UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ARTETERAPIA EM CRIANÇAS HOSPITALIZADAS
A ARTE COMO ESSÊNCIA DO CUIDADO
MARIA DE LOURDES GONÇALVES FERNANDES
RIO DE JANEIRO
JUNHO / 2002
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO A VEZ DO MESTRE
ARTETERAPIA EM CRIANÇAS HOSPITALIZADAS
A ARTE COMO ESSÊNCIA DO CUIDADO
MARIA DE LOURDES GONÇALVES FERNANDES
Trabalho Monográfico apresentado como requisito parcial para obtenção do Grau de Especialista em Arteterapia
Profª Orientadora: Diva Maranhão
RIO DE JANEIRO
JUNHO / 2002
3
Agradeço a Deus por todos os dias nos mostrar
que somos também artesãos e podemos criar um
mundo mais fraterno.
4
Dedico este trabalho:
Aos seres de luz que doam seu tempo às
enfermarias pediátricas, atuando como contadores
de estórias e transformando a noite em dia.
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo principal mostrar a importância da arteterapia no
atendimento às crianças hospitalizadas, promovendo processos de expansão da consciência,
transformações interiores e levando à cura através do ato de criar. A partir de várias
abordagens, será demonstrado como a arteterapia abre caminhos para que a espontaneidade e
a criatividade auxiliem a criança a se afastar da doença e focalizar sua atenção na saúde. Em
função disso, a criação de espaços lúdicos voltados às crianças hospitalizadas torna-se
fundamental.
As unidades hospitalares que já realizaram essas mudanças puderam constatar uma
mudança efetiva de comportamento em seus usuários que conseguem enfrentar com mais
esperança, alegria e alento, a convivência com um momento tão difícil, como é uma
internação hospitalar na sua vida e na vida de uma família.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 08 CAPÍTULO I. ENVOLVENDO-SE COM O SÍMBOLO DA CURA........................... 09 1.1 Ambiente de Cura..................................................................................................... 09 1.2 O Símbolo Nosso de Cada Dia................................................................................. 10 1.3 Uma Nova Forma de Se Relacionar......................................................................... 12 CAPÍTULO II. VISÃO HOLÍSTICA ............................................................................ 13 2.1 Estética Quântica...................................................................................................... 13 CAPÍTULO III. A DOENÇA COMO UM SINAL........................................................ 15 3.1 Saúde e Doença: faces da mesma moeda ................................................................. 15 3.2 Salas de Arteterapia: trazendo luz à sombra ............................................................ 17 CAPÍTULO IV. MATERIAIS EXPRESSIVOS............................................................ 19 4.1 Desenhando Com a Alma ........................................................................................ 19 4.2 Foi Com o Barro Que Tudo Começou ..................................................................... 20 4.3 Teatro de Bonecos.................................................................................................... 20 4.4 Poesia ....................................................................................................................... 21 4.5 Contando Estórias e Histórias................................................................................... 21 CAPÍTULO V. QUESTÕES E DÚVIDAS SOBRE A ARTETERAPIA...................... 22 5.1 Potencial da Arte ..................................................................................................... 22 5.2 Buscando Significados Pela Arteterapia .................................................................. 23 5.3 Dúvidas .................................................................................................................... 24 5.4 Arte + Terapia .......................................................................................................... 25 5.5 Interpretar: sim ou não? ........................................................................................... 25 CAPÍTULO VI. SALAS DE ARTETERAPIA – ESSÊNCIA DO CUIDADO............. 26 6.1 Propósito Faz a Diferença ........................................................................................ 26 6.2 Estar Atento ............................................................................................................. 27 6.3 Arte + Terapia = Comunicação Simbólica .............................................................. 27 6.4 Experiências com Arteterapia nas Enfermarias Pediátricas..................................... 27
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CONCLUSÃO ............................................................................................................... 29 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 30 ANEXOS ....................................................................................................................... 32
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INTRODUÇÃO
A realização deste trabalho resultou de um encontro com uma realidade sofrida e,
muitas vezes, sem perspectiva que consiste ma internação hospitalar na vida de uma criança.
Reverter esta realidade e transformá-la numa oportunidade de crescimento é possível com a
criação de espaços dedicados à arteterapia, onde as crianças podem vivenciar seus medos,
angústias e esperanças num ambiente lúdico que a faça esquecer, pelo menos
momentaneamente, da doença. Esse afastamento, de acordo com arte terapeutas e médicos,
colaboram no processo de restabelecimento.
O presente trabalho também pretende discutir e levar à reflexão a maneira como as
unidades hospitalares se estruturam, os símbolos que elas transmitem a partir de sua
decoração, por exemplo, e a forma como paciente e equipe médica se relacionam.
A partir de vários autores será demonstrado como a arteterapia tem resultados
concretos no restabelecimento da saúde das pessoas, principalmente nas questões ligadas ao
seu inconsciente e instituições que possuem espaço para a prática da arteterapia e os
resultados que essa inovação trouxeram ao paciente e à própria instituição
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CAPÍTULO I
ENVOLVENDO-SE COM O SÍMBOLO DE CURA
Eu te invento, ó realidade!
