle postural, revelando um nível de integridade de
importantes centros e circuitos neurológicos, sem os quais nenhuma atividade pode ser
realizada.
Além do equilíbrio, outra qualidade citada pelos sujeitos é quanto à noção de espaço
e tempo. Gallahue e Ozmun (2001, p. 382) nos auxiliam com os conceitos de percepção
espacial que é a “compreensão do espaço ocupado pelo corpo somada à habilidade de projetar
o corpo, eficientemente, no espaço extremo”; e de percepção temporal que é a “aquisição pelo
indivíduo de certa estrutura temporal adequada.” (2001, p. 382) Em uma associação espaço-
temporal, podemos dizer que a criança dá sequência aos seus gestos, localizando e utilizando
as partes do corpo, coordenando e organizando suas atividades.
Algo que nos chamou a atenção e que também pode ser discutido, está relacionado às
aproximações entre os discursos dos sujeitos alfabetizadores com os dos sujeitos professores
de educação física. Há semelhanças nos enunciados que se fazem pertinentes. Analisando a
situação, são professores da rede estadual, que pertencem à mesma gerência de educação,
então, estão propensos a participar de cursos oferecidos pela secretaria, ou outros cursos, em
80
que diversas vozes circulam. De certa forma, a convivência com os professores de educação
física, na sala dos professores. Como já passamos por momentos de sala dos professores, há
conversas, há discussões, em que as ideias ou termos da Educação Física podem ser
amplamente citados. Há também os momentos de conselhos de classe, ao final de cada
bimestre, em que há uma discussão em certos momentos mais técnica, na avaliação do
desempenho de determinado aluno. Nesses momentos, os sujeitos alfabetizadores são
atingidos pelos ecos do discurso. Segundo Bakhtin (2003, p. 299), “o enunciado é
representado por ecos como que distantes e mal percebidos das alternâncias dos sujeitos do
discurso e pelas tonalidades dialógicas, enfraquecidas ao extremo pelos limites dos
enunciados, totalmente permeáveis à expressão do autor.”
Há também que se levar em conta o que esses sujeitos construíram durante os anos
de graduação. Por isso, analisaremos as grades curriculares e as ementas dos cursos de
graduação em que os sujeitos se formaram. Os sujeitos em questão passaram por algumas
universidades: FURB – Universidade Regional de Blumenau; UNIVALI – Universidade do
Vale do Itajaí e UNIFEBE – Centro Universitário de Brusque. Porém, um dos sujeitos fez a
graduação em uma universidade do RS, mas essa não tinha a grade curricular e as ementas
disponíveis.
Na Matriz curricular da FURB, a disciplina é chamada de Psicomotricidade. Na
ementa, consta o desenvolvimento neuropsicomotor; a estimulação precoce; o esquema
corporal e a prevenção dos distúrbios de aprendizagem; noções de neuropsicologia; noções de
neurofisiologia; esquema corporal e lateralidade; a importância do relaxamento para o
equilíbrio psicossomático; inserção no cotidiano escolar da Educação Básica.
A UNIVALI, em seu ementário, também tem uma disciplina chamada
Psicomotricidade. Nesta, estão inseridos o histórico e evolução da Psicomotricidade;
conceituação básica; aspectos neurológicos; desenvolvimento motor e aprendizagem;
contribuições da Psicomotricidade para a qualidade do processo educativo; implicações
pedagógicas.
A disciplina de Psicomotricidade também é assim chamada na UNIFEBE. Na ementa
da mesma, consta a psicomotricidade: bases antropofilosóficas da psicomotricidade; bases
neurofisiológicas da psicomotricidade; as diversas concepções de psicomotricidade:
psicológica, fenomenológica, psicossociológica, e psicanalística; a psicomotricidade e os
problemas escolares: crescimento, o desenvolvimento e a aprendizagem; a anamnese; os
81
sintomas; o diagnóstico; dislexias, disgrafias, disortografias e discalculia; técnicas de
reeducação e terapia; relaxamento e relaxação; psicomotricidade e a prática: a estimulação
essencial; jogos e brinquedos cantados; os circuitos perceptomotores; laboratório e
sensibilização.
Essas três universidades estão, geograficamente, localizadas próximas uma da outra,
sendo favorável o intercâmbio entre os professores. Talvez, isso possa explicar que alguns
termos presentes nas ementas, sejam comuns.
Outro aspecto que os sujeitos enunciam é quanto à valoração dada à Educação Física.
De acordo com nossos sujeitos, a Educação Física é conceituada como trabalho: trabalha-se
(S6), trabalhando (S7), se trabalha (S9). Para esses professores, trabalhar o corpo, na
educação física, é de forma semelhante a moldar esse corpo, torná-lo obediente aos comandos
cerebrais. É um trabalho repetitivo, dia após dia, que atende a determinadas necessidades.
Semanticamente, este trabalho, como um dos sentidos, estaria no campo de treinamento. Ao
invés de tratar do papel da educação física como trabalho, seria melhor então conceituar como
um desenvolvimento, conforme o enunciado de S4 “desenvolvendo todo o corpo”. Nossa
experiência permite-nos expor aqui uma situação em que professores de Educação Física, em
suas aulas, utilizam demasiadamente o termo trabalho. Por exemplo, numa aula de
basquetebol, hoje vamos trabalhar a bandeja, ou numa aula que envolva dança, o professor
diz, hoje vamos trabalhar o ritmo. Seria mesmo um trabalho ou seria um desenvolvimento?
De certa forma, o termo desenvolvimento se torna mais adequado, de forma que um trabalho
você pode acabar a curto prazo, e um desenvolvimento, o resultado se dá a longo prazo, em
etapas.
