QUEM É O ASSISTENTE DE BIBLIOTECA DA REME E QUAL SUA FUNÇÃO NA BIBLIOTECA DA ESCOLA?
Aparecida de Jesus Paes de Barros.1 Andréia Laura de Moura Cristaldo.2
Silvia Adriana Xavier Rojas.3 Ângela Brito.4
Instituto de Ensino Superior da Funlec - IESF
A leitura embora seja vista por muitos como um ato passional na verdade é caracterizada como meio de emancipação social, e isso tem levado nosso governantes a mascararem a real situação do povo brasileiro: o povo apenas lê, mas não é permitido que se tornem leitores. Foi buscando caracterizar a política de nosso município no que se refere à leitura é que lançamos mão dessa pesquisa, para então delinearmos o perfil do assistente de biblioteca da REME-Rede Municipal de Educação de Campo Grande/MS, suas funções na escola, formação e dificuldades. Para que isso fosse possível num primeiro momento utilizamos da Pesquisa Bibliográfica, que para Gil (1996) é a pesquisa desenvolvida a partir de material já elaborado e que são utilizadas em pesquisas que abordam concepções ideológicas. E foi através da pesquisa bibliográfica que conhecemos a função do assistente de biblioteca em Silva (1986) e as condições sociais em que a leitura é produzida no Brasil veio ser desmistificado por Soares (1998). Em Lajolo (2006) encontramos a grande deficiência não só dos professores como também dos assistentes de biblioteca no que tange à prática de leitura. Num segundo momento partimos para a metodologia do trabalho, onde através do levantamento feito em dez escolas da REME e que segundo Gil (1996) se caracteriza pela interrogação direta das pessoas cujo comportamento se deseja conhecer, delineamos o perfil do assistente de biblioteca da REME, suas atribuições, formação e atividades desenvolvidas dentro das bibliotecas escolares. Embora tenhamos constatado que as bibliotecas escolares da REME não possuem uma política única que realmente objetivem a formação do aluno leitor e que o assistente de biblioteca não tem assumido sua função educativa e política fica aqui um apelo à SEMED - Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande/MS em olhar com mais atenção esse espaço que tem um papel fundamental dentro da escola e na formação do cidadão.
Palavras Chave: Leitura, Consciência política, Assistente de Biblioteca.
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INTRODUÇÃO
Esse trabalho foi motivado pela ânsia de alguns professores em buscar no
assistente de biblioteca um companheiro partícipe na formação do aluno leitor. Hoje a
REME-Rede Municipal de ensino de Campo Grande/MS começa a se destacar nas avaliações
nacionais, mas segundo o resultado do IDEB5 ainda estamos aquém de garantirmos a escola
pública de qualidade. Em avaliações internacionais como o PISA6, o resultado do Brasil
também demonstrou que a educação do país tem resultados críticos, e quando o assunto é
leitura sabemos que o quadro brasileiro é bastante caótico, e querendo ou não é preciso
encarar a dura realidade para então buscarmos efetivar ações na formação do aluno leitor.
Identificar e descobrir a política atual da Secretaria Municipal de Educação do
nosso município, a formação do assistente de biblioteca, e o seu trabalho dentro das escolas,
bem como as grandes dificuldades por eles enfrentadas foi o que propusemos como objetivo
desse estudo. A questão norteadora da pesquisa centrou-se em investigar: qual a função dos
assistentes de biblioteca da REME? Que política que orienta o trabalho desse profissional na
escola? Já que é visível no discurso dos professores e supervisores um descontentamento com
o trabalho desenvolvido pelo assistente de biblioteca, com a estrutura física inadequada das
bibliotecas escolares e com os acervos disponíveis.
Porém, antes de iniciarmos a pesquisa nas escolas procuramos subsídios teóricos
que fundamentassem a prática na biblioteca escolar e para isso procuramos autores que não se
restringissem apenas a falar de leitura, mas que pudessem abordar o papel político em que a
sua produção é submetida e também realizada de modo concreto na escola. Como nossos
governantes usam do discurso nos meios de comunicação enfatizando a leitura como fato de
importância, enquanto na verdade o povo brasileiro é privado de todas as formas de ter acesso
à leitura e principalmente de gostar de ler.
Assim encontramos Soares (1988), Silva (1986) e Lajolo (2006) uma análise
bastante crítica que resgata a importância do assistente de biblioteca e da leitura como forma
de conhecimento e de emancipação social, dando ao assistente de biblioteca não apenas uma
função pedagógica e administrativa, mas também política.
A Metodologia para o levantamento dos dados utilizado foi a pesquisa
bibliográfica desenvolvida a partir de material já elaborado e que são utilizadas em pesquisas
que abordam concepções ideológicas, como é o caso da leitura, já que sua prática é permeada
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por concepções ideológicas e políticas que não oportunizam a formação do aluno leitor.
Também utilizamos o levantamento que segundo Gil (1986) se caracteriza pela interrogação
direta das pessoas cujo comportamento se deseja conhecer e pela solicitação de informação a
um grupo significativo de pessoas acerca do problema estudado. Como coleta dados foi
utilizada a entrevista estruturada. As escolas selecionadas para o levantamento tiveram como
critério de escolha a localização geográfica, para que assim pudessem ser contempladas
escolas periféricas e centrais, já que cada uma conta com clientelas diversificadas, devido ao
poder aquisitivo dos pais. A entrevista estruturada ganhou relevância em nosso trabalho, pois
para conhecermos a concepção de cada segmento entrevistado: professores, supervisores,
diretores e assistentes de biblioteca em no mínimo dez por cento das escolas da REME, que se
caracterizou em dez escolas, foi necessário um instrumento elaborado previamente, pois
visamos resultados uniformes ao final do trabalho. E essa uniformidade é garantida pela
entrevista estruturada. Assim, esse artigo apresenta a fundamentação teórica que respaldou a
pesquisa, a trajetória metodológica, os resultados obtidos e as considerações finais.
AS CONDIÇÕES SOCIAIS DA LEITURA NA NOSSA SOCIEDADE
A leitura embora seja vista como um momento de individualidade, aonde o leitor
venha a se apropriar da mensagem do autor, para Orlandi (apud Soares, 1998) a leitura não se
caracteriza como um ato solitário, mas sim como uma interação verbal entre indivíduos que
são socialmente determinados, onde existe o leitor e o autor com seu universo, seu lugar na
estrutura social, e sua relação com o mundo e com os outros. Sendo assim, o social determina
a leitura e constitui o seu significado.
