RENDIMENTO E PROCESSAMENTO DE PIAU-VERMELHO Leporinus
copelandii STEINDACHNER, 1875, COLETADO EM AMBIENTE
NATURAL
ANA PAULA RIBEIRO COSTA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO
CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ JANEIRO - 2005
RENDIMENTO E PROCESSAMENTO DE PIAU-VERMELHO Leporinus
copelandii STEINDACHNER, 1875, COLETADO EM AMBIENTE
NATURAL.
ANA PAULA RIBEIRO COSTA
Tese apresentada ao Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, como parte das exigências para obtenção do título de Doutor em Produção Animal.
Orientador: Prof. Dalcio Ricardo de Andrade
CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ JANEIRO - 2005
RENDIMENTO E PROCESSAMENTO DE PIAU-VERMELHO Leporinus
copelandii STEINDACHNER, 1875, COLETADO EM AMBIENTE
NATURAL.
ANA PAULA RIBEIRO COSTA
Tese apresentada ao Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, como parte das exigências para obtenção do título de Doutor em Produção Animal.
Aprovada em 14 de janeiro de 2005 Comissão Examinadora: ___________________________________________________________________
Prof. José Brandão Fonseca (Ph.D., Zootecnia) - UENF __________________________________________________________________
Prof. Manuel Vazquez Vidal Júnior (Doutor, Zootecnia) - UENF ___________________________________________________________________
Prof. Eduardo Shimoda (Doutor, Produção Animal) - FACASTELO ___________________________________________________________________
Prof. Dalcio Ricardo de Andrade (Doutor, Ciências Morfológicas) - UENF Orientador
Dedico
À minha família, por todo o apoio ao longo destes maravilhosos anos de
existência, enfim... por todo o amor.
A Deus,
pela honra de viver...
“Onde há uma vontade há um caminho... .
Onde há boa vontade, há muitos caminhos“.
ii
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Darcy Ribeiro, por transformar o seu sonho na nossa realidade;
À FAPERJ, pela bolsa de estudo concedida;
Ao professor Dalcio Ricardo de Andrade, pela confiança, orientação, incentivo,
entusiasmo e amizade dispensados durante a realização deste trabalho;
À ADICON - Indústria e Comércio de Aditivos Ltda. pela doação da fumaça
líquida, SMOKEZ 1517 IC, para a realização das pesquisas;
Aos professores do Curso de Pós-Graduação em Produção Animal
(CCTA/UENF), pela contribuição à minha formação profissional;
Aos técnicos do Laboratório de Zootecnia e Nutrição Animal (CCTA/UENF);
Aos professores José Brandão Fonseca (UENF), Manuel Vazquez Vidal Júnior
(UENF) e Eduardo Shimoda (FACASTELO), pela colaboração e orientação;
Ao Professor e amigo Cláudio Luiz Melo de Souza e sua família, Verônica,
Álvaro e Laís, pelo convívio, amizade e longas horas de estatística;
Ao amigo Guilherme Souza e à família do Projeto Piabanha - Itaocara (RJ);
Ao Milton, Matheus e Mariana, pela paciência, compreensão e amor, tornando
esta jornada possível;
Aos meus pais, Walma e Alberto, meus irmãos, Cris e Edu, pelo apoio e
confiança nas minhas atitudes;
A todos os colegas da UENF com quem tive a oportunidade de conviver, pelas
horas de alegria compartilhadas;
iii
Àqueles que, embora não tendo sido nominalmente citados, estiveram
presentes, às vezes de forma casual e/ou esporádica e, principalmente, afetiva...
iv
BIOGRAFIA
ANA PAULA RIBEIRO COSTA, filha de Alberto da Costa e Walma da Cruz
Ribeiro Costa, nasceu em 7 de setembro de 1968, na cidade de Niterói – RJ.
Em 1986 ingressou no curso de Zootecnia da Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro. Como zootecnista foi estagiária no CEPTA/IBAMA – Centro de
Pesquisa e Treinamento em Aqüicultura – Pirassununga (SP). Em 1993 concluiu o
“Curso de Especialização em Nutrição Animal”, área de monogástricos, na
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP – Campus Botucatu. Foi
bolsista do Programa RHAE do CNPq na Hidrelétrica de Itaipu Binacional – Foz do
Iguaçu (PR). Prestou consultoria para o Ministério do Meio Ambiente dos Recursos
Hídricos e da Amazônia Legal e Prefeitura Municipal de Cardoso Moreira (RJ). Em
março de 1997, ingressou no Curso de Pós-Graduação em Produção Animal e
concluiu o Mestrado em 1999, na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy
Ribeiro - UENF (RJ).
Em agosto de 1999, ingressou no Curso de Pós-Graduação em
Produção Animal, Doutorado, área de concentração: “Nutrição e Produção
Animal”, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF),
em Campos dos Goytacazes (RJ), submetendo-se à defesa de tese para
conclusão do curso em janeiro de 2005.
v
CONTEÚDO
RESUMO.......................................................................................................... viii
ABSTRACT....................................................................................................... x
1. INTRODUÇÃO........................................................................................ 1
2. REVISÃO DE LITERATURA................................................................... 3
2.1. Biologia e distribuição geográfica do Leporinus copelandii.............. 3
2.2. Rio Paraíba do Sul e a produção pesqueira no Estado.................... 4
2.3. Rendimento de carcaça em peixes de água doce............................ 8
2.4. Caracterização química e nutricional do pescado............................ 11
2.5. Defumação de peixes....................................................................... 15
2.5.1. Composição e propriedades da fumaça..................................... 16
2.5.2. Etapas do processo de defumação............................................ 19
2.5.3. Tipos de defumação................................................................... 22
2.5.3.1. Defumação a quente........................................................... 22
2.5.3.2. Defumação a frio................................................................. 23
2.5.3.3. Defumação eletrostática...................................................... 24
2.5.3.4. Uso de aroma natural de fumaça........................................ 25
2.6. Microbiologia geral de pescados...................................................... 27
3. MATERIAL E MÉTODOS........................................................................ 33
3.1. Rendimento de filé e resíduos (cabeça e vísceras).......................... 33
3.2. Defumação....................................................................................... 34
3.2.1. Análise microbiológica............................................................ 36
3.2.2. Análise química...................................................................... 37
3.2.3. Análise sensorial..................................................................... 37
vi
3.3. Comparação entre espécies: piau-vermelho e tilápia....................... 38
3.3.1. Análise química...................................................................... 38
3.3.2. Análise sensorial..................................................................... 39
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................. 41
4.1. Rendimento de filé e resíduos (cabeça e vísceras).......................... 41
4.2. Métodos de defumação.................................................................... 48
4.3. Comparação entre espécies: piau-vermelho e tilápia....................... 54
5. CONCLUSÕES....................................................................................... 63
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................ 64
7. APÊNDICE.............................................................................................. 74
7.1 Apêndice 1A..................................................................................... 75
7.2 Apêndice 2A..................................................................................... 76
7.3 Apêndice 3A..................................................................................... 77
vii
RESUMO
COSTA, ANA PAULA RIBEIRO; D.S., Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro; Janeiro de 2005; Rendimento e processamento de piau-vermelho Leporinus copelandii STEINDACHNER, 1875, coletado em ambiente natural; Professor Orientador: Dalcio Ricardo de Andrade; Professores Conselheiros: José Brandão Fonseca, Manuel Vazquez Vidal Júnior e Eduardo Shimoda.
Avaliou-se o potencial do piau-vermelho Leporinus copelandii para o processamento e
sua aceitação após defumação com aroma natural de fumaça, visando à alternativa de
agregação de valor ao pescado. Determinou-se o rendimento do processamento de
exemplares de piau-vermelho, bem como dois métodos de defumação, com aroma
natural de fumaça: imersão e aspersão, sendo que a qualidade do filé foi comparada
com o filé de tilápia (peixe padrão em qualidade de carne), por análises sensoriais. Para
tanto foram utilizados filés fritos e filés defumados das duas espécies de peixes. Pela
análise sensorial, foram avaliados os atributos aroma, cor, aparência e sabor, além da
determinação da preferência e intenção de consumo entre os quatro produtos. Foram
feitas análises químicas dos filés. Não foi observada diferença de rendimento de filé,
percentual de cabeça e percentual de vísceras entre os exemplares nas diferentes
classes de peso. Exemplares de piau-vermelho eviscerados apresentaram rendimento
de filé igual a 56,7% (± 4,5) e porcentagem de cabeça igual a 16,1% (± 1,8). O valor
médio estimado para percentual de vísceras foi igual a 9,3% (± 3,1) do peso total. A
defumação com aroma natural de fumaça, pelo método de aspersão, mostrou-se
preferida pelos provadores. Na forma frita, a tilápia superou o piau-vermelho quanto ao
aroma e à cor, entretanto para as características de aparência e sabor não houve
diferença entre as espécies. Na forma defumada, o piau-vermelho superou a tilápia
para todas as características avaliadas. Na ordem de preferência dos produtos,
observou-se que a tilápia defumada foi indicada por 46,2% dos julgadores como
produto de baixa preferência, em relação aos outros. Os resultados obtidos indicaram
baixa intenção de consumo para a tilápia defumada e boa aceitação dos produtos piau-
viii
vermelho frito, piau-vermelho defumado e tilápia frita, com possibilidade de consumo
freqüente.
Palavras-chave: defumação líquida, processamento de pescado, rendimento de filé
ix
ABSTRACT
COSTA, ANA PAULA RIBEIRO; D.S., Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro; January 2005; Yield and processing of the red piau Leporinus copelandii STEINDACHNER, 1875, from natural environmental; Professor Advisor: Dalcio Ricardo de Andrade; Committee members: José Brandão Fonseca, Manuel Vazquez Vidal Júnior, Eduardo Shimoda.
The potential for the processing of the red piau Leporinus copelandii and its acceptance
after liquid smoke, aiming at alternative of aggregation of value to the fished one, was
evaluated. The yields of the processing of red piau was determined, as well as two liquid
smoked methods: immersion and aspersion, being that the quality of the fillet was
compared with tilapia fillet (fish standard in quality of meat) for sensorial analyses. Them
fillet fries and fillet smoke of the two species were used. Sensorial analysis were used to
evaluate aroma, color, appearence and flavor, beyond the determination of the
preference and consumption intention among the four products. Chemical analyses of
the fillet had been made. There were no significant difference the yields of fillet,
percentage of head and percentage of visceras of the fishes in different weight
categories. Red piau without viscera showed value of 56,7% (± 4,5) for fillet yields, and
average value of 16,1% (±1,8) for head percentage. The estimate average value for
percentage of viscera was 9,3% (± 3,1) of the total weight. The smoking with liquid
smoke by atomized method, was preferred. In the form of fries, the tilapia was preferred
to red piau. As related to aroma and color characteristics, however for appearance and
flavor there was no difference between the species. In the smoked form, the red piau
was preferred to tilapia for all the evaluated characteristics. In order of preference of the
products it was observed that the smoked tilapia was indicated by 46,2% of the judges
as product of low preference, in relation to the others. The results indicated low intention
of consumption for the smoked tilapia and good acceptance of the products red piau
fries, smoked red piau and fries tilapia, with possibility of frequent consumption.
Key words: liquid smoke, fillet yields, fish processing
x
1. INTRODUÇÃO
Nas últimas duas décadas, estudos a respeito de espécies da ictiofauna
brasileira vêm aumentando devido, principalmente, ao apelo pela preservação dos
nossos rios e à necessidade de mitigar os efeitos poluidores da ação do homem. A
aplicabilidade dos conhecimentos básicos a respeito desta ictiofauna deve ser refletida
na produção e na produtividade destas espécies nativas para a atividade piscícola sem
prejuízo da biodiversidade local.
Uma das avaliações a respeito do potencial zootécnico de espécies nativas
é a resposta em relação à produção de uma das frações comestíveis comerciais, o
filé, e a sua aceitabilidade pelo mercado consumidor.
O piau-vermelho é uma espécie endêmica da bacia hidrográfica do leste
(GARAVELO, 1979) e, como outros Leporinus, alcança baixo valor comercial na
forma in natura por apresentar espinhos na forma de “Y” na sua musculatura. No
entanto, sua carne é comercializada na região norte do Estado do Rio de Janeiro
principalmente na forma de filé congelado, proveniente exclusivamente do ambiente
natural. Este produto alcança valor de mercado em torno de 05 dólares/kg,
semelhante ou, em determinadas épocas do ano, superior à carne bovina de
primeira qualidade. Entretanto, não se sabe se o elevado valor de mercado é devido
ao baixo rendimento de filé, escassez e/ou irregularidade no fornecimento dos
peixes ao longo do ano, ou à qualidade organoléptica do filé.
2
Outra preocupação constante entre os piscicultores está em aumentar o
retorno econômico na comercialização dos peixes cultivados. Um dos desafios para
a agroindústria de pescado está em agregar valor ao produto final, utilizando as
tecnologias de processamento.
A tendência, como ocorreu com o frango, é o consumidor utilizar cada vez
mais produtos convenientes, de fácil preparo, higienicamente corretos e com
qualidade nutricional. Atualmente, a defumação líquida, com aroma natural de
fumaça, vem sendo utilizada pela indústria alimentícia como uma tecnologia segura
e higiênica para a saúde humana, apresentando resultados satisfatórios no que diz
respeito à qualidade do produto final defumado.
Para avaliar o potencial desta espécie para o processamento e defumação,
utilizando exemplares capturados em ambiente natural, foram determinados os
seguintes aspectos:
- Rendimento em diferentes classes de peso;
- Aceitação quanto ao processo de defumação utilizando-se aroma natural de
fumaça, como nova tecnologia, visando à agregação de valor ao produto;
- Composição química e qualidade microbiológica da matéria-prima (filé
congelado) e produto processado com aroma natural de fumaça;
- Comparação entre piau-vermelho e uma espécie de peixe de relevante valor
comercial e de qualidade organoléptica reconhecida (tilápia), quanto às
características químicas, organolépticas, e intenção de consumo.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. Biologia e distribuição geográfica do Leporinus copelandii
A espécie Leporinus copelandii (STEINDACHNER, 1875) pertence à
subordem Characoidei, à família Anostomidae e à subfamília Leporininae. É
encontrado nas bacias dos rios: Jequitinhonha, Paraíba do Sul, Doce, Ribeira de
Iguape, São Mateus e Quenda (GARAVELLO, 1979).
Leporinus copelandii, definido como onívoro (BRITSKI, 1972), ocupa a base
da cadeia alimentar. Conhecido popularmente como piau-vermelho, não desova
espontaneamente em ambientes lênticos, havendo a necessidade de realizar
movimentos migratórios para a reprodução, cujo início ocorre nos meses de agosto
e setembro na região do baixo rio Paraíba do Sul (COSTA, 1999; PEREIRA, 2003).
A reprodução em cativeiro foi obtida por ANDRADE et al. (1991), ANDRADE e
VIDAL Jr. (1991; 1995), quando realizaram trabalhos de reprodução artificial com
indução hormonal da espécie.
A espécie apresenta corpo entre pequeno e médio porte (GODOY, 1972;
1975; BIZERRIL e PRIMO, 2001), atinge até 40 cm de comprimento, possui boca
sub-inferior, focinho longo e arredondado, perfil dorsal bastante inclinado na região
da cabeça e curvado na região anterior à nadadeira dorsal e membranas branquiais
4
unidas ao istmo. Apresenta três grandes máculas negras sobre a linha lateral,
alongada e mais abaixo da série de escamas perfuradas, as quais, em indivíduos
jovens, são arredondadas e circundadas por barras transversais dorsais. Possui 12
escamas em torno do pedúnculo caudal, na região posterior à nadadeira anal. A
linha lateral é composta de 38 – 39 escamas. Disposição dos dentes 4/4
(GARAVELLO, 1979).
O piau-vermelho vem sendo pesquisado em alguns aspectos como dinâmica
populacional e biologia reprodutiva (COSTA, 1999; SOUZA, 2002; PEREIRA, 2003),
e bioacumulação e concentração de metais pesados na porção comestível
(COELHO e FONSECA, 1986; TERRA, 2001). Dados relativos ao cultivo e ao
processamento de piau-vermelho não têm sido relatados na literatura.
Segundo relatos de pescadores da Região Norte Fluminense (RJ), o piau-
vermelho é um peixe procurado para a pesca esportiva e comercial, devido às
características de peixe “brigador” no anzol e apreciável sabor de sua carne.
Observa-se que, na última década, essa espécie de peixe já não é encontrada com
tanta facilidade na bacia do baixo rio Paraíba do Sul (PEREIRA, 2003).
Provavelmente o que vem contribuindo para a redução do estoque desta espécie no
seu ambiente natural é a intervenção humana negativa, prejudicando sensivelmente
a qualidade das águas devido às alterações químicas e físicas (BIZERRIL e PRIMO,
2001; SOUZA et al., 2002).
2.2. Rio Paraíba do Sul e a produção pesqueira no Estado
O rio Paraíba do Sul é um ambiente detentor de biodiversidade dentro da
região ictiogeográfica do leste brasileiro (BIZERRIL et al., 1998) e vem sendo alvo de
depreciação de natureza diversa ao longo de décadas e, conseqüentemente, todos
os indivíduos que, de alguma maneira, têm suas atividades correlacionadas a ele
estão sujeitos aos seus altos e baixos. Os estoques pesqueiros da região não fogem
à regra.
