UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
Colegiado dos Cursos de Graduação em Geografia
ÉRICO JOSÉ DE SOUZA SANTANA
PRODUÇÃO DE FLORES NO MUNICÍPIO DE MARACÁS (BA): PERSPECTIVA E LIMITAÇÕES
Salvador – Bahia
2014
ÉRICO JOSÉ DE SOUZA SANTANA
PRODUÇÃO DE FLORES NO MUNICÍPIO DE MARACÁS (BA): PERSPECTIVA E LIMITAÇÕES
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Geografia como requisito parcial para obtenção do Grau de Bacharel em Geografia pela Universidade Federal da Bahia.
Orientador (a): Prof.ª Dr.ª Noeli Pertile
Salvador - Bahia
2014
_______________________________________________________________
S232 Santana, Érico José de Souza.
Produção de flores no município de Maracás (BA): perspectivas e
limitações / Érico José de Souza Santana.- Salvador, 2014.
75 f. : il.
Orientadora: Profa. Dra. Noeli Pertile.
TCC (Graduação em Geografia) - Universidade Federal da Bahia,
Instituto de Geociências, 2014.
1. Geografia humana – Maracás (BA). 2. Desenvolvimento rural.
3. Flores - cultivo. I. Pertile, Noeli. II. Universidade Federal da Bahia.
Instituto de Geociências. III. Título.
CDU: 913.3. (813.8)
_______________________________________________________________
Elaborada pela Biblioteca do Instituto de Geociências da UFBA.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus: causa primeira de todas as coisas. Em
seguida aos meus queridos pais Érica e José, a quem dedico essa conquista. Vocês
são minha referência. Sinto que nada mais é importante para vocês do que as
conquistas de seus filhos. Por isso tamanho compartilhamento.
A querida professora orientadora Noeli Pertile, pela paciência e
compartilhamento de sua sabedoria. Pela contribuição e fomento no
desenvolvimento da pesquisa e também por toda liberdade dada para o desenrolar
dos trabalhos.
Agradeço imensamente aos professores doutores Alcides Caldas e Antônio
Lobo por aceitarem participar da banca e contribuir para o aperfeiçoamento do
trabalho.
Gentilmente agradeço a todos os entrevistados. Suas experiências e
conhecimentos certamente enriqueceram o trabalho.
À Universidade Federal da Bahia por proporcionar esse divisor de águas em
minha vida. Não esquecendo da sociedade brasileira que custeou esses longos
anos de estudos. Espero retribuir socialmente o que me foi investido.
Àos meus colegas e demais professores da UFBA saudações pela
convivência e que novas batalhas e conquistas nos aguardem.
À minha família e amigos um agradecimento mais que especial. Entendam
que momentos de certa ausência são necessários para que se cumpra aquilo que
fora planejado em momento anterior.
Agradeço a Adriele Teixeira pela ajuda na elaboração dos mapas e ao amigo
Diego Duarte pelo incentivo de sempre.
Acredito que este é um momento de muita gratidão a todos que de alguma
forma contribuíram para este trabalho. Portanto, a todos vocês meu muito
OBRIGADO!
RESUMO
O incentivo à atividade de floricultura no Estado da Bahia passou a ocorrer de forma
expressiva no final da década de 1990, principalmente pela ação do Governo do
Estado da Bahia. Alguns municípios foram beneficiados através dessas ações e
puderam fomentar o cultivo de flores em seu território. Este trabalho busca abordar a
produção de flores no município de Maracás, analisando desde o processo produtivo
realizado por associações comunitárias e pelos produtores individuais, até a
realização do transporte e das vendas nos mercados consumidores. Busca-se
também verificar qual a participação do poder público na formação do Arranjo
Produtivo Local de floricultura em Maracás e como ela se utilizou/utiliza desta
atividade na promoção do município. Nesse âmbito, verifica-se como evoluiu a APL
de Maracás e as ações tomadas nesse processo.
Palavra-chave: Floricultura, Maracás, Produção, Arranjo Produtivo Local.
ABSTRACT
Encouraging activity floriculture in the State of Bahia started to occur significantly in
the late 1990s, mainly by the action of the State Government of Bahia. Some
municipalities have benefited through these actions and could foster the cultivation of
flowers in its territory. This work seeks to address the production of flowers in the
municipality of Maracas, analyzing from the production process done by community
associations and individual producers, and the actual shipping and sales in consumer
markets. Search also check that the participation of government in shaping the Local
Productive Arrangement of flowers in Maracas and how it was used / uses this
activity to promote the county. In this context, it appears as evolved APL Maracás
and the actions taken in this process.
Keyword: Florist, Maracas, Production, Local Productive Arrangement.
LISTA DE IMAGENS
Imagem 01 – Palma de Santa Rita............................................................................27
Imagem 02 – Outras variedades produzidas pela Associação São Matheus......................................................................................................................29
Imagem 03 – Unidade Piloto e Câmara Refrigerada.................................................32
Imagem 04 – Baú refrigerado isotérmico da AMAFLOR sem uso por falta de caminhão....................................................................................................................34
Imagem 05 – Transporte improvisado da produção de flores e veículo isotérmico refrigerado..................................................................................................................53
LISTA DE MAPAS
Mapa 1 – Destinos da produção da AMAFLOR.........................................................35 Mapa 2 – Destinos da produção da Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta.............................................................................................................................40
Mapa 3 – Destinos da produção da Associação dos Trabalhadores Rurais Irmã Dulce..........................................................................................................................43
Mapa 4 – Destinos da produção da Rege Flores.......................................................55
Mapa 5 – Destinos da produção de Jeriosvaldo Cruz................................................58
Mapa 6 – Destinos da produção da Botelho Flores...................................................61
Mapa 7 – Destinos da produção de José Salvador....................................................66
Mapa 8 – Principais municípios atendidos pelas flores de Maracás e projeto de expansão do mercado consumidor............................................................................74
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – Evolução do salário mínimo entre 1997 – 2004 e equivalência em dólares........................................................................................................................30
ABREVIATURA DAS SIGLAS
AMAFLOR – Associação Maracaense dos Agentes Floricultores
APL – Arranjo Produtivo Local
CDA – Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional
CEPLAC – Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira
COOFLOR – Cooperativa dos Produtores de Flores e Plantas Ornamentais de
Maracás
EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuária
EMBASA - Empresa Baiana de Águas e Saneamento S.A
FETAG – Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado da Bahia
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IG – Indicação Geográfica
MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra
ONU – Organização das Nações Unidas
PIB – Produto Interno Bruto
SEAGRI – Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação Reforma Agrária, Pesca e
Aquicultura
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SECOMP – Secretaria de Combate a Pobreza e as Desigualdades Sociais
SEMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Maracás
SICM – Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração do Governo da Bahia
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................12
2 CAPÍTULO I – MARACÁS E A PRODUÇÃO SOCIOESPACIAL DO CULTIVO DE FLORES.....................................................................................................................17
2.1 INICÍO DA APL DE MARACÁS E O PAPEL DA PREFEITURA E DO ESTADO DA BAHIA NESSE PROCESSO................................................................................18
2.2 INFLUÊNCIA DA PREFEITURA NA PROMOÇÃO DO MUNICÍPIO ATRAVÉS DA ATIVIDADE DE FLORICULTURA..............................................................................22
3 CAPÍTULO II - AS ASSOCIAÇÕES COMUNITÁRIAS PRODUTORAS DE FLORES.....................................................................................................................25
3.1 ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA SÃO MATHEUS................................................25
3.2 PROJETO PILOTO..............................................................................................30
3.3 COOFLOR – AMAFLOR......................................................................................32
3.4 PROGRAMA SOCIAL HABITACIONAL – PSH...................................................35
3.5 PRODUTORES INDEPENDENTES DE “FUNDO DE QUINTAL” E ASSOCIAÇÃO DO VALE DO JIQUIRIÇÁ...........................................................................................36
3.6 ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS DA RIBEIRA ALTA..............37
3.7 ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS IRMÃ DULCE......................40
4 CAPÍTULO III – OGANIZAÇÃO E ATUAÇÃO DOS PRODUTORES INDIVIDUAIS DE FLORES...............................................................................................................45
4.1 REGE FLORES....................................................................................................45
4.1.1 Organização do trabalho................................................................................46
4.1.2 Conhecimento acumulado e assistência técnica.........................................48
4.1.3 Conflitos...........................................................................................................49
4.1.4 Mercado consumidor da Rege Flores...........................................................53
4.2 PRODUTOR JERIOSVALDO CRUZ....................................................................55
4.3 BOTELHO FLORES.............................................................................................58
4.4 PRODUTOR JOSÉ SALVADOR..........................................................................62
4.4.1 Organização do trabalho................................................................................63
4.4.2 Distribuição e alcance da produção..............................................................63
4.4.3 Assistência técnica.........................................................................................66
5 CAPÍTULO IV – MARACÁS CIDADE DAS FLORES: PERSPECTIVAS E LIMITAÇÕES.............................................................................................................68
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................74
REFERÊNCIAS..........................................................................................................76
12
1 INTRODUÇÃO
A produção de flores no cenário mundial cresce expressivamente a cada ano,
o exemplo disso é que durante a última década do século XX o crescimento chegou
a 10% ao ano. Estima-se que a área ocupada para o cultivo de flores em todo o
mundo é de 190 mil hectares e movimenta valores em torno de US$ 16 bilhões por
ano na produção e de US$ 44 bilhões por ano no varejo (BUAINAIN; BATALHA,
2007, apud ANDRADE; PEREIRA, 2010).
Dentre os 19 maiores países produtores de flores do mundo, os dois que
dominam o comércio mundial são a Holanda, com 58,2% das exportações, e a
Colômbia, com 13,4% (FAO, 2004, apud ANDRADE; PEREIRA, 2010).
No Brasil, inicialmente, o cultivo de flores era concentrado na Região Sudeste,
em especial no Estado de São Paulo. Em meados da década de 1990 cerca de 80%
da produção de flores do país se concentrava em São Paulo (ALMEIDA; AKI, 1995,
apud PEREIRA, 2004). Somente o município de Holambra produzia 40% da
produção nacional (BRIDI, 1996, apud Pereira 2004). Contudo, este cenário
começou a se alterar a partir dos anos 2000, pois outras regiões passaram a investir
na produção de flores.
Na Bahia a floricultura está ligada ao papel do Estado como fomentadora da
atividade. A referência é o Programa Flores da Bahia, cujas ações estiveram ligadas
a inserção de população em situação de risco social (ANDRADE; PEREIRA, 2010).
Após a interferência do Governo da Bahia, a produção passou a atender 20% do
mercado interno, quando antes não conseguia atender 3% da demanda. Além disso,
conseguiu-se diminuir em 10% a dependência de flores produzidas no Estado de
São Paulo (SCHERER, 2006). As flores tropicais são cultivadas no litoral de
Salvador, enquanto as flores de clima temperado são produzidas no município de
Maracás (FRANÇA; MAIA, 2008, apud MATOSSINHO 2008).
Nesse sentido, esta pesquisa tem como objetivo geral analisar e compreender
como se organizam tanto os núcleos produtores como o Arranjo Produtivo Local
como um todo no município de Maracás (BA). Importante também ressaltar a análise
e compreensão do papel do poder público nesse processo, seja em escala municipal
ou estadual. Os objetivos específicos são analisar e compreender a dinâmica do
trabalho, tanto das famílias organizadas em associações como os trabalhadores
contratados pelos produtores individuais; como ocorre uso da terra; as relações de
13
trabalho presentes em cada núcleo produtivo; o mercado consumidor das flores de
Maracás; a Prefeitura Municipal e sua influencia nos núcleos produtivos.
Para tanto, alguns questionamentos se fazem necessários para auxiliar na
fluidez do estudo e como forma de nortear a pesquisa. Indaga-se como as
associações estão estruturadas no ponto de vista organizacional e de infraestrutura
ao longo do processo produtivo em Maracás? No que consiste as principais
diferenças entre produtores individuais e as associações? Qual a participação da
Prefeitura Municipal e do Governo do Estado da Bahia na atividade de floricultura
em Maracás? Quais as perspectivas e limitações da produção de flores no município
de Maracás (BA)? Como se produz e qual mercado consumidor das flores de
Maracás?
A atividade de Floricultura em Maracás foi fruto do envolvimento da Prefeitura
Municipal, fomentando projetos comunitários e contando com o apoio efetivo do
Governo do Estado da Bahia. A partir dos anos 2000 houve a ação do Sebrae/BA
com o trabalho de capacitação do núcleos produtores de flores, através da
realização de seminários, que tratavam desde o cultivo até marketing e vendas.
Graças à existência de algumas associações e outros núcleos produtivos, foi
desenvolvida a APL (Arranjo Produtivo Local) de Maracás.
A concentração geográfica de aglomerados locais de determinado setor
produtivo pode resultar em ganhos competitivos quando estes, de forma sistemática,
se articulam para fortalecer o ramo em que atuam. Existia, de antemão, algumas
organizações de produtores de flores no município de Maracás. Esta produção se
voltava basicamente para o mercado do próprio município e tinha na feira livre da
cidade de Maracás o ponto de comercialização da produção. Ciente desta realidade,
o poder público municipal atuou na organização de uma cooperativa de produção de
flores. Graças ao Programa Flores da Bahia do Governo do Estado foi possível
iniciar uma sistematização e estruturação da cadeia produtiva e também de
comercialização. Assim se desenhou o arranjo produtivo do setor florístico do
município.
Concentrações de empreendimentos produtivos de um mesmo segmento
possibilita uma análise das relações que estes exercem entre si. Essas relações
podem resultar em ganho de competitividade, elevar o uso de tecnologias de
produção, facilitar financiamentos além de outras possibilidades como treinamentos
mais específicos e direcionados. Todos esses elementos visam o desenvolvimento
14
do lugar, acelerando o crescimento. Esses arranjos que compartilham uma produção
comum e que possuem um grau de proximidade geográfica forte é alvo cada vez
maior de organizações privadas e também públicas, visando sempre o
desenvolvimento da competitividade dos núcleos produtivos locais.
Experiências positivas de crescimento com esse tipo de organização territorial
de produção chamou a atenção de instituições governamentais pelas experiências
que alcançaram sucesso. Nesse sentido, o Governo da Bahia lançou o Programa
Flores da Bahia. O objetivo era organizar em cooperativa trabalhadores que
cultivassem e comercializassem flores e, com isso, concentrar também a venda de
outros aglomerados, interagindo na troca de experiências e de abastecimento de
mercadorias para o mercado. Nesse sentido, a Prefeitura Municipal de Maracás
exerceu um papel de liderança organizando as associações que trabalhavam no
ofício de cultivo de flores, dando início ao Arranjo Produtivo Local dessa atividade no
município.
Baiardi (2009) afirma que se deve entender APL como uma intervenção que
se materializa a partir das necessidades de cada lugar, levando em consideração a
capacidade regional em absorver capitais e ofertar trabalho, concentrando, desse
modo, a possibilidade de promoção do desenvolvimento territorial, à escala local e
regional.
Oliveira (2006) complementa Baiardi afirmando que é o lugar o lócus da
implantação das cooperativas e a região é vista como área fluída do sistema
cooperativo, ou seja, a região é o local de atuação e de influência em que atua as
cooperativas.