Analisando o valor social no acesso à leitura veremos que enquanto os alunos e
pais das camadas populares vêem a leitura como uma exigência do e para o mundo do
trabalho, as crianças e pais de classes favorecidas vêem a leitura como mais uma alternativa
de expressão e comunicação. Sem contar que desde cedo esses pequenos alfabetizandos das
classes populares são levados compulsoriamente a negar seu próprio discurso, o discurso de
sua classe.
Para Soares (1988) os alfabetizandos das classes populares são desapropriados de
seu discurso pela legitimação dos discursos da classe dominante, que impõem a sua retórica
de classe como critério de qualidade da comunicação escrita, é claro que não devemos deixar
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nossos alunos escreverem erradamente, mas devemos deixá-los interpretar o mundo de sua
maneira, com todos os seus sofrimentos, angústias e sonhos. Dessa forma, como vem sendo
efetuada, a alfabetização assume o caráter de um rito de passagem que conduz as camadas
populares ao limiar de um mundo discursivo novo e que as destitui de seu próprio discurso,
resguardando a hegemonia do discurso dominante.
Porém, esse processo de exclusão cultural não é só caracterizado pela
destituição do seu próprio discurso, mas estende-se ao processo de leitura como um todo,
afinal o povo apenas aprende a ler, mas não é permitido que se tornem leitores, já que as
bibliotecas das escolas públicas são pobres em acervos e não contam com bibliotecários
especializados, o que não acontece em bibliotecas que servem às classes mais favorecidas. A
leitura então repete a divisão de classes de nossa sociedade capitalista, pois as relações de
produção, distribuição e de consumo de leitura repete as condições discriminativas da
produção, distribuição e consumo dos bens materiais.
No que tange à produção da leitura é inegável que a posse e o uso da
escrita são privilégios das classes dominantes e como conseqüência ela traz a marca dessa
classe, não só pela sua norma lingüística, mas também pela sua ideologia, assim a leitura é um
dos principais meios e a escola uma das principais instâncias de imposição e inculcação da
ideologia hegemônica. Porém, de um mesmo texto pode-se fazer leituras diferentes, já que
segundo Soares (1998), ela é produzida e a compreensão de um texto não se dá só no nível da
informação, mas também da ideologia. É dentro dessa visão que a autora posiciona-se social e
historicamente, pois para ela essa é uma das mais importantes determinações múltiplas da
produção da leitura, pois é a partir daí que o leitor produz a leitura e cria o texto.
Vendo a leitura como um instrumento de reprodução Soares (1988) faz
uma reflexão em contraponto, pois assim como a contradição está presente nas relações de
produção dos bens materiais e nas condições de acesso a esses bens também está presente nas
relações de produção dos bens culturais. A leitura então, em suas condições sociais não é só
categoria de reprodução, mas também de contradição, em cujo cerne germina a transformação
social. Sendo instrumento de reprodução e contradição a leitura caracteriza-se como um ato
político e como conseqüência alfabetizadores, professores e bibliotecários desempenham um
papel político que pode estar a serviço da ideologia dominante ou da conscientização e
questionamento da realidade em que o leitor está inserido.
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Todavia para Lajolo (2006) a escola não tem oportunizado através da leitura a
distribuição dos bens culturais, mas tem efetivado similarmente aos bens materiais uma
divisão desigual e injusta:
Numa sociedade como a nossa, em que possui uma divisão de rendas e de lucros tão desigual, não se estranha que desigualdade similar presida também à distribuição de bens culturais, já que a participação em boa parte desse último é mediada pela leitura, habilidade que não está ao alcance de todos, nem mesmo de todos aqueles que foram à escola (LAJOLO, 2006, p. 106).
Se nem aqueles que foram à escola não possuem a habilidade de participar dos
bens culturais, podemos concluir que não damos à leitura a importância que se deva dar e nem
tampouco a trabalhamos como se deveria. E prova disso encontramos nas palavras de
Cagliari (2006) que tece uma dura crítica à forma como a leitura tem sido trabalhada dentro
das escolas, e que tem tornado o objetivo da leitura restrito a um simples interrogatório feito
pelo professor:
Uma das maiores atitudes da escola atual em relação à leitura é a maneira como faz interpretação de texto. Quando uma criança ouve histórias, assiste à televisão, é perfeitamente capaz de entender o que ouve. É evidente que sua compreensão não é igual à de um adulto, mas, quando não entende algo que julga importante saber, a criança pergunta. A escola obriga a criança a agir de outra maneira, pretensamente ensinando como se deve interpretar um texto. Então a criança lê um texto e depois responde a um questionário. Os questionários que se vêem nos livros são em geral do tipo: no texto ocorre “Pedro chutou a bola”; o questionário pergunta “Quem chutou a bola?” Ora, perguntar isso a uma pessoa é uma forma de chamá-la de burra, de aviltá-la como falante nativo. Às vezes tenho a impressão de que esses roteiros de interpretação de texto servem única e exclusivamente para a professora dar nota para o aluno. [...] Esse procedimento de interpretação de texto através de perguntas óbvias não só induz o aluno a pensar que interpretar texto é saber o sujeito de uma declaração ou interpretar o objeto direto, etc, como ainda tira todo o sabor da leitura, substituindo por um gosto chato de questionário. [...] Às vezes também uma simples leitura basta. Nem tudo o que se lê precisa ser discutido, comentado, interpretado. Esse é outro erro que se vê eventualmente me livros didáticos. A leitura às vezes é como uma música que se quer ouvir e não dançar (grifo nosso). (CAGLIARI, 2006, p. 21-32).
Ouvir uma música e não dançar, não existe lugar melhor para o aluno ouvir uma
música, aliás, ouvir a música que ele quiser e não dançar que o espaço da biblioteca que
constitui- se, ou pelo menos deveria constituir-se como um lugar que proporcionasse a criança
várias oportunidades de leitura e de várias atitudes como leitor.
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O PAPEL POLÍTICO DO ASSISTENTE DE BIBLIOTECA
Se analisarmos a nossa história em termos de leitura, veremos que a crise de
leitura tão propagada hoje não é exclusividade de nossa época, desde o Brasil colônia
juntamente com a reprodução do analfabetismo, vem se desenrolando no Brasil o quadro de
falta de bibliotecas e a inexistência de políticas concretas para a real popularização do livro.
