João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
II
RADIAÇÕES Natureza, Efeitos e Protecção
2009
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
III
RESUMO
Apresenta-se as radiações, seus efeitos e formas de protecção de maneira geral.
A sua natureza, origem, tipos e classificação são apresentados, além dos princípios bási-
cos de Radiobiologia. Os mecanismos de interacção da radiação com a molécula de
ADN, os tipos de danos que podem ocorrer, bem como os factores que influenciam a
Radiossensibilidade celular são também apresentados.
ABSTRACT
One presents the radiations, its effects and forms of protection in general. Its na-
ture, origin, types and classification are presented, as well as the basic principles of Ra-
diobiology. The mechanisms of interaction of radiation with the molecule of DNA, the
types of damages that may occur, as well as the factors that influence cellular radiosen-
sitivity are also presented.
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
IV
ÍNDICE
RESUMO ....................................................................................................................................... III
ABSTRACT ..................................................................................................................................... III
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES E TABELAS ............................................................................................ VI
§I - INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 7
I.1. Objectivo do trabalho .................................................................................................... 8
I.1. Palavras-chave ............................................................................................................... 8
I.2. Definição dos termos e acrónimos usados neste trabalho ............................................. 9
§II - RADIAÇÕES E SUAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS ......................................................... 10
II.1. Radiação ...................................................................................................................... 10
II.1.1. Radiação mecânica .............................................................................................. 10
II.1.2. Radiação electromagnética .................................................................................. 10
II.1.3. Radiação de partículas materiais ......................................................................... 11
II.2. Radiação ionizante ...................................................................................................... 12
II.2.1. Tipos de radiação ionizante ................................................................................. 13
II.2.2. Fontes de radiação ionizante ............................................................................... 13
§III - GRANDEZAS, LIMITES E PRINCÍPIOS RADIOLÓGICOS ...................................................... 15
III.1. Grandezas de medição da radioactividade .............................................................. 15
III.1.1. Actividade ........................................................................................................... 15
III.1.2. Actividade específica .......................................................................................... 16
III.1.3. Lei fundamental da desintegração radioactiva .................................................... 16
III.2. Grandezas dosimétricas ........................................................................................... 18
III.2.1. Exposição ............................................................................................................ 18
III.2.2. KERMA ............................................................................................................... 19
III.2.3. CEMA .................................................................................................................. 20
III.2.4. Dose absorvida .................................................................................................... 20
III.2.5. LET ..................................................................................................................... 21
III.2.6. Taxa de dose absorvida ....................................................................................... 22
III.3. Grandezas de radioprotecção................................................................................... 22
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V
III.3.1. Dose equivalente ................................................................................................. 22
III.3.2. Taxa de dose equivalente .................................................................................... 24
III.3.3. Dose efectiva ....................................................................................................... 25
III.4. Gestão do risco radiológico ..................................................................................... 25
III.4.1. Princípio da Justificação da prática. .................................................................... 26
III.4.2. Princípio da optimização da protecção ................................................................ 26
III.4.3. Princípio da limitação da dose............................................................................. 26
III.5. Regras de protecção individual ............................................................................... 26
III.5.1. Distância .............................................................................................................. 26
III.5.2. Barreiras de protecção ......................................................................................... 26
III.5.3. Tempo de exposição ............................................................................................ 29
§IV - RADIOBIOLOGIA E EFEITOS BIOLÓGICOS DAS RADIAÇÕES ............................................. 30
IV.1. Mecanismos de interacção da radiação com o ADN ............................................... 30
IV.2. Tipos de danos no ADN .......................................................................................... 31
IV.3. Possíveis efeitos sobre a célula devido a sua interacção com a radiação ................ 31
IV.4. Radiossensibilidade ................................................................................................. 32
IV.4.1. Factores que influenciam a radiossensibilidade celular ...................................... 32
IV.5. Efeitos estocásticos (probabilísticos) ...................................................................... 34
IV.6. Efeitos determinísticos ............................................................................................ 35
§V - CONCLUSÃO .................................................................................................................... 36
V.1. Recomendações ........................................................................................................... 36
Bibliografia .................................................................................................................................. 37
Índice remissivo ........................................................................................................................... 39
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VI
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES E TABELAS
ILUSTRAÇÃO 1 - ANTOINE HENRI BECQUEREL. FÍSICO FRANCÊS, VENCEDOR DO PRÉMIO NOBEL DA FÍSICA
EM 1903, DESCOBRIU A RADIOACTIVIDADE NO URÂNIO. (FOTO ENCARTA ENCYCLOPEDIA) ................ 7
ILUSTRAÇÃO 2 - JAMES CLERK MAXWELL. UM DOS MAIORES CIENTISTAS DO SÉCULO XIX, DESENVOLVEU
UMA TEORIA MATEMÁTICA, DESCREVENDO AS PROPRIEDADES DOS CAMPOS ELÉCTRICOS E
MAGNÉTICOS. (FOTO ENCARTA ENCYCLOPEDIA) ............................................................................... 10
ILUSTRAÇÃO 3 - ERNEST RUTHERFORD. FÍSICO NEOZELANDÊS, NOBEL DE QUÍMICA EM 1908, PIONEIRO DA
FÍSICA NUCLEAR E PRIMEIRO HOMEM A TRANSMUTAR UM ELEMENTO QUIMICO. (FOTO ENCARTA
ENCYCLOPEDIA)................................................................................................................................. 11
ILUSTRAÇÃO 4 - CARGA ELÉCTRICA DAS RADIAÇÕES ALFA, BETA E GAMA. AS RADIAÇÕES ALFA POSSUEM
CARGA POSITIVA E DESLOCAM-SE NO SENTIDO DA PLACA NEGATIVA, AS RADIAÇÕES BETA TÊM
CARGA CONTRÁRIA E MOVEM-SE NO SENTIDO DA PLACA POSITIVA. AS RADIAÇÕES GAMA SÃO FOTÕES
E NÃO POSSUEM CARGA, CONSEQUENTEMENTE NÃO SOFREM DESVIO. ............................................... 12
ILUSTRAÇÃO 5 - LEI DO INVERSO DO QUADRADO DA DISTÂNCIA. O FLUXO F DE PARTÍCULAS QUE
ATRAVESSA A SUPERFÍCIE DS DIMINUI COM O QUADRADO DA DISTÂNCIA. ......................................... 17
ILUSTRAÇÃO 6 - ABSORÇÃO. ESQUEMA DE UM ARRANJO EXPERIMENTAL PARA A DETERMINAÇÃO DA
ABSORÇÃO DA RADIAÇÃO POR UM MATERIAL. ................................................................................... 27
ILUSTRAÇÃO 7 - NÚMERO DE CÉLULAS QUE SOBREVIVEM EM FUNÇÃO DA DOSE PARA DIFERENTES TAXAS
DE DOSE. ............................................................................................................................................ 32
ILUSTRAÇÃO 8 – DEPENDÊNCIA DA TAXA DE SOBREVIVÊNCIA CELULAR, COM A DOSE PARA RADIAÇÕES DE
DIFERENTES LET................................................................................................................................ 33
TABELA 1 - FACTOR F QUE RELACIONA A DOSE ABSORVIDA COM A EXPOSIÇÃO PARA FOTÕES COM ENERGIA
DE 10 KEV A 2 MEV ........................................................................................................................... 21
TABELA 2 - VALORES DO LET DAS RADIAÇÕES MAIS COMUMMENTE USADAS. FONTE (SUNTHARALINGAM,
ET AL., 2005) ..................................................................................................................................... 22
TABELA 3 - FACTOR DE PONDERAÇÃO DAS RADIAÇÕES. FONTE (IAEA, 1993) ........................................... 23
TABELA 4 - FACTORES DE PONDERAÇÃO DOS ÓRGÃOS. FONTE (IAEA, 1993) ............................................. 24
TABELA 5 - LIMITES DE DOSE RECOMENDADAS PELO ICRP. FONTE (ICRP, 1990) ...................................... 25
TABELA 6 - ESPESSURA MÍNIMA DE CHUMBO NECESSÁRIA PARA A PROTECÇÃO CONTRA OS RAIOS X, VS
ENERGIA DA RADIAÇÃO. (FONTE WIKIPÉDIA) .................................................................................... 28
TABELA 7 - VALORES DE HVL E TVL, PARA ALGUNS MATERIAIS MAIS USADOS NA CONSTRUÇÃO DE
BARREIRAS. FONTE (ANDREUCCI, 2007) ............................................................................................ 29
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7 | P á g i n a
§I - INTRODUÇÃO
“ […Com a radiação] Estás sempre a contrabalançar os riscos
contra possíveis benefícios”.