Mattos (2008) afirma que os arranjos produtivos locais são estratégias
concretas de promoção do desenvolvimento local, gerando emprego e renda. A
autora define APL como uma concentração geográfica de empresas e instituições
que se relacionam em um setor particular e que tem em um de seus principais
fundamentos a cooperação entre os atores envolvidos, ou seja, a principal
característica é a cooperação.
Referente a cooperação, Mattos (2008) sinaliza o crescimento dessa atuação
social paralelamente ou em parceria com o poder local e as autoridades estadual e
federal. Essa tendência importante vem contribuindo para fortalecer alianças
horizontais e verticais.
15
O Arranjo Produtivo Local resulta, assim, em ganhos competitivos e se
manifesta em escala local, conseguindo extrapolar essa escala a partir do nível de
influência que exerce, absorvendo capital e trabalho e possibilitando o
desenvolvimento territorial.
Foi implantado, através de convênios com a SEAGRI (Secretaria da
Agricultura, Pecuária, Irrigação Reforma Agrária, Pesca e Aquicultura) e a SECOMP
(Secretaria de Combate a Pobreza e as Desigualdades Sociais) do Governo do
Estado da Bahia, estufas e uma câmara frigorífica, utilizada para a armazenagem da
colheita em uma área do município conhecida como parque dos eucaliptos,
localizado na cidade de Maracás. Para a distribuição para o mercado consumidor
foram adquiridos, por meios de convênios com as mesmas secretarias citadas
acima, dois caminhões isotérmicos refrigerados.
As principais associações do Arranjo Produtivo de Floricultura de Maracás
que se encontram ativas correspondem a AMAFLOR (Associação Maracaense dos
Agentes Floricultores; Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta e
Associação dos Trabalhadores Rurais Irmã Dulce). Esses núcleos produtores foram
incentivados e fomentados principalmente pela Prefeitura de Maracás e as famílias
envolvidas no cultivo de flores arrecadam em torno de um salário mínimo por mês.
Contrabalanceando com cultivo realizado por associações, surgiram a partir
dos anos 2000 produtores individuais. Os principais produtores individuais
correspondem a Rege Flores; Jeriosvaldo Cruz; Botelho Flores e José Salvador.
Eles contratam trabalhadores em regime de assalariamento, diárias ou parcerias. As
flores cultivadas pelos produtores individuais têm como principais compradores
atacadistas localizados nos principais centros consumidores do estado, que inclui a
capital baiana (Salvador), Feira de Santana e o eixo Ilhéus – Itabuna. Contudo, a
produção já alcança outros mercados interioranos do Estado da Bahia.
A metodologia de pesquisa se baseou principalmente de dados primários
oriundos de pesquisa qualitativa por meio de visitas de campo entre novembro de
2013 e maio de 2014.
Foram realizadas duas visitas de campo informais no ano de 2013. O intuito
era analisar quais núcleos produtores estavam ativos e observar as relações de
trabalho e diferenças entre uma produção e outra. Em seguida foram realizadas
outras três visitas de campo. A primeira em 2013 foi realizada entrevistas com
membros da Prefeitura Municipal de Maracás na tentativa de verificar o papel dela
16
na atividade de floricultura, bem como sua influência junto aos produtores. A
segunda em 2014 foram entrevistados populares e membros de associações
produtivas, sejam essas ativas ou não, para compreender os aspectos de
funcionamento de cada uma. A terceira em 2014 foram entrevistados os quatro
produtores individuais que são descritos nesta pesquisa e alguns funcionários. O
intuito era também a compreensão os aspectos de funcionamento de cada produtor
individual. Por fim, uma última ida a campo foi realizada em maio de 2014 para
findar dúvidas e questionamentos ainda presentes.
Entre os principais entrevistados estavam: Maria Amália Rocha, ex-presidente
da Associação Comunitária São Matheus; Iara Vieira, Agrônoma vinculada à
Secretaria de Produção de Maracás; Jeir Silva, presidente da Associação dos
Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta; Luzia Santos, presidente da Associação dos
Trabalhadores Rurais Irmã Dulce; Reginaldo Santos, produtor individual; José
Salvador; produtor individual; Cloves Pereira da Fonseca, historiador; Adão Botelho,
produtor individual.
Além disso, a pesquisa também se alimentou de dados secundários
(SEBRAE 2007; IBGE, 2010) e da análise do arcabouço teórico geográfico e
informações da atividade de floricultura no cenário mundial, nacional, estadual e do
município de Maracás. Portanto, a partir dos dados primários, do referencial teórico
e de secundários o presente estudo foi desenvolvido e trabalhado.
Dessa forma a pesquisa tenta verificar a relação da produção de flores em
Maracás com foco nas perspectivas e limitações tanto para associações
comunitárias quanto para produtores autônomos e o papel do poder público nesse
processo. Analisar e compreender como essas relações ocorrem e se manifestam
no município justifica o estudo.
17
2 Capítulo I – MARACÁS E A PRODUÇÃO SOCIOESPACIAL DO CULTIVO DE
FLORES
O município de Maracás está situado em parte da bacia do rio Jiquiriçá e do
rio de Contas. Compreende clima semiárido na porção abrangida pela caatinga e
subúmido a seco no contato da caatinga com a Floresta estacional (zona de
transição). Atualmente o município possui de 24.613 habitantes (IBGE, 2010), dos
quais, cerca de 70% residem na zona urbana.
Maracás ganhou destaque na produção de flores no cenário baiano e
nacional no final da década 1990 com a gestão do ex-prefeito Fernando de Oliveira
Carvalho. A produção passou a atingir os grandes centros consumidores do Estado
da Bahia. Contudo, a relação do município com o cultivo de flores antecede à data
supracitada.
Segundo entrevista com Rocha (2014), o cultivo de flores já era realizado na
década de 1970 e 1980, antes mesmo de Maracás ser intitulada a “Cidade das
Flores”, no início dos anos 2000. Ela ressalta que criadores de fundo de quintal e
produtores de povoados próximos à sede municipal, como Lava Pés e Santo
Antônio, realizavam o plantio e levavam a produção para comercialização na feira
livre da cidade.
Era prática comum às pessoas cultivarem em seus quintais variedades de
flores. Algumas famílias vendiam algumas espécies na feira livre da cidade. Cloves
destaca que essa produção não era voltada especificamente para o mercado. O
cultivo era feito como distração ou lazer e a comercialização era muito irregular e,
em muitos casos, chegava a ser inexistente (FONSECA, 2014).
Segundo entrevista com Fonseca (2014), Maracás recebeu o título de cidade
das flores ainda na década de 1970. Segundo ele, um locutor da rádio Sociedade da
Bahia, de nome J. Luna, que também cobria eventos diversos pelo estado,
conheceu Maracás no ano de 1972. O próprio locutor denominou-a como “cidade
das flores” pela abundância dessas plantas na sede municipal, destacando o jardim
da Praça Rui Barbosa, relatado como colorido pelas diversas espécies de flores e os
quintais das casas decorados com flores diversas. A denominação de Maracás
como cidade das flores é notada no Hino do Município, escrito em 1980 por Elvira
Sá, como verificado abaixo:
18
[...] Com muitos metros de altitude /Teu horizonte apresenta lindas cores /Como é lindo contemplar o pôr do sol/Com seus raios cheios de fulgores /Teus campos verdejantes / Clima frio e saudável / Salve, salve Maracás, terra das flores / Maracás, Maracás / Assim teu nome nasceu [...] (SEMEC, 2012).
Portanto, é observado que a relação de Maracás com a produção de flores
não é fato recente, ocorrendo a mais de três décadas. Contudo, o papel da
prefeitura do município foi de fundamental importância para o crescimento dessa
atividade, tornando-a fonte de renda para muitas famílias. Além disso, ocorreu uma
notoriedade do município a partir que foi adotado o slogan: “Maracás cidade das
flores”. Neste capítulo será abordada a relação do governo do estado e,
principalmente, da prefeitura na produção socioespacial da atividade de floricultura
no município de Maracás.
2.1 INÍCIO DA APL DE MARACÁS E O PAPEL DA PREFEITURA MUNICIPAL E DO
ESTADO DA BAHIA NESSE PROCESSO
Em 1997, a prefeitura de Maracás, através do Programa de Desenvolvimento
da Floricultura, apoiou um projeto comunitário elaborado pela Associação São
Matheus para cultivo de flores. O Programa foi constituído com o apoio da Secretaria
de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária do Estado da Bahia; Comitê Baiano de
Floricultura e Plantas Ornamentais; Associação Baiana de Produtores de Flores e
Plantas Ornamentais (ASBAFLOR). A finalidade do programa era estimular o
desenvolvimento da floricultura no estado da Bahia. A respeito disso, Scherer
comenta:
O Programa de Desenvolvimento da Floricultura que objetiva elevar o padrão do nível tecnológico para o desenvolvimento racional da floricultura, além de definir a localização geográfica, segundo as exigências de cada espécies explorada, a identificação de mercado e a melhoria da comercialização (SCHERER, 2002, p. 18).
Foi observado que a atividade de floricultura estava em expansão no Estado
da Bahia. Novos produtores e instituições ligadas à atividade, cada vez mais
19
articulados e buscando novos mercados, chamaram atenção do Estado para o
incentivo da atividade. Nesse sentido, destaca-se a afirmação de Scherer (2002):
Percebe-se, claramente, o forte interesse que produtores de diversas regiões têm demonstrado em resgatar ou iniciar as atividades de produção e comercialização de flores de corte e plantas ornamentais, face às grandes oportunidades existentes. A organização de produtores tem merecido destaque no que se refere às suas demandas no setor da floricultura, seja na criação de incentivos, no apoio governamental e principalmente na produção comercial de flores e plantas ornamentais, o que levou o Governo do Estado da Bahia tomar uma série de providências no sentido de alavancar este segmento, com vistas a beneficiar toda a cadeia produtiva (SCRERER, 2002, p. 18).
De acordo com as ideias explicitas acima, houve a partir do final da década
de 1990, uma atenção por parte do Governo do Estado da Bahia para a atividade de
floricultura. Uma das ações pioneiras nesse sentido foi o Programa Desenvolvimento
da Floricultura. A Associação São Matheus, situada no município de Maracás, foi
uma das primeiras do Estado a ser beneficiada pelo Programa. Nesse sentido, foram
doadas mais de 50 mil pés de palma de Santa Rita para desenvolvimento do plantio.
O programa contava com outros incentivos, como por exemplo, facilidades na
aquisição de empréstimos e assistência técnica fornecida pela EBDA (Empresa
Baiana de Desenvolvimento Agrícola) e CEPLAC (Comissão Executiva do Plano da
Lavoura Cacaueira). No caso da Associação São Matheus essa assistência ficou a
cargo da EBDA.
A Prefeitura de Maracás intermediou o acesso da Associação São Matheus
ao Programa Desenvolvimento da Floricultura. Contudo, o apoio da prefeitura não
ficou restrito a intermediação do Programa. Destaca-se que a assistência prestada
pelo SEBRAE foi também intermediada através da prefeitura. Além disso, ainda no
tocante a contribuição do poder executivo de Maracás perante a Associação São
Matheus, a primeira subsidiou integralmente por período de aproximadamente três
anos todos os insumos produtivos, fazendo com que a associação se estruturasse a
caminho da autossuficiência. Após tal período a contribuição com insumos ocorreu
de forma parcial e gradativamente ia se reduzindo com o tempo.
Após a implantação da atividade de floricultura na Associação São Matheus a
Prefeitura de Maracás iniciou um projeto socioeconômico denominado de “Projeto
Piloto”, atendendo 21 famílias. Novamente todos os insumos produtivos foram
20
subsidiados pela prefeitura que também passou a decidir onde e como vender a
produção, por intermédio da Secretaria de Produção, tendo o secretário como uma
forte figura nesse sentido. Contudo, a contribuição maior desse Projeto, segundo
entrevista com Vieira (2014), ligada a Secretaria de Produção de Maracás, foi o
estímulo para a criação do Programa Flores da Bahia, implantado em mais de 10
municípios do estado.
Já era de interesse do governo do estado expandir e fortalecer a atividade de
floricultura no Estado da Bahia desde o final da década de 1990. Em 2003 foi
lançado o Programa Flores da Bahia pelo Governo do Estado em parceria com a
Secretaria da Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária (SEAGRI) e a Secretaria de
Combate a Pobreza e as Desigualdades Sociais (SECOMP). O Programa foi
concebido para atuar como um projeto comunitário, beneficiando jovens
desempregados e atuando em parceria com as prefeituras locais. Portanto, o
programa visava o estímulo e crescimento da atividade de cultivo de flores no
Estado da Bahia consorciado com a integração de jovens sem emprego na referida
atividade.
Em Maracás, o Projeto Flores da Bahia, no tocante a organização do trabalho,
ficou sob a responsabilidade da Cooperativa dos Produtores de Flores e Plantas
Ornamentais de Maracás (COOFLOR). A cooperativa foi criada para atender a 60
jovens e atuar no projeto.
Maracás foi o primeiro município a ser inaugurado o referido projeto no ano de
2003. Nessa direção, a prefeitura disponibilizou a área que foi inserida o projeto,
situada no Horto Florestal, na zona urbana da cidade. Além disso, toda infraestrutura
básica como água, energia e acessibilidade foi arcada pela prefeitura.
A estrutura do projeto, toda ela de estufas galvanizadas, consistiu em 70% de
ativos financeiros proveniente do governo do estado e 30% da prefeitura. Além
disso, de acordo com o Programa, a prefeitura de Maracás teria de ceder um técnico
agrícola ou agrônomo para monitorar e orientar as atividades de cultivo de flores. Foi
firmada parceria entre a prefeitura de Maracás e o SEBRAE para prestar consultoria
em diversas áreas, desde o cultivo até comercialização e marketing.
Ainda no que se refere ao apoio do SEBRAE, Mattosinho (2008) destaca:
No município de Maracás [...] está sendo aplicada a metodologia GEOR (Gestão Estratégica Orientada para
21
Resultados) acompanhada pelo SEBRAE, que demonstra resultados positivos entre os produtores. Para atender as exigências do mercado, os Projetos Comunitários tiveram de compor um “mix” de produtos bem variado, resultando em um número expressivo de espécies e variedades de flores e folhagens, tanto de corte como para vasos, atingindo um leque de opções para consumidores, atacadistas e decoradores (MATTOSINHO, 2008, p. 21).
Baseado nas ideias apresentadas nota-se uma participação do SEBRAE na
metodologia aplicada no Projeto em Maracás. Observa-se ainda, que toda produção
foi pensada na comercialização, buscando atender também os nichos de mercado.
A contratação de consultores do SEBRAE pela prefeitura não ficou restrita
apenas ao Projeto Flores da Bahia. Outras associações também tiveram o suporte
desse órgão.