Como exemplo das modificações ambientais geradas pela intervenção
humana, SOFFIATI (2003) relata que, no final do século XIX, era possível descer o
rio Paraíba, entrar no oceano e ver Grussaí e Atafona do mar. Também era costume
navegar da foz até São Fidélis em vapores de médio porte, e da foz até Cardoso
Moreira subindo pelo rio Muriaé. Segundo o mesmo autor, hoje em dia, esta situação
5
está completamente diferente: não se passa nem com uma canoa, em determinados
trechos, no período de estiagem.
A pesca no rio Paraíba do Sul e o uso deste sistema em atividades
recreativas pela população é um aspecto observado em todos os seus domínios
ambientais, embora a forma de interação ocorra de diferentes maneiras como: pesca
recreativa, pesca de subsistência, lazer ou turismo (BIZERRIL e PRIMO, 2001).
Segundo a Associação de Pescadores e Amigos do Rio Paraíba do Sul
(APARPS, 1998), a pesca artesanal nos municípios de Itaocara e Aperibé (RJ)
movimenta a economia de aproximadamente 120 famílias (cerca de 720 pessoas), e
dentre as espécies de peixes mais comercializadas na região são citados Caximbau
(Loricariichthys sp.), Curimbatãs (Prochilodus spp.), Piaus (Leporinus spp.), Traíra
(Hoplias malabaricus), Dourado (Salminus maxilosus), Robalo (Centropomus
parallelus), Tucunaré (Cichla ocellaris) e Piabanhas (Brycon spp.). Ainda segundo
BIZERRIL e PRIMO (2001), a atividade pesqueira na região é muito desenvolvida,
atuando, inclusive, como uma fonte de absorção de mão-de-obra quando da
entressafra da cultura canavieira, e as espécies capturadas atendem,
principalmente, ao mercado local e ao mercado de Campos dos Goytacazes, onde
divide espaço com o pescado proveniente da Lagoa Feia.
Em levantamento realizado por BIZERRIL et al. (1998), dentre as espécies
relacionadas como freqüentemente capturadas, algumas são citadas como
presentes nas diferentes regiões do sistema hidrográfico do rio Paraíba do Sul
(Tabela 1).
Um exemplo de interferência negativa do homem neste ambiente ocorreu no
final do mês de março, início do mês de abril de 2003, quando os estados de Minas
Gerais e Rio de Janeiro viveram o maior desastre ecológico dos últimos anos. O
vazamento de rejeitos químicos represados em um antigo reservatório da indústria
Cataguazes Papéis, em Cataguazes (MG), provocou um desastre ambiental no
Noroeste Fluminense. Os rejeitos contaminaram o rio Pomba, afluente do rio Paraíba
do Sul (BALBI et al., 2003a).
Tabela 1 - Espécies de peixes capturadas em todos os domínios da Bacia do Rio
Paraíba do Sul
6
Espécies Nome Científico Nome Vulgar
Hoplias malabaricus Traíra Prochilodus sp. Curimbatã Cyphocharax gilbert Sairu Leporinus sp. Piau Brycon sp. Piabanha e Pirapitinga Salminus maxilosus Dourado Astyanax bimaculatus Lambari-de-rabo-amarelo Rhamdia sp. Jundiá ou Bagre amarelo Hypostomus affinis Cascudos Hypostomus luetkeni Cascudos Loricariichthys sp. Caximbau Geophagus brasiliensis Acará BIZERRIL et al. (1998).
Como conseqüência deste desastre, a população de 39 cidades da Zona da
Mata em Minas Gerais e oito cidades fluminenses: Santo Antônio de Pádua,
Miracema, Aperibé, Cambuci, Itaocara (distrito de Portela), São Fidélis, Campos dos
Goytacazes e São João da Barra foi orientada a não usar as águas dos rios Pomba
e Paraíba na irrigação de lavouras, nem na saciedade da sede dos rebanhos
bovinos, tampouco consumir peixes e utilizar água para tomar banho com risco de
irritação e queimaduras na pele (BALBI et al., 2003a;b).
Em São Fidélis, o projeto desenvolvido pela colônia de pescadores para
repovoar o rio Paraíba do Sul com pitus (espécie de camarão de água doce
abundante no passado) provavelmente foi atingido (BALBI et al., 2003b).
Segundo BIZERRIL e PRIMO (2001), algumas regiões da bacia do rio
Paraíba do Sul notabilizam-se por reunirem conjuntos únicos de espécies, o que as
enquadra dentro da definição de zonas de endemismo.
Como cada trecho de um rio pode ser o habitat de uma população específica
de peixes que aí se estabelece devido a diferentes características locais como
velocidade da corrente, profundidade da água, natureza do leito do rio e das
margens, possibilidade de movimentação, regime do rio e qualidade da água (CBDB,
2003), quando estes ambientes são ameaçados pela ação do homem, toda
ictiofauna e demais organismos componentes deste ecossistema estão sujeitos a
alterações, inclusive irreversíveis.
7
De acordo com os dados do CIDE (2003), que não considerou dados após
este acidente ecológico ocorrido no rio Paraíba do Sul, a pesca artesanal de peixes
de água doce no Estado do Rio de Janeiro, no ano de 1999, foi representada por 13
principais espécies. Dentre estas, o piau representou 9,4% e a tilápia, 8,5% do total
de toneladas de peixes capturados.
Em relação à pesca marítima, segundo RIBEIRO et al. (2004), o
desembarque controlado em Atafona (município de São João da Barra – RJ), foz do
rio Paraíba do Sul, nos últimos cinco anos reduziu cerca de 86% (em toneladas). De
10.859,9 toneladas de pescado capturado em 1998, no ano de 2002, o
desembarque representou 1532,6 toneladas.
A região Noroeste Fluminense foi responsável por 68,2% da produção total
de peixes em águas interiores, sendo representada por 44,7% do total de produtores
do estado. A produção da aqüicultura do Estado do Rio de Janeiro no ano de 1999
foi representada por dez principais espécies, dentre as quais, a tilápia foi
responsável por quase 40% do total de toneladas produzidas, e o piau representou
apenas 3,2% do total (CIDE, 2003).
Em estudo para caracterizar o perfil do consumidor na cidade de Campos
dos Goytacazes (RJ), VIDAL Jr. et al. (2002) identificaram que 51,3% das famílias
entrevistadas consumiam peixes semanalmente, e que a preferência do consumidor
pelo peixe de origem marinha (49,1%) foi superior ao peixe de água doce (20,5%),
entretanto 26,9% das famílias entrevistadas não expressaram sua preferência pela
origem do pescado consumido. Apesar dos comerciantes entrevistados terem
mencionado o menor preço do pescado de água doce como um fator que deveria
aumentar o seu percentual de venda, a maioria (45,2%) respondeu que vende mais
peixe de origem marinha porque a qualidade deste pescado é melhor. Esta situação
pode ser explicada pela falta de infraestrutura para suporte à pesca interior.
Em estudo sobre a comercialização de peruás (Balistes capriscus) no
mercado de Campos dos Goytacazes, ANDRADE et al. (2002) relatam que, nos
locais de venda, os peixes não se encontravam em gelo, nem eram protegidos de
poeira ou insetos. Segundo os resultados das análises microbiológicas, verificaram
que os peruás não apresentavam condições higiênicas e sanitárias satisfatórias,
portanto, apresentavam riscos para a saúde do consumidor.
8
Segundo VALENTI et al. (2000), na região sudeste observa-se um grande
crescimento dos centros de produção e distribuição de alevinos, e as espécies mais
procuradas e mais cultivadas são as destinadas à pesca esportiva.
É a aqüicultura que poderá dobrar o consumo do pescado no país nos
próximos dez anos, afirma OETTERER (2002), uma vez que a pesca extrativa tanto
de mar como das águas interiores situa-se abaixo da metade do potencial e com
tendência à estabilização ou queda. Esta mesma autora cita que o setor cresce em
média 5,5% ao ano, enquanto a pesca está praticamente estagnada.
2.3. Rendimento de carcaça em peixes de água doce
A aqüicultura de água doce vem crescendo e ganha importância como
produtora de proteína animal. Além de espécies exóticas (trutas, carpas e tilápias),
algumas espécies nativas, como pacu, tambaqui, atualmente os Bryconinae e
Anostomideos, vêm contribuindo para o aumento no número de produtores no país
(OETTERER, 2002). A definição do peso de abate, os diferentes métodos de
processamento, o conhecimento sobre o rendimento do peixe, bem como seus
subprodutos são de fundamental importância tanto para a indústria de
processamento de pescado como para o produtor.
Para a indústria de tilápias, por exemplo, algumas características
mercadológicas, como o tamanho ou peso do peixe para o abate e peso do filé, são
imprescindíveis para o sucesso do processamento, pois estão intimamente ligados
ao rendimento de carcaça e rendimento de filés (KUBITZA, 2000).
A carcaça, ou parte útil do pescado, é a parte do corpo pronta para cozinhar
ou para a industrialização. Trata-se do tronco, sem vísceras nem nadadeiras, porém
com a coluna vertebral e a pele (sem escamas). Representa, em média, 62,6% do
peso dos peixes (CONTRERAS-GUZMÁN, 1994).
Além do rendimento do filé depender da eficiência das máquinas filetadoras,
destreza manual do operário e da forma anatômica do corpo do peixe
(CONTRERAS-GUZMÁN, 1994), para SOUZA et al. (1999), deve-se considerar,
também, a forma pela qual é realizada a esfola, ou seja, a retirada da pele da
carcaça ou do filé.
SOUZA (2002), comparando seis métodos de filetagem em relação ao
rendimento de filé e de subprodutos do processamento de tilápia (O. niloticus),
9
observou que o método influenciou todos os rendimentos analisados, e que a
retirada da pele do peixe inteiro com alicate e posterior filetagem proporcionou maior
rendimento de filé. Utilizando a mesma metodologia de filetagem para tilápias,
SOUZA e MARANHÃO (2001) não observaram diferença significativa para
rendimento de filé de tilápias (O. niloticus) nas categorias de pesos avaliadas.
GONÇALVES et al. (2003), para avaliarem as características de carcaça de
tilápias (O. niloticus), efetuaram o processo de filetagem sem a retirada da pele, e
não observaram diferenças significativas no rendimento de carcaça e filé nas
diferentes classes de peso dos peixes ao abate.
Segundo CONTRERAS-GUZMÁN (1994), os valores de rendimento de filé
com pele podem variar de 32,8% a 59,8%, com uma média de 50,5% e, com a
retirada da pele, este reduz para 43,0%. Peixes fusiformes apresentam altos
rendimentos (>54%) devido à massa muscular cilíndrica, enquanto que peixes
comprimidos estão entre as espécies de rendimentos mais baixos (inferiores a 42%).
SOUZA et al. (1999) obtiveram valores de rendimento de carcaça entre 53 e
56% e de 33 a 37% de rendimento de filé de acordo com categorias de peso
corporal em tilápia (Oreochromis niloticus) entre 250g e 450g. Segundo estes
autores, no Brasil, não há uma metodologia padrão para filetagem por categorias de
peso corporal de acordo com as diferentes espécies. SILVA et al. (2000) não
encontraram diferenças significativas entre tratamentos de densidades de
estocagem no rendimento de carcaça e filé de tilápias, obtendo valores médios de
58,1% e 32,6%, respectivamente.
Os resíduos são formados pela cabeça, nadadeiras, pele e vísceras. Nos
peixes ósseos, as vísceras representam cerca de 11% do peixe inteiro, sendo
comparativamente menos volumosas que as dos animais terrestres, e a pele cerca
de 7,5% do peso total dos peixes (CONTRERAS-GUZMÁN, 1994).
Considerando a carcaça sem cabeça, pele e vísceras, CLEMENT e LOVELL
(1994) obtiveram valor de rendimento de carcaça de 51% para Tilápia do Nilo com
peso médio de 585 gramas. Este valor é inferior ao obtido por SOUZA et al. (1999)
em peixes nas categorias de peso entre 250 e 450 gramas.
CONTRERAS-GUZMÁN (1994) cita que a tilápia está entre as espécies que
apresentam o menor rendimento de filé, inferior a 40%.
MAKRAKIS et al. (2000), avaliando a eficiência de dietas em relação ao
rendimento do filé para tilápias, obtiveram valores entre 27,7 e 35,0% para este
10
parâmetro, quando observaram diferença significativa somente para o tratamento
testemunha submetido à produção de alimento vivo no viveiro (adubação). Estes
pesquisadores não observaram diferença significativa entre as médias de
rendimento em pele, vísceras e cabeça. A percentagem de vísceras para tilápias
variou entre 4,0 e 6,4% do peso total entre os tratamentos, diferindo de GONZÁLEZ
(1997), que observou valores de 20,0 a 21,0% no peso de vísceras.
Entretanto, em estudo feito para acompanhar linha de filetagem de frigorífico
em Santa Catarina, os valores de rendimento médio da tilápia obtidos foram: 40%
para filés, 13% para cabeças, 5% para peles, 3% para barrigas, 16% de vísceras e
22% de carcaça (PEREIRA e CAMPOS, 2000b).
GARDUÑO-LUGO e colaboradores (2003) não encontraram diferença
significativa no rendimento de filé quando comparou o desempenho entre
exemplares selvagens e híbridos de tilápias, os quais apresentaram valores de 32,0
e 33,4% respectivamente.
GURGEL e FREITAS (1972), avaliando a composição química de algumas
espécies de peixes de água doce do nordeste brasileiro, consideraram a porção
comestível não somente os músculos, mas também ossos e espinhas,
determinando, assim, para as espécies de Leporinus por eles estudadas, valores de
rendimento da porção comestível entre 60 a 68%.
SANTAMARIA e ANTUNES (1999), comparando piracanjubas (Brycon
orbignyanus) silvestres com as criadas em cativeiro, observaram que a origem não
influenciou significativamente o rendimento médio dos filés sem pele, que foram 40,5
± 2% e 40,6 ± 2% respectivamente, utilizando peixe inteiro eviscerado.
O rendimento médio de filé de traíra (H. malabaricus) foi de 44,33%
(SANTOS et al., 2000), entretanto foi observado efeito significativo do sexo: os
machos apresentaram rendimento superior (48,63%) ao das fêmeas (46,12%).
No processamento de Jundiá (Rhamdia quelen) o peso das gônadas, para
as fêmeas, influenciou significativamente no percentual de resíduo atribuído às
vísceras, e nas categorias de pesos estudadas, o percentual de pele variou entre
4,82 e 6,55% do peso total (CARNEIRO et al., 2003).
2.4. Caracterização química e nutricional do pescado
11
O conhecimento da composição química centesimal do pescado “in natura”,
além do aspecto nutricional, proporciona valiosos subsídios à indústria de
processamento, no controle de qualidade de produtos conservados pelo gelo, sal,
defumação e outros métodos de conservação (BRESSAN e PEREZ, 2000).
O consumidor encontra no pescado a presença de todos os aminoácidos
essenciais, alto teor de lisina, alta digestibilidade protéica, fonte de vitaminas
lipossolúveis e as do complexo B, alta insaturação dos ácidos graxos e o baixo teor
de colesterol, além de apresentar valor biológico igual a 93, superior ao do leite (89)
e da carne bovina (87) (OETTERER, 2002).
A composição química do pescado varia de acordo com a espécie, entre
peixes da mesma espécie e entre diferentes partes do mesmo peixe. Estas
variações são devidas a fatores como a época do ano, alimentação, diferença entre
sexos, entre outras causas (GURGEL e FREITAS, 1972; CONTRERAS-GUZMÁN,
1994; OGAWA e MAIA 1999; KUBITZA, 2000). Segundo GARDUÑO-LUGO e
colaboradores (2003), o grupo genético pode afetar a deposição de lipídios na
musculatura.
O teor de gordura do pescado influencia a performance produtiva, a vida útil
dos produtos e a aceitação do produto pelos consumidores. Jacquot (1961), citado
por CONTRERAS-GUZMÁN (1994), classificou o pescado em relação ao teor de
gordura. O pescado classificado como gordo apresenta, no mínimo, 10,0% de
gordura; no semigordo, o teor está entre 2,5 a 10,0%; e o pescado considerado
magro possui, no máximo, 2,5% de gordura.
Segundo Mantovani (1961), citado por BRESSAN e PEREZ (2000), o
pescado pode ser considerado gordo quando apresenta teor de gordura acima de
8,0%, semigordo com teor entre 3,0 e 8,0%, e magro quando o teor de gordura está
entre 2,0 e 3,0%.
Stansby (1965), citado por CONTRERAS-GUZMÁN (1994), correlacionou o
teor de proteínas com o teor de gordura na carne de pescado, e definiu peixe gordo
como aqueles que apresentavam mais de 15% de gordura (Tabela 2). No entanto,
esta classificação descrita por Stansby não contempla espécies de peixes que
possuem teor de proteína entre 15 e 20% e teor de gordura abaixo de 5%.
Tabela 2 - Categorias do pescado de acordo com o teor de gordura e proteína na
musculatura
12
Categorias Teor de Proteína Teor de Gordura
A Acima de 20% 5 a 15%
B 15 a 20% 5 a 15%
C Abaixo de 15% Acima de 15%
D Acima de 20% Abaixo de 5%
E Abaixo de 15% Abaixo de 5%
Stansby (1965), citado por CONTRERAS-GUZMÁN (1994).
Segundo BRESSAN e PEREZ (2000), o pescado pode ser classificado de
acordo com o percentual de gordura, uma vez que o percentual de proteínas na
musculatura se apresenta em quantidades relativamente constantes, entre 17 e
20%, oscilando, principalmente, devido ao estado biológico do peixe.
