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Na era da ciência, na qual se diz que Deus é um delírio (Dawkins, 2007) e na qual há uma incessante busca (delirante?) pela partícula Deus, poderíamos ficar surpresos quanto ao retorno de questões relativas à religiosidade, à fé, e à espiritualidade.

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Podemos afirmar que, atualmente, há uma decadência da instituição religiosa, mas uma crescente busca pela religiosidade individual e utilitarista (Mattos, 2009).

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O ser humano sempre procurou entender-se e entender o mundo a seu redor recorrendo, para isso, a diversos deuses. Isto porque, como sugere a máxima “conhece-te a ti mesmo”, o homem não pode conhecer-se sem se referir a uma alteridade, ao outro, ao além (Mattos, 2009).

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Para a psicanálise, o “sujeito suposto saber” indica esta forma de crença no Outro plenamente consistente, o qual supomos possuir todo o saber que falta ao sujeito, saber este capaz de nos dar o porquê e o “como” de nosso sofrimento, tornando legível nosso destino.

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Desde a modernidade inaugurada por Descartes, com seu cogito ergo sum, podemos afirmar que houve um deslocamento na origem de suas respostas: da fé em deus, passou-se à fé na ciência.

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Questões antes endereçadas ao sistema religioso passam a ser buscas no método científico. Ser ateu, então, torna-se o reflexo do espetáculo da razão, a afirmação do primado da racionalidade sobre a espiritualidade, a renúncia à ilusão de alcançar uma verdade para-além do mundo terreno.

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Importante observar como esta concepção de ateu está muito mais próxima da figura de onipotência e onisciência do que gostaríamos de imaginar.

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Deus não morreu, como sugeriu Nietzsche, mas se manteve vivo assumindo a forma de certas idolatrias referentes à ação e ao cálculo, recuperados no cientificismo moderno (Mattos, 2009).

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A psicanálise, sempre atenta ao dinamismo cultural, se manteve no seio do debate em relação às mudanças operadas pela modernidade e aos seus novos modos de representação do sujeito. Assim, novas perspectivas acerca da religiosidade são oferecidas pela psicanálise e pela teologia, além das diversas contribuições freudianas, como veremos agora.

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A entrada e difusão da psicanálise no Brasil são consideradas como uma das dimensões do processo de “modernização” da nação, associada à expectativa de predomínio do conhecimento científico na regulação da vida social e à substituição das construções religiosas da pessoa por uma interiorização laica e racionalizada.

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Seus seguidores explícitos iniciais foram médicos, sobretudo psiquiatras, do período do entre-guerras, seguidos por artistas de vanguarda e pelos psicólogos de formação universitária emergentes nos anos 1960-1970.

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Sua presença imaginária esteve comumente associada à dessacralização da vida moral e da preeminência da autoridade familiar, expressa, por exemplo, nas acusações de “pansexualismo”, bastante difundidas nos meios católicos e protestantes.

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A circulação relativamente restrita que a caracterizou até os anos 1960 ampliou-se radicalmente na década seguinte, ensejando um consumo mediato e imediato do conhecimento e da prática terapêutica psicanalíticos amplamente presente nas classes médias e superiores metropolitanas.

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Formulou-se então o diagnóstico de uma “explosão da psicanálise”, relacionada com os efeitos da modernização socioeconômica acelerada após a Segunda Grande Guerra e da modernização ideológica associável à difusão dos movimentos contra culturais.

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Esse fenômeno suscitou uma ampla literatura interpretativa, que se beneficiou de um diálogo intenso dos próprios psicanalistas com as ciências sociais nacionais em fase de consolidação institucional (cf. Figueira, 1985; Russo, 1999; Duarte, 2000).

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A presença da psicanálise, como saber e como instituição, vem se modificando bastante no Brasil desde o final dos anos 1970, quando sua presença e influência visíveis na sociedade e na cultura nacionais tinham atingido o seu auge.

