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UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SÃO CAETANO DO SUL
BACHARELADO EM DIREITO
KEVIN SEDERICK FRANÇA DA SILVA
O CONCEITO DE JUSTIÇA EM ARISTÓTELES E KANT
São Caetano do Sul
2015
2
KEVIN SEDERICK FRANÇA DA SILVA
O CONCEITO DE JUSTIÇA EM ARISTÓTELES E KANT
Monografia apresentada ao
Programa de Graduação
Bacharelada em Direito da
Universidade Municipal de São
Caetano do Sul – USCS, como
exigência final para obtenção do
título de bacharel em direito.
Orientador
Prof. Dr. Carlos Alberto Di Lorenzo
São Caetano do Sul
2015
3
KEVIN SEDERICK FRANÇA DA SILVA
O CONCEITO DE JUSTIÇA EM ARISTÓTELES E KANT
Monografia apresentada ao Programa
de Graduação Bacharelada em Direito
da Universidade Municipal de São
Caetano do Sul – USCS, como
exigência final para obtenção do título
de bacharel em direito.
Área de concentração: Filosofia do Direito
Data da defesa: 14/12/2015.
Nota: 9,0 (nove).
BANCA EXAMINADORA
Prof. Doutor Carlos Alberto Di Lorenzo
Universidade Municipal de São Caetano do Sul
Prof. Mestre Robinson Nicácio de Miranda
Universidade Municipal de São Caetano do Sul
Prof. Especialista Arthur Del Guercio
Universidade Municipal de São Caetano do Sul
4
REITOR DA UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SÃO CAETANO DO SUL – USCS
Prof. Dr. Marcos Sidnei Bassi
PRÓ-REITOR DE GRADUAÇÃO
Prof. Me. Marcos Antonio Biffi
GESTOR DO CURSO DA ESCOLA DE DIREITO
Prof. Dr. Robinson Henriques Alves
5
Dedicatória
Dedico este trabalho à minha mãe Lizete e minha irmã Shelley,
que sempre batalharam e continuam se esforçando ao máximo
para possibilitar a realização de meus sonhos e pelo amor puro
e impossível de traduzir em palavras que sentem por mim.
6
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus que me deu a vida, inteligência
e saúde necessária para eu conduzir a minha vida sem me
desviar de seus caminhos. Agradeço a minha família, ao meu
orientador e amigo Professor Doutor Carlos Alberto Di Lorenzo
por influenciar meus estudos filosóficos. Quero agradecer meu
amigo Andrew, pela sua verdadeira amizade e aos colegas
Luccas, Bernardo e Maria Izabel pelo incentivo.
7
“Creio na justiça, porque é o direito iluminado pela moral,
protegendo os bons e úteis contra os maus e nocivos, para
facilitar o multifário desenvolvimento da vida social.” – Clóvis
Beviláqua.
(Opúsculo Meu Credo Jurídico-Polítco)
8
Resumo
O presente trabalho ira tratar das reflexões elaboradas pelos filósofos
Aristóteles e Immanuel Kant sobre o problema da Justiça. O estudo tem o objetivo de
responder a indagação se o conceito de Justiça é atemporal ou variável, a depender
das condições políticas, econômicas e sociais no meio em que ela se manifesta. A
escolha dos autores foi proposital, dois filósofos que viveram em regiões, épocas e
visões de mundo distintas, no entanto, ambos se preocuparam com a análise das
relações do justo. Para o presente trabalho utilizamos material bibliográfico de juristas
e filósofos do direito consagrados, sendo quase todos professores de faculdades
jurídicas no país. O problema da Justiça também foi escolhido devido a sua
importância e íntima relação com o fenômeno jurídico, a despeito da levando-
despreocupação que muitos estudantes, juristas e até mesmo professores deixam de
lado quando estudam a aplicação das normas jurídicas estatais.
Palavras-chave: Justiça. Aristóteles. Kant. Direito. Capitalismo.
9
Abstract
The present work deals with Aristoteles and Immanuel Kant reflex reflections
about justice. This study aims to answer if the concept of justice is timeless or variable,
depending on political, economic and social conditions in the environment where it
goes on. The authors choice was intentional, two philosophers who have lived in
regions, age, and world view differents, however, both have studied the fair
relationship. This paper uses bibliographic material of jurists and philosophers
renowned. Most are professors in law faculties in the country. The issue with justice
was also chosen because of its importance and intimate relationship with the legal
phenomenon despite the leading unconcern of many students. Lawyers and some
professors even brush the issue to the side when studying the process of the legal
rules.
Keywords: Justice. Aristoteles. Kant. Right. Capitalism.
10
SUMÁRIO
1 Introdução.................................................................................................... 11
2 Aristóteles e a importância do conhecimento.......................................... 14
3 A justiça em Aristóteles.............................................................................. 16
4 O direito em Aristóteles.............................................................................. 27
5 O pensamento filosófico de Immanuel Kant............................................. 29
6 Da razão pura kantiana................................................................................ 33
7 Da razão prática kantiana............................................................................ 36
8 Do direito em Immanuel Kant...................................................................... 40
9 A influência kantiana no pensamento jurídico contemporâneo.............. 43
10 A justiça no pensamento de Kant............................................................... 50
11 A justiça na contemporaneidade................................................................ 53
12 Considerações finais................................................................................... 56
13 Referências Bibliográficas.......................................................................... 59
11
1 INTRODUÇÃO
Entendemos como de fundamental importância o estudo do pensamento já
feito sobre o fenômeno do justo. Ora, como se sabe é praticamente um consenso entre
os juristas e filósofos do direito de que o objetivo do direito é a concretização da
Justiça. Miguel Reale afirmou que a Justiça é o valor fundante do direito1. Neste
diapasão: "Em última análise, o Direito se traduz em princípios de conduta social,
tendentes a realizar a Justiça”2.
Assim, é importante que o jurista, o advogado, o juiz, o professor de direito
e todos aqueles que trabalham com os ferramentais jurídicos não devem se preocupar
apenas com o estudo e sistematização das normas jurídicas estatais, mas também se
preocupar com a justeza dos comandos legais em relação com as necessidades da
sociedade. Isso porque, como sabemos, nem sempre as normas jurídicas estatais
correspondem às aspirações da sociedade, as necessidades mais profundas. O
positivismo jurídico se levanta na sociedade contemporânea como a forma correta de
se compreender o direito, a norma é estuda pela sua forma, se obedece ao processo
legislativo quanto a sua forma prevista na Constituição. Destarte, o conteúdo dessas
regras, se as normas atendem as aspirações e ideal de Justiça de uma sociedade é
deixada de lado. Em outras palavras, a Justiça é deixada de lado para muitos juristas
que trabalham com o direito no dia a dia. Porém, para a transformação da sociedade,
ou seja, para a construção de um mundo melhor, pensar sobre a Justiça é um ótimo
passo para se denunciar os problemas e as injustiças estruturais da sociedade.
Nesta esteira, o presente trabalho tem por objetivo realizar uma análise das
reflexões sobre a Justiça feitas por Aristóteles e Kant, dois grandes marcos na filosofia
do direito ocidental. A escolha desses dois autores feita por nós não é aleatória, tem
uma razão específica. Procuraremos demonstrar neste trabalho que seus
pensamentos são distintos em relação ao fenômeno do justo. Aristóteles entende
1 REALE, Miguel. Filosofia do direito. v.1. p. 244. 2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p. 3.
12
Justiça como equidade3 que consiste em mitigar o rigor da lei para uma aplicação mais
justa para o caso sub judice e Kant como igualdade formal, isto é a isonomia4.
Para Aristóteles, filósofo da idade clássica que se debruçou a reflexões sociais
mais concretas entende que a Justiça é alcançada mediante a apreensão da natureza
das coisas, da análise dos fatos sociais, nos problemas da pólis, nos conflitos levados
a presença do pretor, sendo mutáveis flexíveis e adaptáveis as necessidades de cada
caso concreto. Em Kant, filósofo burguês iluminista do século XVIII e o grande último
filósofo da era moderna5 entende que a Justiça é construída por meio da razão
especulativa, tendo como base o imperativo categórico, sendo, portanto imutável,
inflexível a despeito de quaisquer clamores sociais dos despossuídos e explorados
pelo capital.
Com este trabalho pretendemos mostrar que a compreensão sobre a Justiça
não é atemporal, ou seja, que o conceito de Justiça varia a depender da época, local,
condições políticas, econômicas, sociais, dentre outras.
O pensamento de Aristóteles sobre o justo é de fundamental importância
para as reflexões sobre a Justiça, isso porque foi um grande sistematizador dela6. Em
Ética a Nicômaco é clássica a divisão que elabora sobre Justiça em Universal e
Particular, está se subdividindo em Comutativa, Distributiva e Reciprocidade7. Estas
classificações da Justiça serão abordadas no capítulo 3 deste trabalho
O sistema filosófico proposto por Immanuel Kant ainda exerce grande
influência na filosofia e especialmente na filosofia do direito contemporânea com o
positivismo jurídico - a reflexão que reduz o fenômeno jurídico as normas jurídicas
impostas pelo Estado -, seja em sua vertente eclética, estrita ou ética8. Esta influência
kantiana será evidenciada no decorrer do opúsculo.
3 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 21 e 80. 4 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 222. 5 Ibiden. p. 208. 6 Ibiden. p. 64. 7 Ibiden. p. 66-7. 8 Ibiden. p. 53.
13
É importante para o filósofo e para todo aquele que pretende se aprofundar
nos estudos filosóficos conhecer a tradição da história da filosofia. Por um motivo
muito simples. No caso do presente trabalho, conhecer o que os grandes filósofos do
passado pensaram sobre a Justiça permite que as reflexões sejam mais profundas.
Muito já se escreveu e pensou sobre a Justiça desde Anaximandro até os nossos dias.
Anaximandro é considerado o primeiro filósofo do direito por ter sido o primeiro
a fazer reflexões sobre o justo. Disse que: “De onde as coisas têm seu nascimento,
para lá também devem afundar-se na perdição, segundo a necessidade; pois elas
devem expiar e ser julgadas pela sua injustiça, segundo a ordem do tempo9”.
Isso não torna o pensar profundo sobre a Justiça inútil, porque conhecer o já
pensado possibilita encontrar novos caminhos e idéias para novos horizontes.10
9 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 33. 10 Ibiden. p. 4.
14
2 ARISTÓTELES E A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO.
Aristóteles (384-322 a.C.) ganhou notoriedade pelo caráter científico de seus
textos, e pela fundação de vários saberes, como a biologia e a lógica. É considerado
como o pai das ciências11.
No sentido do texto, o Professor Emérito da Faculdade de Direito de
Coimbra, Luís Cabral de Moncada, diz que:
Tudo quanto geralmente se sabe e com justiça se tem dito acerca das suas
tendências para o empirismo, para o respeito pela experiência e pela
observação, como condição e método do conhecimento, que tornaram
possível o conhecimento científico da natureza pelo homem, tem a sua
origem bem fundamentada nessa modificação por ele introduzida na Teoria
das Ideias (sic) de Platão (...) Aristóteles foi neste aspecto o verdadeiro
fundador da ciência moderna12.
