PATRCIA FERRARI TOSIM
TREINAMENTO AUDITIVO-FONOLGICO: UMA PROPOSTA DE
INTERVENO PARA ESCOLARES COM DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM
MARLIA
2009
PATRCIA FERRARI TOSIM
TREINAMENTO AUDITIVO-FONOLGICO: UMA PROPOSTA DE INTERVENO
PARA ESCOLARES COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Faculdade de Filosofia e Cincias da Universidade Estadual Paulista, para obteno do ttulo de Doutora em Educao. rea de Concentrao: Ensino na Educao Brasileira
Orientadora: Dra. Tnia Moron Saes Braga
MARLIA
2009
PATRCIA FERRARI TOSIM
TREINAMENTO AUDITIVO-FONOLGICO: UMA PROPOSTA DE INTERVENO
PARA ESCOLARES COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM
Tese submetida Coordenao do Programa de Ps-graduao em Educao da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, Campus de Marlia, como requisito para a obteno do grau de Doutora em Educao.
Aprovada em : 18/03/2009
BANCA EXAMINADORA
Dra. Tnia Moron Saes Braga (Orientadora)
Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho UNESP/Marlia
Dra. Andra Lopes Cintra
Universidade de So Paulo / USP Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB)
Dra. Dgma Venturini Marques Abramides
Universidade de So Paulo / USP Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB)
Dra. Dbora Deliberato
Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho UNESP/Marlia
Dra. Simone Aparecida Capellini
Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho UNESP/Marlia
DDEEDDIICCAATTRRIIAA
Dedico esse trabalho
Aos meus pais,
Walter e Ana Lcia, que sempre estiveram ao meu lado, incentivaram e acreditaram em
mim, mesmo nas horas mais difceis.
Ao meu marido,
Gustavo, que sofreu com a privao de minha companhia em muitas situaes, em
funo da minha dedicao aos estudos.
AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOO EESSPPEECCIIAALL
minha orientadora,
Dra. Tnia Moron Saes Braga, por toda a sua dedicao, pelo apoio, pela compreenso e,
principalmente, por ter acreditado e investido em mim. Tnia, muito obrigada por tudo!
AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS
professora Dra. Ana Cludia Vieira Cardoso, pela sua disponibilidade em me
auxiliar com todo seu conhecimento e experincia na rea de Audiologia. Sem sua ajuda,
certamente o tema deste estudo no seria o mesmo!
A todos que participaram deste estudo: coordenadora pedaggica, professoras,
pais, alunos, pois sem vocs seria invivel desenvolver um trabalho desta natureza. Em
especial agradeo s crianas, pois me proporcionaram momentos de muita alegria
enquanto trabalhvamos juntas!
A todos os funcionrios do CEES Centro de Estudos em Educao e Sade,
unidade auxiliar da UNESP, pela ateno e pela educao que sempre dedicaram a mim
e a todos que participaram desta pesquisa.
Aos funcionrios da secretaria da Ps-Graduao, pela forma gentil que sempre
me trataram e tambm pela pacincia em sempre fornecer esclarecimentos solicitados.
CAPES, pelo apoio financeiro, pois tive o privilgio de ser bolsista no perodo de
abril de 2005 a abril de 2008.
Aos professores Rony e Maria Otlia, pelo trabalho de correo gramatical e
professora Arlete, por ter feito o abstract do trabalho.
A todos os amigos, familiares que estiveram ao meu lado durante toda essa
caminhada, acreditando, incentivando e vibrando com minhas conquista. Em especial,
tia Rose, aos meus irmos Waltinho e Maurcio e s amigas de longa data Cristiane e
Tatiane, que esto sempre ao meu lado.
Muito obrigada a todos!
RREESSUUMMOO
Resumo
INTRODUO: As dificuldades escolares apresentadas por crianas podem ter vrias
causas e sofrer influncia de diversos fatores, dentre os quais o transtorno do
processamento auditivo (TPA). Frequentemente, os comportamentos sugestivos de TPA e
dificuldades quanto s habilidades fonolgicas esto associados a problemas de
aprendizagem. Portanto, de suma importncia a avaliao das habilidades auditivas e
fonolgicas visando realizao de uma interveno apropriada. OBJETIVOS: O objetivo
principal deste estudo foi elaborar e aplicar um modelo de treinamento, o treinamento
auditivo-fonolgico, destinado a escolares com dificuldades de aprendizagem e
comportamentos sugestivos de TPA, bem como verificar a sua eficcia. MTODOS:
Participaram deste estudo 3 escolares do gnero feminino, com idade de 8 anos e 7
meses a 10 anos e 1 ms, de 2 e 3 sries do Ensino Fundamental, previamente
selecionadas tendo em comum a participao na sala de reforo devido a dificuldades de
aprendizagem. A pesquisa realizou-se em 3 etapas: a) etapa pr-treinamento, b)
treinamento e c) ps-treinamento. No incio do pr-treinamento, realizaram-se entrevista
com os pais e entrevista com as professoras das escolares. Em seguida, foi feita a
avaliao do processamento auditivo (PA) das participantes por meio da triagem do
processamento auditivo teste de disslabos alternados (SSW), teste Fala com Rudo, teste
PSI e avaliao da conscincia fonolgica aplicando-se a Prova de Conscincia
Fonolgica. O treinamento constituiu-se de 12 sesses individuais nas quais foram
desenvolvidas atividades para estimular as habilidades auditivas e fonolgicas. Sua
frequncia foi de duas vezes por semana, com durao aproximada de dois meses. Aps
o trmino do treinamento, fez-se a reavaliao das escolares com os mesmos
procedimentos acima descritos. Os dados obtidos durante as sesses de treinamento e
nas avaliaes das escolares antes e aps o treinamento foram analisados de forma
quantitativa e comparativa. RESULTADOS: Os resultados demonstraram que houve
melhora no desempenho das 3 participantes nas provas usadas para avaliar tanto o
processamento auditivo quanto a conscincia fonolgica. Na reavaliao do
processamento auditivo, observou-se melhora de P1 nas provas de memria sequencial
para sons verbais, testes Fala com Rudo e PSI; P2 apresentou melhora nas provas de
memria sequencial para sons verbais, memria sequencial para sons no-verbais, testes
PSI e SSW; e P3 apresentou melhor desempenho nos testes PSI e SSW. Quanto Prova
de Conscincia Fonolgica, P1 apresentou melhora no desempenho em 7 subtestes, P2
em 3 subtestes e P3 em 6 subtestes, num total de 10 subtestes que compem tal prova .
A participante P1 apresentou melhor desempenho durante as sesses de treinamento,
especialmente nas sesses de treino fonolgico e melhor desempenho nas atividades em
que se trabalhou ateno auditiva. Observou-se coerncia entre as queixas dos pais e
das professoras quanto ao desempenho das participantes nas sesses de treinamento.
CONCLUSES: De forma geral, P1, P2 e P3 apresentaram melhora no desempenho das
habilidades de ateno seletiva, figura-fundo auditiva, sntese fonmica e segmentao
fonmica, o que justifica a utilizao de programas de interveno, segundo o modelo
aqui proposto, para indivduos que apresentem dificuldades escolares.
Palavras-chave: Aprendizagem. Processamento auditivo. Treinamento. Conscincia
fonolgica.
AABBSSTTRRAACCTT
Abstract
Children's difficulties in school may have many causes and be influenced by various
factors, among which auditory processing disorder (APD). The behaviors suggesting APD
and disabilities in phonological skills are frequently associated with learning problems.
Therefore, an evaluation of auditory and phonological skills is of utmost importance to
determine an appropriate intervention. The main purpose of this study was to devise and
apply a training model, the phonological auditory training, addressed to children who have
learning difficulties and behaviors that characterize APD, as well as to assess its
effectiveness. Three school-girls (ages between 8 years/7 months old and 10 years/1
month old) from the 2nd. and 3rd. grades of Primary Education were previously selected
as they were attending reinforcement classes for students with learning difficulties. The
investigation was carried out in 3 phases: a) pre-training, b) training and c) post-training. In
the pre-training phase, an interview with the students parents and an interview with their
teachers were initially conducted. Afterwards, the participants auditory processing was
evaluated by means of screening tests, namely alternate dissyllable test (SSW), Speech-
in-Noise test, PSI test and evaluation of phonological awareness using the Phonological
Awareness Test. The training phase consisted of 12 individual sessions involving activities
aimed to stimulate phonological and auditory skills. These sessions took place twice a
week and lasted about three months. After the end of the training period, the participants
were re-evaluated following the same procedures described above. The data obtained
both during the training sessions and the evaluations of the participants performance
before and after the training phase were analyzed quantitatively and comparatively. The
results showed the three students had improved in auditory processing and phonological
awareness. It was observed an improvement of P1 in the sequential memory tests for
verbal sounds, Speech-in-Noise and PSI tests; P2 had improved in the sequential memory
tests for verbal sounds, sequential memory for non-verbal sounds, PSI and SSW tests;
and P3 had an improved performance in PSI e SSW test. As for the Phonological
Awareness Test, P1 did better in 7 subtests, P2 in 3 subtests and P3 in 6 subtests, totaling
10 subtests that comprise such test. Participant P1 had an improvement during the training
sessions, particularly those involving phonological skills, and in the activities requiring
auditory attention. The parents and the teachers complaints were coherent regarding the
participants performance in the training sessions. In general terms, P1, P2 and P3
showed an improved performance in selective attention skills, auditory figure-ground,
phonemic synthesis and phonemic segmentation. These findings demonstrate that
intervention programs such as the one proposed in this study can be used to help
individuals with learning difficulties.