Após a atuação do Projeto Flores da Bahia em Maracás outros núcleos
produtores baseados na ideia associativista surgiram. Enfatiza-se que todos eles
nasceram e/ou se estruturaram graças o apoio da Prefeitura Municipal. Destaca-se o
Programa Social Habitacional; Produtores Independentes de Fundo de Quintal;
Associação do Vale do Jiquiriçá; Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira
Alta e Associação dos Trabalhadores Rurais Irmã Dulce. Ressaltando que antes
desses núcleos produtores citados, outros já estavam em funcionamento contando
massiçamente com o apoio da prefeitura, como a Associação Comunitária São
Matheus, Projeto Piloto e COOFLOR – AMAFLOR. Portanto, verifica-se que todos
esses núcleos produtores acima citados de alguma forma foram beneficiados
diretamente pela prefeitura. Esse benefício inclui desde a doação de terrenos,
subsídio de insumos, subsídio da estrutura produtiva e negociação e transporte da
produção por meio da Central de Vendas. Nota-se uma importante presença e, em
muitos casos, dependência desses núcleos produtivos perante o poder executivo
local na atividade de floricultura.
Tendo em vista estas ideias, a APL de Maracás foi estruturada. Neste
processo se inserem também os produtores individuais que, apesar de não terem
tido grande apoio do poder público, comparado às associações produtoras, também
se inserem na formação da APL do município. É adotado nessa pesquisa como
conceito de APL, determinado local que concentra empresas ou associações de
mesma atividade econômica e que mantém relações produtivas entre si.
De acordo com o SEBRAE o Arranjo Produtivo de Floricultura na Bahia se
concentra em Maracás. Assim, o incentivo a produção de flores no município foi
22
fomentada principalmente pela prefeitura, que conseguiu formar e fortalecer núcleos
produtores.
Destaca-se aqui também como fator importante para o crescimento da APL
de Maracás, apesar de muitos conflitos, a Central de Vendas criada pela prefeitura.
Esta tinha o papel de negociar e criar mercados para os produtores. Seria uma
espécie de intermediadora entre o que era produzido e vendido enquanto não
ocorria uma autonomia dos produtores. Contudo, apesar de conseguir vender a
produção, na prática houve uma dependência ainda maior das associações perante
a prefeitura devido à falta de conhecimento de mercado e compradores dos
primeiros. Além disso, a prefeitura, por intermédio da Secretaria de Produção,
possuía autonomia para tomada de decisões sobre algumas associações, o que
pelo estatuto dessas é vedado.
2.2 INFLUÊNCIA DA PREFEITURA NA PROMOÇÃO DO MUNICÍPIO ATRAVÉS DA
ATIVIDADE DE FLORICULTURA
No ano de 2000, o então prefeito Fernando de Oliveira Carvalho tentando
destacar o município vinculou nos meios de comunicação o slogan “Maracás Cidade
das Flores”. Essa iniciativa ocorreu três anos após a primeira organização produtora
cultivar flores especificamente voltadas para o mercado. Referente à atribuição do
município como cidade das flores Mattos (2007) destaca:
[...] a partir de 2000 Maracás deixa de ser “mais um município”, passando a constar em vários veículos informativos e de divulgação como “cidade das flores”, concretizando um processo que podemos definir como uma “invenção de tradição”. Isso, porque, antes de 2000 não havia qualquer indicio de plantio de flores, principalmente com fins comerciais, além de algumas flores cultivadas em jardins e quintais das casas locais (MATTOS, 2007, p. 12).
Fato curioso é que o então prefeito da época (1997 - 2000), Fernando de
Oliveira Carvalho, era publicitário. Portanto, o slogan do município tratou-se de uma
jogada de marketing para promoção do mesmo. Contudo, o destaque dado ao
município sendo vinculado ao cultivo de flores não ocorreu somente para o
conhecimento e distinção de Maracás. Os recursos aplicados, principalmente para
23
esta atividade, aumentaram quando incorporada a “vocação do município para
plantar flores”. Nesse direcionamento, Mattos (2007) afirma ainda:
[...] cabe ressaltar esse fato importante, do destaque dado ao município de Maracás nos últimos tempos, obtendo atenção diferenciada, além de suporte (técnico/financeiro) junto ao Governo do Estado. Basta uma breve passagem pelas Secretarias do Estado, com destaque para a SEAGRI, para vislumbrar o número significativo de informativos sobre o município após a implantação do plantio de flores, e, consequentemente a instalação do Programa Flores da Bahia (MATTOS, 2007, p. 12).
Portanto, remete-se à vinculação de Maracás como cidade das flores sem a
participação da prefeitura nesse processo. O próprio prefeito Fernando Carvalho
(1997–2000 / 2001–2004), como relatado em algumas entrevistas, participava
pessoalmente das vendas das flores quando o cultivo estava recém-iniciado em
Maracás. Este acompanhava as entregas, participava de feiras, eventos e da
comercialização. Era comum ver o ex-prefeito em pontos de vendas da capital
baiana, como o dique do Tororó, realizando a promoção das flores de Maracás.
A prefeitura realiza também a exposição de flores de Maracás, que ocorre
anualmente juntamente com a ExpoMaracás (Exposição Agropecuária de Maracás).
A Expoflores é realizada desde o ano de 2003 (entre os meses de abril e maio),
sendo que no ano de 2013 foi empreendida a 10º exposição. Nela são expostas as
flores cultivadas no município. Vale ressaltar que não se trata de uma exposição
exclusiva e voltada somente para flores. Não são expostas novas técnicas ou
tecnologias de produção e o volume negociado ou novos contratos com
compradores é quase inexiste. Portanto, trata-se de uma feira que expõe as
variedades cultivadas no município e alguns núcleos produtores, não movimentando
efetivamente o comércio dessa atividade.
Em maio de 2014 foi organizada prefeitura e AMAFLOR a primeira Feira de
Flores do dia das mães em Maracás. A feira tinha o intuito de promover a atividade
em Maracás e aumentar o volume de vendas no município nessa época do ano.
Verifica-se mais uma vez o papel da prefeitura, sobretudo da Secretaria de
Produção, na organização e promoção da atividade no município ao organizar a
feira. Contudo, segundo entrevistas com consumidores e produtores, a organização
24
de eventos, feiras e exposições dessa atividade abrange apenas a escala local e o
alcance de um público maior seria importante para a floricultura do município.
25
3 CAPÍTULO II – AS ASSOCIAÇÕES COMUNITÁRIAS PRODUTORAS DE
FLORES
Neste capítulo serão analisados todos os núcleos produtivos organizados em
associações em Maracás: Associação Comunitária São Matheus; Projeto Piloto;
Associação Maracaense dos Agentes Floricultores; Programa Social Habitacional;
Produtores Independentes de Fundo de Quintal; Associação Vale do Jiquiriçá;
Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta e Associação dos
Trabalhadores Rurais Irmã Dulce. Além disso, uma cooperativa (Cooperativa dos
Produtores de Flores e Plantas Ornamentais de Maracás) que funcionou entre o ano
de 2003 e 2004 será analisada. O objetivo é abordar a estrutura e funcionamento
desses núcleos produtivos, as relações de trabalho, mercado consumidor da
produção, possíveis conflitos e motivos para o encerramento de algumas dessas
organizações. É objetivo de análise ainda, o papel dos poderes públicos na
produção de flores dessas associações.
3.1 ASSOCIAÇÃO SÃO MATHEUS
Em 1997 foi fundada a Associação Comunitária São Matheus. A associação
se localizava no bairro Maracaizinho, considerada periferia da cidade de Maracás.
Foi fundada por três irmãos: Mercês Rocha, Juvenal Rocha e Maria Amália Rocha. A
associação foi criada com o intuito de gerar renda para moradores do bairro que, na
época, viviam da colheita ou dos cultivos sazonais das lavouras da região, como a
de tomate, pimentão e principalmente de café. Ou seja, boa parte da comunidade
vivia a partir de rendas como diarista nos cultivos locais. Vale ressaltar que na
década de 1990 houve a decadência da lavoura de café na região de Maracás e isto
afetou profundamente a renda dos trabalhadores que anualmente trabalhavam na
colheita do referido grão.
Analisando esse cenário, os irmãos Rocha pensaram montar uma associação
com o intuito de gerar renda para a comunidade. A associação foi fundada no ano
de 1997. Apesar de a fundação ter sido concretizada, não houve de início um plano
de como e em que a associação iria atuar. Três projetos eram discutidos nos
26
encontros: o primeiro era montar uma fábrica de pré-moldados para uso na
construção civil; o segundo projeto foi desenvolver uma fábrica de sandálias e
empregar homens e mulheres; por fim, o terceiro projeto idealizado por Maria Amália
Rocha era implementar cultivos de flores tropicais. Os três projetos foram
apresentados em 1997 ao poder público municipal a fim de que este fomentasse
algum empreendimento.
A prefeitura, ao analisar as três propostas, firmou uma parceria com a
Associação através do Programa Desenvolvimento da Floricultura. Além da
prefeitura, a parceria contou com o fomento do MDA (Ministério do Desenvolvimento
Agrário) do Governo Federal e a CAR (Companhia de Desenvolvimento e Ação
Regional) ligado a Secretaria de Desenvolvimento e Integração Regional do Estado
da Bahia. Referente a isso, Baiardi (2009) comenta:
A Prefeitura em associação com a CAR e o MDA, lançou em 1997 o Programa Desenvolvimento da Floricultura. A etapa inicial do programa desenvolveu o projeto piloto com o plantio de 105 mil pés de palmas de Santa Rita. Essa experiência envolveu cerca de 25 famílias da Associação Comunitária de São Mateus, que ficaram responsáveis pelo trato das flores no seu lote, com técnica de irrigação manual (BAIARDI, 2009, p. 2).
Além das entidades supracitadas, o projeto contou com a colaboração de
Joaquim José da Rocha, pai dos fundadores da Associação, que cedeu uma área de
2 hectares. No auge do projeto a área chegou a corresponder a três hectares.
Inicialmente foi desenvolvida a cultura de palma de Santa Rita, como demonstrado
na imagem abaixo. Por muitos anos esse foi o “carro-chefe” da produção.
Imagem 1: Palma de Santa Rita
Fonte: IBAFLOR, 2014.
27
A divisão da terra era feita a partir de lotes de igual tamanho entre todas as
famílias associadas, cerca de 800 m², ou 0,08 ha. Inicialmente 25 famílias
participaram do projeto. Todo o custo inicial foi subsidiado pela prefeitura municipal.
Desde sementes, adubos, até a água utilizada. Todos os insumos subsidiados para
a Associação eram divididos em partes iguais para cada família desenvolver seu
cultivo. Portanto, a divisão da terra era realizada de forma igualitária, assim como os
insumos de produção.
Contudo, a produtividade variava de família para família de acordo com a
variedade do plantio, da perda de produção e da dedicação com relação à terra.
Segundo Maria Amália, tinha famílias que não alcançavam um salário mínimo, mas
atingia valor próximo a isto. Ela destaca que o trabalho com a terra variava de uma
família associada para outra, sendo que, cada uma não interferia no lote do outro.
Maria Amália destaca ainda que a falta de experiência foi fator de grande
impacto no inicio do empreendimento. Ela relata que a primeira produção de palma
de Santa Rita enviada para venda no comércio varejista de Salvador foi toda perdida
por falta de manejo adequado da flor. Existem normas de manipular determinadas
flores que devem ser seguidas quando estas forem encaminhadas para venda. A
exemplo da rosa, a palma de Santa Rita não pode ser comercializada para o
atacado com as flores já desabrochadas. Para o mercado quando comercializadas
de tal forma a produção perde o valor de venda pela baixa duração das flores,
perdendo rapidamente a qualidade. A adequação ao mercado foi realizada de
maneira gradativa.
Nesse aspecto, o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas) foi considerado como importante parceiro. O referido órgão colaborou no
desenvolvimento da Associação ofertando cursos técnicos e prestando assistências,
essencialmente nos anos iniciais do projeto. Contudo, a participação desse órgão
não se encerrou nos primeiros anos de existência da Associação, fazendo-se
presente sazonalmente com cursos de aprimoramento e assistências diversas.
Entre os benefícios proporcionados pelo SEBRAE, destaca-se o
desenvolvimento do uso de técnicas de irrigação, como a de gotejamento, aplicada
em algumas culturas, como a de rosas. Após iniciar apenas com palma de Santa
Rita, a associação cultivou mais sete tipos de flores, como rosas, áster, sorriso de
Maria, tango, crisântemo, lírio e gérbera, como exemplificado abaixo.
28
A produção inicialmente era escoada com auxílio de um caminhão coberto por
lona. Tal prática é inapropriada pelo fato da carga ser perecível e a alta temperatura
no interior do caminhão reduzir a vida útil das flores. A perda era alta e a qualidade
era afetada quando a mercadoria chegava ao destino final. Este cenário foi alterado
no ano de 2003, quando a prefeitura municipal, por intermédio da Companhia de
Desenvolvimento e Ação Regional, realizou a aquisição de um caminhão baú
isotérmico refrigerado. Tal equipamento apresenta-se como adequado para realizar
o transporte das flores, pois consegue manter o produto em temperatura ideal,
aumentando a durabilidade e conservando a qualidade das flores. Vale ressaltar que
o veículo foi adquirido para a Secretaria de Produção do Município de Maracás.
Contudo, como os custos de manutenção do caminhão eram arcados pela prefeitura
foi realizado acordo para que a produção da Associação São Matheus utilizasse o
serviço sem ônus para a mesma.
As receitas das vendas eram repassados para as famílias de acordo com o
que cada uma produzia. Eram deduzidos os custos e então o valor líquido era
transferido pela associação. Inicialmente o repasse era semanal. Contudo, a
associação passou a vender em maiores quantidades e os pagamentos passaram a
também ser realizados com prazos maiores. Os cheques passaram a ser aceitos e o
repasse para os associados realizados mensalmente. Como dados adicionais é
importante destacar que o apogeu do projeto ocorreu entre os anos de 1997 e 2004.
Imagem 2: Outras variedades produzidas pela Associação São Matheus.
Fonte: IBAFLOR, 2014. a) rosas; b) áster; c) sorriso de Maria; d) tango; e) crisântemo; f) lírio; g) gérbera.
29
Nesse período cada família conseguia uma renda que girava em torno de um salário
mínimo, como demonstra a tabela a seguir:
Tabela 1: Valor do salário mínimo entre 1997 – 2004 e equivalência em dólares
Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
R$ 120,00 130,00 136,00 151,00 180,00 200,00 240,00 260,00
U$ 53,83 58,32 61,01 67,74 80,75 89,72 107,67 116,64
Elaboração: Érico Santana, 2014.
Nota 1: Conversão realizada com valor do dólar comercial à U$ 2,2290 em 10/06/2014.
A partir do ano de 2000 a prefeitura municipal deixou de subsidiar
gradativamente os insumos. Ou seja, os custos de produção como sementes,
bulbos, frete, água, entre outros, passaram a ficar sob a responsabilidade da
associação. Era pensado, por parte do poder executivo municipal, que a Associação
São Matheus teria de ter autonomia para conseguir sua autogestão. Portanto, esses
gastos passaram a ser descontados das famílias. Logo, houve uma redução na
renda dos associados, principalmente porque boa parte dos insumos era oriundo de
São Paulo, especificamente do município de Holambra.
Um dos aumentos mais significativos foi com o uso da água, proveniente da
concessionária pública, no caso a EMBASA (Empresa Baiana de Águas e
Saneamento S.A). Pela falta de outra viabilidade e a indispensabilidade do uso do
recurso usou-se inicialmente esta fonte. Contudo, por se tratar de uma atividade
agrícola e o alto consumo para a irrigação o valor mensal a ser pago era muito
elevado. Novamente, a prefeitura municipal se mostrou parceira e custeou a
perfuração de um poço artesiano.
