UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS
A APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL NA NATURA: UM OLHAR
DOS LÍDERES E MEMBROS DE EQUIPES DE DESENVOLVIMENTO DE
NOVOS PRODUTOS
Roberto Zardo
São Paulo
2005
2
ROBERTO ZARDO
A APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL NA NATURA:
UM OLHAR DOS LÍDERES E MEMBROS DE EQUIPES DE
DESENVOLVIMENTO DE NOVOS PRODUTOS
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Administração
de Empresas da Universidade
Presbiteriana Mackenzie para
obtenção do título de Mestre em
Administração de Empresas.
Orientadora: Profª. Drª. Darcy Mitiko Mori Hanashiro
São Paulo
2005
3
REITOR DA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
Professor Doutor Manassés Claudino Fontele
DECANA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
Professora Doutora Sandra Maria Dotto Stump
COORDENADOR GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO
Professor Doutor José Geraldo Simões Júnior
COORDENADORA DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
DE EMPRESAS
Professora Doutora Eliane Pereira Zamith Brito
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha mãe Amélia (in memoriam) pela sua visão de futuro,
pela sua dedicação e por ter me mostrado o caminho da eterna aprendizagem.
À minha avó Margarida (in memoriam) pela sua forma carinhosa e sutil
de me incentivar a estudar.
À minha esposa Jussara pelo amor, compreensão e apoio incondicional
durante toda a jornada do meu curso de mestrado.
Aos meus filhos Cintia, Alisson (genro), Roberto Orlando, Iago, Maria Gabriela
e Marcelo pela possibilidade de estarem constantemente aprendendo e me ensinando.
Aos meus netos Rodrigo e Henrique, meus promissores mestres e aprendizes, pela
oportunidade que me proporcionam de vivenciar a beleza da renovação da vida.
5
AGRADECIMENTOS
A conclusão deste trabalho foi uma grande conquista pessoal e profissional que possibilitará
outras ainda maiores.
Agradeço em primeiro lugar a Deus pela paciência que teve com este seu humilde filho e ao
mesmo tempo por ter estado sempre ao meu lado em todos os momentos deste trabalho.
Agradeço amorosamente:
Aos meus mestres e facilitadores educacionais do Mackenzie Prof.o(a)s
Doutor(a)s: Arilda, Eliane,
Isabella, Mallú, Leonardo, Mário, Masseto, Reynaldo e Silvio.
Aos mestres Prof.o(a)s
Doutor(a)s Mallú e Roberto Ruas pelo incentivo, críticas e indicação de
caminhos que possibilitaram a melhoria deste trabalho.
As famílias Zatta, Zardo, Veiga e Silva que me apoiaram e torceram juntos pelo êxito do meu
trabalho.
A todos os colaboradores da Natura, em especial aos dirigentes pelo incentivo e permissão para
que a pesquisa fosse realizada, a Bianca, a Gláucia e a Roseli pela dedicação e apoio e aos doze
colaboradores que dedicaram parte de seu precioso tempo nas entrevistas.
Ao Sebastião pela inestimável ajuda na observação não participante e a Dagmar pela preciosa
cooperação em todos os momentos.
Aos meus parceiros de aprendizagem Prof.o(a)s
Doutor(a)s: Maria Cristina, Guiomar de Mello,
Joel Dutra e Bertero, as amigas Amália Giolo e Yara e ao amigo Paulo Giolo que tanto me
apoiaram e incentivaram para que eu pudesse concluir este trabalho.
Aos meus colegas de mestrado do Mackenzie: Gislaine, Gislene, Ione, Laura, Leni, Míriam,
Rejane, Vera, Caê, Celso, Edson, Eduardo, Luís, Luís Campos, Macau, Marcelo, Maurício,
Ricardo, Rogério, Sarkis e Walmon pelo companheirismo, ajuda e incentivo.
A todos que não citei mas que de alguma forma contribuíram para o êxito deste trabalho, minhas
desculpas pela omissão e meu eterno reconhecimento pela ajuda.
Um agradecimento especial à Prof.a Doutora Darcy Hanashiro que me fez compreender em toda a
amplitude o significado do que é uma exemplar orientação e sentir orgulho de ter sido seu
orientado.
6
RESUMO
A célere inserção das organizações em uma economia globalizada tem exigido uma capacidade
de aprender e aplicar conhecimentos mais rápido que os concorrentes e de desenvolver e
disponibilizar continuamente novos produtos e serviços para um mercado ávido por inovações.
Os processos de aprendizagem organizacional e liderança surgem como alternativas para que as
pessoas e as organizações possam melhorar a competitividade. O objetivo geral deste trabalho foi
compreender a atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional em equipes de
desenvolvimento de novos produtos em uma empresa de grande porte na indústria cosmética. A
pesquisa de campo, de natureza exploratória, do tipo qualitativa, constitui-se de entrevistas em
profundidade, com roteiro pré-definido, com doze profissionais, incluindo quatro líderes e suas
equipes de desenvolvimento de novos produtos. Os dados obtidos foram submetidos a técnica de
análise de conteúdo, usando-se a abordagem qualitativa com categorização temática. Os
resultados revelaram que a atuação do líder é o grande diferenciador no processo de
aprendizagem organizacional. O líder, na organização pesquisada, atua direcionando, facilitando
e administrando o processo de aprendizagem, que mostrou-se integrado e circular,
compreendendo as etapas de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento. Os
resultados permitiram depreender que a cultura de trabalho, que prioriza a rapidez e ciclos cada
vez mais curtos, aliada às variáveis do ambiente externo atuam como barreiras no processo de
aprendizagem. De forma oposta, a cultura da organização pesquisada, com base em um sólido
conjunto de crenças e de valores, mostrou-se nutridora do processo de aprendizagem e
facilitadora da atuação do líder, auxiliando-o na criação de um clima propício à aprendizagem.
Constatou-se que compartilhar foi o aspecto que se mostrou presente nas três etapas do processo
de aprendizagem e, que a organização pesquisada, por meio da vivência de crenças e de valores,
evidenciou que é uma organização que estimula seus colaboradores a compartilharem o
conhecimento. A atuação do líder como facilitador teve destaque em relação aos outros papéis de
orientador e administrador.
Palavras-chave: aprendizagem organizacional, liderança em equipes de desenvolvimento de
novos produtos, barreiras à aprendizagem organizacional, fatores facilitadores, cultura de
trabalho.
7
ABSTRACT
The rapid insertion of organizations in a global economy demands a capacity to learn and apply
knowledge faster than the competitors, continuously developing and offering new products and
services for a market that demands innovations. The processes of organizational learning and
leadership appear as an alternative for people and organizations to improve their competitiveness.
The general objective of this study was to understand the performance of the leader in the process
of organizational learning, focused in teams of new products‟ development in a large cosmetic
industry company. The field research, explorative and qualitative, consisted of twelve profound
interviews, based on pre-defined scripts, that included four leaders and theirs teams of new
products‟ development. The acquired data was submitted to a technique of content analysis, using
a qualitative approach with thematic categorization. The results disclosed that the performance of
the leader is the most important success topic in the process of organizational learning. The
leader in the studied organization conducts, facilitates and manage the learning process, which
revealed itself integrated and circular, including the stages of acquisition, sharing and retention of
the knowledge. The study infers that the work culture, which prioritizes velocity and shorting
cycles, allied with external environment variables act as barriers to the learning process. On the
other hand the culture of the studied organization, based in solid beliefs and values, encourages
the learning process and facilitates the leader‟s performance, assisting him to establish a
propitious environment for learning. The evidences point that “sharing” was an aspect presented
in all three stages of the learning process and that the studied organization, based on its beliefs
and values, encourages its associates to share the knowledge. The leader‟s performance as a
facilitator overshadowed his roles as an advisor or manager.
Keywords: organizational learning, leadership in new products development team, barriers to
organizational learning, factors that promote learning, organizational culture.
8
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................... 14
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Aprendizagem individual................................................................................................ 19
2.2 Criação do conhecimento................................................................................................ 24
2.3 Aprendizagem organizacional....................................................................................... 28
2.4 Resumo........................................................................................................................... 49
2.5 O conceito de liderança................................................................................................... 51
2.6 O líder em uma equipe de trabalho................................................................................ 55
2.7 Elos entre aprendizagem organizacional, criação do conhecimento e liderança de
equipes..................................................................................................................................
2.8 Resumo...........................................................................................................................
66
72
3. PROBLEMA DE PESQUISA, DELIMITAÇÃO E OBJETIVOS................................ 75
4. PROCEDIMENTO METODOLÓGICOS
4.1 Sobre a pesquisa qualitativa......................................................................................... 80
4.2 Explicitação do paradigma........................................................................................... 83
4.3 Tipo de pesquisa........................................................................................................... 85
4.4 O estudo de caso como estratégia de pesquisa............................................................. 87
4.5 Estratégia de amostragem............................................................................................. 91
4.6 O papel do pesquisador................................................................................................ 94
4.7 Técnica de coleta de dados........................................................................................... 97
4.8 Análise de dados...........................................................................................................
4.9 Resumo.........................................................................................................................
103
108
5. PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO DE NOVOS PRODUTOS
5.1 Contextualização da empresa pesquisada..................................................................... 109
5.2 Desenvolvimento de novos produtos na empresa pesquisada...................................... 116
9
5.3 Resumo ........................................................................................................................ 120
6. O PROCESSO DE TRATAMENTO DOS DADOS
6.1 Organização da análise................................................................................................... 121
6.2 Codificação................................................................................................................... 124
6.1 Categorização................................................................................................................. 126
7. A ANÁLISE E A INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
7.1 O multi-método (intra método) na prática............................................................................. 131
7.2 A caracterização da organização pesquisada e indicadores da cultura de trabalho................ 133
7.3 A caracterização dos entrevistados......................................................................................... 135
7.4 A aprendizagem organizacional: o processo, os fatores facilitadores, as barreiras e os
aspectos da cultura de trabalho da organização............................................................................
138
7.5 A atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional........................................... 153
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 176
LIMITAÇÕES DO ESTUDO................................................................................................ 187
RECOMENDAÇÕES................................................................................................................ 188
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................... 189
APÊNDICE A – Roteiro de entrevistas...................................................................................... 196
10
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Modelos de aprendizagem experiencial: ciclos de aprendizagem.......................... 23
Figura 2 Modelo de cinco fases do processo de criação do conhecimento........................... 27
Figura 3 Modelo integrado de aprendizagem organizacional e seus ciclos incompletos de
aprendizagem........................................................................................................................
32
Figura 4 Fatores contextuais que afetam a probabilidade de ocorrência da aprendizagem. 40
Figura 5 Culturas de trabalho................................................................................................ 41
Figura 6 Mudança e aprendizagem...................................................................................... 43
Figura 7 Os 4I‟s da aprendizagem organizacional............................................................... 46
Figura 8 Representação esquemática da teoria caminho-objetivo........................................ 63
Figura 9 Funções de desempenho do líder que contribuem para a eficácia da
equipe....................................................................................................................................
68
Figura 10 Modelo básico conceitual do trabalho................................................................. 74
Figura 11 A escada de abstração analítica............................................................................ 104
Figura 12 Representação esquemática do processo de aquisição do conhecimento............. 143
Figura 13 Representação esquemática do processo de compartilhamento do
conhecimento........................................................................................................................
146
Figura 14 Representação esquemática do processo de retenção do conhecimento.............. 149
Figura 15 Relação entre crenças, valores da organização pesquisada e o processo de
aprendizagem........................................................................................................................
150
Figura 16 Esquema do processo de aprendizagem em equipes de desenvolvimento de
novos produtos......................................................................................................................
151
11
Figura 17 Atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional........................... 174
Figura 18 Conjunto de crenças e valores da organização pesquisada e sua relação com a
forma de atuação do líder no processo de aprendizagem......................................................
175
Figura 19 Representação esquemática da atuação do líder no processo de aprendizagem
em equipes de desenvolvimento de novos produtos.............................................................
185
12
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Enfoques teóricos à aprendizagem e ao ensino..................................................... 21
Quadro 2 Condições capacitadoras da criação do conhecimento organizacional................ 26
Quadro 3 Níveis de aprendizagem organizacional.............................................................. 29
Quadro 4 Tipologia do conhecimento.................................................................................. 33
Quadro 5 Teorias em uso – Modelos I e II.......................................................................... 36
Quadro 6 Constructos e processos relacionados com aprendizagem organizacional.......... 37
Quadro 7 Atributos chave de culturas de trabalho................................................................ 42
Quadro 8 Blocos constitutivos do desenvolvimento da teoria de aprendizagem
organizacional.......................................................................................................................
44
Quadro 9 Fatores orientadores e facilitadores da aprendizagem......................................... 48
Quadro 10 Tarefas básicas para o líder de equipes de aprendizagem organizacional......... 56
Quadro 11 Espectro de respostas em discussões de aprendizagem...................................... 57
Quadro 12 Liderança no processo de aprendizagem organizacional.................................... 59
Quadro 13 Dimensões dos atributos da liderança e alguns exemplos de comportamento
ou ações ................................................................................................................................
61
Quadro 14 Comportamentos observados de acordo com os estilos de liderança................. 64
Quadro 15 Comparativo entre comunidades de prática e outras equipes............................. 65
Quadro 16 Comparação dos três modelos gerenciais no processo de criação do
conhecimento........................................................................................................................
66
Quadro 17 Proposições para o processo de liderança funcional........................................... 71
Quadro 18 Perguntas essenciais para o planejamento adequado de uma pesquisa............... 75
13
Quadro 19 Estágios cognitivos possibilitadores de ações intelectuais................................. 78
Quadro 20 A estrutura de premissas básicas que caracterizam o debate entre objetividade
e subjetividade nas Ciências Sociais.....................................................................................
84
Quadro 21 Testes, táticas e referências recomendadas para estudo de caso......................... 89
Quadro 22 Estratégias de amostragem na pesquisa qualitativa............................................ 92
Quadro 23 Fontes de evidências e seus pontos fortes e fracos............................................. 97
Quadro 24 Enfoques da entrevista de pesquisa..................................................................... 100
Quadro 25 Síntese das principais etapas e procedimentos metodológicos........................... 108
Quadro 26 Conjunto dos valores da Natura.......................................................................... 113
Quadro 27 Conjunto das crenças da Natura.......................................................................... 114
Quadro 28 Funil de Inovação da Natura............................................................................... 118
Quadro 29 Principais responsabilidades das equipes de projetos......................................... 119
Quadro 30 Etapa de tratamento dos dados............................................................................ 124
Quadro 31 Etapa de categorização........................................................................................ 125
Quadro 32 Categorias de análise para aquisição, compartilhamento e retenção do
conhecimento........................................................................................................................
127
Quadro 33 Categorias de análise da atuação do líder........................................................... 128
Quadro 34 Caracterização da organização pesquisada......................................................... 133
Quadro 35 Caracterização dos entrevistados........................................................................ 135
Quadro 36 O Funil de Inovação nos processos de aquisição, compartilhamento e
retenção do conhecimento.....................................................................................................
152
Quadro 37 Categorias de análise da atuação do líder no processo de aprendizagem........... 154
14
1. INTRODUÇÃO
As organizações que atuam no Brasil têm experimentado um processo acelerado de
inserção em uma economia globalizada, exigindo que busquem incessantemente alcançar altos
índices de competitividade. A aprendizagem organizacional surge como um meio para auxiliar
nessa tarefa. Para Loiola e Bastos (2003), o tema aprendizagem organizacional é alvo de intensa
pesquisa na comunidade científica internacional e objeto de vasta literatura de divulgação
científica para gestores e consultores. Segundo os autores, esse interesse crescente pelo tema
objetiva encontrar, na produção acadêmica, resultados que possam ser úteis no delineamento de
agenda de pesquisa para equacionar os dilemas chave e preencher lacunas claramente
perceptíveis na área de aprendizagem organizacional. Os autores ao examinarem artigos sobre
aprendizagem organizacional chegaram a algumas conclusões: a) concentração da produção
acadêmica em seis instituições de pós graduação, b) as bases conceituais têm um domínio de
autores de origem anglo-saxônica, c) uso de métodos empíricos e desenvolvidos, em sua maioria
em macro processos organizacionais e d) debate teórico entre aprendizagem organizacional e
organizações de aprendizagem. Zardo (2003), ao estudar a produção brasileira de artigos sobre
aprendizagem organizacional, publicados nos Anais do Encontro Nacional da Associação
Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração (ENANPAD) no período de 1997
a 2003, constatou que a aprendizagem organizacional continua sendo objeto de estudo e de
produção crescente de artigos. O estudo confirmou a existência de um polo produtor de artigos e
que doze autores respondem por dois terços dessa produção, sendo que Argyris, Senge e Fleury
foram os mais citados. Todavia, ficaram evidenciadas algumas lacunas, dentre elas a falta de
15
trabalhos científicos analisando o processo de aprendizagem organizacional, dentro das
organizações e a atuação dos líderes nesse processo.
Segundo Nevis, DiBella e Gould (1998), o interesse pela aprendizagem organizacional
tem crescido nos últimos anos. Esse crescimento é em função do declínio de algumas empresas
bem estabelecidas e pelo acirramento da concorrência, que acaba diminuindo a capacidade das
empresas fazerem frente ao fenômeno da globalização. Stata (1997) afirma que o ritmo em que as
pessoas e as organizações aprendem pode ser a única vantagem competitiva sustentável. Portanto,
existe hoje uma preocupação sobre aprendizagem organizacional enquanto ferramenta, um meio
para a competitividade.
Easterby-Smith e Araujo (2001), ao discorrerem sobre a literatura de aprendizagem
organizacional, argumentam a existência de uma concentração na observação e análise
distanciada dos processos envolvidos em aprendizagens individuais e coletivas dentro das
organizações.
Para De Geus (1997), talvez a única vantagem competitiva das organizações atuais seja a
capacidade de seus líderes em promoverem o processo de aprendizagem e aplicarem esse
aprendizado mais rápido do que os concorrentes.
Senge (2002) argumenta que cabem, aos líderes, três novos papéis em substituição ao
velho clichê do líder “herói salvador da pátria”. O primeiro é o líder atuando como designer das
idéias, crenças, valores e propósitos da organização, ou nas palavras de Senge, o líder projetista.
O segundo, o líder professor, reforça o trabalho do líder como facilitador do processo em que as
pessoas reestruturam suas visões da realidade. O terceiro, o líder como regente (steward), é mais
sutil que os dois anteriores e pressupõe que o líder atue tanto servindo suas equipes de liderados
quanto ao propósito maior da organização.
16
Garvin (2002) menciona três tarefas básicas do líder no processo de aprendizagem
organizacional. A primeira é projetar cenários e eventos que induzam a criação de oportunidades
de aprendizagem, ou seja, similar aquela apontada por Senge como o líder projetista. A segunda é
aquela na qual o líder estabelece clima e tom adequados para que a aprendizagem ocorra,
nutrindo normas e comportamentos de engajamento adequados. A terceira tarefa é a de liderar o
processo de discussão.
Nonaka e Takeuchi (1997) chamam a atenção para o papel desempenhado pelos gerentes
de nível médio no processo de liderança facilitadora da criação do conhecimento organizacional.
Os autores argumentam que o conhecimento é criado pelos líderes de equipe que se encontram no
nível hierárquico intermediário das organizações. Nonaka (2000) menciona três papéis que um
gerente/líder deve desempenhar. O primeiro, apontado pelo autor como o mais importante, é o de
direcionador do caos para criação de conhecimentos predeterminados. O segundo é na articulação
de metáforas, símbolos e conceitos orientatativos das atividades de criação de conhecimento entre
os colaboradores. O terceiro é a definição de padrões para justificar o valor do conhecimento em
contínuo desenvolvimento pelos colaboradores.
Ambos os temas mencionados anteriormente, aprendizagem organizacional e liderança,
possuem uma vasta gama de possibilidades de estudo. Portanto, é mister focalizar alguns de seus
aspectos. Garvin (2002) e Kim (1993) argumentam a existência de um processo de transição
entre a aprendizagem individual para a organizacional. Garvin (2002) afirma que cabe tanto aos
gerentes quanto aos líderes terem como meta a melhoria do processo de aprendizagem
organizacional. Lyles (2001) argumenta que o conhecimento pode ser transferido entre
indivíduos, equipes e organizações. Para Nonaka e Takeuchi (1997), o conhecimento é um
processo dinâmico com base nas dimensões ontológica e epistemológica. Huber (1991) por sua
vez, afirma que uma organização aprende quando, por meio do processamento de informação,
17
incrementa a probabilidade para que suas ações futuras resultem em uma melhoria de
desempenho.
Considerando o que foi exposto até este ponto, parecem existir algumas lacunas na
produção de pesquisas sobre os temas aprendizagem organizacional e liderança. Percebe-se
também que o processo de desenvolvimento de produtos é uma área interessante para pesquisar-
se conjuntamente os temas mencionados. Outro ponto que emerge dos posicionamentos de
autores clássicos é o relacionamento entre a criação do conhecimento e a aprendizagem
organizacional. Os autores que escrevem sobre criação do conhecimento (Nonaka, Takeuchi,
Terra, Prusak, Davenport, Klein entre outros) têm um foco amplo no conhecimento. Pouco ou
quase nada é escrito sobre aprendizagem organizacional. Por outro lado, os autores clássicos que
escrevem sobre aprendizagem organizacional (Argyris, Schön, Senge, Lyles, Fiol, DiBella,
Nevis, Gould, Huber, Garvin, De Geus, Valença, Kim entre outros) têm abordagens que
transcendem o conhecimento. Para esses autores, o cerne da aprendizagem organizacional está no
relacionamento entre as pessoas, ou seja, aprendizagem organizacional é algo maior do que a
simples criação e transferência de conhecimento.