Key Words: Learning. Intervention. Auditory processing. Phonological awareness.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Desempenho do participante P1 quanto s habilidades fonolgicas
selecionadas para serem trabalhadas no treinamento..........................p.90
Figura 2: Desempenho do participante P2 quanto s habilidades fonolgicas
selecionadas para serem trabalhadas no treinamento..........................p.91
Figura 3: Desempenho do participante P3 quanto s habilidades fonolgicas
selecionadas para serem trabalhadas no treinamento..........................p.92
Figura 4: Desempenho do participante P1 nas provas que avaliam o processamento
auditivo, nas etapas pr-treinamento e ps-treinamento.....................p.111
Figura 5: Desempenho do participante P2 nas provas que avaliam o processamento
auditivo nas etapas pr-treinamento e ps-treinamento......................p.114
Figura 6: Desempenho do participante P3 nas provas que avaliam o processamento
auditivo, nas etapas pr-treinamento e ps-treinamento.....................p.116
Figura 7: Desempenho do participante P1, antes e aps o treinamento, quanto s
habilidades fonolgicas trabalhadas nas sesses...............................p.121
Figura 8: Desempenho do participante P2, antes e aps o treinamento, quanto s
habilidades fonolgicas trabalhadas nas sesses...............................p.122
Figura 9: Desempenho do participante P3 antes e aps a interveno quanto s
habilidades fonolgicas trabalhadas nas sesses...............................p.123
LLIISSTTAA DDEE QQUUAADDRROOSS
Quadro 1: Distribuio das datas de realizao das sesses por
participante................................................................................p.56-57
Quadro 2: Distribuio das habilidades trabalhadas em cada
sesso............................................................................................p.59
Quadro 3: Descrio das queixas informadas pelo responsvel do participante
1, na anamnese..............................................................................p.74
Quadro 4: Descrio das queixas informadas pelo responsvel do participante 2
na anamnese..................................................................................p.75
Quadro 5: Descrio das queixas informadas pelo responsvel do participante
3, na anamnese..............................................................................p.76
Quadro 6: Dados obtidos por meio da entrevista com as professoras dos
participantes...................................................................................p.79
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Caracterizao da amostra.....................................................................p.49
Tabela 2: Frequncia das queixas relatadas pelas professoras quanto s
dificuldades de suas alunas e respectiva pontuao...........................p.80
Tabela 3: Desempenho do participante 1 nas provas realizadas para avaliar as
habilidades auditivas, na etapa pr-treinamento..................................p.83
Tabela 4: Desempenho do participante 2 nas provas realizadas para avaliar as
habilidades auditivas, na etapa pr-treinamento..................................p.84
Tabela 5: Desempenho do participante 3 nas provas realizadas para avaliar as
habilidades auditivas, na etapa pr-treinamento.............................p.85-86
Tabela 6: Desempenho dos participantes quanto Prova de Conscincia
Fonolgica............................................................................................p.93
Tabela 7: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 1, nas sesses do treino
de habilidades auditivas..................................................................p.94-95
Tabela 8: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 2, nas sesses do treino
de habilidades auditivas..................................................................p.96
Tabela 9: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 3, nas sesses do treino
de habilidades auditivas........................................................................p.98
Tabela 10: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 1, nas sesses do treino
de habilidades fonolgicas.................................................................p.100
Tabela 11: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 2, nas sesses do treino
de habilidades fonolgicas..........................................................p.101-102
Tabela 12: Porcentagem de acertos obtida pelo participante 3 nas sesses do treino
de habilidades fonolgicas.................................................................p.103
Tabela 13: Desempenho dos participantes na sesso 1......................................p.104
Tabela 14: Desempenho dos participantes na sesso 2......................................p.105
Tabela 15: Desempenho dos participantes na sesso 3......................................p.105
Tabela 16: Desempenho dos participantes na sesso 4......................................p.106
Tabela 17: Desempenho dos participantes na sesso 5......................................p.106
Tabela 18: Desempenho dos participantes na sesso 6......................................p.107
Tabela 19: Desempenho dos participantes na sesso 7......................................p.108
Tabela 20: Desempenho dos participantes na sesso 8......................................p.108
Tabela 21: Desempenho dos participantes na sesso 9......................................p.109
Tabela 22: Desempenho dos participantes na sesso 10....................................p.109
Tabela 23: Desempenho dos participantes na sesso 11....................................p.110
Tabela 24: Desempenho dos participantes na sesso 12.....................................p110
Tabela 25: Comparao do desempenho dos participantes P1, P2 e P3, nas etapas
pr-treinamento e ps-treinamento.......................................................p.124
LLIISSTTAA DDEE AABBRREEVVIIAATTUURRAASS EE SSIIGGLLAASS
AFT-R: Teste de Fuso Auditiva
ASHA: American Speech-Language-Hearing Association
CEES: Centro de Estudos da Educao e da Sade
DC: direita competitiva
DNC: direita no-competitiva
EC: esquerda competitiva
EF: Ensino Fundamental
ENC: esquerda no-competitiva
F: fonte sonora
FR: Fala com Rudo
HTPC: Horrio de Trabalho Pedaggico Coletivo
IRFD: ndice de Reconhecimento de Fala Distorcida
LD: dificuldade de aprendizagem
MCC: mensagem competitiva contralateral
MCI: mensagem competitiva ipsilateral
P1: participante 1
P2: participante 2
P3: participante 3
PA: processamento auditivo
PCF: Prova de Conscincia Fonolgica
PSI: Pediatric Speech Test ou Teste Peditrico de Inteligibilidade de Fala
R: resposta
S: estmulo
S/R: sinal/rudo
SNC: Sistema Nervoso Central
SSW: Sttagered Spondaic Word Test
TA: treinamento auditivo
TAF: treinamento auditivo fonolgico
TDHA: Transtorno do Dficit de Ateno e Hiperatividade
TPA: transtorno do processamento auditivo
UNESP: Universidade Estadual Paulista
SSUUMMRRIIOO
SUMRIO
1 INTRODUO.....................................................................................................p.01
2 REVISO DA LITERATURA...............................................................................p.05
2.1 Definies de Processamento Auditivo (PA) e Transtorno do Processamento
Auditivo (TPA).................................................................................................p.06
2.2 Processamento Auditivo e Anlise Experimental do Comportamento
........................................................................................................................p.12
2.2.1 A importncia do meio para a promoo e manuteno de novos
comportamentos: a questo das contingncias de reforamento...................p.21
2.3 Relaes entre processamento auditivo, conscincia fonolgica e aprendizagem
da leitura e escrita...........................................................................................p.25
2.4 Impacto do transtorno do processamento auditivo para o ensino e aprendizagem
em sala de aula...............................................................................................p.29
2.5 Interveno para transtorno do processamento auditivo: Treinamento
auditivo............................................................................................................p.31
3 OBJETIVOS.........................................................................................................p.44
2.1 Objetivo geral....................................................................................................p.45
2.2 Objetivo especfico............................................................................................p.45
4 MTODO.............................................................................................................p.46
4.1 Aspectos ticos e procedimentos preliminares.................................................p.47
4.2 Critrios de incluso na amostra.......................................................................p.47
4.3 Seleo da amostra...........................................................................................p.48
4.4 Local..................................................................................................................p.49
4.5 Instrumentos e equipamentos...........................................................................p.49
4.6 Procedimentos...................................................................................................p.49
5 RESULTADOS. E DISCUSSO..........................................................................p.73
6 CONCLUSES..................................................................................................p.128
7 REFERNCIAS..................................................................................................p.131
APENDICES..........................................................................................................p.140
ANEXOS................................................................................................................p.172
IINNTTRROODDUUOO
1 INTRODUO
As dificuldades escolares apresentadas por crianas podem ser decorrentes
de vrios fatores e influenciar negativamente no desenvolvimento da criana. Isto
instiga os pais, educadores e pesquisadores envolvidos nas reas da Educao e
Sade, no sentido de compreender suas causas e propiciar melhores condies de
ensino e aprendizagem.
Com o trmino da pr-escola, e ingresso no Ensino Fundamental - perodo
em que a alfabetizao a principal meta a ser alcanada - que as dificuldades de
aprendizagem, de forma geral, ficam mais evidentes. Freqentemente, muitas
concluem o Ensino Fundamental sem ter o domnio da linguagem escrita, manifestando
dificuldades para ler e escrever.
Os casos de dificuldades de aprendizagem podem ser causados por
diversos fatores: ns, pesquisadores ligados Educao devemos estud-los e
compreend-los para que possamos contribuir para a preveno e deteco precoce
de tais dificuldades e, em muitos casos, na interveno adequada.
O ideal seria se todas as escolas possussem equipe multidisciplinar,
composta por Fonoaudilogos, Pedagogos e Psiclogos para atuar de forma preventiva
nas reas da Educao, visando evitar o surgimento das dificuldades escolares. Para
que isso ocorresse, deveria haver maior empenho de nossos governantes em contratar
tais profissionais para atuar em todas as instituies educacionais, de forma a propiciar
melhores condies de ensino e aprendizagem, pois tais profissionais podem auxiliar
os educadores, pais e escolares, ao atuar de forma preventiva nas escolas.
No caso do Fonoaudilogo que atua na rea educacional, sua atuao visa
auxiliar a esclarecer os educadores sobre a importncia das habilidades auditivas e de
linguagem para o desenvolvimento da criana como um todo e, consequentemente,
para que o processo de alfabetizao possa ocorrer satisfatoriamente.
Infelizmente na realidade em que vivemos so poucas as instituies que
possuem equipe multidsciplinar e, aliado aos agravantes relacionados Poltica
Educacional vigente (Progresso Continuada), das condies scio-econmicas da
populao em geral, torna-se cada vez mais comum a existncia de crianas com
dificuldades de aprendizagem, que so aprovadas de ano a ano na escola, mesmo
apresentando tais dificuldades. Este panorama refora a necessidade de haver maior
estimulao dos pr-escolares, para reduzir a incidncia de dificuldades escolares e,
quando isso no for possvel, ou nos casos que mesmo sendo estimulada a criana
venha apresentar dificuldades de aprendizagem, que seja realizado o planejamento e
execuo de programas de interveno destinados a tais crianas, com o objetivo de
atenuar suas dificuldades e proporcionar-lhes melhores condies de aprendizagem.
