UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
FLÁVIA BOZZA MARTINS
PODER E MÍDIA: UMA ANÁLISE DE JOVENS RECEPTORES
CURITIBA
2011
FLÁVIA BOZZA MARTINS
PODER E MÍDIA: UMA ANÁLISE DE JOVENS RECEPTORES
Monografia apresentada à disciplina Orientação Monografia II como requisito parcial à conclusão do Curso Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientação: Profº. Dr. Nelson Rosário de Souza.
CURITIBA
2011
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por me permitir essa caminhada e estar
presente em minha vida.
Aos meus pais, por sua efetiva presença, apoio incondicional e
compreensão em todos os momentos da minha graduação. Desde o respeito à
escolha pelo curso, até as minhas dúvidas relacionadas a esse universo tão novo
que se apresentou diante de mim.
Agradeço ao meu orientador, Nelson Rosário de Souza, por sua paciência
em me orientar e me auxiliar em todos os momentos de questionamentos referentes
à área. Por me permitir participar desse processo de pesquisa com a sua orientanda
de mestrado, Luana Borsari, a quem também agradeço pelo apoio e espaço cedido
dentro desse projeto idealizado, primeiramente, por ela.
Sou grata aos membros do Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e
Opinião Pública, do qual eu fiz parte durante três anos; particularmente aos
professores que tanto me ensinaram no decorrer desse tempo: Emerson Urizzi Cervi
e Luciana Fernandes Veiga, que não se ativeram, exclusivamente, às lições de
conteúdos e técnicas de pesquisa, mas que também me transmitiram valores que
carregarei sempre comigo.
Agradeço imensamente, ainda, às colegas e amigas do Núcleo de Pesquisa,
em especial Sandra Mara Avi dos Santos e Jaqueline da Silva Borges, por toda
contribuição acadêmica ou não nesse período. Pelo apoio incondicional nos
momentos em que mais precisei e pela parceria que se consolidou nesses últimos
anos.
Aos meus familiares, por toda a torcida e compreensão diante de meus
enormes momentos de ausência. Principalmente à minha, mais do que irmã, a
amiga Bárbara Bozza Martins, por sua profunda dedicação e ouvidos emprestados
durantes todos esses anos.
Agradeço por fim aos meus amigos que estiveram comigo durante esse
processo, que, visando o meu bem, me deram os devidos alertas nesse percurso,
procurando me orientar e estimular, especialmente a Marcia Cristina dos Santos e a
grande amiga Haryanna de Lima Lobo.
RESUMO
Dado o crescimento dos meios de comunicação e a influência desses no processo de formação da identidade e nas relações horizontais, esse trabalho objetiva fazer uma análise de jovens receptores, no intuito de verificar como esses compreendem as mensagens emitidas. Para tanto, fizemos uso de pesquisa qualitativa, intencionando captar o caráter subjetivo dos sujeitos e das interações por eles vivenciadas. Assim, selecionamos nove jovens entre 15 e 24, da cidade de Curitiba, buscando verificar as formas de incorporação, submissão ou resistência que apresentam diante da mensagem. O produto midiático eleito foi a telenovela “Viver a Vida” (Rede Globo de Televisão). A relevância da pesquisa se pauta no fato dos jovens serem grandes consumidores de mídia e, por sua vez, de cultura, o que nos traz a responsabilidade de mensurar qual o tipo de relação o jovem estabelece com a mídia, bem como quanto o contexto social em que esse está inserido influencia nessa relação. Por meio de entrevistas em profundidade, etnografias e realização de mini-grupos focais foi possível perceber que aqueles sujeitos mais plurais, de múltiplas inserções sociais, tendem a apresentar maior resistência frente às mensagens emitidas. Enquanto que aqueles que se pautam pela noção de “morais e bons costumes”, tendem a incorporar as mensagens com mais freqüência.
PALAVRAS-CHAVE: Comunicação. Jovem. Poder. Telenovela.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................5
2 COMUNICAÇÃO, RECEPÇÃO E CULTURA..............................................................................................8
2.1 O QUE DIZEM OS ESTUDOS DE RECEPÇÃO?.................................................................................8
2.2 Estudos culturais ........................................................................................................................12
2.3 Estudos referentes à América Latina .........................................................................................15
2.4 A TELENOVELA LATINO-AMERICANA POR BARBERO E RAY........................................................18
3. MÍDIA: AS RELAÇÕES NA FORMAÇÃO DE IDENTIDADE E PODER DISPERSO.....................................20
3.1 IDENTIDADE E PODER HORIZONTAL ..........................................................................................21
3.2 JOVENS ......................................................................................................................................23
4 METODOLOGIA...................................................................................................................................25
4.1 APRESENTANDO OS JOVENS ......................................................................................................27
4.2 A TELENOVELA VIVER A VIDA.....................................................................................................28
5 RESULTADOS.......................................................................................................................................32
5.1 MEDIAÇÕES QUE OPERAM NAS RECEPÇÕES MIDIÁTICAS.........................................................37
5.1.1 SOBRE A TELENOVELA (E AS NOVELAS) DE MANEIRA GERAL............................................37
5.1.2 SOBRE RELAÇÕES DE GÊNERO E TRAIÇÃO .........................................................................40
5.1.3 SOBRE PRECONCEITOS.......................................................................................................42
5.1.4 SOBRE ABORTO ..................................................................................................................44
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................................................47
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................................................................49
5
1 INTRODUÇÃO
Dada a ampla presença dos meios de comunicação, em especial, a
televisão, no cotidiano dos indivíduos brasileiros, é que este trabalho objetiva fazer
uma análise de receptores. Na expectativa de ir além dos olhares exclusivos dos
estudos da comunicação, tem-se por intento avaliar a recepção com foco nas
práticas cotidianas de poder, as redes de poder que permeiam a sociedade e dentro
das quais todos os indivíduos estão inseridos, independente dos grupos sociais de
que façam parte.
O trabalho a seguir é braço de uma pesquisa idealizada por Luana Borsari1,
juntamente com o seu orientador de mestrado, e meu orientador de graduação2, o
Prof. Dr. Nelson Rosário de Souza. A pesquisa consiste em uma análise
comparativa entre comportamento receptor de mensagem televisa entre (a) jovens
de uma cidade pequena – Cidade Gaúcha/ PR; e (b) jovens de uma cidade grande –
Curitiba/PR. Quando tive conhecimento mais detalhado do projeto, manifestei meu
interesse em participar e contribuir de alguma forma para com o projeto. Desse
modo, coube a mim a responsabilidade de recrutar as pessoas que se encaixassem
ao perfil desejado, realizar as entrevistas em profundidade, bem como realizar as
etnografias, além de co-participar dos mini-grupos focais. Feito isso, e percebendo a
grande quantidade de análises que os dados possibilitariam fazer, decidi-me por
usar um recorte desse tema para a minha monografia de graduação.
Desse modo, deixando de lado o viés comparativo, que a grande pesquisa
ambiciona fazer, aqui me atenho a analisar a leitura da mensagem televisiva feita
por nove jovens de Curitiba, no intuito de averiguar as formas de incorporação,
submissão ou resistência que os jovens, pertencentes a diferentes grupos
identitários, apresentaram perante a mesma. Assim, a telenovela “Viver a Vida”,
exibida entre os anos de 2001 e de 2010, foi o produto midiático eleito para tal
1 Luana Borsari é aluna do mestrado, do PPG em Ciência Política, na Universidade Federal do
Paraná. 2 O Professor Nelson Rosário de Souza me orientou, inclusive, no programa de Iniciação Científica, além desse trabalho de monografia de graduação.
6
verificação, por ser um programa exibido de maneira sequencial e em um,
relativamente, longo período de tempo, já que há interesse em investigar como os
valores e práticas exibidos atuam na formação das preferências dos indivíduos em
questão, na tentativa de perceber qual o ‘diálogo’ que os receptores se permitem ter
com a mensagem emitida.
Para tal avaliação a pesquisa contou com método qualitativo, que combinou
três técnicas em períodos diferentes: entrevistas em profundidade, etnografia e
formação de mini-grupos focais. Os métodos utilizados tornaram possível a
percepção afunilada da leitura que os jovens faziam ao acompanharem a novela,
como também, a identificação dos valores aos quais os jovens estão vinculados, o
contexto social aos quais estão inseridos as ideias e ideologias predominantes em
seu pensamento e daqueles que os circundam.
A importância desse estudo se dá, na medida em que, diante da recusa da
imagem do receptor como um ser passivo, que, exclusivamente, responde a
estímulos3, perfaz-se de suma relevância a averiguação de que fatores são atuantes
na construção da identidade do jovem e que contextos sociais são mais influentes,
que permitem que esses atores sociais se posicionem de maneira crítica e reflexiva
perante alguns valores que lhes são emitidos, possibilitando que os mesmos se
encontrem num processo de negociação de sentido (incorporação ou resistência
diante da mensagem).
Posto isso, o trabalho se apresentará da seguinte forma:
No item 2 (COMUNICAÇÃO, RECEPÇÃO E CULTURA), será apresentado o
estado da arte dos estudos que dizem respeito à comunicação, onde será feito um
resgate histórico, demonstrando as teorias que já foram base de estudos, mas que,
atualmente, foram superadas. Pelo fato de os estudos da comunicação estar tão
diretamente ligados aos estudos culturais, abordaremos os mesmos, ainda nesse
capítulo, finalizando-o ao explanar sobre os estudos referentes à América Latina.
No item 3 (MÍDIA: AS RELAÇÕES DE FORMAÇÃO DE INDENTIDADE E
PODER DISPERSO), será elucidada a questão da formação da identidade, como
fonte de origens híbridas4, provenientes de uma junção de influências as quais o
3 WOLF, 2005. 4 ESCOSTEGUY, 2006 apud BORSARI e SOUZA, 2010.
7
sujeito está exposto. Além da questão da visão do poder disperso na
sociedade, encontrado em qualquer lugar onde haja uma relação que compreenda
mais do que um indivíduo. Falaremos, também, dessa construção identitária no
universo jovem, que hoje se encontra diante de tantos estímulos por meio da
comunicação e tecnologia.
No item 4 (METODOLOGIA), discorreremos a respeito da metodologia
utilizada, que permitiu chegar aos nossos resultados e conclusões, bem como,
contará, por questões elucidativas, com um breve resumo da telenovela ‘Viver a
Vida’, selecionada como produto para a análise.
No item 5 (RESULTADOS) serão expostos os dados obtidos, contando com
a discussão dos resultados alcançados por meio da pesquisa qualitativa.
O trabalho será encerrado com as considerações finais a que os dados e
resultados nos permitiram chegar e, em anexo, será apresentado o perfil de
identidade e social dos jovens participantes da pesquisa.
8
2 COMUNICAÇÃO, RECEPÇÃO E CULTURA
2.1 O QUE DIZEM OS ESTUDOS DE RECEPÇÃO?
O crescimento acelerado dos meios de comunicação em massa levou a
mass communication research5 a uma evolução notável.
Azevedo6, ao fazer uma releitura dos principais paradigmas da
comunicação, aponta para um dos precursores da Sociologia, Gabriel Tarde, um dos
primeiros que se dedicou ao estudo do efeito da comunicação sobre a opinião
pública. Publicou, ainda em 1898, um ensaio, em que afirmava ser a democracia de
massa composta pelos seguintes elementos, que estariam relacionados entre si: (1)
a imprensa; (2) a conversa; (3) a opinião e, finalmente (4) a ação. Esse modelo,
apesar de não ter grande poder explicativo, se apresentou como precursor das
pesquisas sobre o assunto.
