FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA ASSOCIAÇÃO
CRISTÃ DE MOÇOS DE SOROCABA
UMA ANÁLISE DAS MULHERES NO FUTEBOL NA
PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS
ANDRESSA ARAUJO FURQUIM
SOROCABA
2020
FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA ASSOCIAÇÃO
CRISTÃ DE MOÇOS DE SOROCABA
UMA ANÁLISE DAS MULHERES NO FUTEBOL NA
PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS
ANDRESSA ARAUJO FURQUIM
Trabalho apresentado por ocasião de conclusão
das atividades de Iniciação Científica para a
direção da Faculdade de Educação Física da
ACM de Sorocaba, sob a orientação do Professor
Dr. Rubens Antonio Gurgel Vieira
SOROCABA
2020
A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais
somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (HALL, 1987, p. 13).
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todas as bruxas e feministas que lutaram pelas
oportunidades e direitos que temos hoje e em especial a Sandra, Milene e Giovana.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais e irmãos, que me apoiaram nos momentos desafiadores e
incentivaram a concluir essa pesquisa. Aos amigos, pelas amizades verdadeiras e o
carinho.
A todos os professores e professoras, por todos os conselhos, pela paciência
e os ensinamentos com a qual guiaram o meu aprendizado, em especial ao professor
Rubens Gurgel por ter sido meu orientador e ter desempenhado tal função com
dedicação e louvor.
Ao GEPEF e PIBIC da instituição de ensino FEFISO, essenciais no meu
processo de pesquisa e escrita, e por tudo o que aprendi ao longo dos meses de
produção.
RESUMO
Esta pesquisa se propôs compreender o campo teórico dos Estudos Culturais com enfoque no conceito de cultura e sua regulamentação, circuito da cultura e o sujeito pós-moderno. Compreende-se ser um campo favorável para os possíveis questionamentos buscados por meio deste, além de obter um ponto de vista diferente do hegemônico, no caso, visamos positivar a resistência das mulheres nos esportes. O objetivo principal é, através dos Estudos Culturais, compreender a cultura e as relações de poder. Por meio da análise cultural, investigar as representações de mulheres no futebol pela mídia e seus comentários. A pesquisa se baseia, principalmente nos estudos de Hall (2003), Woodward (2008), Bracht (2003), Stigger (2005) e Louro (2000). Os resultados da pesquisa de reportagens sobre a 8ª Copa do Mundo das mulheres, no site Globo Esporte em 2019, constataram comentários de opressão nas notícias, que são direcionadas a sua orientação sexual e características físicas. Conclui-se, nesta investigação, que mulher é uma construção discursiva cultural, e neste processo há opressões nos espaços de comentários do canal de notícias esportivas, devido as relações de poder em interação a cultura dominante.
Palavras-chave: Educação Física, Feminismo, Estudos Culturais.
ABSTRACT
This research aimed to understand the theoretical field of Cultural Studies with a focus on the concept of culture and its regulation, circuit of culture and the postmodern subject. It is understood to be a favorable field for the possible questions sought through this, in addition to obtaining a point of view different from the hegemonic one, in this case, we aim to posit the resistance of women in sports. The main objective is, through Cultural Studies, to understand culture and power relations. Through cultural analysis, investigate the representations of women in football by the media and their comments. The research is based mainly on the studies of Hall (2003), Woodward (2008), Bracht (2003), Stigger (2005) and Louro (2000). The results of the survey of reports on the 2019 8ª Women's World Cup, on the Globo Esporte website, found oppressive comments in the news, which are directed at their sexual orientation and physical characteristics. It is concluded, in this investigation, that woman is a cultural discursive construction, and in this process there are oppressions in the commentary spaces of the sports news channel, due to the power relations in interaction with the dominant culture.
Keywords: Physical Education, Feminism, Cultural Studies.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 1
1 O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS ........................................................ 3
1.1 Cultura e sua regulamentação .......................................................................... 6
1.2 Sujeito pós-moderno ....................................................................................... 10
2 AS MULHERES NO ESPORTE MODERNO ................................................. 13
2.1 Mulheres e feminismo ..................................................................................... 15
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ...................................................... 20
4 ARTICULANDO MACRO E MICRO ............................................................... 22
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 31
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 32
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa é realizada na perspectiva dos Estudos Culturais (doravante
EC), devido ao quadro teórico permitir compreender como a cultura é regulada, algo
fundamental para possibilitar o questionamento da função das mulheres no esporte.
Em razão dos fundamentos dos EC de ativismo, esta análise articular com uma
determinada cultura marginalizada: mulheres jogadoras de futebol brasileiras.
Inicialmente, é importante ressaltar o pouco acesso da mulher no esporte e as
desigualdades sociais, que são mazelas sintomáticas1 que este trabalho se propôs a
tratar e compreender. Pois, a trama é mais complexa do que somente o acesso das
mulheres no esporte, existem barreiras sociais para os corpos, influenciadas de
acordo com as tendências defendidas em cada época, que contribuem para a
configuração das identidades.
Quando pequena todo fim de semana, logo depois de almoçar, eu e meus dois
irmãos mais novos íamos para a rua, entretanto, a maioria dos jogadores eram
meninos e não me deixavam jogar, não entendia por que isso acontecia. As feministas
vão questionar a criação das pessoas, acredito que foi diferente comparada com a
dos meus irmãos e um conceito que permeia estas questões é a cultura, existem
vetores que lutam pelo poder de hegemonia, produzindo representações 2das práticas
culturais – como o futebol ou os corpos das mulheres – e regulamentando as
identidades de acordo com a cultura consumida.
Aos domingos, assisto desde pequena “Esporte Espetacular”, em 2019, eu
assisti ao jogo da 8ª Copa do Mundo Feminina logo após do programa, importante
afirmar que foi a primeira vez de transmissão em televisão aberta e umas das
jogadoras tinha o mesmo nome que o meu, então me perguntei: Qual Andressa eu
poderia ter sido? Este momento me sensibilizou a escrever como forma de protestar,
assim como os escritores, mas, principalmente escritoras feministas do EC fizeram e
fazem.
Objetivo desta exploração, através da análise da cultural, questionar as
representações de mulheres no fenômeno esportivo. A metodologia é analisar as
mídias esportiva e seus comentários, interpretar os indícios que a presença das
1 Ofensas sofridos por uma população por meio da cultura devido as relações de poder. 2 De acordo com Hall (2016, p. 31) “a representação conecta o sentido e a linguagem à cultura”, portanto, para entender como a cultura acontece, é necessário estudar as representações.
mulheres no esporte gera, uma mídia de grande alcance como a Rede Globo, no Brasil
em 2019, colabora na produção de identidades das mulheres, regulamenta a
subjetividade de todos que fazem a leitura dos conteúdos, portanto, como sensibilizam
os que acessam suas informações?
1 O CAMPO DOS ESTUDOS CULTURAIS
EC, nome de um campo teórico, amplo e ramificado, que trabalha na área do
mundano, praticando posicionamentos políticos no meio social. Emergiram na década
de 1950, num período histórico de transformações temáticas e disciplinares globais.
Estuda questões políticas, feministas, raciais e étnicas, assim respondem as questões
sociais da história, vinculando com problemas sintomáticos atuais (SILVA, 2003).
Seu caráter múltiplo de interpretação da realidade, faz com que sejam
produzidas diversas formas de abordar uma situação problema, que expressa
sintomas provenientes das relações de poder. Se faz forte essa sua característica nas
palavras de um dos teóricos mais proeminentes dos EC, Stuart Hall (2003, p. 131),
“velhas constelações deslocadas, e elementos novos e velhos são reagrupados ao
redor de uma nova gama de premissas e temas”.
Outro campo de atuação nos EC, fora da intervenção nos discursos, é o foco
profundo entre a teoria e a articulação com uma determinada realidade, em outras
palavras, na ação propriamente dita, o ativismo na sociedade, “o pensamento não
reflete a realidade, entretanto se articula a partir dela e dela se apropria” (HALL, 2003,
p. 151), isso é, teorizando a prática política.