Podemos também discutir a relação entre aprendizagem e desenvolvimento. A
aprendizagem pode ser concebida como uma mudança no comportamento. É um processo que
depende de condições e situações que as pessoas experienciam ao longo de suas vidas. A
aprendizagem, então, compreende o processo de aquisição de novas experiências que são
integradas nas esferas cognitiva, afetiva e conotativa. A aprendizagem se dá ao longo do
tempo, desde o nascimento, aprendendo a falar, a andar, escrever, entre outros. A
aprendizagem ocorre em diversos espaços sociais, como escola, família, sempre implicando
uma relação entre sujeitos. A aprendizagem apresenta dois aspectos: um motor (objetivo) e
um cognitivo (subjetivo) e os dois possibilitam ao aluno a interação social. Toda atividade
apresenta uma estrutura que possibilita o seu desenvolvimento. Durante o desenvolvimento, a
82
criança com sua capacidade de operar com significados culturais, passa a responder de forma
imediata aos estímulos do meio, controlando sua própria conduta. Nesse sentido, o
desenvolvimento humano é mediado por interações sociais. Em determinados momentos do
desenvolvimento, a criança realiza atividades que estão relacionadas ao seu período de
desenvolvimento psíquico. Começa também a ser capaz de realizar atividades superiores,
utilizando a linguagem, se inserindo em atividades coletivas no meio social em que vive. Para
ocorrer o desenvolvimento então, é necessária a presença da mediação. A criança age no
mundo de forma mediada pelos instrumentos materiais e pelos significados que os adultos
fornecem às suas ações. (VIGOTSKII; LURIA; LEONTIEV; 2001)
O desenvolvimento se dá de forma gradativa, de forma lenta, ou seja, decorre ao
longo de toda a vida escolar do aluno. Pois de acordo com Barbanti (2003, p. 160),
é um processo de mudanças das disposições físicas e psicológicas causadas por
influências endógenas e exógenas e dirigidas de modo ordenado para um estado
maduro. O desenvolvimento motor pode ser interpretado como a emergência, síntese
e diferenciação das capacidades físicas, padrões de movimentos e habilidades
motoras.
Dentro de um conceito generalizado de desenvolvimento, podemos subdividir em
desenvolvimento humano, desenvolvimento motor e o desenvolvimento infantil. Conforme o
mesmo autor (2003, p. 161), o desenvolvimento humano é o “processo de mudanças graduais,
de um nível simples para um mais complexo, dos aspectos físico, mental e emocional pelo
qual todo ser humano passa, desde a concepção até a morte.” Uma das formas dessas
mudanças se dá através do desenvolvimento motor. Este, de acordo com o autor (2003, p.
162), trata das transformações e estabilidades no aspecto motor, que vai se modificando de
acordo com a idade. Também pode ser considerado como alterações no desenvolvimento e
aquisição de movimentos especializados, além dos aspectos motoneurais e dos
comportamentais que vão ocorrendo durante a vida do indivíduo.
Conforme ainda o autor (2003, p. 162), o desenvolvimento infantil engloba “as
transformações que ocorrem numa criança desde o nascimento até a maturidade, ou desde o
primeiro ano de idade até o início da adolescência.” Se desenvolvendo, nas mais diversas
vertentes, a criança chega à representação dos elementos do espaço, descobrindo formas e
83
dimensões. Sendo assim, a criança toma conhecimento da sua dominância corporal, se
constituindo como um corpo orientado, que lhe servirá de padrão para se situar no espaço.
Desenvolvendo seu corpo, o aluno constrói toda imagem de si e do outro,
familiarizando-se com seus componentes corporais. Para isso, Le Boulch (2008, p. 181)
afirma que
a criança constrói sua imagem por um esforço perceptivo das sensações
proprioceptivas, associadas ás informações visuais e táteis: terá consciência das
diferentes partes de seu corpo: cabeça, tronco, braços e pernas; situará essas partes
umas em relação às outras: cabeça em cima do tronco, nariz em cima da boca...;
situará a posição do corpo em relação aos eixos de referência: alto-baixo, frente-
atrás, lateral: direita-esquerda.
É através do desenvolvimento corporal, envolvendo a psicomotricidade, reunindo as
qualidades físicas anteriormente mencionadas, que a escrita se apóia. Esse desenvolvimento
contribui para a evolução do ajuste global em direção ao ajuste cognitivo, que se dá de forma
mentalmente programado, ou seja, que já foi adquirido. Dentre as funções psicomotoras, o
aprendizado envolve o ajuste postural com conscientização, implicada no controle da cintura
pélvica, escapular e da cabeça, sendo que depende do posicionamento do eixo corporal na
vertical. O controle tônico que é necessário à manutenção de um tônus suficiente do eixo
corporal. O relaxamento diferencial que possibilita a dissociação entre o movimento dos
braços e das escápulas. O desenvolvimento da habilidade manual que depende do módulo da
coordenação fina. A aquisição definitiva da orientação esquerda-direita no ato gráfico, que
implica uma boa coordenação de olhos e mão. A passagem da egocêntrica à descentralização,
que permite a criança se colocar na perspectiva do outro. (LE BOULCH, 2008)
O ajuste corporal, como forma de desenvolvimento, pode também ser relacionado à
posição sentada, pois é sentado, durante boa parte da rotina escolar, que o aluno permanece.
Sendo assim, é a posição que o aluno mais se encontra para o ato da escrita. De acordo com
Le Boulch (2008, p. 195),
para que a cópia de um texto possa ser realizada em pequena dimensão, ou seja,
mobilizando a motricidade fina da mão e dos dedos, com um bom controle tônico, é
necessário que o eixo corporal esteja estável e equilibrado na vertical. O eixo do
corpo é o pilar central, estável e maleável, a partir do qual o braço pode ser liberado
84
para encontrar toda a sua mobilidade, que permite os movimentos finos da mão e
dos dedos.