O poço artesiano custeado pela prefeitura atendia a duas instituições: a
Associação São Matheus e a COOFLOR (Cooperativa dos Produtores de Flores e
Plantas Ornamentais de Maracás). Ambas localizavam-se relativamente próximas.
Entretanto, a vazão do poço não conseguiu atender a demanda das duas entidades.
Então o poder executivo do município efetuou a perfuração de outro poço de uso
exclusivo da Associação São Matheus.
Com os custos sendo gradativamente elevados alguns associados deixaram o
cultivo, partindo para outros ramos da economia. Maria Amália aponta que muitos
30
jovens migraram para regiões mais industrializadas do estado e do país,
permanecendo pessoas de idade mais avançada trabalhando em muitos lotes. Ela
destaca também que muitas dessas pessoas de idade mais avançada se
aposentaram e com a renda conseguiram sustentar a toda a família. Em médio
prazo, muitas famílias associadas concluíram que a receita, depois de descontado
todos os encargos de produção, ficou muito baixa, não conseguindo o sustento da
família.
Com todos esses fatores supracitados, a Associação São Matheus, pioneira
no cultivo de flores em Maracás, foi desativada entre o final do ano de 2011 e início
do ano 2012. O auge desse projeto ocorreu entre os anos 1997 até meados de
2003. Após tal período, as famílias envolvidas no projeto foram gradativamente
perdendo renda, ocasionando o encerramento da associação.
Por fim, a prefeitura municipal foi apontada como importante parceira junto à
associação, principalmente pelo subsídio de insumos produtivos, fornecimento de
água para irrigação e disponibilização de assistência técnica. Maria Amália aponta o
desenvolvimento alcançado pelo munícipio graças ao projeto das flores, sobretudo,
pela visibilidade alcançada pelo slogan Maracás Cidade das Flores.
3.2 PROJETO PILOTO
O Projeto Piloto da Prefeitura Municipal de Maracás foi criado no ano 2000
(Imagem 3). O poder executivo do município contratou uma equipe de Holambra
para estudar as características pedoclimáticas da área a ser implantada uma
unidade de produção de flores, situada no parque dos eucaliptos (na sede do
município). Analisada todas as características físicas da área foi então criada, ainda
no ano 2000 a Unidade Piloto.
Quando criada, a unidade funcionou como uma espécie de associação. Os
“associados” cultivavam e a partir desse plantio vendiam sua produção através da
central de vendas do município, ligada à prefeitura. A produção era transportada
pelo veículo ligado a Secretaria de Produção. Caso algum outro produtor
transportasse pelo veículo uma taxa de 20% era cobrado em cima do que é era
31
vendido. Essa porcentagem já chegou a representar quase 40%, como retrata
alguns produtores individuais e membros de outras associações entrevistados.
Atualmente a unidade piloto funciona como unidade experimental e não
possui fins lucrativos. Essa unidade possui três funcionários que, apesar de serem
terceirizados, estão à disposição da Secretaria de Agricultura de Maracás,
responsável pela unidade. A área possui cinco estufas onde são plantados três
variedades de flores: rosas, áster e crisântemo. E medindo aproximadamente 4.356
m² (0,43 ha).
O objetivo da Unidade Piloto é experimentar novas técnicas e difundir para os
produtores de Maracás. As técnicas testadas na unidade correspondem a novos
adubos, sementes, novas variedades de flores e a adaptação destas na região.
Contudo, não foi identificada nesta pesquisa, a partir das entrevistas realizadas com
produtores individuais e associações, uma importância significativa da Unidade
Piloto na difusão de tecnologias e assistências ao cultivo das flores.
A unidade possui uma câmara fria (imagem 3) que se encontra a disposição
das associações. Trata-se de um ponto de acondicionar a produção para ser levado
para o mercado. Segundo a Secretaria de Produção o equipamento está à
disposição também de qualquer produtor individualizado que queira também utilizar
o material. Contudo, não foi observado nessa pesquisa o uso do equipamento por
produtores individualizados do município. Segundo relatado em entrevista, não há
ônus para produtores que queiram estocar a mercadoria na câmara fria. A
quantidade estocada na câmara fria não foi informada pela Secretaria de Produção.
Imagem 3: Unidade Piloto e Câmara Refrigerada
Fonte: Érico Santana, 2014.
32
3.3 COOFLOR – AMAFLOR
A COOFLOR (Cooperativa dos Produtores de Flores e Plantas Ornamentais
de Maracás) foi fruto do Programa Flores da Bahia, fomentado pelo governo do
Estado através da SEAGRI (Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação Reforma
Agrária, Pesca e Aquicultura) no ano de 2003. O programa visava aumentar a área
produtiva do estado, introduzindo o cultivo de alta qualidade e beneficiando jovens
carentes das comunidades atendidas. Dez cidades foram beneficiadas com o
programa, sendo Maracás a primeira delas.
Com um investimento na ordem de 400 mil reais, a unidade do Programa
flores da Bahia em Maracás entrou em operação em setembro de 2003.
Atualmente, segundo Iara Vieira, o valor da estrutura corresponde a 2 milhões de
reais. A estrutura é 100% de estufa agrícola, em uma área com cerca de um hectare
onde são cultivados rosas, gérbera, palma de Santa Rita, áster, crisântemo, vasos
ornamentais, tango e folhagens como avencão e murta.
Por já possuir núcleos de produção de flores anteriormente, Maracás foi a
primeira cidade a sediar o programa. Inicialmente, foi fundada uma cooperativa, a
COOFLOR, que atuaria no cultivo, venda e busca de mercados consumidores para
as flores. A proposta era também que todos os outros projetos do município
fornecessem flores para a cooperativa que seria a responsável por negociar e
escoar o produto para o mercado. Ou seja, além de uma unidade produtora, a
cooperativa seria uma distribuidora e funcionaria como uma central de vendas,
parecido com o que ocorre em Holambra – SP.
A COOFLOR atendia, inicialmente, 60 jovens que eram os responsáveis pela
produção das flores. Contudo, foi uma ação que não teve êxito. A evasão foi muito
grande e em pouco mais de um ano de funcionamento a cooperativa não conseguiu
atender as metas de quando criada, sendo desarticulada.
Com o insucesso da cooperativa foi criada em 06 de outubro de 2004 a
AMAFLOR (Associação Maracaense dos agentes floricultores), que vinha a substituir
a COOFLOR. A AMAFLOR ficou responsável por gerir todo o projeto de floricultura,
bem como toda a infraestrutura implantada pelo Programa Flores da Bahia.
A Associação Maracaense dos agentes floricultores passou a trabalhar não
mais com jovens, mas com famílias no processo produtivo. O cultivo chegou a
absorver 25 famílias. Atualmente trabalham nove pessoas em todo projeto, sendo
33
cada trabalhador pertencente a uma família diferente. É apontado aqui que a
principal causa da redução do número de associados ocorre pelo aumento dos
custos com o processo produtivo e de escoamento das flores. Isso por conta da
menor presença do poder público municipal subsidiando insumos e despesas outras.
Por sua vez, o resultado foi o aumento dos gastos por parte da associação e,
consequentemente, a diminuição da renda por família, fazendo que muitas se
desligassem da AMAFLOR.
Não existe divisão por lote ou área. O trabalho é coletivo e ocorre onde há
necessidade. Já houve, em momento anterior, divisão por lotes, mas o resultado,
segundo os associados, foi uma queda na produção e tal prática foi abortada. Em
2014, a renda por família não alcançava um salário, girando em torno de R$ 500,00
a R$ 600,00.
A AMAFLOR intermedia a venda de sua produção, não tendo interferência da
central de vendas da prefeitura. Suas flores atingem o eixo Ilhéus - Itabuna (283 km
e 259 km distantes de Maracás, respectivamente) e o município de Jequié (90 km
distante de Maracás) e a produção é escoada semanalmente para esses destinos.
Vale ressaltar que a AMAFLOR possui um caminhão baú isotérmico
refrigerado. Da mesma forma a Secretaria de Produção do Município possui
caminhão similar. Contudo, apenas um veículo, que pertence à secretaria, está em
operação. Diante do exposto, o caminhão é dividido por região atendida. As quartas
e sábados atende principalmente a AMAFLOR (vendas para Ilhéus, Itabuna e
Jequié) como verificado no mapa 1 e segundas e terças atende as demais
associações do município (vendas para Salvador e Feira de Santana). Outro veículo
foi adquirido a partir de um convênio com o Governo do Estado, com previsão de
entrega para julho de 2014 para a AMAFLOR.
Imagem 4: Baú refrigerado isotérmico da AMAFLOR sem uso por falta de caminhão
Fonte: Érico Santana, 2013.
35
Interessante ressaltar que a AMAFLOR possui motorista próprio e o caminhão
vinculado a Secretaria de Produção possui outro motorista. Apesar disso ambos são
registrados pela associação, sendo que a segunda usufrui apenas de um condutor.
Os encargos trabalhistas do segundo motorista é recolhido pela central de vendas
da prefeitura de outros núcleos produtores, que usam de tal serviço, e repassado
para a AMAFLOR. Segundo alguns entrevistados, tal prática ocorre por orientação
da Secretaria de Produção desde 2011. Isso demonstra certo grau de influência do
poder público sobre decisões que envolvem a associação.
Até o ano de 2011, a prefeitura subsidiava sazonalmente e parcialmente os
insumos de produção. A partir de 2012 a associação passou a custear seus
encargos. A única ressalva é a manutenção e combustível do caminhão baú da
associação. Foi identificado nesta pesquisa, a partir das entrevistas com os
associados, que desde que o subsídio oriundo do poder público local diminuiu, a
interferência desta também caiu. Foi relatado por um dos entrevistados que o
secretário de agricultura chegou a demitir um dos associados por contrariar
orientações suas no ano de 2008, o que, segundo o regimento da associação, é
ilegal. Atualmente os associados relatam ter autonomia para todas as ações que
envolvem a AMAFLOR.
3.4 PROGRAMA SOCIAL HABITACIONAL – PSH
O PSH (Programa Social Habitacional) trata-se de um programa criado pela
prefeitura municipal no ano de 2004 para moradores contemplados com moradias
populares ou que tiveram suas casas reformadas. Cada família beneficiada poderia
indicar um membro para participar do projeto de cultivo de sete variedades de
gérberas. No ano em que se iniciou o programa foram atendidas 29 famílias.
A área em que foi implantado o programa, correspondendo a
aproximadamente 1.900 m² (0,19 ha), foi cedida pela prefeitura municipal ao lado do
Projeto Piloto. Segundo uma entrevistada, a prefeitura, além da área, contribuiu com
a água usada na irrigação das flores. Os demais custos foram fruto de dois
financiamentos no Banco do Brasil e Banco do Nordeste realizado pelo programa.
36
As vendas da produção desse programa são realizadas principalmente pela
central de vendas, mantida pela prefeitura. Isso significa dizer que os membros do
referido programa não sabem quem são os compradores de sua mercadoria, já que
essa é intermediada por terceiros. Uma taxa de 20% sobre a venda das gérberas é
recolhida pela central de vendas para suprir os custos de transporte e de materiais.
Atualmente não há subsídios por parte do poder público. Isso demonstra certa
autonomia em decisões sem interferência de terceiros. Os insumos são comprados
no mercado local por integrantes do programa a partir das receitas obtidas com as
vendas.
O programa após dez anos de criado sofreu redução de 93% no número de
integrantes, contando atualmente com apenas duas membros. A renda gira em torno
de 300 a 400 reais por mês para cada uma. Nos meses mais fracos de vendas –
meados de janeiro, fevereiro, março e abril – é comum o faturamento chegar a ser
de R$ 0,00, ou seja, não há receitas nesse período. Segundo uma das integrantes
do programa, é comum ela complementar o orçamento fazendo diárias em outros
cultivos de flores de produtores individualizados.
3.5 PRODUTORES INDEPENDENTES DE “FUNDO DE QUINTAL” E ASSOCIAÇÃO
DO VALE DO JIQUIRIÇÁ
A Associação Fundo de Quintal reunia várias famílias que plantavam
principalmente copo de leite nos quintais de suas casas. Nessa pesquisa poucas
informações foram adquiridas a respeito desses produtores e o tempo de operação
da associação. Contudo, segundo as entrevistas realizadas, o funcionamento de tais
núcleos de produção ocorreu por pouco período de tempo.
A Associação do Vale do Jiquiriçá se localizava as margens do rio Jiquiriça,
próximo à sede do município. A terra era arrendada e a produção principal era de
crisântemo. Atualmente a associação está desativada. Uma parte da área foi
substituída por cultivos de hortaliças e feijão. Outra parte foi arrendada por dois
37
empreendedores para o cultivo de crisântemo e áster. Contudo, poucas informações
foram disponibilizadas a respeito de tal produção.
3.6 ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS DA RIBEIRA ALTA
A Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta se organizou no ano
2000 e se trata de um assentamento rural que envolve 30 famílias em uma área de
400 hectares. Cada família possui um lote de cinco hectares, totalizando 150 ha.
Cerca de 62,5% da propriedade corresponde a áreas de uso coletivo, ou seja, 250
hectares. Nessas áreas podem ser desenvolvidas atividades que envolvam vários
associados. O que é cultivado e quais as pessoas que se envolvem em cada cultivo
é definido pelos próprios membros da associação.
Ao contrário de outros assentamentos do município, a área do assentamento
foi adquirida através de um financiamento realizado pelo Banco do Nordeste para a
Associação Ribeira Alta. Ela se localiza na zona rural do município, distante 6 km da
cidade. Os 30 associados pagam anualmente uma parcela do financiamento ao
referido banco em um prazo de 20 anos. A quitação total ocorrerá no ano de 2021.
A produção de flores no assentamento iniciou em março de 2001 com o
incentivo do poder executivo do município. Este realizou um projeto junto aos
associados e subsidiou os insumos para o início da produção. Cada família ganhou
1000 mudas de rosas e assistência técnica por período de alguns meses para o
acompanhamento do cultivo. Em seguida, no que diz respeito à produção, os
associados mantiveram suas plantações de maneira autônoma.
Entre as 30 famílias do assentamento, 90% produzem flores. Antes da seca
esse número chegou a contemplar todas as famílias. Segundo o presidente da
Associação Ribeira Alta, Jeir Silva, a principal fonte de rendas dos associados é
oriundo das flores e essa atividade é o que norteia a associação.
É cultivado no assentamento rosas, áster, palma de santa rita e tango, sendo
a rosa o carro chefe. Contudo, a cerca de três anos a região está passando por um
período de seca muito forte. Essa seca é considerada a pior dos últimos 50 anos. A
principal fonte de água oriunda de um barramento do rio Jiquiriçá está seca a mais
de um ano. Com esse cenário, somente no assentamento Ribeira Alta, foram
38
perdidos mais de 500 mil pés de rosas. Devido à seca, alguns trabalhadores que
cultivavam rosas estão trabalhando em fazendas próximas devido à falta de água.