Além, do princípio, a construção dos conceitos não são fechadas e os dois livros
que iniciaram esta temática dos EC, são As Utilizações da Cultura de Richard Hoggart
(1973) e Cultura e Sociedade de Raymond Williams (1958), a princípio os livros não
apresentaram grandes atualizações, mas, tais contribuições foram essenciais para o
começo do quadro teórico e necessários para as rupturas com a tradição daquele
tempo – corrente marxista3. Receberam influência também, das correntes
estruturalista 4e culturalista5 e devido o foco na prática e ação, colabora para a união
das duas correntes teóricas, entretanto, a discussão da união é complexa e se trata
das ramificações do início dos EC no mundo (HALL, 2003).
A junção posteriormente se ramificou em seus determinados focos de análises,
formando com estas as principais bases do campo teórico até hoje. Converge a
primeira, que trabalha em discutir o papel da linguagem e o antropólogo Lévi-Strauss
torna-se a principal referência, esta considera que os humanos classificam
3 Influenciada por Karl Marx. 4 Período histórico que defende um conjunto que determinando as relações. 5Foco teórico na relevância da cultura para analisar a sociedade.
mentalmente seu cotidiano, suas práticas e relações sociais, além das críticas e
questionamentos de como são classificados e regulados os meios de comunicação,
sobretudo, os discursos que circulam com mais força, são essenciais para
compreender esta vertente. Outro ponto, dessa primeira ramificação, é o trabalho de
identificar a produção de sentidos, ou seja, observar como as práticas carregam
significado e percorrer as amarras do pensamento e dos discursos (HALL, 2003).
Aprofundando na primeira vertente, que pode ser chamada de semiótica, e
estuda as leituras de outros teóricos e seus próprios conceitos, como os pensamentos
psicanalíticos de Lacan. Estes pensamentos emergem na experimentação de somar
potências teóricas discursivas, em torno da questão que somente do estruturalismo
não foi capaz de explicar, que foi o ponto temporal em seu início crítico ao marxismo
(HALL, 2003). Portanto, está pautada criticamente em Marx a segunda vertente, é a
questão que faltava no estruturalismo, a consideração ao sujeito em si ao que se
refere a estrutura geral.
Hall (2003) critica dizendo que a lacuna passava despercebida pelos teóricos
baseados somente em leituras estruturalistas marxistas. Ainda, a crítica considera que
anteriormente o sujeito era abordado no âmbito global e para a perspectiva de atuação
dos EC não se aplicava, porque o foco no micro é visto tanto quanto o macro (HALL,
2003). Cabe afirmar, que aconteceram outras críticas além das citadas acima, como
a contrariedade com a determinação de Marx com a relação do sistema econômico e
o funcionamento das sociedades e suas relações de poder. A cultura é deixada de
lado neste momento, a economia e como ocorre a produção da cultura são mais
relevantes (HALL, 2003). Logo, o lucro, mais-valia e mercado são as ferramentas
chaves para questionar o padrão da sociedade da época.
Existe crítica à limitação e reducionismo do alcance do sujeito no estruturalismo
de Marx, ponto que os estudiosos dos EC buscam nas leituras, uma tentativa de
responder a tais lacunas com o conceito de cultura, uma possível analogia com a
teoria marxista, seria o capital. As relações de base e superestrutura, em outras
palavras, Estado versus povo, não é deixado completamente de lado pelos EC é visto
como local de formação das crenças sociais do capitalismo moderno que combina
diversas características distintas em decretos de leis. O Estado detém poder de
produção e influência sobre a população, no entanto Hall elucida de outra maneira:
"em partes, a função do Estado consiste em unir ou articular em uma instancia
complexa uma gama de discursos políticos e práticas sociais" (HALL, 2003, p. 163).
Por fim, a terceira vertente que fala sobre a diferença, levantando novas
interpretações do todo, o pensando a partir do olhar do outro, do diferente ou do
forasteiro, em que Hall cita o filósofo Althusser à questão da diferença, criando olhares
à questão do poder. Afirma a importância do pensamento no diferente e as diversas
categorias possíveis (HALL, 2003), ou seja, olhar para mais do limite das estruturas,
limite este que Hall aponta. Entretanto, contém a ressalva de que as fixações são uteis
para construir o conhecimento, na composição e forma da ideologia, entretanto, com
o cuidado de não causar inversão, tornando a diferença unidade, muito menos afirmar
que os argumentos presentes neste texto são fechados a somente uma interpretação
ou entender.
Stuart Hall (2003) discute, também, atravessado em seus textos sobre a
necessidade de articular com a realidade, teorizar sobre eventos históricos concretos
e sintomáticos, sem limitar a unidade simples é a capacidade que este texto se propõe
a executar. Logo, a relação entre o micro e o macro se torna um dos conceitos chaves
que move essa pesquisa, possibilitando realizar um estudo de caso, ou seja, uma
amostra de toda sociedade que representa uma determinada situação e tempo
correspondente.
Conclui-se, portanto, após apresentar as vertentes segundo Hall, que no
começo do campo dos EC, a cultura deixa de ser somente um ponto de vista e passa
a ser chave central para movimentar o pensamento. Os dois autores comentados,
Hoggart e Williams, centralizam a cultura nas questões sociais, afirmando que os
pensamentos das sociedades funcionavam determinados pelos sistemas econômicos
e as relações de trabalho, pois, o capital define o cotidiano e as relações pessoais.
Por conseguinte, a cultura passou a não possuir somente o papel de
ramificação nas análises da sociedade. A cultura toma para si a centralidade que era
do capital, passando a ser vista como ferramenta chave e tema central para
movimentar o pensamento dos EC (HALL, 2003). De acordo com Thompson, nas
palavras de Hall, cultura se toma uma dimensão maior e centralizada, ou seja, em
suas várias formas, ele conceitua a cultura como algo que se entrelaça às práticas
sociais. As práticas, por sua vez, se definem como as formas de agir numa tarefa
comum de atividade humana: como os discursos. Afirma ainda, que possibilita a
construção ativa de homens e mulheres na influência da história e a trajetória
mundana (HALL, 2003).
Lembrando que o conceito de cultura carrega a premissa da teorização aberta,
melhor dizendo, ser um local de convergência de ideias onde nenhuma definição única
e não problemática possa ser adotada. A definição de cultura exibe tensão e a
limitação do campo teórico (HALL, 2003), além disso, é este complexo conceito, que
vai ser aceito para servir de ferramenta de análise e de foco deste trabalho.
1.1 Cultura e sua regulamentação
O conceito de cultura que vou adotar é uma arena de disputa de significados e
produção de discurso, entre diversos grupos de pessoas que lutam pela hegemonia.
A análise entre o macro e o micro dentro do discurso, como as pessoas são
subjetivadas pela cultura, como o circuito da cultura opera (HALL, 2003).
No livro A Diáspora, Hall (2003, p. 142) adotou o conceito de cultura em duas
dimensões, uma que entende que são “os sentidos e valores que nascem entre
classes e grupos sociais diferentes”. Assim, enraizados nos contextos históricos e a
segunda como aspectos que são incorporadas à rotina, aquelas entendidas como
práticas sociais (HALL, 2003). Portanto, cultura é tema central, nas questões ligadas,
de como ocorre o processo de regulamentação social, a moralidade e ao governo da
conduta social, possui influência na comunidade como um todo, por exemplo, ela
regula o jeito de se vestir, a forma de se comunicar, a alimentação, o local de
convivência, incluindo condutas e costumes:
É importante sabermos como a cultura é modelada, controlada e regulamentada, é que a cultura, por sua vez, nos governa, “regula” nossas condutas, ações sociais e práticas e, assim, a maneira como agimos no âmbito das instituições e na sociedade mais ampla (HALL, 1997, p. 39).