Clarice Lispector
1.1 Ambiente de Cura
Um elemento presente em todas as formas de arte é a harmonia por ser um caminho no
qual tudo tem seu lugar. Até mesmo os elementos dolorosos da vida fazem sentido e
começam a ser compreendidos dentro de um ambiente criativo. Lidar com esses elementos
constituí uma parte fundamental para estabelecer o processo de cura. O primeiro passo em
direção à conquista deste objetivo é o de repensar e, posteriormente, reestruturar a maneira
como as enfermarias são organizadas e que mensagens passam os símbolos que estão
explícitos e, sobretudo, implícitos na sua decoração, assim como a estruturação de sua equipe
de saúde que é composta de enfermeiros, médicos, auxiliares de enfermagem, psicólogos,
anestesistas, pessoal da limpeza, nutrição e, recentemente e pessoas que atuam em trabalhos
voluntários.
Ainda existem muitos hospitais cujas paredes são decoradas por um quadro que tem
como símbolo uma enfermeira com a posição dos dedos pedindo silêncio, ou então, cartazes
sobre os cuidados que devemos ter para combater a infecção hospitalar. Não resta dúvida que
alguns desses avisos são imprescindíveis. No entanto, o que precisa refletir é que muitas vezes
suas informações estão mais focadas na doença do que na saúde.
A terapeuta Colette Aboulker-Muscat, em seu livro Healing Visualization
(Visualização Curativa) explica como o imaginário é capaz de ligar emoções e sensações à
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imagens. Entre suas reflexões, ela destaca, por exemplo, qual é a imagem que cada um associa
ao sentimento de raiva? E revela a importância de se construir imagens que permitam gerar
respostas completamente novas para situações e problemas. Pois segundo a autora, elas têm
uma energia que pode, e deve, ser utilizada para promover mudanças reais no mundo exterior
que visem melhorar o estado emocional da pessoa. “A maneira como a pessoa se vê e vê o
outro está no cerne da maneira como percebe o mundo. E se tratando de um espaço hospitalar
essa visão é decisiva para colaborar ou não no processo de restabelecimento do cliente”. A
terapeuta Collete defende a idéia de se reavaliar a maneira como as enfermarias estão
organizadas e reforça a importância de se pensar, inclusive, num lay out mais alegre e
positivo.
Como destaca a poesia: “ a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e
arte”, as relações precisam ser repensadas, principalmente entre paciente e médico, e as
normas de conduta necessitam ser reavaliadas para que se caminhe na direção de um ambiente
criativo e promotor de saúde. O filósofo Michel Focault questiona por que a vida de todo
mundo não poderia tornar-se uma obra de arte? Para ele, uma das saídas seria encararmos
uma maneira de viver onde a arte fosse um componente importante na relação. E completa:
“Por que uma luminária ou uma casa podem ser uma obra de arte e a vida não? Que valores
são esses que fomos dando aos objetos em detrimento à vida e suas relações”. O conceito de
arte, segundo o Focault, impõem ao “objeto” uma certa admiração e respeito e é isso que
muitas vezes está faltando às relações humanas.
1.2 O Símbolo Nosso de Cada Dia
Ao longo de sua vida, o homem vai construindo símbolos de sucesso e de fracasso que
são acionados para lidar com a vida, principalmente em momentos de dificuldade, como
acontece com uma pessoa acometida por uma doença repentina que exige uma internação
hospitalar por vários dias; mudando completamente a sua rotina. Nesse momento, quais os
símbolos que são acionados? Costuma-se associar movimento à saúde. Na sociedade
moderna, ficar parado é perder tempo. Afinal “time is money” ( tempo é dinheiro) é o símbolo
do progresso. Portanto, ficar parado por alguns dias numa cama hospitalar é perder dinheiro.
E no caso de crianças é perder a infância, o tempo de brincar. Fica-se, então, mais doente por
conta da impaciência em lidar com esse símbolo de espera que a doença impõem. Para ajudar
na lida com esses símbolos, é importante que o espaço hospitalar garanta um lugar criativo,
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acompanhado por um profissional de arteterapia que acompanhe o paciente em seu encontro
com a arte e desse modo evitar que o seu dia-a-dia no hospital se restrinja apenas ao
tratamento e à medicação. É preciso garantir um cuidado que envolva corpo, mente e espírito,
ou seja, dentro de uma concepção holística que vê o paciente de forma integral.
A escritora Fiona Sampson passou 18 meses como escritora-residente do
Departamento de Saúde da Ilha Wight. Sua tarefa era trabalhar com crianças e adultos
gravemente enfermos e pacientes geriátricos e psiquiátricos internados por um longo período.
Durante sua residência, ela identificou que uma das razões pelas quais escrever cura é o fato
de transformar necessidades particulares em algo universal, ou melhor, em alguma coisa que
outro possa ler. Assim, o paciente em vez de ser uma vítima se transforma em escritor,
construindo um símbolo de ação e reagindo à doença.
Criar uma forma de expressão é uma conquista e há o prazer intrínseco em se ter feito
um quadro, escrito um poema, escutado uma música ou lido um bom livro. A Arteterapia
utiliza esses elementos que ajudam a superar um sentimento de alienação e de rigidez e ainda
proporciona oportunidades novas de aprendizado. Conforme destaca a arte terapeuta, Violet
Oaklander1, numa oficina de arteterapia o paciente/cliente tem a oportunidade de vivenciar
sua doença, transportando para os materiais expressivos, pintura, desenho, escultura,
angústias, sonhos, frustrações e esperanças.
O mais importante no processo de criação, como enfatiza a terapeuta McNiff, no livro
Art as Medicine, é a possibilidade da pessoa se colocar na posição de observador e
vislumbrar as imagens que ele formou e os símbolos que estão impregnados nesta
representação. É como se o indivíduo pudesse ficar de frente a um espelho e dar de cara tanto
com o inimigo, no caso poderia ser a doença, como com o herói, que poderia ser representado
pelos elementos de cura. McNiff ressalta que primeiro passo para transformar o estado de
humor é acreditar que a melhora de saúde é possível. “Se alguém está convencido que suas
chances de melhorar são grandes, terá mais chance de recuperação. “E a arteterapia colabora
com esses processos de mudança.”