Na busca pela explicação de como se processavam os efeitos cognitivos na
relação emissor/receptor, pesquisadores das Ciências Sociais e da Psicologia
dedicaram-se a desenvolver teorias, de caráter empírico, que demonstrassem em
que medida e de que forma tal relação se dava. E é derivada da psicologia social,
produto do behaviorismo, uma das primeiras mais relevantes abordagens que
tratava dos efeitos dos media: a teoria da magic bullet (bala mágica) ou teoria da
agulha hipodérmica defende o modelo comportamental do estímulo-resposta,
5 “A mass communication research se constituiu numa das mais férteis linhas de pesquisa da então
recém-nascida Sociologia da Comunicação e uma de suas raízes teóricas tem origem na corrente funcionalista norte-americana, A literatura costuma apontar os cientistas políticos Lasswell e Lazarsfeld e os pscicólogos Kurt Lewin e Carl Hovland como os pais fundadores dessa linha de pesquisa. Lazarsfeld, por sua vez, reivindicava a denominação de ‘pesquisa administrativa’, para investigações conduzidas por ele e por seu grupo seu grupo de pesquisadores, em contraposição às ‘pesquisas críticas’ desenvolvidas, por exemplo, pelos membros da Escola de Frankfurt. O modelo de agenda-setting se filia à tradição da pesquisa orientada teórica e empiricamente, como as empreendidas pela mass communication research.” (AZEVEDO, 2004, p. 61). 6 AZEVEDO, 2004.
9
acreditando que o receptor dos produtos midiáticos era um consumidor
passivo, que operava no sentido da existência de uma relação direta e causal entre
a mensagem emitida e alcance sobre todos aqueles a que à mensagem foram
expostos. Pesquisas como essa, e derivadas dessa, foram realizadas no cenário
histórico que se passava na I Guerra Mundial, e as propagandas provenientes e
relativas ao momento histórico eram os principais objetos de análise. Os estudos
desempenhados nessa época, em suma, tendiam a indicar efeitos de curto prazo, ou
imediatos, poderosos e, de modo geral, negativos, da mídia sobre a opinião pública7.
Conforme explica Wolf (1994, p. 27), os defensores deste(s) modelo(s) teórico(s), em geral, consideram que o processo da comunicação é assimétrico, ou seja, os emissores são ativos e a massa passiva, que apenas reage a estímulos. Além disso, a comunicação é sempre vista como um resultado da intenção do emissor, que objetiva algo através dos conteúdos veiculados, o que justifica a necessidade de analisar as mensagens. Outra característica dos trabalhos destes pesquisadores, segundo Wolf, é a falta de reflexões sobre a influência das relações sociais, situacionais, contextuais e culturais nos processos da comunicação8.
Nesse contexto, vale ressaltar a pesquisa de Lasswell (1948), em que o
autor desenvolveu um esquema de análise que englobava “quem/ diz o quê/ em que
canal/ a quem/ com que efeito”. Tal fórmula permitia a verificação de
(respectivamente) emissores, mensagens, meio de comunicação, efeito produzido.
O estudo destacou-se, justamente, por possibilitar a observação e mensuração nas
várias etapas do processo9.
Foi Lazarsfeld quem veio a liderar um estudo que se sobrepôs às teorias dos
efeitos ilimitados. Ao fazer uma pesquisa durante a eleição presidencial, em 1940,
em Erie County, Ohio, os pesquisadores, dotados de método quantitativo, em que
entrevistaram mil pessoas, com ondas de questionários aplicados em períodos
diferenciados de tempo, concluíram que os sujeitos encontravam-se mais
suscetíveis às conversas dos grupos primários (familiares, colegas de trabalho,
amigos, líderes locais), do que, de fato, aos meios de comunicação. Lazarsfeld
7 Idem.
8 COLLING, 2007, p. 7. 9 AZEVEDO, 2004, p. 50.
10
constatou, primeiramente, que o processo da comunicação se daria em dois
passos (two-step flow): a relação era mediada por um ‘líder de opinião’, que filtraria
as mensagens absorvidas e refletia sobre as mesmas, para, então, passar adiante
aos demais.
Ainda adentrando o processo de investigação, os pesquisadores dessa
corrente perceberam a existência de uma teia complexa, que englobava diversos
‘líderes de opinião’, que compunham níveis hierárquicos de formadores de opinião.
Esses, antes de fazerem a mediação com os demais sujeitos, trocavam opiniões e
debatiam conceitos entre si. O modelo de recepção de audiência passou daquele
baseado em duas etapas (two-step flow) para a outro, que compreendia uma rede
de diversos níveis de influência (multi-step flow).
Baseado nessa ideia de efeitos limitados da comunicação, rejeitando o
conceito de uma “audiência desestruturada e passiva”10, a década de setenta se
configurou de suma importância na retomada das pesquisas relevantes no campo.
Modelos teóricos retomavam a ideia do poder da mídia, com o cuidado de deixar de
lado a influência do meio ao qual o sujeito está inserido, que Azevedo chama de
meio de mediações complexas e sutis. Ficava clara a necessidade de estudos que
desenvolvessem e englobassem o efeito da mídia, sem desconsiderar as influências
a que os sujeitos estariam expostos:
A centralidade nos meios de comunicação e as novas formas de comunicação política demandavam modelos de investigação e a obtenção de novos dados que permitissem o reexame da questão dos efeitos da mídia na audiência e no eleitor. Além do mais, o eixo metodológico das investigações compreendidas no passado girava em torno da indagação ‘se a mídia era capaz de dizer ao indivíduo como ele deveria pensar ou agir11.
Nasce então o expansivo e revolucionário modelo da agenda-setting, ou
agendamento. Desenvolvida por Maxwell McCombs e Donald Shaw, em 1972, os
autores publicaram um artigo em que demonstravam com estudos empíricos o
agendamento de discussões efetuado pela mídia durante as eleições presidenciais
10
Idem, p. 52. 11 Idem, p. 43.
11
de 1968, na cidade de Chapel Hill, na Califórnia, Estados Unidos.
Pesquisaram de maneira aprofundada o que os eleitores consideravam temas de
maior relevância. A partir desses dados, foram feitas coletas em jornais, revistas e
televisão dos assuntos que esses hierarquizavam como relevantes. Ficou
constatado, assim, que o que se apresentou como relevante para a mídia também o
era para a audiência, bem como os temas desconsiderados ou considerados de
pouca relevância eram também pouco ou nada comentados pelo público. Os autores
levantaram a ideia de que a “agenda da mídia” agia de maneira direta sobre a
“agenda do público”. Esse preceito respalda e desenvolve uma constatação de
Bernard Cohen (1963), que percebia a mídia como capaz de influenciar a audiência
não em “o que pensar”, mas sim “em que pensar”:
Na maior parte do tempo, [a imprensa] pode não ter êxito em dizer aos leitores o que pensar, mas é espantosamente exitosa em dizer aos leitores sobre o que pensar.12
Isto é, as notícias e mensagens exibidas através dos meios de comunicação,
ao dar relevância a determinados temas, em detrimento de outros, acaba por pautar
o debate público, agendando os temas que a opinião pública também dará maior
ênfase (o que os autores chamaram de ‘escala de proeminências’). Esse estudo,
além de sua complexidade metológica, destacou-se por se propor a averiguar os
efeitos cognitivos da mídia a longo prazo.
Ficamos, assim, com a definição proposta por McQuaid13, que classifica os
estudos no ramo da comunicação, desde o início do século XX até os anos
quarenta, como aqueles relacionados à teoria dos efeitos ilimitados ou poderosos.
Os estudos realizados dos anos quarenta até os sessenta se enquadram na teoria
dos efeitos limitados. Já as análises mais modernas, iniciadas em setenta, seguindo
até os dias de hoje, tratam da revalorização do poder da mídia através de influências
que se dão de maneiras mais complexas e sutis.
12 COHEN, 1963, p.13. Apud Wolf, 2005. 13
MCQUAID, 1979. Apud Azevedo, 2004.
12
Destarte, o presente trabalho pretende assumir o viés que valoriza o
poder da mídia, sem deixar de lado as relações e contextos sociais aos quais os
sujeitos estão inseridos. Valendo-nos de não enxergarmos o receptor como um
consumidor de mensagens passivo, que apenas responde a estímulos das
mensagens, reconhecemos o alcance da mídia e sua diferenciação no que se refere
a atingir o receptor, variando de indivíduo a indivíduo, de acordo com o contexto
social ao que estes estão expostos.
2.2 ESTUDOS CULTURAIS
Quando falamos em comunicação, deixando de lado o estudo da cultura, o
primeiro eixo pode ficar esvaziado de sentido. Isso porque essa primeira está imersa
em um contexto, que é regido pelo caráter cultural.
A comunicação é mediada pela cultura, é um modo pelo qual a cultura é disseminada, realizada e efetivada. Não há comunicação sem cultura e não há cultura sem comunicação.14
Barbero15 trata da razão comunicacional, a qual se caracteriza por –
diferentemente da indústria cultural, pensada pelos frankfurtianos – aspectos atuais,
centrados, principalmente, no “fluxo que globaliza e comprime, a conexão que
desmaterializa e hibridiza”16, agenciando mudanças do mercado da sociedade.
O caráter híbrido da cultura moderna, também vem a ser discutido por Hall17,
que preconiza o cunho contraditório, fragmentado, produzido e em permanente
processo de construção da identidade dos sujeitos. Identidade essa que vem a ser a
soma dos contextos culturais aos quais os sujeitos estão imersos.
Tal discussão é relevante porque, há relativamente poucos anos, tratar da
cultura nas Ciências Sociais, tinha uma divisão bastante demarcada: a cultura
14 KELLNER, 2001, p. 53. 15
BARBERO, 2009. 16 BARBERO, 2009, p. 13. 17
HALL, 2006.
13
primitiva, os estudos dos dogmas, dos rituais, das relações de parentescos,
estrutura das linguagens, hierarquia dentro de uma sociedade, ficavam a encargo da
antropologia. Enquanto que, de outro lado, para o estudo da cultura moderna, que
englobava unicamente, o que concernia às letras e às artes, tínhamos a sociologia.
No entanto, na tardomodernidade, verificamos a complexidade nas relações
identitárias e incorporação da cultura pelos sujeitos, deixando empobrecida a análise
de somente alguns aspectos sociais18, demandando a necessidade de estudos mais
amplos, que abarcassem outras questões. A afirmação a seguir nos demonstra:
Na tardomodernidade em que hoje vivemos, a separação que instaurava aquela dupla idéia de cultura é, de um lado, obscurecida pelo movimento crescente de especialização comunicativa do cultural, agora organizado em um sistema de máquinas produtoras de bens simbólicos ajustados a seus ‘públicos consumidores’. É o que hoje faz a escola com seus alunos, a televisão com suas audiências, a igreja com seus fiéis ou a imprensa com seus leitores. E, de outro lado, é toda a vida social que antropologizada, torna-se cultura. Como se a máquina de racionalização modernizadora – que separa e especializa -, impossível de ser detida, estivesse girando, patinando, em círculos, a cultura escapa a toda compartimentalização, irrigando a vida social por inteiro. Hoje são sujeito/objeto de cultura tanto a arte quanto a saúde, o trabalho ou a violência, e há também cultura política, do narcotráfico, cultura organizacional, urbana, juvenil, de gênero, cultura científica, audiovisual, tecnológica etc.19
A centralidade da mídia no âmbito cultural se enraíza na sua presença no
processo de enculturação20 (procurar conceito) dos indivíduos. Através dela temos
material para analisar a interação entre os sujeitos, a partir de suas próprias
preferências, valores e comportamentos. Diante disso, a busca dos estudos culturais
se caracteriza não pela busca de identificar nos sujeitos uma ideologia dominante,
mas sim a dinâmica social que culmina na assimilação negociada da cultura. No
intuito de elucidar a sociedade contemporânea, a cultura e a política, os estudos
culturais se pautam na teoria social, crítica cultural e pedagogia da mídia21;
buscando, assim, não o foco individual, mas o social.
