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Page 1: Quando a Boca Seca é uma Doença

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27 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, domingo, 16 de agosto de 2009

Imagine ter que chorar sem lágrimas ou engolir alimen-tos sem a ajuda da saliva. Esse é o cotidiano de quem so-fre da síndrome de Sjögren, doença de nome difícil,pouco conhecida, mas que atinge cerca de 2% da popu-

lação mundial. O mal se manifesta quando o sistema dedefesa do organismo ataca e impede o funcionamento dasglândulas salivares e lacrimais, responsáveis pela lubrifica-ção da boca e dos olhos. Pouco se sabe sobre as causas dadoença, que acomete mulheres em 90% dos casos e nãotem cura. Com um tratamento contínuo, contudo, é possí-vel controlar os sintomas e levar uma vida normal.

Sintomas como boca seca, sensação de areia nos ol-hos, sede excessiva e dificuldade de sentir o sabor dosalimentos podem ser indicativos da doença, descobertapelo oftalmologista sueco Henrik Sjögren-Larsson, em1957. Nesses casos, o mais indicado é procurar um reu-matologista, que poderá determinar por meio de bióp-sia de glândulas salivares e exames clínicos se o pacienteé portador da síndrome. Quanto antes for feito o diag-nóstico, melhor será a qualidade de vida do paciente emas fácil será para o tratamento ser realizado.

De acordo com a dentista e professora do departa-mento de odontologia da Universidade de Brasília NilceSantos de Melo, uma das principais barreiras para o tra-tamento é o diagnóstico. “Os principais sintomas, comoboca seca e sensação de areia nos olhos, são associadosa várias doenças, o que torna difícil definir se é Sjögren”,explica. Em lugares como Brasília, onde são registradosbaixos índices de umidade, durante boa parte do ano, oproblema é agravado.

A falta de conhecimento também dificulta o trata-mento. “Pouca gente sabe que ela existe, e nem todos osmédicos conhecem seus sintomas, por isso muitas ve-zes o paciente carrega a síndrome há anos e não sabe”diz a dentista. “O agravamento dos sintomas pode levara quadros mais graves, como perda de dentes, úlceras einfecções bucais”, alerta Nilce.

Demora A funcionária pública Andréia Freitas, 36 anos, passou

por dentistas, endocrinologistas e um clínico geral atédescobrir que é portadora da síndrome. “Eu ficava com aboca e a pele ressecadas durante todo o ano, mesmoquando o tempo não estava seco”, conta. Hoje, mantémcuidados diários para controlar os sintomas. “Antes dedormir, passo um gel nos olhos, sempre uso hidratantesno corpo e tento umedecer a minha boca o dia todo.”

Andréia conta que, com o tempo, o convívio com adoença vai ficando mais fácil. “No início, eu ficava muitoirritada, porque sabia que teria que viver com isso parasempre. Com o tempo e com os sintomas controlados, vo-cê vai aprendendo a conviver bem com a síndrome.” Paraela, o maior problema foi a demora no diagnóstico. “Tiveque passar por três médicos antes de descobrir o que eu ti-nha. Esse período foi muito difícil, pois os sintomas iamaumentando e ninguém sabia o que fazer”, completa.

A melhor forma de controlar os sintomas bucais dasíndrome de Sjögren é ingerindo líquidos, em especial su-cos e chás, além do estímulo mecânico. “Esse estímulopode ser feito por meio da ingestão de frutas cítricas oumascando chicletes sem açúcar, que estimulam as glân-dulas a produzirem mais saliva”, conta Nilce Santos Melo.Para controlar a manifestação ocular da doença, é essen-cial o uso de colírios, que funcionam como uma espécie

de lágrima artificial, especialmente em períodos secos, ouà noite, quando o olho nunca se fecha totalmente. Maquia-gem nos olhos, como rímel e sombras, deve ser evitada,pois contribui para agravar o ressecamento da região.

Existem dois tipos de doença, o primário, que é quan-do a síndrome aparece isolada, e o secundário, quandoela vem associada a outra doença relacionada à autoimu-nidade, como lúpus e artrite reumatoide. Esse foi o casoda assistente social Maria Maia, 35 anos. Durante o trata-mento de uma artrite, ela descobriu que tem a forma se-cundária da síndrome. No caso de Maria, a recorrência deduas doenças dificultou o controle dos sintomas. “Foi aparte mais difícil, conviver com a dor nos olhos causadapela síndrome e a dor no corpo por causa da artrite”, con-ta ela, hoje com os sintomas controlados.

Na gravidezPortadoras da doença que estejam grávidas pedem,

em geral, atenção dobrada, principalmente nos primei-ros meses, já que é o período em que o corpo naturalmen-te tende a provocar abortos espontâneos. Quando o pa-ciente já tem um histórico de autoimunização, esse riscoé potencializado, pois o organismo tende a agir contraqualquer corpo que considere “estranho”.

Esse foi o receio que Maria sentiu no ano passado,quando decidiu que era hora de engravidar. Para evitarque acontecesse qualquer problema, foi acompanhadapor um obstetra especializado em gestações de alto risco.“Eu tive a gravidez acompanhada de muito perto por ummédico, o que foi essencial para que eu não tivesse ne-nhuma complicação”, comemora, enquanto brinca coma pequena Letícia, de apenas seis meses.

Quando aboca seca

é uma doença

A síndrome de Sjögren, queimpede o funcionamentodas glândulas salivares e

lacrimais, atinge 2% dapopulação mundial. Asmulheres são as mais

afetadas

Maria teve acompanhamento especial durante a gravidez

Iano Andrade/CB/D.A Press