I
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião
Odilon Massolar Chaves
Doutorando
AVIVAMENTO E O COMPROMISSO SOCIAL METODISTA,
NA INGLATERRA, NO SÉCULO XVIII: UMA BUSCA DE SUBSÍDIOS PARA A
IDENTIDADE DO METODISMO BRASILEIRO NO 3º MILÊNIO
Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth
Orientador
Em cumprimento parcial das exigências
da pós-graduação para a obtenção
de grau de doutor em
Ciências da Religião
São Bernardo do Campo, 2002
II
BANCA EXAMINADORA
Presidente
_____________________________________________________________________________________
III
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Adherico e Roza,que me educaram dentro dos princípios cristãos;
A minha famíliaque me deu força nos estudos e pesquisa.
IV
AGRADECIMENTOS
A Deusque me sustentou com sua imensa graça;
Prof. Dr.Lauri Emilio Wirth,pela valiosa orientação nesta pesquisa,
Aos professores e professoras da Umesp,pelo ensino e amizade;
Aos colegas da Pós-Gradução,pelo convívio fraternal.
A Rosilei e Ricardo,pela sempre preciosa atenção na secretaria.
V
RECONHECIMENTO
Igreja Metodista,
Instituto Metodista Bennett,
Universidade Metodista de São Paulo
Pela participação nos recursos financeiros,
que tornaram possível concluir o doutorado
VI
SINOPSE
Esta pesquisa tem o propósito de dar uma contribuição para a
elaboração histórica sobre o Avivamento e o Compromisso Social
Metodista, no século XVIII, na Inglaterra cujo subsídio poderá servir
para a identidade metodista no novo milênio. Tanto o avivamento, que
surgiu como com conseqüência do forte mover do Espírito Santo, bem
como a atuação do povo metodista junto às camadas pobres, como
resultado da prática das Obras de Misericórdia, sempre andaram
juntas. Fé e obras ou espiritualidade e ação social eram partes
integrantes de uma mesma mensagem, que pode ser resumida como
“a fé que atua pelo amor”. A ênfase na salvação total do ser humano,
com o passar dos anos, passou a ser entendida de maneira diferente
pelos novos grupos que surgiram na Igreja e que passaram a enfatizar
a salvação da alma (Espiritualismo) e o Compromisso Social
(Evangelho Social). Mais recentemente, a partir da década de
sessenta, esses grupos passaram a ter novos nomes: Teologia da
Libertação e Movimento Carismático. As divisões ocorridas, no último
século, no metodismo brasileiro, foram conseqüências, em grande
parte, do radicalismo entre esses dois grupos Se na Igreja Católica a
crise permanece, se bem que bem mais amena, entre os adeptos da
VII
Teologia da Libertação, cuja expressão maior são as CEB
(Comunidades Eclesiais de Base), e a RCC (Renovação Carismática).
(Católica), no metodismo brasileiro tem havido um caminhar para a
unidade entre os chamados “carismáticos” e os “liberais”,
especialmente, a partir do Concílio Geral de 1982, com a aprovação
do Plano para a Vida e a Missão da Igreja, e do Concílio Geral de
1987, com a organização da igreja em Dons e Ministérios Essas duas
ênfases teológicas, a partir da década de noventa, ficaram contidas na
Ação Missionária, que tem sido fator de unidade na Igreja. Esta
pesquisa procura mostrar essa realidade e aponta a atuação do
movimento metodista, na Inglaterra, como paradigma para a Igreja
Metodista, em território brasileiro, no novo milênio.
VIII
ABSTRACT
The purpose of this research is to investigate the approach of the
Methodist Church to renewal and social commitment in England during
the XVIII century. The author proposes that this historical Methodist
Movement can serve as a model for the Methodist Identity in the
present millennium. During the XVIII century, the Renewal Movement
(a result of the Holy Spirit) and the work among the poor (a practice of
works of mercy) were practiced together. Faith and deeds, or
spirituality and social work, completed a unified message: Faith works
through love. Groups that arose within the Methodist church interpreted
this emphasis on the salvation of the whole person in different ways.
Some groups started to emphasize salvation of the soul while others
emphasized social commitment (the social Gospel). Recently, with the
passing of the 1960’s, these groups were given new names: the
Theology of Liberation and the Charismatic Movement. The divisions
that occurred in the last century in the Brazilian Methodist Church
were, to a great degree, consequences of the radicalism of these two
groups. In the Catholic Church, the crisis between the two groups
IX
persists to a lesser degree. The Theology of Liberation movement is
expressed through the CEB (Base Ecclesiastic Communities) and the
RCC (the Renovation of the Catholic Charismatic). The establishment
of one document and one organization within the Methodist church has
helped to unite the “liberationists” and the ”charismatics”: The “Plan for
the Life and Mission of the Church” (approved during the 1982 meeting
of the General Council) and ‘Gifts and Ministries’ (organized during the
1987 meeting of the General Council). These theological emphases
were put into action after the 1990’s with the Missionary Action
Ministry. This has been the most important uniting factor in the Church.
This research is seeking to bring to light this modern reality and to
present England’s XVIII century Methodist Movement as a paradigm
for the Brazilian Methodist Church in the new millennium.
X
HOMENAGEM
A UM LÍDER COM UMA GRANDE VISÃO E IMENSA DETERMINAÇÃO
“Dê-me cem pregadores que não tenham medo de nada, a nãoser do pecado, e que não desejem mais nada, a não ser servir a Deus,e, não me importo se são clérigos ou leigos, eles sozinhos farãotremer os portões do inferno e estabelecerão o reino dos céus aqui naterra.”1
João Wesley
1HEITZENHATER, Richard P. Wesley e o povo chamado Metodista. São Bernardo doCampo-Rio de Janeiro: Editeo-Pastoral Bennett, 1986, p.266.
XI
O avivamento e o compromisso social Metodista, naInglaterra, no século XVIII: uma busca de subsídios para a
identidade do metodismo brasileiro no 3º milênio
XII
INTRODUÇÃO
“Enquanto John Wesley pregava a sua doutrinade salvação individual, compreendeu que a salvaçãoera também social (...)” .2
Hugh C. Tucker
A presente pesquisa tem como título: O avivamento e o
compromisso social Metodista, na Inglaterra, no século XVIII: uma
busca de subsídios para a identidade do metodismo brasileiro no 3º
milênio.
Na estrutura da tese3, temos o seguinte índice4: o capítulo
primeiro mostra o conflito teológico entre os chamados carismáticos e
os sócio-políticos. No segundo capítulo, é abordado o contexto social,
político e religioso em que surgiu o metodismo na Inglaterra, no século
XVIII. O capítulo terceiro analisa o perfil bibliográfico do criador do
2 TUCKER, Hugh C. “Ecumenismo metodista” em Expositor Cristão. São Paulo [s.ed], 19de fevereiro de 1948, ano 62, nº 8, p.1.3 Na digitação da tese, utilizamos o livro de Pedro Augusto Furasté: Normas técnicas parao trabalho científico. Porto Alegre: Serviços Datilográficos e Computadorizados, 10 ed,2001. Livro adotado pela pós-graduação em Ciências da Religião da Umesp.4 Richard P. Heitzenrater, que alcançou notoriedade mundial ao encontrar a chave paradecifrar o Diary particular de João Wesley, (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.IX)propõe a seguinte divisão da história do metodismo primitivo: O surgimento do Metodismo(1725-1739); O reavivamento começa (1739-1744); A consolidação do movimento (1744-1758); O processo de amadurecimento do Metodismo (1758-1775); Tensões e transições(1775-1791). (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.33-261).
XIII
metodismo, João Wesley. No quarto capítulo veremos como foi
formada a identidade teológica do movimento metodista abordando os
diversos movimentos da época, bem como a formação e
desenvolvimento da sua organização e a contribuição dos diversos
líderes da época ligados ao metodismo. O quinto capítulo mostra o
impacto e a contribuição do avivamento wesleyano, no século XVIII,
na Inglaterra, e na década de noventa, no metodismo brasileiro. No
sexto capítulo mostramos que o avivamento metodista trouxe uma
contribuição à sociedade inglesa e ao cristianismo. No último capítulo,
apontamos as principais diretrizes e fundamentos para um autêntico
avivamento, tendo como paradigma o avivamento metodista do século
XVIII.
O método escolhido para a nossa pesquisa é o método histórico.
Segundo Eva Maria Lakatos e Marina de Andrade Marconi, esse
método de procedimento parte do seguinte princípio:
“(...) as atuais formas de vida social, asinstituições e os costumes têm origem no passado, éimportante pesquisar suas raízes, para compreendersua natureza e função. Assim o método históricoconsiste em investigar acontecimentos, processos einstituições do passado para verificar a sua influênciana sociedade de hoje, pois as instituições alcançaramsua forma atual através de alterações de suas partescomponentes, ao longo do tempo, influenciadas pelocontexto cultural particular de cada época.”5
5 LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia Científica. SãoPaulo:Editora Atlas, 1991, p.81-2.
XIV
Partimos de pressuposto básico de que temos que ir às raízes do
metodismo para compreender sua “natureza e função” e trazermos
pistas para o modo de ser e de agir do metodismo hoje.
Não desejamos trazer uma estrutura do passado para o hoje e
nem desejamos tentar repetir uma história e sim verificar os
fundamentos teológicos e a vivência wesleyana na abertura ao mover
do Espírito6 e no compromisso social, para servirem de base para o
nosso tempo, levando em conta a atual cultura e o contexto social e
político do país.
A vivência, conflitos e tendências no metodismo hoje nos levam a
buscar no passado as nossas raízes já que constantemente as
diversas tendências dentro da Igreja hoje buscam em Wesley os
fundamentos para suas práticas.
Como diz Adam Schaff:
“(...) a história é função dos interesses do presenteou - como escreve N.M. Prokovski - é a política atualprojetada sobre o passado.”7
Partimos do princípio de que o metodismo em cada época tem
tido crises, tem tido dificuldades em sua vocação profética e com a
sua própria identidade por causa do contexto social em que se situa.
Atualizando a afirmação das autoras citadas anteriormente, o
metodismo alcançou sua forma atual através de alterações, ao longo
6 Expressão que explicaremos na tese.7 SCHAFF, Adam. História e Verdade. São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda,1983, p. 271.
XV
do tempo, influenciados pelo contexto cultural particular de cada
época.
Como exemplo, citamos a década de cinqüenta quando o país
viveu um triunfalismo com o novo Presidente da República8 e o
metodismo teve também sua euforia com o “Avante por Cristo”9. Na
década de sessenta, quando o Brasil viveu um período de rápidas
transformações, o metodismo não conseguiu acompanhar todo o
processo no contexto em que vivia. Mas o Brasil entrou em crise e o
metodismo também:
“Todo esse desenvolvimento do capitalismonacionalista do populismo entrou em crise durante adécada de 60 devido à marginalização das grandesmassas rurais, para as quais não houve solução e asquais invadiram as cidades, pela limitação do seumercado interno, que levou a uma parada docrescimento econômico, a completar com o estadoplanejador e, finalmente, à desnacionalização do estadoe da economia, para favorecer a intervenção econômicaestrangeira.”10
8 No Governo de Juscelino ”a base para o progresso foi uma extraordinária expansãoindustrial. Entre 1955 e 1961, a produção industrial cresceu 80% (em preçosconstantes),com as percentagens mais altas registradas pelas indústrias de aço (100%),indústrias econômicas (125%), indústrias elétricas e comunicações (380%) e indústrias deequipamentos de transportes (600%)”. (SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo.Rio de Janeiro: Paz e terra, 1975, p.204).9 O programa tinha quatro aspectos: Nossa Fé; Nossa Igreja; Nosso Ministério e NossaMissão (SEXTO CONCÍLIO GERAL. Avante por Cristo. [s.ed], [s.d], p. 138).10 GOTAY, Samuel Silva et al. História da Teologia na América Latina. São Paulo: EdiçõesPaulinas, 1981, p.149.
XVI
Essa análise nos ajuda a entender que a Igreja Metodista
aprovou sua organização em dons e ministérios11 somente em 1987,
porque o Brasil vivia um período de abertura democrática e de
participação popular.
Na verdade, o metodismo brasileiro caminhou muito à sombra da
ênfase política e social brasileira. Getúlio Vargas dirigiu o país da
década de trinta a década de cinqüenta com uma ditadura. O primeiro
bispo brasileiro dirigiu o metodismo com mão de ferro também de
1934 a 1955.12
Esse método histórico é uma opção que nos ajuda a ir por um
caminho mais seguro de fazermos uma pesquisa mais perto da sua
realidade.
Mais uma vez, Adam Schaff nos ajuda:
“A seleção dos fatos é portanto função do contextohistórico do historiador, da teoria que ela aplica (...).”13
Ao pesquisar sobre a história do metodismo é possível que outro
historiador chegue a resultados diferentes do nosso, sem ter forjado a
história ou mentido. Exatamente, porque o sujeito escreve do seu
lugar social, a partir de suas tendências, seleção dos fatos, opções,
interesses, mediações sociais, preconceitos, etc.
11 Organização em dons e ministérios significa a livre escolha do ministério (serviço) quecada pessoa deseja participar na organização da Igreja, sem burocracia. No sextocapítulo abordaremos com mais profundidade sobre os dons e ministérios na organizaçãometodista.12 O primeiro bispo do metodismo brasileiro foi César Dacorso Filho.13 SCHAFF, Adam. História e Verdade . Ibidem, p.237.
XVII
A questão chave da pesquisa é o equilíbrio wesleyano entre
piedade e o seu forte compromisso social, no século XVIII, na
Inglaterra. Uma identidade 14 cujo paradigma15 dará diretrizes aos que
buscam um avivamento em nossos tempos, no Brasil. Abordaremos,
no sexto capítulo, portanto, o metodismo no século XVIII, na Inglaterra,
e a sua contribuição para a Igreja Metodista, no Brasil, no 3º milênio.
Diversos movimentos influenciaram o metodismo ao longo de
sua história. O metodismo que os brasileiros receberam em 1867 veio
como uma roupagem ideológica, que o diferenciava grandemente de
suas origens na Inglaterra. Até mesma concordância com a escravidão
ocorreu na América por parte da liderança da Igreja.
Júlio de Santa Ana afirma:
“(...) a partir de 1839, começaram a surgir cismasna Igreja Metodista dos Estados Unidos por causadessa questão. Esta divisão durou até 1938. Mas o quemais nos interessa aqui é o fato de que foram setores
14 Segundo Magali do Nascimento Cunha, ”nunca se falou tanto em identidade na IgrejaMetodista (...). Falar de identidade e tentar reafirmá-la é próprio dos momentos de crise,seja individual ou coletiva (...). Identidade não se preserva; identidade é um processoincessante de construção: (...). Significa reler o passado com os olhos num processo deconstrução identificando o que foi criado no passado (os traços de identidade que ficam eos que foram abandonados), o que está sendo criado no presente (frente aos desafios darealidade) e somar tudo isso ao projeto futuro (como o que ainda não é que desafia opresente e o passado” (CASTRO, Clóvis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento.Forjando uma Nova Igreja, São Paulo: Editeo, 2001, p.63-5). No Primeiro Capítulo,citaremos doze afirmações do Colégio Episcopal da Igreja Metodista publicada no livro AsMarcas Básicas da Identidade Metodista onde está definida a identidade metodista.15 “(...) terminologia que tomou conta das discussões metodológicas, da filosofia daciência e da epistemologia, desde 1962, quando Kuhn, lançou a primeira edição de suadiscutida obra, The Structure of Scientific Revolutions (...). (CASTRO, Clóvis Pinto de etal. Novos Paradigmas. São Bernardo do Campo: Instituto Ecumênico de pós-graduaçãoem Ciências da Religião, 1995, p.30-1). Paradigma é entendido como “modeloestabelecido por um conjunto de soluções concretas a certos problemas’ que regem osvários momentos e fases das atividades dessa ciência” (Ibidem, p.31).
XVIII
do metodismo, que não souberam assumir as suasresponsabilidades diante da questão escravista, os quechegaram a certas partes da América Latina. Isso querdizer que, além de sua orientação conservadora emquestões sociopolíticas, davam também sinais deincoerência entre o pensamento e a prática. Esteelemento deve ser tomado fortemente em conta quandose fala da nossa herança metodista.”16
O metodismo que veio para o Brasil foi dos sulistas derrotados
na Guerra de Secessão na América. Junius Newmam havia perdido
suas terras e veio tentar a sorte aqui,17 com a benção da Igreja
Metodista Episcopal do Sul.
“Em 1966, um número considerável de sulistas, quetinham sofrido prejuízos enormes em conseqüênciadessa conflagração, resolveu emigrar para o Brasil. ORev. Junius E. Newman, que antes era homem de certafortuna, tendo perdido tudo que possuía, durante essaguerra, precisava de alguma forma restabelecer osseus haveres. Vendo muitos dos seus amigos epatrícios partirem para uma terra longínqua eestrangeira, resolveu acompanhá-los, especialmenteanimado pela esperança de poder auxiliar napropaganda do Evangelho.”18
Ele, primeiramente, fixou residência em Niterói e depois, em 17
de agosto de 1871, organizou a primeira Igreja Metodista com nove
norte-americanos, em Saltinho, SP.19
16BONINO et al. Luta pela vida e evangelização. Edições Paulinas-Editora Unimep, 1985,p.50-1.17 SALVADOR, José Gonçalves. História do Metodismo no Brasil. São Paulo: ImprensaMetodista, 1982, p.51-5.18KENNEDY, J.L. Cinqüenta Anos de Metodismo no Brasil. São Paulo:ImprensaMetodista, 1928, p.1619 Ibidem, p.59.
XIX
Julio de Santa Ana, ao comentar sobre alguns elementos da
herança metodista, afirma:
“(...) o metodismo nos Estados Unidos, apesar deposicionar-se em favor da independência desse paísem relação ao poder colonial britânico (posição na qualdivergiu radicalmente com a de Wesley), caracterizou-se pelo predomínio de posições conservaras emquestões sociais e políticas, pelo menos até inícios donosso século, quando a influência da corrente do´Social Gospel´ começou a fazer-se sentir, emborajamais chegasse a predominar no pensamentometodista.“20
A corrente do Evangelho Social21 teve importante influência no
metodismo brasileiro, especialmente com a liderança do Rev.
H.C.Tucker,22 que foi líder na área social da Igreja Metodista entre as
décadas de trinta e cinqüenta.
Tucker se referiu ao evangelho integral pregado por Wesley:
“Enquanto John Wesley pregava a sua doutrina desalvação individual, compreendeu que a salvação eratambém social, que ele não poderia ser fiel ao
20 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização. São Paulo-Piracicaba: Edições Paulinas-Editora Unimep, 1985, p.49-50.21 “Os anos finais do décimo nono século presenciaram o despertar de profundo interessesocial entre muitos cristãos. Sob a direção de ministros liberais como WashingtonGladden (!836-1918) e Walter Raschenbush (1861-1918) progrediu o ‘evangelho social’americano. No começo desse século o protestantismo expressara seu interesse socialprincipalmente em termos individuais, insistindo em reformas nas obras de caridade e namoral, mas o evangelho social focou sua atenção sobre aspectos corporados da vidamoderna e sobre a consecução da justiça social. Grande atenção foi dada às relaçõesentre capital e trabalho e o movimento influiu no encurtamento das horas diárias detrabalho” ( WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. Tradução de N. Duval da Silva. 2v. São Paulo: Imprensa Metodista, ASTE, 1967, p.282.22O grande líder no Brasil foi H. C. Tucker. Ele foi Secretário Geral de Ação Social naIgreja Metodista do Brasil. Tucker foi influenciado pelas idéias de Rauschenbusch.
XX
chamado do Mestre, se não ocupasse dos grandesmales do seu tempo” .23
Durante a história do metodismo em terras brasileiras surgiram
movimentos, especialmente, a partir da década de trinta procurando
despertar a Igreja, especialmente, para o crescimento. Alguns conflitos
e divisões foram inevitáveis.24 O conflito se tornou mais forte na
década de sessenta quando surgiu uma grande divisão no metodismo,
no Rio de Janeiro, em 1967. 25
A partir dos anos setenta, as duas tendências inerentes ao
metodismo brasileiro assumiram contornos mais nítidos através do
Movimento Carismático e da Teologia da Libertação. Desde, então, o
metodismo brasileiro vive procurando um ponto de equilíbrio e de
ação. Cada um deles sempre procura se fundamentar em Wesley e
no metodismo do século XVIII.
A cisão mais conhecida e mais trágica ocorreu em 1967, no Rio
de Janeiro, quando um grupo de cinco pastores entendeu que o
metodismo brasileiro havia se desviado de sua origem wesleyana. Por
isso organizaram a Igreja Metodista Wesleyana, exatamente por
entenderem que suas práticas eram apoiadas por João Wesley.
23 TUCKER, Hugh C. “Ecumenismo metodista” em Expositor Cristão. São Paulo [s.ed], 19de fevereiro de 1948, ano 62, nº 8, p.1.24 A primeira divisão ocorreu em torno de 1935 com a criação da Irmandade MetodistaOrtodoxa, em um conflito envolvendo o presbítero José Henriques da Matta, Faculdadede Teologia e bispo César Dacorso Filho.25Em janeiro de 1967, no Concílio Regional, em Nova Friburgo, RJ, cinco presbíterosentregaram as credenciais retirando-se da Igreja Metodista por discordância com o bispoNathanael Inocêncio do Nascimento. Organizaram a Igreja Metodista Wesleyana, cujaênfase principal passou a ser no batismo do Espírito Santo.
XXI
Assim, alegavam realizar um avivamento para o metodismo voltar às
suas raízes:
“(...) nos sentimos chamados pelo Espírito Santopara realizar uma obra de avivamento no seio da IgrejaMetodista do Brasil.”26
Como não viram outras alternativas, declararam:
“(...) retiramo-nos da Igreja Metodista do Brasilcom o propósito de organizarmos uma Igreja Metodistanos moldes do Metodismo Primitivo.”27
Essas tendências avivalistas ou sociopolíticas ainda geram
debates na vida da Igreja Metodista, mas sem grandes crises.
Afinal, o metodismo deve se preocupar também com a educação,
a questão indígena, fome, FMI e com a violência?28
Podemos expulsar demônios, orar em línguas, levantar as mãos
e bater palmas nos louvores ou estas práticas não fazem parte da
nossa identidade?29
26 O principal líder, Gessé Teixeira de Carvalho, fez esta declaração em carta ao ConcílioRegional. Eles estavam saindo porque sentiam que não tinham outra alternativa(CARVALHO, Gessé Teixeira de. "Leitura de Documentos" em Atas, Registros eDocumentos do 11º Concílio Regional da 1ª Região. 1967, p.40).27CARVALHO, Gessé Teixeira de., ibidem. O Metodismo Primitivo que é citado pelo grupoé o metodismo de Wesley e não a Igreja Metodista Primitiva, que surgiu após a morte deJoão Wesley, na Inglaterra.28 Essas questões têm sido abordadas naturalmente pelo Colégio Episcopal e demaisórgãos gerais da Igreja Metodista, como a Coordenação Nacional de Ação Social. No ano2000, o Credo Social foi republicado.29 O Colégio Episcopal publicou em 1988 a Pastoral sobre a Doutrina do Espírito Santo eo Movimento Carismático e procurou orientar os relacionamentos entre os chamadoscarismáticos e não carismáticos, entre as páginas 39 e 47.
XXII
Essas questões estão presentes na vida da Igreja.30 Por isso, a
razão desta pesquisa procurar analisar essas questões em Wesley e
assim contribuir para a Vida e a Missão da Igreja Metodista mostrando
sua origem, base teológica e identidade.
O PVM (Plano para Vida e a Missão da Igreja) aprovado no
Concílio Geral, em 1982, fundamentou e deu suporte para a ênfase
nas Obras de Piedade e Atos de Misericórdia. A Igreja conseguiu
colocar em um documento uma forte base teológica com ênfases dos
grupos carismáticos e os chamados “liberais”.31 Entre outras
importantes afirmações, o PVM diz:
“A missão acontece na promoção da vida e dotrabalho - para que haja vida são necessáriascomunhão e reconciliação com Deus e o próximo,direito a terra, habitação, alimentação, valorização dafamília e dos marginalizados da família, saúde,educação, lazer, participação na vida comunitária,política e artística,e preservação na natureza (At 2.42;II Co 5.18-20; Jo 10.10, 15.5. I Jo 1.7).”32
Na tese pretendemos fundamentar a ação do metodismo dentro
do equilíbrio das Obras de Misericórdia e Atos de Piedade, que hoje
30 Magali do Nascimento Cunha afirma que a implantação dos dons e ministérios nometodismo, em 1987, coincidiu com o crescimento do pentecostalismo e “alguns desviosda proposta metodista puderam ser notados na vida das igrejas, com a ênfase na criaçãode ministérios de reforço às práticas avivalistas de tendência carismática” (CASTRO,Clóvis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma nova Igreja. São Paulo:Editeo, 2001, p.69).31 A expressão “liberal” será explicada no Capítulo 1.32 CONCILIO GERAL. Vida e Missão. Editora UNIMEP, 1982, p.16-7.
XXIII
são praticados com outras expressões, como ação profética e vida
devocional, etc.
Por isso, a importância de abordar esses temas em Wesley
procurando diretrizes para os nossos dias, não só para o metodismo,
mas também para os diversos avivamentos que têm surgido.33 Assim,
a presente pesquisa quer ser uma contribuição para sustentar
teologicamente a ênfase e a prática atual metodista, que nos dois
últimos Concílios Gerais, em 1991 e 1997, colocou como tema: Igreja,
Comunidade Missionária a serviço do povo.
Cremos que o avivamento metodista, na Inglaterra, no século
XVIII, serve como paradigma para a Igreja, no Brasil, no novo milênio.
Nosso pressuposto básico é de que avivamento e compromisso social
fazem parte do todo do Evangelho e da identidade metodista.
Como afirma Steve Harper:
“As décadas de sessenta e setenta atacaramduramente esta dimensão da vida social e espiritual. A
33 As Igrejas Protestantes, Católicas e mesmo as pentecostais têm sido abaladas, nadécada de noventa, por diversos movimentos espirituais, como o G12, que têm geradopolêmicas e dividido diversas denominações. G12 é um movimento que têm abalado asIgrejas evangélicas em todo o Brasil levando seus líderes a se posicionar e a orientar osmembros e pastores de suas denominações. Sob a liderança de César e ClaúdiaCastellanos, fundadores da Missão Carismática Internacional, em Bogotá, Colômbia, omovimento passou a ser mais conhecido no Brasil a partir de junho de 1999, quando foirealizada uma Convenção, em São Paulo, com o lema “Avivamento Celular – Desafiopara o século XXI”. Mais de três mil e quinhentos pastores e pastoras de todas asdenominações participaram. O objetivo dos G12 é fazer de cada membro um líder. Háuma forte ênfase no discipulado pessoal. A estrutura básica da liderança é a seguinte:Líderes, supervisores, pastores-de-área, pastores-de-distrito.O G12 se baseia em quatropilares: ganhar, consolidar, treinar e enviar. As Igrejas Metodista e Presbiteriana do Brasile mesmo líderes da Assembléia de Deus, tomaram posição contrária ao movimento, quetêm na pastora Valnice Milhomens uma das principais líderes.
XXIV
relatividade moral e a ênfase nos direitos e privilégiosdo indivíduo desafiaram seriamente a nossa crença nospadrões universais. A nossa herança wesleyana,contudo, nos lembra de que tais padrões aindaexistem.”34
Esta dimensão social e espiritual ou espiritualidade social é que
desejamos recuperar em Wesley para servir de diretriz para as igrejas
que buscam avivamento no novo milênio.
A influência do Movimento Carismático e do Movimento
Profético35 no metodismo brasileiro ainda não foi objeto de uma
pesquisa cientifica mais profunda.
As preocupações e ênfases nas pesquisas têm sido diferentes e
têm levado sempre em conta as situações que cada autor vive em seu
lugar social. A tendência maior é dar um enfoque sob o ponto de vista
dos problemas sociais e não a partir também das necessidades e
ênfase da ação do Espírito Santo nas comunidades locais.
Devido aos problemas sociais e políticos na América Latina,
autores metodistas latino-americanos têm procurado discutir a
participação de Wesley diante dos problemas sociais de sua época,
na Inglaterra, com objetivo de encontrar um referencial para a atuação
da Igreja hoje.
34 HARPER, Steve. A vida devocional na tradição wesleyana. São Paulo:ImprensaMetodista, 1992, p.77.35 Expressão que relacionamos como político-social. No Capítulo 1 abordaremos sobreesse assunto.
XXV
Como exemplo, citamos o Primeiro Encontro de Teologia
Protestante, em Costa Rica, entre 6 e 11 de fevereiro de 1983, cujos
resultados foram publicados no livro La tradición protestante em la
teologia latinoamericana. Foi discutido amplamente sobre a tradição
metodista e foram levantadas questões como:
Poderemos falar e perceber um metodismo Latino-Americano?
Que elementos da herança Metodista a Igreja Latino-Americana
reconhece?
Os temas abordados – “O Wesley dos pobres” (Elza Tamez); "As
comunidades de base e a tradição metodista" (Mortimer Arias);
"Metodismo na América Latina – o caso uruguaio" (Emílio Castro), etc,
revelam a tendência de encontrar na tradição wesleyana respostas
para os problemas que afligem ao povo na América Latina.
A mesma tendência se observa no livro Luta pela vida e
evangelização – A tradição metodista na teologia latino americana,
publicado pela Unimep, em 1991.
Teólogos de expressão abordaram temas como: "Aspectos
políticos e ideológicos do metodismo histórico" (Clory Trindade de
Oliveira); "Herança e responsabilidade do metodismo na América
Latina" (Julio de Santa Ana); “O caráter ideológico do metodismo que
nos veio dos E.U.A.” (Nora Quiroga Boots); “Por uma Igreja solidária
com os pobres” (Vitório Araya G.), etc.
XXVI
Dentre os temas acima, destacamos dois. Segundo Clory
Trindade de Oliveira, para se compreender Wesley é preciso entender
que o seu pensamento político repousa na sua visão teológica do
homem:
“O ser humano é dado à desordem e aodesregramento; os governantes são os responsáveispelo cumprimento da tarefa de manutenção da ordem, afim de que a vida possa acontecer e o povo possaaproveitar as oportunidades que surgirem, inclusive asuprema oportunidade da aceitação de uma nova vidaaqui neste mundo, mas cujo objetivo final é o novomundo, sob a soberania amorosa e justa de Deus.”36
Nora Quiroga Boots comenta o caráter ideológico das Missões
que vieram dos EUA:
“(...) a Guerra Civil dos Estados Unidos e o seuresultado influíram significativamente nas missõesprotestantes, particularmente no Brasil. Cidadãosestadunidenses do Sul, insatisfeitos com os resultadosda Guerra Civil, emigraram para o Brasil (...).”37
As Instituições de Ensino, como a Unimep,38 têm procurado
retomar às raízes do metodismo primitivo lançando livros como
Aspectos do metodismo histórico, de Sante Uberto Barbieri, 1983, que
aborda temas como “A identidade do metodismo”, “A Ação Social do
Metodismo primitivo”, etc.
36 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização. São Paulo: Edições Paulinas-Unimep,1985, p.35.37 Ibidem, p.115.38 Universidade Metodista de Piracicaba.
XXVII
Deste bloco de publicações, destacamos um lembrete de Sante
Uberto Barbieri:
“É bom lembrar aqui que João Wesley viveu naInglaterra antes da Revolução Industrial, quando aindanão se tinha consciência do que seria a redençãosocial, a justa retribuição ao trabalho e a verdadeiranoção de respeito humano. Não devemos, pois, esperarque os primeiros metodistas tivessem a mesmaconsciência moral que nós no século XX.”39
Outro livro publicado foi Metodismo: releitura latino-americana, de
José Miguez Bonino, 1983, abordando temas como: “Foi o metodismo
um movimento libertador?”, “Conservar o Metodismo? Em busca de
um genuíno ecumenismo”, etc.
Dentro do tema "releitura", Bonino diz:
“Em princípio, creio que as duas observações sãocorretas. A investigação de nossa ‘herança metodista’-como costumamos chamá-la – não pode ser nem nossaprimeira prioridade nem nossa lealdade derradeira.Nossa identidade não se forja primeiramente numaidentificação com o passado, mas na realização detarefas presentes e no compromisso com o projetohistórico. Entretanto – e aqui começamos com umaresposta positiva – tão pouco se forja ‘sem’ o passado.”40
Já Edward P. Thompson, historiador inglês comprometido com as
causas populares, escreveu A Formação da Classe Operária Inglesa,41
onde procura mostrar, a partir da Revolução Industrial, século XVIII,
como a classe operária se formou na Inglaterra. Neste aspecto, ele
39 BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos do metodismo histórico. Unimep, 1983, p.12.40BONINO, José Miguez. Metodismo: releitura latino-americana. Editora Unimep, 1983, p.5.41 Editora Paz e Terra, 1, 2 e 3 v. 1987.
XXVIII
coloca o metodismo como tendo sido importante no processo, apesar
de ver também aspectos negativos, como o conservadorismo em
questões políticas. Thompson não poupa também críticas a Wesley.
Apesar das contradições, ele cita o movimento wesleyano como tendo
sido fundamental na sociedade inglesa, no século XVIII.
“(...) foi Wesley - ultraconservador em política esacerdotal em questões de organização - o primeiro achegar aos 'pobres de Cristo', quebrando o tabucalvinista com a simples mensagem: 'A única coisa afazer é salvar almas.” 42
Thompson citou ainda a importância do metodismo inglês na
organização dos operários:
“(...) é-nos conhecido o argumento de que ometodismo foi indiretamente responsável por umaumento na autoconfiança e capacidade deorganização do operariado.”43
Outra tendência é abordar a história do metodismo primitivo e sua
origem no Brasil. Neste aspecto temos autores reconhecidos, como
Duncan Alexander Reily (Metodismo Brasileiro e Wesleyano 44;
História Documental do Protestantismo no Brasil 45); José Gonçalves
Salvador (História do Metodismo no Brasil 46); Richard P. Heitzenhater
42THOMPSON, Edward P. A Formação da Classe Operária Inglesa. 1 v. Paz e terra,1987, p.36.43 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v. p.42.44 São Paulo: Imprensa Metodista, 1981.45 São Paulo: Imprensa Metodista, ASTE, 1984.46 São Paulo:Imprensa Metodista, 1982.
XXIX
(Wesley e o Povo Chamado Metodista47) e Mateo Lelièvre (João
Wesley, Sua Vida e Obra 48).
Dentre este bloco, destacamos o historiador Richard P.
Heitzenhater com o livro Wesley e o Povo Chamado Metodista. Uma
obra de grande importância para a compreensão do metodismo, na
Inglaterra, no século XVIII, onde o metodismo é apresentado como um
movimento.
Richard Heitzenhater diz:
“O foco unificador para Wesley era a preocupaçãocom o espalhar a santidade bíblica. Esta ênfase nateologia pratica era o traço central da tradição do ´viversanto´que por séculos havia atravessado muitas dasdivisões tradicionais dentro do cristianismo (...). Umtraço comum nessa seqüência histórica é a amplapreocupação pelo bem-estar das criaturas de Deus –mente, corpo e alma.”49
Uma outra ênfase atual vem dos metodistas Walter Klaiber e
Manfred Marquardts, teólogos alemães, que procuram abordar os
grande temas teológicos do metodismo wesleyano no livro Viver a
Graça de Deus.50 Os capítulos são: ”Anúncio responsável ou o porquê
de uma teologia metodista”; “Salvação universal ou o amor de Deus
para com seu mundo”; “Fé pessoal ou a experiência da salvação pelo
indivíduo”, “O ser-cristão total ou a realidade do amor”.
47 Editeo-Pastoral Bennett, 1996.48São Paulo:Editora Vida, 1997.49 HEITZENHATER, Richard P. Wesley e o povo chamado Metodista. São Bernardo doCampo-Rio de Janeiro: Editeo-Pastoral Bennett, 1986, p.322.50 São Paulo: Editeo-Editora Cedro,1999.
XXX
Os autores abordam as ênfases doutrinárias em Wesley. Uma
das afirmações do livro mostra como o metodismo se desenvolveu:
“As resoluções das consultas das conferênciasanuais do movimento de Wesley foram protocoladas epublicadas, formando a base doutrinária a que todos sereferiam (...) através da ´conferência anual´ ele crioupara as igrejas metodistas um instrumento que ascapacitou mesmo depois de sua morte a reagir emcomum e em bloco aos desafios de cada época.”51
Dentro da estrutura eclesiástica, os Bispos têm procurado
publicar Pastorais, abordando temas como As marcas da Identidade
Metodista, 1995; Pastoral sobre a Maçonaria, 2000. Todas as
Pastorais foram publicadas pela Biblioteca Vida e Missão. São
orientações visando, especialmente, a unidade da Igreja.
Uma das abordagens recentes que se aproxima mais da
nossa tese é a do teólogo metodista José Miguez Bonino, em seu
livro Rostros del protestantismo latinoamericano.52 Ele procura
mostrar, entre outras ênfases, o surgimento e amadurecimento do
pentecostalismo latino-americano. Ele afirma:
“O movimento pentecostal se coloca, maiormente,entre os setores mais empobrecidos de nossos tempose cidades. Dessa realidade, que foi também a realidadedesde a qual Jesus situou seu ministério (Lc 4.18), o
51 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred. Viver a graça de Deus. São Bernardo doCampo-São Paulo: Editeo-Editora Cesdro, 1999, p.61-2.52 Publicado pela Nuvem Creacion, Buenos Aires-Grand Rapids y William B. EerdmansPublishing Conpany, ISEDET 1995.
XXXI
pentecostalismo desafia a uma sociedade em pecado eem franco processo de decomposição.” 53
Bonino ainda cita documento aprovado em O Encontro de
Pentecostais Latino Americano, Salvador, Bahia, janeiro de 1988, que
indica o amadurecimento dos pentecostais:
“(...) as igrejas pentecostais que, superando umahistórica tendência da marginalização social, se temcomprometido com os que sofrem e descobrindo novasformas de participação social.”54
Entre as teses relacionadas ao metodismo brasileiro,
destacamos: “Sobre sonhos e pesadelos da juventude Metodista
Brasileira nos anos sessenta”, de Jorge Hamilton Sampaio. Para ele, a
crise da mocidade na década de sessenta está relacionada com a
liderança da Igreja em priorizar a salvação da alma.55 Em sua tese,
Hamilton afirma que a mocidade defendia a salvação total do ser
humano.
Jorge Hamilton cita também documento do VII Congresso
Geral da Mocidade Metodista, realizado entre 16 e 20 de julho de
1969, que mostra as principais características da Igreja Metodista, na
década de sessenta: paternalismo, autoritarismo; legalismo,
53BONINO, José Miguez. Rostros del protestantismo latinoamericano, Nuvem Creacion,Buenos Aires, Grand Rapids y William B. Eerdmans Publishing Conpany, ISEDET, 1995,p. 69.54 ______. ______. Ibidem. Documento de síntese, 6-9 de janeiro de 1988, mimiografado,p.5.55 SAMPAIO, Jorge Hamilton. Sobre sonhos e pesadelos da juventude MetodistaBrasileira nos anos sessenta. Pós Graduação em Ciências da Religião da UniversidadeMetodista de São Paulo,1998, p.200,206, 238.
XXXII
clericalização, mistificação (colocar “panos quentes” em todas as
crises) e individualismo.56
Uma das únicas obras que abordam o avivamento, no
metodismo brasileiro, tem como título Avivamento e Despertamento
Missionário, de autoria do pastor metodista José Pontes Sobrinho.
Publicado em 1998, o autor procura fazer uma crítica aos erros
avivalistas, tais como espiritualismo exacerbado, supervalorização do
diabo, menosprezo do intelecto, emocionalismo, perigo de falsos
profetas, os erros dos falsos profetas e das profecias falsas, etc.
Na conclusão, o autor afirma:
“Ao concluir este livro, é nossa oração e esperançaque ele, com toda sua limitação, possa contribuir para acorreção dos erros que fatalmente surgem em temposde avivamento.”57
Contudo, o autor não deixa de reconhecer a existência de
manifestações emocionais e físicas nos avivamentos:
“Os escritos de John Wesley nos mostram quedurante suas pregações, cultos e reuniões, aconteciameventualmente manifestações marcadas por emoções.Em alguns momentos, alguns gritavam tão alto quantopodiam. Diversos caiam ao chão como se estivessemmortos (...).”58
Também os avivalistas ou carismáticos se apropriam, como os
liberais, de textos de Wesley, segundo sua inclinação teológica ou
56VII CONGRESSO GERAL da Mocidade Metodista. “Uma síntese sobre ascaracterísticas da Igreja Metodista”, 16 a 10 de julho de 1969, citado na tese Sobresonhos e Pesadelos da Mocidade Metodista nos anos sessenta, p.224-6.57 SOBRINHO, José Pontes Sobrinho. Avivamento e despertamento missionário. BeloHorizonte:Éphata Publicações, 1998, p.82-3.
XXXIII
interesse. No livreto 50 dias de oração pelo VII Encontro Nacional de
Avivamento, são citadas diversas experiências dos primeiros
metodistas, com o Espírito Santo. Entre elas está:
“Deus derramou abundantemente seu Espíritosobre nós Muitos ficaram cheios de consolação (...).Deus restaurou o homem à luz de sua face, e deu àjovem moça a convicção clara do seu amor.”59
O tema que é objeto de nossa pesquisa, portanto, não foi ainda
abordado cientificamente, no metodismo brasileiro.
Ao abordar a herança wesleyana, citamos Duncan Alexander
Reily:
“Certamente, não significa, porém, tentarmosreproduzir o wesleyanismo inglês do século XVIII e nemo metodismo norte-americano do século XIX ou XX,pois o princípio da autonomia nos liberta desta imitaçãoservil. Significa assumirmos responsavelmente a nossaherança, não como escravos a ela, senão com ‘agloriosa liberdade dos filhos de Deus (Rm 8.21).”60
Com esta tese desejamos contribuir para o equilíbrio e unidade
da Igreja hoje dentro de sua missão e busca de avivamento.
Desde o estabelecimento das missões vindas da América do
Norte, a partir de meados do século XIX, duas forças entraram em
choque no metodismo brasileiro empurrados pelo Evangelho Social e
58 Ibidem, p.37.59 Reunião dos metodistas, sob a liderança de Wesley, em 28/04/1762. Publicado nolivreto 50 dias de oração pelo VII Encontro Nacional de Avivamento, Ibidem, p. 7.
XXXIV
a Igreja Espiritual. Mas a mensagem maior que veio com os primeiros
missionários não foi de compromisso social e sim uma vida salva do
mundo pecador.61
O metodismo brasileiro oficialmente procurou um avivamento
nos moldes do metodismo wesleyano. Como exemplo, citamos o
Instituto Ministerial Geral da Igreja, em 1947.
Entre os dias 9 e 17 de julho de 1947, a Igreja promoveu seu I
Instituto Ministerial Geral, no Colégio Bennett, sob a direção da Junta
Geral de Educação Cristã. Segundo os documentos, o Instituto Geral
foi tão marcante que, no final do encontro, todos estavam com os
corações trasbordantes de entusiasmo cristão.
Os Bispos e pastores presentes lançaram um desafio a todos em
prol do mais pronto estabelecimento do Reino dos Céus em nossa
Pátria, através da sua ação evangelizante, educativa e assistencial.62
Os pastores aceitaram o desafio do Colégio dos Bispos de alcançar
seis mil novos membros no exercício eclesiástico.
O desafio tinha um preço:
60 REILY, Duncan Alexander. Metodismo Brasileiro e Wesleyano. São Paulo: ImprensaMetodista, 1981, p.17.61 Antônio Gouvêa de Mendonça afirma que “a teologia explícita nos sermões e hinos doscongregacionalistas, presbiterianos, metodistas e batistas, nos seus contornos gerais, é ado metodismo americano: o amor de Deus por todos os homens pecadores, o perdãogracioso pela aceitação, através da fé, do sacrifício expiatório de Cristo, a vidaregenerada visível na ética mundana e a expectativa da vida eterna no céu” (O CelestePorvir,. Edições Paulinas, 1984, p.203).62 Reportagem do Expositor Cristão sobre o “Instituto Geral do Ministério da IgrejaMetodista do Brasil”. Publicado em 28 de agosto de 1947, p.1.
XXXV
“O desafio vos apela a uma consagração irrestrita eincondicional, de todas as energias e capacidades, nagloriosa empresa da conquista do Brasil para Cristo.”63
O Instituto Ministerial trouxe aos pastores a consciência da
necessidade de mudança:
“1. Todos nós sentimos necessidade de renovaçãoespiritual concretizada numa experiência viva,resultante de nosso encontro com Jesus e o EspíritoSanto. Do vigor espiritual do Ministério da Igrejaresultará uma Igreja vivamente espiritual (...);
2. Todos nós sentimos necessidade de maisaproximação entre os ministros e pastores de nossaIgreja (...) O IG facilitou esta aproximação e a igreja jáestá gozando dos resultados dos novos ideais de queestão possuídos os pastores que não se furtaram aoprivilégio de tomar parte nos seus trabalhos;
3. Todos nós sentimos necessidade de dar mais forçaao trabalho de Evangelização (...). A ênfase nesteponto, avivou-nos o espírito o ideal de Cristo e da IgrejaCristã nos seus primórdios, dando a cada um de nósCONSCIÊNCIA do verdadeiro sentido deEVANGELIZAÇÃO (...).”64
O repórter oficial do Instituto Ministerial, no fim da reportagem,
declara:
“Cada pastor que participou do Inst. Minist. Geral jáestá infundindo em sua igreja uma nova consciência doque quer dizer Avivamento Espiritual, Trabalho Pastorale Evangelização.”65
63 Ibidem.64 ALMEIDA, José Rui de. “Os frutos do Instituto” em Expositor Cristão. 28 de agosto a 4de setembro de 1947, p. 14-5.65 Ibidem, p.15
XXXVI
Como resultado do Instituto Geral, os metodistas se envolveram
mais nas Cruzadas,66 na década de quarenta, e no Avante por Cristo,
na década de cinqüenta.
Durante a história do metodismo no Brasil, alguns líderes, como
Guaracy Silveira, lutaram para que a dicotomia espiritual-social
pudesse ser eliminada e a questão da espiritualidade fosse vista sem
preconceitos.
No início da década de cinqüenta, o Movimento das Cruzadas
em algumas denominações era forte, principalmente, em São Paulo.
Diante desta situação, na abertura do Concílio Regional do Centro, no
dia 23 de Janeiro de 1953, Guaracy Silveira propõe a eleição de uma
Comissão Especial para estudar a situação da Igreja Metodista do
Brasil em face do pentecostalismo e avivamento de João Wesley.67
A Comissão ficou constituída de Afonso Romano Filho, Guaracy
Silveira, Francisco Gonçalves Noceti, Joviniano Ferreira e Natanael
66 As Cruzadas e o Avante por Cristo foram movimentos que visavam dinamizar a Igrejanum todo, especialmente na evangelização. Com a manchete Cruzada Metodista deEvangelização, o Expositor Cristão, órgão oficial da Igreja Metodista, publicou em 11 deoutubro de 1955, matéria de Duncan Alexander Reily, novo Secretário Geral de Missões eEvangelização, que afirmou: “O Relatório Estatístico do VII Concílio Geral revela que,durante o qüinqüênio findo, a Igreja Metodista marchou a passos largos no setor material.Construiu um templo cada 21 dias e uma casa pastoral cada 53 dias. Quase triplicou omovimento financeiro do quadriênio anterior. As publicações aumentaram sensivelmenteas suas tiragens, a ‘Cruz de Malta’, por exemplo, ultrapassando o seu alvo por 8.000.Maso fato que o Metodismo ficou aquém do seu alvo de matrícula nas EE.DD.(Alvo:58.200;atingiu 48.800) e no número de membros da Igreja (Alvo:45.000; atingiu:40.500) era desanimador (...). Estas estatísticas destacaram o que a Igreja vem sentindodesde há muito – a necessidade de maior ênfase na evangelização (...)”. (REILY, DuncanAlexander. “Cruzada Metodista de Evangelização” em Expositor Cristão. São Paulo, 13 deoutubro de 1955, nº 41, ano 70, p.1).67 FILHO, Afonso Romano et al. "Extrato das Atas das sessões do 23º Concílio Regional"em Atas e Documentos. 21 a 25 de Janeiro de 1953, Piracicaba, p.14.
XXXVII
Bizarro Rosa. A Comissão Especial fez observações simpáticas ao
pentecostalismo:
“Devemos nos alegrar com o trabalho dospentecostais, e dar graças a Deus porque, aquilo quehá neles, que nos parecem erros de prática cristã, nãotenha sido obstáculo a que eles estejam alcançandomilhares de almas (...).”68
Para a Comissão, o metodismo tem armas dadas por Deus,
através de João Wesley, por isso não precisamos de armas de outras
comunidades para vencer a nossa luta.
Mas a Comissão foi franca e também disse:
“Devemos, portanto, nós, ministros e leigos, numavigorosa e honesta autocrítica, examinar nossas vidas everificar onde estão nossas falhas, para que,removidas, tornemos mais eficiente nossa vida noserviço do Mestre.”69
Foram dadas ainda várias recomendações, desde a prática do
jejum até o reconhecimento dos dons das pessoas que têm frutos no
trabalho, mesmo sendo de pouco preparo teológico. A Igreja deveria
prepará-los.
A questão ainda continua, se bem que bem mais tranqüila. Mas
há ainda os que são rotulados de “carismáticos” e “liberais.”70 A
68 Atas e Documentos do 23º Concílio Regional do Centro, 1953 [s.ed], "Suplemento 4",p.18.69 Ibidem.70CASTRO, Clóvis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento.Forjando uma nova Igreja.Ibidem, p.56.
XXXVIII
questão hoje é saber se é possível haver uma unidade entre as
correntes teológicas como foi no metodismo primitivo.
É possível ser “avivado” ou “carismático” e ter um forte
compromisso social?
É possível ser “liberal” ou da Teologia da Libertação e ser
avivado?
Na história do metodismo, na Inglaterra, vemos que isso foi
possível. Nas Conferências Anuais,71 essa questão nunca mereceu
maior destaque e nunca gerou polêmica, a não ser a questão do livre
arbítrio, perfeição cristã, relação com a Igreja Anglicana, regras, etc.
Pelo desenrolar da história a força do avivamento e a ênfase na
participação profética do metodismo convergem para se tornar uma
força única em uma geração futura. Hoje ainda há radicalismo nos
dois grupos dentro da Igreja.
Mas muito menor do que na Igreja Católica onde a Renovação
Carismática Católica e os participantes das Comunidades Eclesiais de
Base têm ainda hoje sérios conflitos.
Mas o movimento carismático na Igreja Metodista é diferente do
catolicismo. No metodismo, ele encontrou uma herança histórica e
71Posteriormente, detalharemos a importância das Conferências Anuais no metodismo, naInglaterra, século XVIII.
XXXIX
uma base teológica que levam ao equilíbrio. Essa expressão
“carismática” tem a tendência de desaparecer dentro do metodismo.
É até já é possível se ver também alguns dos chamados liberais
participando do louvor com mais intensidade. É possível também ver
os chamados carismáticos hoje muito mais engajados na ação social e
conscientes politicamente. Desde que o metodismo passou a se
organizar em dons e ministérios, em 1987, passou a caminhar para
uma maior unidade.
Não cremos que a Igreja chegará em uma uniformidade, que não
é sinônimo de unidade. Cremos que as diretrizes da Igreja já são
resultado dessa mútua compreensão que vem de um amadurecimento
ao longo da história.
Nossa hipótese é que é possível essa retomada, tendo em vista
que os primeiros metodistas e Wesley tinham essa visão e práticas
bem definidas. Ao escrever sobre as marcas de um metodista, João
Wesley disse:
“Um metodista é alguém que tem o amor de Deusem seu coração, pelo Espírito Santo que lhe foi dado; éalguém que ama ao Senhor seu Deus, ‘com todo o seucoração, com toda a sua alma, com todo entendimentoe força (...).”72
72 WESLEY, João. As Marcas de Um Metodista. Publicado pelo Departamento deEditoração, São Paulo, [s.d.], p.3.
XL
Para Wesley era impossível uma pessoa ter o Espírito Santo e
ser voltada para si mesma.
“(...) Finalmente, na medida de suas forças, ele fazo bem a todos, amigos e inimigos, ao próximo e aoestranho, e isto em todas as espécies: não só a seuscorpos, vestindo os nus, dando de comer a quem temfome, mas, muito m ais do que isto, procurando o bemde suas almas, de acordo com os dons que vêm deDeus (...).”73
Mostrando sua percepção na ação do Espírito Santo, nas
reuniões congregacionais, Wesley descreveu em 28 de abril de 1762:
“(...) Depois do sermão, tivemos uma Festa de Amor.Foi hora deliciosa. Deus derramou e seu Espírito sobrenós. Muitos ficaram cheios de consolação(...).”74
Contudo, revelando seu equilíbrio, sensibilidade e ênfase no
compromisso social, ele relata um momento de um culto, em 10 de
março de 1765:
“Levantamos uma coleta em nossa congregaçãoem prol dos tecelões que estavam sem emprego (...).”75
O mesmo equilíbrio se percebe, em seu diário, escrito no dia 3
de março de 1788, quando ele trata de uma questão social séria - a
escravidão, numa quinta feira:
“Dei aviso de que, na quinta feira, pregaria sobre oassunto muito discutido - A Escravidão.”76
73 Ibidem, p.7.74 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.106.75 Ibidem, p.109.76 Ibidem, p.190.
XLI
E, já no dia seguinte, Wesley marca um momento de jejum e
oração para a libertação dos que estavam escravizados:
“(...) marcamos sexta-feira como dia de jejum eoração; que Deus se lembrasse daqueles homenspobres e desgraçados e (o que parece impossível comhomens, considerando a riqueza e poder na suapossessão) lhes desse meio de escapar, quebrando-lhes as algemas em pedaços.”77
Para Wesley, a ação do Espírito Santo no ser humano deveria
trazer, conseqüentemente, o amor a Deus e ao próximo, e, assim, um
compromisso social:
“Os que ‘andam segundo o Espírito’, tanto nocoração como na vida O Espírito lhes ensina a amar aDeus e ao próximo com um amor que é semelhante auma ‘fonte que jorra para a vida eterna’ (...).”78
Wesley diz claramente que era essa a razão do Espírito Santo
existir na vida do cristão:
“A manifestação do Espírito Santo teve em miraconceder-lhes (o que ninguém pode negar sejaessencial a todos os cristãos, em todos os tempos), amente que havia em Cristo; os santos frutos do Espírito,os quais, não os tendo alguém, esse tal não lhespertence; teve em vista enche-los de ‘caridade, gozo,paz, longanimidade, benignidade, bondade’ (Gl 5.22-24)(...).”79
77 Ibidem, p.191.78 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 1v. São Paulo: Imprensa Metodista, 1981, p.173.79 Ibidem, p.83.
XLII
Avivamento e amor ao próximo e, conseqüentemente,
compromisso social, marcaram o metodismo, na Inglaterra, desde o
início:
“Esta ênfase particular em 'amar ao próximo' eseguir o exemplo de Cristo (que 'andou por toda a partefazendo o bem', Atos 10:38), continuou a caracterizar ometodismo, quando ele entrou no reavivamento.”80
Tanto que o último desejo de Wesley foi que seis pessoas
pobres deveriam levar seu caixão e por esse trabalho receberiam uma
libra cada uma delas.81 As cortinas fúnebres utilizadas na capela
foram, posteriormente, utilizadas na confecção de vestidos e
distribuídos entre as mulheres pobres.82
Vamos nos aprofundar nessa história e retirar, então, lições e
diretrizes para a caminhada da Igreja Metodista no novo milênio.
80 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.125.81 Ibidem, p.312.
XLIII
1- CARISMÁTICOS E SÓCIO-POLÍTICOS NA TRADIÇÃO
METODISTA BRASILEIRA
“Tudo isso num período em que o Golpe de 64, oemergir de um novo Catolicismo Romano depois doVaticano II e a onipresença de pentecostais produziramem nós uma profunda crise de identidade.”83
Duncan Alexander Reily
1.1. Do metodismo do Evangelho integral ao metodismo da ética
individualista
O metodismo nasceu com o coração aquecido84 e cresceu junto
às classes85 pobres na Inglaterra, especialmente a classe operária.86
Cresceu e amadureceu diante do mover do Espírito Santo, o chamado
82 Ibidem, p.313.83 REILY, Duncan Alexander. “Escola Dominical Ontem e Hoje” em Expositor Cristão,agosto de 1993, p.8.84 João Wesley teve a experiência do coração aquecido, em 24 de maio de 1738. Eledescreveu assim sua experiência: "Senti o coração maravilhosamente aquecer-se,senti que eu agora confiava em Cristo realmente em Cristo, somente em Cristo, parasalvação; e me foi dada a segurança de que Cristo havia perdoado os meus pecados,sim, os meus, e que eu estava salvo da lei, do pecado e da morte. (WESLEY, João.Trechos do Diário de João Wesley. Tradução de Paul Eugene Buyers. São Paulo:Imprensa Metodista, 1965, p.24).85 Em seu livro A formação da classe Operária Inglesa, Edward P. Thompson, historiadoringlês, afirma que o metodismo participou na formação da clsse operária inglesa, noséculo XVIII.86 Segundo Edward P. Thompson, a maior parte dos novos adeptos do metodismoprovinha da nova classe operária industrial (A Formação da Classe Operária Inglesa. 2 v.Paz e Terra, 1987, p.226).
XLIV
revival metodista,87 que proporcionou santificação88 e o impulsionou a
ser solidário com as classes oprimidas e empobrecidas.89
Portanto, a ênfase no Espírito Santo90 e no Compromisso
Social,91 fazem parte das raízes, da identidade metodista.92 A
submissão ao Espírito Santo93 e o compromisso social sempre
87Max Weber fala em "poderoso revival do Metodismo", na Inglaterra (A Ética Protestantee o Espírito do Capitalismo. 3 ed. Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1983, p. 125).88 WESLEY, João.Trechos do diário de João Wesley. Traduzido por Paul Eugene Buyers.São Paulo: Imprensa metodista, 1965, p.130.89 Ibidem, p.112.90 Wesley utiliza diversas expressões para falar da ação do Espírito, como "cheio doEspírito", “a manifestação do Espírito" e "andam segundo o Espírito" (WESLEY, João.Sermões de Wesley, 1v. São Paulo: Imprensa Metodista, 1981, p.83, 173).91 Amor a Deus e ao próximo eram para Wesley as conseqüências naturais de alguémque tinha o amor de Deus em seu coração derramado pelo Espírito Santo (WESLEY,João. As marcas de um metodista. [s.ed], [s.d.], p.3,7).92. As marcas essenciais da identidade metodista são destacadas pelo Colégio Episcopalda Igreja Metodista como sendo: a. A base da fé e da prática do metodismo é a Bíblia (...)b. A experiência pessoal com Cristo é fundamental para a vida cristã pessoal ecomunitária (...). c. A presença e o poder do Espírito Santo é fundamental, tanto para avida da comunidade de fé como para a vida de piedade pessoal (...). d. A vida dedisciplina pessoal e comunitária é expressão de nosso amor a Deus, ao próximo e a nósmesmos (...). e. Paixão evangelizadora como testemunho de uma fé viva e práticaobjetivando proclamar e sinalizar a todas as pessoas as boas novas do amor de Deusrevelado em Jesus Cristo. f. Compromisso com o bem-estar da pessoa total: espiritual,moral, física, emocional, psicológica, mental e social (...). g. Sacerdócio Universal detodos os crentes (...). h. O sistema conexional é característica básica e fundamental paraa existência do Metodismo (...). i. A consciência de que somos 'parte da Igreja Universalde Jesus Cristo' (...). j. A graça divina é o fundamento de toda a revelação (...). l. A Igrejametodista vê-se em sua natureza como um corpo. Um organismo vivo (...) m. A vivênciaprática da fé cristã. O Metodismo afirma o valor da prática e da experiência da fé cristã(...). (COLÉGIO EPISCOPAL. Biblioteca Vida e Missão, 1995, p.17-19). No Concílio Geral,em Maringá, julho de 2001, o Colégio Episcopal reafirmou sua preocupação com aidentidade metodista: “(...) precisamos resistir à tentação da uniformidade de ritos epráticas missionárias, presentes na Igreja Evangélica brasileira, quase sempreindividualista, baseada na satisfação pessoal, na negação do sofrimento, e centrada naprosperidade a qualquer custo. Assim, em meio a essa situação, somos desafiados/as afortalecer a configuração da nossa identidade e o sentido de nossa finalidade – a vocaçãopara a qual fomos chamados”. (Colégio Episcopal. “O futuro do metodismo no Brasil” emAvante. Rio de Janeiro, Fé&Nexo, agosto 2001, p.3).93 Diversos teólogos metodistas usam outras terminologias, como “tudo o que o Espíritoopera”; “O Espírito de Deus não só age”; “ação do Espírito”; “obra do Espírito”, etc(KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred. Viver a graça de Deus – Um Compêndio deTeologia Metodista. Editeo – Editora Cedro, 1999, p.188-190). A expressão “mover do
XLV
andaram juntos no metodismo94 primitivo. Steve Harper fala de uma
espiritualidade social:
“Foi exatamente isso que aconteceu com aespiritualidade metodista primitiva. Sua combinação dapiedade e da misericórdia produziu um instrumento que,nas mãos de Deus, era mais eficaz do que esseselementos jamais teriam sido enquanto separados” .95
Para Wesley, a religião é essencialmente social. Reduzi-la só a
uma expressão solitária é destruí-la.96 Era, natural, portanto, a ação
dos metodistas junto ao povo.
Foi Wesley quem restabeleceu a ênfase na doutrina do Espírito
Santo que tinha sido quase extinta, devido ao deísmo dos teólogos da
Igreja oficial e ao socianismo e moralismo dos puritanos.97
Duncan Alexander Reily afirma:
”(...) ao restaurar a doutrina do Espírito Santo,Wesley contribuiu também para um saudável equilíbriona fé e na prática do cristianismo na Inglaterra e,
Espírito” é atual e reconhece a mesma personalidade do Espírito Santo. No livreto 50 diasde oração pelo VII Encontro Nacional de Avivamento, os autores - João Carlos Lopes eJosé Pontes Sobrinho, Coordenador Nacional de Expansão Missionária, afirmam:" (... )para celebrarmos o mover do Espírito de Deus em nossa vida pessoal e comunitária,capacitando-nos para continuar a ser uma Igreja viva no próximo milênio"(20/07a 07/09,página 3).94 Para Gonzalo Baéz Camargo, “o metodismo foi um movimento e não uma instituição. Ummovimento que se iniciou no redescobrimento da experiência viva da graça de Deus e do´testemunho do espírito`, feito por João Wesley, e que debaixo da influência de sua poderosapregação se propagou como um incêndio em bosque seco.” (Gênio e Espírito do MetodismoWesleyano. Imprensa Metodista, 1986, p.19).95 HARPER, Steve. A vida devocional na tradição wesleyana. Ibidem, p.76.96 BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos do metodismo histórico. Editora Unimep, 1983, p.9.97 REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História, Metodismo ,Libertações . São Paulo: Editeo, 1990, p.5
XLVI
através do movimento metodista, ao protestantismo emgeral.”98
Entre as diversas categorias utilizadas por Wesley para falar da
ação do Espírito Santo está: "movidos pelo Espírito". Ele diz:
”(...)Tanto os antigos profetas como os apóstolosforam entusiastas, tendo estado, por diversas vezes,tão cheios do Espírito e tão influenciados por Aqueleque habitava em seu coração, que o exercício de suaprópria razão, de seus sentidos e de todas asfaculdades naturais, estando suspenso, erainteiramente dirigido pelo poder de Deus - e somente'falavam conforme eram movidos pelo Espírito Santo.”99
Sante Uberto Barbieri mostra que as expressões “renovação
espiritual” e “movimento” fazem parte da origem do metodismo:
“O metodismo não foi, na sua origem, uma novaforma eclesiástica. Foi um movimento de renovaçãoespiritual” .100
Mas o metodismo brasileiro seguiu a fórmula de João Wesley:
avivamento traz perfeição cristã, que é igual ao amor perfeito e,
conseqüentemente proporciona solidariedade aos marginalizados?101
Veremos que não. O metodismo brasileiro passou por diversas
crises. Só no início da década de noventa é que a Igreja Metodista
98 Ibidem.99 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v. São Paulo: Imprensa Metodista, 1981, p.216.100 BARBIERI, Sante Uberto, Ibidem, p.3. O objetivo de Wesley era transformar a Igreja, a Nação eespalhar a santidade bíblica por sobre a terra. Um movimento, portanto, de renovação espiritual,que abordaremos com mais detalhes mais à frente.101 WESLEY, João. Explicação clara da perfeição cristã. São Paulo: Imprensa Metodista, 1984,p.52.
XLVII
brasileira passou dos 100 mil membros.102 Muito pouco para uma
Igreja que, no tempo de João Wesley, acreditou ter sido levantada por
Deus para transformar a nação, a Igreja e espalhar a santidade
bíblica sobre a terra.103
Na América do Norte, o metodismo cresceu muito através dos
avivamentos e expansão nas fronteiras,104 mas também foi
influenciado por diversos movimentos avivalistas105 chegando,
inclusive, a haver divisões.106
Segundo Mortimer Árias:
“A contextualização norte-americana, em seuprimeiro período, mostra um movimento metodista aptopara o novo meio: originada do ‘revival’, prospera no‘revival’ (...).”107
Mais tarde a Igreja passou a enfatizar a ética individualista e,
muitas vezes, chegou ao ritualismo estéril e com status de classe
média, como diz Clory Trindade de Oliveira:
102 Em 1990, o metodismo brasileiro tinha 80.061 membros (XV CONCILIO GERAL. Atas eDocumentos. Juiz de Fora, 5 à 13 de julho de 1991. Gráfica e Editora Sanroquense Ltda, p.71).103 A santificação aqui descrita não é separação do mundo e alienante. Walter Klaiber e ManfredMarquardt afirmam: "Visto que a santificação é amor, ela é necessariamente santificação social.Por mais que Wesley pareça, algumas vezes, concentrar-se na experiência do indivíduo navivência de sua santificação, o horizonte da santificação é o da comunidade, o esforço pelacomunhão perfeita com Deus inclui o reto relacionamento com os outros homens" (Ibidem, p. 302).104 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização. Edições Paulinas-Editora Unimep, 1985, p.100-1.105 Entre as denominações que surgiram, nos EUA, com origem no metodismo, estão:Igreja Metodista Livre, em 1858; Igreja do Nazareno;, em 1895. (______. A luta pela vidae evangelização. Ibidem, p.98, 101).106 BONINO et al. Ibidem, p. 98).107 ______. ______. ______. P.97.
XLVIII
“Ao redor do fim do século XIX, o metodismo jáhavia alcançado o status de classe média, com umaacentuada neutralidade burguesa. Ao chegar ao Brasil,o metodismo norte-americano, de origem sulista ecomprometido com o sistema político-social de suapátria, trouxe a ideologia dominante de que eraabsolutamente necessário e prioritário compartilhar os”benefícios da civilização protestante bíblico-norte-americana” com os brasileiros que eram menos“afortunados.”108
1.2. As grandes crises no metodismo brasileiro
Uma boa parte dos historiadores, como Edward Thompson,109 vê o
avivamento metodista, na Inglaterra, como tendo tido aspectos
positivos.110 O movimento Metodista levou a uma ativa participação
nas questões sociais, com os presos, escravos, meninos e meninas de
rua, desempregados, viciados etc.
A questão é que a Igreja pode passar por diferentes fases em sua
história. Ela pode ser instrumento de libertação bem como até de
omissão e de opressão. Pode perder a identidade e se afastar das
próprias raízes esquecendo a sua herança.
108 OLIVEIRA, Clory Trindade de. Situações Missionárias na História do Metodismo.Editeo – Imprensa Metodista, 1991, p.26.109 Thompson, historiador inglês, fala da participação metodista na formação da classeoperária inglesa, em seus livros A Formação da classe operária inglesa, volumes 1, 2, e3, Paz e Terra, 1987. Nos capítulos da tese trataremos desse assunto.110 No capítulo sobre “A Contribuição do Avivamento Metodista” abordaremos com maisdetalhes a posição do historiador inglês Edward P. Thompson, que indica que ometodismo foi ultraconservador em questões políticas e nos cultos deu ênfase aoemocionalismo.
XLIX
Segundo Paulo Ayres Mattos, por não haver no metodismo
brasileiro um projeto Missionário de índole nacional, que
proporcionasse unidade e levasse em conta o povo brasileiro, após a
década de trinta:
(...) os conflitos e contradições passaram a sermediados pelo carisma e força das lideranças e aunidade conexional do metodismo brasileiro passa a sermedida pela maior ou menor fidelidade às propostas eprogramas apresentados pelos líderes da Igreja.Quando aquela mediação tornou-se impossível, ascisões e expurgos foram inevitáveis (...) a unidadeburocrática-administrativa começou a vir a pique e asdivisões antes ocultas e abafadas foram pouco a poucose evidenciando(...).”111
A primeira divisão no metodismo brasileiro, ocorreu entre 1934 –
1935 e proporcionou a criação da Irmandade Metodista Ortodoxa, foi
por questões teológicas.112 Na finalidade de sua criação estava o
111 BONINO et al. Ibidem, p.298.112 Segundo José Henriques da Matta, a “gota d’água” foi em 1934 quando ele eraPresbítero Presidente do Distrito de Cataguases, MG. Na reunião do Concílio Distrital, umjovem formado "teve de prestar exames para ser recomendado à experiência dopastorado da Igreja Metodista do Brasil." (MATTA, José Henriques. Explicação daFundação da Irmandade Metodista Ortodoxa no Brasil , [s.ed], [e.d], p.2) No culto deabertura, o jovem havia pregado e utilizado a expressão "personificação do mal" para sereferir ao diabo. Como já havia alguns comentários sobre o liberalismo na Faculdade deTeologia, houve uma reação contrária da Comissão e do próprio José Henriques daMatta. Quando a Comissão estava reunida com o candidato, José Henriques da Mattapassava no local e ouviu a afirmação do candidato de que o diabo não era umapersonalidade. José Henriques da Matta, então, questionou duramente o candidatodizendo que então o Espírito Santo seria também apenas uma personificação dastendências boas do ser humano. O candidato acabou não sendo recomendado àexperiência por causa da questão sobre a personalidade do diabo. O reitor da Faculdadede Teologia, Derly de Azevedo Chaves, chegou após a decisão do Concílio Distrital. Elequestionou e censurou a decisão da Comissão e ao Rev. José Henriques da Matta. Aquestão aborreceu a José Henriques da Matta. Vários colegas o questionaram emdiversas reuniões posteriores. Segundo ele, "para os da Faculdade de Teologia de OGranbery eu fiquei sendo um difamador. O Bispo César mandou-me uma acusação,assinada por alguém dizendo que eu difamara a Faculdade de Teologia, o Bispo, pastorese missionários. Ao receber a acusação, tinha já tomado deliberação de deixar a Igreja
L
permanecer nas raízes wesleyanas, por isso, a expressão “ortodoxa”.
