UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURIDICAS APLICADAS
CURSO DE PSICOLOGIA
MARCELLA QUADROS MORETTI
CAMILLE CLAUDEL: A ARTE COMO EXPRESSÃO DO INCONSCIENTE
SANTOS 2008
MARCELLA QUADROS MORETTI
CAMILLE CLAUDEL: A ARTE COMO EXPRESSÃO DO INCONSCIENTE
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Católica de Santos como exigência parcial para a obtenção do título de Psicólogo. Orientador: Professor Doutor Helio Alves.
SANTOS 2008
MARCELLA QUADROS MORETTI
CAMILLE CLAUDEL: A ARTE COMO EXPRESSÃO DO INCONSCIENTE
Banca Examinadora
Professor Dr. Helio Alves (Orientador)
___________________________________________________________________Professor
a Ms. Iara Cândida Chalela Genovese (Examinadora)
Professora responsável pela coordenação do TCC – Psicologia
Doutora Daisy Inocência Margarida Lemos.
SANTOS
2008
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter me abençoado com a realização deste sonho tão precioso de
ser Psicóloga e por ter iluminado a minha mente e sensibilidade para a realização do presente
trabalho.
Ao meus grandes e eternos amores: meu pai Túlio e à minha avó Helena (in
memorium), por todos os valores que, em vida, ensinaram para mim, como o valor do amor,
da abnegação, do respeito e da dedicação ao próximo. Este trabalho eu dedico a vocês, que
com certeza estão no plano astral comemorando a realização deste sonho tão importante para
nós.
À minha mãe Rosa, meu porto-seguro e heroína. Absolutamente tudo que tenho e sou
de melhor, devo a você que é meu maior motivo de orgulho, admiração, inspiração e amor.
Obrigada por ser meu maior exemplo de vida, força, determinação e coragem.
À minha irmã Juliana, a pessoa de melhor índole que conheço. Com você aprendo
diariamente o significado da generosidade, da amizade, do desprendimento e do amor
incondicional. Com a alegria e espontaneidade de uma criança, nos ensina a verdadeira arte de
viver com sabedoria. Agradeço à Deus por ter abençoado nossa família com uma alma tão
evoluída como a sua. Você é um presente valioso para todos nós.
Ao meu namorado Bruno, minha alma gêmea, por todo carinho, amor e
companheirismo. Obrigada por fazer de cada segundo um momento de sublime
felicidade e por ser a razão de minha inspiração diária. Nosso amor me enobrece como ser
humano e me traz força para lutar pelos nossos sonhos.
Ao meu orientador e mestre Doutor Helio Alves, por ser minha melhor referência de
profissional. Obrigada pelo carinho, paciência, ensinamentos e dedicação ao longo destes
últimos cinco anos. Devo grande parte do que aprendi a você, pois acredito que existe uma
diferença entre professores e mestres. Penso que muitos podem ser professores, reprodutores
do conhecimento. Mas poucos são mestres, aqueles que já adquiriram experiência e possuem
sensibilidade para
simplificar o complexo, sem precisar ostentar a insegura postura do detentor do saber. O
mestre não é apenas inteligente, é sábio.
A inteligência sem sabedoria torna-se apenas um acervo bibliográfico sem acesso.
Por isto Helio, não o considero meu professor, mas sim, meu mestre.
Este mesmo título atribuo à minha examinadora e mestre Iara Chalela. Jamais
esquecerei do apoio que você me deu ao longo destes cinco anos e por sempre ter acreditado
em meu potencial. Obrigada por ser uma maravilhosa referência de profissional e ser humano
para mim. Tenho profunda admiração pela pessoa carismática, alegre, maternal e sensível que
você é.
À mestre Edna Alves, minha doce supervisora de Psicologia Clínica. Obrigada por ter
me ensinado a ouvir o não dito. Sinto imensa admiração pela pessoa iluminada que você é e
serei eternamente grata pelo carinho, dedicação e confiança que depositou em mim. Você
sempre será, para mim, um exemplo de profissional, devido sua sensibilidade e ética.
À todos que fazem da arte sua própria vida e principalmente àqueles que fazem da
vida uma verdadeira obra de arte.
À vocês, todo meu amor e devoção.
DEDICATÓRIA
Ao meu pai Túlio e à minha avó Helena por terem me ensinado a bela e
nobre arte de amar incondicionalmente. (In memorium)
Camille Claudel: “A Idade Madura” (1898)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................04
CAPÍTULO 1 - CAMILLE CLAUDEL E O INCONSCIENTE........................................05
1.1Biografia de Camille Claudel....................................................................................05
1.2. Cronologia..............................................................................................................07
1.3. Definição de inconsciente......................................................................................13
1.4. Inconsciente............................................................................................................13
CAPÍTULO 2 - PSICANÁLISE...........................................................................................15
2.1. Definição de psicanálise.........................................................................................15
2.1.2. Método da psicanálise.............................................................................15
CAPÍTULO 3 –CIÚME E INVEJA......................................................................................17
3.1.Definição de inveja..................................................................................................17
3.2. Definição de ciúme.................................................................................................17
3.3. Considerações sobre ciúme e inveja.......................................................................17
3.4. Auto-inveja.............................................................................................................22
CAPÍTULO 4 –OBJETO E OBJETIVO DA PESQUISA..................................................25
4.1.Objeto da pesquisa..................................................................................................25
4.2.Objetivo da pesquisa...............................................................................................25
CAPÍTULO 5 – METODOLOGIA.......................................................................................26
5.1. Delineamento da pesquisa......................................................................................26
5.2. Procedimento..........................................................................................................26
5.3. Instrumento.............................................................................................................26
ANÁLISE DA BIOGRAFIA DE CAMILLE CLAUDEL CONFORME A
PSICANÁLISE........................................................................................................................27
CAPÍTULO 6- ANÁLISE DA OBRA DE ARTE “A IDADE MADURA” .....................29
CAPÍTULO 8 – CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................32
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................36
ANEXOS..................................................................................................................................38
RESUMO
MORETTI, Marcella Quadros. Camille Claudel: A arte como expressão do inconsciente. Santos, 2008. 41p. Trabalho de Conclusão de Curso de Psicologia – Universidade Católica de Santos. O presente trabalho tem como objetivo identificar e analisar a influência da inveja e do ciúme
na vida e obra de Camille Claudel, tendo como objeto de estudo a biografia da artista e sua
obra de arte: “A Idade Madura” (1898). A Psicanálise foi a abordagem utilizada pela autora
para a realização do presente trabalho. A pesquisa, de acordo com Gil (2002), foi
bibliográfica, pois foi desenvolvida com base em material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científicos. Utilizou-se a técnica de estudo de caso, pois foi
explicada a relação entre variáveis causais que através de outros tipos de pesquisa como
levantamentos e experimentos, não possibilitariam esta explicação; na qual se fez uso de um
objeto de estudo. Fez-se uso deste método, pautado na biografia de Camille Claudel e sua
obra de arte “A Idade Madura”, em decorrência de acreditar-se na relação entre a arte e a
expressão do inconsciente. Inicialmente foi realizada a leitura da biografia de Camille Claudel
e analisou-se a mesma. O mesmo procedimento foi feito com sua obra de arte “A Idade
Madura” (1898). Concluiu-se o presente trabalho identificando e analisando a influência da
inveja e do ciúme na vida e obra de Camille Claudel, segundo preconizou Melanie Klein.
Palavras-chave: Psicanálise; Camille Claudel; Auto-inveja; Ciúme; “A Idade Madura” (1898)
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho é um projeto para obtenção da graduação no curso de Psicologia,
referente ao Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas, da Universidade Católica de
Santos.
A arte e a ciência requerem uma invenção de novos conceitos, idéias e novos
caminhos de percepção. Ambas dependem da mesma sensibilidade emocional e física a
padrões, ritmos, consistência, novidade, metáfora e analogia. Necessitam um refinado uso
dos sentidos em conjunção com a mente e as mãos.
Considerando-se o acima explicitado, o presente trabalho foi elaborado visando
identificar e analisar a influência da inveja e do ciúme na vida e obra de Camille Claudel.
Utilizando-se como recurso, o estudo de sua biografia e de sua obra de arte “A Idade Madura”
(1898), as quais foram correlacionadas aos fundamentos psicanalíticos de Freud, Melanie
Klein e Winnicott.
O primeiro capítulo contemplou a vida e obra de Camille Claudel e conceitos sobre o
inconsciente, visando familiarizar o leitor a respeito do objeto de estudo do presente trabalho,
possibilitando uma melhor compreensão do mesmo.
O segundo capítulo procurou conceituar a Psicanálise, abordagem utilizada pela
autora, para a realização do trabalho.
No terceiro capítulo, fizeram-se considerações sobre a inveja e o ciúme, segundo o
olhar Kleiniano, visando à compreensão destes conceitos e a identificação da influência dos
mesmos na vida e obra de Camille Claudel.
