27º Salão de Iniciação Científica
Toxoplasmose Cerebral e a Aplicabilidade da Tomografia Computadorizada na Evolução da
Patologia: Relato de Caso
Werle, NW1, Alves, GRT1; Magno PRS1; Cordenonsi, I1; Corrêa JRM1, Haygert, CJP1.
Apresentador: Norberto Weber Werle
Orientador: Carlos Jesus Pereira Haygert
Co-autores: Pedro Rafael del Santo Magno, Isadora Cordenonsi, Giordano Rafael Tronco Alves e
José Roberto Missel Corrêa.
1 Hospital Universitário de Santa Maria, Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria–RS
1. Introdução:
O sistema nervoso central constitui-se no segundo órgão mais acometido por infecções
secundárias à Sindrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV/SIDA), situando-se atrás apenas do
pulmão¹. A toxoplasmose é a principal causa de infecção do sistema central nervoso central (SNC)
em pacientes portadores de HIV, representando 29,9% do total de infecções em tal sítio anatômico².
Tipicamente, a doença do SNC ocorre durante a infecção avançada por HIV quando a contagem de
CD4 + resulta em menos de 200 células / ml. O maior risco é em pacientes com contagem de CD4 +
abaixo de 50 células / ml, nos quais os sintomas neurológicos tendem a dominar a apresentação
clínica5.
Em pacientes com AIDS, a toxoplasmose é mais frequente devido à reativação da infecção
latente. Um terço dos pacientes portadores do HIV, com anticorpos séricos anti-toxoplasma IgG,
desenvolverão encefalite toxoplásmica. A ausência de anticorpos séricos anti-toxoplasma IgG e
IgM não exclui o diagnóstico, já que 22% dos indivíduos com diagnóstico firmado através da
biópsia não possuem anticorpos IgG e o anticorpo IgM é raramente presente7.
A tomografia de crânio (TC) ou ressonância magnética (RM) com e sem contraste são
indicadas para todo o paciente com estado mental alterado, cefaléia, convulsões ou sinais
neurológicos focais8. RM claramente é a técnica superior, mas não é universalmente disponível.
Lesões hipodensas únicas ou múltiplas ou lesões hipointensas em substância branca e núcleos da
base com efeitos de massa podem ser observadas na tomografia computadorizada ou ressonância
magnética. As lesões podem aumentar em um padrão homogêneo ou anel com contraste8.
Por conseguinte, é nítida a importância de uma abordagem acerca do diagnóstico por
imagem da Toxoplasmose Cerebral, assim como do acompanhamento e resposta terapêutica da
patologia, justificada por sua agressividade e destacada prevalência em pacientes portadores de
HIV.
2. Objetivo
Visa-se através deste estudo, apresentar um caso de Toxoplasmose Cerebral, ressaltando-se a
evolução da patologia frente aos exames de Tomografia Computadorizada diagnóstico e pós
teste terapêutico. O estudo desenvolveu-se em conformidade com as normas éticas vigentes;
3. Metodologia
Paciente de 40 anos, masculino, em acompanhamento no ambulatório de Doenças Infecciosas
desta instituição por diagnóstico de HIV em agosto de 2007, internou no Pronto Atendimento do
Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM) com história de confusão mental, desorientação
têmporo-espacial e alucinações auditivas e visuais há 1 dia. Associadamente, paciente tem história
de astenia, perda ponderal de 22 Kg nos últimos 2 meses e picos febris diários há 2 semanas.
Paciente negou dispneia, icterícia, alterações no hábito intestinal e urinário, tabagismo e etilismo.
Na história patológica pregressa, paciente realizara colecistectomia há 4 anos. Ao exame físico,
apresentou-se em bom estado geral, lúcido e com desorientação têmporo-espacial. As mucosas
estavam descoradas (2+/4), anictéricas e acianóticas e, à oroscopia, observou-se lesões orais
esbranquiçadas condizentes com Candidíase Oral. Exame físico cardiovascular e respiratório não
mostraram alterações. Ao exame abdominal, evidenciou-se dor à palpação epigástrica,
correlacionada com quadro de Pancreatite Aguda previamente diagnosticada segundo informações
de familiar. Paciente referiu interrupção na terapia antirretroviral, apresentando Contagem de
Linfócitos T CD4+ = 37, na última aferição há 2 meses. Ao exame laboratorial, obteve-se 4410
leucócitos/mm³, com predomínio de segmentados (52,6%), sem desvio à esquerda. Dosagem de
Lipase ultrapassou 1400 U/L.
Realizou-se TC de Crânio (Figura 1A) sem contraste no dia de internação, a qual evidenciou
edema capsulo-ganglionar esquerdo com efeito de massa pronunciado. Após a injeção de contraste,
a TC ( Figura 1B) demonstrou lesão com realce anelar na mesma topografia.