Metodista do Brasil, e trabalhar de acordo com a organização que fizera, a que dei o títulomais tarde de Irmandade Metodista Ortodoxa no Brasil." (MATTA, José Henriques.Explicação da Fundação da Irmandade Metodista Ortodoxa no Brasil. Ibidem, p.8).Segundo o bispo César Dacorso Filho, José Henriques teve três denúncias: calúnia,separatismo e intromissão indébita em atribuições alheias (dada por um ministro);difamação, separatismo e atitudes impróprias de um ministro (dada por uma pessoa quenão pertence a Igreja); quebra voluntária e proposital dos Cânones, com prejuízo materiale moral para o denunciante (dada por um eminente leigo). (FILHO, César Dacorso. “Umacarta do Superintendente da Igreja Metodista do Brasil” em Expositor Cristão. 9 de abril de1935, p.1e 2.) Em pleno Concílio Regional do Norte, realizado em Belo Horizonte, entre29 de janeiro e 4 de fevereiro de 1935, o bispo César nomeou o Conselho de Sentençacomposto de José Antonio de Figueiredo, João Pereira do Couto, Benjamim da Silva Reis,Oswaldo Luis da Silva e Antonio de Campos Gonçalves. O Bispo ainda nomeou duaspessoas ligadas a Faculdade de Teologia, contra a qual José Henriques da Matta havialevantado questões. Nomeou para promotor Derli de Araújo Chaves (Reitor da FT) e parapresidente da comissão o professor “modernista” W.H.Moore. (Anuário do ConcílioRegional do Norte. Belo Horizonte, 29 de janeiro a 4 de fevereiro de 1935). Durante a 7ªsessão, “o Conselho de Sentença nomeado para o julgamento de José Henriques daMatta, por instrumento do seu secretário João Augusto do Amaral, apresenta a sentençadada, sendo o acusado excluído do ministério e da Igreja Metodista do Brasil” por quatrovotos contra um. (Anuário do Concílio Regional do Norte. Belo Horizonte, 29 de janeiro a4 de fevereiro de 1935, p.25) A Comissão se baseou no artigo 219, letra C dos Cânonesde 1934, o qual coloca o acusado no delito de heresia. Os outros delitos eramclassificados em: Conduta imprópria (manifestação de gênio inconveniente, linguagemimpura, ofensiva, ação injusta, ou quebra da ordem ou disciplina da Igreja; Má-administração eclesiástica ou ineficiência administrativa; d) Imoralidade. Este julgamentofoi criticado pelo redator do Expositor Cristão, José Guerra, em 26 de janeiro de 1935 nareportagem “O Concílio Regional do Norte sob o ponto de vista do Redator”. Ele disse: “Não tivemos privilégio de um encontro com o Rev. Matta que, fomos informado, estevepresente, apenas um dia, ao Concílio, do qual se retirou sob acusação, sem prestarrelatório. É com profundo pesar que vemos retirar-se do nosso grêmio esse velhocompanheiro, espírito culto e cristão zeloso.” (GUERRA, José de Azevedo. “O ConcílioRegional do Norte sob a ponto de vista do redator” em Expositor Cristão. 26 de fevereirode 1935, p.2). José Guerra procurou ressaltar seu caráter: “Deve ser dito de passagemque as acusações apresentadas não afetam o seu caráter moral, basearam-se emconseqüência de certos escritos, nos quais ele delatava idéias que se propagavam àsocapa (disfarce - nota do autor) e, segundo o seu julgamento, solapavam os alicerces daIgreja.” (Ibidem). Quando o bispo César questionou a reportagem do “Expositor”, JoséGuerra respondeu dizendo que “um processo como esse, contra um ministro que laborouem nossas fileiras pelo espaço de 20 anos, devia ser conhecido pela Igreja fazer um juízoreto sobre os seus dirigentes. Não sabemos se tal processo seguiu os tramites legais; seo paciente foi primeiramente admoestado pelo superior hierárquico e se, depois disso,perseverou naquelas faltas.” (“Resposta de José Azevedo Guerra ao Bispo CésarDacorso Filho” em Expositor Cristão, 09 de abril de 1935, página 2). José Guerra aindacontinua: “Se foi acusado em plenário, mesmo não comparecendo, era de justiça querecebesse cópia da acusação e tivesse, pelo menos, dez dias de prazo para preparar suadefesa, antes de ser declarado expulso do seio do ministério da Igreja Metodista” (Ibidem).
LI
A data da fundação é considerada 31 de janeiro de 1934. Neste ano,
José Henriques da Matta organizou a Irmandade com a finalidade de
promover também o avivamento:
“(...) promover a expansão do Reino de DEUS e oAvivamento Espiritual; realizar e cooperar com obrassociais, tudo sem fronteiras denominacionais.” 113
A busca do avivamento e santidade proporcionou também, entre
1946-1948, uma crise e divisão nas igrejas metodistas de Vila Mazzei
e Tucuruvi, em São Paulo, e o surgimento da Igreja Evangélica do
Avivamento Bíblico,114 que teve origem e foi organizada dentro da
113 MATTA, José Henriques. Explicação da Fundação da Irmandade Metodista Ortodoxano Brasil. {s.ed], [s.d], p.2.114 O Provisionado-Suplente-Estudante Benedito de Paula Bittencourt era pastor em VilaMazzei e Tucuruvi. Ele convidou o seminarista Mário Roberto Lindstron para ajudar nasduas paróquias. Nem sempre Bittencourt podia estar presente durante a semana (Cartade Benedito de Paula Bittencourt, em 29 de julho de 1997). Lindstron teve assim liberdadenas duas igrejas. Muitos membros viam a urgente necessidade de uma maior santificaçãoe de clamar por misericórdia ao Senhor. Foi dentro deste contexto, influenciado por doisjaponeses - Taisuke Sákuma e Kinzo Uchida - que alguns membros das igrejasmetodistas de Vila Mazzei e de Tucuruvi participaram de um movimento de santificação.(Entrevista de Ruth Fialho Dias, em maio de 1997, com Orestes Branchini, AngelaBranchini e José de Oliveira e Silva. Informação por escrito de José de Oliveira e Silva,em 1997, sobre a igreja Metodista de Vila Mazzei e o surgimento do movimento.Informação oral de Air Sudário da Silva, em Belo Horizonte, durante o Concílio Geral, emfevereiro de 1997. Ele se converteu com as pregações da Igreja Evangélica doAvivamento Metodista, no princípio da década de cinqüenta. Hoje é membro da IgrejaMetodista em Sorocaba). “No final de 1945 começou um grande descontentamento noseio da Igreja Metodista em Vila Mazzei devido ao comodismo e indiferença sobre osensinamentos da Bíblia. A vaidade, o conformismo com o mundanismo aumentou essedescontentamento. Isso fez que tivesse início de certo movimento de grande número demembros que começaram a buscar a santificação e poder através do batismo com oEspírito Santo.” Segundo o pastor Bittencourt, o movimento foi realizado “com práticasque nem eram do avivamento.” (Informações de Benedito de Paula Bittencourt, em cartade 29 de julho de 1997). Ele e sua esposa Elisa se sentiram “exprimidos por algo quenunca havíamos visto e que representava para nós algo estranho, especialmente o modode orar aos gritos e com gemidos prolongados (...) ”. (Ibidem). Havia uma Igreja dentro daprópria igreja, pois cerca de 30 pessoas tinham suas próprias reuniões onde buscavam asantificação e o batismo do Espírito. Ficaram conhecidos com o “grupo do clamor”. Todoseles oravam com intensidade buscando a santidade e o poder do Espírito. O movimento
LII
teve início na Faculdade de Teologia, em Rudge Ramos, São Bernardo do Campo. Haviadois seminaristas japoneses que pertenciam a Igreja Metodista Livre - Taisuke Sákuma eKinzo Uchida. Eles influenciaram o jovem Mário Roberto Lindstron, que acabava dechegar a Faculdade, em 1945. Os jovens japoneses ensinavam a necessidade de buscara experiência de santificação ou santidade. Mário Lindstron foi batizado pelo Espírito.Passou a ser ajudante em Vila Mazzei e Tucuruvi. O avivamento foi levado para as duasigrejas por Mário, Taisuke e Kinzo, que tiveram várias reuniões nas casas com osmembros. Um dos líderes do movimento, Taisuke Kinzo, havia nascido no Japão, em1915, e teve o sonho de conhecer e morar no Brasil chegando aqui em 1933. No dia 17de maio de 1935 ele teve um encontro com Jesus. Em 21 de setembro de 1937 passoupela experiência da “segunda benção”. Após ter ficado doente por vários anos, sentiu ochamado de Deus para o ministério pastoral, em 29 de abril de 1940, ingressando naFaculdade de Teologia, em Rudge Ramos, em 1943 (UCHIDA, Kinzo. Autobiografia.Expositor Cristão, 11 de dezembro de 1947, p.3). Em sua dissertação para o bacharel deteologia, em 1947, Kinzo abordou o seguinte tema: A Segunda Benção, sua Comunicaçãoe segredo de sua Conservação. Nela, Kinzo diz que “sem a segunda benção, dificilmentealguém produzirá obra duradoura de edificação espiritual cristã; pois é ela a geradora deenergia para a ‘loucura da pregação” (Ibidem). Para ele, segunda benção é o mesmo quesantificação. A primeira benção é a justificação. O catedrático de sua dissertação foi oprofº Almir dos Santos (UCHIDA, Kinzo. Autobiografia. Expositor Cristão, 11 de dezembrode 1947, p.3). No ano de 1946, os jovens Alírio Flora Agostinho e Oswaldo Fuentes forampara a Faculdade e logo na chegada decidiram orar com Mário para agradecer a viagem eexperimentaram o batismo com o Espírito. Ficaram então marcados, como já aconteciaMário Lindstron, como pertencentes ao ’grupo’ (SEMINÁRIO TEOLÓGICO AVIVALISTAPOR EXTENSÃO. Conhecendo o Avivamento Bíblico, ibidem, p.1) O grupo respeitava opastor e só orava do modo tradicional em sua presença. Bittencourt diz: “sempre que euchegava nas reuniões de oração que eles estavam dirigindo, cessavam a metodologiaempregada do ‘clamor’ e voltavam a orar pacificamente como até então se praticava. Nãoprecisava que eu dissesse qualquer coisa para que a atitude fosse mudada e, depois deencerrada a reunião, vinham me pedir desculpas.” (Informações de Benedito de PaulaBittencourt, em carta de 29 de julho de 1997). Para resolver o problema, o pastor localconvidou “o profº Almir dos Santos para fazer uma visita àquelas igrejas e falar a elassobre o assunto, o que foi feito, por dois ou três dias. Tucuruvi escolheu o métodotradicional (de então) de ser metodista, e abandonou os rapazes, mas em Vila Mazzeiperdemos metade da congregação que saiu com o Mário Roberto e, ato continuo,abandonou também o Seminário.” (Informações de Benedito de Paula Bittencourt, emcarta de 29 de julho de 1997). No dia 7 de setembro de 1947, na Faculdade de Teologia,em Rudge Ramos, SP, nasceu oficialmente a Igreja do Avivamento Bíblico (SEMINÁRIOTEOLÓGICO AVIVALISTA POR EXTENSÃO. Conhecendo o Avivamento Bíblico. CursoPastoral, 3º e 4º estágio, apostila, [s.d], p, 1). Neste dia, estavam presentes osseminaristas japoneses Taisuke e Kinzo, Mário Lindstron, Alírio Flora Agostinho, OswaldoFuentes e diversos membros das igrejas de Tucuruvi e Vila Mazzei. A sugestão do nomeda Igreja veio de Orestes Branchini. Os dois grandes incentivadores do movimento foramCícero Faustino Inojosa (Presidente da Sociedade de Homens) e Orestes Branchini(Presidente da Mocidade), que depois se tornaria pastor. A esposa de Cícero - OtiliaInojosa - nunca se afastou da igreja Metodista de Vila Mazzei. O primeiro líder escolhido,porém, foi Tertuliano Antunes, um jovem professor e crente novo. Sua esposa eraaleijada e tinha dificuldades de andar. Ele liderou a Igreja até a chegada de MárioLindstron, em 1947, quando foi excluído da Faculdade de Teologia. Oswaldo Fuentes eAlírio Flora Agostinho ainda permaneceram na Faculdade, em 1947, quando saíram.
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Faculdade de Teologia, em Rudge Ramos, SP. Seus principais líderes
foram os jovens estudantes Mário Roberto Lindstron, Alírio Flora
Agostinho, Oswaldo Fuentes, Taisuke Sákuma e Kinzo Uchida:
“Quando o jovem Mário Roberto Lindstron,candidato ao ministério metodista veio para aFaculdade de Teologia em 1945, encontrou osestudantes Taisuke Sákuma e Kinzo Uchida, ambos daIgreja Metodista Livre, que faziam seu curso no mesmolocal, Kinzo foi o instrumento usado por Deus parapregar ao seminarista Mário Roberto Lindstron que,então, estava insatisfeito com sua vida espiritual, esentia a necessidade de buscar a ‘experiência desantificação ou de santidade’- doutrina pregada pelometodismo histórico. Ele e outros colegas entregaram-se então à busca de poder e santificação, orandointensamente. Mário encontrou então o que buscava: obatismo no Espírito Santo (...). Sendo o seminaristaMário ajudante das igrejas de Tucuruvi e Vila Mazzei,São Paulo – Capital; foi usado por Deus para anunciara mensagem de despertamento, que foi aceita por
Oswaldo Fuendes foi se dedicar a advocacia e Alírio a outra função. (Entrevista de RuthFialho Dias, em maio de 1997, com Orestes Branchini, ibidem). Este assunto foi discutidono Concílio Regional do Centro, em janeiro de 1948, após o relatório do pastor IrineuMonteiro de Pinho, e chegou à cúpula da Igreja: “Atendendo ao pedido de Álvaro Alves deSouza no pedido que fez sobre os ex-seminaristas da Faculdade de Teologia (Alírio FloraAgostinho e Oswaldo Fuentes), Augusto Schwab informa que eles estão fora da IgrejaMetodista.” (ATAS E DOCUMENTOS do Concílio Regional do Centro. 27 de janeiro a 2de fevereiro de 1948, p.44). Tertuliano Antunes voltaria para a Igreja Metodista de VilaMazzei com a chegada de Mário Lindstron, pois estava desempregado e não resistiu aproposta de emprego do pastor metodista José Guerra. A notícia foi publicada noExpositor Cristão de 11 de setembro de 1947: “Novos membros - Recebemos por batismoe profissão de fé: Turfa Asaf e Pedro da Silva; a pedido: Tertuliano Antunes e MariaBarbosa (...)”. (”Em Vila Mazzei todas as organizações cooperam na arrancada próCruzada” em Expositor Cristão, 11 de setembro de 1947, p.3). A Igreja Evangélica doAvivamento Bíblico passou a utilizar a Harpa Cristã e, posteriormente, a se reunir na casade Edmundo Branchini (que anos depois iria para a Congregação Cristã) e depois nacasa humilde de Lázaro Sansão, em Jaçanã. Logo uma intensa evangelização foirealizada nas praças, feiras, nos bairros vizinhos (Tremendé e Jardim Tremendé) e nacidade de Mairiporã. No dia 15 de junho de 1947, nas águas do rio Cabuçú, entre SãoPaulo e Guarulhos, foi realizado o batismo de 47 avivalistas, entre eles, Mário Lindrston.Em agosto foi realizada a primeira assembléia da Igreja, organizada a primeira diretoria econsagrado Mário Lindrstron como pastor. O batismo e a assembléia foram presididospelo missionário Henry Jeffery, na época ligado a Missionary Chapel of London(SEMINÁRIO TEOLÓGICO Avivalista por Extansão. Conhecendo o Avivamento Bíblico,ibidem, p.2).
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muitos. Esses irmãos avivados tiveram profundasexperiências com o Espírito Santo e se tornarampoderosos na oração.” 115
No dia 7 de setembro de 1947, nos eucaliptos da Faculdade de
Teologia, em Rudge Ramos, SP, nasceu oficialmente a Igreja do
Avivamento Bíblico.116
“A preocupação básica do grupo consistia emsantificação, poder para testemunhar e reavivamentodas igrejas”.117
Na década de sessenta, o chamado Movimento de Renovação
Espiritual 118 atingiu em cheio as Igrejas históricas. Entre 21 a 26 de julho
de 1964, aconteceu o I Encontro de Renovação Espiritual, em Belo
Horizonte, na Igreja Batista da Floresta, sob a liderança de José Rego do
Nascimento. O I Encontro fez uma Declaração de Princípios de Renovação
Espiritual:
“1) Renovação Espiritual será somente uma mensagem,não uma denominação particular nem um movimento emtorno de determinado homem (...); 2) As igrejas, alcançadaspela mensagem, procurem se conservar dentro de suaherança denominacional (...); 3) Que se procure levar asigrejas a se ajustarem à orientação do apóstolo Paulo em ICOR. 12 e 14, na ordem e decência dos cultos (...); 4) Quese procure evitar pregação ou literatura de caráter ofensivoou pessoal...; 5) Que se promovam encontros, nacionais e
115 SEMINÁRIO TEOLÓGICO Avivalista por Extensão. Conhecendo o Avivamento Bíblico.Curso Pastoral, 3º e 4º estágio, apostila, [s.d], p.1.116 Ibidem.117 Ibidem, p.2118 Movimento iniciado em fins da década de cinqüenta e liderado pelos pastores BatistasEnéas Tognini, de São Paulo, e Antônio Rego do Nascimento, de Minas Gerais, queinfluenciou diversas Igrejas históricas, entre as quais, a Igreja Metodista (TOGNINI,Enéas. Renovação Espiritual no Brasil. São Paulo: Editora Renovação Espiritual, [s.d] ).
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regionais, para pregações de inspiração e exercício do cultoapostólico (...)”119
A crise entre os que desejavam o avivamento e os que se
opunham (conservadores e liberais120) levou à “divisão wesleyana”, 121
em 1967, e a criação da igreja Metodista Wesleyana.122 Para Gessé
119 MINAS BATISTA. I Encontro de Renovação Espiritual. Janeiro-Abril de 1964, p.5.120 Paulo Ayres Mattos chama de liberais os metodistas de tendência teológica oposta aoscarismáticos e aos conservadores: “Diante disto, como é possível querer imputar aoscarismáticos ou aos liberais a crise de identidade que hoje vivemos?” (BONINO et al. Lutapela vida e evangelização. Ibidem, p.299).121 Expressão popular para falar da crise e surgimento da Igreja Metodista Wesleyana, em1967, no Rio de Janeiro.122 Uma crise gerada pelo conflito entre o bispo Nathanael e os líderes do Movimento deRenovação Espiritual caiu como uma bomba sobre o Concílio Regional da PrimeiraRegião em 1967, cujos estragos se fizeram sentir de uma forma traumática durantelongos anos. Para Gessé Teixeira de Carvalho, “as razões que deram origem àseparação, basearam-se na doutrina do batismo do Espírito Santo, como sendo umasegunda benção para o crente. Na aceitação dos dons espirituais como recursos divinospara a realização da obra (...)” .(CARVALHO, Gessé Teixeira. A vida Espiritual de minhaIgreja. Ed 4, 1996, p.14). No primeiro Concílio Regional que presidiu, em 1966,Nathanael com sua forte personalidade e determinação já havia procurado assumir adireção espiritual da Região. Atingiu em cheio o Movimento de Renovação Espiritual,quando publicou o Documento "Do Culto Público" onde criticou os excessos emocionais eafirmou que o culto deveria ter ordem, dignidade e majestade. Ele disse ainda que o culto"não pode transformar-se em emocionalismo incontrolado, próprio dos momentos detragédia." (NASCIMENTO, Nathanael Inocêncio. "Do Culto Público "em Atas, Registros eDocumentos dom 10º Concílio Regional da 1ª Região, 1966, p.52). Ele concluiu dizendoque "as normas litúrgicas devem ser seguidas." (Ibidem., p.53). Na primeira sessão doConcílio Regional, em Nova Friburgo, RJ, teve inicio às 9 hs, na manhã do dia 5 deJaneiro. Começou com uma comunicação do Bispo dizendo que o diácono Oriele Soaresdo Nascimento havia se retirado da Igreja Metodista, comunicando a decisão através deuma carta.94 Oriele decidiu sair porque não concordou com o teor de uma carta peloBispo intimidando os pastores a decidirem abandonar o movimento de renovação ouabandonar a Igreja (Oriele Soares do Nascimento, [Informação oral], 06/05/1997).Nathanael chamou os “avivados” para conversar. Com Gessé, que era Secretário deMissões, Nathanael foi categórico dizendo que ele havia feito um levantamento na Regiãoe que no máximo umas 60, 70 pessoas sairiam. Ele não deveria perder seu tempo. Naentrevista, o Bispo disse que esperava contar com ele na Secretaria de Missões. Gesséestava disposto a continuar, mas na despedida Nathanael lhe disse que ele seriatransferido de igreja e que teria que começar tudo de novo. Gessé, então, disse que iriaorar sobre o assunto (Gessé Teixeira de Carvalho, [Informação oral], 16 de dezembro de1997). No dia 05 de Janeiro, às 14 hs, 13 pessoas se reuniram na ponte da FundaçãoGetúlio Vargas, onde se realizava o Concílio Regional, e decidiram organizar a IgrejaMetodista Wesleyana. Essas pessoas foram: “Idelmício Cabral dos Santos, WaldemarGomes de Figueiredo, Coró da Silva Pereira, José Mendes da Silva, Zeny da Silva
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Teixeira de Carvalho, que viria a ser Bispo na Igreja Metodista
Wesleyana, a questão foi teológica:
“As razões que deram origem à separação,basearam-se na doutrina do batismo do Espírito Santo,como sendo uma segunda benção para o crente. Naaceitação dos dons espirituais como recursos divinospara a realização da obra” .123
Outra conseqüência da crise da década de sessenta foi o
traumático fechamento da Faculdade de Teologia, em 1968,124
num período de golpe militar no país. O fechamento da Faculdade de
Teologia foi conseqüência da ação dos conservadores dentro da
Igreja. A gota d'água, para alguns, foi a presença do arcebispo de
Olinda, D. Helder Câmara, na formatura dos alunos da Faculdade de
Teologia, em 1967. Ele era considerado inimigo dos militares. O apoio
a D. Helder foi visto como concordância com a sua luta social e ao
ecumenismo. 125
Para alguns, a crise na Faculdade de Teologia foi uma crise de
indisciplina. Os argumentos foram:
Pereira, Dinah Batista Rubim, Ariosto Mendes, Wilson da Silva Mendes, Jacir Vieira eAntônio Faleiro Sobrinho (CARVALHO, Gessé Teixeira de. A vida Espiritual de minhaIgreja. Ibidem).123 CARVALHO, Gessé Teixeira. A vida Espiritual de minha Igreja. 4 ed. [s.ed], 1996, p.14.124 Crise entre a juventude e acadêmicos de teologia da Igreja Metodista com a liderançada Igreja proporcionou o fechamento da Faculdade de Teologia, em São Bernardo doCampo, SP.125 O Jornalista Percival de Souza afirma: “Dom Helder, paraninfo dos audazes formandosda Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, em Rudge Ramos, São Paulo, no ano de1967. A faculdade seria arbitrariamente fechada no ano seguinte, com o expurgo emestilo de limpeza teológica dos jovens simpatizantes da contestação política, oengajamento parcialmente clandestino, em especial na AP, e as conseqüências: jovenspresos em paróquia central, após denúncia do próprio pastor local à repressão, em tardede reunião de sábado, que levou vários deles para o Dops e o DOI-CODI (Eu, CaboAnselmo. Depoimento a Percival de Souza, Editora Globo, 1999, p.192-3).
LVII
“(...) onde a liberdade sexual, o uso de bebidaalcoólica e do fumo e o desrespeito a Direção tornaramo ambiente insuportável.”126
A situação teria chegado ao seguinte ponto:
“Após a oração de agradecimento, os seminaristasjogaram a comida para cima em sinal de protesto.”127
Para Elias Boaventura tais fatos foram citados como pretexto
para justificar a intervenção do Gabinete Geral e suspender as aulas.
Na verdade, o que houve foi uma crise política e ideológica, que
resumidamente mostrou-se nos seguintes episódios:
“1. D. Hélder Câmara é convidado para serparaninfo de uma turma de seminaristas e o fatorepercute desfavoravelmente por toda a Igreja.
2. Diversos seminaristas participaram depasseatas estudantis em São Paulo e alguns sãopresos.
3. Correm rumores de que a UNE teriaorganizado um congresso nas férias, no ‘campus’ semautorização do Reitor Otto Gustavo Otto.
4. Os Bispos Metodistas são avisados emreunião, por um líder metodista que o DOPS e oExército estavam preocupados com a situação nafaculdade.
5. O Gabinete Geral suspende as aulas, dispensaprofessores, destitui o Conselho Diretor e provoca apronta reação dos jovens que começam a comparecerà Faculdade através de caravanas.”128
126 BOAVENTURA, Elias. Esboço da História do Metodismo no Brasil. UNIMEP, [s.ed],[s.d], p.30.127 Ibidem.128 Ibidem.
LVIII
A crise foi grande e o Gabinete Geral resolveu convocar o
Concílio Geral Extraordinário, em 1968, em Piracicaba, que confirmou
a decisão do Gabinete Geral e anunciou a reabertura da Faculdade de
Teologia para 1969.129
Um dos professores da Faculdade de Teologia - José Gonçalves
Salvador - afirmou:
“(...) estourou a greve dos seminaristas (1968),seguindo-se o conseqüente fechamento doeducandário e a exoneração dos mestres, um dosquais fui eu, sem que, todavia, saiba até hoje osmotivos para isto.”130
Em que contexto se situava a Igreja Metodista na década desessenta?
Duncan Alexander Reily em sua análise sobre a situação da
Igreja Metodista, na década de sessenta, diz:
“Tudo isso num período em que o Golpe de 64, oemergir de um novo Catolicismo Romano depois doVaticano II e a onipresença de pentecostaisproduziram em nós uma profunda crise deidentidade.”131
O Conselho Mundial de Igrejas, em 1969, alertou sobre o
despreparo e a conseqüente crise nas Igrejas históricas:
129 Ibidem.130 SALVADOR, José Gonçalves. História do Metodismo no Brasil. [Imprensa Metodista?]1982, p.10.131 REILY, Duncan Alexander. “Escola Dominical Ontem e Hoje” em Expositor Cristão,agosto de 1993, p.8.
LIX
“A Igreja cristã no Brasil atravessa uma das fasesmais difíceis de sua história. Herdeira de estruturasalienígenas e acostumados à reflexão importada (...).O desmoronamento das velhas estruturas parece nostomar de surpresa, inteiramente despreparados queestávamos para o evento (...). Os antigos programasevangelísticos e as costumeiras campanhasmissionárias parecem-lhes agora inadequadas paraenfrentar os novos tempos (...).”132
Diante dessa nova realidade, a partir de 1974, alguns líderes da
Igreja Metodista, no Rio Grande do Sul, passaram a ter a chamada
experiência do batismo do Espírito Santo133, sob a liderança de Moises
Cavalheiro e Erasmo Ungaretti. Sady Machado da Silva, bispo da
Região, assim se expressou sobre o movimento no sul:
"Surge um movimento de Renovação ( por algunsdenominados 'Carismáticos') com apoio e/ou restriçõespor parte de pastores e membros da Igreja. Dessamatéria nós nos ocupamos e preocupamos,especialmente, por ocasião do Instituto Ministerial.Temos nos esforçado para orientar, no sentido de evitarexcessos que se confundem com emoção e nãopropriamente ação do Espírito Santo e, por outro lado,não podemos ficar contentes com a bonita herança queherdamos e nada mais. Pessoalmente acho que ou o
132 CONSELHO MUNDIAL DE IGREJAS. Uma Igreja para o Mundo. Traduzido por JacyC.Maraschin. Publicadora Eclesia. Edições Oikoumene, 1969, p. 9.133 Expressão bíblica (Mc 1.8). Segundo o metodista George W. Ridout, “o batismo doEspírito é uma benção e experiência dos crentes. É bem diferente da regeneração”(RIDOUT, George W. O poder do Espírito Santo. São Paulo: Imprensa Metodista, 1973,p.37). Pentecostais, como Gordon Lindsay, afirmam que a evidência inicial do batismo doEspírito Santo é falar em outras línguas (LINDSAY, Gordon. Como receber o Batismo noEspírito Santo. Cruzada de Literatura, [s.ed], [s.d], p.12). Já o Colégio Episcopal da Igrejametodista, apesar de afirmar que “o dom de línguas é um dom de edificação pessoal e,em outras circunstâncias, pode ser usado para edificação da comunidade” (COLÉGIOEPISCOPAL. Orientações pastorais sobre o uso dos dons do Espírito e outras práticas.São Paulo, [s.ed], 1989, p.13), ele também é categórico: “O batismo com o Espírito Santonão está condicionado à presença do Dom de línguas como sinal confirmativo” (Ibidem).
LX
Espírito Santo fala através da Igreja ou esta sedesgasta e as pedras falarão."134
O conflito com a liderança da Igreja Metodista foi inevitável. Um
grupo saiu da Igreja e formou a Comunidade de Porto Alegre. No
Concílio Regional, em 1976, eles deixaram a Igreja metodista:
"Sobre o movimento carismático 'ecumênico, obispo falou francamente apontando seus aspectospositivos e negativos e lamentou a saída de doispastores metodistas (Erasmo Ungaretti e MoisésCavalheiro) integrados de tal forma no movimento, quepediram' licença para tratar de interesses na fase maisprodutiva do ministério."135
1.3. Teologia da Libertação e o Movimento Carismático comoalternativas para o metodismo brasileiro
Com o despreparo da Igreja Metodista para a situação
reinante do país e com as crises, os resultados negativos logo foram
percebidos nas estatísticas. William Schisler Filho disse que os dados
comprovavam que a Igreja Metodista havia parado. Na sua análise,
ele citou as perdas no período de 1965-1976, como demonstram,
dentre outros, os seguintes resultados:
134 SILVA, Sady Machado da. "Relatório do bispo Sady Machado da Silva ao XI ConcílioGeral da Igreja Metodista" em Atas e Documentos do XI Concílio Geral da IgrejaMetodista.1974, p.81.135 GUTIERREZ, Washington. "Concílio da 2ª Região recebe pessoas importantes" emExpositor Cristão. 1ª quinzena de março de 1977, p.11. A expressão "a saída de" não estáno texto publicado, mas é o que se entende que era para ter sido escrito.
LXI
- Menos 28 igrejas;
- Menos 11.101 alunos na Escola Dominical;
- Menos 1.216 Sociedades de Jovens;
- Menos 1960 Sociedades de mulheres.136
A Igreja havia decrescido, segundo ele, porque havia deixado de
ser missionária; havia deixado secar as principais fontes de
crescimento (Sociedades e Escola Dominical) e havia perdido a sua
unidade e mística.137
O fato é que, depois da crise da década de sessenta, no
metodismo brasileiro, duas fortes tendências se fizeram presentes: o
movimento social-político que pregava a Responsabilidade Social da
Igreja (os também chamados liberais138 ou Evangelho Social 139,
136 FILHO, William Schisler. "Os dados comprovam: a Igreja parou" em Expositor Cristão.2ª quinzena de Julho de 1978, p.13.137 Ibidem.138 Expressão com origem na Teologia Liberal, cujo início teve “uma séria de experiênciashereges” (WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. São Paulo: ImprensaMetodista, Aste,1959, p.281). O professor Charles Briggs (1841-1913) do UnionTheological Seminary Nova York foi demitido pela Assembléia Geral Presbiteriana, em1893 (Ibidem). “Nas primeiras décadas do século os conservadores militantes fizeram umesforço para expulsá-los através de amarga controvérsia fundamentalista-modernista”(Ibidem). Albrecht Ristchl (1822-1889) foi “pioneiro do liberalismo e teólogo de valor moral(...) os esforços de Ritschl visavam a formar uma nova síntese apologética entre a fécristã e o novo conhecimento trazido pela erudição científica e histórica” (Ibidem, p.250).Para Ritschl, “a vida cristã é essencialmente social” (Ibidem, p.252).139 “Os anos finais do décimo nono século presenciaram o despertar de profundointeresse social entre muitos cristãos. Sob a direção de ministros liberais comoWashington Gladden (1836-1918) e Walter Rauschenbusch (1861-1918) progrediu o ‘’evangelho social” (WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. São Paulo:Imprensa Metodista, Aste,1959, p. 282). No metodismo brasileiro. H.C.Tucker foi ogrande líder. Ele foi influenciado pelas idéias de Rauschenbusch. Tanto assim que, em1906, ele criou o Instituto Central do Povo, no Rio de Janeiro, chamado inicialmente deMissão Central. O Rio de Janeiro vivia em uma difícil situação social. Havia muitamiséria, muitas revoltas no Brasil. Tanto que o presidente Rodrigues Alves (1902-1906)teria no programa do seu governo apenas melhorar os portos para exportação e sanear a
LXII
posteriormente, Teologia da Libertação140) e o Movimento
Carismático141.
cidade do Rio de Janeiro, pois a população era constantemente dizimada pela febreamarela, peste bubônica, varíola e outras epidemias. Osvaldo Cruz fez intensa campanhae acabaria com a peste bubônica. Contudo, houve muitos protestos pela forma como foifeito. Muitos boatos foram espalhados. Houve, inclusive, conflitos com a polícia, quegeraram a morte de 23 pessoas. O missionário metodista H.C. Tucker teve umaparticipação importante na campanha contra a febre amarela (1903-1908). Ele colocouOsvaldo Cruz em contato com o Dr. Walter Reed, que havia saneado Cuba, e comoutras pessoas nos EUA. Havia muita miséria. Por isso, em 1907, o Expositor Cristãopublicou o artigo “ A Pobreza” dizendo que para ver os desgraçados não era preciso irmuito longe. Bastava ir até as vilas ou perto da cidade. A população vivia descontentecom os constantes aumentos dos preços dos alimentos e dos transportes. Foi nestecontexto que apareceu a figura de Tucker e a criação da Missão Central procurando darsolução prática para atender às necessidades dos operários das favelas da Saúde eGamboa, no centro do Rio de Janeiro (TUCKER, Hugh C.; CERILLANES, J.I. Relatórioda Comissão de Temperança e Serviço Social em Atas do 1º Concílio Geral da IgrejaMetodista do Brasil, São Paulo, p.40). H.C.Tucker, na verdade, seria o defensor e oprático do Evangelho Social no Brasil. Preocupado com a segurança das crianças,quando uma foi atropelada e morta na rua, ele publicou em jornais do Rio de Janeiro aimportância de construir parques para crianças - parques de recreio. O interesse cresceuna sociedade e a prefeitura doaria um terreno para a construção de um parque derecreio. Em 1911, no Rio de Janeiro, seria construído o primeiro "playground" moderno.No Instituto Central do Povo eram realizados cultos, instruções religiosas, jardim deinfância, datilografia, aulas de costura, culinária, enfermagem, recreação, serviço médicoe odontológico, jogos ao ar livre, educação física, etc. Na Conferência Anual de 1914eram anunciados os dois primeiros batismos de surdos-mudos do Instituto Central doPovo realizado no dia 19 de julho.O Instituto mantinha três classes para surdos-mudos.Walter Rauschenbusch escreveria Cristianizando a Ordem Social (1914) e Os PrincípiosSociais de Jesus (1916). Nestes livros, houve crítica ao capitalismo e ênfase nasocialização da propriedade.140 O tema e exemplo do êxodo foram redescobertos e serviram de reflexão bíblica e deestímulo aos cristãos da América Latina. Na reunião da Igreja e Sociedade na AméricaLatina (ISAL), em 1966, o professor Beato fez uma reflexão teológica sobre o êxodo comouma iniciativa da graça de Deus para o ser humano ser liberto da escravidão e caminharpara a Terra Prometida e a liberdade (ARIAS, Mortimer. Salvação Hoje. Petrópolis-Rio deJaneiro:Vozes-Tempo e Presença, 1974, p.37). A década de sessenta foi o período deformação da Teologia da Libertação, que via na história de opressão do Egito sobre opovo de Deus semelhança com a situação de miséria, opressão e cativeiro na AméricaLatina. As Comunidades Eclesiais de Base foram os locais propícios para conscientizaçãodos problemas sociais e para fortalecimento e apoio mútuo. A Igreja se voltou para opobre. As CEBs surgiram com alguns movimentos, entre eles, renovação bíblica emovimento de educação popular, este, baseado no método de Paulo Freire. Ajudaramnessa caminhada da Igreja, na luta pela justiça e apoio aos pobres e oprimidos, asAssembléias do Conselho Mundial de Igrejas de Nova Delhi (1961); Upsala (1968),Nairobi (1975), etc. A quarta Assembléia do Conselho Mundial de Igrejas realizada emUpsala, em julho de 1968, no documento “Renovação em Missão”, afirmou que deveriamser favorecida as experiências de novas formas de testemunho e serviço (Ibidem, p. 121).
LXIII
A ênfase na responsabilidade da Igreja veio, especialmente, a
partir da II Assembléia Mundial do Conselho Mundial de Igrejas, em
agosto de 1954, Evanston, EUA. Alguns brasileiros participaram e
voltaram entusiasmados com as teses ali discutidas. Incentivaram
líderes religiosos para se reunirem e discutirem sobre a
responsabilidade social da Igreja. Os graves problemas sociais do
Brasil levaram evangélicos brasileiros a se organizarem:
“Tudo isso fez que um grupo de crentesevangélicos do Brasil, que assistiram em Evanston,Estado de Illinois, na América do Norte, a 2ªAssembléia do Conselho Mundial de Igrejas, onde taisteses foram amplamente discutidas, decidissemconvocar, sem qualquer caráter oficial, vários líderesdas diversas igrejas evangélicas, para estudar essesmesmos problemas em relação à nossa Pátria.”142
No mesmo ano, a Conferência Episcopal Latino- Americana, em Medellin, apontou para asalvação do ser humano total com temas como “libertação integral”; “educaçãolibertadora”; “conversão e libertação.” (Ibidem, p.33). Na década de setenta se tornou fortea Teologia da Libertação num continente marcado pelos golpes de estado, desrespeitoaos direitos humanos, corrupção administrativa etc. O ano de 1970 é considerado o ano-chave para a Teologia da Libertação, quando houve uma série de encontros e simpósiosem diversos países latino-americanos resultado de uma nova consciência sobre asituação oprimida do povo e a missão libertadora da Igreja. Nascida com a experiêncialibertadora de Cuba, em 1959, na década de sessenta ela seria formulada, especialmentea partir de 1968, em Medellin, com os teólogos católicos. Em 1970 aconteceram diversosencontros sobre Teologia da Libertação (Bogotá, Buenos Aires, México). Em 1971,Gustavo Gutierrez publicaria o livro Teologia da Libertação e Leonardo Boff publicaria, em1972, Jesus Cristo Libertador. O tema “exílio” e “cativeiro” seriam abordados na Teologiada Libertação, pois era uma realidade na América Latina num tempo de ditadura militar.141 Nas próximas páginas da tese abordaremos a origem do Movimento Carismático.142CONFEDERAÇÃO EVANGÉLICA do Brasil. Comissão de Igreja Sociedade. Estudossobre A responsabilidade Social da Igreja. [s.ed], Março de 1956.
LXIV
A II Assembléia do Conselho Mundial de Igrejas realizada em
Evanston representou um marco de mudança de mentalidade e ação
em diversos líderes de Igrejas Evangélicas no Brasil.143
Como conseqüência, em 1955, em São Paulo, durante uma
semana foi discutido sobre a responsabilidade social da Igreja através
da Comissão Igreja e Sociedade, que era um departamento da
Confederação Evangélica do Brasil. O presidente era o pastor
Benjamim Moraes e o secretário executivo, Waldo A. César.
A I Consulta sobre a Responsabilidade Social da Igreja foi
realizada em São Paulo entre os dias 15 e 18 de novembro de 1955
com a presença de quarenta pessoas de 12 denominações e
organizações, como o Conselho Mundial de Igrejas. O objetivo foi dar
uma resposta ao clamor dos marginalizados em todas as suas
necessidades.
A visão dos líderes era:
“Diante do quadro de rápidas transformações porque o mundo está passando, cumpre a Igreja de Cristoestudar, com a Bíblia na mão e sob a iluminação doEspírito Santo, as novas contingências sociais, a fim deoferecer aos povos conturbados a solução cristã detodos os seus problemas.”144
143 João Parahyba escreveu no Expositor Cristão, em 24 de outubro de 1957, um artigochamado “Ele mesmo deu evangelistas”, onde comenta que até a Assembléia deEvanston, a ênfase era colocada em métodos de evangelização e depois passou a sersobre as convicções teológicas que respaldam a proclamação do Evangelho.144 Ibidem.
LXV
Havia 21 leigos e 19 pastores presentes na I Consulta. Entre os
metodistas presentes estavam: Charles Wesley Clay, Francisco
Gonçalves Nocetti, Hulda Chaves Lenz César, João Parayba da Silva,
Robert Whitfield Wisdom e William Richard Schisler Filho.145
Entre os problemas sociais da época levantados estavam:
“Fora dos centros urbanos, o quadro social denosso País apresenta-se-nos verdadeiramente trágico.A atuação governamental faz-se sentir tãoescassamente que o sertanejo se sente alheio aosproblemas nacionais, circunscrito ao seu pequenomundo local, sem aspirações nem esperanças. Omundo de doenças que cerca o homem do campo alia-se à falta de escolas, à superstição, à ausência dehigiene e de remédios (...)à existência das 'favelas`. Onúcleo de famílias morando em miseráveis choupanasnos grandes centros urbanos (e só no rio de Janeiro,há mais de 400.000 favelados); o problema daprostituição que cresce assustadoramente enquanto seagravam as dificuldades econômicas (...).”146
Entre os temas abordados, estavam:
“Problemas dos países de rápida mudança social” (Profº Egbert
De Vries); “Fundamentos bíblicos e teológicos da responsabilidade
cristã na esfera político-social” (Rev. Wilhelm Hann);
“O significado e as conseqüências da Encarnação” (Richard
Shaull), etc.147
145 Ibidem.146 Ibidem.147 Ibidem.
LXVI
O Encontro foi um marco no protestantismo brasileiro e trouxe
várias conseqüências ao metodismo. O despertar para as questões
sociais foi grande. O período 1955/1965 foi marcado por avanços:
“(...) marcado pelo maior engajamento da igreja navida das comunidades. O evangelho é encarnado narealidade de pobreza e injustiça nacional. O credosocial passa a ser uma força crescente na formaçãoreligiosa dos fiéis. As obras de assistência social setransformam em obras promocionais" do ser humanocom cursos de alfabetização e cursos de orientaçãoprofissional.148
Um dos líderes que despertou a Igreja sobre a sua
responsabilidade social foi o presbiteriano Richard Shaull, um dos 10
membros da Comissão Igreja e Sociedade.
Seus escritos influenciaram líderes e a juventude, entre os quais
está Gutemberg de Campos, que escreveu um artigo ao Expositor
Cristão, em 1954, e citou algumas afirmações de Richard Shaull, entre
elas:
“Não basta para o homem ter liberdade para votar.É preciso que tenha, também, capacidade eoportunidade para ganhar um salário alto compatívelcom a sua dignidade de ser livre e responsável.”149
148 CÉSAR, Ely Éser Barreto. "Evolução Social Brasileira e Igreja Metodista" em ExpositorCristão. 1ª quinzena de maio de 1977, p.4.149 CAMPOS, Gutemberg. “ Cristianismo e problemas sociais” em Expositor Cristão. São Paulo,30 de dezembro de 1954, ano 69, nº 52, p.4.
LXVII
A Conferência do Nordeste, em 1962, na cidade de Recife, foi
outro evento marcante para o protestantismo brasileiro. A Conferência
teve como tema “Cristo e o processo revolucionário brasileiro”. Almir
dos Santos, Secretário Geral de Ação Social na Igreja Metodista do
Brasil, foi um dos líderes do encontro e afirmou sobre sua importância:
“A Conferência do Nordeste foi uma tentativa paraencontrar novas formas de ação da Igreja na situaçãorevolucionária que vive o povo brasileiro na horapresente (...). A Igreja deve estar disposta, inclusive, amudar as suas estruturas eclesiásticas, se necessáriofor, para melhor cumprir a sua missão no mundoatual.”150
Dentro dessa necessidade de ampliar a ação da Igreja, o Ciemal151 (Conselho de Igrejas Evangélicas Metodistas da América Latina e
do Caribe) foi organizado em 1969, com a necessidade e o propósito
de um maior testemunho profético152 na América Latina:
“A dimensão profética de nosso ministério éirrenunciável, no momento que atravessa nossaAmérica, como denúncia da injustiça da ordemimperante (...).”153
Um outro fato importante aconteceu em 1971: a aprovação do
novo Credo Social no metodismo brasileiro.154 Ele serviu de âncora
150 SANTOS, Almir dos. “Cristo e o processo revolucionário brasileiro” em ExpositorCristão. São Paulo, 15 de outubro de 1962, ano 77, nº 20, p.7.151 CIEMAL, Missão e Testemunho. Organizado em 2 de fevereiro de 1969, em Santiagodo Chile com a “presença dos delegados das Igrejas Metodistas da Argentina, Bolívia,Brasil, Chile, Costa rica, Cuba, México, Panamá, Peru e Uruguai”, p.3.152 Como a citação aponta, o termo profético aqui quer dizer, especialmente, promover ajustiça.153 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização. Ibidem, p.252.154 “Nosso Credo Social tem como base um documento semelhante elaborado em 1922pela Igreja Metodista Episcopal do SUL (EUA), chamada por nós de Igreja-mãe. Este foi
LXVIII
para os líderes da Igreja. Entre alguns líderes e documentos da Igreja
Metodista, a expressão “libertação” passou a ser utilizada dentro da
ênfase da Missão da Igreja. Isac Aço assim se expressou:
“Evangelizemos, pois evangelizar é continuar aobra de Cristo que evangelizou aos pobres, foi enviadopara proclamar libertação aos cativos.”155
A Teologia da Libertação foi a passagem do cristianismo social156para um cristianismo revolucionário157, numa época que exigia que a
Igreja fosse revolucionária e lutasse também pela liberdade,
democracia, direitos humanos e justiça social.
inspirado no documento produzido naquele país pelo Conselho Nacional de Igrejas deCristo, em 1908. Em 1930, quando houve a autonomia da Igreja metodista no Brasil, odocumento da Igreja-mãe passou a fazer parte dos nossos Cânones, editados em 1934(...) o 10º Concílio geral da Igreja Metodista (1970-1971), novamente sob a iniciativa daJunta Geral de Ação Social, realizou mais uma reforma no Credo Social com a finalidadede atualizá-lo” (IGREJA METODISTA. Credo Social. São Paulo: Editora Cedro, BibliotecaVida e Missão, 1999, p.7-8)155 AÇO, Isac. “Evangelizemos” em Expositor Cristão. São Paulo, 31 de julho de 1971,ano 86, nº 14, p.3.156 Samuel Silva Gotay afirma que “ (...) os cristãos que enfrentaram a problemática sócio-econômica e política da América Latina antes do desenvolvimento da Teologia daLibertação o fizeram equipados com a teologia européia do cristianismo social” (Históriada Teologia na América Latina, Edições Paulinas, São Paulo, p. 139). Segundo ele, com ocristianismo social houve uma ênfase na humanização, pois na doutrina social cristã, “(...)o homem enquanto pessoa, possui uma projeção à transcendência que lhe confere´direitos e deveres” (...). (Ibidem, p.143). O cristianismo social enfatizava os direitos edeveres dos cristãos na sociedade.157 As idéias da Teologia da Libertação surgem no final da década de cinqüenta, segundoSamuel Silva Gotay. “No final da década de 50 nota-se a estagnação dos programas deindustrialização e desenvolvimento social que haviam enchido de esperança osmovimentos populistas (...)”. (Samuel Silva Gotay, ibidem, p.149). Ele afirma: “O fracassoda atividade da esquerda cristã brasileira, em 1964, levará um grande número de cristãose sacerdotes à participação revolucionária na América Latina (...). Em fevereiro de 1968,se realizou em Montevidéo o Primeiro Encontro Latino-Americano Camilo Torres, onde ossacerdotes latino-americanos discutiram a incorporação dos cristãos à luta revolucionária”(Ibidem, p.152-153)
LXIX
O outro movimento que surgiu como opção para a saída da crise
no metodismo brasileiro foi o chamado Movimento Carismático158, que
procurou enfatizar os carismas, os dons espirituais.
O Movimento Carismático159 começou nas Igrejas históricas, em
1960, na Igreja Episcopal em Van Nuys, Califórnia sob a liderança do
pastor Dennis Bennet. Na Igreja Católica começou em 1967 na
Universidade de Duquesne, Califórnia.160
Uma das primeiras denominações históricas a darem apoio ao
Movimento Carismático, nos EUA, foi a Igreja Presbiteriana Unida, em
1970. Ela manifestou sua aprovação através do documento A Obra do
Espírito. Logo depois a Igreja Presbiteriana nos Estados Unidos
também deu sua aprovação ao movimento em outro documento
chamado A pessoa e a obra do Espírito Santo - Com referência
especial ao batismo do Espírito Santo.161
Em novembro de 1972, a Assembléia de Deus, nos EUA, se
posicionou sobre o Movimento Carismático no periódico Advance. Ela
reconhecia o que Deus fazia ao redor do mundo dizendo:
158 Os Bispos metodistas brasileiros definem o Movimento Carismático como “ (...) o “Neo-Pentecostalismo´ou, ainda, a ´Renovação Carismática´, é o despertar no seio de Igrejastradicionais de uma nova experiência, conhecida no ambiente do PentecostalismoClássico, de vivência do Batismo do Espírito Santo e dos Dons do Espírito” (Pastoralsobre a Doutrina do Espírito Santo e o Movimento Carismático. Sede Geral, São Paulo, 2ªedição, 1988, p.10).159 O padre Caetano Minette de Tillesse define o Movimento Carismático como “ (...) aIgreja em oração” (A Teologia da Libertação à luz do Movimento Carismático. SãoPaulo:Edições Paulinas, 1979, p.8).160 PRANDI, Reginaldo. O sopro do Espírito. São Paulo: Edusp, 1997, p.32.161WILLIAMS, J. Rodman. O Movimento Carismático e a Teologia Reformada.Carapicuíba, SP, [s.ed.], 1980, p.5-6.
LXX
“Os ventos do Espírito Santo estão soprandolivremente fora do corpo pentecostal.”162
As Igrejas pentecostais entendiam que não eram mais os únicos
lugares da manifestação dos dons espirituais, mas elas advertiam:
“As Assembléias de Deus não aprovam nenhumadoutrina ou conduta manifestadamente antí-bíblica.Tampouco condenam categoricamente qualquer coisaque não se conforme aos seus padrões.”163
Na Igreja Ortodoxa, o Movimento Carismático surgiu em 1971. Já
em 1973, foi realizada a primeira Conferência Carismática Ortodoxa,
em Ann Arbor, Michigan, EUA.164
Os conflitos foram inevitáveis. O próprio New York Times
publicou um artigo sobre os novos movimentos que estavam trazendo
rupturas nas Igrejas tradicionais:
“Para algumas outras Igrejas, a causa maisinquietante de conflito tem sido o movimentocarismático (...). Faz pouco reuniram-se na cidade deKansas 50 mil carismáticos dos meios católicos eprotestantes, numa reunião que se constituiu num dosmaiores acontecimentos ecumênicos jamais ocorridosnos Estados Unidos.”165
162 HORTON, Stanley M. O Avivamento Pentecostal. CPAD, 1997, p.66. “CorpoPentecostal” aqui é entendido como as Igrejas que aceitam o Pentecostes nos dias atuais,ou seja, os dons do Espírito. Nesse sentido, segundo os Bispos metodistas do Brasil, ometodismo tem também origem pentecostal: “Como herdeiros do Pentecostes do séculoXVIII, o movimento conduzido por Deus através dos irmãos Wesley (...). (Pastoral sobre aDoutrina do Espírito Santo e o Movimento Carismático. Ibidem, p.9).163 Ibidem.164 WILLIAMS, J. Rodman. Ibidem, p. 9 e 38.165 “A crise da religião convencional” (Briggs apub Estado de São Paulo, 23.10.77).
LXXI
1.4. 1974, início de grandes mudanças no metodismo brasileiro
O início da década de setenta começou promissor para o
metodismo brasileiro. O Ministério Pastoral Feminino encontrou
espaço na Igreja, a partir do Concílio Geral de 1970-71. Nos Cânones
de 1971 está registrado no Art.157, parágrafo único:
“Na ordem presbiteral, a Igreja acolhe homens emulheres que reconhece vocacionados para a plenitudedo ministério ordenado (...).”166
Em 1971, o Conselho Mundial Metodista, reunido em Denver,
Colorado, EUA, convocou o metodismo mundial para participar da
campanha “Metodismo Mundial em Chamas por Cristo”. Em 1973, o
metodismo brasileiro seguiu a recomendação para o início da
campanha e realizou três eventos:
- Lançamento oficial da campanha no dia 10 de junho, Dia de
Pentecostes. Em diversos lugares foram realizadas concentrações ao
ar-livre. Na central de Belo Horizonte se reuniram duas mil pessoas,
sob a liderança do bispo Omar Daibert;
- Vigília Mundial de Oração no dia 31 de dezembro das 12:00
às 24 h;
166 CÂNONES da Igreja Metodista. São Paulo: Imprensa Metodista, 1971, p.109.
LXXII
- Estudo do livro Jesus Cristo para Hoje de Barclay, nas
Escolas Dominicais, no 1º semestre de 1974.167
De uma forma mais acentuada, a partir de 1974, experiências
com o Espírito Santo passaram a ocorrer na vida de pastores e igrejas
metodistas. A própria liderança da Igreja testemunha que um sopro do
Espírito aconteceu em seu meio, em 1974, antes do Concílio Geral:
“Sentindo a ingente responsabilidade paracumprimento da Missão aqui e agora, no Brasil e nomundo, buscavam os conselheiros encontrar o caminhoadequado para o desenvolvimento da Obra profética daIgreja. Não estavam em reunião formalmenteadministrativa; apenas dialogavam.
Ao sopro do Espírito Santo, que vivifica, fortalece econserva a Igreja, surgiu espontaneamente, cremosnós, o tema que será centro de toda a preocupação eprogramação da Igreja no quadriênio: Ministério eMissão.”168
No Concílio Geral de 1974 foi aprovado o tema para o quadriênio
na igreja: ”Missão e Ministério”. Antes, foi tomada uma decisão
histórica. Pela primeira vez, a agenda reservou um dia (quarta feira)
para jejum e oração. Os Bispos disseram:
“Vamos à Fonte da Água da Vida.”169
Eles ainda alertaram aos conciliares:
167 CONSELHO GERAL. "Plano Quadrienal" em Atas e Documentos do XI Concílio Geral,1974, p.223.168 COLÉGIO EPISCOPAL. "Mensagem do Colégio Episcopal ao XI Concílio Geral da IgrejaMetodista. Atas e Documentos do XI Concílio Geral. 1974, p.32.169 Ibidem, p. 33.
LXXIII
“Se no final deste colendo Concílio tivermossomente dotado a Igreja de uma legislação perfeita,vamos necessitar clamar com 'saco e cinza na cabeça'pela inutilidade do encontro conciliar (...). Reunimo-nospara achar, encontrar, reencontrar a Missão da IgrejaMetodista no hoje no mundo e no agora do Brasil.”170
Mas fora dos Concílios algo mais acontecia. O pastor argentino
Juan Carlos Ortiz através dos seus livros O Discípulo e Ser e Fazer
Discípulos171 influenciou também os líderes carismáticos da Igreja
Metodista, no Brasil. Jamie Buckingham afirmou, em 1974:
“(...) Deus está agindo, enviando de novo aquelaslínguas de fogo de Pentecostes por todo o mundo. E osensinamentos de Juan Carlos se tornam agoranecessários para maiores esclarecimentos sobre a açãodo Espírito Santo nestes últimos tempos antes da voltade Cristo. 172
Não era mais possível fechar os olhos para a realidade do
Movimento Carismático nas igrejas Metodistas. No seu relatório sobre
170 Ibidem.171 Ortiz é um ministro argentino que através do discipulado alcançou bons resultados decrescimento em sua igreja.172 ORTIZ, Juan Carlos; BUCKINGHAM, Jamie. Ser e fazer discípulos. São Paulo:Edições Loyola, 1979, p.9. Entre as afirmações do pastor argentino pentecostal JuanCarlos Ortiz, que despertou muitos líderes para o discipulado, está: “As ovelhas devemparir ovelhas.Não só têm que parir como também alimentá-las com leite. Quem pariu, dáleite. Vacas produzem bezerros, figueiras produzem figos, e ovelhas produzemcordeirinhos. Portanto, ministros devem produzir ministros. De modo que as ovelhas semultiplicam e alimentam os cordeirinhos com o seu próprio leite, e nós, ministros,pegamos esses cordeirinhos e fazemos deles ministros” (Ibidem., p.27). Ortiz criticou asestruturas da época: ”As nossas estruturas eclesiásticas não favorecem o crescimento. Aspessoas são salvas e começam a crescer. Ouvem os sermões, aprendem a doutrina,chegam ao nível espiritual de pastor – e param. E a Igreja se torna um ambiente detensões” (Ibidem, p.32). Sua proposta foi o discipulado através Ide “células vivas. isto é,pequenos grupos de quatro ou cinco pessoas que se reúnem nas casas sob acoordenação de um líder, de modo que suas vidas possam ser moldadas para semobilizarem e se multiplicarem em outras células” (Ibidem., p.39). A partir de 1979,quando fui pastor em Itaguai e Muriqui, RJ, conheci alguns livros de Ortiz com os pastoresdo distrito eclesiástico de Campo Grande, que liam e debatiam sobre os assuntosabordados neles, especialmente, o discipulado..
LXXIV
o ano de 1975, ao Concílio da Primeira Região, o bispo Almir dos
Santos disse que o Plano Quadrienal tinha um total desconhecimento
dos membros das igrejas. Disse mais:
“Ainda para continuar sendo honesto, penso que aênfase de muitas igrejas não esteve no PlanoQuadrienal, mas em certos aspectos do movimentocarismático que vem atuando em todas as igrejascristãs no mundo de hoje, inclusive na CatólicaRomana. O Colégio Episcopal elaborou e publicou umapastoral sobre o Movimento Carismático, e para elatemos endereçado os pastores e leigos interessados nodespertamento espiritual da Igreja.”173
Bispo Almir dos Santos ainda falou da necessidade de
mudança na vida de algumas pessoas e do valor do movimento:
“Pessoalmente, creio que este movimento, quandopurificado de seus exageros, traz grande benefício àsigrejas e aos crentes. Não há como negar orebaixamento do nível de vida espiritual e moral demuitas das pessoas das nossas comunidades,transformadas em verdadeiros clubes.”174
No metodismo brasileiro o Movimento Carismático teve início,
especialmente, na 1ª (Rio de Janeiro), 2ª (Rio Grande do Sul) e 6ª
Regiões Eclesiásticas (Paraná e Santa Catariana).175 Diversas igrejas
173 SANTOS, Almir dos. "Relatório do bispo Almir dos Santos ao Conselho Regional daPrimeira Região Eclesiástica da Igreja Metodista" em Atas e Documentos. Rio de Janeiro,[s. ed], 1978, p 39.174 Ibidem.175 São sete as Regiões Eclesiásticas e um Campo Missionário no metodismo brasileiro. A1ª abrange o Rio de Janeiro; a 2ª, o Rio Grande do Sul. A 6ª Região abrange ao Paraná eSanta Catarina. Ter a experiência com o Batismo do Espírito Santo, nos movimentospentecostais, significa, especialmente, falar em línguas estranhas, conforme At 2.5 e 1Co12.10.
LXXV
experimentavam um mover do Espírito. Alguns líderes passavam pela
experiência do Batismo do Espírito.176
Em 1978, no Brasil, o Concílio Geral da Igreja Metodista elegeu
um Bispo carismático - Richard dos Santos Canfield - de uma Região
considerada carismática. Com esta atitude reconhecia o Movimento no
metodismo brasileiro. Neste ano, o tema aprovado no Concílio Geral
revela a intenção da Igreja: Unidos pelo Espírito, Metodistas
Evangelizam.
O Movimento Carismático foi mais bem aceito do que o
Movimento de Renovação Espiritual177 por não ter uma preocupação
tão moralista e doutrinária, como o Movimento Wesleyano, na década
de sessenta. Além do mais, houve amadurecimento em relação à
participação na vida política e social brasileira.178
176 Entre esses lideres, estão: Paulo Lockmann e Richard Canfield (que vieram a se tornarBispos na Igreja Metodista), Erasmo Ungaretti e Moisés Cavalheiro, que pertenciam aocorpo docente do Seminário Metodista, em Porto Alegre (GUTIERREZ, Washington."Concílio da 2ª Região recebe pessoas importantes" em Expositor Cristão. 1ª quinzenade março de 1977, p.11). Não há ainda nada escrito a respeito destas experiências.O quese sabe é por testemunho pessoal. Paulo Lockmann conta que sua experiência foi em1974, em Porto Alegre. A experiência de Richard Canfield foi em Londrina, 1976. Nasduas ocasiões, Moisés Cavalheiro estava ministrando. Recordando essa época, AsaphBorba disse:” 'Começou a haver gente liberta e batizada com o Espírito Santo (...). Euparticipei daquilo tudo, eu entrei naquele rio” (BORBA, Asaph. “O embaixador da músicaevangélica” em VINDE. Abril de 1997, p.40).177 Movimento avivalista ocorrido na década de sessenta, liderado pelos pastores batistasEnéas Tognini e Antônio do Rêgo Monteiro. O Movimento teve a participação de algunspastores metodistas, que em 1967 criaram a Igreja Metodista Wesleyana.178 O Movimento de Renovação Espiritual da década de sessenta apoiou o golpe de 1964,no Brasil, crendo que era uma intervenção de Deus. O Movimento Carismático, quandosurgiu, já conhecia os extremos da ditadura e, especialmente, no metodismo brasileiro, jáhavia a consciência da salvação integral, herança da ênfase de Wesley em Atos dePiedade e Obras de Misericórdia, que explicarmos mais adiante em outro capítulo.
LXXVI
Na Consulta Nacional sobre Evangelização promovida pelo
CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação), em 1980,
foi constatado o avanço do Movimento Carismático também nas
Igrejas brasileiras:
“Constatamos que o movimento de renovação nasIgrejas, como o movimento carismático, está assumindoproporções significativas no Brasil e no mundo.”179
Mais tarde, iniciou-se o ENAVI (Encontro Nacional de
Avivamento e Santificação) organizado pelos líderes carismáticos
metodistas. O primeiro foi realizado ainda de forma tímida entre os
dias 21 e 23 de abril de 1989, no Acampamento Betel, em São Paulo,
com a presença de três Bispos e cerca de 120 pessoas, a maior parte
era de pastores e pastoras.180
O Enavi foi organizado com o objetivo de promover o
avivamento espiritual no metodismo brasileiro e tem sido realizado de
dois em dois anos. O VI ocorrido em 1999 reuniu cerca de nove mil
pessoas em Londrina, Paraná.181 No último Enavi, no Maracanãzinho,
em 2000, cerca de quatro mil pessoas participaram.182
Na palavra de apresentação do livreto motivador para que a
Igreja viesse a orar e jejuar durante cinqüenta dias pelo VII Enavi, no
Rio de Janeiro, no ano 2000, está:
179 CEDI. Missão e Evangelização. Tempo e Presença. [s.ed], [s.d], p.24.180 O autor participou do encontro em São Paulo. Os dados são de sua observação pessoal.181 DO EDITOR, “No Enavi, 9 mil metodistas celebram a Jesus como Senhor” em Expositor Cristão.Outubro de 1998, nº 10, p.11.182 ______.”7º Enavi mostra a necessidade do genuíno avivamento” em Expositor Cristão. Outubrode 2000, nº 10, p.12-3.
LXXVII
“Queremos então desafiá-lo/a a se envolvercriativamente e com muita intensidade, juntamente comsua igreja, nesses 50 dias de oração pelo reavivamentodevocional da nossa amada Igreja metodista.”183
Estes dois movimentos dentro do metodismo - sócio-político e
Movimento Carismático - cada um por si, sempre procuraram uma
alternativa para a crise no metodismo brasileiro, desde a década de
sessenta.184
A crítica que José Miguez Bonino faz aos dois movimentos é que
eles agindo assim, separadamente, não têm conseguido alcançar seus
objetivos:
“O Evangelho Social tratou de restaurar aperspectiva profética com sua insistência nos 'princípiossociais' de Jesus. Porém tanto sua interpretação 'liberal'desses princípios como sua incapacidade para vincula-los com uma visão teológica mais plena frustraram emparte esse intento. O movimento carismático, nainsistência em Jesus Cristo como 'Senhor' e, porconseguinte na fé com o 'discipulado' abriu as portaspara um desenvolvimento cristológico mais pleno queme parece, no entanto, que não logrou definir osconteúdos sociais mais profundos do discipulado aoque convoca.”185
183 LOPES, João Carlos; SOBRINHO, José Pontes. “Palavra de apresentação” em 50 dias deoração pelo VII Encontro Nacional de Avivamento. Ibidem, p.3.184 Bispo Paulo Ayres Mattos afirma: “(...) como é possível imputar aos carismáticos ou aos liberaisa crise de unidade que hoje vivemos? Ora, a falta da unidade de nossa Igreja deve-se sim à faltade um projeto Missionário nacional que, fundamentado numa evangelização encarnada narealidade do povo brasileiro, pudesse ter superado de forma criativa as tensões e conflitos quedividiram a Igreja Metodista antes e depois de 1930” , no texto “A questão da unidade metodista(Ou da unidade que temos à unidade que precisamos)”. (BONINO et al. Luta pela vida eevangelização, Ibidem, p.299).185 BONINO, José Miguez Rostros del protestantismo latinoamericano. Nueva CreacionBuenos Aires - Grand Rapids y William B. Eerdmans Publishing Conpany, ISEDET, 1995,p.120.
LXXVIII
Neste ponto a tensão entre o Evangelho Social e o Movimento
Carismático é mais forte no catolicismo brasileiro. Há uma
incompatibilidade entre a proposta da Renovação Carismática Católica
(RCC)186 e a proposta das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs),
como afirma Reginaldo Prandi em seu livro Um Sopro do Espírito:
“A RCC é confrontada permanentemente com ocatolicismo das CEBs e com o pentecostalismo, umavez que a hipótese básica assume que o catolicismocarismático pode ser pensado como movimentoconservador de dupla reação: primeiro, um movimentomais geral, voltado para fora do catolicismo, isto é,tendo como oposição o pentecostalismo e outrasreligiões que vêm minando as fileiras católicas.Segundo, um movimento voltado para dentro da própriaIgreja, enfraquecendo as posições assumidas pelaIgreja Católica da Teologia da Libertação e das CEBs,comprometida com transformações sociais àesquerda.”187
186 Logo no princípio do Movimento Carismático, líderes da R.C.C. (RenovaçãoCarismática Católica) se reuniram, entre 4 a 11 de janeiro de 1978, e apreciaram asdiversas críticas feitas ao movimento. Entre suas conclusões estão: “Constatamos que aBíblia, em particular o Novo Testamento, não fala exatamente como os adeptos daTeologia da libertação gostariam que ela falasse. Pelo contrário, em alguns casosconcretos, o Novo Testamento aconselha atitudes contrárias àquelas desejadas pelateologia da Libertação, por exemplo 1Pedr 2,13-25 ou 1 Cor 7,20-23. (...) A estrutura é uminstrumento humano, a serviço do homem. Não pertence a Igreja propor outro modeloeconômico, nem de lutar para promover outro sistema econômico (...) Efetivamente, aigreja parece muito comprometida com o poder e com as estruturas injustas (...) De outraparte, uma simples mudança de estrutura política ou econômica não resolveria, se nãohouvesse primeiramente uma conversão interior (...) Finalmente, todos ficaramconvencidos de que o seu compromisso para com os mais pobres e os marginalizados émanifestação essencial do Reino de Deus (...) Uma vez que a segunda Páscoa élibertação pelo Espírito Santo, ficamos com a grande confiança que Ele mesmo guiarátodos os nossos Grupos de oração, em íntima união com seus Pastores e todos osmembros autênticos da Igreja” (TILLESSE, Caetano Minette. A Teologia da Libertação àluz da Renovação Carismática. São Paulo: Edições Loyola, 1979, p.37-46).187 PRANDI, Reginaldo, Ibidem, p. 11.
LXXIX
Reginaldo Prandi descreve em seu livro os conflitos entre
padres e a RCC e diz que desde a sua fundação, nos EUA, ela
enfrentou resistência por parte da Igreja progressista do catolicismo.188
A questão do Espírito Santo e a participação social da Igreja têm
gerado conflitos, discórdias e divisões desde que o metodismo foi para
a América, especialmente diante da questão da escravidão.189
Ela sempre esteve presente nos debates da Igreja Metodista, no
Brasil, e ainda o é. Muitos são rotulados de “carismáticos” e
“progressistas”.190 Apesar da publicação das Pastorais dos Bispos
sobre a doutrina do Espírito Santo,191 diversas divisões têm ocorrido
na Igreja.192
188 Ibidem, p.57.189“Embora já nas Atas da Conferência Anual Metodista de 1780 se diga que a Conferênciareconhece que a escravidão é contrária às ’leis de Deus, do Homem e da Natureza’, e que ‘sedesaprovam aqueles que têm escravos’, o certo é que, já a partir de1839, começaram a surgircismas na Igreja Metodista dos estados Unidos por causa dessa questão” (BONINO et al. Luta pelaVida e Evangelização. São Paulo: Edições Paulinas-Editora Unimep, 1985, p.50).190 Expressão utilizada pelos conservadores e carismáticos para falar dos que se envolvem emquestões sociais e políticas.191 Em 1980, o Colégio Episcopal publicou a Pastoral sobre a Doutrina do Espírito Santo e oMovimento Carismático. Nesta Pastoral, os bispos dão “diretrizes para todos”. “Para os pastores epastoras carismáticos”; “Para os pastores e pastoras não carismáticos”; ”Para os leigos quetenham tido experiências carismáticas”; Para os leigos não carismáticos”. Em 1988, os Bispospublicaram Dons e Ministérios; Em 1989, o Colégio Episcopal publicou: Orientações pastoraissobre o uso dos dons do Espírito e outras práticas.192 As mais recentes foram: em 1982, alguns leigos organizaram a Comunidade CristãEvangélica, em Suzano, SP; Igreja Metodista Renovada, em 1993, Vila Mariana, SP, foiorganizada com o pastor Joel Cardoso; a Igreja Evangélica Ebenézer, com o pastorSamuel Palma Ferreira, em Vila Industrial, SP, 1994 (Carta da Comissão especial paraaveriguação, São Bernardo do Campo, 27 de julho de 1994, Flávio Moraes de Almeida);o Projeto Vida Igreja Evangélica, organizada no dia 4 de fevereiro de 1997 com o leigoPaulo Térsio, membro da Igreja em Campo Belo , SP. Todas elas surgiram por causa doavivamento ou questões como a maçonaria, cujos líderes sentiram falta de abertura eapoio por parte das autoridades da Igreja Metodista (Relatório: Por que vocês sesepararam da Igreja Metodista? Rev. Flávio Moraes de Almeida, 8 de julho de 1994).
LXXX
Entre as principais denominações que surgiram por causa de
conflitos na Igreja Metodista, estão: Irmandade Metodista Ortodoxa,
1934/1935;193 Igreja Evangélica do Avivamento Bíblico, 1946;194 Igreja
Metodista Cristã Brasileira, 1961;195 Igreja Metodista Wesleyana,
1967;196 Comunidade de Porto Alegre, 1976;197 Comunidade
Evangélica de São José do Rio Preto, 1977;198 Igreja Metodista
Renovada, em Ribeirão Preto, 1981;199 Igreja Metodista Renovada, em
São Paulo, 1993.200
Antônio Gouvêa de Mendonça afirma que os protestantes
historicamente têm sido incapazes de lidar adequadamente com as
divergências, como o movimento carismático, favorecendo as
divisões.201 No Movimento Carismático Metodista não há uma reação
193A irmandade Metodista Ortodoxa foi fundada em 31/01/1934 e tem sua sede em Madureira, RJ(Nota em carta oficial da Irmandade Metodista Ortodoxa, em carta do Bispo Samuel Henriques daMatta, em 5 de dezembro de 1997).se SEMINÁRIO Teológico Avivalista por Extensão. Curso Pastoral, matéria: Conhecendo oAvivamento Bíblico, [s.ed.], [s.d.], folhas 1.195 RODRIGUES, Helerson Bastos. No Mesmo Barco. ASTE - Programa Ecumênico dePós Graduação em Ciências da Religião, 1986, p.54.196 CARVALHO, Gessé Teixeira. A vida Espiritual de minha Igreja. 4ª edição, 1996, p.14.197 GUTIERREZ, Washington. "Concílio da 2ª Região recebe pessoas importantes" emExpositor Cristão. 1ª quinzena de março de 1977, p.11. (BRUM, Hélio Maurício.Movimento das Comunidades Evangélicas. [s.ed],1977, p.3.198 BARROS, Davi F. "Os Movimentos Carismáticos" em Expositor Cristão. 1ª quinzena defevereiro de 1978, p.10.199BARRETO, Inaldo. Compreendendo o mundo após a queda. Igreja Metodista Renovada.[s.ed],1977.200 CARDOSO, Joel. Igreja Metodista Renovada. Conheça a nossa História . [s.ed], [s.d.], p.3.201 Em 1992, Antonio Gouvêa de Mendonça afirmou que o movimento carismático “ é muito forte einfluente nas igrejas e não tem sido devidamente avaliado. A Igreja Católica, segundo sua práticahistórica de lidar com dissidências, está tentando gerí-lo no seu próprio interior; as igrejasprotestantes, com sua tradicional impotência para manter divergências têm favorecido a formaçãode comunidades alternativas (MARASCHIN Jaci [ed]. Estudos de Religião. São Bernardo doCampo: Bartira Gráfica e editora, ano VI, nº 8, outubro de 1992, p.53).
LXXXI
sistemática ao pentecostalismo e nem aos liberais. Há, sim,
discordância em alguns posicionamentos. 202
Diante disso, perguntamos se é possível às Igrejas de hoje uma
prática semelhante àquela do tempo de Wesley: uma Igreja com
submissão ao Espírito Santo e com compromisso social.
Nosso pressuposto básico é de que é possível caminhar para a
unidade no metodismo, especialmente, levando os grupos a
compreenderem que as Obras de Piedade e os Atos de Misericórdia
fazem parte das raízes wesleyanas. São dois aspectos constitutivos
da identidade metodista. É possível e necessária uma Ação
Missionária comum entre os chamados carismáticos e a ala
progressista da Igreja. Esta Ação Missionária é fator de unidade da
Igreja.
Esta é a proposta do bispo Paulo Ayres Mattos, que fala em
unidade da Igreja através de um Projeto Missionário Nacional.203
Para ele, o projeto teria exigido uma pneumatologia:
“(...) profética (crítica e transformadora da realidadebrasileira), carismática (fundamentada na diversidadedos ministérios e serviços concedidos pelo Espíritolivremente a todos os crentes), comunitária (o povo deDeus sobrepondo-se à máquina burocrática e àslideranças personalistas) e Missionária (voltada para
202Um dos questionamentos de alguns carismáticos mais conservadores, no metodismo, é emrelação ao ecumenismo com a Igreja Católica. Para os mais conservadores, não é possívelrelacionar-se com uma Igreja que adora Maria e é submissa ao Papa.203 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização, Ibidem, p.299.