O quarto e quinto capítulo abordaram o objeto e objetivo do trabalho, além da
metodologia utilizada para realizá-lo.
O sexto capítulo foi composto pela análise da vida e obra de Camille Claudel, segundo
a visão Winnicottiana, onde se visou analisar como Camille Claudel buscou a construção de si
própria em suas manifestações artísticas, ao mesmo tempo em que se colocava à admiração do
espectador, numa tentativa de se constituir através do olhar do outro.
O sétimo capítulo referiu-se à análise da obra de arte “A Idade Madura” (1898), pois
esta serviu de recurso para a realização do objetivo do presente trabalho.
O oitavo capítulo apresentou as considerações finais acerca de tudo o que foi estudado.
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CAPÍTULO 1 – CAMILLE CLAUDEL E O INCONSCIENTE
1.1. Biografia de Camille Claudel
Segundo Büel (2007), Camille Claudel nasceu em 8 de dezembro de 1864 na pequena
cidade de Aisne chamada Fères-en-Tardenois e cresceu na aldeia de Villeneuve-sur-Fère,
território de Champagne, ambos na França.
Ainda para o autor, os pais de Camille, Louis-Prosper Claudel e Louise-Athanaïse
Claudel, tiveram quatro filhos, mas somente três sobreviveram, duas mulheres e um homem.
A irmã mais nova, Louise, era a preferida dos pais. Camille, já com veia artística, criou com o
irmão Paul uma cumplicidade. Paul, quatro anos mais jovem viria a ser no futuro poeta e
dramaturgo.
O pai de Camille, maravilhado com o precoce talento da filha que, ainda criança,
produziu esculturas de ossos e esqueletos com impressionante verossimilhança, oferta-lhe
todos os meios de desenvolver suas potencialidades. Sua mãe, por outro lado, não vê com
bons olhos, colocando-se sempre contra a todo aquele empreendimento, reagindo muitas
vezes violentamente no sentido de reprovar a filha que traz incômodos e custos excessivos
para a manutenção de seu “capricho”.
A vida da inigualável Camille Claudel foi sempre palco de especulações no final do
século XIX e a razão disso se deveu à sua relação amorosa com seu professor, mentor
intelectual e amante - o também inigualável escultor do século XIX Auguste Rodin. Esse
relacionamento tremendamente tumultuado virou nas mãos de um dos gênios da literatura,
Henrik Ibsen, a peça "When We Dead Awaken". O drama pessoal entre Camille Claudel e
Rodin serviu, também, para ofuscar o brilho de Camille como artista.
Dotada de enorme talento que pode ser claramente visto em seu trabalho, desde jovem
Camile demonstrava maestria na utilização do barro e o fazia com destemido instinto. Ela
preferia a sensação de tocar o material à de desenhar. Quando a família de Camille mudou-se
do bairro onde moravam para o bairro "Nogent-sur-Seine" passaram a ser praticamente
vizinhos de Alfred Boucher, importante escultor do século XIX. O pai de Camille levou seus
trabalhos para a apreciação de Boucher que, impressionado com o talento da jovem, levou
esses trabalhos para a apreciação de outro famoso escultor Paul Dubois. Após a aprovação
desses dois gênios da escultura foi fácil para Camille entrar para a "Académie Colarossi" uma
das raras academias abertas também para mulheres.
Em seguida, juntou-se a um grupo de três outras escultoras e começaram a ter aulas
informais com Boucher que visitava o estúdio das "moças" uma vez por semana. Quando em
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1883 Boucher mudou-se para a Itália, Rodin assumiu a responsabilidade perante os estudantes
de Boucher. O deslumbramento pelo enorme e precoce talento da artista e os encontros
sucessivos entre Rodin, 43 anos e Camille, 19 anos, levou-os a uma relação que durou quinze
anos, relacionamento que influenciou toda a técnica utilizada por Camille em seus trabalhos
até então. Naquela época, a talentosa Camille tentou existir num mundo que ainda não era
feito para mulheres.
O período em que ela ficou no estúdio de Rodin como sua assistente foi considerado o
mais produtivo da vida do famoso escultor e para Camille, a pior fase para a sua afirmação
como escultora, independente dele. Sua vida e seu trabalho ficaram, sem dúvida, ligados ao
gênio Rodin o que virou uma trágica história de criação, amor e loucura. Para Rodin, Camille
foi modelo, assistente, amante e rival. O domínio da juventude e beleza de Camille sobre
Rodin levou-o a prometer-lhe casamento em 1884.
Quando Camille esculpiu o busto de Rodin, ela o fez rude e forte. Rodin modelava
Camille raramente como uma vencedora (escultura A França). A obra mais famosa de
Camille, A Valsa (1892), marca o coroamento da relação de ambos e da sua realização como
escultora. Na época em que foi influenciada pela arte japonesa Camille esculpiu em mármore
e ônix, As bisbilhoteiras (1894). Quando Camille, em 1884, assistiu Rodin em Calais seu
trabalho sofreu significativas alterações. Suas esculturas iniciais refletiam esplendorosa
tradição da Academia Francesa em especial na leveza e nas formas das faces, como em sua
escultura "Giganti", de 1885, que demonstra uma superfície natural que utiliza os reflexos da
luz para distinguir os diversos planos da face. Em seu trabalho "Young Girl with a Sheaf"
(1890) que poderia ser traduzido como "Uma jovem com um feixe de trigo" Camille mostra
uma jovem debruçada sobre um feixe de trigo e utiliza sua técnica particular para mostrar a
dócil e lisa face da jovem contraposta com a textura de um fundo rude ou grotesco.
A vida de Camille foi marcada por paixão, sofrimento, revolta e trabalho.
O romance com Rodin terminou em 1898, mas Camille continuou a esculpir. Longe
dele começou a ter problemas financeiros e a demonstrar sinais de distúrbios mentais. Em
1906, ela destrói grande parte de seu próprio trabalho sendo internada em um hospital para
doentes mentais. Do hospital Camille mantinha correspondência com sua família e seus
amigos. Nessas correspondências, às vezes, Camille pedia à sua mãe que lhe mandasse alguns
itens como chá, açúcar em cubinhos e, repetindo as palavras da própria Camille, “... café
brasileiro porque é de excelente qualidade...". Com seu irmão Paul, a intensidade das cartas
chegou ao nível do emocionante.
Paul, em seus escritos sobre a irmã, descreve o trabalho da artista:
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Da mesma forma que um homem, no campo, se serve de uma árvore ou de um rochedo ao qual seus olhos se prendem, a fim de acompanhá-lo em sua meditação, uma obra de Camille Claudel no meio do apartamento existe unicamente através de suas formas, assim como essas curiosas rochas colecionadas pelos chineses, como um tipo de monumento do pensamento interior, o tufo de um tema proposto a todos os sonhos. Ao passo que um livro, por exemplo, somos obrigados a ir buscá-lo nas prateleiras de nosso armário, uma música, a tocá-la, ao contrário, a peça trabalhada, de metal, ou de pedra, exala de si mesma seu encantamento, e a casa inteira é por ela penetrada.
Seu pai, umas das referências de segurança e afeto de Camille, morre em 3 de março
de 1913.
A eclosão da Primeira Guerra Mundial levou-a a ser transferida para Villeneuve-lès-
Avignon, onde Camille Claudel passou os últimos trinta anos de sua vida e lá morreu, em
1943, sem nunca ter recebido a visita de sua mãe.
1.2.Cronologia
1864
8 de dezembro: nascimento de Camille Claudel, filha de Louis-Prosper Claudel e Louise-
Athanaïse Cerveaux, em Fère-en-Tardenois (Picardia).
1866
2 de fevereiro: nascimento da irmã, Louise.
1868
6 de agosto: nascimento do irmão, Paul, no presbitério de Villeneuve-sur-Fère (Picardia).
1869
Morte do cura Nicolas Cerveaux, tio de Camille. Os Claudel deixam o antigo presbitério e
instalam-se na casa em frente, construída pelo cura.
1876-79
Louis-Prosper é nomeado conservador de hipotecas em Nogent-sur-Seine (Aube).
Camille encontra o escultor Alfred Boucher.
Modela suas primeiras figuras em barro : Davi e Golias, Bismarck e Napoleão.
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1879-81
Louis-Proper é nomeado em Wassy-sur-Blaise (Haute Marne).
1881
Louise-Athanaïse e os filhos instalam-se em Paris, no número 135 bis do boulevard du
Montparnasse. Paul é matriculado no Liceu Louis-le-Grand. Camille faz cursos na Academia
Colarossi (hoje não mais existente), no número 10 da rue de la Grande Chaumière.
Busto de Paul Claudel aos 13 anos.
1882
A família muda-se para o número 111 da rue Notre-Dame-des-Champs.
Camille aluga um ateliê, no número 117 da rue Notre-Dame-des-Champs, com amigas
inglesas, dentre as quais Jessie Lipscomb.