Assim, orientou-se isolamento respiratório, NPVO e foi iniciado tratamento com Fluconazol EV
200 mg 12/12 h e Clindamicina EV 600 mg 12/12 h. Orientou-se controle glicêmico via teste de
glicose capilar, com Insulina Regular e se glicemia < 60 mg/dL, foi prescrita glicose 50%, 2
Ampolas EV.
Paciente apresentou boa evolução do quadro abdominal, com diminuição da dor epigástrica,
tendo sido realizado ultrassonografia (abdômen total) de controle 15 dias após a internação, a qual
se mostrou dentro da normalidade. Iniciou-se Sulfadiazina 500 mg 2 cp 6/6h, Ácido Folínico 15mg
1 cp/dia e Pirimetamina 25 mg 1cp 8/8 h no 14º dia de internação. Paciente apresentou diminuição
da intensidade e frequência dos picos febris ao longo do tratamento, sendo suspensa a Clindamicina
no 21º dia de uso. Realizou-se, então, TC de Crânio para controle pós teste terapêutico (Figura 2A),
a qual evidenciou redução importante do edema da região capsulo-ganglionar esquerda, e não mais
foi evidenciado realce patológico pós injeção de contraste (Figura 2B). No 25º dia de internação,
após mais de 48 horas afebril, paciente recebeu alta hospitalar, orientando-se manutenção do
tratamento vigente por mais 3 semanas, acrescentando-se Azitromicina 3cp 1 vez por semana e
Bactrin 2cp 1 vez ao dia profiláticos.
A B
Figura 1: (A) Evidencia-se edema cápsulo-ganglionar esquerdo com contornos irregulares,
comprimindo ventrículo lateral esquerdo (Hipodensidade à TC sem contraste.) (B) Na TC com
contraste, evidenciou-se lesão com realce anelar, e diâmetro de 2,1 cm (Seta azul). Visualiza-se
edema perilesional pronunciado.
4. Resultados e Discussão
Apesar de não ter sido efetivado o estudo histopatológico da lesão no sistema nervoso central,
ao teste terapêutico, visando-se à toxoplasmose cerebral, o paciente em questão apresentou
relevante melhora clínica, associada à diminuição importante do edema capsulo-ganglionar e
desaparecimento da lesão com realce anelar até o 21º dia de uso de Clindamicina.
Centrando-se nas manifestações clínicas, a toxoplasmose cerebral inicia com sintomas
constitucionais e cefaléia. Mais tarde, confusão, sonolência, convulsões, fraqueza focal e
perturbação da linguagem podem se desenvolver. Sem tratamento, os pacientes evoluir para o coma
em dias ou semanas. Ao exame físico, alterações do estado mental e de personalidade podem ser
observados9. Deduz-se, coerentemente, que a clínica do paciente deste relato apresentou-se
sugestiva de acometimento central por infecção oportunista (CD4+ = 37), sendo bem fundamentada
a conduta da equipe.
Dentro deste contexto, as modalidades de imagem revelam-se atualmente exames
complementares muito úteis para a suspeita diagnóstica e decisão terapêutica. Conforme
evidenciado neste caso, a suspeita diagnóstica embasada no quadro clínico do paciente, associada
aos estudos epidemiológicos que alertam para a significante prevalência de neurotoxoplasmose em
pacientes portadores de HIV, foi necessária a complementação oriunda dos métodos de imagem.
Tomografia computadorizada, disponível na instituição, corroborou com a hipótese diagnóstica,
obtendo-se sucesso no teste terapêutico efetivado.
Figura 2: (A) Pós teste-terapêutico, evidencia-se grande diminuição do edema capsulo-ganglionar,
associado à significante melhora clínica do paciente em questão. A cápsula interna esquerda pode
ser adequadamente visualizada (Seta Azul). (B) Ao contraste, não houve impregnação anelar,
ratificando a resolução da infecção em sistema nervoso central.
A B
5. Conclusão
Com a antibioticoterapia, 74% dos pacientes melhoram no 7º dia de tratamento e 91%
melhoram no 14º dia. A terapia padrão consiste de pirimetamina, sulfadiazina, e ácido folínico em
combinação. Clindamicina pode ser usado em pacientes alérgicos à sulfa3,4,5,6
. A melhora clínica
significante do paciente com o tratamento estabelecido, mostrando-se afebril, viabilizou a alta
hospitalar e a resolução da patologia. Posteriormente, paciente fora orientado, objetivando-se
acompanhamento regular no Ambulatório de Doenças Infecciosas da instituição.
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