LXXXII
fora da instituição metodista, em direção ao mundo dosbrasileiros.”204
Com o objetivo de encontrar uma base histórica e teológica sólida
para o mover do Espírito Santo e um forte compromisso social junto ao
povo carente é que pesquisaremos esta história cheia de fatos
apaixonantes e que poderão apontar um caminho para a Igreja, no
Brasil, em nossos dias.
2- A INGLATERRA NO SÉCULO XVIII
“É o século na qual a economia inglesa setransforma no centro da economia mundial; o século noqual o império colonial inglês se constituí no impériodominante e na qual se acham as bases daindustrialização inglesa.”205
Franz Hinkelammert
204 Ibidem205 “Las Condiciones económico-sociales Del Metodismo em la Inglaterra Del Siglo XVIII” (FranzHinkelammert apud Departamento Ecuménico de Investigaciones, 1983, p.21).
LXXXIII
Para compreendermos melhor as idéias e práticas de Wesley e
do metodismo inglês, abordaremos de um modo geral a Inglaterra no
século XVIII. Abordagem descritiva, não analítica, com o intuíto de
contextualizar o tema em apreço. Contudo é importante termos
consciência de que isso é uma tarefa difícil. Como afirma Duncan
Alexander Reily:
“Caracterizar um século é tarefa árdua earriscada.”206
Mas é fundamental entendermos como o metodismo nasceu, se
desenvolveu e realizou sua missão em meio à revolução social,
religião e política da época.
J.P. Barruel de Lagenest afirma:
“O fenômeno religioso caracteriza-se por ser, aomesmo tempo, individual, social, pessoal e comunitário;nele há contínua inter-relação e interação do indivíduocom a sociedade e da sociedade com o indivíduo, dapessoa para com a comunidade e da comunidade paracom a pessoa.”207
Para pesquisarmos sobre uma história evidentemente temos que
levar em consideração a trilogia: ser humano, tempo e espaço. O ser
humano interfere e é influenciado no meio em que vive. Não se pode
escrever sobre um fato histórico sem levar em consideração o
contexto em que ele se situa.
Adam Schaff, contudo, alerta:
206 REILY, Duncan A. História Documental do Protestantismo no Brasil . São Paulo, ASTE, 1984,p.9.207 LAGENEST, J.P. Barruel de. Elementos de Sociologia da Religião Editora Vozes Ltda, 1976,p.36.
LXXXIV
“O historiador – sujeito que conhece – é um homemcomo qualquer outro e não pode libertar-se das suascaracterísticas humanas: não é capaz de pensar semas categorias de uma língua determinada, possui umapersonalidade socialmente condicionada no quadro deuma realidade histórica concreta, pertence a umanação, a uma classe, a um meio, a um grupoprofissional, etc., com todas as conseqüências que tudoisto implica no plano dos estereótipos que aceitainconscientemente, em geral, da cultura de que é aomesmo tempo uma criação e um criador, etc.”208
Não podemos escrever a história de uma Igreja sem levar em
conta os fatos sociais em que ela surgiu. Os fatos e fenômenos vão
acontecendo mediados por variáveis sociais, culturais, políticas,
econômicas e outros fatores. O sujeito interfere e sofre as
conseqüências do meio onde se localiza:
“(...) em função das quais introduz noconhecimento elementos de subjetividade diversos:preconceitos, opiniões preconcebidas, predileções efobias, os quais caracterizam a sua atitude cognitiva.”209
Adam Schaff nos alerta mais uma vez:
“No seu trabalho, o historiador não parte dos fatos,mas dos materiais históricos, das fontes, no sentido maisextenso deste termo com a ajuda dos quais constrói oque chamamos os fatos históricos. Constrói-os namedida em que seleciona os materiais disponíveis emfunção de um certo critério de valor, como na medida emque os articula, conferido-lhes a forma deacontecimentos históricos.. Assim, a despeito dasaparências e das convicções correntes, os fatos
208 SCHAFF, Adam. História e Verdade. São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda, 1983,p.284.209 Ibidem, p.291.
LXXXV
históricos não são um ponto de partida, mas um fim, umresultado.”210
O historiador não se isenta de tendências ao pesquisar e
escrever sobre os fatos históricos, mesmo que ele não esteja
envolvido emocional ou historicamente com os fatos ou idéias
pesquisadas. A verdade atingida no conhecimento histórico é uma
verdade objetiva relativa.211
Segundo Adam Schaff, é ilusório pensar em evitar os
condicionamentos de classe social, pois o sujeito é um produto
social.212 Para ele:
“A única solução é a escolha entre oscondicionamentos de classe possíveis, e não a tentativade lhes escapar em geral”.213
2.1. Contexto social
A partir da física de Isaac Newton (1642-1727), centrada na lei da
gravitação universal, que tornou compreensível os movimentos de
todas as partes do mundo físico, e da psicologia de John Locke214
(1632-1704), a qual parecia desvendar os mistérios da mente humana,
o século XVIII é conhecido como o Século das Luzes. Acompanhou o
210 Ibidem, p.307.211 Ibidem, p.301.212 Ibidem, p.295.213 Ibidem.214 Manfred Marquardt afirma que Wesley “aparentemente (...) estava imbuído de uma tendênciacontemporânea pelo empirismo e seguiu Locke em sua abordagem sobre as questões doconhecimento” (Redescobrindo o Sagrado. São Paulo: Editeo, 2000, p.18).
LXXXVI
Iluminismo o conceito de religião natural, elaborado por Edward
Herbert (1583-1648) e o Deísmo, sendo o livro de Mattew Tindal
(1657-1733), Cristianismo tão velho quanto a criação (1730),
conhecido como a bíblia dos deístas.215
Uma das conseqüências da expansão do iluminismo no fim do
século XVI e início do século XVII foi o desenvolvimento do
racionalismo na religião.216
“O conhecimento recente de antigas civilizações ede outras religiões ampliou os horizontes humanos e osconfrontou com outras culturas que não a cristã. Aprova da verdade para Locke era a razoabilidade, nosentido de conformidade com o senso comum.Compreendia ele a moralidade como o conteúdoprincipal da religião.”217
Alguns filósofos passaram também a combater o cristianismo
existente na Grã-Bretanha. Historiadores liberais como conservadores
são quase unânimes em afirmar que o iluminismo218 despertou uma
crítica ao cristianismo e aos diversos relatos de milagres na Bíblia.
“Toland, o superficial, combatia o Cristianismo portodos os meios que tinha ao seu alcance multiplicandoseus livros e sofismas, e levando seus discursosinflamatórios tanto às tabernas como aos salõesnobres. O elegante conde de Shaftesbury atacavafortemente a revelação divina (...). O fanático Woolston
215 REILY, Duncan A. História Documental do Protestantismo no Brasil. Ibidem, p.9.216 WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. ASTE, São Paulo, [s.ed], [s.d], p.190.217 Ibidem, p.190.218 Manfred Marquartd, entretanto, adverte: “Essas referências às atitudes afirmativas e críticas deWesley, a respeito do iluminismo e do lugar da razão, podem nos fazer cautelosos contrajulgamentos precipitados acerca desse movimento filosófico, como sendo a fonte de todo o declíniomoral e da perda das crenças religiosas em nossas sociedades seculares ou pós-modernas”(Redescobrindo o Sagrado , Ibidem, p.18).
LXXXVII
nos seus Discursos sobre os milagres, obra cuja vendachegou, segundo se diz, a trinta mil exemplares, atacoucom violência os relatos dos evangelhos, declarandoque não passavam de mitos e lendas (...”).219
Com o Iluminismo veio também a Revolução Industrial, que
substituiu as ferramentas pelas máquinas e a energia humana pela
energia motriz. No aspecto positivo da Revolução Industrial, a
invenção da máquina de fiar e tecer trouxe grande desenvolvimento.
“Com a invenção de máquinas mais eficientes defiar e tecer, e com a aplicação da força (primeiro daágua, e, depois de James Watt [1736-1819], do vapor)para propulsionar essas máquinas, nasceu o sistemade fábricas (substituindo a fabricação caseira quedominava até então) e divorciando a indústria dosolo.”220
Foram várias as invenções ocorridas durante o século XVIII, que
levaram o país de agrícola a industrial.
“James Watt (1736-1819) patenteou a primeiramáquina de fato a vapor, em 1769. James Hargreaves(?-1778) tirou patente, em 1770, da máquina de fiar.Richard Arkwright (1732-1792) inventou o fusomecânico, em 1768. Edmund Cartright (1743-1823)inventou, em 1784, o tear. Josias Wedgwood (1730-1795) de 1762 em diante tornou efetivas suas olarias deStaffordshire.”221
Com essas mudanças, a Inglaterra tornou-se uma grande
potência, o entreposto central do comércio mundial.222 No começo do
219WALKER, Welliston, Ibidem, p.11.220 Ibidem.221 Ibidem, p.203.222 ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX. Editora Unesp, 1997, p.215.
LXXXVIII
século XVIII, ela obtém o monopólio da comercialização têxtil de
algodão hindu.
Como o maior produtor era a Índia, a Inglaterra passou a
comprar a lã para revendê-la. Proporcionou modernização e a
utilização de diversas pessoas como mão de obra barata:
“Grandes massas de operários, e mesmo decrianças, são colocadas a serviço do ferro, do carvãode pedra e da grande indústria têxtil.”223
Ao ultrapassar a Holanda, depois da metade do século XVIII, a
Inglaterra passa a deter a hegemonia econômica mundial, quando foi
parte integrante de um processo contínuo de expansão, restruturação
e reorganização financeira da economia mundial capitalista.224 Ela
deixa de ser subordinada e se transforma:
“(...) na nova dirigente e organizadora da economiacapitalista mundial.”225
Franz Hinkelammert, durante o Primeiro Encontro de Teologia
Protestante, na Costa Rica, entre 6 e 11 de fevereiro de 1983, afirmou:
“Que representa o século XVIII para a Inglaterra? Éo século na qual a economia inglesa se transforma nocentro da economia mundial; o século no qual o impériocolonial inglês se constituí no império dominante e naqual se acham as bases da industrialização inglesa.”226
223 BONINO et al. Luta pela vida e Evangelização. Ibidem, p.246.224 ARRIGHI, Giovanni, Ibidem, p.214.225 Ibidem.226 “Las Condiciones económico-sociales Del Metodismo em la Inglaterra Del Siglo XVIII” (FranzHinkelammert apud Departamento Ecuménico de Investigaciones, 1983, p.21).
LXXXIX
A crescente necessidade de matéria prima implicou numa
mudança na estrutura agrária inglesa. A produção de alimentos deu
lugar à produção de lã. Os grandes latifundiários transformaram suas
fazendas em produtoras de lã. Os fazendeiros começaram a ocupar as
terras cedidas aos agricultores para integrá-las às suas fazendas e
transformá-las em fazendas de lã, utilizando menos mão de obra
levando a expulsão de grande número de camponeses de suas
terras.227
A desapropriação das terras proporcionou uma crise social
enorme, que afetou grande parte da população trazendo desemprego
em massa.
Segundo Edwards Thompson:
“Na agricultura, os anos entre 1760 e 1820 foram aépoca de intensificação dos cercamentos, em que osdireitos a uso da terra comunal foram perdidos numavila após a outra; os destituídos de terras e, no sul, oscamponeses empobrecidos são abandonados àsexpensas dos granjeiros, dos proprietários de terras edos dízimos da Igreja.”228
Muitos passaram a vaguear pela cidade procurando onde ficar.
Para o historiador Christhoper Hill, a realidade social na Inglaterra, no
final do século XVII, era alarmante:
“(...) por baixo da aparente estabilidade daInglaterra rural, dos vastos e plácidos campos abertosque cativam o olhar, havia portanto a fermentação emobilização dos invasores de florestas, dos artesãos e
227 Ibidem.228 THOMPSON, Edward P. A Formação da Classe Operária Inglesa. 2 v. Paz e Terra, 1987,p.22.
XC
pedreiros itinerantes, de desempregados de ambos ossexos em busca de trabalho, de atores, menestréis ejograis ambulantes, bufarinheiros e charlatões, ciganos,vagabundos, vadios, concentrando-se principalmenteem Londres e nas grande cidades.”229
Uma contradição enorme na Grã-Bretanha que passou a ter a
hegemonia mundial, mas que vivia grave crise social:
“A expansão comercial, o movimento defechamento das terras comunais, os inícios daRevolução Industrial - tudo ocorreu à sombra da forca.Os escravos brancos deixavam nossas costas para asplantações americanas e depois para a Terra de VanDieman, enquanto Bristol e Liverpool enriqueceram comos lucros da escravidão branca; e os proprietários deescravos das plantações das Índias ocidentaistransportavam sua riqueza para antigas linhagensgenealógicas no mercado casamenteiro de Barth. Nãoé um quadro agradável. Nas profundezas, policiais ecarcereiros apascentavam nos pastos do crime: opagamento por assassinatos de encomenda, o dinheiroembargado pela justiça, o comércio de álcool para suasvítimas. O sistema de recompensa proporcional àgravidade do crime, oferecidas pela captura de ladrões,incitava-os a aumentar o delito dos acusados. Ospobres perdiam seus direitos na terra e eram tentadosao crime pela sua pobreza e pelas medidas preventivasinadequadas; o pequeno comerciante ou.” mestre deofícios eram tentados à falsificação ou a transaçõesilícitas por temor à prisão por dívidas (...).”230
Para o historiador inglês Edward Thompson, a Revolução
Industrial foi catastrófica para o povo:
“O povo foi submetido, simultaneamente, àintensificação de duas formas intoleráveis de relação: aexploração econômica e a opressão política. As
229 HILL, Christopher. O mundo de ponta-cabeça. São Paulo: Companhia Duas Cidades, 1991,p.65.230 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 1 v. p.64.
XCI
relações entre patrões e empregados tornaram-se maisduras e menos pessoais (...).”231
Segundo o metodista Francis Gerald Ensley, no século XVIII, a
conduta moral de uma grande parte era irregular, na Inglaterra:
“A Bretanha estava nas garras de uma Idade doGelo, mais conhecida na história como a Idade daRazão. Muitos consideravam morta a organizaçãoEclesiástica e também a vida cristã (...). A moral erabaixa, como resultante. Os estadistas proeminenteseram incrédulos e distinguiam-se pela conduta irregular,enquanto as massas pobres eram ignorantes e brutaisnum grau de difícil descrição.”232
Entre os problemas sérios na sociedade inglesa, o historiador
metodista Duncan Alexander Reily cita alguns e afirma que havia
imoralidade ente os altos oficiais do governo; o jogo havia se tornado
quase um passatempo; o alcoolismo era um problema tremendo; a
recreação era bárbara em geral; o roubo de todo tipo era comum,
etc.233
Como conseqüência de toda uma insatisfação social, a lei era
odiada e deprezada. O movimento de resistência à lei tomava a forma
de atos individuais e de insurreições esporádicas. O povo inglês era
conhecido pela sua turbulência e o povo de Londres pela sua falta de
respeito.234
231 ______. 2 v. p.23.232 ENSLEY, Francis Gerald. João Wesley, o Evangelista. São Paulo, Junta Geral de Educaçãocristã, 1960, p.10.233 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano. São Paulo: Imprensa Metodista,1981, p.148-53.234 THOMPSON, Edward P. 1 v. Ibidem, p.64.
XCII
Diversos motins surgiram por questões sociais e econômicas:
“(...) ocasionados pelos preços do pão, pelospedágios e portagens, impostos de consumo, 'resgates',greves, nova maquinaria, fechamento das terrascomunais, recrutamentos e uma série de outrasinjustiças.”235
Motins famosos por causa de alimentos foram os registrados na
Feira do Ganso em Nottingham, 1764, e ficou conhecido como o
"Grande Motim do Queijo", quando queijos inteiros rolaram pelas
ruas. Na mesma cidade, houve o motim provocado pelo alto preço da
carne, em 1788. O povo arrancou as portas e venezianas dos
açougues, que foram incendiados.236
2.2. Contexto político
A situação política na Inglaterra, no século XVIII, era tranqüila,
em comparação ao século anterior, quando houve guerra civil237 e o rei
Carlos I foi destituído e morto em 9 de fevereiro de 1649.238
A partir de 1688, o sistema político inglês caminhou para a
política de clientela, que consistia na manipulação dos favores e
ameaças. Os favores consistiam em salvar uma pessoa da cadeia ou
forca.239
235 Ibidem, p.64-5.236 Ibidem, p.67.237 HILL, Christhoper, Ibidem, p.83.238 Ibidem, p.337.239 Ibidem, p.333.
XCIII
“Os conflitos políticos e religiosos do séculoanterior não somente produziram cicatrizes, masdeixaram ainda feridas abertas a sangrar. A tiraniaStuart somente terminou com a guerra civil e morte dorei(1649), A Comunidade de Cromwell (1649-1660) e aexpulsão final de James II pela Revolução Protestantede 1688, causaram ódios, derramamento de sangue, oexílio ou morte de muitos homens de caráter ecapacidade, em todos os partidos, e o conseqüenteempobrecimento da nação.”240
A ilha da Grã-Bretanha, no século XVII, e, consequentemente,
parte do século XVIII, apresentava um quadro peculiar na corte:
“Na Inglaterra do século XVII era elegante ir aohospício de Bedlam ver os pobres lunáticos; no teatroisabelino e especialmente no do rei Jaime sãofreqüentes as máscaras de loucos dançando. Bobos dacorte, ou bobos de casas aristocráticas, fazem partedesse panorama mais amplo; é de se perguntar se elesseriam sempre tão espirituosos como os deShakespeare, embora não haja dúvida de queeventualmente alguns homens muito sagazesrepresentavam o papel de bobo para ganhar a vida.Alguns governantes inteligentes, ouvindo os seusbobos, talvez tenham conseguido varar a barreira decortesãos bajuladores que se interpunha entre eles e aopinião pública. Mas foi certamente um progresso queHenry Barrow, separatista radical, criticasse por razõesde princípio a prática de os bispos manterem bobospara se divertirem. Os Stuart foram os últimosmonarcas ingleses a terem bobos da corte; e o ultimobobo que sabemos ter servido a uma família senhorialna Inglaterra morreu em 1746, em Durham, no.” mesmoano em que fracassou a derradeira tentativa derestaurar a dinastia Stuart.”241
240 JOY, James Richard. O despertamento religioso de João Wesley. Instituto Metodista Bennett,1996, p.94.241 Ibidem, p.269.
XCIV
A situação política volta ao normal quando o príncipe Charles é
derrotado em abril de 1746.242
A partir de meados do século XVIII, a Grã-Bretanha passa a deter
a posição central na economia mundial. Segundo Giovanni Arrichi, isto
ocorre no contexto do ciclo sistêmico de acumulação.243 O ciclo
genovês vai do século XV ao início do século XVII; o ciclo holandês,
do fim do século XVI até decorrida a maior parte do século XVIII; o
ciclo britânico, da segunda metade do século XVIII até o inicio do
século XX .244
A Grã-Bretanha disputava com a França a supremacia mundial.
Quando ela venceu a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), estava
encerrada a luta com a França pela supremacia,245 contudo, não ainda
mundial.
Segundo Giovanii Arrighi, isso se deu após a perda da colônia na
América. Os norte-americanos haviam vencido os ingleses com o
apoio dos franceses em aliança com os holandeses. Posteriormente,
houve retaliação britânica à Holanda após a Guerra da Independência
dos EUA causando assim a aniquilação do poderio marítimo
holandês com as conseqüentes perdas em seu império nas Índias
Orientais. Em conseqüência, uma crise que vinha minando o mercado
242 Ibidem.243Para Gionanni Arrighi os ciclos sistêmicos de acumulação são definidos como compostos deuma fase de expansão material seguida por uma fase de expansão financeira (O longo século XX.São Paulo:Editora Unesp, 1997, p.90).244 Ibidem, p.6245 Ibidem, p.51.
XCV
financeiro de Amesterdam, desde 1760, roubou-lhe a posição central
na economia mundial, que passou à Grã-Bretanha.246
Para Giovanni Arrighi, a Inglaterra/Grã-Bretanha ‘tornou-se’ uma
ilha poderosa através de um árduo processo bissecular de
‘aprendizagem’ sobre como transformar uma desvantagem geopolítica
fundamental, na luta continental pelo poder diante da França e da
Espanha, numa vantagem competitiva decisiva na luta pela
supremacia comercial no mundo.247
Havia dois partidos políticos na Inglaterra do século XVIII.
“O partido Tory era conservador, enquanto opartido Whig era favorável a reformas e ao progresso;era liberal com preocupações sociais.”248
O fato é que a Inglaterra do século XVIII, politicamente foi
tolerante, em relação ao século anterior onde houve constante luta.249
Mas os nervos de muitos estavam abalados pela catástrofe política do
século anterior.250 Havia um governo monárquico, que tinha uma certa
tranqüilidade em governar com o partido Tory.251
Contudo, a fermentação social trouxe dificuldades para o
Governo, quando surgiram as turbas, que lutavam pelos seus direitos,
como a turba de Londres, em 1760, que ficou fora do controle das
autoridades:
246 Ibidem, p.163.247 Ibidem.248 BONINO et al. Luta pela Vida e Evangelização. Ibidem, p.34.249 Ibidem, p.36.250 JOY, James Richard, Ibidem, p.95.251 BONINO et al. Luta pela Vida e Evangelização. Ibidem, p.34.
XCVI
“Num certo sentido, era uma turba de transição, emvias de se tornar uma multidão radical autoconsciente;o fermento da Dissidência e da educação políticaentrava em ação, dando ao povo uma predisposiçãopara assumir a defesa das liberdades populares,desafiando as autoridades, em 'movimentos de protestosocial, onde o conflito subjacente dos pobres contra osricos’ (...) é claramente visível.”252
Esses protestos assumiam um tom republicano e revolucionário,
quando o povo dizia slogans como: Maldito seja o Rei! Maldito seja o
Governo! Malditas sejam as Justiças!253
A última grande ação de uma turba, no século XVIII, ocorreu em
14 de julho de 1791, em Birmingham, quando reformadores da classe
média comemoravam a tomada da Bastilha, na Revolução Francesa.
Naquela noite, e nos três dias seguintes, casas de cultos, lojas e
casas foram saqueadas e incendiadas, especialmente os dissidentes
ricos foram as principais vítimas.254
2.3. Contexto religioso
O surgimento do protestantismo na Inglaterra teve origem em
uma disputa do rei Henrique VIII com a Igreja de Roma. De "defensor
da fé", título que recebeu do Papa por defender o catolicismo contra os
escritos de Lutero, o rei da Inglaterra passou a ser visto como um
252 THOMPSON, Edward P, 1 v. ibidem., p.73.253 Ibidem.254 Ibidem, p.77.
XCVII
herege pela atitude de se separar da Igreja Católica e assumir a
liderança como "cabeça da Igreja" na Inglaterra.255
“O Parlamento da reforma (1532-35) estabeleceuuma forma Erastina de governo, isto é, elesproclamaram Henrique VIII como cabeça tanto da Igrejacomo do estado na Inglaterra (pelo Ato de Supremacia)e constituíram a Igreja da Inglaterra como a religiãooficial do estado e uma parte integrante da estruturapolítica.”256
Com o rei Eduardo VI, a Igreja Anglicana adotou o Livro de
Oração Comum, em 1549, e os 42 Artigos de Religião (depois
mudados para 39 Artigos).257 Em 1595, Richard Hooker escreveu Of
The Laws of Ecclesiastical Polity (Das leis do estabelecimento
Eclesiástico) promovendo uma exposição da estruturação e da
doutrina da Igreja.258
Os protestantes que não estavam vinculados à Igreja do Estado,
eram conhecidos com dissidentes ou não-conformistas (mais tarde
conhecidos como Igrejas Livres).259
Entre 1553-1558,260 a Inglaterra foi governada por Maria Tudor.
Durante esse período, muitas pessoas se exilaram e sofreram
influência do protestantismo em Genebra, Zurique e Frankfort. Após
sua morte, voltaram com um protestantismo mais radical, zeloso e que
255 WALKER, Welliston, Ibidem, p.82.256 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.4-5.257 Ibidem, p.6.258 Ibidem, p.9.259 REILY, Duncan A., Ibidem, p.12.260JONES, D.M.Lloyde. Os Puritanos. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1993, p.254.
XCVIII
tinham a Bíblia como autoridade por excelência superando toda
pretensão da Igreja de ser a intérprete ou ter a sua custódia.
Pelo desejo que tinham de purificar a Igreja passaram a ser
chamados de “puritanos.”
“Queriam banir dos ofícios o que criam ser umremanescente de supertição romanista e desejavampara cada paróquia um pregador zeloso, espiritual. Emparticular, eram contrários às vestes clericais (...)opunham-se ao ajoelhar para receber a Ceia doSenhor, dizendo que tal atitude implicava adoração dapresença física de Cristo; combatiam o uso de aliançasno casamento, tendo-o como continuação do conceitodo matrimônio como um sacramento; fazer o sinal dacruz no batismo, como superstição.”261
A partir do puritanismo e com o apoio de simpatizantes, como
professores da Universidade de Cambridge, as idéias separatistas se
desenvolveram. Um dos líderes do puritanismo foi Thomas Cartwright
(1535 ?-1603).262
Eles e seus companheiros puritanos se opunham à separação
da Igreja oficial da Inglaterra. Queriam introduzir a disciplina e as
práticas puritanas e esperar as reformas do governo. Alguns não
quiseram esperar tal mudança. Eram os separatistas, dentre os quais
se encontravam os adeptos da política congregacional.263
“Os separatistas insistiam em que os ministrosdeviam ser eleitos pela congregação de seus fieis epagos por contribuições voluntárias destes (...).
261 WALKER, Welliston, Ibidem, p.139.262 Ibidem, p.140.263 Ibidem, p.141.
XCIX
Defendiam a tolerância para todas as seitasprotestantes, repelindo a censura eclesiástica e todasas formas de jurisdição eclesiástica, em favor de umadisciplina interna às congregações, sem o aval denenhuma sanção coercitiva (...). O seu programaimplicaria em destruir a Igreja nacional, deixando acada congregação a responsabilidade de seus negóciose havendo apenas um tênue contato entre as diversascongregações (...).” 264
Mais tarde, então, surgiram os chamados, não-conformistas,
dissidentes ou Igrejas-Livres. Estes incluem os Congregacionalistas ou
Independentes, os Batistas e os Presbiterianos, por um lado, com os
Quacres e os Unitários por outro lado.265
Os Puritanos tinham uma forte influência pietista.
“Os puritanos freqüentemente portavam umapreocupação tipicamente calvinista, a promoção dapiedade individual, a qual se tornou, então,característica de muitos não-conformistas.”266
Quem não pertencia à Igreja oficial sofria os efeitos do Código
Clarendon (1661-65)267 e da Lei de Provas (1672)268, cujo objetivo era
264 HILL, Christopher. Ibidem, p.52-3.265 VIDLER, Alec R. A Igreja numa era de revolução. Lisboa: Editora Ulisséia Limitada, 1961, p.137.266 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.17.267 No reinado de Carlos II,na Inglaterra, várias “provisões visavam a por os puritanos fora daIgreja” (WALKER, Welliston, ibidem, p.155). “Pelo Primeiro Ato do Conventículo, de 1664, aspenalidades para quem comparecesse a um ofício não de acordo com o Livro de Oração efreqüentado por cinco ou mais pessoas da mesma família eram: multa, prisão e deportaçãodefinitiva. Pelo ‘Ato das Cinco Milhas’, de 1665, era proibido a quem quer que fosse ‘em ordenssacras ou pretensas ordens sacras’ ou alguém que tenha pregado num ‘conventículo’, e não hajafeito juramento condenando a resistência armada ao rei e assegurado não intentar ‘nenhumaalteração de governo quer na igreja quer no Estado morar num raio de cinco milhas de uma cidadeincorporada ou dentro da mesma distância do lugar onde exercera o ministério. A essas pessoastambém era vedado ser mestre-escola – quase a única ocupação à disposição de um ministrodeposto. Estas e outras deliberações do assim chamado ‘Código Clarendon ’não foram passíveisde estrita tolerância, mas levaram às grandes perseguições aos dissidentes” (Ibidem, p.155).
C
forçar a uniformidade religiosa na Inglaterra. Eram impedidos de
exercerem o poder político e ainda tinham que pagar dízimos para o
sustento do culto anglicano.269
A maior parte dos ingleses vivia, no século XVII, em um mundo
mágico. Para eles, Deus e o demônio intervinham diariamente - um
mundo de feiticeiras, fadas e encantamentos .270
O fato é que durante os anos de 1640 a 1650 surgiram
movimentos sectários, na Inglaterra:
“Alguns deles como os Levellers e os Diggers,formaram seitas tanto religiosas como políticas. Outrosfortemente demonstraram tendências milenáristas(relativo ao milênio), especialmente os Homens daQuinta Monarquia. Ainda outros revelaram inclinaçõesmísticas, tais como os Seekers e os Finders.”271
Dentre as seitas estavam os Ranters, grande parte dos quaiseram artesãos:
“(...) um bom número dos seus partidários foirecrutado entre artesãos itinerantes, que se viramlibertos durante a Revolução das peias quecaracterizavam o sistema de trabalho interior - homensque não tinham amarras e estavam prestes a rompercom a tradição.”272
Os Ranters não formavam, necessariamente, uma congregação
que se reunia para cultos:
268 “Todos os que tinham funções militares ou civis, com poucas exceções, vivendo dentro de trintamilhas de Londres, eram obrigados a tomar a Ceia do Senhor conforme o rito da Igreja daInglaterra ou o perder seus postos” (Ibidem, p.156).269 WALKER, Welliston, Ibidem, p.141.270 HILL, Christopher, Ibidem, p.99.271 WALKER, Welliston, Ibidem, p.160.
CI
“(...) grande população móvel e itinerante depequenos cottagers expulsos de sua terra, algunscamponeses, outros artesãos, que lentamente iamsendo atraídos pelas grandes cidades, onde se sentiamcomo estranhos, dispostos assim (às vezes) a seintegrarem em grupos religiosos que rapidamente seradicalizavam.”273
Para eles, o juízo final era coisa inventada e a vida após a morte
não existia:274
“(...) vinda de Cristo significa a vinda aos homenspor intermédio do seu espírito. Quando ele assimintegrar nos corações dos homens, estes nãoprecisarão mais de socorros tão baixos a elesministrados de fora.”275
Um Ranter, Joseph Salmon, escreveu o folheto Anti-Christ in
Man (O Anti-Cristo no homem), em 1647. Ele afirmava que não
precisamos ir a Roma, Cantuária. A luz natural reside no homem, sob
o nome de Cristo. 276
Salmon foi preso em 1650. Foi solto com a promessa de se
retratar. Foi a Barbados, onde teve dificuldades de organizar uma
congregação Anabatista, em 1682.
272 HILL, Christopher, ibidem, p.204.273 Ibidem.274 Ibidem, p.207.275 Ibidem.276 Ibidem, p.206.
CII
Jacob Baythumley publicou The Light end na Darh Sides of God
(Luzes e trevas em Deus), 1650. Para ele, o inferno e o demônio
estão dentro de nós. Não devíamos guiar–nos pela Bíblia e sim pelo
Espírito de Deus que temos em nós. 277
Em 1650, os Ranters eram conhecidos como coppinistas ou
claxtinianos. Richard Coppin foi pastor anglicano até 1648. Ele
escreveu Divine Teachings (ensinamentos divinos), em 1649. Foi a
obra mais influente junto aos Ranters. Coppin foi celebrado como
sucessor de Joseph Salmon. Em 1655, Coppin foi preso por causa de
suas pregações.278 Ele tratava como alegóricas as histórias da Queda
e do Dia do Juízo. 279
A Lei de 9 de agosto de 1650 contra as blasfêmias visava
especialmente os Ranters. As penas eram severas: seis meses de
reclusão, banimento em caso de reincidência e morte se o banido se
recusasse a deixar o pais ou retornasse clandestinamente.280 Os
blasfemadores foram tratados com rigor pelo Exército e obrigados a
deixarem suas fileiras, como Joseph Salmon.
“Já que os ranters nunca tiveram qualquerorganização, ao que sabemos, é difícil afirmar que fimlevou a massa dos fiéis depois que foram detidos seuslíderes, em 1650 e 1651.”281
277 Ibidem, p.219.278 Ibidem.279 Ibidem, p.220.280 Ibidem, p.208.281 Ibidem, p. 225.
CIII
Uma outra seita chamava-se Anabatista ou ainda Familistas ou
Membros da Família do Amor. O familismo foi difundido na Inglaterra
graças a um marceneiro itinerante de origem holandesa – Christopher
Vittels.
“A principal doutrina anabatista era que as criançasnão deviam ser batizadas. A aceitação do batismo - istoé, a recepção na Igreja – tinha de ser o ato voluntáriode um adulto. Isso claramente subvertia o conceito deuma Igreja Nacional, à qual todo inglês, toda inglesapertencia; ao invés desta, propunha a formação decongregações voluntárias por aqueles que acreditavamser os eleitos. Logicamente, um anabatista tinha deobjetar ao pagamento de dízimos, os dez por cento dosganhos de cada um que, pelos menos teoricamente,serviam para sustentar os ministros da Igreja estatal.Muitos anabatistas recusavam-se também a prestarjuramentos, pois não admitiam que uma cerimôniareligiosa servisse para finalidades judiciais e seculares;outros rejeitavam a guerra e o serviço militar (...). Onome veio a ser usado num sentido pejorativo genérico,para referir-se àqueles que, creditava-se, opunham-se`ordem social e política vigente.”282
Os familistas ou membros da Família do Amor eram seguidores
de Henry Niclaes, nascido em Munster, em 1502, que pregou que o
céu e o inferno haviam de se encontrar nesse mundo.
“Acreditavam que os homens e mulherespudessem resgatar, na terra, o estado de inocência queexistia antes da Queda (...). Punham em comum assuas propriedades, pensavam que todas as coisas seproduziam segundo a natureza, e que só o espírito deDeus, presente no fiel, pode compreender corretamenteas Escrituras.”283
282 Ibidem, p. 43-4.283 Ibidem, p.44.
CIV
Existiram ainda outras seitas, como a dos grindletonianos. Foi a
única seita inglesa que deve o seu nome a um lugar e não a uma
pessoa ou a um conjunto de crenças (...).284
A congregação de fiéis desenvolveu diversas heresias. Entre
elas, afirmavam:
“(1) Devemos confiar mais num ímpeto que nosvenha do espirito do que no próprio Verbo; (2) é pecadocrer no Verbo (...) faltando um ímpeto do espírito(3) ofilho de Deus afetado pelo poder da graça desempenhatão perfeitamente cada um dos seus deveres, que seriapecado ele pedir perdão por qualquer falta quecometesse, tanto quanto à forma como quanto ao fundo(...).”285
Mas de todos esses movimentos um dos mais notáveis produtos
das guerras civis na Inglaterra foi os Quacres, chamados também de
Sociedade dos Amigos. 286
Seu fundador foi Jorge Fox (1624-1691), que procurava
ansiosamente a realidade espiritual, o que aconteceu em 1646.
“Daí lhe veio a firme convicção de que toda criaturarecebe do Senhor uma porção de luz e que se esta ´LuzInterior´é seguida, ela seguramente leva à Luz da Vidae à verdade espiritual.”287
Contrário ao formalismo, sua crença se baseava na imediata
inspiração do Espírito Santo. Os elementos externos eram
284 Ibidem, p.94.285 Ibidem, p.95.286 WALKER, Welliston, Ibidem, p.160.287 HILL, Christopher, Ibidem, p.95.
CV
condenados. Os sacramentos são verdades interiores e espirituais. Os
títulos artificiais, como Rei, Juiz deviam ser rejeitados. A guerra é
ilícita e a escravidão incompatível.288
Eles viviam em extrema vigilância do comportamento dos
membros. Os Quacres foram perseguidos, mas o Ato de Tolerância,
em 1689, lhes deu liberdade. Fox morreu em 1691. 289
Grande importância também tiveram as Sociedades no
desenvolvimento da religiosidade na Inglaterra.
As sociedades adquiriram grande importância na Inglaterra, no
século XVII. Elas procuravam preencher o vazio espiritual do povo
inglês. Em certo sentido, elas se pareciam aos collegia pietatis de
Spener. Eram compostas, especialmente, por participantes da Igreja
oficial.
“Iniciadas por Anthony Horneck, na década de1670, as sociedades religiosas eram também formadasde pequenos grupos de leigos, que representavam umafusão quase espontânea de moralismo e devoção,zelosos de promoverem a real santidade (...).”290
As sociedades tinham a função de promover a verdadeira
santidade, mas também promoviam algumas causas de caridade,
combatendo a pobreza e o analfabetismo, por exemplo.291
288 WALKER, Welliston, Ibidem, p.160-1.289 Ibidem.290 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.21291 Ibidem, p.23.
CVI
Acreditavam que a solução para a mudança da sociedade era a
mudança individual de cada pessoa. Por essa razão promoviam o
esforço individual de uma vida de piedade.292 Não tinham preocupação
com a evangelização e crescimento.
Mais tarde, surgiram outros grupos, como a Sociedade para a
Reforma de Costumes, em 1691.
“Preocupada com a moralidade da vizinhança, estasociedade foi designada para encorajar e ajudar osmagistrados a executarem seus deveres nocumprimento das leis a respeito de ofensas morais,especialmente ´profanação e devassidão.”293
Outra sociedade surgiu - A SPCK (Sociedade para a Propagação
do Evangelho). Esta sociedade procurou atacar o que considerou a
raiz do problema: a ignorância. A SPCK procurou desenvolver canais
para a educação do povo.
“O programa da SPCK consistia principalmente emestimular o estabelecimento de escolas de caridadepara ensinar os pobres, promovendo a disseminação debibliotecas de empréstimo e visitando os presos paradar-lhes instrução e livros, além de prestar-lhesassistência religiosa.”294
Os sermões eram, geralmente, sobre as virtudes morais.
Segundo o historiador Mateo Lelièvre, a Inglaterra apresentava um
aspecto sombrio em sua religiosidade. Ele cita Montesquieu:
292 Ibidem.293 Ibidem, p.24.294 Ibidem., p.24.
CVII
“Não ha religião na Inglaterra; quatro ou cincomembros da Câmara dos Comuns freqüentam a missaou o culto oficial. Se por ventura alguém falar em Deus,todos riem.”295
Alec Vidler afirma que a Igreja Anglicana era quase sem
expressão na vida do povo:
“Conservadora sem ser teológica. Pensava-sepouco em problemas doutrinários. A religião, como seensinava na Igreja Anglicana, significava obediênciamoral ao desejo de Deus.”296
Havia homens sábios e talentosos na Igreja Anglicana, no
século XVIII, como os teólogos Guilherme Sherlock, Daniel Waterland,
o bispo Butler e o cônego Prideaux, mas seus sermões eram meras
dissertações sobre assuntos morais, que eram lidos em tons frívolos e
superficiais.297
2.4. Wesley no contexto social-político-religioso da Inglaterra
Dentro desse contexto social, político e religioso nasceu e viveu
Wesley. A questão é: até que ponto João Wesley foi um produto
desse meio questionador ?
O fato é que muito do que o metodismo praticou foi incorporado
ou adaptado por Wesley, como as Sociedades. Os próprios
antepassados de João Wesley foram influenciados pelas Sociedades,
295“Notes Su L' Anglaterre” (Monstesquieu apub Lelièvre, 1997, p.11).296 VIDLER, Alec R. Ibidem, p.36.297 LILIÈVRE, Mateo. João Wesley – Sua vida e obra. São Paulo: Editora Vida, 1997, p.16.
CVIII
especialmente pela SPCK (Sociedade para a Propagação do
Evangelho) e ele próprio ganhou livros quando foi como missionário
para a Geórgia.
“Em 1700, Samuel Wesley tentou organizar umapequena sociedade religiosa em Epworth, construídanos moldes das sociedades de Londres. Livros epanfletos foram pedidos a SPCK.”298
Os metodistas, posteriormente, deram grande ênfase à
educação dos pobres, apoio aos presos, evangelização, ênfase na
santidade, etc, fruto das influências das sociedades da época.
O próprio pai de Wesley tinha no projeto da sociedade de
Epworth a criação de escolas para os pobres, distribuição de folhetos
visando a edificação pessoal, etc.299
Wesley tinha consciência sobre o valor das sociedadesmetodista. Falava delas até num tom de supremacia:
“(...) não há sociedade religiosa nenhuma debaixodo céu, que não exige dos homens para seremadmitidos nela, senão o desejo de salvar as suasalmas. Olhai ao vosso redor, não podeis ser admitidosna Igreja ou Sociedade dos Presbiterianos, Anabatistas,se não aceitardes as mesmas opiniões deles, e vosconformardes com a mesma adoração. Só osMetodistas é que não insistem em que tenhais asmesmas opiniões, mas pensam e deixam pensar. Nemimpõem qualquer modo de adoração (...).”300
298 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem p.27.299 Ibidem, p.29.300 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, op. cit, p.210.
CIX
As sociedades, posteriormente, foram importantes na formação e
desenvolvimento do metodismo. Foi numa sociedade que Wesley teve
sua experiência no dia 24 de maio de 1738.
“A participação nas sociedades era aberta a todosquantos desejassem fugir da ira vindoura. A Sociedadereunia-se semanalmente, sendo que a oração, aexortação, e o cuidado mútuo eram os principaiscomponentes da vida comum. O alvo principal eraauxiliarem-se mutuamente a alcançar a sua própriasalvação.”301
Em 1743, Wesley criou as Regras Gerais das Sociedades
Unidas302 para controlar as atividades das sociedades. A escolha da
sociedade para o movimento metodista foi acertada.
“Em 1768, o Metodismo possuía quarenta circuitose 27.341 membros. Dez anos mais tarde, havia crescidopara sessenta circuitos e 40.089 membros. Em 1798, oMetodismo tinha 149 circuitos com 101.712membros.”303
Quando Wesley iniciou seu ministério, as tendências no
pensamento e na vida religiosa na Inglaterra, no início do XVIII, eram
preocupantes, segundo o historiador Walker Welliston:
301 HARPER, Steve, Ibidem, p.66.302 O motivo para Wesley organizar as sociedades era que os convertidos precisam ganharalimento imediato. Para ele, a pregação não poderia produzir espiritualidade madura e muitos seperdiam ou ficavam adormecidos. (Ibidem, p.64-65). Steve Harper cita livro de Samuel Emerick –Spiritual Renewal for Methodism (Nashville:Methodist Evangelistic Material, 1958), p.2 – ondeWesley diz: “Eu estava convencido do que nunca, de que pregar como um apóstolo, sem ajuntaros que são despertados, e sem treiná-los os caminhos de Deus, era como conceber filhos para oassassino. Quanta pregação não têm havido todos estes vinte anos através de Pembrokeshire!Mas nenhuma sociedade regular, nenhuma disciplina, nenhuma ordem ou conexão; e o resultado éque nove em cada dez despertos estão agora mais adormecidos do que nunca” (HARPER, Steve,Ibidem, p.65).303 Ibidem.p.65.
CX
“O racionalismo penetra todas as classes depensadores religiosos, de modo que mesmo entre osortodoxos o cristianismo se assemelhava mais a umsistema de moralidade apoiado por sanções divinas.”304
Em relação à política, Wesley foi conservador, fiel ao Rei. Na
tentativa de restauração da dinastia Stuart305, houve um episódio
envolvendo os irmãos Wesley. Rumores indicavam uma ligação deles
com o pretendente à coroa, o Príncipe Charles, o Belo, que estava na
França. Eram suspeitos de serem Jacobitas,306 partidários de Stuart.
304 WALKER, Welliston, Ibidem, p.203.305 Segundo Heitzenhater, “a restauração da monarquia sob Charles II (convidado a voltar para otrono pelo próprio Parlamento) significava o restabelecimento também da Igreja. A monarquia dosStuart, considerando-se autorizada por ‘direito divino’, seguiu o ritual tradicional de auto-autorização através de uma série de atos do Parlamento (..) (HEITZENHATER, Richard P., ibidemp.13). Charles I havia sido executado “diante de uma multidão ávida por vingança, Charles foi aoencontro da morte com tal graça e dignidade que, dez anos depois, após uma década semmonarquia e sem uma Igreja estabelecida, mesmo as forças revolucionárias que formavam oParlamento reconheceram que a Inglaterra estaria melhor com a antiga forma degoverno do quenascondições precárias, tanto políticas, como religiosas, que Oliver Cromwell havia tentato dirigir(..) ( Ibidem, p.13). “A execução de Charles I, em 1649, chamada, nos livros de orações posteriroesde ‘o Martírio do abençoado Rei Charles o Primeiro’, cuja dignidade e conduta real naquelaocasião ajudou, mais tarde, a reforçar a perspectiva de direito divino dos defensores dos Stuart”(Ïbidem, p.14).306 A expressão Jacobitas vem de Henry Jacob (1553-1625). Ele foi pastor em Oxford, depois foipara a Holanda. Em 1600 foi pastor de uma igreja composta de exilados ingleses. Em 1604,escreveu Razões extraídas da Palavra de Deus e dos melhores testemunhos humanos queprovam a necessidade de reformar a nossa Inglaterra . Em 1610, publicou Divino Princípio e aInstituição da Verdadeira, Visível e Ministerial Igreja de Cristo. Em 1611, Jacob publicou outro livroonde afirma que ´o governo da Igreja sempre deve ser com o consentimento do povo´ (JONES,D.M.Lloyd, Os Puritanos, Ibidem, p.159-180). Juntamente com outros teólogos “formularam osprincípios da posição independente ou congregacional não separatista, da qual proveio o modernocongregacionalismo. Empenhados em evitar a separação da Igreja da Inglaterra, trabalharam afavor de um sistema nacional de igrejas congregacionais estabelecidas” (WALKER, Welliston,Ibidem, p.146). Henry fundou uma igreja em Southwark, 1616, a primeira congregacional que aindaexiste Ibid., p.146). Os partidários de James, que fugiu para a frança onde esperava aoportunidade de voltar ao trono inglês, passaram a ser chamados de ”Jacobitas”. Depois de 1688,“os atos parlamentares tradicionais, se seguiam depois de uma sucessão real, forçaram osseguidores da linha dos Stuart a uma decisão difícil. Os bispo e outros líderes da Igreja queapoiavam James (e que foram chamados de ‘Jacobitas’), mas que deviam assinar um voto defidelidade ao novo monarca, de acordo com o Ato de Supremacia, tiveram que escolher entre suaconsciência e seu benefício eclesiástico. Aqueles que foram incapazes de assinar foram chamadosde ‘não-jurados’ (nonjurors) e perderam suas posições na Igreja e no governo. Em geral, os não-jurados representavam o maior segmento de oposição à monarquia de William e Mary(HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.16)”.
CXI
E isso significava ser perseguido e agredido violentamente por parte
do povo.307
Segundo Glen Williamson, Susana Wesley era uma jacobita.
Provavelmente, esse fato levava Wesley a ser identificado como
partidário dos Stuarts:
“Susana, cujas simpatias sempre se voltaram paraos Stuarts, suplantados por Guilherme e sua rainha em1688, era uma jacobita confirmada. Para ela, o princípede Orange era um usurpador da coroa.” 308
Carlos Wesley foi acusado de orar para que o Senhor trouxesse
de volta o Príncipe banido. Ele foi inocentado pela justiça e aproveitou
para demonstrar sua lealdade à coroa. 309
“Wesley achou melhor escrever ao rei, em nomedos metodistas, uma mensagem de lealdade (...).”310
Quando o príncipe Charles invadiu a Escócia, em 1745, Wesley
foi para Newcastle para ficar junto ao seu povo.
“(...) Em contato com o prefeito e afirmou seu lealapoio, declarando com clareza: 'Eu exorto todos os queme ouvem a fazerem o mesmo, e em suas diversassituações a se manifestarem como súditos leais que,enquanto temerem a Deus, não poderão honrar senão aorei.”311
307 JOY, James Richard, Ibidem, p.95.308 WILLIAMSON, Glen. Susana. Miami, EUA: Editora Vida, 1988, p.144.309 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.151.310 Ibidem.311 Ibidem, p.161.
CXII
Samuel e Susana Wesley, pais de João e Carlos Wesley, foram
leais à coroa inglesa, portanto, apoiavam o partido Tory. Wesley
seguiu aos seus pais,312 embora a sua consciência social o levasse à
atitudes contrárias ao partido Tory em relação à liberdade religiosa, à
guerra, ao contrabando, à escravidão, à produção e comércio de
bebidas.313
Apesar de citar o metodismo como um grupo religioso que serviu
de base para o surgimento de sentimentos de esperança e de
solidariedade entre os operários, Edward Thompson coloca Wesley
como muito conservador em questões políticas:
“A certo nível, pode-se reconhecer sem a menordificuldade o caráter reacionário – na verdade,odiosamente subserviente – do wesleyanismo oficial.As poucas intervenções políticas ativas de Wesleyincluíram panfletos contra o dr. Price e os colonosamericanos. Raramente deixou passar a oportunidadede impor a seus seguidores as doutrinas de submissão(...).”314
Contudo, Wesley foi sensível às necessidades dos excluídos e
questionador da situação social do povo. Em 1759, ele comentou
sobre a difícil situação dos presos que estavam em Knowle:
“Andei a pé até Knowle, boa milha distante deBristol, para visitar os prisioneiros franceses. Mais de mile cem, segundo fomos avisados, estavam reunidos numpequeno espaço, sem cousa alguma em que deitar,senão colchões de palha, e sem cobertores; para secobrirem só tinham alguns trapos, quer de dia quer denoite, portanto, morreram como se fossem ovelhas
312 Ibidem.313 Ibidem, p.37.314 THOMPSON, Edward P, 1v. ibidem, p.42.
CXIII
atacadas de morrinha. Fiquei horrorizado; à tarde pregueisobre Êxodo 23:9 ´Não oprimirás o peregrino; pois vósconheceis o coração do peregrino, visto que fostesperegrinos na terra do Egito.” 315
Em seu tempo, aumentaram as injustiças sociais e o
desemprego. Em seu diário, João Wesley comenta, em 1772, sobre
um grande desemprego como nunca se tinha visto antes:
“Descobrindo que muita gente estava sememprego, e conseqüentemente em necessidades, porcausa de uma crise no comércio, crise tão grande comonunca houvera igual lembrança do homem (...).”316
Mesmo tendo sofrido com os motins, quando foi perseguido por
questões religiosas,317 Wesley elogiou a ação de uma turba por agir
sem violência, em James Town:
“(...) estivera em atividade durante todo o dia; massua preocupação era apenas com os açambarcadoresdo mercado, que tinham comprado trigo em toda parte,para matar de fome os pobres e carregar um navioholandês, que estava no cais; mas a turba trouxe-o todode volta para o mercado e vendeu-o pelos comerciantesao preço comum. E isso fizeram com toda calma ecompostura imagináveis, sem atacar nem ferirninguém.”318
A aceitação das mensagens de Wesley e de seus companheiros,
especialmente pela classe mais pobre, se deu porque elas atingiram
suas necessidades:
315 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.108-9.316 Ibidem, p.110.317Os motins contra Wesley e os metodistas foram, muitas vezes, incentivados por párocos.Contudo, em 1789, quando João Wesley voltou a Talmouth, depois de quarenta anos, aondechegou a ser preso por um motim imenso, agora todos olhavam para ele com amor e bondade(Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.56-63).
CXIV
“Foi esta combinação de piedade e misericórdiaque deu à espiritualidade wesleyana a sua vitalidade eministério. Essa combinação impediu que asSociedades Unidas se tornassem introvertidas e auto-suficientes. Wesley fez do mundo a sua paróquia edesejava que os seus seguidores fizessem omesmo.”319
Steve Harper, por isso, define a espiritualidade wesleyana como
espiritualidade social.320 Ela surgiu da ênfase de Wesley nos Atos de
Piedade e Obras de Misericórdia.
3- PERFIL BIOGRÁFICO DE JOÃO WESLEY
318 THOMPSON, Edward P, 1 v. Ibidem, p.67.319 HARPER,Steve, Ibidem, p.78.320 Ibidem, p.79
CXV
“Dos meus dez anos para treze ou catorze tivepouco para comer, mui pouco além de pão e água” . 321
João Wesley
Dentro desta tese a importância de João Wesley é fundamental,
pois foi ele o organizador do metodismo, na Inglaterra, no século XVIII.
Por isso a necessidade de conhecer sua origem, formação e o que o
moveu a participar de um movimento que incomodou a Igreja
Anglicana, teve sérias controvérsias com o calvinismo, participou na
formação da classe operária inglesa e foi ele o líder máximo de um
movimento espiritual, que é visto hoje por diversas pessoas como
paradigma para os avivamentos contemporâneos.
Vamos, por isso, conhecer a sua origem, formação, crises e
desenvolvimento, dentro dos anos turbulentos da Revolução Industrial
e Religiosa na Inglaterra, quando surgiram diversos movimentos,
inclusive o metodismo liderado por João Wesley.
3.1. Seu ambiente familiar
João Wesley nasceu no dia 17 de julho de 1703 e era filho de
Susana e Samuel Wesley, pastor da Igreja Anglicana.
CXVI
“Os pais dos irmãos Wesley322 eram descendentesde não-conformistas, Seus avós estavam entre osclérigos expulsos em 1662. O pai, Samuel Wesley(1662-1735), preferira o ministério da Igrejaestabelecida e fora, desde 1696 até a morte, pároco daigreja campesina de Epworth. Homem de sinceratendência religiosa, no entanto era pouco prático.Escreveu a Vida de Cristo em verso e um comentárioao livro de Jó. A mãe, Suzana Annesley, era mulher denotável fortaleza de caráter, sendo, como seu marido,anglicana devota. Os filhos tinham muito dos pais, maistalvez da força materna. Num lar de dezenove filhos,dos quais oito morreram na infância, a regra era dotrabalho duro e de estrita economia.”323
Susana Wesley é citada por alguns historiadores, entre eles,
Duncan Alexander Reily, como a "mãe do Metodismo",324 pois através
dos seus métodos disciplinou os seus filhos e filhas e sua atuação
junto à Wesley foi determinante em sua vida espiritual.
Susana marcou profundamente a vida de seus filhos. Ela tinha
consciência de sua responsabilidade. Muitas vezes, teve que tomar
decisão sozinha pela ausência de seu esposo, Samuel Wesley.
Em carta escrita a seu esposo, em 6 de fevereiro de 1711,
Susana comenta sobre sua função e responsabilidade:
“Como sou mulher, assim também sou dona denumerosa família; e ainda que a maiorresponsabilidade, pelas almas deste lar, cai sobre você,contudo, na sua ausência não deixo de considerar cadaalma que você deixa aqui sob meu cuidado, como umtalento entregue a mim, pelo grande Senhor de todas asfamílias, tanto no céu como na terra; e se eu for infiel a
321 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.168-9.322Os irmãos Wesley aqui citados se referem a João e Carlos Wesley por serem líderes domovimento metodista, na Inglaterra, no século XVIII.323 WALKER, Welliston, ibidem, p.205.324 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.49.
CXVII
Deus ou a você, pela negligência de melhorar estestalentos, como posso eu responder a Ele, quando Eleexigir contas da minha mordomia?”325
Wesley um dia solicitou a sua mãe que lhe escrevesse sobre as
principais regras que ela usou na educação familiar. Susana lhe
respondeu, em 24 de julho de 1732, dizendo que ele poderia dispor
das regras, se as julgasse proveitosas.326 Entre as diversas regras
utilizadas por Susana Wesley com os filhos e filhas, estão:
“As crianças tinham de conformar-se a certométodo de viver, em certas coisas compreensíveis,desde o nascimento; tais como, vestir, despir, mudançade fralda, etc.”327
“Quando chegavam à idade de um ano (e algumasantes dito), eram ensinadas a temer a vara, e a chorarbrandamente.”328
“Uma vez crescidas e mais fortes, eram limitadas atrês refeições do dia.”329
“Às dezoito horas, logo que terminasse o cultodoméstico, jantavam; às dezenove horas a empregadadava banho nelas; e, começando com a mais nova, elamudava a roupa delas e preparava todas para a camaàs vinte horas.”330
“A fim de formar a mente das crianças, a primeiracoisa que fazer é vencer-lhes a vontade, e traze-las aoponto de obedecer.”331
325 WESLEY, João, Ibidem, p.222.326 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.225.327 Ibidem.328 Ibidem, p.226.329 Ibidem.330 Ibidem, p.227.331 Ibidem.
CXVIII
“`As crianças do nosso lar, logo que podiam falar,era ensinado o ´Pai Nosso´ , que tinham de repetir nahora de deitar e levantar.”332
“Muito cedo na sua vida, meus filhos aprenderamdistinguir ente o domingo e os outros dias dasemana.”333
“Logo aprenderam que não seriam atendidas segritassem por alguma coisa, e tinham que falar comdelicadeza quando pediam alguma coisa.”334
“Não se ensinava a ler antes dos cinco anos deidade, mas a Kezzy, por exceção se tentou maiscedo.”335
“Sair do lugar, ou sair da sala não lhes erapermitido, sem boa razão; correr no jardim ou na rua,sem permissão, era considerado falta grave.”336
“Que nenhuma menina seria ensinada a trabalharantes de aprender a ler bem.”337
Até os quatro anos de idade, Wesley conviveu apenas com umas
quatro ou cinco irmãs, pois somente depois nasceria Carlos Wesley.338
Quando era pequeno, aos cinco anos de idade, Wesley foi salvo
de um incêndio, em 9 de fevereiro de 1709, e ficou conhecido como
"tição tirado do fogo.”339 A infância de Wesley teve momentos
difíceis com algumas perdas:
332 Ibidem, p.229.333 Ibidem.334 Ibidem.335 Ibidem, p.230.336 Ibidem, p.231.337 Ibidem, p.234.338 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.26.339 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.28.
CXIX
“Mais de uma vez, a pobreza instalou-se tal qualuma hóspede importuna naquele lar. Seu pai morreuendividado, a despeito dos prodígios econômicosrealizados por sua digna esposa. A morte visitou aquelafamília com freqüência, deixando lembrançasdolorosas. A casa pastoral foi atingida duas vezes porum incêndio criminos”o.340
Quando tinha nove anos de idade, Wesley teve varíola. Ele
suportou os sofrimentos com paciência, o que levou sua mãe a
escrever ao marido, que estava em Londres, e dizer:
“João tem agüentado sua enfermidade como umhomem e um verdadeiro cristão, sem proferir uma únicaqueixa.”341
3.2. Sua formação escolar
Por volta de 1770, Samuel e Susana Wesley enviaram seus filhos
para receberem uma educação mais formal em escolas excelentes.
Samuel e Carlos foram para Westminster e João Wesley para
Charterhouse.
Wesley comentou, mais tarde, sobre suas dificuldades na escola
longe de casa:
“Dos meus dez anos para treze ou catorze tivepouco para comer, mui pouco além de pão e água.”342
340 Ibidem, p.27.341 Ibidem, p.29.342 Ibidem, p.168-9.
CXX
Essa fase aconteceu, no período em que ele estudava fora de
casa, entre 1714-1719. Foi graças ao pedido do seu pai e ao
patrocínio do Duque de Buckingham,343 então Lord Chumberlain da
casa real, que Wesley pôde ingressar como aluno interno em
Charterhouse, Londres, em 28 de janeiro de 1714.344
“Essa escola fundada em 1611 por Thomas Sutton,ocupava edifícios antigos que formavam parte de umantigo mosteiro e acomodava cerca de 100 rapazes. Osalunos mais jovens eram brutal e tiranicamentemaltratado pelos mais adiantados e forçado a fazer todaa sorte de trabalhos manuais e serviçoshumilhantes.”345
Uma carta de seu irmão Samuel, professor na Escola
Westminister, aos pais revela como João Wesley se portava:
“(...) João é rapaz corajoso, e aprende o hebraicotão depressa como pode.”346
Em 1720, João Wesley foi para a Universidade, em Oxford,
graças, mais uma vez, a uma bolsa concedida, agora, pela escola:
“Anualmente, a escola de Charterhouse enviavaquatro de seus melhores estudantes para aUniversidade com uma bolsa de quarenta libras,equivalente a 800 dólares.”347
343 Historiadores como Duncan Reily, José Gonçalves Salvador, Richard Heitzanhater, JamesRichard Joy e teólogos como Sante Uberto Barbieri não comentam sobre este apoio financeiro aosestudos de Wesley.344 JOY, James Richard, Ibidem, p.31.345 Ibidem, p. 42.346 Ibidem.347 Ibidem, p.45-6.
CXXI
Wesley estudava no Christ Church College, um dos melhores
estabelecimentos de cultura superior em todos os internatos que
formavam a Universidade de Oxford.348
Uma homenagem da escola a Wesley, em 1722, revela como ele
era visto pela comunidade estudantil:
“Era um dos de nossa companhiaWesley, João Wesley.Qual profeta incansável, longos anos,Intimorato sempre, e sem canseiras,Trabalhando passou, com alegria,Servindo a Deus com fé, sem desenganos,Em múltiplas carreiras.”349
Um companheiro da escola assim descreveu Wesley:
“(...) sensato e perspicaz, um jovem do maisapurado gosto pelos estudos clássicos e imbuído dossentimentos mais nobres e liberais.”350
A carreira de Wesley prosseguia brilhante. Em 1724, João Wesley
se formou bacharel; no ano seguinte, foi ordenado diácono da Igreja
Anglicana.351
Em março de 1726, recebeu sua toga de honra, do “Lincoln
College”, da Universidade de Oxford. Esse título de “Fellow”, além do
valor honorífico, dava-lhe uma posição de independência.352
348 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 32.349 JOY, James Richard., Ibidem, p.45.350 Ibidem, p.31.351 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 21, 31-7.352 Ibidem, p. 35.
CXXII
“A Universidade de Oxford, no início do séculodezoito, refletia muito dos problemas que caracterizama sociedade inglesa como um todo. Embora umobservador contemporâneo sentisse que Oxford fosse´um lugar de boas maneiras, assim como deaprendizagem.”353
Como ponto fraco, havia uma lassidão nas atividades acadêmicas
e espirituais dentro da Universidade.354
“Voltando a Oxford, em setembro de 1726, Wesleyrecebeu novas distinções acadêmicas. Foi reconhecidocomo literato de excelente gosto, muito versado nasliteraturas antigas e de suma habilidade nos debatesfilosóficos. Em novembro do mesmo ano seussuperiores demonstraram confiança nele, ao chamá-lopara ocupar a cátedra de literatura grega e presidir osdebates políticos dos estudantes.”355
Neste mesmo ano, aos 23 anos, Wesley recebeu o grau de
mestre em artes ou humanidades, depois de apresentar três teses em
latim.356
Entre os anos de 1727–1729, Wesley atuou como coadjutor de
seu pai. Foi ordenado presbítero no dia 22 de setembro de 1728.357
Carlos, em 1729, deu início a algumas atividades religiosas com
alguns colegas da Universidade de Oxford, cujo grupo seria conhecido
depois como Clube Santo e metodistas.358
353 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.31.354 Ibidem.355 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 35.356 Ibidem, p.36.357 WALKER, Welliston., Ibidem, 206.358 HEITZENHATER, Richard, p. 41.
CXXIII
“A palavra de Carlos, em maio de 1729, de quehavia convencido um colega a se juntar a ele numestudo sério e a freqüentar semanalmente a Igreja,encorajou João a visitar Oxford, onde ele chegou no diade seu aniversário, 17 de junho. Durante os dois mesesseguintes, João, Carlos, o amigo de Carlos, WilliamMorgan (e ocasionalmente seu velho amigo BobKirkham), animavam um ao outro em suas atividadesacadêmicas e religiosas, reunindo-se ocasionalmentepara o estudo e indo à igreja todas as semanas. Odiário de João mostra que essas reuniões entre amigos,durante essas dez semanas que ele passou em Oxfordno verão de 1729, não eram regulares; mas assementes de um modelo organizacional começaram agerminar durante esse período.”359
O começo formal das atividades regulares do Clube Santo foi no
fim do inverno de 1929/30, quando Bob Kirklam deixou sua
sociedade e começou a encontrar-se com Wesley e Morgan
regularmente.360
Em 1729, Wesley se tornou o líder do “Clube Santo”, organizado
por Carlos Wesley, Robert Kirlham e William Morgan.361 O grupo
ampliou sua visão e atividades passando a visitar aos presos. Seus
estudos e vida regrada levaram os estudantes a chamá-los de
metodistas. Estavam, porém, longe ainda do que viria a ser o
metodismo.362
3.3. Sua vida missionária e o contato com os moravianos
“Fui à América para converter índios, porém, oh!Quem me converterá?”
359 Ibidem, p.38.360 Ibidem, p.39.361 Ibidem, p.38.362 Ibidem.
CXXIV
João Wesley
Geórgia foi fundada no dia nove de junho de 1732 quando o rei
Jorge II concedeu uma Carta Constitucional para a fundação da nova
colônia norte-americana. Esse território deve a sua fundação a
Oglethorpe, que havia sido ajudante-militar do príncipe Eugênio.363
“Naquela colônia nascente faltavam pastores quenão somente pregassem aos colonos, como tambémestivessem prontos para evangelizar os índios e osescravos negros. Oglethorpe anelava tanto por issoque, tendo ouvido Wesley pregar, rogou-lhe que seencarregasse dessa missão.”364
João Wesley foi encaminhado à Geórgia como missionário
voluntário, sem pagamento ou uma nomeação especifica.365 Partiram
no dia 14 de outubro de 1735366 e em 6 de fevereiro de 1736 os irmãos
Wesley chegaram à Geórgia como missionários. Essa viagem teve
grande influência sobre a sua vida, pois teve a oportunidade de
encontrar-se com os morávios que tiveram grande influência sobre sua
vida.
“Um de seus bispos, David Nitshemann,acompanhava-os; era um ancião de 70 anos de idade eamável, embora fosse muito reservado. Wesley e seuscompanheiros começaram imediatamente uma amizadecom aqueles excelentes cristãos, que lhes
363 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.51.364 Ibidem, p.57.365A motivação básica de Wesley era a busca de sua salvação (REILY, DuncanAlexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.85).366 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.52.
CXXV
evidenciaram um tipo de cristianismo superior àqueleque tinham conhecido até então.”367
A travessia foi longa e com tempestades. A angústia tomava
conta de todos, inclusive de Wesley, que temeu a morte. Somente os
moravianos tinham atitude tranqüila e serena. O que mais
surpreendeu Wesley foi a atitude deles em face da morte, quando
ondas gigantescas vieram sobre o navio. Somente os morávios
permaneceram calmos e continuaram a cantar um hino.368 E quando
ele perguntou aos morávios, se eles não estavam espantados:
“‘Não, senhor,’ respondeu o morávio comsingeleza, ‘nossas mulheres e crianças não temem amorte’. Wesley passou a entender que ainda não tinhaa fé suficiente como a deles.”369
João e Carlos Wesley desejavam evangelizar os índios e
acreditavam que esse trabalho iria auxilia-los no progresso
espiritual.370
Duncan Alexander Reily argumenta que há evidências de que eles
desejavam mesmo buscar a salvação de suas almas.371 Eles
consideravam que poderiam se tornar melhores cristãos participando
na evangelização dos índios. 372
367 Idem, p.53.368 Ibidem, p.54.369 Ibidem.370 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.85.371 Ibidem.372 Ibidem.
CXXVI
Em maio de 1736, Wesley fundou em Savannah uma pequena
sociedade para cultivo da vida religiosa.
“Wesley procurou agrupar as almas piedosas queencontrava (da mesma maneira que fazia em Oxford),em pequenas sociedades, as quais deviam reunir-seuma ou duas vezes por semana, a fim de seexaminarem, instruírem e exortarem mutuamente.Essas reuniões, que mais tarde desempenharam umpapel tão importante na organização do Metodismo,surgiram das necessidades de sua obra missionária.”373
Mas nem tudo correu bem para os Wesley. Ambos acabaram
voltando frustrados para a Inglaterra.
3.4. Sua vida sentimental
Carlos Wesley voltou logo à Inglaterra, em 1736, desgostoso e
doente. O término do relacionamento sentimental de João Wesley com
Sophy Hopkey e o casamento apressado dela com Williamson foi
desastroso para a vida do homem e pároco João Wesley.374
A descoberta de que ela tinha um comportamento secreto duplo e
a sua falta de penitência, levou Wesley a excluí-la da comunhão. Isso
foi considerado uma afronta por William Williamson, marido de Sophy,
373 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.57.374 Wesley não teve sorte na vida sentimental. Mais tarde, ele se casaria e seu casamentoseria um desastre acabando cedo, apesar dele ter acreditado o contrário, por isso disse:“Tendo recebido resposta clara do Sr. Perronet, fiquei convencido de que devia casar. Pormuitos anos fiquei solteiro, julgando que podia ser mais útil como solteiro do que comocasado. E louvo a Deus que me ajudou a viver assim. Agora estou plenamenteconvencido de qu%, nas minhas circunstâncias atuais, poderei ser mais útil no estado decasado. Sob esta convicção clara e pelo conselho de amigos, casei-me, há poucos dias“(WESLEY, João. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem, p.212).
CXXVII
que fez uma série de acusações ao grande júri de Savannah contra
Wesley.375
Thomas Causton, tutor de Sophy e magistrado-chefe formou um
júri e indiciou Wesley em dez acusações. Para ele, Wesley era um
mau caráter:
“(...) um hipócrita malicioso, um sedutor, um traidorde minha confiança, um egrégio mentiroso edissimulador, empenhado em afastar de mulherescasadas as afeições por seus maridos, um beberrão, oproprietário de um bordel, admitindo prostituas (...).”376
Wesley deixou secretamente a colônia, em dezembro de 1737,
com amargura e desapontamento, antes que qualquer julgamento
fosse realizado.377
Alguns historiadores acham difícil entender como Wesley teve
tanta inabilidade para desenvolver um relacionamento duradouro com
uma mulher.378 Richard Heitzenhater acredita que o fato de Wesley ter
vivido até os quatro anos de idade, ou seja seus primeiros anos de
vida, somente com suas irmãs, pois só havia ainda ele de menino em
casa, ajudou Wesley, mais tarde, a ter uma disposição de aceitar as
habilidades da liderança das mulheres permitindo que elas
pregassem.379 No relacionamento sentimental não aconteceu o
mesmo.
375HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.69-0.376 Ibidem, p. 69-0.377 Ibidem, p.71.378 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.26.379 Ibidem.
CXXVIII
Wesley chegou a defender o celibato ao escrever sobre
Pensamentos de uma vida de solteiro onde ele exalta os exemplos de
Jesus e de Paulo.380
Um dia ele mudou de opinião e se interessou por Graça Murray,
uma viúva que era governanta em um orfanato. Ela fez promessa a
Wesley, mas quando ele fez uma de suas viagens soube que Graça
havia se interessado por João Bennett, um dos pregadores, o que foi
um duro golpe para Wesley.381
Em 1751, foi apresentado a uma outra viúva, Sra.Vazeille, mãe
de quatro filhos, que parecia ter ótimas qualidades.382
Wesley foi precipitado no casamento com Molly Vazeille. Em 2 de
fevereiro de 1751, com 48 anos, argumentou a razão de se casar:
“Por muitos anos fiquei solteiro, julgando que podiaser mais útil como solteiro do que como casado. E louvoa Deus que me ajudou a viver assim. Agora estouplenamente convencido de que, nas minhascircunstâncias atuais, poderei ser mais útil no estado decasado.”383
Mas Wesley passou a ter sérias dificuldades com sua esposa, que
era muito ciumenta.
380 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.194.381 Ibidem, p.195.382 Ibidem.383 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.212.
CXXIX
“Todas as qualidades dela eram, com efeito,eclipsadas por um grande defeito: era muito ciumenta.Incapaz de compreender a natureza e elevação docaráter de seu esposo, nem a pureza de seus motivos,deixou-se levar por sua imaginação desviada atéconceber as suspeitas mais absurdas e afrontosas (...)Dominadas por idéias preconcebidas, algumas vezes oseguia até 100 milhas de distância para vê-lo entrar emuma cidade e descobrir que tipo de companhia elelevava pelo caminho afora.”384
O casamento terminou em 23 de janeiro de 1771, quando ela
deixou a casa. Wesley tinha 68 anos. Apesar de amá-la, declarou:
“Hoje, não sei porque motivo, ela saiu paraNewcastle com a intenção de nunca mais voltar. Noneam reliqui; nom dismasi; non recabo.” 385
Depois desta experiência sentimental, Wesley permaneceu só até
o fim de sua vida.