1 OAKLANDER, Violet. Descobrindo Crianças. 13a edição. São Paulo: Summus Editorial .
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1.3 Uma Nova Forma de se Relacionar
Na relação médico/paciente, os dois pólos precisam cada qual saber o seu poder e seu
saber pois é nesse encontro que ambos podem aprender. Como destaca a psicóloga Lenise
Brandão, em seu livro Psicologia Hospitalar, o crescimento só é real se for crescimento
compartilhado e, sobretudo, se for crescimento de todos.
Seria de grande importância para os médicos se na sua rotina de atendimentos
pudessem dar uma parada e realizarem uma reflexão sobre suas práticas para observarem que
símbolos eles foram construindo na relação com o paciente, com a doença e, especialmente,
com a morte. Essa oportunidade poderia fazer-lhes avaliar os preconceitos ideológicos e
vícios contidos em suas abordagens e daria uma chance para vislumbrarem a maneira como
um ambiente hospitalar é organizado: não cedendo espaço à própria reflexão dos seus
profissionais. A resistência a essa mudança passa a idéia de o melhor é deixar para lá, evitar o
encontro com a sua realidade. Essa atitude impõem uma certa paralisação, ficando mais difícil
implantar mudanças; inclusive no que consiste em criar espaços de arteterapia.
Uma administração que se olha acaba mudando. Como ocorreu com o INCA (Instituto
Nacional do Câncer) que possui várias áreas de lazer e espaços de arte que envolve os
pacientes numa atmosfera mais otimista e construtiva. Esta abordagem de tratamento focaliza
o indivíduo em seu desenvolvimento global. Como define a psicóloga Lenise Brandão, não se
trata apenas de fazer algo pela pessoa, mas de ajudá-la a fazer alguma coisa para e por si
mesmo, colaborando na superação dos entraves ao seu desenvolvimento e a sua transformação
de paciente para agente. O indivíduo passa a funcionar de forma mais integrada, com
repercussões em seu estado físico e na saúde, em seu contexto mais amplo.
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CAPÍTULO II
VISÃO HOLÍSTICA
Não tenho um caminho novo.
O que tenho de novo é o jeito de caminhar.
Thiago de Mello
2.1 Estética Quântica
“Comparando-se o fato por meio da qual a máquina produz uma dúzia de pratos
idênticos, pode-se avaliar plenamente por que um é um ato criativo e o outro não, e por que
nossa criatividade está tão próxima do sentido de nossa existência”, compara Danah Zohar.
Portanto, sem a intenção consciente da criança, a argila nunca teria sido transformada
num pote. Da mesma forma, sem aquele pote, o senso estético da criança jamais teria sido
encarnado. Num amplo e numa visão quântica da realidade, criança e pote dão origem um ao
outro. O mesmo ocorre, em maior ou menor grau, com o ambiente e artefatos materiais a
nossa volta. Ao fazê-los, nós nos fazemos. Vivendo com eles nós nos descobrimos. Num
ambiente hospitalar, ter consciência dessa teia (web) pode mudar a relação e o tratamento
dados aos pacientes e sobretudo às equipes de trabalho.
Para a física Danah Zohar, há algo feio e brutal nas coisas meramente funcionais, nas
mesas de plásticos planas e com pernas retas, nas torres de concretos e nos infinitos designers
intencionalmente mecânicos que excluem qualquer consideração do fator humano em seu uso
e reforça o senso de alienação cujas raízes estão em toda tendência mecanicista de nossa
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cultura newtoniana.2 Artefatos que não contém nada de fator humano não refletem nada de
volta quando lidamos com eles. “Não estão em diálogo conosco e não conseguem satisfazer
nossa necessidade de auto descoberta criativa”3.
Um prédio funcionalista feito de concreto não reflete nem a dinâmica da consciência
nem a sua “textura”. O mesmo vale para aqueles conjuntos habitacionais onde fileiras e mais
fileira de unidades idênticas são apinhadas em pequenos espaços por projetistas que tentam
aplicar a técnica de produção em massa na arquitetura. Conforme exemplifica Danah Zohar,
nenhum condensado de Bose-Einstein vivo é igual a outro, e o ser humano também tem
necessidade de ver tal diversidade expressa em seu ambiente.
Usando a física podemos concluir, por exemplo, que um elétron, confinado num
espaço muito pequeno, fica “enlouquecido” pois, de acordo com a física Zohar, sua posição
torna-se fixa demais e, portanto, o princípio de incerteza exige que seu momentum se torne
muito grande. E, guardando as devidas proporções, é o mesmo que ocorre com um paciente
internado numa enfermaria. Confinado a sua própria “doença”, aglomerado a outros pares
iguais, sob o risco de contrair tédio, num plano espiritual, e infecção hospitalar, no plano
material da existência.
Uma estética quântica abriria, necessariamente, a possibilidade de se discutir como o
meio interfere no comportamento das pessoas. Visto que, os sistemas quânticos, são como
poemas, sempre prestes a propor vários significados, novas evocações, novas interpretações.
Assim como os pensamentos, que ora podem assumir uma qualidade livre, ora uma qualidade
asfixiante, e é esta mutabilidade que faz o homem do homem um ser criativo.