O objetivo deste trabalho é contribuir para as organizações por meio da compreensão da
atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional do conhecimento criado em
equipes de desenvolvimento de produtos. O problema de pesquisa deste trabalho é: De que forma
a atuação do líder contribui para o processo de aprendizagem organizacional do conhecimento
criado nas equipes de desenvolvimento de novos produtos? Será estudada a aprendizagem
organizacional e a atuação do líder em equipes de uma empresa na indústria cosmética. A escolha
considerou a necessidade mercadológica que esta indústria tem de lançar, regularmente, uma
grande quantidade de novos produtos. Normalmente uma empresa nesse segmento industrial
desenvolve, anualmente, novos produtos em média de 20% a 40% do seu portifólio. Esses novos
18
produtos são geralmente desenvolvidos por meio de equipes de projetos. Cada equipe de projeto
tem alguém atuando como líder. Acredita-se que os temas aprendizagem organizacional da
criação do conhecimento e atuação do líder no processo de desenvolvimento de novos produtos
possam ser adequadamente estudados ao serem analisadas algumas equipes de projetos de
desenvolvimento de novos produtos.
19
2. REFERENCIAL TEÓRICO
“Mestre é aquele de repente, aprende”.
Guimarães Rosa
Será construída uma linha de raciocínio com base em autores clássicos que escrevem a
respeito dos temas aprendizagem, criação do conhecimento e liderança. Serão discutidas
definições de aprendizagem individual e organizacional. Procurar-se-á estabelecer um elo entre
os processos de criação do conhecimento e a aprendizagem organizacional. Será discutida a
relação entre liderança e aprendizagem organizacional. Também serão abordados aspectos
facilitadores e orientadores da aprendizagem organizacional. Modelos de aprendizagem
experiencial e ciclos de aprendizagem também serão mencionados.
2.1. Aprendizagem Individual
Senge (2003), ao pesquisar o significado de aprendizagem individual, encontrou no
ideograma chinês que representa esse conceito, composto por dois caracteres, uma pista
interessante. O primeiro caracter, composto por duas partes, significa estudar. Na primeira parte é
encontrada a simbologia do conhecimento acumulado e a segunda parte, sobreposta à primeira,
simboliza uma criança na soleira de uma porta. O segundo caractér, também composto de duas
partes, significa praticar constantemente. Na primeira, isto é representado por um pássaro
desenvolvendo habilidades para deixar o ninho, também representando a juventude. A segunda
simboliza o vôo desse pássaro. Em resumo, parece que os orientais entendem aprendizagem
20
como um processo contínuo de estudo e prática conjunta, talvez remetendo também à idéia de
liberdade e autonomia. Senge (2003) sintetiza que a aprendizagem para a mente do oriental tem o
significado de maestria na forma de se auto-desenvolver. No entanto, para Nonaka e Takeuchi
(1997), a tradição intelectual japonesa difere da ocidental, fundamentada no racionalismo e na
fragmentação, por considerar três premissas básicas: a unidade do homem e da natureza; a
unidade do corpo e da mente; e a unidade do eu e do outro.
Tomando “emprestado” alguns conceitos de eminentes educadores sobre o processo de
aprendizagem individual e criação do conhecimento, pode-se fazer uma ponte com o tema
aprendizagem organizacional. Morin (2003, p. 20) afirma que o “conhecimento não é um espelho
das coisas ou do mundo externo. Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções ou sinais
captados e codificados pelos sentidos”. O autor aponta que o conhecimento quando assume a
forma de palavras, de idéias, de teorias é fruto de uma tradução/reconstrução por meio da
linguagem e do pensamento. Consequentemente sujeito ao erro. Mello (1998) complementa as
afirmações de Morin, agregando o conceito de contextualização de conteúdo, que, segundo a
autora, significa primordialmente, assumir que todo conhecimento envolve uma relação entre
sujeito e objeto. Por esta razão, quase sempre o conhecimento se vale de uma transposição
didática, na qual a linguagem assume papel decisivo. A autora acrescenta que é possível
generalizar a contextualização como recurso possibilitador da aprendizagem ao associá-la com
experiências de vida cotidiana ou com os conhecimentos adquiridos de forma espontânea.
Dierkes et al. (2003) indicam que aprendizagem individual geralmente é mencionada
como um elo muito próximo da psicologia. Para os autores, existem abordagens sociológicas,
antropológicas, econômicas, políticas e históricas quando se estuda o processo de aprendizagem.
Este trabalho utilizará a abordagem psicológica em virtude da aderência com os temas que serão
pesquisados. Maier, Prange e Rosenstiel (2003) afirmam que todos os organismos são capazes de
21
aprender de diferentes formas, em um processo evolutivo ou adaptativo. Para as autoras, a
aprendizagem é vista como um processo, que a literatura de aprendizagem organizacional
enquadra em três conceitos básicos: teorias comportamentais, baseadas em condicionamento
clássico e instrumental; teorias de aprendizagem sociais; e teorias de processamento de
informação e memória.
Para Moreira (1999), existem três vertentes teóricas sustentando os principais modelos de
aprendizagem individual. A primeira baseia-se no modelo comportamentalista com foco nos
comportamentos observáveis e mensuráveis. A segunda, com base no modelo cognitivo que
enfatiza o ato de conhecer e trata, principalmente, dos processos mentais. A terceira é a vertente
do humanismo, em que o aprendiz é visto em sua totalidade (sentimentos, pensamentos e ações).
O Quadro 1 resume de forma sintética as três filosofias subjacentes às teorias de aprendizagem,
segundo o autor.
Quadro 1 Enfoques teóricos à aprendizagem e ao ensino
Comportamentalismo Cognitivismo Humanismo
Ênfase Comportamentos
observáveis.
Cognição. Pessoa.
Conceitos básicos Estímulo, resposta,
condicionamento,
reforço, objetivo
comportamental.
Esquema, signo,
modelo mental,
constructo pessoal.
Aprender a aprender,
liberdade para
apreender, ensino
centrado no aluno,
crescimento pessoal.
Idéia-chave O comportamento é
controlado por suas
conseqüências.
O conhecimento é
construído.
Pensamentos,
sentimentos e ações
estão integrados.
Autores Pavlov, Watson,
Guthrie, Thorndike,
Skinner.
Piaget, Bruner,
Vigotsky, Johnson-
Laird, Ausubel, Kelly.
Rogers.
Fonte: Adaptado de Moreira (1999, p. 18)
22
Para Kolb (1976), a aprendizagem organizacional está baseada em uma abordagem de
aprendizagem individual, que propõe que a aprendizagem ocorra baseada na experiência, e é
concebida como um processo de quatro fases. Segundo esse autor, o ciclo se constitui em: “A
experiência concreta imediata é a base para observação e reflexão. Essas observações são, então
assimiladas em uma teoria, da qual novas implicações para a ação podem ser deduzidas. Essas
implicações ou hipóteses servem então como guias para a ação, para criar novas experiências.”
(KOLB, 1976, p. 21).
Essa teoria pressupõe que o aprendiz precisa ter diferentes habilidades para que seu
processo de aprendizagem seja eficaz. As habilidades compreendem: envolver-se em
experiências novas, concretas de maneira aberta e sem preconceitos; ser capaz de refletir e
observar essas experiências de diferentes pontos de vista; ser capaz de criar conceitos e integrar
suas observações em teorias lógicas ou coerentes; e ser capaz de usar essas teorias para decidir e
resolver problemas. Assim, no processo de aprender, o indivíduo oscila em diversos graus entre
ser ator e ser observador, vivenciando momentos de um envolvimento específico e momentos de
afastamento analítico genérico. Segundo o autor, desenvolver igualmente todas essas capacidades
é difícil. O que ocorre freqüentemente é as pessoas desenvolverem um estilo de aprendizagem
que enfatiza algumas habilidades de aprendizagem em detrimento de outras.
Kim (1993), ao analisar os modelos de aprendizagem experiencial, provoca uma reflexão
ao discutir autores como Lewin, Deming, Schein, Argyris & Schön e Kofman. Os modelos de
aprendizagem desses cinco autores são sintetizados na Figura 1, na qual se observa uma certa
aproximação entre os modelos de Lewin, Kofman, Schein e Argyris & Schön que, de acordo,
com Argyris, poderiam ser considerados como modelos de circuito duplo. Esses modelos têm
como estratégia básica a busca pela inovação e pela diferenciação. O modelo de Deming, embora
com ciclo similar aos demais, é na realidade um modelo típico de circuito simples, ou seja, de
23
manutenção e de busca da excelência operacional. Os termos usados na Figura 1 foram mantidos
na língua original (inglesa) para preservar a fidedignidade da informação. Os números que
precedem os termos indicam a seqüência original nos modelos dos autores. As cores procuram
agrupar as etapas similares.
Figura 1 Modelos de aprendizagem experiencial: ciclos de aprendizagem
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Kim (1993, p. 38-39).
Deming
1. Plan
2. Do
3. Check
4. Act
Argyris
& Schön
1. Discovery
3. Production4. Generalization
2. Invention
Kofman
1. Observe
3. Design
2. Asses
4. Implement
Lewin
2. Observation
1. Concrete
experience
3. Generalization
4. Testing
Schein
1. Observation
2. Emotional
3. Reaction
4. Judgment
5. Intervention
24
2.2. Criação do Conhecimento
O processo de aprendizagem individual pode, de acordo com Garvin (2002), ser encarado
como uma atividade natural dos seres humanos que ocorre ao longo do tempo. Como possível
resultado desse processo emerge, a criação do conhecimento, ou seja, uma pessoa ao apreender
está de certo modo criando algum tipo de conhecimento. Nonaka e Takeuchi (1997), ao
compararem as empresas ocidentais com as japonesas afirmam que as últimas obtêm sucesso por
criarem conhecimento e, dessa forma, inovarem e se diferenciarem em um ambiente globalizado
competitivo. Os autores complementam colocando que as empresas ocidentais têm uma visão
mecanicista da organização, focadas nos conhecimentos explícitos, ao passo que as japonesas têm
uma visão de empresa como organismo vivo, focadas nos conhecimentos tácitos. Os autores
consideram o conhecimento como um processo humano dinâmico de justificar a crença pessoal
com relação à “verdade”. Consideram também que o aprendizado mais poderoso é aquele que
vem da experiência direta.
Nonaka e Takeuchi (1997) indicam que a criação do conhecimento possui duas
dimensões. A primeira é a ontológica, em que o conhecimento só é criado por indivíduos e,
posteriormente é compartilhado em níveis grupais, organizacionais e interorganizacionais. A
segunda é a epistemológica, que os autores se basearam em Polanyi (1966) que estabeleceu a
distinção entre conhecimento tácito e explícito. A conversão do conhecimento tácito para o
explícito é um processo social entre pessoas, possui quatro possibilidades que apresentam cada
qual um conteúdo de conhecimento:
A primeira é chamada de socialização e visa o compartilhamento do conhecimento tácito,
por exemplo, por meio de treinamento. O conteúdo gerado nessa possibilidade é o
conhecimento compartilhado;
25
A segunda é a externalização que objetiva explicitar o conhecimento tácito por meio de
metáforas, analogias, conceitos, hipóteses ou modelos. O conteúdo gerado nessa segunda
possibilidade é o conhecimento conceitual;
A terceira é a combinação de conjuntos distintos de conhecimentos explícitos, que pode
ser operacionalizado por meio de documentos, reuniões, conversas ou redes de
comunicação via computador. Conhecimento sistêmico é o conteúdo gerado nessa terceira
possibilidade de conversão;
A quarta possibilidade é a internalização, na qual o conhecimento explícito é incorporado
no tácito, com um forte apelo ao aprender fazendo. O conteúdo gerado é o conhecimento
operacional (know how).
Nonaka e Takeuchi (1997) indicam cinco condições capacitadoras da criação do
conhecimento organizacional explicitadas no Quadro 2 e suas respectivas formas de
operacionalização. Condições capacitadoras promovem a criação do conhecimento dentro das
organizações, fornecendo o contexto apropriado para facilitar as atividades em equipe, a criação e
o acúmulo do conhecimento individual.
26
Quadro 2 Condições capacitadoras da criação do conhecimento organizacional
Condição Definição Operacionalização
Intenção Aspiração de uma organização às suas
metas. A essência da estratégia está no
desenvolvimento na capacidade
organizacional de adquirir, criar, acumular
e explorar o conhecimento.
Estimular o compromisso dos
colaboradores, mediante de
perguntas como: “O que é
verdade? O que é ser humano?
O que é vida?”
Autonomia Capacidade de todos os colaboradores de
uma organização para agir de forma
autônoma de acordo com as circunstâncias.
Estímulo a criação de equipes
auto-gerenciadas, equipes de
projetos.
Flutuação e
caos criativo
Adoção de atitude aberta em relação aos
sinais ambientais, explorando a
ambigüidade para aprimorar o sistema de
conhecimento.
Enfrentamento de crises, visões
ambíguas, estabelecimento de
metas arrojadas.
Redundância Superposição consciente de informação,
atividades e responsabilidades que
transcendem as exigências operacionais
imediatas dos colaboradores da
organização.
Estímulo a competição sadia
interna , uso de job rotation,
livre acesso as informações.
Variedade de
requisitos
Capacidade da organização em
corresponder à variedade e à complexidade
do ambiente de modo a permitir que ela
enfrente os desafios impostos pelo
ambiente.
Adoção de estruturas
organizacionais do tipo
biofuncional, flexibilidade e
rapidez no acesso às
informações.
Fonte: Adaptado de Nonaka e Takeuchi (1997, p. 83-95).
Após a análise das quatro formas de conversão e das cinco condições capacitadoras que
promovem a criação do conhecimento organizacional, Nonaka e Takeuchi (1997) propuseram um
modelo de cinco fases do processo de criação do conhecimento. A primeira fase é o
compartilhamento do conhecimento tácito, que demanda um “campo” adequado onde os
colaboradores possam interagir uns com os outros por meio de diálogos pessoais. A segunda fase
é a criação do conhecimento ou externalização (passagem do conhecimento tácito para o
explícito), que é facilitada pelo uso de múltiplos métodos de raciocínio, como dedução, indução e
abdução. A terceira fase é a justificativa de conceitos, ou seja, a justificação das crenças
verdadeiras em procedimentos. A formulação conjunta da estratégia e visão é um processo
27
facilitador dessa fase. A quarta fase é a construção de um arquétipo: algo tangível ou concreto,
por exemplo, um protótipo no caso de desenvolvimento de produtos. A cooperação dinâmica
entre todas as áreas de uma organização é indispensável para o sucesso dessa construção. A
quinta fase é a difusão interativa do conhecimento, aonde o conhecimento que se torna real pode
desencadear novos ciclos de criação, alimentando, dessa forma, a espiral do conhecimento. A
Figura 2 explicita o modelo das cinco fases.
Figura 2 Modelo de cinco fases do processo de criação do conhecimento
Fonte: Nonaka e Takeuchi (1997, p. 96)
Comparti-
lhamento do
conhecimento
Criação
de
conceitos
Construção
de um
arquétipo
Justificação
de
conceitos
Novo ciclo
de criação do
conhecimento
Condições capacitadoras
Intenção
Autonomia
Flutuação/Caos criativo
Redundância
Variedade de requisitos
Socialização Externalização Combinação
Internalização
Conhecimento explícito
na organização
Conhecimento tácito
na organização
De organizações
colaboradoras
Conhecimento de usuários
tácito
Mercado
Internalização
pelos usuários
Conhecimento explícito como
anúncios, patentes, produto/serviço
28
2.3. Aprendizagem Organizacional
Vimos que as pessoas aprendem naturalmente por meio de um processo de aprendizagem
individual. Notamos também que o “produto” dessa aprendizagem pode ser a criação do
conhecimento. Mas será que: “a aprendizagem organizacional poderia ser pensada com base na
mesma lógica do processo de aprendizagem individual?” ou “a aprendizagem é eminentemente
um processo individual que transita para grupos e organizações, ou existiria efetivamente um tipo
de „aprendizagem coletiva‟?” (RUAS, In: FLEURY e OLIVEIRA JÚNIOR, 2001, p. 253).
Responder essas questões será o foco desta parte do referencial teórico.
Dierkes et al. (2003) mencionam que Argyris, Schön, March e Olsen são freqüentemente
citados como os pioneiros nos estudos sobre aprendizagem organizacional. Para Argyris e Schön
(1978), a aprendizagem organizacional é um processo pelo qual os colaboradores detectam erros
ou desvios e os corrigem ao reestruturar a teoria em uso da organização. Argumentam, também,
que ela ocorre de duas formas. Uma é chamada de circuito simples, em que basicamente é feita
uma pergunta de única dimensão para que seja deduzida uma resposta unidimensional. O
exemplo utilizado por Argyris é o termostato, aparelho que mede a temperatura ambiente em
relação a um valor que foi padronizado por alguém e que irá ligar e/ou desligar toda vez que a
temperatura estiver fora dos padrões determinados. A transição é binária e a maior preocupação é
com a manutenção de um determinado estado. A outra chamada de aprendizagem em circuito
duplo, usa uma ou mais etapas adicionais. Nesse tipo de aprendizagem a pergunta é devolvida ao
seu proponente. Voltando ao exemplo do termostato, a aprendizagem em circuito duplo questiona
o valor definido como padrão e, também, se a fonte de calor presente seria o meio mais eficaz
para alcançá-lo. Na aprendizagem de circuito duplo, as perguntas são feitas não apenas sobre
fatos objetivos, mas também sobre as razões e motivos existentes por trás deles.
29
Para Lyles (2001), existe o pressuposto que o conhecimento pode ser transferido entre
pessoas, equipes e organizações. A autora descreve a estrutura da aprendizagem como cíclica.
Fiol e Lyles (1985) agregam o conceito de dois níveis de aprendizagem organizacional à
discussão. O primeiro, chamado de nível mais baixo (lower-level), é aquele no qual a
aprendizagem ocorre por mera repetição das experiências passadas. Geralmente é um nível
baseado no curto prazo, na superficialidade e na temporalidade. Esse nível também pode ser
caracterizado como de circuito simples, baseado em rotinas e em conhecimento explícito. O
segundo nível, denominado mais alto (higher-level), considera o desenvolvimento de regras
complexas e associações com ações inovadoras. O entendimento das causas é primordial e o
desenvolvimento e o aprendizado envolvem toda a organização. O modelo de circuito duplo é
usado, já que as normas, estruturas, referências e premissas são constantemente mudadas. Esse
conhecimento de nível mais alto é o tácito. O Quadro 3 reflete esses dois níveis de aprendizagem
organizacional, suas características, conseqüências e apresenta alguns exemplos de cada um dos
níveis.
Quadro 3 Níveis de aprendizagem organizacional
Nível mais baixo (lower-level) Nível mais alto (higher level)
Definições Foca aprendizagem como mera
repetição de comportamentos passados
– geralmente de curto prazo,
superficial, temporária, mas com
associação sendo formadas. Captura
apenas certos elementos – ajustamentos
de parte daquilo que a organização faz.
Circuito simples. Nível de rotina.
Desenvolvimento de regras complexas e
associações relativas à novas ações.
Desenvolvimento do entendimento de causa
e efeito. Aprendizagem afetando a
organização em seu todo. Circuito duplo.
Regras gerais, estruturas de referência e
mudança de premissas.
Características Ocorre através da repetição;
Rotina;
Controle sobre tarefa imediata,
regras, estruturas;
Contexto bem entendido;
Ocorre em todos os níveis da
organização.
Ocorre através do uso de insights e
houristics;
Não rotineira;
Desenvolvimento de estruturas e regras
diferenciadas, para lidar com a falta de
controle;
Contexto ambíguo;
30
Nível mais baixo (lower-level) Nível mais alto (higher level)
Maior ocorrência nos níveis mais altos.
Conseqüências Resultados comportamentais Insights, houristics e conscientização
coletiva
Exemplos Institucionalização de regras
formais;
Ajustamentos nos sistemas
gerenciais;
Habilidades de resolução de
problemas.
Novas missões e novas definições de
direcionamento;
Agendamento;
Habilidades para definir problemas;
Desenvolvimento de novos mitos,
histórias e cultura.
Fonte: Adaptado de Fiol e Lyles (1985, p. 810)
A exemplo de Lyles (2001), Kim (1993) defende que o aprendizado organizacional é um
processo de transferência do aprendizado individual e que a organização pode aprender
independentemente de pessoas específicas, mas não de todas as pessoas. O autor resgata o papel
da memória, buscando na psicologia o conceito de que aprendizagem é equivalente a aquisição de
conhecimento e que a memória é o processo pelo qual esse conhecimento adquirido é retido.
Visto de forma linear, poder-se-ia dizer que a memória armazenada cria uma estrutura que afeta o
processo mental e as ações do indivíduo, desembocando no que se conhece como modelo mental
individual, em que a pessoa desenvolve sua visão de mundo. Visão essa baseada em estruturas e
rotinas que provem o contexto, a codificação dos recursos e identificam o que faz sentido para o
indivíduo. Na seqüência, ocorre a transferência do que a pessoa aprendeu para a organização.