Essa situação tem uma justificativa: tornar as pessoas leitoras é extremamente perigoso ao
poder dominante, pois assim suas manobras políticas e as estruturas sociais seriam facilmente
percebidas, assim o governo “faz de conta” que oferece livros na intenção de formar leitores.
Essa contradição é facilmente percebida no Brasil, pois enquanto convivemos com discursos
apologéticos sobre a importância da leitura o que vemos em nossas bibliotecas são
profissionais despreparados, em alguns casos readaptados de funções para as quais não
possuem mais condições físicas ou psicológicas de executar, além de bibliotecas sem
estruturas físicas adequadas, e com acervos insuficientes ou desatualizados. Silva (1986)
procurou elucidar as barreiras existentes em nosso país para a democratização da leitura e
afirmou:
O ato de ler é, fundamentalmente, um ato de conhecimento. E conhecer significa perceber mais contundentemente as forças e as relações existentes no mundo da natureza e no mundo dos homens explicando-as. Aos dominadores, exploradores ou opressores interessa que as classes subalternas não percebam e nem expliquem as estruturas sociais vigentes e o regime de privilégios. [...] Interessa à classe dominante que ao lado de uma indústria da “fome de alimento” também exista uma indústria da “fome de ler”. [...] Imagine o problema que seria criado para a ideologia dominante se a maior parte da população tivesse acesso, por exemplo, à leitura de Marx, Engels, Mão Tse Tung, Gramsci, Paulo Freire, etc... (SILVA, 1986, p 12/13).
E quando falamos em elitização do livro em nossa sociedade, que é uma política
intencional que visa manter o povo na alienação, sem gerar contestações e vamos até as
escolas, veremos que além da pobreza de títulos ainda esbarramos na centralização da decisão
da compra desses títulos, assim secretarias de educação compram os livros e entregam as
escolas delimitando o que o aluno pode ler e o que ele não pode ler. Alguém já encontrou em
alguma biblioteca pública que atenda alunos de periferia obras como a de Marx? É claro que
não, pois até nossos professores em sua maioria ainda não tiveram contato com uma obra sua.
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Se analisarmos dados estatísticos veremos que em cada 100 brasileiros adultos
alfabetizados, o hábito de leitura é comum a apenas 30 e outros 61 têm pouco ou nenhum
contato com livros, conforme pesquisa Retrato da Leitura no Brasil, da Câmara Brasileira do
Livro (CBL), e mais, segundo Rosa (2005), somente 1% da produção editorial no Brasil
destina-se às bibliotecas públicas no Brasil, enquanto nos Estados Unidos 30% dos livros
editados são adquiridos pelos acervos públicos.
Quando a pesquisa foi dimensionada para a leitura dos professores e assistentes de
biblioteca a situação fica ainda mais caótica, pois percebemos que quem deve estimular o
gosto pela leitura, na verdade não lê e evidencia que não gosta de ler. Lajolo (2006) ao se
reportar a leitura desses profissionais afirmou:
A discussão sobre leitura, principalmente sobre a leitura numa sociedade que pretende democratizar-se, começa dizendo que os profissionais mais diretamente responsáveis pela iniciação na leitura devem ser bons leitores. Um professor precisa gostar de ler, precisa ler muito, precisa envolver se com o que lê.
E esse não é, infelizmente, o perfil comum do professor. Pesquisa recente feita entre professores do primeiro grau e bibliotecários de Campinas e do Recife mostrou como o repertório de leitura desses profissionais é desolador, constituído, a maior parte das vezes, por best-sellers tão antigos como Fernado Capelo Gaivota, O menino do dedo verde e O pequeno príncipe ou pelo que se pode chamar de clássicos escolares, como A moreninha, Iracema e A escrava Isaura (LAJOLO, 2006, p. 108).
Essa pobreza de repertório para Lajolo (2006) é grave, sendo necessário segundo a
autora ser dado uma atenção especial à formação dos profissionais de leitura para que as
concepções acerca da leitura e de como a mesma deve ser trabalhada possam ser mudadas:
E a gravidade aumenta quando se sabe que, para muito além do conhecimento mecânico de metodologias e técnicas de desenvolvimento de leitura, a formação de um leitor exige familiaridade com grandes números de textos. É preciso, pois, que haja espaço para a leitura nos cursos destinados aos profissionais de leitura. Se afirmar isso soa redundante, cumpre lembrar que, em tais cursos, a ênfase fica geralmente por conta da prescrição de títulos, e do treinamento em atividades como fazer cartazes, recortar figuras, dramatizar textos, fazer jograis. Atividades interessantes, e que podem realmente tornar mais agradável o tempo de escola, mas que são inócuas quanto ao papel que representam na interação leitor-livro, que é afinal, aquilo que a leitura consiste (LAJOLO, 2006, p. 108).
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Assim fica fácil alardear que o governo investe na leitura, quando o que está
acontecendo de fato é que cada vez mais o povo brasileiro está sendo privado de conhecer e
transformar a sua própria história. Conhecer por quê? Porque como vimos anteriormente nas
palavras de Silva (1986) é através do conhecimento que podemos perceber as relações
existentes no mundo da natureza e dos homens. A leitura não é um ato passivo, pelo
contrário, quando me coloco como leitor eu estou descobrindo e re-criando, e o ato de ler é
considerado em uma primeira instância por Silva (1986) como um ato de possuir elementos
de combate à alienação e ignorância.
Porém para que a leitura crítica realmente aconteça, para que a escola realmente
esteja formando leitores é necessário que o bibliotecário assuma a dimensão educativa e
principalmente política do seu trabalho, colocando-se como um co-responsável pela formação
do aluno leitor, e para isso é primordial que o mesmo seja um leitor e que goste de ler. Pois
um assistente de biblioteca que não gosta de ler, também não conseguirá cativar e conquistar
o aluno para que seja um leitor, abrindo assim as portas para as várias finalidades e funções da
leitura, dentre elas a de: informar, alarmar, convencer, dar prazer, etc.