Este controle postural, de acordo com Quirós e Scharger (1978 apud FONSECA,
2004, p. 70), “se eleva ao âmbito hemisférico e não simplesmente ao âmbito cerebeloso,
dando-lhe ênfase e relevância psíquica superiores, na medida em que se equaciona a
aprendizagem humana em termos intra e inter-hemisféricos.” O hemisférico esquerdo, trata
das funções de linguagem, de análise e de tratamento seqüencial, enquanto o hemisfério
direito é responsável pelas informações corporais, de síntese e de tratamento simultâneo e
global.
De certa forma, podemos referir que uma disfunção, nesse emaranhado
informacional, caracteriza muitos dos problemas de comportamento e aprendizagem em
diversas crianças, com lesões ou disfunções no cérebro, autistas, hiperativas e dispráxicas.
(FONSECA 1986, 1999 apud FONSECA, 2004). Sem essa hierarquia funcional, a linguagem
e a aprendizagem podem não se integrar, nem se desenvolver de modo adequado.
Outro aspecto enunciado pelos sujeitos diz respeito ao movimento. Este, em alguns
dizeres, pode ser associado ao lúdico.
(S5): [...] há um trabalho voltado mais na área lúdica’ onde a criança: executa
moviMENtos [...] (Ed. Física – 25 anos)
(S6): [...] o próprio movimento da criança ela vai se associando com a alfabetização
[...] (Ed. Física – 18 anos)
Compreendemos esses movimentos, não como os próprios da natureza humana,
como andar, correr, entre outros. Analisando o que os sujeitos enunciam, é o ato de se
movimentar. Este, na criança, exerce um efeito sobre si e, consequentemente, sobre o mundo
que as cerca (GONZÁLEZ E FENSTERSEIFER, 2005). A atividade que é realizada na aula
de Educação Física pode colaborar para o aprendizado da leitura e da escrita, sendo que o
movimento, a exploração de diversos tipos de movimentos é capaz de levar o aluno à
comunicação e à expressão de fatos e idéias. A exploração também do ambiente, as interações
entre espaço e ritmo mediadas de certa forma pelo movimento, é que promoverão habilidades
motoras e cognitivas que inclinarão para o aprendizado da leitura e escrita. Ao se movimentar,
a criança toma decisões, tenta, refaz, compreende o papel do próprio corpo ao interagir com o
85
meio circundante, enfim, toma consciência de si própria, relacionando-se com o mundo físico
e social. (ARANTES, 1996, p. 235). Para S5, em suas aulas, a criança deve executar
movimentos “sem a finalidade de uma cobrança específica para o certo’ para o errado né
deixando a criança criar alguma coisa com os elementos que a gente disponibiliza pra eles
na durante as aulas”. Podemos ainda citar como exemplo, uma criança que entra em contato
com uma bola de borracha pela primeira vez. Devido a sua facilidade de quicar, a criança se
assusta e não consegue retomar o controle. Mas aos poucos, essa criança vai percebendo a
força que impele na bola, tomando consciência do movimento, e sem que perceba, já
consegue quicar a bola duas, três vezes, e assim por diante, com uma certa habilidade, que aos
poucos vai sendo aprimorada. De acordo com González e Fensterseifer (2005, p. 385), é “uma
conduta de atores numa referência sempre pessoal-situacional. Isso, portanto, só pode ser um
acontecimento relacional, dialógico.” Compreendendo, neste contexto, o diálogo, somos
levados ao entendimento que é a relação do indivíduo com algo exterior a ele. O diálogo,
muitas vezes, é dado pelo movimento. Podemos chamar de linguagem corporal. Um exemplo
de comunicação através do movimento, utilizando a linguagem corporal, é a linguagem de
sinais utilizada pelas pessoas com deficiência auditiva. Em nossa realidade, S2 enuncia que
“os meus alunos eles escrevem nas costas dos outros com o dedinho a letra do nome e eles e
eles tentam adivinhar o que o que o outro tá escrevendo [...] e eles fazem letrinha no chão
com o corpo deles”.
Há, neste dizer, uma preocupação da professora em favorecer a linguagem, através
do movimento, do gesto em suas aulas. Quando os alunos escrevem nas costas dos colegas ou
reproduzem letras no chão, desenvolvem a percepção dos movimentos, dos gestos e, ao
mesmo tempo, exprimem emoções, sentimentos, ou até mesmo ironias, que essa manifestação
realizada na aula pode oferecer. O diálogo através do corpo permite a expressão de
sentimentos, de vozes, sorrisos, sensualidade, gênero, raça, etnia. De acordo com Gil (1997
apud González e Fensterseifer, 2005, p. 267), “o corpo é um operador discursivo, tem um
papel de mediação e integração, porque além de se construir nos discursos ele constrói
discursos”. O movimento humano é mais do que simples deslocamentos do corpo no espaço.
Ele se constitui em uma linguagem que permite às crianças agirem sobre o meio físico.
O corpo vive na linguagem, mas uma linguagem que se desvia de todas as
decodificações, porque é continuamente inventado à medida que vai sendo produzido. Não
existe, então, linguagem sem corporalização. O corpo torna-se referência fundante de todas as
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linguagens. Nesse âmbito, se encaixam a linguagem falada, a escrita, a gestual, a das roupas, a
dos sinais, a musical, a plástica, a esportiva, a dança. Todas essas têm uma inscrição corporal,
inclusive o silêncio. (GONZÁLEZ E FENSTERSEIFER, 2005)
4.3 A ALFABETIZAÇÃO NAS MÚLTIPLAS VOZES
Outro item de análise faz referência quando perguntamos aos sujeitos que palavras
eles associam à alfabetização e o que entendem por este termo. Falando a partir de
experiência própria, para um professor de Educação Física, enunciar sobre a alfabetização, se
for apenas baseado no que adquiriu no período de graduação, se torna complicado devido à
falta de uma disciplina que discuta esse processo. O que o professor de Educação Física sabe
a respeito disso, pode, então, ser oriundo de leituras, de conversas de sala de aula, conselhos
de classe e cursos ou seminários de que participaram.