18
BARBERO, 2009. 19 BARBERO, 2009, p. 13. 20
Condicionamento social do indivíduo para assimilação dos padrões culturais dominantes (SOUZA e BORSARI, 2010). 21
KELLNER, 2001.
14
Para Johnson22 os estudos no campo da cultura se empenham em
avaliar o cunho subjetivo emergente das relações sociais que se dão no dia-a-dia.
Intentam verificar os valores e vivências que alimentam tal subjetividade,
decorrentes, não exclusivamente dos signos culturais, mas do processo de
conscientização e interação cotidiana que atribuem e distinguem o significado pelo
sujeito atribuído. O autor admite três premissas que definem os estudos culturais,
sendo elas: (1) o que pauta os processos sociais são as relações que se dão no
âmbito das classes sociais, das divisões de gênero, das formas como se estruturam
as relações raciais, bem como as opressões da idade; (2) a cultura envolve poder, o
que torna o comportamento dos indivíduos assimétrico, havendo disparidade nas
relações sociais, inclusive no que diz respeito a definir e satisfazer necessidades; (3)
a cultura não se apresenta como um campo autônomo, livre de influências do meio.
Como já se verificou, é palco onde se produzem e reproduzem diferenças e lutas
sociais (ligando-se à ideia de poder entre o público e o privado).
A partir do princípio da influência do cotidiano (e, principalmente, das
relações em que estão imersos) sobre o processo de enculturação dos sujeitos,
vemos evidenciado em Johnson e em Hall23 o constante movimento, proveniente do
contínuo ‘construir’ das formas identitárias. O cerne da questão é o constante
processo de formação e a fragmentação (proveniente de diferentes fontes e redes
complexas imbricadas na sociedade, que vêm a alimentar de modos distintos a
subjetividade dos atores sociais) a que os sujeitos estão submetidos
Assim, Barbero nos ilustra a importância da cultura frente às relações
interpessoais e hierárquicas:
Então, mais do que objetos de políticas, a comunicação e cultura constituem hoje um campo primordial de batalha política: o estratégico cenário que exige que a política recupere sua dimensão simbólica – sua capacidade de representar o vínculo entre os cidadãos, o sentimento de pertencer a uma comunidade – para enfrentar a erosão da ordem coletiva. Que é o que o mercado não pode fazer24por mais eficaz que seja o seu simulacro. O mercado não pode sedimentar tradições, pois tudo o que produz ‘desmancha no ar’ devido à sua tendência estrutural a uma obsolescência
22
JOHNSON, 2006. 23
HALL, 2006. 24 J.J. BRUNNER. Cambio Social y democracia. Estudios Públicos, Santiago, n 39. 1990 apud BARBERO, 2009, p. 15.
15
acelerada e generalizada não somente das coisas, mas também das formas e das instituições.25
2.3 ESTUDOS REFERENTES À AMÉRICA LATINA
Por mais escandaloso que pareça, é um fato cultural incontornável que as maiorias da América Latina estão se incorporando à, e se apropriando da, modernidade sem deixar sua cultura oral, isto é, não por meio do livro, senão a partir dos gêneros e das narrativas, das linguagens, e dos saberes, da indústria audiovisual”.26
Os meios de comunicação em geral, mas, em especial, a televisão,
assumem grandes proporções de modo globalizado. Uma das grandes marcas do
século XX pode ser considerada a expansividade e alcance que a TV possui. Ainda
assim, essa característica se torna ainda mais marcante quando se trata da América
Latina. Diante desse contexto de oralidade cultural, hoje a televisão está presente
em praticamente 98% das casas latinoamericas27.
Os relevantes processos históricos e, especialmente políticos, nesses países
contaram com a ampla presença do meio de comunicação em questão. O poder
político sempre esteve presente no meio televisivo, vide o caso do Brasil, através do
empresário Assis Chateubriand, que foi o primeiro grande empresário das
Comunicações, então proprietário da Rede Diários Associados que:
no era decididamente su lado específicamente empresarial, sino una capacidad de sacar el máximo provecho de una situación política relativamente fluida, em el que participó directamente para ir extendiendo su red de medios de comunicación por el país, con una mezcla de sagacidad, audacia y oportunismo”28
25 BARBERO, 2009, p. 15. 26 BARBERO E RAY, 2004, p. 47. 27 OROZCO in Alencar-Moura, 2010. 28
CAPPARELLI e SANTOS, em: OROZCO, 2002, apud FERRAZ, 2010, p.3.
16
Tal expansão dessa mídia se perpetuou em larga escala pela Rede
Globo de Televisão, inclusive com a sua estreita ligação com o campo do poder
político. Ferraz nos demonstra, ainda, que, na Colômbia, a televisão nasceu dotada
de caráter estatal, a serviço do governo militar (ODIPE – Oficina de información y
prensa del Estado) que atuava à época29. Também foram de origem estatal as
primeiras redes de comunicação televisiva da Venezuela, Argentina e Peru. O Chile,
diferenciando-se dos supracitados, caracterizou-se por sua primeira rede de TV ser
de natureza educativa, vinculada a universidades católicas locais30.
Orozco31 evidencia ainda a fundamental importância que os meios de
comunicação exercem sobre os processos políticos. Cita, então, a inegável
influência desses no processo de Impeachment do ex-presidente da república do
Brasil, Fernando Collor de Melo, no ano de 1992.
Além do viés político a que a televisão se aproxima, há também o
entretenimento que chega às casas dos telespectadores. É considerando o largo
alcance dessa mídia, que Barbero e Ray 32 assumem a posição crítica que defende
que os estudos no campo da comunicação no âmbito da América Latina atêm-se
pouco à análise da televisão, como objeto de pesquisa. Os autores verificam que as
pesquisas sobre os mass media focam-se, quase que exclusivamente, na análise de
imprensa ou do cinema, legando à televisão uma única medida inteligente por parte
dos receptores: desligá-la33. É o que chamarão de “incompreensão das ciências
sociais para com a televisão”34. Nesse sentido, os autores ressaltam o possível ciclo
vicioso que pode haver proveniente do distanciamento das elites da mídia televisa:
acreditando que haverá um maior espaço para que os produtores se foquem, ainda
mais, na exibição de programações “toscas, acreditando, assim, abarcar mais
pessoas”35. A afirmação proveniente da qual os autores reclamam a carência de
29
RAY em OROZCO, 2002, apud FERRAZ, 2010.
30 FUENZALIDA em OROZCO, 2002, apud FERRAZ, 2010.
31 OROZCO 2002, apud FERRAZ, 2010.
32 BARBERO E RAY, 2004.
33 Eduardo Haro Tecglen, “El Círculo vicioso” em El País, Babelia, Madri, 20-11-1993, apud
BARBERO E RAY, 2004. 34 BARBERO E RAY, 2004, p. 27. 35
Idem, ibdem.
17
estudos na área é a que diz que “a cultura é menos a paisagem que vemos
do que o olhar com que a vemos”36.
O cenário social que envolve a perpetuação da televisão se apresenta como
ausência do espaço político que permita que se desenvolvam as relações, ainda
diante de sua complexidade inerente a modernidade:
São a debilidade de nossas sociedades civis, os extensos lodaçais políticos e uma profunda esquizofrenia cultural nas elites as causas que alimentam cotidianamente a desmedida capacidade de representação adquirida pela televisão.37
Barbero e Ray definem a conjuntura em que reside a América Latina como
em desordem cultural, que seria proveniente do mal-estar cultural em que se
encontram. Esse processo se deve ao fato da modernidade tardia a qual os latino-
americanos foram inseridos. Para elucidar a questão, os autores afirmam que, desde
o México, até a Argentina e o Brasil, as pessoas se dedicam à televisão mais do que
a qualquer outra mídia. Entretanto, ressaltam, os rostos que veem em seus
televisores não cumprem o papel de lhes representar, ao contrário, são rostos que
aparecem a serviço de interesses econômicos e políticos. Partindo desse fato, vem
a análise, bastante relevante, que indaga: menos importante do que é exibido na TV
é o que faz com que as pessoas restrinjam-se às suas casas: “se a televisão atrai é
porque a rua expulsa, é dos medos que vivem as mídias”38. O que demonstra que
ficou legado a essas pessoas a televisão, como importante aparato no que se refere
à construção de suas preferências, suas relações e interações. No entanto, esse
aparato reproduz uma cultura hegemônica, por meio de interesses políticos e
financeiros, que:
(...) portanto, com a conformação de um mercado cultural, em que as fontes de produção da cultura passam da dinâmicadas comunidades ou da autoridade da Igreja à lógica da indústria e dos aparelhos especializados, que substituem as formas tradicionais de viver pelos estilos de vida conformados a partir da publicidade e do consumo, secularizam e
36 Idem, p. 23. 37 Idem, p. 39. 38 Idem, p. 40.
18
internacionalizam os mundos simbólicos e segmentam o povo em públicos construídos pelo mercado.39
2.4 A TELENOVELA LATINO-AMERICANA POR BARBERO E RAY
Fazendo um breve resgate histórico a respeito das programações que
envolvem entretenimento na América Latina, os autores40 demonstram que até
meados de 1970 os programas norte-americanos, em especial os seriados,
ocupavam cerca de 40% do espaço do horário nobre41 (sendo esse o horário
noturno, durante a semana e ao longo do dia nos finais de semana). No início da
década de oitenta essa situação começa a mudar com o crescimento das produções
nacionais os seriados norte-americanos, por sua vez, num processo rápido, vão
dando lugar a tais produções. Essas, em sua maioria, aparecem no formato das
telenovelas. O Brasil, a Venezuela, o México, a Colômbia e a Argentina lideram na
produção e exibição; além disso, as novelas brasileiras, mexicanas ou venezuelanas
adentraram os demais países latino-americanos que não contavam com produções
próprias. Essa expansividade veloz tirou de cena os programas norte-americanos
por completo, tornando esse produto latino uma marca dos países em questão.
Os formatos que dominaram o mercado das telenovelas estavam divididos
em dois modelos, quais sejam: o tradicional, marcado pelas mexicanas e
venezuelanas e o moderno, marcado pelas brasileiras. O primeiro dos modelos se
caracteriza por seu cunho sério, com predomínio da inclinação trágica. Aqui, a
ênfase é direcionada aos sentimentos, paixões e ações dos indivíduos,
desconsiderando, portanto, o contexto histórico ou referências de lugar e tempo. No
39 Idem, p. 44. 40
Idem. 41 T. Varis, International Inventory of Television Programmes Stucture and the Flow of the Programmes between Nations (Tampere: University of Tampere, 1973), apud BARBERO e RAY, 2004, p. 117.