Na verdade nós conseguimos com que a criança entre na escola gostando de ler e
ouvir histórias, e quanto mais elas vão adentrando nas séries seguintes, mais massacramos os
possíveis leitores que têm dentro delas, e ao final do Ensino Fundamental, nossos alunos têm
aversão à leitura, acham uma atividade massacrante, sem finalidade e monótona, e aí
simplesmente falamos que a culpa é de suas famílias e das condições sociais em que as
mesmas estão imersas: a margem de livros, revistas e jornais. Será que formar um aluno
leitor e não simplesmente decifrador de códigos, não é nossa função? Como isso tem
acontecido em nossas escolas? Por que a cada dia mais em que permanece na escola o aluno
gosta menos da leitura? Quais são as soluções para que esse problema seja superado no Brasil
e qual é o papel do assistente de biblioteca na efetivação de alunos leitores e críticos?
A (DES) VINCULAÇÃO DO TRABALHO DO PROFESSOR E DO ASSISTENTE DE BIBLIOTECA
Como vimos anteriormente o problema na deficiência literária dos brasileiros vem
se arrastando há anos, e essa situação interessa aos nossos governantes, pois uma pessoa
alienada e sem posicionamento crítico transforma-se facilmente em massa de manobra.
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Assim, não adianta alardeamos e reclamarmos que a culpa de nossos alunos não gostarem de
ler é do governo que não compra livros ou das famílias, essa função é nossa, dos professores,
supervisores, gestores e também dos assistentes de biblioteca.
Para que isso de fato aconteça em primeiro lugar é necessário romper com a idéia
de que o assistente de biblioteca é simplesmente quem recebe, cataloga e arquiva os livros da
escola, função essa arraigada em nossas escolas. Em segundo lugar é necessário que os
professores unam-se ao assistente de biblioteca no objetivo de fazer do aluno um leitor, pois
temos a divisão de trabalho oriundo do nosso sistema capitalista7 presente em nossas
concepções, e assim o professor quando é convidado a ir à biblioteca com seus alunos, ele se
vê descomprometido com aquela situação, como se o aluno não fosse seu, assim em algumas
escolas em que o assistente de biblioteca vem desenvolver alguns projetos de leitura levando
os alunos na biblioteca através de uma escala planejada para leitura, manuseio e exploração
dos livros, o professor se vê livre para fazer alguma atividade paralela, é como se ele tivesse
um planejamento a mais, não tivesse nada a ver com aquilo, afinal não é seu trabalho mesmo,
e quando chega à sala não há continuidade do trabalho desenvolvido pelo assistente de
biblioteca.
Em terceiro lugar, é preciso que professor e assistente de biblioteca tornem-se
leitores o que sabemos que não é realidade na maioria das nossas escolas, como foi afirmado
por Lajolo (2006) em sua pesquisa citada anteriormente: o repertório de leitura dos
professores do primeiro grau, hoje ensino fundamental, e dos bibliotecários mostram um
quadro de leitura desolador. E não é raro vermos nas escolas o próprio professor dizer que
não gosta de ler, como então poderá explorar um livro lido por ele, e o assistente de
biblioteca? Este também deverá ser um leitor por excelência, uma pessoa formada, com
conhecimentos em diversas áreas, uma pessoa crítica e com consciência política do seu papel
dentro dessa sociedade. Hoje já se reconhece a importância de uma pessoa que não apenas
cuide da biblioteca, mas que também seja um leitor. “A biblioteca tem de ser um espaço
integrado aos outros espaços da escola e o seu uso deve estar previsto no planejamento
pedagógico. É preciso que haja um profissional com prática de leitura para que efetivamente
a estimule.” (BEAUCHAMP, apud MARICATO, 2007, s/p).
Romper com essas barreiras não é uma tarefa fácil, mas será possível, quando
todos (professor, coordenador pedagógico, gestor e também o assistente de biblioteca)
assumirem sua responsabilidade na construção de uma sociedade mais democrática e justa, e
quando houver uma política direcionada ao assistente de biblioteca, para que ele deixe de ser
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um funcionário que simplesmente empresta livros para pesquisa e torne-se um leitor com
consciência política do seu papel na formação de sujeitos críticos e participativos.
O CAMINHO PERCORRIDO DURANTE A PESQUISA
A escolha do tema se deu na discussão das maiores dificuldades encontradas hoje
no dia-a-dia da escola, como profissionais em educação, sabemos das deficiências, problemas
e principalmente das angústias em que passam os professores quando se deparam na escola
com uma biblioteca desatualizada e com um assistente de biblioteca que nada faz além de
emprestar livros à comunidade escolar. E a leitura hoje é fundamental, aliás, gostar de ler é
fundamental, então a delimitação do tema levou em conta uma contribuição à realidade vivida
hoje na REME-Rede Municipal de Ensino de Campo Grande/MS.
Assim o primeiro passo dado para a realização da pesquisa foi ir à busca do
material bibliográfico, um material que não se restringisse apenas a falar da leitura, mas que
pudesse falar do papel político em que a sua produção é submetida e também realizada na
escola, como nossos governantes usam do discurso nos meios de comunicação enfatizando a
leitura como fato de importância, enquanto na verdade o povo brasileiro é privado de todas as
formas de ter acesso à leitura e principalmente de ter o gosto de ler.
Assim encontramos em Soares (1988) um questionamento bastante crítico quanto
à produção de leitura no Brasil, vindo a ser complementado por Silva (1986) que atribui à
leitura a responsabilidade pela emancipação social. Silva (1986) também fala da importância
do papel do assistente de biblioteca enquanto agente de transformação social. Lajolo (2006)
complementou a discussão sobre a similaridade da distribuição dos bens culturais que é
mediada pela leitura, com a dos bens materiais que é característica de nossa sociedade. Ela
também contribuiu com a citação de uma pesquisa que mostra o quadro caótico do repertório
de leitura dos professores do ensino fundamental e dos bibliotecários no Brasil. Esses dados
estatísticos vieram a ser ampliados por revistas atuais que nos ofereceram dados recentes que
retratam como o povo brasileiro tem portado-se como leitores, para que pudéssemos traduzir
em números aquilo que no dia a dia vemos: a inócua tarefa desenvolvida pela escola no papel
de formadora do aluno leitor.
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A Pesquisa utilizada foi a bibliográfica e o levantamento, pois segundo Gil (1996)
a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado e possibilita as
pesquisas que abordam concepções ideológicas:
A pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de trabalho dessa natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas. [...] As pesquisas sobre ideologias, bem como aquelas que se propõem à análise das diversas posições acerca de um problema, também costumam ser desenvolvidas quase exclusivamente a partir de fontes bibliográficas (GIL, 1996, p. 48).