- Dr. Joseph R. Castro, chefe de radioterapia do Laboratório
Lawrence Berkeley
“Radiação1. Dificilmente uma palavra em qualquer idioma gera mais ansiedade”.
Estas palavras retiradas do artigo living with radiation, publica-
do em Abril de 1989 pela revista norte americana National Geo-
graphic, espelham bem o efeito que a radiação tem sobre as
pessoas.
A radiação é um dos temas mais controversos de ser
abordado, porque ela pode ser altamente benéfica ou perigosa.
De facto, segundo um relatório da American cancer society2,
apenas em 2007 foram diagnosticados cerca de 12 milhões de
novos casos de cancro no mundo todo (UOL, 2007). Ora, para
cerca de metade dos casos de cancro é aplicado radioterapia3
(IAEA, 2006). Dos casos que recebem radioterapia, cerca de 3/5
deles resulta em cura o que corresponde a mais de 3 milhões e
meio de pessoas livres desta enfermidade, graças a aplicação positiva das radiações.
Talvez a melhor forma de expressar os benefícios do uso das radiações não esteja nas
estatísticas, mas nas palavras como as que se seguem, ditas por uma paciente que rece-
bia radioterapia no laboratório Lawrence Berkeley.
“As pessoas deveriam estar orgulhosas disto…” (Cobb, 1989)
1 Aqui radiação refere-se a radiação ionizante (ver pág. 7).
2 Sociedade Americana do cancro.
3 Tratamento com radiações
Ilustração 1 - Antoine Henri
Becquerel. Físico Francês,
vencedor do prémio Nobel da
Física em 1903, descobriu a
radioactividade no Urânio.
(Foto encarta encyclopedia)
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8 | P á g i n a
No entanto, logo após a descoberta dos raios X por Wilhelm Konrad Roentgen
(1845-1923) em 1895, e da radioactividade natural em 1896 por Antoine Henri Becque-
rel (1852-1908), cedo tornou-se evidente que as radiações emitidas nestes processos não
somente eram úteis para efeitos de diagnóstico e tratamento, mas também nocivos aos
tecidos humanos (López, et al., 2005). Por exemplo, Cerca de 4 mil mortes são espera-
das que venham a acontecer entre as pessoas mais afectadas pelo maior acidente envol-
vendo radiações: o acidente de Chernobyl (IAEA, 2005).
Incrementar os benefícios e reduzir os perigos do uso das radiações, é o objecto
da radioprotecção. Segundo Carvalho (2009), define-se protecção radiológica (radio-
protecção) como a ciência e a prática de limitar os danos causados pelas radiações as
pessoas e ao ambiente.
Uma das razões principais para a criação e uso de normas e procedimentos de
segurança é o facto de não se poder desfazer dos benefícios da radiação. Por exemplo, a
importância das radiações na medicina e na indústria transcende a radioterapia e os tes-
tes não destrutivos de materiais essenciais; é utilizada como uma poderosa ferramenta
de diagnóstico, não apenas nas tradicionais radiografias, mas em dispositivos mais
complexos como nas tomografias computadorizadas e nos PET4. Além disto, as radia-
ções são amplamente usadas na pesquisa e investigação científica, e em vários outros
campos.
I.1. OBJECTIVO DO TRABALHO
Este trabalho tem como objectivo apresentar alguns conceitos sobre as radiações,
a sua interacção com a matéria viva e as formas de protecção contra os riscos delas
advindas, baseando-se em padrões internacionais de protecção radiológica.
I.2. PALAVRAS-CHAVE
Radiação, radioprotecção, blindagem, absorção, radioactividade, efeitos
biológicos, dosimetria.
4 PET – Positron Emission Tomography (tomografia por emissão de positrões).
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I.3. DEFINIÇÃO DOS TERMOS E ACRÓNIMOS USADOS NESTE TRABALHO
ALARA – As Low As Reasonable Achievable (tão baixa quanto razoavelmente
possível).
c.d.o – Comprimento de onda.
CEMA – Converted Energy by Unit mass (energia convertida por unidade de
massa).
eV – Electrão-volt, unidade de energia equivalente a 1,6.10-19
Joule.
HVL – Half Value Layer (Camada semi-redutora).
IAEA – International Atomic Energy Agency (Agência Internacional de Energia
Atómica).
ICRP – International Commission on Radiological Protection (Comissão Inter-
nacional sobre Protecção Radiológica).
ISO – Organização Internacional para padronização.
KERMA – Kinetic Energy Released by Unit Mass (energia cinética por unidade
de massa).
KeV – Quilo electrão-volt.
MeV – Mega electrão-volt.
OER – Oxygen Enhancement Ratio (ratio de aprimoramento por oxigénio).
rad – Radiation Absorbed Dose, unidade de dose absorvida.
rem – Roentgen Equivalent Man, unidade de dose equivalente.
SI – Sistema Internacional de Unidades.
TVL – Tenth Value Layer (Camada Decimo-redutora).
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§II - RADIAÇÕES E SUAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
II.1. RADIAÇÃO
Radiação é o processo de transmissão de energia com
ou sem matéria5 através do espaço. A radiação consiste de
ondas e partículas. Na verdade, a distinção entre onda e partí-
cula não pode ser estabelecida. De acordo com De Broglie6,
partículas e ondas são consideradas duas faces de uma mesma
moeda, sendo mais correcta a denominação partícula-onda.
De qualquer forma, a divisão da radiação como sendo consti-
tuída por partículas ou por ondas é muito usada na bibliografia
corrente e será também eventualmente usada neste trabalho.
Segundo a sua natureza, as radiações podem ser divi-
didas em três partes:
II.1.1. RADIAÇÃO MECÂNICA
Este tipo de radiação depende de um meio material para a sua transmissão, e
manifesta-se como onda, não havendo durante o processo transmissão de matéria. As
radiações sonoras e sísmicas são alguns exemplos.
II.1.2. RADIAÇÃO ELECTROMAGNÉTICA
As radiações electromagnéticas foram inicialmente previstas, pelo Físico Esco-
cês James Clerk Maxwell (1831-1879) no seu trabalho “treatise on electricity and mag-
netism” publicado em 1873. As radiações electromagnéticas não precisam de um meio
para a sua transmissão, podendo ser transmitidas através do vácuo. Contudo, são
5 O conceito de matéria neste trabalho é apresentado como todo o ente Físico para o qual existe
um sistema de referência qualquer em que este esteja em repouso. Esta definição é importante para distin-
guir matéria de partícula.
6 Louis Victor de Broglie (1892 – 1987). Prémio Nobel de Física em 1927, pela sua teoria de
1923 onde descrevia a natureza ondulatória dos electrões.
Ilustração 2 - James Clerk
Maxwell. Um dos maiores
Cientistas do século XIX,
desenvolveu uma teoria mate-
mática, descrevendo as pro-
priedades dos campos
eléctricos e magnéticos. (Foto
encarta encyclopedia)
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11 | P á g i n a
influenciadas pela presença da matéria. São normalmente consideradas como ondas,
embora tenham natureza dual (corpúsculo-onda). As “partículas” da radiação electro-
magnética - os fotões - não possuem massa em repouso, e no vácuo se deslocam todas
com a mesma velocidade c7, transportando energia através do espaço. A energia das
radiações electromagnéticas depende somente da sua frequência (e consequentemente
do seu c.d.o), podendo variar desde ondas com energia muito pequena (frequência mui-
to pequena; c.d.o muito grande) conhecidas como ondas de rádio, até ondas de altíssima
energia (grande frequência; pequeno c.d.o), conhecidas como radiações gama (𝛾). Ao
todo, a radiação electromagnética inclui uma grande sucessão de radiações que ficam
entre estes dois extremos conhecida como espectro electromagnético.
II.1.3. RADIAÇÃO DE PARTÍCULAS MATERIAIS
Este tipo de radiação consiste de pequenos corpúsculos materiais (massa em
repouso diferente de zero), que se movem com velocidades
muito grande (perto da velocidade da luz c), não precisando
portanto, de um meio para a sua transmissão, mas também
são influenciadas pela presença da matéria. Estas radiações
observam-se durante a desintegração radioactiva dos núcleos
atómicos.