Mesmo com esse cenário de estiagem prolongada, a produção ainda é
enviada para o grande mercado consumidor por intermédio da central de vendas,
ligada a Secretaria de Produção da prefeitura. Semanalmente uma parte da
produção de flores da associação é destinada para Salvador e Feira de Santana
(distantes 365 km e 257 km de Maracás, respectivamente), como verificado no mapa
2. Um dos associados viaja juntamente com o caminhão para vender a produção
nesses centros consumidores. O que não é vendido retorna e geralmente a
produção é perdida. Na maioria das vezes a produção não sai com destino concreto,
ou seja, não sai vendida. É descontado cerca de 20% do total vendido para custear
despesas com o transporte.
Contudo, alguns produtores da associação comercializam e transportam sua
produção de forma autônoma. Os principais mercados nesses casos correspondem
a cidades próximas, como Jequié e Jaguaquara. Contudo, outros mercados mais
distantes também são alcançados, como Ipiaú e Santo Antônio de Jesus. Nessa
modalidade, a produção geralmente é transportada em veículos não isotérmicos e
refrigerados, percorrendo assim curtas distâncias e atendendo as cidades
circunvizinhas.
Por fim, a assistência técnica é por conta dos próprios associados. Eles
indicam que alguns técnicos da EBDA visitam de forma irregular o assentamento.
Contudo, não vão a campo nem desenvolvem outros tipos de assistência.
40
3.7 ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES RURAIS IRMÃ DULCE
A Associação dos Trabalhadores Rurais Irmã Dulce é um assentamento rural
ligado ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra). Trata-se de uma
área da EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuária) que está em
processo de desapropriação. Contudo, por mais de 30 anos, entre a década de 1970
até meados dos anos 2000, a terra foi apropriada por um posseiro. Em abril de 2003
houve a ocupação da área por trabalhadores rurais e em 2005 foi criada a
associação. A FETAG - Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Estado da
Bahia – foi o principal órgão, segundo os trabalhadores entrevistados, que apoiou o
processo de ocupação, resistência e, posteriormente, organizou a divisão dos lotes.
Cada família possui uma tarefa de terras. Isso, segundo o Ministério do
Desenvolvimento Agrário, corresponde na Bahia a 4.356 m² ou 0,43 hectares.
Foram beneficiadas com o assentamento 46 famílias. Contudo, somente 20
famílias vivem efetivamente no assentamento. Devido sua localização, distante 5 km
do centro da cidade, outras 26 famílias possuem somente o lote e vivem na zona
urbana do município. Se por algum motivo alguma família se desligar do
assentamento, outra substitui a anterior. O tamanho dos lotes é igual para cada
família, independentemente do número de membros de cada uma.
Segundo a Sra. Luzia, presidenta da associação, cerca de 11 anos depois da
ocupação existem sinais concretos que os títulos da terra serão emitidos. Os
assentados relatam a importância do título como uma segurança para a
permanência definitiva na terra e a possibilidade de alguns benefícios, como
aquisição de financiamentos, por exemplo.
Cada assentado pode produzir o que achar mais viável em seu lote. A lavoura
mais comum atualmente é a de hortaliças: uma parte para subsistência e outra
direcionada a feira livre da cidade. Também é comum lavouras de mandioca, aipim e
o cultivo de flores. Esta última atividade iniciou com 23 assentados no ano de 2004.
Atualmente, esse número corresponde a 12 assentados e cerca de 90% deles
produzem flores consociada com outra cultura. Estima-se que em todo
assentamento exista uma área de aproximadamente três hectares de cultivo de
flores, sendo as rosas a principal delas, seguido de flores de vasos.
41
O cultivo de flores no assentamento foi incentivo de um associado que
realizava o plantio anteriormente. Segundo algumas entrevistas, a prefeitura
colaborou também com assistência técnica e sazonalmente subsidiando insumos.
É interessante ressaltar aqui que apesar dos assentados estarem em uma
associação, cada umas delas cultivam independentemente. Não existe, por
exemplo, o trabalho coletivo de um membro no lote de outro quando necessário,
como acontece na AMAFLOR onde o trabalho com terra é comunitário. De maneira
geral, o mesmo ocorre na venda da produção. Cada produtor tenta realizar a venda
de maneira independente.
O mais comum é a produção ser intermediada pela Central de Vendas da
Prefeitura. Contudo, quando não há destino certo, e isto é o mais comum de ocorrer,
um vendedor tentar realizar as vendas no destino. A produção da Associação dos
Trabalhadores Rurais Irmã Dulce, quando intermediada pela Central de Vendas da
Prefeitura, é levada para a capital baiana (mapa 3), juntamente com a produção das
demais associações (exceto a AMAFLOR) semanalmente, as segundas feiras e,
com menos frequências, duas vezes por semana. Pelo uso do veículo e para custear
as despesas, 20% do que é vendido é recolhido pela central de vendas.
Outra modalidade menos comum, mas que ocorre, são os atravessadores
que compram diretamente com os associados. Nesse caso, novamente não há uma
venda pela associação. Cada produtor realiza sua venda de acordo os preços
oferecidos pelo atravessador. Entende-se aqui que isso seja um ponto negativo, pois
em vez de fortalecer a atividade da associação ocorre o contrário, existindo assim
uma concorrência entre os próprios associados.
A assistência técnica, segundo informado, fica por conta de um técnico da
EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola. Contudo, foi informado
também, que tal assistência ocorre muito sazonalmente e é quase inexistente.
O primeiro produtor de flores do assentamento é conhecido como Genival. Ele
produz rosas a mais de dez anos. Boa parte de sua produção é negociada pela
central de vendas e encaminhada para Salvador. Isso acarreta um problema: ele
não sabe quem são os compradores. Por conta disso, possui dificuldade em ter
mercado fixo. Além disso, grande parte do que é transportado para a capital baiana
é enviado para a comercialização sem vendas prévias. Isso faz com que, muitas
vezes, sua produção fique ociosa e com as vendas irregulares.
43
A falta de mercado e regularidade força o produtor a vender, por exemplo, um
pacote de rosas que contém 20 unidades e custa no atacado R$ 15,00 por um preço
muito inferior, alcançando valores entre R$ 5,00 a R$ 6,00 o pacote. Isso é praticado
para a mercadoria não retornar e não acarretar prejuízos pela falta de vendas. Este
fator é interpretado nesta pesquisa como negativo para os produtores e para a APL
de Maracás como um todo pela desvalorização da produção local.
Outro fator são as vendas a prazo. Algumas mercadorias chegam a ser
intermediadas pela central de vendas com cheques a serem pagos em 60 dias. Ou
seja, trata-se de um retorno não imediato e, para o pequeno produtor, isso acarreta
dificuldades pela falta de capital para investimento na lavoura de flores. Além disso,
os trabalhadores são afetados pelo atraso no pagamento de seus vencimentos e
pela diminuição nos postos de trabalho. Isso é apontado, por produtores e
trabalhadores, como fator de dificuldades na geração e distribuição de rendas e,
inclusive, de endividamento de muitos produtores.
Devido a essas circunstâncias, o cultivo está caindo tanto em área como em
número de famílias. Segundo os entrevistados a área de cultivo já foi 50% maior e a
quantidade de associados que plantam flores caiu de 23 para 12. A tendência,
segundo eles, é o número cair ainda mais, haja vista a desistência ou diminuição do
cultivo de flores pelos assentados em prol de outras lavouras.
Por fim, as entrevistas revelaram unanimidade em considerar “Maracás a
Cidades das Flores” apenas como uma questão de marketing. Segundo eles, as
dificuldades e a falta de assistência que passam os produtores não faz jus ao slogan
do município. Além disso, eles apontam que no assentamento apenas um assentado
vive exclusivamente de flores. Portanto, não se trata de um município que vive
exclusivamente ou maciçamente dessa atividade.
44
4 CAPÍTULO III – OGANIZAÇÃO E ATUAÇÃO DOS PRODUTORES INDIVIDUAIS
DE FLORES
No município de Maracás existem cinco produtores individuais de flores.
Neste capítulo serão analisados quatro desses núcleos produtivos: Rege Flores;
produtor Jeriosvaldo Cruz; Botelho Flores e o produtor José Salvador. O quinto
produtor não será analisado nesta pesquisa devido a poucas informações
disponibilizadas. O objetivo é abordar a estrutura e funcionamento desses núcleos
produtivos, as relações de trabalho, o mercado consumidor da produção e possíveis
conflitos, como disputas territoriais por mercado.
4.1 REGE FLORES
A relação entre o produtor Reginaldo Santos com o cultivo de flores teve inicio
no final da década de 2000 na Associação dos Trabalhadores Rurais da Ribeira Alta,
distante 6 km da cidade de Maracás. A associação corresponde a 30 famílias
assentadas em uma área de 400 hectares. Reginaldo cultivava plantios tradicionais,
tais como mandioca, feijão e hortaliças. Ainda no ano de 2003, sua esposa plantou
500 pés de rosas no assentamento. Depois de realizado o cultivo e ampliando o
plantio com outras espécies de flores, Reginaldo observou que a produção de rosas
regulamente era mais rentável que suas lavouras. Após alguns anos de resistência
ele abraçou a ideia de plantar flores no ano de 2008 e, atualmente, é proprietário de
uma empresa de flores: a Rege Flores. A empresa trabalha desde o cultivo,
beneficiamento, transporte e comercialização de flores.
Apesar de ter seu início no Assentamento Rural Ribeira Alta, sua produção
atualmente encontra-se em outra propriedade, distante cerca de 5 km do
assentamento. O ano de 2012 foi marcado por uma seca muito forte. A falta de água
atingiu o Assentamento Ribeira Alta e muitos assentados perderam suas lavouras.
Essa seca fez com que Reginaldo perdesse cerca de 100 mil pés de rosas na
localidade.
No ano de 2002, Reginaldo adquiriu uma fazenda, medindo 85 hectares, a ser
paga em longo prazo. Com o documento da fazenda conseguiu realizar diversos
45
empréstimos e financiamentos bancários. Isso demonstra a importância do título da
terra e os benefícios que isso pode render. Sem o título de propriedade existe uma
dificuldade grande na aquisição de recursos, como o empréstimo bancário. Nesse
sentido, quando a seca atingiu a produção no assentamento, ele iria transferir todo o
cultivo para a fazenda adquirida em 2002. Tal fazenda possuía um histórico de
criação de gado que sempre foi objetivo de trabalho de seu pai que também é
produtor rural. A partir da seca do ano de 2012 foi então firmada uma parceria entre
a Regi Flores e o pai de Reginaldo. O primeiro passou a usar as terras de dez
hectares do segundo. Esta propriedade possui água em abundância por está
localizada próximo ao rio Jiquiriçá e ainda possuir duas nascentes. Como resultado
da parceria, a fazenda de 85 hectares passou a ser administrada por seu pai para
criação extensiva de gado.
Atualmente, segundo dados da própria Rege Flores, são produzidos oito tipos
de flores (rosa, áster, tango, crisântemo, murta, folhagens, vasos ornamentais e
statice), sendo as rosas o “carro-chefe” com 140 mil pés plantados no município de
Maracás. Essa produção é realizada em uma área de quatro hectares. Toda
produção é realizada em céu aberto, sendo toda ela irrigada por gotejamento e/ou
aspersão, a depender do tipo de flor cultivada. A água usada é proveniente de uma
das nascentes do rio Jiquiriçá. Os insumos adquiridos no mercado local trata-se de
adubos e agrotóxicos. Outros insumos como bulbos e sementes são oriundos de
São Paulo. Isso demonstra que Maracás não se desponta como inovadora de
tecnologia, apenas como uma região produtora. O desenvolvimento de novas
tecnologias e/ou técnicas de cultivos e o desenvolvimento de sementes e afins, por
exemplo, poderia agregar valor, aumentando as receitas e qualidade das flores.
4.1.1 Organização do trabalho
Em 2008, no início do cultivo existia apenas um único funcionário para o trato
com as flores. Em 2009 o número de funcionários passou para duas pessoas.
Atualmente esse número corresponde a 34 pessoas. Verifica-se que em um período
de cinco anos (2009 - 2014) houve um aumento do número de trabalhadores de
aproximadamente 94%. A perspectiva é de dobrar tal número, haja vista que a
46
pretensão é de também dobrar a área do cultivo, passado de quatro para oito
hectares.
É interessante apontar que existem duas formas de trabalhadores na Rege
Flores. A primeira se trata dos trabalhadores assalariados, correspondendo a seis
pessoas e o segundo que se trata dos denominados de parceiros. O número de
assalariados corresponde a 18% do total de trabalhadores. Isso é devido “aos custos
trabalhistas serem muito altos. Manter um trabalhador de carteira assinada é uma
despesa que em muitos casos não compensa” (SANTOS, 2014). Nessas
circunstâncias, foi realizada uma espécie de parceria.
Desde que esse sistema foi implantado a Rege Flores aumentou a produção
e o número de trabalhadores consideravelmente. A organização do trabalho
funciona da seguinte forma. Os parceiros entram com o trabalho. Insumos e
estruturas, como sementes, bulbos, Iluminação, irrigação, adubo, veneno e
assistência são de responsabilidade da Rege Flores. A produção é dividido 50%
para ambas as partes, segundo aponta o produtor Reginaldo. A principal fonte de
mão de obra empregada é de homens, 27 pessoas. O número de Mulheres
corresponde a sete.
Fora da área de sua propriedade ele possui ainda três outras parcerias.
Operam da mesma forma das demais. O ganho da Rege Flores com esse sistema
ocorre pela soma de todas suas parcerias. O ganho é em quantidade, ou seja, é
justamente totalizando tudo o que é produzido de todos os seus colaboradores que
ele consegue suprir o mercado. O volume produzido é maior se realizado dessa
maneira, se comparado com a produção realizada individualmente. Com a
constância da produção a Rege Flores consegue atender o mercado regulamente
com a própria mercadoria, não sendo necessário comprar de outros fornecedores
para atender sua clientela. A constância o torna um fornecedor confiável. Além
disso, as despesas são altas e regulares em qualquer época do ano. Por isso a
importância de ter sempre mercado consumidor.
47
4.1.2 Conhecimento acumulado e assistência técnica
O conhecimento técnico é uma importante ferramenta para o desenvolvimento
de qualquer cultivo. Isso devido ao fato de que trabalhar sem o referido
conhecimento eleva os custos e o ciclo de cada produção tende a ser maior.
Reginaldo aponta ser o próprio responsável técnico de sua propriedade e que
conhece variados tipos de pragas e os procedimentos para combatê-las. “Não sou
agrônomo, mas faço o papel dele no campo, desde o diagnóstico até o tratamento”
(Santos, 2014). Quando iniciou o plantio de flores ele não possuía conhecimentos
do trato dessas plantas. Seus conhecimentos provinham de outros cultivos. Trata-se
de um conhecimento adquirido por muitos anos de experiência e que não pode ser
desprezado. E tal conhecimento foi imprescindível para prosseguir com o negócio.
Fato curioso em um momento da entrevista com Reginaldo foi quando um de seus
parceiros o procurou mostrando uma folha que continha uma praga. De prontidão
Reginaldo identificou do que se tratava, o motivo pelo qual a praga apareceu, o
produto e as doses a serem aplicados e a quantidade de dias que este reagiria e
combateria a praga. Portanto, o conhecimento adquirido outrora foi imprescindível
para a lavoura de flores.