19
segundo modelo, com seu início marcado pela exibição de Beto Rockfeller
(Rede Globo), em 1968, há uma inovação, onde a trama possibilita a “cotidianização
da narrativa”42, levando em conta o cenário histórico e social, e indo de encontro
com algumas matrizes culturais brasileiras. Para elucidar as características do
modelo brasileiro, faço uso da seguinte explanação:
A rigidez dos esquemas e as ritualizações são penetradas por imaginários de classe e território, de gênero e de geração, ao mesmo tempo que exploram possibilidades expressivas abertas pelo cinema, pela publicidade e pelo videoclipe. Os personagens se libertam, em alguma medida, do peso do destino e, afastando-se dos grandes símbolos, se aproximam das rotinas cotidianas e das ambigüidades da história, da diversidade das falas e dos costumes.43
O trajeto histórico da telenovela, que, derivada do teleteatro (que teve seu
auge entre 1955 e 1960, contando com aspectos de tradição culta), combinou os
principais elementos desse, e adaptou ao caráter de massa, unindo às narrativas
audiovisuais impostas pela televisão. Contando, assim, com elementos da
modernidade, como a retratação dos ambientes sociais urbanos, bem como o
protagonismo cultural da classe média.
Fica claro que o nascimento e a expansão do gênero televisivo contaram
com mudanças e especializações, no que diz respeito à parte produtiva. Os artistas
tiveram que especializar e se adequar ao produto, já que atuar em uma telenovela
não é o mesmo do que outros tipos de atuações (teatrais, cinematográficas,
publicitárias); além deles, contamos, ainda, com a profissionalização do ofício de
autor de textos, o que prova de seu reconhecimento cultural dentro da sociedade. E
é por essa forte presença das telenovelas no âmbito da cultura latino-americana que
Barbero e Ray defendem as mesmas como objeto de estudo e de análise dentro das
ciências sociais. Justamente pelo seu papel de produzir e reproduzir padrões de
comportamento, poder e identidade.
42 D. Pignatari, Signagem da televisão (São Paulo: Brasiliense, 1984), p. 60, apud BARBERO e RAY, 2004, p. 120. 43 Idem, p. 121.
20
3. MÍDIA: AS RELAÇÕES NA FORMAÇÃO DE IDENTIDADE E
PODER DISPERSO
3.1 IDENTIDADE E PODER HORIZONTAL
Como já vimos, a identidade, na tardomodernidade, é marcada por se
configurar como produto de diferentes meios, em processo de constate
(trans)formação:
As identidades culturais são posicionamentos cambiantes e instáveis, construídos pelos discursos em circulação em uma determinada conjuntura, que, por sua vez, constituem a cultura e a história. Portanto, não são essenciais e suas origens são híbridas.44
Para Souza e Borsari muitas teorias pós-modernas atribuem à cultura da
mídia a responsabilidade pelo caráter fragmentário desses novos sujeitos. O que
levaria os media a assumir importante papel no que se refere à reestruturação das
identidades contemporâneas. A identidade, aqui, é vista como de extrema relevância
dos sujeitos frente ao grupo ou coletividade. Ainda que em um grupo social coeso, o
que distingue um indivíduo do outro é a sua identidade. As experiências cotidianas,
expressas no círculo familiar, no ambiente de trabalho, no ciclo de amizades,
compõem a imagem identitária e permite que os atores sociais construam suas
preferências e atribuam significado a suas vivências.
Essas diferentes expressões da identidade se espraiam numa complexa
rede de relacionamentos, que conta com interações hierarquizadas, sob o espectro
das classes sociais, gênero, etnias e outros fatores determinantes45. Interações,
essas, regidas pelo âmbito político. Através das mais diversas manifestações de
poder.
44 ESCOSTEGUY, 2006, p. 10 apud SOUZA e BORSARI, 2010, p. 8. 45
Como já vimos em Johnson, 2006.
21
Quando falamos de poder, aqui, abandamos a ideia do poder
político-institucional, apresentado na figura do Estado, regido por experiências
exclusivamente horizontais (o Estado, soberano, atuando sobre os dominados,
através de uma vontade que lhes foi imposta). A visão que adotamos se apoia na
noção de poder horizontal, disperso, existente em qualquer relação que compreende
dois ou mais sujeitos. Como argumenta Reis:
Há uma tendência frequente a associar a ideia de política como uma ‘espécie’ de pedaço da realidade social total, que seria o pedaço correspondente ao Estado. [...] Mas não há porque abrir mão da ideia de poder em sentido mais amplo e ambicioso, no sentido genérico em que a expressão se torna, precisamente, equivalente à idéia de interação estratégica ou da busca de afirmação de si. Nesse sentido, além de podermos falar de poder e interação estratégica no plano político-institucional e nas relações de ricos e pobres, vamos poder falar de relações de poder nas relações que se estabelecem entre pessoas de raças diferentes, de religiões diferentes, de sexos diferentes, de gerações diferentes – enfim, rigorosamente qualquer coisa pode ser motivo para interação de tipo estratégico, em que uns procuram prevalecer ou afirmar-se sobre os demais, e em que se trata propriamente de interesses e de conflito.46
Hayward47 possui uma visão bastante próxima, quando afirma que o poder,
longe de ser entendido como algo que uma pessoa poderosa detém e lança mão,
funcionam como um conjunto de elementos sociopolíticos que limitam o campo de
ação de todos os agentes sociais. Sujeitos pautados pelas ações dos próximos,
através de normas, regras e hábitos. O autor atenta para a noção de que o poder
não se enraíza no cerne da violência ou do conflito. As interações provenientes do
consenso também implicam poder.
Reis48 relaciona o poder à autonomia dos sujeitos, afirmando ser o primeiro
fundamental à existência e manifestação da segunda. Diante disso, defende a
fundamental importância de, além da possibilidade de realizar as suas preferências,
os sujeitos devem escolher as mesmas.
Dentro desse contexto de construção de preferências, favorecida pelo viés
identitários, Hall49 faz uso de códigos para a análise da individualização e ação do
sujeito. Tais códigos permitem a classificação de como os atores sociais recebem e
46 REIS, 2000, p.14, apud SOUZA e BORSARI, 2010, p. 10. 47 HAYWARD, 2003, apud PERISSINOTTO, 2003, p. 38. 48 REIS, 2002, p. 18, apud SOUZA e BORSARI, 2010. 49 HALL, 2006.
22
‘leem’ uma mensagem televisiva. Define, então três possibilidades de
processamento do telespectador, mediante o emissor: a primeira delas é
denominada código dominante ou hegemônico. Trata da apropriação do sentido de
maneira literal, entendendo as mensagens da maneira que lhe foi dirigida. A
operação da mensagem de maneira negociada implica na combinação do código
hegemônico e da leitura de oposição, onde o receptor age de forma a dialogar com o
conteúdo, discordando de alguma parte, mas concordando em certo sentido.
Quando o sujeito entende a mensagem de modo literal e ainda assim a decodifica
de maneira contrária, significa que ele está trabalhando sob o código de oposição.
Nesse momento é que se trava a política na significação, a luta no discurso.50 É à
luz dos códigos supracitados que partiremos para a análise dos dados levantados
em campo.
Temos aqui, para encerrar o item, as palavras de Barbero e Ray, que
pontuam as implicações políticas da cultura.
A necessidade de uma crítica capaz de distinguir entre a indispensável denúncia da cumplicidade da televisão com as manipulações do poder e dos mais sórdidos interesses mercantis - que sequestram as possibilidades democratizadoras da informação e as possibilidades de criatividade e de enriquecimento cultural, reforçando preconceitos racistas e machistas e nos contagiando com a banalidade e a mediocridade apresentada pela maioria da programação – e o lugar estratégico que a televisão ocupa nas dinâmicas da cultura cotidiana das maiorias, na transformação das sensibilidades, nos modos de construir imaginários e identidades. Pois encante-nos ou nos dê asco, a televisão constitui hoje, simultaneamente, o mais sofisticado dispositivo de moldagem e deformação do cotidiano e dos gostos populares e uma das mediações históricas mais expressivas de matrizes narrativas, gestuais, e cenográficas do mundo cultural popular, entendido não como as tradições específicas de um povo, mas a hibridação de certas formas de enunciação, de certos saberes narrativos, de certos gêneros dramáticos do Ocidente com as matrizes culturais de nossos países.51
50
HALL, 2006, apud SOUZA e BORSARI, 2010. 51 BARBERO E RAY, 2004, p.26.
23
3.2 JOVENS
A imagem dos jovens tem se apresentado, hoje, como nos aponta Schmidt 52, diante da sociedade de modo amplo e multifacetado. Isto é, estão em cernes de
abordagens que tratam do protagonismo juvenil em, pelo menos, dois aspectos:
tanto no que se refere a demandas sociais, por meio da gravidez na adolescência,
uso de drogas, alto potencial de consumo, mídia, novas tecnologias, beleza,
entretenimento, violência, educação, emprego, desemprego, esportes radicais,
música, dentre outros; quanto no que se refere à responsabilidade desses atores
sociais diante do rumo e direção do rumo que a sociedade tomará:
[...] os jovens são, também, considerados uma espécie de reserva ética das sociedades. Eles são o ponto de virada da história social. Antes de serem encarados como um agrupamento social que deve aguardar seu turno para a construção do novo presente (o futuro), a juventude é assumida como co-autora – e co-responsável – pelo presente. Os analistas deixam a juventude em duas situações incômodas: delinqüentes e/ou responsáveis pelo destino do gênero humano.53
A autora nos mostra que é para esse relevante universo, em que o jovem
está representado na sociedade, que são voltadas inúmeras produções midiáticas,
visando exatamente esse público. São eles os grandes consumidores (da mídia e do
mercado), e, também, através desse consumo que esses sujeitos se constroem,
como afirma Murdochowicz54 “nas práticas de consumo cultural se constroem novos
sentidos de cidadania”.
Por desempenharem tal papel social, esse trabalho elegeu o jovem como
objeto de análise, para verificar a maneira que este apropria da tela e ressignifica as
mensagens. Considerando que os televisores estão presentes no cotidiano de 50%
52 SCHMIDT, 2008.
53 IULIANELLI, 2003, p.61, apud SCHMIDT, 2008, p. 2.
54 MURDOCHOWICZ, 2008, p.47, apud SOUZA e BORSARI, 2010, p. 14.
24
a 80% dos jovens55e que estes fazem uso diferenciado desse meio, devido
ao acesso a outras novas tecnologias56, o interesse é mensurar em que medida e de
que forma esse grupo se relaciona com o produto da televisão, aqui, no caso, a
telenovela.
55 Idem, ibdem.
56 BARBERO, 2009.
25
4 METODOLOGIA
Para mensurar a forma como os jovens operam as mensagens recebidas
pela televisão, a pesquisa elegeu a telenovela Viver a Vida como produto midiático.
Essa foi exibida entre os anos de 2009 e 2010, no horário nobre da televisão
brasileira (“novela das oito”), pela Rede Globo de Televisão.
Foram recrutados nove jovens de Curitiba, de idade entre 15 e 24 anos, que
assistiam à telenovela pelo menos três vezes por semana.
No intuito de avaliar de maneira aprofundada o sentido atribuído ao produto,
a pesquisa lançou mão de métodos qualitativos, que nos permitiram enxergar a
subjetividade da linguagem, aparecendo por meio de resistência e/ou reprodução
dos padrões oferecidos pela telenovela. Assim, por meio de (a) entrevistas em
profundidade; (b) mini-grupos focais; (c) etnografias, tivemos a possibilidade de
explorar tanto o cotidiano das pessoas analisadas, quanto a forma que entenderam
as mensagens televisionadas.