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Diversas análises recentes apontam para uma descentralização, diversificação e complexificação muito grandes da oferta psicoterapêutica; ao mesmo tempo em que se reconhece um intenso recrudescimento da oferta de recursos religiosos ou parareligiosos.

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Inicialmente, esse reconhecimento se concentrou nas alternativas associáveis ao estilo Nova Era, características das camadas médias metropolitanas, que são às vezes consideradas como variações de uma cultura psicologizada.

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Também se descreve um revigoramento notável da psiquiatria biologizante no Brasil, seguindo uma tendência mundial (por influência dos Estados Unidos), hostil às interpretações psicogênicas do sofrimento mental.

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O crescimento da adesão às igrejas pentecostais, principal característica dos desenvolvimentos religiosos nas camadas populares desde os anos 1970, seguiu uma outra dinâmica, também crescentemente estudada, de reavivamento mágico-religioso.

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Recentemente, tornaram-se mais visíveis as mediações já existentes entre as religiões evangélicas e pentecostais e a psicanálise (ou, pelo menos, os saberes psicológicos) que deslocaram também para esse plano as polêmicas sobre tradição e modernidade nesse segmento religioso.

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Verificou-se, além do mais, que a proliferação de propostas de interpretação e terapêutica do sofrimento e da aflição, que podem ser consideradas como formações ideológicas transicionais ou híbridas entre os saberes psicológicos (ou psicologizantes) e as fórmulas mágico-religiosas, afeta não apenas as classes populares, mas também as classes médias e as elites.

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E nestas não se expressam apenas em “novos movimentos religiosos”, mas afetam também, de dentro, as denominações tradicionais, inclusive a Igreja Católica.

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O CAMPO PSI NO BRASIL HOJEO que é chamado de “campo psi” no Brasil e que abarca os saberes muito díspares abrigados sob as rubricas da psicologia, da psiquiatria e da psicanálise oferece um quadro de grande complexidade.

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Esses saberes não se concentram mais apenas nas grandes metrópoles pioneiras (Rio de Janeiro e São Paulo), mas se disseminam por todos os centros urbanos de alguma monta.

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Os cursos universitários de psicologia se encontram disseminados por todo o país e seus currículos oferecem uma gama muito variada de especializações, correntes e tendências.

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As formações médicas em psiquiatria também se multiplicaram, obedecendo a currículos muito diversificados em função das tradições locais. Mas é sobretudo a psicanálise que se organiza em uma trama complexa de instituições onipresentes, em contínua segmentação e reordenação.

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A RELIGIÃO E A PSICANÁLISE COMO CATEGORIAS DE ESTUDOAté o momento, utilizamos as categorias “religião” e “psicanálise” como se fossem unívocas e se referissem a fenômenos indiscutivelmente universais.

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Não cabe aqui portar tal discussão até seus limites extremos, mas convém sublinhar alguns pontos necessários a nossa análise. De um ponto de vista formal, o caso da “psicanálise” é mais simples, já que seguimos, em princípio, a convenção antropológica de respeitar as classificações nativas.

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Como os nativos não estão, porém, de acordo entre si a esse respeito, é preciso acrescentar moduladores que expressem a dissensão presente no campo em torno do uso da categoria (é o caso de “psicanálise didática cristã”, por exemplo).

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De um ponto de vista mais substantivo, pode-se preferir a referência – como fizemos eventualmente – a “saberes psicológicos” ou “psicologizantes”, sempre que isso seja útil para significar um universo mais abrangente de fenômenos aparentados.

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A psicanálise proposta por Freud é uma das herdeiras mais típicas dessa complexa disposição cultural, ainda mais por se voltar justamente para a vida moral, psicológica, subjetiva, humana (cf. Freud, 1976).

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É preciso levar ainda em conta que as religiões ocidentais não têm uma relação uniformemente antagônica ao “pensamento científico” nem tampouco mantiveram a mesma atitude a respeito de todas as suas dimensões ao longo dos últimos três séculos.