Com o avano das pesquisas que estudam os mecanismos envolvidos na
aprendizagem da leitura e da escrita, muitos pesquisadores que atuam na Audiologia
Clnica, Audiologia Educacional e na Educao revelam em seus estudos tericos e
empricos que o processamento auditivo desempenha importante papel no
desenvolvimento da criana, tanto da linguagem oral, quanto da escrita alm de
influenciar nos aspectos sociais e emocionais da mesma. Portanto, de suma
importncia estar atento para o desenvolvimento das habilidades auditivas da criana,
por meio da observao de seus comportamentos frente aos estmulos sonoros seja no
ambiente familiar, pela observao dos pais e familiares que convivem com a criana,
quanto no ambiente escolar, por meio da observao do comportamento da criana em
sala de aula.
Na literatura especializada so descritos os comportamentos associados s
dificuldades, ou transtorno do processamento auditivo (TPA), tais como: dificuldade de
manter ateno, dificuldade de ouvir em ambiente ruidoso, dificuldade de seguir
instrues, baixo desempenho escolar, especialmente quanto leitura e escrita.
Destaca-se aqui que, muitos dos sintomas associados ao TPA, esto associados
tambm s dificuldades escolares. Estudiosos da rea referem que, por este motivo,
torna-se difcil diferenciar crianas que tem dificuldades de aprendizagem, das que tem
TPA, crianas com dficit de ateno e hiperatividade e TPA, por exemplo, pela
semelhana das manifestaes comportamentais presentes nestas situaes.
H tambm a possibilidade de co-existir TPA com dificuldades de
aprendizagem, distrbios de linguagem, TPA com dficit de ateno e hiperatividade e
conseqentemente, tais crianas necessitaro de apoio especializado para obter o
desempenho escolar desejvel.
O diagnstico do TPA no fcil de ser obtido na prtica clnica, e muitos
estudos esto sendo realizados no Brasil a fim de padronizar os testes utilizados para a
avaliao do processamento auditivo, visto que muitos dos testes utilizados no pas so
baseados em testes cuja verso original na lngua inglesa e, portanto, tiveram que
ser adaptado lngua portuguesa. Entretanto, os comportamentos sugestivos de TPA
so facilmente detectados por pais, professores e, pelo fato de interferirem no processo
de aprendizagem da criana, justifica-se a necessidade de atuarmos com estas
crianas com o objetivo de aprimorar suas habilidades auditivas e propiciar melhores
condies de aprendizagem.
RREEVVIISSOO DDAA LLIITTEERRAATTUURRAA
2 REVISO DA LITERATURA
Com o objetivo de compreender o que e quais as finalidades do treinamento
auditivo, para crianas que apresentem dificuldades quanto ao processamento auditivo,
inicialmente sero expostos trabalhos tericos e empricos os quais definem os termos
processamento auditivo e transtorno do processamento auditivo. Na sequncia, tais
termos sero analisados com base no referencial terico da Anlise Experimental do
Comportamento. A seguir, apresentaremos estudos que evidenciam relaes entre
dificuldades de leitura e escrita com dificuldades quanto s habilidades auditivas e
fonolgicas e suas implicaes para a criana em fase de alfabetizao. Posteriormente,
sero apresentadas pesquisas que abordam o foco deste trabalho: o treinamento auditivo.
2.1 Definies de processamento auditivo (PA) e transtorno do processamento
auditivo (TPA)
Em uma sala de aula, o professor lida constantemente com alunos que
apresentam dificuldades escolares dificuldades quanto leitura, escrita e/ ou
matemtica, entre outras possveis. Espera-se que exista essa diversidade, visto que
cada aluno tem seu prprio "ritmo de aprendizagem": uns so mais geis, aprendem com
maior facilidade; outros so mais lentos e, consequentemente, demoram mais para
aprender e requerem maior ateno por parte de pais e educadores em geral.
Em alguns casos, podem-se observar alunos que apresentam dificuldade de
prestar ateno em sala de aula, que so agitados e, assim, tm seu desempenho
acadmico prejudicado. Trata-se de condies desfavorveis ao processo de ensino e
aprendizagem, mas um fato comum, quando se prope estudar as possveis causas do
fracasso escolar, a dificuldade que os alunos apresentam em acompanhar as instrues
em sala de aula.
Tais comportamentos podem ser decorrentes de diferentes problemas:
distrbio de aprendizagem, dficit de ateno e hiperatividade, distrbio de leitura e
escrita, ou de um transtorno do processamento auditivo, tambm denominado distrbio ou
desordem do processamento auditivo.
Este ltimo termo tem sido abordado em vrias publicaes (PEREIRA, 1996;
PEREIRA, 1997; CHERMAK; MUSIEK, 1997; CLEVAND, 1997; ROBERTSON, 1999;
GARCIA, 2001; JERGER; MUSIEK, 2000; BELLIS, 2002; MOMENSOHN-SANTOS;
BRANCO-BARREIRO, 2004), que estudam relaes entre transtorno de processamento
auditivo e dificuldades de aprendizagem. Portanto, necessrio que os educadores
saibam reconhecer possveis manifestaes comportamentais caractersticas desse
transtorno, observadas no contexto escolar, para que possam agir adequadamente
nessas situaes.
Nos prximos pargrafos, faremos uma breve reviso de literatura acerca dos
termos processamento auditivo e transtorno do processamento auditivo, definindo-o e
posteriormente, relacionando aspectos abordados pela Anlise Experimental do
Comportamento, que podem ser aplicados para melhor compreenso e interveno nos
casos em que existe a suspeita da ocorrncia de tal transtorno.
Em meados da dcada de 1990, houve um aumento significativo das
publicaes nacionais de estudos dedicados ao processamento auditivo (AZEVEDO;
PEREIRA, 1997; MACHADO; PEREIRA, 1997; PEREIRA; ORTIZ, 1997; PEREIRA;
SCHOCHAT, 1997; PEREIRA; CAVADAS, 1998). Ou seja, cresceu o interesse dos
pesquisadores da rea de Audiologia em estudar se o indivduo tem a audio normal e,
mais que isso, como ele ouve. Em alguns casos, o indivduo pode apresentar a audio
normal, constatada em exames especficos (audiometria, por exemplo), porm, manifestar
comportamentos indicativos de problemas quanto ao processamento auditivo, o que, na
literatura internacional, chamado de auditory processing disorder, traduzido para o
portugus como desordem/distrbio ou transtorno do processamento auditivo.
Deve ser destacado que o transtorno do processamento auditivo diferente
da deficincia auditiva: o indivduo apresenta o nvel de audio normal, porm, tem
dificuldade quanto s habilidades auditivas que compem o processamento auditivo.
Cabe, portanto, fazer uma retomada sobre o conceito de processamento auditivo e
habilidades auditivas.
Segundo Boothroyd (1986), o processamento auditivo, tambm denominado de
percepo auditiva, est relacionado com as seguintes habilidades auditivas: deteco,
sensao sonora, discriminao, localizao, reconhecimento, compreenso, ateno e
memria. A seguir, so caracterizadas tais habilidades, de ainda acordo com Boothroyd
(1986):
A deteco auditiva a habilidade que permite ao indivduo detectar, identificar
a presena do estmulo sonoro.
Como sensao sonora, define-se a habilidade responsvel pelo julgamento
que o ouvinte faz acerca das caractersticas do som, ou seja, se este grave ou agudo
(sensao de frequncia ou pitch), alto ou baixo (sensao de intensidade, denominada
loudness). De acordo com essa definio, verifica-se que a sensao sonora uma
habilidade subjetiva, que varia para cada indivduo: por exemplo, um som que eu
considero alto ou intenso pode ser considerado baixo por outra pessoa, especialmente
se esta apresentar uma perda auditiva.
Define-se como discriminao sonora a habilidade de perceber diferenas
mnimas entre estmulos sonoros.
A localizao sonora, como o prprio nome diz, a habilidade que permite ao
ouvinte localizar a fonte sonora, o local de origem do estmulo sonoro.
Reconhecimento auditivo a habilidade de reconhecer um estmulo sonoro que
j foi apresentado anteriormente.
Compreenso auditiva a habilidade de atribuir significado informao
sonora recebida. Trata-se de um comportamento aprendido, que pode ser observado em
crianas, a partir de um ano de idade.
Ateno auditiva a habilidade de selecionar um estmulo auditivo principal,
dentre outros estmulos competitivos, sejam estes de natureza auditiva ou visual.
Memria auditiva a habilidade de armazenar informaes auditivas, de tal
forma que, posteriormente, tais informaes possam ser recuperadas, associadas ao
contexto em que foram utilizadas.
Pereira (1993) salienta que o processamento auditivo se desenvolve nos
primeiros anos de vida e depende tanto da integridade fisiolgica quanto da estimulao
ambiental que a criana recebe. Isto , no basta apenas a integridade do sistema
auditivo para que o processamento auditivo se desenvolva: tambm necessrio que o
meio atue de modo estimulante, propiciando o desenvolvimento das habilidades auditivas.
Pereira (1997) define o TPA como um distrbio da audio no qual h um
impedimento da habilidade de analisar e/ou interpretar padres sonoros. Tem como
possveis causas um prejuzo da capacidade biolgica inata do organismo (causa de
natureza orgnica) e/ ou falta de experienciao, em um meio ambiente acstico
(circunstancial), que podem ser consequncia de alteraes neurolgicas ou alteraes
sensoriais auditivas (perdas condutivas, mesmo que transitrias, decorrentes de episdios
de otite mdia, na infncia).
Existem alguns comportamentos que podem ser sugestivos de TPA, tal como
Pereira (1996) listou: ateno ao som prejudicada, dificuldade de escutar em ambientes
ruidosos, problemas de produo da fala, envolvendo os fonemas /r/ e /l/, principalmente,
problemas de linguagem expressiva quanto s regras da lngua (estrutura gramatical),
dificuldade de compreender em ambiente ruidoso, dificuldades de compreender palavras
de duplo sentido (piadas), problemas de escrita quanto a inverses de letras, orientao
direita/esquerda, disgrafias, dificuldade de compreender o que l; os indivduos podem ser
distrados, agitados, hiperativos ou muito quietos; desajustados (ou brincam com crianas
mais novas, ou com adultos mais tolerantes); tendncia ao isolamento (sentem-se
frustrados ao notarem suas falhas, na escola ou no lar); desempenho escolar inferior em
leitura, gramtica, ortografia e matemtica.