Como abordar a produção de leitura em nossa sociedade requer principalmente
um olhar sobre a ideologia produzida hoje pelos nossos governantes, ficamos num primeiro
momento com essa pesquisa, porém num segundo momento nos utilizamos do levantamento
que segundo Gil (1996) se caracteriza pela interrogação direta das pessoas cujo
comportamento se deseja conhecer. Quanto à forma de aplicação da pesquisa Gil (1996)
afirmou:
Na maioria dos levantamentos, não são pesquisados todos os integrantes da população estudada. Antes se seleciona, mediante procedimentos estatísticos, uma amostra significativa de todo o universo, que é tomado como objeto de investigação. As conclusões obtidas a partir desta amostra são projetadas para a totalidade do universo, levando em consideração a margem de erro, que é obtida a partir de dados estatísticos (GIL, 1996, p. 56).
O local escolhido para a realização da pesquisa foram dez escolas da REME. A
escolha das escolas se deu pela localização geográfica, de modo a contemplar escolas
periféricas e centrais, já que cada uma possui uma clientela específica, pois os pais dos alunos
possuem poder aquisitivo diferenciado.
O número estabelecido de escolas atendeu mais de dez por cento das escolas da
REME, totalizando dez escolas, e em cada uma das escolas foram entrevistados diferenciados
atores sociais da escola, entre eles: assistentes de biblioteca, professores, supervisores,
diretores, sendo entrevistados quatro sujeitos em cada escola, o que totalizou ao final dez
professores entrevistados, dez supervisores, dez assistentes de biblioteca e dez gestores, sendo
atribuídos às escolas e aos sujeitos da pesquisa nomes fictícios.
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Também direcionamos uma entrevista a Chefia do CEMTE-Centro Municipal de
Tecnologia Educacional de Campo Grande/MS para que pudéssemos fazer um parâmetro
entre a realidade das escolas e a concepção que a Secretaria tem do assistente de biblioteca e
do seu fazer dentro das bibliotecas escolares da REME. Todavia o olhar especial foi dado ao
assistente de biblioteca já que é o seu perfil que buscamos traçar: sua função como assistente
de biblioteca, formação e concepção de leitura.
Tabela I. Formação e função inicial do assistente de biblioteca da REME/Rede Municipal de Ensino de Campo Grande /MS.
Escola Nome Função inicial (concurso) Formação
T Tereza Professor com pedagogia.
Administrativo
Pedagogia
Curso Superior
H Helena Administrativo Ensino Médio
I Irmã Administrativo Ensino Fundamental
E Eduarda Administrativo Cursando curso superior
C Carla Administrativo Ensino Médio
F Fernanda Administrativo Ensino Médio
D Diva Administrativo Ensino Médio
A Auxiliadora Administrativo Ensino Médio
M Marisa Administrativo Curso Superior
S Sueli Administrativo Ensino Médio Fonte: Pesquisa realizada com os Assistentes de biblioteca da REME.
Como método de coleta de dados, utilizamos a entrevista estruturada que segundo
Lüdke e Menga (1986) tem como característica a rigidez, visando mais tarde o tratamento
estatístico:
Quando o entrevistador tem que seguir muito de perto um roteiro de perguntas feitas a todos os entrevistados de maneira idêntica e na mesma ordem, tem-se uma situação muito próxima da aplicação de um questionário, com a vantagem óbvia de se ter o entrevistador presente para algum eventual esclarecimento. Essa é a chamada entrevista padronizada ou estruturada, que é usada quando se visa à obtenção de resultados uniformes entre os entrevistados, permitindo assim uma comparação imediata, em geral mediante tratamentos estatísticos. Entre esses dois tipos extremos se situa a entrevista semi-estruturada, que se desenrola a partir de um esquema básico,
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porém não aplicado rigidamente, permitindo que o entrevistador faça as necessárias adaptações (LÜDKE e MENGA, 1986, p. 35).
A entrevista se deu na forma escrita, onde o entrevistado pode escrever suas idéias
e foi direcionada ao Diretor, Supervisor, Professor, Assistente de Biblioteca, e a Chefia do
CEMTE-Centro Municipal de Tecnologia Educacional de Campo Grande/MS.
Cuidamos ao elaborar as entrevistas para que cada assistente de biblioteca
pontuasse sua formação e sua origem, sendo solicitado que o diretor da escola também
identificasse a formação desse profissional. Também cuidamos para que cada segmento
pudesse responder a mesma formulação do outro segmento, de sua ótica. Dessa forma, foram
poucas as questões que foram dirigidas com a mesma redação a todos os segmentos, embora o
objetivo proposto fosse o mesmo.
As questões elaboradas foram divididas em dois grandes eixos: concepções
teóricas sobre a leitura e como a mesma tem se efetivado na prática das bibliotecas da Rede
Municipal de Ensino de Campo Grande/MS. Porém, a análise dos dados além de utilizar-se
das entrevistas utilizou-se da observação, para constatarmos a estrutura física e a organização
desse ambiente. Foi visível que enquanto escola não assumimos nossa função e não
garantimos a nossos alunos as mínimas condições de se tornarem efetivamente leitores.
Todavia, quando partimos para a análise dos dados, nos deparamos com situações
que nos levaram a perceber possíveis problemáticas que poderiam ser trazidas à tona na
pesquisa. Assim, quando chegamos à sexta escola e a diretora pontuou ter três assistentes de
biblioteca, e quando nos deparamos com carga horária distinta adotada por assistentes de
biblioteca, notamos que nossa entrevista ficou relegada mais a parte pedagógica e política,
ficando questões de ordem administrativa relegadas a poucos momentos. O que possibilita
em outro momento estarmos complementando esse trabalho, buscando conhecer assim não só
a função do assistente de biblioteca na REME, mas num projeto audacioso contemplar todo o
estado de Mato Grosso do Sul.