Da mesma maneira que o mundo que cada um cria a sua volta e os objetos incluídos
nele refletem, de certa forma, quem somos e como estamos. O mesmo ocorre num ambiente
programado para “sarar” feridas construído de forma fria; com corredores que dão a
impressão de não serem habitados; proliferação de equipamentos para exames que, embora
sejam de grande ajuda para o diagnóstico, causam na pessoa um sentido de desamparo, de
falta de humanidade. Ocasionando um distanciamento entre paciente e equipe médica.
2 idem. 3 idem
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CAPÍTULO III
A DOENÇA COMO UM SINAL
Para poder receber, deves ter dado antes.
Isto se chama sabedoria.
Tao Te King
3.1 Saúde e Doença: faces da mesma moeda.
Desde a época de Hipócrates, a medicina acadêmica vem tentando convencer os
pacientes de que um sintoma é um fenômeno mais ou menos acidental, cuja origem deve ser
procurada nos processos mecânicos do organismo. Desde então, todos estão empenhados na
pesquisa desses processos. E assim, os laboratórios e as grandes indústrias farmacêuticas
investem seus recursos em drogas cada vez mais sofisticadas. Evitam interpretar o sintoma, e
assim condenam o sintoma e a doença ao exílio da ausência de significado. Com isso o sinal
perde sua verdadeira função: os sintomas transformam-se em sinais sem significado.
Para compreendermos melhor, seria como se um automóvel que de repente acende a
luz do painel e sentimo-nos obrigados a interromper o passeio por causa desse sinal, ou seja,
alguma função importante do carro não está mais funcionando como devia. Trata-se de um
sinal. E ficaríamos muito zangados se o mecânico simplesmente apagasse essa luz ao invés
de buscar o que , de fato, ocorreu ao carro.
O que aconteceu acima com o carro, equivale em nosso caso ao sintoma. O que
constantemente se manifesta em nosso corpo como sintoma é a expressão visível de um
processo invisível, o qual deseja interromper nosso caminho por meio de sua função de sinal
de advertência, indicando que alguma coisa não está em ordem. Nesse caso, também é
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absurdo apagar o sintoma, impedindo-o de manifestar-se. Para isso é preciso desviar nosso
olhar do sintoma e examinar tudo com mais profundidade, a fim de compreender o que o
sintoma está apontando.4
Para os autores, o problema da medicina acadêmica está no fato de ela não ter
capacidade para dar esse passo, na medida que está encantada com os sintomas. Não consegue
separar a forma do conteúdo.5 Então passa a tratar com grandes recursos e bastante
habilidade, os órgãos e as partes do corpo, mas não trata do ser humano que está doente. Ele
persegue a meta de ser capaz de, a qualquer tempo, eliminar todos os sintomas de uma só vez,
sem procurar analisar com mais sobriedade a viabilidade deste objetivo.
Conforme elucida Jung “ um médico não deve jamais perder de vista o seguinte: as
doenças são processos normais perturbados, e nunca entia per se, dotados de uma psicologia
autônoma. Assim, prática médica deve prevenir-se contra o risco de ela mesma tornar-se
doente. Parcialidade e estreitamento de horizontes são características neuróticas largamente
conhecidas.6
A doença é um estado do ser humano que indica que, na sua consciência, ele não esta
mais em ordem, ou seja, sua consciência registra que não há harmonia. Essa perda de
equilíbrio interno se manifesta no corpo como um sintoma. Sendo assim, o sintoma é um sinal
e um transmissor de informação, pois, com seu aparecimento, ele interrompe o fluxo de nossa
vida e nos obriga a prestar-lhe atenção. O sintoma avisa que, como seres humanos, como
seres anímicos, nós estamos doentes, isto é, o equilíbrio de nossas forças anímicas interiores
está comprometido. O sintoma nos informa que está faltando alguma coisa. Pôr isso que
antigamente costumava-se a perguntar a um doente: “ O que está lhe faltando? Hoje
pergunta-se: “O que o senhor sente?”. Estas duas perguntas expressam formas diferentes de
lidar com a situação. Ambas seja dirigidas a uma pessoa doente e, para alguém nesse estado, a
consciência sempre capta a falta de alguma coisa, pois se nada lhe faltasse, ela estaria sadia,
ou seja, perfeita e íntegra. No entanto, quando algo falta à saúde, ela não esta sadia, está
doente. Conforme destaca Dethlefsen e Dahlke, essa doença se manifesta no corpo como um
sintoma. Então, o que se tem é a comprovação de que algo nos falta.. Falta consciência, e
portanto, tem- um sintoma. O sintoma pode nos dizer algo que falta em nosso caminho, mas
4 DETHLEFSEN, Thorward & DAHLKE, Rüdiger. A Doença Como Caminho. São Paulo: Cultrix, 1983. 5 Idem. 6 6 JUNG, C.Gustav. A Vida Simbólica. Petrópolis: Vozes, 1981.
17
isso pressupõem que entendamos a sua linguagem. A cura acontece através da incorporação
daquilo que está faltando.
3.2 Salas de Arteterapia: trazendo luz à sombra
Podemos comparar a doença à falta de luz, ou seja, a manifestação de nossa sombra
(de acordo com Jung ) e o sintoma como a luz, a parte que nos trará à consciência. Olhar
para a doença e buscar descobrir o que lhe falta é um importante passo no caminho da cura.
E nem sempre o tratamento e a fala médica colaboram para que o paciente fique isolado da
possibilidade de lidar com a doença num nível simbólico, de trazer à tona o inconsciente, o
que lhe falta e da origem à sombra.