Em geral, o músculo do pescado pode conter de 60 a 85% de umidade,
aproximadamente 20% de proteína, 1 a 2% de cinzas, 0,3 a 1,0% de carboidratos e
0,6 a 36% de lipídeos (OGAWA e MAIA, 1999).
Segundo SANTOS et al. (2000), a composição química do filé de traíras
(Hoplias malabaricus) coletadas em ambiente natural foi de 20,7% de proteína bruta,
0,84% de extrato etéreo, 1,39% de cinzas e 77,71% de umidade, e classificaram a
traíra como peixe magro e pertencente à categoria “A” de Stansby.
Segundo OGAWA e MAIA (1999), o pescado, em geral, fica mais saboroso
antes da desova, período este em que o peixe deposita mais gordura e glicogênio
para serem utilizados como fontes energéticas. COSTA (1999) observou que,
durante o período de preparação para a migração reprodutiva de piau-vermelho (L.
copelandii), ocorreu acúmulo de gordura na região celomática, entretanto não foi
analisado o conteúdo de gordura na porção comestível do pescado (filé).
A quantidade de lipídio na carne de pescado torna-o mais saboroso, porém o
excesso pode alterar o seu sabor. ROBB e colaboradores (2002) determinaram que
o percentual máximo de lipídios que proporcionou o melhor sabor de peixe na
porção comestível de salmão defumado (Salmo salar) foi de 8,6%, e que a partir de
10,0%, o sabor era comprometido, influenciando a preferência dos provadores.
Segundo FRANCO (1999), ocorre pouca variação na fração protéica da
13
musculatura de peixes tanto de água doce quanto de água do mar, entretanto, a
fração lipídica apresenta maior amplitude de variação (Tabela 3).
Tabela 3 – Composição química e valor energético de diferentes espécies de peixes
Espécies de peixe (100 gramas)
Calorias Kcal
Proteínas (g)
Lipídios (g)
Cálcio (mg)
Fósforo (mg)
Ferro (mg)
Leporinus piau 86,0 15,9 2,00 545 295 2,40
Cyprinus carpio 86,0 19,2 1,01 15 165 2,00
Hypophtalmus edentatus 115,0 18,9 3,80 34 225 1,10
Geophagus spp. 101,0 20,0 1,90 112 344 3,20
Peixe de água doce cru
(média)
75,0 16,6 0,50 20 100 0,70
Micropogon fournieri 100,0 20,8 1,20 38 198 1,10
Mugil cephalus 115,0 19,3 3,60 99 338 2,80
Mugil brasiliensis 173,0 22,9 8,96 13 196 1,57
Sciena wieneri 72,0 17,2 0,30 32 316 1,00
Peixe marinho cru (média) 82,9 16,0 2,10 22 229 1,10
FRANCO (1999).
MAIA e colaboradores (1999), avaliando Prochilodus cearensis, concluíram
que o habitat não influenciou na composição química centesimal.
Segundo HIANE et al. (2002), os valores médios de lipídios totais obtidos
nas amostras de seis espécies de peixes capturadas no rio Miranda, na região do
Pantanal, (Piaractus mesopotamicus [2,5 ± 3,1], Pygocentrus nattereri [2,2 ± 1,1],
Salminus maxillosus [4,6 ± 2,8], Brycon orbigynanus [6,7 ± 2,8], Leporinus
macrocephalus [3,4 ± 1,9] e Pseudoplatystoma coruscans [1,0 ± 0,6]), ficaram abaixo
dos valores encontrados na literatura para algumas espécies de peixes de água
salgada.
A composição de minerais como o cálcio, fósforo e ferro não seguem padrão
definido para espécies de peixe de água doce (FRANCO, 1999) (Tabela 3). Em
estudo sobre componentes minerais em peixes de água doce criados em cativeiro
(MANTOVANI e MORGANO, 1995), dentre as sete espécies analisadas, o bagre
14
apresentou altos índices de ferro e zinco e o teor mais baixo de potássio em
comparação com os demais. CONTRERAS-GUZMÁN (1994) cita que os teores de
cinzas dos peixes de água doce encontram-se na faixa de 0,98 a 3,29%, e que esta
variação provavelmente se deve à quantidade de ossos intramusculares presentes
no filé.
Considerando as variáveis que podem afetar a composição química do
pescado, GURGEL e FREITAS (1972) avaliaram a porção comestível de peixes em
diferentes épocas de captura. Dentre as espécies de valor comercial no Nordeste
brasileiro, foram avaliadas Leporinus sp., Leporinus friderici, Hoplias malabaricus,
Prochilodus cearensis, e Tilapia melanopleura (Dumeril) (Tabela 4).
Tabela 4 – Valores percentuais médios da composição química aproximada de
peixes de água doce de valor comercial do Nordeste brasileiro
Espécies de peixe
Calorias (cal./100g)
Porção comestível
(%)
Matéria seca (%)
Proteínas (%)
Lipídios (%)
Cinzas
(%)
Prochilodus cearensis 183 64,0 30,4 18,3 11,2 1,9
Leporinus friderici 156 59,9 27,5 17,9 8,4 1,9
Leporinus sp. 194 67,9 32,8 19,2 12,0 2,1
Tilapia melanopleura 116 56,1 24,8 18,9 3,4 2,2
Hoplias malabaricus 115 59,6 24,2 21,0 2,3 1,9
GURGEL e FREITAS (1972) modificada.
Segundo CLEMENTE e LOVELL (1994), o filé de tilápia (Oreochromis
niloticus) possui, em média, 75% de água, entre 3,4 e 8,5% de lipídios (gordura),
20% de proteína e 2% de minerais. Estes pesquisadores determinaram, em 100g de
filé, 18mg de cálcio, 35mg de sódio, 169mg de fósforo e 324mg de potássio.
Comparando dois grupos genéticos de tilápias, um selvagem (Oreochromis niloticus,
Linnaeus) e outro híbrido (Florida red tilápia x Stirling red O. niloticus), GARDUÑO-
LUGO e colaboradores (2003) observaram deposição de lipídios na porção de filé
para os exemplares do grupo selvagem 6,3 vezes superiores à deposição em tilápias
pertencente ao grupo híbrido.
SILVA et al. (2000), avaliando a composição de filés de tilápias vermelhas
em cultivos com diferentes densidades de estocagem (dois, três e 4 peixes/m2), não
encontraram diferença significativa entre os tratamentos e determinaram valores de
15
75% de umidade, 21% de proteína bruta, 1,3% de extrato etéreo, e 1% de cinzas
para os filés.
2.5. Defumação de peixes
Originalmente, a principal razão para se defumar alimentos era conservá-los
e, assim, aumentar a vida-de-prateleira. Com o desenvolvimento da estocagem
frigorífica e facilidades no congelamento, a importância da defumação como método
de conservação tem ficado em segundo plano. Atualmente, é empregada pela
indústria alimentícia principalmente para conferir aroma, sabor e coloração
característicos de produto defumado desejados pelo mercado consumidor (MORAIS
e ESPÍNDOLA FILHO, 1995; SILVA, 2000; HATTULA et al., 2001).
O princípio da defumação constitui em expor o peixe fresco ou ligeiramente
salgado à ação da fumaça (BRESSAN e PEREZ, 2000).
A ação conservadora da defumação se deve aos efeitos combinados da
salga, cocção, secagem e deposição de substâncias químicas bactericidas,
presentes na fumaça (HORNER, 1992; WARD, 1995), resultantes da combustão de
determinadas madeiras duras (carvalho, elmo, mogno, etc.) (MORAIS e
ESPÍNDOLA FILHO, 1995). No Brasil, o eucalipto, predominante em certas regiões,
pode ser utilizado devido à boa qualidade, facilidade de obtenção e conferir
características apreciadas ao produto defumado (MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO,
1995).
A perda de água e a ação dos constituintes da fumaça conferem ao alimento
uma barreira física e química contra a penetração e atividade dos microrganismos
(EVANGELISTA, 1992; 2001; 2002). A desidratação que se processa na superfície
do produto, as reações protéicas e a camada de resinas formada pela deposição das
partículas de fumaça são as causas para a formação desta barreira protetora
(WARD, 1995; SILVA, 2000).
2.5.1. Composição e propriedades da fumaça
Quimicamente, vários autores comentam que a fumaça é um material
complexo e muito reativo, apresenta cerca de 200 (SCHINDLER, 1995), 300
(MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995; SILVA, 2000) ou 400 (GONÇALVES, 1998)
16
substâncias isoladas e identificadas, como hidrocarbonetos, álcoois, aldeídos,
cetonas, ésteres benzóis e compostos de anéis-aromáticos, como o cancerígeno 3,4
benzopireno. Além disso, estão presentes cinza de dióxido de carbono e alcatrão.
Estas substâncias orgânicas são provenientes da queima lenta de substâncias
combustíveis da madeira, tais como celulose, lignina, hemicelulose, pentosanas,
ácidos tânicos, resinas e terpenos (MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995;
SCHINDLER, 1995; SILVA, 2000).
A composição química da madeira determina a composição e as
propriedades da fumaça. Na Tabela 5 está descrita, de um modo geral, a
composição básica das madeiras e, na Tabela 6, os compostos produzidos de
acordo com a temperatura de queima das madeiras.
Tabela 5 – Substâncias orgânicas componentes das madeiras
Componentes Madeiras Duras (%) Moles (%)
Celulose 48 – 53 54 – 58 Lignina 18 – 24 26 – 29
Hemicelulose 25 – 31 22 – 25 MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO (1995) modificada.
Tabela 6 – Características da fumaça em relação à temperatura de queima e
componentes produzidos
Componentes (%) Temperatura OC Produto
Hemicelulose e Celulose Baixa Ácidos e álcoois
Lignina > 310 Alcatrões e fenóis > 350 Substâncias cancerígenas
GONÇALVES (1998).
As madeiras, para fazer fumaça, devem apresentar 20 a 30% de celulose,
40 a 60% de hemicelulose e 20 a 30% de lignina (EVANGELISTA, 2001).
17
A duração do fluxo de fumaça sobre o produto influencia na eliminação de
bactérias. As bactérias patogênicas como as da difteria e Staphilococcus são
destruídas quando submetidas à fumaça por uma hora (BRESSAN e PEREZ, 2000).
A composição das fumaças e, conseqüentemente, a qualidade dos produtos
defumados dependem de vários fatores físicos da combustão da madeira. Os fatores
mais importantes estão relacionados com a estrutura, tipo e quantidade de madeira
queimada em relação ao tempo, temperatura de queima, presença de ar, técnica de
geração da fumaça e distância do produto em relação à fonte de fumaça (OGAWA e
MAIA, 1999; SILVA, 2000). Segundo MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO (1995), as
madeiras mais duras são melhores, pois proporcionam queima mais lenta.
Um exemplo disso é o sabor de fumaça no pescado defumado, devido à
presença de substâncias orgânicas na fumaça resultante da combustão incompleta
da madeira. Se esta for excessiva, os produtos finais da combustão (gás carbônico e
água) de nada servirão para o processo. Assim sendo, há a necessidade do controle
da temperatura de queima bem como a quantidade de ar admitida no interior dos
defumadores (MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995).
Todos os componentes químicos da fumaça podem ser classificados em
quatro grupos principais: os compostos ácidos, fenólicos, carbonílicos e
hidrocarbonetos (Tabela 7).
Os componentes dos três primeiros grupos são responsáveis pelas
características desejadas aos produtos defumados, isto é, a cor típica do defumado,
o aroma, o sabor, a maior vida-de-prateleira e a estabilidade do produto final. O
grupo dos hidrocarbonos é indesejável no produto final defumado (MORAIS e
ESPÍNDOLA FILHO, 1995; SCHINDLER, 1995; 1997; OGAWA e MAIA, 1999).
A fumaça por definição é um sistema de partículas sólidas dispersas em
matéria gasosa, com exceção da fumaça líquida. Foi comprovado que esta fase
gasosa da fumaça se dissolve na água intersticial da carne, formando, assim, uma
solução que se transforma em um efetivo agente de defumação (SCHINDLER,
1995).
Tabela 7 - Principais grupos de componentes químicos presentes nas fumaças e
respectivas características que conferem ao produto final
18
Grupos Características Ácidos Conferem sabor de defumado e aceleram a reação entre nitrito e
hemoglobina. Também contribuem para a formação da “pele” nas
salsichas.
Fenólicos Conferem sabor de defumado. Reagem com os compostos
carbonílicos formando substâncias resinosas que dão brilho aos
produtos defumados.
Carbonílicos Responsáveis pela cor característica (marrom dourada), reação
conhecida entre os compostos carbonílicos da fumaça e os
grupos aminos da proteína animal (Reação de Maillard).
Hidrocarbonos Os componentes policíclicos como benzopireno não são
desejáveis por serem cancerígenos (3,4 benzopireno)
SCHINDLER (1995) e SILVA (2000).
A coloração típica do defumado, que varia de amarelo-dourado claro até um
marrom-escuro, depende principalmente da composição de celulose e lignina da
madeira utilizada. A cor dos produtos defumados é resultado basicamente da reação
de carbonilas da fumaça com os aminoácidos livres da proteína do pescado
(MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995; SILVA, 2000), obtida pela deposição de
ácido málico, pirrol e seus derivados na superfície do produto (SILVA, 2000).
O aroma é função, principalmente, da presença de compostos
dicarbonílicos, ácido salicílico, benzilálcool, benzaldeído, cetonas, coniferaldeído,
indol, anizol, sinapaldeído, vanilina, dentre outros. Os efeitos bactericidas e
fungicidas são provocados principalmente pelos ácidos orgânicos (ácido fórmico,
acético e benzóico) aldeídos (formaldeídos) e diversos componentes fenólicos
(fenóis) (OGAWA e MAIA, 1999; SILVA, 2000; EVANGELISTA, 2001). No entanto, o
efeito conservante que a defumação exerce sobre os produtos é devido, em grande
parte, à secagem superficial da matéria-prima e perda parcial da umidade, fator
essencial para o desenvolvimento dos microrganismos existentes nos produtos
(BRESSAN e PEREZ, 2000; SILVA, 2000).
O formaldeído e o fenol são considerados os mais fortes componentes
bacteriostáticos da fumaça, entretanto em fumaças com temperatura inferior a 40oC
têm sua ação anti-séptica bastante reduzida. Somente a defumação a quente
garante a redução substancial do número de microrganismos, devido à alta
19
temperatura da fumaça. Entretanto, o fenol quando presente em grandes
quantidades altera negativamente o sabor do produto (MORAIS e ESPÍNDOLA
FILHO, 1995). O sabor também é influenciado pela umidade, pois contribui para
maior deposição destes componentes (SILVA, 2000).
O composto carcinogênico mais conhecido é o 3,4 benzopireno, pertencente
ao grupo dos hidrocarbonetos policíclicos, proveniente da combustão da lignina em
temperatura superior a 250oC (BRESSAN e PEREZ, 2000). Além do mais,
temperaturas demasiadamente altas alteram negativamente o valor biológico,
digestibilidade e textura do pescado, favorecendo o desprendimento de gás
sulfídrico que prejudica a qualidade e o sabor do produto final (OGAWA e MAIA,
1999).
2.5.2. Etapas do processo de defumação
Para o processo de defumação de pescado, existem três fases distintas e
imprescindíveis à boa qualidade do produto final: a salmouragem, a secagem e a
defumação propriamente dita (MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995; GONÇALVES,
1998; OGAWA e MAIA, 1999).
A matéria-prima deve ser de primeira qualidade, pois qualquer processo de
conservação não melhora a qualidade de matéria-prima inferior, mesmo submetida a
um processo intenso de salmouragem e defumação (BRESSAN e PEREZ, 2000).
O pescado é um produto altamente perecível e em temperaturas tropicais
deteriora-se rapidamente, portanto o pescado destinado à defumação deve ser
fresco, ou, para aqueles que têm período prolongado de distribuição até o
consumidor, conservado por refrigeração ou congelamento (MORAIS e ESPÍNDOLA
FILHO, 1995; GONÇALVES, 1998; OGAWA e MAIA, 1999).
A finalidade da etapa de salmouragem é propiciar sabor e consistência à
carne de pescado, favorecer a formação de uma película brilhante de proteínas na
superfície do corte com coloração amarelada devido à fumaça, conferir aroma
peculiar e melhorar a aparência pela lixiviação do sangue (MORAIS e ESPÍNDOLA
FILHO, 1995). Com a desidratação, a carne do pescado apura melhor sua qualidade
de sabor (GONÇALVES, 1998).
20
Para o processamento do pescado defumado podem ser utilizadas
salmouras de sal refinado na concentração de 25% e na proporção de 2:1 de
salmoura e peixes (volume/peso) (OETTERER, 1995).
Segundo MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO (1995), quando se utiliza salmoura
com concentração baixa de sal (50% de saturação) ocorre ligeiro intumescimento do
tecido do pescado e um ganho de peso na ordem de 2 a 3%. Em salmoura mais
fraca que 80%, o sal é absorvido mais uniformemente, todavia o tempo de
salmouragem é mais longo.
Na Tabela 8, podem ser encontrados dados relativos à concentração,
porcentagem de saturação e quantidade de sal necessária para a obtenção de
salmouras.
A concentração mínima de 3% de sal na fase aquosa do produto defumado
é efetiva no controle da deterioração microbiana, principalmente na inibição do
crescimento do Clostridium botulinum (SIQUEIRA, 1995; EVANGELISTA, 2001).