Nas ciências humanas e ciências sociais a cultura aparece com certa
frequência para estudar arte, literatura, religião e filosofia, sendo abordadas para
compreender como é o comportamento das sociedades, em certo sentido, a cultura
sempre foi importante e as ciências humanas e sociais há muito reconhecem isso
(HALL, 1997). Assim, na visão dos EC o conceito de cultura não é apenas uma
ferramenta chave visual, auditiva, constante e passível a transformações, ou seja, um
pouco diferente da concepção das disciplinas acadêmicas cientificas.
A cultura pode ser analisada de duas maneiras distintas, a primeira
substantivamente, que seria de “estrutura empírica real” (HALL, 1997, p. 16), assim,
como discorre a organização do diário corriqueiro, instituições, e aspectos culturais na
sociedade, em uma situação histórica selecionada. A segunda epistemologicamente,
se referindo à influência da cultura as questões de contextos e “em como a “cultura” é
usada para transformar nossa compreensão, explicação e modelos teóricos do
mundo” (HALL, 1997, p. 16). Entende-se que na visão substantiva e no olhar
epistemológico, a cultura adquiriu importância na questão de análise das situações da
sociedade e o social globalmente. Ainda, nós não agimos por nós mesmo, mas
motivados por práticas anteriores, a história dita como atual é baseada nas condições
anteriores (HALL, 2003).
O ponto de conhecer como governar o processo pelo qual a cultura passa, toda
sua regulamentação, é necessário para compreender a importância dos estudos da
cultura, para os EC, pois, apresenta uma outra visão de análise para o problema em
foco “aqueles que precisam ou desejam influenciar o que ocorre no mundo ou o modo
como as coisas são feitas necessitarão – a grosso modo – de alguma forma ter
“cultura” em suas mãos, para moldá-la e regulá-la de algum modo ou em certo grau”
(HALL, 1997, p. 40).
Como se faz notar Kathryn Woodward (2008), em Identidade e Diferença: uma
introdução teórica e conceitual apresentando a teoria de Paul de Gay O Circuito da
Cultura, argumentando como a cultura é governada, regulada e organizada. O
desenho do circuito da cultura é como um fluxograma cíclico articulando com o
consumo, a produção, a regulação, a identidade e a representação:
FIGURA 1 – Réplica do Circuito da Cultura de Paul de Gay.
FONTE: adaptado de Woodward, 2008.
É um mecanismo que teoriza explicando como a cultura é governada e como
ela governa, que ilustra os vetores de força capazes de influenciar e serem
influenciados continuamente, que disputam na sociedade para determinar qual
verdade é a divulgada. Mostra, como os significados dos discursos e suas mensagens
são construídas. A trama desse ciclo é a prática, que ativa e reforça a reprodução.
Outro ponto citado pela autora, é a necessidade de compreender a questão da
produção de identidades, os dilemas gerados em torno do assunto e os locais de
encontros do sujeito pós-moderno6, a autora afirma que para compreender como
estes sistemas operam, temos que conhecer como se dão as posições-de-sujeito no
social, o que elas produzem nos indivíduos e como os mesmos são posicionados
interiormente, ou seja, sua regulamentação (WOODWARD, 2003).
Nos EC a questão da regulamentação, é um ponto essencial para entender o
papel da cultura e sua influência nas relações interpessoais. O controle pode parecer
de livre escolha das pessoas, mas, é fortemente disputado, existem fronteiras
estruturadas, não quer afirmar que seja uma disputa de dois poderes, entre regulação
e liberdade, entretanto, entre diversas regulações, resultando na dificuldade de ter um
pensamento livre dessas amarras (VIEIRA, 2013) e este processo vem se
globalizando.
Com a globalização no final do século XX, os EC foram compartilhados
carregando a mensagem de quebrar diversas barreiras disciplinares ao analisar uma
mesma situação problema, “caracterizam-se por sua dimensão multidisciplinar, a
quebra das fronteiras tradicionais estabelecidas nos departamentos e nas
universidades” (ORTIZ, 2004, p. 121). Ponto de encontro com a fala de Ana
Escosteguy quando a pesquisadora cita em Uma Introdução aos Estudos Culturais a
intencionalidade de foco do quadro teórico, que seria a preocupação com as
demandas sociais, trabalhando com diversas disciplinas, observando a cultura popular
e os movimentos sociais (ESCOSTEGUY, 1998).
No que diz respeito as ações sociais do meio, ou seja, os comportamentos
decorrem de uma seguinte lógica, Hall em A Centralidade Da Cultura, define como:
Os seres humanos são seres interpretativos, instituidores de sentido. A ação social é significativa tanto para aqueles que a praticam quanto para os que a observam: não em si mesma, mas em razão dos muitos
6 Segundo Hall (2006), é a terceiro momento do sujeito, por conseguinte, a primeira é o sujeito do iluminismo e o sujeito sociológico.
e variados sistemas de significados que os seres humanos utilizam para definir o que significam as coisas e para codificar, organizar e regular sua conduta uns em relação aos outros (HALL, 1997, p. 16).
O processo de significação é regulamentado por práticas sociais culturais
diariamente, exemplo na TV, matérias e reportagens sobre a prática de jogadores e
não jogadores, destacam a identidade do homem no esporte, enquanto é deixando de
lado o das mulheres no esporte e por consequência limitam a divulgação de diferentes
formas de identidades - "toda a nossa conduta e todas as nossas ações são moldadas,
influenciadas e, desta forma, reguladas normativamente pelos significados culturais"
(HALL, 1997, p. 41). De modo que tais práticas criam significados para o cotidiano das
pessoas, normatizando através de sistemas classificatórios e produzindo novos
sujeitos. De acordo com os significados culturais, criam cadeia linguística de
significados, o discurso mulher não sabe jogar bola, afirma também que homem sabe
jogar bola.
E as práticas corporais confirmam a continuidade das práticas físicas, que em
determinado contexto, exclui as mulheres no esporte, este recurso é uma das formas
de regular a cultura, em grupos menores comparar ações de acordo com os sistemas
de classificação cultural, entretanto, Hall (1997) adverte que o processo não é
simplesmente inverter essa chave. Por conseguinte, a cultura toma lugar, os vetores
que à governam se apresentam, firmes modelando e regulamentando o modelo de
regras da cultura, que engloba as práticas culturais sociais, exercendo poder sobre as
vidas dos indivíduos. As instituições que tencionam o jogo de poder, são do meio
econômico, o Estado, área política ou as relações sociais, e o processo dever ser:
Compreender o que há por detrás destas áreas de contestação moral e apreensão cultural é adquirir certo acesso indireto às correntes profundas e contraditórias da mudança cultural que se formam abaixo da superfície da sociedade. Fornecem também alguns indicadores preliminares das fragilidades que perpassam a política do corpo (HALL, 1997, 39).
Quem possui o poder governa a cultura e as tradições são criadas pelas
instituições, tais práticas são estruturadas em normas e sistemas classificatórios, e a
forma de regulação a ser analisada é a normativa, ou seja, as ações do sujeito “são
guiadas por normas no sentido de que, quando fazemos alguma coisa, temos de ser
capazes de prever seus fins ou os propósitos, de modo alcança-los” (HALL, 1997, p.
41).
Segundo Hall (1997), a definição de regulação normativa é fundamenta nas
práticas corporais, com determinado propósito e intenção, por fim tem o objetivo de
tornar uma só cultura comum para todos, além disso, ocorre a diferença também.
Prontamente o processo de diferenciação, que é mais uma das formas de regular a
cultura, diferencia quem somos nós de quem são eles, o processo de criação de
fronteiras na regulamentação cultural através da normativa, seleciona “quem
pertence” (HALL, 1997, p. 42), isto é, quem realiza da mesma forma as ações é o nós,
diferente das nossas regras e jeitos é um outro ou o diferente.