A presença de organizações de fomento como o SEBRAE seria de grande
importância para orientação e instruções no cultivo, essencialmente quando este
estiver em fase de implantação ou início de operação. Contudo, Reginaldo não
aponta à presença do SEBRAE em momento algum de seu negócio, tampouco a
assistência técnica de outras instituições. Aponta ainda que o poder público
municipal não exerce parceria ou muito pouco contribui com seu negócio de flores.
Entretanto, afirma que a prefeitura apoia os produtores menores com transporte e
ações outras.
Em relação à produção orgânica de flores Reginaldo afirma que não
desenvolve em seus cultivos. Quanto maior a área, de qualquer cultivo que seja,
existe uma dificuldade maior para o controle biológico de insetos e pragas. Por isso
muitos agricultores afirmarem que quando aumenta a área de produção, o plantio de
orgânicos não funciona. Reginaldo quando questionado a respeito do tema aponta a
importância dos orgânicos como alimento. Para a produção de flores afirma que tal
prática é indiferente. Afirma ainda que, apesar dos riscos do manuseio dos
agrotóxicos, é imprescindível o uso dos mesmos. Dificilmente se encontraria
48
mercado para comercialização de flores orgânicas. Isso devido à qualidade e
durabilidade do produto, estipulado pelo próprio mercado.
No que se refere ao armazenamento de flores, a Rege Flores não possui um
equipamento essencial chamado câmara fria. Tal equipamento consegue aumentar
a durabilidade das flores em cerca de dez dias. A colheita é realizada num dia e o
transporte realizado no dia subsequente. Contudo, a necessidade de ter o aparelho
de refrigeração se justifica pelo fato de poder realizar a colheita de flores mais vezes
na semana e armazenar adequadamente as mesmas, aumentando a durabilidade e
reduzindo as perdas.
4.1.3 Conflitos
O produtor Reginaldo quando iniciou sua produção de flores no ano de 2008
não possuía meios próprios de escoamento da produção. Também não tinha um
mercado fixo, com uma clientela consolidada. A produção era escoada através do
veículo da Secretaria de Produção de Maracás. Existe no município, além deste
veículo, outro pertencente à AMAFLOR. Ambos frutos de uma parceria com o
governo do estado, que doou os dois veículos. Os dois caminhões também
transportam produções de terceiros e é cobrada uma porcentagem para realização
da condução.
Inicialmente, uma boa parte da produção de Reginaldo era vendida pela
central de vendas. Este setor é ligado à prefeitura municipal e responsabiliza-se pela
venda de flores para diversos compradores no estado, como dito no capítulo
anterior. Essa central era responsável por vender a produção da Unidade Piloto
ligada a prefeitura. Quando faltavam flores para atender a demanda solicitada era
encomendada na mão de terceiros para complementar as entregas. Essas
encomendas foram essenciais para sobrevivência de Reginaldo quando estava no
começo de produção, já que não possuía mercado consolidado.
O produtor Reginaldo transportava também sua mercadoria para Salvador,
Ilhéus e Itabuna, através do veículo da Secretaria de Produção (coordenado por
“associados” do Projeto Piloto) na tentativa de serem comercializadas de forma
49
avulsa. Quando ocorria isso, uma ajuda de custo era repassada para auxílio nas
despesas do caminhão e do vendedor.
É preciso assinalar que o veículo supracitado era subsidiado pela Prefeitura
de Maracás. Atualmente esta custeia o óleo e a manutenção, mas, do ano de 2003
até o ano de 2011, custeava também o motorista. Ou seja, até o ano de 2011 o lucro
com a venda das mercadorias era livre de custos. Contudo, a ajuda de custo
cobrada (pelos gestores do veículo – “associados” do Projeto Piloto) de outros
produtores pelo serviço de transporte variava entre 30% a 35% a partir do volume
transportado e vendido.
Por conta desse valor arrecadado, houve um conflito entre Reginaldo e os
responsáveis por gerir o veículo da Secretaria de Produção. Segundo Reginaldo, em
um dos transportes realizados pelo caminhão das flores foi embutida uma taxa de
cerca de R$800,00, equivalente a 35% do volume transportado vendido. Ou seja,
cada pacote de flores ocupava um volume e em cima da soma de todo volume
enviado e que fosse vendido era calculado o valor a ser pago pelos não associados.
Era cobrada essa taxa em cima do volume a ser transportado para os produtores
não associados que quisessem usar o veículo. Entretanto, Reginaldo discordou do
cálculo. Segundo ele, a despesa do caminhão em uma única viagem girava em torno
da metade do que ele, nessa ocasião, pagou, ou seja, cerca de R$ 400,00. Ele
observou que, sozinho, custeava a despesa de toda viagem e ainda sobrava o dobro
do valor para a os associados responsáveis pelo caminhão. Na época (2010), além
dele, outros dois produtores não associados pagavam valores de acordo o volume
transportado.
Reginaldo não aponta nenhuma ilegalidade realizada pelos associados nessa
prática. Inclusive relata que era justo pagar um valor para o transporte. Contudo, era
abusiva a taxa. Existia uma espécie de monopólio dos transportes das flores. Ele
relata ainda que os associados passaram a viver de rendas: da produção que
compravam em sua mão e revendiam para complementar os pedidos e, ainda, do
valor cobrado pelo uso do veículo pelas flores que transportavam de terceiros. A
associação tinha uma espécie de monopólio, justamente por possuir um veículo
adequado para o transporte. Isso fez dos associados da unidade piloto não mais
produtores, mas comerciantes de flores, sobrevivendo dessas rendas. Nesse
sentido, Reginaldo passou a não mais concordar com o valor pago e decidiu vender
e transportar por conta própria sua produção. Com essa opção tomada e
50
demonstrando os valores pagos, os demais produtores individuais, segundo ele,
também passaram a não realizar tal transporte.
Quando a produção de Reginaldo passou a ser transporta por ele mesmo e
sua mercadoria não mais repassada, ele atingiu boa parte das receitas dos
“associados” do Projeto Piloto. Ainda segundo Reginaldo, o projeto perdeu força por
praticamente parar de produzir e passar a sobreviver de rendas como receita
primária, oriunda principalmente dos valores cobrados pelo transporte das
mercadorias dos produtores não associados e pela aquisição de produtos de
terceiros. Com a ruptura dos produtores individuais e a redução do plantio (que
acontecera antes da ruptura), a qualidade das flores do Projeto Piloto foi afetada e,
por conta disso, a participação desse núcleo produtor no mercado afetado.
A partir desse quadro não ficou interessante o desligamento do produtor
individualizado. A taxa cobrada por volume então sofreu uma redução em quase
50%, ou seja, cerca da metade. Caiu de cerca de 35% para 18%. Mesmo assim, um
único produtor individualizado, a depender do volume transportado, continuava a
custear todo o transporte. É apontado que já na época (por volta de 2010), a
produção dos três produtores individuais que utilizavam o serviço de transporte era
superior aos de todas as associações de Maracás.
Com a ruptura com a associação, a alternativa encontrada por Reginaldo foi
transportar sua produção em um caminhão próprio, porém antigo e inadequado. Foi
confeccionado um baú forrado de lona para realização das viagens até Itabuna,
distante 257 km de Maracás, como demonstra a imagem 5. Na primeira viagem a
carga não resistiu, principalmente por ficar exposta ao calor. As flores chegaram ao
destino já murchas e danificadas. Ocorria nesta forma de transporte uma espécie de
cozimento da mercadoria. Com a primeira tentativa frustrada tentou-se o transporte
em um veiculo de passeio utilizando o ar-condicionado na tentativa de conservar as
flores. Foi relatado que com esse método, ao chegar à cidade de Ipiaú, distante 138
km de Maracás a carga estava toda perdida. A flor quando exposta ao ar-
condicionado resseca e desidrata.
Por duas semanas consecutivas toda a produção foi perdida por falta de
mercado e de transporte adequado. Com esse resultado, as flores que conseguiam
chegar ao destino sadias eram distribuídas nas floriculturas por não conseguir
vendas, a fim de somente de divulgar o produto e a qualidade do mesmo. Contudo,
como fornecer o produto com um transporte adequado? Nessas circunstâncias uma
51
nova estratégia fora adotada. Uma lona de qualidade superior e branca, para refletir
os raios solares e diminuir a temperatura interna foi usada no lugar da antecessora.
Além disso, foi usada uma estrutura com compensado, também na tentativa de
diminuir o calor interno. Nessas circunstâncias, o transporte não era o ideal, mas
tornou-se possível. Após quatro semanas sob essas novas condições, as
encomendas conseguiram custear as despesas. Após isso, as encomendas
aumentaram de forma significativa.
Por duas semanas consecutivas toda a produção foi perdida por falta de
mercado e de transporte adequado. Com esse resultado, as flores que conseguiam
chegar ao destino sadias eram distribuídas nas floriculturas por não conseguir
vendas, a fim de somente de divulgar o produto e a qualidade do mesmo. Contudo,
como fornecer o produto com um transporte adequado? Nessas circunstâncias uma
nova estratégia fora adotada. Uma lona de qualidade superior e branca, para refletir
os raios solares e diminuir a temperatura interna foi usada no lugar da antecessora.
Além disso, foi usada uma estrutura com compensado, também na tentativa de
diminuir o calor interno. Nessas circunstâncias, o transporte não era o ideal, mas
tornou-se possível. Após quatro semanas sob essas novas condições, as
encomendas conseguiram custear as despesas. Após isso, as encomendas
aumentaram de forma significativa.
Segundo Reginaldo, sua mercadoria era de melhor qualidade do que as
produzidas pelos associados. O resultado foi que sua concorrência fez frente ao
produto comercializado por eles. Vale destacar que a central de vendas e os
associados compravam sua produção e repassavam para o mercado. Então, não se
Imagem 5: Transporte improvisado da produção de flores e veículo isotérmico refrigerado.
Fonte: Érico Santana, 2014.
52
tratava de uma nova mercadoria, apenas houve uma reestruturação na distribuição e
do fornecedor destas, que passou a ser feita pelo próprio produtor diretamente aos
compradores.
Além de não mais transportar pelo veículo da associação, Reginaldo firmou
parceria com os outros dois produtores individuais e, por um período, passou a
transportar a mercadoria de ambos. Isso aumentou ainda mais os conflitos com os
associados. Segundo Reginaldo, houve a tentativa de fazer com que ele se retirasse
da linha de comercialização com o sul da Bahia, sob a alegação que esta era de
autonomia dos associados.
Outras propostas foram formalizadas, como a queda do percentual a ser
cobrado para suprimento das despesas do veículo de 35% para menos de 8%. Tal
proposta não foi aceita por Reginaldo que continuou a transportar sua mercadoria de
flores em um baú improvisado por dois anos. Atualmente este produtor conta com
um veículo equipado com câmera fria, realizando desde a etapa de produção até a
distribuição do produto, como pode ser verificado na imagem 5.
4.1.4 Mercado consumidor da Rege Flores
O principal mercado em que a Rege Flores atua é o sul da Bahia (Ilhéus e
Itabuna), com perspectiva de atender o sudoeste, na região de Guanambi e Caetité,
como verificado no mapa 4. O transporte é realizado uma ou duas vezes na semana,
a depender da demanda e da época do ano. Ao ser questionado o que o leva a não
comercializar em Salvador, maior mercado da Bahia, Reginaldo afirma que se trata
da demanda de preços. Ele ressalta que produz com qualidade alta e não aceita
vender com baixos preços. Isso demonstra que existe em Salvador uma forte
demanda, mas também uma grande oferta e isso reduz os preços. Trata-se da lei de
oferta e demanda onde, nesse caso, o preço é muito disputado. Com isso ele busca
atingir mercados menos valorizados onde, segundo ele, São Paulo – maior produtor
nacional – não atinge. Ou seja, enquanto os produtores de São Paulo alcançam o
grande mercado consumidor, a Rege Flores se desponta no sentido contrário,
alcançando mercados menos concorridos no sul do estado da Bahia, por exemplo.
54
Atualmente, a Rege Flores conta ainda com uma floricultura na cidade de
Maracás para atender a demanda local, onde são vendidos arranjos, buquês e
artigos relacionados com flores. Existe a tendência da floricultura atender a
cerimoniais e eventos.
Por fim, Reginado destaca que antes do cultivo de flores não tinha um foco de
produção, sendo suas lavouras produções aleatórias. Atualmente destaca um
enorme público mais qualificado que visita a sua propriedade, incluindo
universidades, instituições de pesquisa, emissoras de TV e jornais, o que atribuiu
maior visibilidade e reconhecimento de seu trabalho.
4.2 PRODUTOR JERIOSVALDO CRUZ
O produtor Jeriosvaldo Evangelista Cruz reside no bairro Maracaizinho, em
Maracás, e iniciou o cultivo em fundo de quintal, especificamente com produção de
copo de leite. Tratava-se de uma produção em pequena escala, iniciada no início da
década de 2000. Ele sofreu influência da Associação São Matheus. A presidente da
referida associação, Maria Amália Rocha é conjugue de Jeriosvaldo. Contudo, ele
sempre realizou seus cultivos de flores de forma independe da associação.
A qualidade do cultivo de copo de leite realizada por Jeriosvaldo chamou a
atenção de floricultores tanto do estado da Bahia quanto de outros estados. Uma
equipe de Holambra, em certa ocasião, fora a Maracás visitar quase que
exclusivamente o plantio dessa flor cultivada por Jeriosvaldo. A visita consistia em
analisar sob quais condições ocorria o desenvolvimento dessa planta.
Provavelmente a intenção era verificar e aplicar algum método que, por ventura,
fosse benéfico ao desenvolvimento dos cultivos realizados em São Paulo.
Após o sucesso obtido com o cultivo de copo de leite, a plantação foi
expandida, alcançando 0,5 hectares. Outras variedades de flores foram inseridas,
tais como: palma de Santa Rita e rosas. Todo custo de produção é coberto por
Jeriosvaldo. Não há subsídios de qualquer instituição. Em comparação com outros
produtores individuais do município, sua área de produção é menor em área e em
produção. Questionado a respeito da expansão de seus cultivos ele afirma que isso
ocorre de maneira muito tímida, quase estacionada. A falta de capital para
55
investimento é apontado como fator principal de expansão. O quintal em que ele
iniciou plantando copo de leite é próximo ao local da então Associação Comunitária
São Matheus. Com a desativação da associação, Jeriosvaldo ocupa parte do espaço
antes preenchido pelos associados da São Matheus e a meta é alcançar uma área
produtiva de um hectare.
Uma parte da produção de Jeriosvaldo é destinada, semanalmente, para
Salvador. Grande parte do que é transportado para a capital já é deslocada com a
produção vendida. Contudo, existe também uma quantidade avulsa levada para
comercialização. O que não é vendido retorna e geralmente essa produção é
perdida pela não resistência da flor. Além disso, existem atravessadores que
compram diretamente na propriedade de Jeriosvaldo. Essa produção é levada para
municípios baianos como Aiquara, Iaçu e alcançando mercados como Itambé, como
demonstrado no mapa 5.