A concentração de sal na fase aquosa do produto defumado a quente é
determinada segundo a expressão abaixo:
Concentração de sal (%) = Teor de sal x 100 Teor de sal + teor de umidade
Tabela 8 - Dados relativos à concentração, porcentagem de saturação e quantidade de sal necessária para a obtenção de salmouras
Concentração (%) (g de sal/ 100ml de água)
Saturação da salmoura (%)
Quantidade de sal por litro de água (g/L)
3.0 10 28 – 32 6.0 20 56 – 64 8.9 30 87 – 95 11.6 40 120 – 125 14.3 50 154 – 158 16.9 60 190 – 193 19.5 70 223 – 229 21.8 80 254 – 270 24.2 90 286 – 315 26.5 100 317 – 363
MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO (1995).
21
A secagem posterior é condição imprescindível para a obtenção de um bom
produto. O pescado úmido quando submetido ao processo de defumação tem a
umidade de sua superfície evaporada, ocorrendo a condensação abundante de
fumaça e conferindo-lhe cor marrom-escura desagradável. Para prevenir é
imprescindível a secagem do pescado (GONÇALVES, 1998).
O pescado ligeiramente defumado precisa ter de 2 a 3% de sal, de modo a
apresentar sabor aceitável e bom aspecto superficial (GONÇALVES, 1998). Na
secagem ocorre desidratação superficial do pescado (5 a 20%), tornando-o mais
resistente e criando uma película pegajosa e lustrosa sobre a superfície (proteínas
coaguladas) que, na defumação, impedirá a perda excessiva de substâncias
intrínsecas além de conferir coloração peculiar dos produtos defumados (MORAIS e
ESPÍNDOLA FILHO, 1995).
O tempo de secagem depende da temperatura e da umidade relativa do ar
dentro do defumador. Se forem altas ocorrerá o enfraquecimento do tecido conectivo
do pescado, devido à degradação térmica do colágeno (MORAIS e ESPÍNDOLA
FILHO, 1995).
Concluído o período de secagem, o pescado desidratado apresenta, em sua
carne, o teor de umidade em torno de 8 a 12% e rendimentos na faixa de 22 a 30%,
em relação ao seu peso antes da operação de secagem (MORAIS e ESPÍNDOLA
FILHO, 1995).
Na defumação propriamente dita, o objetivo do processo é expor o pescado
à fumaça. O tipo de defumação a ser utilizado leva em conta necessidades
diferentes de estabilidade do produto e hábitos alimentares locais, ou seja, produto
com características sensoriais aceitas pelo mercado consumidor.
Na defumação ocorre maior desidratação e a absorção dos compostos da
fumaça os quais irão conferir ao pescado sabor e cor característicos (GONÇALVES,
1998; EVANGELISTA, 2001).
2.5.3. Tipos de defumação
Existem dois métodos convencionais de defumação comumente conhecidos:
“a frio” e “a quente”, dependendo da temperatura em que se encontra a câmara de
defumação. Vale ainda ressaltar o uso da fumaça líquida, o método eletrostático e a
elaboração de produtos defumados condimentados.
22
O método tradicional para conferir sabor, aroma e cor de defumado a
pescados é realizado por contato direto com a fumaça gerada pela queima da
serragem. O método tradicional tem alguns inconvenientes, principalmente com
relação à falta de controle do sabor e cor pela grande variação da fumaça gerada no
defumador (ADICON, 1996).
O rendimento dos produtos pesqueiros defumados é variável com o tipo de
produto e com o método de defumação. Segundo OGAWA e MAIA (1999), peixes
como arenque podem apresentar rendimentos de 51 a 78% para exemplares
grandes, 42 a 76% para exemplares médios e de 39 a 75% para os pequenos, caso
o período de defumação ocorra de um a cinco dias. Para peixes nacionais como o
surubim inteiro e eviscerado, estes mesmos autores relatam que os rendimentos
encontrados situam-se em torno de 40-50%.
Segundo BRESSAN e PEREZ (2000), o tipo de pescado adequado à
defumação deve possuir de 7 a 15% de gordura, pois as gotículas de gordura
ajudam na retenção dos compostos aromáticos da fumaça.
2.5.3.1. Defumação a quente
A defumação a quente em torno de 70 a 130oC (T>40oC) é usada quase que
exclusivamente para produtos cárneos submetidos à salga. Esse método tem como
objetivo principal proporcionar sabor característico de defumado ao produto final
(OGAWA e MAIA, 1999). A temperatura a ser alcançada no defumador irá depender
de cada produto. Este processo pode ser dividido em três fases: pré-aquecimento,
dessecação e acondicionamento (GONÇALVES e PRENTICE-HERNÁNDEZ, 1998).
Na primeira fase, a temperatura atinge, aproximadamente, 60oC num
período de 1 hora e 30 minutos, tendo somente uma fonte de calor (carvão, por
exemplo). Nesta fase deve-se evitar o cozimento excessivo da carne com
conseqüente eliminação de gordura e depreciação do aspecto do produto
(GONÇALVES, 1998).
Na segunda fase, a temperatura chega a 100oC por 1 hora e 30 minutos, e a
terceira fase tem início quando o pescado estiver com a carne avermelhada e bem
seca. O pescado deve ficar exposto à fumaça por tempo suficiente para dar a cor
desejada ao produto, o que ocorre com a sedimentação e queima progressiva das
23
substâncias da fumaça que se fixam a altas temperaturas na superfície do pescado.
Este tempo pode variar de 2 a 16 horas. Os produtos obtidos neste tipo de
defumação têm vida útil curta, porém podem ser consumidos sem necessidade de
cozimento (WARD, 1995; GONÇALVES, 1998).
Segundo OGAWA e MAIA (1999), a temperatura da fumaça neste método é
de 50 a 70oC, podendo, muitas vezes, atingir 90oC, sendo que o período de
exposição do peixe à ação da fumaça fica em torno de 3 a 8 horas. Objetivando
ação mais preservativa, esse período pode ser ampliado para dois ou três dias.
A umidade final do produto varia de 55 a 65%, enquanto o seu conteúdo de
sal é de 2,5 a 3,0%. Teores acima deste prejudicam o sabor do produto. Com estes
parâmetros, a carne se apresenta macia e de boa consistência para o consumo,
embora possa apresentar rachaduras (OGAWA e MAIA, 1999).
As temperaturas elevadas utilizadas na defumação a quente também
exercem uma significativa ação sobre os microrganismos contaminantes (SILVA,
2000; KOLODZIEJSKA et al., 2002).
O pescado defumado a quente deve ser resfriado, pelo menos à temperatura
ambiente, de preferência em câmara de refrigeração (0oC), antes de ser embalado.
Em situações em que o produto defumado é embalado ainda quente, é observada
redução na vida-de-prateleira, pois as condições de umidade e temperatura são
propícias para o crescimento de bolores na superfície do mesmo (MORAIS e
ESPÍNDOLA FILHO, 1995).
Na defumação a quente, os efeitos da temperatura, concentração de sal,
componentes da fumaça e o processo de secagem contribuem para a estabilidade
microbiana do produto. Aliado a estes fatores, a baixa temperatura de refrigeração
propicia eficiência na estocagem (KOLODZIEJSKA et al., 2002).
2.5.3.2. Defumação a frio
A defumação a frio é desenvolvida numa faixa de temperatura de 15-30oC
(T<40oC), por quatro a seis semanas. Foi desenvolvida principalmente com
finalidade preservativa, e não somente para modificar a qualidade do alimento como
aroma, sabor e textura (GONÇALVES, 1998; GONÇALVES e PRENTICE-
HERNÁNDEZ, 1998). Estes produtos têm longa duração, mas exigem cocção antes
de serem consumidos (MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO, 1995; GONÇALVES, 1998).
24
A umidade relativa dentro do forno deve ser sempre ligeiramente inferior à
atividade da água (aW) do produto, possibilitando lenta transferência da água e a
não-formação de uma capa seca protetora impedindo a maturação de dentro para
fora. A temperatura pode atingir 18oC na primeira semana, 22oC na segunda
semana e 25oC no final do processo. Os principais produtos obtidos com a
defumação a frio são os embutidos (cozidos) e os presuntos crus (ou em suas
variedades) (EVANGELISTA, 1992; MORAIS, 1994; MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO,
1995; WARD, 1995; GONÇALVES, 1998).
Na Tabela 9, são apresentados dados comparativos entre a defumação a
quente e a defumação a frio.
Tabela 9 - Parâmetros comparativos entre os métodos de defumação a frio e a quente
de produtos cárneos
Parâmetros Métodos de defumação a quente a frio
Grau de saturação da salmoura 70 a 80% 90 a 100%
Temperatura de defumação 65 a 120oC < 40oC Período de defumação 4 a 6 horas 4 a 6 semanas
Necessidade de dessalga antes da utilização do produto para consumo
sem dessalga
com dessalga
Teor de sal do produto 4% 7 a 15%
Umidade final do produto 60 a 70% 45 a 55%
Vida útil do produto (estabilidade) menor maior
Presença de substâncias carcinogênicas maior menor
MORAIS e ESPÍNDOLA FILHO (1995); OGAWA e MAIA (1999); EVANGELISTA (2001). 2.5.3.3. Defumação eletrostática
25
A deposição eletrostática de partículas de fumaça de madeira tem sido
usada em alguns produtos pesqueiros. Embora para alguns autores o produto final
seja de boa qualidade, do ponto de vista econômico só são recomendáveis quando a
produção se faz em larga escala, e quando as peças a defumar sejam uniformes em
forma e tamanho (OGAWA e MAIA, 1999: EVANGELISTA, 2001).
Este processo oferece vantagem econômica e consiste em ativar o depósito
das partículas de fumaça carregadas de eletricidade e depositá-las sobre o produto
a defumar. Entretanto alguns pontos do método são questionáveis, como, sabores
indesejáveis introduzidos no produto, maior concentração de substâncias
potencialmente carcinogênicas incorporadas ao defumado, aumento de risco à
saúde das pessoas que operam as máquinas e o aumento do custo de
processamento em função de aquisição de equipamentos específicos (OGAWA e
MAIA, 1999).
2.5.3.4. Uso de aroma natural de fumaça
A defumação convencional de alimentos está sendo substituída pelo
emprego de fumaças líquidas saborizantes, ou aroma natural de fumaça. Dentre as
vantagens desta tecnologia estão a higiene, menor tempo de processamento, menor
poluição ambiental, além da existência de variedades de fumaças, podendo-se obter
produtos com diferentes propriedades organolépticas (GUILLÉN et al., 1996).
As fumaças saborizantes naturais eliminaram muitos dos problemas
associados com o método tradicional de defumação direta, proporcionando
uniformidade de sabor e cor, deposição de substâncias antioxidantes e
antimicrobianas, baixa concentração de compostos indesejáveis como
hidrocarbonetos poliaromáticos (3,4-benzo(a)pireno), e facilidade de aplicação,
podendo, portanto, ser utilizada pelo consumidor e pela indústria (GONÇALVES e
PRENTICE-HERNÁNDEZ, 1998; SILVA, 2000). Estima-se que a cada 10 produtores
de carne defumada nos Estados Unidos, sete empregam fumaça líquida no
processamento (GUILLÉN et al., 1996).
Os processos de obtenção da fumaça líquida iniciam-se a partir da queima
da madeira. Um dos procedimentos de obtenção consiste na simples condensação
da fumaça, gerada na queima da madeira, dando lugar a um condensado no qual
26
podem ser eliminados os hidrocarbonos e o alcatrão. Outro procedimento consiste
em reter os componentes da fumaça em suportes físicos, utilizados na fabricação do
alimento defumado. Como suporte líquido empregam-se: água, azeite, vinagre ou
soluções hidroalcoólicas. Como suporte sólido tem-se o açúcar, amido, dextrina,
goma arábica, sais, hidrolisados de proteína e sistemas coloidais, como a gelatina
(PSZCZOLA, 1995; SCHINDLER, 1997; SILVA, 2000).
Os métodos tradicionais de defumação podem, ocasionalmente, contaminar
os alimentos com hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA’s), de modo que o
uso da fumaça líquida tem sido sugerido como uma alternativa para se evitar este
problema. Devido principalmente a esta qualidade, estudos dos componentes da
fumaça e dos condensados da fumaça têm sido objeto de interesse constante de
pesquisadores (GUILLÉN e MANZANOS, 1996; 1997; GONÇALVES, 1998;
HATTULA et al., 2001).
Para a defumação do pescado, a fumaça líquida, ou aroma natural de
fumaça, pode ser aplicada diretamente na salmoura ou na superfície da matéria-
prima. Diluída na salmoura (imersão), proporciona a penetração do sabor no interior
dos tecidos do pescado, enquanto que a aplicação superficial, por aspersão ou
atomização, produz, além do sabor, coloração dourada e brilhante na superfície do
pescado (ADICON, 1996; SCHINDLER, 1995; 1997; SILVA, 2000).
No processo de imersão, a fumaça líquida é adicionada na salmoura
utilizada para a salga de peixes. O nível de fumaça líquida recomendada é de 0,2
até 0,5% (peso/volume) na proporção de pescado:salmoura (1:2). A concentração
final de fumaça líquida depende fundamentalmente das preferências de sabor do
mercado a que se destina o produto final (SCHINDLER, 1995; ADICON, 1996;
GONÇALVES, 1998). O pescado retirado da salmoura deve ser colocado em
bandejas teladas para eliminar o excesso da mesma (GONÇALVES, 1998), para
então passar pelo tratamento térmico usual (SCHINDLER, 1995; ADICON, 1996;
GONÇALVES, 1998).
No processo de aspersão da fumaça líquida diretamente no pescado, após o
tratamento com salmoura (sem fumaça), o pescado é pré-seco até a obtenção de
superfície pegajosa (OETTERER, 1995). Esta pré-secagem é necessária para
eliminar a umidade superficial do pescado, reter a fumaça na superfície e ajudar na
solubilização da proteína da superfície, obtendo-se um acabamento brilhante do
produto (ADICON, 1996). Resultado satisfatório foi obtido por GONÇALVES (1998),
27
que utilizou estufa com circulação forçada de ar a 50oC por 45 minutos para a
secagem de filés de anchova (Pomatomus saltatrix).
Posteriormente à pré-secagem, faz-se a aspersão da solução de fumaça
durante um período de 30 a 60 segundos, dependendo do grau de sabor e cor do
defumado desejado. A partir de então, o pescado é submetido à secagem
propriamente dita (SCHINDLER, 1995; ADICON, 1996; GONÇALVES, 1998).
A utilização de fumaça líquida ou aroma natural de fumaça tem uma série de
vantagens quando comparada com outros métodos de defumação (PSZCZOLA,
1995; SCHINDLER, 1995; 1997; GUILLÉN et al., 1996).
Com relação ao procedimento de defumação propriamente dito, podem ser
citadas razões econômicas como as instalações e os geradores de fumaça, razões
ecológicas e higiênico-sanitárias (SILVA, 2000; HATTULA et al., 2001), versatilidade
de aplicação gerando melhor controle da qualidade sensorial, e a possibilidade de
emprego pelo consumidor e pelas indústrias (GONÇALVES, 1998; SILVA, 2000).
As vantagens relacionadas à qualidade do defumado final são descritas
como o controle das substâncias que se incorporam nos alimentos gerando produtos
uniformes em cor e sabor de defumado, a utilização de variedade de perfis
aromáticos comerciais, possibilidade de variação da intensidade de aplicação da
fumaça, e a baixa concentração de compostos indesejáveis, hidrocarbonetos
poliaromáticos (HPA’s) nos aromas naturais de fumaça comercializados
(GONÇALVES, 1998; SILVA, 2000; EVANGELISTA, 2001).
Em estudo da utilização da fumaça líquida como método alternativo de
substituição à defumação tradicional, HATTULA et al. (2001) concluíram que não
houve diferença sensorial dos filés nos métodos de defumação avaliados, e que o
conteúdo de hidrocarbonetos poliaromáticos foi menor nos peixes defumados com a
fumaça líquida do que os defumados pelo método tradicional.
A fumaça líquida também pode ser aplicada a uma variedade de alimentos
que tradicionalmente não são defumados (sopas, vegetais enlatados, temperos),
além do aproveitamento da ação antioxidante e antimicrobiana de determinados
componentes do aroma (ADICON, 1996; GONÇALVES, 1998).
2.6. Microbiologia geral de pescados
28
A higiene dos alimentos cada vez mais assume importante papel na
produção de alimentos para o consumo humano, principalmente porque vários
estudos têm demonstrado que inúmeros produtos alimentícios, em particular os de
origem animal, encontram-se contaminados por microrganismos causadores de
intoxicações alimentares, visto que os próprios mamíferos, aves e peixes, albergam
estes microrganismos (SOUZA e LIMA, 1993).
Os microrganismos podem desempenhar papéis importantes no que se
refere aos alimentos, sendo possível classificá-los em três grupos distintos: os
causadores de alterações químicas prejudiciais, resultando na deterioração
microbiana; os que podem representar riscos à saúde humana, genericamente,
denominados patogênicos; e os que causam alterações benéficas em um
determinado alimento.
Os denominados patogênicos podem afetar tanto o homem quanto os
animais. As características das doenças que estes microrganismos causam
dependem de uma série de fatores inerentes ao alimento, ao microrganismo e ao
indivíduo a ser afetado.