Quanto ao impacto psicossocial e necessidade educacional das crianas que
apresentam TPA ou seus comportamentos sugestivos, uma vez que difcil diagnosticar
tal transtorno, Pereira (1996) afirma que esto relacionados ao grau do TPA: poder ser
indicada desde a orientao e o acompanhamento do desenvolvimento da linguagem e da
aprendizagem, at o encaminhamento para a realizao de treinamento auditivo verbal e
fonoterapia.
Diante de todos esses comportamentos que podem ser indicativos de um
transtorno do processamento auditivo, verificamos que fica difcil diferenciar esse
transtorno de um distrbio de aprendizagem ou de um distrbio de linguagem, entre
outros, tais como o transtorno do dficit de ateno e hiperatividade. Sobre tal aspecto,
alguns autores referem que o TPA pode coexistir com esses outros distrbios, mas fica
difcil saber se secundrio ou no, com respeito aos distrbios citados anteriormente
(CLEAVAND, 1997; ROBERTSON, 1999; JERGER; MUSIEK, 2000).
Embora seja difcil diagnosticar o TPA, visto que preciso realizar uma srie de
testes especiais para avaliar diferentes habilidades auditivas, na presena de alteraes
na avaliao do processamento auditivo, existe a possibilidade de reverter esse quadro.
Nesse processo de facilitar as condies de escuta (as contingncias nas quais o
indivduo com TPA est inserido), o profissional que avaliou o processamento auditivo
(fonoaudilogo), alm de planejar as sesses de terapia para o indivduo com TPA,
direcionando as estratgias s suas necessidades especficas, deve tambm orientar
seus pais e professores, a fim de que o ambiente escolar e familiar propicie melhores
condies de escuta a esse indivduo que possui dificuldades quanto ao processamento
auditivo. Ou seja, preciso conhecer o ambiente em que o indivduo est inserido, para
saber quais as modificaes devem ser realizadas, para adequar as contingncias, tanto
na escola, quanto no lar e em terapia.
A orientao aos pais de crianas com TPA de grande valia, pois, informar os
mesmos sobre como lidar com a criana, da importncia de exp-la a diferentes situaes
de escuta e conscientiz-la sobre os diferentes sons que esto presentes no cotidiano,
qual a sua respectiva fonte sonora etc., so medidas simples que podem auxiliar a atuar
nas contingncias que influenciam na aprendizagem, tanto do comportamento auditivo
quanto do comportamento verbal.
Conhecer as contingncias que influenciam o comportamento auditivo
possibilita prevenir a ocorrncia do transtorno do processamento auditivo, ao expor o
beb a um ambiente acstico favorvel, com variados sons e auxiliado por adultos que
propiciem uma estimulao adequada, favorecendo igualmente o aprendizado da
linguagem oral. Nos casos em que o transtorno do processamento auditivo no pode ser
evitado, torna-se importante conhecer tais contingncias, de forma a modificar o ambiente
atual e facilitar as situaes de comunicao de maneira geral.
Madell(1999) salienta que
[...] problemas de ateno auditiva so definidos como dificuldades de atender a estmulos auditivos de uma maneira consistente. Ateno auditiva importante para a aprendizagem acadmica e da linguagem, comunicao e socializao. Crianas com problemas de ateno auditiva respondero aos sons inconsistentemente. (MADELL, 1999, p.372).
Robertson (1999) afirma que crianas com TPA podem distrair-se facilmente,
principalmente na escola (onde h muitas atividades, rudos) e podem ter dificuldade de
memorizar ou de se concentrar em atividades verbais. Frequentemente, essas crianas
so rotuladas como "pobres ouvintes", ou podem ser erroneamente diagnosticadas com
outros problemas de aprendizagem ou de comportamento. A autora sugere que, na
presena desses sintomas, a criana deve ser avaliada por profissionais qualificados (tais
como psiclogos e audiologistas), sendo que tais profissionais, juntamente com pais e
professores, podem definir estratgias para auxili-la em sala de aula.
Bellis (2002) conceitua o TPA como um dficit na recepo (entrada) de
base sensorial, envolvendo um ou mais processos auditivos (termo utilizado pela ASHA,
American Speech-Language-Hearing Association, em 1996), que pode ocasionar
dificuldades mais gerais, tais como comportamentos complexos, de que so exemplos
escutar, usar a linguagem e aprender.
Momensohn-Santos e Branco-Barreiro(2004) definem processamento
auditivo como o termo usado para descrever o que acontece quando o crebro
reconhece e interpreta os sons em torno de uma pessoa. Essas autoras enfatizam que o
processamento auditivo influenciado por muitos fatores e que mesmo a tarefa auditiva
mais simples influenciada por funes de alto nvel e no especficas modalidade,
como a ateno, a aprendizagem, a motivao, a memria e os processos de deciso
(MOMENSOHN-SANTOS; BRANCO-BARREIRO, 2004, p.555). Listam uma srie de
caractersticas (caractersticas gerais, emocionais, sociais e fsicas), as quais podem estar
presentes em crianas com TPA especialmente se ocorrer uma ou mais das seguintes
caractersticas, pode-se suspeitar da existncia de TPA. Entre as Caractersticas gerais
descritas pelas autoras, esto os comportamentos mais frequentes:
- falam muito hein? ou o qu?; - apresentam respostas inconsistentes para o som; - frequentemente interpretam mal o que lhe dito; - sempre pedem para lhe repetir o que lhe foi dito; - apresentam respostas lentas ou atrasadas para os estmulos de fala; - tm dificuldade para aprender via canal auditivo; dificuldade para ouvir em
ambientes ruidosos; - tm dificuldade para ouvir em situao de grupo; - tempo de ateno reduzido; - ansiedade ou estresse, quando em tarefas auditivas; - facilmente distrados; - dificuldade para obedecer a ordens ou direes (instrues); - parecem ouvir, mas no entendem o que a pessoa diz; - tm dificuldade para lembrar o que foi dito; - apresentam habilidades de fala e linguagem ruins; - apresentam habilidades fonolgicas, de discriminao dos sons da fala e
de leitura ruins; - apresentam discrepncia entre sua performance para atividades verbais e
no verbais. (MOMENSOHN-SANTOS; BRANCO-BARREIRO 2004, p.555).
Outro aspecto relevante salientado pelas autoras refere-se dificuldade de
provar objetivamente a existncia de TPA, j que exames objetivos no detectam esse
tipo de transtorno, que funcional fator que dificulta tanto o diagnstico, quanto a
aceitao da sua existncia, por parte de outros profissionais.
Rowe, Rowe e Pollard (2004) utilizam o termo dificuldade de processamento
auditivo funcional, para aludir capacidade de ouvir bem quanto acuidade auditiva,
ocorrendo uma dificuldade funcional para processar o que se ouve. Os autores definem
processamento auditivo como a habilidade de reter, seqenciar e processar
precisamente o que ouvido.
Em suma, existem vrias definies para o TPA e, de modo geral, todas
exemplificam manifestaes comportamentais, as quais podem ser identificadas por pais
e educadores e que so passives de serem modificadas, por meio de alteraes do
ambiente e, caso necessrio, pela interveno apropriada neste caso, o treinamento
auditivo, a ser abordado mais adiante.
2.2 Processamento Auditivo e Anlise Experimental do Comportamento
Baseada na teoria behaviorista, que tem Skinner como representante, a
Anlise Experimental do Comportamento busca compreender as relaes entre o
indivduo e o seu meio, como um influencia o outro, em suas interaes, ou seja, estuda o
comportamento e as variveis que nele interferem e que, muitas vezes, so influenciados
pelo mesmo.
Na literatura que trata do Behaviorismo ou que segue tal vertente, comum
encontrarmos a classificao de comportamento de duas formas distintas: comportamento
respondente e comportamento operante.
Comportamento respondente caracteriza-se por ser uma resposta eliciada por
estmulos antecedentes, isto , um comportamento que est sob o controle de estmulos
eliciadores, tal como explicita Skinner (1967). So considerados comportamentos
respondentes os reflexos, como o de salivao, que eliciado ao se introduzir alimento
na boca; o reflexo ccleo-palpebral, que o piscar de olhos, eliciado por um estmulo
sonoro antecedente demasiadamente intenso, entre outros que, como todos, tm em
comum o fato de sua ocorrncia ser controlada pela presena de estmulos eliciadores.
Quanto ao comportamento operante, como o prprio nome sugere, aquele
que opera sobre o ambiente, quer dizer, o comportamento ocorre na interao com o
meio, porm, no eliciado por um estmulo especfico. Ao invs disso, o comportamento
operante acontece na presena de estmulos discriminativos. A principal diferena entre o
estmulo eliciador e o estmulo discriminativo que o primeiro elicia a resposta (o
comportamento respondente), enquanto o outro apenas altera a probabilidade de
ocorrncia de determinado comportamento operante. Com relao a essa distino de
comportamento operante versus respondente, pode-se afirmar que o primeiro emitido,
enquanto o outro eliciado: os estmulos discriminativos aumentam a probabilidade de
que o comportamento operante seja emitido (SKINNER, 1967).
Em decorrncia dessa classificao, o comportamento auditivo pode
compreender ambos os comportamentos descritos: respondente e operante.
Dizer que o comportamento auditivo respondente, para muitos, pode ser
perfeitamente aceito, porque muitas vezes o ouvinte considerado como um ser passivo,
que recebe as informaes auditivas e, em seguida, responde. No entanto, no por
esse motivo que o comportamento auditivo , em parte, respondente. Na verdade, nos
primeiros meses de vida, o beb apresenta reaes exacerbadas quando diante de
estmulos sonoros de alta intensidade, isto , o estmulo sonoro; nessas situaes, este
exerce o papel de estmulo eliciador, pois sua presena elicia reflexos caractersticos da
espcie humana (o reflexo de Moro e o reflexo de Startle so alguns exemplos).