Kim (1993) afirma que as organizações também têm modelos mentais, rotinas, memórias,
procedimentos, e que esse conjunto permite que elas tomem suas decisões. O autor chama a
atenção para o que define como elo perdido entre a aprendizagem individual e a aprendizagem
organizacional, que nada mais é do que a falta de consideração na maioria dos modelos sobre o
papel dos indivíduos e suas interações com os demais e com o ambiente.
Kim (1993) propõe um modelo integrado de aprendizagem organizacional, conforme a Figura
3. Nesse modelo é explorado o processo de transferência da aprendizagem individual para a
31
organizacional. O autor observa ainda, como identificado pelos números na Figura 3, sete
desconexões que tornam a aprendizagem organizacional incompleta:
1. Aprendizagem limitada pelo papel – quando a aprendizagem individual não é efetiva no
indivíduo, em função de seu papel restritivo (rompimento do círculo de aprendizagem);
2. Aprendizagem pela audiência – indivíduo pode afetar a ação da organização de modo
ambíguo;
3. Aprendizagem supersticiosa – falta de conexão entre a ação organizacional e a resposta do
ambiente;
4. Aprendizagem sob ambigüidade – falta de clareza na relação de causa e efeito entre ações
organizacionais e respostas ambientais;
5. Aprendizagem situacional – rompimento entre a aprendizagem individual e o modelo
mental individual. Por exemplo, gerenciamento de crise;
6. Aprendizagem fragmentada – os indivíduos aprendem, mas as organizações nem sempre.
Por exemplo, algumas Universidades;
7. Aprendizagem oportunística – ocorre quando pessoas ou pequenos grupos “desobedecem”
os padrões normais da organização. Por exemplo, o desenvolvimento do carro Saturn da
GM e o computador pessoal da IBM.
32
Figura 3 Modelo integrado de aprendizagem organizacional e seus ciclos incompletos de
aprendizagem
Fonte: Adaptado de Kim (1993, p. 47)
Lyles (2001) considera a aprendizagem como um fluxo contínuo que se auto reproduz, ou
seja, é algo dinâmico, um processo. Para a autora a natureza da aquisição do conhecimento pode
ser descrita em quatro pontos:
A aquisição do conhecimento está baseada em percepção;
Conhecimento explícito pode ser conquistado e codificado;
A aprendizagem depende de modelos mentais compartilhados;
As pessoas necessitam se envolver ativamente.
Aprendizagem individual
1. Observar
4. Implementar
Operacional (know how)
2. Avaliar
3. Projetar
Conceitual (know why)
Estruturas
Rotinas
Modelos mentais - Individuais
Weltanschauung
Rotinas organizacionais
Modelos mentais compartilhados Ação organizacional
Ação individual
Resposta do ambiente
7
Aprendizagem oportunística
5 55
Aprendizagem situacional
6 6 Aprendizagem fragmentada
AOCS
AICS
AOCD
AICD
ACD
ACS
1
2
3
4
Aprendizagem limitada
pelo papel
Aprendizagem pela
audiência
Aprendizagem sob
ambigüidade
3
Aprendizagem supersticiosa
AICD = Aprendizagem individual de circuito duplo
AICS = Aprendizagem individual de circuito simples
AOCD = Aprendizagem organizacional de circuito duplo
AOCS = Aprendizagem organizacional de circuito simples
ACD = Aprendizagem de circuito duplo
ACS = Aprendizagem de circuito simples
33
Oliveira Jr., Fleury e Child (2001) apontam que a aprendizagem é um processo que muda o
estado do conhecimento de uma pessoa ou de uma organização.
Considerando o que foi mencionado anteriormente, parece conveniente uma classificação
dos distintos tipos de conhecimento. Choo (2003) apresenta uma tipologia do conhecimento com
base em Boisot (1995), conforme o Quadro 4. O autor amplia a tipologia criando uma
diferenciação do conhecimento em três níveis:
Tácito, conhecimento implícito usado pelas pessoas da organização para realizarem seus
trabalhos e darem sentido ao seu mundo;
Explícito, conhecimento que pode ser expresso formalmente com uso de sistema
simbólico e com facilidade de comunicação;
Cultural, estruturas cognitivas e emocionais que normalmente são usadas pelas pessoas da
organização para perceber, explicar, avaliar e construir a realidade.
Quadro 4 Tipologia do conhecimento
Codificado: pode ser
escrito/armazenado sem
perdas significativas de
informação
Privado: conhecimento desenvolvido
e codificado que faz sentido somente
para seus criadores. Conhecimento
explícito.
Público: conhecimento em
sociedade e que pode ser
encontrado de forma
estruturada e registrada.
Conhecimento explícito.
Não codificado: não pode
ser escrito/armazenado
sem perdas essenciais
Pessoal: é aquele que nasce da
experiência própria, não acessível
aos outros e sem contexto para
debate. Conhecimento tácito.
Senso comum: é aquele
adquirido gradualmente ao
longo da vida por meio de
experiências pessoais e sociais.
Não disseminado: conhecimento que
permanece fechado dentro de
alguém.
Disseminado: conhecimento
compartilhado amplamente.
Conhecimento cultural.
Fonte: Adaptado de Choo (2003, p. 187)
34
Choo (2003), com base em Cyert e March (1963, 1992), aponta quatro tipos de
procedimentos baseados em regras, quando o tema é conhecimento explícito:
Regras para o desempenho de tarefas – especificam os métodos para a conclusão de
tarefas da organização, como Normas e Procedimentos. Isto é importante porque
incorpora e facilita a transferência do conhecimento adquirido no passado. Essa regra
também facilita a coordenação, permitindo que a solução encontrada por uma equipe é
coerente com muitas outras que estejam sendo desenvolvidas em outro local ou
projeto da organização;
Regras para manutenção de registros – especificam quais registros devem ser feitos e
mantidos pela organização. No curto prazo, esses registros são usados com a
finalidade de controle. No longo prazo, para prever o ambiente por meio de hipóteses
relacionando o passado e o futuro;
Regras de uso da informação – especificam o sistema de comunicação da organização,
explicitando características, regras de distribuição e sumarização das informações
internas e externas;
Regras de planejamento – especificam o processo de planejamento periódico e a
alocação de recursos entre as atividades da organização.
Ampliando o entendimento de modelos mentais mencionado por Lyles (2001), Kleiner
(2003) afirma que o conceito de modelo mental se reporta à antigüidade e foi criado, na
atualidade, pelo psicólogo escocês Kenneth Craik nos anos 40. Os modelos mentais se referem a
duas situações: os “mapas” tácitos semipermanentes do mundo, que as pessoas carregam em sua
memória de longa duração (long-term); as percepções imediatas (short-term) que as pessoas
constróem como parte de seus processos racionais cotidianos. Decorre daí, que a aprendizagem
de circuito simples não implica em uma revisão extensa dos modelos mentais ou em outros
35
termos a desconstrução dos modelos mentais, enquanto que essa desconstrução ocorre
verdadeiramente na aprendizagem de circuito duplo.
Ao aprofundar nos aspectos interpessoais do processo de aprendizagem organizacional,
Argyris e Schön (1977) desenvolveram uma teoria de aprendizagem altamente prescritiva
chamada de teoria de ação. Os autores argumentam que quando as pessoas são confrontadas com
situações interpessoais ameaçadoras, elas confiam em “teorias em uso” tácitas que, embora sejam
efetivas, acabam inesperadamente tolhendo a capacidade de aprendizado. Esse hiato, em que as
pessoas não estão conscientes, é decorrente da diferença entre o modo como elas acreditam que
se comportam (“teoria esposada”) e como elas realmente se comportam (“teoria em uso”).
Argyris (1977) criou o termo “Modelo I” para situações em que uma pessoa faz inferências sobre
o comportamento de outra, sem verificar se estas são válidas e, ao defender suas próprias visões
de modo abstrato, sem preocupação de explicar ou ilustrar seu raciocínio. Esse modelo é guiado
por uma mentalidade defensiva, da qual o “ator” não tem consciência e acaba provocando
“rotinas defensivas” (ações para “livrar a cara”) na organização. Para mudar de patamar, Argyris
(1977) propõe o “Modelo II”, que visa desenvolver uma capacidade organizacional a partir de
dados observáveis, fatos a partir dos quais se possa então extrair inferências. No Quadro 5 pode-
se observar as diferenças entre os dois modelos.
36
Quadro 5 Teorias em uso – Modelos I e II
Variáveis de
governança em uso
Ações estratégicas
para o “ator”
Conseqüências para o
“ator” e seus associados
Conseqüências para
a aprendizagem
Eficácia
Modelo I
1. Atingir os
propósitos como
eu os percebo.
2. Maximização dos
ganhos e
minimização das
perdas.
3. Minimização dos
sentimentos
negativos
escolhidos.
4. Ser racional e
minimizar
emotividade.
1. Desenvolver e
gerenciar o
ambiente de
forma que o
“ator” esteja no
controle dos
fatores relevantes
para mim.
2. Propriedade e
controle da tarefa.
3. Auto proteção
unilateral.
4. Proteção
unilateral para
que os outros não
se “machuquem”.
1. “Ator” percebe-as
como defensivas.
2. Relacionamento
interpessoal e
grupal , defensivo.
3. Normas defensivas.
4. Pouca liberdade de
escolha,
comprometimento
interno e assumir
riscos.
1. Processo
“lacrado”.
2. Aprendizado de
circuito simples.
3. Poucos testes da
teoria publicada.
Decrescente.
Modelo II
1. Informação válida.
2. Escolha livre e
informada.
3. Comprometimento
interno pela
escolha e
monitoramento
constante da
implementação.
1. Desenvolver
situações ou
enfrentamento
onde os
participantes
podem originar e
experimentar
elevadas
motivações
pessoais.
2. Tarefa controlada
conjuntamente.
3. A auto proteção é
um
empreendimento
conjunto e
orientado em
direção ao
crescimento.
4. Proteção bilateral
dos outros.
1. “Ator” percebe-as
como minimamente
defensivas.
2. Relações
interpessoais
minimamente
defensivas e
dinâmicas de grupo.
3. Normas de
aprendizado
orientado.
4. Alta liberdade de
escolha,
comprometimento
interno e riscos
assumidos.
1. Processos
testáveis.
2. Aprendizado de
circuito duplo.
3. Testes
freqüentes da
teoria publicada.
Aumentada.
Fonte: Argyris (1977 p. 118, apud Argyris e Schön, 1974)
Huber (1991) afirma que uma organização aprende quando por meio do processamento de
informação ela aumenta a probabilidade para que suas ações futuras resultem numa melhoria do
desempenho. Visando contribuir para a elucidação dos estudos sobre aprendizagem
37
organizacional, Huber (1991) pesquisou duzentos e dois trabalhos, publicados em língua inglesa
no período de 1957 a 1991, de cento e sessenta e três diferentes autores. O autor elaborou quatro
construtos integralmente ligados a aprendizagem organizacional: aquisição do conhecimento;
distribuição da informação; interpretação da informação; e memória organizacional. No Quadro
6, pode-se observar os quatros constructos e os dezenove subconstructos e subprocessos,
desenvolvidos pelo autor.
Quadro 6 Constructos e processos relacionados com aprendizagem organizacional
Constructos e processos Sub-constructos e sub-processos
1 Aquisição de conhecimento
Processo pelo qual o conhecimento é obtido.
Exemplos: pesquisas com clientes, análise de
produtos da concorrência (benchmarking e business
intelligence), revisão de desempenho (balanced
scorecard), atividades de desenvolvimento e
pesquisa, curva de aprendizagem.
1.1 Aprendizagem congênita
1.2 Aprendizagem experiencial
1.2.1 Experiências organizacionais
1.2.2 Auto avaliação organizacional
1.2.3 Organizações experimentais
1.2.4 Aprendizagem não intencional e não sistemática
1.2.5 Curvas de aprendizagem baseadas na experiência
1.3 Aprendizagem substitutiva
1.4 Aprendizagem “transplantada”
1.5 Pesquisa e informação
1.5.1 Exame detalhado
1.5.2 Pesquisas focadas
1.5.3 Monitoramento do desempenho
2 Distribuição da informação
Processo pelo qual as informações de distintas
fontes são compartilhadas e que conduzem a uma
nova informação ou novo entendimento.
Exemplos: benchmarking interno e externo, trocas
de experiências.
3 Interpretação da informação
Processo pelo qual a distribuição da informação
propicia um ou mais entendimentos comuns da
interpretação, ou processo através do qual a
informação ganha significado.
Exemplos: Reuniões de resultados, focus group,
aprendizagem de circuito simples e/ou duplo etc.
3.1 Estruturas e mapas cognitivos
3.2 Mídia intensiva
3.3 Excesso de informação
3.4 Desaprender
4 Memória organizacional
Processo de estocagem do conhecimento para uso
futuro.
Exemplos: banco de dados, arquivos, minutas de
reuniões, CBT (computer based training)
4.1 Armazenamento e recuperação da informação
4.2 Memória organizacional baseada em computação
Fonte: Adaptado de Huber (1991, p. 90)
38
Aparentemente Huber (1991) usa indistintamente informação e conhecimento como conceitos
similares. Já Davenport e Prusak (1998) fazem uma distinção entre dados, informação e
conhecimento. Esses autores definem dados como um conjunto de fatos distintos e objetivos,
relativos a eventos, que se transformam em informação quando seu criador lhes acrescentam
significado. Os métodos possibilitadores da transformação de dados em informação são:
Contextualização (saber a finalidade dos dados coletados);
Categorização (conhecimento das unidades de análise ou os componentes essenciais dos
dados);
Cálculo (análise estatística ou matemática dos dados);
Correção (eliminação de erros dos dados);
Condensação (resumo dos dados em forma concisa).
Finalmente, os autores definem conhecimento como “uma mistura fluida de experiência
condensada, valores, informação contextual e insight experimentado, a qual proporciona uma
estrutura para a avaliação e incorporação de novas experiências e informações” (DAVENPORT e
PRUSAK, 1998, p. 6). Os autores afirmam que o conhecimento é originado e aplicado na mente
dos conhecedores, e que nas organizações esse conhecimento geralmente fica embutido em
rotinas, processos, práticas e normas além da parte documental. A transformação da informação
em conhecimento ocorre, segundo Davenport e Prusak (1998) por meio de quatro processos:
Comparação (forma como as informações relativas em uma determinada situação são
comparadas com outras situações conhecidas);
Conseqüências (análise das implicações que as informações trazem para o processo
decisório);
Conexões (relação entre o novo e o conhecimento já acumulado);
Conversação (o pensamento de outras pessoas em relação à nova informação).
39
Nonaka e Takeuchi (1997) também destacam as semelhanças e diferenças entre conhecimento
e informação. O conhecimento ao contrário da informação, diz respeito às crenças e aos
compromissos. Tanto o conhecimento como a informação possuem significado, isto é, são
específicos e relacionais ao contexto. Porém o conhecimento, ao contrário da informação, indica
ação. Para esses autores, a informação é um meio necessário para adquirir e construir o
conhecimento. DiBella e Nevis (1999) reforçam a distinção entre conhecimento e informação.
Para esses autores, o conhecimento é gerado quando é atribuído significado à informação ou
experiência. Ampliando o raciocínio, Garvin (2002) define conhecimento organizacional como
sendo a capacidade de execução coletiva de tarefas, agregadoras de valores para a organização, e
que as pessoas não conseguiriam fazer sozinhas. Para Oliveira Jr., Fleury e Child (2001), o
conhecimento organizacional é um ativo socialmente construído como resultado das interações
específicas que ocorrem entre as pessoas e a organização.
Buscando construir um elo de ligação entre o aprendizado individual e o organizacional,
Fiol e Lyles (1985) afirmam que as pessoas entram e saem das organizações, a liderança pode
mudar, porém a memória da organização retém certos comportamentos, mapas mentais, normas e
valores ao longo do tempo. Quando analisam os fatores contextuais que afetam a probabilidade
de ocorrência da aprendizagem, as autoras apontam para quatro fatores:
a) A cultura, que pode ser usada para prever ações futuras;
b) A estratégia, criadora do momentum para a aprendizagem organizacional;
c) A estrutura, que se complexa e formal demais pode afetar negativamente a aprendizagem;
d) O ambiente, com o uso adequado do estresse como vetor para a aprendizagem.
Esses quatro fatores são dispostos circularmente na Figura 4.
40
Figura 4 Fatores contextuais que afetam a probabilidade de ocorrência da aprendizagem
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Fiol e Lyles (1985, p. 804-805)
Os fatores contextuais apontados por Fiol e Lyles (1985) são complementados por
Flannery et alii (1997) que introduzem o conceito de cultura de trabalho, que abrange a forma
como o trabalho é realizado e como as pessoas são selecionadas, desenvolvidas, gerenciadas,
reconhecidas e recompensadas. Didaticamente dividem a cultura em quatro elementos: cultura
voltada para funções, cultura voltada para processos, cultura baseada no tempo e cultura baseada
em redes, conforme esquematizado na Figura 5.
Cultura
Corporativa
Estratégia
Estrutura
Organizacional
AmbienteA
prendizagem
Flex
ibili
dade
Inovação
Nov
osIn
sigh
ts
41
Figura 5 Culturas de trabalho
Fonte: Adaptado de Flannery et alii (1997, p.45)
No Quadro 7 são explicitados os principais atributos das culturas: funcional, voltada para
processos, baseada em tempo e em redes, suas respectivas metáforas (M) relacionadas a esportes,
considerando a realidade norte americana, e uma escala que mede o grau de extensão, variando
de grande (+) a pouca (-).
Flannery et alii (1997, p. 57) afirmam que a analogia com esportes é uma maneira mais
eficaz de explicar a confusa retórica gerencial. Os autores consideram que nas empresas e
também nos esportes não existe apenas uma cultura, mas sim várias delas em funcionamento.
Exemplificam usando o atletismo como uma mescla de várias culturas.
Clientes
Flexi
bilid
ade
Tecnologia
Con
fiabi
lidad
e
Cultura
baseada
em redes
Cultura
baseada
no tempo
Cultura
voltada
para
funções
Cultura
voltada
para
processo
42
Quadro 7 Atributos chave de culturas de trabalho
Funcional Processual Temporal Redes
M Futebol americano Futebol Basquete Beisebol
- Ser altamente organizada
- Utilizar métodos comprovados para
atender aos mercados existentes
- Manter linhas claras de autoridade e
responsabilidade
- Limitar o lado ruim dos riscos
- Minimizar a imprevisibilidade dos
resultados no negócio
- Maximizar a satisfação do cliente
- Demonstrar a compreensão do ponto
de vista do cliente
- Manter sempre os compromissos
assumidos com os clientes
- Aperfeiçoar continuamente as
operações
- Conquistar a confiança dos clientes
- Reduzir significativamente os ciclos
- Desenvolver novos produtos ou
serviços
- Manter alto senso de urgência
- Capitalizar oportunidades
- Adaptar-se rapidamente às
mudanças no ambiente de negócios
- Desenvolver novos produtos ou
serviços
- Capitalizar oportunidades
- Estabelecer novos empreendimentos
ou novas linhas de negócios
- Formar alianças estratégicas com
outras empresas
- Utilizar recursos externos à empresa
para realizar projetos
E
X
T
E
N
S
Ã
O
- Fornecer emprego seguro
- Estabelecer processos de trabalho
claros e bem documentados
- Tratar os colaboradores com justiça
e coerência
- Estabelecer descrições e requisitos
claros para os cargos
- Respeitar a cadeia de comando
- Agir com precisão
- Minimizar os erros humanos
- Fornecer recursos aos colaboradores
para que satisfaçam os clientes
- Manter os clientes atuais
- Estabelecer processos de trabalho
claros e bem documentados
- Responder ao feedback do cliente
- Participar de treinamento e educação
continuada
- Adquirir conhecimentos e
habilidades interfuncionais
- Forçar a tomada de decisões até
pelos níveis inferiores
- Ser flexível e adaptável na forma de
pensar e na abordagem
- Antecipar mudanças no ambiente
dos negócios
- Aumentar a velocidade da tomada
de decisões
- Ser pioneiro em novas formas de
fazer as coisas
- Agir apesar da incerteza
- Defender energicamente seu ponto
de vista
- Aplicar tecnologia inovadora a
novas situações
- Adaptar-se rapidamente a mudanças
no ambiente de negócios
- Ser flexível na forma de pensar e na
abordagem
- Ser pioneiro em novas formas de
fazer as coisas
- Aplicar tecnologia inovadora a
novas situações
- Capitalizar a criatividade e a
inovação
- Encorajar a inovação
- Atrair os melhores talentos
- Apoiar as decisões da chefia
- Maximizar a satisfação do cliente
- Fornecer recursos aos colaboradores
para que satisfaçam os clientes
- Manter sempre os compromissos
assumidos com os clientes
- Usar recursos limitados com eficácia
- Participar de treinamento e educação
continuada
- Verificar a qualidade do trabalho
dos colaboradores
- Apoiar as decisões da alta gerência
- Ser leal e comprometido com a
empresa
- Alcançar objetivos orçamentários
- Utilizar métodos comprovados para
atender aos mercados existentes
- Tratar os colaboradores com justiça
e consistência
- Tolerar erros bem intencionados
- Limitar o lado ruim dos riscos
- Encorajar o trabalho em equipes
- Capitalizar a criatividade e a
inovação
- Organizar os cargos em torno das
capacidades das pessoas
- Agir com precisão
- Ser leal e comprometido com a
empresa
- Alcançar objetivos orçamentários
- Maximizar a satisfação dos clientes
- Demonstrar compreender o ponto de
vista do cliente
- Adquirir conhecimentos e
capacidades interfuncionais
- Organizar cargos em torno das
capacidades das pessoas
- Encorajar inovações
- Recompensar desempenhos
superiores
- Tomar iniciativas
- Atrair os melhores talentos
- Estabelecer novos empreendimentos
ou novas linhas de negócio
- Manter alto senso de urgência
- Antecipar mudanças no ambiente de
negócios
- Agir apesar da incerteza
- Defender energicamente seu ponto
de vista
- Maximizar a satisfação dos clientes
- Organizar os cargos em torno das
capacidades das pessoas
- Recompensar o desempenho
superior
- Conquistar a confiança dos clientes
- Vender com sucesso
- Descobrir novas formas de
capitalizar as habilidades das pessoas
Fonte: Adaptado de Flannery et alii (1997, p. 47-56)
-
+
43
Segundo Fiol e Lyles (1985) existem duas dimensões básicas a respeito dos conceitos
de aprendizagem organizacional. Uma refere-se ao conteúdo da aprendizagem, em que o
desenvolvimento comportamental e cognitivo é analisado. As autoras afirmam que as
mudanças comportamentais podem ocorrer sem nenhum desenvolvimento cognitivo
associado e, de modo similar, o conhecimento pode ser obtido sem qualquer acompanhamento
de mudança comportamental. A outra dimensão refere-se à extensão do desenvolvimento
cognitivo. Essas duas dimensões e suas possibilidades podem ser observadas na Figura 6.