RESULTADOS DA PESQUISA
Foi possível constatar ao longo da pesquisa e por meio das visitas às salas
destinadas à biblioteca escolar, que a biblioteca na Rede Municipal de Ensino de Campo
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Grande/MS não tem correspondido às expectativas do corpo docente e discente da escola. É
visível no discurso do diretor e do professor a frustração de ver que ainda não concebe e não
tem no assistente de biblioteca um companheiro na formação do aluno leitor. Assim quando
indagados sobre o cumprimento da função do assistente de biblioteca em suas respectivas
escolas, os mesmos responderam negativamente, ou seja, professores, supervisores e gestores
pontuam com clareza a não efetivação do papel do assistente de biblioteca nas respectivas
escolas.
Em outras algumas escolas embora não houvesse uma afirmação enfática “sim”
ou “não” para a afirmação ou negação do cumprimento da função do assistente de biblioteca
na escola, as respostas obtidas indicaram um descontentamento com o trabalho desse
profissional. Ou seja, esse profissional embora cuide de alguma esfera do seu trabalho como
a administrativa, outras como a pedagógica ainda fica a desejar. Como é o caso da leitura em
sala ou mesmo a organização das visitas dos alunos à biblioteca.
Já o assistente de biblioteca pauta-se na justificativa de falta de recursos e um
espaço físico adequado. Assim quando indagados sobre os cuidados com a biblioteca, as
condições da mesma e dos livros, sua organização e seu acervo, as opiniões foram quase
unânimes em afirmar que as bibliotecas das escolas das REME estão necessitando de uma
reformulação.
Verificamos na entrevista que apenas uma assistente pontuou ter um bom acervo.
Vale ressaltar que observando o espaço físico da última escola pudemos constatar que o
acervo é pobre (não sendo diferente das outras) e que a sala é pequena, sendo a única
ventilação da sala a porta, pois a única janela foi desativada, para ceder lugar à TV.
Realmente o espaço físico das bibliotecas da REME estão necessitando de uma
estruturação, pois elas apresentam um espaço pequeno, em alguns casos com pouca
ventilação, não apresentando assim um aspecto convidativo, gostoso e estimulante ao aluno,
além disso, em algumas escolas esse espaço foi destinado à sala de aula, ou seja, a biblioteca
nem existe. Também foi verificado em outra escola que a biblioteca foi dividida com a sala
da educação especial por ordem da própria secretaria de educação, ou seja, não se pode fechar
a sala de recurso, mas a biblioteca pode. Isso nos leva a confirmar aquilo que o próprio Silva
(1986) colocou, nossos governantes fazem de conta que incentivam a leitura, pois se a própria
secretaria de educação não vê a biblioteca e não prioriza uma política de incentivo ao
funcionamento da biblioteca a mesma ficará estagnada onde está.
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Foi constatado também que esse profissional ainda não concebe a sua real função
política que Silva (1986) pontua ser fundamental, pois a leitura não é um ato passivo, pelo
contrário, quando me coloco como leitor eu estou descobrindo e re-criando, sendo o ato de ler
em primeira instância, considerado como um ato de possuir elementos de combate à alienação
e ignorância, pois quando se pontua o papel desse profissional, observa-se que o mesmo
restringe-se a emprestar livros, onde não se reconhece em nenhum momento seu papel
político, e o desconhecimento desse papel político abrangeu os diversos segmentos:
professores, gestores, supervisores e assistentes de biblioteca. As respostas revelaram que
apenas a minoria do corpo docente sabe o que é função política, através das entrevistas
podemos constatar que não é só o assistente de biblioteca que em 80% dos casos possui
formação média não reconhece seu papel político, apenas 30% dos professores souberam
fazer um reporte a esse papel político de suma importância, importante pontuarmos aqui que
todos os professores da REME tem como formação mínima a graduação.
O que nos leva a afirmar que alguns atores da escola ainda concebem educação
desvinculada da ação política. Veiga (2001) ao elencar uma das características do currículo
escolar pontuou a sua não-neutralidade, sendo que a escola deve identificar e desvelar os
componentes ideológicos do conhecimento escolar que a classe dominante utiliza para
manutenção de privilégios, não podendo conceber a prática educativa como neutra, o que
podemos afirmar que não tem acontecido em nossas escolas, já que ainda nem concebemos
nosso papel político.
Além disso, verificamos nas visitas as escolas, por parte de alguns diretores a
resistência de estar participando dessa pesquisa, parece que algumas verdades precisam ficar
sem serem desveladas, em outros momentos se percebeu o discurso do “temos tanto coisa
para fazer e não podemos perder tempo com conversa sobre a biblioteca”, porém alguns
diretores abriram as portas e falaram da ânsia de ter na escola um profissional que realmente
venha estar cumprindo sua função, ajudando na construção de um aluno leitor.
Também foi interessante percebermos que o mecanismo utilizado pela SEMED,
como forma de avaliação desse profissional ou foi dito ser desconhecido ou foi colocado
como ineficiente na melhoria do trabalho desse profissional. A entrevista também revelou
que quando a avaliação foi apontada, a mesma foi dita como sem retorno pela SEMED.
Apesar da minoria das escolas ter reconhecido como avaliação cursos e visitas de
acompanhamento, ficando a avaliação restrita ao formulário, quando reconhecida, a Chefia do
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CEMTE pontuou que a avaliação do assistente de biblioteca se dá através de seminários,
relatos de experiência e através da avaliação escrita feita pela escola.
Quando solicitamos que o segmento dos professores, diretores e supervisores
pontuassem fatores que levassem cada vez menos as crianças a gostar de ler, todas as
respostas mostraram a família como uma das possíveis causas, já que não incentiva as
crianças a lerem. Ou seja, não assumimos nossa função, não é a família que cabe
desenvolver o gosto pela leitura, essa função é nossa. Aí então nos assustamos quando Lajolo
(2006) afirma que não somos capazes nem de proporcionar aos que vão a escola tornar-se
leitores, o que dizer então dos que não vão? Todavia alguns profissionais (apenas três) já
reconhecem essa função como da escola e então pontuaram entre os fatores causais a proposta
pedagógica, a escola propriamente dita e a falta de um trabalho onde a leitura seja trabalhada
como forma de prazer.