Segundo HOBBS e ROBERTS (1998), sob condições ideais as bactérias
podem se dividir a cada 20 minutos. Desta forma, uma simples bactéria poderá se
transformar, dentro de sete horas, em, aproximadamente, dois milhões de bactérias.
LEITÃO e SILVEIRA (1993) ressaltam que o pescado tem, naturalmente,
flora microbiana própria da espécie, associada com as condições de equilíbrio
ecológico no ambiente de criação ou na natureza. Esta flora microbiana pode trazer
conseqüências durante a comercialização e processamento. A intensidade da ação
dos microrganismos é também conseqüência das condições em que é mantido o
produto, desde sua captura até o início da comercialização.
Segundo OGAWA e MAIA (1999), os músculos, órgãos e líquido corporal de
peixes vivos saudáveis são assépticos, enquanto que a pele e guelras, que têm
contato direto com a água, apresentam razoável nível de contaminação,
especialmente por bactérias. Quando o pescado marinho é capturado, a
contaminação a bordo pode atingir 105 a 106/cm2. Entretanto, se o pescado passar
por boa lavagem com água do mar, a contaminação por bactérias pode ser reduzida
a 1/10 quando comparada ao momento antecedente ao da lavagem.
29
O desenvolvimento dos microorganismos pode ser afetado por diversos
fatores ambientais, sendo os mais importantes: água disponível, temperatura, tensão
de oxigênio, pH, disponibilidade de nutrientes e fatores antimicrobianos.
O pescado é um dos produtos de origem animal mais susceptível ao
processo de deterioração, principalmente por apresentar pH próximo à neutralidade,
elevada atividade de água nos tecidos, alto teor de nutrientes facilmente utilizáveis
pelos microorganismos, acentuado teor de fosfolipídios e rápida ação destrutiva das
enzimas presentes nos tecidos e vísceras dos peixes (OGAWA e MAIA, 1999;
BRESSAN e PEREZ, 2000).
A intoxicação alimentar ocorre após a ingestão de alimentos contaminados
com certas bactérias, e é descrita como distúrbio do trato gastrintestinal com
diarréia, náusea e vômito, com o aparecimento ou não de febre (HOBBS e
ROBERTS, 1998; SIQUEIRA, 1995). O período de incubação pode ser curto, de 1
hora a 24-48 horas, ou mais longo, dependendo do organismo responsável, de sua
quantidade no alimento, ou da quantidade de toxina ingerida. A idade e condições
individuais do consumidor são fatores que interferem no período de incubação,
sintomas e grau de severidade (HOBBS e ROBERTS, 1998).
No Brasil, o regulamento técnico sobre padrões microbiológicos para
pescados e produtos de pesca está definido na Resolução RDC no 12, de 2 de
janeiro de 2001 (ANVISA, 2001). Para pescado in natura, resfriados ou congelados
não consumido cru é definido a tolerância de 103 Unidades Formadoras de Colônias
(UFC) para estafilococos de coagulagem positiva/g de amostra e ausência de
Salmonella sp. em 25 gramas (alínea a do item sete). O pescado defumado tem que
apresentar ausência de Salmonella sp. em 25 gramas, e limites máximos de 102
UFC para coliformes a 45oC/g de amostra, e 103 UFC para estafilococos de
coagulagem positiva/g de amostra (alínea d do item sete).
Os gêneros Escherichia, Enterobacter, Citrobacter e Klebsiella formam o
grupo denominado coliforme. Estas bactérias são Gram-negativas, com formato de
bastonete curto, não esporulantes, anaeróbicas facultativas e apresentam
temperatura ótima de crescimento entre 32 e 37oC (SIQUEIRA, 1995), são
encontradas no trato intestinal de animais, inclusive do homem, no entanto,
Enterobacter, Citrobacter e Klebsiella podem persistir longos períodos e se
multiplicarem em ambientes não fecais (HOBBS e ROBERTS, 1998;
EVANGELISTA, 2002).
30
Na contagem de coliformes pode-se diferenciar dois grupos: coliformes totais
e coliformes fecais. O índice de coliformes totais é utilizado para avaliar as
condições higiênicas, e sua presença em alta quantidade sugere contaminação pós-
processamento, limpeza ou condições sanitárias deficientes, tratamento térmico
ineficiente, ou multiplicação durante o processamento ou estocagem.
O índice de coliformes fecais, formado principalmente por Escherichia coli, é
empregado como indicador de contaminação fecal, indicando condições higiênico-
sanitárias deficientes (LEITÃO et al., 1985; SIQUEIRA, 1995). A água, os alimentos
crus e as fezes são fontes destes organismos, e a quantidade de E. coli auxilia na
avaliação do perigo potencial da água e dos alimentos fornecidos ao consumo
humano (HOBBS e ROBERTS, 1998)
Alguns sorotipos de E. coli são responsáveis por gastroenterites agudas,
com presença de sangue e muco nas fezes, especialmente em crianças, idosos e
convalescentes, sendo a diarréia o principal sintoma, com tempo de incubação de 6
a 36 horas e duração de três dias (HOBBS e ROBERTS, 1998).
Bactérias do grupo Salmonella podem ser encontradas em solos, ar, água,
animais (inclusive o homem), alimentos, fezes e equipamentos usados no
processamento dos alimentos (SIQUEIRA, 1995). A transmissão de salmonelas está
relacionada com alimentos de origem animal. São transferidas dos alimentos crus
para os cozidos através das mãos, superfícies, utensílios e outros equipamentos
(HOBBS e ROBERTS, 1998).
Presume-se que todas as espécies de salmonelas sejam patogênicas ao
homem e, de acordo com a sintomatologia, elas podem ser separadas em dois
grupos. As que causam febre tifóide e paratifóide causadas por Salmonella typhi e S.
paratyphi. A febre tifóide é mais grave do que a febre paratifóide e é caracterizada
por septicemia, com febre contínua, cefaléia e diarréia. Tem período de incubação
de 7 a 21 dias; e as que causam infecções entéricas, Salmonella sp., provocando
sintomas de dores abdominais, diarréia, febre, vômito e prostração, porém
raramente são fatais. O período de incubação geralmente é de 12 a 24 horas,
podendo ocorrer entre 5 a 72 horas. Estas últimas são agentes de intoxicações
alimentares (SIQUEIRA, 1995; HOBBS e ROBERTS, 1998).
As doenças ocorrem quando um grande número de microrganismos é
ingerido (Salmonelas), através do consumo de alimentos expostos, por algumas
31
horas, à temperatura ambiente, condição favorável à sua multiplicação (HOBBS e
ROBERTS, 1998).
Staphylococcus aureus é uma bactéria que habita as cavidades nasais,
garganta e trato intestinal dos animais. Alimentos de origem animal industrializados,
carnes, ovos, pescado, massas, cremes, maioneses e doces de confeitaria são
substratos comuns para o desenvolvimento de S. Aureus (SIQUEIRA, 1995).
A presença desta bactéria nos alimentos sugere contaminação a partir da
pele, boca, e das fossas nasais dos manipuladores de alimentos, bem como da
limpeza inadequada dos equipamentos e dos materiais utilizados no processamento
(SIQUEIRA, 1995; HOBBS e ROBERTS, 1998).
O principal problema relacionado à presença de S. aureus é a liberação de
uma enterotoxina que pode causar intoxicação no homem quando presente entre
0,015 e 0,357 µg / Kg de peso corporal. Esta toxina pode ser parcialmente inativada
por cocção, pasteurização e tratamentos térmicos (SIQUEIRA, 1995). O período de
incubação é, em geral, de 2 a 4 horas após a ingestão do alimento contaminado, e
os sintomas apresentados são náuseas, vômitos, diarréia, contrações abdominais e
cefaléia, com duração de um a dois dias (SIQUEIRA, 1995; HOBBS e ROBERTS,
1998).
O Clostridium perfringens, comumente encontrada nos solos, água, poeira e
fezes de animais, pode causar deterioração em alimentos e intoxicação alimentar
(HOBBS e ROBERTS, 1998). Desenvolve-se bem em carnes após o cozimento,
frango refrigerado, pasta de pescado e em alimentos aquecidos e resfriados
lentamente. A presença de C. perfringens em enlatados de baixa acidez indica que o
tratamento térmico foi mal conduzido e se detectado em baixo número sugere
higiene deficiente (SIQUEIRA, 1995; EVANGELISTA, 2002).
A contagem padrão em placas (PCA) tem sido usada como indicador da
qualidade higiênica dos alimentos, fornecendo também idéia sobre seu tempo útil de
conservação. A presença de microrganismos em grande número pode ser
proveniente de matéria-prima excessivamente contaminada, inadequada limpeza e
desinfecção de superfícies, higiene inadequada na produção, condições
inadequadas de tempo/temperatura durante a produção ou a conservação dos
alimentos, ou ainda uma combinação destas circunstâncias (SIQUEIRA, 1995).
Se o processamento ou manipulação for inadequado sob o ponto de vista
sanitário, os produtos acabados podem se tornar contaminados, inclusive com
32
microrganismos produtores de toxinfecções, sendo necessário que se tenha controle
da qualidade microbiológica da matéria-prima, do processamento e produto final
(SOUZA e LIMA, 1993). Segundo HOFFMANN et al. (1995), o elevado número de
bactérias aeróbias mesófilas pode acarretar diminuição da vida útil do produto.
Existem ainda outras bactérias, que apesar de menos abundantes, também
habitam o trato intestinal dos homens e podem ser encontradas em alimentos. As
espécies mais comuns são pertencentes aos gêneros Klebsiella, Enterobacter,
Proteus e Yersinia (HOBBS e ROBERTS, 1998; EVANGELISTA, 2002).
Casos de doenças transmissíveis por alimentos (DTA) são relatados a
qualquer tempo, sempre que há população suscetível em contatos com agentes
patogênicos em número suficiente para fazer acontecer a enfermidade. Hall (1997),
citado por MASSON e PINTO (1998), identifica que, dentre os fatores que
contribuem para o surgimento de DTA, estão a temperatura à qual o alimento está
exposto, o comportamento humano na higiene pessoal, falta de medidas preventivas
de controle e de informação ao consumidor e tecnologias de preparo e de
conservação do alimento não adequadas.
AQUINO et al. (1996) analisaram pescados congelados comercializados em
Manaus (AM), e os resultados obtidos evidenciaram deficiências na estocagem e
manipulação inadequada da matéria-prima, visto que o nível de contaminação
aumentou conforme o grau de manipulação.
3. MATERIAL E MÉTODOS
Os trabalhos foram conduzidos nos Laboratórios de Zootecnia e Nutrição
Animal (LZNA) e de Tecnologia de Alimentos (LTA) do Centro de Ciências e
Tecnologias Agropecuárias, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy
Ribeiro (UENF), no município de Campos dos Goytacazes (RJ), e na Peixaria da
Neide, no município de Itaocara (RJ), com apoio do Projeto Piabanha.
3.1. Rendimento de filé e resíduos (cabeça e vísceras)
Para a determinação do rendimento de filé e percentagem de cabeça foram
utilizados 98 exemplares de piau-vermelho (Leporinus copelandii) com peso acima
de 200g, capturados rotineiramente na região do baixo rio Paraíba do Sul por
pescadores mediante o uso de redes de emalhar. Os peixes utilizados foram
adquiridos já eviscerados e com cabeça. Cada exemplar foi pesado em balança com
aproximação de 1,0g e medido com auxílio de uma régua com aproximação de
0,1cm, e logo em seguida filetado por operador treinado da própria peixaria em
Itaocara (RJ). A cabeça, incluindo as brânquias, foi secionada do corpo na altura de
sua junção com a coluna vertebral, logo atrás do opérculo. Foram obtidos os valores
de peso total eviscerado (g), comprimento total (cm), peso de cabeça (g) e peso dos
filés com pele (g). Cada peixe foi considerado uma unidade experimental.
35
Para a determinação da percentagem de vísceras foram utilizados valores
obtidos na pesagem de 318 exemplares de piau-vermelho, sem evisceração,
coletados na região do baixo rio Paraíba do Sul, ao longo de 15 meses.
Os dados de rendimento de filé, percentagem de cabeça e percentagem de
vísceras foram submetidos à análise descritiva não paramétrica utilizando-se cálculo
de médias e Intervalo de Confiança (IC) em classes de peso total pré-determinadas.
Para a análise dos dados foram determinadas seis categorias de peso para os
exemplares de piau-vermelho: 200 a 400g; 401 a 500g; 501 a 600g; 601 a 700g; 701
a 800g; e exemplares com peso acima de 801g.
Foi feita correlação de Pearson (r) para as variáveis peso total, peso de filé,
peso de vísceras, e peso de cabeça.
3.2. Defumação
A matéria-prima utilizada foi o filé de piau-vermelho congelado, adquirido nas
peixarias do município de Itaocara (RJ), tal como é comercializado. A fumaça líquida
natural, SMOKEZ 1517-IC, indicada para o processo de defumação líquida
(ADICON, 1996), obtido da pirólise controlada da madeira, hickory, disperso em
água para uso externo (imersão ou aspersão), foi doado pela ADICON Indústria e
Comércio de Aditivos Ltda, localizada em São Bernardo do Campo, SP.
O processo de defumação com aroma natural de fumaça (defumação
líquida) de filés de piau-vermelho foi realizado de acordo com o protocolo descrito
por GONÇALVES e PRENTICE-HERNÁNDEZ (1998).
Os filés foram descongelados e lavados com água em abundância para a
remoção de possíveis resíduos de sangue e escamas. Para os filés que
necessitaram remoção mais efetiva do sangue, foi utilizada uma solução de
salmoura contendo 3,0% de Cloreto de Sódio (NaCl). A salmoura foi colocada em
recipiente plástico com capacidade de 10 litros. Conforme a necessidade de mais
esforços para a remoção total dos resíduos de sangue, os filés foram submergidos e
lavados na salmoura (GONÇALVES, 1998).
Para a defumação com aroma natural de fumaça, o pescado foi submetido,
inicialmente, à salga, feita pela imersão dos filés em salmouras. O sal utilizado na
preparação das salmouras sofreu esterilização pelo calor à temperatura de 100oC
durante 15 minutos (MORAIS et al., 1996).
36
A aplicação do aroma natural de fumaça foi feita em dois processos: Processo
de Imersão (T1), Processo de Aspersão (T2).
T1 - Adição do aroma natural de fumaça na salmoura, na fase de salga;
T2 - Aspersão do aroma natural de fumaça diretamente na superfície dos filés, após
a salga.
T 1 - Processo de Imersão
Na fase de salga os filés de piau-vermelho descongelados foram imersos em
salmoura com 15% de NaCl, na proporção de pescado:salmoura 1:2 (p/v), contendo
aroma natural de fumaça na concentração de 0,2% durante 10 minutos. Com
objetivo de uniformizar a penetração de sal nos filés foi realizada agitação manual
dos filés submergidos na salmoura. Após esta fase, os filés foram colocados em
bandejas teladas para a eliminação do excesso de salmoura.
T 2 - Processo de Aspersão
Para a fase de salga os filés foram imersos em salmoura com 15% de NaCl,
na proporção de pescado:salmoura 1:2 (p/v), durante 10 minutos. Para a
uniformização da penetração do sal, os filés submergidos na salmoura foram
agitados manualmente. Após esta fase, os filés foram colocados em bandejas
teladas para escorrer o excesso de salmoura e levados à estufa com circulação de
ar forçada para a pré-secagem (50 oC por 45 minutos). Posteriormente à pré-
secagem, as bandejas teladas contendo os filés foram retiradas da estufa. Com
auxílio de um borrifador manual, uma solução de 20% de aroma natural de fumaça
foi aspergida nos dois lados dos filés, durante 30 segundos.
Os filés, depois de submetidos aos diferentes tratamentos, foram colocados
em bandejas teladas e submetidos à secagem em estufa com circulação forçada de
ar. O processo de secagem (tempo-temperatura) seguiu a especificação do
fabricante do aroma natural de fumaça (ADICON, 1996), que consistiu das seguintes
etapas:
- Os filés foram submetidos, durante 30 minutos, a temperatura de 54 oC;
- Elevou-se, a cada 30 minutos, a temperatura da estufa em 17oC, até que a
temperatura interna dos filés, medida com auxílio de termômetro inserido na
musculatura do filé, atingisse 82oC;
37
- Após atingirem temperatura interna igual à 82oC, os filés foram mantidos na
estufa ligada por 30 minutos.
3.2.1. Análise microbiológica Foram realizadas análises microbiológicas dos filés in natura e dos filés
processados com aroma natural de fumaça por aspersão e imersão.
Foram pesados 25g de filé, transferidos para frasco Erlenmeyer contendo
225mL de solução salina-peptonada (Cloreto de sódio: 8,5g + Peptona 1,0g + Água
destilada 1000ml), e, após homogeneização, obteve-se diluição 1:10 (10-1). A partir
desta, foram preparadas as demais diluições decimais seriadas empregadas para as
determinações microbiológicas, segundo recomendação das metodologias oficiais
para pescado congelado, descritas em SIQUEIRA (1995) e ROSSONI (1988), com
diluições de 1:100 (10-2); 1:1.000 (10-3); 1:10.000 (10-4); 1:100.000 (10-5).