Para o filósofo a importância do conhecimento é o alcance da felicidade geral,
mediante o bem-estar de todos os cidadãos. No entanto, esta felicidade só é possível
de ser alcançada se o conhecimento for usado para o bem, ou seja, fundado na ética.
A diferença dessa forma de pensar com o sistema platônico é muito grande. Em Platão
o conhecimento, por si só, possibilita o enriquecimento da alma e uma conduta ética.
Já para Aristóteles o conhecimento deve buscar a felicidade terrena e possibilitar
caminhos para escolher uma conduta dentro da ética. Destarte, para Aristóteles o
conhecimento e ética não estão umbilicalmente ligados.
O sistema filosófico aristotélico é direcionado para usar o conhecimento de
maneira prática, para os problemas do mundo fenomênico13. Para Aristóteles o
homem não quer apenas viver, mas viver bem14
11 BITTAR, Eduardo C. B; ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do direito. p. 30. 12 MONCADA, Luís Cabral de. Filosofia do direito e do estado. p. 26. 13 SACADURA ROCHA, José Manuel de. Fundamentos de filosofia do direito. p. 21. 14 REALE, Miguel. Filosofia do direito. v. 1. p. 243.
15
Aristóteles pensava que a conduta imoral deve ser evitada porque
impossibilita a felicidade terrena e não porque gera consequencias indesejadas em
outra vida, mas porque isso impediria que todos os indivíduos fossem felizes15.
Sócrates afirmava ser a violência corolário da ignorância. No entanto,
malgrado o conhecimento facilite a melhor escolha dentro dos patamares éticos,
sabemos que muitas pessoas instruídas praticam condutas imorais, até mesmo
criminosas. A despeito disso, Aristóteles considerava o conhecimento fundamental
para a construção da felicidade geral e bem estar coletivo, motivo pelo qual fundou o
Liceu, a escola em que ensinou, e diz para que os governantes criem escolas públicas,
com o escopo de possibilitar a todos que atuem optando pela ética e decência16.
Para o autor Sacadura Rocha:
Todas as classificações de Aristóteles apontam sempre para a necessidade
de se pensar o coletivo acima do particular, sem, contudo, imaginar que
interesses individuais não devam ser respeitados. Por exemplo, o Justo Total
– bem coletivo e interesse público – deve prevalecer sobre o Justo Particular
– justiça entre indivíduos e direito privado -, isto é, qualquer solução de litígio
entre as partes não pode ferir normas nem condições que dizem respeito à
conveniência da paz coletiva17.
Feito este introito, vamos analisar, agora, as reflexões de Aristóteles sobre o
fenômeno do justo, no tópico a seguir.
15 ROCHA, José Manuel de Sacadura. Fundamentos de filosofia do direito. p. 21. 16 Ibiden. p. 22. 17 Ibiden. p. 22.
16
3 A JUSTIÇA EM ARISTÓTELES
Aristóteles classifica a Justiça em dois grandes ramos. São elas a Justiça
universal e a Justiça particular. A primeira seria a Justiça observada da maneira mais
lata possível, como o ideal do justo da polis. Nesse sentido o justo universal se
confunde com o justo legal. Para Aristóteles, ao contrário dos modernos e
contemporâneos, a lei, como manifestação ética dos indivíduos, é boa. Nessa esteira,
a lei má, para o filósofo, não é uma lei. A justiça universal é a virtude que está em
todas as virtudes, como a caridade, a paciência, a compaixão, o respeito, dentre
outros. A caridade é decorrente da Justiça, assim como a paciência. Mas a caridade
não é decorrente da paciência. A Justiça é a virtude que se encontra em todas as
demais como fundamento, daí porque dizer ser a Justiça universal18.
A Justiça particular é compreendida como aquela que se manifesta nas
relações privadas entre os indivíduos. Para Aristóteles, a idéia de Justiça é
intimamente ligada com a questão de dar a cada um o que é seu segundo os seus
méritos. Pensar sobre a Justiça é pensar sobre a distribuição, de bens, cargos
públicos, ônus, obrigações, dentre outros.
A Justiça particular se divide em três espécies, que Aristóteles designa como
Justiça distributiva, Justiça comutativa e Reciprocidade, que regula casos especiais19.
A Justiça distributiva consiste em distribuir, perante todos os cidadãos da
polis, os bens, riquezas, honrarias e cargos públicos. A distribuição se verifica em no
mínimo dois sujeitos em que se era distribuir dois bens, e estabelecer qual será a
proporção de cada um. Para Aristóteles, o justo é o meio termo, o afastamento
eqüidistante entre extremos. São os excessos que Aristóteles considerava injusto.
Essa idéia de proporção não segue o rigor matemático, mas a análise de cada caso.
Se alunos de uma faculdade de direito, e crianças do ensino fundamental forem
responder as mesmas questões de uma prova, é injusto que a nota seja atribuída de
maneira igual, por razões óbvias. A análise deveria ser feita de modo diferentemente,
18 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 66-7. 19 Ibiden. p. 67-70
17
com o objetivo de nivelar a posição das crianças que estão desniveladas por suas
condições de tenra idade20.
A Justiça corretiva é mais simples de se entender. Busca fazer a reparação
de um quinhão, ou em outras palavras, de um prejuízo que alguém sofreu de modo
indevido. Se manifesta com a pena aplicada ao criminoso, a indenização paga para a
vítima de um delito civil, dentro outros. Aristóteles pondera que neste tipo de Justiça,
não se aplica a idéia de a cada um segundo os seus méritos, de maneira flexível a
depender dos fatos, não. A idéia aqui aplicada é a de proporção aritmética. Se o dano
causado for de 10 mil, então será 10 mil que deverá ser pago. Nesse tipo de Justiça,
como ficou claro, não importa as condições econômicas, intelectuais e sociais dos
pacientes da Justiça21.
A outra espécie de Justiça, distinta das anteriores que o filósofo identifica. A
reciprocidade. Tal consideração sobre o justo se manifesta nas relações de produção.
Não pode ser considerado justo que um sapato valha o mesmo que uma casa, ou que
uma caixa de tomates valha o mesmo que um cavalo. Nesse sentido, afirma
Aristóteles que o dinheiro realiza esse papel universalizante nas relações de troca,
por desempenhar um valor justo nas relações mercantis22.
Alysson Mascaro disserta que:
Tal forma de justiça, muito sensível, porque não diretamente atrelada a bens
ou a correções, mas a produção, é a ligação mais profunda já feita até então,
na filosofia do direito, entre direito e economia. Aristóteles desponta, assim,
como um crítico da justiça meramente formal ou matemática, na medida em
que é na realidade concreta da produção e da circulação dos bens e serviços
que se estabelece o padrão da reciprocidade23.
Em Ética a Nicômaco, Aristóteles argumenta que:
20 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 69. 21 Ibiden. p. 70. 22 Ibiden. p. 70-1. 23 Ibiden. p. 71.
18
[...] a justiça é a qualidade em função da qual diz-se de um homem que está
disposto a fazer por livre escolha aquilo que é justo, posto que quando está
distribuindo coisas para si e outrem, ou entre duas outras pessoas, não
concede demasiado a si mesmo e demasiado pouco ao seu semelhante do
que é desejável e demasiado pouco a si mesmo e demasiado ao seu
semelhante do que é indesejável ou prejudicial, mas a cada um o que é
proporcionalmente igual, e analogamente quando distribui entre duas outras
pessoas.24
Aristóteles entendia que a Justiça é uma virtude que sempre está
relacionado ao outro, nunca a si mesmo. Da mesma forma que, para Aristóteles, a
Justiça é uma virtude que se manifesta apenas entre iguais, os cidadãos da polis.
Portanto, como podemos perceber as mulheres, crianças, idosos,
estrangeiros e escravos não eram destinatários da Justiça. Estas pessoas não tinham
posição igual na sociedade em relação aos cidadãos, pelo contrário, eram social e
politicamente desiguais. Não tinham o poder de participar das decisões políticas, nem
decidir questões no meio familiar. Não eram cidadãos da polis grega. Nesse sentido,
todas essas pessoas estavam sobre o poder do cidadão, o chefe da família, que
poderia fazer com eles o que bem entendesse sem que fosse questionada a Justiça
da ação, porque, para Aristóteles, ninguém pode ser injusto consigo mesmo25 e como
essas pessoas dependiam do cidadão para tudo o que precisavam eram como se
pertencessem ao cidadão, como se fossem partes dele mesmo.
Alysson Leandro MASCARO preleciona que:
Aristóteles, com isso, afasta os escravos, os filhos, as mulheres, do âmbito
da aplicação do justo. São do lar, submissos ao senhor, ao pai de família, e
portanto não estão na arena dos iguais. A justiça se mede, para Aristóteles,
entre os cidadãos da pólis. Entre tais há de se falar na honra, no mérito, na
justa distribuição26.
24 Aristóteles apud CASTILHO, Ricardo. Filosofia do direito. p. 47. 25 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 72. 26 Ibiden. p. 72.
19
Aristóteles inclusive afirmou em sua obra A Política de que em um modelo de
cidade ideal os artesãos não deveriam receber jamais o título de cidadão. Dalmo
Dallari explica este pensamento aristotélico:
Isso porque a virtude política, que é a sabedoria para mandar e obedecer, só
pertence àqueles que não têm necessidade de trabalhar para viver, não
sendo possível praticar-se a virtude quando se leva a vida quando se leva a
vida de artesão ou mercenário27.
A influência aristotélica nas reflexões sobre a Justiça pode ser constatada na
idade contemporânea a título exemplificativo em nossa legislação, onde a equidade é
permitida desde que a lei a preveja28, bem como na concepção do jurista e filósofo do
direito Miguel Reale quando afirma que a Justiça é uma virtude sempre direcionada
ao outro e nunca a si mesmo, in verbis:
No entanto, ninguém poderá ser justo para consigo mesmo. A Justiça é,
sempre, um laço entre um homem e outros homens, como bem do indivíduo,
enquanto membro da sociedade e, concomitantemente, como bem do todo
coletivo.29
Entretanto, em nossa sociedade atual, capitalista, o direito é organizado de
um modo em que as regras sejam certas, conhecidas e previsíveis, de modo que o
uso da equidade é excepcional, como expressamente previsto no artigo 127 do
Código de Processo Civil pátrio.
Maria Helena Diniz ao tratar sobre a equidade, explica o momento preciso em
que ela deve ser utilizada pelo juiz:
Em caso de lacuna, o juiz deverá constatar, na própria legislação, se há
semelhanças entre fatos diferentes, fazendo juízo de valor de que esta
semelhança se sobrepõe às diferenças. E se não encontrar casos análogos,
27 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 146. 28 Alguns exemplos da autorização legislativa para o uso do corretivo da equidade se encontram no artigos 944,
parágrafo único do Código Civil, artigo 20, parágrafo quarto, do Código de Processo Civil, dentre outros. 29 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 40.
20
deve recorrer ao costume e ao princípio geral de direito, não podendo contar
com estas alternativas, é-lhe permitido, ainda, socorrer-se da equidade30.