Também observamos que a Chefia do CEMTE também pontuou ser nossa a
responsabilidade pela formação do aluno leitor, não atribuindo essa função à família. Isso
quer dizer que a Secretaria de Educação já reconhece o grande problema: nós não temos dado
conta da nossa função de formar leitores, falta agora avalancar políticas que mudem o quadro
atual das bibliotecas da REME, e que levem a comunidade escolar e o corpo docente a
conhecer a real função desse profissional, pois apenas na entrevista da Chefia do CEMTE
visualizamos claramente suas funções que nos segmento de professores, supervisores,
gestores e assistentes de biblioteca ainda encontram-se mal definidas e duvidosas. É
importante frisarmos que o fato de não ser do conhecimento da escola as funções desse
profissional, a avaliação enviada pela SEMED é comprometida, pois só poderemos avaliar o
trabalho desse profissional se tivermos claro as suas reais atribuições.
Ao analisarmos as bibliotecas escolares da REME concluímos que falta por parte
da Secretaria de Educação uma política de leitura em nosso município, pois enquanto escolas
possuem três assistentes (todos com curso superior, não em biblioteconomia, mas em outras
áreas), outras possuem apenas um profissional com ensino fundamental. E essa política não
se restringe apenas a distribuição desse profissional na escola, mas também no cumprimento
da carga horária, que em umas escolas se dá em dois períodos de quatro horas (07h00min as
11h00min e das 13h00min as 17h00min), enquanto em outra pudemos constatar que esse
profissional faz horário corrido, entrando as 07h00min horas, fechando o turno às 15h15min.
Isso quer dizer que se o aluno, ou mesmo o professor precisar recorrer ao assistente de
biblioteca em seu planejamento, ou mesmo algum aluno para fazer pesquisa, a biblioteca
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estará de portas fechadas para atendê-lo. Embora inicialmente não proponhamos falar da
jornada de trabalho desse profissional, somos obrigados a indagar: o que faz esse profissional
das 11h10min as 13h00min na escola? Sendo que nesse momento a clientela desse
profissional está ausente da escola: o aluno e também o professor.
Confirmamos assim na prática, através da pesquisa e das visitas às bibliotecas o
que Lajolo (2006) afirmou com relação a nossa sociedade, que possui uma divisão de rendas e
de lucros tão desigual, e que reproduz essa desigualdade similar também à distribuição de
bens culturais, já que a participação em boa parte desse último é mediada pela leitura,
habilidade que não está ao alcance de todos, nem mesmo de todos aqueles que foram à escola.
Pois nas quarenta entrevistas em nenhum momento se pontuou como atribuição desse
profissional a responsabilidade na formação de um aluno leitor crítico e transformador dessa
sociedade. Atribui-se a ele a função de realizar projetos de leitura e de emprestar livros à
comunidade, como se a criança tivesse que ler por ler, ter o hábito, a automação e
mecanização que segundo Lajolo (2006) assemelha-se mais a certos rituais como de higiene e
alimentação, por exemplo.
A escola então não tem a oportunidade de dispor da biblioteca para a efetivação
da leitura, e assim a possibilidade desse espaço ser um dos ricos momentos para o aluno
adentrar o mundo da leitura com todos os seus significados, conhecimentos e aprendizagens
não tem se efetivado, é claro, que isso não isenta o professor de realizar esse trabalho em sala,
mas contar com uma biblioteca e um assistente de biblioteca que desempenhe seu papel é
imprescindível na formação do aluno leitor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término da pesquisa pudemos afirmar que apesar da resistência de algumas
escolas o objetivo de nossa pesquisa foi atingido, pois através da análise das entrevistas
direcionada aos diversos segmentos: professores, diretores, assistentes de biblioteca e chefia
do CEMTE e das visitas às bibliotecas baseados em teóricos críticos apreendemos a função e
o papel desempenhado pelo assistente de biblioteca da REME e assim concluímos que nosso
município não tem dado grande importância à biblioteca dentro da escola e ao papel que o
assistente de biblioteca desempenha, e que não existe uma política direcionada a esse trabalho
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e ao seu profissional. Isso pode ser comprovado quando se autoriza dividir a biblioteca,
destinando-a para outra função, relegando a mesma um papel secundário dentro da escola.
Em algumas escolas a bibliotecária entrega kit, uniforme e cuida do livro didático, ficando
nesse ínterim a biblioteca sem cumprir sua função principal. Percebe-se também a falta de
uma política no cumprimento da carga horária do profissional e na distribuição do mesmo
dentro das escolas, pois enquanto escolas com 1000 (segundo informação da direção) alunos
possuem três profissionais com curso superior, outras possuem apenas um (com ensino
fundamental) com aproximadamente 820 alunos.
A política de formação do assistente e de avaliação do assistente de biblioteca
também necessita ser repensada, pois apesar do CEMTE (o trabalho do assistente de
biblioteca é direcionado e acompanhado pelo CEMTE) pontuar que são oferecidos cursos
bimestrais e que quando há necessidade os mesmos são oferecidos, na prática visualizamos
um profissional alienado que muitas vezes não cumpre nem a sua função administrativa e que
a avaliação desse profissional ou é desconhecida pela escola ou é tida como ineficaz.
Das dez escolas pesquisadas embora a Chefia do CEMTE tenha afirmado que os
profissionais são preparados para cumprir sua função administrativa, pedagógica e política,
apenas quatro escolas apresentaram uma biblioteca que tenha um funcionamento satisfatório
pelos diversos segmentos entrevistados, das outras seis, uma foi pontuada por desenvolver um
trabalho satisfatório em partes. Porém o mais crítico é que das quatro escolas que apontaram
um trabalho satisfatório, apenas um assistente de biblioteca fez um reporte ao seu papel
político, que é a contribuição para a formação do cidadão leitor e portanto, crítico. Os outros
três apesar de afirmarem que desempenham um papel político atribuíram a esse papel o fato
de emprestar livros, como se emprestar livros por emprestar levasse alguém a ser crítico. O
que nos leva a pontuar a importância de estarmos revendo a formação desse profissional que
Lajolo (2006) pontuou ser fundamental, e que na maioria das vezes tem sido relegada
simplesmente a elaboração de material como cartazes e outros, não que eles não sejam
importantes na estruturação física da biblioteca, mas por si só não garantem um trabalho
eficaz com a leitura.
O que Souza (1986) falou da prática de leitura em nosso país e da falsa idéia de
que o governo incentiva a leitura é confirmado nos dias atuais, pois na prática vemos
profissionais despreparados, desmotivados, e sem formação, sem consciência política da
importância do seu trabalho, sem uma política que direcione o seu trabalho dentro da Rede
Municipal de Ensino de Campo Grande/MS e por fim sem uma avaliação que realmente
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venha estar avaliando seu trabalho. Aliado a esse fator o espaço físico de nossas bibliotecas
têm servido mais como depósitos, são atribuídas a ela várias funções, ficando então o espaço
lúdico, gostoso e cativante onde o aluno deveria estar em contato com diversos livros
destinado a um simples espaço onde se guarda livro e se utiliza para outras funções que não
tem lugar apropriado.