Assim, todas as ações do cotidiano das pessoas são julgadas, segundo a
cultura dominante, enquanto do outro lado a cultura da diferença não possui poder de
governar a cultura com a mesma intensidade de força, “toda a nossa conduta e todas
as nossas ações são moldadas, influenciadas e, desta forma, reguladas
normativamente pelos significados culturais” (HALL, 1997, p. 41).
Portanto, compreender a importância do governo da cultura, requer a
preocupação de saber como são governados os meios de comunicação, assim,
compreender o papel de produzir que a linguagem conduz, que ao ser reproduzida
está operando na cultura e apontar os problemas latentes nas relações sociais e,
todas questões polemicas que os EC abordam, os “pontos de eclosão”, “as questões
não resolvidas, as tensões subjacentes, os traumas do inconsciente coletivo, nas
culturas das sociedades do modernismo tardio” (HALL, 1997, p. 39).
Processos globais de profunda mudanças, influenciam as práticas sociais e as
relações de poder, causam transformações na forma que é construída as identidades
do sujeito, seja intimamente ou no coletivo.
1.2 Sujeito pós-moderno
Adentrando no conceito de identidade, cabe afirmar que este é de um tema
complexo, estudado pelo campo, onde a todo momento está em construção e os
estudiosos buscam compreender mais sobre o conceito. Pois, todo o procedimento
ocorre no período da pós-modernidade e a identidade toma forma fragmentada,
descentradas e de caráter provisório (HALL, 2006).
Nesse aspecto, um ponto da questão levantado, é que as velhas identidades
que durante muito tempo foram estipuladas, como estruturas sólidas, - com ressalva
se realmente foram sólidas - estão em decadência, sendo segmentadas “fazendo
surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um
sujeito unificado” (HALL, 2006, p. 7). Por conseguinte, as novas identidades chocam
com as identidades construídas anteriormente no espaço tempo, causando conflitos
no indivíduo moderno, que pode ser chamada de “crise de identidade”, que está
“abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem
estável no mundo social” (HALL, 1987, p. 7).
Assim, no final do século XX, os sistemas de deslocamentos acontecem com
mais força e fragmenta as concepções divisórias, entre elas as de classes
econômicas, o binarismo dos gêneros, orientação sexual, separação pela cor de pele
e identificação nacional. O que antes fora entendido como sólido, sofre uma
desestruturação de dentro e fora do indivíduo, seus alicerces socioculturais
construídos ao longo das épocas se torna cenário de uma crise, que está presente na
constituição de sujeito pós-moderno (HALL, 2006).
Por conseguinte, o indivíduo não possui essência, pode apresentar algum grau
de poder sobre si, porém, é resultado do meio que habita e estabelece contato, “somos
diferentemente posicionados, em diferentes momentos e em diferentes lugares, de
acordo com os diferentes papéis sociais que estamos exercendo” (HALL apud
WOODWARD, 2008, p. 31).
Segundo Hall (2006), o sujeito pós-moderno, surge do processo de
identificação, ou seja, um conceito central dos EC que situa uma disputa cultural, no
qual um dos processos é a idealização da própria identidade através da identificação,
acontece da projeção de nós mesmo nas identidades culturais da sociedade, com as
mudanças temporais se tornou mais provisório, variável e problemático. Assim, é
produzido o sujeito pós-moderno, a identidade antes fixa, essencial ou permanente,
hoje apresentada como instável, acontece de forma falha, vacilante e contínuo, além,
de mudar dependendo de como é interpelado, em outras palavras, a identificação não
é espontânea, mas pode ser adquirida ou excluída.
Logo, as manifestações culturais do indivíduo são fragmentadas, entretanto,
ocorrem resistência, ou seja, apesar de todo processo de mudança, há alguns
comportamentos que ainda são defendidos, bases sólidas do passado “as identidades
nacionais e outras identidades locais ou particulares estão sendo reforçadas pela
resistência a globalização” (HALL, 2006, p. 69).
Entretanto, no mundo globalizado, a cultura circula muito rápido e as
identidades são híbridas, que passam pelo processo desprendimento do seu lugar
dito como fixo, ocorrendo uma fragmentação em todo sistema em rede, através do
processo de regulamentação e acelerando-o em escala global (HALL, 2006). Nas
relações sociais, todo sistema das sociedades passa a ser veloz e a identidade vai
sofrer influência da globalização devido as coordenadas “o que é importante para
nosso argumento quanto ao impacto da globalização sobre a identidade é que o tempo
e o espaço são também as coordenadas básicas de todo sistema de representação”
(HALL, 2006, p. 71).
De acordo com Hall (2006, p. 75) a vida social está mediada "pelo mercado
global de estilos, lugares e imagens, pelas viagens internacionais, pelas imagens da
mídia e pelos sistemas de comunicação globalmente interligados" e diante desse fato
as identidades se tornam fluídas. Além disso, existem as identidades nacionais que
procedem de um processo de identificação “essas identidades não estão literalmente
impressas em nossos genes, entretanto, nós efetivamente pensamos nelas como se
fossem parte de nossa natureza essencial” (HALL, 2006, p. 47).
2 AS MULHERES NO ESPORTE MODERNO
A questão do esporte moderno, que nasce na Inglaterra no final do século XIX
e início do século XX, é um exemplo de que toda tradição é inventada; conforme a
estratégia discursiva chamada por Hobsbawm e Ranger de invenção da tradição, quer
afirmar que um grupo de significações e ações é criado (HALL, 1992).
Por consequente, as práticas defendidas hoje são invenções do passado,
ocorre uma transferência dos valores do passado até o presente. Essa tradição é uma
fonte de significados culturais, conduz um processo de identificação e cria um sistema
de significados. Esta teoria também é citada por Marcos Stigger (2005, p. 21), o autor
entende o termo da seguinte forma “conjunto de práticas, normalmente reguladas por
regras táticas ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica,
visam inculcar certos valores e normas de comportamento através de repetição”.
No livro Educação Física, Esporte e Diversidade, Stigger (2005), descreve dois
pontos de vistas para o Esporte, um provindo de uma rede histórica muito distante,
onde guerreiros após ganharem uma batalha, utilizam as cabeças dos derrotados
como uma espécie de bola, para jogar algo parecido com o atual futebol. A segunda
vertente do nascimento do Esporte, como sendo a forma institucional, ou tradição
inventada. Buscando a definição de esporte, o escritor considerado que Esporte fora
analisado pelas ciências sociais, como um tema isolado e simplório, entretanto, para
ele, passa a receber atenção de estudiosos, que estudam por diversos pontos de vista,
uma conexão possível com o tema cultura, antes analisado pelas ciências sociais e
humanas como conceito simples, a partir da metade do século XX, recebe tamanha
importância pelas mesmas ciências (STIGGER, 2005).
Outro ponto levantado pelo autor, é o posicionamento aberto da definição de
esporte e a sua visão contrária ao conceito rígido construído, quando o objetivo é
compreender fenômenos e realidades culturais. Isso porque “esses conceitos ao invés
de serem esclarecedores, poderão mostrar-se obscurecedores e redutores de
qualquer realidade em estudo” (STIGGER, 2005, p. 5). Portanto de modo geral, o
conceito de esporte descrito no início do livro e que adoto é:
O esporte se evidencia de forma global, trazendo consigo uma lógica e características padronizadas que o distinguem de outras práticas sociais, que lhe conferem uma homogeneidade capaz de permitir a realização de trocas esportivas em escalas mundiais (STIGGER, 2005, p. 9).
Um fator importante do compartilhamento do esporte no século XX é a
globalização, conceito dos processos efetivos numa escala global, que ultrapassam
fronteiras nacionais e conectam comunidades e organizações em novas combinações
de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais
interconectado (MCCREW apud HALL, 2006).