Segundo a tradição da história da filosofia Aristóteles escreveu cerca de mil
livros, relacionados com todas as ciências de seu tempo, bem como as demais que
criou. No entanto, poucas obras de Aristóteles chegaram até o nosso tempo.31 A
despeito disso, as obras mais importantes do filósofo grego que interessam a filosofia
do direito e que temos conhecimento são Ética a Nicômaco e Política32.
José Cretella Júnior faz uma breve síntese da importância do pensamento
filosófico de Aristóteles:
Deu grande importância ao Estado e fez interessante divisão da Justiçam
classificando-a em distributiva e corretiva. Preocupou-se com a dificuldade
em aplicar a lei abstrata a todos os casos concretos, sugerindo para isso o
corretivo da equidade, que ele comparou a uma régua flexível, muito usada
nas construções da ilha de Lesbos, régua essa que poderia ser aplicada para
a medida de qualquer superfície, mesmo curva, visto que poderia amoldar-se
até às esferas, dado o material dúctil de que era feita.33
Aristóteles foi o primeiro a discriminar os poderes do Estado em legislativo,
executivo e judiciário34, ensinamentos que seriam usados e desenvolvidos
posteriormente nas reflexões do Barão de Montesquieu e John Locke.35
Foi o primeiro pensador grego a empregar o termo categoria em sentido
filosófico, identificando dez: substância ou "ousia", quantidade, qualidade, relação,
lugar, tempo, situação, condição, ação e paixão.36
Sobre a compreensão do filósofo de Estagira em relação a política e
sociabilidade do homem, Miguel Reale ensina in verbis:
30 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao código civil brasileiro interpretada. p. 133. 31 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 112. 32 MONCADA, Luís Cabral de. Filosofia do direito e do estado. p. 27-8. 33 JÚNIOR, José Cretella. Curso de filosofia do direito. p. 101. 34 ROCHA, José Manuel de Sacadura. Fundamentos de filosofia do direito. p. 23. 35 JÚNIOR, José Cretella. Curso de filosofia do direito. p. 101. 36 Ibiden. p. 102.
21
Segundo Aristóteles, é evidente que o Estado pertence ao número das coisas
que existem na natureza e que o homem é naturalmente um animal político,
destinado a viver em sociedade. O homem é, aliás, um animal sociável em
que um grau mais alto do que todos os animais que vivem reunidos. A
natureza não faz nada em vão. Ora, somente o homem é dotado do dom da
palavra, servindo a linguagem exprimir o útil e o nocivo, e, por conseguinte,
também o justo e o injusto. O que distingue o homem de maneira especial é
o discernimento do bem e do mal, do justo e do injusto, em todos os
sentimentos da mesma ordem, cuja comunicação constitui precisamente a
família do Estado.37
Ao comentar o pensamento de Aristóteles no tocante a sociabilidade do
homem como algo natural Dalmo Dallari preleciona que:
Para o filósofo grego, só um indivíduo de natureza vil ou superior ao homem
procuraria viver isolado dos outros homens sem que a isso fosse
constrangido. Quanto aos irracionais, que também vivem em permanente
associação, diz Aristóteles que eles constituem meros agrupamentos
formados pelo instinto, pois o homem, entre todos os animais, é o único que
possui a razão, o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto.38
Para compreender o pensamento político de Aristóteles é fundamental
contextualizar o tempo histórico em que viveu. A Grécia de seu tempo era uma
sociedade em que o modo de produção era escravagista39, a força do trabalho escravo
sustentava a pólis. Os senhores exerciam uma dominação direta40, bruta sobre os
escravos. Nesta sociedade apenas uma classe tinha privilégios e o poder de participar
das decisões políticas, os cidadãos41 e somente a estes era distribuída a Justiça42.
É importante que nós entendamos também que a sociedade grega antiga é
do tipo dinâmico, as guerras possibilitam que o povo vencedor submeta os vencidos
ao jugo da escravidão43.
37 REALE, Miguel. Fundamentos do direito. p. 4. 38 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 10. 39 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 20. 40 Ibiden. p. 18. 41 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 64. 42 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 20. 43 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 20-1.
22
Nessa esteira, nada impede, no entanto que o povo escravizado se levante
contra o escravizador e consiga a liberdade por intermédio da força, ou que um povo
estrangeiro ao vencer os escravizadores em uma guerra libertasse esses escravos.
Percebe-se então, pode haver épocas de senhorio e de jugo, considerando que a
escravidão não é um fato acabado e eterno44.
A ordem das coisas é muito flexível e variável. Por isso Aristóteles entender
que a escravidão é algo natural.
Aristóteles foi o primeiro filósofo que tratou o problema da cidadania de
maneira sistêmica45.
Ao tentar responder a pergunta sobre o que faz de alguém um cidadão,
Aristóteles rejeita as idéias do local de nascimento e de herança dos antepassados.
Em relação ao local do nascimento, tal argumento não se sustenta porque escravos
podem nascer no mesmo lugar em que um cidadão e nem por isso se torna um
cidadão. No tocante aos antepassados, isso não explica a aquisição da cidadania do
primeiro deles. Aristóteles deixa claro que a cidadania deve ser compreendida no que
se refere a sua funcionalidade e não sobre as suas origens46.
Para Aristóteles, a função do cidadão é se resume em participar da
administração da Justiça e de ocupar os cargos públicos. Nesse diapasão, entende
que a cidadania implica o poder de decisão e a submissão a ordem política
estabelecida. Esse binômio não é passível a todos os indivíduos da sociedade,
chegando ao extremo de afirmar que existiam seres humanos que eram escravos por
natureza. Já outros homens, em decorrência da profissão que exerciam, não tinham
a virtude necessária para governar.47
44 Ibiden. p. 20-1. 45 LIPSON, Leslie. Os grandes problemas da ciência política. p. 116. 46 Ibiden. p. 117. 47 LIPSON, Leslie. Os grandes problemas da ciência política. p. 117.
23
O trecho a seguir deixa clara a cosmologia48 do filósofo em comento:
"Aristóteles pregava que existe algo que move todas as coisas e que, por sua vez,
não é movido por nada, seria este algo aquilo que origina todas as coisas: o ato é de
Deus, e a potência, a matéria”.49
Aristóteles foi um grande sistematizador do pensamento grego50 e o seu
pensamento foi o mais marcante na filosofia até a idade média51.
Foi discípulo de Platão na famosa Academia desde os seus 18 anos de idade
e permaneceu durante 20 anos até a morte de seu mestre. Foi tutor de Alexandre, O
Grande durante três anos a pedido do pai deste, Filipe II, Rei da Macedônia52.
Aristóteles considerava a Justiça uma virtude, uma virtude que torna possível
outras virtudes como a caridade, e que independe de qualquer outra virtude.
Aristóteles entendia que a Justiça deve se pautar pela ponderação, ou seja, estar
igualmente equidistante entre o excesso e a escassez. São os extremos que
Aristóteles entendia como injusto. Aristóteles assevera que o vocábulo justo e injusto
são usados comumente para designar situações diversas, e ponderava que o justo é
o legal e o equitativo, sendo a injustiça o ilegal e o não equitativo.
Aristóteles acreditava em um direito natural. No entanto, é preciso esclarecer
ab initio, que o direito natural dos antigos gregos não se confunde com o direito natural
dos medievais, fundado na vontade divina53 e modernos, assentado na razão54.
Para os gregos – com o Ápice no pensamento de Aristóteles -, o sentido do
direito natural era a busca da natureza das coisas. Quando Aristóteles fala em direito
natural insiste na idéia de prudência e equidade, não em um direito cerebrino,
previamente estabelecido pela razão55.
48 A cosmologia consistiu nas primeiras reflexões dos filósofos pré-clássicos e objetivava compreender o mundo
e tudo aquilo que ele contém, desvinculada das explicações míticas. 49 CASTILHO, Ricardo. Filosofia do direito. p.45. 50 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 65 51 Ibiden. p. 64. 52 CASTILHO, Ricardo. Filosofia do direito. p. 44. 53 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 17 e 106. 54 Ibiden. p. 17 e 153. 55 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 153-4.
24
A natureza era a fonte do direito natural, ou seja, a norma justa era conhecida
mediante a apreensão da natureza das coisas. A natureza ensinava e era a régua de
medida de todas as coisas. Era pela análise de cada caso particular que o julgador
encontraria a norma adequada para ser aplicada ao caso.
A lei possui um imperativo que é geral e abstrato. No entanto, alguns casos
concretos têm certas especificidades que o legislador não previu no momento de
elaboração da norma. Neste caso, para evitar uma aplicação fria e mecânica da regra,
o julgador usaria a equidade, complementando a regra para a sua aplicação mais
justa.
Disserta Aristóteles sobre a equidade, in verbis:
Quando a lei se exprime de modo genérico, e na prática ocorre um fato que
não entra nessa generalidade, então é justo corrigir tal lacuna; e isso diria o
próprio legislador se estivesse presente, pois se tivesse presente o fato, tê-
lo-ia regulado com a lei.56
A compreensão do direito natural em Aristóteles só é possível se
analisarmos como o filósofo acreditava no modo de constituição das coisas que
existem no nosso mundo.57
Aristóteles denominou esse modo de ver as coisas - explica Galves58 - como
Teoria da Matéria e Forma.
Esse modo de ver as coisas recebe o nome de Teoria da Matéria e Forma.
Um exemplo a elucida, aproximativamente. Aqui temos a estátua de um
atleta. Ali temos a estátua de uma Deusa. Aliás, podemos fazer uma multidão
de esculturas, cada uma delas representando uma entidade diferente.
fiquemos com o Atleta e a Deusa. Vemos que ambas são feitas da mesma
matéria - o mármore. Mas cada uma delas representa uma figura diferente -
um Atleta, uma Deusa. Como aconteceu isso? É que o escultor, por assim
dizer, inseriu, num mármore, a idéia do Atleta e, noutro, a idéia da Deusa - e,
56 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 115. 57 Ibiden. p. 112. 58 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 113.
25
por assim, deixou que cada idéia plasmasse ou modelasse o seu pedaço de
mármore, segundo as exigências, aqui, da imagem do Atleta, ali, da imagem
da Deusa. Resultado: aqui, uma certa idéia misturou-se a uma matéria, e fez
o Atleta; ali, outra idéia misturou-se a uma matéria, e fez uma Deusa. Assim,
podemos dizer que, de certa maneira, o Atleta é composto de uma idéia e de
uma matéria; a Deusa, de uma matéria e outra idéia. Aristóteles dizia: matéria
e forma - forma certamente porque a idéia é que deu forma a respectiva
escultura.59
Aristóteles entendia que todas as coisas do mundo são compostas de
matéria e forma e ensina que esse binômio permite compreender o dinamismo de
todas as coisas do mundo. Nessa linha de raciocínio, as lições de Galves:
Na verdade, a estátua vai sendo feita aos poucos. Assim também a semente
vai fazendo aos poucos a árvore. É como se a matéria, progressivamente
modelada pela forma, tivesse em si a possibilidade de ir passando de
semente à árvore frondosa. A essa possibilidade Aristóteles chamou
potência, à árvore frondosa chamou de ato - certamente porque a plena
realização da potência equivale a ter tornado atual, e não somente potencial,
a forma que atuava na matéria. Matéria e forma, potência e ato - explicam
como o mundo é, e como evolui.60
Aristóteles também deu o nome de natureza para a forma. As coisas se
desenvolvem conforme a sua natureza, agem de acordo com a sua natureza ou
procuram realizar as potencialidades de sua natureza. Em outras palavras, isso
significa que todas as coisas que existem no mundo se modificam até atingirem a sua
forma plena, pronta e acabada. Destarte, a mutabilidade das coisas tinham por
objetivo realizar, concretizar a sua natureza ou forma.61
O direito natural para os gregos e em especial Aristóteles, não é um conjunto
de regras pré-estabelecidas, conhecidas por todos mediante a razão, como o
jusracionalismo moderno tentou construir. O direito natural era um complemento ao
direito positivo. Nesse sentido, Miguel Reale sustenta que:
59 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 113. 60 Ibiden. p. 113. 61 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 113-4.