Foi Ernest Rutherford (1871 – 1937) quem descobriu
que durante a desintegração radioactiva, estavam presentes
pelo menos dois componentes, as partículas alfa (𝛼), capazes
de penetrar apenas alguns milionésimos de centímetro no
alumínio, e as partículas beta (𝛽), que eram cerca de 100
vezes mais penetrantes que as partículas alfa (𝛼) (Lewin, 2008).
7 c é a velocidade da luz no vácuo e vale precisamente 299 792 458 m/s.
Ilustração 3 - Ernest Rutherford.
Físico Neozelandês, Nobel de
Química em 1908, pioneiro da
Física Nuclear e primeiro homem a
transmutar um elemento quimico.
(Foto encarta encyclopedia)
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Rutherford mostrou que as partículas alfa possuíam carga positiva (ver Ilustra-
ção 4) e que eram núcleos de
hélio, as partículas beta possuíam
carga negativa. As partículas β
foram mais tarde identificadas
como sendo electrões.
Rutherford mostrou ainda
a existência de uma Terceira for-
ma de radiação vinda dos proces-
sos radioactivos, que não possuía
carga eléctrica a que denominou
radiação gama (γ).
Apesar de as radiações α serem mais perigosas que as radiações β e γ (para
iguais doses absorvidas destas radiações, é maior a dose equivalente das radiações alfa)
(ver Dose equivalente na pág. 22) estas são de maior facilidade de protecção, porque só
podem percorrer alguns poucos centímetros no ar, antes de serem totalmente absorvidas,
e são facilmente detidas por uma simples folha de papel. As partículas β podem percor-
rer uma distância maior no ar, mas são detidas por alguns milímetros de alumínio. As
radiações γ são mais difíceis de deter, percorrendo grandes distâncias no ar, e só são
absorvidas por pesadas barreiras de betão ou chumbo.
Finalmente, durante a desintegração radioactiva existem três tipos de radiação
que Rutherford denominou de radiação alfa (𝛼), radiação beta (β) e radiação gama (γ).
A radiação alfa é constituída de núcleos de hélio, a beta é formada por electrões, e a
radiação gama por ondas electromagnéticas de elevada energia.
II.2. RADIAÇÃO IONIZANTE
Embora existam diversos tipos de radiação, do ponto de vista da segurança e
protecção radiológica tem apenas interesse a radiação ionizante. É sobre estas radiações
em particular, que se destina a radioprotecção e o presente trabalho.
Radiação ionizante é a radiação que possui energia suficiente para ionizar áto-
mos e moléculas (Wikipédia). Estas radiações tem a capacidade de ao atravessar um
Ilustração 4 - Carga eléctrica das radiações alfa, beta e gama.
As radiações alfa possuem carga positiva e deslocam-se no sentido
da placa negativa, as radiações beta têm carga contrária e movem-
se no sentido da placa positiva. As radiações gama são fotões e não
possuem carga, consequentemente não sofrem desvio.
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determinado meio, ionizarem-no, i.e., são capazes de arrancar os electrões das suas orbi-
tas no cortejo electrónico, e por esta razão danificar tecidos vivos.
II.2.1. TIPOS DE RADIAÇÃO IONIZANTE
Neste grupo, encontram-se todas as radiações emitidas durante o processo de
desintegração radioactiva, ou seja as partículas alfa, beta e gama, as quais adiciona-se a
radiação X, neutrões (n), protões (p) e iões de elementos pesados.
Na prática considera-se como radiação ionizante toda a radiação cuja energia
seja superior a 14 eV (Primeiro curso nacional de protecção radiológica, 2009).
As radiações ionizantes podem dividir-se em dois tipos:
Com carga eléctrica: neste grupo encontram-se as radiações α, β, pro-
tões (p) e iões de materiais pesados.
Sem carga eléctrica: neste grupo encontra-se as radiações X, γ, e os
neutrões.
II.2.2. FONTES DE RADIAÇÃO IONIZANTE
As fontes de radiação podem ser de dois tipos:
II.2.2.1. Radiação de origem natural.
Estas radiações têm origem em fontes que ocorrem naturalmente na natureza; a
radiação terrestre, cósmica e interna são fontes de radiação natural. A radiação terrestre
deve-se ao facto de existirem mais de 60 radioisótopos na crusta terrestre (Primeiro
curso nacional de protecção radiológica, 2009), por exemplo o urânio, o tório, o carbo-
no-14, e o radão-222. O radão-222 em especial requer tratamento diferenciado. Segundo
carvalho (2009), este elemento é responsável por cerca de 50% de toda a dose de radia-
ção a que uma pessoa está exposta. Os Raios Cósmicos são partículas extremamente
penetrantes, dotados de alta energia, que se deslocam a velocidades próximas a veloci-
dade da luz no vácuo e se originam no espaço sideral (Wikipédia). A radiação também
pode advir de dentro dos organismos, algumas das substâncias que formam os seres
vivos são na verdade isótopos radioactivos de elementos estáveis. Por exemplo, parte do
carbono do nosso corpo é carbono-14, um isótopo radioactivo do carbono. Outros
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exemplos são o potássio-40 (40
K), o rádio-226 (226
Ra), o chumbo-210 (210
Pb), o polónio-
210 (210
Po), o urânio (U) e o tório (Th).
II.2.2.2. Radiação de origem artificial.
Estas radiações originam-se num dos três processos que se seguem:
Partículas carregadas aceleradas por uma diferença de potencial contí-
nua ou alternada, curvadas por campos magnéticos em aceleradores de
partículas.
Por radiação de travagem (bremsstrahlung). Partículas previamente
aceleradas são bruscamente travadas por um alvo. É por este meio que se
produzem os raios X.
Por radioactividade artificial. Uma parte da dose a que uma pessoa está
exposta tem origem em isótopos radioactivos activados artificialmente.
Os testes com explosivos nucleares por exemplo, emitiram quantidades
consideráveis de césio-137 (137
Cs), estrôncio-90 (90
Sr), iodo-131 (131
I),
cério-144 (144
Ce), trítio (3H) e carbono-14 (
14C). Outra parte dos isótopos
radioactivos artificiais é lançada para a atmosfera durante acidentes em
centrais nucleares; são o caso do cobalto-60 (60
Co), zinco-65 (65
Zn), pra-
ta-110 (110
Ag), césio-137 (137
Cs), Plutónio-239 e 240 (239
Pu e240
Pu), ame-
rício-241 (241
Am), e o trítio (3H).
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§III - GRANDEZAS, LIMITES E PRINCÍPIOS RADIOLÓGICOS
As magnitudes radiológicas podem ser classificadas da maneira que se segue:
Grandezas radiométricas. Magnitudes associadas a um campo de radiação
(fluência e fluxo de energia e de partículas, energia radiante, etc.).
Coeficientes de interacção. Magnitudes associadas com a interacção da radia-
ção com a matéria (coeficientes de atenuação mássico, linear, secção eficaz, etc.).
Grandezas dosimétricas. Magnitudes relacionadas com a medida da energia
absorvida e da sua distribuição. Derivam das duas anteriores (Dose absorvida, KERMA,
LET, etc.)
Grandezas de medição da radioactividade. Magnitudes associadas com o
campo de radiação produzido por determinadas substâncias (Actividade, actividade
específica, etc.).
Grandezas usadas em radioprotecção. Magnitudes relacionadas com os efeitos
biológicos produzidos pelas radiações em determinados órgãos ou tecidos (Dose Efecti-
va, Dose Equivalente em órgão, etc.).
III.1. GRANDEZAS DE MEDIÇÃO DA RADIOACTIVIDADE
III.1.1. ACTIVIDADE
A actividade (A) de uma fonte radioactiva é a grandeza Física que determina a
rapidez com que uma fonte radioactiva se desintegra. Ela é igual ao número de núcleos
que se desintegram na unidade de tempo. Matematicamente, expressa-se da seguinte
forma:
(1) 𝐴 =𝑑𝑁
𝑑𝑡
Onde dN é o valor esperado de núcleos atómicos desintegrados espontaneamente
durante o intervalo de tempo dt.
No sistema SI, a unidade de actividade é o Becquerel [Bq], e corresponde a acti-
vidade de uma fonte radioactiva que em 1 segundo espera-se que desintegre 1 núcleo,
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16 | P á g i n a
ou 1 Bq = 1 desintegração por segundo (s-1
). A unidade antiga de actividade é o Curie
[Ci] e 1 Ci é a actividade de um grama de rádio.