Stigger (2005) comenta a linha do tempo - que Guttmann idealiza - do esporte
no contexto a seguir: “o esporte primitivo, o esporte grego, o esporte romano, o esporte
medieval e, finalmente, o esporte moderno” (GUTTMANN apud STIGGER, 2005, p.
13). Em torno de 1800, os jogos populares sofrem um declínio porque os processos
industriais e urbanos geram novas formas de condições de vida, dos quais tais jogos
não compunham mais o estilo na época a emergir (DUNNING apud BRACHT, 2003).
Visto que, os jogos populares vão perdendo força, no entanto, nas escolas
públicas permanecem presentes e nestes locais vão se desenvolver a ponto de se
formalizar e gerar os grandes esportes de modernidade, como o futebol (BRACHT,
2003). O discurso da identidade do esporte está presente na cultura nacional, pois
palpita um ponto de vista, é uma forma de poder, assim, não se passa simplesmente
como uma razão de união ou ponto de identificação para a unificação, entretanto, uma
organizada estrutura de inter-relação poder e cultura (HALL, 2006).
Dentro do fenômeno futebol, por ser considerado um espaço dos homens, as
mulheres são subjugadas como faz notar o artigo Preconceito No Futebol Feminino
No Brasil: Uma Revisão Narrativa:
[...] o preconceito no futebol feminino no Brasil ainda é muito predominante e um dos fatores principais que contribuem para que esse preconceito fique alojado é a nossa própria sociedade que criou seu padrão e modo de visão em relação às mulheres (FERREIRA et al., 2018, p. 126).
Outro aspecto levantado, é que as mulheres sofrem preconceito ao adentrar no
mercado esportivo, os “salários menores, menor visibilidade por parte da imprensa,
campeonatos com menos apelação midiática” (FERREIRA et al., 2018, p. 120), que
resulta em desmotivação da prática pelas mulheres desde pequenas, pois,
deslegitimar o trabalho e a trajetória das atletas.
Os autores enfatizam sobre o cenário na competição brasileira feminina,
apontando a mídia como veículo de fala que fortalece a desvalorização das mulheres
no esporte, devido à falta de representatividade, que enaltece o mito de fragilidade do
sexo feminino, prejudicando assim as conquistas no mercado e direitos das jogadoras
(FERREIRA et al., 2018). Portanto, para analisar os julgamentos da população de
mulheres e seus reflexos sintomáticos, que são frutos das relações de poder da
sociedade, os meios de comunicação se fazem uma peça chave de compreensão e
articulação com o real. Existem grupos que veem estudando tais questões, com
ênfase na segunda metade do século XX.
2.1 Mulheres e feminismo
Assim, os anos 60 abriram brechas para um debate que não havia antes,
revolucionando as identidades historicamente determinadas, levantando
questionamentos sobre identidade de gênero e orientação sexual, ramificando-se nos
movimentos feministas e homossexuais, ou, aqueles que pensavam diferente da
lógica culturalmente hegemônica (LOURO, 2000).
Antes dessas transformações sociais desse contexto sócio-político, a
identidade dos sujeitos, assim como a das mulheres foram uma identidade universal,
descentralizando esse conceito Beauvoir (1967, p. 7) questiona “ninguém nasce
mulher: torna-se mulher” ainda, qualquer que seja o fator biológico, mental ou classe
social, determina o que é ser mulher em uma sociedade. Por conseguinte, há décadas
que os relacionamentos estão se fragmentando, se multiplicando e se modificando,
gerando diversas manifestações da identidade, que são denominadas para além das
fronteiras.
Compreende-se pela identidade mulher de acordo com as autoras citadas, de
modo geral, uma construção social que forma o sujeito pós-moderno, o que antes
parecia ser uma identidade sólida e universal, passa a ser considerada como uma
“celebração móvel” (HALL, 1987, p. 13). Em relação a constante global dos
significados, a teoria de uma história única do livro O Perigo De Uma História Única
(2019) da escritora negra e ativista Chimamanda Adichie, articula como o poder de
uma única trajetória sobre um povo, repetida em grande escala e longo período, é
tomada como verdade original, ou seja, quem possui mais controle de significar os
fatos, pois, selecionar como é contada e, repetida vezes a mesma trajetória sobre uma
cultura, resulta por fim, em definir como essa população deve ser.
O conto que é decidido a ser passada para frente, passa a ser conhecida
globalmente, ganha força e é dita como verdade. Acarreta um único pensamento
sobre toda uma rica cultura, pois, por não apresentar representações da resistência
desse povo, motiva um genocídio silencioso das histórias dos povos. Por conseguinte,
ocorre assim com a identidade das mulheres, pelos discursos que circulam a respeito
dessa criação, são definidas as barreiras de ser mulher, qualquer expressão que não
se encaixem nas características selecionas, são nomeadas e ridicularizadas.
Em Louro (2000), há um exemplo de notícia de jornal, onde uma prefeita,
mulher transgênero pronuncia a comunidade a sua nova identidade, ou seja, antes
perante a sociedade, a líder da cidade era reconhecida por ser homem e
posteriormente se tornou mulher. Enaltecendo a reação da população que julgaram
uma possível alteração de qualidade no trabalho da prefeita. Outro ponto,
pressupondo que exista uma essência própria em cada pessoa acredita-se que possa
ser mudada conforme as identificações de gênero, assim, o gênero deixa de ser uma
simples classificação do indivíduo, para passar a ser território de disputa.
Mais um argumento da autora, é o conceito de “marcas” biológicas” (LOURO,
2000, p. 8-9) pontua a questão visual, como se reconhece que determinada pessoa é
de um certo gênero, também é um processo de significá-la as características.
Portanto, a escritora nomeia os meios de efetivar as marcas “família, escola, mídia,
igreja, lei participam dessa produção” (LOURO, 2000, p. 15), os dois primeiros núcleos
citados são grandes impressores de educação sexual, assim, são centros de regular
quais características são afirmadas ou negadas e os dois seguintes, apresentam
signos variantes, porém, determinantes na formação do sujeito e o último, é o
resultado da construção da sociedade de cada cultura.
Quando um fenômeno acontece repetidamente, no caso os discursos
pejorativos, que são criados e ensinados no meio social, “desde muito cedo, piadas e
gozações, apelidos e gestos para dirigirem àqueles e àquelas que não se ajustam aos
padrões de gênero e de sexualidade admitidos na cultura em que vivem” (LOURO,
2000, p. 19), ou seja, a sexualidade não é somente uma característica intima de cada
pessoa, mas, uma questão político-social, fora afirmar que é um processo, formado
por um conjunto de práticas diárias, discursos e representações, profundamente
cultural e plural (LOURO, 2000). O processo de construção dos gêneros binários, são
forjados nas relações sociais, que possuem pontos de tensão que depende de poder.
Que se desenvolvem dentro de uma determinada cultura, ou seja, a cada tradição as
significações mudam, sejam seus significados e representações (LOURO, 2000).
Outro ponto citado por Louro (2000), é a necessidade do “outro” para a
formação e definição das identidades representadas na comunidade, seja na sua
produção global ou no íntimo de cada indivíduo. Esse processo é violento e de
inferioridade, ocorre delimitando as fronteiras de semelhanças e de diferenças de
características das identidades, por conseguinte, rotula qual corpo é desejável para a
execução de um determinado esporte, existe também uma seleção de uma identidade
central e outras marginalizadas. Alguém que não partilha das mesmas semelhanças
físicas é condenado a ser diferença, ou melhor, o primeiro padrão a ser atingido é o
homem e a mulher é o segundo sexo (LOURO, 2000).