3.5. Sua experiência espiritual
Wesley saiu de Savannah, dia 27 de novembro de 1737, depois
do seu fracasso sentimental e espiritual, e chegou à Inglaterra no dia
1º de fevereiro de 1738.386
Todo esse episódio, junto com a experiência no navio com as
tempestades, revelou a Wesley, que ele precisava de uma profunda
mudança espiritual. Em diversas ocasiões, ele revelou a fraqueza do
seu coração. Ele tinha medo de morrer:
384 Ibidem, p.195-6.385 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.197.386 JOY, James Richard , op cit, p.71.
CXXX
“Altas horas da noite, acordei-me com o rugido dovento, fiquei assustado; tal susto me revelou que eutinha medo de morrer.”387
Ele não tinha a certeza de sua salvação. Quando esteve na
América, um dos moravianos lhe perguntou:
“Tens o testemunho dentro de ti mesmo?Testemunha o Espírito Santo com o teu espírito de queés filho de Deus?” 388
João Wesley não soube responder. Quando foi perguntado
novamente, se ele conhecia a Jesus Cristo e se tinha a certeza da
Salvação, mais uma vez Wesley hesitou.389
Wesley vivia em meio aos moravianos onde o radicalismo era
explorado. Ele chegou a afirmar que esteve perto de cair em trevas:
“Chego a pensar que estou mais perto daquelemistério de Satanás (...); fiquei tão perto que,provavelmente, teria caído nele, se não fosse a grandemercê de Deus.”390
Entre os problemas colocados por Casiano Floristán e Juan José
Tamayo é o imediatismo com que se aspira a experiência.391 A
exigência espiritual de Wesley o levaria a buscar a sua experiência
com Deus de uma forma quase obsessiva.
387 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 15.388 Ibidem, p. 16.389 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.55.390 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, ibidem, p. 19-0.391 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José [ed]. Conceptos fundamentales delcristiniasmo. Apostila de Colóquios, Universidade Metodista de São Paulo, [s.d], p. 494.
CXXXI
Alguns estudiosos interpretam que Wesley não se considerava
um convertido:
“Fui à América para converter índios; porém, oh!quem me converterá?” 392
Como Wesley tinha se proposto a buscar a santidade, ele era
muito exigente consigo mesmo. Cinqüenta anos mais tarde, Wesley
reconheceria o engano dessa sua afirmação. A influência Morávia393 o
havia levado a entender que antes ele tinha a fé de um servo e não de
um filho. O servo buscava a fé, enquanto o filho tinha a segurança da
fé. Ambos buscavam a Salvação.394
James Fowler nos ajuda a entender um pouco mais o que houve
com Wesley. Ele afirma que a fé tem estágios. Segundo ele, são seis
estágios: Fé Intuitivo-Projectiva; Fé Mítico-Literal; Fé Sintético-
Convencional; Fé Individuativo-Reflexiva; Fé Conjuntiva e Fé
Universalizante.395 Wesley estaria, então, dentro da passagem de um
estágio para outro. O mais provável é que ele estivesse passando
para o estágio da Fé Conjuntiva:
“A fé conjuntiva do estágio 5 implica a integração,no eu e na própria perspectiva de muita coisa que foisuprimida ou não-reconhecida no interesse daautocerteza e da consciente adaptação cognitiva eafetiva à realidade, próprias do estágio 4. Este estágiodesenvolve uma Segunda ‘Segunda ingenuidade’(Ricouer), na qual o poder simbólico é reunido a
392 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 20.393 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.77.394Ibidem, p.303.395 FOWLER, James. Estágios da Fé. Editora Sinodal. [s.d.], p.5.
CXXXII
significados conceptuais. Aqui também deve haver umanova retomada e reconsideração do passado dapessoa. Deve haver uma abertura às vozes do ´eumais profundo’ da pessoa. É importante observar queisto implica um reconhecimento do inconsciente social –os mitos, imagens ideais e preconceitos profundamenteembutidos no sistema do eu em virtude da educação dapessoa dentro de determinada classe social, tradiçãoreligiosa, grupos étnicos ou coisa semelhante”.396
Nesta época, para Wesley, a esperança de salvação estava
firmada em sua sinceridade de ter uma vida santa. Desde 1725, ele
havia iniciado a busca da perfeição:
“Em 1725, encontrei com ´Regras de Santo Viver eMorrer´ (Rules of Holy Libing and Dyin), pelo BispoTaylor. Foquei impressionado especialmente com oCapítulo sobre Intenção; e senti a intenção fixa deentregar-me a Deus. Nisto fiquei confirmado poucosdias depois pelo Modelo Cristão, e desejava entregar-me a Deus de todo o coração. Isto é exatamente o queentendo agora pela Perfeição. Eu a busquei desdeaquela hora.” 397
Ele publicou, em 1733, Coleção de modelos de oração para
todos os dias da semana.398 Portanto, Wesley era convertido no
sentido que hoje consideramos uma conversão. Ele tinha sim, muitas
dúvidas antes de 1738. Além disso, sua desastrosa atuação pastoral
na América havia aumentado essa dúvida, mas ele não buscava a
396 Ibidem, p.166.397 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.215.398 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 46.
CXXXIII
conversão e sim a santificação. Escrevendo sobre o ano de 1733,
Wesley disse:
“No mesmo ano publiquei (primeira vez que tenteipublicar qualquer coisa), para uso dos meus alunos,uma ´Coletânea de Formas de Oração´. E nesta obrafalei explicitamente em dar ´totalmente o coração e avida a Deus´. Esta foi, então, como é agora, a minhaidéia a respeito da Perfeição (...).” 399
Diante dos fracassos que experimentou na América, Wesley foi
muito crítico consigo mesmo e, então, notou que o seu coração estava
corrompido:
Diante desse quadro, Wesley percebeu mais nitidamente o
estado do seu coração. Por isso, afirmou que aprendeu na América
que o seu coração estava corrompido:
“(...) que eu tenho estado destituído da glória deDeus; que meu coração está completamentecorrompido (...).”400
Wesley saiu da Geórgia com amargura e desapontamento.
Como positivo, passou a ser mais cauteloso. Havia aprendido a
conhecer com os moravianos direção paternal de Deus; havia vencido
seu medo do mar. Em acréscimo, havia conhecido muitas pessoas
que, como ele, buscavam a santidade e desejam servir a Deus.401
399 WESLEY, João. Trecho do Diário de João Wesley, ibidem, p.215-6.400 Ibidem, p. 21.401 Ibidem, p. 72.
CXXXIV
A consciência de sua situação o levou a procurar ajuda e a se
humilhar. Conheceu um moraviano chamado Pedro Bohler que lhe
ensinou sobre a fé viva. Wesley disse:
“(...) me surpreendeu mais e mais com a explicaçãoque me deu a respeito dos frutos da fé viva, a santidadee a felicidade que ele afirmou acompanharem tal fé.”402
Os moravianos diziam que não existem graus de fé403. Ou você
tem ou não tem fé404. Wesley não tinha a fé que os moravianos
tinham, por isso, se julgava um incrédulo. Pedro Bohler lhe ensinou
sobre a fé viva.405
Wesley estava triste porque seus amigos haviam tido
experiências com Deus e ele ainda não. George Whitefield 406 tinha
tido uma experiência espiritual, em 1735, e Benjamim Ingham407
também já havia experimentado uma transformação. Carlos Wesley
402 Ibidem, p. 22.403 Para James Fowler a fé tem estágios: “Quando falamos do envolvimento de Deus nosentido de iniciar o relacionamento que chamamos fé, normalmente fazemo-lo – pelomenos na tradição bíblica – em termos das categorias de revelação e graça (...). Talvez acoisa mais importante que se pode dizer ao concluir este livro é que nosso estudo dodesenvolvimento da fé, até agora, sublinha o fato de que nós, seres humanos, parecemoster uma vocação genérica – um chamado universal – para nos relacionarmos com oFundamento do Ser em um relacionamento de confiança e lealdade.” (Estágios da fé,Ibidem, p.247-8)404 James Fowler afirma que “a fé é interativa e social, requer comunidade, linguagem,ritual e alimentação. A fé também é moldada por iniciativas que vem de além de nós e deoutras pessoas, iniciativas de espírito ou graça” (Ibidem, p.10).405 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.64.406Whitefield nasceu em Gloucester, Inglaterra, no dia 16/12/1714. Seus pais eramzeladores da Estalagem do Sino. O Clube Santo o ajudou no propósito de ter uma vidasanta. Sua experiência espiritual foi em 1735, antes dos irmãos Wesley. Foi maiorpregador do que Wesley com quem divergiu em relação a predestinação. No Anexo,abordaremos sobre a vida de Whitefield.407 Benjamim Ingham pertencia ao Clube Santo e foi para a Geórgia junto com osWesleys e com Carlos Delamontte, outro membro do Clube Santo (LELIÈVRE, Mateo,Ibidem, p. 52-3).
CXXXV
408também tinha sentido uma "palpitação no coração", em 21 de maio
de 1738,409 mas João Wesley ainda não havia tido a sua
experiência.410
Esta “palpitação do coração” de Carlos Wesley dentro da
estrutura da experiência religiosa, segundo Casiano Floristán e Juan
José Tamayo, é algo difícil de se explicar:
“Basta entrar um pouco nas descrições daexperiência para que apareça a insuficiência dessacaracterização tão genérica. Não é algo superior, é osupremo.”411
Wesley estava consciente do estado do seu coração. Sabia que
precisava de uma ação de Deus em sua vida. Havia aprendido que a
fé viva poderia restaurar a sua vida. Pela influência dos moravianos,
Wesley pensava que não tinha fé e que era incrédulo. Ele aprendeu
que precisa ter uma fé viva.
Rudof Otto explica sobre essa predisposição que Wesley tinha
para vir a ter uma experiência com o sagrado:
408 Carlos Wesley nasceu em 18 de dezembro de 1708 e escreveu mais de seis mil hinos,que eram cantados com entusiasmo pelo povo. No Anexo, abordaremos sobre sua vida.409 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 79-0.410 Estas experiências se enquadram dentro das formas de experiência religiosaelaborada por Casiano Floristán e Juan José Tamayo, que eles chamam de “AExperiência Mística” . Ela consiste num ato isolado na vida de um indivíduo e umaexperiência contínua com vistas a etapas de purificação ascética e de prova ativa epassiva. Origina uma forma de relação com Deus, o divino, segundo os contextosreligiosos (...) aqui o contato se produz por um “toque substancial de Deus” na substânciamesma da alma (Conceptos fundamentales del cristianismo, Ibidem, p.487).411 Ibidem, p.492.
CXXXVI
“A religião realiza-se na história da seguintemaneira: primeiramente, na evolução histórica doespírito humano, graças à ação recíproca do objetoexcitativo e da predisposição. A predisposição tornar-seatp e toma a forma determinada pela ação. Emsegundo lugar, em virtude da predisposição a intuiçãoreconhece, em certas partes da história, a manifestaçãodo sagrado.Esta descoberta age sobre a natureza esobre o grau da predisposição. Em terceiro lugar, esteduplo fundamento estabelece a comunhão do sagradocom o conhecimento, da alma com a vontade.”412
Diante das crises, Wesley decidiu procurar os moravianos, que o
haviam mostrado sobre uma fé superior.
“Uma semana após ter voltado para a Inglaterra,Wesley se encontrou com Peter Bohler, um ministroluterano (ordenado mais tarde por Zinzendorf para oministério morávio) recentemente chegado daAlemanha e a caminho da América. O contato deWesley com Bohler, durante os quatro mesesseguintes, proporcionaria modelos tanto para arenovação espiritual como para o desenvolvimentoorganizacional do metodismo.”413
Wesley, contudo, continuava preocupado com a falta de
segurança da fé, que havia se tornado evidente em sua viagem
durante as duas travessias do oceano.414 A vida de Wesley começou
a ter um novo rumo, quando ele foi sem vontade a uma reunião numa
412OTTO, Rudof. O Sagrado. Traduzido por Prócoro Velásquez Filho. São Paulo:Imprensa Metodista-Ciências da Religião, 1985, p. 164.413HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.76. O Conde Nicolau von Zinzendorf nasceu emDresden, no dia 26 de maio de 1700. Seu pai era um alto oficial da Corte eleitoral daSaxônia. Seu pai morreu cedo e a mãe se casou de novo. Ele foi criado pela avó, abaronesa pietista Henrietta Catarina von Gersdorf. No Anexo, abordaremos sobre a vidado Conde Zinzendorf.414 Ibidem.
CXXXVII
sociedade, no dia 24 de maio de 1738. No culto, alguém comentava
sobre a mudança que Deus opera pela fé em Jesus.415
Wesley assim descreveu a sua experiência, quando disse ter
sentido seu coração aquecido:
“(...) senti que eu agora confiava em Cristo,somente em Cristo, para salvação; e me foi dada àsegurança de que Cristo havia perdoado os meuspecados, sim, os meus, e que eu estava salvo da lei dopecado e da morte.”416
Wesley comemorou a experiência417 com um testemunho diante
dos presentes.418 Mais tarde, continuou no quarto de Carlos Wesley
com um hino.419 Os ensinos de seus mentores morávios se tornaram
uma confissão pública.420
Essa experiência espiritual mudou a vida espiritual de João
Wesley. Rudof Otto, ao destacar o não-racional na experiência com o
divino, afirma:
415 Ibidem, p. 24.416 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, Ibidem, p.24.417 A “Experiência Mística” de Wesley, segundo Casiano Floristán e Juan José Tamayo,se enquadra igualmente nas experiências de seus companheiros relatadas anteriormente(Conceptos fundamentales del cristianismo, Ibidem, p.487).418 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 80.419 Apesar de considerar o cristianismo superior às outras religiões (OTTO, Rudof. OSagrado. Traduzido por Prócoro Velásquez Filho. São Paulo: Imprensa Metodista-Ciências da Religião, 1985, p. 7), Rudof Otto vê paralelo das experiências da graça e deregeneração em outras religiões (Ibidem, p.41). Rudof Otto afirma que “uma evidênciahiperbólica faz-se sentir em todo verdadeiro sentimento de felicidade religiosa, mesmoonde ele se apresenta mesurado e contido. É o que corresponde claramente ao estudodas grandes experiências, nas quais a emoção religiosa aparece em sua pureza típica ena sua realidade suprema manifesta-se com clareza mais perceptível (...). (Ibidem, p.40).
CXXXVIII
“Em toda piedade que atinge um grau superior,desenvolve-se ao mesmo tempo a consciência daobrigação e do mandamento moral, e este últimoapresenta-se como mandamento da divindade.” 421
Em sua experiência religiosa, Wesley sentiu, especialmente,
segurança: Ele sentiu que agora confiava em Cristo. Somente nele
para a Salvação. Foi-lhe dada a segurança de que Cristo havia
perdoado os seus pecados. Ele passou a ter a segurança de ter sido
salvo da lei do pecado e da morte , etc.422
“Aos olhos dos próprios Wesleys, antes do dia 21de maio de 1738, para Carlos, e 24 de maio do mesmomês e ano para João, eles não eram plenamentecristãos, pois lhes faltava o elemento essencial, a féevangélica.”423
Wesley vivia dentro de um contexto de efervescência religiosa e
de conflitos internos. É possível entender a experiência de Wesley
dentro do que Casiano Floristán e Juan José Tamayo afirmam:
“(...) seu contato experiencial com a realidade émediado pela cultura, a sociedade, e sobretudo alinguagem (...).”424
A experiência de Wesley foi mediada pelos conceitos de fé,
salvação e comunhão com Deus que ele recebeu dos moravianos.
Richard Heitzenhater afirma:
420 Ibidem.421 OTTO, Rudof. O Sagrado. Ibidem, p.56.422 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.66.423 REILY, Duncan Alexander, Ibidem, p.87.424 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José, Ibidem, p.480
CXXXIX
“A fé como confiança e certeza não era maisapenas uma verdade expressa em conceitos, mas, pelocontrário, uma realidade experimental. O ensino deseus mentores morávios agora se tornara umaconfissão que ele podia fazer por si mesmo.”425
Rudof Otto explica a tendência do ser humano que está oculta
na alma e os místicos a chamam de “profundezas de sua alma”:
“Seja sob a forma de Reino de Deus que virá ou soba forma de acesso do sujeito à realidade supraterrestree beatifica; seja na espera e no pressentimento ou naexperiência presente; sob as formas e nasmanifestações as mais diversas, aparece umatendência única, estranha e poderosa, em direção a umbem que conhece apenas a religião e que não éracional. A alma tem disto certeza, busca-a por intuiçãoe a reconhece por detrás de expressões simbólicasobscuras e insuficientes. Este fato atesta que além donosso ser racional existe, oculto no fundo de nossanatureza, um elemento último e supremo que nãoencontra satisfação no saciamento, nem na supressãodas necessidades que respondem às tendências e àsexigências de nossa vida física, psíquica e espiritual.Os místicos chamaram esta experiência de´profundezas da alma.” 426
Após sua experiência, Wesley foi à Alemanha conhecer mais de
perto o estrilo de vida dos moravianos. Ele encontrou e entrevistou
diversas pessoas. Prestou bastante tenção na organização morávia e
encontrou o que procurava:
“Encontrei aqui aquilo que buscava, a saber, provasvivas do poder da fé: pessoas salvas do pecado internotanto como do pecado externo, ‘pelo amor de Deusderramado nos seus corações’; e de toda a dúvida e
425 HEITZENHATER, Richard, Ibidem,p. 80426 OTTO, Rudof. O Sagrado. Traduzido por Prócoro Velásquez Filho. São Paulo:Imprensa Metodista-Ciências da Religião, 1985, p.39-40.
CXL
medo pelo testemunho constante ’do Espírito Santoderramado sobre ele”. 427
Retornando à Inglaterra, em setembro de 1738, Wesley começou a
agir, especialmente para resolver assuntos que ainda causavam
confusão em sua mente, como a exigência dos morávios sobre a
plenitude da fé (segurança).428
Anos mais tarde, contudo, Wesley diria que, após 24 de maio de
1738, ele passou da condição de servo para a condição de filho de
Deus.429
“Sua experiência do coração aquecido ocorrera numaquarta-feira. No domingo seguinte, Wesley pregou por duasvezes sobre um tema novo para ele: ´Esta é a vitória que venceo mundo, a nossa fé´ (1Jo 5.4) pela manhã e sobre o Deus ´quejustifica o ímpio´ (Rm 4.5) de tarde.”430
Wesley passou a viver a fé liberta do medo e da dúvida. Segundo
Reily, ele realmente recebeu esta espécie de fé no dia 24 de maio de
1738.431
Em seu sermão A Justificação pela fé, impresso em 1747,
Wesley relata o que em sua vida havia experimentado:
“A fé é, em geral, a divina, sobrenatural, evidênciaou convicção ‘das coisas não vistas’, não perceptíveis
427 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.25.428OTTO, Rudof. O Sagrado. Traduzido por Prócoro Velásquez Filho. São Paulo:Imprensa Metodista-Ciências da Religião, 1985, Ibidem, p.82-5.429 Ibidem, p.303.430 REILY, Duncan Alexander. O Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p. 91.431 Ibidem, p.91.
CXLI
aos sentidos corporais, sejam passadas, futuras ouespirituais.”432
William James descreve psicologicamente o fruto em alcança
esse estado religioso semelhante ao que Wesley alcançou:
“O homem que vive em seu centro religioso de energiapessoal, e é movido por entusiasmos espirituais, diferedo seu eu carnal anterior de maneiras perfeitamentedefinidas. O novo ardor que lhe inflama o peitoconsome em seu brilho os ‘nãos ’que dantes o sitiavam,e mantém-no imune à infecção de toda a porçãorastejante da sua natureza. Magnaminidade outroraimpossíveis tornam-se fáceis; convencionalismosdesprezíveis e incentivos mesquinhos, antigamentetirânicos, perdem o seu domínio. A parede de pedradentro dele desmoronou, quebrou-se-lhe a dureza docoração.”433
Dentro da experiência com o sagrado, Casiano Floristán e Juan
José Tamayo esclarecem que ela aparece de forma diferente nas
pessoas, mesmo em uma mesma tradição. Dentro desse fenômeno
tão complexo, pode significar consciência da presença de Deus;
consciência da responsabilidade de uma missão recebida, etc.434
Wesley sentiu seu coração aquecer-se maravilhosamente e
ampliou seus horizontes:
“O sujeito em contato com essas dimensões ampliaas fronteiras do seu conhecimento; transcende a formade conhecimento ordinário em termos de sujeito-objeto;
432 WESLEY, João. Sermões de Wesley. v.1, ibidem, p.117.433JAMES, William. As variedades da Experiência Religiosa. Tradução de Octavio MendesCajado. São Paulo: Editora Cultrix, 1995, p. 171-2.434 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José, Ibidem, p. 482-3.
CXLII
se sente de alguma maneira inundado pela realidadeque se apresenta e fica misteriosamente identificadocom ela; e sente uma intensa comoção afetiva queorigina sentimento de paz, gozo (...).”435
Uma outra forte experiência religiosa 436 que os carismáticos437 de
hoje desejam ressaltar, ocorreu pouco tempo depois da experiência do
coração aquecido e foi registrado pelo próprio Wesley:
“Janeiro 1, 1739. Mr. Hall, Kinchin, Ingham,Whitefield, Hutchins e meu irmão Carlos estavampresentes à nossa festa de amizade em Fetter Lane,com mais sessenta de nossos irmãos. Pelas 3 horas damanhã, enquanto nos mantínhamos em oração, o poderde Deus veio poderosamente sobre nós, de tal modoque muitos clamaram de indizível alegria, e muitoscaíram por terra. Logo que recobramos um poucodaquele espanto e do temor que nos sobreveio dapresença da Majestade Divina, entoamos em uma sóvoz: "Louvamos-Te, ó Deus, reconhecemos a Ti comoSenhor.”438
435 Ibidem, p. 484.436 Esta forma de experiência Casiano Floristán e Juan José Tamayo chamam de “Experiência Carismática”, cujas características são: visões, batismo do Espírito Santo,experiências de revelação através das quais Deus tem conduzido a humanidade a ummelhor conhecimento de sua existência, sua vontade e seu desígnio para com oshomens. Em alguns casos, as visões são acompanhadas de fenômenos extraordinários(Conceptos fundamentales del cristiniasmo, Ibidem, p. 488).437 William Allen, cita Whitefield, que lembra essa experiência: “Foi na verdade ummomento Pentecostal: (História dos Avivamentos Religiosos, Rio de Janeiro, CasaPublicadora Batista, 1958, p.21). Benedito Natal Quintanilha, coloca a experiência de1739 da seguinte forma: “(...) Wesley alcançou a experiência denominada por váriosnomes: Santificação, Perfeição Plena, Perfeito Amor, Segunda Benção, Santidade Bíblica,Revestimento de Poder, Batismo com o Espírito Santo, Plenitude do Espírito Santo”(QUINTANILHA, Benedito Natal. Doutrinas Metodistas, Copiadora e Gráfica Ltda, SãoPaulo, 3ª edição, 1995, p.26). Duncan Alexander Reily, contudo, afirma que “há, naverdade, diversas razões bem substanciadas por concluir que a experiência de 2 dejaneiro de 1739 não deve ser vista como o ‘batismo do Espírito Santo’ de Wesley” (REILY,Duncan Alexander. Fundamentos Doutrinários do metodismo brasileiro. São Paulo:Êxudos, 1997, p.24).438ALLEN, William E. História dos Avivamentos Religiosos. Casa Publicadora Batista,1958, p. 32.
CXLIII
Dentro do sentido técnico que o termo experiência tem adquirido
na metodologia científica, Casiano Floristán afirma que:
“(...) a palavra experiência não tem aplicação noterreno religioso, dado que a relação vivida na ER secaracteriza por ter sua origem numa realidadesobrenatural ou ao menos superior ao homem queescapa a sua iniciativa ou controle.”439
Wesley não ressalta, posteriormente, em seu diário essa
experiência. Talvez por ela ter se tornado comum no meio metodista
com o constante mover do Espírito Santo, mas a experiência do
coração aquecido, em 24 de maio de 1738, foi um marco na vida de
João Wesley.440
Como é explicada cientificamente a experiência religiosa?
Os editores Casiano Floristán e Juan José Tamay afirmam que a
experiência significa um conhecimento obtido na vida, no sentido de
que a pessoa já passou por ela. Ela tem um forte impacto sobre a
pessoa:
“Este tipo de conhecimento, ainda que se refira aum objeto exterior, repercute sobre o sujeito, e envolve,
439 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José, Ibidem, p. 480.440 Após suas experiências com o coração aquecido e com o poder do Espírito Santo, em01 de janeiro de 1739, Wesley “registrou muitas ocasiões quando as pessoas foram´fulminadas´, ´feridas pela espada do Espírito´, ´tomadas de fortes dores´, ´feridas nocoração´ ou ´caiam de joelhos´. Logo começou a circular a notícia de que as pessoasestavam ´tendo estranhos acessos´ nas reuniões da sociedade; a mesma coisa começoua acontecer ocasionalmente nos ofícios públicos em Newgate e em outros lugares.Wesley ficou sabendo que muitos ficavam escandalizados com essas manifestaçõesexteriores do poder de Deus, mas explicou que, na maioria dos casos, a pessoa atacadaera aliviada através da oração e era levada a sentir paz alegria” (HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p. 100).
CXLIV
e transforma em alguma medida sua vida e seumundo.”441
A experiência com o sagrado traz uma ruptura e uma enorme
capacidade de mobilização de todas as faculdades do sujeito, libera
sua energia.442
“Constitui um fato extraordinário na vida dossujeitos, um hiato que divide a vida e que assinala comtodo cuidado as circunstâncias do lugar e sobre todotempo.”443
3.6. As três conversões de Wesley
Afinal, uma pessoa pode se converter três vezes?
Para o teólogo Mortimer Árias, sim é possível. Segundo ele,
Wesley teve três momentos de conversão, dentro da visão
contextualizada do metodismo na América Latina, onde se propõe que
a Igreja esteja junto ao povo, seja povo e instrumento de libertação.
Mortimer Arias cita o francês dominicano Maximino Piette Llama,
que afirma que o ano de 1725, em Oxford, foi a primeira conversão de
Wesley, quando ele foi aceito como professor de Lincoln College e
decide iniciar o caminho para sua ordenação como ministro da Igreja
Anglicana.444
441 Ibidem, p. 480.442 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José, Ibidem, p.485.443 Ibidem.
CXLV
Wesley decide individualmente se aprofundar na vida espiritual
em busca da santidade.445 As leituras de Regras para Viver e morrer
santamente, do Bispo Jeremias Taylor, e do livro A Imitação de Cristo,
de Tomás Kempis:
“Wesley inicia uma busca intensa e tenaz pelasantidade total. Começa a escrever seu diário e realizarum severo auto-exame cada dia. Sua meta ‘ter a mentede Cristo’ e ‘andar com Ele andou.”446
Wesley passou a ter uma firme convicção de que o viver santo é
essencial ao verdadeiro cristianismo. Tanto que em 1730 começou a
ler Sério chamado a uma vida devota e santa de William Law.447
Sobre esse tempo de busca da santidade e de leituras, Wesley
diz:
“Em 1725, encontrei com ‘Regras de Santo Viver’(Rules of Holy Living and Dying), pelo Bispo Taylor.Fiquei impressionado especialmente com o Capítulosobre Intenção; e senti a intenção fixa de entregar-me aDeus. Nisto fiquei confirmado poucos dias depois peloModelo Cristão, e desejava entregar-me a Deus de todoo coração. Isto é exatamente o que eu entendo agorapela Perfeição. Eu a busquei desde àquela hora.”448
444 “John Wesley the Evolution of Protestantism” (Llama apub Bonino et al, p.114)445 Wesley ainda não tinha tido contato com os Pietistas. Sua influência vinha da leiturade autores Puritanos. Max Weber afirma que o metodismo, e certamente Wesley, sendode origem inglesa, na sua ”ética prática relacionava-se intimamente àquela do puritanismoinglês, cujo ‘revival’ aspirava a ser” (A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo,Ibidem, p.101).446 ARIAS, Mortimer. “Las comunidades de base y la tradición wesleyana” em La tradiciónprotestante la americalatina, Ibidem, p. 113-4.447 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem,p. 33.448 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.215.
CXLVI
A segunda conversão de Wesley aconteceu, então, em
Aldersgate, em 24 de maio de 1738. Foi uma experiência de
segurança interna de sua salvação, a uma vivência que os teólogos
chamam de testemunho interior do Espírito Santo. Muitos anos mais
tarde, Wesley fala dessa experiência como passar da fé de um servo
para a segurança da fé de um filho de Deus.449
William James explica o que significa uma conversão:
“Converte-se, regenerar-se, receber a graça, sentira religião, obter uma certeza, são outras tantasexpressões que denotam o processo , gradual ourepentino, por cujo intermédio um eu até então dividido,e conscientemente errado e infeliz, se torna unificado econscientemente certo, superior e feliz, emconseqüência do seu domínio mais firme das realidadesreligiosas. Isso, pelo menos, é o que significa aconversão em termos gerais, quer acreditemos, quernão, que se faz mister uma operação divina direta paraproduzir uma mudança natural dessa ordem.”450
Para os teólogos latino-americanos, a terceira conversão de
Wesley, em Bristol no ano de 1739, foi mais marcante.
Qual era a importância de Bristol?
“Bristol era o epicentro da dupla revolução agrícolae industrial do século XVIII, com seus camponeses
449 James Fowler coloca esse momento na vida de Wesley como a passagem de umestágio da fé. Provavelmente, foi a passagem do estágio da fé sintético-convencional(Estágios da fé. Ibidem, p.130), para a fé individuativo-reflexiva (Ibidem, p.154), isto é, o“adulto começa a assumir seriamente o encargo da responsabilidade por seus próprioscompromissos, estilo de vida, crenças e atitudes” (Ibidem, p.154).450 JAMES, William. As variedades da Experiência Religiosa. Tradução de OctavioMendes Cajado. São Paulo: Editora Cultrix, 1995, p.126.
CXLVII
desalojados com seus artesãos e operários, seusmineiros e comerciantes, em um dos centros vitais doImpério Britânico em plena expansão manufatureira ecomercial.”451
A cidade de Bristol tinha cerca de 50 mil habitantes. Era rodeada
de minas de carvão que ajudavam a estimular a crescente revolução
industrial. Era líder no reino e o porto principal para o comércio com a
América do Norte e com as Índias Ocidentais. Importava tabaco e
açúcar e exportava produtos manufaturados.452
Foi em Bristol que as multidões respondiam aos apelos das
pregações de George Whitefield.453 Igualmente, Wesley estava em
contato direto com as massas. Isso significou uma radical mudança
em seu ministério, seus enfoques e em sua própria teologia.454
Thomás Maxfield, que se era um dos líderes do movimento, teve
uma emotiva experiência com a pregação de João Wesley, em Bristol,
abril de 1739.455
Mortimer Àrias cita o teólogo metodista Albert Outler, que
considera esse momento o real começo do metodismo. Para ele,
Aldersgate havia acendido um coração, mas não havia ensinado a
451“John Wesley the Evolution of Protestantism” (Llama apub Bonino et al, p.120).452 HEITZENHATER, Richard, p.98-9.453 As pregações de Whitefield impressionaram a Wesley, que estava acostumado aomodo de decência e ordem. Ele viu seu companheiro pregar para 30 mil pessoas emudou seu modo de pensar, mesmo a contragosto. Haviam manifestações físicas nosculto, cujos apelos emocionais de Whitefield vinham da influência emocional Pietista cujasênfases eram no arrependimento, confissão e mudança de vida (HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p.98-101).454 Ibidem, p.121.455 REITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.115.
CXLVIII
comunicar o Evangelho e como guiar as pessoas à santidade. A partir
de 2 de abril de 1739, passou a haver uma nova perspectiva
evangelística e pastoral.456
3.7. “Gosto de música simples e de gente simples”
João Wesley
Wesley não era melhor pregador do que George Whitefield, mas
seus dons como organizador eram notáveis.457 Os números mostram
que ele era um homem dinâmico e prático. Escreveu 233 trabalhos
originais e resumiu ou editou outros tantos. 458Ele se preocupava muito
com a formação do povo chamado metodista, especialmente, os
pregadores.
Edward P.Thompson afirma que George Whitefield e outros
pregadores conseguiram impressionar mais do que Wesley. Contudo,
Wesley teve seu reconhecimento também:
“Mas foi Wesley o organizador, administrador eordenador mais enérgico e hábil. Conseguiu combinarnas proporções exatas de democracia e disciplina,doutrina e emotividade (...).”459
456 “Evangelism in the wesleyam Spirit’ (Outler apud Àrias, Nashville, p.122).457 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.210.458 JOY, James Richard., Ibidem, p. 77.459 THOMPSON, Edward P. A Formação da Classe Operária Inglesa. 1 v. Ibidem, p.38.
CXLIX
Wesley era dinâmico e pregou mais de 40 mil sermões.460 Ele
visitou o País de Gales 24 vezes; a Irlanda, 21 vezes e a Escócia, 20
vezes.461
“As viagens de Wesley eram incessantes. Em1764, entre 19 de maio a 4 de agosto, período de 77dias, ele viajou de Bristol a Inverness na Escócia, evoltou pregando em 122 cidades, realizando 300 cultos,além das reuniões das sociedades unidas.”462
Wesley cresceu junto com o Movimento Metodista. No final de
1738, ele passou a entender a função do Espírito Santo como
central, tanto como fonte de autoconhecimento (evidência interna,
testemunho do Espírito) e também como fonte dos frutos (evidência
externa – frutos do Espírito).463
Em diversas ocasiões, ele descreveu o mover do Espírito com
expressões como estas: "Deus manifestou o Seu poder"; "Enquanto
nos mantínhamos em oração, o poder de Deus veio poderosamente
sobre nós"; "Deus derramou abundantemente Seu Espírito sobre nós.”
Para ele, isso era o real avivamento.464
Como abordamos nessa tese, o avivamento, contudo, não era
algo isolado, que se perdia dentro de um coração ou se estacionava
dentro de um templo. Ele trazia justificação, santificação e,
consequentemente, obras de misericórdia. Em seu sermão
Cristianismo bíblico, Wesley afirma:
460 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 344.461 JOY, James Richard. O Despertamento Religioso de João Wesley. Instituto MetodistaBennett, 1996, p.79.462 Ibidem, p.78.463 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.91.
CL
“O amor de Deus foi também derramado em seucoração pelo Espírito Santo que lhe foi dado (...). E oamor filial de Deus foi-se aumentando continuamente,pelo testemunho que ele possuía em si mesmo (...). Osque assim amam a Deus, não podem deixar de tambémamar a seus irmãos, ‘não em palavras somente, masem obras e em verdade”. 465
Na caminhada do progresso do metodismo, Wesley se viu diante
de fatos novos, que ele teve que superar. Uma dessas novidades foi a
pregação ao ar livre, à qual inicialmente fora contra. Ele mesmo diz:
“Sábado, dia 31, de tarde, cheguei a Bristol, ondeencontrei o sr. Whitefield. A princípio quase não podiareconciliar-me com este modo esquisito de pregar noscampos, conforme o sr. Whitefield me deu exemplo nodomingo, pois tenho eu sido toda a minha vida, e istoaté agora, tão agarrado a todos os pontos que eramconsiderados de acordo com a decência e a ordem, -tais eram os meus preconceitos, - considerava pecadoum pecador salvar-se fora da igreja.”466
Revelando toda uma visão espiritual e uma maturidade,
posteriormente, Wesley disse:
“(...) preguei ao ar livre perto do Hospital deKeelmen. Que maravilha que o diabo não gosta depregações ao ar livre! Nem eu gosto disso; aprecio maisum salão de comodidades, almofadas macias, púlpitobonito; porém onde está meu zelo, se eu não pisar aospés todas estas cousas, com o fim de ganhar maisalmas?” 467
464 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.103-5.465 ______. Sermões de João Wesley. 1 v, Ibidem, p.85.466 ______. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.28.467 Ibidem, p.30.
CLI
Sua visão de organizador foi colocada em prática também
quando William Morgan,468 um irlandês e um dos participantes do
Clube Santo, sugeriu que fossem visitados os presos e condenados na
Prisão do Castelo. O jovem irlandês começou também a trazer
crianças das famílias pobres de Oxford. Posteriormente, Wesley
percebeu que as crianças pobres precisavam de um melhor
atendimento e uma organização permanente. No fim de junho de
1731, Wesley contratou a senhora Plat para tomar conta das
crianças.469
Quando o movimento evangelístico trouxe novos desafios
pastorais, Wesley soube tomar novas decisões:
“A crescente necessidade de estrutura eorganização, à medida que o movimento crescia emtamanho e complexidade, é refletida no sumário de umareunião realizada no final de junho de 1732, eregistrada no diário de Wesley: ´separei homens etarefas.”470
Os bands foram importantes no processo de formação da
organização metodista. Eles eram mais wesleyanos do que muitas
sociedades.471 Eram grupos pequenos de cinco a dez pessoas que se
reuniam para edificação e apoio espiritual.
468 William Morgan influenciou os líderes do Clube Santo para o exercício da solidariedadeaos presos, crianças, idosos e pobres. No Anexo, abordaremos sobre sua vida.469 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 40-1.470 Ibidem, p.45.471 Existiam diversas sociedades na Inglaterra. Wesley e outros líderes do Clube Santolideravam algumas, mas não necessariamente elas eram consideradas metodistas(HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.103).
CLII
“Suas principais atividades eram a confissão e aoração; o alvo deles era o crescimento espiritual. Osbands eram homogêneos, de acordo com o modelomorávio; havia band de mulheres, de homens e mesmode rapazes (...).”472
Com o desenvolvimento do movimento metodista, Wesley foi
necessário tomar decisões radicas e se separar dos moravianos.
Procurou seu próprio modelo de bands. Como homem simples e que
tinha sensibilidade para com os problemas do ser humano, Wesley
percebeu equívocos no modelo morávio:
“(...) não se adaptava bem às necessidades daclasse trabalhadora inglesa, pessoas que enfrentavamas dificuldades da mudança social e das condiçõeseconômicas do mundo de trabalho diário.”473
Mais tarde, diante das novas exigências, Wesley fez novas
adaptações, criou os bands seletos474 para aqueles que haviam
recebido a remissão dos pecados e estavam tendo uma vida
exemplar.
Essas adaptações e abertura ao novo, caracterizaram Wesley e
o metodismo, na Inglaterra, no século XVIII.
3.8. Wesley diante das oposições e controvérsias religiosas
472 Ibidem, p.104.473 Ibidem, p.108.474 As classes se diferenciam dos bands: eram agrupadas geograficamente em vez deserem divididas pela idade, sexo ou estado civil; elas continham todas as pessoas dasociedade, não apenas aquelas que voluntariamente se agrupavam (Idem, p.119).
CLIII
Em sua caminhada, Wesley enfrentou toda espécie de oposição,
incompreensão, crítica e abandono. Ele viveu em um período difícil
para o povo inglês, que explodia em revoltas. A Inglaterra se tornava o
principal centro econômico do mundo, mas com o povo pagando um
alto preço.475
“As classes populares da Inglaterra do século XVIIIeram ignorantes, grosseiras e desordenadas. Tinhamherdado as agitações políticas do século anterior ehavia uma tendência muita elevada aos alvoroços (...)nunca mudava seu ódio intenso aos papistas, de umlado e, de outro, aos dissidentes.”476
Foi na Universidade, em Oxford, que Wesley começou a
experimentar oposição às suas idéias e práticas religiosas.
“(...) em 1731, os estudantes de mais tempo decasa fizeram uma reunião com o fim expresso de detero progresso do Metodismo. No ano seguinte, aimprensa, que já exercia uma grande influência naInglaterra, também entrou na luta. O semanário Eogg´sWeekly Journal atacou com violência Wesley e seusamigos, comparando-o com os essênios da Judéia e ospietistas da Suíça, e acusando-os de querer transformara Universidade em um mosteiro.”477
Um dos problemas sérios e de provas para o grupo metodista
aconteceu em 1732, com a notícia da morte de William Morgan, cujo
475 Conferir Contexto Social e Wesley no contexto social-político-religioso da Inglaterra nono século XVIII , no Capítulo 2 da tese, onde há uma descrição mais detalhada da gravecrise em que vivia o povo.476 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.12.477 Ibidem, p.46.
CLIV
boato dizia que sua morte foi devido ao rigoroso ascetismo do estilo de
vida metodista.478
As controvérsias foram especialmente em relação às doutrinas.
Wesley queria que os pregadores e clérigos metodistas pregassem,
especialmente, sobre as três doutrinas principais metodistas:
“(...) as três grandes doutrinas bíblicas - o pecadooriginal, a justificação pela fé, e a conseqüentesantidade.”479
Ele definia a santidade ou a perfeição cristã numa palavra – o
amor de Deus derramado no coração pelo Espírito Santo:
“Nas Minutes, Wesley mais uma vez define aperfeição cristã como ‘amar a Deus de todo o coração,de modo que qualquer mal temperamento é destruído,e todo o pensamento, palavra e ação surgem e sãoconduzidos para aquele fim pelo puro amor a Deus e aonosso próximo.”480
Em 1764, Wesley fez uma revisão e um sumário do que ele
entendia sobre a doutrina da perfeição cristã.481
478 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.46.479 Ibidem., p.204.480 Ibidem., p.205.481 1) Existe a perfeição, pois ela é constantemente citada nas Escrituras. 2) Ela não vemcedo como a justificação, pois as pessoas justificadas precisam ‘prosseguir para aperfeição’ - Hebreus 6:1. 3) Não é tão tardia quanto a morte, pois S.Paulo nos fala dehomens vivos que eram perfeitos – Fil.3:15. 4) Não é absoluta. A perfeição absoluta nãopertence ao homem, nem aos anjos, mas somente a Deus. 5) Ela não torna o homeminfalível: ninguém é infalível enquanto está no corpo. 6) É ela sem pecado? Não vale apena contendermos a respeito de termos. Ela é ’salvação do pecado’. 7) É ‘amor perfeito’- I Jo 4:18. Este é a essência da mesma. As suas propriedades ou frutos inseparáveissão: alegria constante, oração sem cessar e em tudo darmos graças- I Ts 5:16, etc. 8)
CLV
Umas das piores dificuldades que Wesley teve em seu ministério
foi as controvérsias teológicas com o seu amigo Jorge Whitefield. Por
causa da defesa de Whitefield da predestinação482 e sua tendência de
depreciar a necessidade de santificação e de edificação na vida cristã,
eles se separaram.483
Qual era a diferença básica entre o arminianismo de Wesley e a
predestinação de Whitefield?
Para Wesley, o livre arbítrio contribuía mais para a glória de Deus
do que a predestinação, que ele chamava também de
“condenação”.484
Ao contrário de Wesley, George Whitefield acreditava na doutrina
da perseverança do crente:
“A disputa teológica de Wesley com Whitefield tinhadois pontos: as doutrinas relacionadas com apredestinação e as questões da justiça imputada.
Não podemos prová-la. Não pode de maneira nenhuma permanecer como um pontoindivisível, ser incapaz de desenvolvimento, pois uma pessoa aperfeiçoada em amor podecrescer na graça muito mais rapidamente do que o fazia antes. 9) Pode ser perdida.Temos muitos exemplos disto. Mas não tínhamos inteira convicção disso até 5 ou 6 anosatrás. 10) É constantemente precedida e seguida de um trabalho gradual.” (BURTNER,Robert W.; CHILES, Robert E. Coletânea da teologia de João Wesley. Ibidem, p.212).482 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem., p.107.483 Ibidem, p.214.484 Eis um resumo do que Wesley pensava sobre a predestinação: Se existe a eleição,toda a pregação seria vã; ela tende a destruir diretamente a santidade; tende a destruir onosso zelo pelas boas obras; subverte toda a revelação cristã; faz a revelaçãocontradizer-se; é uma doutrina cheia de blasfêmia, pois coloca Jesus como um hipócrita,um enganador do povo, etc (BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert E. Coletânea dateologia de João Wesley. Ibidem, p. 53-4)
CLVI
Whitefield aceitava a crença dos calvinistas de que umapessoa verdadeiramente justificada por Deusperseveraria na fé até o fim – não havia nada parecidocom recaída entre os verdadeiros crentes.”485
Sobre a justiça de Cristo, Wesley e Whitefield tinham a seguinte
opinião:
“Sobre a justificação, Whitefield concordava com aidéia calvinista de que apenas a justiça de Cristo éimputada a nós para nossa salvação, e que não temosjustiça a não ser a de Cristo. Wesley estava ficandoconvencido que a atividade de Deus em Cristo, emboraa causa de nossa salvação, era apenas uma parte doquadro; a atividade de Deus em nós era tambémimportante, de modo que a fé que temos, em nós, pelagraça de Deus (“uma confiança real que o homem temde que Cristo o amou e morreu por ele” ) era a condiçãoexigida para nossa salvação. E essa fé resultaria emuma verdadeira mudança no crente, onde, pela graçade Deus , a justiça de Cristo seria concedida à pessoa,que não apenas seria tida como justa mas se tornariajusta (santificação ou santa).”486
Whitefield era o principal líder calvinista entre os reavivalistas
evangélicos.487 Em 1741, eles se separaram. Foi inevitável, pois
Wesley era arminiano e Whitefield, calvinista.488 Entre as
discordâncias com Whitefield estava sobre a possibilidade da
eliminação do pecado na vida humana. Whitefield disse:
“Não concordo que a realidade do pecado íntimapossa ser destruída nesta vida.”489
485 HEITZENHATER, Richard P.Ibidem, p.107.486 Ibidem.487 Segundo D.M.Lloyd-Jones, Os temas das pregações de Whitefield eram: O pecadooriginal, A regeneração, o Espírito Santo, a justificação pela fé, etc. (JONES, D. M. Lloyd.Os puritanos. Ibidem, p.130-1).488 HEITZENHATER, Richard P.Ibidem, p.120-1.489 Ibidem, p.120.
CLVII
Em abril de 1739, Wesley pregou seu sermão Livre Graça e
depois o publicou juntamente com o poema “Redenção Universal” de
Carlos Wesley:
“O sermão tratou diretamente de seu ponto básicode diferença com George Whitefield, a doutrina dagraça irresistível e todos os corolários dapredestinação: redenção limitada, eleição incondicional,condenação (lei ‘horrível’) e perseverança dossantos.490
Uma das batalhas teológicas travadas por Wesley foi contra o
antinomianismo, que a Conferência de 1744 definiu assim:
“P. Que é antinomianismo?R. A doutrina que torna a lei inútil em presença da fé.”491
Wesley precisou fazer um vigoroso protesto junto à Conferência
pela tendência de alguns metodistas para o calvinismo antinominiano.
Suas três questões foram:
“Dissemos, em 1774: ´Temo-nos inclinadodemasiadamente para o calvinismo. Em quê?1.Com relação à fidelidade do homem. Nosso Senhormesmo ensinou-nos a usar essa expressão. Nuncadevíamos envergonhar-nos dela. Devíamos proclamarfirmemente, estribados em sua autoridade, que, se ohomem não for fiel nas riquezas injustas, Deus lhe nãodará as riquezas verdadeiras.
490 Ibidem491 WESLEY. João. Sermões de Wesley. v.2, ibidem, p.174.
CLVIII
2. Em relação a trabalhar pela vida. Isto também nossoSenhor nos recomendou expressamente. Trabalhai –literalmente operai – pela comida que permanece paraa vida eterna. E, de fato, todo crente, até que suba àglória, trabalha para a vida e pela vida.3. Temos recebido como máxima que ó homem nadadeve fazer para a justificação. Nada pode ser maisfalso. Quem quer que deseje achar graça diante deDeus, ´cesse de fazer o mal e aprenda a fazer o bem´.,Quem quer que se arrependa, fará ´obras dignas dearrependimento´. E se isto não se faz para achar graça,para que, então, se faz?” 492
Wesley teve também batalhas teológicas com os Moravianos,
especialmente em relação ao quietismo,493 mas as batalhas teológicas
contra a predestinação,494 foram mais intensas. Wesley teve sérias
dificuldades, pois alguns dos seus líderes e amigos tendiam para o
calvinismo, como George Whitefield e a condessa Lady Huntingdom.
Foi preciso a Conferência Anual de 1770 confirmar o metodismo
arminiano,495 com o apoio de Fletcher.496
“Em 1769, a controvérsia sobre a predestinaçãorenovou-se com intensidade. Na ´Conferência´ de 1770
492 Ibidem, p.174-5.493 Um moraviano, Philip Henry Molther, ensinava que, para alcançar a verdadeira religião,deveriam ser abandonados “todos os meios de graça e todas as obras de piedade e, emvez disso, deviam permanecer ‘quietos’ diante do Senhor” (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p.154).494 Rudof Otto afirma que “Ela é o meio pelo qual tenta-se dar uma expressão conceitual aalgo que não pode ser explicado. Como mistério, ela é absolutamente indispensável eperfeitamente legítima. Esta liberdade torna-se summainjúria quando não se leva emconta que ela é um signo analógico, e quando se toma esse ideograma por um conceito epor base de uma teoria. A idéia de predestinação torna-se, numa religião racional como ocristianismo, perniciosa e intolerável, por mais que se tente faze-la inofensiva deatenuações múltiplas” (OTTO, Rudof. O Sagrado. Ibidem, p.91.).495 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 212.496 João Guilherme de La Flechére ou João Fletcher nasceu em Nyon, Suíça, em 12 desetembro de 1729. Descendia de uma família francesa e estudou na Universidade deGenebra. Por questões de consciência não se tornou pastor da Igreja Reformada, porcausa do credo calvinista. Foi um dos líderes que apoiou Wesley. No Anexo,abordaremos sobre a sua vida e ministério.
CLIX
Wesley tomou forte posição arminiana e foi defendidopor seu devotado discípulo, o suíço John WilliamFletcher (...). O resultado da controvérsia foi confirmaro caráter arminiano do metodismo wesleyano.”497
Mas mesmo tendo dificuldades, inclusive, com George
Whitefield, eles continuaram amigos. Inclusive, a pedido dele, Wesley
pregou no seu ofício fúnebre, em 1770.498
Talvez, por isso, Wesley publicou, em 1771, o sermão O Senhor
nossa Justiça. O objetivo foi prevenir mal-entendido sobre a salvação
pela fé. Contudo, ele repudiava as contendas sobre religião:
“Como são odiosas e como são numerosas ascontendas levantadas acerca da religião! E nãosomente entre os filhos deste século, entre os que nãoconhecem o que seja a verdadeira religião, mas entreos filhos de Deus (...). Quantas almas débeis seescandalizam por essa causa! Quantos estropiados sedesviaram do caminho! Quantos pecador esseafervoraram no desprezo de toda a religião e naaversão àqueles que professam!”499
Por diversas vezes, Wesley procurou resolver conflitos nas
sociedades metodistas, mas as mais graves foram com os próprios
líderes e até amigos. Foi assim com Thomas Maxfield500 e George
Bell.
497WALKER, Welliston, Ibidem, p.212.498 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 241.499 WESLEY, João. Sermões de Wesley. v.1, ibidem, p.406.500 Maxfield foi o primeiro pregador leigo do metodismo, em abril de 1739, após ter tidouma violenta experiência em Bristol com a pregação de Wesley (HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p.115).
CLX
“Em janeiro de 1763, George Bell estavaproclamando que o fim do mundo chegaria no mêsseguinte, dia 28 de fevereiro.”501
As tentativas de mudar Bell foram em vão. Maxfield afirmava que
o cristão perfeito estava sem pecado e, uma vez perfeito, permanecia
nesse estado quase angelical.502 Ambos deixaram o metodismo.
Vários artigos procuravam atingir a sua moral. Um deles,
referindo-se a Wesley, tinha por titulo "A serpente e a raposa". Até
caricaturas sobre Wesley foram publicadas mostrando, inclusive,
obscenidades, etc.503 O fato dos metodistas limitarem suas reuniões
apenas a membros que tivessem tickets de classes,504 levou a
diversas interpretações e críticas, entre elas:
“(...) críticas apontadas em Fanatical Conversion(Conversão Fanática) a respeito da festa do amormetodista, como uma orgia onde as ´virgens sãodepravadas em fantasias religiosas.”505
No período de controvérsia, o "pai do metodismo" se dedicou ao
empreendimento editorial. Escreveu muito. Na década de 1750, ele
escreveu uma média de seis obras por ano. Depois de 1765, ele
aumentou a produção.506
501 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.209-0.502 Ibidem.503 Ibidem, p. 267.504 Ibidem. Os metodistas tinham a “secreta’ (senão subversiva) prática de limitar suasreuniões apenas aos membros que tivessem os tickts de classes” (HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p.267).505 Ibidem.506 Ibidem, p. 228. Em 1745, Wesley já desejava viajar menos e escrever mais, mas aConferência não achou aconselhável por ora (HEITZENHATER, Richard P.,ibidem,p.154).”Entre as obras importantes durante esse período estavam o sumário desua doutrina mais distinta, A Plain Account of Christian Perfection (Um simples relato da
CLXI
Entre os prós e contra sobre Wesley, o teólogo metodista Rui de
Souza Josgrilberg afirmou:
“Wesley foi conservador politicamente,centralizador na organização das sociedadesmetodistas, mas liberal na visão do indivíduo, suasliberdades, possibilidades e necessidades sociais. Foisensível ao desespero do povo e aos seus clamores. Aincorporação de categorias liberais em sua teologiaproporcionou a Wesley elemento de um equilíbriodinâmico e uma visão teológica-flexível.”507
Apesar de toda sua formação e liderança, Wesley era simples e
preferia a simplicidade do povo. Em 1781, ele foi a um concerto onde
passou momentos agradáveis, mas se sentiu fora do seu ambiente:
“Passei uma hora agradável assistindo ao concertodo meu sobrinho. Mas senti-me fora do meu ambiente,estando no meio de Lords e Senhoras. Gosto demúsica simples e de gente simple”s.508
Wesley faleceu no dia 2 de março de 1791, aos 88 anos. Uma de
suas últimas declarações foi:
“O melhor de tudo é que Deus está conosco.”509
perfeição cristã, 1766), e mais dois sermões, em 1767, The Witness of th Spirit, II ( Otestemunho do Espírito, II) e The Repentance of Believers (O arrependimento doscrentes), ambos com uma revisão significativa de seus sermões anteriores sobre essesassuntos” (Ibidem, p.228).507 BONINO et al. Luta pela Vida e Evangelização, Ibidem, p.263.508 WESLEY, João, Ibidem, p.200.509 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.308.
CLXII
No seu túmulo está colocada a seguinte frase que revela seu
caráter e credibilidade:
“Ele foi uma das poucas personalidades quesobreviveram à inimizade e ao preconceito, e recebeuem seus últimos anos todo o respeito de todas asdenominações.”510
3.9. O Ministério Feminino dentro do messianismo de Wesley
Wesley procurou justificar e explicar a ênfase na Perfeição
Cristã, bem como a abertura ao Ministério Feminino como uma
concessão e delegação de Deus ao metodismo, no século XVIII, a
partir de 1738.
“Em 1738, quando Deus começou a sua grandeobra na Inglaterra, comecei a pregar às mesmas horas,verão ou inverno, e não faltaram os ouvintes.”511
Ele chamou a esse momento de “Dispensação Extraordinária da
Providência de Deus.”
O líder do metodismo chegou a essa conclusão, especialmente,
quando percebeu que algumas mulheres poderiam pregar no
metodismo. Deus estava permitindo fazer uma exceção às regras
tradicionais existentes na Inglaterra. Wesley afirmou:
510 Ibidem, p.312.511 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, ibidem, p.138. Em 1738, Wesleyteve a experiência do coração aquecido.
CLXIII
“Não creio que todas as mulheres são chamadaspara falarem em público, nem que todos os homens osão para serem pregadores metodistas; porém,algumas têm um chamado extraordinário para isso, e aidaquela que não o obedece" (documents, 4:171).Wesley aceitou o argumento de um "chamadoextraordinário" reconhecendo que não apenas apregação leiga, mas também 'todo o trabalho de Deuschamado metodismo, era uma 'dispensaçãoextraordinária da providência de Deus.” 512
Não está aqui a primeira abertura ao ministério feminino?
Começando com Susana Wesley513 e continuando com
pregadoras como Mary Bosanquet, Sarah Crosby, Sarah Ryan514 e
outras,515 o metodismo pode ter sido o primeiro movimento religioso a
abrir espaço para o ministério feminino.
“Se Susannah acendeu o pavio do reavivamento,John Wesley abanou a chama até transformá-la numverdadeiro incêndio. Sua praticidade característica tevepapel importante nos reavivamentos, inclusive amodificação de seus pontos de vista sobre aparticipação feminina.”516
512HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 248.513 No Capítulo 3, Seu Ambiente Familiar, é abordado sobre a importância de SusanaWesley no metodismo e na vida de Wesley.514HEITZENHATER, Richard P. , Ibidem, p.249.515 Selina Shirley, Condessa de Huntingdon, apesar de ter se unido ao calvinismo deGeorge Whitefield, é chamada a “rainha do metodismo” pelas suas obras sociais. Eraconhecida pelo título de Lady Huntingdon. Deixou suas propriedades para o sustento desetenta e quatro capelas (Estranha estirpe de audazes, Ibidem, p.83-0).516 GRENZ, Stanley J. Mulheres na Igreja. São Paulo: Candeia, 1997, p.47.
CLXIV
Segundo Stanley J.Grenz, inicialmente, Wesley deu autorização
para as mulheres somente “exortar” e não “pregar”. Contudo, elas
passaram da exortação para a pregação.517
“O sucesso desses esforços finalmente levouWesley a concluir que o chamado da mulher era umfator-chave na determinação desse ministério”.518
Dentro do movimento das Escolas Dominicais, a metodista Ana
Ball se destacou:
“A senhorita Ana Ball, de High Wycombe, éconsiderada a fundadora da primeira Escola DominicalMetodista, no sentido exato do termo. Organizada noano de 1769, a sua escola Dominical funcionou pormuitos anos.”519
A oportunidade concedida às mulheres de pregarem está
também dentro do messianismo520 de Wesley.
Segundo Duncan Reily:
“João Wesley teve a consciência de estar envolvidoem algo extraordinário que o próprio Deus fazia nomundo.”521
517 Ibidem.518 Ibidem.519 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.159-0.520 Aqui deixamos de abordar o tema “ministério feminino” onde só levantamos algumaspossibilidades, para abordar o messianismo em Wesley, que faz parte deste subcapítulo edentro do qual se encontra o próprio ministério feminino.521 REILY, Duncan Alexander. Fundamentos Doutrinários do Metodismo brasileiro, Ibidem,p.47.
CLXV
O próprio resgate da doutrina da perfeição cristã, segundo Reily,
fazia parte da responsabilidade dada por Deus ao metodismo, no
século XVIII:
“A perfeição cristã, cria Wesley, era o depositumque Deus havia entregue aos metodistas como suaresponsabilidade especial.”522
A própria expansão do metodismo, além da Inglaterra, deve ser
vista dentro desse entendimento de Wesley. Em 1746, ele definiu sua
visão da seguinte forma:
“(...) ´um chamado suficiente da Providência´ paranovos lugares, tais como Dublin ou Edinburgo: `1: Umconvite de...um homem sério temente a Deus, que temuma casa para nos receber. 2. A probabilidade defazermos o melhor indo mais adiante, do que ficandomais tempo onde estamos.”523
A participação leiga e todo o trabalho metodista eram visto como
uma dispensação extraordinária da providência de Deus.524
Esse messianismo de Wesley, segundo Max Weber, surge em
oposição à liderança tradicional e à liderança burocrático-legal. Ele se
posiciona e é visto como um instrumento de Deus para consertar o
que está de errado na sociedade.525 E Wesley acreditava ter sido o
metodismo levantado por Deus para mudar a situação vigente, ou
seja, para:
522 REILY, Duncan Alexander. Wesley e sua Bíblia. São Paulo: Editeo, 1997, p.39.523 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 163.524 Ibidem, p.248.
CLXVI
“(...) reformar a nação (...) e espalhar a santidadebíblica sobre a terra.”526
A crise social, na Inglaterra, no século XVIII, como resultado da
Revolução Social, havia criado um ambiente propício para o
surgimento das idéias messiânicas.527 Como afirma Dominique Julia:
“Esses movimentos inscrevem-se em situaçõessociais determinadas: perda da individualidade por umasociedade global, por causa de uma ocupaçãodominante (situação colonial), opressão, no próprio seioda sociedade, das camadas inferiores pela camadasociais privilegiadas, desorganização que ameaça aconfiguração de um equilíbrio e a desestruturação deuma cultura (...).”528
O metodismo do século XVIII trazia, portanto, em sua origem
ideais messiânicas, que o motivou a prosseguir em sua caminhada. A
chamada Dispensação Extraordinária da Providência de Deus, entre
ela, a oportunidade de pregar às mulheres, nada mais é do que essa
visão messiânica.
525 QUEIRÓZ, Maria Isaura.O messianismo no Brasil e no mundo. Editora Alfa-Omega,1977, p.26-9.526 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 230.527 No 2º capítulo é abordado sobre os diversos movimentos espirituais que surgiram naInglaterra, especialmente entre os séculos XVI e XVIII.528 DOMINIQUE, Julia. História: Novas Abordagens. [s.ed.], [s.d.], p.115. Maria IsauraPereira de Queiróz afirma que essa situação pode levar “à concepção do reino ideal queum enviado divino instalará no mundo” (O Messianismo no Brasil e no mundo. EditoraAlfa-Omega, 1977, p.26-7).
CLXVII
4- A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE METODISTA
“Olhai ao vosso redor, não podeis ser admitidos naIgreja ou Sociedade dos Presbiterianos, Anabatistas, senão aceitardes as mesmas opiniões deles, e vosconformardes com a mesma adoração. Só osMetodistas é que não insistem em que tenhais asmesmas opiniões, mas pensam e deixam pensar.” 529
João Wesley
Este capítulo pretende mostrar as raízes da formação da
identidade metodista,530 as doutrinas que moveram Wesley e os
529 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.210.530 Na parte introdutória, já abordamos sobre o conceito de identidade. Relembramos aafirmação de Magali do Nascimento Cunha no livro Forjando uma Nova Igreja: ”Nunca sefalou tanto em identidade na Igreja Metodista (...). Falar de identidade e tentar reafirmá-laé próprio dos momentos de crise, seja individual ou coletiva (...). identidade não sepreserva; identidade é um processo incessante de construção: (...). Significa reler opassado com os olhos num processo de construção identificando o que foi criado nopassado (os traços de identidade que ficam e os que foram abandonados), o que estásendo criado no presente (frente aos desafios da realidade) e somar tudo isso ao projetofuturo (como o que ainda não é que desafia o presente e o passado” (cf. CASTRO, ClovisPinto de - CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma Nova Igreja, São Paulo, Editeo,2001, p.63-5). O Colégio Episcopal reafirmou no Concílio Geral, em julho de 2001, aimportância da nossa identidade:“(...) somos desafiados/as a fortalecer a configuração danossa identidade e o sentido de nossa finalidade – a vocação para a qual fomos
CLXVIII
principais líderes do movimento que influenciou a classe operária
inglesa e a vida religiosa na Inglaterra. Este capítulo é o coração da
tese, onde estão expostos algumas das idéias, conceitos e doutrinas
que levaram o metodismo a ser um forte movimento espiritual no
século XVIII, especialmente na Grã-Bretanha e na América do Norte.
São diversas as heranças doutrinárias que influenciaram na
formação do metodismo. Wesley herdou desde sua formação familiar
o paradigma da santidade ou perfeição531. Sua visão tendia sempre
para este lado. Em seu Diário, em 1765, ele cita as leituras dos livros
Santo viver e morrer, do Bispo Taylor, em 1725, e Perfeição Cristã, de
Law, em 1927, quando ele tomou a decisão de ser inteiramente
devotado a Deus.532
Wesley encontrou, especialmente no Pietismo, Puritanismo e
Arminianismo uma forte base para sustentar suas pregações e
práticas visando a santificação.
Wesley não teve a intenção de criar a Igreja Metodista533. Nada
foi programado para se criar uma nova Igreja na Inglaterra do século
chamados” (COLÉGIO ESPISCOPAL. “O futuro do metodismo no Brasil” em Avante, Riode Janeiro, Fé&Nexo, agosto 2001, p.3).531 Em seu livro Explicação Clara da Perfeição Cristã, publicado pela Imprensa Metodista,1984, Wesley afirma: “Convém observar que este sermão foi o primeiro de todos os meustrabalhos a ser publicado. Este era o conceito de religião que tinha e não hesito emchamá-la pelo termo Perfeição” (Ibidem, p.11).532 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.215.533 No seu diário, em 2 de janeiro de 1787, Wesley comenta sobre um fato em Depford:”(...) A maioria dos homens de influência na Sociedade se achava zangada porque queriaseparar-se da Igreja. Esforcei-me para raciocinar com eles, mas em vão; não tinha bomsenso nem até boas maneiras. Finalmente, depois duma reunião de toda a Sociedade, eulhes disse: ’Se vós estais resolvidos, podereis ter culto nas horas da Igreja; mas ficaisabendo que dessa hora e m diante, não vereis mais a minha face’. Esta expressão feriu
CLXIX
XVIII, nem Wesley se rebelou contra a Igreja Anglicana.534 Em seu
diário, ele escreveu sobre a posição doutrinária metodista, referindo-se
ao diálogo com um clérigo anglicano:
“Um clérigo sério desejava saber em que pontosnós (os Metodistas) nos diferenciávamos da IgrejaAnglicana? Respondi: ´que eu saiba, em nada; asdoutrinas, que nós pregamos, são as doutrinas daIgreja Anglicana; deveras, as doutrinas fundamentais daIgreja se encontram tanto nas orações como nos artigose homilias.”535
Para alguns estudiosos do metodismo,536 foi o Espírito Santo
quem moveu corações e abriu as portas para o surgimento do
Movimento ou Avivamento Metodista. No centro do avivamento está a
vida:
“(...) avivar significa trazer-se novamente à vida.Ilustrativamente significa fazer uma pessoa morta amassagem cardiológica necessária para voltarem osbatimentos do coração (...) É algo semelhante aonarrado em Ezequiel 37.1-14. A ação do Espírito divinono vale de ossos secos, simbólico ao povo de Israel.” 537
profundamente; também daquela hora em diante não se ouviu mais acerca da separaçãoda Igreja” (WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.208).534 Mateo Lilièvre, em seu livro João Wesley - sua Vida e Obra, p.349, cita diversosautores que realçam o caráter de Wesley. Uma de suas citações é de Lecky, historiadoringlês, séc. XVIII, onde ele diz que "nada mais injusto do que atribuir a Wesley a ambiçãodo cismático ou os instintos subversivos do revolucionário" (England Intre EighthenthCentury, tomo II, p.632).535 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.36.536Na Introdução citamos opiniões de diversos historiadores e teólogos sobre o revival, oreavivamento ou avivamento metodista no século XVIII.537LEITE, Nelson Luiz Campos. Como alcançar o genuíno avivamento. Exodus Editora,1997, p.19. Báez Camargo afirma que “o metodismo não foi outra coisa, senão aexpressão do ímpeto de constante renovação espiritual (...) O avivamento evangélico doséculo XVIII; tal é a expressão de que se servem os historiadores para designar ometodismo” (Gênio e Espírito do Metodismo Wesleyano. São Paulo: Imprensa Metodista,1986, p.17). Welliston Walker fala em “Reavivamento na Igreja Católica” e “ReavivamentoEvangélico na Grã-Bretanha” (História da Igreja Cristã. 2 v. ibidem, p.102 e 201). A
CLXX
Mas o que foi o avivamento metodista?
Segundo Gonzalo Baez Camargo, o movimento metodista foi,
antes de tudo, um avivamento evangelístico:
“O quer dizer isto? Simplesmente um retorno àexperiência e doutrina da salvação pela graça livre euniversal de Deus, em Cristo Jesus e ao gênero (tipo)de vida e obras cristãs que procedem dessaexperiência.”538
Wesley interpretava teologicamente esse mover do Espírito como
tendo objetivos claros. Em 1762, ele escreveu:
“O dia de Pentecostes não chegou ainda na suaplenitude; mas não duvido que venha; e então vocêverá tantas pessoas santificadas como justificadas.”539
O Avivamento Metodista ocorreu dentro de uma grave crise
social, na Inglaterra, com a Revolução Industrial540 e não foi um
expressão “aviva” e depois “reaviva” foi retirada de Habacuque 3.2: “ Aviva a Tua obra, óSenhor”.538 CAMARGO, Gonzalo Baez. O desafio de João Wesley aos metodistas de hoje. SãoPaulo:Setor Gráfico do I.M.S., Terceira Região Eclesiástica, maio de 1986, p.4.539 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.130.540 No Contexto Político, Contexto Social e Contexto Religioso, no Capítulo 2, abordamosem que ambiente ocorreu o avivamento metodista.
CLXXI
movimento isolado. Havia também um mover do Espírito541 em
diversas partes, como em Gales e na Escócia, na década de 1730. 542
As experiências de santificação no meio do povo metodista 543
confirmavam e motivavam Wesley a prosseguir na caminhada de
transformar a sociedade, Igreja e espalhar a santidade bíblica. Em
1757, ele registrou em seu Diário um dos casos em que alguém
alcançou a perfeição cristã:
“Conta, peço-te, dize a todos que a perfeição éconseguível, e exorta a todos que a busquem (...)”.544
Casiano Floristán e Juan José Tamayos afirmam que a
experiência religiosa traz mobilização:
“(...) são experiências cujo conteúdo supera emmuito a capacidade de expressão do sujeito (...) É umaexperiência de alguma maneira imediata (...) uma
541FLORISTÁN,Casiano; TAMAYOS, Juan José.Conceptos fundamentales delcristianismo. Ibidem, p.485). Dentro da experiência carismática, os estudiosos afirmam:“(...). Nesse sentido interpreta a teologia de tais experiências como experiências derevelação através das quais Deus têm conduzido a humanidade a um melhorconhecimento de sua existência, sua vontade e seu desígnio para com os homens”(Ibidem., p.487).542Desde 1670, as sociedades religiosas haviam feito sérias tentativas de ter umreavivamento espiritual. O reavivamento de Gales começou em meados da década de1730 e um reavivamento procedeu Wesley tanto em Cornwall como na Escócia(HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.97).543 Wesley cita em seu diário vários exemplos de pessoas que haviam alcançado aperfeição cristã, entre elas, miss Berresford. Ela é citada como modelo de piedade e deatividade. Sua palavra: “Conta, peço-te, dize a todos que a perfeição é conseguível (...)Manda dizer ao Sr. W. que sinto não ter crido mais cedo na doutrina da perfeição cristã(Ibidem, p.125-6)”.544 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.125.
CLXXII
enorme capacidade de mobilização de todas asfaculdades do sujeito.” 545
Por mais que tenha havido uma participação ampla, muito se
deve ao gênio organizador de Wesley.546
Dentro do tema da tese – avivamento e compromisso social - essa
visão messiânica e prática de Wesley o levaram a experimentar
diversos avivamentos no meio do povo chamado metodista, que teve
como conseqüência um compromisso social com o povo inglês dentro
da revolução industrial que ocorria na Inglaterra. As chamadas Obras
de Misericórdia ensinada por Wesley eram praticadas por aqueles que
tinham fé.547
Dentro da compreensão de Wesley, todos os que eram justificados
pela fé deveriam ser zelosos de boas obras548 e para haver
santificação, o que creu deveria praticar boas obras. E as obras
necessárias à santificação deveriam ser as Obras de Piedade e Obras
de Misericórdia.549
Toda essa dinâmica é obra do Espírito Santo:
545FLORISTÁN,Casiano; TAMAYOS, Juan José.Conceptos fundamentales delcristianismo. Ibidem, p.485546 O mesmo Mateo Lelièvre diz que "Wesley era ainda mais organizador que pregador, etão grandioso nesse sentido que nenhuma outra pessoa de seu século se iguala a ele"(Ibidem, p.354). Richard Heitzenhater afirma que Wesley tinha a habilidade de prosperarem períodos de crise e confusão (Wesley e o Povo Chamado Metodista, Ibidem.p.48).547 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v., ibidem, p.352.548 Ibidem, p.352.549 Ibidem, p.354. Obras de Piedade consistiam em oração, participar da Ceia do Senhor,estudar as Sagradas escrituras, jejuar, etc. As Obras de Misericórdia consistiam em vestiros nus, alimentar os famintos, visitar aos presos, dar pousada ao peregrino, etc.
CLXXIII
“O Espírito lhes ensina a amar a Deus e ao próximocom um amor que é semelhante a uma ‘fonte que jorrapara a vida eterna”. 550
A herança doutrinária colocou um firme alicerce no movimento
metodista do século XVIII. Wesley soube reter o que era bom dos
diversos movimentos e grupos.
Mas quais foram os movimentos espirituais que deram ao
metodismo suas principais ênfases doutrinárias?
4.1. A herança doutrinária
João Wesley foi influenciado em sua prática espiritual pelo
Arminianismo,551 Puritanismo, Moravianos e Pietismo, que enfatizavam
mais o aspecto emocional, o moralismo e a vida devocional com Deus.
Dentro das contribuições da época para a formação da identidade
metodista estes grupos tiveram uma parcela importante na vida dos
primeiros líderes
“A busca de Wesley, durante esse período, de umacompreensão mais significativa das exigências do vivercristão, o levou finalmente a englobar o perfeccionismodos pietistas, o moralismo dos puritanos e a devoçãodos místicos, numa abordagem pragmática que elesentia poder operar dentro da estrutura e da doutrina daIgreja da Inglaterra.”552
550 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 1 v., ibidem, p.163.551 SALVADOR, José Gonçalves. Arminianismo e Metodismo. São Paulo:ImprensaMetodista, JGEC, [s.d.], p. 19-28.552 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 31.
CLXXIV
Mas também foi grande a influência do anglicanismo na vida de
Wesley e dos primeiros metodistas. No amadurecimento do
movimento, as Conferências Anuais foram importantes na formação e
estruturação das idéias.
4.1.1. A herança Arminiana
A expressão arminianismo vem de Jacob Armínius (1560-1609).