1𝐶𝑖 = 3,7. 1010𝐵𝑞.
III.1.2. ACTIVIDADE ESPECÍFICA
A actividade específica é a actividade de uma fonte por unidade de massa.
(2) 𝐴𝑒𝑠𝑝 =𝑄
𝑚
A sua unidade SI é o Bq/Kg.
III.1.3. LEI FUNDAMENTAL DA DESINTEGRAÇÃO RADIOACTIVA
A probabilidade de que um certo número de núcleos excitados dN emita radia-
ção no intervalo de tempo dt não é afectada por processos Físicos e Químicos. Só
depende de 3 factores:
1. Do Número de núcleos radioactivos N não desintegrados existentes.
2. Do tempo dt.
3. Do elemento radioactivo (representado pela constante característica do isó-
topo radioactivo λ).
Assim se chega a seguinte equação diferencial de variáveis separáveis.
𝑑𝑁 = −𝜆𝑁𝑑𝑡 Onde o sinal (-) significa que o número de núcleos não desinte-
grados diminui com o tempo. A partir desta equação podemos escrever:
𝑑𝑁
𝑑𝑡= −𝜆𝑁 Ou seja a actividade A da fonte é igual a
(3) 𝐴 = 𝜆𝑁
Resolvendo a equação acima podemos escrever a solução como
(4) 𝑁 𝑡 = 𝑁0𝑒−𝜆𝑡
Ou o seu equivalente para a actividade
(5) 𝐴 𝑡 = 𝐴0𝑒−𝜆𝑡 .
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17 | P á g i n a
III.1.3.1. Período de semi-desintegração
O intervalo de tempo no qual, uma fonte radioactiva desintegra metade dos seus
núcleos excitados, restando apenas N0/2 núcleos excitados é conhecido por período de
semi-desintegração (T1/2). Da equação 𝑁 𝑡 = 𝑁0𝑒−𝜆𝑡 , chega-se a relação entre T1/2 e λ.
(6) 𝑇12
=𝑙𝑛2
𝜆≅
0,693
𝜆
O período de semi-desintegração dos elementos radioactivos pode variar de
alguns milionésimos de segundo, a milhares de milhões de anos. Para vários radiofár-
macos8, interessa principalmente o tipo de radiação que emitem, e que tenham T1/2 rela-
tivamente pequenos (de poucas horas a alguns dias).
Em termos práticos uma fonte pode ser considerada como não radioactiva passa-
do no mínimo 5 períodos de semi-desintegração, desta maneira pode-se usar o T1/2 como
forma de descontaminação de uma área caso o elemento radioactivo em causa tenha um
T1/2 pequeno como no caso dos radiofármacos.
III.1.3.2. Lei da proporcionalidade inversa do quadrado da distância
Seja 𝐴 = 𝐴(𝑡), a actividade total
de uma fonte radioactiva.
Seja 𝐹 o fluxo, i.e., o número de
partículas que atravessa a superfície 𝑑𝑆 no
ponto P por unidade de tempo (ver figura
a esquerda), nesta figura, a distância entre
o detector e a superfície dS é apenas ilus-
trativa, na verdade, considera-se o detec-
tor situado sobre o ponto P, o módulo do
vector 𝐹 , será a actividade 𝐴𝑑 da fonte no
ponto P, i.e., 𝐹 = 𝐴𝑑 .
8 Elementos radioactivos usados em medicina.
Ilustração 5 - Lei do inverso do quadrado da distân-
cia. O fluxo F de partículas que atravessa a superfície
dS diminui com o quadrado da distância.
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18 | P á g i n a
Então:
𝑑𝐴 = 𝐹 ∙ 𝑛 𝑑𝑆 ⇒
𝐴 = ( 𝐹 𝑛 cos(𝜃)𝑑𝑆𝑆
𝑛 É o vector unitário ( 𝑛 = 1) normal a superfície 𝑑𝑆; mas como o vector 𝐹 é
paralelo a 𝑛 (𝐹 ∕∕ 𝑛 ) quer dizer 𝜃 = 0, logo cos(𝜃) = 1.
Isto é:
𝐴 = 𝐴𝑑𝑑𝑆𝑆
Vamos além disto considerar que 𝐴𝑑 é o mesmo em todos os pontos da esfera S
(A radiação emitida não depende da direcção e é igualmente distribuída no espaço).
𝐴 = 𝐴𝑑𝑑𝑆𝑆
= 𝐴𝑑 𝑑𝑆𝑆
= 4𝜋𝑟2𝐴𝑑
(7) 𝐴𝑑 =𝐴
4𝜋
1
𝑟2= 𝐴0
1
𝑟2
A equação acima demonstra a relação da proporcionalidade inversa com o qua-
drado da distância r. Ela é válida caso o tamanho da fonte seja muito menor que a dis-
tância ao ponto de interesse P, deste modo a fonte pode ser considerada pontual.
III.2. GRANDEZAS DOSIMÉTRICAS
III.2.1. EXPOSIÇÃO
Exposição (X) é o valor absoluto da carga dos iões de um mesmo sinal produzi-
dos no ar quando todos os electrões libertados pelos fotões por unidade de massa de ar
são completamente detidos. Define-se para a radiação electromagnética ionizante, com
base na sua capacidade de produzir ionizações no ar. Esta grandeza é definida unica-
mente para a radiação electromagnética que interactua no ar.
A sua expressão matemática é:
(8) 𝑋 =𝑑𝑄
𝑑𝑚
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19 | P á g i n a
Aqui, dQ corresponde a carga eléctrica total dos iões formados pela radiação, e
dm é o elemento de massa de ar.
No sistema SI, a unidade de exposição é o Coulomb por quilograma [C/Kg], e
corresponde a actividade de uma fonte radioactiva, que cria 1 C de carga eléctrica, em 1
Kg de ar seco. Outra unidade muito usada é o Roentgen [R] (Ler “réntguen”). 1𝐶
𝐾𝑔=
3976 𝑅
É possível obter a exposição X que produz uma fonte pontual de actividade A
num ponto situado a uma distância r durante um tempo t mediante a expressão:
(9) 𝑋 =Γ∙𝐴∙𝑡
𝑟2
Γ é uma constante específica de exposição, que é característica de cada radionu-
clídeo. Ora, como os valores de Γ são bem conhecidos e tabelados, esta equação é muito
útil na determinação da exposição, e concomitantemente da dose absorvida (ver Deter-
minação da dose absorvida conhecida a exposição na pág. 20).
III.2.2. KERMA
KERMA (K) energia cinética libertada por unidade de massa, é uma grandeza
não estocástica, aplicável a radiações indirectamente ionizantes como os fotões e os
neutrões. Quantifica a energia média transferida da radiação indirectamente ionizante
para a radiação directamente ionizante, sem levar em conta o que acontece após a trans-
ferência (Seuntjens, et al., 2005).
(10) 𝐾 =𝑑𝐸𝑡
𝑑𝑚
Onde 𝐸𝑡 é a energia média transferida pela radiação indirectamente ionizante
para as partículas carregadas (electrões), e m é a massa do meio exposto a radiação.
A sua unidade SI é o Joule por quilograma [J/Kg], denominada Gray [Gy].
𝐺𝑦 =𝐽
𝐾𝑔
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20 | P á g i n a
III.2.3. CEMA
CEMA (C) energia convertida por unidade de massa. Ela é uma grandeza não
estocástica, aplicável a radiações directamente ionizantes como os protões e os elec-
trões.
(11) 𝐶 =𝑑𝐸𝑐
𝑑𝑚
Aqui dEc é a energia perdida pelas partículas carregadas (excepto electrões
secundários), numa unidade de massa. A unidade de CEMA é o Gray.
III.2.4. DOSE ABSORVIDA
A dose absorvida (D) é a energia média 𝑑𝐸 cedida pela radiação a um material
de massa dm e volume dV no ponto de interesse. Esta é uma grandeza não estocástica,
que se aplica tanto a radiações indirectamente ionizantes, como para aquelas directa-
mente ionizantes. A energia 𝑑𝐸 é a soma de toda energia que entra no volume de inte-
resse dV, menos toda a energia que sai deste mesmo volume, tendo em conta toda a
conversão massa-energia que venha a ocorrer (Seuntjens, et al., 2005).