Foi realizada a contagem padrão dos seguintes microrganismos: bactérias
aeróbias mesófilas, enterobactérias, coliformes a 45 oC, Escherichia coli,
Staphylococcus sp., e Salmonella, conforme Portaria no 451, de 19 de setembro de
1997 da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária/MS e Resolução - RDC No 12,
de 2 de janeiro de 2001 (ANVISA, 2001)
Para todas as contagens padrões em placas utilizou-se cinco amostras,
cada uma representada por um pool de três filés, com três repetições para cada
diluição. Foram consideradas as contagens das diluições que apresentavam entre
30 e 300 UFC/g (Unidades Formadoras de Colônias/ g de amostra).
- Contagem total de microrganismos aeróbios mesófilos
Foi utilizado ágar padrão para contagem (PCA) como meio de cultura e
plaqueamento por profundidade, com incubação a 35oC por 48 horas.
- Contagem de Staphylococcus sp.
Foi utilizado ágar Baird-Parker como meio de cultura e plaqueamento em
superfície, com incubação a 35oC por 48 horas. As unidades formadoras de colônias
foram identificadas pela coloração creme.
- Contagem de coliformes a 45oC, Enterobactérias, Escherichia coli e Salmonella sp.
38
Foi utilizado Chromocult como meio de cultura e plaqueamento em
superfície, com incubação a 35oC por 48 horas. As unidades formadoras de colônias
foram identificadas segundo coloração específica: coliformes totais (roxo),
Enterobactérias (creme), E.coli (marrom com alo claro) e Salmonella (verde).
Todos os utensílios utilizados foram desinfetados com solução de água
clorada (50 ppm de cloro).
3.2.2. Análise química
Para as análises químicas do filé de piau-vermelho in natura e do filé
defumado pelos tratamentos de Imersão e Aspersão, foram utilizadas cinco
amostras, compostas cada uma por um pool de cinco filés. As amostras foram
trituradas em multiprocessador, analisadas em triplicata, e determinada a
composição química, com resultados expressos como média para as variáveis:
matéria seca (%), umidade (%), proteína bruta (N x 6,25) (%), extrato etéreo (%) e
cinzas (%) (SILVA, 1998). Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância
(ANOVA) e as médias comparadas pelo teste Tukey (P ≤ 0,05).
Na determinação de cloreto de sódio, foi utilizado o método de determinação
rápida de sal em carnes descrito por PEARSON (1976). Os dados obtidos foram
submetidos à análise de variância e comparação de médias pelo teste t (P ≤ 0,05).
3.2.3. Análise sensorial
Para avaliar os efeitos do processamento de filés de piau-vermelho com
aroma natural de fumaça por imersão e aspersão em relação às suas propriedades
sensoriais, foi utilizado o teste afetivo de aceitação, constituído de uma escala
hedônica de nove pontos variando de “gostei extremamente” (9 pontos) até
“desgostei extremamente” (1 ponto) (CHAVES e SPROESSER, 1996) (Tabela 1A,
apêndice). Os parâmetros avaliados foram: aroma, cor, textura, aparência e sabor.
As amostras foram julgadas por 50 provadores não treinados. As amostras
foram aquecidas em forno microondas (30 segundos em potência média), e
mantidas em caixas térmicas para a degustação.
Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e as
médias comparadas pelo teste t (P ≤ 0,05).
39
3.3. Comparação entre espécies: piau-vermelho e tilápia
Para a comparação com o piau-vermelho foi utilizada a Tilápia por ser um
peixe padrão em relação à sua produção, comercialização e qualidade.
Mundialmente reconhecida por apresentar carne sem espinho, de cor branca, textura
firme, aspecto fibroso e suculento e de sabor delicado, a tilápia é um peixe destinado
aos bons “gourmet”, se ajustando aos mais diferentes tipos de temperos e formas de
preparo e apresentação.
Foram utilizados, como matéria-prima, filés congelados de piau-vermelho
adquiridos em peixaria do município de Itaocara (RJ), e filés de tilápia congelados
fornecidos por aquicultor do município de Campos dos Goytacazes (RJ). Os filés
foram submetidos a dois tratamentos: fritura e defumação. Um lote de 2,5kg de filé
de cada espécie foi descongelado e submetido à fritura convencional em óleo de
soja refinado. Um lote de 3,5kg de filé de piau-vermelho, e um lote de 6,0kg de
tilápia foram submetidos à defumação por aspersão de aroma natural de fumaça em
sua superfície.
Para a fase de salga os filés de piau-vermelho e de tilápia foram imersos em
salmoura, separadamente, em recipiente plástico de capacidade de 10 litros. A
salmoura utilizada apresentou concentração de 4% de NaCl, na proporção de
pescado:salmoura (1:2). Os filés ficaram submersos durante 15 minutos, sendo
mexidos manualmente para uniformizar a penetração do sal (MORAIS et al., 1996).
Após este processo, os filés foram colocados em bandejas teladas para
escorrer o excesso de salmoura, e, em seguida levados à estufa com circulação de
ar para a pré-secagem (50oC por 45 minutos). Posteriormente à pré-secagem, as
bandejas teladas contendo os filés foram retiradas da estufa. Com auxílio de um
borrifador manual, uma solução de 20% de aroma natural de fumaça foi aspergida
nos dois lados dos filés, durante 30 segundos. O processo de secagem seguiu o
protocolo descrito acima no item 3.2. - secagem.
3.3.1. Análise química
Para a análise química centesimal dos filés fritos e defumados de piau-
vermelho e de tilápia as amostras foram trituradas em multiprocessador, analisadas
em triplicata, para a determinação da composição química das seguintes variáveis:
40
matéria seca (%), umidade (%), proteína bruta (N x 6,25) (%), extrato etéreo (%) e
cinzas (%) (SILVA, 1998). Foi utilizado delineamento inteiramente casualizado em
esquema fatorial 2x2 (espécie x modo de preparo), com três repetições. Os dados
obtidos foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e as médias comparadas
pelo teste Tukey (P ≤ 0,05).
3.3.2. Análise sensorial
Para avaliar o efeito da espécie nas características aroma, cor, aparência e
sabor, foi utilizado o teste afetivo de aceitação, constituído de uma escala hedônica
de nove categorias (9 = gostei extremamente; 5 = indiferente; 1 = desgostei
extremamente) (CHAVES e SPROESSER, 1996) (Tabela 2A, apêndice). Foram
realizados dois experimentos (peixes fritos, peixes defumados), em delineamento
inteiramente casualizado com dois tratamentos (piau-vermelho e tilápia) e 52
repetições. Os resultados foram submetidos à análise de variância (ANOVA), e a
comparação de médias feita pelo teste t (P ≤ 0,05).
Como teste de preferência para identificar se há diferença entre as espécies
quanto ao modo de preparo, foi utilizado o método de comparação pareada de
diferença simples (CHAVES, 1998), em delineamento inteiramente casualizado, com
dois tratamentos (frito, defumado) e 52 repetições. Os resultados foram analisados
pelo teste bilateral, p = ½, (P ≤ 0,05) (CHAVES, 1998).
Para o teste de aceitabilidade do produto com intenção de consumo foi
utilizada escala de atitudes com nove categorias (9 = comeria sempre; 5 = comeria,
mas não compraria; 1 = não comeria de jeito nenhum) (Tabela 3A, apêndice).
Utilizou-se delineamento inteiramente casualizado, com quatro tratamentos (piau
frito, tilápia frita, piau defumado, tilápia defumada) e 52 repetições. Os dados foram
submetidos ao teste Qui-quadrado χ2 (P ≤ 0,05), cuja hipótese de nulidade
representou a escolha ao acaso dos tratamentos nas categorias de intenção de
consumo, ou seja, igual intenção de consumo em todos os tratamentos.
A preferência pelo produto foi avaliada mediante teste de ordenação, no qual
cada provador enumerou as amostras (1 a 4) de acordo com a ordem de sua
preferência. Os dados foram submetidos ao teste Qui-quadrado χ2 (P ≤ 0,05), cuja
hipótese de nulidade representou a ordenação ao acaso dos produtos, ou seja,
preferência igual entre os produtos.
41
As amostras foram avaliadas por 52 provadores não treinados. Após o
processo de fritura, os filés foram mantidos em caixas térmicas até o momento da
degustação. Os filés, previamente defumados e mantidos sob refrigeração (sete
dias), no momento da degustação foram aquecidos em forno microondas (30
segundos em potência média) e mantidos em caixas térmicas.
42
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1. Rendimento de filé e resíduos (cabeça e vísceras)
A relação entre peso total (PT) e peso do filé (PF) foi determinada para
estimar a variação do peso do filé em função do peso total eviscerado, e a equação
que melhor expressa esta relação foi PF = 0,5598 PT + 4,029 (r = 0,9802) (Figura 1).
y = 0,5598x + 4,029
0
150
300
450
600
750
0 200 400 600 800 1000 1200 1400
Peso Total (g)
Peso
do
Filé
(g)
Figura 1 - Relação entre peso total (g) e peso de filé (g) de exemplares eviscerados
de piau-vermelho (Leporinus copelandii) coletados em ambiente natural. A relação entre peso total (PT) e peso da cabeça (Pca) foi determinada para
estimar a variação do peso da cabeça em função do peso total eviscerado, sendo
43
esta relação melhor expressa pela equação PCa = 0,1608 PT – 0,2965 (r = 0,9511)
(Figura 2).
y = 0,1608x - 0,2965
0
50
100
150
200
250
0 200 400 600 800 1000 1200 1400
Peso Total (g)
Peso
da
Cab
eça
(g)
Figura 2 - Relação entre peso total (g) e peso da cabeça (g) de exemplares eviscerados de piau-vermelho (Leporinus copelandii) coletados em ambiente natural.
A relação entre peso total (PT) e peso das vísceras (PV) foi determinada
para estimar a variação do peso das vísceras em função do peso total, sendo esta
relação melhor expressa pela equação PV = 0,1156 PT – 8,1284 (r = 0,8479) (Figura
3).
g) y = 0,1156x - 8,1284
0
100
200
300
0 500 1000 1500 2000
Peso Total (g)
Peso
das
Vís
cera
s (
Figura 3 - Relação entre peso total (g) e peso das vísceras (g) de exemplares de
piau-vermelho (Leporinus copelandii) coletados em ambiente natural.
44
As categorias de peso e os respectivos valores médios (± desvio padrão) do
rendimento de filé e percentual de cabeça dos exemplares de piau-vermelho
eviscerados, coletados em ambiente natural, estão descritos na Tabela 10. Os limites superior e inferior determinados pelo intervalo de confiança para
os valores médios de rendimento de filé e percentual de cabeça dos peixes
analisados se sobrepuseram, demonstrando que não houve diferença
estatisticamente significativa destas características para piau-vermelho em
diferentes classes de peso. Os exemplares analisados apresentaram peso total entre
200,0 e 1150,0g.
O valor médio para rendimento de filé de piau vermelho (peixe eviscerado e
com cabeça) coletado em ambiente natural variou de 55,5 a 57,7%.
O valor médio (± desvio padrão) da percentagem de cabeça de piau
vermelho foi igual a 16,1 ± 1,8% (n = 98; CV = 11,0%).
Em matrinxã (Brycon cephalus), foi observada diferença significativa entre os
valores médios de rendimento de cabeça de 14,64%, 14,07% e 12,36% para as três
classes de peso: 400 a 500g; 501 a 600g e 601 a 700g, respectivamente estudadas
(MACEDO-VIEGAS, 2000). Segundo o mesmo autor, o rendimento de cabeça de
matrinxã seguiu tendência inversa ao peso do peixe, ou seja, o menor rendimento de
cabeça foi observado para exemplares de 601 a 700g de peso. Relação inversa
entre tamanho da cabeça e rendimento de filé também foi observada por FARIA et
al. (2003) em estudo comparativo entre rendimento do processamento de tilápia (O.
niloticus) e pacu (Piaractus mesopotamicus). Esta tendência não foi corroborada no
presente estudo, pois não foi possível detectar diferenças significativas para estas
características entre as classes de peso estudadas. O valor médio de rendimento de
cabeça obtido para piau-vermelho (16,1%) foi superior ao encontrado na literatura
citada para outras espécies.
GONÇALVES et al. (2003), analisando características de carcaça de tilápias
(O. niloticus), sugerem que, independentemente do comprimento do peixe de sua
cabeça e altura, os rendimentos de filé e de carcaça não se alteram. Entretanto,
quando consideraram a porcentagem de cabeça em relação ao peso eviscerado,
estes autores observaram que os peixes maiores (536 e 746g) também
apresentaram menores valores de rendimento de cabeça (13%).
45
Tabela 10 – Valores médios (± desvio padrão) do peso da carcaça (g) (peixe eviscerado com cabeça), rendimento de filé (%), percentual de cabeça (%) e respectivos Intervalos de confiança (IC) em diferentes categorias de peso de carcaça de piau-vermelho (Leporinus copelandii) coletados em ambiente natural
Categorias de peso
(g)
N Peso da
Carcaça (g)
Rendimento de filé
(%)
IC1
(filé)
Percentual
de cabeça (%)
IC1
(cabeça)
200,0 a 400,0 26 326,9 ± 66,7 56,2 ± 6,1 ± 2,33 16,2 ± 1,7 ± 0,7
401,0 a 500,0 12 487,5 ± 22,6 57,2 ± 3,9 ± 2,20 16,4 ± 2,1 ± 1,2
501,0 a 600,0 21 581,4 ± 24,4 56,5 ± 4,9 ± 2,01 16,1 ± 2,0 ± 0,9
601,0 a 700,0 16 684,4 ± 23,9 57,6 ± 3,5 ± 1,69 15,7 ± 1,4 ± 0,7
701,0 a 800,0 11 772,7 ± 26,1 57,7 ± 3,0 ± 1,78 15,5 ± 1,6 ± 1,0
> 801,0 12 954,2 ± 101,0 55,5 ± 2,7 ± 1,51 16,2 ± 1,9 ± 1,1
Média 586,3 ± 210,1 56,7 ± 4,5 16,1 ± 1,8 1 IC do rendimento de filé e percentual de cabeça (P ≤ 0,05).
46
Nas espécies que realizam migração reprodutiva, ocorre acúmulo sazonal de
gordura na cavidade celomática (NIKOLSKI, 1963). Esta variação sazonal de
gordura foi observada em piau-vermelho (COSTA, 1999). Sendo assim, neste
estudo, foi considerada como peso das vísceras a porção composta pelo peso das
vísceras acrescida do peso da gordura celomática.
Os valores médios (± desvio padrão) relativos ao peso total, peso das
vísceras e percentual de vísceras de piau-vermelho coletados em ambiente natural
estão descritos na Tabela 11.
Os limites superior e inferior determinados pelo intervalo de confiança para
os valores médios de rendimento de vísceras dos peixes analisados se
sobrepuseram, demonstrando que não houve diferença estatisticamente significativa
desta característica para piau-vermelho em diferentes classes de peso.
O valor médio (± desvio padrão) do rendimento de vísceras de piau
vermelho foi igual a 9,3 ± 3,1% (n = 318; CV = 33,3%) para exemplares com peso
total entre 200,0 e 1.740,0 gramas.
Para peixes ósseos, em geral, as vísceras correspondem,
aproximadamente, a 11,0% do peso total (CONTRERAS-GUZMÁN, 1994).
Entretanto, em estudo sobre rendimento do processamento de matrinxã (Brycon
cephalus) MACEDO-VIEGAS (2000) observou diferença significativa para os valores
de percentagem de vísceras em diferentes classes de peso, correspondendo menor
valor igual a 8,38% para a classe de peso corporal de 400 a 500g, e maior valor
igual a 9,48% de vísceras para a classe de peixes pesando de 601 a 700g.
Para o piau-vermelho, o valor médio de 9,3% de rendimento de vísceras
encontra-se próximo dos valores descritos na literatura. Para uma estimativa do
valor de rendimento de filé com pele em relação ao peixe inteiro, utilizando-se a
porcentagem média estimada de vísceras, podemos considerar que o piau-vermelho
apresentou rendimento de filé entre 46,2% a 48,4% do peso total. No geral, os
valores de rendimento de filé com pele variam de 32,8% a 59,8%, com uma média
de 50,5% e, com a retirada da pele, este reduz para 43,0% (CONTRERAS-
GUZMÁN, 1994).
47
Tabela 11 – Valores médios (± desvio padrão) do peso total (g), peso de vísceras (g) e percentual de vísceras (%) em diferentes categorias de peso total, sem evisceração, de piau-vermelho (Leporinus copelandii) coletados em ambiente natural
Categorias de peso (g) n Peso Total
(g)
Percentual de
Vísceras (%)
IC1
(vísceras)
200,0 a 400,0 186 293,1 ± 55,6 9,0 ± 2,9 ± 0,4
401,0 a 500,0 59 447,2 ± 29,2 8,9 ± 3,3 ± 0,8
501,0 a 600,0 35 545,2 ± 30,1 10,6 ± 3,7 ± 1,2
601,0 a 700,0 16 634,8 ± 22,2 10,3 ± 2,4 ± 1,2
701,0 a 800,0 08 727,3 ± 18,6 10,1 ± 2,1 ± 1,5
Acima de 801,0 14 992,4 ± 240,6 10,8 ± 3,2 ± 1,7
Médias 408,3 ± 186,6 9,3 ± 3,1 1 IC do percentual de vísceras (P ≤ 0,05).