A palavra consciência é usada para designar as características e os aspectos humanos
que ficam na luz, ou seja, que o homem pode ver. A área não iluminada pela luz da
consciência, e que portanto é escura, denomina-se inconsciente. Contudo os aspectos
sombrios somente parecem maus e infundem temor quanto estão na sobra. O simples fato de
olhar para os conteúdos da sombra traz luz para as trevas .
Olhar para as coisas é a grande fórmula mágica do caminho para o auto conhecimento.
O mero fato de observar modifica a qualidade daquilo que está sendo observado, pois esse ato
traz luz, ou seja, consciência à escuridão. Em se tratando de um diálogo com o símbolo, um
dos melhores meios para que isso aconteça é justamente através dos materiais expressivos
usados em arteterapia, com desenho, pintura, escultura, música, poesia, psicodrama, entre
outros. Portanto, a criação de salas de arteterapia nas enfermarias tanto pediátricas quantos de
adultos abriria espaço para a utilização destes materiais e, assim a possibilidade do tratamento
incorporar o olhar a sombra, trazendo luz para o diagnóstico e a forma de lidar com o
paciente.
Esses espaços criariam um distanciamento da doença pois permitiria que a pessoa
pudesse viver outras formas de expressão que não fossem a lamentação pelo seu estado atual.
No caso de crianças, é muito comum, numa sala de recreação, a apatia dar lugar ao
movimento. Apenas um breve contanto com brinquedos e visualização de cores já alteram o
estado emocional da criança. Esse fato pode ser comprovado até mesmo em casa, quando o
filho está doente e o responsável conta uma história ou traz um brinquedo diferente como o
ânimo da criança muda. Fazendo uma analogia entre ânimo e anima que significa alma, esse
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ato de atenção atinge onde a doença realmente está instalada: na alma que precisa tanto de
atenção quanto o corpo.
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CAPÍTULO IV
MATERIAIS EXPRESSIVOS
Não convém embrulhar este brinquedo feito de amor.
Pode estragar,
pode mudar de cor,
mudar de rumo, deixem,
que ele precisa de ar...
Thiago de Mello
4.1 Desenhando Com a Alma
A arteterapia é considerada como um tratamento dado à alma, ou seja, ao que está
invisível e que nem sempre as palavras conseguem dar conta. A utilização dos materiais
expressivos como desenho, pintura, argila, psicodrama, música, facilitam a exteriorização dos
sentimento do indivíduo quando as palavras não brotam com tanta facilidade. No caso de
crianças, a arteterapia é a linguagem ideal para expressarem seus medos e angústias, além de
criar um ambiente lúdico e de brincadeira.
Experiências prazerosas de desenho e pintura, por exemplo, auxiliam a criança com
problemas emocionais a manter o gosto de viver. Conforme elucida Violet Oaklander, em
Descobrindo Crianças, experimentar sentimentos de raiva é como recuperar parte de sua
própria força. A cor, tonalidade e a fluidez da pintura se prestam tão bem a estados de
sentimentos. “Posso pedir a uma criança que faça uma pintura de como ela está se sentido
naquele momento. As crianças parecem representar melhor os sentimentos com tinta do que
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com as palavras”, afirma Violet. Além disso, a arteterapia ajuda a criar laços de afetividade
entre paciente e o ambiente.
4.2 Foi com o Barro que Tudo Começou
A criatividade é uma atitude essencial na vida dos seres humanos percorre toda nossa
história e cultura. O homem é visto como um artesão que ao longo de sua trajetória histórica
vem construindo instrumentos e ferramentas para aliviar o fardo e torná-lo,
antropologicamente falando, um criador. E está criatividade que distingue o homem das feras,
definindo assim sua humanidade. Em síntese, nossa criatividade tem sido considerada a razão
de nossa humanidade.
Este tema surge na tradição mística judaica, que afirma que Deus fez o homem porque
precisava de um parceiro na criação e assim empreender o surgimento de novos criadores. O
material expressivo e simbólico desta criação foi o barro/argila; muito utilizado em
arteterapia por ser uma das técnicas que permite ao indivíduo viver a um só tempo a
realização e a transformação. Pois quando a criança ou o adulto faz o seu pote ou sua
escultura, dá forma e significado a algo que nunca existiu antes. Mais do que isso, é a relação
dela, de seu senso de beleza em evolução, com aquela argila. O ato criativo da criança deu
origem a uma nova coisa. Portanto, como enfatiza Danah Zohar7, ao fazer esse pote, a criança
também fez algum novo aspecto de si mesma e uma pequena porção de seu mundo – de seu
relacionamento com as coisas.
4.3 Teatro de Bonecos
Muitas vezes é mais fácil uma criança falar por intermédio de um boneco do que
expressar diretamente o que acha difícil dizer. O boneco proporciona um certo
distanciamento, e a criança sente-se mais segura para revelar desta forma alguns de seus
pensamentos mais íntimos. Descobre-se muita coisa a partir do animal que ela escolhe e,
através do boneco, a criança diz o que gosta e quais são seus medos.
7 ZOHAR, Danah. O ser Quântico. São Paulo: Best Seller, 1990.
21
As crianças também sentem prazer em fazer os bonecos e depois ao atuar são capazes
de resolver conflitos internos bem como externos, equilibrando e integrando aspectos de si
mesmas.