A dose absorvida é a grandeza mais comummente medida, e a magnitude dosi-
métrica de maior interesse. A sua expressão matemática é:
(12) 𝐷 =𝑑𝐸
𝑑𝑚
A unidade SI de dose absorvida é o Gray (Gy). Outra unidade de dose absorvida
conhecida como unidade antiga é o rad e equivale a 0,01 Gy, i.e., 1Gy = 100 rad.
III.2.4.1. Determinação da dose absorvida conhecida a exposição
É possível calcular a dose absorvida num meio material conhecida a exposição,
pela equação:
(13) 𝐷 = 𝑓 ∙ 𝑋
Nesta equação D e X são a dose absorvida e a exposição correspondente respec-
tivamente.
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21 | P á g i n a
𝑓 é um factor que depende do tipo de radiação, e das unidades de dose e exposi-
ção escolhidas. Por exemplo, A energia absorvida em 1 gr. de ar exposto a 1 R de raios
X é 0,869 rad. Quando as unidades de dose e de exposição são o rad e o Roentgen res-
pectivamente os valores de 𝑓 são em geral, muito próximos a 1 para os raios X de diag-
nóstico, em todos os tecidos biológicos excepto no tecido ósseo. A Tabela 1 apresenta
alguns valores do factor f para fotões de energia dos 10 KeV a 2 MeV.
Tabela 1 - Factor f que relaciona a dose absorvida com a exposição para fotões com energia de 10 KeV a 2 MeV
Dose absorvida/exposição
Energia Água Osso Músculo
(KeV) Gy∙Kg/C rad/R Gy∙Kg/C rad/R Gy∙Kg/C rad/R
10 35,4 0,914 135 3,48 35,8 0,925
15 35,0 0,903 150 3,86 35,8 0,924
20 34,7 0,895 158 4,09 35,8 0,922
30 34,4 0,888 165 4,26 35,7 0,922
40 34,5 0,891 157 4,04 35,9 0,925
50 35,0 0,903 137 3,53 36,1 0,932
60 35,6 0,920 113 2,91 36,5 0,941
80 36,7 0,946 75,4 1,94 36,9 0,953
100 37,2 0,960 56,2 1,45 37,2 0,96
150 37,6 0,971 41,3 1,065 37,4 0,964
200 37,7 0,973 38,1 0,982 37,4 0,965
300 37,8 0,974 36,6 0,944 37,4 0,966
400 37,8 0,974 33,3 0,936 37,4 0,966
500 37,8 0,975 36,2 0,933 37,4 0,966
600 37,8 0,975 36,1 0,932 37,4 0,966
800 37,8 0,975 36,1 0,931 37,4 0,966
1000 37,8 0,975 36,1 0,931 37,4 0,966
1500 37,8 0,975 36,0 0,930 37,4 0,966
2000 37,8 0,974 36,1 0,931 37,4 0,965
III.2.5. LET
A dose absorvida por si só não é suficiente para estimar o risco radiológico asso-
ciado a uma radiação. Ela requer uma estimativa paralela do grau em que a energia
depositada esta concentrada em volumes comparáveis com as porções sensíveis da célu-
la (Schimmerling, 2009). Isto consegue-se através do LET.
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22 | P á g i n a
O LET (L) representa a energia dissipada dE por uma partícula carregada ao
atravessar um comprimento dl em todas as colisões com electrões. O LET tem grande
importância em Radiobiologia e em Radioprotecção, porque serve de base para o cálcu-
lo dos factores que ponderam a Qualidade da Radiação na avaliação do dano biológico.
(14) 𝐿 =𝑑𝐸
𝑑𝑙
A unidade SI de LET é o J/m, o KeV/µm é a unidade mais usada.
Valores típicos do LET de para radiações comummente usadas são apresentados na
Tabela 2.
Tabela 2 - Valores do LET das radiações mais comummente usadas. Fonte (Suntharalingam, et al., 2005)
Radiação Energia LET (KeV/µm)
Raio X 250 KVp 2
3 MeV 0.3
Raio gama (60Co)
0.3
Electrões 1 MeV 0.25
III.2.6. TAXA DE DOSE ABSORVIDA
A Taxa de dose (P): a taxa de dose representa a dose absorvida por um material
na unidade de tempo.
(15) 𝑃 =𝑑𝐷
𝑑𝑡
A unidade de P no SI é o Gy/s ou Sv/s. Também usa-se o rad/s.
III.3. GRANDEZAS DE RADIOPROTECÇÃO
III.3.1. DOSE EQUIVALENTE
A dose absorvida como definida acima não reflecte o grau de perigosidade asso-
ciado a cada tipo de radiação. Na verdade, observou-se que para iguais doses, alguns
tipos de radiação são mais perigosos do que outros. Por esta razão, definiu-se a dose
equivalente num meio (HR) como a dose absorvida por um material, multiplicado pelo
factor de qualidade wr desta radiação e o produto dos factores de modificação represen-
tado por N. N normalmente assume-se igual a unidade.
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23 | P á g i n a
(16) 𝐻𝑅 = 𝐷𝑅 ∙ 𝑤𝑟 ∙ 𝑁 = 𝐷𝑅 ∙ 𝑤𝑟
DR é a dose absorvida pelo meio exposto a radiação R. O factor wr, denominado
factor de ponderação da radiação R, representa o peso da radiação em causar um dano
biológico, wr é uma grandeza adimensional maior ou igual que a unidade.
A unidade SI de dose equivalente é o Sievert [Sv] (1Sv = J/Kg). A unidade antiga
de dose equivalente é o rem, e equivale a 0,01 Sv, i.e., 1Sv = 100 rem. Na Tabela
seguinte apresenta-se os factores de ponderação wr para as radiações.
Tabela 3 - Factor de ponderação das radiações. Fonte (IAEA, 1993)
Tipo de radiação Energia wr
Fotões Todas 1
Electrões9 e muões Todas 1
Neutrões
<10 KeV 5
10 - 100 KeV 10
100 KeV - 2 MeV 20
2 - 20 MeV 10
>20 MeV 5
Protões >2 MeV 5
Partículas alfa, núcleos pesados fragmentos de fissão
20
III.3.1.1. Dose equivalente em órgão
A probabilidade de uma radiação causar um dano em determinado tecido orgâni-
co, não é o mesmo para todos eles. Verifica-se que determinados tecidos sofrem danos
maiores que outros para igual dose de uma mesma radiação (mesma dose equivalente).
Por este motivo quando o meio irradiado for um tecido ou órgão, define-se a dose equi-
valente em órgão HT como o produto da dose equivalente a que um órgão está exposto,
pelo factor de ponderação wt, que representa a susceptibilidade deste mesmo órgão em
sofrer um dano radiológico.
(17) 𝐻𝑇 = 𝐻𝑅 ∙ 𝑤𝑡
9 Excepto para electrões Auger emitidos do núcleo ao ADN, onde são aplicadas considerações
micro-dosimétricas especiais.
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24 | P á g i n a
Tabela 4 - Factores de ponderação dos órgãos. Fonte (IAEA, 1993)
Tecido ou órgão wt
Gónadas 0,20
Medula óssea (vermelha) 0,12
Cólon 0,12
Pulmão 0,12
Estômago 0,12
Bexiga 0,05
Peito 0,05
Fígado 0,05
Esófago 0,05
Tiróide 0,05
Pele 0,01
Superfície óssea 0,01
Restante 0,05
Se o campo de radiação a que o órgão está exposto for composto de diferentes
tipos de radiação com diferentes factores de ponderação, então a dose equivalente neste
órgão é igual a soma das doses individuais de cada radiação, multiplicada pelo seu res-
pectivo factor de ponderação.
(18) 𝐻𝑇 = 𝑤𝑡 ∙ 𝐻𝑅 =𝑟 𝐷𝑇,𝑅 ∙ 𝑤𝑡 ∙ 𝑤𝑟 = 𝑤𝑡 ∙ 𝐷𝑇 ,𝑅 ∙ 𝑤𝑟𝑟𝑟
DT,R é a dose absorvida pelo órgão (ou tecido) T exposto a radiação R. A Tabela
4 apresenta os valores de wt, para os diferentes órgãos. Nesta tabela restante inclui todo
o órgão não explicitamente apresentado.
III.3.2. TAXA DE DOSE EQUIVALENTE
A taxa de dose equivalente (𝐻 ) Representa a dose equivalente absorvida por um
tecido na unidade de tempo.