Ele nasceu nos Países Baixos (Holanda) num contexto de tradição
calvinista.553 Estudou Teologia, Filosofia, Hebraico, Literatura e outras
disciplinas. Pastoreou uma igreja em Amsterdã.554 Ao ser chamado
para defender o calvinismo extremado criticado pelo rico negociante
Koornher, Armínius acabou criticando a doutrina da predestinação
trazendo uma grande polêmica e criando inimigos, como Franz
Gomarus,555 que dava ênfase na soberania de Deus e negava o valor
da fé do ser humano.
No conceito de Armínius:
“(...) a predestinação ia de encontro à natureza deDeus e a do homem, gerava desespero, tirava oestímulo para uma vida de santidade e diminuía aimportância do Evangelho.”556
553 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 134. O primeiro a reagir ao rigor calvinista foi o eruditoholandês Dirck Coornhert (1522-1590), entretanto essa reação alcançou expressão plenacom Jacó ou Jacobus Arminius.554 SALVADOR.José Gonçalves. Arminianismo e Metodismo, Ibidem, p.22.555 Ibidem, p.28.556 Ibidem.
CLXXV
Entre as declarações de fé do calvinismo, na Confissão de
Westminster,557 estava a doutrina da predestinação:
“Pelo decreto de Deus, para a manifestação de suaglória, alguns homens e anjos são predestinados para avida eterna e outros preordenados para a morte eterna.Ninguém é redimido por Cristo senão somente oseleitos. O resto da humanidade aprouve a Deus (...)deixá-la de lado e ordená-la para a desonra e para a ira(...).”558
O fato é que o rigor do calvinismo havia produzido reações,
especialmente na Holanda e com Jacob Armínius559 ela alcançou
expressão plena.560
Depois da morte de Arminius, João Wtenbogaert (1557-1644) e
Simão Episcopius (1583-1643) sistematizaram e desenvolveram
opiniões arminianas e se opuseram à ênfase corrente sobre minúcias
de doutrina, considerando o cristianismo primordialmente uma força
para a transformação moral. Em 1610 eles e outros quarenta e um
simpatizantes redigiram uma declaração de fé contrariando a doutrina
calvinista da predestinação.561
“Em oposição à doutrina calvinista da graçairresistível, ensinavam que a graça pode ser rechaçada,e, mostravam incerteza com referência ao ensino
557 A Confissão de Westminister foi redigida em 1643 pela Assembléia de Clérigos ao qualfora confiada a tarefa de organizar o New Establishment (BETTENSON, Henry.Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: Imprensa Metodista, ASTE, 1967, p.278).558BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: Imprensa Metodista,ASTE, 1967, p. 278-9.559 Também chamado de Jacobus Arminius (BETTENSON, Henry. Documentos da IgrejaCristã, Ibidem, p. 305).560 WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. São Paulo: ASTE, 1967, p. 15.561 Ibidem, p.135.
CLXXVI
calvinista da perseverança dela, assegurando serpossível perder a graça uma vez recebida.”562
O Sínodo de Dort563 condenou os pontos de vista do
arminianismo e adotou cânones com tom bem calvinista, que se
tornou a base doutrinal da Igreja holandesa. Os remonstratenses
foram banidos.564
Jacob Armínius não trouxe tanta influência na Holanda, mas sim
na Inglaterra de Wesley.565 Outras pessoas seguiram seus passos,
entre elas, o Bispo Burnet:
“O Bispo Burnet, em 1699, deu novo impulso àstendências arminianas, quando publicou suas obrasExposição dos Trinta e Nove Artigos, dedicadas ao reiGuilherme III. Nela, ao interpretar o Artigo XVIII, quetratava da Predestinação, deu-lhe sentido arminiano elhe atribuiu igual validez ao calvinista.”566
562 Ibidem.563 O Sínodo de Dort, 1618, condenou os pontos de vista dos arminianos, que foramobrigados a deixar a Igreja Reformada. Nos “Cinco Artigos” condenados pelo Sínodo estádito: I. Que Deus, por um eterno e imutável plano em Jesus Cristo, seu Filho, antes quefossem postos os fundamentos do mundo, determinou salvar, de entre a raça humanaque tinha caído no pecado – em Cristo, por causa de Cristo e através de Cristo (...). II.Que, em concordância com isto, Jesus Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos(...). III. Que o homem não possui por si mesmo a graça salvadora (...) mas que énecessário que por Deus em Cristo e através de seu Santo espírito seja gerado de novoe renovado em entendimento, afeições e vontade (...). IV. Que esta graça de Deus é ocomeço, a continuação e o fim de todo o bem; de modo que nem mesmo o homemregenerado pode pensar, querer ou praticar qualquer bem, nem resistir a qualquertentação para o mal sem a graça precedente (ou preveniente) que desperta, assiste ecoopera (...). V. Que aqueles que são enxertados em Cristo por uma verdadeira fé, e queassim foram feitos participantes de seu vivificante Espírito, são abundantemente dotadosde poder para lutar contra Satã, o pecado, o mundo e sua própria carne, e de ganhar avitória (...). (BETTENSON, Henry, Ibidem, 305-6).564 WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. São Paulo: ASTE 1967, p. 136.565 Ibidem.
CLXXVII
O bispo George Bull, em 1699, defendeu e escreveu sobre as
idéias de Armínio e teve grande aceitação, especialmente através de
sua obra Exposição dos Trinta e Nove Artigos, dedicada ao Rei
Guilherme III:
“Nela, ao interpretar o Artigo XVII, que trata daPredestinação, deu-lhe sentido arminiano e lhe atribuiuigual validez do calvinismo. Quer dizer que tantoimportava um quanto o outro. Ambos podiam seraceitos. Havia lugar na Igreja para as duas posições.”567
Os avós de Wesley568 participaram da Igreja dissidente, mas seus
pais se filiaram à Igreja Anglicana. Samuel e Susana Wesley
inculcaram em João Wesley idéias da Harmonia Apostólica569 do
bispo Bull, que teve grande aceitação na Inglaterra.
“A teologia de Bull generalizou-se, pois no seio da IgrejaOficial e para termos noção da mesma, daremos, a seguir,breve apanhado: Jesus Cristo, por Sua obra expiatória, é oSalvador dos homens, mas cada qual tem a sua parte afazer, procurando ativamente reformar a própria vida. Secada um agir desse modo, tornar-se-á capaz de receberméritos da expiação. Fé e obra são identificadas numa sófinalidade. A justificação é pela fé e pelas obras. São doisaspectos de uma só realidade. Nem Paulo se opõe a Tiago enem Tiago a Paulo. No conceito do bispo Bull, a fé incluitodas as obras da piedade cristã. A fé não se limita só aaceitar como válidos os ensinos do Evangelho: envolve,também, desejo de ser bom e de fazer o bem. Noutraspalavras: a fé passa a ser ato do próprio homem” (...)..Ajustificação exige, igualmente, a copartipação do homem.Deus considera ao transgressor como justo, livre da pena,desde que este assim queira”.570
566 SALVADOR, José Gonçalves. Arminianismo e Metodismo. São Paulo: IgrejaMetodista do Brasil, [s.d], p. 51.
567 Ibidem.568 Ibidem, p.63.569 Ibidem., p.61-2.
CLXXVIII
Os irmãos Wesley seguiram muito de perto diversos conceitos
teológicos do arminianismo,571 entre eles, o livre arbítrio572 e a graça
preveniente.573
Seguindo o arminianismo, para Wesley a doutrina da
predestinação é contrária ao espírito da Bíblia e destrói os atributos de
justiça, misericórdia e verdade de Deus e o coloca pior do que o
demônio. Segundo ele:
“A predestinação representa o mais santo Deuscomo pior do que o demônio, mais falso, mais cruel emais injusto.”574
Sobre o livre arbítrio, o 8º Artigo de Religião explica:
“A condição do homem, depois da queda de Adão,é tal que ele não pode converter-se e preparar-se peloseu próprio poder e obras, para a fé e invocação deDeus; portanto, não temos forças para fazer boas obrasagradáveis e aceitáveis a Deus sem a sua graça porCristo, predispondo-nos para que tenhamos boa
570 Ibidem., p.62.571 WALKER, John. A História do Avivamento Morávio. Goiás: [s.ed.]. 1978, p. 2.572“Armínio discordava tanto de Agostinho como de Calvino, quando negava ter o homemficado reduzido pelo pecado à inatividade. Houve algo que o homem não perdeu. Aindalhe resta a capacidade de responder à graça de Deus e aceitá-la ou recusá-la. Noutraspalavras: ainda possui liberdade e volição e, assim, é responsável pela sua decisão”(SALVADOR, José Gonçalves, Ibidem, p.41).573 No IV artigo de Jacobus Arminius, condenado pelo Sínodo de Dort, está dito:” Que estagraça de Deus é o começo, a continuação e o fim de todo o bem; de modo que nemmesmo o homem regenerado pode pensar, querer ou praticar qualquer bem, nem resistira qualquer tentação para o mal sem a graça precedente (ou preveniente) que desperta,assiste e coopera (...). Que aqueles que são enxertados em Cristo por uma verdadeira fé,e que assim foram feitos participantes de seu vivificante Espírito, são abundantementedotados de poder para lutar contra Satã, o pecado, o mundo e sua própria carne, e deganhar a vitória (...)”.574 BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert E. Coletânea da Teologia de João Wesley.Ibidem, p. 54.
CLXXIX
vontade e operando em nós quando temos essa boavontade.” 575
Mas qual ênfase doutrinária proclamada pelo Arminianismo que
cooperou para o Avivamento ou compromisso social metodista?
Dentro da compreensão de Wesley, o livre arbítrio é fundamental
para que ocorra avivamento e compromisso social.
O livre arbítrio dentro da identidade metodista leva o ser humano
a uma dependência da graça de Deus, o incentiva a sair de sua
situação pecaminosa, crescer espiritualmente e a alcançar a perfeição
cristã. O livre arbítrio motiva o ser humano a buscar mais a Deus e a
amar ao próximo. Ao contrário de levar a resignação, ele é motivado
a lutar. Wesley afirma:
“Lutemos constantemente por desembaraçarmos-nos de todas as coisas inúteis que nos rodeiam. Deusgeralmente suprime das nossas almas assuperficialidades na mesma proporção que nós aeliminamos do nosso corpo. A melhor maneira deresistir ao diabo é destruir qualquer coisa do mundo quepermanece em nós (...).576
Dentro do tema da tese – avivamento e compromisso social – o
livre arbítrio motiva a buscar o Espírito Santo e a ser solidário com os
que sofrem. Segundo Wesley, os frutos imediatos do Espírito na vida
do cristão, são:
575 CÂNONES da Igreja Metodista, Ibidem, p.36.
CLXXX
“amor, alegria, paz, coração misericordioso,humildade de espírito, mansidão, doçura,longanimidade. Es os frutos exteriores são: fazer o bema todos os homens, não fazer mal a ninguém e andarna luz, guardando uma obediência zelosa, uniforme, atodos os mandamentos de Deus.”577
O arminianismo influenciou tanto a Wesley que a partir de 1778 a
sua revista passou a se chamar A Revista Arminiana.578
Para ele, a graça é livre e alcança a todos. Não depende dos
méritos humanos. O ser humano decide aceitá-la ou não. Pela fé nos
apropriamos dos méritos de Jesus.579 A fé é a única condição
necessária para a salvação. Mas esta fé não é obra humana. Provém
da graça de Deus. Ele completa:
“(...) a graça de Deus da qual nos vem a salvação égratuita em tudo e para todos.”580
4.1.2. A influência Anglicana
Se João Wesley e os primeiros metodistas discordavam, em
parte, da Igreja Anglicana e criam que Deus os havia levantado,
inclusive, para mudar esta Igreja, ela deixou uma grande influência na
estrutura e na base doutrinária do metodismo.
576 WESLEY, João. Explicação clara da Perfeição Cristã, ibidem, p.125.577 ______. Sermões de Wesley. 1 v., ibidem, p.213.578 “A revista wesleyana passou a denominar-se, desde 1778, ‘A Revista Arminiana’ (TheArminian Magazine). É digno de nota que o primeiro artigo publico no volume de 1792 é atradução do escrito de Armínio, intitulado ‘O julgamento de Armínius acerca dos decretosdivinos’ (SALVADOR, José Gonçalves, Ibidem, p.77)”.579 BURTNER, Robert W. ; CHILES, Robert E.,Ibidem, p. 160.
CLXXXI
A Igreja Anglicana surgiu em 1534 por vontade do rei Henrique
VIII, que se separou da Igreja Católica para obter o divórcio e se
casar de novo para ter um herdeiro. Ele havia se casado secretamente
em 25 de janeiro de 1533 com Ana Bolena. O Papa Clemente VII
preparara uma bula ameaçando o rei de excomunhão em 11 de julho
de 1533.581
“A resposta do rei foi uma série de leis obtidas em1534 do parlamento. Por elas foram proibidos quaisquerpagamentos ao papa; todos os bispos seriam eleitospor indicação do rei; todos os juramentos de obediênciaao papa, licenças romanas e outros reconhecimentosda autoridade papal eram nulos.”582
O Parlamento inglês aprovou o "Ato de Supremacia"
reconhecendo o rei como o único cabeça da Igreja na Inglaterra e não
mais o papa. O rei elaborou dez artigos de religião, uma espécie de
credo, mas quando ele morreu a Inglaterra ainda tinha muito do
catolicismo.583
Os antepassados de João e Carlos Wesley foram anglicanos. O
pai, Samuel Wesley, foi pastor na Igreja da Inglaterra. Wesley foi
ordenado sacerdote e serviu em Epworth durante três anos, ajudando
seu pai. Por isso, também havia um respeito grande pela Igreja de
origem, tanto que João e Carlos Wesley lutaram contra a separação e
morreram anglicanos.
580 Ibidem, p. 147.581 WALKER, Welliston, Ibidem, p.83.582 Ibidem.583 Ibidem, p. 84.
CLXXXII
Dos 39 Artigos de Religião da Igreja oficial, os metodistas
deixaram 25 como parte da base doutrinária. Entre algumas dessas
ênfases doutrinárias, resumidamente citamos:
Nos 25 Artigos de Religião, que formam basicamente a herança
doutrinária que o metodismo herdou do anglicanismo, estão: (1) Da fé
na Santa Trindade; (2) Do Verbo ou Filho de Deus que se fez
verdadeiro Homem; (3) Da ressurreição de Cristo; (4) Do Espírito
Santo;584 (5) Da suficiência das Santas Escrituras para a salvação; (6)
Do Antigo Testamento; (7) Do pecado original;585 (8) Do livre arbítrio;
(9) Da justificação do homem; (10) Das boas obras; (11) Das obras de
superrogação;586 (12) Do pecado depois da justificação; (13) Da Igreja;
(14) Do purgatório;587 (15) Do falar na congregação em língua
584 Este artigo 4º afirma: “O Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho, é da mesmasubstância, majestade e glória com o Pai e com Filho, verdadeiro e eterno Deus”(CÂNONES da Igreja Metodista, Ibidem, p.34).585 Este artigo diz : “O pecado original não está em imitar Adão, como erradamente dizemos Pelagianos, mas é a corrupção da natureza de todo descendente de Adão, pela qual ohomem está muito longe da retidão original e é de sua própria natureza inclinado ao mal eisto continuamente” (CÂNONES da Igreja Metodista, Ibidem, p.36). “Pelágio era ummonge inglês, possivelmente, de origem irlandesa. Em 400 veio a Roma e ficou chocadocom o baixo nível da península itálica. Achando que havia necessidade de um esforçomoral mais acentuado, chocou-se com a oração de Santo Agostinho: ‘Concede-me,Senhor, o que tu exiges, e manda o que for de teu agrado. ’Sua doutrina, parece não Terprovocado distúrbios antes de sua ida `a África após o saque de Roma” (BETTENSON,Henry. Documentos da Igreja Cristã, ibidem, p.87).Ele acredita que o homem podiapermanecer sem pecado. Com isso, ele dizia glorificar a Deus “já que reconhecemos quedEle nos vem esta dádiva e este poder” (BETTENSON, Henry, Ibidem, p.88).586 Obras de superrogação significa: “As obras voluntárias que não se achemcompreendidas nos mandamentos de Deus, as quais se chamam de obras desuperrogação, não se podem ensinar sem arrogância e impiedade; pois, por elas,declaram os homens que não só rendem a Deus tudo quanto lhe é devido, mas tambémde sua parte fazem ainda mais do que devem, embora Cristo claramente diga: ´Quandotiverdes feito tudo o que se vos manda, dizeis: Somos servos inúteis” (CÂNONES daIgreja Metodista. Ibidem, p.37).587 Este 14º artigo afirma: “A doutrina romana do purgatório, das indulgências, veneraçãoe adoração, tanto de imagens de relíquias, bem como a invocação dos santos, é umainvenção fútil, sem base em nenhum testemunho das Escrituras e até repugnantes à
CLXXXIII
desconhecida; (16) Dos Sacramentos; (17) Do batismo; (18) Da Ceia
do Senhor; (19) De ambas as espécies; (20) Da ablação única de
Cristo sobre a cruz; (21) Do casamento dos ministros; (22) Dos ritos e
cerimônias da Igreja; (23) Dos deveres civis dos cristãos; (24) Dos
bens dos cristãos; (25) Do juramento do cristão. 588
As chamadas Fontes do Conhecimento Espiritual 589 como
critério para a compreensão da verdade espiritual tiveram como ponto
de partida o anglicanismo:
“À típica trilogia anglicana de autoridade (Escritura,tradição cristã, razão) ele acrescentou a experiênciahumana direta da realidade divina como um critérioimportante para a compreensão da verdade divina.”590
Segundo Manfred Marquardt:
Palavra de Deus (CÂNONES da Igreja Metodista. São Paulo: Associação ReligiosaImprensa da Fé, 1998, p. 38)588 CÂNONES da Igreja Metodista. Ibidem, p.33-43.589 Além da Tradição Cristã, Razão, Escritura e Experiência Espiritual, a Criação Naturaltambém estava incluída nas Cinco Fontes do Conhecimento Espiritual. Para Wesley,“Toda Escritura é inspirada por Deus” (BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert E., Ibidem,p.20). Sobre a importância da razão, ele diz: “o Filho de Deus começa a sua obras nohomem capacitando-nos a crer nele. Ele abre e alumia os olhos de nosso entendimento”(Ibidem,p.23). Segundo Wesley, o Testemunho do Espírito, a Experiência Espiritual é “aevidência mais forte da verdade do cristianismo” (Ibidem, p.30). Sobre a importância datradição cristã, ele diz: “ (...) Clemente Romanus, Inácio, Policarpo, Justino Mártir, Irineu,Origenes, Clemente Alexandrinus, Cipriano, aos quais eu acrescentaria Macarius e EfraimSyrus (...). Reverencio muito estes cristãos com todas as suas falhas porque vejo tãopoucos cristãos atualmente; porque leio tão pouco nos escritos dos últimos tempos e ouçotão pouco de cristianismo genuíno, e porque a maioria dos cristãos modernos (assimchamados) não contentes com o serem totalmente ignorantes a respeito do cristianismotêm profundos preconceitos contra ele chamando-o ‘entusiasmo’ e não sei mais o que”(BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert, Ibidem, p.35-6). Sobre a Criação Natural,Wesley diz: “Assim todas as partes da natureza nos conduzem ao Deus da natureza”(Ibidem, p.37).590 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 320.
CLXXXIV
“Escritura, razão e experiência tornaram-se, cadavez mais, o lema de Wesley para a autoridade nafé.”591
Sobre a importância da experiência, que Wesley chamava
também de Testemunho do Espírito, 592ele escreveu:
“Supõe-se geralmente que a evidência tradicionalse enfraquece com o passar do tempo visto que ela temnecessariamente de passar por muitas mãos numacontínua sucessão de épocas. Mas nenhuma extensãode tempo pode possivelmente afetar a força daevidência interna. Ela é igualmente forte e nova atravésdo curso.”593
Para Wesley religião e razão devem caminhar juntas,594 mas para
ele a razão não pode dar fé, esperança, amor ou produzir virtudes.595
“Somente ele pode dar aquela fé que é a‘evidência’ e a convicção ‘das coisas não vistas’.Somente ele pode fazer-nos gozar a esperança viva deuma herança eterna nos céus, e só ele pode ‘derramaro seu amor no vosso coração pelo Espírito Santo quevos é dado.”596
A justificação ocupou lugar central na pregação metodista. Este
tema provinha dos escritos dos reformadores e indiretamente da Igreja
Anglicana. 597
591 MARQUARDT, Manfred. Redescobrindo o Sagrado. São Paulo: Editeo, 2000, p.18.592 BURTNER Robert; CHILES, Robert, Ibidem, p.29.593Ibidem, p. 31.594 Ibidem, p.25.595 Ibidem, p.27.596 Ibidem.597 KLAIBER Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p.270.
CLXXXV
No 9º Artigo de Religião dos Metodistas, que foi retirado dos 39
Artigos de Religião da igreja Anglicana, a justificação é assim definida:
“Somos reputados justos perante Deus somentepelos merecimentos de nosso Senhor e Salvador JesusCristo, por fé e não por obras ou merecimentos nossos;portanto, a doutrina de que somos justificados somentepela fé é mui sã e cheia de conforto”. 598
Para Wesley a justificação é o mesmo que perdão e libertação da
culpa e do castigo.
“Esta é, pois, a salvação pela fé, mesmo no mundopresente; salvação do pecado e das conseqüências dopecado, expressas com freqüência pela palavrajustificação, a qual, tomada em sentido mais lato,implica na libertação da culpa e do castigo, pelapropiciação de Cristo atualmente aplicada à alma dopecador (...).599
Mas em que sentido as ênfases doutrinárias da igreja Anglicana
contribuíram com o avivamento ou compromisso social do metodismo?
Entre essas ênfases está a justificação, que leva ao novo
nascimento e inicia o processo de santificação600. E entre os sinais do
novo nascimento está o amor, que é derramado em nossos corações
pelo Santo Espírito.601 Ao próximo deve ser ministrado esse amor, que
proporciona ao cristão compromisso social. Segundo Wesley:
598 CÂNONES da Igreja Metodista, Ibidem, p.37.599 WESLEY, João. Sermões de Wesley. Tradutor Nicodemus Nunes. v 1. São Paulo:Imprensa Metodista, 1953, p.36.600 Ibidem, p.112.
CLXXXVI
“Os frutos necessários desse amor de Deus são oamor a nosso próximo – a toda alma que Deus criou,não excetuando nossos inimigos (...)”.602
Após a justificação, a dinâmica das Obras de Misericórdia, bem
como as Obras de Piedade, são também necessárias para que haja
santificação. Wesley diz:
“E cabe a todos os que são justificados seremzelosos de boas obras. Estas são tão necessárias quese o homem voluntariamente as negligenciar, nãopoderá razoavelmente esperar que jamais sejasantificado (...)”. 603
Só após a morte de João Wesley é que oficialmente o metodismo
se separou do anglicanismo.604
“Os metodistas wesleyanos separaram-se da IgrejaEstabelecida aos poucos e, por fim, somente após amorte de John Wesley (1791), que desejava que seusseguidores evitassem a separação.”605
Em 1784 dois importantes passos foram dados para o
rompimento:
“Em 28 de fevereiro Wesley, por um ‘Ato deDeclaração’, cuidou da continuação do movimento apósa sua morte, nomeando uma ‘Conferência’ de cemmembros para zelar pelas propriedades e assumir adireção do movimento. Foi um passo avante noautogovêrno do metodismo. Em 1º de fevereiro Wesleyjuntou-se a outros presbíteros da Igreja da Inglaterrapara ordenar presbíteros e um superintendente para aAmérica. Na verdade, isto foi um rompimento com a
601 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 1 v., ibidem, p.376.602 Ibidem, p.377.603 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v., ibidem, p.252.604 WALKER, Welliston,.Ibidem, p.214.605 Ibidem.
CLXXXVII
igreja da Inglaterra, ainda que Wesley não oconsiderasse como tal.”606
Em 1795, através do “Plano de Pacificação”,607 o metodismo
tentou resolver as tensões através da aprovação de um documento.608
Ele permitia que o sacramento fosse ministrado aonde a liderança
local aprovasse. O Plano foi um reconhecimento da separação
eclesiástica entre metodistas e anglicanos, o controle da Conferência
sobre o metodismo.609
4.1.3. A herança do Pietismo
O Pietismo foi um rompimento com as tendências escolásticas
do luteranismo alemão, que havia assumido uma interpretação
606 Ibidem.607 O Plano de Pacificação determinava: “O sacramento da ceia do Senhor não seráadministrado em qualquer capela a não ser que o permitam a maioria dos depositáriosdesta capela, dos ecônomos e líderes dela (sendo eles os mais qualificados para darem aopinião do povo). Contudo, em todos os casos se deverá obter primeiramente oconsentimento da Conferência... Previsto que, em todas as capelas em que a ceia doSenhor já tem sido pacificamente administrada a sua administração continuará para ofuturo... Concordamos em que a Ceia do Senhor seja administrada entre nós somente nosdomingos à tarde, exceto lá onde a maioria dos ecônomos e líderes desejarem que seja,nos horários eclesiásticos... Contudo, nunca será administrada naqueles domingos emque é administrada na igreja paroquial. A ceia do Senhor deverá sempre seráadministrada na Inglaterra segundo a forma da Igreja estabelecida; mas a pessoa que aadministra terá a liberdade de anunciar hinos, usar a exortação e a oração extemporânea.Onde quer que na Inglaterra o serviço divino é celebrado no dia do Senhor, em horárioseclesiásticos, o pregador oficiante deve ou ler o ritual da Igreja – a abreviação feita pornosso venerável pai – ou pelo menos as leituras marcadas pelo calendário. Portanto,recomendamos quer o serviço plenos quer a abreviação. A nomeação dos pregadoresmencionados no título arrolado, e seus sucessores, são as únicas pessoas legais queconstituem a Conferência. E pensamos que os irmãos mais jovens não têm razão emobjetar a essa proposição, visto que são regularmente eleitos segundo a idade” (BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã, ibidem, p. 293).608WALKER, Welliston, Ibidem.609 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.318.
CLXXXVIII
dogmática, exata e rígida. Foi uma afirmação da primazia do
sentimento na experiência cristã.610
O Pietismo foi uma tentativa de renovar a Igreja Luterana na
Alemanha, reinstalando diversos temas da Reforma tradicional.611
Philipp Jacob Spener (1635-1705) foi a figura predominante do
reavivamento pietista.612
Nessa época, no Luteranismo, era enfatizada a pura doutrina e a
prática dos sacramentos como os elementos suficientes para a vida
cristã. Isto tornava a religião sem influência na sociedade, além de não
cooperar para a vida abundante dos cristãos.613
O papel do leigo era passivo na Igreja. Ele, simplesmente, ouvia
os sermões do pastor, participava dos sacramentos e das ordenanças.
A vida cristã era vista como aceitar unicamente os dogmas da
Igreja.614
Mais alguns fatores contribuíram para o surgimento do Pietismo,
entre eles, a Guerra dos 30 Anos (1618-1648),615 envolvendo toda a
Europa Ocidental. Nesta guerra, a Alemanha ficou arrasada,
proporcionando uma onda de misticismo.
610 WALKER, Welliston, Ibidem, p.190.611 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.19.612WALKER, Welliston, Ibidem, p.190.613 Ibidem.614 Ibidem.
CLXXXIX
Philipp Jacó Spener, versado em exegese bíblica, foi
influenciado pelo livro Verdadeiro Cristianismo do Místico Johann
Arndt (1555-1621), publicado entre 1605-1609. Spener foi influenciado
também pelos escritos puritanos de Lewis Bayly, especialmente pelo
livro A Prática da Piedade.616
Spener era pastor em Frankfurt e sentia-se embaraçado por toda
a autoridade estar nas mãos do governo. Em 1670, chamou um
pequeno grupo de pessoas de idéias semelhantes para estudarem a
Bíblia, orar e meditar sobre o sermão pregado no Domingo.617 Tudo
isto com o objetivo de aprofundamento na vida espiritual.
No ano de 1675, publicou a Pia Desideria, onde mostrava a
interferência do governo na Igreja, o mau exemplo dos clérigos, as
controvérsias religiosas existentes, as bebedices e imoralidades e a
ambição dos leigos. Para Spener estes eram os principais males da
época.618
Na Pia Desideria, Spener atacou os líderes políticos:
“Enquanto isso, muitas pessoas revestidas deautoridade civil procuram tirar proveito de suassituações. Pela maneira como vivem, pode-se concluirque poucos sabem o significado do verdadeirocristianismo.”619
615 A Guerra dos trinta anos foi entre católicos e protestantes, na Europa, e começou naBoêmia. WALKER, Welliston, ibidem, p.125.616 Ibidem, p. 191.617 Ibidem.618 Ibidem.619SPENER. Philipp Jacob. Pia Desideria. Imprensa Metodista, Ciências da Religião,1985, p.25.
CXC
Sobre os pastores, Spener afirmou:
“Eles buscam promoção, pulam de paróquia aparóquia e envolvem-se em todo tipo de conchavos.”620
Spener pretendia empreender uma reforma moral e espiritual e
propôs um coração reto e a conversão. Propunha ainda a formação de
círculos nas congregações para a leitura da Bíblia, vigilância mútua e
auxílio.
Ele elaborou propostas para a situação da Igreja, entre elas,
incentivou o uso mais extensivo das Escrituras; o exercitamento do
sacerdócio universal; prática e conhecimento do cristianismo; a
reforma das escolas e universidades, etc.621
“O plano de renovação de Spener foi realizadoatravés de pequenos grupos conhecidos como collegia-pietatis - escolas de piedade.”622
No programa de reforma de escolas e universidades, Spener
orientou os professores de teologia para que os alunos tivessem uma
vida de piedade. Entre os livros que sugeriu para que os alunos
lessem estava A Imitação de Cristo, de Thomas Kempis,623 que mais
tarde influenciou Wesley.
620 Ibidem, p.27.621 Ibidem, p.56-80.622 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 20.623 SPENER, Philipp Jacob. Pia Desideria. Ibidem, p.73.
CXCI
Spener teve várias oposições e foi considerado herege.624
Depois da morte de Spener, outras pessoas contribuíram na liderança
do Pietismo como Augusto Hermann Francke (1663-1727).625
“Francke era dotado de imensa energia e gênioorganizador. Sua paróquia de Glaucha era um modelode fidelidade pastoral. Suas conferências nauniversidade foram exegéticas e experimentais; e suacombinação de cátedra e pratica pastoral foi altamentebenéfica para seus alunos.”626
Wesley incorporou ao Metodismo algumas ênfases do Pietismo,
como a experiência pessoal e uma maior participação do leigo na vida
da Igreja.627
Na América, em 1737, Wesley publicou uma Coleção de Salmos
e Hinos onde diversas expressões revelam a teologia e a prática
Pietista de Wesley:
“Esses textos, muitos traduzidos do alemão,expressam o coração de um pietismo baseado nasEscrituras e elucidam os temas que eram apreocupação espiritual mais importante para Wesley –completa dependência da graça, centralidade do amore o desejo de fogo genuíno para inflamar seu coraçãofrio.”628
624Spener foi acusado de heresia. “Falsamente, como demonstrando afastamentointencional dos padrões luteranos; mas com verdade no sentido de que seu espírito eideais eram inteiramente distintos da ortodoxia luterana da hora” (WALKER, Welliston,Ibidem, p.192).625 Ibidem. p.192.626 Ibidem, p.194.627 BURTNER, Robert W. ; CHILES, Robert E. Ibidem, p.28-3.628 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p. 69.
CXCII
Dentro do tema da tese - avivamento e compromisso social – o
Pietismo deu impulso na busca da comunhão com Deus, que leva ao
avivamento, e a solidariedade aos oprimidos. O Pietismo é a religião
do coração. O arrependimento, o perdão, o novo nascimento, a vida
eterna e a cruz foram algumas marcas do Pietismo. Vários hinos
revelam esta marca, como o hino escrito pelo missionário metodista J.
J. Ranson:
“Por meus delitos expirouJesus a vida e luz.O meu castigo ele esgotouNa ensangüentada cruz.”629
Outro missionário metodista, Justus H. Nelson, que esteve em
Belém, Pará, entre 1882-1925, traduziu diversos hinos, dos quais nove
se encontram no Hinário Evangélico. 630
Um deles diz:
“Achei um bom amigoJesus, o SalvadorO escolhido dos milharespara mim;Dos vales é o Lírio;É o forte mediador,Que me purifica e guarda para si;Consolador Amado,Meu protetor do mal,Solicitude minha toma a si (...).”631
629 HIÁRIO Evangélico, hino 413, Imprensa Metodista, 1985, p. 246.630Hinário Evangélico é uma coleção de hinos publicados e utilizados pela IgrejaMetodista.631 Ibidem, hino 226, p. 166.
CXCIII
Dentro do tema da tese - avivamento e compromisso social - o
Pietismo trouxe sua contribuição ao metodismo ao dar ênfase ao novo
nascimento632 e, consequentemente, a santificação e perfeição cristã,
que para Wesley é perfeito amor.633 Ele explica que amor é este:
“É amar o Senhor nosso Deus de todo coração,mente e alma e força e amar ao próximo como a nósmesmos, como a nossa própria alma”.634
O Pietismo foi um movimento necessário, na época, diante de
uma religião muito mais voltada para os debates teológicos,
esquecendo-se de enfatizar a comunhão pessoal com Deus.
“O Pietismo foi um rompimento com tais tendênciasescolásticas.”635
Uma das críticas que se faz ao Pietismo é que ele rompeu com a
ortodoxia confessional, mas não trouxe líderes religiosos que
tomassem o lugar dos velhos teólogos dogmáticos.636
“A teologia pietista alemã, como é vista nosescritores como Spener, August Hermenn Francke, eparticularmente Nicholas Ludwing von Zinzendorf(patrono dos morávios), seria caracterizada como‘teologia do coração.”637
632 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v., ibidem, p.348.633 Ibidem, p.348.634 WESLEY, João. Explicação clara da perfeição cristã. Ibidem, p.88.635 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 190.636 Ibidem, p. 233.
CXCIV
Wesley deve ao Pietismo uma contribuição valiosa a sua fé.
Contudo, além da comunhão com Deus, ele também teve
sensibilidade com os sofrimentos 638 da classe operária inglesa.
O equilíbrio de Wesley determinou o amadurecimento do
metodismo. Ele falava da necessidade do cristão praticar as obras de
Piedade639 (oração, leitura da Bíblia, jejum, participação na ceia e
cultos, etc.), aspectos nos quais mostra a influência pietista sobre
Wesley, contudo, enfatizava também a necessidade da prática dos
atos de Misericórdia640 (alimentação aos famintos, vestir os nus, visitar
os presos e enfermos, etc).
“Wesley partilha os pressupostos de Zinzendorf; oscristãos são santificados unicamente pela fé, e emCristo; mas Wesley tem, além disso, a convicção que opoder santificador da graça de Deus entraeficientemente na vida dos homens e os capacita parao perfeito amor a Deus e aos Homens, seussemelhantes”.641
4.1.4. A contribuição dos Moravianos
637 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.19.638 No quinto capítulo abordaremos o compromisso social dos metodistas.639 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v., p,.354.640 A ênfase de Wesley nos Atos de Misericórdia remonta às Sociedades religiosas que“também estimulavam algumas causas de caridade” (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p.23). Heitzenhater afirma que “trabalhando com os pobres, as sociedadespretendiam, não tanto melhorar seu nível de vida num sentido econômico, mas melhorarsuas vidas num sentido moral e espiritual” (Ibidem, p.23). Samuel Wesley, pai de Wesley,foi influenciado pela SPCK (Sociedade para a propagação do Evangelho) e tentouorganizar uma sociedade em Epworth (Ibidem, p.27). Cinco das catorze regras que eleescreveu se referem à caridade (Ibidem, p.29).641 KLAIBER Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p.302.
CXCV
Os moravianos sofreram na Guerra dos Trinta Anos (1618-
1648)642 e fugiram das perseguições. Eles pertenciam a diversos
grupos:
“(...) seguidores de Huss, Lutero, Calvino e outrosreformadores, fugindo das perseguições mortíferasdaquela época, acharam asilo em Herrnhut, nopatrimônio de um fidalgo abastado, o CondeZinzendorf.” 643
Os morávios de língua alemã buscaram refúgio na Sexônia.
Posteriormente, em 1722, o Conde Zinzendorf deu-lhes permissão de
fundar uma aldeia em Berthelsdorf, a qual denominaram Herrnhurt. A
eles se juntaram muitos pietistas germânicos.644
A partir de 1727, eles fizeram uma Aliança Fraternal a fim de
procurar e enfatizar os pontos em que concordavam e não salientar as
suas diferenças. O amor fraternal e a unidade em Cristo seriam o que
ligariam uns aos outros e se comprometeram a obedecerem aos
estatutos da aliança. Seriam verdadeiro seguidores de Cristo.645
No dia 13 de agosto de 1727, numa reunião onde se celebrava a
Ceia do Senhor, os moravianos tiveram uma experiência carismática,
como hoje interpreta Casiano Floristán,646 e caíram no chão. Eles se
642 Só a Alemanha teve um decréscimo de mais de 10 milhões de pessoas. Os camposforam desvastados e as indústrias destruídas ( WALKER, Welliston, Ibidem, p. 130).643 WALKER, John. Sangue e Fogo, A História do Avivamento Morávio. Rubiataba,Goias:[s.ed],1978, p.1.644 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 198.645 WALKER, John. Sangue e Fogo, Ibidem, p. 2646Casiano Floristán afirma que a experiência mística é interior, imediata, simples,passiva e frutífera, que têm lugar em nível de consciência. Já a experiência carismática
CXCVI
entregaram às orações e nos quatro anos seguintes experimentaram
tempos de avivamento constantes. Ascendeu um desejo ardente de
levar a salvação de Cristo aos pagãos. O avivamento produziu um
movimento missionário.647
Eles saíram como missionários pelo mundo. Foi assim que
Wesley teve, em 1736, um encontro com um grupo de morávios no
navio em que viajava para a América:
“Os missionários moravos mostravamextraordinária devoção. Alguns como Dover, um oleiro,que para pregar aos escravos na Ilha de S.Tomás(Índias Ocidentais) ofereceu-se como escravo, paramelhor atingir o seu fim, pois os proprietários deescravos não lhes consentiram que pregasse aos seusserviçais. Outros ofereciam-se voluntariamente para aGroelândia. Em 1734 abriram uma missão entre osPeles Vermelhas, no estado de New York e naPensilvânia.”648
Na América, Wesley teve um contato mais intenso com os
moravianos e conviveu com eles.
“O líder morávio apresentou a Wesley as diferençasentre os dois grupos de alemães pietistasrepresentados na Geórgia. De um lado, osSalzburgers, estalecidos em New Ebenezer, seguiamos ensinamentos de August Hermann Francke eSamuel Urlperger, firmados na tradição de PhillippJacob Spener e da Universidade de Halle. De outrolado, os morávios, estabelecidos em Savannah,
inclui fenômenos como visões, audições (Conceptos Fundamentales del Cristianismo,Ibidem, p. 486-8).647 WALKER, John. Ibidem, p. 3-4.648 TUCKER, John T. Compêndio de História de Missões. Lisboa: [s.ed.], 1954, p.170.
CXCVII
seguiam os ensinamentos de Spangenberg e NicholasLudwig von Zinzendorf.”649
Dentro da tese - avivamento e compromisso social, os
Moravianos influenciaram pouco. Os morávios influenciaram mais a
vida espiritual de Wesley, quando ele esteve na América,
especialmente, em relação a fé:
“(...) os pietistas alemães haviam tomado o lugarcentral na sua busca de uma fé significativa. Asimagens e os ensinamentos centrais da ‘teologia docoração’ dos morávios, ficaram claramente impressosem sua mente e espírito quando esteve na Geórgia.”650
Quando viajava para sua missão na América, João Wesley
observou cuidadosamente as atitudes dos moravianos no navio. Entre
suas observações, estão:
Eram meigos e nenhuma injúria os ofendia;
Eram isentos de espírito de medo;
Não tinham espírito de ira, orgulho e vingança;
Consideravam o Sermão da Montanha como lâmpada para os
pés;
O servir a Deus era considerado o único motivo de suas vidas,
Tinham uma fé viva.651
Wesley se referia ao moraviano como:
649 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.60.650 Ibidem, p.73.651 WALKER, John, Ibidem, p. 6.
CXCVIII
“(...) o adocicado morávio (...)” .652
O episódio da tempestade a bordo653 levou Wesley a observar a
vida dos moravianos e a ter mais submissão a Deus:
“Submissão à sábia, santa e graciosa vontade deDeus; a também abrir seus olhos para a profundidadeda fé dos morávios alemães que estavam a bordo.”654
Em Londres, ele se encontrou com o líder Peter Bohler durante
uns quatro meses para aprender mais sobre a fé.655 Esse contato
proporcionou a Wesley paradigmas para a renovação espiritual e o
desenvolvimento organizacional do metodismo.656. Em um sermão
publicado em 1765 – O meio bíblico de salvação – Wesley explica
sobre a fé:
“Mas qual é a fé pela qual somos santificados;salvos do pecado e aperfeiçoados em amor? ‘É umadivina evidência ou convicção, primeiro de que Deus oprometeu nas Santas Escrituras (...). Em segundo lugar,uma divina evidência ou convicção de que Deus écapaz de cumprir o que prometeu (...). E, em terceirolugar, uma evidência, ou convicção de que Deus pode equer faze-lo agora.” 657
652 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v, p,.445.653 Wesley temia o mar e nunca havia estado em um navio. Diante da tempestade, ”A nuarealidade da morte iminente mostrou a fragilidade do senso de segurança de Wesley (...)A terceira e pior tempestade, apenas uma semana antes de avistarem a terra, levouWesley à ‘submissão à sábia, santa e graciosa vontade de Deus’; e também abriu seusolhos para a profundidade da fé dos moravianos alemães que estavam a bordo”(HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p.58-9).654 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 59.655 Ibidem, p. 76.656 Ibidem.
CXCIX
Pedro Bohler organizou no dia 1º de maio de 1738 (antes da
experiência de Wesley) a Sociedade de Fetter Lane, que veio a ser o
terceiro surgimento do metodismo.658
João Wesley e John Hutton participaram da organização da
sociedade.659 As regras tinham o objetivo de proporcionar saúde
espiritual. Quando Bohler foi para Londres deixou Wesley na liderança
da sociedade.
Em que sentido os moravianos contribuíram para a vida de
Wesley e, consequentemente, com o metodismo?
Os morávios estão ligados historicamente a experiência do
“coração aquecido” de Wesley. Ele foi a uma Sociedade Moravia, em
24 de maio de 1738, quando teve sua experiência. Alguns estudiosos
chegam a falar de sua “conversão Moravia”.660
Após sua experiência, Wesley foi até a Alemanha passar um
período com eles. Através dos moravianos, Wesley aprendeu sobre a
dedicação total ao senhor. João Wesley partilhou de alguns
pressupostos teológicos do conde Zinzendorf, especialmente a fé::
“Os cristãos são santificados unicamente pela fé,em Cristo; mas Wesley tem, alem disto, a convicçãoque o poder santificador da graça de Deus entra
657 WESLEY, João. Sermões de Wesley. v 2, ibidem, p.355-6.658HEITZENHATER, Richard P., Ibidem., p.78.659 Ibidem, p.79;660 RUMBLE, L. “Os Metodistas” em Vozes em defesa da fé. Petrópolis:Editora VozesLimitada, 1959, p.30.
CC
eficientemente na vida dos homens e os capacita parao perfeito amor a Deus e os homens.”661
Evidentemente, por ser uma pessoa prática, houve afirmações
teológicas que Wesley teve que deixar de lado. 662 Ele reteve o que
considerou bom.
“Wesley também prestou muita atenção àorganização morávia. A divisão de Herrnhut emgrupos de vizinhança, chamados “coros” , fornecia abase para onze ‘classes’ baseadas na localizaçãogeográfica. Além dessas havia dez classes,determinadas pelo sexo e idade, que formavam a basepara a supervisão espiritual diária para conversaçõesreligiosas regulares.”663
Em 1739, Wesley começou a questionar algumas posições de
líderes morávios, entre elas a quietude,664 que consistia em afirmar
que os cristãos deveriam abster-se dos meios de graça,
especialmente a Ceia do Senhor, e ficar quietos na presença do
Senhor em espera. Isso cancelava as obras de misericórdia e os atos
de piedade, o que Wesley não concordou:665
“Vós subestimais as boas obras, (especialmente asobras exteriores de misericórdia), nunca insistindo depúblico na necessidade delas, nem proclamando seuvalor excelência.” 666
661 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p. 302.662 Em 1739, com tendências morávias, Philip Henry Molther, passou a ensinar nassociedades de Londres que não haviam meios de graça e sim Cristo. Eles deveriampermanecer "quietos", diante do Senhor. Essa "teologia sublime" era contrária "a tudo emque Wesley há muito tempo cria e praticava". Wesley exortou as sociedades a esperaremno Senhor em todas as sua ordenanças (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.106).663 Ibidem, p. 84.664 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.106.665 Ibidem, p. 106.666 WESLEY, João. Sermões de Wesley. v.2, ibidem, p.174.
CCI
Wesley se opôs também a idéia morávia de que o pecado não
permanece naquele que é nascido de Deus. Em seu sermão “Sobre o
pecado nos crentes”, ele afirma:
“Dos seguidores de Zinzendorf, nestes vinte anos,muitos de nossos compatriotas herdaram a mesmaopinião, afirmando que a corrupção da natureza nãomais existe no que crê em Cristo”.667
Wesley afirmava que Cristo pode estar no mesmo coração em
que habita o pecado, caso contrário, ele não poderia ser salvo do
pecado. Para ele, onde há doença há necessidade de médico.668 Por
isso, Wesley exortava os crentes à contínua vigilância contra a carne,
o mundo e o diabo669. Ele criticou abertamente essa doutrina morávia:
“Já se observou que a doutrina oposta – que não hápecado nos crentes – é bastante nova na Igreja deCristo: dela não se ouviu falar durante dezesseteséculos, nem antes que fosse descobertas pelo CondeZinzendorf”.670
Dentro do tema da tese - avivamento e compromisso social – os
moravianos foram importantes para despertar em Wesley uma fé viva.
Contudo, ele teve que evitar, especialmente o “quietismo” dos
moravianos:
667 _______._______. 1 v., p.258. Por pecado, Wesley entende como “toda tendênciapecaminosa, paixão ou afeição, tais como orgulho, obstinação, amor ao mundo, dequalquer espécie ou grau; cobiça, ira, impertinência; qualquer disposição contrária àmente que havia em Cristo” (Ibidem, p.258-9.)668 WESLEY, João. Sermões de Wesley. v.1, ibidem, p.262.669 Ibidem, p.270.
CCII
“(...) no outono de 1739, em uma das freqüentesviagens de Wesley a Londres, ele descobriu que PhilipHenry Molther, recentemente chegado da Alemanha,havia convencido muitas pessoas da Sociedade queelas não possuíam a verdadeira religião, e deviam,portanto, descontinuar todos os meios de graça e todasas obras de piedade e, em vez disso, deviampermanecer ‘quietos’ diante do Senhor”.671
A partir da Conferência Anual de 1745, Wesley se dedicou mais
a escrever. Ele estava preocupado com a influência morávia que
contaminava672 as sociedades. Por isso, escreveu “Uma breve
apresentação da diferença entre os Irmãos Morávios...e o Reverendo
Sr. João e Carlos Wesley” 673 e ainda “Um diálogo entre um
antinomiano e seu amigo”.674
“Wesley expurgou os escritos de Zinzendorf de´três grandes erros´ que encontrou: salvação universal,antinomianismo e quietismo.”675
Sobre o antinomianismo, Wesley explica:
“Guardai-vos do antinomianismo, quero dizer, deanular a lei ou alguma parte dela pela fé (...). Digamos:´Amo os teus mandamentos mais do que ouro, mais doque ouro refinado. Amo a tua lei. Medito nela tododia.”676
670 Ibidem, p.262.671HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.106.672 Ibidem, p.154.673 Nesta publicação, ele “responde à acusação de Church de que Wesley compartilhavade muitos dos mesmos problemas que havia colocado aos pés dos moravianos noJournal, tais como negar qualquer valor às boas obras (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p.154)”.674 Apesar de Wesley apreciar a profunda piedade dos moravianos, ele se preocupavacom seu antinomianismo, ou seja, ética que dispensa a lei (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p.154).675 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 155.676 WESLEY, João. Explicação clara da Perfeição Cristã, Ibidem, p.112.
CCIII
Quais foram as principais divergências com os moravianos?
A salvação universal, quietismo e antinominianismo677 foram as
principais divergências doutrinárias com os Moravianos. Wesley
chegou a escrever uma carta à Igreja Moravia, na Inglaterra,
questionando essas ênfases doutrinárias e pressionando-os a
mudarem na doutrina, disciplina e prática.678 Ele fez a demarcação e
continuou firme em seu propósito trazendo identidade e unidade ao
metodismo.
Por outro lado, a fé e a organização morávia foram aceitas, em
parte, por Wesley e contribuíram na formação da identidade
metodista.
4.1.5. A influência dos Puritanos
Segundo Duncan Reily, o Puritanismo679 surgiu na Inglaterra no
reinado da Rainha Isabel (Elizabeth I), na segunda metade do século
XVI:
“Foi um movimento para `purificar` o cultoanglicano dos vestígios romanos ou, de uma outraótica, calvinizar a Igreja na Inglaterra.”680
677 ______. Sermões de Wesley. 2 v., p,.445.678HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 143.679 No Capítulo 2, no Contexto Religioso, o Puritanismo é também citado.
CCIV
D.M.Lloyd-Jones coloca o Puritanismo como tendo começado a
manifestar-se com William Tyndale por volta de 1524.
“Por que dizer isso? Porque o puritanismo, comoespero demonstrar, é um tipo de mentalidade. É umaatitude, é um espírito, e é evidente que duas dasgrandes características do puritanismo começaram amostrar-se em Tyndale. Ele tinha um ardente desejo deque o povo comum pudesse ler as Escrituras. Mashavia grandes obstáculos em seu caminho; e é o modocomo ele enfrentou e venceu os obstáculos que mostraque Tyndale era um puritano. Ele lançou uma traduçãoda Bíblia sem o endosso e sanção dos bispos (...).Essas duas ações eram típicas do que sempre foi aatitude dos puritanos para com as autoridades.”681
D.M.Lloyd-Jones, dentro dessa linha de pensamento, coloca John
Knox como o fundador do puritanismo inglês: 682
“(...) era costume receber a Ceia de joelhos. Esta éuma prática anglicana. John Knox foi o primeiro aensinar as pessoas – e não somente a ensiná-las,porém a pô-lo em prática – a tomar a Ceia assentadas.Isso é puritanismo na prática.”683
Os protestantes que não estavam vinculados à Igreja do Estado,
eram conhecidos como dissidentes ou não-conformistas, depois como
Igrejas Livres.
680 REILY, Duncan Alexander. “O culto do Protestantismo Puritano-Pietista” em O cultoProtestante no Brasil., Estudos de Religião 2, São Paulo: Imprensa Metodista,1985, p.91.681 JONES, D.M.Lloyde. Os Puritanos. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas,1993, p.249-0.682 Ibidem, p.282.683 Ibidem, p.277.
CCV
Por causa das perseguições da Rainha Maria Túdor, entre 1553
e 1558,684 diversas pessoas se exilaram em Genebra, Zurique e
Frankfurt. Especialmente em Genebra:
“Ali entraram em contato direto com movimentosprotestantes que tinham ido muito mais longe em suasreformas do que a Igreja da Inglaterra.”685
Essas pessoas sofreram influências e voltaram com um
protestantismo radical.686 Passaram a ter a Bíblia como autoridade por
excelência superando toda pretensão da Igreja de ser a intérprete ou
ter a sua custódia. Sua ênfase sempre foi na doutrina da graça, na
teologia pastoral e na Igreja pura.687
Como tivessem o desejo de purificar a Igreja, passaram a ser
chamados de “puritanos”. Os Puritanos se tornaram um partido com
forte influência política.
“Queriam banir dos ofícios o que criam ser umremanescente de supertição romanista e desejavampara cada paróquia um pregador zeloso, espiritual. Emparticular, eram contrários às vestes clericais (...)opunham-se ao ajoelhar para receber a Ceia doSenhor, dizendo que tal atitude implicava adoração dapresença física de Cristo; combatiam o uso de aliançasno casamento, tendo-o como continuação do conceito
684 LILIÉVRE, Mateo, Ibidem, p.8. O rei Henrique VIII havia mudado a Inglaterra docatolicismo para o anglicanismo . Seu filho Eduardo VI, a reforma religiosa prosseguiu,mas quando Maria Túdor assumiu o poder, iniciou uma perseguição aos protestantes(Ibid, p.8). Maria perseguiu ao Arcebispo Cranmer, por ele ter declarado sem valor ocasamento de sua mãe (WALKER, Welliston, Ibidem, p.91).685 MENDONÇA, Antônio Gouvêa. O Celeste Porvir, Ibidem, p. 35.686 JONES, D.M.Lloyde, Ibidem, p. 251.687 Ibidem, p.267.
CCVI
do matrimônio como um sacramento; fazer o sinal dacruz no batismo, como supertição.”688
Essas pessoas queriam introduzir a disciplina e as práticas
puritanas e esperar as reformas do governo. Alguns não quiseram
esperar tal mudança. Eram os separatistas, dentro os quais se
encontravam os adeptos da política congregacional.689
“Os separatistas insistiam em que os ministrosdeviam ser eleitos pela congregação de seus fieis epagos por contribuições voluntárias destes (...).Defendiam a tolerância para todas as seitasprotestantes, repelindo a censura eclesiástica e todasas formas de jurisdição eclesiástica, em favor de umadisciplina interna às congregações, sem o aval denenhuma sanção coercitiva (...). O seu programaimplicaria em destruir a Igreja nacional, deixando acada congregação a responsabilidade de seus negóciose havendo apenas um tênue contato entre as diversascongregações (...).”690
Surgiram, posteriormente os chamados não-conformistas,
dissidentes ou Igrejas-Livres. Estes incluem os Congregacionalistas
ou Independentes, os Batistas e os Presbiterianos, por um lado, com
os Quacres e os Unitários por outro lado.691 Os Puritanos tinham uma
forte influência pietista.
“Os puritanos freqüentemente portavam umapreocupação tipicamente calvinista, a promoção dapiedade individual, a qual se tornou, então,característica de muitos não-conformistas.”692
688 WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. Ibidem, p. 139.689 Ibidem, p. 141.690 HILL, Christopher, Ibidem, p. 52-3.691 VIDLER, Alec R, Ibidem, p. 137.692 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 17.
CCVII
Antônio Gouvêa Mendonça afirma que tanto o Pietismo como o
Puritanismo faziam parte da teologia de Wesley:
“Os metodistas continuaram enfatizando o conflitopenitencial (arrependimento), a convicção de pecado ea experiência pessoal de regeneração. Em seus pontosprincipais, a teologia de Wesley é Reformada ePuritana, especialmente na ênfase moral.”693
Max Weber compara o metodismo do século XVIII com o
ascetismo monástico694 da idade média:
“O poderoso revival do Metodismo, que, em fins doséculo XVIII, procedeu o florescimento da indústriainglesa pode ser comparado com uma dessas reformasmonásticas.”695
As Sociedades foram utilizadas por Wesley e tiveram influência
na organização do movimento metodista. Elas foram criadas em 1670
por Anthony Horneck com objetivos puritanos:
“(...) eram também formadas de pequenos gruposde leigos, que representavam uma fusão quaseespontânea de moralismo e devoção de promoverem areal santidade no coração e na vida.”696
693 MENDONÇA, Antônio Gouvêa, Ibidem, p. 41.694 “Antão, o fundador do monaquismo cristão, nasceu em Koma, no Egito central, porvolta de 250, de cêpa nativa (copta).Impressionado pelas palavras de Cristo, ao moçorico, desfez-se de suas posses e, por volta de 270, encetou vida de ascese em sua vilanatal. Quinze anos mais tarde, dedicou-se à vida solitária, tornando-se eremita. (...)Jejuava, praticava a mais severa abnegação e orava constantemente, Cria que vencendoa carne, se aproximaria cada vez mais de Deus. Antão em breve teve muitos imitadores(....).O primeiro grande aperfeiçoador do monaquismo foi Pacômio. (...) fundou o primeiromosteiro cristão, em Tabenísi, no Sul do Egito, por volta de 315-320” (WELLISTON,Walker. História da Igreja Cristã. v 1, Ibidem, p.182-3).695 WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Ibidem, p. 125.696 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 21.
CCVIII
A renovação da aliança introduzida por Wesley no Natal de 1747
tinha uma conotação reformada-puritana.697
“A idéia de aliança teve, desde o início, na tradiçãometodista, uma grande significação. Tanto em suapregação, como na ordenação da vida comunitáriaeclesiástica, João Wesley – influenciado pela teologiareformada – reservou uma posição significativa para aidéia de aliança.”698
Em que consistia a renovação da aliança?
A idéia é de que Deus age por meio da aliança e através de sua
graça.699 Na aliança, os parceiros são exortados a viverem em
obediência700 a Deus, que sempre mantém sua fidelidade.701 Os
participantes são chamados a uma nova conversão de suas vidas a
Deus.702
“A primeira liturgia de renovação da aliança de queWesley nos informa, se realizou em agosto de 1755,emSpitalfields. Os cultos de renovação da aliança erampreparados com oração e jejum, e para eles foiestabelecida, como data regular, o primeiro domingo doano novo. O ponto alto desses cultos era constituídopela entrega renovada dos membros da comunidade aoDeus da aliança. Wesley se sentia feliz por terestabelecido para os metodistas um meio de graça, que
697 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p.150.698 Ibidem.699 Ibidem, p.151.700 Ibidem.701 Ibidem, p.152.702 Ibidem, p.153.
CCIX
quase por toda parte tinha caído em desuso, do qualeles recebiam ricas bênçãos.”703
Apesar dos pais de João e Carlos Wesley terem aderido à Igreja
e ao partido político oficial, Wesley teve toda uma herança Puritana,
pois os seus antepassados foram não – conformistas:
“Samuel e Susanna vieram de um background não-conformista. Como já vimos, o pai de Samuel (JohnWesley) tinha sido destituído de sua paróquia pelobispo de Bristol no século dezessete. Susanna era filhade Samuel Annesley, um conhecido ministro não-conformista de Londres no final do século dezessete.”704
Que os Wesley tinham consciência do passado puritano de sua
família fica evidente no seguinte episódio relato por Mateo Lelièvre.
Ele cita uma carta de Samuel, irmão de João e Carlos Wesley,
endereçada à Susana, em 20 de maio de 1739, por ela estar dando
apoio a Wesley. Em sua carta ele se mostra preocupado com a mãe e
pede a Deus para livra-la de cair em nova heresia:
“(...) assim como desgraçadamente já se achouenvolta em outra heresia (...).”705
A “heresia” aqui citada foi pelo fato de Susana Wesley ter sido
Puritana em sua juventude.706
703 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p.153.704 Ibidem, p. 26.705 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.84.706 Ibidem.
CCX
Em carta a Wesley, em 23 de fevereiro de 1725, Susana deixa
claro a sua orientação Puritana e Pietista aos filhos e filhas:
“(...) Meu querido Joãozinho: A transformaçãooperada em sua alma me tem dado muito o que pensar(...). Peço-lhe encaricidamente que faça um examerigoroso de sua consciência a fim de saber se tem umaesperança bem fundamentada da salvação e descobrirse possui a fé e o arrependimento que são, conformevocê bem sabe, as condições indispensáveis paraentrarmos em uma aliança com Deus.”707
Contribuiu o Puritanismo para o avivamento e o compromisso
social metodista?
Foi inevitável Wesley sofrer influências do Puritanismo num
contexto muito puritano e com o background que recebeu de seus
antepassados.708 Como vimos, pouca foi a contribuição do Puritanismo
no Avivamento e Compromisso Social dos metodistas. A influência foi,
especialmente, na utilização das Sociedades, a idéia da Aliança e a
ênfase moral das Regras Gerais.709
4.1.6. As Conferências Anuais
Sob a liderança de João Wesley, os pregadores participam de
reuniões para avaliação, aprovação de assuntos relacionados à vida e
707 Ibidem, p.33.708 “Samuel e Susanna vieram de um background não-conformista. Como já vimos, o paide Samuel (John Wesley) tinha sido destituído de sua paróquia pelo bispo de Bristol noséculo dezessete. Susanna era filha de Samuel Annesley, um conhecido ministro não-conformista” (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.26).
CCXI
à missão do metodismo. Nas Conferencias Anuais haviam estudos,
debates, orientações, exame dos pregadores, planos, etc,
proporcionando assim a formação da identidade e trazendo unidade
aos metodistas.710
A primeira Conferência Anual teve início em 25 de junho de
1744711 e foi um marco no desenvolvimento da doutrina e disciplina
wesleyana. Trata-se de uma reunião realizada para direcionar o
reavivamento e fazer ajustes. A Conferência durou uma semana. Além
dos irmãos Wesley e os pregadores, estavam presentes mais quatro
ministros anglicanos: João Hodges, Henrique Piers, Samuel Taylor e
João Meriton.712
“A Conferência tinha em sua ordem do dia trêsperguntas:1.O que ensinar?2.Como ensinar?3.Como regulamentar a doutrina, a disciplina e aprática?”713
Outras Conferências vieram. A seguir registramos o tema
principal discutido nas principais Conferências realizadas quando
Wesley ainda era vivo:
709 BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley,ibidem,p.264-6.710 WESLEY. João. Trechos do Diário de João Wesley, ibidem, p.113.711 Wesley assim comentou sobre esta Conferência: “Na segunda-feira, 25 de junho de1744, demos início à primeira conferência, estando presente seis clérigos e todos osnossos pregadores. Na manhã seguinte consideramos seriamente a doutrina dasantificação ou perfeição cristã” (Explicação Clara da Perfeição Cristã, ibidem, p.41).712 A Conferência, que se reuniu na capela de uma antiga fundição, foi precedida, navéspera, por um culto solene de Santa Ceia, e, na manhã do dia da abertura, por umsermão de Carlos Wesley (LILIEVRE, Mateo, Ibidem, p. 139-0).713 Ibidem. P. 140.
CCXII
Na segunda Conferência, realizada em 1º de agosto de 1745, a
santificação continuou sendo o principal assunto.714 Foi discutido "o
que pregar" e as doutrinas básicas com ênfase na perfeição sem
negligenciar a justificação. Ficou estabelecida a prática de uma
Conferência Anual;715
Na terceira Conferência Anual, em 26 de maio de 1746, a
preocupação foi averiguar as atas anteriores.716 A pregação ao ar livre
foi estimulada.717 Dois anos depois, foram discutidas as regras e o
currículo da Escola em Kingswood. Houve também uma preocupação
com a função das Sociedades;718
Em 1749, a Conferência discutiu sobre a União Geral das
Sociedades em toda a Inglaterra.719 Dois anos depois, Wesley
convocou a Conferência Anual para examinar os pegadores. Seis
meses depois, os Wesley continuaram a examinar os pregadores
individualmente ou em grupos;720
A questão doutrinária era uma constante nas Conferências. Em
1753, a discussão abordou temas como a predestinação, os
714 WESLEY, João. Explicação Clara da Perfeição Cristã. Ibidem, p.41.715 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 152.716 WESLEY, João. Explicação Clara da Perfeição Cristã. Ibidem, p.42.717 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.161-2.718 Ibidem, p. 168.719 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 174.720João ordenou a expulsão dos efeminados, intrometidos e levianos, mas advertiu aCarlos que eles precisavam de pelo menos quarenta pregadores" (Ibidem, p. 182).
CCXIII
moravianos e o antinomianismo.721 Cinco anos depois, em 1758, em
Limerick, Irlanda, acusações de falta de ortodoxia doutrinária foram
lançadas contra um dos pregadores, Mark Davis, que havia se tornado
metodista recentemente. Thomas Walsh, convertido do catolicismo,
defendeu seu companheiro.722 Em 1763 as questões mais sérias
tratadas foram sobre a perfeição cristão. Havia uma comoção porque
alguns afirmavam ter recebido o dom da perfeição e outras pessoas
foram ao extremo levantando questões sobre a maldição e o estado
angelical;723
Através de outras Conferências Anuais, o movimento metodista
foi sendo solidificado com as decisões tomadas, pois elas se tornaram
leis para os pregadores e demais líderes praticarem.
Entre essas decisões, está a preocupação com os pregadores:
721"A Conferência anual dos pregadores realizada em Leeds, em maio de 1753,apresentou uma oportunidade para se estabelecer diversos assuntos. Os problemasdoutrinários eram a primeira ordem do dia, especialmente as contínuas tensões com 'acorrupção dos alemães' (isto é, os morávios) e a 'mancha' da predestinação e doantinomianismo (isto é, Whitefield) " (Ibidem, p. 186).722 O argumento de defesa de Thomas Walsh foi de que Mark Davis mudaria quando setornasse mais familiarizado com a literatura metodista (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p. 199).723 Nesse período o assunto perfeição cristã causava certa comoção. Alguns acreditavamter recebido o dom da perfeição entusiasmando assim a Wesley, seu ardente defensor.Por outro lado problemas começaram a surgir com extremismos de certos pregadores.“Alguns haviam afirmado que até a perfeição a pessoa estava sob a maldição de Deus,entre eles, Thomás Maxfield e George Bell, que levaram a doutrina até as últimasconseqüências afirmando que com a perfeição as pessoas passavam a viver em estadoangelical. A Conferência de 1763 procurou tratar desses abusos (.HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p. 209-0)”.
CCXIV
1765: Aprovação do “Fundo para os pregadores" beneficiando os
pregadores "cansados", suas viúvas e filhos;724
1768: Wesley deu aos pregadores mais um ano para deixarem
seus trabalhos seculares.725
Algumas decisões trouxeram ruptura, como ocorrido em 1770.
Foi decidido reavivar o trabalho onde estava estagnado e dar atenção
às doutrinas. A Conferência defendeu as idéias de Armínio em
contraste com a predestinação. Isso trouxe profundo desgosto aos
calvinistas, entre essas pessoas estava a condessa Lady Huntingdon,
que declarou a Wesley que não pregaria mais em suas capelas.726
A preocupação com os pregadores continuou sendo uma
constante nas Conferências. Em 1773, Wesley persuadiu 49
pregadores presentes a assinarem os “Artigos do Acordo”, esboçado
em 1769.727 Por esta aliança, eles apoiavam uns aos outros, à antiga
doutrina e disciplina metodista. No ano seguinte, mais 72 outros
assinariam. Em 1775, outros 81 novos pregadores assinariam
também.728 Em 1776, a Conferência Anual decide por maior
severidade nos exames dos pregadores.729 No ano de 1778, Wesley
724 Em 1767, os pregadores contribuíam com um total de cerca de 50 libras anualmenteao Fundo para os pregadores (Ibidem, p. 234).725 Pregadores itinerantes recebiam um subsídio anual de 12 libras mais as despesas, eesperava-se que servissem a conexão em tempo integral (Ibidem, p. 234).726 LILIÈVRE, Mateo. João Wesley - sua vida e obra. Ibidem, p. 253.727 Pelos Artigos do Acordo, os pregadores se comprometiam “por essa aliança apoiaremum ao outro e à antiga doutrina e disciplina metodista” (HEITZENHATER, Richard P.,Ibidem, p. 254).728 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 254, 258.729 Ibidem, p.266.
CCXV
se preocupa com a saúde dos pregadores e pergunta porque eles têm
problemas nervosos. Deu seis conselhos práticos, entre eles, fazerem
diariamente exercícios físicos; dormirem cedo e acordarem cedo,
etc.730 Na Conferência de 1793 foi proibido o título "reverendo" aos
pregadores e acabou a distinção entre pregadores ordenados e não
ordenados.731
Nos últimos anos de vida de Wesley, as principais decisões da
Conferência foram:
Em 1784, Wesley pede voluntários para acompanhar Thomas
Coke na América. Ele escolheu Thomás Vazey e Richard Whatcoat.732
Wesley registrou em seu Diário, no dia 31 de agosto de 1784:
“O Dr. Coke, Sr. Whatcoat e Sr. Vazey chegaram deLondres com o fim de embarcar para a América.Quarta-feira, 1º de setembro. Estando agoraesclarecido na minha própria mente tomei agora umpasso que me pesara por muito tempo, e nomeei o Sr.Whatcoat e Sr. Vazey para irem servir às ovelhasdesconsoladas na América” .733
Em 1785, Wesley Ordenou John Pawson, Thomas Hanby e
Joseph Taylor como pregadores na Escócia. Wesley permitiu a
Christopher Hopper presidir as sessões da Conferência.734
730 Ibidem, p.272.731 Ibidem, p.314.732 Ibidem, p.287.733 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.165.
CCXVI
Já sem a liderança de Wesley, em 1795, foi aprovado o "Plano de
Pacificação".735 Foi reconhecida a separação eclesiástica entre o
Metodismo e a Igreja Anglicana.736
Na verdade, as atitudes tomadas durante sessenta anos por
Wesley e as Conferências Anuais não levaram a uma reforma da
Igreja Anglicana, mas deram aos metodistas uma identidade própria e
distinta.737
As Conferências foram fundamentais no metodismo primitivo:
“As resoluções das consultas das conferênciasanuais do movimento de Wesley foram protocoladas epublicadas, formando a base doutrinária a que todos sereferiam.” 738
Segundo Edward Thompson:
“As Conferências Anuais Wesleyanas, com sua'plataforma', comitês com suas ordens do dia emeticuloso encaminhamento, parecem uma incômoda'contribuição' a mais para o movimento trabalhista deépocas mais recentes”7.739
Esta afirmação de Thompson está dentro de sua visão de que o
metodismo foi um fator importante na formação da classe operária
inglesa. Uma contribuição foi exatamente conseguir a reorganização
734HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.294.735 Já abordado neste capítulo.736 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.317.737 Ibidem, p. 314.738 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred. Ibidem, p. 61.739 THOMPSON, Edward P. 1 v. Ibidem., p. 44.
CCXVII
do povo, abrir espaço para sua participação e despertar líderes
através das classes onde haviam estudos e pregações.
Em sua afirmação, Thompson vê as Conferências Anuais como
tendo sido um desses espaços para a participação popular.
Tiveram as Conferências participação no avivamento e
compromisso social metodista do século XVIII?
Dentro da tese – avivamento e compromisso social – a
contribuição das Conferências foi, especialmente, em dar um rumo
equilibrado ao movimento metodista, especialmente dentro da ênfase
Atos de Piedade e Obras de Misericórdia.
O movimento metodista teve três etapas em seu desenvolvimento,
segundo Wesley. É o que abordaremos a seguir.
4.2. Passos na organização do movimento
“(...) em quase todos os lugares os Metodistas sãoainda gente pobre, desprezada e trabalha sob oopróbrio e que muitas inconveniências (....”)740
João Wesley
740 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.115.
CCXVIII
João Wesley considerava que o movimento metodista era uma
Dispensação Extraordinária da Providência de Deus:
“Wesley aceitou os argumentos de um ´chamadoextraordinário, reconhecendo que não apenas apregação leiga, mas também ´todo o trabalho de Deuschamado Metodista´ era uma ´dispensaçãoextraordinária.” 741
Foi evidente o messianismo de Wesley dentro de sua
compreensão do chamado ao metodismo. Maria Isaura Pereira de
Queiroz afirma que circunstancias internas, que fomentam insatisfação
com as condições humanas de existência podem levar à concepção
do reino ideal que um enviado divino instalará no mundo. 742
Para Wesley, a Dispensação extraordinária da Providência de
Deus compreendia a doutrina da Perfeição Cristã743, o Ministério
Feminino744 e o surgimento do próprio metodismo.745
Duncan Reily vê essa tendência messiânica em Wesley, ao
afirmar:
“João Wesley teve a consciência de estar envolvidoem algo extraordinário que Deus fazia no mundo.”746
741 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.248.742 QUEIRÓZ, Maria Isaura Pereira de. O Messianismo no Brasil e no mundo.Editora Alfa-Omega, 1977, p.37.743 REILY, Duncan Alexander. Fundamentos doutrinários do Metodismo brasileiro. Ibidem,p.61.744 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p. 248.745 Ibidem, p. 230.746 REILY, Duncan Alexander. Fundamentos doutrinários do Metodismo brasileiro. Ibidem,p.47.
CCXIX
4.2.1.Os três começos do metodismo747
O Metodismo não foi programado, não teve o nome escolhido
pelos próprios adeptos e nem pretendia ser uma Igreja estabelecida.
O Metodismo surgiu do desejo de colocar o cristianismo em prática, de
se levar mais a sério a vida cristã. João Wesley mesmo destacou três
etapas no desenvolvimento do Metodismo antes de 1739: em Oxford,
Geórgia e Londres.
A primeira etapa começou no ano de 1729 em Oxford com
Carlos Wesley, William Morgan e João Wesley em que se
encontravam ocasionalmente para estudos acadêmicos e para irem à
igreja. O verdadeiro começo, com propósitos e projetos, foi no fim do
inverno de 1729/1730. Bob Kirkham748 filiou-se ao grupo. Eles se
reuniam quase que diariamente no quarto de um deles. Por sugestão
de William Morgan, o grupo começou a visitar também os presos.