4.4 Poesia
A poesia vem do coração. A melhor forma de fazer com que as crianças se interessem
em escrever poesia é ler para elas os poemas de outras crianças e de poetas como Manuel de
Barros, Cecília Meireles, Mário Quintana, entre outros que possuem uma forma poética de
lidar com as palavras à maneira das crianças. Após se ler uma poesia, pode se pedir à criança
para que faça um desenho de seus sentimentos acerca do poema, e do que ela tomou
consciência através do mesmo. Ou então, que faça um desenho de alguma coisa de que o
poema tenha feito recordar; alguma palavra ou frase pode ter tocado a criança.
4.5 Contando estórias e histórias
Quem conta um conto aumenta um ponto. E é nessa trama que muitos traumas são
vivenciados como se viessem do personagem da estória e não de quem estão contando. Esse
distanciamento proporciona um momento rico para se avaliar, julgar, criticar e elogiar sem
afetar, diretamente, a auto estima da criança. E, o que é melhor, essas observações podem e
devem sair da própria.
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CAPÍTULO V
QUESTÕES E DÚVIDAS SOBRE ARTETERAPIA
Daquilo que eu sei
Nem tudo me deu clareza
Nem tudo foi permitido
Nem tudo me deu certeza...
Ivan Lins
5.1 Potencial da Arte
Num momento ou em outro temos a oportunidade de vivenciar a criatividade e seu
potencial por meio da arte. Como criança, você provavelmente encontro prazer em desenhar
com lápis cera, fazer alguma colagem, construir castelos de areia ou com suas próprias mãos
modelar alguma figura. Como adulto, acabamos não nos considerando criativos ou um artista,
mas com certeza já tivemos algum tipo de experiência com alguns dos processos terapêuticos
da arte em nossas vidas. Você pode pintar ou fotografar como hobby, se envolvendo com o
processo de criação e conhecendo-o como uma atividade que ajuda a aliviar o estresse. Você
pode manter um diário, esboçar seus sonhos, anotar os símbolos a pensar sobre essas coisas.
Quando você rabisca linhas nas laterais de seu livro ou na própria carteira ou mesa, encontra
nesta atividade uma forma de relaxar a tensão. Todas essas simples atividades são caminhos
para se acalmar e liberar a tensão, dão prazer e lhe ajudam a transpor sentimentos turbulentos.
Trata-se de métodos de auto-expressão que mudam seu estado de ser e tocam sua intuição e
seu poder criativo.
23
Embora você já tenha experimentado o poder terapêuticos dessas atividades, continua
achando que a arte não tem relação com terapia. Isso vai depender da definição que se tem
sobre a arte, pode-se pensar que trata-se de objetos utilizados em decoração, diversão ou
alguma novidade ou, simplesmente, algumas esculturas e pinturas exibidas em museus. Pode-
se achar ainda que arte são apenas as brincadeiras de criança, ou talvez uma diversão ou um
passatempo. Embora em alguns momentos seja difícil encontrar uma definição para a arte,
você provavelmente concorda que a arte dá mais brilho a sua existência, mas sem saber qual a
maneira que a arte possa dar significado a sua vida/ ou significar sua existência.
5.2 Buscando Significados de Vida Pela Arteterapia
Ao mesmo tempo que a arte serve como decoração ou pendurada em museus, existem
outros propósitos para arte, um deles é nos conectar com o nosso auto-conhecimento, na
busca de significados que proporcionem crescimento individual e saúde. Muitos de nós já
perderam contato com esses propósitos ou jamais realizaram e a arte é muito mais do que uma
mera novidade ou decoração. A pintura, escultura e outros processos artísticos são poderosas
formas de comunicação, e culturas do passado podem ser entendidas através de sua arte.
Enquanto a arte tem sido usada para recordar a história da humanidade, ela também
podes ser incorporada aos nossos ideais, sentimentos, sonhos, e aspirações. A arte pode nos
conduzir a uma ampla ordem de emoções, que podem trazer uma profunda alegria ou um
sentimento de grande tristeza, superando traumas. Neste sentido, a arte é usada como um
caminho de entendimento, na busca de sentido, clarificando nossas experiências interiores
sem o uso das palavras.
Arteterapia tem crescido sob o conceito de que as imagens podem nos ajudar a
entender quem somos, expressando sentimentos e idéias que as palavras não conseguem e
conduzindo a vida através da auto-expressão. Apesar de ser aceita como uma forma de
tratamento e de auto-conhecimento, transformação de emoções, e crescimento pessoal, a
arteterapia não tem sido amplamente reconhecida e ainda é mal compreendida.
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5.3 Dúvidas
Muitas pessoas ainda confundem o que justamente significa Arteterapia. Embora ela
tenha sido cunhada para descrever o uso da arte como forma terapêutica, ela freqüentemente
sofre associações impróprias. Através dos anos. Existem algumas impressões interessantes
sobre o que a arteterapia representa, algumas delas muito engraçadas. Certa vez perguntaram
se arteterapia é dirigida apenas para artistas doentes ou com distúrbios, necessitando de algum
tratamento especial para curarem suas depressões, ansiedades ou bloqueios criativos.
Existem ainda os que perguntam se a arteterapia pode ajudar a melhorar alguém a
desenhar ou pintar. Outra pessoas interrogam se o arte terapeuta trabalha com pintores ou
escultores que tenham problemas. Aparentemente ele pensou que a arteterapia poderia ajudar
a melhorar as pinturas ou esculturas mal feitas. É fácil entender que o termo Arteterapia pode
provocar confusões à primeira vista, principalmente para aqueles que jamais tiveram qualquer
experiência com o processo.