26
O Direito Natural clássico não se apresenta como uma duplicata do Direito
Positivo, mas se resume em alguns preceitos que, sendo base da vida
prática, condicionam também o mundo jurídico. Para os mestres do Direito
Natural clássico, este (sic) não é senão a Moral mesma enquanto serve de
pressuposto ao Direito, expressando, por conseguinte, certos princípios
gerais de conduta, como exigências imediatas e necessárias da racionalidade
humana. Essa concepção do Direito Natural é muito diversa da dominante na
era renascentista, com Hugo Grócio e seus continuadores, os quais
converteram o Direito Natural em verdadeiro código da razão, capaz de
conter a priori soluções adequadas para todos os problemas jurídicos
emergentes da experiência concreta. Na concepção do Direito Natural
aristotélico ou estóico não se modela um código abstrato e imutável,
contraposto ao código positivo, contingente e relativo.62
Agora passaremos a analisar a compreensão de Aristóteles em relação ao
fenômeno jurídico.
62 REALE, Miguel. Filosofia do direito. v. II. p. 530.
27
4 O DIREITO EM ARISTÓTELES
Ao percorrermos todo o nosso estudo até aqui podemos perceber que: "A
conclusão só pode ser a de que é realizando a sua natureza e seguindo as inclinações
desta é que o ser realiza e atinge o seu objetivo: a plena realização de si mesmo".
O Direito Natural para Aristóteles era o conjunto de prescrições, emanadas
da natureza do indivíduo e que este deveria seguir para atingir a sua finalidade na
existência, que é a realização de suas potencialidades. Aristóteles chamava o direito
natural de justo natural. O justo legal seria as normas ditadas pelo legislador que se
inclinava ao justo natural, as normas eram injustas se não respeitassem os ditames
do justo natural.63
A natureza humana, como é óbvio, encontra-se em todos os homens,
portanto todos eles teriam o objetivo de atingir as suas potencialidades, isto é, todos
os homens tem o direito de viver humanamente. Portanto como todos os homens
possuem a mesma natureza, devem ser tratados como iguais, porque a mesma
natureza impõe a igualdade.64
Galves explica a compreensão de Aristóteles sobre o fenômeno jurídico:
O direito é um conjunto de regras de conduta que os homens devem obedecer
em sua vida social, a fim de que possa ser, nela, respeitada a sua natureza.
Assim, o fim do Direito é assegurar que, na vida social, cada homem possa
encontrar aquelas condições para realizar o seu ser: o Direito procura dar a
cada um o seu. Ora, dar a cada um o seu é a definição da Justiça. O Direito
tem por objetivo a Justiça. Esta é, pois, como vimos, algo vinculado a
natureza humana, serve a esta.65
63 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 114. 64 Ibiden. p. 114. 65 Ibiden. p. 115.
28
O direito objetiva que essa repartição justa dos bens e honrarias segundo os
méritos e necessidades de cada um seja cumprida mediante a coação física, se
necessário. A idéia de Justiça está ligada a idéia de proporção. Para Aristóteles essa
proporcionalidade é realizada de dois modos diferentes: mediante a Justiça
Comutativa e Justiça Distributiva. Aquela visa a igualdade matemática, uma proporção
aritmética como mercadoria e valor, trabalho e salário, dano e reparação civil. Com a
Justiça Distributiva é diferente. Ela visa a proporção de modo desigual. As honras,
bens, cargos públicos dentre outras coisas seriam repartidas de acordo com os
méritos de cada um.66
Agora daremos um grande salto no tempo, da filosofia clássica para a filosofia
moderna, onde abordaremos a filosofia de Immanuel Kant, especialmente no que se
refere a sua compreensão sobre a Justiça, objeto de estudo do nosso trabalho.
66 GALVES, Carlos Nicolau. Manual de filosofia do direito. p. 115.
29
5 O PENSAMENTO FILOSÓFICO DE IMMANUEL KANT
Immanuel Kant (1724-1804), nascido em Königsberg, na Rússia, é
considerado o grande último filósofo moderno e foi o que melhor desenvolveu um
sistema de filosofia e filosofia do direito entre eles67.
O pensamento de Kant apresenta três fases muito distintas entre si. Na
primeira delas, na juventude, Kant se debruça aos temas clássicos das ciências da
natureza, física, astronomia, dentre outros. Na segunda fase, Kant começa a refletir
sobre questões especialmente de natureza filosófica, e, na terceira fase, nas últimas
décadas de sua vida, Kant desenvolve os pressupostos de seu pensamento filosófico,
tratando do criticismo de maneira ampla. Nessa ocasião, Kant abandona o
pensamento tradicional racionalista moderno, e indaga criticamente sobre as
possibilidades do próprio conhecimento. Kant escreveu na maturidade três grandes
críticas: Crítica da Razão Pura (1781), Crítica da Razão Prática (1788) e Crítica da
Faculdade de Julgar (1790). Nesta fase também escreveu outras obras de peso como
a Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785), À Paz Perpétua e outros
opúsculos e Metafísica dos Costumes (1797), obra em que tratará especificamente do
direito68.
O filósofo iluminista organizou uma compreensão jusnaturalista direito
rigorosamente lógica, mediante um direito fundamentado inteiramente na razão.69
Sobre os fundamentos que levaram o filósofo alemão a desenvolver essas
críticas e importância de tais obras, Miguel Reale explica que Kant buscou responder
três perguntas, cada uma delas respondidas em respectivamente nos três livros supra
mencionados: A) Que é que posso conhecer? B) Como devo comportar-me como
homem? C) qual o sentido último do universo e da existência humana70.
67 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 208. 68 Ibiden. p. 209. 69 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. p. 39. 70 REALE, Miguel. Filosofia do direito. v. I. p. 31.
30
Como dito alhures, a obra mais importantes de Kant em relação ao direito é
A Metafísica dos Costumes -, obra em que trata especificamente do fenômeno jurídico
no Livro I Da Doutrina do Direito. Kant também abordará os problemas do fenômeno
jurídico nas obras Crítica da Razão Prática e A Paz Perpétua e outros opúsculos.
Hoje em nossa sociedade o sistema econômico dos meios de produção é o
capitalista, com normas jurídicas e o aparato estatal que garantem o seu pleno
funcionamento. No entanto, na época em que Kant viveu em uma época em que a
classe burguesa, que era detentora dos meios produtivos e de grande poder
econômico não tinha o poder político e dele estavam em busca. Neste meio de grande
efervescência dos ideais burgueses, Kant construiu a sua compreensão sobre a
liberdade, que entendia ser inata a todos os seres humanos.
Miguel Reale comenta esse pensamento de Kant que: “Ser homem é ser livre,
existindo no homem, portanto, o poder de acordar o seu arbítrio com o dos demais,
segundo uma lei geral de liberdade”.71
A idade moderna é marcada por um embate teórico entre duas correntes de
pensamento, uma antiga, fundada na tradição do pensamento e a outra nova. De um
lado o absolutismo que tinha sua base na filosofia cristã e mais recentemente na razão
com o contratualismo hobbseniano72, de outro o Iluminismo que surgiu como uma
teoria de combate que objetivava a construção de uma nova idéia de sistema
econômico e fundamentos para o poder político73.
O absolutismo trouxe vantagens para a burguesia. A unificação dos feudos
em Estados permitiu uma circulação livre de pessoas e mercadorias. Antes a
burguesia ficava restrita aos burgos que ficavam entre os feudos. No entanto, o
fortalecimento dos reis acabou sendo, para a burguesia, uma faca de dois gumes. Os
reis tinham poderes absolutos e a classe burguesa não tinha qualquer participação
política. A liberdade e propriedade dos indivíduos poderia ser atacada a qualquer
71 REALE, Miguel. Filosofia do direito. vol. II. p. 549. 72 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 173. 73 Ibiden. p. 173.
31
momento e sem aviso. Para o capitalismo, incerteza e insegurança são inadmissíveis
para a manutenção deste sistema74.
A época em que Kant viveu foi muito importante para formar o seu
pensamento filosófico, e é a partir dela, mediante o auxilio da história que podemos
compreendê-lo melhor. A época contemporânea de Kant foi de grande debate sobre
qual deveria ser o método da filosofia. De um lado os racionalistas defendiam que
somente por meio da razão especulativa era possível alcançar um conhecimento
válido universalmente, porque as percepções, as sensações variam de pessoa a
pessoa e dependem da experiência de vida concreta de cada um, bem como o
conhecimento empírico é relativizado, o resultado da análise pode ser falho. Por outro
lado, os empiristas criticavam o racionalismo por entenderam que a razão não é
universal, nem todas as pessoas tem as mesmas condições racionais, e também não
é possível alcançar o conhecimento valido e universal somente com categorias da
razão, sem a análise efetiva dos fatos75.
Embora tivesse vivido toda a sua vida na Alemanha, país em que o
racionalismo teve grandes defensores, Kant o tratou com grande reprovação. Isso
porque no início de seu pensamento, Kant teve ligações com às ciências naturais,
onde os resultados são obtidos de maneira empírica, mediante os sentidos. Foi em
David Hume que Kant extraiu todo o arcabouço para a crítica contra o racionalismo,
chegando até mesmo a dizer que o filósofo empirista inglês o despertou de seu sono
dogmático76.
David Hume chegou a dizer que da experiência de um objeto que solto ao ar,
cai ao solo, é impossível extrair leis gerais para a gravidade. Aquela experiência só é
válida para aquele objeto e outros nas mesmas condições77.
74 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 160. 75 Ibiden. p.140-8. 76 Ibiden. p.209. 77 Ibiden. p. 209.
32
Esse empirismo de Hume, levado as últimas consequências, impressionou
Kant e o levou a questionar sobre qual a possibilidade de se alcançar um
conhecimento verdadeiro78.
78 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 209-10
33
6 DA RAZÃO PURA KANTIANA
Embora a Crítica da Razão pura não trate do direito e da Justiça, mas do
problema do conhecimento, ela é de fundamental importância para conhecer o
pensamento de Kant sobre a Justiça. O ideal de Kant sobre o direito justo é um
transporte de sua filosofia geral para a filosofia do direito. A conclusão de Kant na
Crítica da Razão Pura é transportada para o direito, este construído apenas mediante
a razão, o tornando, por conseguinte, imutável, inflexível, consectário lógico da
racionalidade kantiana que não se modifica a despeito de quaisquer clamores ou
circunstâncias concretas.