Ao longo do desenvolvimento, alguns reflexos no so mais apresentados pela
criana (apenas em casos especficos, tais como crianas com problemas neurolgicos),
porm, outros reflexos se mantm na idade adulta, como o reflexo ccleo-palpebral, o
qual pode ser observado facilmente quando diante de sons de alta intensidade,
apresentados de forma pontual (uma buzina, um tiro), alm do reflexo estapediano,
registrado ao se realizar um exame audiolgico especfico (imitanciomentria).
Entretanto, boa parte do comportamento auditivo operante, ou seja, ele
controlado por estmulos discriminativos auditivos; portanto, pode ser caracterizado como
sendo um comportamento aprendido.
O processamento auditivo, ou comportamento auditivo, de modo geral deve ser
considerado um comportamento aprendido e, como tal, influenciado no apenas pelas
condies biolgicas do indivduo (integridade dos rgos responsveis pela audio),
mas tambm pelas contingncias com as quais o indivduo convive.
Pelo fato de o comportamento auditivo ser aprendido, as respostas do indivduo
so modificadas em funo de novas aprendizagens, da interao entre este e seu meio
(SKINNER, 1967).
Pereira (1993) salienta que o processamento auditivo se desenvolve nos
primeiros anos de vida e depende tanto dos aspectos biolgicos quanto da estimulao
ambiental que a criana recebe. Essa estimulao ambiental, na viso da Anlise
Experimental do Comportamento, corresponde s contingncias de reforamento com
que o ouvinte influenciado e que lhe possibilita aprender o comportamento auditivo
que um aprendizado lento e complexo.
Katz e Wilde (1999) afirmam que, alm das habilidades auditivas, o
processamento auditivo envolve a aplicao do conhecimento que cada um possui para
entender melhor a mensagem, estando igualmente relacionado com a integrao e a
associao da informao auditiva com outros estmulos sensoriais (por exemplo, os
estmulos visuais). Com tal assertiva, as autoras nos remetem importncia da
comunidade verbal para a aprendizagem do comportamento auditivo e, da mesma forma
que os estmulos auditivos, os estmulos visuais so importantes para a aprendizagem do
comportamento verbal e do comportamento auditivo (por exemplo, para reconhecer o som
da campainha do telefone, necessrio que eu veja ou toque, se eu tiver uma deficincia
visual, o aparelho telefnico; caso contrrio, fica muito difcil abstrair o objeto que produziu
esse som).
Vale ressaltar que, segundo Skinner (1967), a habilidade corresponde a um
comportamento refinado, e a contingncia que aperfeioa a habilidade o reforo
diferencial de respostas que possuem propriedades especiais. E, para a habilidade se
desenvolver, necessrio que o reforo seja imediato resposta adequada.
A seguir, ser feita uma anlise do comportamento auditivo em funo das
definies das habilidades auditivas descritas anteriormente, segundo Boothroyd (1986).
A deteco auditiva corresponde ao comportamento de discriminar entre a
presena e ausncia de determinado som. Pessoas que apresentam deficincia auditiva
necessitam que o som seja emitido numa intensidade sonora maior, para apresentar o
comportamento auditivo de detectar a presena do som, quer dizer, sons de baixa
intensidade no so detectados.
Por tratar-se de um comportamento aprendido, podem-se observar diferentes
respostas presena do som: por exemplo, ao detectar o toque da campainha de um
telefone (onde esse som ser chamado de S1, e o telefone, F1, fonte sonora 1, no caso),
um beb pode apresentar o comportamento de despertar de um sono leve e chorar, ou
apenas se assustar. Contudo, quando ele ouvir outras vezes esse mesmo som e verificar
que, toda vez que tal fenmeno ocorre, uma pessoa atende ao telefone (chamarei esse
comportamento de R1), futuramente essa criana vai querer atender ao telefone, ou seja,
ela vai, por imitao, tentar emitir o comportamento que foi reforado pelos adultos, todas
as vezes que o telefone toca, isto , vai atend-lo.
Conforme o exemplo acima, tal comportamento de acordar e, em outras
circunstncias, de imitar o comportamento do adulto, atendendo ao telefone, que, por seu
turno, o prprio adulto reforar este na criana, no ocorre pura e simplesmente pelo fato
de a criana apresentar a habilidade de detectar o som.
Vejamos outra situao parecida para exemplificar: em outro momento, ao
invs do som da campainha do telefone, a criana escuta o som da campainha do
interfone (F2= fonte sonora 2) de sua casa (S2) e observa que, toda vez que esse som
est presente, algum vai em direo base do interfone, dentro da casa, para conversar
com a pessoa que inicialmente interfonou (R2). Essa resposta acontece, em primeiro
lugar, pelo fato de o adulto detectar o som de S2 (interfone) e, ainda, por discriminar S2
de S1(campainha do telefone) e reconhecer que o S2 proveniente de F2. Portanto, se,
numa situao como essa, a criana que ouviu S2 se dirigir ao telefone, ao invs do
interfone, pode-se dizer que ela no discriminou auditivamente S1 de S2, portanto, no
reconheceu S2. Se isso acontecer, provavelmente sua me vai lhe dizer: No, filho, no
foi o telefone que tocou: foi o interfone, este aqui! (mostrando F2, que gerou S2). A
criana vai aprender que esse S2 proveniente do interfone (F2) e no do telefone(F1),
pelo fato de, ao atender ao telefone nessas circunstncias, observar que no h ningum
na linha para conversar com ela, por exemplo.
Porm, quando a criana apresentar R1 apenas na presena de S1, isso ser
reforado, por meio do reforo diferencial imediatamente emisso de seu
comportamento: a) pela pessoa que fez a ligao e que vai conversar com a criana pelo
telefone, b) pelo adulto de casa que vai elogiar a criana, nessas situaes, depois vai
solicitar o telefone e c) quando, na presena de S2, a criana olhar ou se dirigir F2,
provavelmente vo lhe dizer: Ah! Voc ouviu o interfone tocar? Pode deixar que a
mame vai ver quem .
Por conseguinte, nesta ltima situao, a criana detectou, discriminou e
reconheceu o som S2 gerado por F2 e, por isso, foi elogiado por sua me.
Consequentemente, a probabilidade de a criana emitir o comportamento de se dirigir
fonte sonora correta vai aumentar, de sorte que se diz que a criana aprendeu tal
comportamento, reproduzindo-o toda vez que ela o emitir nas mesmas condies. Ou
seja, a criana no nasce sabendo que o telefone tem um som, o interfone tem outro,
que a voz de sua me diferente da voz da sua av, mas devido a sua interao com o
ambiente, e pelas contingncias que a criana aprende tais diferena e portanto,
responde diferentemente em cada situao.
Talvez, de todas as habilidades auditivas descritas como etapas do
processamento auditivo, a de sensao sonora seja a mais subjetiva de todas,
lembrando-se que a sensao sonora a habilidade que permite fazer o julgamento
acerca das caractersticas do som, isto , se este grave ou agudo (sensao de
frequncia ou pitch), alto ou baixo (sensao de intensidade ou loudness).
Mesmo subjetiva, a sensao sonora pode ser considerada um comportamento
auditivo aprendido tambm, fortemente influenciado pelas contingncias e dependentes
do meio em que o ouvinte vive. Por exemplo, um msico, devido a sua profisso e
exposio aos sons, definido por muitos como um profissional que possui a audio
refinada, que percebe diferena sutis entre os sons. De fato, espera-se que isso ocorra,
pois um msico est exposto a contingncias em que diferenas mnimas entre os sons
so importantes para a consequncia do seu comportamento; sua percepo auditiva
deve assim ser refinada, para que ele possa perceber algo que est em desarmonia no
conjunto de todos os instrumentos de sua orquestra. Isso se explica devido ao fato de que
tal profissional est exposto a uma variedade de sons, que diferem em funo da
tonalidade, intensidade propiciando-lhe um repertrio extenso de estmulos
discriminativos.
Portanto, todo e qualquer aluno que se dispe a aprender a tocar um
instrumento musical, aprende a fazer tais discriminaes mnimas entre os sons.
Entretanto, em um indivduo que no se dedica ao aprendizado nessa rea, seja para
tocar um instrumento musical, seja para cantar, a sensao sonora menos acurada,
uma vez que a exposio que tem com os diferentes sons no exige desses indivduos a
diferenciao de forma to precisa das caractersticas dos sons.
Em consequncia, um indivduo pode considerar a frequncia da sua voz muito
grave e, quando um tenor ouve a voz deste, no a considera to grave. Por outro lado,
uma famlia de descendncia oriental pode considerar a voz de um vizinho de
descendncia italiana demasiadamente alta, e estes podem achar a voz dos primeiros
extremamente baixa enquanto, se perguntarmos para cada um deles o que acham de
sua voz, ambos provavelmente considerem sua voz normal, nem to alta (alta
intensidade), nem to baixa da o porqu se considerar to subjetivo esse
comportamento e, ao mesmo tempo, dependente das contingncias de reforamento
pelas quais influenciado.
Tal como foi referido a respeito das habilidades auditivas de deteco,
discriminao e reconhecimento, a localizao sonora um comportamento aprendido.
Para que a criana aprenda a localizar a fonte sonora, ou seja, a discriminar e a precisar a
direo da fonte sonora, importante que a mesma apresente audio binaural e que o
meio seja estimulante, isto , que a criana vivencie situaes em que o som emitido
em diferentes direes. Porm, isso no suficiente para que a criana discrimine
diferentes direes em que o som foi gerado: necessrio que o adulto sinalize, seja
verbalmente,seja visualmente, falando e mostrando o local da fonte sonora, a fim de que
a criana encaminhe o olhar para a direo indicada e, assim, localize o som.
Na verdade, inicialmente, a aprendizagem ocorre por modelagem, pois, quando
a criana escuta determinado som (por exemplo, o som de um carrinho de brinquedo,
que produz o som de uma sirene), ela olha para todos os lados, procura deste
brinquedo; o adulto auxilia a criana, ao mostrar onde est o carrinho, direcionando seu
olhar, seus passos. Futuramente, quando a criana se dirigir fonte sonora sem o auxlio
do adulto, provavelmente o fato de conseguir localizar o brinquedo imediatamente aps
ouvir seu som ser reforador, porque ela vai obter o brinquedo mais rapidamente. Sendo
assim, a probabilidade de a criana se dirigir ao brinquedo, todas as vezes em que ouvir o
barulho da sirene, vai aumentar.