Existem várias razões porque a Arteterapia não é facilmente entendida. Em primeiro
lugar, arteterapia é praticada com uma ampla gama de pessoas. O uso da arteterapia tem sido
documentada por uma variedade de pessoas incluindo crianças, adolescentes, adultos e idosos;
pessoas viciadas, indivíduos em fases terminais, veteranos de guerra, vivências familiares
difíceis, prisioneiros, e experiências individuais com um amplo espectro de distúrbios
emocionais. A arteterapia tem sido usada, ainda, com crianças traumatizadas que tenham
sofrido algum abuso, com famílias problemáticas para explorar seus problemas ou com
desavenças de adultos em creches.
Com auxílio da arteterapia, uma psicóloga pode sugerir que seus pacientes façam um
desenho ou expressem seus sentimentos a fim de ajudar pessoas com síndrome de pânico ou
outros sintomas. Artistas trabalham com paraplégicos, ajudando-os a pintarem, e terapeutas
criam estúdios para auxiliar adultos com distúrbios. Existem ainda a arteterapia voltada para
escolas, com crianças lendo ou resolvendo problemas. Outros trabalham em centros médicos
da comunidade com crianças e adultos com câncer. Este são alguns dos exemplos que
demonstram o campo diversificado de atuação dos arte terapeutas.
Outras razões porque muitas pessoas cometem confusão sobre arteterapia tem a ver
com a experiência que tiveram com a arte. A arteterapia é uma terapia dinâmica que exige que
a própria pessoa participe do tratamento e, no caso, fazendo arte. Portanto, para se entender
realmente o que ver a ser arteterapia requer, em primeiro lugar, uma experiência com ela. O
25
arte terapeuta precisa passar e por um análise em arteterapia. Só assim entende o significado
real do seu trabalho com outras pessoas.
5.4 Arte + Terapia
Quando se pergunta a um arte terapeuta o que ele faz, muitos são os exemplos. Em
parte porque a arteterapia é praticada com uma variedade da população. Para aumentar ainda
mais o problema, alguns profissionais do campo discordam sobre a definição de arteterapia.
Isto porque existem muitas definições e só a partir da prática e da realização de encontros
entre profissionais da área, poderá ir se delineando uma definição que, no entanto, jamais
poderá ser estática visto que, fazer arte, é um processo dinâmico onde novas formas de
expressão vão surgindo. No entanto o que faz a diferença entre um trabalho de arte e de
arteterapia é a posição e intervenção do profissional e, por outro lado, o paciente estar
consciente de estar passando por um processo terapêutico, ou seja, querer entrar em terapia.
Caso contrário, trata-se apenas de lazer, hobby ou escola de arte. Essa visão o profissional de
arteterapia não pode perder de vista.
5.5 Interpretar: sim ou não?
Muitas pessoas se espantam ou perguntam a si mesmo se a arteterapia é simplesmente
a interpretação dos conteúdos das expressões artísticas. Cathy Malchiodi, no livro The Art
Therapy Sourcebook,8 conta que em certa ocasião, ela foi confrontada por outros terapeutas
que queriam saber se a partir do desenho de uma criança poderia concluir se ela havia sofrido
algum abuso ou trauma? Com certeza, imagens são formas não verbais de comunicação
contém significados escondido mas ficar interpretando seu conteúdo, sem levar em conta a
impressão do próprio criador, é correr riscos de fazer um análise errada e perder a
oportunidade da pessoa olhar para dentro se ver na própria obra. Esse encontro e as falas e
gestos que saem a partir do olhar-se na obra é a parte fundamental da ação da arteterapia.
88 MALCHIODI, Cathy. The Art Therapy Sourcebook. Los Angeles: Lowell House, 1998.
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CAPÍTULO VI
SALAS DE ARTETERAPIA - ESSÊNCIA DO CUIDADO
Tudo que existe e vive precisa ser cuidado
para continuar a existir e a viver:
uma planta, um animal, uma criança, um idoso, o planeta Terra.
Leonardo Boff
6.1 O Propósito Faz a Diferença
Alguns anos atrás existia uma frase dos arte terapeutas que afirmavam que a
arteterapia é o desenho a partir de dentro. Na opinião da terapeuta Malchiodi, esta é uma boa
definição para arteterapia e ajuda a distingui-la a partir de outras formas pela qual a arte é
usada. Embora uma sessão de arteterapia se assemelhe a uma aula de arte, o fim e o propósito
são diferentes. Por exemplo, num estúdio típico de arte podem exigir que você desenhe um
modelo, pinte um quadro sobre estilos de vida ou faça um esboço de uma caminhada pela
floresta. Eles são freqüentemente interpelados a desenhar alguma coisa que viu o trabalhar
numa interpretação com acurada proporção, sombra, cor técnica e habilidade.
Já numa sessão de arteterapia o foco é a experiência interior, o sentimento, a
percepção e a imaginação. Embora a arteterapia possa envolver habilidade e técnica, a sua
ênfase primeira é no desenvolvimento e expressão da imagem que vem do interior da pessoa,
antes do que vê do mundo exterior. Enquanto as classes de arte tradicionais pedem para
pintar ou desenhar a partir da sua imaginação, em arteterapia, sua imagem interior,
sentimentos, pensamentos e idéias são concretamente importantes e primários para a
experiência.