Morgan foi o planejador de grande parte do trabalho de ação social no
início do Metodismo.749
747 “Wesley foi muito específico ao destacar três etapas no progresso do metodismo antesde1739: Oxford, Geórgia e Londres. Esta sugestão de uma progressão explicitadosdesenvolvimentos iniciais fornece uma moldura dentro da qual se pode examinar asorigens do metodismo (HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.33).748 Bob Kirklam era estudante e amigo dos irmãos Wesley. “O diário de Wesley revelaclaramente o modelo que desenvolveu no começo de março de 1730: reuniões à noite, naterça-feira, no quarto de Carlos, Quinta-feira no de Kirklam, no sábado no de João” (HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.39).749 Ibidem.
CCXX
Nessa etapa , eles foram chamados de Clube Santo, Traças da
Bíblia e Metodistas.750 João Wesley se tornou o líder do grupo, que se
propunha à busca de um viver santo. Seu irmão Carlos Wesley havia
começado com o grupo antes de João Wesley.751
Foi nesta etapa que os metodistas começaram a visitar os presos
na Prisão do Castelo incentivados por Willam Morgan. No dia 14 de
agosto de 1730, os irmãos Wesley acompanharam Morgan na visita
aos presos. Em dezembro de 1730, o grupo expandiu suas atividades
e passou a incluir a visitação aos encarcerados da prisão na cidade no
North Gate (Bocardo).752
“O jovem irlandês, que era o planejador de grandeparte do esquema de ação social dos metodistas,começou também a trazer crianças das famílias pobresem Oxford, pelo menos já no começo da primavera de1731 (...) João percebeu bem depressa que a situaçãoexigia uma organização permanente, e pelo fim dejunho de 1731, ele contratou a senhora Plat para tomarconta das crianças. Os metodistas, entretanto,continuaram a Ter um ativo interesse e participação noprogresso das crianças.”753
Contudo, os metodistas de Oxford tinham, especialmente, suas
ações guiadas para um auto-exame em cada dia. Eles observavam se
estavam amando mais a Deus, ao próximo, se tinham mais humildade,
mortificação, abnegação, mansidão e gratidão.754
750 Ibidem, p.41.751 "No início, esta se constituía somente dos dois irmãos e dos jovens Roberto Kiklam eGuilherme Morgan. Pouco a pouco, novos membros, tanto catedráticos como estudantes,reuniam-se a esse primeiro núcleo" (LILIEVRE, Mateo, Ibidem, p.42).752 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.40.753 Ibidem, p.40-1.754 Ibidem, p.47.
CCXXI
Qual era o ponto central da espiritualidade dos metodistas de
Oxford ?
Era a religião do coração, a vida interior, que leva a uma vida
santa, que são características pietistas:
“Era, então, um estado interior da alma refletido no(e medido pelo) seu estilo de vida cristã.”755
Outra característica dos metodistas de Oxford foi que as várias
regras e métodos que dirigiam as atividades dos metodistas
originavam-se, geralmente, do grupo de João Wesley depois de
testadas.756 O encargo piedoso de Wesley tinha o objetivo de salvar
sua própria alma.757 Com este objetivo ele foi para a América.
A segunda etapa do desenvolvimento do Metodismo foi na
Geórgia aonde Wesley chegou no dia seis de fevereiro de 1736.
“(...) esse período foi bastante importante paraWesley, que mais tarde o chamou de ‘o segundosurgimento do metodismo’. Tal terminologia se refereprincipalmente ao estabelecimento de um grupowesleyano na Geórgia semelhante aos metodistas deOxford. Mas a experiência na Geórgia também foi umepisódio importante na peregrinação espiritual deWesley e teve assim um papel significativo no seudesenvolvimento teológico.”758
755 Ibidem, p.47.756 Ibidem, p.49.757 Ibidem., p. 58.758 Ibidem, p,.59.
CCXXII
Mas porque este período é considerado a segunda etapa do
metodismo?
Nesse local, Wesley teve diversos encontros com os moravianos
e com os pietistas.759 Ele encorajava as pessoas desse grupo
corrigindo, instruindo e exortando uns aos outros. Eles se reuniam nas
tardes de domingo, quartas à noite e sábados para momentos
devocionais.
Em fevereiro de 1737 a sociedade em Savannah já havia
estabelecido uma rotina semanal de reuniões. Paralelamente, Wesley
mantinha sua paróquia com freqüência dominical de sessenta a
oitenta pessoas.760
“Em Savannah, tanto quanto em Oxford,desempenhou sua atividade principal com o bem dos´pequeninos´; os pobres, os enfermos, e as criançaseram objeto do seu cuidado especial. Interessou-semuito também pelos negros (...).”761
Richard Heitzenhater afirma que Wesley parecia se sentir melhor
com sua missão entre os negros americanos, apesar do seu desalento
por eles não terem instrução cristã e os conhecimentos básicos da
fé.762
759 Ibidem, p.58.760 "Havia um pequeno grupo em Savannah que iria formar um núcleo para o programatipicamente metodista de enriquecimento espiritual" (HEITZENHATER, Richard P, Ibidem,p.62).761 LELIÈVRE, Mateo. Ibidem, p.56-7.
CCXXIII
“Uma experiência similar em Ponpon, nomes deabril seguinte, resultou em um trabalho de catequesepara uma jovem negra, cuja atenção às suas instruçõesele descreveu com inexprimível’. A moça ficouparticularmente intrigada com o comentário de Wesley,dizendo que se ele fosse boa, sua alma deixaria seucorpo por ocasião de sua morte e iria viver com Deus‘acima no céu’, onde ninguém a espancaria ou amagoaria. No dia seguinte ela se lembrou de tudo, edisse a Wesley que iria pedir a Deus, seu criador, quemostrasse como ‘ser boa’. Seu sucesso nesta aventurafoi duplicado pouco tempo depois com um jovem rapazde Purrysburg, que ele achou ser ‘tanto desejoso comocapaz de receber as instrução. Estes incidenteslevaram-no a propor um programa de instruções paraos negros americanos (...) não há indicação de que oplano tenha sido posto em prática.”763
Em Savannah, Wesley se preocupou com o ensino das crianças.
Ele dirigiu uma escola dando aula de religião para trinta a quarenta
alunos. Além da instrução oral, ele dava aos alunos alguns exemplos
práticos. Um dia foi a escola descalço porque alguns alunos que
tinham sapatos desprezavam aos que não tinham.764
“O segundo surgimento do metodismo na Geórgia,embora marcado por inovações interessantes, alcançouum sucesso limitado numa situação envolvida portensões e políticas. Os esforços para implantar umaversão da piedade meditativa da high-Church, nointerior de uma colônia lutando para manter a ordem e acivilidade básicas, não conquistaram muitos adeptosentre uma população sem muita inclinação religiosa.”765
762 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.67.763 Ibidem, p. 67.764 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.58.765 HEITZENHATER, Richard P., ibidem, p.94.
CCXXIV
O casamento de Sophy Hopkey , de quem ele gostava, trouxe
dificuldades imensas para o ministério pastoral de Wesley. As
denúncias de seu futuro marido contra Wesley apressaram a sua
saída da América.
E o que caracteriza a terceira etapa do metodismo, segundo
Wesley?
A terceira etapa do Metodismo foi em Londres. Wesley percebeu
que o movimento sobreviveu em Oxford e se desenvolveu em outros
lugares. Percebeu também que muitos dos seus amigos haviam
experimentado uma transformação de vida, entre eles Whitefield, que
pregava com fervor em diversos lugares. Havia na Inglaterra uma
fermentação espiritual.766
No dia 1º de maio de 1738, o moraviano Peter Bohler organizou
uma célula (Band) convidando algumas pessoas que tinham o mesmo
modo de pensar; entre elas Wesley e James Hutton. Foram colocadas
duas regras para pertencer a essa pequena sociedade:
“1. Que eles se encontrariam uma vez por semanapara confessarem suas faltas uns aos outros e paraorarem também uns pelos outros a fim de que fossemcurados (cf. Tiago 5.16).2. Que qualquer outra pessoa, de cuja sinceridade elesestivessem bem seguros, poderia, se assim odesejasse, reunir-se com eles para aquele propósito”..767
766 Ibidem, p. 74.767 Ibidem, p. 78.
CCXXV
O grupo ficou conhecido como Sociedade Fetter Lane, que
Wesley chamaria mais tarde de:
“O terceiro surgimento do Metodismo”. 768
Com a ida de Peter Bohler para a América, Wesley ficou como o
líder principal da sociedade, cuja única exigência era a sinceridade de
intenção. A preocupação básica do grupo era com a soteriologia, a
saúde espiritual.769
Neste período, Carlos Wesley, em meio às lutas espirituais,
sentiu uma estranha palpitação coração e pode dizer que cria. Assim,
ele achou paz com Deus. Ele teve a certeza de que seus pecados
estavam perdoados.770 Três dia depois, em 24 de maio de 1738,
Wesley teve seu coração estranhamente aquecido. Sentiu seus
pecados perdoados e obteve a paz em Deus.771
Wesley visitou os moravianos, em 1738, na Alemanha e voltou
com mais dúvidas em relação à fé, mas ele aprendeu com a sua
organização e aplicou as classes em suas sociedades. Logo depois,
ele começou a se desprender de alguns ensinamentos dos
moravianos. Passou a aceitar que havia graus de fé e que a libertação
768 Ibidem,p.79.769 Ibidem, p.79.770LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.67.771 Abordamos a experiência de Wesley no 3º capítulo.
CCXXVI
do pecado deveria ser entendida como libertação do domínio do
pecado.772
Nesta etapa, dentro do tema da tese – avivamento e compromisso
social - o avivamento se sobressaiu.
Nesta terceira etapa, Wesley procurou entender mais da ação do
Espírito. Ao ler, em 10 de outubro de 1738, sobre as experiências de
Jonathan Edwards,773 Wesley percebeu a influência do Espírito Santo
nos reavivamentos na América e começou a entender mais sobre a
importância do Espírito Santo.774
As dúvidas, neste período, ainda continuavam na vida de Wesley,
especialmente sobre a fé, mas ele continuava a pregar com
entusiasmo.
O que ele havia lido sobre o mover do Espírito na América com
Jonathan Edwards aconteceria, pela primeira vez no princípio de 1739:
“Na passagem do novo ano, durante uma noite devigília na celebração da festa do amor, o poder de Deusveio poderosamente sobre o grupo Fetter Lane, de talmaneira que muitos gritavam com extraordinária alegriae muitos caíram no solo.”775
772 Ibidem, p.82.773 Jonatham Edwards (1703-1758) era pastor congregacional em Northampton. Foi olíder do chamado Grande Despertamento ocorrido na Nova Inglaterra. No Anexo, no finalda tese, colocaremos sua biografia.774HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.91.775 Ibidem, p. 90. Esta experiência é citada por alguns carismáticos e pentecostais como aexperiência do Batismo com o Espírito Santo ou unção do Espírito . No livro Heróis da Féestá escrito sobre essa experiência: ”Essa unção do Espírito Santo dilatou grandemente
CCXXVII
Logo depois, com temor, eles entoaram o cântico que diz:
"Louvamos-Te, ó Deus, reconhecemos a Ti como Senhor.”
Uma experiência carismática, segundo Casino Floristán,
acontece em diversas religiões e é caracterizada por fenômenos como
visões, audições, revelação, manifestações físicas, etc.776
Segundo Heitzenhater, a ação do Espírito começou a ser
evidente na vida dos que ouviam as pregações dos metodistas.
Wesley menciona que numa pregação em dezembro de 1738, uma
senhora foi liberta de sua loucura, outra recebeu testemunho de que
era filha de Deus, outra o testemunho do Espírito etc.777
“A inspiração espiritual deste tipo, entretanto,trouxe controvérsias. Wesley não era simplesmentecrédulo em todos os casos, mas estava inclinado a´testar o espírito do modo bíblico, ´para ver se ele erade Deus ou não.”778
Milhares de pessoas passaram a vir para ouvir as pregações de
Whitefield, Wesley e Carlos Wesley. Em 1739, Whitefield pregou em
uma ocasião para 30 mil pessoas. Cada vez que Wesley pregava,
haviam de um a quatro mil pessoas presentes. A média ficou no
primeiro mês em 3 mil pessoas ao ar livre, cemitérios, praças etc.779
os horizontes espirituais de Wesley” (BOYER, Orlando. Heróis da Fé. Rio de Janeiro:CPAD, 1986, p.68).776 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Juan José. Ibidem, p.487-8.777HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.92.778 Ibidem, p. 92.779 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 77.
CCXXVIII
Wesley não era um pregador tão conhecido como Whitefield,780mas logo o número de assistentes ficou entre 12 e 20 mil.781
Em Bristol, em 1739, a grande maioria dos participantes era
constituído de mineiros das minas de carvão, que ajudavam na
revolução industrial, na Inglaterra.782
“O tamanho dessas multidões não era tãoespantoso quanto o número relativamente pequeno depessoas que naquela época realmente estavamarroladas em sociedades até esse momento.”783
O clero local via essas pregações dos metodistas como sendo
algo ilegal.784 Havia manifestações espirituais que ele descrevia
dizendo que as pessoas estavam sendo fulminadas, feridas pela
espada do Espírito, tomadas de fortes dores. Algumas caíam de
joelhos, outras tinham estranhos acessos, mas ele registra ainda que
a maioria era aliviada pela oração e alcançava a paz.785
Em 1749, Wesley relatou sobre algumas manifestações no final
do culto:
“Quando, enfim, despedi o povo com a benção,ninguém se mexeu; ficaram todos nos seus lugares,enquanto eu ia passando no meio deles. Logo se ouviu
780 No Anexo abordaremos sobre a vida de George Whitefield.781LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 79.782 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 99.783 Ibidem, p.100.784 Ibidem, p.101.785 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, Ibidem, p.37-8.
CCXXIX
uma pessoa que gritou: ´Meu Deus, meu Deus, tu teesquecestes de mim´. Tendo dito isto, caiu no chão.Oramos a Deus em favor dela. Seus gritos junto com demuitos outros, clamando a Deus, se aumentaram. Masnós continuamos lutando com Deus em oração, até queEle nos atendeu com a paz.”786
Wesley precisava entender mais sobre o avivamento e leu os
relatos do avivamento que ocorria na América com Jonathan Edwards.
Ele passou a ver a ação do Espírito no meio do povo chamado
metodista como sendo a mesma ação que ele havia lido nos relatos
de Jonathan Edwards.787
“Ele menciona diversas mulheres, em particular, queresponderam `a obra do Espírito em conseqüência desua pregação em Oxford”.788
Segundo D.M.Llloyd.Jones:
“(...) Edwards defendia as incomuns e excepcionaisexperiências que estavam sendo concedidas a certaspessoas naquela época particular.”789
Esta terceira etapa foi um período de amadurecimento espiritual
na vida de Wesley:
“O terceiro surgimento do metodismo, a SociedadeFetter Lane, foi o resultado de uma combinação deinfluências: anglicana, metodista e morávia (...). Wesleyajudou a consolidar o trabalho dos metodistas e dosmorávios dentro das estruturas fornecidas pela Igrejada Inglaterra (...). Wesley estava calmamente
786 Ibidem, p.84.787HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 91.788 Ibidem, p.92.789 JONES, D.M. Lloyd. Os Puritanos, ibidem, p.372.
CCXXX
elaborando sua teologia no contexto de sua própriaperegrinação espiritual e dentro da edificação mútua depequenos grupos de crentes..”790
Era necessária uma estrutura e Wesley soube organizar o
movimento metodista, como veremos a seguir.
4.2.2. O caminhar do metodismo para sua estabilidade
Wesley não tinha a intenção de criar uma nova Igreja. Em 1790,
ele disse:
“Vivo e morro como membro da Igreja da Inglaterra,e ninguém que respeita o meu julgamento me separaradela”.791
Seu desejo era, através das sociedades, criar um povo capacitado
e santificado para assim transformar a Igreja Anglicana e a nação
inglesa. Tanto é verdade, que no início, ele não ministrava a Santa
Ceia nas sociedades, mas pedia que o povo participasse da Igreja
Anglicana.792 Ele não marcava cultos no mesmo horário dos cultos
anglicanos e nem tinha pastores, mas pregadores. Wesley, contudo,
tinha uma visão clara dos seus objetivos e de suas possibilidades:
“Dê-me cem pregadores que não tenham medo denada, a não ser do pecado, e que não desejem maisnada, a não ser servir a Deus, e, não me importo se sãoclérigos ou leigos, eles sozinhos farão tremer os
790 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.94.791 BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã, ibidem, p.292.792 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 191.
CCXXXI
portões do inferno e estabelecerão o reino dos céusaqui na terra.”793
Com o desenvolvimento, porém, Wesley foi obrigado a tomar
certas decisões e a criar certos organismos que foram aos poucos
afastando mais o Metodismo do Anglicanismo. O rompimento oficial,
porém, só ocorreu quatro anos após a sua morte, na Conferência
Anual realizada em 1795.794
“(...) embora pretendessem ´reformar´ a Igreja naInglaterra, na realidade davam aos metodistas umaidentidade própria distinta da Igreja.”795
Eis alguns avanços do Metodismo ocorridos durante o tempo em
que Wesley era o grande líder:
Em 1738 é criada a Sociedade de Fetter Lane que seria
denominada depois por Wesley como o terceiro surgimento do
Metodismo;796
No Natal de 1738, Wesley escreveu as Regras das Sociedades
Unidas. 797Era uma versão revisada das regras usadas pela
Sociedade Fetter Lane.798 As Regras consistiam basicamente em
793 Ibidem, p.266.794 Ibidem, p. 317-8.795 Ibidem, p. 314.796 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 94.797 Entre alguns itens das regras, estão: ” I – Abster-se cuidadosamente da prática domal, especialmente: 1) Não comprar ou vender no Dia do Senhor; 2) Não tomar qualquerbebida alcóolica a menos que seja indicada pelo médico;3) Serdes de uma só palavratanto no comprar como no vender (...) II – Praticardes boas obras zelosamente, de modoparticular: 1) Dardes a maior quantidade de esmolas que puderdes; 2) Chamardes aatenção de todos os que pecarem na vossa presença, e isso com amor e sabedoria; 3)
CCXXXII
“Abster-se cuidadosamente da prática do mal (...)Praticardes boas obras zelosamente (...) Atenderdesconstantemente a todos os mandamentos de Deus(...)”799
No dia 12 de maio de 1739 foi lançada a pedra fundamental do
que viria a ser o primeiro templo metodista no mundo - a casa de
pregação em Londres - Sociedade da Fundição.800
Dentro do tema da tese – avivamento e compromisso social - em
junho de 1739, foi lançada a pedra fundamental da Escola em
Kingswood para as crianças dos mineiros revelando a forte
preocupação de Wesley e dos metodistas com os empobrecidos:
“Para que as crianças (dos mineiros) tambémpossam saber aquilo que concorre para a sua paz, foiproposto, há algum tempo, que fosse construída umacasa em Kingswood; e no meio de muitas dificuldades,vistas e não vistas, foi lançada a pedra fundamental emjunho próximo passado.”801
Serdes exemplos de diligência, frogalidade, de renúncia e tomardes a vossa cruzdiariamente (...) III ) Atenderdes constantemente a todos os mandamentos de Deus, demodo especial: 1) Irdes à Igreja e comungardes todas as semanas e estardes presentesàs reuniões públicas das sociedades; 2) Ouvirdes a pregação todas as manhãs anão serque a distância, as ocupações ou a doença vos impeçam de fazê-lo; 3) Orardes todos osdias, em particular, e em família, se sois chefes de família (...). (BURTNER, Robert;CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem, p.265-60.798 Alguns autores levantam a possibilidade das Regras das Sociedades Unidas teremsido escritas em 1739 (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.90).799 BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem,p.265-6.800 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 78.801 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, ibidem, p.63-4.
CCXXXIII
Em 23 de julho de 1740 Wesley e seus companheiros fundam a
Sociedade Unida puramente metodista, após ter se afastado dos
moravianos de Fetter-Lane. 802 Wesley escreveu sobre sua origem:
“Oito ou dez pessoas vieram a mim, em Londres,em fins de 1739, e pareciam profundamenteconvencidas do pecado e a suspirar sinceramente pelaredenção. Como duas ou três fizeram no dia seguinte,desejavam que eu orasse com elas e as aconselhassesobre como fugirem da ira vindoura que pendiaconstantemente sobre as sua cabeças. Para quetivéssemos mais tempo para essa grande obra, marqueium dia em que poderiam vir juntas. Elas o fizeram todasas semanas, especialmente, às quintas-feiras à noite.Dei a estas e a quantas outras desejassem, pois o seunúmero crescia dia a dia, os conselhos que julgueinecessários, e sempre terminávamos a nossa reuniãocom oração adequada às suas diferentesnecessidades. Essa foi a origem da Sociedade Unida,primeiro em Londres e depois em outros lugares.”803
Em 1742 são organizadas as sociedades, dividindo os membros
em classes, visando levá-los ao perfeito amor. As classes eram
agrupadas geograficamente e continham todas as pessoas da
Sociedade.804
Wesley orientou como as pessoas deveriam se agrupar:
“Para que se possa discernir mais facilmente seestão realmente realizando a sua salvação, cadasociedade é dividida em grupos menores chamadosclasses, de acordo com as suas residências. Há cerca
802 WALKER, Welliston, Ibidem, p.210.803BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem,p.264. Enquanto Walker Welliston coloca a data de 23 de julho de 1740 (WALKER,Welliston, Ibidem, p.210), Wesley escreve que tudo começou em fins de 1739.804 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.118.
CCXXXIV
de 12 pessoas em casa classe sendo uma delasindicada para ser o líder.”805
Ao visitar a sociedade de Newcastle relaxada na disciplina, em
1743, Wesley normatizou o processo de realizar exames ao escrever
A Natureza, o Plano, e as Regras Gerais das Sociedades Unidas. Em
uma breve história e descrição das sociedades, Wesley detalhou as
regras para os membros.806
“A fim de se juntar à sociedade, era exigido que aspessoas demonstrassem apenas uma condição - ´odesejo de fugir da ira vindoura, para ser salvo de seuspecados´. Aqueles, entretanto, que quisessemcontinuar nas sociedades, deveriam demonstras ´aevidência de seu desejo de salvação, primeiro, nãopraticando o mal...segundo, fazendo o bem (...).terceiro, obedecendo todas as ordenanças de Deus.”807
Apesar destes três pré-requisitos não serem a totalidade da
verdadeira religião, eles se tornaram o mínimo que se esperava de
uma pessoa para permanecer na sociedade.
“Eles representavam a antítese doantinominianismo, que nessa época simbolizava umadas maiores ameaças ao programa wesleyano.”808
Em 1744 é realizada em Londres a Primeira Conferência Anual
para Pregadores.809
805 BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem,p.264.806 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 138.807 Ibidem, p. 138.808 Ibidem, p.139. Antinomianismo significa não praticar a lei.809 "A Conferência abriu suas sessões na Segunda feira, 25 de junho de 1744, e durouuma semana. Além dos dois irmãos Wesley, estavam presentes mais quatro ministros
CCXXXV
No ano de 1746 são nomeados pregadores itinerantes e o
campo é dividido em circuitos. Wesley estabeleceu sete circuitos com
vários pontos de pregação, para onde os pregadores eram
designados, geralmente dois ou três para o mesmo local e um mês de
itinerância, depois se mudavam para outra região.810
“A fim de manter seus pregadores em atividadeconstante e evitar que esgotassem seus recursospregando em um mesmo lugar, exigia deles quemudassem freqüentemente do local de atividade. AConferência de 1767 regularizou essas substituições etornou-as obrigatórias. Ali se resolveu que ´não sedevia manter o mesmo pregador no mesmo lugar pormais de um ano, e nunca mais do que dois anosconsecutivos´. Mais tarde, esse limite foi ampliado paratrês anos.” 811
No ano de 1748, Wesley publicou o segundo volume de
sermões.812
Em 1769, Wesley tomou uma decisão histórica: perguntou na
Conferência quem estaria disposto a ir como pregador para a América.
anglicanos: João Hodges, pastor em Wenvo (principado de Gales); Henrique Piers, vigáriode Bexley, convertido através de Carolos Wesley e um dos partidários mais devotos domovimento; Samuel Taylor, bisneto do dr. Rowland Taylor, que confessou a sua fé emcima da fogueira nos dias de Maria, a sanguinária,; e, por último, João Meriton, pastor dailha de Man, associado, nos últimos anos de sua vida, com o ministério itinerante de seusamigos Wesley. Dos quatro pregadores leigos que tomaram parte da primeiraConferência, Tomás Richards, Tomás Maxfield e João Bennet passaram a ser,posteriormente, ministros de outras igrejas. Somente João Downes viveu e morreu comometodista" (LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 139-0).810 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 162811 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.242.812 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.177.
CCXXXVI
Boardman e Pilmoor se ofereceram. Foi o início da autonomia do
metodismo na América, que aconteceria em 1784.813
Em 1770 a Conferência Anual toma forte posição arminiana. Em
1771, Wesley publicou Vindication of the Rev. Mr.Wesley’s Last
Minutes (Defesa das últimas Minutes do Rev. Sr. Wesley) escrito por
John Fletcher.814 Foi o tiro inicial de uma longa série de rajadas contra
os calvinistas.815
“A principal ameaça à oposição calvinista, deacordo com os wesleyanos, era o antinomianismo, ounegligência da lei moral. O trabalho de Fletcherfocalizava esse assunto (...).” 816
Em 1772, foi fundada em Londres, patrocinada por Wesley, uma
sociedade para assistir os pobres conhecida como Comunidade
Cristã.817
Dentro da tese – Avivamento e compromisso social – a criação
desta sociedade revela o compromisso social de Wesley com os
empobrecidos.
A Conferência Anual de 1784, Wesley fez o "Ato de Declaração"
ou o Estatuto Declaratório nomeando uma conferência de 100
pregadores - os "Cem Legais" - como sucessor de Wesley em
perpetuidade. Esse documento foi registrado no Tribunal Superior no
813 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.233.814 No Anexo, abordaremos sobre a vida de Fletcher.815 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 246-7.816 Ibidem, p.247.
CCXXXVII
dia 28 de fevereiro de l784.818 Em 1784, no dia primeiro de setembro,
Whatcoart e Vasey são nomeados por Wesley como diáconos na
América. Logo depois, foram ordenados presbíteros. Thomas Coke foi
nomeado como superintendente na América.819
Com a independência da América, muitos sacerdotes anglicanos
voltaram à Inglaterra. Milhares de crianças permaneciam sem batismo
na América e alguns metodistas permaneciam sem participar da Ceia
do Senhor.820 A nomeação de pastores, portanto, era necessária e
urgente. Mesmo com oposição, Wesley procedeu à ordenação de
presbíteros para pastorearem na América.821 Neste mesmo ano, na
Conferência de Natal, na América, é criada a Igreja Metodista
Episcopal. Uma denominação separada da Inglaterra.822
Na Conferência Anual, em 1788, Wesley ordenou Alexander
Mather, presumivelmente para suprir a continuidade de ministros
metodistas ordenados na Inglaterra depois de sua morte. Dois meses
depois, nomeou um comitê para supervisionar a livraria e gerenciar as
suas contas. Quatro meses mais tarde escreveu um testamento
revisado.823
Em 1771, Wesley já havia feito seu testamento:
817 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.281.818 Ibidem, p.310.819 HEITZENHATER, Richard P., cit, p.287.820 Ibidem, p.287.821 Ibidem.822 O ano de 1784 foi o "ano crucial do metodismo, ocasião em que Wesley concedeu àssociedades inglesas sua constituição, e às norte-americanas a sua organizaçãoepiscopal" (LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.309).
CCXXXVIII
“Revisei e transcrevi meu testamento, declarando,em linguagem simples, clara e breve o mais que pude,nada mais e nada menos o ´que tenho feito com osbens terreais que deixarei no mundo” .824
Em 1790, o Metodismo tinha cerca de 300 pregadores na
Inglaterra e 71.463 membros;825
Wesley faleceu em 1791, no dia dois de março. Antes, reuniu
forças para cantar o hino "Louvarei meu Criador enquanto tiver fôlego.”
João Wesley disse:
“O melhor de tudo é que Deus está conosco.”826
Até na hora do seu enterro, Wesley pensou em ajudar aos
pobres dentro de sua prática de amar ao próximo. O seu funeral foi no
dia nove de março e seis pessoas pobres levaram o caixão. Eles
ganharam uma libra cada uma, conforme desejo de Wesley.
Nas decisões seguintes da Conferência, William Thompson foi
eleito presidente da Conferência, em 1791.827 Na Conferência de
1795, pelo Plano de Pacificação ocorreu à separação eclesiástica
entre o Metodismo e Anglicanismo.828
823 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 200-1.824 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.169-0.825HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, 306.826 Ibidem, p.308 -9.827 Ibidem, p.314.828 Ibidem, p.317.
CCXXXIX
Conclusão do capítulo
Wesley foi um homem do seu tempo. Ele viveu e sentiu
intensamente as alegrias, contradições e sofrimento do povo inglês, do
qual ele esteve muito perto. Como um cristão, viveu também a
revolução espiritual que ocorria na Inglaterra e em outras partes do
mundo. Experimentou o coração aquecido e viu fenômenos
acontecerem em suas pregações.
Estudou, debateu e formulou posições doutrinárias para alicerçar
o povo metodista em sua busca pela santidade.
Herdou as ênfases e práticas religiosas do anglicanismo,
puritanismo e pietismo. Na busca da segurança da fé e da paz de
espírito, teve encontros com novos líderes e outros grupos, como os
moravianos, e teve diante de si novos horizontes da espiritualidade e
aprendeu sobre novas formas de servir a Deus.
Mas foi na caminhada da prática da fé, nas crises e desafios que
Wesley e os primeiros metodistas amadureceram e encontraram
definitivamente a base doutrinária do movimento metodista, debatida e
formulada, especialmente, nas Conferências Anuais.
Deixou a doutrina da Perfeição Cristã como a forte base
doutrinária da nova Igreja que se formou porque acreditou que Deus
CCXL
havia levantado o povo metodista para transformar a Igreja e a nação
e espalhar a santidade bíblica por sobre a terra.
Wesley soube organizar o movimento metodista evitando que o
avivamento caminhasse para o fanatismo e o compromisso social
fosse transformado no quietismo indiferente ao sofrido povo inglês,
como veremos no capítulo a seguir.
CCXLI
5- O IMPACTO DO AVIVAMENTO METODISTA
“Deus derramou abundantemente Seu Espíritosobre nós.”829
João Wesley
O avivamento 830 do século XVIII, na Inglaterra, ocorrido entre os
metodistas é considerado paradigma831 para algumas pessoas.832 Ele
teve como conseqüência a solidariedade aos necessitados,
especialmente aos operários.
Em um dos seus sermões, Wesley disse:
“Mas quantos há neste país cristão que trabalhame suam e afinal não têm senão que lutar contra atristeza e a fome?” 833
829 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, ibidem, p.105.830 Max Weber usa a expressão poderoso revival para falar do movimento metodista noséculo XVIII, na Inglaterra (A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, Ibidem, p.125).831 Segundo Kuhn, o paradigma é ’um modelo ou padrão aceito’ que orienta a montagemde um quebra-cabeça, servindo para solucionar problemas considerados importantes pelacomunidade que o adota” (CASTRO, Clóvis Pinto de et al.Novos Paradigmas. Ibid, p.32).Nesse sentido, o avivamento metodista é um padrão para o verdadeiro avivamento bíblicopara os dias de hoje.832 MAC ALISTER, Robert. Boletim do bispo Roberto. [s.ed], dezembro de 1987.833 BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem,p.246.
CCXLII
Para muitos estudiosos e líderes evangélicos, o Movimento
Metodista impediu a Inglaterra de ter uma revolução semelhante a
que aconteceu na vizinha França, em 1789.834
Avivamento e compromisso social caminharam sempre juntos
no metodismo do século XVIII. As experiências espirituais na vida de
Wesley foram diversas ao longo de toda caminhada, mas duas foram
fundamentais: o coração aquecido, em 24/05/1738, e o derramamento
do Espírito Santo, em 01/01/1739.835 Por outro lado, a ação do Espírito
Santo trouxe compromisso com os necessitados:
“Já na primeira conferência anual (1744), aoestabelecer algumas regras práticas para aliviar asituação dos mais necessitados, aponta nessa direção:‘Até que tenhamos todas as coisas em comum, cadamembro trará, uma vez por semana, honestamente,tudo que possa para um fundo comum.”836
João Wesley, em seu sermão O Cristianismo Bíblico, pregado em
24 de agosto de 1744, em Oxford, comenta sobre os motivos da
manifestação do Espírito Santo a todos os cristãos, entre eles, após
realizar mudança interior, levar a andar no trabalho de amor:
834“ Num tom apologético, alguns ” historiadores concordam que, embora o século XVIIIfosse para a Europa continental uma época de dissolução, para a Inglaterra, pelocontrário, foi o momento de benéfica mudança, que regenerou a vida de uma nação einiciou uma era inteiramente nova (...). Essa regeneração da Inglaterra foi, em especial,obra do metodismo, e assim reconhece a história eclesiástica” (LELIÈVRE, Mateo,Ibidem, p. 371). O francês Edmundo Scherer chama o metodismo de o ‘movimento quetransformou a face da Inglaterra’ (Ibidem, p. 372).835 Para Nadir Pedro dos Santos, um dos líderes do Movimento de Renovação Espiritual,na década de sessenta e um dos fundadores da Igreja Metodista Wesleyana, em 1967, nodia 24 de maio, Wesley teve a experiência da justificação e no dia 1º de janeiro, ele teve aexperiência da santificação (Retalhos de um Pastorado Itinerante. Cromosete Gráfica eEditora Ltda, 1997, p.59-0).836 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização, Ibidem, p.29.
CCXLIII
“Conceder-lhes ( o que ninguém pode negar sejaessencial a todos os cristãos, em todos os tempos), amente que havia em Cristo; os santos frutos do Espírito,os quais, não os tendo alguém, esse tal não lhepertence; teve em vista enchê-los de ‘caridade, gozo,paz, longanimidade, benignidade, bondade (Gál, V:22-24); dotá-los de fé (talvez esta idéia melhor se expressepelo termo fidelidade), com humildade e temperança;habilitá-los a crucificar a carne, com suas feições ecobiças, suas paixões e desejos; e em conseqüência damudança interior, assim assegurada, preencher todajustiça exterior, ‘andar como Cristo também andou na‘obra da fé, na paciência da esperança, no trabalho deamor’ (! Tes.I:3).837
Neste capítulo pretendemos mostrar que o metodismo participou
profundamente na transformação social inglesa porque viveu o
Evangelho integral de Jesus Cristo. Ele procurou suprir às
necessidades espirituais e sociais, especialmente dos excluídos pela
revolução industrial.
5.1. O desenvolvimento da ação do Espírito Santo no movimento
metodista
O mover838 do Espírito no meio do povo chamado metodista, na
Inglaterra, não foi um fato único e isolado. Houve simultaneamente
outros avivamentos em algumas partes do mundo.839
837 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 1.v, ibidem, p.83.838 Wesley utiliza a expressão ”Movidos pelo Espírito Santo” (BURTNER, Robert; CHILES,Robert, Ibidem, p.20.)839REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História, Metodismo,Libertações, Ibidem, p.15.
CCXLIV
O dia 13 de agosto de 1727 é conhecido como o dia do
renascimento da Igreja Moravia.840.Quando era realizado um ofício, os
presentes foram marcados por um forte poder espiritual. Casiano
Floristán e Floriano José Tamayo explicam esta experiência com o
sagrado:
“Nesses momentos e situações o sujeito entra emcontato com novas dimensões da realidade queexpressa em termos de profundidade ou totalidade;assiste uma ampliação maravilhosa das fronteiras deseu conhecimento; transcende a forma deconhecimento ordinário em termos de sujeito-objeto; sesente de alguma maneira inundado pela realidade quese apresenta e até misteriosamente identificado comela; e padece de uma comoção afetiva que originasentimentos de paz, gozo (...)”841.
Por volta de 1730, aconteceram os chamados reavivamentos em
Gales e na Escócia, que antecederam a Wesley.842 Na América, a
partir do fim de 1734, Jonathan Edwards foi o líder no chamado
"Primeiro Grande Despertamento.”
“O movimento de maior influência e o maistransformador na vida religiosa da América no séculodécimo oitavo foi o Grande Despertamento –reavivamento que teve muitas fases e se estendeu pormais de cinqüenta anos.”843
Não se pode também atribuir a João Wesley a realização do
avivamento metodista na Inglaterra. Havia um mover do Espírito em
diversos lugares e sua ação em meio ao povo metodista aconteceu
840 HEITZENHATER, Richard P. Ibidem, p.198.841 FLORISTÁN, Casiano; TAMAYO, Floriano Juan José, Ibidem, p.483-4.842 Ibidem, p.97.843 WALKER, Welliston, Ibidem, p.216.
CCXLV
com diversos líderes. Ele foi, sim, o principal líder do movimento
metodista. Segundo Duncan Alexander Reily:
“Wesley percebia que os diversos movimentos, asaber: os morávios, no continente da Europa, osmetodistas, na Grã-Bretanha, Jônathas Edwards eoutros na Nova Inglaterra (América do Norte) realmenteperfaziam uma única obra de Deus.”844
Foi George Whitefield quem despertou Wesley para as
pregações ao ar livre aonde milhares vinham participar e onde houve
diversos derramamentos do Espírito. Wesley o viu pregar no dia 1º de
abril de 1739 para trinta mil pessoas em Rose Green. Ele logo passou
a pregar também no "campo".845
O fato de não estar dentro de um ambiente litúrgico rígido da
Igreja Anglicana trouxe maior liberdade às pessoas e ao Espírito
Santo.
A experiência de 24 de maio de 1738846 trouxe a Wesley a
segurança da salvação, mas a experiência do poder de Deus, na
madrugada da vigília iniciada, no dia 3l de dezembro do mesmo ano,
trouxe a Wesley profunda reflexão sobre o derramar do Espírito Santo.
“Tais demonstrações da obra do Espírito levaramWesley a refletir sobre sua própria condição e, empoucos dias, teve novamente uma oportunidade deescrever notas de auto-reflexão.”847
844REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História, Metodismo,Libertações, Ibidem, p. 15. A expressão “campo” significa pregar fora do templo.845 Ibidem, p. 99.846 Experiência citada e comentada no Capítulo 2.847 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p. 90.
CCXLVI
A ação do Espirito Santo passou a fazer parte da vida diária de
Wesley. Em 1749, ele registrou em seu Diário:
“Preguei (como de costume), às cinco horas e àsquinze, com convicção e poder do Espírito.”848
Dez anos antes, em 1739, Wesley escreveu alguns versos num
volume de Hinos e Poemas Sagrados onde ele revela sua
necessidade do poder do Espírito Santo e do amor de Deus:
“(...) Senhor, fortifica-me com o poder do TeuEspírito,Posto que sou chamado pelo Teu grande nomeEm Ti todos os meus pensamentos errantes se unem,De todas as minhas obras seja Tu o alvo;O Teu amor me assista toda a vidaE a minha única ocupação seja o Teu louvor (...)”. 849
Segundo Heitzenhater, tais experiências levaram Wesley a auto-
reflexão e a registrar que tinha dúvidas sobre si em relação ao amor,
paz e alegria. Em sua avaliação, o cristão é alguém que tem o fruto do
Espírito. Nesse sentido, ele não se considerava um cristão850.
A partir de 1739, Wesley presenciou uma constante ação do
Espírito no meio do povo. Estiveram presentes em suas pregações
848 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.82.849 ______.______. Explicação clara da perfeição cristã. Ibidem, p.13-4.850 Ibidem.
CCXLVII
milhares de pessoas: Blackheath (12.0000); Moorfields (20.000);
Gloucester (7.0000); Parque de Kensington (20.000).851
Após longa experiência com as pregações e com as sociedades
metodistas, seu conceito, em 1761, era:
“(...) onde não se encontra o poder de Deus, otrabalho enfraquece.” 852
Multidões vinham ouvir as pregações dos metodistas. Em 20 de
maio de 1752, Wesley registrou em seu Diário:
“Preguei em Beddick a grande multidão de Coliers (mineiros de carvão), ainda que chovia durante apregação.”853
A teologia e os métodos de Whitefield e Wesley passaram a ser
atacados pela imprensa local, mas o pai de Metodismo passou a ter
consciência de que Deus o havia chamado para pregar além das
fronteiras da paróquia.854
As sementes do avivamento estavam brotando no meio do povo
chamado metodista de uma forma que Wesley e os primeiros
metodistas não haviam pensado ou experimentado antes. Com o
851 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 79.852 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, ibidem, p.115.853 Ibidem, p.73.854 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 86.
CCXLVIII
avivamento, muita gente simples do povo passou a freqüentar as
sociedades metodistas.855
Nas pregações de Wesley e Whitefield começaram a haver
manifestações físicas. Alguns caiam no chão. Outras pessoas
gritavam, choravam, gemiam. Até auto-esbofeteamento e mordidas
ocorriam.856
Certa ocasião, um quaker estava perto e muito desgostoso pela
dissimulação daquelas criaturas. Ele estava mordendo os lábios e
franzindo a testa quando caiu como que fulminado por um raio.857
Wesley e os metodistas foram chamados de entusiastas,858 ou
seja, pentecostais, para os dias de hoje. Wesley não aceitava essa
acusação. Ele orava a Deus para livrar as pessoas dos gritos, que
revelavam que sua alma estava em profunda agonia.859
As manifestações passaram a ser algo natural nos cultos em que
Wesley e Whitefield pregavam. Certa vez, Wesley foi impedido de
pregar em Epworth e o pastor local pregou um sermão o acusando de
entusiasta.860 Alguém convidou Wesley para voltar ali e pregar às 6
855 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 127.856 REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História, Metodismo,Libertações, ibidem, p. 20.857 FISCHER, Harold A. Avivamentos que avivam. Livros Evangélicos, 1961, p. 101.858 O Bispo Joseph Butler foi um dos que chamou os irmãos Wesley e Whitefield de “entusiastas” (REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História,Metodismo, Ibidem, p. 19).859 Ibidem.860 Quando havia prática contrária ao ensinamento bíblico, Wesley não deixava de orientarou até repreender aos que agiam assim, mesmo sendo pregadores, como aconteceu comGeorge Bell, que marcou o fim do mundo para 28 de fevereiro de 1763. Ele acabou
CCXLIX
horas da manhã. Ele ficou no lado oriental do templo, sobre o túmulo
do seu pai e pregou durante uma semana no mesmo lugar.
“Neste local, algumas vezes, suas voz era abafadapelo choro e clamor dos ouvintes e diversos caíramcomo se estivessem mortos. Ele disse: Meu paitrabalhou aqui durante quase 40 anos; mas houvepouco fruto. Eu sofri também entre este povo, e pareciaque os meus esforços eram feitos em vão, mas osfrutos aparecem agora.”861
Os que eram alcançados pelo mover do Espírito Santo estavam
dependentes de Deus: o povo simples, sofrido, que vivia
miseravelmente. Eram os mineiros, os criados, os tecelões
desempregados, as crianças pobres, etc. Eles experimentaram a
graça de Deus e eram transformados. 862
Para Wesley:
“O mesmo Espírito que conduz o pecadorarrependido a Cristo e lhe permite confessar ´Jesus éSenhor´ (1Co 12.3) faz-nos não apenas andaruniformemente como Cristo andou (1Co 11.1) comotambém ter o mesmo sentimento que nele houve, asaber, o de esvaziar-se a si mesmo e identificar-se coma nossa humanidade, nossa miséria, nosso pecado enossas contradições, a fim de nos remir (...).”863
deixando o metodismo, juntamente com Maxfield. Wesley chegou a mandar Bell a pararde falar em línguas (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 209-0).861 FISCHER, Harold A. Avivamentos que avivam. Ibidem, p.102.862 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 90.863 REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História, Metodismo,Libertações, Ibidem, p. 18.
CCL
Os avivamentos aconteciam em momentos de orações ou
pregações. Não era algo programado. Em abril de 1739, houve um
reavivamento em Bristol.864 Em 1750, o reavivamento metodista era
reconhecido na Inglaterra.865
Em 31 de maio de 1767, Wesley registra em seu Diário sobre um
grande avivamento ocorrido em Cork:
“Estive aqui quando a chama do avivamento estavamais alta, e preguei ao ar livre, no centro da cidade e nolado sul, perto do quartel, e diversas vezes emBlackpool, que fica ao norte. Mais e mais interessados,e houve aqui avivamento maior do que em qualqueroutra parte do reino.” 866
No Diário de Wesley e outros livros encontramos o relato de
diversos acontecimentos relacionamentos ao Espírito Santo no meio
do povo metodista:
A descrição de Wesley sobre ação do Espírito Santo revela a
evidência do fruto do Espírito no movimento metodista. O avivamento
se tornou parte da identidade metodista. Numa das reuniões, em 13
de outubro de 1747, a chama do amor marcou a vida dos presentes:
“(...) uma chama de amor se manifestou de talmaneira como nunca se tinha visto antes.”867
864 HEITZENHATER, Richard, Ibidem,98-9.865 Ibidem, p.181.866 WESLEY, João.Trechos do diário de João Wesley, ibidem, p.156.867 Ibidem, p.97.
CCLI
Em outra reunião, em 9 de fevereiro de 1750, o fruto do Espírito
descrito por Wesley foi a alegria:
“(...) a voz de louvor subiu ao trono de Deus, e foigrande o nosso regozijo perante o Senhor.”868
Já na reunião de 18 de fevereiro de 1750, uma semana depois,
houve a experiência com o poder de Deus:
“Hoje, também, onde nós nos reunimos, Deusmanifestou Seu poder.”869
A ação do Espírito proporcionava a mudança do caráter. Não era
apenas a evidência dos dons espirituais, como em 28 de abril de 1762,
quando houve transformação nas pessoas presentes:
“Deus derramou abundantemente Seu Espíritosobre nós. Muitos ficaram cheios de consolação (...)Deus restaurou o homem à luz da Sua face, e deu àjovem moça a convicção clara do Seu amor.”870
Junto com o avivamento vinham também os problemas como
resultado de extravagâncias. No avivamento de 1762, em Londres,
Wesley comenta sobre o joio semeado por Satanás entre o trigo, após
ele se ausentar:
“Mas logo que me ausentei, estalou o entusiasmo.Dois ou três começaram a espalhar suas própriasimaginações como revelações vindas de Deus, e daísupuseram que jamais morreriam; estes, lutando paraque outros fossem da mesma opinião, provocarambarulho e confusão. Pouco depois, estas mesmas
868 Ibidem, p.101.869 Ibidem, p.103.870 Ibidem, p.105.
CCLII
pessoas com algumas mais, cometeram outrasextravagâncias; criam-se imunes à tentação e à dor; eque possuíam o dom de profecia e de discernir espíritos(...). Nesta época, um amigo que morava certa distânciade Londres, me escreveu assim: ´Não fique alarmadoque Satanás semeie joio entre o trigo de Jesus Cristo.Sempre foi assim, especialmente numa ocasião denotável derramamento do Espírito (...)” .871
Em 10 de julho de 1767, Wesley mostra em seu Diário que a
manifestação do Espírito acontecia também pela oração. Deus não era
indiferente ao clamor dos metodistas:
“(...) Deus respondeu às nossas orações. Pareciaque as portas do céu foram abertas.”872
Em algumas ocasiões, como em 9 de outubro de 1768, as
orações eram incessantes para Deus manifestar sua graça. Havia uma
certeza de que Deus era poderoso e misericordioso para os atender:
“(...) não cessaram de clamar a Deus enquanto nãoforam atendidos. Deus lhes transbordou o coração dealegria.”873
Os metodistas oravam também por um avivamento específico,
como Wesley revela que aconteceu, em 19 de maio de 1769:
“(...) oramos por avivamento no trabalho do Senhor(...) desta feita Deus tocou o coração do povo, e até ocoração daqueles que estavam mortos no pecado.”874
871 WESLEY, João.Explicação Clara da Perfeição Cristã, ibidem, p.72.872______.Trechos do diário de João Wesley, Ibidem, p.99.873 Ibidem.874 Ibidem.
CCLIII
Wesley descreveu a mudança que o Espírito do Senhor realizou
em suas vidas e, conseqüentemente, nas fábricas:
“Não mais impudícia ou profanação foramencontrados, pois Deus havia colocado uma novacanção em seus lábios, e as blasfêmias setransformaram em louvor.”875
Diversos metodistas experimentaram o poder do Espírito.
Wesley, como cita a madame Guyon:
“Creio que ela não era somente uma boa mulher,mas até mesmo virtuosa em grau eminente,profundamente consagrada a Deus e muitas vezesfavorecida por comunicações extraordinárias com oEspírito Santo.”876
Essas experiências são denominadas por Casiano Floristán e
Juan José Tamayo de “Experiências religiosas como experiências da
presença de Deus, com ou sem mediação perceptiva”.877 Segundo
eles:
“Decisivo em tais experiências o fato de que osujeito não só percebe a presença, senão que a aceita,a reconhece (...) pode em outros casos converter-se joentendimento e a consciência de uma presençapermanente de Deus, que envolve a vida de umapessoa (...) constitue um índice elevadíssimo derealidade que lhes leva a conceder-lhes maior créditoque o mesmo testemunho dos sentidos.”878
875 Ibidem.876 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 302.877 FLORISTAN, Casiano; TAMOYO, Juan José, Ibidem, p. 485.878 Ibidem.
CCLIV
Alguns dons do Espírito Santo eram evidenciados no meio do
povo metodista. João Wesley dizia que o dom de curar é um dom que
havia sido destinado a permanecer na Igreja.879 Ele dizia também que
Deus dava sonhos divinos, êxtases e visões para fortalecer e animar
aos que crêem.880
Thomaz Walsh registra em seu diário, em 08/03/1750, que o
Senhor lhe deu um idioma desconhecido, achegando sua alma a Ele
de um modo maravilhoso.881
Wesley, contudo, teve dificuldades com alguns pregadores na
questo dos dons espirituais. Ele pediu ao pregador George Bell para
deixar de falar em línguas como sendo de Deus.882
Em 1788, disse que observava há quase setenta anos os
profetas que profetizam coisas terríveis. Para Wesley, eles eram
levados pela vã imaginação e raramente se convenciam de seus
erros. 883 Wesley fala do misticismo como sendo um veneno.884
5.2. Diferentes avivamentos no meio do povo metodista
879 BAILEY, Keith. Cura Divina. Editora Betânia, 1988, p. 200.880 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 134.881 CONDE, Emílio. Pentecoste para todos. CPAD, 1985, p. 35.882 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.210.883 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.211.884 Ibidem.
CCLV
O avivamento se tornou uma marca do metodismo. Wesley,
contudo, também observou um "entusiasmo selvagem" entre o
avivamento genuíno.885 Ele se pautou sempre pelo equilíbrio e
fundamentação bíblica. Fora disso, Wesley não tinha dúvidas de
questionar. Foi assim com George Bell, que pregava o fim do mundo
para 28 de fevereiro de 1763. Ele se separou dos metodistas.886
Mas, no meio dos exageros, Wesley também presenciou
diversas manifestações do poder do Espírito. Em 1884, ele encorajou
o avivamento na Inglaterra dizendo:
“A quem verdadeiramente esses são os símbolosde nossa missão, prova de que Deus nos enviou.Sessenta mil pessoas volvendo suas faces para o céu,e muitas delas se regozijando em Deus, seu Salvador.”887
Apesar de alguns verem o Metodismo entrando em um período
de tempestade e tensão, Wesley comparava a obra do Espírito entre
os metodistas ingleses com o reavivamento realizado por Jonathan
Edwards na América, quando houve uma forte ação do Espírito
Santo.888
Um dos reavivamentos que impressionaram Wesley foi o de
Weardale, em 1772. Entre as semelhanças com os outros
reavivamentos estão: "seu surgimento inesperado, rápido progresso,
grande número de conversões, emoções violentas que ocorreram, e o
885 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.277.886George Bell foi repreendido por Wesley e saiu do movimento metodista, juntamentecom Maxfield e alguns seguidores (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.210).887 Ibidem, p.293.
CCLVI
povo simples que o liderou", mas também Wesley percebeu que
haviam diferenças:
“Este era um verdadeiro reavivamento do trabalho,não um começo; o povo foi despertado e justificado emtempo muito mais curto; um número muito maior foiconvertido; o número de visões e revelações fatalmentefalsificadas pelo diabo foi bem menor; e o grupo deliderança incluía três pregadores itinerantes que foramrenovados em amor (...).”889
Se Wesley não promovia encontros de avivamento, não se pode
deixar de registrar que ele sabia de sua importância. No princípio, em
1739, Wesley viu diversas manifestações do poder de Deus, que ele
descrevia as pessoas como sendo:
“(...) fulminadas, feridas pela espada do Espírito,tomadas de fortes dores, feridas no coração ou caíamde joelhos.” 890
Houve muitas críticas a Wesley e ao Movimento Metodista.891
Mas essas pessoas atingidas pelo poder de Deus eram aliviadas pela
oração e encontravam a paz.892
Neste período, nas colônias inglesas na América, também
estava havendo avivamento. Foi o chamado "Primeiro Grande
Despertamento". Começou com Jonathan Edwards, em 1734. Logo
depois, chegou George Whitefield que teve uma grande participação e
888 Ibidem, p.293.889 Ibidem, p.249.890 Ibidem, p.100.891 Ibidem, p.100-1.892 Ibidem, p.100.
CCLVII
o avivamento se espalhou por diversos lugares até por volta do ano de
1758. Mais tarde, Wesley compararia a obra do Espírito nos
metodistas, na Inglaterra, com os reavivamentos de Jonathan
Edwards, na Nova Inglaterra.893
A ação do Espírito de Deus acontecia em diversos lugares,
especialmente onde haviam corações humildes, submissos ao Senhor,
que viviam nos limites da miséria e só esperavam em Deus.894
Pentecoste era uma expressão utilizada por Wesley para falar da
vinda do Espírito Santo. Apesar de toda a ação Espírito que acontecia,
ele declarou em 1762:
“O dia de Pentecostes não chegou ainda na suaplenitude; mas não duvido que venha (...).”895
O progresso da obra missionária foi um fruto reconhecido por
Wesley que revela a chegada do Pentecoste. Ele sabia que o Espírito
poderia realizar coisas maiores. Neste mesmo ano, Wesley disse:
“Nosso Pentecoste finalmente chegou’, disse em1762, ao contemplar os progressos da obra missionária.Somente em Londres, mais de 400 membros dassociedades testificaram que foram libertos de todopecado. Em Liverpool, a sociedade passou por umaverdadeira metamorfose em sua perfeição.”896
893 Ibidem, p.293.894 Ibidem, p.127.895 WESLEY, João, Ibidem, p.130.896 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.217.
CCLVIII
O avivamento era resultado do trabalho espiritual que as
sociedades desenvolviam na busca da perfeição cristã. O avivamento
havia começado mesmo em 1761 e o objetivo era buscar a santidade.
“O grande avivamento que apareceu no âmbitodas sociedades em 1761 era a melhor prova de queelas levavam muita a sério essa missão” .897
Wesley estava feliz com o que presenciava. Era o coroamento
de todo um trabalho. Ele disse:
“Aprouve a Deus derramar Seu Espírito em todasas partes, tanto na Inglaterra como na Irlanda, e de umamaneira tal que nunca sequer vimos antes, pelo menosnestes últimos vinte anos.” 898
O avivamento em Dublin foi o mais notável para Wesley. Teve
início com um pregador chamado João Manners, pessoa singela e
sem eloquência, mas que parecia destinada a essa obra. João Wesley
descreveu o que viu:
“Essa gente está tomada pelo fogo divino; nuncapresenciei dias como o domingo passado. Enquantoorava na sociedade, o poder de Deus tomou conta denós completamente, e alguns exclamavam em voz alta,‘Senhor, já posso crer.” 899
Wesley presenciou a chama do avivamento não somente entre
os jovens e adultos, mas também entre as crianças por volta do ano
de 1781.900 Em Epworth, a industrialização havia instalado quatro
897 Ibidem, p.216.898 Ibidem, p.217.899 Ibidem, p.218.900 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 277.
CCLIX
fábricas de fiar e tecer. Diversas crianças foram empregadas. Algumas
delas entraram por acaso em uma reunião de oração e foram tocados
no coração.
“Alguns deles entrando por acaso em uma reuniãode oração foram tocados no coração. Seus esforçosentre os companheiros mudaram então as condiçõesem três fábricas.”901
Wesley ficou entusiasmado também com a Escola Dominical,
que atendia especialmente as crianças. Ele acreditava que era uma
das formas de expandir o avivamento. Ele deu todo apoio ao jornalista
Roberto Raikes, quando ele deu início ao atendimento aos meninos e
meninas que andavam pela rua e incentivou aos metodistas que
sempre ensinassem às crianças.902
Mas, afinal, o avivamento era algo que deveria somente
acontecer naturalmente ou deveria ser propagado?
Como característica do metodismo, Wesley entendeu que o
avivamento deveria ser propagado. Em 1787, ele escreveu a um de
seus pregadores que havia organizado uma Escola Dominical e disse:
“Parece que essas escolas serão um meiopoderoso de que Deus se valerá para propagar umavivamento religioso no país.” 903
901 Ibidem.902 WALKER, Welliston., Ibidem, 224.903 Ibidem, p.299.
CCLX
Nisto tudo vemos que o metodismo foi uma expressão dinâmica
da espiritualidade, em seu inicio, onde a ação do Espírito Santo foi
fundamental:
“A expressão de uma espiritualidade dinâmicapessoal e comunitária. A plenitude da manifestação doEspírito na vida da pessoa e da comunidade testifica olugar fundamental do Santo Espírito no movimento. Elenão seria apenas o Consolador, mas o Sustentador, oFortalecedor, o Inspirador, o que nutria todos nocaminho da verdade, o que possibilitaria a experiênciada graça, o recebimento do dom e o frutificar da novavida.”904
5.3. A conseqüência do avivamento metodista: compromissosocial
“Refletindo hoje sobre o caso de uma pobre mulherque sofre continuamente de dor no estômago, pudeobservar a negligência indesculpável da maioria dosmédicos nos casos dessa natureza. Prescrevem drogase mais remédios sem saberem um jota da natureza detais desordens. Não a conhecendo, não podem curar,embora possam matar o paciente. De onde vem a dordessa mulher (ela nunca teria dito coisa alguma, se nãofosse perguntada)? Ela vem do desgosto pela morte doseu filho. De que adiantaria o remédio enquantopermanecer a tristeza? Por que então não consideramtodos os médicos até onde as desordens físicas sãocausadas ou influenciadas pela mente, e por que nãopedem a assistência de um ministro para os casos quefogem à sua alçada?"905
904LEITE, Nelson Luis Campos. As Marcas Básicas da Identidade Metodista, [s.ed],1993,p.10.905 BURTNER, Robert; CHILES, Robert. Coletânea da Teologia de João Wesley, ibidem,p.252
CCLXI
Wesley nasceu numa Inglaterra doente. Alguns autores chegam
a afirmar que a Inglaterra estava à beira de uma revolução semelhante
a que aconteceu na França em 1789,906 ou seja, três anos antes de
Wesley falecer.
“Foi um século, cuja poesia não tinha romance,cuja filosofia não tinha penetração, e cujos políticos nãotinham caráter; século de luz sem amor, cujos própriosméritos eram da terra, terrenos.” 907
A influência do Metodismo teria sido vital para mudar a situação
vigente na Inglaterra. Wesley não foi um reformador de estruturas e
nem via o indivíduo como agente de transformação social, mas sua
contribuição, dentro da visão da época, foi fundamental para mudar a
situação social. Alguns se entusiasmam tanto que chegam a colocar o
metodismo até como o remédio para aquela época na Inglaterra:
“O evangelho de Wesley era o remédio para aqueleséculo enfermo. Não somente abrasou corações,esclareceu inteligências, expulsou temores, acalmou osnervos, repreendeu pecados específicos e estimulou oamor ao próximo, mas expressou-se em atos decaridade.”908
Desde o princípio, Wesley estava interessado numa pergunta:
906 Edward P.Thompson afirma que o metodismo talvez tenha inibido a revolução (AFormação da Classe Operária Inglesa. 2 v. Ibidem, p.264). Já o historiador francês ElieHalévy (1870 -1938), no livro História do Povo Inglês no século XVIII, afirma que aInglaterra têm uma dívida com o metodismo porque ele impediu a Revolução semelhantea da França, em 1789.
907JOY, James Richard. O Despertamento Religioso de João Wesley, Ibidem, p. 96.908 Ibidem, p.97.
CCLXII
“Você ama e serve a Deus?” 909
Wesley tinha um cristianismo prático. Não lhe agradava um
avivamento enclausurado. O avivamento deveria levar a um
compromisso social. A fórmula de Wesley era: Avivamento traz
santificação910, que é igual a amor perfeito.911 O amor perfeito inclui
amar a Deus e ao próximo.912 Em seu sermão Os quase cristãos,
pregado em Santa Maria, Oxford, em 25 de julho de 1741, Wesley
afirma que aquele que é totalmente cristão, além de amar a Deus,
ama também ao próximo:
“A segunda coisa em que implica o ser totalmentecristão é o amor ao próximo.”913
Conforme o tema desta tese, o mover do Espírito Santo e a
santificação, necessariamente, deveriam trazer atos concretos de
amor a Deus e ao próximo.
“Visto que a santificação é amor, ela énecessariamente santificação social. Por mais queWesley pareça, algumas vezes, concentrar-se naexperiência do indivíduo na vivência de suasantificação, o horizonte da santificação sempre é o dacomunidade; o esforço pela comunhão perfeita comDeus inclui o reto relacionamento com os outroshomens.”914
909 “O amor de Deus está no coração da tradição wesleyana. Ele é a base de sua teologia,é o ímpeto para sua missão, e é a razão de sua organização” (HEITZENHATER, RichardP., Ibidem, p. 321).910 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley. Ibidem, p.130.911 ______. Explicação clara sobre a perfeição cristã. Ibidem, p.52, 130.912 Ibidem, p.52.913 ______. Sermões de Wesley. 1 v, Ibidem, p.53.914 KLAIBER Walter; MARQUARDT, Manfred, Ibidem, p.302.
CCLXIII
Em 1742, Wesley escreveu sobre O Caráter de um metodista,
cuja marca principal era o amor a Deus e ao próximo. Wesley começa
este texto dizendo o que não são as marcas de um metodismo:
“As marcas distintivas de um metodista não são assuas opiniões de qualquer sorte. O seu assentimento aeste ou aquele esquema de religião ou o seu abraçarde qualquer grupo particular de noções ou o seuesposar o julgamento de um ou outro homem, estãocompletamente fora de discussão.”915
Mas qual é, então, a marca? Wesley pergunta e responde que
a sua principal marca de um metodista é o amor:
“Um Metodista é alguém que tem o amor de Deusem seu coração, pelo Espírito Santo que lhe foi dado;éalguém que ama ao Senhor seu Deus, ‘com todo o seucoração, com toda a sua alma, com todo oentendimento e força’(...). Ele faz o bem a todos,amigos e inimgos, ao próximo e ao estranho, e isto emtodas as espécies: não só aos seus corpos, vestindo osnús, dando de comer a quem tem fome, mas muito maisdo que isto, procurando o bem de suas almas, deacordo com os dons que vêm de Deus (...).”
Heitzenhater interpreta o que Wesley afirma sobre as marcas de
um metodista:
“A ação filantrópica dos metodistas, muitas vezes,foi a nível pessoal. João Wesley procurou envolver acomunidade na expressão de atos de misericórdia. Eledizia que as pessoas que se enriquecem devem
915 WESLEY, João. As marcas de um Metodista. São Paulo: Imprensa Metodista, [s.d], p.1
CCLXIV
proporcionalmente aumentar seus atos de misericórdia,caso contrário, serão avarentos.” 916
Uma das formas de levantar dinheiro para ajudar aos
necessitados era através de "pregações de caridade".917
Uma hipótese para a ênfase metodista nas obras de caridade:
sua origem pode ter sido nas próprias Sociedades. Ao ajudar os
necessitados, os membros da Sociedade pretendiam melhorar seu
nível de vida espiritual.918
“As sociedades religiosas, na tentativa de ajudar amelhorar essa situação, acharam necessário assumiruma atitude apologética que sustentasse programastais como o desenvolvimento das escolas de caridade,destacando, com muito cuidado, que tais escolas nãoeram o berço de descontentes ou revolucionários (...).”919
Em termos teológicos, contudo, a visão de Wesley para que
ajudássemos o necessitado pode ser encontrada em seu sermão O
Mordomo Fiel escrito em 1768. Para ele, somos dispenseiros da
alma, corpo, bens materiais e dos vários talentos dados por Deus.
Baseado em Lucas 17, Wesley afirma que um dia o Juiz nos julgará:
“Foste conseqüentemente, um benfeitor geral dahumanidade, alimentando o faminto, vestindo o nu,
916 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.252.917 Ibidem, p.127.918 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem., p.23.919 Ibidem, p.23-4. A SPCK (Sociedade para a propagação do Evangelho) procuroudesenvolver canais para a educação do povo nos princípios cristãos. Samuel Wesley, paide João e Carlos Wesley, organizou uma sociedade em Epworth. Livros e panfletos forampedidos a SPCK. A Sociedade era composta por 12 pessoas, modelo que Wesley seguiumais tarde com seus amigos em Oxford. (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.25-8).
CCLXV
confortando o enfermo, abrigando o forasteiro,consolando o aflito, segundo suas váriasnecessidades? Foste os olhos do cego, os pés doestropiado? Foste o pai dos órfãos e o marido da viúva?E trabalhaste por levar a efeito todas as obras demisericórdia, como meio de salvar as almas da morte?”920
Eis algumas das atitudes de Wesley e dos metodistas diante dos
problemas sociais:
5.3.1. O combate à pobreza
A revolução industrial no século VXIII trouxe grande desemprego
entre o povo. Wesley tinha uma visão social razoável para a sua
época. Ele não culpava os pobres pela sua situação social e sim a
falta de alimento, emprego, ganância, etc.921
Wesley acreditava que a questão da pobreza poderia ser
resolvida através da santificação do mundo:
“(...)’virá o tempo em que o cristianismopredominará e cobrirá toda a face da terra’, quandocessarão guerras, ódios e desconfianças, que nosseparam, desaparecerão; injustiça e pobreza serãobanidas e a justiça regerá o mundo. Esta meta elevadasempre deve estar na base de nossos esforços e deveser a medida de nossas expectativas, em vista dosdons que Deus nos concedeu.” 922
920 WESLEY, João. Sermos de Wesley. v.2, ibidem, p.509.921 Em 1773, em Pensamentos sobre a presente escassez de alimentos, Wesley “culpa acarência de alimento e habitação a um ciclo de ganância entre os que ´têm`, e não apreguiça dos que não ´têm`. Ele declara mais particularmente que a causa do problemapode ser reduzida a ´destilação’ (NT – isto é, fabricação de bebidas alcoólicas), imposto eluxo” (Ibidem, p. 253).922 “Viver a graça de Deus” ( WIilliams apud Marquardt, 2000, p.310).
CCLXVI
Esta esperança de Wesley vinha de sua piedade e do seu
messianismo.923
Em 1783, Wesley registrou em seu Diário:
“Notando a pobreza profunda de muitos dos nossosirmãos, resolvi fazer o que podia para aliviá-los. Faleipessoalmente com alguns que estavam em boascondições, e recebi quarenta libras. Depois de indagar,quais eram as pessoas mais necessitadas, eu as visiteide casa em casa.”924
Era difícil a situação da classe operária, na Inglaterra. Ela era
nova e não tinha dos patrões o devido reconhecimento do seu valor.
Muitos camponeses perderam suas terras e passaram a andar pelas
cidades. 925
Como se devia esperar, os que pertenciam à classe dos ricos
viviam bem. Eles gastavam seu tempo em jogos e em reuniões
sociais, onde imperava a imoralidade. Portanto, os ricos não tinham
tempo para pensar na situação das demais classes.926
Não faltou em Wesley a nota profética relativa aos graves
problemas sociais. Segundo José Miguez Bonino, ele rechaça as
explicações tradicionais sobre as causas da pobreza. Denuncia a
923 O messianismo de Wesley é abordado no Capítulo 2.924 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.111.925 HILL, Christopher, Ibidem, p.65.926 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.149-0.
CCLXVII
privatização, que deixa milhares de camponeses desempregados na
Inglaterra.
“ Wesley se manifestou, de modo particular em seutratado ´Thoughts on the Present Scarcity of Previsions`(work, 11/53 ss): Ali, Wesley não se limita a comprovara terrível situação em que se encontra, senão querechaça as explicações tradicionais da pobreza comodestino ou como conseqüência de preguiça ou vício.Tais explicações, diz ele, são ´perversas ediabolicamente falsas´. Denuncia a privatização dapropriedade (énclousure laws´) que deixa milhares decamponeses sem terra.” 927
A explicação inovadora, segundo Bonino, foi exatamente a
denuncia da privatização da propriedade que deixava milhares
desempregados.
Um fator fundamental para aumentar o número de
desempregados e, conseqüentemente a pobreza, foi a revolução
industrial ocorrida na Inglaterra no último terço do século dezoito, que
a transformaria de país agrícola em industrial. 928
Esta revolução trouxe vantagens ao país, mas tirou também o
pão-de-cada-dia de muitos que fabricavam à mão. Quando acontecia
uma nevada, como em 1740 em Bristol, muitos acabavam na miséria.
Ele incentivava os metodistas de mais posses que ajudassem os
927BONINO, José Miguez. Metodismo: releitura latino-americana [s.ed], Unimep-Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, 1983, p. 9. Nas páginas seguintes, as açõesde Wesley contra a pobreza são destacadas.928 REILY, Duncan Alexander, Ibidem, p.153.
CCLXVIII
empobrecidos. Como resultado, nessa ocasião, mais de cento e
cinqüenta pessoas por dia eram alimentadas. 929
Quais foram as atitudes de Wesley num país em que as massas
pobres eram ignorantes e brutais num grau de difícil descrição? 930
Podemos dizer que, pelo menos de quatro maneiras, Wesley
tentou resolver o problema da pobreza:
João Wesley levantou ofertas para os que estavam
desempregados. Em seu diário ele diz:
“Levantamos uma coleta em nossa congregaçãoem prol dos tecelões que estavam sem emprego. Acoleta importou em quarenta libras.”931
Wesley solicitou aos metodistas que assumissem um
compromisso de ajuda contínua aos menos favorecidos. Os
metodistas procuravam fazer a sua parte:
“O dinheiro levantado nas sociedades era usado,em parte, para a caridade local. Os stewards dasociedade de Londres distribuíam sete ou oito libras porsemana para os pobres.” 932
Em 1741, Wesley percebeu que um grande número de pessoas
da Sociedade Unidade de Londres carecia de meios de vida. Sua
atitude foi:
929 WALKER, Welliston. História da Igreja Cristã. 2 v. São Paulo: ASTE, 1967, p. 203.930ENSLEY, Francis Gerald. João Wesley, o Evangelista, Ibidem, p.109.931 WESLEY, João. Trechos do diário de João Wesley, Ibidem, p.109.
CCLXIX
“(...) fez um apelo à Sociedade para que cada umcontribuísse, se eles fossem capazes, com um penny(mais ou menos) por semana para um fundo de auxílioaos pobres e doentes, e que também trouxessemroupas das quais pudussem dispos, para seremdistribuídas (...).”933
Wesley e outros metodistas construíram orfanatos, asilos e lares
para viúvas dentro da ética social metodista.934 Uma destas pessoas
foi Maria Bosanquet que gastou toda sua herança na manutenção de
um orfanato e de um posto de caridade. 935
Os metodistas criaram "a casa dos pobres". 936Eram duas casas
alugadas perto da Fundição937 para viúvas e idosos. Haviam cerca de
doze pessoas. Em 1763, um grupo de mulheres (Sarah Crosby, Sarah
Ryan, Mary Bosanquet) organizou uma escola e um orfanato em
Leytonstone.938
A caridade metodista era grandemente uma filantropia pessoal.
À Miss March, Wesley determinou:
932 HEITZENHATER, Richard P.Ibidem, p.253.933 Um "penny" significa um centavo de libra esterlina (HEITZENHATER, Richard P.
Ibidem, p.128).934 “Essa ênfase particular em ‘amar o próximo’ e seguir o exemplo de Cristo (que ‘andoupor toda a parte fazendo o bem’, Atos 10:38), continuou a caracterizar o metodismo,quando ele entrou no reavivamento” (Ibib., p.125).935BARBIERI, Sante Uberto. Estranha Estirpe de Audazes, Ibidem, p.151.936 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.167.937 “A Fundição se tornou o quartel general de Wesley em Londres. As depend6encias dareconstrução incluíam: (A) os apartamentos de Wesley, (B) seu escritório, (C) um sinobatendo diariamente às 3 horas da manhã para os cultos matinais e às 4 horas da tardepara as orações vespertinas, (D) a entrada principal, (E) a entrada para o salão depregações, (F) uma habitação para familia, pregadores, etc, (F) sala de aula, sala para osgrupos, (H) estábulo, (I) cocheira e quintal” (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.109).938 Ibidem.