Camille é apresentada a Paul Dubois, diretor da Escola Nacional de Belas-Artes, por Alfred
Boucher.
A Velha Helena, em gesso, é exposta na Sociedade Nacional de Artistas Franceses.
1883
Alfred Boucher parte para a Itália e Rodin passa a dar aulas a Camille e suas amigas.
Expõe na Sociedade Nacional de Artistas Franceses.
1884
Camille entra no ateliê de Rodin, como modelo e aprendiz.
Torso de mulher em pé
Jovem Romano ou Paul Claudel aos 16 anos
1885
A família Claudel instala-se no número 31 do boulevard de Port-Royal.
Mulher Agachada
Mulher de olhos fechados
Cabeça de Escravo
Estudo para um Burguês de Calais
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Gigante
Exposição na Sociedade Nacional de Artistas Franceses.
1886
Setembro: viagem com Jessie Lipscomb e o irmão Paul à l’île de Wight. Traz desenhos.
Encontra Florence Jeans de quem pinta um retrato, em Shankli.
Expõe no Nottingham Castle com a amiga.
Começa a trabalhar na obra Sakountala.
25 de dezembro: conversão de Paul Claudel ao catolicismo na Notre-Dame de Paris.
O Beijo.
1888
Rodin aluga, para trabalhar com Camille, a Folie-Neubourg, velha residência arruinada, no
número 68 do boulevard d’Italie.
Sakountala (gesso) recebe uma menção honrosa na Sociedade Nacional dos Artistas
Franceses.
1889
Participa da Exposição Universal.
Busto de Auguste Rodin (gesso).
1890
Estada com Rodin no Château de l’Islette.
1892
Realiza A Valsa com planejamento.
Aluga um apartamento no número 11 da avenue de la Bourdonnais.
Segunda estada em l’Islette.
Busto de Rodin (bronze).
1893
Torna-se sócia da Sociedade Nacional de Belas Artes.
Diversos gessos de A Valsa.
Torso de Cloto Calva.
A Pequena Castelã (gesso)
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A Aurora (gesso)
A Valsa com panejamento (bronze).
1894
As Bisbilhoteiras (gesso)
Cabeça de Velha (gesso)
1895
O Estado encomenda A Idade Madura.
Encomenda de Cloto, em mármore, para o banquete em homenagem a Puvis de Chavannes,
em 16 de janeiro.
Estudo para A Hamadríade.
1896
Encontro com Marthias Morhardt, redator do jornal Le Temps.
Expõe As Bisbilhoteiras (gesso), no museu Rath de Genebra.
A Pequena Castelã (mármore)
1897
Exposição no Hôtel de Samuel Bing, na rue de Provence.
A Hamadríade (mármore e bronze)
Cloto (mármore)
A Onda (gesso).
1898
Rodin abandona definitivamente a Folie-Neubourg.
Rompimento com Rodin. Camille aluga um ateliê no número 63 da rue de Turenne.
Demite-se da Sociedade Nacional de Belas Artes.
O Pensamento Profundo (bronze e ônix)
A Idade Madura (segunda versão, em gesso)
A Suplicante (bronze)
Março: Mathias Morhard publica no Mercure de France, Mlle Camille Claudel, primeiro
artigo consagrando a artista.
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1899
Janeiro: instala-se no número 19 do quai Bourbon.
1900
Apresenta três obras na Exposição Universal:
O Pensamento Profundo (mármore), Sonho ao Pé da Lareira (gesso), e A Hamadríade.
Encontra Eugène que virá a ser seu fundidor e amigo.
A Onda (ônix)
1905
Agosto: Paul Claudel escreve Camille Claudel Statuaire (publicado em L'Occident).
Paul Claudel escreve Rodin ou l'homme de génie (permanece inédito até a publicação do
tomo XVIII das Oeuvres Complètes).
Esculpe Paul Claudel aos 37 anos (gesso).
1906
15 de março: casamento de Paul Claudel e partida para a China.
Primeiras manifestações da doença mental.
Isola-se e destrói várias obras.
1907
Fevereiro: aquisição pelo Estado de O Abandono.
Encomenda pelo Estado de A Níobe Ferida.
Visita de Judith Claudel que pretende redigir um artigo no jornal La Fronde. Camille não
aceita.
1910
Participa da Exposição das Mulheres Pintoras e Escultoras, no Grand Palais.
1913
2 de março: falecimento de Louis-Prosper Claudel em Villeneuve-sur-Frère.
10 de março: o pedido de internamento voluntário de Camille, pela mãe, é aceito pelo
Hospital Psiquiátrico de Ville-Evrard.
16 de abril: conselho de família.
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Julho: aparição de um artigo de Paul Claudel sobre a irmã, na revista L'Art Décoratif.
1914
Junho: Morhardt escreve a Rodin sugerindo reservar uma sala do Hôtel Biron à obra de
Camille Claudel. Rodin concorda.
Agosto : Camille é transferida para Enghien e depois para Montdevergues (Vaucluse).
1915
Visita de Paul à irmã.
1917
17 de novembro: morte de Auguste Rodin.
1920
Visita de Paul Claudel à irmã.
Uma carta do médico constata a nítida melhora de Camille e sugere que volte para junto dos
seus.
A mãe recusa categoricamente: “(…) Não se pode colocar os paranóicos em liberdade sem
que isso represente um grande perigo, pois ao se encontrarem em seu meio, retomam
rapidamente as idéias...”
1921 a 1933
Durante esse período, os relatórios médicos falam da mania de perseguição da paciente. Paul
Claudel visita a irmã todos os anos.
Em 1924 e mais tarde, em 1929, Jessie Lipscomb visita a velha amiga.
1942
24 de fevereiro: Paul Claudel é nomeado tutor e administrador dos bens da irmã.
11 de agosto: os médicos notam um abatimento físico e intelectual.
1943
19 de outubro: Camille Claudel falece longe dos seus.
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1951
Grande retrospectiva de Camille Claudel no Museu Rodin.
Paul Claudel redige o prefácio do catálogo da exposição, sob o título de À minha irmã
Camille.
1.3. Definição de inconsciente
De acordo com Hermann (1995) o inconsciente é “o lugar teórico das representações
recalcadas ou daqueles que nunca puderam chegar à consciência, das pulsões sem
representação consciente”.(p. 36).
Para Laplanche (1992), o inconsciente “representa o conjunto de conteúdos não
presentes no campo atual da consciência”. (p. 306).
1.4. Inconsciente Conforme Laplanche (1992), o inconsciente, no sentido tópico:
Designa um dos sistemas definidos por Freud no quadro de sua promeira teoria do aparelho psíquico: é constituído por conteúdos recalcados aos quais foi recusado o acesso ao pré-consciente-consciente, pela ação do recalcamento (recalcamento primitivo e recalcamento posterior). (p.306).
Ainda para o autor (1992):
O inconsciente freudiano é, em primeiro lugar, indissoluvelmente uma noção tópica e dinâmica, que brotou da experiência do tratamento. Este mostrou que o psiquismo não é redutível ao consciente e que certos conteúdos só se tornam acessíveis à consciência depois de superadas certas resistências; revelou que a vida psíquica estava inteiramente cheia de pensamentos eficientes embora inconscientes, e que era destes que emanavam os sintomas. Levou a supor a existência de grupos psíquicos separados e, mais geralmente, a admitir o inconsciente como um lugar psíquico especial que deve ser concebido, não como uma segunda consciência, mas como um sistema que possui conteúdos, mecanismos e talvez uma energia específica. (p.307).
Segundo Laplanche (1992), “as representações inconscientes são dispostas em
fantasmas e histórias imaginárias em que a pulsão se fixa e que podemos conceber como
verdadeiras encenações do desejo”. (p.307).
Em relação às manifestações do inconsciente, Freud (1972), argumenta sobre o ato
sintomático:
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Dou o nome de atos sintomáticos àqueles atos que as pessoas executam, como dizemos, automaticamente, inconscientemente, sem prestar-lhes atenção, ou num momento de distração. São ações às quais as pessoas gostariam de negar qualquer significação, e os quais, se inquiridas acerca dos mesmos, explicariam como sendo indiferentes e acidentais. (p.74).
Para Freud (1972), “uma observação mais atenta, contudo, mostrará que essas ações,
sobre as quais a consciência nada sabe ou deseja saber, de fato dão expressão a pensamentos e
impulsos inconscientes que não puderam vir à tona”. (p.74).
Brenner (1969), sob o enfoque freudiano, diz que:
Os fenômenos mentais inconscientes poderiam ser divididos em dois grupos: o primeiro compreendia pensamentos e lembranças, que podiam facilmente se tornar conscientes por um esforço de atenção. Tais elementos psíquicos têm acesso fácil à consciência e Freud os chamou de “pré-conscientes”. (p.8).