(S5): [...] alfabetizar ela:: é:: uma palaVRA:: bem aberta’ tá’ ela envolve o
alfabetizar na leitura’ na escrita’ na fala e também no seu modo de agir [...] (Ed. Física – 25
anos)
(S7): [...] alfabetizar é: penso que é pra vida toda [...] né então alfabetização é algo
bem amplo [...] (Alf. – 28 anos)
(S8): ler escrever né reconhecer os símbolos [...] saber interpretar os símbolos [...]
(Ed. Física – 27 anos)
(S6): alfabetização na educação física’ é o próprio movimento da criança ela vai se
associando com a alfabetização’ eu daria pra essa palavra o movimento’ [...] (Ed. Física –
18 anos)
(S9): alfabetização é aprender ler e escrever a principio [...] pra mim alfabetização
é ler e escrever [...] (Alf. – 30 anos)
(S4): eu entendo que a alfabetização seja ta integrando né ou engajando a criança
dentro de todo um contexto social né porque eu penso que se ela não estiver alfabetizada com
o MUNdo né com certeza também ela não vai estar só no LER e no escrever’ mas sim toda
num contexto social (Alf. – 28 anos)
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(S3): alfabetizar é:: a pessoa decifrar aqueles símbolos’ em palavras [...] (Alf. 26
anos)
(S1): alfabetização eles tem que VÊ reconheCÊ e LÊ né interpreTAR [...] (Alf. – 31
anos)
(S2): pra mim alfabetizar é::: (3) é tudo é::::: [...] alfabetizar não é só aprender a
ler e escrever é se socializar é faze parte de um grupo [...] (Ed. Física – 10 anos)
(S10): alfabetizar na minha opinião significa é mostrar pro aluno ahm (3) o
conhecimento (Ed. Física – 10 anos)
Os enunciados revelam diferentes sentidos para o processo inicial que envolve a
leitura e a escrita: as práticas sociais; a aprendizagem do código escrito; a alfabetização
motora. Há uma tendência, nos dizeres dos professores (S5, S7, S4, S1, S2, S9, S10), voltada
para a questão do letramento, quando enunciam: S5 “[...] também no seu modo de agir [...]”;
S4 “[...] integrando né ou engajando a criança dentro de todo um contexto social né [...]”; S2
“[...] é faze parte de um grupo [...]”; S7 “[...] alfabetizar é: penso que é pra vida toda [...]”;
S1 “alfabetização eles tem que VÊ reconheCÊ e LÊ né interpreTAR [...]”; S9 “[...] pra mim
alfabetização é ler e escrever [...]”; S10 “alfabetizar na minha opinião significa é mostrar
pro aluno ahm (3) o conhecimento”. Há também uma tendência voltada para a alfabetização,
como também sinalizam S8 “[...] ler escrever né reconhecer os símbolos [...]”; S9
“alfabetização é aprender ler e escrever a principio [...]”; S3 “[...]decifrar aqueles símbolos’
em palavras [...]”, de que é preciso estar alfabetizado para haver socialização entre partes
distintas. Uma terceira vertente nos enunciados dos sujeitos está relacionada com a
alfabetização motora, conforme S6 “alfabetização na educação física [...] eu daria pra essa
palavra o movimento’ [...]”
Um indivíduo pode não saber ler e escrever, mas de certa forma, ele pode ser letrado.
Sendo assim, este indivíduo pode ser analfabeto, tanto por problemas de marginalização
social, quanto por problemas de cunho econômico. Mas se vive em um meio em que a leitura
e a escrita têm forte presença, se há um interesse em ouvir a leitura de jornais feita por alguém
alfabetizado, se recebe cartas que outros lêem pra ele, se dita cartas para que um alfabetizado
as escreva, se pede a alguém que lhe leia avisos ou indicações, este analfabeto, é de certa
forma, letrado. Isto porque faz uso da escrita, se envolvendo em práticas sociais de leitura e
escrita. De forma semelhante, uma criança que ainda não se alfabetizou, mas já folheia livros,
88
finge que está lendo, faz movimentos parecidos com a escrita, ouve histórias que alguém lhe
conta, está rodeada por materiais escritos e consegue perceber o uso e a função da escrita.
(SOARES, 2003b)
Podemos trazer para este momento, os estudos de Heath (1982) com as comunidades.
Em Maintown, as crianças são inseridas no mundo da leitura, com quartos decorados com
personagens, verbalização dos conteúdos de livros, sendo as crianças motivadas a inventar
histórias. Em Roadville, os pais compram livros infantis constantemente e as crianças são
estimuladas também com brinquedos a criar histórias.
O letramento seria a apropriação da leitura e da escrita que o indivíduo usa durante
seu dia a dia. Um exemplo, aliando com a Educação Física, pode ser de um aluno que mesmo
não sabendo ler, sabe identificar as regras de um jogo, apenas olhando pela televisão. É uma
condição que o indivíduo se impõe, devido às condições em que está inserido. Tanto é, que
conforme S6, “[...] a gente trabalha o atletismo o basquete o handebol o voleibol né essas
modalidades que desenvolva e que eles tenham uma noção desse esporte de regras [...]”,
sendo oferecida a oportunidade de o aluno conhecer as regras de determinado esporte,
podendo inclusive, explicar a outros membros de seu convívio familiar.
A criança, ao receber os estímulos para a leitura, como nas comunidades investigadas
por Heath (1982), pode fazer num âmbito apenas relacionado à fantasia, sempre partindo de
significados culturalmente construídos. É dos adultos que as crianças recebem seus primeiros
incentivos, neste caso à leitura, embora tenham certa liberdade ou não para aceitar ou recusar
tal sugestão. Muitos são, de certa forma, impostos como objetos de valor, levando as crianças
a exercerem certa admiração.