(19) 𝐻 =𝑑𝐻
𝑑𝑡
A unidade SI de taxa de dose equivalente é o Sv/s, mas é muito comum o uso de
outras unidades como o Sv/h (sievert por hora) e o rem/h.
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25 | P á g i n a
III.3.3. DOSE EFECTIVA
A Dose Efectiva E é a soma das doses ponderadas em todos os tecidos e órgãos
T do corpo devido as irradiações internas e externas. Como os factores de ponderação
wt, e wr são adimensionais, então a unidade de dose efectiva é também o Sv.
(20) 𝐸 = 𝐻𝑇𝑇
As grandezas dose equivalente e dose efectiva, são denominadas de magnitudes
limitadoras, porque é sobre elas a que se estabelecem os padrões de protecção radiológi-
ca, limitando a dose a que determinado órgão ou indivíduo pode estar exposto, tanto
profissionalmente como não (membros do público). Embora os limites de dose estejam
sujeitos a aprovação dos governos de cada país, os limites de dose recomendados pelo
ICRP em 1990 costumam ser adoptados pela maioria dos países e organizações interna-
cionais. Os limites de dose recomendados pelo ICRP são apresentados na Tabela 5.
Tabela 5 - Limites de dose recomendadas pelo ICRP. Fonte (ICRP, 1990)
Limites de dose
Ocupacional Pública
Dose efectiva 100 mSv em 5 anos (20 mSv por ano10
em média) 1 mSv num ano11
Dose equivalente anual no
Cristalino 150 mSv 15 mSv
Pele 500 mSv 50 mSv
Braços e pernas 500 mSv -
III.4. GESTÃO DO RISCO RADIOLÓGICO
Os princípios que se seguem são considerados regras de ouro na gestão do risco
radiológico.
10 O valor de dose efectiva ocupacional, não deve ultrapassar 50 mSv num único ano.
11 Esta dose deve advir de fontes artificiais não incluindo portanto a dose a que um indivíduo está
exposto devido a radiação de fundo local.
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26 | P á g i n a
III.4.1. PRINCÍPIO DA JUSTIFICAÇÃO DA PRÁTICA.
Nenhuma prática envolvendo exposição a radiações deve ser tomada, a menos
que esta produza benefício suficiente ao indivíduo ou a sociedade para compensar os
prejuízos causados pela radiação (ICRP, 1990).
III.4.2. PRINCÍPIO DA OPTIMIZAÇÃO DA PROTECÇÃO
Na prática envolvendo fontes de radiação, a dose individual, o número de pes-
soas expostas a radiação, e a probabilidade de ocorrência de exposição a radiações,
devem ser mantidas tão baixo quanto razoavelmente possível (ALARA).
III.4.3. PRINCÍPIO DA LIMITAÇÃO DA DOSE
As doses a que um indivíduo está exposto resultantes das combinações de todas
as práticas relevantes devem ser sujeitas a limites. Este princípio tem como objectivo,
garantir que ninguém é exposto aos riscos da radiação julgados inaceitáveis para aquela
prática em situação normal (ICRP, 1990).
III.5. REGRAS DE PROTECÇÃO INDIVIDUAL
III.5.1. DISTÂNCIA
A protecção contra as radiações ionizantes, usando-se a distância como factor de
redução da exposição é o meio mais prático, de baixo custo e mais rápido numa situação
normal ou de emergência (Andreucci, 2007).
Como foi mostrado, a radiação diminui inversamente com o quadrado da distân-
cia (ver pág. 17), i.e., a intensidade da radiação diminui 4 vezes quando a distância
duplica. Por este facto, a distância representa um poderoso método para protecção radio-
lógica, a quando da ocorrência de acidentes, porque é de simples entendimento, e fácil
aplicação.
III.5.2. BARREIRAS DE PROTECÇÃO
O uso de barreiras é também um meio de protecção. Embora mais dispendioso,
porque envolve a obtenção de meios para construção, além de requerer autorização da
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RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
27 | P á g i n a
autoridade competente, é o meio mais eficaz, permitindo que se usem fontes maiores
com um máximo de protecção.
Na construção de blindagens, salvo casos em que se trabalha com fontes de mui-
to elevada energia (𝐸 > 10 𝑀𝑒𝑉), as blindagens costumam ser construídas para protec-
ção contra radiações gama, ou X. A razão para tal, consiste no facto de as partículas
carregadas e de massa em repouso diferentes de 0, serem fortemente absorvidas pelos
materiais, o que permite a sua total absorção com poucos mm de alumínio por exemplo.
Já as radiações electromagnéticas por não possuírem carga eléctrica nem massa em
repouso são mais difíceis de controlar, exigindo vários cm de chumbo para reduzi-la a
níveis aceitáveis.
A absorção de radiação electromagnética segue a lei de Bouguer-Lambert, i.e., a
intensidade de um feixe de raios gama, ao atravessar um material, diminui exponen-
cialmente com a espessura do material atravessado:
(21) 𝐼(𝐸) = 𝐼0𝑒−𝜇 𝐸 𝑥
Aqui, I é a intensidade da radiação que atravessa o meio de espessura 𝑥, I0 é a
intensidade do feixe antes de incidir sobre
a barreira.
O chumbo é o protector mais
comummente usado na protecção aos
raios-X por causa da sua alta densidade
(11340 Kg/m3), facilidade de instalação e
do baixo custo (Wikipedia).
A Tabela 6 mostra a espessura recomendada do chumbo que se deve usar como
protecção em função da energia do raio-X (os valores da energia não devem ultrapassar
os picos de tensão dados), saídas das recomendações do segundo Congresso internacio-
nal de Radiologia.
Um elemento muito importante a ter em conta nos cálculos de barreiras é o HVL
simbolizada por “X1/2”. Define-se HVL, como a espessura necessária para que um mate-
rial absorva metade da radiação que o atravessa, i.e., a intensidade da radiação que atra-
Ilustração 6 - Absorção. Esquema de um arranjo
experimental para a determinação da absorção da radia-
ção por um material.
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28 | P á g i n a
vessa a barreira é igual a 50% (𝐼 =𝐼0
2) da radiação que sobre ela incide. O conhecimento
desse valor torna prático o cálculo imediato da espessura do material necessário para
reduzir o nível da radiação num local a ser protegido a níveis recomendados.
(Andreucci, 2007)
A partir de (21) e aplicando a condição 𝐼 =𝐼0
2 chega-se a expressão para a HVL.
(22) 𝐻𝑉𝐿 =𝑙𝑛2
𝜇≅
0,693
𝜇
Tabela 6 - Espessura mínima de chumbo necessária para a protecção contra os raios X, Vs energia da radiação.
(Fonte Wikipédia)
Picos de voltagem de geração dos raios-X (KV) Largura mínima de chumbo (mm)
75 1.0
100 1.5
125 2.0
150 2.5
175 3.0
200 4.0
225 5.0
300 9.0
400 15.0
500 22.0
600 34.0
900 51.0
Seguindo o mesmo raciocínio, define-se o TVL simbolizado por X1/10, como
sendo a espessura tal que deve ter um material, para que a radiação que sobre ele incida
seja reduzida em 1/10. Alguns valores para a HVL e a TVL dos materiais mais usas na
construção de barreiras são apresentados na Tabela 7.
Pode-se estabelecer uma relação entre HVL e TVL:
(23) 𝑋110 =
𝑙𝑛10
𝑙𝑛2∙ 𝑋1
2 = 𝑙𝑜𝑔210 ∙ 𝑋1
2 ≅ 3,322 ∙ 𝑋1
2
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Tabela 7 - Valores de HVL e TVL, para alguns materiais mais usados na construção de barreiras. Fonte
(Andreucci, 2007)
Fonte radiação
Alumínio 2,3 g/cm3
(cm)
Chumbo 12 g/cm3
(cm)
Concreto 2,3 g/cm3
(cm)
Aço 7,8 g/cm3
(cm)
HVL TVL HVL TVL HVL TVL HVL TVL
Raios X
100 KVp 10,24 34 0,026 0,087 1,65 5,42 - -
200 KVp 2,2 7,32 0,043 0,142 2,59 8,55 - -
250 KVp - - 0,088 0,29 0,28 0,94 - -
300 KVp - - 0,147 0,48 0,31 1,04 - -
400 KVp - - 0,25 0,83 0,33 1,09 - -
Irídio 192 3,66 12,16 0,55 1,9 4,3 14 1,3 4,3
Cobalto 60 5,36 17,8 1,1 4 6,3 20,3 2 6,7
Césio 137 4,17 13,85 0,65 2,2 4,9 16,3 1,6 5,4
III.5.3. TEMPO DE EXPOSIÇÃO
A dose total acumulada é directamente proporcional ao tempo em que uma pes-
soa está exposta, então, uma forma de reduzir a dose total absorvida por um indivíduo,
consiste em manter a carga de trabalho num valor estritamente necessário. Segundo
Andreucci (2007), Se as condições de trabalho não permitem reduzir a taxa de exposi-
ção ambiental, a carga de trabalho consiste na ferramenta indispensável para compensar
a dose recebida por trabalhadores.