O livro O segundo sexo com título provocador da filósofa Simone de Beauvoir,
a autora argumenta que a representação das mulheres é formada e subjugada por um
grupo, na introdução do seu livro escreveu: “educadas por mulheres, no seio de um
mundo feminino, seu destino normal é o casamento que ainda as subordina
praticamente ao homem” (BEAUVOIR, 1967, p. 7), se trata de uma denúncia de como
se dá a cultura, da submissão das mulheres aos homens. A autora considera também,
quais as forças que sustentam este processo: “o prestígio viril está longe de se ter
apagado: assenta ainda em sólidas bases econômicas e sociais” (BEAUVOIR, 1967,
p. 7). Portanto, as relações sociais e econômicas geradas sob desigualdades resultam
em conflitos e a escritora argumenta resistindo sobre tais vetores de força que
estimulam a diminuição das mulheres e suas amarras limitantes.
Por outro lado, a superestrutura teoricamente propaga certos discursos em que
as mulheres devem agir de “correta” maneira e nesse processo aponta quais outros
costumes ficam de fora nessa classificação e não devem ser seguidos ou realizados.
Presumindo que a base, seguirá de forma ordenada, sistêmica e determinada as
ordens, isto de forma geral na população de mulheres. Nos discursos que dialogam
no campo da diferença, novas interpretações do todo são semeadas, por exemplo, as
diferentes vertentes no movimento feminista mundial. Há repartições do macro,
formam ramificações específicas que refletem a criação de sujeito em diferentes
culturas.
Em 1990, Butler coloca em questionamento o posicionamento das correntes
feministas sobre a questão entre sexo e gênero resultando na identidade feminina da
mulher, inicialmente com o Livro Gender Trouble: feminism and the subversion of
identity (FIRMINO; PORCHAT, 2017), ou seja, ela questiona a palavra mulher, que
vem de uma construção masculina e social. Na introdução do artigo Feminismo,
Identidade e Gênero em Judith Butler: Apontamentos a Partir de Problemas De
Gênero, os autores reforçam que a discussão entre sexo e gênero é longa nas áreas
de conhecimento, como a da educação ou das feministas, e apresenta limites da sua
conclusão algum dia.
No entanto, fornece pano de fundo para os movimentos sociais. Butler se
aproximar dos Estudos Culturas e teoriza as transições dos entenderem sobre o sexo
ser determinados pela biologia da pessoa. Ainda, considerar gênero uma construção
social, porque toda trama remete a uma questão de poder. (FIRMINO; PORCHAT,
2017). Portanto, Butler critica a identidade feminina como ativa no feminismo, por estar
funcionando na lógica dual, além, da consequência de exclusão dos sujeitos que não
se enquadrem na descrição de mulher. O foco de articulação da autora, seria como a
produção de identidades acontece e um estudo das relações de poder se mantem
(FIRMINO; PORCHAT, 2017).
Adichie (2012, p. 33), define o sujeito feminista como “a pessoa que acredita
na igualdade social, política e econômica dos sexos”, assim, demonstra o caráter
ativista do movimento que uma das premissas é que questionam como as mulheres
são criadas, importante ressaltar que esta é uma das visões sobre o que é o
feminismo. Ainda, quando as lutas buscam equidade e igualdade é estabelecido uma
competição para as mulheres atingirem o padrão: homem. Por conseguinte, o
caminho é a existência plena dos corpos e uma das maneiras é a influência da família.
A criação é influenciada pelo acesso de representatividade nas mídias, que são
diferentes entre os gêneros masculinos e femininos. Segundo a escritora nigeriana,
da seguinte forma:
Nós ensinamos meninas a se encolher, para se tornar menor. Nós dizemos para meninas: "você pode ter ambição, mas não muito, você deve procurar ser bem-sucedida, mas não muito bem-sucedida, caso contrário, você ameaçará o homem". [...] porque eu sou mulher e esperam que eu aspire a casamento, esperam que eu faça minhas escolhas de vida sempre tendo em mente que o casamento é o mais importante. Agora o casamento pode ser uma fonte de alegria, amor e apoio mútuo, mas por que ensinamos meninas a aspirar ao casamento e nós não ensinamos meninos o mesmo? [...] nós criamos garotas umas para as outras como concorrentes, não para empregos ou para realizações, o que eu acho que pode ser uma coisa boa, mas pela atenção dos homens. Nós ensinamos meninas que elas não podem ser seres sexuais na maneira que os meninos são. [...] (ADICHIE, 2012, p. 33-35.).
Somos produzidos pela cultura da sociedade, principalmente pelo meio que
vivemos, ou seja, o micro e acontece de forma naturalizada, as mulheres são
constantemente castradas, por exemplo pela própria família, escola ou religião.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Morais (2016) afirmou o comprometimento da análise cultural como as mazelas
sociais que aparecem com as práticas da sociedade selecionada como estudo de
caso, motivo dessa pesquisa, atingir as questões sintomáticas de comunidade e
oferecer respostas a essas mazelas, articulando entre macro e micro, em um grupo
específico e em dado lugar. Uma análise cultural tem como foco, interpretar os dados
referentes a comunicação. Como caráter dos Estudos Culturas, este procedimento é
uma construção teórica que não recorre a definição, entretanto, vincula com questões
políticas e articula com a produção e o consumo cultural (MORAIS, 2016).
Cabe citar o trabalho de Hall (1997), que afirma a centralidade do conceito
cultura, como central e locomotor do pensamento analítico, compreendido como
campo de disputa, de diversos grupos, referente ao processo de significação e
produção do discurso. Portanto, os trabalhos dos autores influenciados pelos EC no
campo da comunicação, problematizam as produções de sentidos, investigando os
programas televisionados, observam que são fartos de significados em potencial.
Constatam também, que a “significação torna-se objeto de investida por parte da
ideologia dominante na tentativa de propor um sentido preferencial, articulado com os
seus interesses” (ROCHA, 2011, p. 6), assim, existe uma trama complexa midiática
que argumenta e elabora conteúdo com propósito, esse processo necessita de
questionamento.
A dedicação dos pesquisadores da análise cultural, relacionam olhares teóricos
e processos metodológicos, demais, centralizando a cultura (ROCHA, 2011).
Portanto, uma ferramenta que orienta a pesquisa dos fatos sociais e qual sua
produção de sentido. Segundo Morais a análise cultural “é como um instrumento de
análise cujo vínculo com o materialismo cultural se dá na relação do método analítico
com o método de abordagem” (MORAIS, 2016, p. 30).
Sob outra perspectiva, análise cultural é a articulação com a produção e
consumo cultural. Evidenciado O Circuito da Cultura de Paul Du Gay, já citado nessa
pesquisa através da Kathryn Woodward (2008), apresento para reforçar esse ponto,
Morais (2016) definindo como:
Para as pesquisas em comunicação, a articulação comum aos circuitos da cultura é, sobretudo, uma forma de apresentar as relações entre a esfera produtiva e suas representações midiáticas e as
maneiras pelas quais os sujeitos se apropriam das mensagens, como as decodificam e delas fazem uso em suas vidas privadas (MORAIS, 2016, p. 34).
Nesse seguimento, as análises do texto televisivo buscam entender e
interpretar a comunicação que surgem nos programas, no caso os códigos, que são
os resultados da tenção ligação entre produtores, conteúdo e telespectadores,
reconhecer o arranjo de cruzamentos de informações que opera com as relações de
poder da sociedade (MORAIS, 2011). Refletindo e relacionando as relações de poder
das práticas sociais, procurando os signos, ou melhor, padrões que se repetem, além,
das fugas, no caso a diferença. De acordo com Rocha (2011), os EC, questionam a
televisão, analisando a partir da abordagem cultural. Fortalecendo o estudo político
teórico, devido ao caráter analítico.
Diante do exposto, em 15 de maio de 2020, através do site
globoesporte.globo.com, foi realizado uma busca, por data personalizada na página
de busca, entre os dias 7 de junho a 7 de julho, afinal, a 8ª Copa do Mundo de Futebol
Feminino da Fifa foi realizada na França em 2019 nesse período. Com as seguintes
palavras chaves: Copa do Mundo de Futebol Feminino.