CCLXX
“Vá e veja o pobre e doente em suas pobreschoupanas. Tome a sua cruz, mulher! Lembre-se da fé!Jesus foi adiante de você e irá ao seu lado.” 939
Wesley reconhecia que nem sempre era algo agradável o
trabalho junto aos pobres, como a sujeira e outras circunstâncias
desagradáveis. Em carta posterior, ele lhe pediu que: :
“(...) visitasse os pobres, as viúvas, os doentes, osórfãos em sua aflição; sim, embora eles não tenhamnada que os recomende a não ser que foramcomprados com o sangue de Cristo. É verdade que nãoé agradável à carne e ao sangue. Há milhares decircunstâncias geralmente ligadas a isso que chocam adelicadeza de nossa natureza, ou antes, a nossaeducação. Mas as bênçãos que se seguem a essetrabalho de amor irão mais do que equilibras a cruz.”940
Empréstimo foi uma solução que Wesley encontrou para trazer
novas oportunidades às pessoas que passavam por grandes
dificuldades financeiras.941
“Wesley estabeleceu em julho de 1746 um fundode empréstimos, iniciando a empresa com somente 30libras esterlinas. Mas o fundo proporcionou a muitosuma chance, dando-lhes um novo começo de vida.”942
Houve problemas na área de empréstimo e algumas pessoas
procuraram levar vantagem ou depois, simplesmente, viravam suas
costas à igreja. Foi o caso de James Lackington. Conseguiu um
939 Ibidem, p. 252.940 Ibidem, p.252.941 Ibidem, p.166.942 REILY, Duncan Alexander. A Influência do Metodismo Revolução Social na Inglaterra
no século XVIII., Ibidem, p. 8.
CCLXXI
empréstimo de cinco libras. Ele teve grande sucesso em seus
negócios, contudo dois anos depois de ter recebido o empréstimo, ele
deixou os metodistas. 943
Wesley procurou arranjar emprego para os pobres. Considerou
mais importante arranjar emprego do que dar esmola. Procurou ainda
escrever e orientar sobre medicina caseira. Escreveu Medicina
Primitiva:
“(...) Wesley expandiu o programa de assistênciamédica entre seu povo. Fascinado pelas doenças ecuras desde os dias de Oxford, Wesley estavaconvencido, há muito tempo, ‘por inúmeras provas’ deque os médicos regulares prestam muitíssimo poucosbenefícios (...). Ele havia estocado remédios nas trêsprincipais casas de pregação por cerca de um ano epublicado uma pequena coleção de receitas medicinais.Agora ele havia conseguido um cirurgião e umfarmacêutico para o auxiliarem em ‘um tipo deexperiência emergencial, a distribuição regular deremédios.”944
Apesar de verificar falhas no atendimento médico, Wesley não
pretendia substituí-los. Ele havia conseguido um cirurgião e um
farmacêutico para o auxiliarem.945 Wesley não queria ir além de sua
capacidade.946
943 HEITZENHATER, Richard P., op. cit, p. 251-2.944 Ibidem, p.166.945 Ibidem.946 Ibidem, p.166-7.
CCLXXII
“(...) sua intenção era ajudar aqueles que tivessemuma doença crônica e não aguda, e enviar todos oscasos difíceis e complicados para os médicos.”947
Wesley então, não foi indiferente à situação da pobreza que
reinava na Inglaterra. A sua participação foi em termos concretos. Ele
não culpava os pobres dizendo que eles eram preguiçosos, mas sim a
ganância dos que tinham muito. A ação metodista junto aos pobres
era resultado da ênfase no amor ao próximo. Entre as marcas de um
metodista está:
“(...) ele ama ao seu próximo como a si mesmo e acada homem como a sua própria alma. Seu coraçãoestá cheio de amor à humanidade e para com cada filhodo ’Pai dos espíritos de toda a carne’. Nenhumobstáculo é ao seu amor o fato de um homem lhe serdesconhecido, mesmo que este seja um tipo cuja vidaele desaprove, pois paga o ódio com boa vontade. Eleama até mesmo os seus inimigos, sim, os inimigos deDeus, os maus e todos os ingratos.”948
5.3.2. Criação de escolas para o povo
Quase não havia preparo escolar na Inglaterra.949 Praticamente,
só os ricos estudavam. Isto se fez, inclusive, sentir entre os próprios
pregadores metodistas. Por isso Wesley se preocupou em criar
947 “Entre os seus primeiros casos estava um verdadeiro teste para seu método. WilliamKikman, de setenta e um anos, um tecelão que sofria de uma ‘tosse muito aborrecida’desde os onze anos.O medo de Wesley era que, se falhasse nesse caso, os outros sesentiriam desencorajados a voltarem lá. O xarope receitado curou a tosse em dois ou trêsdias, sendo Wesley cuidadoso em não assumir o crédito dessa cura, atribuindo tudo aopoder de Deus” (Ibidem, p.167).948 WESLEY, João. As marcas de um Metodista, Ibidem, p.4-5.949 “Em 1715 havia em todo o Reino Unido somente 1.193 escolas primárias,freqüentadas por 26.920 alunos” (LILIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.14).
CCLXXIII
escolas para os filhos dos pregadores metodistas, um grupo de
sessenta e três pregadores.
“Havendo na América nessa época somente oitentae três pregadores metodistas. Nenhum deles, comexceção do Dr. Thomas Coke, havia estado numcolégio, ou mesmo no que seria chamado agora, umaescola secundária rudimentar. Todos eramdesesperadamente pobres financeiramente.” 950
Diante desta situação, quais foram as atitudes de Wesley?
Wesley criou escolas para os pobres e para os filhos dos
pregadores metodistas. Entre essas escolas estão "A escola da
Fundação de Londres", "A Casa dos Órfãos em Bristol" e a "Escola
Kingswood" que os metodistas abriram para os filhos dos mineiros de
Kingswood.951
Whitefield, além de ser avivalista e um grande pregador do
metodismo, também se preocupava com o trabalho social. Foi ele
quem fundou a Escola Kingswood e um orfanato na Geórgia. 952
Em 4 de janeiro de 1758, Wesley registrou em seu Diário:
“Cheguei a Kingswood, e fiquei contente por causada escola, que é finalmente o que já eu há muito queria
950 LUCCOCK, Halford, ibidem, p. 65. Thomás Coke nasceu em 1747, no País de Gales, erecebeu diploma de doutor em leis. Em 1784, foi nomeado por Wesley comoSuperintendente do Metodismo na América. Título, posteriormente, mudado paraBispo.Idem, p.107-1.951 ROY, James Richard, ibidem, p. 80.952 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 121.
CCLXXIV
que fosse: uma benção a todos que residem nela, e atodos os metodistas.”953
Wesley observou que haviam falhas no sistema educacional da
Inglaterra, mostrando assim que tinha uma atitude crítica diante do
mundo em que vivia. E is um resumo das falhas que ele encontrou:
1) As escolas eram mal localizadas,2) As crianças piores corrompiam as melhores,3) A instrução religiosa era falha,4) As disciplinas eram mal escolhidas,5) Havia defeitos na pedagogia. 954
Neste período, o jornalista Robert Raikes criou a Escola
Dominical para educar as crianças pobres que andavam fazendo
arruaça pelas ruas aos domingos. Nesta escola, Raikes administrava
Matemática, Geografia e Religião, entre outras coisas. Wesley
prontamente apoiou tal idéia e a empregou nas sociedades
metodistas. Tudo indica, inclusive, que a Escola Dominical de Ana
Ball, membro da Sociedade Metodista em High Wycombe, foi iniciada
quatorze anos antes da de Roberto Raikes.955
Assim vemos que Wesley não foi também indiferente a situação
educacional na Inglaterra. Seu compromisso social compreendia
também as escolas.
Quando encontrava problemas nas escolas, Wesley demonstrava
preocupação. Em 1781, ele disse sobre a Escola de Kingswood:
953 WESLEY, João.Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.64-5.954 REILY, Duncan Alexander, Ibidem, p. 9.955 LUCCOCK, Halford, Ibidem, p. 86.
CCLXXV
“Quanta preocupação esta escola me tem dado porestes trinta anos! Faço planos, mas quem é que vaiexecutá-los! Eu não sei; o Senhor me ajudará!”956
E quando Wesley observou o progresso na Escola de Kingswood,
ele disse, em 1786:
“Achei tudo como eu queria: as regras estão sendoobservadas e o comportamento das crianças demonstraque estão sendo governadas com sabedoria.”957
5.3.3. A luta pela melhoria das prisões
Não havia condição de um ser racional viver nas prisões da
Inglaterra, pois faltava quase tudo: água, luz, higiene. Não havia
também a intenção de reformar os réus, reabilitando-os como
cidadãos úteis.958
Outro fator ainda contribuía para piorar a situação dos presos: o
carcereiro, não tendo um salário estipulado pelo governo, tirava o que
podia dos que estavam encarcerados.959
956 WESLEY, João.Trechos do Diário de João Wesley. Ibidem, p.66.957 Ibidem, p. 66.958 REILY, Duncan Alexander. A Influência do Metodismo Revolução Social na Inglaterrano século XVIII, Ibidem, p. 11.959 REILY, Duncan Alexander, Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.164.
CCLXXVI
Quais foram as atitudes de Wesley ante o problema dos
cárceres?
Expressar amor aos excluídos, como resultado da ação do
Espírito Santo e da santificação, mas Wesley não agiu sozinho. Foi
William Morgan quem sugeriu inúmeras vezes a Wesley visitar os
presos na Prisão do Castelo.
“Morgan tinha estado desenvolvendo uma amplaárea de atividades beneficentes, já há algum tempo:ensinando as crianças órfãs, cuidando dos pobres eidosos, visitando prisões.” 960
Os irmãos Wesley visitaram a Prisão do Castelo com Morgan
pela primeira vez em 24 de agosto de 1730 e passaram a visitar, pelo
menos, uma vez por semana. Morgan foi o planejador de grande
parte do trabalho social dos metodistas. 961
Semanalmente, João Wesley visitava as prisões levando roupas,
remédios, alimentos e também um conforto espiritual. Isto começou
com o Clube Santo: em agosto de 1730, pela influência de Morgan,
começaram a visitar os encarcerados em Oxford962 e, praticamente,
continuou por toda a vida de Wesley.
A conversão de carcereiros pela pregação metodista foi outro
fator importante para o melhoramento dos cárceres. Um dos
carcereiros convertidos foi Dagge. Eis um resumo e adaptação de uma
960 HEITZENHATER, Richard P., ibidem, p.40.961 Ibidem.962 WALKER, Welliston, ibidem, p. 206.
CCLXXVII
carta de Wesley, sobre a transformação que este carcereiro teve na
prisão:
“1) A cadeia passou a ficar limpa, pois cada presoficou com responsabilidade de limpar a cela;2) Não houve mais brigas, pois o carcereiro resolvialogo com os presos as controvérsias que surgiam;3) O roubo praticamente deixou de existir nas prisões,pois os presos sabiam que seria restrita a sua clausurase roubassem;4) Não foi mais permitida a embriaguez, embora ocarcereiro pudesse tirar lucro disto;5) A prostituição acabou, pois foi tomado oprocedimento de separar as mulheres dos homens nasprisões;6) A ociosidade foi evitada, pois providenciavam-seferramentas para os presos trabalharem;7) O domingo era observado. Os detentos não sedivertiam nem trabalhavam aos domingos. Elesparticipavam do culto público;8) Passou a haver uma preocupação com a vidaespiritual do preso.” 963
O Metodismo, através do avivamento e sua ênfase social
influenciou também pessoas que tinham grandes responsabilidades
administrativas no país. Um dos influenciados foi João Howard, que
era uma espécie de secretário de segurança. Ele dedicou sua vida à
reforma das prisões procurando dar ao preso condições dignas de um
ser humano. 964
Wesley, então, não foi omisso diante dos problemas dos presos.
Ele participou ativamente da vida dos encarcerados e transformou
estas prisões de uma maneira indireta.
963 REILY, Duncan Alexander.A Influência do Metodismo Revolução Social na Inglaterrano século XVIII, Ibidem Ibidem, p. 13.
964 NICHOLS, Robert. História da Igreja Cristã. Casa Editora Presbiteriana, 1954, p. 193.
CCLXXVIII
5. 3.4. A luta contra a escravidão
O comércio de escravos negros era algo considerado normal
pelo povo inglês. O povo era, praticamente, indiferente a esta situação
e os ricos prosperavam às custas do sofrimento do escravo.
Wesley agiu energicamente contra tal procedimento de um
goveno cristão, que permitia a existência da escravidão na Inglaterra.
Em 1774, Wesley escreveu um livro chamado Pensamento Sobre a
Escravidão. Assim ele se expressa nesse livro:
“Metade da riqueza de Liverpool é derivada daexecrável soma de todas as vilanias comumentedenominadas comércio de escravos. Desejo por Deusque o comércio de escravos nunca mais sejaestabelecido. Que nunca mais roubemos e vendamosnossos irmãos como animais, nunca mais osassassinemos aos milhares e dezenas de milhares.”965
Outra atitude de Wesley foi apoiar os grandes líderes do país,
que lutavam para acabar com a escravatura. Um dos líderes foi
Guilherme Wilberforce para quem Wesley escreveu, entre outras
coisas, o seguinte:
“Meu caro senhor: a não ser que o poder divino otenha levantado para ser um athanasius contramundum, não posso ver como poderá o senhor terminarsua gloriosa empresa, opondo-se àquela execrávelvilania, que é o escândalo da religião, da Inglaterra e danatureza humana. A não ser que Deus o tenhaverdadeiramente levantado para esta obra, o senhor
965 LUCCOCK, Halford, Ibidem, p. 31.
CCLXXIX
será consumido pela oposição dos homens e dosdemônios, mas, se Deus for pelo senhor, quem lhe daráconta? São eles todos juntos mais fortes que Deus?Oh! Não se canse de fazer o bem. Continue, em nomede Deus, e com a força do seu poder, até que aescravidão americana, a mais vil que já houve sob osol, se desvaneça diante desse poder. O servo que oestima, João Wesley.”966
A consciência cristã não percebia, na época de Wesley, que a
escravidão era um crime e era algo condenado por Deus, pois Ele
quer restaurar a dignidade humana e o Evangelho é libertador,
restaurador. Essa consciência não existia nem em Whitefield que
quatro anos antes de morrer deixara em testamento numerosos
escravos de suas fazendas na Geórgia com a condessa Lady
Huntingdon. 967
A oposição à escravidão não foi uma atitude isolada de Wesley.
A Conferência Anual de 1780 reconheceu que a escravidão é contrária
às Leis de Deus.968
Portanto, avivamento e compromisso social sempre estiveram
juntos no movimento metodista, na Inglaterra, no século XVIII. O
metodismo atraiu também a burguesia969, mas avivamento e a pobreza
estavam interligados.
“À medida que o avivamento metodista seespalhava pelos subúrbios pobres das cidadesinglesas, no começo de 1740, as novas sociedades
966 Ibidem, p. 30.967 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 283.968 BONINO et al. Luta pela vida e Evangelização, Ibidem, p. 50.969 BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos do metodismo histórico. Editora Unimep, 1983,p.15.
CCLXXX
metodistas começaram a ficar cheias de mineiros,criados e muitas outras pessoas de classe trabalhadoraque vivia nos limites da miséria, senão emcalamidade.”970
Foi assim, na década de 40, no século XVIII, bem como no final
da vida de Wesley, nas décadas de 80 e 90, na luta contra a
escravidão. O avivamento atraia o povo simples e o coração cheio de
amor proporcionava solidariedade aos excluídos da sociedade.
970 HEITZENHATER, Richard P., op. cit, p.127.
CCLXXXI
6- A CONTRIBUIÇÃO DO AVIVAMENTO METODISTA
“A Inglaterra foi poupada da revolução a que ascontradições de sua política e economia poderiam terconduzido, pela influência estabilizadora da religiãoevangélica, particularmente o metodismo.”971
Elie Halévy
6.1. Contribuição do metodismo ao cristianismo na Inglaterra
Uma boa parte da liderança mundial dos evangélicos considera o
metodismo de Wesley como paradigma para o avivamento e como
modelo de Igreja para hoje.
Oswaldo Smith, avivalista internacional, chegou a afirmar:
“Como resultado de minhas leituras, estou certo deque os metodistas primitivos estavam mais próximos daexperiência apostólica do que qualquer outro grupo depessoas que conheço.”972
No livro Identidad Pentecostal, uma publicação do Clai (Conselho
Latino Americano de Igrejas), um pentecostal Gabriel O. Vaccaro inclui
o metodismo dentro do que ele chama de “Movimento da fé
apostólica” ao dividir em quatro períodos a história da Igreja:
971 “The Birth of Methodism in England” (Halévy pub Bonino, p.32).
CCLXXXII
“a) Estabelecimento da Igreja (Período Apostólico);b) Apostasia da Igreja (até a idade média);c) A reforma da Igreja (Lutero);d) A Restauração da Igreja (sob Wesley).”973
Este autor pentecostal propõe ainda a seguinte periodização para
o desenvolvimento da história da Igreja:
“a) Período que vai até Constantino;b) Com os séculos de obscuridade (que para oshistoriadores pentecostais chega até Lutero);c) A partir de Wesley, avivamento pentecostal, batismodo Espírito Santo e exercício dos Dons Espirituais naigreja.”974
Para ele, o metodismo é um divisor de águas na história da
Igreja, especialmente, inaugurando a ação da Igreja numa perspectiva
pentecostal.
O bispo Roberto Mac Alister, fundador da Igreja Nova Vida,
numa expressão de fé e dentro de uma idéia messiânica, chegou a
falar que será um avivamento semelhante ao do metodismo primitivo
que salvará o Brasil:
“A única coisa que poderia salvar o Brasil seria umreavivamento espiritual, tal como se verificou na“Inglaterra do século 18, o que provocou umasubstancial mudança na vida pública quando uma
972 SMITH, Oswald J. O Reavivamento de que Precisamos. [s.ed],1958, p.101. O autoraqui fala do metodismo wesleyano e não da nova denominação surgida, na Inglaterra,após a morte de Wesley.973 VACCARO, Gabriel O. Identidad Pentecostal. Clai, Quito, Equador, 1990, p. 51. OSecretário Geral do Clai, Felipe Adolf, afirma sobre Vaccaro: “el nos há permitidoacercarnos a lo pentecostal desde uma perspectiva diferente, natural, auténtica” (Ibidem,p.7).974 Ibidem, p.252.
CCLXXXIII
consciência metodista mexeu com todas as camadasda sociedade, desde o padeiro até o parlamentar.”975
Maria Isaura Pereira Queiróz afirma que as crenças messiânicas
pressupõem a necessidade de salvação terrena e levam`à concepção
do reino ideal que um enviado instalará no mundo.976
6.2. Contribuição do metodismo à sociedade inglesa
O metodismo na Inglaterra é visto por diversos autores como um
modelo. Por mais que isso possa ser um triunfalismo dos metodistas,
algo de extraordinário aconteceu na Inglaterra, para que Paul (David)
Y. Cho, pastor da Assembléia de Deus, a maior igreja local do mundo,
na Coréia do Sul, chegasse a dizer:
“A pregação dos irmãos Wesley salvou a Inglaterrade mergulhar numa revolução como a que a Françaexperimentou no século XVIII.”977
O país vivia num caos. Era chamada a "nação selvagem". A
revolução industrial trouxe progresso, mas também proporcionou
desemprego.978
975 MAC ALISTER, Robert. Boletim do bispo Roberto. [s.ed], dezembro de 1987.976 QUEIRÓZ, Maria Isaura Pereira de. Ibidem.977 CHO, Paul Y. Oração, a chave do avivamento. Editora Betânia, 1986, p. 12.978“A Revolução Industrial havia trazido consigo uma abominável exploração dostrabalhadores, que se amontoavam, em número crescente, em bairros em que aaglomeração e o abandono tornavam insalubres e moralmente corrompidos”(CAMARGO, Gonzalo Baéz, Ibidem.p. 55).
CCLXXXIV
Para Edward Thompson, o metodismo serviu à burguesia e ao
proletariado:
“(...) o metodismo obteve o maior êxito em servirsimultaneamente como religião da burguesia industrial(apesar de compartilhar este terreno com outras seitasheterodoxas) e de amplos setores do proletariado. Nãopode haver dúvida sobre a profunda devoção de muitascomunidades da classe operária (incluindo igualmentemineiros, tecelões, operários industriais, marinheiros,ceramistas e trabalhadores rurais à Igrejametodista).”979
Apesar de Wesley não atacar efetivamente as estruturas sociais,
o avivamento metodista não foi alienante. Ele proporcionou uma ativa
participação nas questões sociais, como os presos, escravos, meninos
e meninas de rua, desempregados, vícios , etc.
Max Weber toca nesse tema, ao comentar sobre o revival
metodista:
“O poderoso revival do Metodismo, que, em fins doséculo XVIII, precedeu o florescimento da indústriainglesa pode ser comparado com uma dessas reformasmonásticas.”980
Weber, contudo, mostra que a conversão no metodismo não era
somente seguido por um piedoso gozo da comunidade de Deus, à
maneira do pietismo emocional de Zinzendorf. Para ele:
“A emoção, uma vez despertada, era dirigida parauma luta racional pela perfeição. Assim, o caráter
979 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v. p. 232.980 WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Biblioteca Pioneira deCiências Sociais, 3 ed. 1983, p.125.
CCLXXXV
emocional de sua religiosidade não levou a umcristianismo sentimentalista interior, do tipo do pietismoalemão.”981
Essa é uma das contribuições do metodismo. Para Wesley, a
razão assistida pelo Espírito Santo é fundamental na vida cristã.
A questão da terra tão discutida nos dias de hoje era uma
preocupação de Wesley. Ele questionava a estrutura social vigente,
que aumentava a pobreza.
“Mas por que a terra está tão cara? Porque, pelasrazões acima, a aristocracia não pode viver de formaque está acostumada, sem aumentar a sua renda, oque a maioria só pode fazer aumentando os aluguéis.Assim, o posseiro, pagando mais aluguel pela terra,precisa ganhar mais pelos produtos. Isto por sua vez,aumenta o preço da terra e assim a roda gira.”982
O metodismo participou na reforma dos costumes. O próprio
Wesley comenta em suas pregações sobre a situação da sociedade
inglesa e dos membros da Igreja Anglicana.
“Todos os que se chamam “membros da Igreja daInglaterra” estão cordialmente empenhados naoposição às obras do diabo e combatendo contra omundo e a carne? Ai! Não podemos dizer isto. Temoque, ao contrário, a maior parte deles sejam omundo.”983
981 Ibidem, p. 101.982 WESLEY, John. Pensamentos sobre a falta de alimentos. Lewiasham, 20 de fevereirode 1773. In: Mosaico nº 4, 1993, p. 8-9.983 WESLEY, João. Sermões de Wesley. 2 v. São Paulo: Imprensa Metodista, 1981, p.520.
CCLXXXVI
Em vez de combater os males, eles próprios estavam vivendo
segundo o mundo, isto é, segundo o povo que não conhece a Deus
para qualquer propósito de salvação.984 Wesley afirmou isso em seu
sermão “A reforma dos costumes”, em 30 de janeiro de 1763, na
capela de West-Street, Sevendials. Em seu sermão, Wesley fez um
histórico do surgimento da Sociedade para a Reforma dos Costumes,
em Londres, no século XVII.
“Incrível soma de bem foi feito por essa Sociedade,durante perto de quarenta anos. Mas, depois, tendo amaior parte dos membros fundadores ido a receber suarecompensa, os que lhes sucederam se tornaramfracos no espírito e abandonaram o trabalho; de modoque, poucos anos faz, a Sociedade se extinguiu, semque qualquer remanescente permanecesse noreino.”985
Um novo grupo havia surgido, em agosto de 1757, disposto a
ressuscitar a Sociedade para a Reforma de Costumes.
Para eles, os grandes problemas eram:
“(...) se fez menção da grande e abusivaprofanação daquele dia sagrado, por parte de pessoascomprando e vendendo, mantendo o comércio aberto,bebendo pelas tavernas, permanecendo de pés ouassentadas nas ruas, nas estradas ou nos campos,vendendo suas mercadorias como nos dias comuns;especialmente em Moorfields, que então se enchiadesses transgressores todos os domingos, da manhã ànoite.”986
Entre as providências que o grupo tomou, estão:
984 Ibidem.985 Ibidem, p.521.986 Ibidem.
CCLXXXVII
“(...) enviaram petições a S. Excia. O Lorde Maior eao Tribunal de Aldermen; às Justiças com sede emHick´s Hall e às de Westminster; e receberam de todasessas venerandas cortes o maior encorajamento nosentido de prosseguirem na obra.”987
Depois comentaram a idéia com várias pessoas de posição
eminente e ao corpo de clérigos, assim como a ministros de outras
denominações na cidade de Londres e Westminster e seus
arredores.988
O grupo fundador da Sociedade distribuiu milhares de panfletos
dando instrução às autoridades policiais e demais oficiais locais
explicando seus deveres para executarem as leis. No começo de
1758, deram informações aos magistrados daqueles que profanavam
o dia do Senhor.
“Por esse meio eles limparam as ruas e os camposdos transgressores notórios que, sem qualquer respeitoa Deus e ao rei, vendiam suas mercadorias de manhã ànoite. Em seguida passaram a uma empresa maisdifícil: evitar a bebedeira no dia do Senhor.”989
O grupo foi censurado, insultado e ofendido. Não só pelos que
bebiam, mas também pelos donos das tavernas que obtinham lucro
com as bebidas. 990
987 Ibidem.988 Ibidem.989 Ibidem, p.522.990 Ibidem.
CCLXXXVIII
Depois de conseguir impedir que as bebidas fossem vendidas, a
Sociedade se voltou para os diversos tipos de jogadores. Segundo
Wesley:
“(...) que faziam da exploração dos jovens e dosinexperientes o seu comércio, despojando-os de todo oseu dinheiro. Depois de os terem reduzido à miséria,freqüentemente lhes ensinavam o mesmo mistério deiniqüidade.”991
Outra ação da Sociedade foi acabar com as casas de prostituição
processando-as de acordo com a lei. Muitas das mulheres que se
prostituíam ficaram agradecidas por saírem dessa situação. Wesley
fala da sabedoria da Divina Providência ao fazer surgir o Asilo
Madalena onde as mulheres que não tinham moradia pudessem ficar.
Nesse local, elas foram recebidas com ternura e viveram em
conforto.992
Em seu sermão, Wesley faz um balanço da quantidade de
pessoas que foram levadas à Justiça pela Sociedade entre agosto de
1757 a agosto de 1762: 9.596.993
Eram cento e sessenta pessoas que participam da Sociedade
para a Reforma de Costumes sendo cerca de vinte relacionadas a
991 Ibidem, p. 523.992 Ibidem.993 Ibidem.
CCLXXXIX
Whitefield, cerca de cinqüenta relacionadas a Wesley; cerca de vinte à
Igreja Estabelecida e cerca de setenta eram dissidentes.994
Sua visão sobre a importância dessa ação da Sociedade era:
“Na proporção em que se promove a justiça detoda espécie, avança, pois, o progresso nacional.”995
A ação da Sociedade não devia ser através da violência e nem
da intimidação. Para Wesley, os membros deveriam ser escolhidos
pelo seu caráter. Ele realça como importante a fé, coragem, prudência,
humildade, doçura, simplicidade e mansidão, etc. Para ele, somente
assim a Sociedade será eficiente.996
“O que acrescenta doçura ainda maior ao trabalhoe à dor é o amor cristão a nosso próximo.”997
Nem todos historiadores e teólogos viram em Wesley e no
metodismo do século XVIII um movimento transformador.
“Segundo Richard Niebuhr, os irmãos Wesley –forjadores do movimento wesleyano – repensaram oconceito de Reino (de Deus) pelo símbolo do céu eviram o pecado como relaxamento e um vício individuale não como uma opressão ou um desajuste social.”998
994 Ibidem. Os que eram “dissidentes” não pertenciam à Igreja oficial da Inglaterra. Oprimeiro defensor realmente notável das idéias separatistas, na Inglaterra, foi RobertoBrowne (1550-1633). Em 1581, ele criou, com seu amigo Roberto Harrison, umacongregação independente em Norwich ( WALKER, Welliston, ibidem, p.141-2).995 Ibidem. p.526.996 Ibidem, p.532-6.997 Ibidem., p.532.998 CONSEJO MUNDIAL DE IGLESIAS. Consulta com las Iglesias Pentecostales. Peru,14 el 19 de noviembre del 1984, p. 19-0.
CCXC
Thompson condenada o autoritarismo de Wesley e ainda os
cultos wesleyanos como tendo aspectos negativos:
“O termo é desagradável, mas é difícil não ver nometodismo desta época uma forma ritualizada demasturbação mental. Energias ou emoçõesameaçadoras para a ordem social eram liberadas eminocentes e esporádicas festas de confraternização,vigílias, reuniões mensais ou campanhasrenovacionistas.”999
Apesar disso, Thompson cita o metodismo como uma força que
conseguiu atrair os operários e lhes dar uma esperança:
“Mas foi Wesley - ultraconservador em política esacerdotal em questões de organização - o primeiro achegar aos 'pobres de Cristo', quebrando o tabucalvinista com a simples mensagem: 'A única coisa afazer é salvar almas.”1000
Para ele, Wesley conseguiu seu sucesso por ser organizador,
administrador das sociedades. Conseguiu combinar nas proporções
exatas democracia e disciplina, doutrina e emotividade.1001
Os dados, contudo, revelam um Wesley com uma visão da
importância da Igreja ser comunitária (sociedades). Em termos
sociais, o metodismo procurou atender também aos necessitados e
pobres. Thomas W. Madron afirma:
999THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v. p. 248.1000______. Ibidem, 1 v. p. 36.1001 Ibidem, p.38.
CCXCI
“A velha fundição de Londres, por exemplo,transformou-se num verdadeiro crisol de projetos – casade misericórdia para viúvas, escola para meninos,dispensário para enfermos, bolsa de trabalho e agênciade emprego, cooperativa de crédito e agência deempréstimo, sala de leitura e igreja.”1002
Segundo vários teólogos e historiadores, entre eles, o bispo
Sante Uberto Barbieri, a luta de Wesley contra a escravidão cooperou
para o seu fim na Inglaterra:
“A abolição da escravidão, na Inglaterra, foi oresultado do avivamento metodista e da filantropia queinspirou por causa da ênfase que João Wesley dava àdoutrina da salvação universal e da igualdade de todosos homens perante Deus.”1003
Segundo ele, foi devido à doutrina e disciplina metodista que
infundiram nos líderes do proletariado e da burguesia uma inclinação
para a ordem, contra a violência.1004
Edward Thompson concorda com a afirmação sobre a
disciplina,1005 mas vê esse resultado como negativo, pois
impossibilitou de acontecer a revolução inglesa ao proporcionar aos
operários a resignação.1006
Já o historiador francês Elie Halévy (1870 -1938), no livro História
do Povo Inglês no século XVIII, sustentou que a Inglaterra tem uma
1002 “John Wesley on Economics” (Madron apub Bonino, p.26).1003 BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos do metodismo histórico. Editora Unimep, 1983,p.15.1004 Ibidem.1005 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v. p. 255.1006 Ibidem, p. 264.
CCXCII
dívida com o metodismo, pois foi poupada de uma revolução
semelhante à acontecida na França em 1789:
“A Inglaterra foi poupada da revolução a que ascontradições de sua política e economia poderiam terconduzido, pela influência estabilizadora da religiãoevangélica, particularmente o metodismo.”1007
O próprio Edward P. Thompson argumenta favoravelmente à
participação do metodismo no processo revolucionário inglês, apesar
da Conferência Wesleyana, que sob a liderança de Wesley era
autoritária, pois ele só aceitava as mudanças após serem
consumadas. Mas, segundo ele, a contribuição do metodismo é
inegável. Ele afirma:
“Mas, a outro nível, é-nos conhecido o argumentode que o metodismo foi indiretamente responsável porum aumento na autoconfiança e capacidade deorganização do operariado.”1008
Thompson cita ainda autores, como Wearmouth, que fazem uma
leitura favorável ao metodismo na formação da classe operária
inglêsa.1009
6.3. A contribuição do avivamento do século XVIII ao metodismo
brasileiro no 3º milênio
1007 “The Birth of Methodism in England” (Halévy apub Bonino, p. 32).1008 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v. p. 42.1009 Ibidem, p. 43.
CCXCIII
“(...) desde o metodismo primitivo
aprendemos com Wesley (...).1010
Colégio Episcopal da Igreja Metodista
Wesley continua sendo a “alma” do metodismo.1011 Ele ainda fala
através dos seus escritos e sua influência continua sendo
determinante na vida e missão do metodismo. Ele é o paradigma para
os metodistas, tanto carismáticos, conservadores e progressistas.
Como afirma o teólogo Rui Josgrilberg:
“Os metodistas, em quase todas as partes domundo onde se encontram, estão redescobrindo JohnWesley como fonte de inspiração para umaespiritualidade, uma teologia e uma pastoralcontextualizadas.”1012
Em relação ao avivamento, o metodismo primitivo é o paradigma
para nossos dias. Bispo Nelson Luis Campos Leite afirma:
“João Wesley, no desenrolar do seu movimentoavivador ocorrido na Inglaterra no século 18,fundamenta a espiritualidade do movimento na açãodinâmica da Graça, espiritualidade esta que traz comoresultado na vida do que crê e da Igreja os ATOS DEPIEDADE e as OBRAS DE MISERICÓRDIA, presentesnas dimensões eclesiais da Intra-Igreja, Inter-Igreja eExtra-Igreja (sua vivência e missão fora dos seuslimites internos e dentro do contexto da realidadehistórica humana e social).”1013
1010COLÉGIO EPISCOPAL. Relatório do Colégio Episcopal ao 16º Concílio Geral.Biblioteca Vida e Missão, 1997, p. 671011 Ibidem, p. 260.1012 BONINO et al. Luta pela vida e evangelização, Ibidem, p. 259.1013 LEITE, Nelson Luiz Campos. Como alcançar o genuíno avivamento. Êxodus editora,São Paulo, 1997, p.28.
CCXCIV
A contribuição do avivamento wesleyano do século XVIII ao
metodismo brasileiro atual, portanto, é notória nas citações em
documentos, planos, estudos e pastorais dos Bispos. Entre estas
contribuições, destacamos e abordaremos quatro: consciência
profética; abertura aos dons e ministérios; crescimento numérico e
evangelização integral (Ação Missionária).
Por outro lado, também é impossível abordar sobre a contribuição
histórica do avivamento e compromisso social ao metodismo, na
década de noventa, sem dar uma visão histórica sobre o assunto, pois
durante décadas duas tendências caminharam separadas no
metodismo brasileiro – o Evangelho Social e a Igreja Espiritual, ou
Evangelical, cujas ênfases sempre foram conflitantes. Uma
preocupando-se com os problemas que afligem o ser humano e a
outra com a vida espiritual.
Na década de sessenta, com a supremacia do grupo conservador
no Colégio Episcopal 1014 proporcionando exclusão dos, então,
“renovados”, que saíram para formar a Igreja Metodista Wesleyana,
em 1967, e dos chamados “liberais”, que foram perseguidos e alguns
presos e torturados durante o regime militar, os que permaneceram
encontraram no recém organizado Movimento Carismático e na
1014 Em 1965, Natanael Inoscêncio do Nascimento chegou ao episcopado através dochamado “esquema”, que propunha retirar os missionários da liderança da Igreja e osliberais “comunistas” da literatura da Igreja. Seu episcopado perseguiu os chamadosRenovados, no Rio de Janeiro proporcionando a chamada “divisão wesleyana”, em 1967.
CCXCV
Teologia da Libertação uma base para seus ideais e práticas, tendo
sempre Wesley como referencial.
Nesses movimentos, era possível ver semelhança com o
movimento metodista, no século XVIII, nas práticas das Obras de
Misericórdia e Atos de Piedade. Apesar de divergentes, os dois
movimentos proporcionaram uma volta às raízes wesleyanas e uma
busca da identidade metodista, que estava deteriorada com as
diversas crises internas e influencias externa.
Os participantes das idéias desses dois movimentos contribuíram
para o metodismo brasileiro, das décadas de setenta a noventa, ser
uma Igreja atuante na sociedade, cuja unidade documental foi possível
acontecer, especialmente, no Plano para a Vida e a Missão da Igreja,
aprovado no Concílio Geral de 1982.
As principais contribuições dos adeptos da Teologia da
Libertação e dos participantes do Movimento carismático ao
metodismo brasileiro, a partir da década de setenta, foram:
6.3.1. Uma consciência profética
O metodismo da década de noventa tem uma consciência social
e age proféticamente.1015 João Wesley é o grande inspirador. A
1015 Já foi citado no Capítulo 5, no item 3.4. A luta contra a escravidão, a posição enérgicade Wesley condenando o procedimento iníquo do Governo inglês, que permitia aexistência da escravidão. Em 1774, ele escreveu Pensamento sobre a Escravidão,quando denuncia que grande parte da riqueza de Liverpool era derivada do comércio de
CCXCVI
expressão “como Wesley” é comum ser encontrada nos documentos
oficiais da Igreja. Os metodistas são vistos assim:
“Como Wesley, combatem tenazmente osproblemas sociais que oprimem os povos e associedades onde Deus os tem colocado, denunciandoas causas sociais, políticas, econômicas e morais quedeterminam a miséria e a exploração e anunciando alibertação que o Evangelho de Jesus Cristo oferece àsvítimas da opressão.”1016
Mas foi a partir da década de setenta que a volta às raízes
wesleyanas foi mais intensa. Nas décadas de sessenta e setenta,
quando a situação social e política na América Latina exigiam por
parte da Igreja uma atuação mais libertadora, diversos metodistas se
levantaram na luta por justiça, democracia e liberdade, principalmente
durante o período em que regimes ditatoriais imperavam na América
Latina. Os militares davam os golpes e assumiam o poder trazendo
opressão e desrespeito aos direitos humanos. Foram diversos os
golpes. 1017
A Igreja na América Latina foi tomando consciência de seu papel
profético na sociedade. O exemplo do êxodo seria redescoberto e
serviria de reflexão bíblica e de estímulo aos cristãos da América
escravos. Essa atitude de Wesley mostrou o seu lado profético e serve hoje de modelopara os metodistas agirem em questões sociais. COMBLIN, Joseph. A Ideologia deSegurança Nacional. Editora Civilização Brasileira. 1977, p. 150-208.1016XIII Concílio Geral da Igreja Metodista. Plano para a Vida e a Missão da Igreja. EditoraUnimep, São Paulo, 1982, p. 9.1017 COMBLIN, Joseph. A Ideologia de Segurança Nacional. 3 ed.Editora CivilizaçãoBrasileira: Rio de Janeiro, 1980, p.150-204. Os golpes foram nos seguintes anos: Brasil(1964); Argentina (1966); Peru e Panamá (1968); Bolívia (1969 e 1971); Equador (1972),Uruguai e Chile (1973).
CCXCVII
Latina. A década de sessenta seria o período de formação da
Teologia da Libertação, que via na história de opressão do Egito sobre
o povo de Deus semelhança com a situação de miséria, opressão e
cativeiro na América Latina. Gustavo Gutierrez, Leonardo Boff, entre
outros, foram grandes articulares do movimento através de livros. Em
seu livro Pobreza y Liberacion em América Latina, Gutierrez afirmou:
“O anúncio do evangelho é uma contribuição àlibertação de tudo o que oprime ao pobre aqui e agorada injustiça social em que vive, e o conduz assim aviver como filho de Deus e entrar em comunhão com oPai.”1018
O metodismo na América Latina procurou se organizar para
cumprir melhor seu papel histórico. No dia 2 de fevereiro de 1969, em
Santiago do Chile, as Igrejas Metodistas da América Latina criariam o
Conselho de Igrejas Evangélicas Metodistas da América Latina
(Ciemal), para fortalecer o testemunho cristão e expressar a paixão
evangelizante.1019 Posteriormente, quando as Igrejas do Caribe
passaram a fazer parte e o Ciemal este se tornou o Conselho de
Igrejas Evangélicas Metodistas da América Latina e Caribe.
Os fundamentos teológicos de sua origem e missão são:
“A profunda necessidade de sinalizar e trabalharpela unidade, conexidade e ecumenicidade dometodismo latino-americano e caribenho.
A profunda necessidade de sinalizar e trabalhar poruma busca da identidade própria, indigenização e
1018 GUTIERREZ, Gustavo. Pobreza y Liberacion em América Latina. Cristianismo ySociedade. Argentina: [sed], nº 63, 1970, p. 75.1019 CIEMAL. Missão e Testemunho. [ s.ed], [s.d], p.3.
CCXCVIII
contextualização do metodismo latino-americano ecaribenho.
A profunda necessidade de sinalizar e trabalhar peloevangelho através de uma prática mais integral,histórica e teologicamente, sinal do Reino de Deus,comprometida com a libertação do povo latino-americano e caribenho, a partir dos empobrecidos.”1020
O fato histórico de maior relevância foi a necessidade de
concretizar a autonomia em relação à liderança da Igreja Metodista
dos EUA e desenvolver uma teologia prática e um maior
relacionamento entre as Igrejas metodistas da América Latina.
Era necessária uma postura de maior atuação nos problemas que
envolviam as Igrejas Metodistas na América Latina, especialmente, em
um período de ditadura militar. Inclusive, alguns metodistas foram
presos ou foram mortos pelos militares. Alguns traídos pelos próprios
irmãos na fé, inclusive, pastores.1021
Para viabilizar mais eficientemente o testemunho cristão, as suas
três Comissões de Evangelização, Promoção Humana e Assuntos
Educacionais seriam, nos anos noventa, transformados em uma só:
Comissão de Missão e Testemunho.1022
Na década de setenta se tornou forte a Teologia da Libertação
num continente marcado pelos golpes de estado, desrespeito aos
direitos humanos, corrupção administrativa , etc. O ano de 1970 é
1020 Ibidem, Ibidem, p. 7-8.1021 SOUZA, Percival de. Eu, Cabo Anselmo, Ibidem, p.193.1022 CIEMAL,Ibidem, p. 8.
CCXCIX
considerado o ano-chave para a Teologia da Libertação, quando
houve uma série de encontros e simpósios em diversos países latino-
americanos resultado de uma nova consciência sobre a situação
oprimida do povo e a missão libertadora da Igreja.
Fato importante no metodismo brasileiro foi a aprovação do novo
Credo Social pelo X Concílio Geral, em 1971, quando ele foi
incorporado à constituição da Igreja e passou a constar do conjunto
doutrinário que define o pensamento da Igreja Metodista.1023
Entre suas afirmações, estão:
“A reconciliação do homem em Jesus Cristo tornaclaro que a pobreza escravizadora em um mundo deabundância é uma grave violação da ordem de Deus; aidentificação de Jesus Cristo com o necessitado e comos oprimidos, a prioridade da justiça nas Escrituras,proclamam que a causa dos pobres do mundo, é acausa dos seus discípulos (...). É injusto aumentar ariqueza dos ricos e o poder dos fortes confirmando amiséria dos pobres e oprimidos. Os programas paraaumentar a renda nacional precisam criar condiçõesequatitativas de recursos, combater discriminações,vencer injustiças econômicas e libertar o homem dapobreza (...).”1024
O Credo Social serviu de âncora para os líderes da Igreja. Entre
alguns líderes e documentos da Igreja Metodista, a expressão
“libertação” passou a ser utilizada dentro da ênfase da Missão da
Igreja. Isac Aço assim se expressou:
1023 X Concílio Geral da Igreja Metodista. Credo Social. [s. ed], 1971, p.1.1024 Ibidem, p. 7.
CCC
“Evangelizemos, pois evangelizar é continuar aobra de Cristo que evangelizou aos pobres, foi enviadopara proclamar libertação aos cativos.”1025
Os próprios Bispos metodistas brasileiros, em sua Pastoral em
1971, já usavam termos semelhantes:
“Nosso testemunho e serviço cristãos no mundonos levarão a dizer ´não´ a tudo que escarnece do amorde Cristo, a todo sistema, todo programa e toda pessoaque trate qualquer ser humano como se fora um objetoirresponsável ou como um mero lucro, aos quedefendem a injustiça em nome da ordem, e aos quesemeiam a guerra (...).”1026
Na Igreja Metodista no Brasil, o XI Concilio Geral teve mudanças
substanciais em sua forma de encarar a missão da Igreja. A Missão
teve primazia no Concílio e o tema aprovado foi “Missão e Ministério”.
A ênfase foi na libertação:
“(...) programa de ação da Igreja, como serva deJesus Cristo, para libertar totalmente o Homem, atravésdo poder do Evangelho (...).”1027
Mas o Plano Quadrienal aprovado no Concílio Geral significou um
avanço e foi mais enfático ainda. A expressão “libertação” foi utilizada
para falar do ser humano e das estruturas injustas. A missão da Igreja
tem como objetivo, entre outras coisas:
“Libertar o ser humano de todas as coisas que oescravizam e conduzi-lo à comunhão com Deus e o
1025 AÇO, Isac. “Evangelizemos” em Expositor Cristão. São Paulo, 31 de julho de 1971,ano 86, nº 14, p. 3.1026 COLÉGIO ESPISCOPAL. “Pastoral dos Bispos da Igreja Metodista” em ExpositorCristão. São Paulo, 30 de junho de 1970, ano 85, nº 12, p.1.1027 CONSELHO GERAL. Atas e Documentos do XI Concílio Geral. Relatório do ConselhoGeral, Rio de Janeiro, 4 a 14 de julho, Imprensa Metodista, p. 33.
CCCI
amor ao próximo; buscar a transformação dos sereshumanos e das estruturas sociais, à luz do Evangelhode Cristo (...).”1028
No metodismo brasileiro o avanço em relação ao trabalho junto
aos índios se faz sentir com a aprovação pelo Colégio Episcopal das
Diretrizes Pastorais para a Ação Missionária Indigenista.
Entre suas diretrizes, está:
“A Igreja metodista reconhece que cada povo ésujeito e protagonista da própria história. Por isso todasas missões e todos os espaços de solidariedadeassumidos pela Igreja tem o propósito de fortalecer osprincípios de autodeterminação que os povos indígenasprojetam e constroem historicamente (...).” 1029
O Ministério profético exercido pelos metodistas no século XVIII,
na Inglaterra, tem sido retomado pelo metodismo brasileiro, nas
últimas décadas. No seu relatório ao XVI Concílio Geral, o Colégio
Episcopal afirmou:
“O sistema neo-capitalista do mercado total,associado às novas tecnologias, tem demonstrado umaperversidade especialmente cruel em países nãodesenvolvidos, onde o processo de exclusão atingeenormes contingentes da população pobre (...).”1030
Uma marca wesleyana que é necessária permanecer sem a qual
a Igreja não será fiel às suas raízes.
1028 Ibidem, p. 37.1029 COLÉGIO EPISCIOPAL. Diretrizes Pastorais para a Ação Missionária Indigenista.Ibidem, p. 15.1030 ______. Relatório do Colégio Episcopal ao XVI Concílio Geral, Ibidem, p. 17.
CCCII
6.3.2. A organização em dons e ministérios
(...) Pedro era um pregador cheio do EspíritoSanto como Wesley.1031
Colégio Episcopal da Igreja Metodista
Wesley constantemente é citado quando se deseja abordar
oficialmente as questões relacionadas ao Espírito Santo, tanto para se
falar da importância de se ter experiências com o Espírito Santo bem
como no combate aos extremos do avivamento.
“Wesley, diante dos que se apresentavam parareceber atribuição de pregadores locais, lhesperguntava: (1) tens a Graça? (experiência viva comcristo). (2) Tens os dons? (reconhecimento do chamadodo Espírito). (3) tens os frutos? (comprovação naprática da Graça e dos Dons).”1032
A expressão e ênfase dons do Espírito não haviam tido ainda
uma atenção da liderança do metodismo brasileiro. A rejeição ao
Movimento de Renovação Espiritual, na década de sessenta, impediu
que a abertura aos dons e ministérios acontecesse há mais tempo.
Contudo, havia uma efervescência na sociedade e no metodismo. O
Movimento Carismático cresceu e teve seu papel na redescoberta dos
dons e ministérios.
1031 ______. Dons e Ministérios. São Paulo: Departamento Editorial, 1988, p. 38.1032 Ibidem, p.16.
CCCIII
O dia 25 de março de 1974 é histórico no metodismo brasileiro,
pois o Conselho Geral (composto de todos os Bispos e leigos e
clérigos de cada Região) estava reunido para elaborar o Plano
Quadrienal para ser apresentado ao próximo Concílio Geral. Havia
uma angústia nos presentes, pois os números nas estatísticas não
traziam boas perspectivas. Mas veio o sopro do Espírito sobre os
presentes. Houve um mover do Espírito num diálogo informal entre os
conselheiros.
Não houve nada sobrenatural, mas a consciência dos presentes
foi de que houve uma ação do Espírito Santo, naquela noite, em 1974,
convocando a Igreja para a Missão:
“Sentindo a ingente responsabilidade paracumprimento da Missão aqui e agora, no Brasil e nomundo, buscavam os conselheiros encontrar o caminhoadequado para o desenvolvimento da Obra profética daIgreja. Não estavam em reunião formalmenteadministrativa; apenas dialogavam. Ao sopro doEspírito Santo, que vivifica, fortalece e conserva aIgreja, surgiu espontaneamente, cremos nós, o temaque será centro de toda a preocupação e programaçãoda Igreja no quadriênio: Ministério e Missão.”1033
Algo ainda marcante aconteceu no Concílio Geral de 1974. Por
proposta do então pastor Paulo Ayres Mattos, houve a decisão de
deixar os Cânones em segundo lugar para discutir primeiro a Missão
da Igreja. Foi um passo muito importante. A Igreja estava dizendo que
a Missão deve ser a preocupação máxima.1034
1033 ______. "Mensagem do Colégio Episcopal ao XI Concílio Geral da Igreja Metodista”.Atas e Documentos do XI Concílio Geral. [s. ed],1974, p. 32.1034 Ibidem, p. 3.
CCCIV
Neste Concílio foi tomada uma decisão histórica. Pela primeira
vez, a agenda reservou um dia (quarta feira) para jejum e oração. Os
Bispos disseram:
“Vamos à Fonte da Água da Vida.”1035 Elesdisseram: se no final deste colendo Concílio tivermossomente dotado a Igreja de uma legislação perfeita,vamos necessitar clamar com 'saco e cinza na cabeça'pela inutilidade do encontro conciliar (...). Reunimo-nospara achar, encontrar, reencontrar a Missão da IgrejaMetodista no hoje no mundo e no agora do Brasil.”1036
O tema aprovado foi "Missão e Ministério". Foi um início para a
Igreja chegar na organização em Dons e Ministérios. Para
completar, foram extintas as Juntas de Ecônomos e criada a
Comissão de Patrimônio e Finanças.
Entre as recomendações ao XI Concílio Geral, feita pela
Comissão do Estado Geral da Igreja, estava o desejo de um novo
Pentecostes na Igreja:
“(...) e, acima de tudo, os ministros de Deus,clérigos e leigos, não poderão ficar condicionados aoséculo presente e nem à tendência de apegodemasiado à História da Igreja, nos livre paracriatividade de acordo com a inspiração do EspíritoSanto, flamejado por um novo Pentecostes que tornepleno de valor espiritual a Igreja Metodista em nossopaís.”1037
1035 Ibidem, p. 33.1036 Ibidem.1037 Comissão do Estado Geral da Igreja. Atas e Documentos do XI Concílio Geral.[s.ed], 1974, p. 54. A Comissão era composta pelos pastores Oswaldo Dias da Silva,Lindopho da Silva Lavoura e Silas Pereiras Barbosa.
CCCV
O tema aprovado, no Concílio Geral de 1978, mostra o caminho
de maturidade que a Igreja havia encontrado: Unidos pelo Espírito
Metodistas Evangelizam.
Dentro da caminhada que proporcionou mudança na vida da
Igreja, foi realizada a consulta sobre "Vida e Missão", colhendo
subsídios para o Concílio Geral de 1982. O Concílio Geral, realizado
em Piracicaba, aprovou o Plano para a Vida e a Missão da igreja, que
ajudou na unidade da Igreja e deu diretriz sólida para a prática da
Igreja.
As decisões do Instituto Internacional para Evangelização
Mundial do Conselho Mundial Metodista, realizada em 1984, na
Geórgia, EUA, revelaram tendências da Igreja e ajudou na abertura ao
mover do Espírito. O Instituto enviou uma mensagem a Igreja:
“À medida que nossos corações se abriram um aooutro e ao Espírito Santo, tivemos uma visão maisampla de evangelização e descobrimos novos meios deoferecer a fé cristã ao mundo. Confessamos nossosfracassos do passado e as limitações da nossa vidainterior, chamamos os cristãos em toda a parte parapacturar conosco em uma nova dedicação à tarefa daevangelização mundial.”1038
A mensagem dizia ainda:
1038Instituto Internacional para evangelização mundial do Conselho Mundial Metodistarealizado entre os dias 16 de julho a 2 de agosto de 1984. Expositor Cristão. 2ª quinzenade outubro de 1984, p. 11.
CCCVI
“O segredo do crescimento da Igreja se encontraem células de oração, estudos bíblicos e amor epreocupação um pelo outro.”1039
Disse ainda:
“Uma nova abertura e obediência à direção e aopoder do Espírito Santo fazem-se necessárias.”1040
Com a abertura na sociedade brasileira, a organização popular e
a democracia influenciaram e ajudaram a desmantelar toda estrutura
antidemocrática dentro da Igreja.
Na V Região (Interior de São Paulo, Triângulo Mineiro, Mato
Grosso e Goiás), em 1985, foi aprovado o Projeto de dons e
ministérios. O Expositor Cristão publicaria a seguinte matéria: “V RE
descobre dons e ministérios para realizar a Missão”. Em 1986,
oficialmente começaria uma experiência prática com os dons e
ministérios através do projeto que preparava agentes da missão. O
ponto de partida era entender que o leigo já estava preparado.
Precisava apenas reconhecer seus dons e ministérios. Entre os
possíveis dons e ministérios estavam: visitação, oração, música,
música e cânticos, mordomia cristã, proclamação, ensino, lazer e
recreação, aconselhamento, solidariedade, governo, literatura , etc.
O Concílio Geral aprovou, em 1987, a organização da Igreja em
dons e ministérios e a Igreja abriu oficialmente as portas para o mover
do Espírito, para a participação de todos e para a maturidade
1039 Ibidem.1040 Ibidem.
CCCVII
espiritual. A Igreja passou a reconhecer a pluralidade existente em seu
meio e a impossibilidade de haver uma uniformidade. Os Bispos
declararam:
“Somos desafiados a reconhecer, em nossarealidade, um fato inquestionável: 'A nossa Pluralidade'.Pluralidade teológica, prática, no aspecto daconfiguração regional, local e nacional.”1041
Para os Bispos, a organização da Igreja Metodista em dons e
ministérios:
“a) reafirmou o princípio conciliar para todos osníveis, inclusive a igreja local e a descentralização dopoder:b) a igreja local deixou de ser vista como unidade
institucional, e, sim "Comunidade da fé";c) enfatizou o sacerdócio universal de todos os crentese a necessidade de todos se envolverem na missão;d) reafirmou o conceito de Igreja e missão percebidanos últimos anos e presente no "Plano para a vida e amissão da Igreja";e) reafirmou a unidade da Igreja e o princípio metodistade conexidade.”1042
. Nesse novo paradigma, os dons e ministérios passaram a ser
fundamentais para a vida e missão da Igreja:
“A Missão para a qual Deus tem nos chamado,desenvolvida através da multiplicidade de dons e
1041COLÉGIO EPISCIOPAL. Relatório do Colégio Episcopal ao XIX Concílio Geral. RudgeRamo, SP. julho/87, p.6. Conexidade é o oposto de congregacionalismo. As igrejasmetodistas locais são interligadas e devem se ajuda mutuamente. “Deus lhe deu essaforma de articulação unificadora para cumprir sua vocação histórica (...)”. (CANÔNES daIgreja Metodista. São Paulo:Imprensa da Fé,1998, p.80).1042 ______. Plano Nacional: Ênfases e Diretrizes. Biblioteca Vida e Missão. SolariunServiços Criativos, 1997, p.17-8.
CCCVIII
ministérios , tem seu chão e apoio em nossa realidadebrasileira e leva a sério o seu contexto atual.”1043
Em 1989, o Colégio Episcopal já amadurecido publicou
Orientações Pastorais sobre o uso dos dons do Espírito e outras
práticas. A linguagem utilizada reconhecia diversas expressões que no
passado foram rejeitadas. Efetivamente, a experiência e a ação do
Espírito Santo passaram a fazer parte do novo paradigma do
metodismo brasileiro. Os Bispos disseram:
“Muitas pessoas estão experimentando algo novo,em suas vidas cristãs. Uma nova efusão do Espíritoque provoca profundas mudanças de vida. Aexperiência do Espírito, que pode ser chamada de'batismo do Espírito', 'derramamento do Espírito','plenitude do Espírito' ou 'segunda benção' e outros,sempre provoca mudanças na vida das pessoas.”1044
Disseram mais:
“O movimento 'Dons e Ministérios' trouxe novamotivação e alento no período final do quinquênio,mobilizando algumas Regiões, várias igrejas e umaimensidão de irmãos(as) leigos(as). Cremos que oEspírito está agindo em nosso meio (...).”1045
Segundo os Bispos, organização da Igreja em dons e ministérios:
“a) reafirmou o princípio conciliar para todos osníveis, inclusive a igreja local e a descentralização dopoder:
1043 Ibidem, p. 12.1044______ Orientações Pastorais sobre o uso dos Dons do Espírito e outras práticas.[s.ed],1989, p. 8.1045 Ibidem, p. 7.
CCCIX
b) a igreja local deixou de ser vista como unidadeinstitucional, e, sim "Comunidade da fé";c) enfatizou o sacerdócio universal de todos os crentese a necessidade de todos se envolverem na missão;d) reafirmou o conceito de Igreja e missão percebidanos últimos anos e presente no "Plano para a vida e amissão da Igreja";e) reafirmou a unidade da Igreja e o princípio metodista
de conexidade.”1046
A expressão “dons e ministérios” passou a ser comum e parte
dos documentos da Igreja:
“A Missão para a qual Deus tem nos chamado,desenvolvida através da multiplicidade de dons eministérios , tem seu chão e apoio em nossa realidadebrasileira e leva a sério o seu contexto atual.”1047
Outro passo para o amadurecimento da Igreja foi dado em 1991.
O Concílio Geral procurou despertar a Igreja para o trabalho
missionário com o tema: Igreja: Comunidade Missionária a Serviço do
Povo. As duas maiores tendências teológicas da Igreja ajudaram na
elaboração e aceitação, por parte das igrejas, desta ênfase.
Na Avaliação Nacional Metodista realizada em novembro de
1990 foi constatado que 91% das igrejas estavam organizadas em
dons e ministérios. Exatamente 85% delas declararam que a
organização em dons e ministérios era um sistema melhor do que o
sistema de “Juntas e Comissões”, que existiu até 1987. Apenas três
anos de experiência para uma avaliação excelente.
1046______. Plano Nacional: Ênfases e Diretrizes. Biblioteca Vida e Missão. SolariunServiços Criativos, 1997, p. 17-8.1047 Ibidem, p. 12.
CCCX
6.3.3. Paixão evangelizante
“Desde os planos quadrienais, a IgrejaMetodista no Brasil lutava para sair de uma açãomajoritariamente voltada para si mesma e voltar-separa uma ação missionária que projetasse concreta ehistoricamente as convicções missionárias herdadasde João Wesley e do metodismo histórico.”1048
Colégio Episcopal da Igreja Metodista
Crescimento numérico sempre foi sinônimo de crise no
metodismo brasileiro, apesar dos entusiasmos e campanhas durante
décadas. A ênfase do Movimento Carismático fez retomar, em parte, a
realização de grandes concentrações do povo como foi ao redor de
Wesley e Whitefield. O mais importante foi que passou a haver
crescimento da Igreja. Em princípio lento, mas depois com resultados
satisfatórios.
As ênfases burocráticas foram cedendo espaço para momentos
devocionais na vida da Igreja, que passaram a atrair as pessoas que
precisam de momentos de paz e restauração de suas vidas. No seu
relatório sobre o ano de 1975 ao Concílio da Primeira Região, o bispo
Almir dos Santos usou de honestidade e disse que o Plano
Quadrienal tinha um total desconhecimento dos membros das igrejas.
Disse mais:
1048______L Relatório do Colégio Episcopal ao 16º Concílio Geral. Biblioteca Vida eMissão, 1997, p 21.
CCCXI
“Ainda para continuar sendo honesto, penso que aênfase de muitas igrejas não esteve no PlanoQuadrienal, mas em certos aspectos do movimentocarismático que vem atuando em todas as igrejascristãs no mundo de hoje, inclusive na CatólicaRomana. O Colégio Episcopal elaborou e publicou umapastoral sobre o Movimento Carismático, e para elatemos endereçado os pastores e leigos interessados nodespertamento espiritual da Igreja.”1049
Bispo Almir dos Santos ainda disse:
“Pessoalmente, creio que este movimento, quandopurificado de seus exageros, traz grande benefício àsigrejas e aos crentes. Não há como negar orebaixamento do nível de vida espiritual e moral demuitas das pessoas das nossas comunidades,transformadas em verdadeiros clubes.”1050
Em doze anos, a Igreja Metodista, no Rio de Janeiro, teve um
crescimento irrisório. Ela alcançou o seguinte número de membros:
1963:12.494 1051
1975:14.254 1052
Houve uma frustração por a Igreja não ter chegado aos 100 mil
membros, em 1982, como havia sido colocado no Concílio Geral de
1049 SANTOS, Almir dos. "Relatório do bispo Almir dos Santos ao Conselho Regional daPrimeira Região Eclesiástica da Igreja Metodista" em Atas e Documentos. Rio de Janeiro,[s. ed], 1978, p. 39.1050 Ibidem.1051 ATAS, Registros e Documentos. Estatística, Rol de Membros, Tabela I, 8º ConcílioRegional, 9 a 14 de Janeiro de 1964. Imprensa Metodista, São Paulo.1052 ATAS e Documentos. 20º Concílio, 6 a 9 de Janeiro de 1977, Instituto MetodistaBennett, p. 70.
CCCXII
1978. As causas foram diversas. Segundo o Conselho Geral, os
próprios delegados do Concílio Geral reagiram com indiferença. Houve
ainda falta de sensibilidade e motivação do grupo responsável pela
execução. Outra justificativa foi de que o prazo dado inviabilizou a
meta.1053
Diante das dificuldades decrescimento, em 1984, Adriel de
Souza Maia, Bispo presidente do Colégio Episcopal, disse:
“O bom êxito da evangelização depende doavivamento da própria Igreja.”1054
No II Seminário Nacional de Evangelização, realizado em 1984,
na Faculdade de Teologia, foi publicado um manifesto que propunha,
entre outras coisas, uma evangelização ampla:
“Que a evangelização seja a razão de ser da Igreja,levando em conta a realidade da comunidade e asexpectativas das igrejas locais; Que pratiquemos umaevangelização que inclua a proclamação, ação social ea educação (...).”1055
Diante dos resultados negativos no crescimento da Igreja e
dentro das diretrizes do Plano de Vida e Missão, o Colégio Episcopal e
os Secretários Gerais, em 1985, procuraram promover a
1053 RELATÓRIO do Conselho Geral ao XIII Concílio Geral. Atas e Documentos. [s. ed],1982, p.41-3.1054 Destaques do Relatório Episcopal do bispo Adriel Maia publicado no Expositor Cristãoem 1984, p. 9.1055 RAMALHO, Eliane. “Evangelização, a razão de ser da Igreja” em Expositor Cristão.
1ª quinzena de novembro de 1984, p. 12.
CCCXIII
evangelização e a espiritualidade para o restante do quinquênio. A
ênfase foi na:
redescoberta da evangelização; expansão missionária; mística e carisma do metodismo; revitalização da piedade (santidade).1056
Havia a busca de uma nova Igreja pela liderança da Igreja. No
artigo "1986, a Igreja a Caminho de sua Identidade", publicado no
Expositor Cristão, o professor da Faculdade de Teologia, Tércio
Machado Siqueira, disse:
“(...) a nova Igreja só nascerá a partir do esforçocomum, sem regionalismos e sem preconceitos àsposições teológicas. A unidade da Igreja é o únicocaminho para o projeto Dons e Ministérios produzirfrutos (...).”1057
Neste período de estudos, debate, busca, amadurecimento, o
crescimento da Igreja ainda foi bastante fraco:
1974: 61.990
1978: 67.236
1982: 71.949
1987: 74.039
1056 Reportagem da jornalista Léia Leme no Expositor Cristão com o título “ColégioEpiscopal e Secretários Gerais concluem para o restante do quinquênio as ênfasesevangelização e espiritualidade”. 1ª quinzena de abril de 1985, p. 12.
1057 SIQUEIRA, Tércio Machado. "1986, a Igreja a Caminho de sua Identidade" emExpositor Cristão. 1ª quinzena de fevereiro de 1987, p. 16.
CCCXIV
1990: 83.652 1058
O grande salto no crescimento no metodismo brasileiro começou
na década de noventa. Foi o desembocar de toda uma trajetória. A
partir de 1974, com a ênfase na Missão da Igreja e não nos Cânones;
a abertura maior ao mover do Espírito no Concílio Geral de 1978; a
estabilidade trazida pelo Plano Para a Vida e Missão da Igreja,
aprovado no Concílio Geral de 1982; a abertura para organizar a
Igreja em Dons e Ministérios, aprovado no Concílio Geral de 1987; a
ênfase na Igreja como uma comunidade a serviço do povo, aprovado
no Concílio Geral de 1991 é que a Igreja voltaria às suas raízes.
Os relatórios apontaram os seguintes números de membros:
1990 1996
83.652 112.641 1059
Enfim, o metodismo passou dos 100 mil membros. O ano de
1999 trouxe um aumento de 7.751 novos membros ao metodismo
brasileiro significando um crescimento de 5,94%. Em 1998, o
crescimento numérico foi de 8.908 novos membros e significou um
crescimento de 9,3%.
As 3ª (Capital de São Paulo e Vale do Paraiba) 4ª (Minas Gerais,
Espírito Santo, etc) e 5ª Regiões (Interior de São Paulo e sul de Minas
1058 COLÉGIO EPISCIOPAL Relatório do Colégio Episcopal ao 16º Concílio Geral, Ibidem,p.26.1059 Ibidem.
CCCXV
Gerais) tiveram um crescimento percentual semelhante ficando entre
2% e 3%. A 6ª Região (Paraná e Santa Catarina) teve um
crescimento maior: 7,32%.
O destaque ficou com a área missionária, que mais cresceu
percentualmente. A Remne (Região Missionária do Nordeste) teve
16,23% e os CMA (Campo Missionário da Amazônia) tiveram 12,69%.
A 2ª Região (Rio Grande do Sul) foi a única que não
acompanhou o crescimento. Ela teve um decréscimo de 1,39%. Por
outro lado, dos 7.751 novos membros recebidos, a 1ª Região recebeu
4.729. Isso significa que 61% dos membros arrolados no metodismo
vieram da 1ª Região.
Em 1999, eram 138.172 membros arrolados no metodismo
brasileiro. O quadro das estatísticas referente ao ano de 1999 aponta
para este crescimento:
Região 1998 1999 CrescimentoTotal
%
1ª 51.589 56.318 4.729 9,17
2ª 8.969 8.844 -125 1,39
3ª 17.413 17.907 494 2,28
4ª 19.873 20.408 535 2,69
5ª 16.456 17.047 591 3,59
6ª 11.661 12.515 854 7,32
Remne 3.018 3.508 490 16,23
CMA 1.442 1.625 183 12,69
CCCXVI
Total 13.0421 13.8172 7.751 5,94 1060
Ressaltando a importância da paixão pela missão e sempre
colocando Wesley como paradigma, o Colégio Episcopal, em seu
relatório ao XVI Concílio Geral, afirmou:
“Ser uma Igreja missionária é um desafio de Deus para osmetodistas. Cremos mesmo no reavivar da velha chama dapaixão pela missão, tão notória em João Wesley, FrancisAsbury e em tantos outros do metodismo primitivo.”1061
6.3.4. A salvação integral
“Nós, metodistas, somos como João Wesley, umpovo comprometido com a evangelização integral, queune preocupação com o ser humano enquanto corpo,alma e espirito; trabalhamos e anunciamos a vida plenahoje e a vida eterna.”1062
Colégio Episcopal da Igreja Metodista
Se havia uma dicotomia entre social e espiritual no metodismo
brasileiro, essa tendência tem desaparecido. Tem havido um
crescente amadurecimento e ênfase na salvação integral do ser
1060 DO EDITOR. “Metodismo chega a 138 mil membros” em Expositor Cristão, maio de2000, Editora Cedro, p.10.1061 COLÉGIO EPISCIOPAL Relatório do Colégio Episcopal ao 16º Concílio Geral. Ibidem,p.26.1062 Ibidem, p.78.
CCCXVII
humano. Esse amadurecimento pode ser visto nas decisões dos
Concílios Gerais.1063
Em 1982, a Igreja conseguiu colocar em um documento uma
forte base teológica para as obras de misericórdia e os atos de
piedade unindo os carismáticos e os liberais ao aprovar no Concílio
Geral o PVM - Plano para a Vida e a Missão da Igreja, apesar da
oposição dos mais conservadores.1064 Entre outras importantes
afirmações, o PVM diz:
“A missão acontece na promoção da vida e dotrabalho - para que haja vida são necessárioscomunhão e reconciliação com Deus e o próximo,direito à terra, habitação, alimentação, valorização dafamília e dos marginalizados da família, saúde,educação, lazer, participação na vida comunitária,política e artística, e preservação na natureza (At 2.42;2Co 5.18-20; Jo 10.10, 15.5. 1Jo 1.7 ).” 1065
Para o bispo João Carlos Lopes, o PVMI rejeitou um modelo de
Igreja de manutenção e proporcionou unidade:
“O Plano para a Vida e a Missão da Igreja (PVMI)foi aprovado pelo XIII Concílio Geral, em um momento
1063 Magali do Nascimento Cunha vê a questão do Evangelho integral de maneiradiferente. Para ela, essa ênfase é da teologia avivalista, “difundida em especial pelomovimento evangelical” (CASTRO, Clovis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento.Forjando uma nova Igreja, Ibidem, p. 62. Segundo ela, as Igrejas históricas e pentecostaisprocuram atualmente fazer trabalho social, mas sem atingir as causas. “Esses projetossociais se revelam desprovidos de análise crítica em relação ao funcionamento dasociedade e de atuação frente às causas dos efeitos que eles visam atingir” (Ibidem).1064 Clóvis Pinto de Castro afirma que a Consulta Nacional “Vida e Missão”, em 1981, edepois a aprovação do PVM pelo Concílio Geral, em 1982, “(...) não agradaram aossetores mais conservadores e carismáticos da Igreja (...)”. (CASTRO, Clovis Pinto de ;CUNHA, Magali do Nascimento, Idem, p.42).1065 CONCILIO GERAL. Vida e Missão. Editora UNIMEP, 1982, p.16-7.
CCCXVIII
de forte tensão entre pelo menos três tendênciasdistintas presentes na igreja (a progressista, aconservadora e a carismática). Seu gênio foi acapacidade integradora, como demonstrada naretomada de equilíbrio entre os atos de piedade e asobras de misericórdia.”1066
O PVMI deixou de ser um Programa de ação para um
determinado período para ser um paradigma, que propôs um novo
modelo de Igreja:
“(...) se tornar linhas gerais que deverão orientartoda a ação da Igreja nos próximos anos, devendoquando necessário, ser avaliado periodicamente.” 1067
Dentro do processo de amadurecimento da Igreja, a implantação
dos dons e ministérios, a partir de 1987, revolucionou a vida e a
Missão da Igreja Metodista em terras brasileiras. Liberdade para se
organizar e maior participação dos membros foram alguns dos
resultados desse novo paradigma na estrutura da Igreja.
Como avanço e busca de uma âncora, um eixo para mobilizar
toda a Igreja, a década de noventa é fundamental. A expressão Ação
Missionária passou a ser esse eixo.
Especialmente, o paradigma da Ação Missionária conseguiu
superar barreiras, preconceitos e unir o que parecia impossível:
carismáticos, conservadores e progressistas. A Ação Missionária
engloba toda a prática evangélica, pois inclui pregação, cultos,
1066 LOPES, João Carlos. “O Plano para a Vida e Missão da Igreja, 18 anos depois” emAvante, Suplemento Fé & Nexo, agosto de 2000.1067 Idem.
CCCXIX
expansão missionária, ação social, educação, luta pelos oprimidos etc.
O metodismo conseguiu a unidade em torno deste paradigma. Uma
longa caminhada passando pelos Concílios Gerais, especialmente de
1974 a 1997.
A Igreja ampliou sua visão, atuação e estruturação. Expressões
teológicas como “missão”, “ministério”, “dons e ministérios”,
“libertação”, “mover do Espírito”, etc, passaram a reger a vida da
Igreja.
No Planejamento Nacional da Igreja Metodista aprovado no
Concílio Geral, em 1991, os Bispos disseram o que esperavam
alcançar na Ação Missionária. Foram colocadas como prioridades as
seguintes questões e problemáticas:
a criança e o adolescente empobrecido; o idoso; a situação indígena; o racismo; a condição da mulher; o uso social da terra (rural e urbana); a saúde pessoal e familiar; o trabalho; a ética; o crescimento numérico da Igreja.1068
Em 1991, o Concílio Geral procurou despertar a Igreja para o
trabalho missionário com o tema: Igreja: Comunidade Missionária a
Serviço do Povo.