Em sua primeira Crítica, Kant tratará do problema do conhecimento.
Buscando responder as indagações da possibilidade e limites do conhecimento79.
Kant não rejeita a idéia de que mediante a experiência sensível podemos chegar ao
conhecimento dos objetos. No entanto, o filósofo ponderava que com a experiência
não conhecemos as coisas em si, mas apenas os seus fenômenos, isto é, as formas
com o que apreendemos os objetos do conhecimento.
Para Kant, todos os homens, possuem mecanismos da razão que possibilitam
a apreensão e reflexão dos objetos. Esses mecanismos não são inatos ao sujeito, não
nascem com ele, muito menos são apreendidos em conjunto com os objetos,
antecedem a eles. São a priori. Os mecanismos necessários para se apreender um
objeto são o tempo e o espaço, que Kant chama de formas da sensibilidade. Já os
mecanismos necessários para se pensar sobre os objetos, Kant chama de formas do
entendimento ou categorias apriorísticas80.
As formas da sensibilidade permitem apreendem um objeto no tempo e no
espaço, mas não basta apenas apreender um objeto temporal e espacialmente,
porquanto a experiência sensível permite apenas conhecer os fenômenos, não as
coisas em si. É importante também um pensar sobre os objetos, isto é, organizar os
dados obtidos pela experiência racionalmente.
79 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 211. 80 Ibiden. p. 214.
34
Para Kant, pensar significa fazer um julgamento. O filósofo definia o
pensamento como o julgamento da empiria por meio de categorias, e, para cada
categoria a priori, existe um juízo que lhe é decorrente81.
As categorias que possibilitam o conhecimento dos fenômenos, Kant as
denomina de juízos sintéticos a priori. São sintéticos porque ligam a um objeto um
predicado, uma qualidade que lhe é própria. São a priori porque antecedem a
experiência concreta. Diferentemente, os juízos sintéticos a posteriori são decorrentes
da experiência, como quando alguém, por exemplo, diz que a parede da sala de aula
é branca82. Somente indo até determinada sala de aula e vendo a cor da parede é
possível saber a sua cor.
Sobre os juízos sintéticos a priori, os ensinamentos de Alysson Mascaro:
Quando se diz que toda parede pintada assim o é porque recebeu a ação de
um pintor, que a toda ação corresponde uma reação, trata-se de um juízo
sobre a causalidade necessária dos fenômenos. Não é preciso ver a parede
em si para saber que houve a ação de um pintor com tintas para que ela
esteja pintada. A categoria da causalidade é uma ferramenta que se
apresenta de modo necessário, antes da própria experiência de ver o
fenômeno da parede pintada83.
Para Kant, estas categorias a priori, por serem necessárias, são também
universais. Para Kant o conhecimento não é universal porque a razão seja universal
ou os objetos são sempre os mesmos, mas porque os mecanismos da razão postos
a disposição de todos os homens são universais84.
Além dos juízos sintéticos a priori e a posteriori que ligam predicados a
objetos, há também na filosofia kantiana os juízos analíticos que para o filósofo não
deveriam ser objeto de preocupações dos filósofos, porque não gera conhecimentos
novos. Os juízos analíticos são apenas desdobramentos de juízos anteriores. Mascaro
81 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 214-5. 82 Ibiden. p. 215. 83 Ibiden. p. 215. 84 Ibiden. p.215.
35
dá o seguinte exemplo: “Quando se diz que um triângulo tem três lados, esse
conhecimento é meramente realizado pela extração de uma noção pela outra85”
Como a filosofia kantiana busca lastros de universalidade, serão os juízos
sintéticos a priori que terão maior preocupação, porque são universais, necessários e
passíveis de conhecimento por todos os indivíduos.
Diz Kant na Crítica da Razão Pura:
Todo o nosso conhecimento parte dos sentidos, vai daí ao entendimento e
termina na razão, acima da qual não é encontrado em nós nada mais alto
para elaborar a matéria da intuição e levá-la à suprema unidade do
pensamento86.
Passaremos agora a análise do pensamento elaborado por Kant na obra Crítica
da Razão Prática, no capítulo a seguir.
85 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 215. 86 Kant apud MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 216.
36
7 DA RAZÃO PRÁTICA KANTIANA
Com a Crítica da Razão Pura Kant tratou do problema do conhecimento.
Nesta obra foi dada as bases de sua filosofia geral ou teoria do conhecimento. Porém,
a razão pura não é capaz de resolver os problemas fundamentais do direito como a
questão da justiça. As categorias a priori e as formas da sensibilidade não são capaz
de responder a pergunta o que é a justiça ou como construir uma ordem social justa.
Reconhecendo essa dificuldade, Kant constrói uma filosofia direcionada para a
prática, para os problemas do homem enquanto ser social. A filosofia prática kantiana
terá como fundamento os imperativos categóricos87.
Kant foi o primeiro filósofo a distinguir o direito da moral, esta é uma das
grandes contribuições para a filosofia do direito88, aliás, Kant foi o primeiro a trazer
essa nota diferenciadora, afirmando ser a moral autônoma e o direito heterônomo89.
Nesse sentido, disserta Maria Helena Diniz:
Na teoria kantiana, processa-se a separação entre direito e moral, sob o
prisma formal, e não material, isto é, tal distinção depende do motivo pelo
qual se cumpre a norma jurídica ou moral. No ato moral, o motivo só pode ser
a própria idéia do dever, mesmo que seja diretamente dever jurídico e só
indiretamente dever moral. Porém, no mesmo ato jurídico, o motivo pode ser,
além do motivo moral de cumprir o dever, o da aversão à sanção, seja ela
pena corporal ou pecuniária.90
A moral tem uma característica de ser interna ao sujeito enquanto o direito é
externo. E não apenas isso, os motivos também são relevantes. Para a conduta ser
moralmente válida, não basta apenas cumprir o dever, é necessário querer cumprir.
Em relação ao querer cumprir o dever, Kant chama de boa vontade.91 Já o direito, por
87 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 217. 88 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. p. 39. 89 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 49. 90 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. p. 39. 91 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito.
37
outro lado, basta o seu cumprimento, independentemente do motivo que levou o
individuo a cumprir, mesmo que imoral.
Miguel Reale utiliza um feliz exemplo para ajudar na compreensão desta idéia
kantiana em relação ao motivo do cumprimento da regra jurídica e do dever moral:
Nem todos pagam imposto de boa vontade. No entanto, o Estado não
pretende que, ao ser pago um tributo, se faça um sorriso nos lábios; a ele,
basta que o pagamento seja feito nas épocas previstas. Nada mais absurdo
e monstruoso do que a idealização de um homo juridicus, modelado segundo
o Direito e destinado a praticá-lo com rigorosa fidelidade às estruturas
normativas.92
Em Crítica da Razão Prática Kant é claro ao asseverar que:
A regra prática é, portanto, incondicionada, sendo, por consequência,
representada como proposição categoricamente a priori, em virtude da qual
a vontade é determinada, objetiva, absoluta e imediatamente (pela mesma
regra prática que aqui, evidente, é lei). Com efeito, a razão pura, em si mesma
prática, aqui resulta imediatamente legisladora. A vontade é concebida como
independente de condições empíricas, e, por conseguinte, como vontade
pura, determinada mediante a simples forma da lei, sendo esse motivo de
determinação considerado como a suprema condição de todas as máximas.93
Kant entendia que a moral e o direito possuem a mesma origem racional, o
imperativo categórico94 que é sempre este: “Age de tal modo que a máxima de tua
vontade possa valer-te sempre como princípio de uma legislação universal95”. Há duas
variações do imperativo categórico que iluminam o seu conteúdo, sem torná-lo
múltiplo. São eles:
[...] como se a máxima da tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em
lei universal da razão. [...] age de tal maneira para que uses a humanidade,
92 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 49. 93 KANT, Immanuel. Crítica da razão prática. p. 49. 94 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 219. 95 KANT, Immanuel. Crítica da razão prática. p. 49.
38
tanto na sua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e
simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio96.
Este imperativo se trata de um mecanismo da razão para o agir prático, não
apenas uma forma de alcançar o conhecimento por si mesmo.97 Para Kant, moral e
direito não se diferenciam pelo seu conteúdo, mas pela sua forma.
Para Kant o imperativo categórico é uma máxima. Isto significa que não existe
uma catalogação prévia de regras morais, como as constantes nos Dez
Mandamentos98. As normas morais e jurídicas são extraídas destes imperativos e
podem ser alcançadas por todos se buscarem agir como fim em si memo. As normas
extraídas dos imperativos categóricos são inflexíveis. Kant não concedia foros de
legitimidade moral e racional a flexibilização dos imperativos categóricos. A regra de
ouro aristotélica da equidade, para Kant, é inadimissível. A racionalidade universal
não comporta correções. Kant argumentava que nem mesmo a mentira poderia ser
tolerada, porque impede a segurança no momento da celebração dos contratos.
Nessa ordem de idéias, entrou em uma polêmica com Benjamin Constant que
defendia um direito de mentir por amor à humanidade. Kant afirma que: “Ser verídico
(honesto) em todas as declarações é, portanto, um mandamento sagrado da razão
que ordena incondicionalmente e não admite limitação por quaisquer
conveniências”99.
Kant reconhece a dificuldade de implementação de sua teoria moral,
porquanto os homens, além de possuírem visões de mundo e aspirações distintas,
são também carregados de sentimentos egoísticos, o que pode impedir uma conduta
dentro dos ditames da moralidade universalista. Nesse sentido, Kant invoca
novamente a idéia de boa vontade. Em relação a fragilidade do sistema moral
kantiano, Alysson Leandro Mascaro argumenta que:
Somente um mundo que se imagine em possível harmonia pode engendrar
uma concepção normativa universalizante e querida por todos os indivíduos
96 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 220. 97 Ibiden. p. 219. 98 Ibiden. p. 220. 99 Kant apud MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 221.
39
em todos os tempos. Ao mesmo tempo, tal boa vontade pressuposta pela
universalidade somente em termos profundamente ideais pode ser
concebida. Esse projeto kantiano de construção filosófica dos deveres da
moralidade – e, por fim, do próprio direito natural -, se consegue dar uma
aparente razoabilidade de cabo a rabo a tal empreendimento, não consegue,
no entanto, escapar de sua premissas ideais e de suas presunções
destoantes da realidade100.
Quando transportamos as conclusões da filosofia kantiana para a filosofia do
direito, percebemos resultados marcantes. Só é direito justo aquele que possui
normas inflexíveis, invariáveis a despeito de quaisquer circunstâncias. Os ideais
burgueses de igualdade, liberdade, propriedade e segurança estavam assegurados
como direitos racionais inflexíveis. Nesse sentido a filosofia de Kant é transformadora
e revolucionária, porque combate os privilégios das classes estamentais como débeis.