Quando enviada para Salvador, a mercadoria é escoada pelo único veículo
que está em funcionamento, que pertence a Secretaria de Produção de Maracás,
mas, atualmente, atende tanto a AMAFLOR quanto as demais associações e
produtores que queiram transportar nele. O outro veículo encontra-se desativado e
um novo está sendo adquirido em substituição. Este substituto será destinado a
AMAFLOR. Para realizar o transporte o produtor paga uma taxa que varia entre 15%
a 20% do volume transportado. Ela é paga para auxiliar no pagamento do motorista,
registrado com carteira assinada pela AMAFLOR. Despesas com manutenção e
combustível são subsidiadas pela Prefeitura de Maracás.
O poder executivo municipal é apontado como parceiro. Isso é atribuído ao
fato de poder contar com o transporte das flores ao mercado atacadista em Salvador
que, sempre que necessário, pode ser realizado pelo veículo ligado a Secretaria de
Produção. Além disso, a água usada pelo produtor é oriunda de um poço artesiano
fruto de uma benfeitoria da prefeitura para a então associação São Matheus.
O cultivo de flores acabou envolvendo toda a unidade familiar. A primeira
floricultura de Maracás, criada no ano de 2004 e denominada Mara Flores, foi criada
a partir da produção desenvolvida nos quintais desta família. Devido ao trato com
flores, arranjos e buquês de flores foram desenvolvidos pelos filhos e cônjuge de
Jeriosvaldo. A floricultura não teve relação e não era interligada com a Associação
São Matheus. Atualmente, eventos e cerimoniais são cobertos pela Mara Flores e
57
todas as flores usadas para ornamentar tais celebrações são de plantio próprio. As
exceções se dão por plantas ornamentais, como bonsais, que são oriundas de
Holambra – SP.
Não foi identificado nesta pesquisa que o encerramento da Associação São
Matheus ocorreu por competição com o produtor Jeriosvaldo Cruz, tampouco ambos
disputavam o mesmo espaço.
4.3 BOTELHO FLORES
A Botelho Flores é uma empresa do ramo de flores que atua em Maracás
desde o fevereiro do ano de 2013. Trata-se de um plantio de três sócios, dois irmãos
e um primo (Adão Botelho e Noel Botelho – irmãos; Rony Botelho – Primo). A
propriedade corresponde a aproximadamente oito hectares e o cultivo de flores
ocupa uma área de um hectare, sendo a rosa a única espécie cultivada. A
perspectiva é aumentar a área para dois hectares até o final do ano de 2014. Ao
contrário da Regi Flores, todos os funcionários das Botelho Flores são assalariados.
No total são doze funcionários de carteira assinada, sendo três mulheres e nove
homens. Foi identificado nessa pesquisa, de acordo a entrevistas com alguns
funcionários, o regime de trabalho realizado com carteira assinada.
A Botelho Flores está instalada em dois municípios: Maracás e Vitória da
Conquista. Este último município é onde está a matriz da empresa, onde a maior
infraestrutura está implantada, como os veículos, equipamentos como câmara fria e
a central de distribuição e vendas. Ou seja, na filial de Maracás está somente o
processo de produção. A colheita quando realizada é enviada de imediato para
Vitória da Conquista em um caminhão equipado com câmara fria da própria empresa
e de lá segue para o mercado. A empresa possui também outro veículo sem o
equipamento de refrigeração.
O principal mercado da Botelho Flores é a cidade de Salvador, em seguida
Feira de Santana. Contudo, a empresa atende também o eixo Itabuna e Ilhéus, além
da própria Vitória da Conquista, como apontado no mapa 6. É apontado que muito
raramente ocorre a presença do atravessador. Isso se deve ao fato da própria
empresa transportar e comercializar sua produção para o mercado atacadista,
58
agregando valor à atividade. Segundo Adão Botelho, um dos sócios da empresa,
alguns atravessadores começaram também a produzir e isso dinamizou e
reestruturou o mercado. Ele afirma que devido a isso a empresa foi obrigada a
procurar varejistas e atacadistas no próprio mercado, substituindo assim a figura do
atravessador. Segundo Adão Botelho, cerca de 35% das rosas da Botelho Flores é
vendida para um único atacadista situado na cidade de Salvador. Existe a
perspectiva de outros mercados, principalmente Brasília. Contudo a produção ainda
não é grande suficiente ser direcionada para esse centro consumidor.
Segundo Adão, a atividade de flores na Bahia cresceu de forma significativa,
principalmente nos últimos 15 anos. Mas aponta que a falta de conhecimento técnico
como principal fator de entrave para esse crescimento. Isso reduz a produtividade e
eleva os custos. Ele cita o município de Holambra como referência. Segundo ele,
existe um domínio muito extenso de técnicas de cultivo desenvolvido em tal
município. Para reforçar sua fala, ele descreve que os produtores de Atibaia (grande
produtora de flores do estado de São Paulo) visitam todas as feiras de
equipamentos e tecnologias que ocorre anualmente em Holambra. Este município
concentra todas as novidades do setor.
Ele aponta que um de seus sócios, Noel Botelho, justamente pelo
conhecimento adquirido no plantio de flores atuou em vários locais no estado
prestando assistência técnica, inclusive em Maracás. Essa assistência no município
foi prestada quando ele atuava junto ao SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas) em parceria com o poder público municipal. A
assistência foi prestada para algumas associações no início dos anos 2000. Apesar
disso, não houve nenhuma parceria com o poder público ou outras instituições como
Sebrae e afins para a implantação da Botelho Flores em Maracás.
Os insumos usados pela Botelho Flores como adubos e fertilizantes são
comprados no mercado local. Contudo os agrotóxicos são comprados em Vitória da
Conquista. A questão de custo é apontada como fundamental para realização da
compra em tal município. Alguns adubos que ainda não são encontrados na região
são encomendados de São Paulo.
Todo cultivo de rosas da Botelho Flores é irrigado por aspersão. São dois
poços artesianos cuja perfuração foi custeada pela própria empresa e assessorada
por profissional geólogo. Isso demonstra que se trata de uma empresa com certo
grau de organização e estrutura. A soma da vazão corresponde a 4500 l/hora, o
60
o suficiente para atender a demanda dos 60 mil pés de rosas que cultiva.
A colheita das rosas é apontada como ideal pela Botelho Flores ser realizada
três vezes por semana. Contudo, como toda estrutura está em Vitória da Conquista
à colheita é realizada duas vezes na semana. Toda colheita é enviada para a sede e
de lá distribuído para o mercado. Muito raramente a produção da Botelho Rosas sai
diretamente de Maracás para o mercado. Somente quando ela está muito baixa.
Quando assim ocorre a logística é realizada inversamente: o veículo sai de Vitória
da Conquista, passando por Maracás e direcionado para o mercado. Isso porque
quando direcionada para a sede, a produção oriunda de Maracás é estocada em
câmara fria e, quando a produção é pouca, o gasto com transporte e estocagem não
compensa, gerando assim prejuízos. As rosas após colhidas recebem tratamento a
base de conservantes e conseguem suportar 16 dias na câmera fria. Toda
pulverização e manejo pós-colheita é direcionado para a resistência da flor por tal
período. O carro chefe da empresa são as rosas vermelhas e brancas. Contudo, são
produzidas outras 17 variedades.
Um dos sócios da Botelho Flores quando questionado sobre o rótulo de o
município ser considerado a cidade das flores descreve que se trata de uma questão
de marketing. Ele classifica como muito pequena a participação de tal cultivo para a
economia do município. Ele possui 18 anos de experiência com o cultivo de flores,
sendo oito desses anos de experiência adquirido no estado de São Paulo, na região
de Atibaia, uma das maiores produtoras de flores daquele estado. Ele destaca
conhecer regiões produtoras como Holambra e Campinas. Segundo ele, um
pequeno produtor inserido no agronegócio das flores no estado de São Paulo, onde
sua produção alcança o mercado nacional, o número de roseiras plantadas
ultrapassa 300 mil. Aponta, ainda, que no estado de Minas Gerais e São Paulo
existem propriedades com mais de 10 hectares produzindo somente rosas. Portanto,
considerando a quantidade de flores produzidas, o número de pessoas empregadas
e o volume comercializado, ele enxerga apenas como propaganda a denominação
Maracás Cidade das Flores.
61
4.4 PRODUTOR JOSÉ SALVADOR
No ano de 2002 José Salvador, conhecido como “Lasca Gato”, que é natural
de Entre Rios – BA, teve conhecimento da produção de flores no município de
Maracás. Através do programa de TV Globo Rural e outras reportagens que
denominavam Maracás Cidade das Flores, houve o interesse em conhecer a
atividade e instalar o cultivo no município. Salvador, ainda no ano de 2002, em
contato com o então Secretário de Agricultura de Maracás da época, marcou uma
visita para conhecer os cultivos e a possibilidade de montar um empreendimento
ligado com flores no município.
Segundo o Sr. Salvador, ele possuía no munícipio de Entre Rios 10 tarefas de
terras (equivalente a 4,3 hectares) e uma edificação na propriedade. Realizou a
venda desta por 70% do valor de mercado para obter capital suficiente para
implantar o cultivo de flores em Maracás.
Em Maracás houve o problema de encontrar terra. Existia uma preferência
por parte do produtor, por questão de logística, da terra ser próxima à sede
municipal e possuir água para irrigação. Ele comprou uma área situada a 5 km do
centro da cidade. Contudo a terra pertencia a EMBRAPA (Empresa Brasileira de
Pesquisas Agropecuária) o intermediador da venda era um posseiro sem o
respectivo título da terra. Na falta de outra oportunidade foi realizada a aquisição da
propriedade.
Um ano e dois meses já instalado na terra, esta foi ocupada pelo MST
(Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) como forma de reivindicar a
desapropriação desta. Salvador relata que foi convidado pelo movimento a participar
da ocupação para não perder a posse de sua propriedade. Logo, se juntou ao
movimento e, em tese, trata-se também, de um assentado mesmo não tendo
vínculos efetivos com o movimento. Contudo, ressalta que mais de dez anos se
passaram e o título da propriedade ainda não está em mãos e teme ser relocado
para outra área.
62
4.4.1 Organização do trabalho
Segundo é relatado por José Salvador, a atividade de cultivo de flores não
rende tanto quanto já rendera em outrora e atribui a isso os custos de mão de obra
muito elevados. Ao contrário da Botelho Flores, onde os trabalhadores são
contratados com carteira assinada, na propriedade de José Salvador o regime de
trabalho ocorre por diária. O número de diaristas varia de acordo a época do ano.
Próximo a datas comemorativas o número pode alcançar 25 a 30 diaristas. Contudo,
em média, o número de contratados gira em torno de 22 trabalhadores. O valor da
diária é de R$ 30,00. O regime de trabalho é de segunda a sábado e a soma mensal
corresponde a R$ 720,00, valor quase equivalente a de um salário mínimo. Por
semana existe um gasto, somente com funcionários, de R$ 3.960,00. Isso é
equivalente a R$ 15.840,00 mensais. Contudo, os encargos trabalhistas não são
recolhidos. Caso haja uma obrigatoriedade no pagamento desses custos
trabalhistas, Salvador afirma que encerraria as atividades instantaneamente por falta
de condições financeiras e montaria um horto, empregando apenas uma ou duas
pessoas.
Em 2010 a propriedade foi arrendada para outro empreendedor. Os 14
funcionários contratadores tiveram as carteiras de trabalho assinadas. Após cinco
meses houve um atraso de 15 dias no pagamento e os funcionários fizeram greve.
De uma única vez, oito funcionários foram demitidos. Com o insucesso do negócio
José Salvador reassumiu a administração e considera que os altos custos
trabalhistas foi um dos responsáveis pela operação mal sucedida.
3.4.2 Distribuição e alcance da produção
A produção de José Salvador é vendida comercialmente para atravessadores
que compram diretamente em sua propriedade. Trata-se da principal forma de
escoação de sua mercadoria. Entretanto, entre os anos de 2008 a 2009 ele realizou
também a distribuição de suas próprias flores em veículo próprio e apropriado para
tal transporte. Nesse período seu principal mercado consumidor passou a ser
Brasília. Era transportada e comercializada para a capital federal duas espécies de
63
flores: rosas e murta. Contudo, para atender o mercado varejista ele aponta
necessário uma variedade maior de flores para comercialização. Suas duas
variedades não conseguiu atender o mercado local. Além disso, uma série de
vendas não pagas acarretou prejuízo que ultrapassou cifras de R$ 30.000,00. Isso
fez com que ele passasse a praticamente não mais transportar, somente produzir.
De forma muito irregular, existem encomendas que são transportadas pelo
produtor em sua pick-up para a capital baiana. Contudo, se trata de uma prática
muito pontual. O mais comum nesses casos é o envio das encomendas por uma
empresa de transportes. É relatado pelo produtor que houve susceptíveis conflitos
com os valores cobrados pela empresa. Segundo ele, os valores cobrados eram
altos. Era cobrada uma taxa de R$ 40,00 por um pacote de flor; R$ 47,00 por dois
pacotes e R$ 60,00 por três pacotes. Após muitas negociações, houve uma nova
marcação de preços, onde por um pacote de flor passou a ser cobrado R$ 30,00;
dois pacotes também R$ 30,00 e três pacotes de flores R$ 45,00.
José Salvador aponta alguns motivos para não transportar vinculado a
Secretaria de Produção do município ou da AMAFLOR. Ao contrário do que afirmou
o produtor Reginaldo a taxa paga para poder transportar no veículo ligado a
Secretaria de Produção do município ou da AMAFLOR não representava elevado
custo, mas sim o valor que era vendido à mercadoria quando por eles transportados.
Segundo ele, por investir mais na lavoura, sua mercadoria é de qualidade superior
comparado aos das associações e, por conta disso, preza por um valor maior nas
vendas para compensar os gastos de produção. O vendedor responsável pelas
vendas das flores nos centros consumidores, segundo José Salvador,
comercializava a qualquer preço. Ele aponta ainda que era dada prioridade a venda
das flores das associações, para então serem vendidas as flores dos demais
produtores.
Atualmente, a produção oriunda da propriedade do agricultor atinge o
mercado de Salvador, Ilhéus, Itabuna, Santo Antônio de Jesus, Cruz das Almas e
Nazaré, como pode ser verificado no mapa 7.
Segundo observado nesta propriedade, em épocas festivas não ocorre
problemas na venda da produção. Contudo, em períodos que intermediam uma data
festiva de outra, existe uma inconstância nessas vendas, ocorrendo assim perdas
significativas de flores. Para José Salvador e alguns trabalhadores de sua
propriedade entrevistados, falta no município de Maracás uma cooperativa para
65
organizar e estruturar a distribuição e as vendas das flores de todo o Arranjo
Produtivo Local. Segundo os entrevistados, cada produtor e/ou associação
trabalham de maneira independente, sendo comum muitos desses produtores
venderem sua produção a preços abaixo de mercado para não perderem a
mercadoria. Contudo essa pratica é apontada como prejudicial para APL de Maracás
como um todo.