CCCXX
Os Bispos reafirmaram, em 1991, que a Igreja de Dons e
Ministérios não era um programa para ser substituído por outro.
Passou a ser parte do paradigma. Ele passou a ser aceito na Igreja:
“É um movimento fruto da ação do Espírito nascidono interior da Igreja.”1069
Os Bispos assumiram um compromisso em pleno Concílio Geral,
em 1991:
“Comprometemo-nos, em ato de adoração, comosacrifício vivo, santo e agradável a Deus; não nosconformando com as estruturas de pecado do presenteséculo, convocamos a todos os metodistas a todos osmetodistas a assumirem, juntamente conosco, essecompromisso de testemunho de fé e de serviço em prolde sermos 'Uma Igreja Missionária a Serviço doPovo.”1070
A questão é: porque em diversas igrejas esse paradigma da Ação
Missionária tem se mostrado real e significativo trazendo vida e
envolvimento na Ação Missionária, mas em outras igrejas isso não
ocorre?
Simplesmente porque algumas lideranças, tradições, medo do
novo têm mantido a Igreja em paradigmas antigos, que já mostraram
estarem superados, pois não respondem às necessidades humanas e
nem as diretrizes bíblicas.
1068 MAIA, Adriel de Souza e outros. "Planejamento Nacional" em Atas e Documentos. XVConcílio Geral. Juiz de Fora, 5 à 13 de Julho de 1991, p.137.1069COLÉGIO EPISCIOPAL "Relatório do Colégio Episcopal ao Concílio Geral" em Atas eDocumentos. Juiz de Fora, 5 a 13 de Julho de 1991, p.81.1070 Ibidem, p. 87.
CCCXXI
Hoje a Igreja Metodista tem o paradigma da Ação Missionária,
que inclui pregação, expansão missionária, ação social, luta pela
justiça, dons e ministérios, educação, louvor, abertura para a ação do
Espírito Santo, etc.
“Entende-se por Ação Missionária o conjunto deatividades, palavras, atos e testemunhos, realizadospela Igreja, comunidade de fé, que se dispõe acooperar com Deus em resposta à graça e a vocação,no seu propósito de proporcionar vida àhumanidade.”1071
O avivamento deve ter como conseqüência transformação de
vidas, ação missionária e justiça social. Como disse bispo Paulo
Lockmann, Presidente do Colégio Episcopal da Igreja Metodista,
sobre as suas características:
“Um avivamento Espiritual Bíblico Metodista queseja maduro e produza, junto ao fervor espiritual,compromisso missionário real, promovendo assimvisíveis mudanças nas comunidades locais, onde Deusnos tem colocado.”1072
A Igreja passou a utilizar a expressão Ação Missionária para
enfatizar a mensagem total do Evangelho - social e espiritual, em
outras palavras, Obras de Misericórdia e Atos de Piedade, como
Wesley ensinou aos metodistas primitivos e como o Colégio Episcopal
ensina:
1071______. Plano Nacional: Ênfases e Diretrizes. São Paulo: Biblioteca Vida e Missão,1997, p. 351072 LOCKMANN, Paulo. "O Avivamento Espiritual - Uma Visão Metodista" em Avante.Janeiro/97, p.2.
CCCXXII
“Nós, metodistas, somos, como João Wesley,comprometidos com a evangelização integral, portanto,temos preocupação integral com o ser humano comocorpo, alma e espírito” .1073
7 - O PARADIGMA DO AVIVAMENTO METODISTA DO
SÉCULO XVIII
“Há uma variabilidade irreconciliável nas operaçõesdo Espírito Santo nas almas dos homens,especialmente quanto ao modo da justificação. Muitos oencontram derramando-se sobre eles como umatorrente enquanto experimentam o poder dominador dagraça salvadora (...) mas Ele opera em outros demaneira muito diferente: Ele exerce a sua influência de
1073 COLÉGIO EPISCOPAL. Carta Pastoral do Colégio Episcopal sobre a Aliança comDeus. São Paulo: Editora Cedro, Biblioteca Vida e Missão, 2000, p.14.
CCCXXIII
maneira delicada, refrescante como o orvalhosilencioso” .1074
João Wesley
7.1. A questão do avivamento na Igreja evangélica brasileira
Se na década de sessenta, o Movimento de Renovação Espiritual
atingiu profundamente as Igrejas históricas, como a Metodista, Batista
e Presbiteriana,1075 na década de noventa os movimentos avivalistas
têm retornado e novamente tem trazido inquietações e/ou influências
nas Igrejas históricas sacudindo suas estruturas. 1076
Alguns vêem esse ”mover do Espírito” como sendo positivo. O
Jornal Expressão Nacional colocou como manchete, em julho de 2000:
“O Brasil vive um grande mover do Espírito” 1077 e afirmou:
“As projeções apontam que em pouco tempo onúmero de evangélicos no Brasil irá se igualar ao de
1074 BURTNER, Robert ; CHILES, Robert, Ibidem, p.95.1075 Assunto já abordado na tese.1076 A Revista Eclésia, ano v, nº 57, agosto de 2000, aborda sobre “ A polêmica do G12”.Um movimento da Igreja em células, que divide as igrejas e líderes evangélicos no Brasil.Como exemplo, enquanto o pastor René Terra Nova, da Igreja Batista da Restauração,em Manaus, acredita que o movimento irá curar os males da Igreja e afirma: “Arestauração hoje é uma igreja no modelo dos 12”, o pastor Silas Malafaia, da Assembléiade Deus, Rio de Janeiro, o contradiz e afirma “ lamentar profundamente que pastores eigrejas respeitados no país estejam aderindo ao G12” (Revista Eclésia, Ibidem, p.24). O“G12” também atinge o metodismo brasileiro. No Rio de Janeiro, grandes igrejas comoMacaé e Retiro, em Volta Redonda, se envolveram e têm gerado problemas doutrinários ede relacionamento.1077 MENDES, Roberto de Mattos (dir). Expressão Nacional, Serra Negra, São Paulo,julho de 2000, ano II, nº 16, primeira página.
CCCXXIV
descrentes.os últimos censos demográficos apontamum crescimento de mais de 5% ao ano.”1078
O mesmo Jornal, na mesma edição, coloca uma notícia chamada
“Avivamento paranaense” e comenta afirmações do pastor Edson de
Oliveira Filho, da Igreja Missionária Peniel:
“‘Ate 1994 a Igreja era apagada’, comenta,‘recebemos o Ministério de Evangelismo de Colheira,vindo da Argentina e igrejas como a Metodista e asPresbiteriana Independente e do Brasil se engajaramno movimento. Houve um crescimento muitogrande(...).”1079
Outros líderes vêem a questão de uma forma diferente e
inquietante.
O professor Dr. Gottfried Brakemeier, ex-pastor presidente da
IECLB (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil) e da (FLM)
Federação Luterana Mundial tem abordado sobre os movimentos
pentecostais.
A posição de Brakemeier foi apresentada, em 2000, em debate a
respeito do movimento carismático no seio da IECLB, numa análise
sobre “O Espírito Santo e a Igreja Luterana.”
“Brakemeier começa sua análise fazendo umadistinção entre religiosidade e religião. “A religiosidadeestá em alta, a religião em baixa. Religiosidade é a févivida pelas pessoas, religião é a fé representada eadministrada pelas instituições. Observamos, neste
1078 Ibidem.1079 Ibidem, p.05.
CCCXXV
final de século, uma explosão de religiosidade sobconcomitante diminuição da religião”, constata.”1080
Brakemeier diz que, de modo estranho, as igrejas pentecostais
não suportam a diversidade dos carismas, e resolvem suas
divergências internas recorrendo à divisão. Ele lembra que a
comunidade de Jesus Cristo é composta de públicos diversos, que,
uma vez confessando-se como cristãos, deverão ter assegurado seu
espaço.
“Onde os carismáticos brigam, desprezam unsaos outros e racham a comunidade, aí eles ainda sãomuito ‘carnais’, como o apóstolo Paulo alerta em 1Coríntios 3 e principalmente em 1 Coríntios 13´, aponta,ressaltando que “a intransigência religiosa e oexclusivismo grupal destróem o templo de Deus, que éa comunidade e na qual deve habitar o Espírito deDeus.” 1081
Na atualidade, alerta, é preciso distinguir o que é autenticamente
cristão e o que não passa de pura moda. O próprio Espírito Santo
fornece esses critérios.
“Ainda assim, é preciso considerar o quemovimento carismático apregoa. “Movimentos quesacodem as estruturas da Igreja certamente apontampara aspectos negligenciados ou omissos no passado”,também na Igreja Luterana, onde há erros a seremcorrigidos.”1082
Brakemeier salienta que a Igreja Luterana é Igreja pentecostal,
mas a seu modo. Ele alerta que nem toda Igreja que se diz
1080 Serviço de notícias em português da Agência Latino-Americana e Caribenha deComunicação, “Igreja Luterana é também Igreja pentecostal” em Expositor Cristão, julhode 2000, nº 7, página, 10.1081 Ibidem.1082 Ibidem.
CCCXXVI
pentecostal é evangélica, nem toda religiosidade é cristã e nem todo
discurso do Espírito Santo é autêntico. Mas ele afirma que a IECLB
deve prestar mais atenção ao que se passa em seu meio: déficit de
afetividade, teologia por demais voltada ao intelecto, falta de vigor
missionário, de testemunho pessoal e vivência do discipulado.
“Por isso, confessa, “sonho com uma Igreja maisalegre, consciente do seu talento, menos escondida emais corajosa no testemunho.” O futuro vai mostrar seo movimento carismático que está presente também naIECLB trará renovação à Igreja ou uma profundadivisão ou até mesmo alienação, afirma.”1083
A própria Igreja Assembléia de Deus, que é pentecostal, têm
discutido a necessidade de mudança na Igreja e procurado um
reavivamento.
Em seu artigo, Reavivamento Interno, José Wellington Bezerra da
Costa, Presidente da Convenção Geral das Assembléias de Deus no
Brasil, mostra sua preocupação ao constatar um declínio em diversas
áreas de sua denominação:
“Por que igreja de Cristo não tem alcançado omundo há mais tempo? Porque o número demissionários que enviamos é cada vez menor? Por quetemos tão poucos missionários preparados para seremenviados? Por que temos tão poucas conversões nosnossos cultos? Por que o número de crentes batizadosno Espírito Santo diminui tanto nos últimos dias?.”O percentual de crescimento das Assembléias de Deusno Brasil era, até pouco tempo, cerca de 30% ao ano.Mas, no projeto da Década da Colheita chegamos à
1083 Ibidem.
CCCXXVII
conclusão, após exaustiva pesquisa, que essecrescimento diminui para 5%.”1084
José Wellington Bezerra da Costa propõe um reavivamento
interno na Assembléia de Deus:
“Precisamos de um reavivamento. Este, aliás, é otema que estamos estudando nesse primeiro trimestre.“Precisamos de reavivamento na família, no ministério,na igreja etc. Precisamos, também de pregadoresavivalistas. Mas não precisamos de pregadores queusam de artifícios para levar o povo ao delírio como sea pregação fosse um show, nem precisamos depregadores que batizam os crentes no Espírito Santo.Quem batiza os crentes no Espírito Santo é Jesus.Sensacionalismo não resolve nada.”1085
O pastor metodista José Magalhães Furtado, escreve no
Expositor Cristão o artigo A Igreja profética na sociedade atual e diz
que há necessidade da Igreja mudar. Ele diz as razões, entre elas:
“Por que será que as igrejas históricas tão antigasnão têm rádio e televisão e as Neo-Pentecostais tãonovas têm e falam para a sociedade, impondo inclusivesua visão do mundo? Erro na estratégia, voto desilêncio, isolamento das coisas do mundo? Por que asmatérias pagas na grande imprensa, destacando avisão da Igreja Metodista são tão escassas? E dechamadas na televisão em rede nacional, temosnotícias? Onde foram parar as denúncias dasimprobidades administrativas cometidas? Por que nãose critica a corrupção no Brasil? (...).”1086
1084COSTA, José Wellington Bezerra da. “Reavivamento Interno”, Site<WWW.visaog12.com.br/arquivos_lideres/1_wellington.htm> Feira de Santana, BA,28/08/00.1085 Ibidem.1086 FURTADO, José Magalhães. “A Igreja profética na sociedade atual” em ExpositorCristão, dezembro de 2000, p.16.
CCCXXVIII
Dentro do tema da tese – Avivamento e Compromisso Social - a
Revista VINDE, em um dos seus editoriais, fala sobre "Sinais de
Avivamento Genuíno" e incluiu o Metodismo de Wesley como
exemplo:
“Os grandes avivamentos julgaram e denunciarampelo poder da Palavra, socorreram e defenderam ospobres, marginalizados e oprimidos. Foi assim na IgrejaPrimitiva (Atos 2.42-43; 4.32-35; 2 Co 8.1-5; Rm 12.1-3), na Inglaterra nos tempos de Wesley, nos EstadosUnidos com Charles Finney.”1087
Mas em termos de avivamento espiritual, esse paradigma é
aceito por uma grande parte dos líderes e estudiosos do avivamento,
como citamos acima. Até mesmo por Igrejas tradicionais, como a
Igreja Batista.
O Jornal Batista publicou Mensagem da 55ª Assembléia da
Convenção Batista do Rio Grande do Norte, em 2000, que afirma o
Brasil estar precisando de um avivamento espiritual:
“Quando antevemos os alvores de um novo séculoe milênio, havemos de convir ser gritante anecessidade de um avivamento, no Brasil, no mundo.Como acentua pr. Damy Ferreira, a situação geral denossas igrejas exige um avivamento.”1088
1087 QUEIRÓZ, Carlos Pinheiro. "Sinais de Avivamento Genuíno" Revista VINDE. Ano 1,nº 4, Fevereiro de 1996, p.66.1088 55ª Assembléia da Convenção Batista do Rio Grande do Norte. "O Avivamento de queprecisamos" em Jornal Batista. Rio de Janeiro,10 a 16/7/00, p.11. Damy Ferreira afirmaque há uma insatisfação espiritual nas igrejas; há mundanismo, pecado generalizado; hádesinteresse pela Bíblia; há famílias e lares em crise; há ausência de conduta cristãgenuína; há falta de amor; há falta de ênfase na vida de oração; há falta de estímulo para
CCCXXIX
A Assembléia da Convenção Batista do Rio Grande do Norte,
realizado em 2000, cita Latourette, identifica sete períodos de grandes
avanços e avivamento. O Avivamento metodista na Inglaterra é
colocado como quinto período:
“(...) avivamentos wesleyanos da Inglaterra,concomitantemente, com os grandes despertamentosnos EUA, dos séculos 18 e 19 (...).”1089
O Bispo e Presidente do Colégio Episcopal da Igreja Metodista,
Paulo Lockmann,1090 fala da necessidade do metodismo buscar o
avivamento. As razões são diversas, especialmente, a situação social
brasileira:
“A existência, hoje, em nosso estado e em nossopaís, do fenômeno sempre crescente damarginalização, é prova da não-realização do bemcomum. Cresce a marginalização na medida em que asdecisões da política econômica do governo sãotomadas tendo em vista o interesse de gruposeconômicos nacionais e internacionais, o que em certosentido, dá no mesmo. Ser marginalizado é ser mantidofora, à margem daquilo que é direito de todos: moradia,trabalho, com salário justo, saúde, educação e livreparticipação no poder de decisão. É ser privado dodireito de uma terra para plantar (...). Por tudo istoqueremos ver em nossa Igreja um avivamento queincendeie o coração e a vida do povo metodista de talmaneira que leve a envolver-se com o povo, ajudandoas organizações populares em suas lutas; sendo um
o ministério de tempo integral; há pouca autoridade no púlpito, etc (cf. "O Avivamento deque precisamos", p.11).1089 Ibidem.1090 Paulo Tarso de Oliveira Lockmann foi o Presidente do Colégio Episcopal da IgrejaMetodista até 2001.
CCCXXX
sinal de amor e solidariedade com os que sofrem(...).”1091
No final do seu artigo, Paulo Lockmann afirma:
“Afinal, foi assim com João Wesley no século XVIII;e por que não pode ser igual conosco, neste Brasil, nofinal do século XX?”1092
7.2. O paradigma do avivamento wesleyano, no século XVIII, paraos metodistas brasileiros no novo milênio
Quais, então, as contribuições que o avivamento metodista do
século XVIII pode dar hoje à Igreja Metodista em terra brasileira?
Quais as diretrizes principais que podem ser dadas aos
movimentos de renovação da nossa década pensando num genuíno
avivamento no terceiro milênio, que inclua o compromisso social?
Pelo menos, dez marcas do avivamento wesleyano podem
servir de modelos para os metodistas brasileiros e mesmo de outras
denominações.
7.2.1 O genuíno Avivamento leva ao Evangelho integral e nãotrata só da “alma” ou só do corpo
1091 LOCKMANN, Paulo Tarso de Oliveira. “Compromisso com Deus e com o povo” emExpositor Cristão, outubro de 2000, p.24.1092 Ibidem.
CCCXXXI
“Às onze horas, preguei em Winchester, onde seacham quatro mil franceses presos. Fiquei satisfeito emsaber que eles têm bastante comida, e são bemtratados.”1093
João Wesley
O avivamento genuíno proporciona a prática do Evangelho
integral e não deve se caracterizar somente em algumas ênfases
espiritualistas, como curas, visões, dons espirituais, etc.
Vida devocional com Deus deve andar junto com solidariedade
aos marginalizados. O avivamento genuíno trará a consciência das
injustiças e da situação dos oprimidos. E mais do que isso: levará a
uma prática de solidariedade. O amor será a base, a motivação para
lutar pelos menos favorecidos, exatamente como Wesley entendia a
razão de ser do avivamento em seu tempo.
Richard Heitzenhater afirma:
“Em Oxford, no começo da década de 1730, osmetodistas (universitários em sua maioria) haviamcoletado dinheiro e outras coisas para os pobres dacidade. À medida que o reavivamento metodista seespalhava pelos subúrbios pobres das cidadesinglesas, no começo da década de 1740, as novassociedades metodistas começaram a ficar cheias demineiros, criados e muitas outras pessoas da classetrabalhadora que viviam nos limites da miséria, senãoem calamidade.”1094
1093 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 182.1094 HEITZENHATER, Richard P., p. 127.
CCCXXXII
O genuíno avivamento tem uma mão estendida aos céus
clamando pela graça e poder de Deus, bem como tem a outra mão
estendida aos necessitados, como resultado do amor de Deus em
nossos corações.
Os metodistas exerciam o ministério da misericórdia:
“(...) educando as crianças nos albergues, levandoalimento aos necessitados, fornecendo lã e outrosmateriais com as quais as pessoas pudessem fazerroupas e outras coisas duráveis para usar e vender.”1095
Por outro lado, Wesley registrou em seu diário momentos
devocionais, o que eram freqüentes entre os metodistas:
“Hoje foi observado como dia de jejum e oração;oramos por avivamento no trabalho do Senhor. Muitosassistiram ao culto às cinco horas, às nove e às treze,mas em muito maior número assistiram ao de vigília;desta feita Deus tocou o coração do povo, e até ocoração daqueles que estavam mortos no pecado.”1096
A grande ênfase de Wesley foi a prática das Obras de
Misericórdia e Atos de Piedade.
7.2.2. O Avivamento proporciona consciência crítica e rejeita o
fanatismo
“Estais também no mesmo perigo se desprezais ainteligência, a sabedoria e o conhecimento humano;
1095 Ibidem, p. 125.1096 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.199.
CCCXXXIII
cada um dos quais é um excelente dom de Deus epode servir para os mais nobres fins.”1097
João Wesley
O avivamento genuíno não leva à alienação numa ênfase fora da
realidade do mundo e, sim, cria uma consciência crítica.
Tanto que para Wesley o alvo do movimento era:
“(...) reformar a nação...e espalhar a santidadebíblica sobre a terra (...).”1098
Quando em uma de suas sociedades, Wesley observou que
algumas pessoas gritaram durante a pregação, alguns caíram no chão
perdendo as forças quando escutavam a Palavra de Deus. Para
Wesley:
“Esses sintomas não os posso atribuir a causanatural senão ao Espírito de Deus. Não duvido que eraSatanás que os rasgava quando eles iam a Cristo; daíos gritos pelos quais pudessem desacreditar a obra deDeus, e espantar o povo para que não escutasseaquela palavra que lhe podia salvar a alma.”1099
Quando havia prática contrária ao ensinamento bíblico, Wesley
não deixava de orientar ou até repreender aos que agiam assim,
mesmo sendo pregadores, como aconteceu com George Bell, que
marcou o fim do mundo para 28 de fevereiro de 1763. Ele acabou
1097 WESLEY, João. Explicação Clara da perfeição Cristã. São Paulo: Imprensa Metodista,1984, p. 1091098 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 230.1099 Ibidem, p.40-1.
CCCXXXIV
deixando o metodismo, juntamente com Maxfield. Wesley chegou a
mandar Bell parar de falar em línguas.1100
Em 1743, Wesley refutou mais uma vez seus críticos.
“Wesley publicou Na Earnet Appel to Men ofReason and Religion (um sério apelo aos homens derazão e religião).”1101
A história recente registra o suicídio coletivo de diversas
pessoas pertencentes a algumas seitas resultado de um grande
fanatismo: Templo do Povo, Guiana, 912 mortos (1978); Grande
Sacerdote, Filipinas, 60 mortos (1985); Igreja Amigos da Verdade,
Japão, 7 mortos (1986); "deusa" Park Soon-Ja, Coréia do Sul, 32
mortos (1987); Seita dos Davidianos, EUA, 80 mortos (1993); Ordem
do Templo Solar, Canadá, 5 mortos (1994); Ordem do Templo Solar,
Suiça, 48 mortos (1994); Ordem do Templo Solar, França, 16 mortos
(1995); Ordem do Templo Solar, Canadá, 5 mortos (1997), Porta do
Paraíso, EUA, 39 mortos (1997).1102
Wesley, por isso, dizia que a religião que não é racional é falsa.
A razão, por si só, não pode nos dar fé, virtude, esperança, salvação.
Mas ela, assistida pelo Espírito, nos faz compreender a Palavra, a
santidade, o novo nascimento , etc. A razão é um dom de Deus para a
investigação da verdade.1103
1100 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 209-0.1101 Ibidem, p.130.1102 O GLOBO. "Suicídio na passagem do cometa" em O Globo. 28 de março de 1997, 2ed, p. 20.1103 BURTNER, Robert ; CHILES, Ibidem, p. 22-8.
CCCXXXV
7.2.3. O avivamento genuíno se fundamenta na Bíblia em vezde visões e profecias
“Estais em perigo de ser vitima do fanatismo acada momento, se por menos que seja, vos afastaisdas Escrituras (...).”1104
João Wesley
O avivamento genuíno não vive sob as diretrizes de profecias e
revelações espirituais. Ele tem base bíblica. Ele está aberto às
revelações do Espírito e às novas formas de atuar, desde que tenham
base bíblica.
O psicólogo William James destaca o movimento metodista pelo
seu equilíbrio e ressalta os modelos individuais que ele estabeleceu
como típicos e dignos de imitação:
“O Metodismo segue aqui, sem dúvida, se não oequilibrado mental, pelo menos, de um modo geral, oinstinto espiritual mais profundo. Os modelos individuaisque ele estabeleceu como típicos e dígnos de imitaçãonão são apenas os mais interressantesdramaticamente, mas psicologicamente têm sido osmais completos.”1105
Em 20 de julho de 1740, Wesley cita um fato numa sociedade
em Feter-Lane, onde algumas pessoas se levantavam contrárias a
algumas doutrinas metodistas. Sua palavra foi:
1104 WESLEY, João. Explicação Clara da Perfeição Cristã, Ibidem, p. 109.1105 JAMES, William . As variedades da Experiência Religiosa. Ibidem, p. 148.
CCCXXXVI
“Eu creio que estas asserções são redondamentecontrárias à Palavra de Deus. Tenho vos admoestadoacerca destas coisas repetidas vezes, e vos tenhorogado que volteis à ´lei e ao testemunho.”´1106
Wesley escreveu Explanatory Notes Upon the New Testament
(Notas explicativas sobre o Novo Testamento), cuja primeira edição foi
publicada em 1925. No ano seguinte foi republicado com uma errata.
No ano de 1762 Wesley e Carlos terminaram um aperfeiçoamento dos
textos bíblicos e terminaram uma nova edição.
“Junto com a coleção de Sermons on SeveralOccasions (Sermões para diversas ocasiões) que Joãopublicou (quatro volumes até 1760), forneciam umabase doutrinária como direção para os pregadores.”1107
Wesley dizia:
“Seja eu o homem de um livro. De modo que estoudistante dos costumes atarefados dos homens. Eu meassento à sós: somente Deus está aqui. Em suapresença abro e leio o seu livro (...).”1108
Para resolver questões pessoais ou das sociedades, Wesley
recorria às escrituras. Em 1739, em Bath, devido a certo homem
notável no lugar, pediram a Wesley para ele não pregar. Ele pregou e
a mensagem enfatizou a Bíblia:
1106 WESLEY, João. Explicação Clara da Perfeição Cristã. Ibidem, p.38.1107 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p. 212-3.1108 BURTNER, Robert; CHILES, Ibidem, p. 16.
CCCXXXVII
“As Escrituras ensinam que todos pecaram ecarecem da glória de Deus, grandes e pequenos, ricose pobres, tanto uns como os outros.”1109
Por causa desse boato, Wesley ganhou maior número de
ouvintes.
Em 1739, em Weaver’s Hall, Wesley enfrentou os “profetas
franceses”, que desviavam membros das sociedades:
“(...) eu me esforcei para pôr a descoberto os seuserros, e exortei o povo que seguisse a santidade eevitasse tais profetas, como se evita o fogo, e todosque não falam de ‘acordo com a lei e o testemunho.”1110
Na crise na sociedade em Fetter-Lane, em 1740, em seus
argumentos Wesley disse:
“Eu creio que estas asserções são redondamentecontrárias à palavra de Deus. Tenho vos admoestadoacerca destas coisas repetidas vezes (...).” 1111
E assim Wesley agiu em toda sua vida.
7.2.4. O avivamento capacita para o testemunho cristão
“Durante a última oração dele fiquei completamentesubjugada pelo poder de Deus. Senti mudançainexplicável no fundo do meu ser, e desde aquela horanão tenho sentido ira, nem vaidade ou mau gênio: nada
1109 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 32.1110 Ibidem, p.36.1111 Ibidem, p.38.
CCCXXXVIII
que seja contra o puro amor de Deus, que sintoconstantemente”. 1112
João Wesley
Muitos dos que se tornaram pregadores eram pessoas simples,
pobres e que passavam por dificuldades, como a maior parte do povo
metodista.1113 Wesley, por isso também, procurava prepará-los. Dentro
do seu equilíbrio, João Wesley sempre perguntava aos pregadores:
“Tens os dons? Tens a graça? Tens osfrutos?” 1114
Wesley sabia que o Espírito Santo capacitava, mas ele era
muito cuidadoso com as pessoas que exerciam ministérios. Em seu
diário, em 15 de maio de 1751, ele disse:
“Realizamos pequena Conferência com trintapregadores presentes. Indaguei particularmente arespeito da sua graça, dons e fruto (...).”1115
No ano de 1775, a Conferência Anual, Wesley examinou
queixas de pessoas contra os pregadores. Elas afirmavam que alguns
não estavam qualificados para o trabalho:
“(...) não possuindo graça e dons suficientes paraexecutar.”1116
1112 Ibidem, p.87.1113 Ibidem, p.115.1114 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p.176.1115 WESLEY, João, Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 103.1116 Ibidem, p. 116.
CCCXXXIX
Contudo, após examinar com cuidado, ele viu que as queixas
não tinham fundamentos, pois disse:
“Deus tem realmente enviado seus trabalhadorespara a seara, e que os qualificou para a obra (...).”1117
Wesley combatia os exageros, mas acreditava também que o
Espírito Santo pudesse capacitar com dons sobrenaturais, apesar de
não destacá-los:
(...) “Para fortalecer e animar aqueles que crêem, epara salientar a sua obra, favoreceu diversos deles comsonhos divinos, outros com êxtase e visões” .1118
O movimento metodista deu oportunidade aos leigos e leigas de
exercerem seus ministérios. No ministério da Palavra, Thomas
Maxfield, John Nelson, James Wheatley, Thomas Walsh se
destacaram, alem de uma infinidade de outras pessoas.1119
As mulheres tiveram grande oportunidade e se destacaram no
ensino e obras sociais. Mais tarde, Mary Bosanquet convenceu a
Wesley sobre as mulheres pregarem. O argumento de Wesley aos
opositores foi:
“Todo trabalho de Deus chamado metodista erauma dispensação extraordinária da providência deDeus.”1120
1117 Ibidem.1118 Ibidem, p.134.1119 Ibidem, p. 27.1120 HEITZENHATER, Richard P., biidem, p. 248.
CCCXL
Outras mulheres também tiveram o ministério da palavra: Sarah
Crosby, Sarah Mallett, etc.1121 As mulheres também se destacaram no
Ministério de Ensino (Ana Ball) e nas obras sociais (condessa Lady
Hungtingdon). 1122
Acima de tudo, Wesley acreditava que o avivamento produzia a
santificação e as pessoas viveriam vida digna e santa diante de Deus.
Em 1751, ele registrou em seu Diário:
“O barbeiro que me barbeava disse: ‘Senhor, eulouvo a Deus por sua causa. Quando o senhor estavaem Bolton, a última vez, eu era o ébrio mais notável dacidade; fui ouvi-lo pregar, fiquei perto da janela e Deusme feriu no coração. Então orei, pedindo poder sobre omeu vício de beber, e Deus me deu mais do que eupedira, tirou-me o desejo de beber (...).1123
Para Wesley, tudo o que Deus exige é que tenhamos a fé que faz
obras impulsionadas pelo amor.1124 Uma pessoa perfeita será
testemunha de Cristo, pois não fará nada contrário ao amor, que
permanece em sua alma. Todos os seus pensamentos, palavras e
ações serão governadas pelo amor.1125
7.2.5. O avivamento impulsiona para a Ação Missionária
“(...) tanto em Nova York como na Filadélfia grandesmultidões assistem aos cultos para ouvir, e se portam
1121 Ibidem.1122 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.159-0.1123 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.88.1124 ______. Explicação clara da perfeição cristã. Ibidem, p.88.1125 Ibidem, p.53.
CCCXLI
bem, e a sociedade em cada lugar, já tem mais de cemmembros.”1126
João Wesley
Como uma cadeia, a chama do avivamento weslayano se
espalhou pela Inglaterra e outras partes do mundo.
“À medida que o reavivamento metodista seespalhava pelos subúrbios pobres das cidadesinglesas, no começo da década de 1740, as novassociedades metodistas começaram a ficar cheias demineiros, criados e muitas outras pessoas da classetrabalhadora que viviam nos limites da miséria, senãoem calamidade.”1127
Como o reavivamento se espalhou por outras partes do país,
houve a necessidade de ter casas de pregação, o que deixou Wesley
vulnerável a acusações de que estava criando uma nova seita.1128
Segundo James Richard Joy, o “Ide” de Jesus foi a primeira
ordem que veio ao Wesley despertado.1129 Ele passou a vida pregando
o Evangelho:
“As viagens de Wesley eram incessantes. Em1764, entre 19 de maio e 4 de agosto, período de 138dias, ele viajou de Bristol a Inverness na Escócia, evoltou pregando em 122 cidades, realizando 300cultos, além das reuniões das sociedades unidas.”1130
1126 ______. Trechos do Diário de João Wesley . Ibidem, p. 165.1127 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 127.1128 Ibidem, p. 141.1129 JOY, James Richard, Ibidem, p. 108.1130 Ibidem, p. 116.
CCCXLII
Wesley era todo missionário. Visitou a Escócia 20 vezes e o Pais
de Gales, 24 vezes.1131
Ele se sentia capacitado para pregar e dizia que pregação com o
poder do Espírito Santo:
“Preguei (como de costume), às cinco horas e àsquinze, com convicção e poder do Espírito.”1132
Sua orientação aos pregadores era:
“Falei com todo entusiasmo que puderdes; masnão griteis! Falai com todo o coração, mas com vozmoderada”1133
Mais tarde, Wesley dividiu o campo em circuito, para um melhor
atendimento dos pregadores às sociedades, que para lá eram
nomeados. Em 1768 haviam trinta e quatro circuitos.1134
Em 1785, Wesley falou do crescimento do metodismo em todo o
mundo:
“(...) fico pensando em como um grão de mostarda,plantado há cinqüenta anos, tem crescido. Tem-seespalhado através da Gra-Bretanha e Irlanda ; à ilha deWight, e à ilha de Man; então à América, às ilhas‘Leward’, e outra vez a todo o continente do Canadá eNewfoundland.”1135
1131 Ibidem, p.117-8.1132 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 82.1133 JOY, James Richard, Ibidem, p. 131.1134 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 234.1135 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 206.
CCCXLIII
7.2.6. O avivamento leva ao compromisso social
“Nesta época do ano, costumamos distribuir carvãoe pão entre os pobres da Sociedade.”1136
João Wesley
Os teólogos metodistas alemães Walter Klaiber e Manfred
Marquardt afirmam:
“Visto que a santificação é amor, ela énecessariamente santificação social. Por mais queWesley pareça, algumas vezes, concentrar-se naexperiência do indivíduo na vivência de suasantificação, o horizonte da santificação é o dacomunidade, o esforço pela comunhão perfeita comDeus inclui o reto relacionamento com os outroshomens.”1137
A luta de Wesley contra a escravidão foi importante para mudar o
rumo da história dos negros na Inglaterra. Em seu diário, ele registrou,
em 3 de março de 1788:
“Fui a Bristol, e tendo dois ou três dias, completeimeu sermão sobre A Conferência. Dei aviso de que, naquinta feira, pregaria sobre o assunto muito discutido –A Escravidão. Conseqüentemente a casa estavarepleta de gente, alta e baixa, rica e pobre. Pregueisobre aquela profecia antiga: ´Alargue Deus a Jafé ehabite Jafé nas tendas de Sem; e seja-lhe Canaã porservo´(Gn 9.27).”1138
1136 Ibidem, p. 112.1137 KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred , Ibidem, p. 302.1138 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 190.
CCCXLIV
Richard Heitzenhater afirma que o metodismo teve como ênfase
principal o amor:
“Esta ênfase particular em ´amar o próximo´eseguir o exemplo de Cristo (que ´andou por toda a partefazendo o bem´, Atos 10:38), continuou a caracterizar ometodismo, quando ele entrou no reavivamento.”1139
A casa dos pobres, a Escola em Kingswood, a assistência
médica aos pobres são algumas das manifestações do ministério da
misericórdia exercido pelos metodistas.1140
A sensibilidade de Wesley para com os problemas do povo era
grande e sempre ele procurava dar uma resposta urgente:
“Notando a pobreza profunda de muitos dosnossos irmãos, resolvi fazer o que podia para aliviá-los.”1141
Especialmente, os excluídos mereceram maior atenção de
Wesley, inclusive nas pregações, como em 1752:
“Preguei em Beddick a grande multidão de Coliers(mineiros de carvão).”1142
Toda essa ação levou o historiador inglês Edwards Thompson a
afirmar que o metodismo foi importante na formação de classe
operária inglesa, no século XVIII.1143
1139 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 125.1140 Ibidem, p. 166-8.1141 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 111.1142 Ibidem, p. 73.1143 No quinto capítulo da tese citamos as declarações de Edwards Thompson.
CCCXLV
7.2.7. O avivamento genuíno não é superficial, mas proporcionatransformação de vidas
“Deus derramou abundantemente seu Espíritosobre nós. Muitos ficaram cheios de consolação(...).”1144
João Wesley
O avivamento genuíno pode nos levar a ter expressões
corporais na liberdade que o Espírito traz, mas deve também moldar o
nosso caráter à semelhança de Jesus, a fim de que tenhamos o amor,
a misericórdia e a prática da justiça no nosso viver diário.
Em seu diário, Wesley cita diversas pessoas que foram
justificadas e santificadas. Uma delas, Elizabeth Longmore, em 1760,
descreveu sua experiência quando sua alma se tornou toda amor:
“Desde aquela hora, não tenho sentido meuspensamentos se desviarem de Deus. Tenho cuidadocom cada palavra que falo, com cada olhar e cadapensamento.Esquadrinho o coração constantemente, enada acho ali senão amor.”1145
Levantar as mãos no louvor e orações, dançar nos momentos de
cânticos, balançar o corpo pode acontecer com as pessoas que são
visitadas pelo Espírito ou estão tendo grande regozijo espiritual.
Acontece, contudo, mais com as pessoas extrovertidas do que com as
introvertidas. Mas não podemos medir a espiritualidade das pessoas
1144 WESLEY, João.Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p. 104.1145 Ibidem, p. 128.
CCCXLVI
somente por essas expressões. O avivamento nos leva a andar em
amor e a viver como filhos e filhas da luz.
Para falar das conseqüências do derramamento do Espírito,
Wesley dizia que as pessoas haviam sido despertadas, justificadas,
restauradas, convertidas, renovadas, etc.
Há avivamentos fabricados pelas pessoas, que não são
avivamentos e sim animação onde têm até manifestações psíquicas,
carnais e demoníacas, mas não tem mudança de caráter e nem a
ação plena do Espírito. O verdadeiro avivamento traz transformação
de vidas.
Wesley dizia:
“O dia de Pentecostes não chegou ainda na suaplenitude; mas não duvido que venha; e então vocêverá tantas pessoas santificadas como justificadas.”1146
Por isso, no Exame dos pregadores, Wesley era exigente nesses
pontos. Em 1766, ele perguntou aos pregadores:
“Você tem fé em Cristo? Você está indo em direçãoà perfeição? Você espera ser perfeito em amor nestavida? Está gemendo angustiado por ela? Você estáresolvido a devotar-se inteiramente a Deus e à suaobra?” 1147
7.2.8. O avivamento traz crescimento integral à Igreja
1146 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 130.1147 Ibidem, p.235.
CCCXLVII
“O Senhor reaviva a sua obra como no princípio.Multidões unem-se a sua Igreja todos os dias.”1148
João Wesley
O avivamento genuíno traz transformação de vidas e
consequentemente crescimento numérico.
A partir de 1739, Wesley viu e experimentou um grande derramar
do Espírito no meio do povo. Estiveram presentes em suas pregações
milhares de pessoas: Blackheath (12.0000); Moorfields (20.000);
Gloucester (7.0000); Parque de Kensington (20.000).1149
Aos poucos o metodismo se espalhou para outros povos e
países. O trabalho em Dublin, Irlanda, começou em 1747 comm os
pregadores Jonathan Reeves e John Trembath.1150 Foi assim, em
1759 com Natanael Gilbert, que iniciou o metodismo nas Antilhas.1151
Nas pregações de João Wesley, na Inglaterra, milhares de
pessoas iam ouvir sua Palavra. Era comum haver 10, 20 e 30 mil
pessoas em suas reuniões públicas. Algumas sociedades chegavam a
mais de 1 mil membros. Havia uma média, por volta de 1776, de um
crescimento de 1600 membros por ano.1152
1148 LELIÈVRE, Mateo., Ibidem, p.192.1149 Ibidem, p.79.1150 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.163.1151 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.205.1152 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.265.
CCCXLVIII
Quando Wesley faleceu, em 1791, o Metodismo tinha, na
Inglaterra, cerca de 300 pregadores e 71.463 membros.1153
As Festas de Amor contribuíam para que o interior das pessoas
fosse tratado e transformado. Wesley descreve em seu diário, em 10
de junho de 1780, um desses momentos:
“Então celebramos a Festa de Amor, que foi amais viva que eu jamais vira em muitos anos. Muitosfalaram, e com grande fervor e muita simplicidade;portanto, quase todos os presentes deram louvores aDeus pela consolação que lhe trouxe.”1154
As classes permitiam as pessoas que desejam participar do
movimento metodista de crescerem na fé e no conhecimento. Haviam
quatro tipos de classe:
“Sociedades unidas (unidet societies), pequenascompanhias (bands), sociedades seletas (selectsocieties) e arrependidos (penintents). As sociedadesunidas ( as mais numerosas de todas) compunham-sede todas as pessoas que tinham sido revivificadas;aqueles que professam ter recebido o perdão de seuspecados deviam reunir-se em pequenas companhias(bands); os membros destas últimas que persistiam emandar na luz do Senhor constituiriam as sociedadesseletas; e, finalmente, as pessoas pertencentes àssociedades unidas que permanecessem com suasculpas formariam um grupo à parte, chamados osarrependidos”1155
1153 Ibidem, p. 306.1154 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem,107.1155 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.141.
CCCXLIX
A preocupação de Wesley era que os metodistas crescessem
em número, sim, alcançando os miseráveis, que eram excluídos da
sociedade, mas que estes uma vez justificados crescessem também
em qualidade.
7.2.9. O avivamento traz o derramar do amor de Deus
“Deus restaurou o homem à luz da sua face, e deuà moça a convocação clara do seu amor”1156
João Wesley
Geralmente, as pessoas esperam receber do avivamento o
poder do Espírito acompanhado dos dons espirituais. Mas a
manifestação do amor de Deus está presente no genuíno avivamento.
Foi assim na Inglaterra com os metodistas. No seu diário,
Wesley registrou:
“Depois do sermão, tivemos uma Festa de Amor.Foi hora deliciosa. Deus derramou abundantementeseu Espírito sobre nós. Muitos ficaram cheios deconsolação (...). Deus restaurou o homem à luz da suaface, e deu à moça a convicção clara do seu amor; e detal maneira extraordinária, que parecia que toda a suaalma era amor.” 1157
Essas experiências eram constantes e não casuais. Em 1749,
ele registrou:
1156 WESLEY, João. Trechos do Diário de João Wesley, Ibidem, p.105.1157 Ibem, p.105.
CCCL
“Na reunião da sociedade de S., uma chama deamor se manifestou de tal maneira como nunca se tinhavisto antes.”1158
As diversas experiências religiosas registradas em seu diário
sempre ressaltam o amor de Deus. Em 1765, a jovem Grace Paddy
disse:
“Senti mudança inexplicável no fundo do meu ser,e desde aquela hora não tenho sentido ira, nemvaidade ou mau gênio: nada que seja contra o puroamor de Deus que sinto constantemente.” 1159
Em suas explicações, Wesley via a certeza de que sua ênfase
na perfeição:
“Observo que o espírito e a experiência destes doiscorrem paralelamente. Comunhão constante com Deuso Pai e o Filho enche-lhes o coração com humildadeamor. Agora isto é o que sempre tenho e ensino arespeito da perfeição.”1160
7.2.10. O avivamento proporciona mudança na sociedade
“(...) o metodismo foi indiretamente responsável porum aumento na autoconfiança e capacidade deorganização do operariado.”1161
Edward Thompson
1158 Idem, p.97.1159 Ibidem, p.87.1160 Ibidem, p.128.1161 THOMPSON, Edward P., Ibidem, 2 v., p.42.
CCCLI
Na década de sessenta, quando o metodismo estava com fraco
crescimento e com suas crises, William R.Read escreveu o livro New
Patterns of Church Growth in Brazil (Fermento Religioso nas Massas
do Brasil). Ele elogiou o crescimento das Igrejas Evangélicas e
comentou que não entendia o que estava acontecendo com a Igreja
Metodista no Brasil, mas disse com todo o seu conhecimento de
historiador:
“(...) creio que nela vai arder novamente o fogodivino, que há de varrer toda a sociedade.” 1162
Passados mais de trinta anos, o metodismo brasileiro está mais
próximo de realizar esta afirmação de William R. Read. Um
avivamento, como no metodismo primitivo, que alcançou a classe
marginalizada da sociedade e se preocupou com as questões sérias,
na Inglaterra, como as crianças, desempregados e presos.
“O nível social da população operária elevava-serapidamente; os mineiros transformaram-se empessoas de bem. Quando viajava pelo norte e observouas casas de Weardale, graciosamente cercadas delindos jardins, onde se respiravam o conforto e a paz,Wesley não deixava de dizer: ‘três entre quatro casa outalvez nove entre dez foram construídas depois de oMetodismo aparecer nessas paisagens.”1163
1162 READ, William R. Fermento Religioso nas Massas do Brasil. Livraria Cristã UnidaLtda, 1976, p.191.1163 LILIÈVRE, Mateo, op. cit, p.269.
CCCLII
O metodismo fez diferença na sociedade na questão de sua luta
contra a escravidão.
“Quando Wesley denunciou ao seu país o crime daescravidão, a consciência pública ainda não estavaacordada para esse assunto e os próprios cristãos nãotinham refletido sobre sua gravidade. Whitefield, aomorrer quatro anos antes, deixara numerosos escravosem suas fazendas na Geórgia, e os doara em seufalecimento à Lady Huntingdon.”1164
Para Nelson Luiz Campos Leite, o metodismo e as Igrejas em
geral carecem de um genuíno avivamento:
“(...) carecemos de um genuíno avivamento emnosso meio. Um avivamento bíblico, cristocêntrico,movido pelo Espírito, pleno de dons e ministérios,compromissado com as pessoas e a sociedade,missionário e que visa a transformação da pessoa, dafamília e das estruturas da sociedade. O Espírito há derealizar em nós uma obra conforme a perspectiva de Ez36.24-28.” 1165
Este é o avivamento que o metodismo precisa experimentar hoje.
1164 Ibidem, p.283.1165 LEITE, Nelson Luiz Campos. "Editorial" em Expositor Cristão. Janeiro de 1997, p.2
CCCLIII
Anexo
Líderes e coadjuvantes do metodismo
Segundo Heitzenhater, havia uma fermentação do Espírito
Santo no mundo 1166 quando Wesley e o povo chamado metodista se
despertaram para reformar a Igreja, a Nação e espalhar a santidade
bíblica sobre a terra, especialmente, a partir de 1738. Essa ação do
Espírito Santo ocorreu em diversos lugares e na vida de diversas
pessoas.
1166 Ibidem, p.97.
CCCLIV
Para completar, a partir de 1738, João Wesley teve uma forte
experiência espiritual e viu acontecer um grande avivamento na
Inglaterra.1167
Diversas pessoas atuaram como coadjuvantes para realizar
uma grande mudança nos corações do povo e na estrutura da
sociedade, na Inglaterra e na América, no século XVIII, entre eles,
William Morgan, Carlos Wesley, Francis Asbury, Thomas Coke, Pedro
Bohler e tantos outros .
“(...) Wesley cria firmemente que, para atender auma situação crítica na Inglaterra, o próprio Deushavia levantado a um ministério extraordinário, a saber,pregadores sem preparo teológico formal, semdiploma.”1168
Carlos Wesley chegou a dizer que via:
“(...) tudo ao nosso redor em surpreendentefermentação. Com certeza o cristianismo está mais umavez levantando a cabeça.” 1169
Além do grande líder que foi João Wesley, outras pessoas
também contribuíram para o avivamento metodista, entre eles:
1. George Whitefield
1167 Ibidem, p.801168 REILY, Duncan Alexander. “João Wesley e o Espírito Santo” em História MetodismoLibertações, [s.ed], [s.d], cp.cit, p.20.1169 Ibidem, p. 75.
CCCLV
Whitefield nasceu em Gloucester, Inglaterra, no dia
16/12/1714.1170 Seus pais eram zeladores da Estalagem do Sino.
Muito cedo Whitefield ficou órfão de pai. Teve as suas tentações e
pecados da mocidade. 1171
O Clube Santo o ajudou no propósito de ter uma vida santa. Sua
experiência com Deus foi em 1735, antes dos irmãos Wesley.1172João
Wesley o orientou sobre a justificação pela fé. Ele foi ordenado pastor
anglicano1173 pelo Bispo Benson, no dia 20/06/1736.1174 Uma semana
depois, pregou seu primeiro sermão e cerca de 15 pessoas teriam
ficado loucas depois da Palavra.1175
Verdade ou não, o fato é que as mensagens de Whitefield
levavam o povo a ter manifestações físicas:
“ (...) foram freqüentes notáveis manifestações defenômenos físicos. Homens e mulheres choravam,desmaiavam, tinham convulsões.”1176
Qual era o conteúdo de sua mensagem e como era a sua forma
de pregar?
“Sua mensagem era o Evangelho da graçaperdoadora de Deus, da paz alcançada pela aceitaçãode Cristo pela fé e da conseqüente vida de alegreserviço (...). Dramático, patético, insinuante, possuidor
1170 JONES, D.M.Lloyd, Ibidem, p.113.1171 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 206.1172 Ibidem, p. 206.1173 Ibidem., p. 206.1174 JONES, D.M.Lloyd, Ibidem, p.122.1175 Ibidem.1176WALKER, Welliston, Ibidem, p. 210.
CCCLVI
de voz maravilhosamente expressiva, os auditórios dedois continentes diante dele se fundiam como cera.” 1177
Whitefield atraia multidões, uma média de 20 mil pessoas. Ele
levou os irmãos Wesley a terem gosto pela pregação no "campo.” Foi
o primeiro a construir uma obra social, a Kingswood School.1178 Na
América construiu também um orfanato na Geórgia. 1179
Ele era de origem humilde e teve uma intensa vida de oração.
Suas mensagens continham estes temas: "o pecado original"; "a
regeneração"; "a justificação pela fé". Foi para a América, a partir de
agosto de 1739, e teve participação importante no chamado "Primeiro
Grande Despertamento" junto com Jonathan Edwards. Até Benjamim
Franklin gostava de ouvi-lo pregar.1180 As pessoas se reuniam para
ouvir alguém ler os seus sermões.
No século XVIII, nenhum inglês pregou com tanto poder. Suas
pregações eram acompanhadas de comoção espiritual. Sem espírito
denominacional, pregava para todas Igrejas. Marcantes foram suas
pregações em Kingswood, Inglaterra, bairro habitado exclusivamente
por mineiros.1181
1177 Ibidem, p. 207.1178 JONES, D.M.Lloyd, Ibidem, p.cit, p.120.1178 WALKER, Welliston, Ibidem, p.107.1179 LELÉVRE, Mateo, Ibidem, p. 76.1180 BARBIERI, Sante Uberto. Estranha Estirpe de Audazes., Ibidem, p.77.1181 Em 1739, sua segunda visita teve 2000 ouvintes e entre 4000 e 5000 na terceira visitae essas cifras não demoraram em chegar a 10.000 e 20.000 pessoas ouvindo seusentusiasmados sermões (HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.77).
CCCLVII
George Whitefield esteve sete vezes na América: 1738, 1740,
1744-1748, 1751-1752, 1754-1755, 1763-1765 e 1769-1770.1182
Ele tinha sua crença particular sobre a ação do Espírito Santo:
“Cria nas impressões internas, diretas, imediatasfeitas pelo Espírito Santo.”1183
Até Jonathan Edwards o censurou por isso, mas ele não o
ouvia.1184 Ele acreditava que o Espírito Santo lhe falava pessoalmente.
Ele se consumiu pregando o Evangelho. Após um dia intenso de
pregação e atendimento a diversas pessoas, já com a saúde
debilitada, Whitefild faleceu no dia 30/09/1770 aos 55 anos de idade.
Ele havia convidado Wesley para pregar no ofício fúnebre.1185
2. Howell Harris
Harris nasceu em Travecca, no País de Gales,1186 em 1714, e
faleceu em 1773. Ele era professor e num culto anglicano na paróquia
de Talgarth, no dia 25 de maio de 1735, sentiu todo o seu pecado.
Após uma luta intensa, encontrou a paz ao entregar-se totalmente a
Jesus.
1182 LILIÈVRE, Mateo, Ibidem.p. 76.1183 JONES, D.M.Lloyd, Ibidem, p.1301184 Ibidem, p.130.1185 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 207.1186 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.88
CCCLVIII
Três semanas depois, no dia de Pentecostes - 18 de junho - ele
estava orando na torre de Liangasty e teve nova experiência.1187 A
partir daí passou a ser um inflamado pregador.
“O reavivamento em Gales começou comseriedade em meados da década de 1730 com aconversão de Howell Harris e Daniel Rowland.”1188
Harris começou visitando os presos. Depois passou a pregar ao
ar livre. Com as conversões, passou a estabelecer as Sociedades.1189Ele dizia que os ministros de Gales não pregavam a verdade. Ele
foi perseguido e foi expulso da sua escola. Ele clamou pelo
avivamento.
Nas visitas aos doentes, a palavra de Harris era acompanhada
de tanto poder que muitos ali clamavam a Deus pelo perdão dos
pecados.1190 Herris era sensível ao Espírito Santo.1191
Foi amigo de Whitefield e dos irmãos Wesley, com os quais fez
alianças. Por isso, ele freqüentou as Conferências Anuais do
metodismo.1192
Em 1742, ele procurou fazer uma Associação com todas as
Sociedades de Gales. Whitefield ficou como dirigente. Em 1748,
Wesley participou com ele e Whitefield de uma conferência da
1187 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.292.1188 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.97.1189 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.293.1190 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.301.1191 JONES, D.M. Lloyd.Ibidem, p.300.1192 Ibidem, p. 208.
CCCLIX
Associação de Gales. Wesley queria a união dos diversos ramos do
avivamento. Harris não apenas concordou com diversas regras
visando a união. Ele também participou das Conferências wesleyanas
durante três anos.1193
Eles estavam dispostos a não falarem mal um do outro e
procuraram ter entendimento sobre justificação, predestinação e
perfeição. Mas foi um "acordo inútil", como disse Carlos Wesley. O
assunto ficou sobre a mesa.1194
Em algumas ocasiões, Harris deu um grande apoio a Wesley.
Quando Wesley estava sendo pressionado para nomear pregadores, o
que seria um rompimento com a Igreja Anglicana, os Wesley tiveram o
apoio de Howell Harris (que participou dessa conferência a convite de
Carlos Wesley) e mantiveram firme sua posição à ordenação e à
opinião de que seria ilegal que leigos ministrassem os sacramentos
nas sociedades metodistas.1195
Na Conferência de 1763, havia uma grande insatisfação dos
pregadores em relação ao rígido controle de Wesley. A saída de
Maxfield havia criado um fermento entre os pregadores. Mas Howell
Harris reprimiu os descontentes ao dizer:
1193HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.171.1194 Ibidem, p.171-2.1195 Ibidem, p.208.
CCCLX
“Se o sr. Wesley alguma vez abusar do seu poder,quem chorará por ele se seus próprios filhos não ofizerem.”1196
O efeito foi espantoso sobre os pregadores, que começaram a
chorar e o assunto foi encerrado:
“Essas simples palavras tiveram um espantosoefeito sobre os pregadores, que ´estavam chorando, portodos os lados, e desistiram inteiramente doassunto.”1197
Harris ficou sete anos de cama, pelo desgaste nas pregações.
No seu enterro, mais de 20 mil pessoas estiveram presentes como
gratidão e admiração. Houve nove sermões.
“Especialmente, quando foi ministrada a Ceia doSenhor, Deus derramou abundantemente o SeuEspírito de maneira maravilhosa.”1198
3. Jonathan Edwards
Jonathan Edwards (1703-1758) era congregacional e não
participou diretamente com Wesley do movimento metodista na
Inglaterra. Mas teve em Whitefield um grande aliado no chamado
"Primeiro Grande Despertamento".1199
1196 Ibidem, p.211.1197 Ibidem.1198 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.308.1199 ALLEN, William E. História dos avivamentos religiosos. Casa Publicadora Batista,1958, p.22. O chamado também Grande Despertamento foi “o movimento de maiorinfluência e o mais transformador na vida religiosa da América no século décimo oitavo(...) teve muitas fases e se estendeu por mais de cinqüenta anos (...) Começou odespertamento em 1726, em Raritan Valley, Nova Jersey nos meios reformados
CCCLXI
Além disso, Wesley viu neste avivamento um modelo para o
metodismo, a partir dos relatos que leu em 10 de outubro de 1738.1200
“Lendo os relatos de Edwards sobre a obra deDeus na Nova Inglaterra, ele pôde perceber as novaspossibilidades da ação divina entre o povo.”1201
Jonathan Edwards se tormou pastor em 1727. Mais tarde, foi ser
assistente do seu avô Salomão Stoddard, em Northampton (1643-
1729), na América. Com a morte do seu avô, ele pastoreou a igreja
Congregacional até 1750.1202
Preocupado com a vida espiritual da Igreja, no final de 1734,
buscou em oração um avivamento. Ele mesmo descreve como
aconteceu:
“Foi nos últimos dias de dezembro que o Espírito deDeus começou a estabelecer-se extraordinariamente ea operar maravilhosamente entre nós.”1203
Mas foi na primavera de 1735 que houve um constante
derramamento do Espírito, como Jonathan Edwards gostava de dizer:
“O avivamento se espalhou pelas cidades vizinhas,atingindo puritanos e presbiterianos tradicionais.”1204
holandeses, sob a direção de Teodoro J.Frelinghuysen (1691-1748). (WALKER, Welliston,Ibidem, p.216)”.1200 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 85.1201 Ibidem, p.91.1202 WALKER, Welliston, Ibidem, p.219-0.1203 EDWARDS, Jonathan. O poder de Deus na vida de Jonathan Edwards. Portugal:
Edições de Espada do Senhor, 1978, p.19.
CCCLXII
A partir de 1740, Whitefield participou diretamente do
avivamento, inclusive, morando na casa de Jonathan Edwards. Até
1760, cerca de 25 a 50 mil pessoas se converteram. Foram criadas
cerca de 150 igrejas. Começou também o interesse missionário pelos
índios.1205
Um dos seus escritos – Narração de conversões surpreendentes
– influenciou a Wesley, em 1738:
“No dia 10 de outubro, ele leu a ´surpreendente´narrativa de Jonathan Edwards acerca das conversõesna Nova Inglaterra. Nesta obra ele pôde ver claramentea influência do espírito Santo nos reavivamentos naNova Inglaterra. Esta leitura confirmou, para ele, osignificado da dinâmica espiritual nessa narrativa e adimensão pneumatológica na explicação teológica dela;isso estabeleceu a base para sua compreensão domovimento do Espírito entre o povo.”1206
Em 1745, ele também resumiu e publicou um panfleto sobre as
obras de Jonathan Edwards.1207 Eles ainda tinham em comum o fato
de terem nascido no mesmo ano.
Ele foi considerado um filósofo,1208 teólogo1209 e grande
pregador. Entre os livros que escreveu, estão: Tratado a Respeito das
1204 MENDONÇA, Antônio Gouvêa. O Celeste Porvir. Edições Paulinas, 1984, p. 49.1205 Ibidem.1206 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 85-6.1207 Ibidem, p.155.1208 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem p.358.1209 Ibidem, p.366.
CCCLXIII
Emoções (1746); Tratado sobre a Vontade (1754); A natureza da
Verdadeira Virtude (1765).1210
Era líder em reavivamento1211 e pregava sobre o pecado original,
justificação pela fé, a história da obra de redenção, etc. Jonathan
Edwards era um Puritano.1212 Sua teologia tinha como base a clássica
ênfase calvinista na soberania de Deus e na predestinação.1213
Ele acreditava numa direta e imediata influência do Espírito, e
numa conversão súbita e dramática.1214 Contudo, em 1750, sua igreja
local o despediu ao derrotá-lo por 230 a 23 votos.1215 Ele foi para
Stockbridge onde se tornou missionário entre os índios e procurou
defender o calvinismo contra o arminianismo. Ele teve oportunidade de
escrever seu famoso Tratado sobre a Vontade, em 1754:
“(...) sustentou que ainda que todos os homenstenham capacidade natural para sevoltarem para Deus,falta-lhes habilidade moral – isto é, inclinação – para.”1216
Jonatham acreditava na evidência sobrenatural do poder de
Deus, mas também sabia dos perigos dos impulsos tendo, por isso,
criticado Whitefield.1217
1210 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 220.1211 Ibidem, p.220.1212JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.356-7,1213 WALKER, Welliston, Ibidem, p.220.1214 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.356.1215 Ibidem, p.355.1216 WALKER, Welliston, Ibidem, p. 220.1217 JONES, D.M. Lloyd, Ibidem, p.368-9.
CCCLXIV
Chamado a ocupar a presidência de Princeton, ao tomar uma
vacina contra a varíola, em 1758, Jonathan veio a falecer.1218
4. Conde Zinzendorf
O Conde Nicolau von Zinzendorf nasceu em Dresden, no dia 26
de maio de 1700. Seu pai era um alto oficial da Corte eleitoral da
Saxônia. Seu pai morreu cedo e a mãe se casou de novo. Ele foi
criado pela avó, a baronesa pietista Henrietta Catarina von
Gersdorf.1219 Desde jovem foi marcado pela sua vida religiosa:
“Apaixonada devoção pessoal a Cristo.”1220
Zinzendorf acolheu em seu patrimônio localizado na Alemanha,
os seguidores de Huss, Calvino, Lutero e outros reformadores, que
estavam sendo perseguidos. Com uma parte deles tinha vindo da
Morávia ficaram conhecidos como moravianos.1221
Eles estavam divididos e procuraram orar ao Senhor. No dia
cinco de agosto de 1727 fizeram uma Aliança Fraternal. Passaram a
enfatizar os pontos em que concordavam:
“Neste dia o Conde fez uma aliança com o Senhor.Os irmãos prometeram, um por um, que seriamverdadeiros seguidores do Salvador (...).”1222
1218 WALKER, Weliiston, Ibidem,p.221.1219 Ibidem, p.197.1220 Ibidem.1221 Ibidem, p.198.1222 WALKER, John, Ibidem, p.2.
CCCLXV
No dia 13 de agosto de 1727, enquanto oravam e participam da
Ceia do Senhor algo aconteceu:
“O poder e a benção de Deus vieram de forma tãopoderosa sobre o grupo inteiro que tanto o pastor comoo povo caíram juntos no pó diante de Deus, e nesseestado de mente continuaram até a meia-noite,tomados em oração e cântico, choro e súplicas.”1223
Em 1727, o Conde Zinzendorf se tornou Bispo Morávio. Os
quatro anos seguintes foram de constantes avivamentos. Fizeram um
pacto de oração contínua que durou cem anos.1224 Num período de 25
anos missionários foram enviados a diversas partes do mundo.
Wesley fez a seguinte tradução do texto do Conde Zinzendorf:
Coleção de Salmos e Hinos, que revela a imagem do calor positivo
que a teologia morávia havia fixado como alvo de sua busca espiritual:
“Oh, brilha em meu peito gelado”;Inspira meu coração com o sagrado calor.”1225
Wesley foi a Alemanha conhecer o Conde e o trabalho dos
moravianos. Retirou lições positivas e negativas. Ele viu divergências
no ensino de Pedro Bohler e Zinzendorf. Ele observou a organização
morávia e retirou a idéia da localização geográfica das classes. Mas a
partir daí passou a ter um constante conflito com eles, especialmente,
na questão da "quietude" e os "graus de fé".1226
1223 Ibidem.1224 Ibidem, p.4.1225 HEITZENHATER, Richard P. , Ibidem, p. 73.
CCCLXVI
Acabou havendo divisão na Sociedade de Fetter Lane por causa
de questões doutrinárias com os moravianos.1227 Alguns problemas
continuaram existindo em algumas sociedades por causa da influência
morávia.
“Embora João houvesse se separado dosmoravianos há uns três ou quatro anos, e embora ainfluência antinomiana continuasse a contaminar associedades, ele não podia deixar de apreciar a profundapiedade que caracterizava muito dos irmãos.”1228
Os moravianos deram a Wesley os primeiros ensinamentos e
exemplo de uma vida de fé e de submissão plena a Jesus.
5. John Fletcher
João Guilherme de La Flechére ou João Fletcher nasceu em
Nyon, Suíça, em 12 de setembro de 1729. Descendia de uma família
francesa e estudou na Universidade de Genebra. Por questões de
consciência não se tornou pastor da Igreja Reformada, por causa do
credo calvinista. Foi para a carreira militar. Depois desistiu e foi para a
Inglaterra.1229
1226 Ibidem, p.82-4.1227 Ibidem, p.112.1228 Ibidem, p.154. A separação ocorreu em 1740. Fetter Lane foi um marco na posiçãocontrária aos moravianos. Em 1745, Wesley expurgou os escritos de Zinzendorf de trêsgrandes erros: salvação universal, antinomianismo e quietismo (HEITZENHATER,Richard P., Ibidem, p.153).1229BARBIERI, Sante Uberto. Estranha estirpe de Audazes. São Paulo: ImprensaMetodista, p. 93.
CCCLXVII
“Durante uma de suas permanências em Londrespôde entrar em contato com os metodistas e renasceu-lhe o zelo religioso (...).”1230
Wesley o aconselhou a se ordenar na Igreja Anglicana. Logo
percebeu que as pessoas não demonstravam interesses pela vida
espiritual. Viu a abundância do comercio de bebidas. Tornou-se
pároco de Madeley. 1231
“Não era homem de alta eloquência, mas imprimiatal espirito de piedade e tal sentimento de candura noque dizia, que suas palavras chegavam fundo nocoração dos ouvintes.” 1232
Sua saúde nunca foi boa. Cuidava dos pobres. Ficou conhecido
em toda a Inglaterra como “o vigário de Madeley” Apesar de ser
anglicano, nunca perdeu o fervor metodista. 1233
“Wesley sentiu muito que ele resistisse em aceitar oconvite para substituí-lo no caso de vir a faltar. E pordois motivos não aceitou: por sua má saúde e por suamodéstia.” 1234
Em 1781, casou-se com Maria Bosanquet, que havia sido
excelente cooperadora de Wesley, uma das poucas mulheres que ele
permitia dirigir a palavra em reuniões metodistas. 1235
1230 Ibidem.1231 Ibidem, p.94.1232 Ibidem.1233 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p.96.1234BARBIERI, Sante Uberto. Estranha estirpe de Audazes., Ibidem, p.94.1235 Ibidem, p.97.
CCCLXVIII
Quando Lady Huntingdon deixou o metodismo por ser favorável
à predestinação, ele convidou Fletcher para ser presidente do colégio
Trevecca, ele ficou no cargo por dois anos, mas depois deixou. 1236
No ministério de governo da Igreja, John Fletcher se destacou.
Em momentos cruciais do movimento, ele defendeu Wesley em
questões doutrinárias. Ele era seu assistente e considerado o apóstolo
João do metodismo.1237
Wesley foi atacado por Walter Shirley, em 1771, um clérigo que
havia sido aliado de Wesley:
“O suporte principal da defesa de Wesley foi JohnFletcher, que havia se demitido da presidência docolégio de Lady Huntingdon em Trevecca, no inicio doano e cuja Vindication of the Rev. Mr. Wesley LastMinutes (Defesa das Ultimas Minutes do Rev. Sr.Wesley), publicada por Wesley logo após a Conferênciade 1771, foi o tiro inicial de uma longa série de rajadascontra os calvinistas” .1238
João Guilherme de La Flechére era a pessoa cuja combinação
de conhecimento e piedade vital se encaixava no modelo que Wesley
tinha em mente para substituí-lo.. Ele escreveu a Fletcher em janeiro
de 1773, perguntando quem está capacitado para presidir o trabalho.
Wesley fez uma extensa descrição do líder perfeito e, depois,
perguntou se Deus havia providenciado alguém qualificado:
1236 Ibidem, p.101.1237 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p.213, 257-264, 305.1238 HEITZENHATER, Richard, Ibidem, p.246-7.
CCCLXIX
“Quem é ele? Você é o homem!” 1239
Sobre ele, Wesley escreveu:
“No decurso de 80 anos, disse ele, ‘conheci muitoshomens de coração excelente e de vida perfeita; masnunca vi outro como ele; outro que se iguale emprofunda devoção para com Deus. Homem tãoimaculado como ele (...).”1240
John Fletcher foi o melhor amigo e mais hábil dos conselheiros
de Wesley. Fletcher morreu no dia 14 de agosto de 1785.1241
6. Carlos Wesley, William Morgan e outros
Na Grã-Bretanha, outras pessoas, pobres e ricas, fizeram parte
da liderança do povo chamado metodista. Uma dessas pessoas foi
Carlos Wesley, que nasceu em 18 de dezembro de 1708. 1242 Ele
escreveu mais de seis mil hinos, que eram cantados com entusiasmo
pelo povo.
Carlos Wesley teve a experiência da segurança da fé primeiro
que João Wesley:
“(...) no meio de contínuas lutas espirituaisenquanto estava doente no domingo de Pentecostes,sentiu ´uma estranha palpitação no coração´, foi capaz
1239 Ibidem, p.254.1240 Ibidem, p.305.1241BARBIERI, Sante Uberto. Estranha estirpe de Audazes, Ibidem, p.102.1242 LELIÈVRE, Mateo, Ibidem, p. 41.
CCCLXX
de dizer ´Eu creio, eu creio!´ e achou-se em paz comDeus.”1243
Carlos Wesley sempre esteve ao lado do irmão João. Apesar de
ser um tanto cético quanto aos relatos das multidões que iam às
pregações de Wesley e Whitefield, mudou de opinião, quando em 24
de junho 1739 pregou em Moorfields para uma multidão, segundo
ele, calculada em dez mil pessoas.1244
Mas a grande contribuição de Carlos foi com os hinos. Um dos
versos fala de um momento de luta que os metodistas passavam:
“Permanecei firmes em Seu grande poder,Revestidos de toda a Sua força;E tomai para armar-vos para a luta,A panóplia de Deus.” 1245
A expressão "panóplia" quer dizer a armadura utilizada por um
soldado da idade média.
Contudo, Carlos Wesley expressou, acima de tudo, o grande
amor de Deus em seus hinos. O Divino Amor, um dos seus hinos mais
conhecidos revela a influência da Teologia Pietista, diz:
“Divino amor, a todos os amores supera,Alegria do céu para a terra desce;Fixe em nós a Sua Humilde habitação;Toda a sua fiel misericórdia coroada!Jesus, toda a arte e compaixão,
1243 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.79.1244 Ibidem, p.100.1245 RIDOUT, George W. Revival Blessings or Seasons os Refreshing from the Presence
of the Lord. Pentecostal Publishing Company, Louisville, KY, p. 37.
CCCLXXI
Puro amor ilimitado da arteVisite-nos com a Sua salvação;Entre em todo trêmulo coração.
Respire, oh respire, Espírito amoroso,Em todo peito preocupado!Deixe-nos a Sua herança;Deixe-nos encontrar o descanso.”1246
As expressões "habitação", Espírito amoroso", "descanso" revela
a Teologia Pietista do coração, céu, paz interior, etc. A letra do "Divino
Amor" conclui assim:
“Leve toda a nossa propensão a pecar;Seja o Alfa e o Ômega;
O fim e o começo da fé,Fixe nossos corações à liberdade.
Venha, Todo-Poderoso, para entregar,Deixe-nos receber toda a sua vida;De repente retorne e nunca,Nunca mais deixe os Seus templos.Em Ti seremos sempre bênçãosSirva-te como o Seu anfitrião no céu,Oramos e louvamos a Ti sem cessar,Glória no Seu perfeito amor (...” 1247
Entre os outros hinos que Carlos Wesley escreveu, estão: "Vem
Espírito divino inspirar nossos corações"; "Oh! Se eu tivesse mil
línguas", etc.
Mas outras pessoas também tiveram o ministério do louvor e
música, entre eles, Guilherme Williams, que escreveu "Guia, Grande
1246 Letra de Carlos Wesley traduzida pelo rev. Antônio de Campos Gonçalves. "Hinos eCânticos" em Expositor Cristão, outubro de 1999, p. 23.1247 Ibidem.
CCCLXXII
Jeová"; Eduardo Perronet, que escreveu "Poder do nome de Jesus";
Thomas Olivers, que escreveu "Ao Deus de Abrahão louvai", etc.
William Morgan influenciou os líderes do Clube Santo para a
necessidade do exercício da solidariedade e os levou ajudar aos
presos, crianças, idosos, pobres.1248 Ele foi o grande incentivador do
trabalho beneficente da Igreja e despertou Wesley para a visita às
prisões.
No Ministério da Palavra, Thomas Maxfield, John Nelson, James
Wheatley, Thomas Walsh, Cennick1249 também se destacaram, alem
uma infinidade de outros ministros.
Várias mulheres se destacaram no ensino, obras sociais e na
pregação. 1250
“Todo trabalho de Deus chamado metodista erauma dispensação extraordinária da providência deDeus.”1251
Ainda outras mulheres se destacaram no Ministério de Ensino
(Ana Ball) e nas obras sociais (condessa Lady Hungtingdon).
“A senhorita Ana Ball, de High Wycombe, éconsiderada a fundadora da primeira Escola DominicalMetodista, no sentido exato do termo. Organizada noano de 1769, a sua Escola Dominical funcionou pormuitos anos.”1252
1248 Ibidem, p.40.1249 Ibidem, p.114.1250 Ibidem, p.247-8.1251 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p. 248.1252 REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano, Ibidem, p.159-0.
CCCLXXIII
Na liderança do movimento metodista, Thomas Coke, o primeiro
Bispo nomeado por Wesley, e Francis Asbury (1745-1816), tiveram
destacada atuação na América.1253
Obras Consultadas
1. Livros
1253 HEITZENHATER, Richard P., Ibidem, p.287.
CCCLXXIV
ALLEN, William E. História dos Avivamentos Religiosos. CasaPublicadora Batista, 1958
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