Figura 6 Mudança e aprendizagem
Fonte: Adaptado de Fiol e Lyles (1985, p. 807)
Até esse momento foram discutidos alguns autores que focam seus trabalhos tanto na
aprendizagem individual quanto na organizacional e na criação do conhecimento. Visando a
Alto
Bai
xo AltoDesenvolvimento comportamental
ou nível de mudança
Des
envolv
imen
to
cognit
ivo o
u n
ível
de
apre
ndiz
agem
1 2
3 4
1 = Organizações sem aprendizagem e mudanças quase nulas. Empresas “burocráticas”. Ambiente previsível e estável
2 = Organizações que agem, mudam estratégias e se reestruturam, mas com pouca aprendizagem.
3 = Organizações que agregam novas crenças e desenvolvem novas estruturas, porém sem grandes mudanças.Ambiente turbulento.
4 = Organizações com alta propensão à aprendizagem e mudança. Organizações “holográficas”.
44
busca de um foco para o trabalho, foram recortados, com base em Prange (2001), três autores
e suas respectivas propostas para seis questões chaves nas teorias de aprendizagem
organizacional. Dentre essas seis questões, serão destacadas no Quadro 8 o que e como os
indivíduos aprendem.
Quadro 8 Blocos constitutivos do desenvolvimento da teoria de aprendizagem organizacional
Autores (ano) => Argyris e Schön (1978) Fiol e Lyles (1985) Huber (1991)
Definição de AO
- Aprendizagem
Organizacional
Processo pelo qual os membros
organizacionais detectam erros ou
anomalias e os corrigem ao
reestruturar a teoria em uso da
organização.
Processo de aperfeiçoar
ações por meio de melhor
compreensão e
conhecimento.
Uma entidade aprende se,
por meio do
processamento de
informações, o âmbito de
seus comportamentos
potenciais se modificam.
Vamos assumir que uma
organização aprende se
qualquer de suas unidades
adquire conhecimento que
ela reconhece como útil
para a organização.
Quem? Sujeito da
AO
Aprendizagem individual em
organizações.
Não é apenas a soma de
aprendizagens individuais.
Conceito de entidade, que
inclui pessoas, equipes,
organizações, indústrias,
sociedade.
O quê? Conteúdo
da AO
Teorias em uso ou de ação
organizacionais.
Padrões de associações
cognitivas e/ou novas
respostas ou ações
(mudança cognitiva x
comportamental).
Informação/conhecimento.
Quando?
Incentivos para
AO
Compatibilidade ou
incompatibilidade dos resultados
esperados que confirmam ou
desacreditam as teorias em uso da
organização.
Tensão entre estabilidade
e mudança; crise
(especialmente para
aprendizagem de nível
mais alto).
Provavelmente, não
pretendidos, uma vez que
o autor busca descrever
um amplo conjunto de sub
categorias de
aprendizagem.
Com que
resultados?
Eficiência da AO
Elo entre aprendizagem e ação
aperfeiçoada.
Alinhamento ambiental;
melhoria do desempenho
futuro.
Âmbito de mudança de
comportamento potencial,
não necessariamente
resultando em mudanças
observáveis.
Como? Processos
de AO
Compartilhamento de suposições;
pesquisa individual e coletiva
constrói e modifica teorias em uso;
processo exato permanece obscuro.
Aprendizagem de nível
mais baixo como repetição
do comportamento
passado; aprendizagem de
nível mais alto como o
desenvolvimento de
associações complexas.
Processamento de
informação: aquisição,
distribuição, interpretação
e armazenagem de
informação; os processos
relacionados de
aprendizagem
organizacional
permanecem não
especificados.
Fonte: Adaptado de Prange (2001) In: Easterby-Smith, Burgoyne e Araujo (2001, p. 46-48)
45
Objetivando entender os diferentes níveis em que ocorre a aprendizagem
organizacional, Vera e Crossan (2004) afirmam que ela ocorre em três níveis:
individual/pessoal; grupal/equipe; e organizacional. As autoras apresentam um modelo teórico
(Figura 7) no qual explicitam quatro mecanismos: intuição; interpretação; integração; e
institucionalização e seus respectivos inputs e resultados. Esse modelo descreve como o
conhecimento individual é compartilhado em uma equipe e/ou organização. Nela a intuição é
um processo subconsciente que ocorre no nível individual, que difere daquela defendida por
Kolb e Lewin. A intuição é o ponto de partida da aprendizagem e deve acontecer como um
insight pessoal. Nesse mecanismo, aprender significa reconhecer e identificar diferenças e
similaridades entre padrões e possibilidades, em conformidade com Argyris. Na seqüência o
indivíduo, valendo-se de elementos conscientes, faz a interpretação e compartilha o
aprendizado com a equipe, por meio de mapas conceituais, conversação, diálogo e linguagem.
A linguagem tem valor chave, pois, por meio dela os insights são verbalizados. Faz-se então
uma ponte entre a equipe e a organização, aonde aquilo que foi aprendido pela equipe é
integrado à empresa por meio de um processo de construção da compreensão compartilhada.
Finalmente, a institucionalização garante que as ações rotinizadas aconteçam, ou seja,
certifica a incorporação do aprendizado na organização. Esse aprendizado entrará na “corrente
sangüínea” (embedding) da empresa, por meio de sistemas, estruturas, rotinas e práticas de
trabalho. As autoras observam, porém, que existem limites sobre aquilo que pode ser
rotinizado: se não houver uma estratégia deliberada de transferência do
aprendizado/conhecimento tácito, acabam sendo rotinizados apenas os aprendizados/
conhecimentos explícitos.
46
Figura 7 Os 4I‟s da aprendizagem organizacional
Fonte: Adaptado de Vera e Crossan (2004, p. 225)
Ao se buscar uma estrutura integrada sobre aprendizagem organizacional, DiBella e
Nevis (1999) propõem uma que é baseada em três ciclos. Cada ciclo tem seus critérios
específicos. O primeiro refere-se a criação/aquisição do conhecimento. Novas habilidades,
atitudes, valores e comportamentos são criados ou adquiridos com o passar do tempo. O
segundo refere-se a disseminação do conhecimento. Tudo aquilo que é aprendido
individualmente torna-se propriedade coletiva. O terceiro diz respeito ao uso do
conhecimento. Tudo aquilo que foi aprendido deve permanecer com a equipe ou a
organização, mesmo que a equipe e/ou a organização acusem saída de pessoas. Os autores
dividem a capacidade de aprendizagem organizacional em duas partes. A primeira, chamada
PIntuindo
E
OInstituciona-
lizando
Fluxo do feed-forward da aprendizagem
Pessoa
Equipe
Organização
Flu
xo
do
fee
db
ack
da
apre
nd
izag
em Interpretando (Linguagem, mapa conceitual
conversação/diálogo)
Integrando (Compreensão
compartilhada, ajustamentos
mútuos, sistemas interativos)
Pessoa Equipe Organização
P = estoque individual de aprendizagem: competências individuais, capacidade e motivação para cumprir as tarefas demandadas
E = estoque grupal de aprendizagem: dinâmica da equipe e desenvolvimento de entendimento compartilhado
O = estoque organizacional de aprendizagem: alinhamento entre o conteúdo não humano de aprendizagem, incluindo sistemas, estruturas,
estratégias, procedimentos, e a cultura considerando o ambiente competitivo
= fluxo do feed-forward da aprendizagem: Se e como a aprendizagem individual é repassada para a aprendizagem da equipe e da
organização (exemplos: mudanças na estrutura, sistemas, produtos, estratégias, procedimentos, cultura)
= Fluxo do feedback de aprendizagem: Se e como a aprendizagem é gravada na memória da organização (exemplos: sistemas, estruturas,
estratégia) afeta a aprendizagem individual e da equipe.
(Rotinas, sistemas
de diagnósticos,
regras e
procedimentos)
(Experiências,
imagens e
metáforas)
47
de orientações para aprendizagem, descreve como a aprendizagem ocorre e o que se aprende,
baseado na cultura e no conhecimento básico. Essas orientações de aprendizagem: refletem
onde e como o conhecimento é adquirido, disseminado e usado; representam o que é
aprendido ou considerado importante para aprender; indicam onde a equipe está investindo
para realizar a aprendizagem; indicam onde existe uma conjugação bi-polar contínua que une
as duas abordagens opostas; e determinam o estilo de aprendizagem. A segunda, denominada
de fatores facilitadores da aprendizagem, especifica os elementos que promovem a
aprendizagem. A base deste componente são as melhores práticas (benchmarks) e processos
rotineiros. O Quadro 9 sintetiza os três ciclos e as duas etapas de facilitação e orientação da
aprendizagem.
48
Quadro 9 Fatores orientadores e facilitadores da aprendizagem
Ciclo da
aprendizagem
Orientações para aprendizagem Fatores facilitadores da aprendizagem
Aquisição Fonte de conhecimento: a
preferência por desenvolver o
conhecimento internamente
versus externamente.
Foco conteúdo-processo:
comparação da ênfase sobre o
conhecimento sobre o que
representam os produtos/serviços
versus como estes
produtos/serviços são
desenvolvidos e disponibilizados
para o mercado.
Investigação imperativa: busca de
informações sobre as
condições/procedimentos fora do
próprio ambiente.
Defasagem de desempenho:
percepção de que existe diferença
entre o desempenho real e o
desejado.
Preocupação com medição: a
discussão de critérios de medição é
considerada como aprendizagem.
Curiosidade organizacional: o
interesse pela criatividade e
novidade propiciam a
experimentação.
Disseminação Reserva de conhecimento:
comparação entre conhecimento
de domínio particular versus
público.
Modo de disseminação:
comparação entre o
compartilhamento do
conhecimento de forma
formal/rígida versus informal.
Clima de abertura: comunicação
aberta; livre compartilhamento de
erros e lições.
Educação continuada: organização
provendo recursos de alta
qualidade para aprendizagem.
Uso Escopo da aprendizagem:
comparação entre a preferência
por aperfeiçoar aquilo que existe
versus desenvolver algo novo.
Foco na cadeia de valores:
Comparação entre a ênfase em
atividades tipo projete-e-execute
versus comercialize-e-entregue.
Variedade operacional: valorização
da diversidade de métodos,
procedimentos e competências.
Defensores múltiplos:
envolvimento pessoal dos
funcionários e líderes encorajando
o desenvolvimento de novas idéias
e métodos de trabalho.
Aquisição,
disseminação
e uso
Foco aprendizagem: comparação
do desenvolvimento do
conhecimento pertinente ao
desempenho individual versus
grupal.
Envolvimento das lideranças:
envolvimento pessoal das
lideranças nas iniciativas de
aprendizagem, garantindo a
manutenção de ambiente propício.
Perspectiva sistêmica: reconhecer a
interdependência das diversas
unidades e grupos organizacionais.
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em DiBella e Nevis (1999, p. 26-86)
49
2.4. Resumo
A linha de raciocínio construída até este ponto contemplou uma descrição dos
processos de aprendizagem individual e coletiva, bem como do processo de criação do
conhecimento. Ao serem estudadas as diferentes abordagens teóricas, emerge uma rota que
parece abrir caminhos para a compreensão de como as pessoas e as equipes aprendem e como
o líder atua nesse processo. Alguns elos entre esses processos e o processo de liderança de
equipes foram pontuados e sua discussão será contemplada mais adiante.
O aprofundamento do modelo conceitual desse trabalho aponta para um circuito que
tem início na criação do conhecimento. O indivíduo inicia o processo de aprendizagem
fortemente baseado em experiências pessoais vivenciadas. Para a maioria dos autores
mencionados, o produto dessa aprendizagem é o conhecimento. Segundo Sanchez e Heene
(1997), o processo de aprendizagem muda o estado do conhecimento das pessoas e das
organizações. Para Kolb (1976), o processo de aprendizagem reflete uma relação causal entre
uma experiência concreta do indivíduo e a formulação de um conceito. De acordo com
Nonaka e Takeuchi (1997), o conhecimento é criado a partir de um ciclo composto de cinco
etapas. Na seqüência, ocorre o processo de aprendizagem organizacional. Neste trabalho
optou-se pelo modelo de Huber (1991) que usa um ciclo de quatro etapas contemplando a
aquisição do conhecimento, a distribuição e a interpretação da informação e a memória
organizacional. A abordagem de Huber (1991) foi escolhida pela sua abrangência, por ter sido
usada por autores clássicos com DiBella e Nevis e pela exploração de aspectos relevantes ao
processo de aprendizagem organizacional. Fechando o circuito, tem-se o resultado da
aprendizagem organizacional, ou seja, o conhecimento coletivo. Não é escopo deste trabalho
avançar na análise da próxima etapa que é a organização de aprendizagem. No centro desse
50
processo está a figura do líder de uma equipe de trabalho. Na seqüência serão analisados os
referencias teóricos do tema liderança e seus elos com o processo de aprendizagem
organizacional em equipes de trabalho de desenvolvimento de novos produtos.
51
2.5. O conceito de Liderança
“O líder ruim é aquele que as pessoas desprezam. O bom líder é o que as pessoas
elogiam. O grande líder é aquele sobre quem as pessoas dizem „nós fizemos sozinhos‟.”
Lao Tsé
Quando se estuda o tema liderança deve-se tomar um cuidado especial, devido a
grande variedade de definições, podendo-se afirmar que não existe uma definição correta,
talvez todas estejam. Para Conger (1992), a liderança é geralmente um conceito intuitivo e
que nunca existirá uma definição simples e aceita sobre esse tema. Para exemplificar sua linha
de raciocínio, o autor cita o livro Leaders na qual Bennis e Nanus relataram trezentas e
cinqüenta definições de liderança que os pesquisadores da área elaboraram nos últimos trinta
anos. Vergara ( 2003) apresenta uma citação de Bennis dizendo que a liderança é como
beleza: difícil de definir, fácil de reconhecer. Este trabalho focará inicialmente o conceito de
liderança. Na seqüência será abordado o papel do colaborador que atua como líder de uma
equipe de projeto. Em seguida, serão retomadas as discussões sobre os elos entre
aprendizagem organizacional, criação do conhecimento e liderança de equipes. Para tanto,
serão considerados os referenciais teóricos com base em Garvin (2002), Senge (2002),
Argyris (1957), Ulrich (2000), Nonaka e Takeuchi (1997), DiBella e Nevis (1999), Zaccaro,
Rittman e Marks (2001), House (1996) e Wenger e Snyder (2000). Essa escolha foi baseada
no reconhecimento que estes autores têm quando se discute a atuação do líder no processo de
aprendizagem organizacional.
Ao analisar organizações em especial como são formadas e geridas, Argyris (1957) as
enxergou como organizações racionais, ou seja, existe a premissa básica feita pelos criadores
52
da organização formal que dentro de certas tolerâncias o ser humano irá se comportar de
forma racional, ou seja, de acordo com o planejado. Como conseqüência, surge a
especialização da tarefa (trabalho), aonde quem é você torna-se menos importante do que
aquilo que você pode fazer. Para gerir esta organização racional, surge a necessidade de uma
cadeia de comando explicitada com a função de liderança ou gerenciamento. Em função desse
relacionamento líder/liderado, surgem vários impactos que são minimizados por meio de
recompensas para quem desempenha bem em uma organização formal tecnicamente
competente, objetiva, racional e com lealdade dos líderes e, finalmente, com estímulo a
competição entre os liderados. Naturalmente, surge o dilema típico de unidade de direção que
busca a melhor forma entre deixar a pessoa definir os objetivos versus imposição dos
objetivos pelos líderes. Como desdobramento, na extensão do controle a eficiência é
aumentada com a limitação da extensão de controle por parte dos líderes.
Segundo Argyris (1957), se os princípios da organização formal forem usados, as
pessoas tenderão a terem mínimo controle sobre seu dia-a-dia; a serem passivas, dependentes
e subordinadas; a terem perspectivas de curto prazo; a usarem superficialmente algumas
habilidades; e a produzirem em condições que conduzam para as falhas psicológicas. Em
resumo, Argyris (1957) defende a existência de incongruência entre as necessidades de
pessoas maduras e das organizações formais/racionais. Visando elucidar seu ponto de vista de
que as empresas infantilizam as pessoas, Argyris (1957) cita dois exemplos que pessoas com
retardamento mental foram classificadas como excelentes trabalhadores por seus líderes. A
razão? Os retardados mentais faziam exatamente tudo aquilo que os chefes demandavam.
Esse ponto remete para uma cena do filme Forrest Gump, na qual um recruta (papel vivido
por Tom Hanks) do exército americano, com QI próximo de setenta, é considerado como
53
gênio pelo seu sargento. Por quê? Porque o recruta seguia cegamente as ordens do seu
superior.
Argyris (1957) afirma que existe incongruência entre as necessidades de pessoas
saudáveis e as demandas da organização formal. Como resultados dos distúrbios entre pessoas
e organização formal surgem frustrações, falhas, perspectivas de curto prazo e conflitos. Em
suma, a natureza dos princípios da organização formal causa, em qualquer nível, competição,
rivalidade, insubordinação hostil e preocupação com as partes ao invés do todo. Segundo o
autor, as pessoas tendem adaptar suas frustrações e falhas, agindo de uma ou de várias das
seguintes possibilidades: deixando a organização; escalando a “escada” da estrutura (sendo
promovidas); manifestando reações de defesa (fantasiando, sendo agressivas, ambivalentes
etc.); tornando-se apáticas e desinteressadas (reduzem a quantidade e potência das
necessidades que devem ser atendidas no trabalho, “vendem gato por lebre”, produzem erros,
fraudam etc.); criando grupos informais para sancionar a apatia e o desinteresse; formalizando
o grupo informal; desenvolvendo normas grupais para perpetuar os comportamentos
apontados anteriormente; desenvolvendo uma postura psicológica em que os aspectos
materiais são mais importantes que os humanos e aculturando os novatos para aceitarem as
normas estabelecidas. Os gerentes tendem a responder por esses nove comportamentos,
aumentando o nível de pressão exercido sobre os subordinados, o nível do uso de controles
gerenciais e o número de “pseudo” participação e de programas de comunicação.
Como mencionado na introdução deste referencial teórico existem inúmeras definições
de liderança. Conger (1992) define líder como aquele indivíduo que estabelece orientação
para uma equipe, que obtém comprometimento dessa equipe em relação a orientação dada, e
que motiva os membros da equipe para alcançar resultados. Para Drucker (2001), a liderança
é um meio e sua essência é o desempenho, ou seja, qual é a finalidade da liderança? Segundo
54
o autor, a liderança é o próprio trabalho de identificar qual é a missão da organização,
definindo-a e estabelecendo-a com clareza e visibilidade. Outra exigência nesse processo é
que o líder encare-o com responsabilidade e não como privilégio. Drucker (2001), assim
como Kotter (2000), descarta o carisma e o conjunto de traços de personalidade como
variáveis a serem consideradas na definição de liderança. Kotter (2000) diferencia claramente
o gerenciamento (lidar com a complexidade) de liderança (promover mudança), argumentado
que somente os líderes conseguem produzir mudanças, os gerentes conseguem apenas
cumprir as rotinas, algumas complexas, do seu dia-a-dia.
Não é objetivo deste trabalho aprofundar-se no processo de liderança e suas
respectivas definições, mas sim na atuação de um colaborador que lidera uma equipe de
desenvolvimento de novos produtos. O próximo tópico focará o processo de liderança com
ênfase na atuação de um colaborador liderando uma equipe de trabalho.