Veiga e Gondim57 apontam a importância da utilização dos métodos
qualitativos dentro da Ciência Política, demonstrando que, apesar de pouco
utilizados pelos pesquisadores, esses podem nos fornecer dados exclusivos,
dificilmente cooptados dentro de pesquisas quantitativas. Intentando objetivar
resultados que se referem ao cotidiano e pensamento dos sujeitos, o tipo de
pesquisa aqui adotado se apresenta como uma boa possibilidade.
As autoras demonstram que, partindo desse princípio, no que se refere à
entrevista em profundidade, obtém-se a oportunidade de, a partir de uma entrevista
de caráter assimétrico, identificar anseios e vivências dos entrevistados. Para
Schultz58 é através do cotidiano dos sujeitos que podemos abordar temas sociais e
políticos. Assim, partindo de questionários semi-estruturados, que orientam a
entrevistas, mas que deixam espaço para aprofundar determinadas temáticas que o
pesquisador (ou, ainda o entrevistado) julgar mais interessante, quando são
57 VEIGA e GONDIM, 2001. 58 SCHULTZ, 1974, apud, VEIGA e GONDIM, 2001.
26
identificados alguns elementos que prometem fornecer respostas a
determinadas problemáticas.
Os grupos focais, ou grupos de discussão, também são fonte de análise de
Veiga e Gondim, por sua grande capacidade de mensurar as percepções dos
sujeitos a cerca de determinado tema:
A premissa básica dos grupos de discussão é a de que as pessoas formam as suas opiniões e percepções nos processos interativos em que se engajam, sendo mutuamente influenciadas pelo jogo de forças que vai se constituindo nas relações interpessoais, intra e intergrupais. Constitui, a rigor, um nível de análise distinto do das entrevistas individuais em profundidade. Neste último caso, privilegia-se a compreensão do contexto da pessoa. Os grupos focais (ou de discussão) na pesquisa política podem ser explorados de modo a alcançar os objetivos: explorar as estruturas cognitivas identificadas em entrevistas individuais, previamente realizadas, comparando-as com as manifestações grupais, e servir como fonte principal de coleta de dados, quando a ênfase passa a ser nos processos de 'influenciação' social que estão na base da formação de opiniões, atitudes e valores.59
No caso das etnografias (observação participante), a ideia é que o sujeito
assista ao programa do modo que o faz cotidianamente, como se não houvesse a
presença do pesquisador. Isso para que se avalie o comportamento durante a
exibição do programa. Essa técnica foi usada como forma de complementar as
demais, permitindo que tivéssemos uma maior análise dos hábitos dos pesquisados.
Assim, esses foram os métodos empregados para satisfazer nossas
demandas de pesquisa, que, como já vimos se fazia necessário mostrar o caráter
subjetivo da identidade dos sujeitos. Fizemos entrevista em profundidade com todos
os jovens que participaram da pesquisa.
Foram realizados dois mini-grupos focais em diferentes datas. O primeiro
deles contou com a participação de três jovens, além da presença do moderador.60
O segundo,foi realizado com quatro jovens, além do moderador.61 Foram pré-
selecionadas algumas cenas-chave da novela, que, além de oferecer um panorama
59 VEIGA e GONDIM, 2001, p. 9. 60 Esse primeiro grupo de discussão foi moderado pelo professor Nelson Rosário de Souza, contando com a colaboração de Luana Borsari e minha. 61 O segundo grupo também foi moderado por Nelson, contando com a minha colaboração.
27
geral das personagens, transmitia as principais tramas da maioria dos
núcleos. As mesmas cenas foram exibidas a ambos os grupos, e as perguntas
proferidas foram baseadas nas mesmas.
Três etnografias foram realizadas. É sabido que mais de uma visita de
caráter etnográfico, por pessoa deve ser executada, isso porque, a tendência é que
o pesquisado vá, com o decorrer das visitas, se sentindo mais à vontade, e aja cada
vez com mais naturalidade, como se, de fato, o pesquisador não estivesse presente.
Entretanto, por falta de tempo hábil, só foi possível fazer uma visita de cunho
etnográfico por pessoa. Assim, presenciei a três jovens assistindo três distintos
capítulos de Viver a Vida.
4.1 APRESENTANDO OS JOVENS
A busca por jovens que pudessem nos auxiliar em nossas análises não foi,
de modo geral, fácil. Foi indagado a colegas e amigos se esses, ou aqueles que se
encontravam próximos desses, conheciam alguém que se encaixasse no perfil
desejado (jovens entre 15 e 24, que assistem à telenovela ao menos três vezes por
semana). Alguns desses amigos próximos se empenharam em encontrar essas
pessoas, outros não.
O orientador da pesquisa também perguntou a seus colegas, bem como a
alunos e demais professores se esses sabiam de algum interessado em participar
da pesquisa. Desse contato, recebi e-mails de pessoas interessadas, ou de parentes
dessas pessoas, que poderiam participar.
Além disso, perguntei a amigos professores se eu poderia divulgar a
pesquisa a seus alunos e verificar se obtinha algum sucesso. Nesse contexto
também apareceram interessados dispostos.
Outra fonte foi o contato com estagiários de conhecidos, que se dedicaram a
participar e contribuir da forma que fosse possível.
28
Assim consegui fechar o número de nove jovens, que
acompanhavam a telenovela e estavam dispostos a me oferecer dados para análise.
Aproveitando o contexto, questionei-os sobre o motivo pelo qual eles atribuíam ser
tão difícil conseguir jovens que se encaixassem nesse perfil. Segundo a maioria
deles, as pessoas têm vergonha de dizer que assistem a novelas. Principalmente os
meninos. Possivelmente esse é o motivo pelo qual apenas dois meninos se
dispuseram a participar dessa pesquisa.
Ponderados tais aspectos, referentes ao processo e dificuldades no
recrutamento, apresento o perfil dos jovens participantes.
TABELA 01 – PERFIL DE JOVENS PARTICIPANTES
IDADE SEXO ESCOLARIDADE 17 FEMININO ENSINO MÉDIO INCOMPLETO 16 FEMININO ENSINO MÉDIO INCOMPLETO 17 FEMININO ESCOLA TÉCNICA INCOMPLETA 21 MASCULINO SUPERIOR INCOMPLETO 17 FEMININO ESCOLA TÉCNICA INCOMPLETA 21 FEMININO SUPERIOR INCOMPLETO 24 MASCULINO ENSINO MÉDIO 18 FEMININO SUPERIOR INCOMPLETO 15 FEMININO ENSINO MÉDIO INCOMPLETO
4.2 A TELENOVELA VIVER A VIDA
Estreada em horário nobre, logo após o Jornal Nacional, no ano de 2009, a
telenovela Viver a Vida, de Manoel Carlos, foi exibida até o mês de maio de 2010,
com grande expectativa, alto índice de audiência e muitos patrocinadores.
A trama foi ambientada, principalmente, na cidade do Rio de Janeiro, mais
especificamente na zona Sul, com muitas cenas externas gravadas em Búzios, onde
alguns núcleos da novela estavam concentrados.
29
A trama, que girava em torno da classe média alta e da classe A,
narrava a saga da personagem Helena, representada pela atriz Taís Araújo, coloca
em evidência uma personagem negra, fato inédito na história da teledramaturgia
brasileira, principalmente em se tratando do horário nobre.
Taís Araújo personifica uma respeitada e experiente modelo, reconhecida
internacionalmente, que tem sua vida amorosa ligada ao protagonista masculino da
novela, Marcos (José Mayer), empresário do ramo hoteleiro, bem sucedido, galante
e desejado pelo universo feminino da novela.
Famoso por seus casos extra-conjugais, Marcos é ex-marido de Tereza (Lilia
Cabral) e pai de Luciana (Aline Moraes), que é uma modelo em início de carreira
que, embora jovem, linda e requisitada profissionalmente, sente-se constantemente
ameaçada pela força e notabilidade de Helena.
Marcos e Helena se apaixonam e se casam, mas o casamento dura pouco,
pois ele acaba traindo sua segunda esposa com Dora, personagem vivida por
Giovana Antonelli. Não seria a primeira vez que o protagonista da novela porta-se de
tal maneira, pois, no desenrolar da trama, vai-se evidenciando que, antes mesmo de
seu primeiro casamento, Marcos teve um relacionamento com uma modelo, do qual
resultou no nascimento de um filho. Bruno (Tiago Lacerda), é apresentado ao
público já adulto, passando férias em Petra, onde se encontra com Luciana e
Helena, que estão fotografando para uma campanha.
Nessa viagem, que significa grande oportunidade profissional para as duas
modelos da ficção televisiva, será determinante para os episódios posteriores da
novela, pois, embora tenha sido uma tentativa de Helena se aproximar de sua
enteada e de travar novos relacionamentos de trabalhos para ela, esta se revela
imatura e voluntariosa e, em função de ciúmes e birras, os acontecimentos fogem do
controle e as duas acabam se desentendendo fortemente.
A culminância dessas discussões ocorre quando Luciana, num acesso de
raiva e cansada de ser aconselhada e tolhida por Helena, revela, gritando, os boatos
que correm a respeito do início da carreira desta, hoje, valorizada modelo: a questão
é que no passado, Helena praticara um aborto por não querer interromper a carreira
que, na época, era incipiente.
30
Chocada e magoada, Helena esbofeteia a enteada e a proíbe de
utilizar um carro reservado especialmente para ela no traslado até o aeroporto, no
retorno para o Brasil.
Em função desse episódio, Luciana não tem alternativa e embarca em um
microônibus, destinado a levar todos os profissionais envolvidos naquele trabalho. O
veículo sofre um grave acidente e o resultado é a tetraplegia em uma jovem modelo:
Luciana nunca mais voltará a andar nem comandar seu corpo como antes.
A partir de então, o enfoque principal da novela passa a ser a reflexão sobre
a adaptação da personagem, ainda que o descasamento de Helena e Marcos ganhe
relevância junto ao público, em função de certo clima existente entre Helena e
Bruno, que vem a ser filho de Marcos.
Com isso, um núcleo que ganha ênfase é a casa da primeira esposa de
Marcos, Tereza, que, com suas outras duas filhas, Mia (Paloma Bernardi) e Isabel
(Adriana Biroli) tentam se adaptar à nova situação: uma casa a ser adaptada para
receber uma cadeirante, a situação financeira, os custos com os tratamentos e,
principalmente, as atenções dirigidas para a fragilizada modelo.
Se antes de sair para essa viagem profissional a vida amorosa da modelo
em ascensão não estava muito segura com seu namorado, Jorge (Mateus Solano),
arquiteto compenetrado e mais sisudo, seu retorno nessas condições encontra apoio
em seu cunhado Miguel (Mateus Solano), médico, cujo perfil alegre e descontraído
acaba por conquistar sua confiança e cria um clima de carinho e afeto entre os dois.
A compreensão e o entendimento da situação clínica de Luciana fazem com que a
convivência entre o casal se intensifique e que sua namorada, Renata (Bárbara
Paz), que já sofre de sérios problemas como o alcoolismo e anorexia, se afaste cada
vez mais dele e encontre tranquilidade e conforto em Felipe (Rodrigo Hilbert), que
por sua vez é amigo de Bruno.
O andamento dramático encaminha para a acomodação dos novos casais
(Luciana/Miguel e Felipe/Renata) e isso acarreta uma reação adversa da mãe de
Miguel à união do casal protagonista, que não se conforma com o fato do filho,
médico brilhante, bonito e jovem, se envolvendo com uma tetraplégica. A postura da
mãe se notabiliza porque gera uma reação forte do público, que a apóia ou a
reprova, mas de qualquer forma, abre a questão para o debate público. Da mesma
31
forma, querendo proteger o outro gêmeo (Jorge), ela sofre e condena a
relação deste com uma garota de programa, Myrna (Aline Fanju).