Logo, o papel do assistente de biblioteca que deve ser assumida segundo Souza
(1986) tanto na dimensão educativa como na política, colocando-se como um co-responsável
pela formação do aluno leitor, sendo para isso primordial que o mesmo seja um leitor e que
goste de ler, não tem se efetivado nas escolas da REME, e assim nos dispomos a oferecer à
Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande/MS esse material, para que enquanto
órgão normatizadora e efetivadora de políticas públicas possa estar delineando uma nova
política à biblioteca, ao assistente de biblioteca dentro das escolas da REME. Inclusive a
divulgação junto à comunidade escolar das reais funções desse profissional que em vários
momentos mostrou-se nebulosa entre os diversos segmentos. A clareza da sua função foi
muito bem delimitada pela Chefia do CEMTE, mas não por quem se utiliza do serviço
prestado do assistente de biblioteca.
Como professores e supervisores da REME finalizamos esse trabalho com a
expectativa de que esse profissional tenha da Secretaria Municipal de Educação de Campo
Grande/ MS uma política que realmente ofereça condições para que esse profissional
desempenhe na escola não só a sua função administrativa, mas também pedagógica e
principalmente política, o que requer investimento principalmente na formação desse
profissional, pois apesar de ser pontuado como prática efetiva no discurso, não tem mostrado
resultados no dia-a-dia, sendo necessário que a SEMED venha repensar a formação do
assistente de biblioteca para que a escola possa de fato ter condições de possibilitar a
formação do cidadão leitor, consciente, crítico e participativo, o que nas condições de leitura
atual a escola não tem oportunizado.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Gilberto Luiz. A Produção da Escola Pública Contemporânea. Campo Grande, MS: Ed. UFMS; Campinas, SP: Autores Associados, 2001.
CAGLIARI, Luiz Carlos. A Leitura. In: Apostila da Pós-Graduação. SEMED, 2006, p. 21-32.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1996.
IDEB. http://ideb.inep.gov.br/Site/. Acesso em 08 de agosto de 2007.
LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 6ª ed. São Paulo: Ática, 2006.
LÜDKE, André; MENGA Marli. Pesquisa em educação: abordagem qualitativa. São Paulo: EDU, 1986.
MARICATO, Adriana. Só quem lê pode ensinar o gosto pela leitura. Pátio. N° 40, Artmed, Porto Alegre, nov. 2006/jan. 2007. (encarte).
ROSA, Cida Capo. Um país com fome de leitura. Pátio. N° 33, Artmed, Porto Alegre, fev./abril 2005, (p. 25-30).
SOARES, Magda B. As condições sociais da leitura: uma reflexão em contraponto. In: ZILBERMAN, R. & SILVA, E. Theodoro da, orgs. Leitura: perspectivas interdisciplinares. São Paulo, Ática, 1988.
SILVA, Ezequiel Theodoro. Leitura na escola e na biblioteca. 2ª ed. Campinas, SP: Papirus, 1986.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro (org). Projeto político pedagógico da escola: uma construção política possível. 13ª. Campinas, SP: Papirus, 2001.
1 Pedagoga, Professora alfabetizadora concursada da REME-Rede Municipal de Ensino de Campo Grande-MS, desde 2006, especialista em Planejamento educacional e pós graduanda do curso Organização do trabalho do professor alfabetizador na educação infantil e séries iniciais oferecido pelo IESF. 2 Pedagoga, Supervisora concursada desde 2005 na REME-Rede Municipal de Ensino de Campo Grande-MS, especialista pela UNAES em Metodologia da Educação Infantil e Séries iniciais e pós graduanda no curso A organização do trabalho do Professor alfabetizador na educação infantil e séries iniciais oferecido pelo IESF. 3 Pedagoga, licenciada no curso normal superior pela UEMS-Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, professora concursada da REME desde 2006, pós graduanda no curso a Organização do trabalho do professor alfabetizador na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental oferecido pelo IESF. 4 Orientadora. Professora Mestra pela Universidade Federal de São Carlos/SP. Professora e Coordenadora do Curso de Pedagogia do IESF e Coordenadora Geral de Gestão e Políticas Educacionais da Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande/MS. 5 O IDEB-Índice de Desenvolvimento da Educação Básica revelou o baixo desempenho do município de Campo Grande/MS, que em 2005 obteve médias 4,2 nos anos iniciais e 3,7 nos anos finais do Ensino Fundamental, revelando assim que a educação de nosso município ainda está distante de garantir a escola pública de qualidade a todos, garantido pela LDB/ Lei de Diretrizes e bases 9394/96. 6 Avaliação Internacional feita pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico em 41 países em 2003, que garantiu a Coréia o terceiro lugar em matemática e o quarto em português, e ao Brasil a última e a penúltima colocação nas duas matérias. 7 O capitalismo também adentrou o espaço escolar, assim segundo Alves (2001) em Comenius, e sua obra Didática Magna temos o registro clássico de uma época que postulava transição análoga no domínio da
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educação: que reconhecia a necessidade histórica de superação do mestre artesanal pelo professor manufatureiro. A manufatura agora em estágio mais maduro, passou a decompor e analisar detidamente as operações constitutivas do processo de trabalho, agregando- as, posteriormente, por proximidade temporal e segundo a complexidade de cada uma. O trabalhador começa então a ser submetido à especialização no interior do processo de trabalho, e sua longa aprendizagem começa a tornar- se dispensável. A qualificação profissional, segundo Marx (apud ALVES, 2001) passava a ser reconhecido como um empecilho para a consecução dos objetivos do capital. O operário fabril passou então a realizar operações rotineiras que não lhe exigiam destreza especial, e o professor (mestre artesanal) dentro da visão da Didática Magna de Comenius também estreitou os limites do saber exigido do professor, pois objetivamente, restringiu-os aos seus próprios limites. Assim concretizou de uma forma evidente a reprodução da divisão do trabalho, dentro do estabelecimento escolar, de um modo similar ao ocorrido anteriormente na manufatura.
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