55
2.6. O Líder em uma Equipe de Trabalho
Garvin (2002) aponta três tarefas básicas para o colaborador que lidera equipes de
trabalho:
Criação de oportunidades para aprendizagem por meio da projeção de cenários e
eventos que induzem às atividades necessárias;
Cultivo do tom correto como forma de nutrir normas e comportamentos de
engajamento desejáveis;
Liderança pessoal do processo de discussão enquadrando o debate, fazendo perguntas,
ouvindo com atenção e fornecendo feedback.
Para a primeira tarefa básica, o autor propõe a criação de fóruns de aprendizagem
(atividades objetivando nutrir a aprendizagem), o uso de atribuições exploratórias (criação de
ambiente que permita questionamento aberto e um clima de mútuo feedback) e experiências
compartilhadas (encorajamento para que todos possam compartilhar novas e diferentes formas
de aprendizagem). Para a segunda tarefa Garvin (2002), aponta para a necessidade do líder
criar um ambiente desafiador, oferecer sensação de segurança para que as pessoas não tenham
receio de descartar velhos paradigmas e praticar um processo aberto de comunicação. Para a
terceira, o autor recomenda o questionamento (processo adequado de se perguntar), o ouvir
ativo e, finalmente, o responder. As três tarefas mencionadas anteriormente dizem respeito
aos fatores facilitadores de aprendizagem, ou seja, a criação de uma ambiência de
oportunidade à aprendizagem organizacional. As tarefas com exemplos, operacionalização e
perguntas estão sintetizadas no Quadro 10.
56
Quadro 10 Tarefas básicas para o líder de equipes de aprendizagem organizacional
Tarefas básicas Operacionalização Exemplos Perguntas
Criando
oportunidades
Fóruns de aprendizagem – tarefas,
atividades e eventos cuja finalidade
primária é nutrir a aprendizagem.
Auditorias de sistemas,
projetos de benchmarking
interno, missões de estudos,
reuniões, encontros rotineiros,
telefonemas semanais etc.
O que está
acontecendo? O que
precisamos fazer?
Atribuições exploratórias – reuniões
de pessoas em torno de um desafio
comum e com tempo e espaço
adequados para exercitar o
pensamento verdadeiro.
Wokshops , Work-Out (GE). Quais sucessos e
fracassos vocês
gostariam de
compartilhar?
Experiências compartilhadas –
processo de aprendizagem imitando
uma experiência vivenciada.
Reuniões específicas e fora do
local normal de trabalho da
equipe.
Quais informações e
insights vocês
gostariam de
compartilhar?
Estabelecendo
um clima e tom
adequados para
que a
aprendizagem
ocorra
Desafio e dissensão – aprendizagem
canalizada e dirigida de forma a
evitar acomodação dos líderes e
equipes.
Avaliações de negócios,
estabelecimento de visões.
Por quê? Quais
nossos critérios de
escolha? Por que
pensamos desta
forma? Que
alternativas devemos
considerar?
Segurança e suporte – formação de
ambiente que ofereça proteção e
apoio para que as pessoas possam
descartar velhos paradigmas.
Sessões de brainstorming, job
rotation, substituição
temporária do superior
hierárquico.
Como podemos fazer
diferente e a
diferença? Porque
não?
Comunicação aberta – acesso livre a
informações.
Avaliação e remuneração com
base nas contribuições dos
colaboradores para o banco de
conhecimentos da empresa,
reuniões informais para troca
de conhecimentos.
O que devemos
adicionar ao nosso
banco de
conhecimentos? O
que você aprendeu e
que pode ser útil para
nós?
Liderando a
discussão
Questionar – perguntas e não
respostas certas.
Uso de perguntas para:
enquadrar questões, oferecer
instruções, solicitar
informações, sondar em busca
de análise, inferir conexões,
buscar opiniões e ratificar
decisões.
Estamos todos de
acordo com isto? Por
que não
consideramos a
proposta XYZ? O
que você pensa disto?
O que aconteceria
se...?
Ouvir – ouvir ativamente o que está
sendo dito e como é dito.
Prática da empatia e rapport
no processo de comunicação.
Você quis dizer ...?
Responder – capacidade de resposta
na hora e em tempo real.
Reuniões de trabalho,
processo de comunicação
informal e formal.
Você entendeu meu
ponto de vista?
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Garvin (2002, p.209-235)
Garvin (2002), ao discorrer sobre o papel que o líder tem no processo de conduzir a
discussão com sua equipe, aponta para as possibilidades de respostas que ele pode usar nas
57
discussões sobre aprendizagem. As possibilidades de respostas do líder vão desde seu
silêncio até a sua ameaça aos liderados. O Quadro 11 resume o espectro de possibilidades de
respostas.
Quadro 11 Espectro de respostas em discussões de aprendizagem
Resposta Característica Posição no espectro
Silêncio
Reafirmação
Esclarecimento
Mantém o foco em quem fala
Reflexiva, facilitação
Encorajamento
Sugestão
Injeta um ponto de vista apoiador
Desacordo
Crítica
Injeta um ponto de vista negativo
Ridicularização
Negação
Ameaça
Envolve o uso aberto de poder e autoridade
Intrusiva, intervencionista
Fonte: Garvin (2002, p. 234)
Para Senge (2002), também existem três papéis que os lideres devem desempenhar no
processo de aprendizagem organizacional: líderes projetistas, líderes professores e líderes
regentes (steward). O autor refuta os mitos de liderança ligados a imagens de “heróis e
salvadores da pátria” e propõe um processo de liderança focado em forças sistêmicas e no
aprendizado coletivo. Para o primeiro papel, o líder como projetista, Senge (2002) usa a
metáfora de um transatlântico para demonstrar a importância do papel do “projetista” que
envolve a projeção de políticas, estratégias e sistemas organizacionais. Os demais papéis,
“capitão”, “navegador”, “engenheiro” e “diretor social” são legítimos, porém, nenhum deles
têm maior influência no “transatlântico” do que aquele desempenhado pelo “projetista”. É
inútil ser líder em uma organização que não foi bem projetada.
58
Em suma, Senge (2002) afirma que o papel essencial do líder é projetar processos de
aprendizagem, por meio dos quais os colaboradores em toda a organização poderão trabalhar
de modo produtivo com os problemas críticos que enfrentam no cotidiano. Nesse papel, o
líder assume três atribuições essenciais para criar a “arquitetura social”: propósito e valores
essenciais, ou as idéias governantes; elaboração de políticas, estratégias e estruturas que
reflitam o propósito/valores; e, finalmente, desenvolvimento de processos organizacionais que
possibilitem que essas políticas, estratégias e estruturas sejam aprimoradas constantemente,
tornando efetivos os processos de aprendizagem. O líder como projetista cria uma
visão/propósito compartilhado, desenvolve sistemas para traduzir essa visão/propósito e cria
processos, nos quais se baseiam esses sistemas, com a essência da aprendizagem.
Metaforicamente, pode-se comparar a essência da aprendizagem como um dínamo em que as
políticas se transformam em aprendizagem de circuito duplo.
No segundo papel, o líder como professor, Senge (2002) começa enfatizando que não
é papel do líder ser um especialista autoritário que procura ensinar a visão correta da
realidade. O papel é de um professor que ajuda as pessoas a reestruturarem suas visões da
realidade, de modo a ampliar seus olhares para verem além das condições que apenas tocam a
superfície e permitir enxergar as causas subjacentes dos problemas. De modo específico, os
líderes podem ajudar os colaboradores a verem a realidade em três níveis distintos: eventos
(reativo), padrões de comportamento (responsivo) e estrutura sistêmica (generativo), é neste
último que se deve concentrar o foco de atuação do líder como professor. O terceiro papel, o
líder como regente (steward), é mais sutil que os outros dois já apontados, pois esse papel é
uma questão de atitude da pessoa em praticar um estilo de liderança servidor (servant
leadership), ou seja, o líder deve servir em primeiro lugar. Senge (2002) afirma que os líderes
regentes (steward) operam tanto no nível de servir as pessoas que ele lideram como servir ao
59
propósito maior que sustenta a organização. O Quadro 12 retrata os papéis apontados por
Garvin (2002) e Senge (2002).
Quadro 12 Liderança no processo de aprendizagem organizacional
Autor Papel do líder na aprendizagem organizacional
Garvin (2002) 1. Criando oportunidades de aprendizagem
1.1. Criando fóruns de aprendizagem
1.2. Usando atribuições exploratórias
1.3. Facilitando o compartilhamento de experiências
2. Estabelecendo clima e tom adequados
2.1. Estabelecendo desafios
2.2. Oferecendo segurança e apoio
2.3. Praticando comunicação aberta
3. Liderando a discussão
3.1. Questionando
3.2. Ouvindo
3.3. Respondendo
Senge (2002) 1. Projetista
1.1. Estabelecendo propósito e valores essenciais
1.2. Elaborando políticas, estratégias e estruturas
1.3. Desenvolvendo processos organizacionais
2. Professor
3. Regente (Steward)
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Garvin (2002), Senge (2002)
Visando ampliar a discussão a respeito do líder de uma equipe, serão usados os conceitos
de Ulrich (2000) que apresentam quatro referenciais e catorze dimensões em relação aos
atributos dos líderes.
1) Definição da trajetória:
Compreensão dos eventos externos;
Foco no futuro;
Conversão da visão em ação.
2) Mobilização do comprometimento pessoal:
Construção de relacionamentos colaborativos;
60
Compartilhamento do poder e da autoridade;
Gerenciamento da atenção.
3) Desenvolvimento das capacidades organizacionais:
Construção da infra-estrutura organizacional;
Alavancagem da diversidade;
Organização e posicionamento de equipes;
Desenho de sistemas de recursos humanos;
Promoção de mudanças.
4) Demonstração de caráter pessoal:
Vivência dos valores mediante a prática da pregação;
Auto-imagem positiva e criação da auto-estima em terceiros;
Elevada capacidade cognitiva e grande carisma pessoal.
Dentre os quatro referenciais, existem seis dimensões que têm maior aderência com o
trabalho de um colaborador, atuando como líder em uma equipe de desenvolvimento de novos
produtos. Essas dimensões estão explicitadas no Quadro 13.
61
Quadro 13 Dimensões dos atributos da liderança e exemplos de comportamentos ou ações
Referenciais
Dimensões Exemplos de comportamentos ou ações.
Em que extensão o líder atua da seguinte maneira?
Definição da
trajetória
Conversão da
visão em ação
Alinha o desempenho com a visão.
Inspira a visão compartilhada.
Arregimenta outros para atingir essa situação futura.
Transforma a estratégia em resultados.
Inspira um propósito compartilhado.
Cria uma clima propício ao sucesso.
Mobilização do
comprometimento
pessoal
Compartilhamento
do poder e da
autoridade
Demonstra disposição e capacidade para compartilhar o poder e o
controle.
Ouve mais do que fala.
Manifesta disposição e capacidade para envolver outras pessoas e
para estimular a participação.
Exerce o poder com dignidade.
Potencializa os outros para darem o melhor de si mesmos.
Fortalece os outros mediante o compartilhamento do poder e da
informação.
Usa uma variedade de abordagem para conseguir o melhor de cada
um.
Cria oportunidades para que todos contribuam com os seus
melhores talentos pessoais para o esforço da equipe.
Desenvolvimento
das capacidades
organizacionais
Construção da
infra-estrutura
organizacional
Demonstra liderança formal capaz de integrar, prover recursos e
coordenar as atividades de vários grupos de projetos.
Forma lideranças locais, conforme as exigências de um desses
grupos de projetos.
Alinha e assegura a compatibilidade entre a organização e a
estratégia.
Divulga ativamente entre todos os empregados uma vasta gama de
informações.
Compromete-se integralmente com uma estratégia de longo prazo
para o desenvolvimento de uma instituição valiosa.
Proporciona os estímulos e os recursos necessários à melhoria
contínua.
Promove o apoio entusiástico às metas do negócio.
Organização e
posicionamento de
equipes
Desenvolve equipes de projetos autogerenciáveis.
Promove a fertilização cruzada e movimenta os melhores de um
lugar para outro.
Seleciona as pessoas mais talentosas para a composição das
equipes.
Proporciona feedback específico e freqüente que ajuda a melhorar
o desempenho da equipe.
Apoia a equipe mesmo durante as perdas.
Demonstração de
caráter pessoal
Vivência dos
valores mediante a
prática da pregação
Vive os valores da sua unidade.
Submete-se ao teste do espelho e sente-se à vontade com a
imagem refletida.
Lidera com exemplos.
Auto-imagem
positiva e criação
da auto-estima em
terceiros
Crê em si mesmo: é autoconfiante, com humildade.
Demonstra uma notável capacidade de percepção e insight sobre
as realidades do mundo, sobre o grupo e sobre os membros da
unidade.
Exibe níveis extraordinários de motivação para capacitar os
membros do grupo a superar a dor do aprendizado e da mudança.
Fonte: Adaptado de Ulrich (2000, p. 24-29)
62
House (1996) por sua vez defende a teoria, denominada caminho-objetivo (path goal),
que parte da premissa de que os membros das equipes de trabalho atingem seus objetivos a
partir da ajuda que o líder lhes proporciona, por meio de ações de direção e apoio, de modo
que esses objetivos sejam compatíveis com aqueles da equipe toda. O ponto central dessa
teoria é que os membros das equipes farão aquilo que o líder solicitar, desde que pelo menos
duas condições sejam atendidas. A primeira é que os líderes devem assegurar que os membros
das equipes compreendam como devem atingir os objetivos dele. A segunda é o processo de
previsão que os líderes devem ter para que os membros atinjam seus objetivos pessoais nesse
processo. Para House (1996), a teoria do caminho-objetivo reforça que o comportamento do
líder pode ser motivacional para os membros das equipes quando ele:
a) Tornar a necessidade de satisfação dos membros da equipe contingencial ao
desempenho eficaz;
b) Fornecer treinamento, direcionar e recompensar para a eficácia do desempenho;
c) Adotar postura flexível, se comportando de modo diferente conforme a situação.
A teoria do caminho-objetivo considera que os comportamentos do líder, associados à
fatores contingenciais ambientais e dos membros das equipes é que proporcionam resultados
de desempenho e satisfação, conforme esquematizado na Figura 8. A análise da Figura 8
mostra duas classes de variáveis situacionais, moderando a relação entre o comportamento do
líder e os resultados conseguidos. A primeira variável está fora do controle das pessoas, por
exemplo, a estrutura da tarefa, o sistema formal de autoridade e a própria equipe de trabalho.
A outra variável faz parte das características das pessoas, como, por exemplo, o centro de
controle e a experiência percebida. Esses fatores ambientais determinam o comportamento
requerido do líder como um adendo para que os resultados obtidos pela equipe possam ser
otimizados. Por outro lado, as características das pessoas são fatores decisivos para
63
determinar como o ambiente e os comportamentos do líder ( diretivo, apoiador, participativo e
orientado para realização) são interpretados.
Figura 8 Representação esquemática da teoria caminho-objetivo
Fonte: Adaptado de Robbins (202, p.314)
Os vários tipos de ações do líder, que auxiliam no entendimento de cada um dos
quatro estilos estudados por House, estão descritos no Quadro 14.
Comportamentos do líder:
liderança diretiva
liderança de apoio
liderança participativa
liderança orientada para a realização
Fatores contingenciais ambientais:
estrutura da tarefa
sistema formal de autoridade
equipe de trabalho
Fatores contingenciais do membro da equipe:
centro de controle
experiência
capacidade percebida
Resultados:
desempenho
satisfação
64
Quadro 14 Comportamentos observados de acordo com os estilos de liderança
Estilo Ações do líder
Diretivo - Informar os membros da equipe o que se espera deles;
- Programar e coordenar o trabalho;
- Fornecer orientação específica;
- Esclarecer políticas, normas e procedimentos.
Apoiador - Mostrar que se importa com o bem estar dos membros da equipe;
- Criar um ambiente de trabalho amigável e psicologicamente apoiador;
- Ser fonte confiável nos processos de diálogo;
- Ser fonte confiável para redução do estresse e diminuição da frustração
dos membros da equipe.
Participativo - Consultar a equipe no processo de tomada de decisão;
- Considerar as opiniões e sugestões dos membros da equipe no processo
de tomada de decisão;
- Esclarecer a relação entre esforço versus alcance do objetivo e alcance do
objetivo versus recompensas extrínsecas;
- Aumentar a congruência entre os objetivos dos membros da equipe e os
da empresa;
- Aumentar a autonomia e as habilidades dos membros da equipe de modo
que eles consigam ver a relação entre esforço e desempenho;
- Aumentar a pressão por resultados da organização por meio do
envolvimento e comprometimento dos membros da equipe e dos demais
colaboradores da empresa.
Orientado
para
realização
- Estabelecer objetivos desafiadores;
- Buscar melhorias;
- Enfatizar a excelência do desempenho;
- Demonstrar confiança que os membros obterão altos níveis de
desempenho.
Fonte: Adaptado de House (1996, p. 4-5)
Até este ponto foram apresentados referenciais teóricos com ênfase na atuação do líder
em uma equipe de projetos. Parece oportuno acrescentar algum referencial que possa ampliar
as possibilidades de análise dessas equipes. Wenger e Snyder (2000) afirmam que as
organizações há muito tempo foram reinventadas usando equipes. Entretanto, os autores
acreditam que exista uma forma de evolução e propõe a abordagem das comunidades de
prática que pode ajudar as organizações a reinventarem o conceito de equipes de trabalho.
Segundo Wenger e Snyder (2000), as comunidades de prática podem agregar às organizações
de várias maneiras: ajudando no alcance das estratégias, iniciando novos negócios, resolvendo
65
rapidamente problemas, transferindo as melhores práticas, desenvolvendo habilidades
profissionais e ajudando as organizações a recrutarem e reterem talentos. Os autores definem
de forma resumida que as comunidades de prática são grupos de pessoas que se juntam
informalmente para compartilhar, com paixão e comprometimento, experiências e
conhecimentos. Valença (1997, p. 266) acrescenta que a comunidade de prática “é a reunião
de profissionais que têm uma prática comum, dispostos a regularem sua prática de acordo
com as mesmas normas de conduta pessoal, relacional, técnica e de proficiência operativa”.
Wenger e Snyder (2000) elaboram um quadro comparativo entre as comunidades de
prática e as outras formas de se trabalhar em equipe (força tarefa, equipes de projetos,
comunidades de interesse e redes informais). Os autores elencaram respostas a respeito do
propósito, de quem faz parte, de quais limites, do que mantém as pessoas juntas e qual é a
duração de cada uma das formas de se trabalhar em equipe. O Quadro 15 resume essas
respostas.
Quadro 15 Comparativo entre comunidades de prática e outras equipes
Qual é o
propósito?
Quem
pertence?
Limites O que os mantém
juntos?
Quanto tempo
dura?
Comunidades
de prática
Criar e
compartilhar
conhecimento.
Membros que
se auto
selecionam.
Confuso. Paixão,
comprometimento,
aprendizagem e
identificação.
Evolui e acaba
organicamente.
Força tarefa Endereçar
uma questão e
recomendar
soluções.
Qualquer
pessoa que se
reporte ao
gerente da
força tarefa.
Claro. Requisitos do
trabalho e objetivos
comuns.
Tem fim pré
determinado,
até a próxima
tarefa.
Equipe de
projetos
Cumprir uma
tarefa
específica.
Pessoas
indicadas pela
gerencia
sênior da
organização.
Claro. Objetivos e
milestones do
projeto.
Até o término
do projeto.
Comunidades
de interesse
Ser
informado.
Qualquer um
que estiver
interessado.
Confuso. Senso de
alinhamento com
novas idéias.
Evolui e acaba
organicamente.
Network Receber e Amigos e Não Necessidades e Na realidade
66
informal repassar
informação
companheiros
de trabalho.
definido.
relacionamentos
mútuos.
nunca começa e
nunca termina.
Fonte: Wenger e Snyder 2000, p. 142 e Wenger 2004, p. 8
2.7. Elos entre Aprendizagem Organizacional, Criação do Conhecimento e Liderança de
Equipes
Até este ponto foram discutidos os referenciais teóricos de aprendizagem individual e
organizacional, da criação do conhecimento, de liderança e do líder em uma equipe de
trabalho. Usando essa discussão como pano de fundo, emerge a necessidade da construção de
elos entre os referenciais mencionados. Na construção do elo entre gerenciamento/liderança e
criação do conhecimento, Nonaka e Takeuchi (1997) apresentam três modelos. O primeiro
denominado top-down é indicado para o gerenciamento do conhecimento explícito. O
segundo, bottom-up é indicado para gerenciar o conhecimento tácito. O terceiro, middle-up-
down é adequado ao gerenciamento da interface entre o conhecimento tácito e o explícito.
Para os autores, cabe aos gerentes de nível médio (middle-up-down) a liderança de equipes ou
forças tarefas para a criação do conhecimento nas organizações. O Quadro 16 apresenta a
comparação e o contraste das características relevantes dos três modelos apontados.