A novela se desenvolve com outros núcleos se manifestando nos mais
diferentes temas, como os vivenciados em Búzios, pelas famílias da Helena e sua
irmã envolvida com o pai de seu filho, traficante ligado ao mundo das armas ou
ainda a vida da mãe de Renata, cartomante por profissão e preocupada com os
desvarios de sua filha que bebe demais e come de menos.
Um enfoque da trama que ganha relevância é o relacionamento de Dora,
grávida pela segunda vez e de sua filha de cinco anos com um argentino radicado
em Búzios e que quer organizar a vida em família com Dora, independente das
dúvidas a respeito da paternidade da criança que está para nascer. Durante muito
tempo é levantada a suspeita de que o filho possa ser de Marcos, com quem Dora
se envolveu no início da novela.
Tramas irrelevantes também são testadas perante o público, como por
exemplo, a paixão de um homem casado pela prima de sua esposa, Malu (Camila
Morgado), jornalista famosa, por quem ele tem uma fixação e que passa o tempo
tentando conquistá-la.
A novela termina com o reconhecimento de Bruno como filho de Marcos e a
protagonista, Helena, grávida de Bruno e assumindo um romance com o mesmo.
Um teste de DNA atesta que o filho de Dora é mesmo de Maradona e o
casal, Luciana e Miguel, independente da apelação da mãe do noivo, acaba se
casando e se mostrando muito à vontade com relação às limitações da cadeirante,
inclusive nos momentos mais íntimos. O episódio final mostra que Luciana,
tetraplégica, consegue dar à luz a gêmeos.
32
5 RESULTADOS
É possível subdividir os nove participantes em três grupos. O primeiro deles
(grupo 1) é formado pelos sujeitos dotados de uma forte moral cristã. São, todos
eles, religiosos e praticantes (sendo dois católicos e dois evangélicos pentecostais).
Apresentam, portanto, análises mais conservadoras vinculadas às ideias de “moral e
bons costumes”. Abominam o preconceito e o fazem sob o pretexto de que Deus fez
todos os homens iguais e, portanto, devemos amá-los como são, ainda que sejam
“diferentes”. Reconhecem, porém, certos discursos preconceituosos em alguns de
seus familiares, definindo que esses estão afastados da moral religiosa. Nesse
grupo podemos citar: Caroline62; Carlos; Renata e Beatriz.
Num segundo grupo (grupo 2), estão aqueles com características de uma
percepção ligeiramente crítica do cotidiano e das relações que esse cotidiano
compreende. Levantam alguns questionamentos perante certos assuntos polêmicos,
no entanto, se atêm às indagações, sem se dedicarem a saná-las, já que não
discutem tais assuntos em seus grupos de convívio diário. Encontram-se nesse
grupo dois, dos jovens pesquisados. Sendo eles: Júlia e Paulo.
O último grupo (grupo 3) conta com membros de ideias menos conservadoras
e mais reflexivas. As ideias mostram uma tendência a posicionamentos mais críticos
e maior flexibilidade diante dos freios morais. Os jovens que aqui se encontram
costumam conversar bastante sobre assuntos relacionados a preconceitos, aborto,
relações de gênero e outros assuntos correlatos. Possuem mais intimidade com a
literatura e não gostam muito das programações oferecidas pela TV. São eles:
Regina, Claudia e Louise.
62
Em respeito às identidades dos jovens, todos os nomes utilizados aqui são fictícios.
33
Contudo, é importante salientar que esses subgrupos tratam apenas
de categorias a serviço de análises. Apesar de diferenciados como tipos analíticos,
fazem todos parte do perfil que foi o elemento selecionador.
Isso posto, passo a apresentar o perfil dos participantes da pesquisa.
Júlia, 17 anos, cursa o terceiro ano do Ensino Médio e estudou sempre em
escola pública. Mora com sua mãe (auxiliar de cozinha) e sua avó (do lar). Assistia à
novela sempre com sua mãe, com quem comentava sobre a novela nos intervalos.
O seu grupo de amigos é, em sua maioria, do colégio, embora haja alguns, também,
em seu trabalho. Ela trabalha em um programa social da prefeitura “Menor
Aprendiz”, para jovens abaixo de dezoito anos e acima de dezesseis, que desejam
estagiar na área técnico-administrativa, na instituição Fundação de Ação Social.
Acessa a internet diariamente, verificando e-mails e sites de relacionamento (Orkut).
Informa-se através de telejornais, geralmente da Rede Globo e sua família não
assina ou costuma comprar nenhum periódico. Júlia e seus amigos conversam
sobre “um pouco de tudo”, filmes, reportagens, novelas (mais precisamente, o
comportamento dos personagens) e outros assuntos afins.
Beatriz, 16 anos, cursa o segundo ano do Ensino Médio e sempre estudou em
colégios públicos. Mora com os tios, sendo ele professor e ela gerente de uma
empresa de cosméticos. Costumava assistir à novela com sua tia e primas. O
assunto “novela” era trazido à tona com estas, bem como com seus amigos de
escola e trabalho. Ela trabalha em um programa social da prefeitura “Menor
Aprendiz”, para jovens abaixo de dezoito anos e acima de dezesseis, que desejam
estagiar na área técnico-administrativa, na instituição Fundação de Ação Social. É
com as suas colegas e amigas de estágio que Beatriz costuma socializar, conviver
mais intimamente e conversar mais. Essas conversas tendem a ser sobre namoro e
relacionamentos afetivos, moda, fofoca, novela, família, comida. Acessa a internet
com frequência, buscando sites de relacionamento (Orkut e MSN) e sites de música
online (Vaga-lume). Informa-se através de jornais televisivos e sua família não
assina nenhum jornal ou revista.
34
Regina, 17 anos, mora com a mãe (manicure) e padrasto (montador
de carros, pela Renault). Atualmente estuda na UTFPR, fazendo escola técnica, que
corresponde ao terceiro ano do Ensino Médio regular. Possui dois irmãos, sendo
um deles mais velho (21 anos) e uma mais nova (4 anos). A família assistia à
novela, todos juntos, na sala, embora não conversem sobre a mesma. Ela, além de
cursar o Ensino Médio, faz curso de teatro e não trabalha. Estudou tanto em escola
pública quanto em particular. Não fez parte de nenhum grupo como de igrejas,
escoteiros ou semelhantes. Em seu cotidiano, socializa mais com os colegas do
colégio do que com os do teatro. O tema “novela” não se encontra nos assuntos de
seu dia-a-dia. Faz uso da internet somente nos momentos em que não tem mais o
que fazer, dependendo da semana. Em seu tempo livre, gosta de assistir a filmes e
frequentar bares com muitos amigos. Não assiste muito à televisão. Quando o faz,
assiste a filmes e séries internacionais, geralmente.
Paulo, 21 anos, mora com a avó, a mãe (do lar), o irmão de nove anos, a
irmã, de dois anos e o padrasto (motorista de entrega). O pai (micro-empresário –
presta serviço de coletas e entregas). Todos assistem à novela, mas não juntos.
Entretanto, o assunto vem à tona quando algum dos membros não assistiu e
pretende saber o que ocorreu nos capítulos anteriores. Estudou o Ensino
Fundamental e Médio em colégios estaduais e cursou até o primeiro período de
Design, na Faculdade UniBrasil. Atualmente não está estudando e trabalha como
montador em uma empresa na região metropolitana de Curitiba, onde também
reside. Como lazer, Paulo joga futebol e vai à “balada” com os amigos. Já
frequentou várias igrejas. A última delas, Igreja Quadrangular, durante oito meses.
Não frequentou nenhuma delas por mais tempo do que isso. Convive com os amigos
de adolescência (a maioria do bairro onde mora), além de pessoas apresentadas por
amigos.
Claudia, 17 anos, cursa o 5° período da escola técnica da UTFPR. Estudou
parte de sua vida em escola pública, parte em escola particular. Mora com a mãe,
que é supervisora de telemarketing, embora tenha morado com o pai nos últimos
cinco anos. A mãe sempre assistia à novela e ela acompanhava a mãe, já que o
horário da novela também era o horário das refeições. Durante os intervalos
35
conversavam sobre a mesma. A jovem costumava reclamar da falta de
verossimilhança da trama. A família não assina nenhum periódico, entretanto, a mãe
sempre compra revistas sobre o resumo das novelas, Veja e Caras. Apenas a última
é lida por Cláudia. Não participa de grupos de jovens de alguma igreja e nunca
participou. Foi escoteira, quando criança. Em suas horas de lazer vai muito ao teatro
(além de fazer curso de interpretação teatral) e ao cinema. Não gosta de shopping
porque os passeios por eles são muito tediosos. Socializa com grupo de amigos do
colégio, com quem sai e se diverte em seus momentos de entretenimento. Entre
eles conversam bastante sobre intimidade, “coisas sexuais”, filmes, peças que
assistiram e lugares que frequentaram ou pretendem frequentar. Adquiriu,
recentemente, o gosto pela leitura. No momento está lendo “O diário de Anne
Frank”. Navega muito e todos os dias na internet, onde pesquisa sobre seus atores e
diretores prediletos e acessa a sites sobre filmes, além de e-mail e Orkut.
Caroline, 21 anos, cursa o segundo período do curso superior de
Biomedicina, em faculdade particular. Estudou, durante o Ensino Fundamental, em
escola partículas, já no Ensino Médio, estudou em escola pública. Mora com sua
mãe, seu pai e sua irmã mais velha. Os pais, no momento, se encontram
desempregados, a irmã, psicóloga, trabalha em na área. Caroline trabalha como
recepcionista de um restaurante, no período da noite, contra turno da faculdade.
Geralmente assistia à novela com sua mãe e irmã, todas juntas, na sala e
comentavam algumas cenas, mas não muitas. Esses comentários eram restritos à
família, já que ela não conversava sobre isso em outros lugares. Frequenta a Igreja
Batista e o grupo de jovens da mesma há três anos. E é com esse grupo que a
mesma passa seus períodos de lazer, quando conversam sobre música (as bandas
da Igreja), acontecimentos atuais e a situação de risco de certas crianças, como
prostituição infantil, abuso e violência. A família assina o jornal Gazeta do Povo e a
revista Veja. A jovem lê mais o jornal do que a revista. Quanto à literatura, costuma
ler obras de aventura. Por trabalhar à frente de um computador, acessa à internet
todos os dias, verificando seus e-mails, interagindo através do Orkut e
acompanhando sua conta de telefone celular.
36
Carlos, 24 anos mora com um dos seus irmãos e a cunhada. Os
demais irmãos moram com os pais. Ele, maquinista, há mais de quarenta anos e a
mãe, recepcionista. Em sua casa todos assistiam à novela: o casal em seu quarto e
Carlos no quarto dele, quando não estava na casa da namorada. Apesar de
assistirem à novela separadamente, conversavam sobre a mesma, principalmente
para assuntar o ocorrido em algum capítulo eventualmente perdido. Ele estudou a
sua vida toda em escola pública e no momento faz cursinho pré-vestibular. Trabalha
com assessoria técnica na área de informática. Em seus momentos de lazer gosta
de ficar em casa, assistir aos shows de rock da Igreja Batista que frequenta.
Costuma ler ficção e para se informar assiste ao Jornal Nacional e ao jornal da RIC
TV, além de sites de notícias, já que acessa a internet diariamente, para verificar
seus e-mails, ver notícias nos provedores Terra e UOL, Orkut, embora não muito.