Aprender a ler e escrever depende de diversos fatores, tais como condições reais para
que as crianças se tornem motivadas, experiências funcionais prévias com materiais
impressos, exposições a contextos narrativos e um contexto de ensino-aprendizagem
inteligente, onde o professor e as crianças possam em conjunto construir o letramento.
(SCLIAR-CABRAL, 2003, p. 41)
A alfabetização, para alguns dos professores entrevistados, é a aprendizagem da
leitura e da escrita (S5; S8; S9; S3; S1). Ler se insere em um conjunto de habilidades e
comportamentos que se estendem desde a simples decodificação de sílabas ou palavras até a
leitura de uma grande obra literária. Da mesma forma, escrever também envolve habilidades
89
específicas, se estendendo desde o ato de escrever o próprio nome até uma tese de doutorado
Uma pessoa pode ser capaz de ler ou escrever um bilhete, mas não ser capaz de ler ou
escrever um romance ou um editorial de jornal, ou quem sabe uma argumentação para
determinado assunto. Sendo assim, a leitura e a escrita são compostas de habilidades,
comportamentos e conhecimentos que fazem parte um longo e complexo conjunto de
elementos. (SOARES, 2003b)
Para dois dos sujeitos, há referência quanto à interpretação. S8 ao enunciar que “ler
escrever né reconhecer os símbolos [...] saber interpretar os símbolos” e S1 quando enuncia
“alfabetização eles tem que VÊ reconheCÊ e LÊ né interpreTAR [...]”, pode-se fazer relação
dessa interpretação com as propostas cognitivas de teorias de esquemas, como as lingüísticas,
textuais, psicolingüísticas ou psicológicas, que passam a ser rejeitadas de forma explícita,
favorecendo a circulação e a apropriação das vozes ou enunciações. Isto não deixa de exigir
um determinado enfoque renovado sobre a cristalização e a historicização de significados e
formas discursivas, de mesmo modo como sobre a noção de apropriação dos discursos em
circulação. (ROJO, 1998)
Enunciativamente, o ensino e aprendizagem da linguagem na escola, seguem
algumas aplicações. A linguagem escrita, por exemplo, construída de forma interativa com a
criança, deve ser levada como uma prática, um significativo uso de leitura e produção de
textos, sendo além de um mero ensino gramatical, uma análise ou uma técnica. Deve ser
constituída como discurso significativo, inserida numa situação de produção significativa,
sendo formatada num gênero, ao invés de ter seu foco apenas em letras, sons, palavras,
estruturas ou textuais. Os mais variados discursos escritos, construídos em interação com a
criança, devem ser pensados em sua transição, num processo contínuo de construção social.
(ROJO, 1998)
Uma sócio-construção de diversos modos de discurso escrito, negociada a uma
interação, deve ser sempre informada por uma situação de produção clara, explícita e, se
possível, real. A sócio-construção da língua, da gramática e da grafia, se inserida em práticas
discursivas e usos significativos da escrita, não deverá ser mecânica e limitada a uma
aprendizagem apenas funcional. Ainda na sócio-construção da língua, através dos diversos
modos de discurso escrito na interação, os produtos obtidos deverão ser interpretados em
termos de processo, ou seja, em relação com o pensamento verbal que os originou. Além
90
disso, as atividades pedagógicas geradoras de consciência e controle devem ser praticadas e
levar o aluno a uma construção do sentido da apropriação e da autonomia. (ROJO, 1998)
Os sujeitos enunciam a respeito das práticas que levam os alunos a um processo de
construção de sentidos, como S5, quando diz que “[...] alfabetizar na fala e também no seu
modo de agir [...]”. Ao enunciar sobre alfabetizar na fala, o sujeito revela não ter um
conhecimento teórico sobre a distinção entre aquisição a aprendizagem. Quando o aprendiz
chega à escola, ele já tem domínio da fala, já adquiriu uma variedade sociolinguística, pois
essa criança passa a maior parte do tempo fora da escola. O papel do professor é outro e diz
respeito ao ensino da organização do sistema alfabético considerando os demais eixos do
processo de aprendizagem da leitura e da escrita como a leitura, a produção escrita e a
oralidade. Depois disso, podemos trazer o enunciado de S4, quando diz que “[...] engajando a
criança dentro de todo um contexto social [...]”; e como enuncia S10, “[...] mostrar pro aluno
ahm (3) o conhecimento [...]”, pois é a partir da aquisição do código escrito que a criança
compreende e se faz compreender por meio da escrita.
Isso tudo, fazendo alianças com o ensino e aprendizagem da leitura e escrita. Neste
caso, faz parte a textualidade, ou seja, a capacidade de fazer um texto com coerência, e não
apenas um amontoado de palavras e frases. A textualidade se define pelo enunciado e pelos
gêneros discursivos em que o texto se constitui. O enunciado é a unidade concreta do texto,
uma unidade resultante das combinações dos gêneros discursivos. Assim, para Bakhtin, a
noção de textualidade, ancorada na teoria do enunciado, não se desvincula da noção de
gêneros discursivos. Pelo contrário, os enunciados é que são o elo na corrente da comunicação
verbal com os gêneros sendo os interlocutores das relações dialógicas. (apud MACHADO, p.
238)
Há também que se levar em conta um enunciado que diz respeito ao incentivo da
leitura e da escrita, por parte de um sujeito, durante suas aulas.