Quadro 16 Comparação dos três modelos gerenciais no processo de criação do conhecimento
Top-down Bottom-up Middle-up-down
Quem? Agente de criação
do conhecimento
Alta gerência Indivíduo
empreendedor
Equipe (com os
gerentes de nível
médio como
engenheiros do
conhecimento)
Qual? 1. Papel da alta
gerência
2. Papel da média
gerência
3. Conhecimento
acumulado
4. Conversão do
1. Comandante
2. Processadora de
informações
3. Explícito
4. Conversão parcial
na combinação/
internalização
1. Patrocinadora/
Mentora
2. Intra
empreendedora
autônoma
3. Tácito
4. Conversão parcial
1. Catalisadora
2. Líder de equipe
3. Explícito e tácito
4. Conversão da
espiral de
internalização/
externalização/
67
Top-down Bottom-up Middle-up-down
conhecimento focalizada na
socialização/
externalização
combinação/
socialização
Onde? Armazenamento do
conhecimento
Banco de dados
computadorizado/
manuais
Personificado no
indivíduo
Base do
conhecimento
organizacional
Como? 1. Organização
2. Comunicação
3. Tolerância à
ambigüidade
4. Ponto fraco
1. Hierarquia
2. Ordens/
instruções
3. Não permite caos/
flutuação
4. Grande
dependência da
alta gerência
1. Equipe de projeto
e rede informal
2. Princípio de auto-
organização
3. Caos/ flutuação
como premissas
4. Consome muito
tempo; custo de
coordenação dos
indivíduos
1. Hierarquia e força
tarefa (hipertexto)
2. Diálogo e uso de
metáfora/
analogia
3. Cria e amplifica
caos/ flutuação
4. Exaustão
humana; custo da
redundância
Fonte: Nonaka e Takeuchi (1997, p. 149)
Garvin (2002) explora outro elo entre aprendizagem individual, aprendizagem
organizacional e os fatores facilitadores da liderança nesses dois processos. O autor enumera
quatro requisitos para que os líderes possam desenvolver suas próprias habilidades como
aprendizes:
Abertura a novas perspectivas – os líderes devem aceitar a natureza provisória do
conhecimento. Dois indicadores são recomendados: atitude em relação às perguntas
desafiadoras; quantidade de exposição que se tem a ambientes desconhecidos e
provocadores de raciocínio;
Consciência de viéses pessoais – líderes precisam ter consciência de seus estilos
preferidos e devem buscar aderência às tarefas designadas para a equipe. Algumas
regras práticas são recomendadas: manter listas atualizadas de suas previsões para
superar viéses de conhecimento posterior; solicitar feedback crítico visando combater
o excesso de confiança; revisar escolhas para aflorar suposições ocultas; buscar ajuda
de coaches e de terceiros para assegurar que seus atos reflitam suas palavras; montar
68
bancos de experiências visando enriquecer seu rol de analogias e incrementar sua
habilidade em reconhecer padrões; utilizar processos formais de tomada de decisão
para calibrar seus julgamentos e melhorar a consistência das decisões tomadas;
Exposição a dados não filtrados – ampliação do contato direto do líder com dados
brutos. A aprendizagem, geralmente, melhora significativamente quando os líderes
estão perto da “linha de frente”;
Senso de humildade – os líderes devem reconhecer que não possuem todas as
respostas e que essas, geralmente, estão fora do seu local habitual de trabalho.
DiBella e Nevis (1999), ao discutirem os fatores facilitadores da aprendizagem, chamam a
atenção para a falta de participação dos líderes nos processos de disseminação e uso do
conhecimento. Para os autores, isso decorre do fato dos líderes não se envolverem
adequadamente nesses estágios, preferindo atuar com maior ênfase no estágio da aquisição
do conhecimento. Os autores recomendam que os líderes sejam os primeiros a estudar e a
desenvolver o conhecimento de forma que possam ser reconhecidos como demonstradores
vivos daquilo que aprenderam, afim de servirem de exemplo para os liderados também
aprenderem.
Outro elo que merece atenção é aquele que discute o desempenho do líder para a eficácia
da equipe. Zaccaro, Rittman e Marks (2001) apresentam um esquema conceitual sobre a
atuação do líder funcional. Os autores definem líder funcional como aquela pessoa cuja
principal tarefa é realizar ou fazer com que um trabalho seja feito. Para os autores, a eficácia
da equipe é obtida por meio de processos de equipe e esses são influenciados por processos de
liderança, conforme esquema da Figura 9.
69
Figura 9 Funções de desempenho do líder que contribuem para a eficácia da equipe
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Zaccaro, Rittman e Marks (2001, p. 458)
Os quatro processos de liderança a definem como um processo social de resolução de
problemas. Nesse processo os líderes são responsáveis pelo diagnóstico de qualquer desvio
que possa impedir a equipe e/ou organização de alcançar seus objetivos, pela geração e
planejamento adequados das soluções e pela implementação de soluções dentro dos domínios
sociais complexos. As treze dimensões desses quatro processos são descritas da seguinte
forma:
a) Busca e estruturação da informação:
i) Aquisição da informação;
ii) Organização e avaliação da informação;
iii) Feedback e controle.
b) Uso da informação para solução de problemas:
i) Identificação das necessidades e requisitos;
ii) Planejamento e coordenação;
iii) Comunicação da informação.
c) Gerenciamento de recursos humanos:
i) Obtenção e alocação de recursos humanos;
ii) Desenvolvimento dos recursos humanos;
iii) Motivação dos recursos humanos;
Processos
de liderança
Processos
de equipe
Eficácia
da equipe
70
iv) Utilização e monitoramento dos recursos humanos.
d) Gerenciamento de recursos materiais:
i) Obtenção e alocação dos recursos materiais;
ii) Manutenção dos recursos materiais;
iii) Utilização e monitoramento dos recursos materiais.
Em relação aos quatro processos de equipe, os autores afirmam que as estratégias de
desempenho usadas pelos membros das equipes surgem a partir daquilo que foi planejado e
coordenado pelo líder. Do mesmo modo, a motivação e as escolhas por parte dos membros da
equipe são influenciadas, em parte, pela exortação e encorajamento do líder. As dez
dimensões desse processo são listadas a seguir:
a) Processos cognitivos da equipe:
i) Compartilhamento dos modelos mentais da equipe;
ii) Processamento da informação coletiva da equipe;
iii) Metacognição da equipe.
b) Processos motivacionais da equipe:
i) Coesão da equipe para cumprir as tarefas;
ii) Eficácia coletiva.
c) Processos afetivos da equipe:
i) Controle dos conflitos;
ii) Normas de controle das emoções da equipe;
iii) Contágio emocional pela presença/ausência;
iv) Composição “emocional” da equipe.
d) Processo de coordenação da equipe:
i) Coordenação da equipe.
71
Em suma, Zaccaro, Rittman e Marks (2001) apresentam um esquema com vinte e três
dimensões para auxiliar na compreensão do papel do líder na eficácia da equipe. Os autores
classificam a influência das funções do desempenho do líder em quatro categorias: cognitiva,
motivacional, afetiva e de coordenação. Com base nessas categorias, os autores formularam
sete proposições. Essas proposições foram baseadas em estudos e pesquisas realizadas pelos
próprios autores e uma dezena de outros. O Quadro 17 sintetiza as seis proposições que
objetivam analisar a influência das funções de desempenho do líder.
Quadro 17 Proposições para o processo de liderança funcional
Influência das funções de
desempenho do líder
Proposições
No processo cognitivo da
equipe
1. Equipes com líderes que desenvolvem nos membros a capacidade de
processar informações e encorajam a participação deles na resolução
de problemas da equipe, se envolverão em mais processos de
informação coletivos do que aqueles líderes com um estilo mais
diretivo.
2. Equipes com líderes que desenvolvem e motivam a
metacognitividade dos membros da equipe e proporcionam feedback
adequado do desempenho tenderão a se envolver mais numa
metacognição efetiva do que aqueles líderes que não apresentam estes
comportamentos de liderança.
No processo motivacional
da equipe
1. Equipes cujos líderes estabelecem objetivos elevados de desempenho,
exortam e encorajam os membros a adotarem e alcançarem esses
objetivos, fornecendo estratégias de desempenho, apresentarão uma
eficácia e uma coesão maior da equipe do que aqueles líderes que não
se envolvem em atividades desse tipo.
No processo afetivo da
equipe
1. Equipes cujos líderes proporcionam objetivos claros de desempenho,
designação de papéis e estratégias de desempenho reagirão de forma
menos emocional nas circunstâncias estressantes e apresentarão
menos reações emocionais contagiantes do que aquelas equipes cujos
líderes proporcionam pouca ou nenhuma estrutura e direcionamento.
2. Equipes cujos líderes estabelecem e encorajam normas de controle
emocional apresentarão menores conflitos afetivos do que aqueles
líderes que não estabelecem esse tipo de normas.
Na coordenação da equipe 1. Equipes cujos líderes combinem as capacidades individuais dos
membros com os papéis requeridos, ofereçam estratégias claras de
desempenho, monitorem e forneçam feedback sobre o cumprimento
dessas estratégias e recalibrem as ações dos membros da equipe em
virtude das mudanças nas condições do ambiente coordenarão melhor
e mais efetivamente do que aqueles líderes que não apresentam essas
atividades.
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Zaccaro, Rittman e Marks (2001, p. 458-476)
72
2.8. Resumo
O tema liderança foi discutido em três blocos complementares. No primeiro, foram
apresentadas algumas definições de liderança e do líder. Buscou-se em Argyris (1957),
compreender os primórdios do surgimento da função liderança nas organizações. Mostrando a
amplitude desse tema, Conger (1992) afirma que a liderança é um conceito intuitivo e com
baixa probabilidade de se encontrar uma definição simples e aceita. Ao se buscar o
pragmatismo, encontrou-se, em Drucker (2001), uma linha que define a liderança como sendo
o próprio trabalho de identificar e definir a missão da organização. Kotter (2000) acrescenta à
discussão, as diferenças entre gerenciamento (lidar com a complexidade do dia-a-dia) e
liderança (promover a mudança). Ambos refutam a idéia de lideres carismáticos e “salvadores
da pátria”.
No segundo bloco, foi discutido o papel do líder em uma equipe de trabalho. Tanto
Garvin (2002) como Senge (2002) apontam para três tarefas/papéis que a pessoa que lidera
uma equipe deve ter. A primeira tarefa, apontada por Garvin (2002), é a criação de
oportunidades para aprendizagem por meio da projeção de cenários e eventos que induzem às
atividades necessárias. A segunda, cultivo do tom correto como forma de nutrir normas e
comportamentos de engajamento desejáveis. E a terceira, liderança pessoal do processo de
discussão enquadrando o debate, fazendo perguntas, ouvindo com atenção e fornecendo
feedback. Os três papéis, que os lideres devem desempenhar no processo de aprendizagem
organizacional, mencionados por Senge (2002) são: líderes projetistas, líderes professores e
líderes servidores (steward). Senge (2002), assim como Drucker (2001) e Kotter (2000),
refuta os mitos de liderança ligados a imagens de “heróis e salvadores da pátria” e, propõe um
processo de liderança focado em forças sistêmicas e no aprendizado coletivo. Ulrich (2000)
73
complementa os autores mencionados com quatro referenciais e seis dimensões dos atributos
que um líder de equipe deve apresentar. Os referenciais são: definição da trajetória;
mobilização do comprometimento pessoal; desenvolvimento das capacidades organizacionais;
e demonstração de caráter pessoal. As dimensões: conversão da visão em ação;
compartilhamento do poder e da autoridade; construção da infra-estrutura organizacional;
organização e posicionamento de equipes; vivência dos valores; auto-imagem
positiva/criação da auto-estima em terceiros.
Alguns elos entre os processos de aprendizagem individual, organizacional, criação do
conhecimento e o processo de liderança de equipes foram pontuados. Para uma discussão
mais ampla, buscou-se em Nonaka e Takeuchi (1997) três modelos de liderança que permitem
um elo entre o processo de liderança e criação do conhecimento. O primeiro, top-down é
indicado para o gerenciamento do conhecimento explícito. O segundo, bottom-up é indicado
para gerenciar o conhecimento tácito. O terceiro, middle-up-down é adequado ao
gerenciamento da interface entre o conhecimento tácito e o explícito. Para os autores, cabe
aos gerentes de nível médio (middle-up-down) a liderança de equipes ou forças tarefas para a
criação do conhecimento nas organizações.
Garvin (2002) faz referência ao elo entre aprendizagem (individual e organizacional) e
os fatores facilitadores de liderança nesses dois processos. O autor indica quatro requisitos
para o desenvolvimento das habilidades dos líderes: abertura a novas perspectivas;
consciência de viéses pessoais; exposição aos dados in natura; e senso de humildade. DiBella
e Nevis (1999) acrescentam que o líder deve dar o exemplo e fazer aquilo que fala. Os autores
reforçam que os líderes devem ser os primeiros a estudar e a desenvolver o conhecimento de
forma que possam ser reconhecidos como exemplo daquilo que aprenderam e, com isso,
sirvam de exemplo para que os liderados também aprendam. Zaccaro, Rittman e Marks
74
(2001), assim como Drucker (2001), têm uma visão prática do processo de liderança. Estes
autores buscam a eficácia da equipe por meio de processos de liderança e de equipe. Zaccaro,
Rittman e Marks (2001) apresentaram um esquema com vinte e três dimensões para auxiliar
na compreensão do papel do líder na eficácia da equipe. Os autores categorizaram a influência
das funções do desempenho do líder em: cognitiva, motivacional, afetiva e de coordenação.
Com base nessas categorias, os autores formularam sete proposições que podem ser usadas
para se conseguir a eficácia de equipes.
Retomando o modelo conceitual discutido no referencial sobre aprendizagem (Figura
10), parece ficar evidenciado que a atuação do líder em uma equipe de trabalho merece
estudos adequados, em especial nos elos com a distribuição do conhecimento, a interpretação
da informação, a memória organizacional e o conhecimento coletivo. Parece também existir
possibilidades de aprofundamento desse modelo básico e prévio , estudando-o em séries
seqüenciais, que poderiam ser denominadas modelos 1, 2 e assim sucessivamente.
Figura 10 Modelo conceitual prévio do trabalho
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Huber (1991), Nonaka e Takeuchi (1997)
Aquisição do
conhecimento
Distribuição
do “conhecimento”
Interpretação
do “conhecimento”
Memória
organizacional
Conhecimento
individual
Conhecimento
coletivo
Criação do conhecimento
• Compartilhamento do conhecimento
• Criação de conceitos
• Justificação de conceitos
• Construção de um arquétipo
• Novo ciclo de criação do conhecimento
L
í
d
e
r
75
3. PROBLEMA DE PESQUISA, DELIMITAÇÃO E OBJETIVOS
Laville e Dionne (1999) pesquisaram as origens da palavra “problema” e chegaram a
conclusão que ela tem raízes nas palavras gregas pro (na frente) e ballein (jogar), ou seja
problema seria algo como jogar na frente. Para Barros e Lehfeld (1986), o processo de
investigação científica origina-se com a escolha de um assunto. Para uma adequada escolha,
os autores colocam que fatores externos (pressão da realidade circundante e política
institucional) e internos (curiosidade, imaginação, experiência e filosofia) do pesquisador
devem ser utilizados para a seleção e formulação do problema. Os autores afirmam que o
projeto de pesquisa deve responder a oito perguntas essenciais para o planejamento adequado
de uma pesquisa, explicitadas no Quadro 18.
Quadro 18 Perguntas essenciais para o planejamento adequado de uma pesquisa
1. O que fazer? Definição do tema e problema.
2. Por que fazer? Justificativa da escolha do problema.
3. Para que fazer? Objetivos gerais e específicos.
4. Quando fazer? Cronograma de execução.
5. Onde fazer? Local. Campo da pesquisa.
6. Com que fazer? Recursos de custeio.
7. Como fazer? Metodologia.
8. Feito por quem? Pesquisador (es).
Fonte: Adaptado de Barros e Lehfeld (1986, p. 97)
De acordo com Ferreira (1998), um problema de pesquisa se caracteriza pela
proposição de algo que deve ser resolvido. Esse algo pode ser tanto de ordem prática
(problemas empíricos) quanto de ordem teórica (problemas de revisões ou validações
conceituais). Gil (1994) afirma que o problema deve ser formulado como pergunta, ser claro,
preciso, empírico, suscetível de solução e delimitado a uma dimensão viável. Kerlinger (1980)
76
também coloca que o problema de pesquisa deve ser expresso em forma de pergunta. Laville
e Dionne (1999, p. 87) acrescentam à discussão a variável conhecimento, ao afirmarem que:
“um problema de pesquisa é um problema que se pode „resolver‟ com conhecimentos e dados
já disponíveis ou com aqueles factíveis de serem produzidos”. Os autores argumentam que
um problema de pesquisa não é algo que pode ser resolvido pela tradição, experiência,
intuição ou bom senso. Ele requer informações suplementares que precisam ser obtidas a fim
de delimitá-lo, compreendê-lo e resolvê-lo. Em resumo, pode-se considerar que o problema de
pesquisa é uma questão ainda não resolvida, relacionando pelo menos duas variáveis e objeto
de discussão e comprovação em um determinado domínio do conhecimento.
Em relação à delimitação do problema de pesquisa, Cervo e Bervian (1996) e Vergara
(1998) concordam que o foco está no processo de seleção de tópicos ou partes que devem ser
focalizadas, deixando claro ao leitor interessado o que o estudo contém e aquilo que não
contém. Vergara (1998) afirma que a realidade é muito complexa por um lado e histórica de
outro. Não se pode analisar seu todo, então cuida-se apenas de parte dessa realidade, ou seja,
delimita-se essa realidade. A autora alerta que a delimitação do problema de pesquisa não
pode ser confundida com a definição do universo e da amostra de pesquisa. A delimitação
trata de limites concernentes a variáveis aos pontos que serão estudados, de cortes transversais
e/ou longitudinais no problema de pesquisa, do tempo destinado ao objeto, entre outros.
Cervo e Bervian (1996) contextualizam a delimitação do problema de pesquisa,
partindo de um esquema em que de um lado têm-se os vários objetivos extrínsecos elencados
para posterior escolha do assunto e de outro têm-se listados os vários critérios de seleção. Para
auxiliar o pesquisador na escolha do assunto, entram em cena as técnicas de delimitação:
decomposição em partes; circunstâncias de tempo e espaço; definição dos termos e
tratamento. Esses mesmos autores argumentam que o pesquisador pode dar distintos
77
tratamentos (psicológico, sociológico, histórico, filosófico, estatístico, etc.) para um mesmo
assunto. Esses tratamentos indicam qual a direção que o assunto está alinhado.
Köche (1997, p. 106) agrega o relacionamento de variáveis as definições vistas até este
ponto, afirmando que “um problema de investigação delimitado expressa a possível relação
que possa haver entre, no mínimo, duas variáveis conhecidas”. Segundo o autor, quando o
pesquisador delimita seu problema, usando a imaginação e seus conhecimentos que possui,
ele estabelece uma possível ordem na relação entre os fatos. Em outras palavras, a delimitação
do problema de pesquisa é resultado de um trabalho mental, com bases teóricas, com o
objetivo de estruturar as peças soltas do quebra cabeças, buscando o entendimento da rede de
relações que existe entre os fatos. Triviños (1987) reforça que a delimitação do problema não
é a mesma coisa que a formulação do mesmo. A delimitação é algo muito mais específico do
que a formulação.
O problema de pesquisa deste trabalho é: De que forma a atuação do líder contribui
para o processo de aprendizagem organizacional do conhecimento criado nas equipes de
desenvolvimento de novos produtos? As delimitações do problema deste trabalho são:
1) Não será objeto deste trabalho o estudo do processo de liderança como um todo,
mas sim a atuação do líder em equipes de projetos de desenvolvimento de novos
produtos;
2) Os temas aprendizagem organizacional e desenvolvimento de novos produtos
também não serão explorados em suas totalidades;
3) O processo de criação do conhecimento também não será foco deste trabalho.
Santos (2002), Richardson (1989), Santos e Parra (1998) usam a mesma classificação
para objetivos, definindo-os em gerais e específicos. Santos (2002) compara o objetivo geral
de um projeto de pesquisa científica com uma espinha dorsal. O autor pretende reforçar que o
78
estabelecimento do objetivo é o fio condutor que o pesquisador deve seguir para atingir seus
intentos de pesquisa. O autor argumenta também, que na prática, montar o objetivo geral
consiste numa escolha subjetiva por parte do pesquisador, que é antepor um verbo que
expresse a sua ação intelectual de escolha. Essa escolha é baseada em seis estágios cognitivos
que possuem graus crescentes de complexidade, conforme demonstrados no Quadro 19.
Quadro 19 Estágios cognitivos possibilitadores de ações intelectuais
Estágios Verbos Complexidade
Conhecimento Apontar, citar, classificar, conhecer, definir, descrever,
identificar, reconhecer, relatar.
1 = Baixa
Compreensão Compreender, concluir, deduzir, demonstrar, determinar,
diferenciar, discutir, interpretar, localizar, reafirmar.
2
Aplicação Aplicar, desenvolver, empregar, estruturar, operar,
organizar, praticar, selecionar, traçar.
3
Análise Analisar, comparar, criticar, debater, diferenciar,
discriminar, examinar, investigar, provar.
4
Síntese Compor, construir, documentar, especificar, esquematizar,
formular, produzir, propor, reunir, sintetizar.
5
Avaliação Argumentar, avaliar, contrastar, decidir, escolher, estimar,
julgar, medir, selecionar.