48
SANTAMARIA e ANTUNES (1999), quando compararam piracanjubas
(Brycon orbignyanus) silvestres e criadas em cativeiro, não observaram diferença
significativa para os valores obtidos de rendimento de filé igual a 40,5 ± 2% e 40,6 ±
2%, respectivamente. GARDUÑO-LUGO et al. (2003) também não encontraram
diferença significativa no rendimento de filé quando compararam o desempenho
entre exemplares selvagens e híbridos de tilápias, os quais apresentaram valores de
32,0 e 33,4% respectivamente. Mesmo não identificando diferenças entre origem
dos peixes para a característica rendimento de filé, estes valores estão abaixo do
obtido para piau-vermelho coletado em ambiente natural no presente estudo.
GURGEL e FREITAS (1972), avaliando a composição química de algumas
espécies de peixes de água doce do nordeste brasileiro e considerando a porção
comestível não somente os músculos, mas também ossos e espinhas, determinaram
para as espécies de piau (Leporinus spp.) por eles estudados valores de rendimento
da porção comestível entre 60 e 68%.
No pacu (Piaractus mesopotamicus), o rendimento de filé com pele foi de
51,60%, enquanto que o filé sem pele foi de 46,73% para exemplares com peso
médio de 1958,0g (FARIA et al., 2003). De acordo com CONTRERAS-GUZMÁN
(1994), peixes como o pacu apresentam altos rendimentos (>54%) devido à massa
muscular cilíndrica, enquanto que peixes comprimidos estão entre as espécies de
rendimentos mais baixos (inferiores a 42%).
Para tilápias, o resíduo, composto de cabeça, carcaça sem o filé,
costelas e espinhas com carne aderida, perfaz de 48 a 53% do peixe utilizado
no processamento industrial (KUBITZA, 2000). Segundo OGAWA e MAIA
(1999), os peixes têm de 50 a 60% de carne comestível na carcaça, dos quais
cerca de 25% são utilizados na filetagem.
SOUZA et al. (1999) observaram que tilápias do Nilo (Oreochromis niloticus)
apresentaram rendimento de carcaça (53% e 56%) e de filé (33% e 37%)
significativamente superiores para as menores classes de peso estudadas: 250 a
300g e 301 a 350g, respectivamente. No entanto, MAKRAKIS et al. (2000)
observaram que tilápias com média de peso de carcaça igual a 309,3g não
apresentaram maior rendimento de filé em relação aos outros tratamentos, cujos
valores médios variaram de 32,6 a 34,9%, sem diferença significativa entre médias.
No Brasil, a categoria de peso não é levada em consideração para a
definição de metodologias de filetagem de peixes (SOUZA et al., 1999). Avaliando
49
densidades de estocagem para tilápias (2, 3 e 4 peixes/m2), SILVA et al. (2000) não
encontraram diferenças significativas no rendimento de carcaça nem de filé, obtendo
valores médios de 58,1% e 32,6% respectivamente.
Segundo CONTRERAS-GUZMÁN (1994), a carcaça representa, em média,
62,6% do peso dos peixes. Considerando a carcaça (peixe sem cabeça, pele e
vísceras), CLEMENT e LOVELL (1994) obtiveram valor de rendimento de carcaça de
51% para Tilápia do Nilo com peso médio de 585 gramas. Este valor é inferior ao
obtido por SOUZA et al. (1999) em peixes nas categorias de peso entre 250 e 450
gramas.
Entretanto, em estudo feito para acompanhar linha de filetagem de frigorífico
em Santa Catarina, os valores de rendimento médio da tilápia obtidos foram: 40%
para filés, 13% para cabeças, 5% para peles, 3% para barrigas, 16% de vísceras e
22% de carcaça (PEREIRA e CAMPOS, 2000b).
4.2. Métodos de defumação
A composição química centesimal dos filés de piau-vermelho in natura e
após processamento com aroma natural de fumaça estão descritos na Tabela 12.
Tabela 12 – Valores médios da análise química do filé de piau-vermelho in natura
(congelado) e defumado por imersão e aspersão
Processo de
defumação
Matéria
Seca (%)
Umidade
(%)
Proteína
Bruta (%)1
Cinzas
(%)1
Extrato
Etéreo (%)1
Imersão 48.3* a 51.7 c 32.6 a 10.2 a 7.0 a
Aspersão 44.9 b 55.1 b 30.9 a 9.3 b 4.8 b
in natura 21.5 c 78.5 a 18.2 b 0.9 c 2.8 c 1 Valores expressos na matéria natural; * Médias seguidas de mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey (P ≤ 0,05).
Pela análise dos valores médios de extrato etéreo e proteína bruta dos filés
de piau-vermelho in natura (2,8% e 18,2% respectivamente), não se pode classificar
esta espécie de peixe segundo as categorias definidas por Stansby (Stansby, 1965;
50
citado por CONTRERAS-GUZMÁN, 1994), pois o teor intermediário de proteína (15
a 20%) somente é correlacionado com teor intermediário de gordura (5 a 15%).
No entanto, peixes do gênero Brycon (MENDONÇA, 1996) e curimatã
comum (Prochilodus cearensis) (MAIA et al., 1999) podem ser classificados na
categoria A de Stansby, onde os peixes têm baixo teor de gordura (< 5%) e alto teor
de proteína (15 - 20%).
O pescado pode ser classificado segundo o percentual de gordura, uma vez
que o percentual de proteínas na musculatura se apresenta em quantidades
relativamente constantes, entre 17 e 20%, oscilando, principalmente, devido ao
estado biológico do peixe (BRESSAN e PEREZ, 2000). Neste caso, de acordo com a
Tabela 12, o piau-vermelho pode ser considerado peixe magro pela definição de
Mantovani (Mantovani, 1961; citado por BRESSAN e PEREZ, 2000).
O Leporinus piau (FRANCO, 1999) apresenta 15,9% de proteína e 2,0% de
lipídios, resultados que corroboram a composição observada neste estudo para L.
copelandii capturados diretamente da natureza.
A gordura do pescado possui grande importância nutricional por ser uma
fonte natural de ácidos graxos não-saturados, entretanto apresenta relação inversa
com o tempo de conservação (FREITAS e GURGEL, 1971). Segundo KUBITZA
(2000), dependendo do tamanho do peixe, do sistema de cultivo, da composição da
dieta e do manejo alimentar, tilápias cultivadas apresentam filé com 3 a 8% de
gordura.
Antes do período da desova, algumas espécies de peixes depositam gordura
e glicogênio para utilizarem como fontes energéticas, o que os tornam mais
saborosos (OGAWA e MAIA, 1999). COSTA (1999) observou que L. copelandii
acumula gordura na região celomática no período que antecede à migração
reprodutiva, entretanto não analisou o conteúdo de gordura na porção comestível do
pescado.
A quantidade de lipídio na carne de pescado pode alterar o seu sabor, como
foi observado no salmão defumado (Salmo salar) (ROBB et al., 2002). Até 8,6% de
lipídios na porção comestível do salmão foi considerado o percentual que mais
agradou aos provadores.
Defumados elaborados a partir de peixes gordos podem apresentar “rusting”,
que é caracterizado pelo aparecimento de coloração amarelada ou laranja-
51
avermelhada na parte abdominal e nas guelras durante a estocagem, podendo
atingir a carne do pescado (OGAWA e MAIA, 1999).
MACHADO e GURGEL (1965), em trabalho com salga e secagem de traíra
(Hoplias malabaricus) e pescada do Piauí (Plagioscion squamosissimus),
determinaram teores de gordura de 2,5 a 3,0% e 2,4 a 4,6%, respectivamente, e
obtiveram produto com boas condições de consumo por mais de 83 dias de
estocagem à temperatura ambiente. A anchova (Pomatomus saltatrix), considerada
um peixe gordo (QUEIROZ et al., 1996) ou intermediário em teor de gordura (5 -
15%) (GONÇALVES e PRENTICE-HERNÁNDEZ, 1998), depois de processada com
fumaça líquida, apresentou boa estabilidade no armazenamento por 60 dias à
temperatura de -21,640C (GONÇALVES e PRENTICE-HERNÁNDEZ, 1998). Estes
dados demonstram que peixes gordos além de apresentarem menor tempo de
armazenamento necessitam de frio para sua adequada conservação.
Após o processo de defumação com aroma natural de fumaça, houve
alteração na relação percentual dos componentes da matéria-prima original devido à
redução estatisticamente significativa (P ≤ 0,05) no conteúdo de umidade (de 78,5%
para 51,7% e 55,1% correspondente ao processo de imersão e aspersão,
respectivamente). Os filés processados com aroma natural de fumaça pelo método
de imersão apresentaram menor teor de umidade (P ≤ 0,05) quando comparados
com os filés submetidos ao processo de defumação por aspersão e com a matéria-
prima. No entanto, apesar de apresentar valores significativamente maiores para
cinzas (10,2%) e extrato etéreo (7,0%), o teor de proteína bruta não diferiu
estatisticamente (P > 0,05) entre os métodos de defumação (32,6% para imersão e
30,9% para aspersão).
O teor de umidade nas amostras de filés defumados manteve-se abaixo de
65,0%, o que é recomendado para tal tipo de produto (MORAIS et al., 1996).
O teor médio de cinzas de filés de L. copelandii (0,9%) encontra-se próximo
dos valores descritos para Prochilodus cearensis (MAIA et al., 1999), para Ciprinus
carpio e Tilápia sp. (LEÓN et al., 1991), espécies estas de água doce. Entretanto,
GURGEL e FREITAS (1972) obtiveram valores superiores para teor médio de cinzas
na porção comestível de Leporinus friderici e Leporinus sp. 1,9% e 2,1%,
respectivamente. CONTRERAS-GUZMÁN (1994) cita que os teores de cinzas dos
peixes de água doce encontram-se na faixa de 0,98 a 3,29%, e que a variação,
provavelmente, se deve à quantidade de ossos intramusculares presentes no filé. No
52
entanto, o teor de cinzas após o tratamento com aroma natural de fumaça pelo
método de imersão e aspersão, 10,2% e 9,3% respectivamente, apresentaram-se
acima do teor de cinzas determinado para truta defumada (Oncorhynchus mykiss)
para os métodos de imersão com e sem cocção, os quais oscilaram entre 3,99% e
7,20% (MORAIS et al., 1996). Provavelmente, o aumento no teor de cinzas está
correlacionado à absorção de cloreto de sódio durante o processo de defumação e à
deposição de partículas provenientes da fumaça líquida.
A análise de cloreto de sódio (NaCl) nos filés submetidos aos diferentes
processos de defumação com aroma natural de fumaça está descrita na Tabela 13.
Tabela 13 – Valores de concentração de sal (%) nos filés submetidos a diferentes
processos de defumação, teor de umidade (%) e teor de sal na fração aquosa (%)
Processo de defumação Sal (%)1 Umidade (%) Teor de sal na fração aquosa (%) 2
Imersão 9,66* a 51,66 b 15,71 Aspersão 8,88 a 55,07 a 13,91 1 Valores expressos na matéria natural; 2 [% sal / (% sal + % Umidade)] x 100; * Médias seguidas de mesma letra na coluna não diferem entre si segundo teste t (P ≤ 0,05).
A porcentagem de sal no músculo de piau-vermelho não diferiu
significativamente entre os tratamentos (P > 0,05), porém a porcentagem de
umidade foi maior nos filés defumados por aspersão (55,07%) (P ≤ 0,05), o que,
conseqüentemente, influenciou no cálculo do teor de NaCl na fração aquosa dos
filés de piau-vermelho defumados por imersão e por aspersão iguais a 15,7% e
13,9% respectivamente. Estes valores estão acima do obtido na truta
(Oncorhynchus mykiss) (MORAIS et al., 1996), e na anchova (GONÇALVES e
PRENTICE-HERNÁNDEZ, 1998), ambas defumadas com fumaça líquida.
Para este tipo de produto, o mínimo recomendado para inibir o crescimento
de microrganismos, como Clostridium botulinum, é de 3% de NaCl na fração aquosa
(MORAIS, 1994).
53
Dentre os 50 provadores que participaram dos testes de aceitabilidade, 32%
informaram que as amostras estavam com excesso de sal para ambos os
tratamentos.
A análise sensorial para as características de aroma, cor, textura, aparência
e sabor das amostras de filés defumados com aroma natural de fumaça pelo método
de aspersão e imersão está descrita na Tabela 14.
Tabela 14 - Valores médios (± desvio padrão) da análise sensorial do pescado
defumado com aroma natural de fumaça (Aspersão e Imersão) em teste de aceitabilidade
Processo de defumação Características Aspersão Imersão
Aroma 7,41 ± 1,29 * a 6,14 ± 1,68 b
Cor 7,49 ± 1,10 a 5,86 ± 1,67 b
Textura 7,39 ± 1,29 a 6,51 ± 1,73 b
Aparência 7,43 ± 1,46 a 5,76 ± 1,94 b
Sabor 7,31 ± 1,64 a 5,96 ± 2,12 b
* Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste t (P ≤ 0,05).
Com os resultados da análise sensorial de aceitabilidade do pescado
defumado foram observados valores superiores (P ≤ 0,05) para os filés defumados
pelo método de aspersão em todos os parâmetros avaliados: aroma (T = 4,18; GL =
89; P ≤ 0,05); cor (T = 5,71; GL = 89; P ≤ 0,05); textura (T = 2,84; GL = 89; P ≤ 0,05);
aparência (T = 4,82; GL = 89; P ≤ 0,05); sabor (T = 3,52; GL = 89; P ≤ 0,05).
Esta preferência pela defumação com aspersão de fumaça líquida também
foi observada em teste de aceitabilidade de anchovas defumadas, realizado por
GONÇALVES (1998).
A aplicação superficial do aroma natural de fumaça produz sabor
característico, coloração dourada e brilhante na superfície do produto (ADICON,
1996). Como a gordura dos pescados atua como agente absorvedor das substâncias
aromáticas presentes na fumaça (GEROMEL e FOSTER, 1982), e o L. copelandii,
54
por ser um peixe considerado com baixo teor de gordura (< 5%) (Mantovani, 1961;
citado por CONTRERAS-GUZMÁN, 1994), as respostas dos provadores para as
características de aroma, cor, textura, aparência e sabor para o produto defumado
pelo processo de aplicação do aroma natural de fumaça na salmoura (imersão) se
manteve entre “não desgostei, nem gostei” e “gostei ligeiramente”.
A análise microbiológica realizada nos filés de piau-vermelho antes e após
os processos de defumação com aroma natural de fumaça está descrita na Tabela
15.
Tabela 15 - Resultados das análises microbiológicas do filé de piau-vermelho
congelado e defumado com aroma natural de fumaça.
Análises Congelado Defumado (matéria-prima) Imersão Aspersão
Bactérias aeróbias mesófilas 1,80 x 105 5,2 x 105 7,8 x 104
Staphylococcus sp. < 102 < 102 < 102
Coliformes totais < 102 < 102 < 102
Enterobactérias < 102 < 102 < 102
Salmonella Ausência Ausência Ausência
Escherichia coli Ausência Ausência Ausência
Todos os valores representam a média de cinco repetições; Resultados expressos em Unidades Formadoras de Colônias/g de amostra (UFC/g).
Nas análises microbiológicas não foi constatada a presença de E. coli nem
de Salmonella em nenhuma das amostras, assim como a contagem de Unidades
Formadoras de Colônias por grama de amostra para estafilococos ficou abaixo da
tolerância permitida, tendo sido atendidos, portanto, os padrões da legislação
vigente. Entretanto, a contagem de bactérias aeróbias mesófilas apresentou-se
elevada tanto para as amostras de matéria-prima quanto para o pescado defumado
por imersão e aspersão com aroma natural de fumaça (1,80 x 105; 5,20 x 105 e 7,80
x 104 respectivamente).
55
Esta contagem elevada é um indicador de condições inadequadas de
manipulação, provavelmente causada pelo pouco cuidado com a limpeza e
desinfecção de superfícies ou condições inadequadas de tempo/temperatura na
produção e conservação. Segundo HOFFMANN et al. (1995), o elevado número de
bactérias aeróbias mesófilas pode acarretar diminuição da vida útil do produto.
Apesar de todos os utensílios utilizados terem sido desinfetados com
solução clorada, o processamento não diminui a carga bacteriana da matéria-prima.
SCHRAMM e BEIRÃO (1998), avaliando a manutenção da qualidade
microbiológica de ostras (Crassostrea gigas) lavadas em água do mar refrigerada
com 100ppm de hipoclorito de sódio, observaram que os tratamentos de imersão
das ostras durante cinco e sete minutos reduziram 69% dos organismos mesófilos, e
94 e 97% dos organismos coliformes totais respectivamente.
Outros autores relataram presença de microrganismos em pescado.
PEREIRA e CAMPOS (2000a) estimaram a população de S. aureus, coliformes
totais e fecais, Salmonella e microrganismos pscicrotróficos em filés de tilápia
(Oreochromis niloticus) na indústria de filetagem, e apontaram que a contaminação
ocorre durante a manipulação.
MURATORI et al. (1994) verificaram a presença de Salmonella sp., E. coli e
S. aureus em 6,6% , 20,0% e 3,3%, respectivamente, nas amostras de branquinhas
(Curimatus ciliatus) comercializadas no Mercado Central de Teresina (PI),
caracterizando-as como peixes potencialmente capazes de causar toxinfecção
alimentar. O mesmo foi relatado em filés de pescada branca (Microdon ancylodon)
comercializados na cidade de São José do Rio Preto (SP), evidenciando a
comercialização de produtos em condições higiênico-sanitárias insatisfatórias
(HOFFMANN et al., 1995).