27
6.2 Estar Atento
Therapy é originária da palavra grega therapeia que significa “estar atento para”. Este
significado demarca a arteterapia em dois caminhos. Na maioria dos casos, um profissional
habilidoso atende individualmente. Esta orientação pessoal é a chave para o processo
terapêutico a fim de guiar a experiência individual de fazer arte na busca de seu próprio
caminho. Outro aspecto importante do atendimento é quando a própria pessoa explica o
resultado de seu trabalho, isto é, encontrando uma história, descrevendo ou explicando-a pela
própria arte. Várias terapias depende da participação ativa do paciente.
6.3 Arte + Terapia= Processo + Resultado
Embora os arte terapeutas tenham muitas definições para a arteterapia, muitos deles se
encaixam em duas categorias. A primeira envolve a crença inerente do poder de cura que o
processo criativo da arte proporciona. Esta visão abrange a idéia que o processo de fazer arte
em si é terapêutico. Fazer arte é visto como uma oportunidade para expressar o eu
imaginativo, autêntico e espontâneo; uma experiência que, na maioria das vezes, pode nos
guiar para a realização pessoal, reparação emocional e transformação.
A Segunda definição de arteterapia é baseada na idéia que arte significa uma
comunicação simbólica. Esta visão se refere a arte como arte psicoterapêutica, enfatizando o
produto do desenho, pintura e outras expressões artísticas que ajudariam na comunicação de
emoção e conflitos. A psicoterapia é essencial nesta abordagem pois a imagem artística se
transforma num instrumento significante para realçar a troca verbal entre a pessoa e o
terapeuta. Com orientação e suporte terapêutico a arte pode facilitar novos entendimentos e
compreensão. Além de ajudar a resolver conflitos, solucionar problemas e formular novas
percepções que podem guiar mudanças positivas, crescimento e saúde.
6.4 Experiências de Arteterapia nas Enfermarias Pediátricas.
A cada dia se reconhece o poder da arte no restabelecimento das pessoas internadas
por longos períodos em hospitais. Artistas, pintores, contadores de histórias, poetas e até
dançarinos fazem ocupam as enfermarias transformando a realidade e trazendo resultados
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concretos nos restabelecimento das pessoas. Embora eles não sejam arte terapeutas, no
sentido profissional da palavra, acabam agindo com tais, fortalecendo a necessidade de se
pensar nesta intervenção pela arte de uma forma efetiva e acompanhada por um profissional
da área.
Conforme exemplifica Cathy Malchiody, a Universidade da Califórnia criou o The Art
for Recovery Program, ( programa de recuperação pela arte) no Centro Médico Mount Zion
em São Francisco promovendo atividades artísticas e outras experiências criativas para
pacientes com câncer e AIDS. O propósito do programa é o de encorajar o pacientes a usar a
arte para expressar como estão seus sentimentos neste momento crítico de suas vidas.
Há três anos o Hospital da Lagoa, no Jardim Botânico, estabeleceu convênio com o
curso de teatro da Universidade UniRio, criando o projeto “ O Hospital Como Espaço
Cênico”. Atores ajudavam os pacientes a falarem e interpretarem seu momento atual,
promovendo depois debates e fazendo com que o paciente criasse forças para enfrentar esse
difícil período de sua vida. De acordo com a equipe médica, os pacientes que passavam sob
esse processo sofriam mudanças consideráveis e, de certa forma, tinham uma recuperação
mais rápida do que os outros que se negavam a “brincar com a doença.
Essa mesma experiência positiva podia ser vista na sala de recreação mantida pela
Organização Não Governamental (ONG) Renascer, na enfermaria pediátrica do Hospital da
Lagoa. Segundo depoimento das próprias mães, quando a sala de recreação era aberta podia
se ver um brilho diferente no olhar das crianças. A perspectiva de poder ir brincar, desenhar,
ouvir histórias e, principalmente, sair da enfermaria fazia a criança deslocar sua atenção para
a saúde. No Hospital Jesus, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, antes de uma criança sofrer
uma intervenção cirúrgica ela faz uma espécie de dramatização e acaba podendo externar seus
medos.
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CONCLUSÃO
Fazer da interpretação um caminho novo,
da queda um passo de dança,
do medo uma escada,
do sonho uma ponte,
da procura um encontro.
Fernando Sabino
Equipes de psicólogos e médicos defendem a criação da arteterapia como auxiliar no
tratamento da criança. Organizações Não Governamentais como os “Doutores da Alegria” e
tantas outras que transformam o hospital num ambiente mais alegre acabam fazendo o papel
de arte terapeutas. Mas é preciso ir mais longe. Pois essas iniciativas são esporádicas e nem
sempre o roteiro de suas visitas são agendados de forma permanente. É necessário que as
autoridades de saúde incorporem a arteterapia nos hospitais. As Unidades que contam com a
arte, como acontece com Instituto do Câncer, no Rio de Janeiro, e muitos hospitais
americanos, já comprovaram os efeitos positivos da arteterapia.
Muitas universidades brasileiras, como é o caso da Universidade Cândido Mendes,
estão colaborando com esse processo, criando cursos de formação em Arteterapia. Esse ato é
fundamental para a expansão desta atividade. Confusões a respeito da prática serão
dissolvidas na medida que mais profissionais se formarem e houver mais divulgação. No
entanto, não existe caminho sem o primeiro passo e com “força e com coragem” a arteterapia
irá se espalhar e colaborar para um mundo mais imaginativo, construído com nossos sonhos.
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ZOHAR, Danah. O ser Quântico. São Paulo: Best Seller, 1990.
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ANEXOS
ANEXO I Ficha de Acompanhamento de Estágio
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ANEXO II – Ficha de Programa Cultural
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