Um dos trabalhadores entrevistados afirma que se houvesse um local que
concentrasse as vendas e alcançasse novos mercados, Maracás seria capaz de
vender inclusive para o estado de São Paulo, fazendo concorrência a este,
impedindo que sua produção fosse direcionada para a Bahia e conquistando o
mercado local. Apesar de a prefeitura possuir uma central de vendas, esta
comercializa somente a produção de algumas associações. Além disso, segundo
entrevistas realizadas com várias pessoas de distintas associações que atuam no
ramo de flores do município, a maioria da produção quando transportada não é
direcionada com as vendas já concretizadas. Estas são, em grande maioria,
realizadas por um vendedor nos centros consumidores.
Segundo outro entrevistado, se houvesse um estudo das demandas do
mercado e uma produção mais diversificada na APL de Maracás, o município
conseguiria atender a mais mercados. O Sr. José Salvador afirma que tem muita
gente produzindo a mesma coisa e algumas variedades de flores tem que ser
compradas de outros estados por falta de produção local.
3.4.3 Assistência técnica
Todos os insumos e agrotóxicos usados na propriedade de José Salvador são
comprados no mercado local. Não existe acompanhamento técnico na sua
propriedade. Ele próprio e o comerciante que fornece os insumos fazem
experiências e são os “responsáveis técnicos” pela plantação. Apesar de órgãos
como o SEBRAE já ter visitado sua propriedade instruindo com procedimentos
técnicos, o produtor classifica a atuação deste como insatisfatório. A prefeitura
municipal não é apontada como parceira em seu negócio.
66
O cultivo de José Salvador ocorre 100% a céu aberto e existe em sua
propriedade equipamento de câmara fria onde, segundo ele, suas rosas conseguem
durabilidade entre quatro a cinco dias a mais do que o normal.
Portanto, nota-se que todos os produtores individuais analisados nesta
pesquisa possuem planos de expansão de seus cultivos. Observa-se também uma
disputa territorial que envolveu a Rege Flores e produtores do Projeto Piloto no
mercado consumidor de Ilhéus e Itabuna. Por fim, é observado que a presença do
poder público, principalmente em relação à prefeitura Municipal de Maracás é
considerada nula ou quase nula.
67
5 CAPÍTULO IV – MARACÁS CIDADE DAS FLORES: PERSPECTIVAS E LIMITAÇÕES
Quando as primeiras associações vinculadas ao cultivo de flores foram
criadas (1999 - 2000), a prefeitura estimava que a renda para cada família girasse
em torno de dois salários mínimos (verificar tabela 1). Contudo, em contraste ao que
foi mencionado e excluindo os produtores individuais, a renda dos núcleos
organizados em associações sempre ficou em cerca de um salário. Isso inclui os
meses de maiores vendagens.
Além disso, de acordo as bibliografias pesquisadas e entrevistas realizadas
em campo, o apogeu da APL de Maracás concentrava 200 famílias ligadas
diretamente com o cultivo de flores. O SEBRAE chegou a apontar que 300 famílias
dependiam da produção de flores. Nesta pesquisa foram contabilizadas cerca de 52
famílias organizadas em quatro associações. Dessas quatro associações apenas
duas trabalham exclusivamente com a atividade de floricultura. Pelo menos quatro
outras associações foram desativadas ou os cultivos se converteram em outras
lavouras. As 52 famílias mencionadas representam o resultado de uma redução de
73% do número total de famílias que continha o auge da APL.
Vale a pena mencionar ainda, que nesta pesquisa foram identificadas outras
três modalidades de vínculo de trabalhadores com o cultivo de flores. Na primeira,
pelo menos 18 trabalhadores lidam diretamente com o trato de flores sob o regime
de carteira assinada ganhando um salário mínimo1. Ou seja, são trabalhadores
assalariados. Na segunda modalidade, foi contabilizado um número de 28
trabalhadores em regime de parceria com um produtor individual. Essa parceria é o
resultado de um acordo onde 50% da produção é dividido entre o produtor e o
parceiro. O primeiro subsidia os insumos produtivos e presta assistência técnica,
enquanto o segundo é o responsável pelo cultivo e colheita. Por fim, a terceira
modalidade de vínculo de trabalhadores com o cultivo de flores trata-se de diaristas.
O número deles varia entre 22 a 45 pessoas nas lavouras de flores, a depender da
época do ano. Os diaristas trabalham em lavouras de pelo menos três produtores
individuais.
De acordo com os dados apresentados acima, conclui-se que o número de
trabalhadores que diretamente estão envolvidos com o cultivo de flores nessas três
1 Valor correspondente a R$ 728,00 no ano de 2014.
68
modalidade seja de cerca de 91 pessoas. Para tanto foi considerado um total de 45
trabalhadores diaristas (número de contratados no auge da produção). Se for
somado a este número as famílias organizadas em associações e, para cada
família, for atribuída um número de 1,5 trabalhadores (valor que corresponde a
média de pessoas que trabalham por família no cultivo de flores), o número de
pessoas que estão diretamente envolvidas com o cultivo de flores em Maracás
corresponde a 172 pessoas.
Tendo em vista que, independente do vínculo do trabalhador com a atividade
(diarista, associado, assalariado ou parceiro), o que cada um recebe gira em torno
de um salário mínimo. Se for considerado que um salário mínimo no ano de 2014
corresponde a R$ 728,00, e aplicando este valor a todos os trabalhadores, o total
que mensalmente é pago ou recebido por eles corresponde a R$ 125.216,00. Para
um município de 24.613 habitantes (IBGE, 2010) fica evidente que a economia de
Maracás não gira em torno da floricultura.
Vale ressaltar que apenas está sendo considerado aqui o número de
trabalhadores envolvidos diretamente com o cultivo de flores. As atividades que
indiretamente estão ligadas a floricultura, que pode incluir o comércio, por exemplo,
não fazem parte desta análise.
Tentou-se, nesta pesquisa, identificar a participação da atividade de
floricultura para o PIB (Produto Interno Bruto) de Maracás em valores de
percentagem comparado a outras atividades bem como os valores em cifras R$.
Entretanto, devido à falta de dados primeiros não foi possível obter tais dados.
Contudo, 90% das pessoas entrevistadas afirmaram que a economia do município
não gira em torno da floricultura e esta não é a atividade principal do município.
Segundo a própria Secretaria de Produção, a atividade principal de Maracás é a
agropecuária, com destaque para a criação de bovinos e o cultivo de hortaliças. Vale
destacar também, que a atividade de floricultura é desenvolvida próxima a sede
municipal, onde existe a predominância de uma tipologia climática subúmido a seco
(SEI 1998) e uma floresta estacional decidual (mata caducifólia), enquanto a maioria
do território de Maracás está inserida na vegetação de caatinga e clima semiárido,
onde as atividades desenvolvidas correspondem principalmente à agropecuária.
Portanto, pode-se afirmar que existe uma política social de inserção de
trabalhadores em uma atividade economicamente rentável, no caso o cultivo de
flores. Contudo, a dimensão com que é divulgado e difundido a floricultura se trata
69
muito mais de marketing para promoção do município do que da predominância
socioeconômica dessa atividade.
Apesar desta afirmação, a Prefeitura de Maracás por incentivar e apoiar
pequenos microempreendimentos de floricultura já recebeu os prêmios Melhores
Práticas da Caixa Econômica Federal; Prêmio Internacional de Gestão Pública
Municipal, do Instituto Brasileiro de Estudos Especializados; Prêmio SEBRAE
Prefeito Empreendedor e, em 2004, a experiência foi um dos 100 projetos finalistas
do Prêmio Internacional de Dubai, que aponta as 530 melhores práticas do mundo
para melhorar as condições de vida, promovido pelo Programa de Assentamentos
Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas).
4.4 Perspectivas e limitações para o cultivo de flores em Maracás
Maracás desde o ano de 2012 não é mais somente a “cidade das flores”. Por
uma estratégia de cunho político ela se tornou Maracás “cidade das flores e do
vanádio”. Instalou-se no município, desde 2011, a mineradora Largo Resources que
irá extrair o minério. Segundo a SICM (Secretaria da Indústria, Comércio e
Mineração do Governo da Bahia, 2013) o projeto prevê investimentos de R$ 555
milhões e a exploração irá injetar anualmente cerca de R$ 3,6 milhões no tesouro
municipal. Atualmente, em média, essa receita corresponde a 2,4 milhões/mês. Além
disso, serão gerados 400 empregos diretos e cerca de 3.000 postos de trabalho
indiretos.
Com este novo cenário, fica claro as novas estratégias que Prefeitura
Municipal adotou vinculando Maracás a produção de vanádio. Existe uma tendência
a valorizar a nova “vocação” do município. Já é vinculado nos meios de
comunicação e nos veículos oficiais o novo slogan. Contudo, apesar de ainda ser
associada à produção de flores, na prática esta atividade está em declínio. Essa
afirmação pode ser constatada a partir do número de associações desativadas e do
número de famílias cada vez menor cultivando flores. Segundo algumas entrevistas,
o volume produzido também diminuiu. Contudo, não se conseguiu dados que
confirmasse tais afirmações.
70
Uma possibilidade que resultaria em ganho competitivo na produção de flores
seria uma Indicação Geográfica. Segundo a Lei 9.279/1996, art. 178 que trata das
Indicações Geográficas (IG), especificamente de Denominação de origem, esta é
definida como o nome geográfico de país, cidade, região ou localidade de seu
território, que designe produto ou serviços cujas qualidades ou características se
devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluindo fatores naturais e
humanos (BRASIL, Lei 9.279/1996, art. 178). Trata-se de um território que possui
características de um modo de produção específico daquele lugar, no qual as
relações de produção dão a singularidade do produto (CALDAS, 2013). No que se
refere às Indicações Geográficas Caldas complementa:
As indicações geográficas [...] podem ser definidas como o lugar onde se processam as relações capitalistas de produção, as quais buscam também o lugar como expressão da singularidade, do saber fazer, da experiência da elaboração de determinado produto, agregando-lhes valor e dando-lhes um diferencial competitivo (CALDAS, 2013, p. 2).
O patrimônio material e imaterial podem ser envelopados com uma nova
máscara e etiqueta, na qual marketing territorial passa a ser uma ferramenta
fundamental para a promoção de mercado (CALDAS, 2013). A qualidade de
determinado produto ou o modo de manusear, preparar ou produzir estão ligados
diretamente ao território onde foi originado. Maracás se destaca pela produção de
flores temperadas e subtropicais, enquanto em outros centros produtores do estado
da Bahia são cultivadas flores tropicais. Nesse sentido, Passos afirma que é preciso
consolidar a marca “Flores de Maracás” e reforça:
A Prefeitura de Maracás já associa o projeto de produção de flores com a própria cidade, ao divulgar a divisa “Maracás – cidade das flores”. Esse pode ser o ponto de partida para a consolidação de uma denominação de origem, com apelo mercadológico (PASSOS, 2004, p. 139).
É importante destacar que no Brasil o registro de indicação geográfica deve
ser solicitado por uma associação que representa os produtores. Contudo, a
prefeitura poderia ser uma incentivadora e orientadora para a solicitação de uma IG
na forma de Denominação de Origem.
71
A IG representaria uma vantagem competitiva para os produtores de flores de
Maracás, constituindo uma alternativa na promoção de seus produtos e agregando
valor frente aos produtos de outras localidades. Pois como bem destaca Caldas
(2013), a implantação de uma IG é uma promessa de garantia da inserção do
produtor de base familiar na lógica adversa dos mercados segmentados, situação
que pode se converter em ganhos positivos para Maracás e as associações
produtoras.
Por fim, a partir da visualização do mapa 8, nota-se que o mercado
consumidor das flores de Maracás atende principalmente 13 municípios do estado
da Bahia, se concentrando no recôncavo, no litoral sul, capital e centro sul do
estado. Contudo, perspectivas de expansão para novos mercados, inclusive
interestadual, podem ocorrer. Entretanto, tais expansões são projetos de dois
produtores individuais, sendo tal cenário não expansível para a APL como um todo.
72
Mapa 8: Principais municípios atendidos pelas flores de Maracás e projeto de expansão do mercado consumidor.
73
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao analisar as nove associações descritas aqui nesta pesquisa, verifica-se
que quatro continuam ativas, uma funciona sem fins lucrativos (apenas como
pesquisa) e três foram desativadas. Contudo, foi observado que existe uma
tendência à diminuição do cultivo de flores nas associações ainda em operação. Os
motivos para tal diminuição são diversos: o lucro frente aos investimentos é
pequeno; falta capital para investimento da lavoura; atuação de programas sociais
do governo, diminuindo a mão de obra e a participação de famílias associadas;
atrasos e longos prazos nas vendas intermediadas pela Central de Vendas do
município; falta de chuvas e seca prolongada.
Contudo, um fator pode ser apontado como principal causa para este cenário:
o apoio decrescente da Prefeitura junto às associações. Em todas as referências
utilizadas neste trabalho, o poder executivo municipal foi apontado como
protecionista e, na maioria das vezes, é citado como interventor direto, tomando
decisões junto às associações, inclusive contratando e demitindo trabalhadores. A
partir de 2012, na troca de gestão municipal, o papel de influência e interferência da
prefeitura começa a perder força. Isso poderia ser interpretado de maneira positiva,
tendo em vista que desde o início do projeto a intenção era a autossuficiência das
associações. Entretanto, não foi criado um perfil de gestor e empreendedor das
associações e estas, sem a coordenação da prefeitura, encontram-se em processo
de diminuição de produção. Pode-se afirmar que o poder público local, atualmente,
contribui com manutenção e combustível de um caminhão para o transporte das
flores; a manutenção da central de vendas, que não consegue negociar mercados
para a produção e a câmara fria que está a disposição dos produtores, mas muito
pouco é usada.
Apesar do SEBRAE e da EBDA terem atuado no município, as técnicas
usadas são “importadas” de outras culturas. A assistência técnica especializada é
praticamente inexistente. Os produtores atuam como próprios “técnicos” e, muitas
vezes, lidam de maneira equivocada com manuseio de determinados produtos,
como relatado nas entrevistas.
Nota-se um crescimento da atividade somente quando se diz respeito aos
produtores individuais. Ao contrário do identificado nas associações, todos os
produtores individuais entrevistados afirmaram está expandindo o cultivo de flores e,
74
com exceção de um produtor, nenhum utiliza o veículo disponibilizado pela prefeitura
por intermédio da Secretaria de Produção.
Apesar da importante participação da Prefeitura de Maracás no processo de
articulação e desenvolvimento do Arranjo Produtivo Local, inclusive a prefeitura
intitulando o município como a “cidade das flores” e se beneficiando com projetos e
prêmios por conta disso, existe uma tendência na atualidade de compartilhar o
status do município com a produção de vanádio. Tanto que o slogan e a imagem do
município de “cidade das flores” passou a ser “cidade das flores e do vanádio.
É importante destacar que apesar do forte marketing criado em torno da
produção de flores de Maracás, a importância da APL das flores para o município
não pode ser descartada. A inserção de um setor da população em uma atividade
produtiva que se reverte em geração de renda é de considerável notoriedade. A
consolidação da marca “flores de Maracás” por meio de denominação de origem
seria importante estratégia de reestruturação e crescimento da APL de flores de
Maracás. A Denominação de Origem representaria uma vantagem competitiva para
os produtores de flores de Maracás, constituindo uma alternativa na promoção de
seus produtos e agregando valor frente aos produtos de outras localidades.
75
REFERÊNCIAS
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