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30 | P á g i n a
§IV - RADIOBIOLOGIA E EFEITOS BIOLÓGICOS DAS RADIAÇÕES
Efeitos biológicos da radiação são os efeitos que ocorrem quando a radiação
ionizante actua sobre tecidos vivos, causando danos ao material celular. As funções
celulares podem ser temporal ou permanentemente prejudicadas pela radiação ou a célu-
la pode ser destruída. A severidade da lesão depende do tipo de radiação a que a pessoa
está exposta, da dose absorvida total, da taxa de dose absorvida e da radiossensibilidade
do tecido envolvido (Encarta encyclopedia, 2008). Outro factor importante de que
depende a severidade da lesão é a presença de substâncias químicas como o oxigénio,
ou compostos considerados radiossensibilizadores.
Os efeitos biológicos da radiação provêm quase exclusivamente da modificação
da estrutura do ADN celular (Material de apoio ao estudante de Física Nuclear, 2009).
Estes dão-se segundo uma sequência de etapas. Na primeira etapa há a ionização do
material celular levando a ocorrência de reacções químicas. Seguem-se as alterações
químicas nas moléculas importantes como o ADN, concomitantemente, ocorre a morte
ou mutação da célula, e os efeitos ao organismo.
IV.1. MECANISMOS DE INTERACÇÃO DA RADIAÇÃO COM O ADN
A interacção da radiação com o ADN dá-se de forma directa ou indirecta.
No mecanismo directo, a radiação actua directamente sobre a molécula de
ADN, causando a sua ionização e alteração da sua estrutura química, ou a ruptura de
uma ou mesmo das duas cadeias de nucleotídeos.
No mecanismo indirecto, a radiação ioniza o meio, por exemplo o citoplasma,
criando espécies químicas reactivas (formação de radicais livres principalmente OH+,
H3O+, H
+ etc) que por sua vez interagem com a molécula alvo tal como o ADN. A
grande maioria das interacções radiação-ADN dá-se por mecanismo indirecto. Segundo
Alves (2009), cerca de 2/3 destas interacções são devido a este mecanismo. Como o
corpo humano é 60 – 90% água, grande parte das interacções são através de mecanis-
mos indirectos sobre as moléculas de água.
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31 | P á g i n a
A interacção da radiação com a água, provoca a formação de pares de radicais
H2O+ e H2O
-. Como estes são iões instáveis, dissociam-se e formam cada um mais um
ião e um radical livre (marcado com um ponto).
𝐻2𝑂+ → 𝐻+ + 𝑂𝐻°
𝐻2𝑂− → 𝐻° + 𝑂𝐻−
Os radicais livres são espécies químicas altamente reactivas que podem combi-
nar com outros radicais livres para formar água ou combinarem-se entre si para forma-
rem peróxido de hidrogénio, H2O2 (água oxigenada), este composto é altamente tóxicos
para a célula. A molécula de peróxido de hidrogénio é quimicamente muito reactiva
provocando danos em moléculas de maior importância biológica. A presença de oxigé-
nio no meio celular potencia a actividade dos radicais livres e consequentemente o seu
efeito danoso.
IV.2. TIPOS DE DANOS NO ADN
Os danos causados pela radiação a molécula de ADN podem ser:
Rotura de uma das cadeias;
Destruição ou modificação de uma base;
Rotura das duas cadeias em pontos próximos;
Ligação cruzada entre cadeias;
Múltiplos danos numa zona localizada;
Os primeiros tendem a ser mais prováveis que os últimos, mas também menos
graves. Devido a presença de mecanismos de reparação do ADN, os danos simples não
costumam provocar efeitos biológicos (Material de apoio ao estudante de Física
Nuclear, 2009).
IV.3. POSSÍVEIS EFEITOS SOBRE A CÉLULA DEVIDO A SUA INTERACÇÃO
COM A RADIAÇÃO
Devido a interacção com a radiação, sobre a célula pode ocorrer um dos seguin-
tes efeitos:
1. Não há efeito. Neste caso os mecanismos de reparação celular são capazes
de reparar os danos causados a célula.
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32 | P á g i n a
2. Mutação. A célula sobrevive com o seu ADN modificado. Caso estas muta-
ções ocorram nos genes responsáveis pela proliferação celular, deste efeito
pode resultar em carcinogénese, ou formação de cancro.
3. Falha reprodutiva. A célula morre ao tentar dividir-se.
4. Morte celular. Da interacção com a radiação podem ser formados radicais
tóxicos a célula ou a destruição de mecanismos essenciais da célula, resul-
tando na morte celular (apoptosis ou necrose).
IV.4. RADIOSSENSIBILIDADE
Algumas células e tecidos são mais sensíveis a radiação do que outros, i.e., são
mais fáceis de ser afectados pela radiação do que outras, e costumam manifestar estes
efeitos mais cedo também. Estas células e tecidos são designados como radiossensíveis.
Pelo contrário, outros tecidos costumam ser mais resistentes a radiação e denominam-se
radioresistentes.
IV.4.1. FACTORES QUE INFLUENCIAM A RADIOSSENSIBILIDADE CELULAR
Existem vários factores que influenciam a radiossenssibilidade de uma célula.
IV.4.1.1. Factores Físicos:
Taxa de dose. Embora os efeitos biológicos da radiação costumam a ser expres-
sos em relação a dose absorvida, a taxa de
dose absorvida tem muito mais importân-
cia ao nível da radiobiologia, pois os efei-
tos biológicos da radiação dependem não
necessariamente da dose mas da rapidez
com que esta dose é cedida a célula. É por
esta razão que os limites de dose costu-
mam a ser desenvolvidos em função da
taxa de dose e não da dose. Na Ilustração 7
mostra-se um gráfico que representa a taxa
de sobrevivência das células em função da dose para duas taxas de dose distintas. A
medida que a taxa de dose aumenta, a pendente da curva faz-se mais pronunciada,
Ilustração 7 - Número de células que sobrevivem em
função da dose para diferentes Taxas de dose.
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
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expressando uma maior eficácia das altas taxas de doses, este fenómeno deve-se porque
as ionizações se produzem “concentradas” no tempo.
LET. Tal como já foi supracitado (ver LET na pág. 21), o LET é o principal fac-
tor na determinação da capacidade de uma
radiação produzir um dano numa célula.
Em geral as radiações de maior LET cos-
tumam ser mais danosas, (Material de
apoio ao estudante de Física Nuclear,
2009). Na Ilustração 8, está representada
graficamente a taxa de sobrevivência celu-
lar para amostras irradiadas com radiações
de baixo, e alto LET, a ordenada deste grá-
fico representa a taxa de sobrevivência
celular. A pendente da curva faz-se mais
pronunciada para as radiações de alto LET do para as de baixo LET, expressando uma
maior eficácia das radiações de alto LET na destruição das células.
Fraccionamento. Nos anos 20 do séc. XX verificou-se experimentalmente que
o efeito biológico de uma irradiação com uma dose DT é distinto ao de uma série de N
irradiações repetidas, cada uma com uma dose d = DT/N.
Esta diferença deve-se ao desencadeamento de mecanismos de reparação celular
após a irradiação.
IV.4.1.2. Factores Químicos:
Presença de oxigénio. A presença ou não de oxigénio molecular, no interior da
célula influencia o efeito biológico das radiações sobre esta. Quanto maior for a quanti-
dade de oxigénio molecular na célula, maior será o efeito biológico da radiação sobre
esta. Para determinar o grau de influência do oxigénio, estabelece-se o parâmetro OER.