Por conseguinte, está pesquisa iniciou com a premissa de compreender os
vetores de força através de uma rede de informações sobre esportes, entretanto, com
o decorrer da escrita, identificou uma mudança de foco na investigação, dos textos de
notícia para enaltecer os comentários. Os comentários funcionam dentro do circuito
da cultura, analisando-os como reflexos de certas representações hegemônicas, que
possuem mais poder na disputa por significados.
4 ARTICULANDO MACRO E MICRO
Faz-se necessário o enfoque de olhar sobre uma cultura de sociedade, como a
sua regulamentação é estabelecida e suas relações de poder com suas amarras.
Assim, as identidades que se sobressaem e quais vetores que representam a
diferença são ofuscados. Cada sociedade possui a sua cultura específica de como
viver, o jeito de se vestir, a forma de se comunicar, condutas e costumes. As diferentes
formas de significar a realidade, permeiam as relações de poder, que apontam o mais
“forte” e o mais “fraco”, em outras palavras, homem e mulher.
O preocupante em estabelecer um padrão, é que toda e qualquer diversidade
é negada ou excluída. Hall (2003) pontua os vetores de força, como o Estado, que
transmitem e transformam significados da constituição de família e as relações de
poder, incluindo as de gênero, que determinam o certo e errado, diferenciando o bom
do ruim, isto é perigoso, uma vez que corpos são únicos, com características
específicas e expressões diferentes. Se torna essencial uma reflexão sobre como
funciona as relações de poder, buscando articular na construção das identidades de
mulheres no esporte, com referencial de trabalhar entre o macro e o micro, esta
pesquisa selecionou um grupo, mulheres no futebol brasileiro. Pretende-se analisar
as notícias sobre este tema.
Diante do exposto, selecionamos como fonte empírica o seguinte contexto:
notícias e seus comentários do esporte futebol sobre mulher, pelo site Globo Esporte
da emissora Globo, no período da 8ª Copa de Mundo Feminina, França 2019,
portanto, de 7 de junho de 2019 a 7 de julho de 2019, pelo site
https://globoesporte.globo.com/. Mediante essa pesquisa no site citado, encontrei 4
reportagens, a primeira delas foi ''Qual é, qual é...futebol não é pra mulher?'': conheça
a história por trás do hino da Seleção na Copa, do período do começo da competição,
e comenta que conforme os jogos foram acontecendo, a torcida brasileira alimentou
sua esperança em obter bons resultados na competição com a Seleção
(KESTELMAN; BASTOS, 2019).
Portanto, quando a atacante Cristiane, marcou três gols no jogo contra a
Jamaica e escolheu a música7 Jogadeira, criada pela jogadora do Corinthians Cacau
7 [...] Desde pequena muito preconceito, Aqueles papo futebol não é pra mulher, Mas aprendi a dominar no peito, Pôr no chão e responder com a bola no pé [...] Se você pensa que é fácil, A vida dessa mulherada, Mas não é não, cê tá enganado, Antes de jogo não tem balada, Além de muito treino e
com a ex-jogadora Gabi Kivitz, para comemorar a vitória, não imaginava que a partir
daquele momento essa determinada canção se tornaria um hino de grande motivação
e inspiração para a Seleção feminina. Para alguns, o discurso da notícia repercutiu de
forma negativa ou de forma repudiando as jogadoras (que representa o grupo 1), para
outros, positiva, simbolizou força, empoderamento e ato de resistência (que
representa o grupo 2). De forma limitante, tomarei como grupo 1 os que comentam de
forma a negar as práticas sociais das jogadoras e das mulheres sem serem jogadoras,
e o grupo 2 os que afirmam o trabalho das envolvidas.
No espaço aberto a comentários públicos da reportagem, em que as pessoas
exerceram o direito de se posicionar, expor o que pensam e se expressarem, gerando
uma discussão pelo poder da verdade ou aquele pensamento que se sobressai.
Especificamente nessa reportagem, ao todo foram analisados um total de 71
comentários e deste retirados 98 deles para se tornarem exemplos dos dois grupos.
No que se diz respeito aos comentários elaborados pelos leitores e leitoras referente
a reportagem cita acima, representando o 1º grupo, selecionei as seguintes opiniões:
FIGURA 2 – Comentários a respeito da 1° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
O comentário que consideram os corpos femininos das jogadoras de futebol
muito masculinizados, como um aspecto negativo, remete a como a prática está
associada ao homem. Também, sintetizar o argumento de “marcas biológicas”
(LOURO, 2000, p. 8), em que ocorre o almejo da imagem corporal ser bela, ou seja,
dedicação, Não tem final de semana nem feriadão, E se quiser pagode só tem no buzão [...] (primeira reportagem citada). 8 Segundo o site os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e nesta pesquisa
foram colocados no anonimato.
a ênfase num corpo frágil e fraco das mulheres jogadoras. Entretanto, o esporte com
mais presença de combate - como o futebol diferente do vôlei - solicita maior trabalho
muscular, que pode e muitas das vezes gera, um corpo musculoso ou como dito,
masculinizado e há pensamento, que afirmam o corpo musculoso como novo padrão
para os corpos das mulheres, jogadoras ou não, porque a todo momento com a
globalização, está movimentando novas identidades para as representações a
produção de significados.
Ainda sobre a questão9 de normatizar os corpos, regulamenta a interpretação
das competências como atletas, ou seja, seus desempenhos. Que ela tem que ser
forte para jogar como os homens, entretanto, não pode ser masculinizada. Este é o
processo de significar as características individuais, e mediante certos detalhes
afirmar qual corpo pode existir e qual deve ser negado. Se tratando de um esporte
profissional, se espera que as atletas sejam treinadas para esse nível, por isso, seus
corpos corresponderam a estímulos de forma expressiva, com altos níveis de
treinamento resulta em músculos definidos e fortes.
Portanto, o corpo musculoso é destinado para o masculino e o feminino frágil e
o papel maternal. Analisando pela ação, são as mesmas regras, possui uma
vestimenta semelhante ou até mesmo igual e possui o mesmo objetivo, aquele time
que marcar mais gols até final da partida, é o vencedor. Concordo que são jogos entre
jogadoras e jogadores são diferentes, com dinâmicas e suas particularidades
especificas, porém, o que mais se difere é por se tratar de ser um jogo entre mulheres,
assim, uma classificação de corpo que prediz que é inferior e subjugado. Prática ao
mesmo tempo, a regulação dos corpos e produzindo identidades de mulheres, que
deve praticar o esporte com determinado corpo.
Se encaixar numa determinação é impossível, desnecessário e doloroso, já que
a pessoa vai procurar ser o que não pode ser e nem deve ser, resultando numa
existência infeliz. É ir contra o propósito de cada um, já que cada indivíduo tem algo
dentro de si que se destaca dos outros, ser diferente da norma é ir contra o sistema
capitalista, afinal de contas o corpo é biológico, mas também político, social,
emocional e afetivo. O que Ferreira et al (2018) vai chamar de mito de fragilidade,
explica alguns comentários que escreveram a palavra fragilidade, caracterizam-se
como defensores deste pensamento sobre o sexo feminino e reforça a crença de que
9
as mulheres foram feitas para a maternidade. O olhar entre homens e mulheres da
sociedade, em quais condutas sexuais são aceitas, e o mais primordial, por quais
corpos são aceitas tais condutas.
FIGURA 3 – Comentários a respeito da 1° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
A sociedade na sua trajetória, glorifica as expressões ditas masculinas, o
homem é o parâmetro de comparação da figura da mulher, que por sua vez é dita
como inferior. Para uma visão igualitária dos corpos, é preciso lutar contra esses
vetores de força, regulamentar contra esses princípios para ressignificá-los.
Alguns comentários dizem que as jogadoras devem conciliar futebol com
família, reflexo da construção de que a mulher nasce para gestação e a maternidade.