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Tanto Freud como Lacan partem da ideia de que ao ser humano falta algo – algo este que podemos dar vários nomes, como a falta, a coisa, a castração, a ferida narcísica, etc. - e de que seu desejo para ser completo é sempre impossível de ser satisfeito plena e permanentemente.

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Assim, o sujeito da psicanálise é finito, limitado, e faltoso. Se, por um lado, a psicanálise é o que retifica a absoluta inconsistência e incompletude do ser humano, a religião é o que me alude à completude, é o que me ilude.

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Foi em 1910 que Freud, com a obra Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância, estabeleceu pela primeira vez uma ligação entre o complexo paternal e a crença em Deus. Para Freud, “a religião é a neurose obsessiva universal” (Freud, 1907, p. 109).

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Isso significa que a religião busca obsessivamente o pai idealizado da infância, todo poderoso, onipotente, garantia de completa segurança.

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A religião, portanto, é como uma das mais fortes sugestões de que posso ser salvo, de que posso ser completo, de que posso ser consistente comigo mesmo.

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A ideia de Deus nos remete a um Outro que me protege da minha necessidade de amparo, da minha situação de impotência.

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É a figura da onipotência que trata de recobrir a angústia. Fica claro, neste caso, como o discurso psicanalítico encontra-se no pólo oposto ao do discurso do monoteísmo.

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Inegavelmente podemos constatar de casos clínicos como muitas atitudes religiosas podem ser consideradas verdadeiros sintomas neuróticos, bastando, para isso, tomar exemplos das próprias obras freudianas. Entretanto, como bem salientou Maciel & Rocha (2008), se por um lado Freud nos mostra como se dá a articulação entre a religião e a neurose...

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...por outro ele não deixa de notar como a religião pode mesmo nos proteger do desencadear de um processo neurótico: “o aumento extraordinário das neuroses, desde que decaiu o poder das religiões, pode dar-lhes uma medida disso” (1910/1976, p. 131).

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Em Psicologia de Grupo e a Análise do Ego (1921/1976), Freud retoma esta temática e afirma: “mesmo os que não lamentam o desaparecimento das ilusões religiosas do mundo civilizado de hoje admitem que, enquanto estiveram em vigor, ofereceram aos que a elas se achavam presos a mais poderosa proteção contra o perigo da neurose” (p. 178).

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A ilusão religiosa, de acordo com Freud, teria seu fundamento no assassinato mítico do pai da horda primeva, escrito em Totem e Tabu (1913). Com isso, ele concebia o sentimento religioso como uma “nostalgia do Pai morto”, como um pseudo-retorno do Pai.

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De acordo com Rey-Flaud (2002), trata-se de um apelo “contra a castração e a morte em um mundo onde a castração e a morte já estão consumadas” (p. 21).

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É interessante notar como a representação de Deus, representação que sugere preencher o vazio constitutivo de minha própria existência, pode ser deslocada para diversas outras representações que indiquem um caminho para a salvação, para a proteção, para o amparo, para a união.

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Fuks (2010) exemplifica isso com a imagem de Führer que, representando um eu ideal, caminhava para tamponar o vazio constitutivo da própria cultura, constitutivo da diferença, da singularidade de cada indivíduo.

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Assim se dá a ilusão ideológica e religiosa: utiliza-se da unificação dos sujeitos em torno de uma verdade em comum, ou seja, do sentimento de desamparo universal, incitando a intolerância à diferença, ao outro como portador daquilo que não reconheço em mim mesmo.

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Tal identificação aos ideais religiosos eram testemunhados pelos analistas na clínica, onde “se colocavam pregados a uma cruz imaginária onde sofriam sem morrer” (Mattos, 2009, p. 8).

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Aqui entramos num ponto importante, em que é preciso distinguir religião e espiritualidade. Podemos usar a definição de Koenig (2001), que conceitua a religião como um sistema organizado de crenças, práticas, rituais e símbolos projetados a fim de auxiliar a proximidade do indivíduo com o transcendente.