6 = Alta
Fonte: Adaptado de Santos (2002, p. 66)
Para Santos (2002, p.64-65, 68) o objetivo geral “deve expressar claramente aquilo
que o pesquisador pretende conseguir com sua investigação. Não é o que ele „vai fazer
braçalmente‟ (isto se prevê nos procedimentos), mas o que pretende conseguir como resultado
intelectual final de sua investigação”. O mesmo autor define objetivos específicos como
aqueles que “indicam as partes do conteúdo do futuro texto, a ser produzido na fase de
redação”. Segundo Richardson (1989, p. 23-24), objetivos gerais são aqueles que “definem de
modo geral, o que se pretende alcançar com a realização da pesquisa”. Para esse mesmo autor
objetivos específicos são aqueles que “definem aspectos determinados que se pretende estudar
e que contribuem para alcançar o objetivo geral”. Santos e Parra (1998, p.210) definem
79
objetivo geral como aquele que “procura dar uma visão geral do assunto da pesquisa. O
pesquisador deve mostrar a importância do assunto, tendo em vista o conhecimento geral do
mesmo e a temática proposta. Ele deve mostrar a importância do trabalho a ser desenvolvido e
sua contribuição para a ampliação do conhecimento geral relativo ao mesmo”. Para objetivo
específico esses autores o definem como sendo algo “intrínseco ao objetivo geral, que define
o ponto central do trabalho. Isso quer dizer que dentro de uma idéia geral do trabalho, deve-se
ressaltar a idéia específica a ser desenvolvida”.
O objetivo geral deste trabalho é compreender a atuação do líder no processo de
aprendizagem organizacional do conhecimento em equipes de desenvolvimento de novos
produtos. Os objetivos específicos são:
1) Explicitar como os membros das equipes de desenvolvimento de novos produtos
adquirem um determinado conhecimento;
2) Explicitar como o conhecimento é compartilhado entre os membros das equipes de
desenvolvimento de novos produtos;
3) Explicitar como o conhecimento criado é retido na memória organizacional;
4) Entender as ações que o líder deve tomar para criar um clima propício à
aprendizagem.
80
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
4.1. Sobre a Pesquisa Qualitativa
Godoy (1995) analisa historicamente a evolução da pesquisa qualitativa, em três
períodos. No primeiro que compreende a segunda metade do século XIX, com o estudo
sociológico de Fréderic Le Play (1806-1882) Les ouvries européens, publicado em 1855, que
discorria sobre as famílias das classes trabalhadoras da Europa, pode ser considerado como
pioneiro na abordagem qualitativa. O segundo de 1930 a 1960, embora nesse período tivesse
ocorrido um declínio no uso da abordagem qualitativa, houve importante contribuição da
Escola de Chicago em relação aos pontos de vista metodológico (por exemplo, a aceitação da
entrevista) e conceitual (por exemplo, o aparecimento do interacionismo simbólico,
desenvolvido por Herbert Blumer em 1937). O terceiro a partir dos anos 60, em que a
pesquisa qualitativa foi incorporada em outras áreas (psicologia, educação, administração, por
exemplo) além da sociologia e antropologia. O aparecimento de publicações específicas sobre
essa metodologia, reforçou seu uso pelos pesquisadores.
Segundo Flick (2004), tradicionalmente as ciências sociais e a psicologia adotam como
modelo as ciências naturais e seus aspectos exatos e padronizados. Surge então o uso de
metodologia quantitativa para entender os fenômenos pesquisados. Todavia, esse método não
se mostra efetivo em todas as situações, pois a ciência já não pode mais produzir “verdades
absolutas” que podem ser usadas de forma indiscriminada. Passa então a existir a necessidade
de uma metodologia que possa estudar as relações sociais considerando a pluralização das
81
esferas de vida. A metodologia qualitativa, cujas idéias centrais divergem daquelas
empregadas na quantitativa, se baseia em quatro aspectos:
Apropriabilidade de métodos e teorias – o modelo de relacionamento causa e efeito já
não é mais suficiente para os estudos empíricos, pois se fossem usados todos os
objetos complexos deveriam ser excluídos dos estudos;
Perspectivas dos participantes e sua diversidade – a pesquisa qualitativa deve estudar o
conhecimento e as práticas dos participantes de um estudo e considerar as diversas
perspectivas subjetivas e ambientes sociais relacionados;
Reflexividade do pesquisador e da pesquisa – as subjetividades do pesquisador e dos
pesquisados fazem parte do processo de pesquisa. A comunicação do pesquisador com
o campo e seus membros é parte explícita da produção do conhecimento;
Variedade de abordagens e métodos na pesquisa qualitativa – distintas abordagens e
métodos caracterizam as discussões e as práticas da pesquisa. O ponto de partida são
as visões subjetivas.
Segundo Godoy (1995), Godoy e Alves (2004) existem cinco características básicas que
identificam os estudos denominados qualitativos:
A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta de dados e o
pesquisador como instrumento fundamental – valorização do contato direto e
prolongado do pesquisador com o ambiente e situação estudada;
A pesquisa qualitativa é descritiva – o foco do pesquisador está no processo ao invés
de resultados e/ou produto;
O significado que as pessoas dão as coisas e à sua vida são a preocupação essencial do
investigador – tentativa de compreensão dos fenômenos a partir da perspectiva dos
participantes;
82
Pesquisadores utilizam o enfoque indutivo na análise de seus dados – pesquisadores
partem de questões ou focos de interesse amplos ao invés de hipóteses estabelecidas a
priori;
A palavra organizada por meio de textos é a forma como os dados são expressos em
estudos qualitativos – os textos são então submetidos a um processo analítico.
Triviños (1987) afirma que o processo da pesquisa qualitativa não admite visões isoladas,
parceladas e estanques. Esse tipo de pesquisa se desenvolve de modo dinâmico, ora
realimentando-se ora reformulando-se continuamente. Para Alves-Mazzotti (2002), o
planejamento de estudos qualitativos não é uma tarefa fácil. As investigações qualitativas
devido ao seu caráter diverso e por requer flexibilidade não são aderentes à regras precisas e
aplicáveis a uma ampla variedade de casos. Outro ponto relevante diz respeito ao grau de
estruturação prévia. A autora menciona autores como Lincoln e Guba (1985) que defendem
um mínimo de estruturação e autores como Marshall e Rossman (1989), Milles e Huberman
(1984) que argumentam em favor de um maior grau de estruturação. De acordo com Alves-
Mazzotti (2002), um projeto de pesquisa não é uma “camisa de força”, mas sim um guia que
orienta o pesquisador aonde ele quer chegar e os respectivos meios que pretende utilizar.
A opção deste trabalho é adotar um certo grau de estruturação pelas seguintes razões:
O pesquisador tem em mente o objetivo geral e os específicos. Dessa forma
acredita-se que esses objetivos devam ser explicitados, mesmo correndo-se o risco
de reajustá-los posteriormente;
Foram estudadas e contempladas teorias sobre os temas aprendizagem
organizacional e liderança. Por que não explicitá-las?;
83
Se não houver foco e critérios, mesmo que não suficientemente precisos, corre-se o
risco de se perder tempo, levantar dados de forma excessiva e, consequentemente,
dificultar a etapa de análise e interpretação destes dados.
4.2 Explicitação do Paradigma
Alves-Mazzotti (2002) afirma que não existem metodologias “boas” ou “más”, mas
sim metodologias adequadas ou não adequadas para estudar determinado problema. A autora
recomenda ao pesquisador que antes de iniciar a descrição dos procedimentos ele demonstre a
adequação do paradigma que será adotado no trabalho proposto. De acordo com Morgan e
Smircich (1980), os debates relativos a metodologia de pesquisa no campo das Ciências
Sociais está diretamente ligado as premissas sobre ontologia, epistemologia e a natureza
humana. Para estes autores, a Ciência Social contemporânea é dominada pelo uso de métodos
de pesquisa mais preocupados com o resultado final do que com o processo da pesquisa em si.
Argumentam que a pesquisa qualitativa é uma abordagem e não um conjunto de técnicas. A
decisão pela escolha da pesquisa qualitativa é derivada da própria natureza dos fenômenos
sociais estudados. Os autores ao analisarem as premissas ontológicas constróem uma escala
que considera a realidade como algo que transita entre o subjetivo (“one‟s mind is one‟s
world”) e o concreto (algo real/concreto que afeta todos de uma forma ou de outra). Do
mesmo modo, criam uma escala para as premissas sobre a natureza humana considerando
desde o homem como um ser de espírito puro e consciente até o homem como produto de
forças externas do ambiente onde está exposto. Em relação à postura epistemológica, os
autores constróem uma escala que varia desde a obtenção de uma visão fenomenológica até a
construção de uma ciência de caráter positivista. A metáfora referenciada para a subjetividade
84
é a transcendental e para a objetiva é a da máquina. Os métodos de pesquisa variam desde a
exploração da subjetividade em seu estado puro até experimentos em laboratórios e pesquisas
que retratam aspectos objetivos. No Quadro 20, os autores explicitam um esquema sugerindo
que todas as abordagens das Ciências Sociais são baseadas em um conjunto interrelacionado
de premissas relativas aos aspectos ontológicos, epistemológicos e de natureza humana.
Quadro 20 A estrutura de premissas básicas que caracterizam o debate entre objetividade e
subjetividade nas Ciências Sociais
Subjetividade Objetividade
Principais
premissas
ontológicas
Realidade como
projeção da
imaginação
humana.
Realidade
como
construção
social.
Realidade
como
domínio do
discurso
simbólico.
Realidade
como campo
contextual da
informação.
Realidade
como um
processo
concreto.
Realidade
como
estrutura
concreta.
Premissas sobre
a natureza
humana
Homem como
um ser de
espírito puro e
consciente.
Homem como
construtor
social; o
criador da
simbologia.
Homem
como um
ator; o
usuário da
simbologia.
Homem
como
processador
de
informação.
Homem
como
adaptador.
Homem
como
respondente.
Postura
epistemológica
básica
Obter visão
fenomenológica,
revelação.
Entender como
a realidade
social é criada.
Entender
padrões de
discurso
simbólico.
Mapear
contextos.
Estudar
sistemas,
processos,
mudança.
Construir
ciência
positivista.
Algumas
metáforas
favoritas
Transcendental. Jogo de
linguagem,
performance,
texto.
Teatro,
cultura.
Cibernética. Organismo. Máquina.
Métodos de
pesquisa
Exploração da
subjetividade
pura.
Hermenêutica. Análise
simbólica.
Análise
contextual
gestáltica.
Análise
histórica.
Experimento
laboratorial,
pesquisa.
Fonte: Morgan e Smircich (1980, p. 492)
A natureza do fenômeno a ser estudado frente a estrutura proposta por Morgan e
Smircich (1980) tende para uma posição intermediária entre a abordagem subjetiva e a
objetiva. Easterby-Smith e Araujo (2001) indicam que as pesquisas empíricas sobre o tema
aprendizagem organizacional estão centradas em processos que o pesquisador é um
observador distanciado ou participante ativo. Esse tipo de pesquisa acaba favorecendo o
levantamento do tipo survey, privilegiando resultados, ao invés de estudos de caso em
85
detalhes, que se ocupam do processo em si. Na opinião dos autores, existe escassez de estudos
que: buscam induzir teoria, considerando às práticas existentes; utilizam pequena amostra de
casos estudados em profundidade; focalizam em micropráticas dentro do âmbito
organizacional ou transorganizacional; e estudam processos conducentes de aprendizagem
organizacional.
4.3. Tipo de Pesquisa
Segundo Triviños (1987), existem três tipos de estudos com finalidades distintas:
exploratórios (permitem ao pesquisador aumentar sua experiência em relação a um dado
problema); descritivos (foco central no desejo do pesquisador de conhecer determinadas
características de uma comunidade); e experimentais (o pesquisador está preocupado em
estabelecer causas dos fenômenos com vistas a produzir modificações).
Quanto aos estudos qualitativos Godoy e Alves (2004), apontam uma extensa
variedade de tipos. Com base em levantamento feito nos Anais do ENANPAD de 2003 os
autores identificaram nove tipos de pesquisa: estudo de caso; estudo etnográfico; história de
vida/de empresa/oral; pesquisa fenomenológica; pesquisa documental; pesquisa-ação; análise
de narrativas; análise de discurso e grounded theory.
O tipo de pesquisa escolhido será um estudo de caso que investigará os fenômenos:
aprendizagem organizacional e atuação do líder em equipes de desenvolvimento de novos
produtos em uma empresa na indústria cosmética. A opção pelo estudo de caso foi baseada
em Yin (2001) que afirma que esse método tem uma aderência adequada para perguntas do
tipo como e por quê, além de não requerer controle sobre o comportamento dos eventos e
focalizar eventos contemporâneos. A opção de escolher uma empresa na indústria cosmética
86
considerou a necessidade mercadológica que essa indústria tem de lançar, regularmente, uma
grande quantidade de novos produtos. Normalmente uma empresa, nesse segmento,
desenvolve anualmente novos produtos numa média de 20% a 40% do seu portifólio. A
escolha da empresa Natura Cosméticos S/A considerou as informações contidas no prospecto
Oferta Pública Inicial de Ações, publicado em 2004, no qual a inovação é citada como uma
busca constante em todas suas atividades e a habilidade contínua em renovar o portifólio com
produtos inovadores é considerado um ponto essencial de sua estratégia. Considerou também
que a Natura acredita que o sucesso obtido nos lançamentos de linhas de produtos como
Chronos, Natura Ekos, Vitaplant, Tododia entre outras, demonstra sua capacidade em
desenvolver produtos e conceitos inovadores. A empresa avalia a vitalidade desse processo de
acordo com a parcela da receita decorrente de produtos novos, que ela considera inovadores,
lançados nos últimos 24 meses. Em 2003 esse indicador foi de 37,4%, 29,2% em 2002 e
28,6% em 2001.
87
4.4. O Estudo de Caso como Estratégia de Pesquisa
Yin (2001) menciona que o estudo de caso, assim como outras estratégias de pesquisa,
representa um modo de investigar um problema empírico, seguindo-se um conjunto de
procedimentos pré-especificados. Para o autor, um estudo de caso é uma investigação
empírica que:
Investiga um fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto da vida real,
especialmente quando os limites entre esse fenômeno e o contexto não tem clara
definição;
Enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá muito mais variáveis de
interesse do que pontos de dados. Como conseqüência, se baseia em diversas fontes de
evidências, com os dados necessitando convergir em forma de triangulação. E,
beneficia-se do desenvolvimento a priori de proposições teóricas para conduzir a
coleta e análise de dados.
Quanto a triangulação, Flick (2004) afirma que essa palavra é adequada para indicar a
combinação de distintos métodos, grupos de estudos, ambientes locais e temporais, bem como
distintas teorias usadas no tratamento de um fenômeno. Denzin (2000) apresenta quatro tipos
de triangulação:
De dados – uso de distintas fontes de dados, em que o ponto de partida é o
envolvimento intencional e sistemático dos entrevistados, de ambientes locais e
temporais de estudo;
Do investigador – uso de mais do que um investigador visando minimizar os viéses
pessoais e tendenciosos, típicos dos seres humanos;
88
Da teoria – uso de vários pontos de vistas teóricos, permitindo ao pesquisador várias
perspectivas e hipóteses;
Metodológica – uso da triangulação dentro do método (por exemplo, usar subescalas
distintas para medir uma questão do questionário) e uso da triangulação entre métodos
(por exemplo, combinar questionário com entrevista semi estruturada).
Neste trabalho será usado o primeiro tipo, a triangulação de dados, pelo uso de
documentos, entrevistas semi-estruturadas e observação não participante. O tipo metodológico
também deverá ser usado, pois se pretende usar o intramétodo, combinando as entrevistas
com Notas de Campo.
Yin (2001) afirma que um projeto de pesquisa usando o estudo de caso deve representar
um conjunto lógico de proposições e ter uma preocupação com a qualidade. O autor aponta
quatro testes que devem ser usados para a determinação da qualidade de qualquer pesquisa
social empírica:
Validade do constructo – estabelecimento de medidas operacionais adequadas para os
conceitos que estão sendo estudados;
Validade interna – estabelecimento de uma relação causal por meio da qual são
evidenciadas certas condições que levam a outras;
Validade externa – estabelecimento do domínio sob o qual as descobertas de um
estudo podem ser generalizadas;
Confiabilidade – demonstração que as operações de um estudo podem ser repetidas,
apresentando os mesmos resultados.
O Quadro 21 apresenta os quatro testes mencionados, as táticas recomendadas e a
referência à fase da pesquisa em que a tática deve ser usada.
89
Quadro 21 Testes, táticas e referências recomendadas para estudo de caso
Testes Táticas do estudo de caso Fase da pesquisa na qual a
tática deve ser aplicada
Validade do
constructo
Utiliza fontes múltiplas de evidências;
Estabelece encadeamento de evidências;
O rascunho do relatório do estudo de caso é
revisado por informantes-chave.
Coleta de dados;
Coleta de dados;
Composição.
Validade
interna
Faz adequação ao padrão;
Faz construção da explanação;
Faz análise de séries temporais.
Análise de dados;
Análise de dados;
Análise de dados.
Validade
externa
Utiliza lógica de replicação em estudos de
casos múltiplos.
Projeto de pesquisa.
Confiabilidade Utiliza protocolo de estudo de caso;
Desenvolve banco de dados para estudo de
caso.
Coleta de dados;
Coleta de dados.
Fonte: Yin (2001, p. 55)
Neste trabalho serão usadas algumas táticas visando garantir a qualidade da pesquisa.
Em relação a validade interna, a tática será a confrontação dos dados com a proposição teórica
deste trabalho (Figura 10). Lincoln e Guba (1985) recomendam o uso de duas técnicas para
melhorar a validade do estudo. A primeira, peer debriefing, como forma efetiva de aumentar a
credibilidade por meio de discussões entre o pesquisador e as pessoas consideradas como
pares. Neste estudo será usada essa técnica, por meio da submissão de textos às pessoas com
reconhecido expertise nos temas aprendizagem organizacional, liderança e desenvolvimento
de novos produtos. O trabalho feito pela orientadora, de leitura crítica, correção e
estabelecimento de novos desafios é uma forma de peer debriefing. A segunda técnica,
member checks, recomendada pelos autores consiste em envolver os participantes da pesquisa,
por meio de perguntas adicionais, verificação de entendimento, cruzamento de respostas etc.
Em relação a validade externa, pretende-se no futuro replicar esse estudo de caso em outras
empresas. De acordo com Yin (2001), a lógica da replicação é análoga àquela usada em
experimentos múltiplos e, pode ser tanto teórica (produção de resultados que contrastem
90
apenas por razões previsíveis) ou literal (previsão de resultados semelhantes) . Quanto a
confiabilidade será usado um banco com os dados relevantes deste estudo de caso.
91
4.5. Estratégia de Amostragem
Para Alves-Mazzotti (2002), é fundamental que o pesquisador defina a população a ser
pesquisada e o tipo de amostra escolhido. Schwandt (2000) afirma que em uma pesquisa
qualitativa a amostra não é uma questão de representatividade, mas sim de relevância.
Segundo o autor, a relevância pode advir de três situações típicas:
A escolha das unidades de análise é determinada em função da curiosidade do
pesquisador e por ele acreditar que o fenômeno compreendido nelas é crítico para a
compreensão do processo, conceito ou teoria explicativa;
O conhecimento apriorístico do pesquisador determina a escolha das unidades de
análise. O pesquisador então, busca uma situação típica ou um caso desviante, único;
A necessidade de comparação é determinante para a escolha das unidades de análise.
Para Flick (2004), a questão da amostragem emerge em distintos pontos do processo de
pesquisa. Em um estudo para entrevistas, a amostragem relaciona-se à decisão sobre quais
sujeitos serão entrevistados e quais serão seus grupos de origem. Em conseqüência disso,
surge a decisão sobre quais entrevistados devem ter seus dados transcritos e interpretados. Na
seqüência, surge outra decisão sobre quais as partes de um texto devem ser selecionadas para
a adequada interpretação da pesquisa. E, finalmente surge a indagação: quais casos ou partes
de texto são mais adequados para a apresentação das descobertas da pesquisa? Para o autor,
existem dois pólos determinantes da amostragem. O primeiro baseado em critérios mais ou
menos abstratos. E, o segundo em critérios mais ou menos concretos.
Flick (2004) apresenta doze estratégias de amostragem na pesquisa qualitativa. As duas
primeiras são a determinação a priori e coleta completa. As oito seguintes são amostragens:
teórica, de caso extremo, de caso típico, de variedade máxima, da intensidade, de caso crítico,
92
de caso delicado e de conveniência. As duas restantes são a seleção primária e a secundária.
O Quadro 22 retrata as doze estratégias propostas pelo autor.
Quadro 22 Estratégias de amostragem na pesquisa qualitativa
Estratégia Resumo
1. Determinação a
priori
Decisões são tomadas com vistas a selecionar casos ou grupos de
casos.
2. Coleta completa Busca de dados por meio de uma coleta completa.
3. Amostragem teórica Processo, controlado pela teoria em formação, de coletar, codificar
e analisar dados para a geração da teoria.
4. Amostragem de caso
extremo
O campo de estudo é revelado a partir das suas extremidades,
visando a compreensão do todo.
5. Amostragem de caso
típico
Seleção de casos nos quais o sucesso ou fracasso são típicos na
média ou maioria dos casos. Campo revelado de dentro e do seu
centro.
6. Amostragem da
variação máxima
Integração daqueles casos que forem os mais diferentes possíveis
visando revelar o alcance da variação e da diferenciação no campo.