Por outro lado, esta filosofia é fortemente conservadora, porque uma vez estabelecido
o direito racional, ele é inalterável, independentemente dos problemas, mazelas e
clamores das classes mais exploradas101.
100 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 222. 101 Ibiden. p. 222.
40
8 DO DIREITO EM IMMANUEL KANT
Para Kant o direito é um conjunto de princípios capazes de informar uma
legislação positiva102 e o identifica como o poder de exercer coação103.
O direito assume um papel importante quando a moralidade não inibe os atos
que sejam indesejados ao capital. A força coativa do Estado deve cair sobre aqueles
que não respeitam a ordem, que se comportam contrariamente as leis. Kant é explícito
nesse sentido:
A resistência que frustra o impedimento de um efeito promove este efeito e é
conforme ele. Ora, tudo que é injusto é um obstáculo à liberdade de acordo
com leis universais. Mas a coerção é um obstáculo ou resistência à liberdade.
Consequentemente, se um certo uso da liberdade é ele próprio um obstáculo
à liberdade de acordo com leis universais (isto é, é injusto), a coerção que a
isso se opõe (como um impedimento de um obstáculo à liberdade) é conforme
à liberdade de acordo com leis universais (isto é, é justa). Portanto, ligada ao
direito pelo princípio de contradição há uma competência de exercer coerção
sobre alguém que o viola104.
O filósofo rompe com a tradição grega classe, ao proclamar que a Justiça é
construída pela razão, não necessitando de confirmações ou correções pela
sociedade. Kant argumenta que o direito justo e racional não se identifica pelo
conteúdo de suas relações, nem mesmo tem o objetivo de promover o bem comum,
Justiça social, dignidades e transformações positivas na vida das pessoas. O direito
assume o papel de garantir as relações mercantis burguesas, presumindo que todos
os indivíduos são livres e iguais. O direito, portanto, deve ser analisado pela forma e
não pelo conteúdo. No sentido do texto, afirma Immanuel Kant em A Metafísica dos
Costumes:
O conceito de direito, enquanto vinculado a uma obrigação a este
correspondente (isto é, o conceito moral de direito) tem a ver, em primeiro
102 JÚNIOR, José Cretella. Curso de filosofia do direito. p. 156. 103 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. p. 39. 104 KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. p. 77.
41
lugar, somente com a relação externa e, na verdade, prática de uma pessoa
com outra, na medida em que suas ações, como fatos, possam ter influência
(direta ou indireta) entre si. Mas, em segundo lugar, não significa a relação
da escolha de alguém com a mera aspiração (daí, por conseguinte, com a
mera necessidade) de outrem, como nas ações de beneficência ou
crueldade, mas somente uma relação com a escolha do outro. Em terceiro
lugar, nessa relação recíproca de escolha, não se leva de modo algum em
conta a matéria da escolha, isto é, o fim que cada um tem em mente com o
objeto de seu desejo; não é indagado, por exemplo, se alguém que compra
mercadorias de mim para seu uso próprio uso comercial ganhará com a
transação ou não. Tudo que está em questão é a forma na relação da escolha
por parte de ambos, porquanto a escolha é considerada meramente como
livre e se a ação de alguém pode ser unida com a liberdade de outrem em
conformidade com uma lei universal. O direito é, portanto, a soma das
condições sob as quais a escolha de alguém pode ser unida à escolha de
outrem de acordo com uma lei universal de liberdade105.
Podemos dizer que Kant foi um filósofo contratualista. No entanto, o seu
contratualismo é muito peculiar, isso porque Kant nunca acreditou de fato na
existência do contrato social, como se alguns homens tivessem se reunido em uma
praça ou floresta e discutido as clausulas e termos desta convenção.
O pactus originalis, portanto consiste em um pressuposto universal da razão
para legitimar toda a ordem social existente, independente de sua comprovação
histórica concreta.
Para Miguel Reale:
O contrato aparece em Kant como uma condição transcendental, sem a qual
seria impossível a experiência mesma do Direito. O conceito do contrato torna
possível a experiência jurídica: - donde a sua definição do Direito como “o
conjunto das condições mediante as quais o arbítrio de cada um se
harmoniza com o dos demais, segundo uma lei geral de liberdade”. Como se
vê, o de Kant é um contratualismo deontológico, mas de base lógico
transcendental, enquanto que o de Rousseau, em que êle (sic) se inspira, tem
um fundamento psicológico.106
105 KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. p. 76. 106 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. v. II. p. 549.
42
Kant afirma que o Estado não tem por objetivo garantir a felicidade dos
cidadãos, eles a devem buscar por si mesmos. O papel do aparato político estatal é
garantir a liberdade dos indivíduos e defesa dos demais direitos naturais inatos107.
O direito público Kant classifica em estatal, direito internacional e direito
cosmopolita108. O direito estatal regularia as relações entre os cidadãos vinculados a
um Estado. O direito internacional regularia as relações entre Estados ou indivíduos
de Estados diferentes. Já o direito cosmopolita seria um salto em relação ao direito
internacional, porque não leva em consideração a nacionalidade de um indivíduo para
a aquisição de direitos, o direito cosmopolita enxerga o homem como um cidadão do
mundo109.
Os ideais de igualdade formal defendidos por Kant não se limitam apenas em
relação aos indivíduos, mas também em relação aos Estados. Para Kant, a
escravidão, a servidão, as guerras são abomináveis a razão e devem ser sempre
evitadas. Com sapiência, Kant verificou que os Estados do seu tempo viviam como o
homem no estado de natureza, em situações de hostilidades, conflitos e guerras
iminentes.110
Com o objetivo de construir um direito natural mediante a paz dos Estados,
Kant desenvolveu um projeto para a paz perpétua em uma obra homônima. Para a
concretização desse ideal, Kant idealizou uma grande sociedade internacional, um
contrato entre os Estados, em que deveriam constar três artigos fundamentais. O
primeiro que a associação desses Estados fosse constituída por Estados
republicanos, que no entender de Kant eram os que melhor assegurariam os
interesses burgueses. O segundo artigo era que os Estados fossem livres, e o terceiro
artigo era que o direito cosmopolita deveria se fundar em relações de reciprocidade,
sendo esta entendida não apenas como receber bem um estrangeiro, mas que as
nações tivessem relações amigáveis e respeito mútuo111.
107 KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. p. 160 108 Ibiden. p. 153, 185 e 194. 109 Ibiden. p. 233. 110 Ibiden. p. 234. 111 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 234.
43
9 A INFLUÊNCIA KANTIANA NO PENSAMENTO JURÍDICO CONTEMPORÂNEO
Percebemos a influência da metafísica de Immanuel Kant na legitimação do
direito na contemporaneidade quando analisamos a obra do jurista e filósofo do direito
Hans Kelsen quando ele trata da grundnorm112 ou norma fundamental113 na mais
famosa obra do juspositivismo estrito, a Teoria Pura do Direito.
Nessa ordem de idéias, Miguel Reale argumenta que:
Kelsen é kantista, mas kantista especialmente quanto ao método, pois se algo
distingue a ele a seus companheiros da escola de Viena é a preocupação da
pureza metodológica como condição primeira de uma verdadeira e autônoma
Ciência do Direito.114
Alysson Leandro Mascaro explica que a construção do pensamento jurídico
kelseniano contrasta com as perspectivas filosóficas da totalidade, como o
hegelianismo e marxismo, em diálogo de uma visão filosófica de tipo kantiano e
igualmente afirma que o pensamento de Kelsen pode ser reputado como
neokantiano115.
Prossegue o eminente filósofo do direito:
Toda a grande proposta filosófica de Kant, no iluminismo do século XVIII, foi
a de perguntar sobre o quê e como se pode conhecer. Distinguindo o
conhecimento específico, lastreado em possibilidades objetivas, do
pensamento vago especulativo, Kant abriu margem à sua teoria pura do
conhecimento, na Crítica da razão pura. Do mesmo modo, Kelsen propugna
não uma reflexão sobre o direito ou sobre o seu estado ou sobre sua relação
com a política, a economia, a moral e a sociedade. Sua indagação é sobre a
possibilidade do conhecimento jurídico. A objetividade desse conhecimento
112 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. p. 217. 113 Essa norma fundamental não é posta pelo Estado, não é constituída pelos detentores do poder político. Ela é
considerada como um pressuposto racional e necessário para explicar a legitimidade e unidade do direito estatal
na obra do autor da Teoria Pura do Direito. Aliás, Kelsen se intitulava como um neokantiano. 114 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 152 115 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 344.
44
deve ser afastada de qualquer entendimento do direito enquanto fato social,
enquanto fato econômico, enquanto fato político ou moral116.
O próprio Kelsen revela a influência que recebeu do pensamento de Kant ao
dizer que:
Na medida em que só através da pressuposição da norma fundamental se
torna possível interpretar o sentido subjetivo do fato constituinte e dos fatos
postos de acordo com a Constituição como seu sentido objetivo, quer dizer,
como normas objetivamente válidas, pode a norma fundamental, na sua
descrição pela ciência jurídica - e se é lícito aplicar per analogiam um conceito
da teoria do conhecimento de Kant -, ser designada como a condição lógico-
transcendental desta interpretação. Assim como Kant pergunta: como é
possível uma interpretação, alheia a toda metafísica, dos fatos dados aos
nossos sentidos nas leis naturais formuladas pela ciência da natureza, a
Teoria Pura do Direito pergunta: como é possível uma interpretação, não
reconduzível a autoridades metajurídicas, como Deus ou a natureza, do
sentido subjetivo de certos fatos como um sistema de normas jurídicas
objetivamente válidas descritíveis em proposições jurídicas? A resposta
epistemológica (teorético-gnoseológica) da Teoria Pura do Direito é: sob a
condição de pressupormos a norma fundamental: devemos conduzir-nos
como a Constituição prescreve, quer dizer, de harmonia com o sentido
subjetivo do ato de vontade constituinte, de harmonia com as prescrições do
autor da Constituição.117
Kant foi muito importante para a formulação do pensamento jurídico
kelseniano. E a maioria dos juristas da atualidade, com sua visão juspositivista e
parcial do direito, entendem a obra de Kelsen como a definitiva em explicar o
fenômeno jurídico.
Nesse sentido, Fábio Ulhoa Coelho no opúsculo Para Entender Kelsen
afirma que:
Há dois Kelsens: o da primeira página do Teoria Pura do Direito, que todos
conhecem, muitos leram e alguns adotam como lição definitiva para a ciência
116 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 344. 117 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. p. 225.
45
jurídica; e o do restante de sua obra, em que conduziu, com rigor inusual, às
últimas conseqüências (sic) o seu primado metodológico.118
Assim, ainda que brevemente, entendemos ter demonstrado a influência que
o filósofo de Königsberg exerce na compreensão do direito na atualidade.