(S3): [...] procuro assim incentivar meus alunos à leitura e a escrita’ [...] montei um
textinho com eles né mas eu vejo ainda que eles não dominam a leitura então precisa muito
traBALHO de incentivo para que eles GOSTEM de ler’ [...] ahm então eu procuro ler livros
pra eles até quero ler MAIS porque eu vejo que eles gostam (2) [...] (Alf. – 26 anos)
Para Heath (1982), as crianças aprendem conforme vão crescendo e com o ambiente
que as cerca. Em muitas comunidades, os costumes para a aprendizagem são semelhantes aos
91
ensinados na escola, porém em outras não, e isso pode ser conflitante. De um modo geral, as
crianças que se alfabetizam em casa, podem ter sucesso na escola.
Histórias contadas na hora de dormir são um bom exemplo de eventos de letramento,
pois ajudam a estabelecer comportamentos e tendências na vida das crianças, porém há a
necessidade de se estabelecer uma relação entre o real e o imaginário. O letramento familiar
pode iniciar com contação de histórias na hora de dormir, leitura de embalagens, placas de
trânsito; assistir televisão e discutir o que é veiculado, interpretação de regras de jogos e
brinquedos. Isso seria uma possibilidade, pois não tendo esses estímulos em casa, a escola se
torna a agência de letramento mais importante.
Esses incentivos à leitura e à escrita, e não apenas isso, mas também incentivar o
aluno a se inserir numa comunidade letrada (por exemplo, numa comunidade em que um
leitor experiente media a aprendizagem da leitura para leitores iniciantes), é que são
fundamentais para o desenvolvimento da criança. Como professores, sabemos da importância
do estímulo, do incentivo às práticas de leitura e escrita. E não só dos pais para as crianças,
mas também o caminho inverso, para que pais muitas vezes, também voltem a ter o gosto pela
leitura, que muitas vezes é deixado de lado. Para isso, deve estar implícito o papel da família e
da escola. E podemos interligar com os eventos de letramento, que são ocasiões que a
linguagem escrita é fundamental para as interações naturais de seus participantes e os
processos e estratégias de interpretação deles. Cada esfera, tanto familiar quanto escolar, tem
as suas regras para interagir socialmente e partilhar os seus conhecimentos por meio de
eventos de letramento. Existe uma alfabetização familiar para integrar as crianças em eventos
de letramento, como a leitura de caixas de cereais, placas de trânsito, instruções de jogos. Para
tanto, este contato não é um processo natural, requer um processo de mediação, é aprendido.
Ao retomarmos um enunciado de S6 “alfabetização na educação física [...] eu daria
pra essa palavra o movimento’ [...]”, nos remete a uma alfabetização motora, ou
aprendizagem motora. Para Barbanti (2003), a aprendizagem motora é uma área do
conhecimento da Educação Física que se preocupa com a aquisição de habilidades resultantes
das práticas e das maneiras pelas quais as habilidades são ensinadas e executadas. Ainda de
acordo com o autor, a aprendizagem motora seria uma
melhora relativamente permanente na habilidade, resultante da prática e deduzida na
performance. O processo de aprendizagem motora pode ser descrito como uma
busca de solução para uma tarefa, que surge de uma interação do indivíduo com a
92
tarefa e o meio ambiente. Ela deve ser sempre entendida dentro do contexto das
formas pelas quais os indivíduos estão solucionando tarefas funcionais em
ambientes específicos. (2003, p.43) (grifo do autor).
A aprendizagem motora parte do principio de alterações cognitivas que ocorrem em
decorrência de práticas, ou seja, partindo de um estado em que uma determinada habilidade
não é dominada, e após um período relativamente significativo de prática, o indivíduo
consegue executar essas habilidades com destreza e segurança. E assim como a linguagem, a
aprendizagem motora depende de processos complexos para ocorrer a maturação. Quanto
maior a exigência dos movimentos, quanto mais prática, maior a habilidade para executar o
movimento.
4.4 ENTRE SILÊNCIOS E CONTRAPALAVRAS: SENTIDOS NA DOCÊNCIA
Muitos dos sujeitos entrevistados, ou praticamente todos eles, deixaram de falar
sobre determinados assuntos. Por esquecimento, por medo ou ressalva, ou por timidez de falar
sobre algo que não dominam.
O que chama atenção é o fato do estado de Santa Catarina possuir uma proposta
curricular, que norteia o trabalho do professor, que dá suporte para os conteúdos, e não ser
citada por nenhum sujeito entrevistado. Entendemos que o documento mais recente é do ano
de 2005, mas não se trata de uma proposta completa, sendo apenas tratados eixos os
temáticos. O documento que trata de todas as disciplinas curriculares tem seu último exemplar
no ano de 1998.
O silêncio que denota um diferendo é aquele das frases que estão em sofrimento, por
não acontecerem. (AMORIM, 2004). O diferendo é justamente esse resto que não se deixa
dizer no interior de um regime discursivo, que permanece em sofrimento de não poder se
dizer e que demanda então a mudança e, às vezes, até a invenção de um regime discursivo.
Este silêncio precisa estar marcado em algum lugar do discurso, para que possa se
manifestar. Está então entre palavras, entre frases. Portanto, não se pode analisar o lugar de
93
onde se fala, pois sempre haverá outro, que virá na sequência, que poderá apontar os silêncios
do enunciado.
Há que se considerar também os silêncios nas grades curriculares, principalmente na
grade do curso de Educação Física. Passamos por quatro anos de curso, em que o assunto
alfabetização foi praticamente zero. Portanto, os saberes dos professores da disciplina
entrevistados a respeito da alfabetização, são provenientes apenas de ecos. Todo enunciado,
que é apropriado pelo sujeito, para Bakhtin (2003, p. 294), “é pleno de palavras dos outros, de
um grau vário de alteridade, ou de assimilabilidade, de um grau vário de aperceptibilidade e
de relevância.” As palavras que apropriamos do outro, trazem então a sua expressão, o seu
tom valorativo, que a partir disso assimilamos, reelaboramos e reacentuamos. Sendo assim,
esses ecos são advindos de saberes experienciais, curriculares e disciplinares.