A respeito da ateno auditiva, alguns autores empregam o termo ateno
seletiva, para definir tal habilidade.
Traduzindo para a anlise experimental do comportamento, a habilidade de
ateno auditiva seria caracterizada pelo controle exercido por determinado estmulo
discriminativo especfico, de natureza auditiva (por exemplo, a fala do professor) em
relao a outros estmulos discriminativos, os quais ocorrem simultaneamente (a fala dos
demais alunos, em sala de aula, dos funcionrios que esto prximos sala de aula
conversando, os estmulos visuais presentes na prpria sala de aula).
A ateno auditiva talvez seja mais difcil de ser conceituada, visto que
frequentemente se associa o prestar ateno a algo prprio do ouvinte, quando, na
verdade, Skinner (2003, p. 137) define ateno como uma relao que controla, a
relao entre uma resposta e um estmulo discriminativo. Nessa definio, a ateno
parece ser mais influenciada pelo controle exercido pelo estmulo discriminativo do que
pelo prprio ouvinte.
Machado e Pereira (1997) argumentam que a criana que apresenta
dificuldades quanto ateno seletiva pode responder a todos os estmulos ou a nenhum,
por no distinguir entre os significativos e os que devem ser ignorados. De fato, a criana
que apresenta dificuldade em manter a ateno auditiva no estabelece uma relao de
controle com o estmulo discriminativo em questo e, dessa forma, por no estar sob o
controle de tal estmulo, ela responde a este e aos demais estmulos discriminativos
presentes ou, ento, no responde a nenhum, pois, neste caso, a sobreposio destes
no possibilita que apenas um estmulo discriminativo exera o controle do
comportamento da criana: consequentemente, ela no consegue prestar ateno, sendo
caracterizada como um aluno distrado, caso se comporte dessa maneira na sala de aula.
A definio da habilidade compreenso auditiva est ligada capacidade de
atribuir significado informao auditiva. E, embora as outras habilidades mencionadas
tambm estejam diretamente relacionadas com o comportamento verbal, a compreenso
auditiva (bem como a memria auditiva) parece ser bastante dependente do
comportamento verbal, da troca entre falante e ouvinte e de que ambos sejam membros
da comunidade verbal, para que o operante verbal emitido pelo falante esteja associado
s mesmas contingncias de reforamento s quais o ouvinte foi exposto, conforme
sustenta Skinner (1991):
[...] Os falantes no apreendem o mundo e o descrevem com palavras; eles respondem ao mundo, dependendo das maneiras como as respostas foram modeladas e mantidas por contingncias especiais de reforamento. Os ouvintes no extraem informao ou conhecimento das palavras, compondo cpias de segunda mo sobre o mundo; eles respondem aos estmulos verbais segundo as maneiras com que foram modelados e mantidos por outras contingncias de reforamento. Ambas as contingncias so mantidas por um ambiente verbal desenvolvido ou cultural. (SKINNER, 1991, p.53-54).
Dessa forma, para que o ouvinte compreenda o operante verbal emitido pelo
falante, torna-se necessrio que ambos tenham sido expostos aos mesmos estmulos
verbais e, tambm, que suas respostas tenham sido modeladas e mantidas por
contingncias de reforamento funcionalmente iguais.
A respeito da memria auditiva, tal como definida por Boothroyd (1986), a
habilidade de armazenar informaes auditivas, de sorte que, posteriormente, essas
informaes possam ser recuperadas, associadas ao contexto em que foram utilizadas,
uma habilidade aprendida e dependente de vrios fatores. Primeiro, para que um ouvinte
memorize uma sequncia auditiva (sons verbais, instrumentais), necessrio que ele
tenha sido exposto a tais estmulos; isso significa que o ouvinte deve ser capaz de
detect-los, reconhec-los, discrimin-los e, obviamente, tais estmulos devem servir
como estmulos discriminativos de maneira a exercer o controle sobre o comportamento
auditivo do ouvinte, ou seja, para que ele atente ao som (ateno auditiva). Assim, tais
estmulos discriminativos funcionaro como um repertrio para o qual o fato de memorizar
esses estmulos seja reforador nas contingncias em que tais estmulos no estejam
presentes, porm o indivduo seja capaz de reproduzi-los verbalmente.
Ainda a respeito da importncia do meio, das contingncias de reforamento e
da modelagem das respostas auditivas do ouvinte, alguns autores destacam a sua
importncia para a aprendizagem das habilidades que compem o comportamento
auditivo (PEREIRA; ORTIZ, 1997; RAMOS, 1999).
Pereira e Ortiz (1997) argumentam que, se um indivduo estiver inserido num
ambiente desfavorvel, com privao sensorial, causada tanto por ambientes privados
culturalmente quanto por perdas auditivas (temporrias ou no), o desenvolvimento das
habilidades envolvidas no processo de reconhecimento da fala poder estar prejudicado,
dificultando o aprendizado dessas habilidades e, consequentemente, o desenvolvimento
do processamento auditivo.
Segundo Ramos (1999), a criana nasce com o sistema auditivo perifrico
(orelha externa, mdia e interna) totalmente formado. Porm, a maturao das vias
auditivas no nvel de tronco cerebral ocorrer somente se a criana receber estimulao
sonora.
Em suma, o desenvolvimento do comportamento auditivo muito mais
complexo e depende uma srie de fatores. No um comportamento inato, pois, embora
o recm-nascido apresente a capacidade biolgica para ouvir, o seu meio que vai
possibilitar que ele aprenda a ouvir.
Muitas vezes, isso no to claro para as pessoas, que apenas diferenciam
a pessoa com audio normal daquela com uma perda auditiva, que pode variar desde
leve at a profunda, como se o fato de apresentar a audio normal garantisse ao
indivduo o status de ser um bom ouvinte. Infelizmente, no to simples assim!
A literatura especializada, na rea de Audiologia, utiliza o termo transtorno do
processamento auditivo para designar indivduos que possuem a audio normal,
contudo, apresentam dificuldade quanto a uma ou mais habilidades auditivas e
frequentemente so caracterizados como pobres ouvintes (PEREIRA, 1996; 1997;
JERGER; MUSIEK, 2000; BELLIS, 2002; MOMENSON; BRANCO-BARREIRO, 2004;
ROWE; POLLARD; ROWE, 2004).
Pessoas com transtorno do processamento auditivo podem apresentar as
dificuldades caractersticas desse transtorno e, possivelmente, no foram expostas a
contingncias de reforamento suficientemente adequadas para possibilitar o aprendizado
do comportamento auditivo, das habilidades auditivas.
Portanto, fundamental compreender o processamento auditivo enquanto
comportamento aprendido, para melhor definir as estratgias que possam suprir as
contingncias que no foram suficientes para o desenvolvimento das respectivas
habilidades, tanto no contexto clnico, quanto no escolar e familiar.
2.2.1 A importncia do meio para a promoo e manuteno de novos
comportamentos: a questo das contingncias de reforamento
A Anlise Experimental do Comportamento cincia originada do
Behaviorismo Radical, tendo como seu maior representante Skinner preocupa-se em
estudar o comportamento humano, bem como as variveis que o influenciam, de forma a
aumentar ou diminuir a probabilidade de sua ocorrncia, quais variveis influenciam na
manuteno ou, ento, na extino de determinados comportamentos. Ou seja, tal como
afirma Skinner (1967), o comportamento controlado pelo meio.
Ao contrrio da posio dos autores que criticam os pressupostos de Skinner,
bem como a Anlise Experimental do Comportamento, a influncia que o meio exerce
sobre o comportamento, segundo Skinner, no se resume dade estmulo-resposta.
Para compreender o papel do meio sobre determinado comportamento, necessrio
conhecer as variveis que o, as consequncias desse comportamento e os eventos que o
mantiveram, o que chamado de contingncias de reforamento.
O meio pode influenciar de modo acidental os comportamentos; entretanto,
esse tipo de influncia ambiental no a que mais interessa ao analista de
comportamento da rea de educao preciso que o professor conhea quais so as
condies, os eventos que aumentam a probabilidade de um determinado comportamento
(especificamente, o comportamento dos alunos) ocorrer. Quer dizer, quais so as
contingncias de reforamento: sob quais condies/eventos o comportamento
contingente.
Skinner(1991) escreve sobre o ouvinte, explicitando como ocorrem as relaes
entre ouvinte e falante:
[...] Os falantes no apreendem o mundo e o descrevem com palavras; eles respondem ao mundo, dependendo das maneiras como as respostas foram modeladas e mantidas por contingncias especiais de
reforamento. Os ouvintes no extraem informao ou conhecimento das palavras, compondo cpias de segunda mo sobre o mundo; eles respondem aos estmulos verbais segundo as maneiras com que foram modelados e mantidos por outras contingncias de reforamento. Ambas as contingncias so mantidas por um ambiente verbal desenvolvido ou cultural. (SKINNER, 1991, p. 53-4).
Considerando que a criana, enquanto ouvinte, vai aprender em funo das
atitudes dos falantes e das contingncias de reforamento do seu meio, mais uma vez fica
claro que tais contingncias so de suma importncia para favorecer novos aprendizados.
A respeito das contingncias de reforo no processo de ensino e
aprendizagem, Zanotto (2000) faz algumas consideraes interessantes:
Falar em arranjo de contingncias afirmar o carter planejado do ensino, questionando-se, como Skinner j o fez em relao aprendizagem, alternativas que defendam a natureza espontnea, natural e assistemtica deste processo. O ensino formal e cuidadosamente programado, possibilita agilizar e maximizar as mudanas comportamentais pretendidas, as quais, se se as deixar ocorrer naturalmente, podem ser bastante demoradas ou at mesmo no ocorrer. [...] Mas contingncias s podem ser arranjadas quando se tem clareza das mudanas comportamentais que se quer obter. (ZANOTTO, 2000, p. 42 ).