O curioso é que esta cobrança não é destinada aos homens. Além disso, há
comentário em que se pergunta se a jogadora Cris é igual a Marta, se refere a
orientação sexual das jogadoras e, um comentário mais a abaixo concordando com o
anterior, considera que as duas são anormais, ou seja, um caráter de julgamentos
sobre qual sexualidade é a correta que demonstra uma moral religiosa:
FIGURA 4 – Comentários a respeito da 1° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
De acordo com Louro (2000) a orientação sexual de cada um não se limita a
uma característica pessoal, mas, uma questão político-social que se relaciona com a
produção do sujeito pós-moderno. A religião é uma grande fonte de formador de
opinião, de ditar regras a serem seguidas e pelo que demonstra, é um canal de
verdade que oriente a esse tipo de pensamento. Ainda que o jogo de futebol em si,
não sofra influência da crença de Deus na sua execução de movimentos e técnicas.
Existem os comentários que respondem as opressões escritas acima,
representando o grupo 2 que afirmam o espaço das jogadoras, esses comentários
defendem que os corpos das mulheres não sejam julgados, assim como qualquer
outro corpo não deve ser comentado, o comentador analisa, também, que o esporte
pede o desempenho físico:
FIGURA 5 – Comentários a respeito da 1° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
A segunda reportagem de análise é Pioneiras relembram proibição do futebol
feminino e mandam recado à Seleção na Copa: Ex-jogadoras do Araguari Atlético
Clube contam frustração vivida no Brasil há seis décadas e acreditam em conquista
inédita de Marta e companhia, evidencia os preconceitos sofridos nos passados e
como atualmente o cenário é diferente, como melhorou e incentivando a carreira das
jogadoras atuais (PAPEL, 2019). No entanto, esse discurso deve tomar cuidado,
porque existem muito campo a ser vencido, espaço para serem reconhecidas e para
terem visibilidade. O perigoso de olhar para o passado e comparar com o presente,
mas, sem senso crítico de que a luta ainda não acabou, silencia as mulheres que
estão lutando no agora. Ouvir os dois lados e reconhecer as debates e vitórias de
cada tempo, é um possível caminho de respeito.
A terceira reportagem Na final da Copa, duelo entre a ''tradição e a ascensão''
mostra novo cenário do futebol feminino, comentar que com os incentivos financeiros,
as seleções crescem e se desenvolvem (KESTELMAN, 2019). Evidencio que, após
um mês de competição, os comentários desta notícia, apresentaram mudanças, de
uma discussão por significados, para uma disputa futebolística, por exemplo, qual
jogadora em qual posição fica melhor e com bem menos opressões verbais
direcionadas a jogadoras, não que devem ser esquecidas, entretanto, me parece que
ouve uma mudança, sutil, entretanto, diferente daquela primeira reportagem
analisada.
Ainda com a mesma jornalista, Kestelman (2019), na quarta reportagem
Emocionada Marta dá recado a jogadoras mais novas apresenta 1.239 comentários,
uma das reportagens selecionadas com mais repercussão e um bom exemplo de
como ofertar lugar de fala gera discussão. Nesta, consta a entrevista com a seis vezes
campeã mundial Marta, discorre sobre a derrota contra a França, demostrando uma
certa preocupação sobre o futuro do futebol feminino brasileiro, porque se não é
divulgado é esquecido, entretanto, a presença das jogadoras do hoje e do passado
surtem efeito de identificação nas meninas que estarão crescendo hoje, na
reportagem as autoras apresentam a afirmação de Marta: “É isso que peço para as
meninas. Não vai ter uma Formiga para sempre, uma Marta, uma Cristiane. O futebol
feminino depende de vocês para sobreviver. Pensem nisso, valorizem mais. Chorem
no começo para sorrir no fim” (KESTELMAN, 2019).
E os comentários são apoiando, referentes ao grupo que apoia a presença das
jogadoras, entretanto, são a minoria dos comentários, isso não quer afirmar que seja
um grupo fraco, mas que, o discurso que ridiculariza a prática das mulheres no futebol,
ganha força nas redes sociais:
FIGURA 6 – Comentários a respeito da 4° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
Visto que, existem os comentários negativos, que julgam como a pessoa deve
ou não se vestir, que ela não pode ou deve passar batom, se demonstra no processo
determinar como esta pessoa deve ser:
FIGURA 7 – Comentários a respeito da 4° reportagem.
FONTE: Globoesporte, 2019.
Através da não visibilidade, o respeito negado e a não popularidade dessa
modalidade de esporte futebol, a população o considera chato ou desmotivador, ou
seja, um dos pilares do circuito da cultura, o consumo, é negativo, não ocorre ou é
mínimo, porém, com a transmissão dos jogos pela Globo em 2019, possivelmente o
jogo começou a promover mudanças. Quando uma reportagem oferece visibilidade
para as mulheres falarem dos seus estados atuais, revelando os preconceitos, por
exemplo, quando um comentário se refere sobre sua sexualidade em vez da sua
qualidade no esporte, está participando do processo do circuito da cultura.
A não visibilidade gera pouco incentivo por parte da família para as meninas ou
devido à escassez de notícias de mulheres na mídia. Considerando que, afasta a
garota da prática esportiva, devido à expectativa de beleza corporal da sociedade
associada as mulheres. Por consequência, baixa representatividade nas posições de
tomada de decisão, por exemplo técnico.
Portanto, inspirado no circuito da cultura, a cultura midiática da mulher no
futebol, através dos comentários do canal da rede globo de esportes, regulamenta e
determina quais representações recebem visibilidade para serem consumidas
globalmente, ou seja, seleciona quais discursos, sejam imagens, textos escritos ou
músicas, são divulgadas, operando assim na produção da identidade feminina. Ainda,
apresentando limitações desta identidade, hora aspectos físicos, outros de orientação
sexual ou comportamentos sociais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este é um texto inicial e apresenta uma série de limitações, se declara em
transformações, que a cada encontro se constrói e se representa como um manifesto
de resistência, assim como as identidades do sujeito pós-moderno, que segundo Hall
(1997), são frágeis e conflituosas e requerem questionamentos. Por conseguinte, de
acordo com a revisão de literatura deste estudo as relações sociais e os vetores de
forças, que circulam as informações e detém esse poder, são construídos pela cultura,
que é um conceito amplo e complexo, que engloba diversas questões, como as
situações sintomáticas, preconceitos, sofridas pela classe mulheres no esporte.
Uma forma de governar a cultura é entender como o circuito da cultura funciona.
Os canais de informação, determinam quais representações recebem visibilidades
para serem consumidos globalmente, ou seja, seleciona quais discursos, sejam
imagens, textos escritos ou músicas, são divulgadas, operando assim na produção de
identidades, ainda, apresentando limitações desta identidade, hora aspectos físicos,
outros de orientação sexual ou comportamentos sociais.
Outro ponto, nós não agimos por nós mesmo, mas subjetivados pela cultura
que somos inseridos, que recebe influência do tempo atual e do seu passado. Estas
memórias formam certa identidade nacional, que é defendida por leis e regulamentos.
O esporte está num campo com suas próprias leis, entretanto, não está a parte dos
processos que acontecem na sociedade. Futebol como uma modalidade com prática
na sua maioria masculina, tanto no contexto do alto rendimento, quanto no meio
escolar ou outros ambientes. Os resultados constataram que as opressões escritas
relacionadas diretamente ao gênero feminino, a sua orientação sexual e suas
características físicas (como o corpo masculinizado), apresentaram força nas
discussões através do site de notícias.
Conclui-se, nesta investigação, que toda sociedade colabora na construção de
o que é ser mulher dentro da cultura por meio do discurso. Existe um predomínio de
preconceitos sofridos pelas mulheres, praticado pelas pessoas que acessam e
comentam o canal de informação, que além de colaborar para o pouco espaço no das
mulheres no esporte, refletem a influência de certas representações.
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