O grupo mais interessante dos fenômenos inconscientes, no entanto, compreendia
aqueles elementos psíquicos que podiam se tornar conscientes a custo de considerável
esforço. Em outras palavras, eles eram barrados da consciência por uma força considerável
que tinha de ser superada antes que eles pudessem tornar-se conscientes.
De acordo com Brenner (1969), ainda não temos um meio de observar diretamente as
atividades mentais inconscientes. Podemos apenas examinar seus efeitos enquanto expressos
nos pensamentos e sentimentos do paciente. (p.9).
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CAPÍTULO 2 – PSICANÁLISE
2.1. Definição de psicanálise
Hermann (1995), pontua que:
O termo “psicanálise” tem três sentidos: é o método interpretativo, mas significa também uma forma de tratamento psicológico (ou psicoterapia analítica) e igualmente é o nome do conhecimento que o método produz (ou teoria psicanalítica). (p.14).
Para Brenner (1969), a psicanálise:
É uma disciplina científica instituída por Sigmund Freud há cerca de sessenta anos. Como qualquer outra doutrina científica, deu origem a certas teorias que se derivam de seus dados de observação e que procuram ordenar e explicar esses dados. Aquilo que chamamos de teoria psicanalítica é, portanto, um corpo de hipóteses a respeito do funcionamento e do desenvolvimento da mente do homem. (p.1).
Conforme Laplanche (1992), as definições de psicanálise são:
Um método de investigação que consiste essencialmente na evidenciação do significado inconsciente das palavras, das ações e das produções imaginárias (sonhos, fantasmas, delírios) de um indivíduo. Este método baseia-se principalmente nas associações livres do indivíduo, que são a garantia da validade da interpretação. A interpretação psicanalítica pode estender-se a produções humanas para as quais não se dispõe de associações livres. (p.495). Um método psicoterápico baseado nesta investigação e especificado pela interpretação controlada da resistência, da transferência e do desejo. Com este sentido se relaciona o uso da psicanálise como sinônimo de tratamento psicanalítico: exemplo: começar uma psicanálise (ou uma análise). (p.495). Um conjunto de teorias psicológicas e psicopatológicas em que são sistematizados os dados introduzidos pelo método psicanalítico de investigação e de tratamento. (p.495).
2.1.2. Método da psicanálise
De acordo com Hermann (1995), fazer análise é uma espécie de falta de educação
sistemática.
Hermann (1995) pontua:
Atrás do paciente, você estará calado, procurando juntar os pedaços da conversa, sem se deter no que, de hábito, significaria mudança de assunto. Ao contrário, prestará a máxima atenção às mudanças de assuntos, perguntando-se: “Se se trata de um só assunto, qual é ele e que se diz agora a respeito?”. Em outras palavras, você eliminou uma
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referência consensual importantíssima, aquela que afirma que cada dito tem de ser entendido no assunto a que o interlocutor se pretende ater. (p. 17).
Costuma-se crer que a interpretação psicanalítica mostra ao paciente um tipo especial
de sentido, através de suas associações, das idéias que nos comunica: os remanescentes da
sexualidade infantil, os processos de recalcamento e outros conteúdos semelhantes.
(Hermann, 1995)
Conforme Brenner (1969):
É verdade que a prática da psicanálise consiste no tratamento de pessoas que se acham mentalmente enfermas ou perturbadas, mas as teorias psicanalíticas se referem tanto ao normal quanto ao anormal, ainda que se tenham derivado essencialmente do estudo e do tratamento da anormalidade. (p.1).
Para Laplanche (1992), chamamos de psicanálise, o trabalho pelo qual levamos à
consciência do doente, o psíquico recalcado nele.
O autor ainda pontua que o termo psicanálise consagrou o abandono da catarse sob
hipnose e da sugestão, além do recurso exclusivo à regra da associação livre para obter o
material.
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CAPÍTULO 3 – CIÚME E INVEJA
3.1. Definição de inveja
De acordo com o dicionário Aurélio (1993), a inveja é:
Desgosto ou pesar pelo bem ou felicidade de outrem. Desejo violento de possuir o bem alheio. Objeto da inveja. (p.315)
3.2. Definição de ciúme Segundo Segal (1975), o ciúme:
Baseia-se no amor e visa à posse do objeto amado e à remoção do rival. Pertence a uma relação triangular e, portanto, a um período da vida em que os objetos são claramente reconhecidos e diferenciados um dos outros. (p.52)
3.3. Considerações sobre ciúme e inveja Para Segal (1975), a inveja é uma relação de duas partes, na qual o sujeito inveja o
objeto por alguma posse ou qualidade; nenhum outro objeto vivo precisa entrar nessa relação.
Ainda segundo a autora (1975), a inveja:
Visa a que se seja tão bom quanto o objeto; mas, quando isto é sentido como impossível, visa a danificar a bondade do objeto, para remover a fonte de sentimentos invejosos. É esse aspecto danificador da inveja, que é tão destrutivo para o desenvolvimento, visto que a própria fonte de bondade da qual o bebê depende é tornada má e, portanto, introjeções boas não podem ser alcançadas. A inveja, embora surgindo a partir do amor e admiração primitivos, tem um componente libidinal menos forte do que a voracidade, e é impregnada de instinto de morte. (p.52)
Segal (1975), pontua que:
A inveja opera também por projeção, e freqüente e principalmente por esse meio. Quando se sente cheio de ansiedade e maldade, e o seio como sendo a fonte de toda bondade, o bebê, em sua inveja, deseja danificar o seio, projetando nele suas próprias partes más e danificadoras; assim, em fantasia, ataca o seio cuspindo, urinando, defecando, soltando flatos, e pelo olhar projetivo e penetrante (o mau-olhado). (p.53)
A inveja, porém, não se limita a esgotar o objeto externo. O próprio alimento que foi
recebido, na medida em que é percebido como tendo sido parte do seio, é em si mesmo objeto
de ataques invejosos, que se voltam também para o objeto interno.
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Quando a inveja primária é muito intensa, interfere na ação normal dos mecanismos
esquizóides.
Para Segal (1975):
O processo de divisão (splitting) em um objeto ideal e outro perseguidor, tão importante na posição esquizo-paranóide, não pode ser mantido, tendo-se em vista que é o objeto ideal que dá origem à inveja e que é atacado e danificado. Isso conduz a confusão entre o bom e o mau, interferindo na divisão (splitting). Como esta não pode ser mantida e como um objeto ideal não pode ser preservado, ocorre uma grave interferência na introjeção de um objeto ideal e na identificação com este. Com isto, o desenvolvimento do ego tem, necessariamente, de sofrer. Fortes sentimentos de inveja conduzem ao desespero. Um objeto ideal não pode ser encontrado e, portanto, não há esperança de amor ou de qualquer ajuda. Os objetos destruídos são fonte de perseguição interminável e, posteriormente, de culpa. Ao mesmo tempo, a falta de introjeção boa priva o ego de sua capacidade de crescimento e de assimilação, a qual diminuiria o sentimento de uma tremenda brecha entre si mesmo e o objeto; surge então um círculo vicioso, no qual a inveja impede a introjeção boa; isso por sua vez aumenta a inveja. (p.53)
Segundo Freud (1922), o ciúme é um sentimento universal, inerente a qualquer ser
humano, e caso este não o identifique, talvez tenha sido reprimido, o que acaba refletindo em
ações inconscientes.
Deve-se traçar uma distinção entre inveja, ciúme e voracidade.
De acordo com Klein (1984):
A inveja é um sentimento irado de que outra pessoa possui e desfruta de algo desejável – sendo o impulso invejoso tirá-lo dela ou espoliá-la. Além disso, a inveja implica na relação do indivíduo apenas com uma só pessoa e remonta à mais primitiva relação exclusiva com a mãe. (p.29).
O ciúme se baseia na inveja, mas envolve uma relação com, pelo menos, duas pessoas; diz respeito principalmente ao amor que o indivíduo sente como lhe sendo devido e que lhe foi tirado ou se acha em perigo de sê-lo, por seu rival. Na concepção popular de ciúme, um homem ou uma mulher se sente despojado da pessoa amada por outrem. (p.29). A voracidade é uma ânsia impetuosa e insaciável, a exceder aquilo que o indivíduo necessita e o que o objeto se acha capacitado e disposto a dar. No nível inconsciente, a voracidade visa primariamente a esvaziar completamente, a sugar até deixar seco e devorar o seio: ou seja, seu objetivo é a introjeção destrutiva, enquanto que a inveja não apenas procura despojar desta maneira, mas também depositar
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maldade, primordialmente excrementos maus e partes más do eu dentro da mãe, acima de tudo dentro do seio dela, a fim de espoliá-la e destruí-la. (p.30).
No sentido mais profundo, isto ocorre devido à necessidade inconsciente do bebê de
destruir a criatividade da mãe.
Este processo, que se deriva de impulsos sádico-anais, é um aspecto destrutivo da
identificação projetiva, que ocorre no prelúdio da vida.