Sobre os fundamentos e objetivos do contrato social na visão de mundo
iluminista burguesa de Immanuel Kant, assevera Miguel Reale que:
Para a escola do Direito Natural", escreve Radbruch, "o contrato era como se
sabe, o fundamento de todo o Direito, fornecendo a solução do problema
básico da Filosofia Jurídica individualista - isto é, o problema de saber como
é possível que o Direito, que foi inventado para servir exclusivamente os
indivíduos, pode também obrigá-los e vinculá-los ao mesmo tempo. Fundar o
Estado com todo o seu poder jurídico soberano sobre a idéia dum contrato
celebrado entre os seus membros, parece ser o suficiente para poder
apresentar, em última análise, toda a obrigação em uma auto-obrigação.119
Paulo Dourado de Gusmão complementa que:
O pensamento de Kant é influenciado por Rousseau, porque não consideram
o contrato social como um fato histórico, mas como um pressuposto
necessário para a legitimação do Estado de Direito, ou seja, de um governo
que se submete a lei.120
Para Kant uma vez estabelecido o direito racional é inconcebível que os
indivíduos se rebelem contra o seu governante e a ordem estabelecida, porque a
Justiça racional é inflexível as necessidades concretas. Portanto, para Kant não se
admitia o direito de resistência ou rebelião, sendo que tal ato merece punição não
inferior do que a morte por se tratar de um parricídio, um crime contra a pátria.121
118 COELHO, Fábio Ulhoa. Para entender Kelsen. p. 9. 119 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 18. 120 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução à ciência do direito. p. 447. 121 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 232-3.
46
Esse pensamento kantista é diferente de John Locke que entendia que o
contrato social poderia ser quebrado e o governante deposto se os direitos naturais
inatos não fossem respeitados.122
Maria Helena Diniz discorre sobre a filosofia prática kantiana, in verbis:
A obediência do homem a sua própria vontade livre e autônoma constitui,
para Kant, a essência da moral e do direito natural. As normas jurídicas, para
tal concepção, serão de direito natural, se sua obrigatoriedade for cognoscível
pela razão pura, independente de lei externa ou de direito positivo, se
dependerem, para obrigarem, de legislação externa.123
Entendemos que a construção da doutrina do direito em Kant como um
ferramental para se fazer cumprir, quando necessário, o dever moral, influenciou a
idéia contemporânea do direito como um “mínimo ético”.
Sobre a idéia do mínimo ético, elucida Miguel Reale:
A teoria do “mínimo ético” consiste em dizer que o Direito representa apenas
o mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa
sobreviver. Como nem todos podem ou querem realizar de maneira
espontânea as obrigações morais, é indispensável armar de força certos
preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre. A Moral, em regra, dizem
os adeptos dessa doutrina, é cumprida de maneira espontânea, mas como
as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais vigor
e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar
indispensáveis à paz social.124
Kant concebia que a construção do direito natural é decorrente da idéia de
liberdade, que só poderia ser restringida em casos que os direitos de outros indivíduos
fossem ameaçados por uma conduta arbitrária. Nessa esteira, Kant entendia que o
imperativo categórico faz decorrer uma lei natural ética que fundamenta a autoridade
do legislador para exercer a coação física por intermédio de normas jurídicas positivas
122 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. p. 39. 123 Ibiden. p. 39-0. 124 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 42
47
para quem age contrário aos interesses de todos. Nesse sentido, a preclara
professora Maria Helena Diniz explica que:
Tal lei natural, que é o princípio de todo o direito, deriva da liberdade humana,
reconhecida por intermédio do imperativo moral categórico. Essa lei de
liberdade, como ideal da razão, é moral e encerra imediatamente a
autorização de coagir quem a impede ou prejudica, conforme leis gerais
sancionadoras. Logo, tanto a lei moral como o direito têm como princípio
último a liberdade ou autonomia da vontade.125
Mais especificamente Immanuel Kant afirma em A Metafísica dos Costumes:
Todos os deveres ou são deveres de direito (officia iuris), quais sejam,
deveres para os quais a legislação externa é possível, ou deveres de virtude
(officia virtutis s. ethica), para os quais a legislação externa não é possível.
Deveres de virtude não são suscetíveis de estarem submetidos à legislação
externa simplesmente porque eles têm a ver com um fim o qual (ou cuja
posse) é também um dever. Nenhuma legislação externa é capaz de fazer
alguém estabelecer um fim para si mesmo (já que isto constitui um ato interno
da mente), a despeito de lhe ser possível prescrever ações externas que
conduzem a um fim sem que o sujeito o torne seu fim.126
Como já dito anteriormente, em seu livro A Metafísica dos Costumes, Kant
trata especificamente do fenômeno jurídico e distribui o direito em três grandes
divisões: direito privado, direito público e direito cosmopolita.
A ordem escolhida por Kant não é aleatória. O filósofo do direito entende que
o fundamento do direito público é o direito privado, porque as noções de propriedade
e contrato já existiam em um estado de natureza127. O Estado então se ergueria como
um aparato político de manutenção e defesa dos interesses dos burgueses.
A divisão superior do direito natural não pode ser a divisão (por vezes feita)
em direito natural e direito social; em lugar disso, tem que ser a divisão em
direito natural e direito civil, o primeiro sendo chamado de direito privado e o
125 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, p. 40. 126 KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. p. 85. 127 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 230.
48
segundo, em direito público, pois o estado de natureza não se opõe à
condição social, mas sim a condição civil, visto ser certamente possível haver
sociedade no estado de natureza, mas não sociedade civil (a qual garante o
que é meu e teu mediante leis públicas). Esta é a razão porque o direito num
estado de natureza é chamado de direito privado.128
Sobre o problema de saber qual o método da filosofia tem implicações
importantes na filosofia do direito. O capitalismo que se desenvolvia necessitava de
que normas seguras, certas, conhecidas e inflexíveis fossem ditadas para o
desenvolvimento da ordem econômica iminente.
Nesse diapasão, se as normas jurídicas fossem flexíveis, adaptáveis as
circunstâncias de cada caso, a invariabilidade e incerteza das regras do absolutismo
estariam legitimadas teoricamente, o que para os modernos não era concebível
pensar. E se houvessem várias fontes jurídicas que pudessem ser consideradas
legítimas, haveria pluralidade de razões e maiores dificuldades para a abolição do
absolutismo. É nesse contesto específico que a filosofia do direito burguesa, com o
Iluminismo, ganha força, porque buscava a construção de somente um direito que
fosse considerado legítimo, o direito natural que garante a certeza e inflexibilidade dos
direitos. A igualdade de todos perante a lei, a liberdade de todos interagirem mediante
contrato, a segurança das relações jurídicas foram os lastros da filosofia do direito
iluminista129, em que Immanuel Kant levou à razão burguesa as últimas
conseqüências.
Miguel Reale preleciona que:
A filosofia de Kant permanece fundamentalmente dualista: há a coisa em si,
há o mundo dos fenômenos; há uma face do homem que é a do homem
sensível e finito (homo phaenomenon) e uma outra é a do homem como ser
racional acima do espaço e do tempo (homo noumenon), capaz de comandar
os sentidos pelas leis da razão; há uma ordem subordinada a uma
necessidade mecânica inviolável (a ordem da natureza) e um domínio
intemporal no qual as nossas ações são livres.130 [...] Segundo Stammler"
128 KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. p. 88. 129 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p.160. 130 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 139.
49
observou Recaséns Siches, "Kant foi pouco kantiano em sua Teoria Jurídica.
Ele trata, então, de por Kant de acordo consigo mesmo. A justiça se converte
assim no resultado de uma operação lógica: da operação de coordenar
harmonicamente todos os elementos da vida social. (...). Em Kant, a razão
prática era a própria razão pura aplicada ao problema da ação.131
Sobre o kantismo de Stammler, seguem as palavras de Miguel Reale:
O Direito justo é aquele que, de uma forma ou de outra, traduz uma realização
do ideal da comunidade pura que seria, em última análise, aquela
comunidade perfeita na qual cada indivíduo poderia dizer: "eu ajo de maneira
tal que a máxima de eu ato pode valer como uma lei universal.132
Com isso, encerramos a reflexão sobre a influência Kantiana no pensamento
jurídico contemporâneo.
No próximo capítulo passaremos a analisar a compreensão de Kant em relação
a justiça.
131 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 145 132 Ibiden. p. 146
50
10 A JUSTIÇA NO PENSAMENTO DE KANT
O pensamento kantiano é claro no sentido de compreender a Justiça como
o direito orientado pela razão pura, isto é, a construção do direito sem a necessidade
de ser corrigido pela sociedade. A idéia de Justiça, portanto, não decorre da
experiência concreta das formas sociais existentes, mas decorrente da razão que
orienta o direito positivo.
Para Maria Helena Diniz:
Nítida é a feição dedutiva desse jusnaturalismo, que é levado a propor
normas de conduta pelo método dedutivo, por influência do racionalismo
matematicista, tão em voga na época; assim, a partir de uma hipótese lógica
sobre o estado natural do homem, se deduzem racionalmente todas as
conseqüências (sic). Nesta teoria que encontrava sua legitimidade perante a
razão, mediante exatidão matemática e a concatenação de suas proposições,
a ciência jurídica passa a ter uma dignidade metodológica especial.133
Dialogando com o que até aqui foi dito, Miguel Reale doutrina que:
O jusnaturalismo põem como ideal jurídico a perfeita autonomia, e quer ver
no sujeito ao mesmo tempo um legislador e um súdito, o artífice da lei e o
servo da lei. Daí um contraste interno e imparcial que se nota em todo grande
sistema contratualista, com uma justaposição impressionante de elementos
liberalistas, como se nota tanto na doutrina de Rousseau como na de Kant.134
Para Kant o direito justo então seria aquele em que todos os ideais
burgueses estivessem protegidos, pois a visão capitalista de mundo era racional.
Mascaro conclui que: “A mera conservação dos parâmetros da circulação
mercantil e dos contratos é o que Kant considerará por direito justo135”.
133 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito, p. 35-6. 134 REALE, Miguel. Fundamentos do Direito. p. 19. 135 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 225.
51
É importante que nós entendamos que na época de Kant havia o predomínio
do absolutismo, em que o direito não era certo e previsível mas variava a depender
da vontade do soberano. Kant assim como os filósofos burgueses que o precederam,
como John Locke136 buscavam a criação de um novo direito que, ao contrario do
direito positivo existente, absolutista e incerto, fosse orientado pela razão da nova
classe que estava em ascensão - a burguesa.
O mundo racional era diferente do mundo real, pois era injusto se analisado
com uma visão burguesa de mundo em que a propriedade, liberdade e segurança
pessoais não eram respeitadas pelos reis. Esse dualismo desapareceu com as
revoluções liberais que resultaram com burguesia assumindo o poder dos Estados
nacionais e legislando de acordo com os seus interesses
Tanto é verdade que George Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), o
primeiro grande filósofo contemporâneo afirmou no prefácio de seus Princípios de
Filosofia do Direito que: "O que é racional é real e o que é real é racional."137
Como o mundo em que Hegel viveu já era burguês e os ideais iluministas
que fundamentavam teoricamente o modo de produção capitalista eram racionais, eis
o motivo pelo qual identificar no seu sistema filosófico razão e realidade.138
Mascaro pondera que a filosofia moderna é muito importante para a filosofia
do direito por dois motivos. O primeiro deles é em relação ao método de
conhecimento, assentado na razão, que fez com que se abandonassem algumas
idéias aristotélico-tomistas e se pensassem em novas fontes para princípios e normas
do direito, dando forma individual, laica, cerebrina, universalista, inflexível e a-
histórica. O segundo motivo é porque a filosofia política que se formou, com lastro
136 Filósofo iluminista do século XVII, John Locke (1632-1704) com sua idéia liberal burguesa de mundo defendia
que o poder do soberano não é de origem divina, mas humana, sendo limitado pela razão burguesa. O poder político
do monarca foi resultado de um contrato social celebrado entre os homens, no qual os indivíduos abririam mão
apenas do poder de fazer justiça com as próprias mãos em nome da segurança e defesa dos direitos naturais inatos.