Outro silenciamento que se dá a respeito da educação física e da alfabetização se faz
nos documentos oficiais. Em nenhum momento se viu exposto nos documentos que a
Educação Física pode caminhar junto com a alfabetização, levando a um pensamento
interdisciplinar. Sempre tratando de jogos, esportes, mas sem citar que no início da
aprendizagem para determinado esporte, são desenvolvidos os elementos da psicomotricidade
que, como já vimos, podem levar o aluno a melhorar seu rendimento dentro de sala de aula.
Essa falta da interdisciplinaridade nos documentos, se viu em todos os utilizados para esta
pesquisa, tanto os PCN‟s, quanto as Propostas Curriculares. E podemos também salientar que
o silenciamento é recíproco. Quando documentos tratam da Educação Física não há menção
para a alfabetização, e quando documentos tratam da alfabetização,não há menção para a
Educação Física.
A própria história da Educação Física não nos traz apontamentos a respeito as
relação entre as áreas. Passamos por fases estritamente militares, por períodos em que a
ginástica era predominante, ou momentos em que o esporte era a razão principal. Durante
esses períodos, as discussões sobre a alfabetização, por parte dos professores da então
Educação Física, eram silenciadas? Pelos registros históricos, pode-se dizer que sim. Os reais
motivos, a literatura não apresenta.
O professor, apesar de sua formação, faz um trabalho voltado ao desenvolvimento do
aluno. Se dependesse de sua formação e dos documentos oficiais, sua prática seria
segmentada. É o próprio professor que consegue distinguir a cultura local, as diferenças. Isso
reforça a tese de ouvirmos os professores. Portanto, o fato dos professores relatarem sobre
94
alfabetização, ou a relação com a educação física, intrínseco em sua prática, que vai além do
que os documentos apresentam, além do que a história registra.
Bakhtin (1997) aborda as ideologias. Uma caracterizada oficial e a outra do
cotidiano. Portanto, uma ideologia oficial, entendida como relativamente dominante, procura
implantar uma visão única dos fatos, sistematizada e formalizada pelas esferas que a
compõem. De acordo com Miotello (2005, p. 171), a ideologia oficial se constitui “como um
sistema de referência que troca sentido com a sociedade.” Já a ideologia do cotidiano é
formulada no cérebro humano, baseada nas relações do próprio cotidiano. Para Miotello
(2005, p. 169), a ideologia do cotidiano “é a que brota e é constituída nos encontros casuais e
fortuitos, no lugar do nascedouro dos sistemas de referência, na proximidade social com as
condições de produção e reprodução da vida.”
Um outro conceito, diz respeito às forças centrífugas. De acordo com Clark e
Holquist (1998, p. 103), as forças centrífugas “combatem a completitude a fim de manter o
mundo aberto ao devir.” São essas forças que atuam permanentemente a favor da divisão,
estratificação, variação e multiplicação da linguagem, em todas as suas esferas.
Após as análises dos dados obtidos com as entrevistas, apresentamos no próximo
capítulo as considerações à respeito daquilo que compreendemos dos discursos.
95
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa pesquisa se encerra retomando a questão problema que levantamos desde o
princípio: Quais as relações entre saberes docentes dos profissionais da Educação Física e dos
alfabetizadores acerca da alfabetização? Com isso, traçamos um caminho com vias teóricas e
metodológicas, sempre compreendendo os sujeitos como seres sociais, que são constituídos
por várias fontes de saber, em contextos diferentes.
Na introdução, apresentamos nossa intenção de pesquisa, bem como os objetivos,
justificativa e visita a algumas pesquisas já realizadas aproximando as duas áreas, Educação
Física e alfabetização, constituindo, assim, o Estado da Arte, o que nos ajudou a tomarmos
nossa posição em relação ao que já foi pesquisado. Os nossos estudos tiveram ancoragem nos
estudos do Círculo de Bakhtin, através da teoria da enunciação, buscando compreender as
vozes dos sujeitos e as situações enunciativas.
No capítulo em que tratamos da fundamentação teórica, buscamos compreender de
que forma a Educação Física se constituiu disciplina com a sua entrada no currículo escolar.
Sendo disciplina escolar, trouxemos também de que maneira é discutida em dois documentos
oficiais: os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Propostas Curriculares de Santa Catarina.
De forma semelhante, apresentamos também a alfabetização e sua contextualização, além da
questão do letramento. E também como é dada a discussão nos documentos oficiais
anteriormente citados, através da metodologia e da questão curricular. Quanto à Educação
Física, os documentos trazem os objetivos da disciplina para os primeiros anos do ensino
fundamental e os conteúdos divididos em blocos ou temas (conhecimentos sobre o corpo;
esportes, jogos, lutas e ginásticas; atividades rítmicas e expressivas). Quanto à alfabetização,
os documentos apresentam os objetivos para os primeiros aos do ensino fundamental e os
conteúdos divididos em três eixos (língua oral, língua escrita e análise e reflexão sobre a
língua).
Relembrando o objetivo geral de nossa pesquisa, compreender as interfaces dos
diferentes saberes docentes que circulam nos anos iniciais no que se refere à alfabetização e à
Educação Física, podemos perceber os diferentes caminhos percorridos pelos professores.
Cada um dos sujeitos teve uma formação. Mesmo alguns com tempo de serviço parecido, mas
essa formação, muitas vezes, não foi na mesma universidade ou na mesma cidade. É esse
96
amálgama de conhecimentos que faz uma escola ser diferente da outra, uma metodologia de
trabalho ser diferente da outra.