Klein (1984) pontua que:
Uma diferença essencial entre a voracidade e a inveja, embora nenhuma linha divisória rígida possa ser traçada, visto estarem estreitamente associadas, seria, por conseguinte, achar-se a voracidade principalmente ligada à introdução, e a inveja, à projeção. (p. 30).
Klein (1984) faz referência a outros autores na posterior citação, visando esclarecer as divergências entre ciúme e inveja:
Segundo o Shorter Oxford Dictionary, ciúme significa que alguma outra pessoa tomou ou está dando o “bem” que por direito pertence ao indivíduo. Neste contexto, interpretaria o “bem” basicamente como o seio bom, a mãe, uma pessoa amada, que a outra tirou. De acordo com English Synonyms, de Crabb, (...) O ciúme faz temer perder o que se tem; a inveja é sofrida por ver outro possuir o que ele deseja para si (... ) O invejoso passa mal com a vista da fruição. Sente-se à vontade apenas com o infortúnio dos outros. Assim, todos os esforços para satisfazer um invejoso são vãos. O ciúme, segundo Crabb, é uma “paixão nobre ou ignóbil, de acordo com o objeto. (...) A inveja é sempre uma paixão vil, carreando em seu caminho as piores paixões’.(p.31).
No primeiro caso, trata-se de uma emulação aguçada pelo temor. No segundo,
constitui a cobiça estimulada pelo medo.
A atitude geral para com o ciúme difere da que se tem para com a inveja. Na realidade,
em certos países, o assassinato induzido pelo ciúme acarreta sentença menos severa.
O motivo para esta distinção deve se basear no sentimento universal de que a morte de
um rival pode implicar amor pela pessoa infiel. Isto significa, em função do que foi acima
analisado, existir amor pelo “bem” e que o objeto amado não é danificado e espoliado como o
seria pela inveja.
Para Klein (1984):
O primeiro objeto a ser invejado é o seio que amamenta, pois o bebê sente que aquele possui tudo o que ele deseja e dispõe de um fluxo ilimitado de leite e amor que o seio guarda para sua própria
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gratificação. Esta sensação adiciona-se ao seu sentimento de frustração e ódio e o resultado é uma relação perturbada com a mãe. (p.33).
Um dos principais derivados da capacidade de amar é o sentimento de gratidão.
Segundo Klein (1984), a gratidão é essencial à construção da relação com o objeto
bom e fundamenta também a apreciação da bondade nos outros e em sí próprio.
A autora ainda pontua que a gratidão tem suas raízes nas emoções e atitudes que
surgem no mais primitivo estágio da infância, quando, para o bebê, a mãe constitui o único e
exclusivo objeto.
O vínculo com a mãe constitui a base para todas as relações ulteriores com
determinada pessoa amada.
De acordo com Klein (1984):
Se a inveja do seio que alimenta for forte, a plena gratificação sofre interferência, porque, é característica da inveja produzir o despojamento do objeto daquilo que este possui, e sua espoliação. (p.41).
Segundo Klein (1984), o bebê só pode experimentar satisfação completa se a
capacidade para o amor achar-se suficientemente desenvolvida; e é a satisfação que forma a
base da gratidão.
Estas experiências constituem não apenas a base da gratificação sexual, mas também de toda felicidade ulterior, tornando possível a sensação de unidade com outra pessoa; tal unidade significa ser plenamente compreendido, o que é essencial para toda relação amorosa ou amizade feliz. Na melhor das hipóteses, essa compreensão não necessita de palavras para expressá-la, o que demonstra sua derivação da mais primitiva intimidade com a mãe no estágio pré-verbal. A capacidade de desfrutar plenamente da primeira relação com o seio forma a base para experimentar prazer de diversas fontes. (p.42)
Existe um vínculo direto entre a inveja que se experimenta para com o seio da mãe e o
desenvolvimento do ciúme.
Klein (1984), analisa:
O ciúme se baseia na suspeita do pai e na rivalidade com este, que é acusado de haver se apossado do seio materno e da mãe. Esta rivalidade assinala os primeiros estágios do complexo edipiano direto e invertido, que normalmente surge concomitantemente à posição depressiva no segundo trimestre do primeiro ano de idade. (p.59).
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Para a autora, o desenvolvimento do complexo edipiano é intensamente influenciado
pelas vicissitudes da primeira relação exclusiva com a mãe e, quando esta é perturbada muito
cedo, a rivalidade com o pai introduz-se prematuramente.
As fantasias do pênis dentro da mãe, ou dentro do seio dela, transformam o pai num
intruso hostil.
Para Klein (1984):
Esta fantasia é particularmente intensa quando o bebê não teve a satisfação e felicidade que a relação primitiva com a mãe pode conceder-lhe, e o primeiro objeto bom não foi absorvido com certa segurança. Esse fracasso depende parcialmente da intensidade da inveja. (p. 59-60).
O ciúme é inerente à situação edipiana e se acompanha de ódio e desejos de morte.
Klein (1984), pontua que:
No menino, uma boa quantidade do ódio se desvia para o pai, que é invejado pela posse da mãe; isto constitui o típico ciúme edipiano. Na menina, os desejos genitais pelo pai permitem-lhe encontrar outro objeto amado. Assim, o ciúme, até certo ponto, suplanta a inveja e a mãe se torna a principal rival. A menina deseja tomar o lugar da mãe e possuir e tomar conta dos bebês que o pai amado dá a mãe. (p.62).
Klein (1984), baseando-se no enfoque Freudiano:
Freud demonstrou quão vital é a atitude da menina para com a mãe em suas relações subseqüentes com homens. Quando a inveja do seio materno for intensamente transferida para o pênis do pai, o resultado pode ser um reforço de sua atitude homossexual. Outro desfecho é um súbito e abrupto afastamento do seio para o pênis,. Devido ás ansiedades excessivas e conflitos que a relação oral dá origem. Isto constitui essencialmente um mecanismo de fuga e, portanto, não conduz a relações estáveis com o segundo objeto. Se os principais motivos para esta fuga forem a inveja e o ódio experimentados em relação à mãe, estas emoções são logo transferidas para o pai e, portanto, um comportamento amoroso e duradouro para com ele não pode ser estabelecido. Ao mesmo tempo, a relação invejosa com a mãe se expressa numa rivalidade edipiana excessiva. Esta rivalidade deve-se muito menos ao amor ao pai do que à inveja da posse, pela mãe, do pai e do pênis deste. A inveja experimentada em relação ao seio é então integralmente transportada para a situação edipiana. O pai (ou o seu pênis) tornou-se um apêndice da mãe, e é nessas bases que a menina quer roubá-lo da mãe. (p.64-5).
Dessa maneira, mais tarde na vida, cada sucesso em sua relação com homens torna-se
uma vitória sobre outra mulher. Isto se aplica mesmo quando não existe a mãe do homem,
como se pode observar nas freqüentes perturbações de relacionamentos entre nora e sogra.
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Se o homem é principalmente valorizado porque sua conquista constitui um triunfo
sobre outra mulher, ela pode perder o interesse nele assim que o sucesso é alcançado.
A atitude para com a mulher rival implica então: “ Você (representando a mãe) teve
aquele maravilhoso seio que eu não pude ter quando você o retira de mim, e do qual ainda
quero roubá-la; portanto, tiro-lhe aquele pênis que você preza”.
A necessidade de repetir este triunfo sobre uma rival odiada amiúde contribui
intensamente para a busca de mais e mais homens.
Para Klein (1984):
A inveja excessiva do seio tem probabilidade de estender-se a todos os atritos femininos, em particular à capacidade da mulher ter filhos. Se o desenvolvimento obtém sucesso, o homem deriva compensação para esses desejos femininos irrealizados através de uma boa relação com a esposa ou amante e ao tornar-se pai dos filhos concebidos com ela. (p.67).
Tanto no homem quanto na mulher, a inveja desempenha papel no desejo de tirar os
atributos do outro sexo, assim como no de possuir ou espoliar os do genitor do mesmo sexo.
Decorre disto, que o ciúme paranóide e a rivalidade na situação edipiana direta e
invertida, baseiam-se, em ambos os sexos, porquanto divergentes em seus desenvolvimentos,
na inveja excessiva do objeto primário, a mãe, ou melhor, o seu seio.
3.4. Auto-inveja
Segundo Klein (1957), a inveja interfere na construção de uma relação segura com o
objeto bom interno e externo, solapa o sentimento de gratidão e, de muitas maneiras,
obscurece a distinção entre bom e mau.
A segurança interna do indivíduo é abalada quando este sente que perdeu o objeto
bom. Como conseqüência, o mesmo sente-se perseguido por outrem, vivenciando este como
um objeto interno invejoso e malevolente, o qual perturba seu trabalho, sua vida e suas
atividades.