Destarte, todos os outros direitos dos homens como a vida, liberdade e propriedade estariam resguardados, não
podendo o Estado atacá-los arbitrariamente, se tal fato ocorresse o contrato estaria quebrado e os homens teriam o
direito de se rebelar contra a ordem estabelecida e depor o governante. 137 HEGEL, George Wilhelm Friedrich. Princípios de filosofia do direito. p. 5. 138 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 240.
52
liberal e burguês, formou a concepção dos direitos naturais racionais, apartando da
compreensão do homem a suas relações com a natureza ou a sociedade, mas apenas
o próprio indivíduo considerado, onde o Estado deve garantir a igualdade formal,
liberdade de contrato e segurança nas relações de troca, os alicerces do capitalismo
que está presente até os nossos dias139.
139 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 160-1.
53
11 A JUSTIÇA NA CONTEMPORANEIDADE
Tentamos demonstrar no decorrer deste trabalho que o pensamento filosófico
de Immanuel Kant foi muito importante para a formação do pensamento jurídico
moderno e contemporâneo na medida em que enfraqueceu a doutrina absolutista, o
que possibilitou a ascensão da classe burguesa ao poder político mediante as
revoluções liberais, especialmente a revolução francesa que defendia os direitos
naturais burgueses de liberdade, igualdade e propriedade.
Da influência do pensamento kantiano, decorreu um sistema de pensamento
liberal do qual o nosso legalismo exacerbado está assentado140.
Nos dias de hoje, nas sociedades contemporâneas, capitalistas, a Justiça é
entendida como o cumprimento das normas estatais, a inclinação aos deveres
jurídicos e a manutenção da ordem. A estrutura concreta da sociedade é pensada
como correta e necessária. O ladrão que furta um pão para comer é preso e
processado porque ofendeu o direito de propriedade alheio e tal ato é considerado
injusto141. No entanto, não questionamos a injustiça de poucas pessoas serem
detentoras do capital e da terra, bens de alto valor econômico enquanto outras
pessoas não têm sequer um pedaço de chão para morar. A lógica do capital é que
todas as terras são ocupadas, o Estado pode comprar a terra do particular e conceder
ao favelado, porém a forma de conceder a propriedade é sempre jurídica e sempre
depende de um intermediário - o contrato.
O jurista e filósofo do direito Alysson Leandro Mascaro com sua reflexão
profunda e crítica do fenômeno jurídico contemporâneo, denuncia a estrutura jurídica
capitalista:
Com os olhos de olho, o artesanato jurídico pré-capitalista parece muito falho
e injusto, e de fato o é. Em sociedades escravagistas e feudais, nas quais as
instituições são débeis, o direito era realizado como uma arte porque outra
140 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 208. 141 Ibiden. p. 197.
54
coisa não poderia ser. Em geral, olhando-se ao passado pré-capitalista, viu-
se em mais vezes o direito justificar a exploração do que transformá-la, por
depender da vontade de quem mandava, o direito era inseguro, incerto, e na
maioria das relações e situações sociais era uma injustiça que se confirmava.
Mas o capitalismo, que é institucionalizado por meio do Estado, do direito e
das leis, também é uma estrutura social injusta, com a diferença de que as
injustiças são seguras, previsíveis e consolidadas. O direito garante que o
capitalismo seja seguramente injusto142.
A Justiça é pensada em casos particulares. O juiz, promotor, advogado,
jurista, operador do direito dizem que atuam em busca da Justiça. O advogado ao
peticionar em juízo diz que o faz por Justiça. No entanto o advogado busca alcançar
a Justiça apenas no caso particular, assim como o juiz e o promotor. Os grandes
problemas da sociedade, como a fome, miséria extrema, violência social o jurista diz
que não é seu problema investigar, mas apenas a análise crua e fria das normas
jurídicas estatais - uma infeliz herança do juspositivismo estrito do século XX -, com
sua compreensão parcial do fenômeno jurídico.
Alguns juristas e filósofos do direito, seguindo a tradição kantiana com as
categorias a priori ainda sustentam que a Justiça é conhecida mediante o uso da
razão, a despeito de análises concretas dos problemas das estruturas sociais e de
quaisquer correções pelos clamores dos despossuídos.
Trazemos a lume exemplificativamente o ensinamento de José Cretella
Júnior que pondera que:
A própria noção de justiça somente pode ser captada por quem se proponha
a fazer incursões metajurídicas ou extrajurídicas, de natureza filosófica,
lançando mão de determinados conceitos abstratos (grifo nosso) e
raciocinando em moldes inerentes a filosofia pura (grifo nosso), já que
"filosofia é o setor do saber humano que tem por objeto específico o estudo
do universal, concepção geral da vida e do universo, ciência dos valores
universalmente válidos, vontade de conhecer a realidade global, como
totalidade homogênea.143
142 MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. p. 14. 143 JÚNIOR, José Cretella. Curso de filosofia do direito. p. 5.
55
Para Miguel Reale a Justiça não se confunde com os valores mais importantes
para a existência e dignidade do homem como a vida, saúde, conforto, bem-estar,
segurança, liberdade mas sim é uma condição prévia para todos eles. Nas palavras
do antigo professor catedrático de filosofia do direito das Arcadas:
A nosso ver, a Justiça não se identifica com qualquer desses valores, nem
mesmo com aqueles que mais dignificam o homem. Ela é antes a condição
primeira de todos eles, a condição transcendental de sua possibilidade como
atualização histórica. Ela vale para que todos os valores valham. Não é uma
realidade acabada, nem um bem gratuito, mas é antes uma intenção radical
vinculada às raízes do ser do homem, o único ente que, de maneira originária,
é enquanto deve ser. Ela é, pois, tentativa renovada e incessante de
harmonia entre as experiências axiológicas necessariamente plurais,
distintas e complementares, sendo, ao mesmo, tempo a harmonia assim
atingida.144
Até aqui estudamos as linhas mestras dos pensamentos de Kant e Aristóteles,
sem a pretensão de esgotar o assunto, evidentemente, porquanto este labor não
comportaria tal empresa.
144 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 371.
56
12 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término deste trabalho verificamos a importante influência de Aristóteles e
Kant na construção do pensamento jurídico moderno e contemporâneo, aquele em
relação a compreensão da justiça de forma sistêmica, e este para a construção do
nosso sistema jurídico, liberal, burguês. Quando verificamos no Código Penal a
sanção para o roubador, ou no Código Civil o princípio segundo o qual todo aquele
que causa um dano fica obrigado a repará-lo, percebemos uma mostra da
manifestação do ideal de justiça corretiva aristotélica.
Ao nos depararmos com a Constituição, logo no artigo 5º vemos consagrados
os principais direitos naturais dos modernos. Propriedade, liberdade, igualdade,
segurança contra as arbitrariedades estatais são elevadas a categoria de direitos
fundamentais, positivados.
É inegável como o pensamento de Aristóteles, bem como o dos iluministas, e
em especial Kant estão fortemente presentes nos dias atuais, mesmo que não nos
demos conta de tal presença.
Cada pessoa tem a sua idéia de Justiça, seja o jurista, seja o advogado,
professor, juiz, lavrador da terra, médico, pedreiro. No entanto, o filósofo e
principalmente o jurista, que se colocam a frente de questões sociais a todo o instante,
deve estar mais presente a preocupação com o justo.
Como dito no início deste estudo, a compreensão e reflexão crítica sobre a
justiça não pode ser dissociada da história. Direito e justiça são fenômenos históricos,
que se manifestam em ralações sociais concretas. O justo nas sociedades capitalistas
é o cumprimento dos contratos celebrados e manutenção do aparato jurídico estatal
que garante os seus cumprimentos. Na idade moderna, a Justiça implica em que
aquele que tem a posse da terra exerça o seu mando sem limite e sem mudanças,
porque a estaticidade da ordem econômica é da vontade de Deus. Já nos tempos
antigos, nas sociedades do modo escravagista, desde as mais rudimentares até
aquelas que se desenvolveram muito culturalmente e economicamente como Roma e
57
Grécia, a Justiça está no acaso, na sorte, na força bruta e controla o destino de
milhares de seres humanos ao jugo da escravidão. Tem com isso que a idéia média
de Justiça, como já afirmado neste opúsculo, é a manutenção das estruturas sociais
existentes145. Age de maneira justa quem respeita a ordem, age injustamente quem
luta pela sua transformação.
Porém, o jurista e o filósofo não devem ter uma conduta passiva diante dos
problemas estruturais das sociedades do nosso tempo. A importância das reflexões
filosóficas, penetrando no âmago dos problemas não é de simplesmente compreender
as suas causas. A tarefa do filósofo é além de verificar as causas dos problemas,
encontrar os possíveis caminhos para mudanças, para tornar a vida das pessoas mais
digna, feliz. A análise histórica do direito nos mostra que desde o século XIX a sua
utilização não teve como fundamento o bem comum, a paz social e a felicidade, mas
apenas e de balizar as relações jurídicas mercantis e garantir, mediante o poder
político a execução das convenções por meio da coação física.
Se por um lado graças ao iluminismo e a filosofia do direito burguesa foi a gota
d’água para o absolutismo, de outro lado é a causa dos maiores problemas da
contemporaneidade. De nada adianta a lei garantir que todos são livres, iguais e tem
sua propriedade defendida para aquele que não tem nada para chamar de seu, fora a
sua força de trabalho, que deve vender ao capital para sobreviver, nas condições e
formas que o burguês assim o entender. A liberdade passa ser uma liberdade
condicionada, e a igualdade se concretiza apenas em dizer o sim para a celebração
do contrato de trabalho.
É fundamental que o jurista olhe o direito com os olhos de hoje, de ontem,
mas especialmente com os olhos do amanhã. O capitalismo é estruturalmente injusto.
Caberá então ao jurista buscar a construção de uma nova sociedade, estruturalmente
mais justa.
Os advogados, no dia a dia dos fóruns trabalham no sentido de que, ao final,
o juiz lhe profira uma decisão que seja favorável para os seus clientes. Ora, tal visão
145 MASCARO, Alysson Leandro. Introdução ao estudo do direito. p. 196.
58
futurística deve ser encarada sob uma visão mais ampla, no sentido de não buscar
uma adequada decisão que mudará a vida de clientes, mas de decisões políticas e
jurídicas que possibilitem a transformação da vida de todos os homens da sociedade,
tornando suas vidas melhores, sem a exploração do homem pelo homem e sem
misérias.
59
13 REFEFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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