Os dados também nos apontaram para uma aproximação entre os professores,
esboçando uma interdisciplinaridade. Há em seus discursos a vontade de um trabalho em
conjunto. Esse trabalho pode incentivar os alunos a construírem relações entre os diferentes
conteúdos presentes nas diversas disciplinas do currículo; a interdisciplinaridade. Para os
professores, é essa parceria que pode trazer efeitos consideráveis no aprendizado das crianças.
Porém, o fato de ser um desejo dos professores, pode nos levar a compreender também que
esse discurso está longe de uma prática constante, tendo em vista que os enunciados dos
sujeitos revelam que precisaria de uma maior aproximação.
O que podemos compreender também é quanto ao discurso sobre alfabetização, na
voz dos sujeitos professores de Educação Física e dos anos iniciais. Os sujeitos
alfabetizadores passaram grande parte da graduação com o tema alfabetização em suas aulas.
Porém, os professores de Educação Física, diferentemente, e por experiência própria, muito
pouco ouviram falar sobre a alfabetização. Mas o que seus dizeres sinalizam é um
entendimento sobre o assunto, apesar da formação inicial, na graduação, revelar um
desconhecimento sobre o tema, resultando numa posterior busca de um entendimento ou
interesse sobre a alfabetização.
Quanto ao discurso dos professores sobre alfabetização e Educação Física, com
relação aos documentos oficiais, houve um certo silêncio. Como também fizeram parte desta
pesquisa, em nenhum momento das entrevistas foram citados os documentos oficiais. Isso
pode revelar uma falta de compromisso do professor com a educação e com o Estado, pois são
documentos que norteiam o ensino e que servem de base para os conteúdos.
A entrevista narrativa, utilizada como instrumento, nos proporcionou muitas
informações a respeito do tema. Além das relações estabelecidas com os sujeitos, com visitas
às escolas até então desconhecidas.
Podemos compreender também, que a atividade realizada na aula de Educação
Física, pode colaborar para o aprendizado da leitura e da escrita, sendo que o movimento ou a
exploração de diversos tipos de movimentos, é capaz de levar o aluno à comunicação e à
expressão de fatos e idéias. A educação física é movimento. A escrita também é movimento.
97
E a leitura também tem seus movimentos. Todos os três temas têm uma palavra em comum
então, nada mais adequado do que aproximá-los.
Acreditamos que esta discussão pode encorajar a novos pesquisadores, pois se trata
de uma temática pouco pesquisada, conforme constatamos no estado da arte. Novas pesquisas
podem fazer maior alusão ainda aos novos documentos (leia-se Resolução 4 e Parecer 7) que,
a partir de sua homologação, deixaram os PCNs apenas como objeto de pesquisa de conteúdos
para planejamentos. Nesse contexto, a partir da tomada de conhecimento por parte dos
professores desses dois documentos, pode haver novas pesquisas que visem compreender os
movimentos curriculares e a própria concepção que cada segmento educacional e cada
disciplina/área passam a ter ou cujos sentidos são deslocados.
98
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104
ANEXOS
ANEXO A – Roteiro para a entrevista
Nome:_________________________________________________________
Data de nascimento: ____/_____/_____
Naturalidade:________________________________
Endereço para podermos entrar em contato:
Rua:________________________________________________________Nº_________Bairr
o:___________________________Município:____________
Fone____________________________________
E-mail__________________________________________________________
FORMAÇÃO
Ensino Médio:
( ) magistério – habilitação para ensino 1.ª a 4.ª séries
( ) educação geral (antigo científico)
( ) curso técnico
( ) outro. Qual?_________________________________________________________
Término em:___________________________________________________
Graduação:
( )sim ( )não
Se sim: ( ) concluída ( ) em andamento
Curso: ( ) Pedagogia ( ) outro:_______________________________
Modalidade: ( ) presencial ( ) a distância
105
Aulas em sistema: ( ) regular (diariamente) ( ) finais de semana+ férias
( )outro:______________________________________
Formado ou formando em:________________________________________
ATUAÇÃO PROFISSIONAL
Escola em que atua :_____________________________________________
Carga horária semanal:_________________horas
Tempo de serviço no magistério:____________________________________
Você leciona todas as disciplinas nas turmas que você trabalha? ( ) Sim ( )Não
Série(s) em que atua no momento:
( ) 1º Ano ( ) 1ª série ( ) 2ª série ( ) 3ª série ( ) 4ª série
Quais disciplinas você leciona?
Você já trabalhou em turmas diferentes das quais você trabalha atualmente? Se sim, assinale
a(s) série(s):
( ) 1ª série ( ) 2ª série ( ) 3ª série ( ) 4ª série
Você desenvolve alguma outra atividade na escola? Qual?
( ) secretaria ( ) direção ( ) coordenação ( ) outras _______
Você tem participado de atividades de formação continuada? Quais?
( ) cursos ( ) palestras ( ) seminários ( ) pós-graduação ( ) outras
Você tem o hábito de ler? ( ) Sim ( ) Não
O quê? _______________________________________
106
Você tem o hábito de escrever? ( ) Sim ( ) Não
O quê? ___________________________________
Pergunta aberta:
- Levando em conta seu tempo de serviço, fale sobre o trabalho que você realiza com seus
alunos, como são suas aulas com o primeiro ano.
Caso fale sobre determinados assuntos, perguntar:
- Que palavras você associa com a alfabetização? O que você entende por alfabetização?
- Você acha que a Educação Física tem alguma relação com a alfabetização? Se sim, me fale
sobre isso.
- Alguma coisa ainda que queira complementar?
Ao final, uma conversa sem gravação, com tópicos que possam ser anotados.
107
ANEXO B – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia - Universidade Regional de
Blumenau - FURB
108
ANEXO C – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia – Universidade do Vale do Itajaí
- UNIVALI
109
110
111
ANEXO D – Matriz Curricular do Curso de Pedagogia – Centro Universitário de
Brusque - UNIFEBE
112
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