Klein (1957) pontua que:
A prevalência de objetos internos persecutórios reforça impulsos destrutivos, ao passo que, se o objeto bom estiver bem estabelecido, a identificação com ele fortalece a capacidade de amar, os impulsos construtivos e a gratidão. (p. 263).
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A autora analisa que se o objeto bom está profundamente enraizado, perturbações
temporárias podem ser suportadas e estão assentados os alicerces da saúde mental, da
formação do caráter e do desenvolvimento bem sucedido do ego.
De acordo com Klein (1957):
O “superego invejoso” é sentido como perturbando e aniquilando todas as tentativas de reparar e de criar. É também sentido como fazendo exigências constantes e exorbitantes à gratidão do indivíduo. Pois à perseguição acrescentam-se os sentimentos de culpa de que os objetos internos persecutórios são resultantes dos próprios impulsos invejosos e destrutivos que estragaram primariamente o objeto bom. A necessidade de punição, que encontra satisfação no aumento da desvalorização do self, leva um círculo vicioso. (p.263).
Considerando que o objetivo último da psicanálise é a integração do ego. Os processos
de cisão surgem nos estágios mais iniciais de desenvolvimento. Se são excessivos, fazem
parte integrante de graves traços paranóides e esquizóides que podem ser a base da
esquizofrenia.
No desenvolvimento normal, essas tendências esquizóides e paranóides são, em
grande parte, superadas durante o período que é caracterizado pela posição depressiva, e a
integração desenvolve-se com êxito.
Para Klein(1957), os passos importantes em direção à integração, surgidos durante
esse período, preparam o ego para sua capacidade de operar a repressão, a qual, acredito,
funcionará cada vez mais no segundo ano de vida.
Em relação à criatividade, a autora diz que esta cresce em proporção à capacidade de
estabelecer mais seguramente o objeto bom, sendo isso, nos casos bem sucedidos, o resultado
da análise da inveja e destrutividade.
Em seu trabalho “Sobre a Identificação”, Klein (1957) mostrou que a não
predominância da fragmentação nos processos arcaicos de cisão, propicia um
desenvolvimento mais satisfatório da saúde mental e da personalidade do indivíduo.
Klein (1957) esclarece:
“O sentimento de conter um mamilo e um seio não-danificados – embora co-existindo com fantasias de um seio devorado e, portanto, em pedaços- faz com que a cisão e a projeção não sejam predominantemente relacionadas a partes fragmentadas da personalidade e sim a partes mais coesas do self. Isso implica que o ego não é exposto a um enfraquecimento fatal por dispersão e, por essa razão, é mais capaz de desfazer repetidamente a cisão e de conseguir integração e síntese em sua relação com objetos”. (p.266).
24
A autora considera que todas as emoções ligam-se ao primeiro objeto. Se os impulsos
destrutivos, a inveja e a ansiedade paranóides são excessivos, o bebê distorce e amplia
crassamente todas as frustrações de fontes externas, e o seio materno transforma-se
predominantemente em um objeto persecutório, interna e externamente.
Klein (1957), diz que quando o indivíduo supera, até certo ponto, sua incapacidade
inicial de estabelecer um bom objeto, a inveja diminui e sua capacidade de fruição e gratidão
aumenta passo a passo.
Essas mudanças estendem-se a muitos aspectos da personalidade do sujeito e vão
desde a vida emocional mais arcaica até as experiências e relações adultas.
]
25
CAPÍTULO 4 - OBJETO E OBJETIVO DA PESQUISA
4.1. Objeto da pesquisa
Biografia de Camille Claudel e sua obra de arte “ A Idade Madura” (1898) à luz da
Psicanálise como resultado do inconsciente.
4.2. Objetivo da pesquisa
Identificar e analisar a influência da inveja e do ciúme na vida e obra de Camille
Claudel, segundo o construto teórico de Melanie Klein.
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CAPÍTULO 5 - METODOLOGIA
A pesquisa, de acordo com Gil (2002), foi bibliográfica, pois “é desenvolvida com
base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” (p.
44). Utilizou-se a obra de arte “A Idade Madura” (1898) de Camille Claudel.
Conforme o autor (2002), as pesquisas sobre ideologias, bem como aquelas que se
propõem à análise das diversas posições acerca de um problema, também costumam ser
desenvolvidas mediante fontes bibliográficas.
Priorizou-se este tipo de pesquisa pelo fato da autora ter a finalidade de verificar a
expressão do inconsciente na produção artística de Camille Claudel, a partir do embasamento
psicanalítico já explicitado.
5.1. Delineamento da pesquisa
Utilizou-se a técnica de estudo de caso, pois foi explicada a relação entre variáveis
causais que através de outros tipos de pesquisa como levantamentos e experimentos, não
possibilitariam esta explicação; na qual se fez uso de um objeto de estudo.
Este método foi utilizado, pautado na biografia de Camille Claudel e sua obra de arte
“A Idade Madura”, em decorrência de acreditar-se na relação entre a arte e a expressão do
inconsciente.
5.2. Procedimento
Inicialmente realizou-se a leitura da biografia de Camille Claudel e analisou-se a
mesma. O mesmo procedimento foi feito com sua obra de arte “A Idade Madura” (1898).
Concluiu-se o presente trabalho identificando e analisando a influência da inveja e do ciúme
na vida e obra de Camille Claudel, segundo preconizou Melanie Klein.
5.3. Instrumento
O trabalho baseou-se na biografia de Camille Claudel e em sua obra de arte “A Idade
Madura”, além dos recursos teóricos de Sigmund Freud, D.W. Winnicott e Melanie Klein.
27
CAPÍTULO 6 - ANÁLISE DA BIOGRAFIA DE CAMILLE CLAUDEL CONFORME
A PSICANÁLISE
Neste capítulo, explicou-se como Camille Claudel buscou a construção de si própria
em suas manifestações artísticas, ao mesmo tempo em que se colocava à admiração do
espectador, numa tentativa de se constituir através do olhar do outro.
Segundo Moura e Outeiral (2002), o corpo de Camille, com proporções admiráveis e
sua vitalidade física, desde muito cedo, gerou nos adultos que a cercavam a idéia de que ela
era independente, o que seduzia o pai e assustava a mãe. Camille cresceu despertando
sentimentos fortes e contrastantes, mas nas imagens distintas que seu pai e sua mãe tinham
dela, algo se repetia: a idéia de que ela tudo podia, como, por exemplo, lidar com os ataques
da mãe e com as paixões do pai. Porém, esta sua constituição aparentemente sólida deixava
transparecer um descompasso: Camille mancava; uma seqüela de paralisia infantil.
Segundo Moura e Outeiral (2002), a família passava suas férias sempre em
Villeneuve, sua cidade de origem. Lá, Camille tinha um contato muito próximo com a
natureza, constantemente fugindo de casa para ingressar nos bosques; desenvolveu uma
intimidade muito grande com as árvores, as pedras e o barro. Conhecia as pedras da região e
dava-lhes nomes. O bosque era seu refúgio, para onde ia despistando até mesmo seu
companheiro Paul.
Balint (1968 apud MOURA; OUTEIRAL, 2002), afirmara que na idade adulta, ela
faria a seguinte afirmação: “Há sempre algo de ausente que me atormenta”; o que sugere que
ela tenha sentido os primeiros contatos com a mãe como uma importante Falta Básica.
Provavelmente o cerne de sua identificação primária seja pontuado pela sensação de ausência
do outro, a ausência do olhar materno e do reconhecimento da sua ausência.
Winnicott (1971 apud MOURA; OUTEIRAL 2002) afirmara que as vivências de
feminilidade de um bebê com sua mãe são as responsáveis pela constituição do cerne do seu
self e, conseqüentemente, o que possibilitará a experiência de ser. Porém, os processos
introjetivos que promoverão um sentido de consistência interna só podem se dar mediante
uma presença. Ferenczi (1912 apud MOURA; OUTEIRAL 2002) . No caso de Camille sua
vivência primeira de feminilidade foi marcada por uma ausência. Ainda para Winnicott (1971
apud MOURA; OUTEIRAL 2002), seus contatos com seu Elemento Feminino Puro eram
perturbadores, constituindo-se de uma não presença e um conseqüente sentimento de
inexistência. A partir daí, Camille passa a fazer uma adaptação ativa, aproximando-se dos
referenciais masculinos e incrementando a dissociação entre os Elementos Feminino e
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Masculino, este processo é o que Ferenczi (1932 apud MOURA; OUTEIRAL 2002) chama de
“ Adaptação Autoplástica, quando o ambiente não se adapta à criança, ela passa a fazer uma
adaptação interna, o que pode gerar uma cisão do ego.
Segundo Winnicott (1971 apud MOURA; OUTEIRAL 2002) enquanto o Elemento
Feminino está ligado ao sentimento de ser, o Masculino está intimamente relacionado ao
fazer. Sendo que este fazer, em situações adversas, pode incluir um agir compulsivo visando a
uma precoce auto-sustentação.