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Já a espiritualidade seria uma busca pessoal por respostas sobre o significado da vida e, talvez o mais importante, abarcaria o próprio relacionamento com o transcendente.

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Aqui se trata, portanto, de uma especificidade da religião, que transmite uma verdade na qual o sujeito deve se encaixar para ser auxiliado na busca pelo transcendente, enquanto que o conceito de espiritualidade traz intrinsecamente algo do próprio sujeito, algo da busca por sua própria verdade, abarcando, inclusive, a própria experiência religiosa do sujeito.

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Com essa distinção de conceitos, poderíamos pensar se a instituição religiosa não distorceria o caminho do próprio sujeito em sua busca eterna pelo transcendental, uma vez que o insere num sistema já organizado, sistema este que, ao mesmo tempo em que permite a libertação, prende-o à marra de crenças previamente definidas.

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Com isso, poderíamos concordar com Leonardo Boff (2000), quando diz que enquanto as instituições religiosas separam, a espiritualidade reúne. Isto porque a experiência mística que a última proporciona transmite a possibilidade de uma experiência da verdade de cada um.

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De acordo com Lopes (2008), podemos comparar a religião como uma busca pela salvação, com a cura pela hipnose, que Freud recorria antes de construir o método de associação livre.

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Uma das razões de Freud abandonar a hipnose era o fato de esse método ser um tanto invasivo, no sentido de que eram feitas sugestões ao paciente, encaixando-o em uma verdade da qual ele desconhece.

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O sujeito era “curado”, mas não era responsabilizado por sua cura. Esta, ao contrário, era atribuída ao hipnotizador, que possuía um suposto saber sobre o paciente e absorvia toda a autonomia e responsabilidade do paciente por sua cura, fazendo este se alienar na verdade do hipnotizador.

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Como bem disse Lopes (2008), encaixar alguém numa verdade que lhe é exterior constitui uma tremenda violência ao sujeito. Podemos até mesmo pensar no conceito de abuso sexual na criança visto pelos olhos de Ferenczi, como comparação, mas deixemos isto para outro momento.

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Se introduzir uma verdade no universo simbólico de alguém, persuadindo-o de que esta verdade também pode ser sua, se constitui numa violência, estamos nos referindo a uma forma de submissão, a uma retirada da autonomia do sujeito, retirada de sua própria verdade.

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A religião, oferecendo Deus como a restituição do Pai da infância do sujeito, oferece uma relação transferencial destituída de qualquer ética; a mesma ausência de ética que afastou Freud do método hipnótico.

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Foi com Artigos sobre técnica (1914) que Freud resguardou uma ética para a relação transferencial, tendo de ser utilizada com muito cuidado, uma vez que poderia se transformar em uma arma muito perigosa; e lucrativa, diga-se de passagem. Assim, na psicanálise a transferência é quase sempre utilizada para ser denunciada, para impedir que ela mesma constitua um obstáculo ao método da livre associação.

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Em algumas igrejas, poderíamos dizer, a relação transferencial com a imagem de Deus serve de instrumento para a garantia de dinheiro, como bem podemos observar na Igreja Universal do Reino de Deus, onde o único sacrifício possível é a doação de dinheiro. Assim, a religião sugere um encontro com Deus, um encontro com o todo-poderoso, onipotente, enquanto que, de outro lado, ao final de uma análise bem sucedida há, pelo sujeito, a aceitação não de um Pai idealizado, mas a de um pai que foi o pai possível, de um pai humano, demasiadamente humano.

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Se Freud defende a ideia de que a crença em Deus é uma busca pela figura de um pai, figura esta que me garante segurança e proteção de doenças e da morte, por outro lado a queda na realidade nos livra de um Pai tirânico, distante, rigoroso e onipotente, que deseja sacrifícios a todo custo.

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