Essa autora, de fato, refere-se importncia de o professor planejar
adequadamente suas aulas, para que assim possa alcanar o verdadeiro objetivo do
ensino escolar, que a aprendizagem do aluno. Da mesma forma, o professor poder
auxiliar o aluno que apresente comportamentos sugestivos de transtorno do
processamento auditivo, se ele souber: em primeiro lugar, que seus comportamentos em
sala de aula so manifestaes de um transtorno que pode ser superado com auxlio de
profissionais especializados (fonoaudilogos, psiclogos); em segundo lugar, que o
professor pode modificar as contingncias reforadoras de comportamentos indesejveis
(tal como o de distrair-se facilmente com estmulos concorrentes fala do professor) e,
finalmente, que o pode ser feito um rearranjo das contingncias, de sorte a propiciar a
reduo de comportamentos inadequados, de um lado, e de favorecer ou aumentar a
probabilidade de ocorrer comportamentos que favoream a aprendizagem, em sala de
aula.
Quanto ao desempenho escolar de crianas com transtorno do processamento
auditivo, Pereira (1996) salienta que este pode ser melhorado ou agravado, dependendo
de fatores tais como:
- posio do aluno em sala de aula;
- tamanho da classe;
- nvel de rudo ambiental;
- fala do professor quanto ao nvel de intensidade e clareza de voz;
Isso significa que, se o aluno for posicionado nas primeiras fileiras, prximo ao
professor e distante do corredor (para que o rudo externo no atrapalhe a escuta em sala
de aula) e, se o professor falar de forma mais clara, bem articulada, por exemplo, a
tendncia que o desempenho do aluno melhore: as modificaes ambientais so
modificaes nas contingncias que podem facilitar o aprendizado do aluno com
transtorno do processamento auditivo.
Machado e Pereira (1997) destacam o avano tecnolgico que possibilitou o
acesso televiso, ao computador, ao videogame; embora possuam as suas vantagens,
tm distanciado pais e filhos, reduzindo o tempo de comunicao entre eles trata-se de
contingncias de reforamento que aumentam a probabilidade de a criana manter a
ateno nesses estmulos discriminativos, ignorando outras fontes de informao, trocas
comunicativas entre os pares, familiares, que repercute seriamente nas suas habilidades
auditivas e, consequentemente, no desenvolvimento (e aprendizagem) do comportamento
auditivo e do comportamento verbal. Sendo assim, ficam reduzidas as experincias de
ouvir a linguagem fato que pode propiciar ou agravar dificuldades de processamento
auditivo de algumas crianas. Por esse motivo, as autoras sugerem que os pais de
crianas com problemas auditivos (seja perda auditiva, seja transtorno do processamento
auditivo):
a) Falem olhando para a criana, de frente para ela, em um ambiente
silencioso isto , dar o modelo de como ouvir com ateno;
b) Chamem a criana pelo nome, fazendo contato de olho ou mesmo a
tocando, antes de comear a falar;
c) Falar com ritmo contendo pausas ntidas, articulao clara, entonao
enfatizada e apresentar uma idia do pensamento que se quer transmitir por vez;
d) Garantir que a criana entendeu as solicitaes, pedindo-lhe que as repita e
no apenas perguntando se ela entendeu. Sempre que a criana fizer uma transmisso
de seu pensamento, responder com palavras que demonstrem, no mnimo, que voc
ouviu o que ela falou. Evitar que a criana faa uma comunicao e esta fique sem
resposta.
e) Criar situaes de comunicao diria de pelo menos trinta minutos.
Tais condutas, sugeridas pelas autoras, nada mais so do que rearranjo das
contingncias, cujo objetivo facilitar as condies para as crianas em fase de
aprendizado da linguagem (envolvendo tanto o comportamento auditivo quanto o
comportamento verbal), de forma a promover melhor interao entre falante e ouvinte e
amenizar as dificuldades que as crianas com problemas auditivos comumente
apresentam.
Nos itens a e b, as autoras referem-se ao papel reforador do olhar do
ouvinte em direo ao falante e vice-versa, nas situaes de comunicao. No item d,
fica claro o papel reforador do adulto, ao manter o dilogo com a criana se a criana
conversa com o adulto, dirige-se ele verbalmente e este ignora sua fala, reduz-se a
probabilidade de que sejam estabelecidas novas situaes comunicativas,
posteriormente.
Gielow (1997) sugere estratgias que podem ser usadas pelos professores em
sala de aula, a fim de melhorar as condies de aprendizagem:
- usar instrues curtas;
- usar instrues verbais e visuais, escrevendo na lousa as instrues (uso de
pistas visuais);
- reformular as instrues, reduzindo a complexidade das frases, sempre que a
criana no compreender o que foi explicado;
- associar informaes de natureza auditiva e visual, para facilitar a
memorizao do novo aprendizado;
- ao ensinar novos conceitos, familiarizar a criana com novos conceitos e
vocabulrios que sero apresentados em sala de aula, escrevendo na lousa uma lista
contendo palavras-chave do novo assunto a ser trabalhado;
- permitir que o aluno se sente numa distncia de, no mximo, trs metros do
professor; e
- posicionar a criana longe do corredor (devido ao rudo externo).
Novamente, observa-se que mudanas no ambiente de aprendizagem so
indicadas para facilitar o aprendizado de crianas com dificuldades quanto ao
processamento auditivo.
2.3 Relaes entre processamento auditivo, conscincia fonolgica e aprendizagem
da leitura e escrita
Pelas consideraes feitas at o momento, verificamos que o transtorno do
processamento auditivo est diretamente ligado s dificuldades escolares, sendo comum
encontrar na literatura relaes entre dificuldades quanto s habilidades auditivas e
fonolgicas em indivduos que possuem problemas de leitura e/ou escrita. Sendo assim,
neste tpico, sero expostos dados da literatura que relacionam as habilidades de
processamento auditivo conscincia fonolgica em crianas com e/ou sem dificuldades
de leitura e escrita.
No caso das dificuldades de leitura e escrita, alguns autores podem usar
diferente terminologia: transtorno da leitura, transtorno da escrita, dislexia, distines que
sero mais bem definidas nos pargrafos seguintes. Muitos dos estudiosos associam tais
dificuldades ao transtorno do processamento auditivo, podendo ou no estar ter relao
com as dificuldades de conscincia fonolgica.
Segundo Blomert, Mitterer e Paffen (2004), a dislexia de desenvolvimento
um termo que designa pobres habilidades de leitura e escrita apesar de adequada
inteligncia e na ausncia de distrbio sensorial ou sinais neuropsicolgicos. Tais autores
referem que a dislexia de desenvolvimento est relacionada a um dficit fonolgico e que
este pode ser consequncia de dficits na percepo auditiva e de fala. Dessa forma,
observamos que os autores consideram a dislexia de desenvolvimento como decorrente
de distrbios de natureza fonolgica e auditiva.
Fellipe, Colafmina e Costa Jnior (2001) examinaram a habilidade de figura-
fundo auditiva, comparando os resultados obtidos ao desempenho dos participantes nas
tarefas de leitura e escrita. Participaram desse estudo 62 adolescentes, de 12 e 14 anos,
alunos da 5 a 8 srie de uma escola pblica de Ribeiro PretoSP. Foi utilizado o teste
de Escuta Dictico Consoante-Vogal, para avaliar a ateno seletiva (nas suas trs
etapas, de ateno livre, ateno direcionada direita, ateno direcionada esquerda),
e as tarefas de leitura oral, leitura silenciosa, ditado de pseudopalavras e elaborao
escrita de uma histria a partir de temas propostos, para verificar o desempenho de leitura
e escrita. Com os resultados obtidos, no foi encontrada associao estatisticamente
significante entre dificuldade na habilidade auditiva de figura-fundo e baixo desempenho
nas tarefas de leitura e escrita. Entretanto, houve associao entre a no vantagem da
orelha direita com a dificuldade de decodificao na tarefa de leitura oral, alm de
tambm se notar relao estatisticamente significante entre baixo escore de compreenso
de leitura e baixa porcentagem de acertos, na etapa de ateno direita.
Capovilla et al. (2001) adotaram uma verso do International Dislexia Test,
adaptada para o portugus, com crianas da primeira srie do Ensino Fundamental.
Nesse teste, so avaliadas: leitura, escrita, habilidades matemticas, conscincia
fonolgica, processamento auditivo, processamento visual, velocidade de processamento,
sequenciamento, habilidades motoras e raciocnio. A amostra foi dividida em dois grupos:
com bom e mau desempenho de escrita sob ditado. Observou-se que o segundo grupo
apresentou dificuldades mais expressivas quanto conscincia fonolgica,
processamento auditivo, sequenciamento e velocidade de processamento. Porm,
ambos os grupos tiveram escores semelhantes para as habilidades motoras,
processamento visual e habilidades aritmticas.
Baran e Musiek (2001) relatam que a maioria dos estudos realizados com
testes dicticos em crianas demonstra uma vantagem significativa quanto porcentagem
de acertos na orelha direita, e que o desempenho nesses testes tende a melhorar, com o
aumento da idade. No caso das crianas com distrbios de aprendizagem, os resultados
quanto orelha esquerda esto alterados, quando comparados com os padres de
normalidade para a idade, enquanto, na orelha direita, os resultados tendem a ser
normais.