Ferenczi (1932 apud MOURA; OUTEIRAL 2002) afirmara que com o início de suas
atividades como escultora, o jogo de sedução com seu pai tornou-se mais explícito. O que por
um lado, era uma promessa de resgate de uma não existência, por outro lado, tinha um caráter
de relação intrusiva. Camille precisava ativamente corresponder às expectativas do pai; para
garantir este contato visual, mantinha com ele uma relação passional, comum ao mundo dos
adultos.
Ainda segundo os autores, um triângulo se repete na vida e obra de Camille Claudel,
ela assim escreve ao seu irmão Paul: “Continuo presa ao meu grupo de três”. Estes triângulos,
ao se repetirem, mostram-se imutáveis, destituídos da capacidade de realmente triangular.
O trio é uma busca constante na obra de Camille, assim como um triângulo se forja em
sua vida, estagnando-a.
C. Bollas (1987 apud MOURA;OUTEIRAL 2002) constatara que o triângulo edípico,
realmente experienciado, liberta; os objetos envolvidos no édipo tornam-se objetos
transformacionais .
Segundo o autor, estes objetos suportam a experiência de fusão, mas aceitam também
a diferenciação. Assim, os adultos envolvidos com a criança transformam continuamente o
ambiente interno e externo do bebê, promovendo enlaces entre a experiência passada e a
futura.
Constatou-se que Camille Claudel conseguiu retratar o que parecia impossível, a
ausência que a atormentava. Tentou construir a si própria e reconstruir sua história através de
suas lutas, força, beleza, eternos triângulos, paixões, fragilidades e, por fim, sua loucura.
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CAPÍTULO 7 - ANÁLISE DA OBRA DE ARTE “A IDADE MADURA (1898)”
Julgou-se essencial falar sobre a obra “A Idade Madura” de Camille Claudel, pelo fato
desta ser a mais autobiográfica da escultora. Apresentar-se-ão os personagens da obra e como
os mesmos se relacionam entre si, numa visão psicanalítica, com o objetivo de mostrar a
manifestação do inconsciente da artista na presente obra de arte. Além de identificar a
influência da inveja e do ciúme em sua vida e obra.
Segundo Moura e Outeiral (2002, p. 72), “A Idade Madura” é formada por um grupo
de três protagonistas, em que o centro é vazio e os três tomam um lugar em diferentes níveis.
Uma jovem ajoelhada está baixo e mais distante, um homem maduro no plano médio e uma
velha, no plano mais alto, parece vitoriosamente, estar levando o homem consigo. Esta obra
que muito desagradou Rodin, que se sentiu exposto, retrata o sentimento de derrota de
Camille frente à Rose, à sua mãe, à passagem do tempo e à morte. A jovem ajoelhada volta-se
para o homem e suplica. A Suplicante, por sua vez, é o detalhe que compõe “A Idade
Madura”. O ventre da jovem está crescido, a gravidez é um tema que se repete em sua obra,
talvez reflita uma esperança de se conectar com a feminilidade, com a experiência de Ser e
substituir a ausência por uma presença.
A obra “A Idade Madura” foi concebida em 1898, quando Rodin terminou o
relacionamento com Camille.
Segundo Rosemberg (2004), desprendendo suas mãos da mão amada, a jovem deixa o
poder ao destino; entrega a ruptura; aceita abandonar o amor de um homem para ver fugir
com ele as sombras do passado. Sofre por romper os laços. Inclinada sobre o vazio, os joelhos
presos ao solo, estirando-se na súplica, seu equilíbrio oscila, não pode evitar a queda
eminente. Para Camille, a queda prefigurada na suplicante, testemunha a renúncia que sua
consciência ignora: renúncia ao seu desejo e abandona-se ao passado. A escultora “A Idade
Madura” pode ser interpretada como uma alegoria da separação mostrando o abandono. Ao
expor o bronze ele foi elogiado, mas também criticado pela crueza que retratava a decadência
e o sofrimento. Conseguira uma encomenda depois retirada. Camille ficou magoada por
Rodin não intervir a seu favor, Rodin parecia não desejar a obra exposta, deixava transparecer
que se sentia pessoalmente atingido.
Na primeira versão da Idade madura, a juventude caiu de joelhos e ainda segura o
braço do homem, na segunda versão, este braço de amante escapa as mãos da Suplicante e se
estendem para o vazio. A suplicante estende as mãos, implora, invoca a morte.
30
Segundo Moura e Outeiral (2002, p. 93), podemos usar “A Idade Madura” (L’Âge
Mûr) como uma obra emblemática da tendência de Camille de repetir triângulos, talvez esta
escultura seja a mais autobiográfica obra de Camille.
A primeira maquete de A Idade Madura é de 1894; do mesmo ano é O Deus que
Voou; do ano anterior são Clotho Calva; em 1898, Camille fez a segunda versão de “A Idade
Madura” e, em 1900, A Suplicante.
Essas obras se inter-relacionam, parecem ser um estudo em torno do mesmo tema. O
mesmo tema que Camille expõe na sua frase: “Há sempre algo de ausente que me atormenta”.
Clotho, de 1893, é uma imagem a qual um corpo de mulher se apresenta murcho,
envelhecido, sugado pelo tempo. Este corpo sem vida parece lutar contra uma cabeleira que o
envolve e o aprisiona, como serpentes e cipós.
Ainda para Moura e Outeiral, a versão Clotho Calva integra a primeira maquete de “A
Idade Madura”, Nesta obra, a figura central é um homem forte que parece prestes a tombar.
Seus braços são desproporcionalmente grandes. De um lado, uma jovem ajoelhada agarra-se
ao seu braço olhando para cima como que suplicando sua presença, um espaço vazio se abre
entre os dois. A terceira figura é uma mulher velha, á imagem de Clotho, ainda que
envelhecida tem sobre seus ombros o enorme braço do homem, o qual parece se firmar com a
ajuda daquele corpo murcho. A mulher velha ensaia abraçá-lo pela cintura, mas não chega a
tocá-lo. O rosto dela e o do homem parecem se encaminhar para fitarem-se. Seus corpos estão
próximos, em contraste com o espaço entre o corpo dele e o da jovem. Porém o braço
descomunal do homem, do qual a jovem agarra com seu peito e suas mãos parecem tornar-se
parte dela, sendo difícil caracterizar onde termina um e começa o outro.
Ainda que com o espaço que se abre entre a jovem e o homem, os três personagens
pareceram se unificar através dos enormes braços dele, que formam um enorme arco. A
maneira como a jovem está posicionada: distante e, ao mesmo tempo, unida
indiscriminadamente ao homem; parece refletir muito bem a relação entre Camille e Rodin.
Ora, se Camille não vê em Rose um objeto separado, Rose está incapacitada de
desempenhar para Camille um papel de impedimento, de um limite organizador, como seria a
mãe num autêntico triangular edípico.
Conforme Moura e Outeiral (2002), o que se processa é uma série de fusões entre
Rose, Camille e Louise, a mãe de Camille. As três nasceram na região da Champagne,
Camille nasceu no mesmo ano em que Rodin e Rose se conheceram, a mãe de Camille tinha
uma diferença de idade em relação ao seu marido parecida à que Camille tinha de Rodin.
Camille via em Rose uma mulher desvalorizada, submetida, desprovida de desejos próprios
31
como sua mãe Louise. O que Camille mais temia era se perceber parecida com sua mãe ou
com Rose, enquanto que, paradoxalmente, quereria ocupar os lugares destas mulheres ao lado
dos seus homens.
A segunda versão de “A Idade Madura”, de 1898, é feita justamente quando Camille e
Rodin efetivamente terminam o romance. A segunda versão de A Idade Madura é uma clara
seqüência da primeira, o que está em total acordo com Os Caminhos da Vida de Camille, que
se sente afastada de Rodin e, com isto, na iminência da queda.
Segundo Moura e Outeiral (2002), em 1899, um ano após a segunda versão de A Idade
Madura, é significativo o fato de Camille ter feito o detalhe da jovem uma nova escultura,
intitulada A Suplicante. Esta figura, agora, encontra-se só, com seu ventre crescido, seu olhar
e seus braços voltados para cima e seu corpo pendente, prestes a cair. A Suplicante é a terceira
cena de uma seqüência, dando continuidade às duas versões de A Idade Madura, nas quais o
homem vai se distanciando da jovem mulher e se aproximando da velha.
Na continuidade desta seqüência qual seria a quarta cena senão a própria queda?
Ficou evidente que o rompimento do relacionamento de Camille Claudel com Rodin,
inconscientemente, a influenciou a criar A Idade Madura. Esta obra retrata o sentimento de
derrota de Camille, a jovem suplicante, frente à Rose, a mulher mais velha e esposa de Rodin.
Além de refletir sua derrota frente à sua mãe Louise e sua vulnerabilidade diante da passagem
do tempo e à morte.