A família não assina nenhum periódico, mas Carlos pretende fazer uma
assinatura da Revista Veja, em breve.Com seus amigos, conversa sobre as notícias
do momento, futebol, bandas de rock. Não conversam sobre novela, porque ele
dificilmente encontra um menino que a acompanhe.
Louise, 18 anos, estudante do quarto período de Ciências Sociais, trabalha
com pesquisa acadêmica e mora com os avós e irmã mais nova. A mãe trabalha em
supermercado e o pai trabalha em escritório comercial. O avô é representante
comercial e a avó é do lar. Sempre estudou em escola pública. Disse assistir mais a
novelas antes de começar a faculdade, porém, segundo ela, sempre teve uma visão
crítica e, com o tempo, foi perdendo a vontade de acompanhar as telenovelas.
Assiste por falta do que fazer e pelo fato da TV aberta não dar muita opção aos
espectadores. Segundo a mesma, essas novelas do autor Manoel Carlos não
estabelecem os padrões clichês mocinha/bandido, o que é bom, porque todos
parecem bastante humanizados. Louise busca analisar os aspectos morais que
regem, assiste também, pela questão sociológica. Afirma também encontrar entre as
pessoas de seu meio um grande preconceito contra aqueles que assistem a
novelas, mas ela luta contra isso, dizendo que não é só por estar no senso comum,
que aliena. Embora nem sempre seja assim, ela considera que muitas vezes pode
transformar padrões de comportamento de maneira positiva. Louise admite que
37
sofre preconceitos por parte dos colegas “mais cultos” (em suas palavras),
inclusive por parte do namorado, pelo fato de assistir a telenovelas. Segundo ela,
eles são “mais comunistas” e defendem a noção de manipulação completa por meio
da Rede Globo de Televisão. Louise acredita que o assunto deveria ser discutido,
pois percebe que essas produções oferecem coisas boas, além de permitirem várias
reflexões analíticas.
Renata, 15 anos, estudante do Ensino Médio. Assiste à novela sempre na
companhia dos familiares, pai (funcionário público), mãe (trabalha no banco HSBC)
e irmã mais nova, também estudante. Assiste a todas as novelas, das seis, das sete
e das oito horas. Todos sempre assistem à novela exibida no horário nobre (20h),
independente da novela que esteja no ar, porque geralmente elas trazem uma boa
trama e é o horário em que todos estão em casa. Através da etnografia ficou claro
que a família faz comentários sobre a novela durante toda a sua exibição, sempre
comentando o que acham que deveria ocorrer ou o que sabem que irá ocorrer por
terem acompanhado o resumo prévio na rádio.
5.1 MEDIAÇÕES QUE OPERAM NAS RECEPÇÕES MIDIÁTICAS
5.1.1 SOBRE A TELENOVELA (E AS NOVELAS) DE MANEIRA GERAL
Ao abordar a telenovela em questão, bem como externar sua opinião diante
das produções, em geral, identifica-se um padrão bastante claro, que se refere à
opinião que esses jovens têm, acreditando que as telenovelas, em grande medida,
distam da realidade. Notam, assim, grande ausência de verossimilhança.
Percebemos isso no depoimento de Louise, que avalia que as telenovelas “forçam a
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barra”, principalmente no que se refere ao retrato das classes sociais, que
aparecem de maneira romântica e fictícia. Romântica, ao mostrarem as classes
baixas, como menos dificuldades do que realmente têm. Fictícias, porque se atêm
muito à classe média alta, como se a maioria da população tivesse as mesmas
condições.
Há, ainda, a visão, que reclama a ausência de verossimilhança, quando
aborda a imagem da vilania representada em um único personagem. Isso fica claro
na fala de Claudia, quando diz:
O que não gosto nas novelas é acontecer que nem isso: tipo todas as coisas más do seres humanos... ah! Tipo cada um tem defeito, beleza! Mas se uma pessoa que é o vilão, tipo, todo o preconceito era dela. Ai porque a Aline era cadeirante o preconceito era dela, porque a menina era prostituta o preconceito era dela. E, tipo, é uma coisa que existe em toda a sociedade e ao invés de fazer em uma só pessoa. (Claudia)
Claudia se demonstra contrariada com essa tendência das novelas de
concentrar todos os “sentimentos ruins”, ou embasados no mau-caratismo em uma
única pessoa. Ela defende, no caso de sua fala supracitada, que várias pessoas são
dotadas de diversos tipos de preconceitos; portanto, quando a telenovela apresenta
todos os preconceitos na figura de alguém, fica irreal.
Ou ainda o exagero quando se trata da bondade do personagem, identificado
por Regina:
Acho que o Maradona é muita novela aparecer um cara destes, tipo claro que existe né, mas toda novela tem um Maradona da vida, um bobão assim (risos) um homem bom que assim tenha dinheiro, era bom de vida assim, apesar de ter toda uma experiência de vida mesmo assim ele cai na dela. (Regina)
De modo geral, com mais ou menos intensidade, todos os jovens pesquisados
sentem falta de uma maior dose de realidade no gênero. A famosa frase “só em
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novela, mesmo”, ou algo parecido, foi proferida por todos eles, operando
assim, segundo a literatura nos mostrou, uma leitura negociada, já que não se
opuseram completamente (nesse caso, a oposição por completo culminaria ao não
consumo do produto), mas, em certa medida, se recusaram aceitar de maneira
hegemônica o que lhes foi emitido.
Ainda assim, existe a noção de que a telenovela influencia no comportamento
das pessoas na [chamada] vida real. Como vemos:
Eu acho que influencia bastante, porque, moda ou modo de falar, porque querendo ou não muitas das pessoas às vezes até se identifica um pouco com o personagem, tipo, é aquele corte de cabelo eu acho que pode ficar legal pra mim! Enfim, ah! Vou sair com aquela roupa, ou vou procurar uma igual! Então eu acho que influencia e bastante as pessoas num modo geral(Beatriz)
[...]
Eu acho que até nas coisas negativas muitas vezes influencia, querendo ou não! Até você sem perceber, você acaba vendo que na novela; ah! Aquela menina foi pra tal festa, ela é tão nova! Ela fez tal coisa, ah! O que vai acontecer comigo? Não vai “dar nada”, vai que minha mãe encara do mesmo jeito que a mãe dela. Eu acho que acaba influenciando também do mesmo jeito, até você sem perceber, você acaba fazendo o que a pessoa faz e isso também eu acho que influencia bastante (Caroline)
Uma das jovens percebeu, ainda, diferença no comportamento de seus
colegas no cotidiano:
[...] Por exemplo, tenho uma amiga de cabelo crespo e ela anda sempre com o cabelo preso, amarrado e lá, tipo, na mídia, e ali na novela o cabelo tava bem armadão.. então na novela deixa tudo isso influenciar: você é bonita porque é parecida com a atriz da novela, inteligente, você fica bonita que nem ela[...]
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A operação, nesse caso, se dá através do código hegemônico, já
que as jovens acreditam que a telenovela exerce o poder de pautar o
comportamento dos sujeitos.
5.1.2 SOBRE RELAÇÕES DE GÊNERO E TRAIÇÃO
As meninas, de modo geral, perceberam as representações da relação
hierárquica de gênero tratada na novela. Marcos, o primeiro marido de Helena, ao
casar-se, exigiu que ela largasse a profissão de modelo. Nesse conjunto, as
meninas perceberam o machismo por parte do personagem e afirmaram ser isso,
sim, um retrato da realidade, definindo que, apesar do contexto social em que as
mulheres atualmente vivem, esse é um problema recorrente, a fala de Júlia
exemplifica o que todas as outras mencionaram e outras palavras:
Eu acho que, tipo, é bem parecido, porque, não é porque você casa, a mulher tem que ser independente. Não é só porque casou que o marido pode te dar do bom e do melhor que você não vai correr atrás dos seus objetivos. Ela fez super bem em querer continuar porque não é homem nenhum que vai falar o que você tem ou tem que deixar de fazer. (...) Acho que não, acho que mulher também tem vontade, né de... seguir uma carreira, tipo, tanto... tanto profissões que antigamente assim ““ah, mulher não pode fazer isso, não pode fazer isso”, hoje tem mulher fazendo mais coisas que homem. (Júlia)
Entendendo a mensagem de jeito hegemônico, já que a trama já colocava
essa questão como um grave defeito do personagem, que, além de impedir que sua
esposa trabalhasse, ainda mantinha relacionamentos extra-conjugais, sendo infiel.
Diante da infidelidade de alguns personagens, percebe-se, claramente, que
a aqueles jovens que compõem o grupo 1, aplicando à problemática a sua moral
41
cristã, tratam do tema lançando mão da noção de ‘perdão’. Exemplifico
através das falas de dois deles:
[...] Eu acho que a Dora logo no começo que ela descobriu que o Marcos era marido da Helena, eu acho que ela devia ter chegado na Helena e conversado. Ela não devia ter ficado escondida, porque ele ficou sendo infiel dentro da própria casa dele. Ela devia ter chegado e contado pra helena, até porque ela não tinha culpa, ela sabia, ela devia chegar e esclarecia, até porque elas eram amigas [...]. (Beatriz)
[...]
Eu achei legal a parte do casal. Acho que é movida a um perdão, se isso aconteceu uma vez e houve o perdão mesmo, “pô”, é uma coisa assim que a novela passou bem legal. Assim é que tem que tomar outra vida. Porque eu, assim, particularmente, eu não gosto de traição e ninguém gosta e eu tento ao máximo fazer tudo na minha vida assim não só no meu relacionamento, no meu namoro, mas no meu relacionamento com a minha família e aos meus amigos, ser especial para as pessoas que eu amo, ser especial em tudo, no trabalho, para tudo. Então, tipo, essa foi a coisa do perdão assim foi uma coisa bem legal a ser passado. (Carlos)
A análise, aqui, parte do princípio da trama que girava em torno do triângulo
amoroso Betina e seu marido, e Malu, que vem a ser sua prima. O marido de Betina,
ao ter caso com Malu, acaba por ser perdoado por sua esposa. Assim como é
pregado pelas igrejas cristãs, que, em suma, condenam a separação e estimulam a
conversa, para que se chegue ao acordo, por meio do perdão.
42
5.1.3 SOBRE PRECONCEITOS
A novela, em dado momento, apresentou um dos personagens mais
relevantes (Jorge, ex-namorado de Luciana), apaixonado por uma mulher (Mirna),
que era prostituta. Percebemos aqui, mais uma vez, o pensamento conservador e
sim, dotado de preconceito, de jovens pertencentes ao grupo 1. Vemos isso através
das seguintes explanações:
Eu não trabalharia numa profissão dessas! Eu não tenho nada contra assim, eu não sou preconceituosa, assim: “ai! Eu não vou conversar com aquela menina e tal que trabalha”, mas pra mim, pra mim, como profissão, eu não acho que é uma profissão vender o corpo, eu acho que tem várias opções de ganhar dinheiro, formas honestas, hoje em dia tem muito curso, muitas oportunidades, sabe, eu acho que não precisa disso pra ganhar a vida, pra mim é isso (Caroline)
[...]
Não que o trabalho dela seja desonesto, mas eu também acho que ela podia ter achado outras formas de se sustentar, não vendendo o corpo, eu também não me vejo nessa profissão, igual ela falou, tem vários modos de ganhar dinheiro hoje em dia, cursos, cursos gratuitos aí que muita gente aproveita e hoje em dia são grandes pessoas na sociedade que souberam aproveitar (Beatriz)
[...]