Com o objetivo de estudar os mecanismos e processos envolvidos no
processamento auditivo, em crianas com e sem distrbios de aprendizagem, Garcia
(2001) avaliou 60 indivduos, na faixa etria de nove anos e cinco meses a onze anos e
dez meses. Os participantes de seu estudo cursavam a 3 e 4 srie do Ensino
Fundamental de uma escola pblica de BotucatuSP. A amostra foi distribuda em dois
grupos: Grupo I (grupo-controle), constitudo por 40 participantes sem distrbio do
aprendizado do cdigo grfico, e o Grupo II (com queixa escolar de alterao na
aprendizagem), constitudo por 20 participantes. A bateria de testes usada para avaliar o
processamento auditivo comps-se da triagem do processamento auditivo, proposta por
Pereira (1993, 1997) e revisada por Toniolo et al. (1994), Teste Peditrico de
Inteligibilidade de Fala PSI (Pediatric Speech Test), Teste Dictico de Dgitos e Teste de
Fuso Auditiva AFT-R. A autora concluiu que os testes de memria sequencial para
sons verbais e no verbais, PSI, com mensagem ipsilateral, na orelha direita, na relao
fala/rudo 0 e 10dB, Dictico de Dgitos e AFT-R na condio binaural e monoaural,
foram adequados para diferenciar os grupos I e II. Destacou igualmente que os testes
mais efetivos para diferenciar os dois grupos foram o Teste Dictico de Dgitos e o AFT-R.
Para verificar possveis associaes entre o desempenho de crianas com
transtornos especficos da leitura e da escrita em testes que avaliam o processamento
auditivo para sons verbais e no verbais, Frota (2003) estudou 60 crianas, sendo 30 sem
transtornos especficos de leitura e escrita (G1) e 30 com transtornos especficos de
leitura e escrita (G2). Foram utilizados os testes SSW, Fala com Rudo, Dictico no
verbal Memria sequencial no-verbal, Localizao, Padro de durao e Padro de
Frequncia, para avaliar o processamento auditivo. A autora encontrou associao
estatisticamente significante entre o desempenho inferior em atividades de leitura e
escrita e inabilidades auditivas de ordenao temporal complexa de sons verbais,
fechamento, figura-fundo para sons verbais, figura-fundo para sons no verbais, escuta
direcionada e identificao de padro de sons.
Ribas e Tozi (2005) realizaram uma pesquisa com o objetivo de verificar a
performance de crianas com diagnstico de distrbio de aprendizagem, alterao de
processamento auditivo e queixa de desateno, frente ao teste de fala com rudo branco,
numa relao sinal/rudo de 10 dB. Para isso, examinaram os pronturios de 22 crianas
que se submeteram avaliao do processamento auditivo na Clnica de Fonoaudiologia
da Universidade Tuiuti do Paran. O critrio utilizado para analisar o resultado do teste de
Fala com rudo foi do ndice de acertos igual ou superior a 70% de acertos em ambas as
orelhas, indicando resultado normal. Observou-se que 5 crianas (22% da amostra)
mostraram performance inferior a 70% - embora 100% da amostra apresentou o
diagnstico de distrbio do processamento auditivo. Dessa forma, as autoras concluram
que a relao sinal/rudo de +10dB no sensibiliza o teste de fala com rudo ipsilateral.
A fim de verificar possveis associaes entre habilidades de conscincia
fonolgica e de processamento auditivo em crianas com e sem distrbio de
aprendizagem, Garcia, Campos e Padovani (2005) avaliaram as habilidades de
conscincia fonolgica e de processamento auditivo em 60 crianas, de 9 a 11 anos de
idade, sendo 30 de baixo risco para alteraes de aprendizagem (Grupo 1) e 30 crianas
com distrbio de aprendizagem (Grupo 2). Os autores empregaram os seguintes
procedimentos: provas de localizao sonora, memria sequencial para sons verbais e
no-verbais, Teste de Inteligibilidade de fala, PSI e as provas de conscincia fonolgica
sntese silbica, sntese fonmica, rima, segmentao fonmica, excluso fonmica e
transposio fonmica. Observou-se, no Grupo 2, associao predominantemente entre
as provas de sntese fonmica, rima, segmentao fonmica, excluso fonmica e
transposio fonmica e PSI com mensagem competitiva contralateral e mensagem
competitiva ipsilateral em diferentes relaes fala/rudo, dado este que sugere relao
entre pobre performance em habilidades auditivas e pobre performance nas provas de
conscincia fonolgica, em indivduos com distrbio de aprendizagem. Mais
especificamente, houve associao entre habilidade de figura-fundo e as habilidades de
conscincia fonolgica.
Frota e Pereira (2004) aplicaram a Prova de Conscincia Fonolgica numa
amostra de 60 crianas de 9 a 12 anos de idade, sendo 30 sem histria de manifestao
de distrbio de leitura e escrita e com resultado adequado faixa etria na Prova de
Conscincia Fonolgica, compondo o Grupo 1. O Grupo 2 continha 30 crianas com
dificuldades fonolgicas constatadas na Prova de Conscincia Fonolgica. Ambos os
grupos foram avaliados com os testes de padro de durao e de frequncia com tom
puro. As autoras constataram que o Grupo 2 apresentou maior variabilidade de
resultados, com comportamento mais heterogneo e desempenho inferior, quando
comparado ao Grupo 1. Em face dos dados obtidos, as estudiosas observaram que as
crianas com inabilidade de manipular sons da fala apresentam dificuldade em
ordenao temporal de sons com frequncias e duraes diferentes, concluindo que
existe correlao entre alteraes da ordenao temporal de sons de diferentes
frequncias (grave x aguda) e durao (longo x curto) e dficit de conscincia fonolgica.
Capellini, Germano e Cardoso (2008) mediram o processamento auditivo e a
conscincia fonolgica de crianas com dislexia, buscando possveis correlaes.
Participaram desse estudo 20 escolares da 2 e 4 srie do Ensino Fundamental, da rede
pblica municipal de uma cidade no interior de So Paulo. A amostra foi dividida em dois
grupos, GI e GII, com 10 escolares em cada. O GI foi constitudo por escolares com
dislexia, e o GII, por escolares com bom desempenho acadmico. A avaliao do
processamento auditivo foi feita por meio das provas de memria sequencial para sons
no-verbais, memria sequencial para sons verbais, localizao sonora e pelos testes
especiais PSI, Dictico de Dgitos e SSW. Para verificar as habilidades fonolgicas, foi
usada a Prova de Conscincia Fonolgica (CAPOVILLA; CAPOVILLA, 1998). Ao
examinar os dados obtidos em tais provas, observou-se que os escolares do GII
apresentaram melhor desempenho quanto s habilidades silbicas e fonmicas para
segmentao, manipulao, transposio, rima e aliterao, em relao aos escolares do
GI. Mas, de forma geral, em ambos os grupos houve melhor desempenho nas habilidades
silbicas, comparadas s fonmicas. Outro dado importante foi a associao significante
entre habilidades auditivas e fonolgicas, que, segundo as autoras, pode influenciar
diretamente na percepo de aspectos acsticos, temporais e sequenciais dos sons,
interferindo na formao de uma representao fonolgica estvel (CAPELLINI;
GERMANO; CARDOSO, 2008).
2.4 Impacto do TPA para o ensino e aprendizagem em sala de aula
Clevand (1997) afirma que tanto crianas com dificuldades de PA como
crianas com transtorno do dficit de ateno podem ter problemas para prestar ateno,
seguir instrues, tendendo a ser hiperativas, a ficar frustradas facilmente e a ter
dificuldades para organizar e sequencializar informaes recebidas auditivamente. Todas
essas caractersticas podem estar associadas aos distrbios de aprendizagem, problemas
comportamentais e desordens emocionais.
Gomes e Condon (1999) verificaram as habilidades de processamento auditivo
em trs grupos de crianas: 1) crianas sem dificuldade de aprendizagem; 2) crianas
com dificuldade de aprendizagem (LD) e transtorno do dficit de ateno (TDHA); e 3)
crianas com TDHA e sem LD. O grupo de crianas com TDHA e LD mostrou mais
dificuldades de processamento auditivo do que as que tinham apenas TDHA ou as sem
quaisquer dificuldades. Os resultados desse estudo sugerem que os problemas quanto s
habilidades do processamento auditivo esto mais relacionados s dificuldades de
aprendizagem do que ao TDHA.
Ao avaliar o processamento auditivo, a leitura e escrita de crianas da 2 srie
do Ensino Fundamental, Ferrari (2004) constatou que houve associao estatisticamente
significante entre o desempenho, nas provas de leitura de palavras reais, leitura oral de
texto e escrita de palavras reais, com os resultados da etapa de ateno direcionada
direita do teste Dictico de Dgito; concluiu que a habilidade auditiva denominada ateno
seletiva est diretamente relacionada com o desempenho na leitura e na escrita. Portanto,
uma habilidade que deve ser estimulada nos programas que visam ao treinamento
auditivo, para crianas com dificuldades de leitura e escrita e dificuldades quanto ao
processamento auditivo.
Bellis e Beck (2000) acentuam que crianas com TPA fazem uma srie de
queixas de natureza acadmica e comunicativa, tais como inabilidade para seguir
instrues complexas, dificuldades para ler e escrever, performance cognitiva verbal
pobre, quando comparada performance no verbal, atraso ou distrbio de linguagem
receptiva, m vontade para dedicar-se s discusses em sala de aula ou para contribuir
de forma no apropriada ao assunto em discusso, pobres habilidades de misturar os
sons, de discrimin-los, segment-los e dificuldade de prestar ateno ao som
apresentado auditivamente. Por tudo isso, essas crianas tendem a se distrair mais
facilmente, requerem mais repeties e podem exibir sinais de frustrao, principalmente
em disciplinas baseadas na linguagem, tais como cincias sociais, segundo Bellis e Beck,
(2000). Os mesmos autores acrescentam que o audiologista que realiza a avaliao do
processamento auditivo, independentemente de este ser em ambiente educacional ou
clnico, deveria ser parte integral da equipe multidisciplinar em Educao Especial.
Neves e Schochat (2005) estudaram a maturao do processamento auditivo
em crianas com e sem dificuldades escolares. Para tanto, as autoras avaliaram 89
crianas sem queixas de dificuldades escolares (Grupo I) e 60 com queixas de
dificuldades escolares (Grupo II), na faixa etria de 8 a 10 anos. Foram utilizados os
seguintes testes, para avaliar o processamento auditivo: PSI, Fala com Rudo,Teste
Dictico No Verbal e o Sttagered Spondaic Word (SSW). Ao comparar o desempenho
entre os grupos, verificou-se que os indivduos do Grupo II apresentaram pior
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