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CAPÍTULO 8 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para o psicólogo compreender o comportamento humano, ele precisa oferecer escuta,
ter sensibilidade, empatia e acima de tudo, identificar a causa, ou seja, o que desencadeou
determinada reação do paciente.
Esta causa, segundo o olhar da psicanálise, é conseqüência de vivências infantis e, no
enfoque Kleiniano, é resultado da relação que o indivíduo teve com o primeiro objeto, a mãe,
ou melhor, seu seio.
O ciúme e a inveja, temas abordados no presente trabalho, são sentimentos universais,
porém o primeiro baseia-se no amor e visa à posse do objeto amado e à remoção do rival.
Pertencendo a uma relação triangular e, portanto, a um período da vida em que os objetos são
claramente reconhecidos e diferenciados um dos outros. A segunda, em contrapartida,
consiste em uma relação de duas partes, na qual o sujeito inveja o objeto por alguma posse ou
qualidade, sendo que nenhum outro objeto vivo precisa entrar nessa relação.
Ao longo do presente trabalho, estes sentimentos acima citados, foram abordados com
o objetivo de identificar na vida e obra de Camille Claudel, como estes influenciaram sua vida
e obra. Utilizando como instrumento a biografia de Camille Claudel e sua obra de arte “A
Idade Madura” (1898).
Considerando-se o estudado no presente trabalho, concluiu-se que Camille Claudel,
através da sublimação, expressou sentimentos inconscientes de ciúme e inveja, o que
acarretou conseqüências significativas em sua vida e obra.
Klein (1984), pontua que o vínculo com a mãe constitui a base para todas as relações
ulteriores com a pessoa amada, porém se a inveja do seio que alimenta for muito forte, ocorre
o despojamento do objeto daquilo que este possui.
De acordo com a autora, o bebê só pode experimentar satisfação completa se a
capacidade para o amor achar-se suficientemente desenvolvida; e é a satisfação que forma a
base da gratidão.
Camille Claudel não desfrutou satisfatoriamente da primeira relação com o seio, não
formando a base para experimentar prazer em outras fontes.
Existe um vínculo direto entre a inveja que se experimenta para com o seio da mãe e o
desenvolvimento do ciúme.
Klein (1984) analisa que o desenvolvimento do complexo edipiano é intensamente
influenciado pelas vicissitudes da primeira relação exclusiva com a mãe e, quando esta é
perturbada muito cedo, a rivalidade com o pai introduz-se prematuramente.
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Camille Claudel, em uma carta para seu irmão Paul, fez a seguinte afirmação:
“Continuo presa ao meu grupo de três”. O trio, aliás, é uma busca constante na vida e obra de
Camille.
O explicitado acima pode ser observado em sua obra de arte “A Idade Madura”,
recurso utilizado no presente trabalho, a qual é constituída por três protagonistas, onde é
retratado o sentimento de derrota de Camille frente à Rose (esposa de Rodin), à sua mãe, à
passagem do tempo e à morte. Além do significativo fato de seu ventre estar crescido na
escultura.
Observa-se que Camille não teve a satisfação e felicidade que a relação primitiva com
a mãe poderia ter-lhe concedido, ou seja, o primeiro objeto bom não foi absorvido com certa
segurança.
Baseando-se no enfoque Kleiniano, o ciúme edipiano na menina, permite que os
desejos genitais pelo pai possam encontrar outro objeto amado.
Assim, o ciúme, até certo ponto, suplanta a inveja e a mãe torna-se a principal rival. A
menina deseja ocupar o lugar da mãe, possuindo e tomando conta dos bebês que o pai amado
dá a esta.
Esta afirmação pode ser observada quando Camille Claudel precisava ativamente
corresponder às expectativas do pai e quando aparece com o ventre crescido em “A
Suplicante”, parte integrante de sua obra de arte “A Idade Madura”, além do fato de
relacionar-se com um homem que tinha a idade de seu pai.
Klein (1984), baseando-se no enfoque Freudiano: Freud demonstrou quão vital é a atitude da menina para com a mãe em suas relações subseqüentes com homens. Quando a inveja do seio materno for intensamente transferida para o pênis do pai, o resultado pode ser um reforço de sua atitude homossexual. Outro desfecho é um súbito e abrupto afastamento do seio para o pênis,. Devido ás ansiedades excessivas e conflitos que a relação oral dá origem. Isto constitui essencialmente um mecanismo de fuga e, portanto, não conduz a relações estáveis com o segundo objeto. Se os principais motivos para esta fuga forem a inveja e o ódio experimentados em relação á mãe, estas emoções são logo transferidas para o pai e, portanto, um comportamento amoroso e duradouro para com ele não pode ser estabelecido. Ao mesmo tempo, a relação invejosa com a mãe se expressa numa rivalidade edipiana excessiva. Esta rivalidade deve-se muito menos ao amor ao pai do que à inveja da posse, pela mãe, do pai e do pênis deste. A inveja experimentada em relação ao seio é então integralmente transportada para a situação edipiana. O pai (ou o seu pênis) tornou-se um apêndice da mãe, e é nessas bases que a menina quer roubá-lo da mãe. (p.64-5).
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Claudel tinha sua segurança interna abalada, pois nutria a fantasia de que havia
perdido o objeto bom, quando dizia: “Há sempre algo de ausente que me atormenta”. Sugere-
se que isto seja conseqüência do fato desta ver em sua mãe uma figura persecutória,
vivenciando a mesma como um objeto interno invejoso e malevolente, o qual perturba seu
trabalho, sua vida e suas atividades.
A prevalência destes objetos internos persecutórios reforçam impulsos destrutivos e
dificuldade de suportar perturbações, além de não propiciar um desenvolvimento satisfatório
do ego e da saúde mental do sujeito.
Pode-se constatar o acima explicitado, no fato de Camille Claudel ver em sua mãe e
em Rodin, intrusos que queriam usurpar seus conteúdos bons.
Considerando-se que a criatividade cresce em proporção à capacidade de estabelecer
mais seguramente o objeto bom, devido à inveja.
O “superego invejoso” de Claudel aniquilou suas tentativas de reparar e criar quando
Rodin terminou seu relacionamento extraconjugal com a mesma, já que esta teve a fantasia de
ter perdido, para Rose, aquele que tinha como objeto bom e invejado.
À partir de então, Camille parou de produzir e sentiu-se derrotada.
Os processos de cisão surgem nos estágios iniciais do desenvolvimento, porém,
quando excessivos, fazem parte de graves traços paranóides e esquizóides que podem ser a
base da Esquizofrenia. Esta última é considerada pelos autores, como o motivo que manteve
Camille internada num manicômio durante os trinta últimos anos de sua existência.
Claudel, devido aos seus impulsos destrutivos, inveja e ansiedade paranóides
excessivos, distorceu e ampliou todas as frustrações de fontes externas, transformando o seio
materno em um objeto persecutório interna e externamente.
Devido a não superação da incapacidade inicial de estabelecer um bom objeto,
Camille Claudel não reduziu sua inveja, não possibilitando, assim, vivenciar o sentimento de
gratidão na sua vida emocional e em suas relações.
Constatou-se com o presente trabalho, a necessidade de estabelecer-se uma boa
relação com o primeiro objeto, a fim de ter relações satisfatórias com os objetos ulteriores,
além de bom desenvolvimento do ego, da saúde mental e da criatividade.
Quando o indivíduo satisfaz-se completamente, internalizando o objeto bom,
desenvolve a capacidade para o amor e esta satisfação forma a base da gratidão.
O presente trabalho contribuiu para a sociedade, pois a partir do momento que a
pessoa identifica a causa de seus comportamentos, pode elaborá-los, através da busca de uma
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psicoterapia individual, pois quando o indivíduo supera, até certo ponto, sua incapacidade
inicial de estabelecer um bom objeto, a inveja diminui e sua capacidade de fruição e gratidão
aumenta gradativamente.
Acredita-se que o trabalho colaborou para o avanço da ciência, pois procurou
identificar a expressão do inconsciente na arte, área onde, até então, existem poucas pesquisas
realizadas.
O trabalho realizado foi de suma importância para a vida acadêmica e profissional da
autora, pois além de possibilitar a integração entre a pesquisa teórica e os conteúdos
apreendidos durante o curso, englobou dois dos grandes focos de interesse e paixão da
mesma: a psicanálise e a arte.
Os sentimentos analisados e estudados na presente pesquisa ajudarão à autora a melhor
identificá-los em seus pacientes durante sua atuação profissional, o que propiciará melhor
compreensão das fantasias vividas pelos mesmos e conseqüentemente, o tratamento conduzir-
se-á com mais segurança e eficácia.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ANEXOS
39
Camille Claudel (1864-1943), em foto de 1877.
40
Camille Claudel aos 65 anos, internada no Hospital Psiquiátrico de Ville-Evrard, onde passou
seus últimos trinta anos de vida.
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