GONÇALVES e PRENTICE-HERNÁNDEZ (1998) relatam que a baixa
contagem microbiana encontrada na fração aquosa do músculo da anchova
defumada poderia estar relacionada com o alto teor de NaCl, proveniente do
processo.
4.3. Comparação entre as espécies: piau-vermelho e tilápia
A composição química centesimal dos filés de piau-vermelho e de tilápia
fritos ou defumados está descrita na Tabela 16.
56
A análise de variância indicou efeito de interação significativo (teste F; P ≤
0,05) para efeito entre espécies de peixe, e tipo de processamento utilizado, para
todas as características analisadas. Somente para o teor de cinza dos peixes fritos
não houve diferença significativa (P > 0,05) entre filés de piau-vermelho (0,8%) e
filés de tilápia (0,4%).
Após o processo de defumação, ocorreu desidratação da musculatura do
pescado e a fração correspondente à percentagem de matéria seca (% MS)
aumentou significativamente (P ≤ 0,05) nas duas espécies estudadas. Esta variação
foi maior para a tilápia. Entre a forma frita e a defumada houve acréscimo de 26,2
pontos percentuais, enquanto para o piau-vermelho, a variação foi de 14,0 pontos
percentuais.
BRESSAN e PEREZ (2000) citam que tilápias (O. niloticus) analisadas ao
longo do ano apresentaram teores de umidade entre 75,80 e 80,14%, e teor de
lipídeos entre 2,09 e 3,65%. CLEMENTE e LOVELL (1994) determinaram para o filé
de tilápia cultivada (O. niloticus) valor médio de 75% de água, entre 3,4 e 8,5% de
lipídios (gordura), 20% de proteína e 2% de minerais.
Segundo LUNARDI e JORGE (2001), a fritura de alimentos consiste em um
processo de desidratação parcial, o qual ocorre na parte externa do produto
promovendo a formação de uma crosta na superfície. O produto final tem, portanto,
algumas características físicas, químicas e sensoriais muito distintas das iniciais,
destacando-se o aumento considerável de seu conteúdo energético. Mesmo depois
de fritos, em óleo de soja refinado, os filés de tilápia apresentaram maior teor de
umidade
57
Tabela 16 - Valores médios da análise química centesimal dos filés de piau-vermelho (Leporinus copelandii) e tilápia (Oreochromis niloticus) fritos (F) e defumados (D) com aroma natural de fumaça (n = 3; em triplicata)
Espécies Matéria Seca (%) Umidade (%) Proteína Bruta (%)1 Cinzas (%)1 Extrato Etéreo (%)1
F D F D F D F D F D
Piau 25,0 * bA 39,0 aB 75,0 aB 61,0 bA 18,7 bA 28,4 aB 0,8 bA 3,1 aB 2,39 ba 4,70 aA
Tilápia 17,3 bB 43,5 aA 82,7 aA 56,5 bB 16,3 bB 36,0 aA 0,4 bA 3,8 aA 0,17 bB 1,08 aB 1 Valores expressos na matéria natural; * Considerando cada característica da análise química, médias seguidas das mesmas letras minúsculas na linha e maiúsculas na coluna não diferem entre si segundo o teste Tukey (P < 0,05).
58
(82,7%), menor teor de extrato etéreo (0,17%) e de cinzas (0,4%) em relação aos
valores descritos na literatura citada.
Água, proteína e óleo são as maiores frações constituintes da carne do
pescado. O conteúdo em água do músculo fresco do pescado depende,
principalmente, do conteúdo em óleo, pois a proporção de proteínas, em geral, é
constante, entre 17 e 20% (BRESSAN e PEREZ, 2000).
Alguns autores citam a hidratação dos tecidos e diminuição nos teores de
extrato etéreo na carcaça de peixes submetidos a períodos de restrição alimentar
(ZAMAL e OLLEVIER, 1995; EINEN et al., 1998; SOUZA et al., 2002). A tilápia
utilizada neste estudo provém de criação em cativeiro e apresentou maior
quantidade significativa de água no filé em relação ao piau quando fritos (82,7% e
75,0%, respectivamente) e desidratação de tecido muscular significativamente
superior quando defumada (56,5% e 61,0% de teor de umidade para tilápia e piau,
respectivamente) (P ≤ 0,05).
Segundo BRESSAN e PEREZ (2000), os pescados magros apresentam um
alto teor de água, enquanto que os gordurosos possuem uma quantidade menor de
água, que pode chegar a 58%.
Esta variação também pode estar relacionada à hidratação da musculatura
ocorrida no processo de glaseamento dos filés de tilápia para a comercialização, o
que para piau-vermelho não é empregado.
A análise sensorial para as características de aroma, cor, aparência e sabor
das amostras de filés fritos e de filés defumados das espécies piau-vermelho e
tilápia está descrita na Tabela 17 e 18, respectivamente.
Quanto à característica aroma do filé frito, foram observados valores médios
de 6,6 e 7,5 respectivamente para as espécies piau e tilápia, evidenciando maior
aceitabilidade da tilápia em relação ao piau (t = 3,5; GL = 102; P < 0,01; Hom.). Para
a característica cor foi observada a mesma tendência estatisticamente significativa, a
tilápia (7,8) teve preferência sobre o piau (7,1) (t = 3,54; GL = 102; P < 0,01; Hom.).
59
Tabela 17 - Valores médios da análise sensorial do filé frito de piau-vermelho e tilápia em teste de aceitabilidade
Espécie de peixe Características Piau-vermelho Tilápia
Aroma 6,6* b 7,5 a
Cor 7,1 b 7,8 a
Aparência 7,2 a 7,6 a
Sabor 7,3 a 7,2 a
* Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste t (P ≤ 0,05).
Não foram observadas diferenças significativas de preferência entre as
espécies piau e tilápia com relação à aparência (t = 1,9; GL = 102; P > 0,05; Hom.) e
sabor (t = 0,19; GL = 102; P > 0,05; Hom.), ficando a aceitação entre os termos
hedônicos “gostei regularmente” e “gostei muito”.
Para a comparação com o piau-vermelho, foi utilizada a Tilápia por ser um
peixe padrão em relação à sua produção, comercialização e qualidade.
Mundialmente reconhecida por apresentar carne sem espinho, de cor branca, textura
firme, aspecto fibroso e suculento e de sabor delicado, a tilápia é um peixe destinado
aos bons “gourmets”, se ajustando aos mais diferentes tipos de temperos e formas
de preparo e apresentação (KUBITZA, 2000).
SANTOS et al. (2001), em estudo de aceitabilidade de lingüiças de
piraputanga (Brycon microlepis), utilizaram escala hedônica para os atributos de
aparência, sabor, aroma e textura e observaram maior aceitação para as lingüiças
pasteurizadas com e sem aditivo e lingüiça frescal sem aditivo, identificando os
termos hedônicos “gosto ligeiramente” e “gosto moderadamente” para os produtos
avaliados.
Com os resultados da análise sensorial de aceitabilidade do pescado
defumado, foram observados valores superiores estatisticamente (P ≤ 0,05) para os
filés defumados de piau em relação aos filés defumados de tilápia, em todas as
características avaliadas: aroma (t = 2,94; GL = 102; P = 0,0016; Hom.); cor (t =
3,25; GL = 102; P <0,01; Hom.); aparência (t = 4,50; GL = 102; P < 0,01; Hom.) e
sabor (t = 2,13; GL = 102; P < 0,05; Hom.).
60
Tabela 18 - Valores médios da análise sensorial do filé defumado de piau-vermelho e tilápia em teste de aceitabilidade
Espécie de peixe Características Piau-vermelho Tilápia
Aroma 7,5 * a 6,5 b
Cor 7,5 a 6,5 b
Aparência 7,5 a 6,2 b
Sabor 7,1 a 6,2 b
* Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste t (P ≤ 0,05).
Com os resultados da análise sensorial de aceitabilidade do pescado
defumado, foram observados valores superiores estatisticamente (P ≤ 0,05) para os
filés defumados de piau em relação aos filés defumados de tilápia, em todas as
características avaliadas: aroma (t = 2,94; GL = 102; P = 0,0016; Hom.); cor (t =
3,25; GL = 102; P <0,01; Hom.); aparência (t = 4,50; GL = 102; P < 0,01; Hom.) e
sabor (t = 2,13; GL = 102; P < 0,05; Hom.).
Provavelmente, a boa aceitabilidade do piau-vermelho defumado se deve à
sua composição química, pois maior teor de gordura proporciona melhor absorção
dos compostos da fumaça líquida, conferindo melhor aroma, cor e aparência. O teor
de umidade final o torna mais tenro, conferindo melhor sabor, uma vez que esta
característica envolve o gosto, o olfato e a apreciação da amostra na boca. Segundo
BRESSAN e PEREZ (2000), os pescados destinados à defumação devem
apresentar de 7 a 15% de gordura, pois as gotículas de gordura ajudam a reter os
compostos aromáticos da fumaça e conferem odor e sabor agradável de defumado.
Segundo estes mesmos autores, a utilização de peixes magros produz produto de
aspecto externo e rendimento insatisfatórios, além do aroma característico de
defumado não ser impresso no produto.
A análise sensorial de preferência entre espécies, quanto ao modo de
preparo dos filés, está descrita na Tabela 19.
61
Tabela 19 – Número de respostas às amostras quanto à preferência pela espécie nos diferentes modos de preparo dos filés em teste de comparação pareada de diferença simples
Espécie de peixe Modo de preparo Piau-vermelho Tilápia
Frito 22* a 30 a
Defumado 32 a 20 a
*Número de respostas seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si pelo teste Bilateral (p = ½), para Comparação Pareada.
O número mínimo de respostas necessárias para estabelecer diferença
significativa (P < 0,05) entre as espécies foi de 33 respostas para 52 julgamentos.
Conclui-se, portanto, que, com base nos resultados observados no teste de
comparação pareada, não há razão suficiente para se considerar que houve
preferência à tilápia frita em relação ao piau frito, ou que houve preferência pelo piau
defumado em comparação à tilápia defumada.
Como primeiro estudo, estes resultados colocam o piau-vermelho em
posição favorável, pois, provavelmente, o consumidor atribuiu, de um modo geral,
qualidade à carne deste pescado quando degustado.
Na análise de preferência mediante teste de ordenação dos quatro produtos
avaliados (PF = piau-vermelho frito, TF = tilápia frita, PD = piau-vermelho defumado,
e TD = tilápia defumada), houve significância pelo teste Qui-quadrado (P ≤ 0,05)
para o terceiro χ2 = 7,85 (GL = 2, P ≤ 0,05) e quarto χ2 = 15,08 (GL = 2, P ≤ 0,05)
lugares (Figura 4).
A tilápia defumada foi indicada por 46,2% dos julgadores como produto de
baixa preferência dentre os avaliados.
62
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5
10
15
20
25
30
1o Lugar 2o Lugar 3o Lugar 4o Lugar
Ordenação de preferência
Freq
uênc
ia������������ PF������������ TF
PD������������ TD
Figura 4 – Histograma de freqüência dos escores de ordenação de preferência dos
produtos avaliados: piau-vermelho frito (PF), piau-vermelho defumado (PD), tilápia frita (TF) e tilápia defumada (TD).
De certa forma, os atributos cor, aroma, aparência e sabor avaliados na
análise sensorial dos produtos defumados foi refletida neste teste de preferência,
indicando que, de um modo geral, a tilápia defumada não se apresentou como um
bom produto defumado. Provavelmente a excessiva desidratação da tilápia após a
defumação e o baixo teor de gordura na musculatura tenham contribuído para o
aspecto geral final. Mesmo tendo perdido menos água e concentrado duas vezes
mais o teor de gordura no músculo após o processo de defumação, o teor inicial de
gordura no filé de piau-vermelho, provavelmente, foi o fator determinante desta
diferença.
Segundo OETTERER (2002), o teor de lipídios pode determinar o tipo de
processamento a que o pescado pode ser submetido. Os peixes magros submetidos
a processos de defumação podem tornar-se ressecados, não apresentar suculência
e qualidade de melhoria de sabor, cor e textura que os peixes passam a ter após a
defumação.
63
Provavelmente, a degustação das amostras influenciou na preferência pelos
produtos, pois, na análise sensorial dos peixes fritos, o filé de tilápia superou
significativamente o filé de piau-vermelho nos atributos aroma e cor (Tabela 17),
entretanto, para a característica sabor, que leva em conta a apreciação da amostra
na boca, não houve diferença significativa, mas, para a maioria dos julgadores, a
tilápia frita foi indicada como terceiro produto na ordem de preferência.
Um dos fatores críticos para o desenvolvimento de novos produtos
alimentícios é a aceitabilidade por parte dos consumidores. Neste estudo, as médias
obtidas na análise sensorial para intenção de consumo foram 6,5 ± 1,9 para piau
frito, 6,6 ± 2,0 para tilápia frita, 6,6 ± 2,2 para piau defumado, e 5,8 ± 2,5 para tilápia
defumada, no entanto, para as categorias 4 (não gosto, mas comeria) e 7 (comeria
freqüentemente), o teste Qui-quadrado foi significativo, χ2 = 8,6 (GL = 2, P < 0,05) e
χ2 = 7,19 (GL = 2, P < 0,05) respectivamente. Estes resultados demonstraram baixa
intenção de consumo para a tilápia defumada, e boa aceitação dos produtos piau
frito, piau defumado e tilápia frita, com possibilidade de consumo freqüente (Figura
5).
Agregar valor ao produto vem sendo uma preocupação constante dos
piscicultores, não esquecendo que, para a transformação da carne de peixe em
produto popular como é a carne de frango, deve-se considerar a conveniência,
facilidade de preparo, produção higienicamente correta e vantagens do ponto de
vista nutricional (OETTERER, 2002).
SANTOS et al. (2001), visando obter produtos com maior vida útil e valor
agregado, elaboraram, a partir de piraputanga (Brycon microlepis), peixe nativo de
água doce, lingüiças do tipo frescal e pasteurizadas.
O consumidor de pescado na cidade de Campos dos Goytacazes (RJ),
segundo VIDAL Jr. et al. (2002), consome mais peixes de origem marinha devido à
baixa qualidade do pescado de água doce. Entretanto, existe um potencial de
consumidores passíveis de reverter esta situação de preferência pela origem do
pescado consumido. Para tanto, os setores da cadeia produtiva precisam direcionar
esforços para oferecer produto diferenciado e de melhor qualidade ao consumidor.
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5
10
15
20
25
30
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Categorias de Intenção de Consumo
Freq
uênc
ia�������������� PF
�������������� TF
���������������� PD
���������������� TD
X2 = 7,19*(GL = 2, P < 0,05)
Figura 5 – Histograma de freqüência dos escores de intenção de consumo produtos avaliados: piau-vermelho frito (PF), tilápia frita
(TF), piau-vermelho defumado (PD), e tilápia defumada (TD).
5. CONCLUSÕES
1) Para o mercado de filé: o ponto de abate do piau-vermelho independe do
peso final;
2) A defumação por aspersão do aroma natural de fumaça teve preferência
sobre a defumação por imersão, e o produto final apresenta boa
aceitação, com possibilidade de consumo freqüente;
3) A carne do piau-vermelho pode ser considerada de boa qualidade,
principalmente em relação ao sabor.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Apêndice 1A – Ficha utilizada para Análise Sensorial (Escala Hedônica de nove pontos)
NOME: _______________________________________________________________________________________________ DATA: ______________
Você vai analisar amostra de peixe defumado.
Por favor, avalie cada amostra para cada característica, quanto à preferência utilizando a escala abaixo.
Amostra NO: ____________
AROMA COR TEXTURA APARÊNCIA SABOR( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
COMENTÁRIOS: __________________________________________________________________________________________________________
Apêndice 2A – Ficha utilizada para Análise Sensorial (Escala Hedônica de nove pontos)
35
NOME: _______________________________________________________________________________________________ DATA: ______________ VOCÊ VAI ANALISAR AMOSTRAS DE PEIXE.. Por favor, avalie cada característica para cada amostra, anotando a preferência segundo a escala abaixo. Amostra NO: ____________
AROMA COR APARÊNCIA SABOR CONSUMO( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Comeria sempre
( ) Comeria muito freqüentemente
( ) Comeria freqüentemente
( ) Comeria agora
( ) Comeria, mas não compraria
( ) Não gosto, mas comeria
( ) Comeria se disponível
( ) Sem opções, comeria
( ) Não comeria de jeito nenhum
Amostra NO: ____________
AROMA COR APARÊNCIA SABOR CONSUMO( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Gostei muitíssimo
( ) Gostei muito
( ) Gostei regularmente
( ) Gostei ligeiramente
( ) Não desgostei e nem gostei
( ) Desgostei ligeiramente
( ) Desgostei regularmente
( ) Desgostei muito
( ) Desgostei muitíssimo
( ) Comeria sempre
( ) Comeria muito freqüentemente
( ) Comeria freqüentemente
( ) Comeria agora
( ) Comeria, mas não compraria
( ) Não gosto, mas comeria
( ) Comeria se disponível
( ) Sem opções, comeria
( ) Não comeria de jeito nenhum Apêndice 3A – Ficha utilizada para Análise Sensorial (Teste de ordenação)
36
MÉTODO DE ORDENAÇÃO
Nome:______________________________________________________________________Data:___/___/___ Prove as amostras. Ordene-as de acordo com a sua preferência. Enxágüe a boca após a degustação de cada amostra e
espere trinta segundos.
1o Lugar 2o Lugar 3o Lugar 4o Lugar
______ ______ ______ _______
Comentários: __________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
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