[...] É... igual ela, eu acho que a pessoa que faz isso não é por falta de opção, a pessoa, não só no brasil, mas em vários países, a questão da pessoa querer se profissionalizar mais num curso específico do que fazer a... vender o corpo assim, é só a pessoa chegar e querer, ter força de vontade (Júlia)
Apesar da Caroline se dizer livre de preconceito, a mesma se contradiz,
quando afirma que a personagem podia se valer de uma profissão “honesta”, ao
invés de “vender o corpo”. Termo esse que já é bastante pejorativo, também
identificado na fala de Beatriz, que defende, assim como Júlia, que qualquer outra
profissão é melhor do que essa. Salientando ainda, que a condição de prostituta se
restringe a uma opção do sujeito. Esquecendo-se que se trata, de modo geral, de
ausência de opção.
Os jovens do grupo 3 não se aprofundam na temática.
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Quando se mencionou o preconceito proveniente da condição
de cadeirante da personagem Luciana, a jovem Beatriz (grupo 1), emitiu,
novamente, juízo de valor, de cunho moral, quando afirmou o seguinte:
Então eu acho que ela pensava assim [a mãe de dos gêmeos ,Jorge e Miguel]“ai, além de ela já ter sido é... namorada do meu outro filho, agora ela é cadeirante e vai namorar com meu filho que é médico”. Acho que ficou um preconceito aí, sabe? Claro, preocupação de mãe também, porque a mãe quer sempre ver o filho feliz mas... Eu acho que foi mais preconceito. (Beatriz)
Juízo de valor porque, em momento algum, a mãe explicitou incômodo com o
fato da possível nora já ter sido, anteriormente, namorada de seu outro filho. Todo o
problema residia no fato de Luciana estar em uma cadeira de rodas, o que, segundo
o olhar materno, viria a limitar a vida e o futuro do seu filho.
Nesse sentido, fazendo uma análise já mais avançada, Regina avalia:
Ah! Ali também achei que foi meio que todo mundo ficou meio desesperado, ah! Nossa eles vão ter a primeira noite deles e, mas por outro lado que eu acho que também o que a novela quis mostra é que eles têm vida né, uma vida normal como qualquer pessoa, pertinente a qualquer pessoa, de ter relação sexual (Regina)
A jovem, aqui, dialoga com a mensagem, achando, em primeira instância uma
expressão exagerada da realidade, considera, no entanto, importante mostrarem a
possibilidade de um cadeirante ter uma vida sexual normal, ativa. Ela, em outro
momento, diz que achou interessante levantarem essa temática, pois nunca, em
outro momento, havia pensado como seria o sexo para algum deficiente físico.
A telenovela, que trouxe, pioneiramente no horário nobre, uma protagonista
negra, não abordou profundamente o preconceito racial. Nas entrevistas em
profundidade, isso foi questionado aos jovens, sobre como eles enxergam a
questão. Paulo (grupo 2), não havia pensado no assunto antes de ser abordado,
mas acha bom que tenham apresentado uma Helena negra, pois não se lembrava
de isso ter ocorrido antes. Segundo ele, é legal o fato dela ser bonita.
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Bruna (grupo 3), disse que considera importante terem trazido uma
Helena negra, oriunda de classe média. Considera, todavia, que a temática do
preconceito deveria ter sido mais explorada na novela. Claudia, do mesmo grupo,
concorda:
Eu acho que é muito bom apareceu uma cena [cena que suscita preconceito da mãe do nvo namorado de Helena]. Também, tipo, a mãe fala: ah! Subiu na vida porque enfrentou o preconceito contra a sua cor, tipo, não é uma coisa tipo deixar, porque existe mesmo preconceito sobre a cor e tudo tem que deixar tipo, tem umas novelas assim que branco e negro, está tudo bem, mas não é assim. (Claudia)
Claudia refere-se, ao dizer que “tem umas novelas que branco e negro está
tudo bem”, ao fato de que as relações entre brancos e negros não são livres de
tensão. E que isso não deveria deixar de ser exibido na novela.
5.1.4 SOBRE ABORTO
O tema aborto, como não poderia deixar de ser, nos permite verificar, com
uma linha bem demarcada, o pensamento mais forte de cada grupo.
Assim, as falas selecionadas, primeiramente, são ditas por membros do
grupo 1, que são veementemente contra o aborto, independente do contexto:
Uma questão que eu acredito e creio é que a gente não é Deus não é nada né?! A gente não pode decidir pela vida de uma outra pessoa. (Carlos)
[...]
Eu acho que a novela acabou até um pouco, como se encobrisse o aborto! Porque como era uma... uma carreira de modelo, entendeu, ela não, ela não ficou triste tudo por jogarem na cara dela tudo: que ela tinha abortado. Mas a novela não deixou claramente que ela se arrependeu, de que é errado, entendeu? A novela tipo, ah! Pra seguir a carreira dela, ela teve que fazer isso, até no final ela engravidou, tudo entendeu? Então eu acho que não foi bem tratado (Caroline)
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Carlos defende que só Deus tem o direito de tirar a vida de alguém.
Caroline, por sua vez, considera que o assunto não foi bem tratado, pois a
personagem não se mostrou arrependida ou triste por ter praticado o aborto.
Quando analisamos a fala de alguém do grupo 2, verificamos que ele dialoga
mais com a temática. Mostrando maior flexibilidade diante do assunto:
Aborto tipo eu sou contra né? Que nem a lei hoje, num caso que não seja nem por violência ou por.... É por essas coisas aí, tudo bem se for assim desse jeito eu concordo com abortos, mas se for porque ela não quer realmente o filho porque tipo por um motivo ou outro, né? Ela não, o filho não foi previsto ou alguma coisa assim, ai eu sou contra, já acho que não é certo fazer isto (Paulo)
O jovem demonstra que não considera “certo” que alguém faça aborto pelo
simples fato de não ter planejado um filho. Entretanto, em caso de estupro, ele
defende a prática.
A jovem que representa o grupo 3, se mostra livre de freios morais, e adota
argumentos feministas, em defesa do gênero para defesa do aborto. Acha, além
disso, que a novela se posicionou contra a prática:
Pelo ataque das duas [Luciana e Helena] que tinha a cena que jogava na cara dela [Helena] e porque ela se mostrava arrependida. Só que em minha opinião acho que é válido, é um direito da mulher. Claro que, assim: ah! Então beleza vamos transar sem camisinha e que posso abortar depois. Então, nisso eu sou contra entendeu acho que é um dos problemas se legalizasse o aborto assim. Porque se a mulher não quer ter um filho é um direito dela não ter, entendeu? Mas na novela pelo que percebi que eles se colocaram contra, totalmente contra o aborto assim, seja pelo arrependimento dela. (Regina)
Andressa defende que a mulher deve ter pleno direito e domínio sobre o seu
corpo. Diante disso, contrariamente ao entendimento de Caroline, ela considera que
a telenovela se posicionou contra o aborto. Isso porque mostrou o arrependimento
de Helena e sua tristeza diante das verdades ditas pela personagem da Luciana.
Essa oposição entre os membros do grupo 1 (representado pela afirmação de
Caroline) e membros do grupo 3 (no caso, representado pela fala de Regina), nos
46
mostra, claramente, como o contexto social vai interferir de maneira
considerável a leitura que esses atores sociais farão diante da mensagem televisiva.
Partindo de seus princípios morais e religiosos, Caroline achou que a telenovela
deveria ter mostrado o grande arrependimento de Helena. Em contrapartida, Regina,
dada a sua flexibilidade frente aos freios morais, percebe que a produção midiática
se posicionou contra o aborto, quando mostrou a Helena sofrendo por
arrependimento pelo ato que cometeu. Nesse caso, Caroline entendeu a mensagem
de modo negociado: percebeu o arrependimento da personagem, mas acha que ela
deveria ter se mostrado ainda mais arrependida pelo “pecado” que cometeu. Regina,
em contrapartida, operou através de oposição, já que entendeu, literalmente, que
Helena estava arrependida, mas não achava que ela deveria se sentir, por se tratar
de um direito que a mulher tem: decidir o momento apropriado para ter um filho.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Num cenário onde a mídia se apresenta com grande relevância, este trabalho
buscou verificar qual o alcance desta por jovens espectadores. Para tanto, perfez-se
necessário mensurar a comunicação no ambiente social e como se deram os
estudos de recepção nas últimas décadas. Impossível abordar a comunicação,
deixando de lado a cultura. Assim, os estudos culturais, no tocante aos media foram
mencionados.
Há larga abrangência da televisão, e, especialmente, da telenovela na
América Latina, e por esse motivo, elegemos uma telenovela como produto midiático
para nos oferecer a análise desejada.
Diante disso, através dos jovens participantes da pesquisa, que se deu por
meio de pesquisa qualitativa, pudemos perceber de que forma os mesmos dialogam
com as mensagens emitidas. Queríamos verificar as possibilidades de incorporação,
submissão ou resistência que apresentam diante da mensagem.
Notamos, destarte, que aqueles jovens que são provenientes de múltiplas
inserções sociais, que não permanecem, exclusivamente, em casa; que saem com
os amigos e conversam sobre temáticas de cunho social, moral, religioso e outros,
se mostram contra preconceitos e defendem uma sociedade mais equânime; os que
têm o hábito de leitura, dedicando-se a obras literárias, tendem a operar as
mensagens através da oposição ou modo negociado. Principalmente quando essas
mensagens dizem respeito à manutenção do status quo, reproduzindo preconceitos
por eles identificados na sociedade.
Em contrapartida, os jovens que frequentam menos grupos sociais e não se
dedicam à leitura; que se declaram contra o preconceito, embora tenhamos
identificado em diversas de suas falas; não conversam sobre temas como aborto,
racismo, homofobia em seu cotidiano e tendem a transmitir esses valores no
momento de codificar as mensagens recebidas. Não podemos afirmar que se trata,
unicamente, de operarem as mensagens de modo hegemônico, mas que, quando as
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mensagens aparecem com impressões mais conservadoras, o código tende
a ser hegemônico. Em caso de mensagens mais críticas, a tendência é que haja
negociação ou recusa.
A literatura nos aponta o que foi confirmado através da pesquisa empírica.
Quando fala da formação multifacetada da identidade, que se constrói com base nas
diversas vivências experienciadas pelos atores sociais; essas experiências, por sua
vez, vem a agir, de modo direto ou indireto, tanto sobre a construção e realização
das preferências, quanto (e é o nosso objeto de estudo aqui) nas mediações feitas
com os media e todos os conteúdos emitidos.
A pesquisa evidenciou que a forma do jovem interpretar a mensagem
diferencia-se da forma dos demais, dependendo do cotidiano, histórico e rotinas
familiares.
É necessário ressaltar o caráter exploratório da pesquisa que visou
problematizar a questão e nos indicou alguns apontamentos. Não estou, com isso,
querendo afirmar que jovens de determinado perfil comportam-se de determinada
maneira. Esse tipo de afirmação, certeira, somente pode ser feito após análise
quantitativa.
Ainda assim, considero que chegamos a resultados bastante relevantes, já
que temos o jovem assumindo importante papel diante da sociedade e é de suma
importância que percebamos que os meios sociais interferem diretamente na forma
que esses jovens receberão as mensagens. Ademais, também é importante verificar
que meios são esses, que oferecem ao jovem critérios mais reflexivos e
posicionamentos mais críticos diante de tantos conteúdos irrelevantes tele-
transmitidos, e que, alguns jovens, se vêem obrigados a consumir.
.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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