O OER define-se como a razão entre a dose D necessária para produzir um efeito
X sobre uma célula sem Oxigénio e a dose Do necessária para produzir este mesmo efei-
to na presença de oxigénio.
Ilustração 8 – Dependência da taxa de sobrevivência
celular, com a dose para radiações de diferentes LET.
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
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(24) 𝑂𝐸𝑅 =𝐷
𝐷𝑜
Este efeito é tanto maior para radiações de menor LET, e toma um valor proximo
de 1 (𝑂𝐸𝑅 ≈ 1) para radiação com LET superior a 135 KeV/µm (Suntharalingam, et al.,
2005).
Radioprotectores e radiossensibilizadores. Variados compostos químicos
podem alterar a forma como uma célula responde a radiação. Aquelas substâncias que
aumentam a sensibilidade da célula denominam-se radiossensibilizadores e as que
aumentam a resistência da célula são denominados radioprotectores. Elas geralmente
influenciam os efeitos indirectos da radiação por eliminação dos radicais livres.
IV.4.1.3. Factores inerentes a célula:
Fase do ciclo celular. As células são mais sensíveis a radiação durante a fase da
Mitose e a fase de pós-síntese da ADN, durante a Mitose a metafase é a mais sensível.
Contudo, são menos sensíveis durante o período preparatório para a síntese do ADN e
durante a síntese do ADN.
Grau de diferenciação. Quanto menos diferenciadas forem as células, mais
sensíveis são a radiação, i.e., células pouco especializadas numa tarefa específica são
mais sensíveis a radiação. É por esta razão que as células tronco da medula óssea são
fortemente afectadas durante a exposição a radiação. Pelo contrário células altamente
especializadas como as células musculares e nervosas são menos afectadas pela radia-
ção.
Taxa Mitótica. São mais sensíveis as células de alta taxa mitótica (células com
grande capacidade de divisão celular), as células nervosas além de altamente especiali-
zadas, tem uma taxa mitótica extremamente reduzida ou nula, daí a serem umas das
células com maior radioresistência.
IV.5. EFEITOS ESTOCÁSTICOS (PROBABILÍSTICOS)
Teoricamente qualquer radiação, independentemente da sua dose pode produzir
um efeito biológico. Isto porque mesmo no menor valor possível de dose (aquela que é
produzida pela exposição a um único “quantum” ou “partícula” de radiação ionizante),
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
35 | P á g i n a
esta possui energia suficiente para ionizar o material celular, e causar um efeito biológi-
co. Por esta razão, mesmo quando a dose de radiação é suficientemente pequena para
não produzir um efeito visível, permanece uma probabilidade de que esta radiação cause
um efeito danoso sobre as células ou tecidos.
Os efeitos estocásticos podem aparecer para qualquer nível de dose (não há
limiar) mas a probabilidade de que se produzam efeitos aumenta com a dose. A sua
aparição pode ocorrer anos depois da irradiação. O cancro induzido pela radiação e os
efeitos genéticos são estocásticos (Material de apoio ao estudante de Física Nuclear,
2009).
IV.6. EFEITOS DETERMINÍSTICOS
Quando a dose absorvida por um tecido ultrapassa um certo valor (limiar), os
efeitos da radiação podem ser observados, i.e., pode ser estabelecido uma relação causa
e efeito entre a radiação incidente e o dano observado. Estes efeitos podem ser imedia-
tos ou observados em períodos de tempo relativamente curtos. Por exemplo, uma dose
de 100 Sv distribuída sobre o corpo todo matará rapidamente uma pessoa, por dano no
sistema nervoso central. Uma dose de 3 Sv sobre todo o corpo leva a morte em 50% dos
casos. Entre os 3 e 1 Sv é bastante provável que venha a ocorrer um ferimento, devido a
radiação (Cobb, 1989). As exposições a pequenas partes do corpo são por sinal os aci-
dentes mais comuns e levam a danos localizados. Os danos causados aos vasos sanguí-
neos da zona afectada, causa mau funcionamento do órgão, e em caso de doses mais
elevadas levam a necrose e a gangrena (Encarta encyclopedia, 2008).
Os efeitos determinísticos são provocados pela morte celular ou pelo falho
reprodutivo, quando afectam uma importante proporção das células de um tecido. Os
efeitos determinísticos não aparecem até que a irradiação supere um determinado valor
limiar de dose. Se esse valor limiar é superado, a severidade do dano aumenta com a
dose.
João Manuel Oliveira
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§V - CONCLUSÃO
As radiações são na verdade, um dos temas mais controversos dos tempos
modernos. Embora criem alguma ansiedade na sua abordagem, pelo facto de estarem
associados a mitos e a acidentes nucleares, elas constituem um marco importante alcan-
çado pelo saber humano. A comprovar isto, está a sua enorme aplicação na medicina, na
indústria, na pesquisa científica, etc. Contudo, independentemente da sua importância e
da sua natureza, os riscos provenientes da sua utilização são reais e devem ser tratados
com a cautela que lhe é devida, porque os seus efeitos sobre os tecidos podem causar
lesões graves ou mesmo a morte.
Neste trabalho, estão espelhados os principais conceitos relacionados com a
radiação, sua natureza, efeitos sobre os tecidos vivos, e os principais padrões e regras de
protecção individual. Finalmente, para uma pessoa em geral, o assunto sobre as radia-
ções pode parecer um tema distante e assustador, mas o mais provável é que acabará
precisando das radiações em alguma altura da sua vida.
V.1. RECOMENDAÇÕES
Recomenda-se neste trabalho a criação e aprovação de legislação especial que
regulamente o uso e aplicação de fontes de radiação no país, embora reconhece-se aqui,
que a aprovação da lei nº 4/07 de 5 de Setembro, que institucionaliza a criação da Auto-
ridade Reguladora de Energia Atómica (AREA) e o Conselho Nacional de Radioprotec-
ção e Segurança Nuclear (CNRSN), constituem marcos importantes na criação de
condições para a regulamentação destas no país.
João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
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[ed.] E. B Podgorsak. Radiation Oncology Physics: A Handbook for Teachers
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12 Segundo a norma ISO 690 – primeiro elemento e data.
João Manuel Oliveira
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João Manuel Oliveira
RADIAÇÕES - SUA NATUREZA, EFEITOS E PROTECÇÃO
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ÍNDICE REMISSIVO
A
absorção · 8, 27
Actividade · 15
Específica · 16
ALARA · 9, 26
B
Becquerel · 8, 15
Antoine Henri · 8
blindagem · 8
bremsstrahlung · 14
C
CEMA · 9, 20
D
Dose absorvida · 15, 20, 21
dosimetria · 8
E
Efeitos
Determinísticos · 35
Estocásticos · 34
Ernest Rutherford · 11
espectro electromagnético · 11
Exposição · 18
Tempo de · 29
F
Factor
de ponderação do tecido · 23
de qualidade da radiação · 22
f · 21
Factores
Físicos · 32
inerentes a célula · 34
Químicos · 33
fotões · 11, 18, 19, 21
H
HVL · 9, 27, 28, 29
I
IAEA · 9, 37
ICRP · 9, 25, 37
Ionizante
Fonte de radiação · 13
Tipos de radiação · 13
isótopo radioactivo · 13, 16
K
KERMA · 9, 15, 19
L
LET · 15, 21, 22, 33, 34
M
Mecanismo de interação
Directo · 30
Indirecto · 30
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O
OER · 9, 33
P
Partículas
alfa · 11
beta · 12
Princípio
da justificação da prática · 26
da limitação da dose · 26
de optimização da protecção · 26
protecção radiológica · 8, 12, 25, 26, 37
R
rad · 9, 20, 21, 22
Radiação · 10
Alfa · 12
Beta · 12
cósmica · 13
de origem artificial · 14
de origem Natural · 13
de partículas materiais · 11
de travagem · 14
electromagnética · 10
Gama · 12
Interna · 13
Ionizante · 12
mecânica · 10
mecanismos de interação com o ADN · 30
possíveis efeitos sobre a célula · 31
Terrestre · 13
radioactividade · 8, 14, 15
Artificial · 14
radioprotecção · 8, 12, 15, 22
Radioprotectores · 34
radiossensibilidade · 30, 32
Radiossensibilizadores · 34
rem · 9, 23, 24
Roentgen · 8, 9, 19, 21
Wilhelm Konrad · 8
S
semi-desintegração · 17
T
Taxa Mitótica · 34
TVL · 9, 28, 29
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