7. Amostragem da
intensidade
Escolha de casos que tenham maior intensidade, ou integram-se e
comparam-se sistematicamente casos com diferentes intensidades.
8. Amostragem de caso
crítico
Seleção de casos nos quais as relações a serem estudadas tornam-se
especialmente claras ou importantes para a avaliação da pesquisa.
9. Amostragem de caso
delicado
Seleção de casos politicamente importantes ou delicados, a fim de
apresentar descobertas positivas na avaliação mais eficaz.
10. Amostragem de
conveniência
Seleção daqueles casos mais fáceis de serem acessados em
determinadas condições.
11. Seleção primária Integração dos critérios gerais para um “bom informante”
(respondente): conhecimento, experiência, capacidade de refletir e
articular, disponibilidade de tempo e prontidão para participar da
pesquisa.
12. Seleção secundária Casos onde nem todos os critérios satisfazem aqueles mencionados
na seleção primária, especialmente conhecimento e experiência.
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Flick (2004, p. 76-86)
As estratégias da escolha da amostra deste trabalho serão baseadas nos critérios de
amostragem de caso crítico, de conveniência e seleção primária. Serão entrevistados
aproximadamente três membros, sendo um obrigatoriamente o líder, de três equipes de
projetos de desenvolvimento de novos produtos. Há cerca de doze equipes de projetos de
93
desenvolvimento de novos produtos que serão consideradas como a população desta pesquisa.
Os aproximadamente nove membros de três equipes de projetos que serão entrevistados são a
amostra desta pesquisa.
Será adotado como unidade de análise as equipes de projeto, conforme será explicitado
no item desenvolvimento de novos produtos na empresa pesquisada. Cada equipe é composta
por um líder com mínimo três e no máximo cinco membros fixos. Membros adicionais são
incorporados à equipe de acordo com a complexidade do projeto e a decisão cabe ao líder do
projeto.
94
4.6. O Papel do Pesquisador
Cabe ao pesquisador buscar acesso adequado ao campo de pesquisa, praticar a
interação com os entrevistados e ter claro o critério de quando deixar o campo. Segundo Yin
(2001), o pesquisador necessita possuir habilidades de elaboração de perguntas, assimilação
de informações e interpretação das respostas. O pesquisador também deve ser flexível,
rigoroso com os aspectos metodológicos e ter uma base sólida de conhecimento sobre o
objeto de estudo. O autor acrescenta a essas habilidades o cuidado que o entrevistador deve
ter para não influenciar sua pesquisa pelo uso de viéses pessoais.
De acordo com Yin (2001), o pesquisador necessita possuir pelo menos quatro
habilidades:
Elaborar perguntas adequadas e interpretar as respostas. A curiosidade deve estar
sempre presente, de modo que o pesquisador se pergunte o tempo todo o porque que
os eventos aconteceram. Isto, na realidade é um ciclo em que uma pergunta
desencadeia outras;
Assimilar as informações de forma isenta e ser bom ouvinte. As ideologias devem ser
postas de lado e os acontecimentos devem ser vistos de modo genérico;
Usar a flexibilidade e adaptabilidade, sem contudo perder o rigor da metodologia;
Usar uma base sólida de conhecimentos que exigem interpretação clara daquilo que é
necessário ao estudo. Esse não é um trabalho mecânico.
Yin (2001) acrescenta a essas habilidades o cuidado que o entrevistador deve ter para não
influenciar sua pesquisa pelo uso de viéses pessoais. Para reduzir essa possibilidade e
aumentar a confiabilidade do estudo, o autor recomenda a elaboração de protocolo que oriente
a pesquisa. O autor recomenda um protocolo com as seguintes seções:
95
Visão geral do projeto do estudo de caso – objetivos e patrocínios do projeto,
perguntas do estudo de caso e leituras relevantes sobre o tema que está sob
investigação;
Procedimentos de campo – credenciais de acesso aos locais de estudo de caso, fontes
de informações e advertências de procedimento;
Questões do estudo de caso – questões específicas que o pesquisador deve manter em
mente ao coletar os dados. Uma planilha para disposição específica dos dados e as
fontes de potencial de informações, quando cada pergunta é respondida;
Guia para o relatório do estudo de caso – resumo, formato das narrativas,
especificações de informações bibliográficas e demais documentos.
Convém ressaltar que o pesquisador deste estudo de caso trabalha na empresa pesquisada,
embora em área distinta de onde irá ocorrer o estudo. O pesquisador atua na área da
Qualidade e o estudo de caso será realizado na área de Inovação. Para franquear o acesso do
pesquisador ao campo, neste trabalho, foi feita uma solicitação, via e-mail, para o diretor
responsável. A resposta foi positiva. Também foi mantido contato com o gerente responsável
pela administração de todos os projetos de desenvolvimento de novos produtos. O objetivo
deste contato foi estabelecer uma interação com a área a ser pesquisada e também obter
maiores informações sobre os projetos atualmente em curso na empresa. Foi definido o
critério da saturação como indicador que será usado para interromper as entrevistas. De
acordo com Machado (2002), as entrevistas devem ser interrompidas quando elas deixam de
oferecer informações suplementares.
Cuidados especiais deverão ser tomados, uma vez que o pesquisador por fazer parte da
força de trabalho da empresa pesquisada pode apresentar viéses indesejáveis à pesquisa.
Recomenda-se uma postura de outsider e total isenção de partido, bem como respeitar e
96
mencionar as fontes de dados disponibilizados, em alguns casos até de forma privilegiada.
Outro aspecto que merece cuidado do pesquisador neste trabalho é sua posição hierárquica.
Ela pode “mascarar” algumas respostas dos entrevistados. Caberá ao pesquisador buscar uma
postura de neutralidade e ter a compreensão de que a neutralidade completa é um “ideal”
praticamente impossível de ser alcançado. Caberá também ao pesquisador reforçar aos
entrevistados o caráter acadêmico da pesquisa.
97
4.7. Técnica de Coleta de Dados
De acordo com Alves-Mazzotti (2002), as pesquisas qualitativas usam vários
procedimentos e instrumentos de coleta de dados. A autora ressalta que as técnicas mais
utilizadas são: observação participante; observação não participante; entrevistas em
profundidade; e análise de documentos.
4.7.1. TIPOS DE FONTES DE EVIDÊNCIAS
Yin (2001) indica seis tipos de fontes de evidências usadas em estudos de caso:
registros em arquivos, entrevistas, observação direta, observação participante, artefatos físicos
e documentação. Na investigação da documentação podem ser consideradas as seguintes
fontes: cartas, memorandos e outros tipos; agendas, avisos e minutas de reuniões, e outros
relatórios escritos de eventos em geral; documentos administrativos; estudos e/ou avaliações
formais do mesmo “local” sob estudo; e recortes de jornais e outros artigos publicados na
mídia. Yin (2001) recomenda que sejam considerados os pontos fortes e fracos de cada uma
das seis fontes de evidências descritas. No Quadro 23 são apontados os pontos fortes e fracos
para as três fontes de evidências a serem utilizadas na pesquisa.
Quadro 23 Fontes de evidências e seus pontos fortes e fracos
Fonte de evidência Pontos fortes Pontos fracos
Documentação Estável – pode ser revisada inúmeras
vezes.
Discreta – não foi criada como resultado
do estudo de caso.
Exata – contém nomes, referências e
detalhes exatos de um evento.
Ampla cobertura – longo espaço de
tempo, muitos eventos e muitos
ambientes distintos.
Capacidade de recuperação pode ser
baixa.
Seletividade tendenciosa, se a coleta
não estiver completa.
Relato de visões tendenciosas – reflete
idéias preconcebidas (desconhecidas)
do autor.
Acesso pode ser deliberadamente
negado.
98
Fonte de evidência Pontos fortes Pontos fracos
Entrevistas Direcionadas – enfocam diretamente o
tópico do estudo de caso.
Perceptivas – fornecem inferências
causais percebidas.
Visão tendenciosa devido a questões
mal elaboradas.
Respostas tendenciosas.
Ocorrem imprecisões devido à
memória fraca do entrevistado.
Reflexibilidade – o entrevistado dá ao
entrevistador o que ele quer ouvir.
Observação não
participante
Realidade – tratam de acontecimentos em
tempo real.
Contextuais – tratam do contexto do evento.
Consomem muito tempo.
Seletividade – salvo ampla cobertura.
Reflexibilidade – o acontecimento
pode ocorrer de forma diferenciada
porque está sendo observado.
Custo – horas necessárias pelos
observadores humanos.
Fonte: Yin (2001, p. 108)
Para maximizar os benefícios obtidos a partir das fontes de evidências e controlar a
qualidade do estudo de caso, Yin (2001) apresenta três princípios. O primeiro é o uso de
várias fontes de evidência. O segundo é a criação de um banco de dados para o estudo de
caso. Esse banco de dados aumenta a confiabilidade do estudo. O terceiro princípio é manter o
encadeamento de evidências. Para Yin (2001), essa técnica objetiva abranger a máxima
amplitude na descrição, explicação e compreensão do tema da pesquisa. Essa técnica tem
como princípio básico que é impossível conceber a existência isolada de um fenômeno social,
sem considerar suas raízes históricas, significados culturais, vinculações estreitas e
fundamentais com o entorno social. O autor resume a técnica em três etapas:
Processos e produtos centrados no sujeito – pelo pesquisador por meio de percepções
(entrevista, questionário), comportamentos e ações; pelo próprio sujeito e por
documentos internos e/ou externos;
Elementos produzidos pelo meio do sujeito – instrumentos legais (leis, decretos,
regimentos etc.) e oficiais (diretrizes, dados estatísticos, etc.);
99
Processos e produtos originados pela estrutura sócio-ecônomica cultural do macro
organismo social do sujeito – modos de produção (capitalismo, socialismo etc.) e
forças e relações de produção, prioridade dos meios de produção e classes sociais.
A coleta de dados nesta pesquisa será realizada por meio de entrevistas em profundidade,
apoiadas em roteiro semi-estruturado, por observação não participante e análise da
documentação disponibilizada pela empresa pesquisada.
4.7.2. ENTREVISTA SEMI ESTRUTURADA EM PROFUNDIDADE
Para Godoy e Alves (2004), a entrevista é um método de coleta de dados que busca
resposta para as questões sobre o que as pessoas fazem, pensam ou sentem. Fontana e Frey
(2000) complementam, afirmando que a entrevista é o mais comum e poderoso meio usado
para entender os seres humanos. Segundo os autores, o tipo mais comum de entrevista é a
individual, face a face. As entrevistas podem ser estruturadas, semi-estruturadas ou
desestruturadas. A entrevista estruturada refere-se a uma situação na qual o entrevistador
pergunta para cada respondente uma série de questões pré-estabelecidas e com um conjunto
limitado de categorias de respostas.
Para Queiroz (1991), o registro da informação viva, por meios eletrônicos de gravação,
realça a observação que provém diretamente do respondente e de suas motivações específicas.
A autora chama a atenção para o significado da técnica do gravador e suas fases. Em uma
fase, embora captada a fala do respondente com fidelidade, existe um recorte pela não
captação do não verbal. Na outra fase, que é a passagem daquilo que foi gravado para forma
escrita, ainda se perde algo. Porém, o documento escrito será, mesmo não retratando a
realidade em sua totalidade, a base para o trabalho seqüencial do pesquisador.
100
Machado (2002) apresenta três enfoques no processo de entrevista de pesquisa. Para o
primeiro enfoque, o interesse do pesquisador está na obtenção de respostas quantificáveis.
Esse enfoque tem como base o desenvolvimento de técnicas de construção de questionários e
de escalas de medidas e atitudes. No segundo enfoque, o interesse do pesquisador é apreender,
a partir das representações feitas pelos sujeitos da pesquisa. Nesse enfoque o pesquisador
deve ser compreensivo e não se preocupar com a padronização da pergunta e sim no seu
significado para o entrevistado. Como conseqüência, a análise das informações obtidas na
pesquisa também passa por etapas de desenvolvimento. Em uma primeira etapa, a técnica de
análise do conteúdo do material qualitativo torna-se útil para a delimitação das categorias
temáticas. Na seqüência essas categorias podem ser quantificadas ou sofrerem tratamento de
forma menos atrelada a uma contagem de ocorrências. No terceiro enfoque, o entrevistado é o
sujeito central. O discurso é obtido preferencialmente com pouca interferência do
entrevistador. As informações obtidas são tratadas por meio da análise do discurso. No
Quadro 24 estão sintetizados os pontos principais dos três enfoques.
Quadro 24 Enfoques da entrevista de pesquisa
Enfoque I Enfoque II Enfoque III
Roteiro de perguntas ou
questionário.
Não diretiva. Não diretiva.
Entrevistador Formula questões. Escuta benevolente. Escuta benevolente.
Sujeito Escolhido aleatoriamente,
por procedimentos de
amostragem.
Selecionado como
representando um
grupo.
Central, expressando
uma formação
discursiva.
Objeto Passível de medida e de
quantificação.
Representação social. Discurso.
Análise Estatística: freqüência,
correlação etc.
Análise de conteúdo. Análise de discurso.
Qualidade Depende de padronização. Depende de facilitação. Depende de interação.
Fonte: Machado (2002, p. 58)
101
No presente trabalho será adotado o Enfoque II, com uso de roteiro semi-estruturado
para a condução da entrevista em profundidade. As entrevistas serão gravadas e
posteriormente transcritas e analisadas. Adicionalmente, será analisada a documentação de
desenvolvimento de novos produtos e dados de negócio, disponibilizados pela empresa.
4.7.3. OBSERVAÇÃO NÃO PARTICIPANTE
Flick (2004) afirma que a observação é uma habilidade metodologicamente
sistematizada e aplicada na pesquisa qualitativa. A observação reúne as percepções baseadas
na audição, tato e olfato. Quanto a flexibilidade da observação, Yin (2001) e Alves-Mazzotti
(2002) apontam a existência de dois tipos: formal (estruturada, sistemática) e informal (não
estruturadas, assistemáticas, livres). Na formal são desenvolvidos protocolos do estudo de
caso que incluem observação de reuniões, atividades de trabalho, entre outras. Alves-Mazzotti
(2002) identifica três níveis de quantificação possíveis na observação formal: sistema de sinal
(quando é registrado apenas a presença ou ausência do comportamento durante a observação,
sem preocupação com freqüência e grau em que ocorre); registro de freqüência; e escalas que
permitem estimar o grau de ocorrência de um determinado comportamento. Na informal, são
realizadas observações ao longo da visita de campo, incluindo situações durante as quais estão
sendo coletadas outras evidências. Yin (2001) recomenda a existência de mais do que um
observador com o objetivo de aumentar a confiabilidade das evidências observacionais.
Alves-Mazzotti (2002) enumera as principais vantagens da observação não
participante:
Não depende da capacidade verbal ou do nível de conhecimento dos sujeitos;
Possibilita verificar, na prática, a sinceridade de algumas respostas que, algumas
vezes, são dadas somente para causar “boa impressão”;
102
Possibilita a identificação de comportamentos não-intecionais e explorar tópicos
que os sujeitos não se sentem a vontade para discutir;
Permite registrar o comportamento em seu contexto temporal-espacial.
Para Flick (2004) existem sete fases que devem ser consideradas durante o processo de
observação:
Selecionar adequadamente o ambiente. Onde e quando os processos e os sujeitos
que forem significativos para a pesquisa podem ser observados;
Definir aquilo que deve ser documentado, caso a caso, durante a observação;
Treinar os observadores visando a padronização dos focos;
Desenvolver observações descritivas que ofereçam uma representação geral inicial
do campo;
Desenvolver observações focadas que se concentrem nos aspectos relevantes à
questão de pesquisa;
Desenvolver observações seletivas visando a apreensão intencional apenas dos
aspectos focais da pesquisa;
Decidir quando finalizar a observação. Um critério pode ser o da saturação teórica,
ou seja, quando outras observações não estiverem mais agregando conhecimento
adicional.
A observação não participante será realizada e registrada por meio de Notas de Campo
para depreender, especialmente, a atuação do líder. A base teórica que fundamentará a
elaboração do instrumento será o “espectro” de respostas em discussão de aprendizagem de
Garvin (2002), conforme mencionado no referencial teórico. O autor analisa o espectro de
respostas do líder em discussões de aprendizagem variando de posicionamentos que vão
desde a reflexão e facilitação até a intrusão e a intervenção, por parte do líder. Quatro
103
características serão observadas (manutenção do foco em quem fala, injeção de pontos de
vista apoiador e/ou negativo e envolvimento do uso aberto de poder e autoridade) em uma
escala de respostas que varia desde o silêncio até a ameaça.
104
4.8. Análise de Dados
Para Flick (2004), a interpretação de dados é o cerne da pesquisa qualitativa. Freitas e
Janissek (2000) recomendam a análise léxica e de conteúdo para se tratar qualquer forma de
texto, não importando sua natureza. Para os autores, a análise de conteúdo é constituída por
uma leitura profunda de cada uma das respostas, que codificadas individualmente, chega-se a
uma idéia sobre o todo. Na análise léxica, passa-se da análise do texto para a análise do
conjunto de todas as palavras transcritas dadas pelos respondentes. Os autores reforçam que
as análises léxica e de conteúdo são técnicas que se complementam, são seqüenciais e
recorrentes quando se busca explorar os dados em estudos qualitativos. Em suma, Freitas e
Janissek (2000) descrevem esse processo de análise de conteúdo em três etapas: leitura e
decomposição de um texto, construção e documentação de uma grade temática e uma
avaliação e comparação dos temas que levam ao conhecimento sobre o objetivo da pesquisa.
4.8.1. ANÁLISE DE CONTEÚDO
Bardin (1977) descreve seis etapas sucessivas para análise exploratória do texto: pré-
análise; codificação; categorização; tratamento dos dados; inferência e interpretação. Segundo
a autora, a análise de conteúdo pode seguir tanto uma perspectiva objetivista, por meio de
enfoque quantitativo, ou uma tradição qualitativa em que o pesquisador visa compreender as
características, estruturas e/ou modelos que permeiam os fragmentos de mensagens que são
tomadas em consideração. Miles e Huberman (1994) recomendam elaborar a análise de
conteúdo em três níveis: sumarizando e ordenando os dados; reclassificando e agregando os
dados; e desenvolvendo e testando proposições para a construção de uma estrutura
105
explanatória. Os autores com base em Carney (1990) sugerem que esses três níveis sejam
escalonados por meio de uma escada de abstração analítica, conforme demonstrado na Figura
11.
Figura 11 A escada de abstração analítica
Fonte: Miles e Huberman (1994, p. 92)
A discussão envolvendo a evolução da análise de conteúdo pode ser dividida em duas
etapas. Numa primeira, anterior as décadas de 50 e 60, em que predominava o método
quantitativo e uma segunda na qual o método qualitativo passou a ser aceito e usado no
campo das ciências sociais. Segundo o autor, a discussão na primeira metade do século XX
era marcada pela defesa do rigor nas análises, o que de certa forma demandava o uso de
métodos quantitativos. Porém, os pesquisadores começaram a perceber que a inferência
Fazer verificação cruzada. Montar
matriz com os temas chave.
Sintetizar: integrar os
dados em uma
estrutura explanatória.
Criando um
texto
para ser
trabalhado
Buscando
codificação
para um conjunto
adequado de
categorias
Identificando
temas
e tendências no
conjunto de
dados
Testando hipóteses e
reduzindo a quantidade
de dados para
análise de tendência
Delineando
uma
estrutura
profunda
1. Sumarizando e
ordenando os dados
Reconstruir os transcrições em notas escritas. Fazer sinopse das
entrevistas individuais.
Codificar os dados. Escrever notas analíticas conectando
comas varias estruturas de interpretação.
Buscar relacionamento nos dados: escrever
notas analíticas. Encontrar as ênfases e as
lacunas nos dados levantados.
2. Reclassificando e agregando
os dados
Níveis
3. Desenvolvendo e testando
proposições para a construção de uma
estrutura explanatória
106
(variáveis inferidas partindo-se de variáveis de inferência ao nível da mensagem) era uma
característica significativa na análise de conteúdo e, nesse caso, o método quantitativo
apresentava limitações. Começa-se aí uma nova etapa aonde o uso do método qualitativo
passou a ser reforçado, principalmente, em áreas como psicologia, educação e administração.
Para entender as diferenças entre estas duas metodologias, buscou-se na literatura
definições de cada uma delas. No caso da metodologia quantitativa, Bardin (1977, p. 114)
afirma que “a abordagem quantitativa fundamenta-se na freqüência de aparição de certos
elementos da mensagem”. Para a definição da metodologia qualitativa, Bardin (1977, p. 114)
diz que “a abordagem não quantitativa, recorre a indicadores não frequenciais susceptíveis de
permitir inferências; por exemplo, a presença (ou a ausência), pode constituir um índice tanto
(ou mais) frutífero que a freqüência de aparição”. Godoy (1995, p. 58) acrescenta que “de
maneira diversa, a pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ou medir os eventos
estudados, nem emprega instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou
focos de interesses amplos, que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve”. Nesse
ponto, cabe questionar se existe predominância de uma abordagem em relação a outra. Bardin
(1977) menciona que as duas abordagens não têm o mesmo campo de ação. A abordagem
quantitativa obtém dados descritivos com o uso de método estatístico, que permite uma
análise mais objetiva, fiel e exata. Para a abordagem qualitativa usa-se um procedimento mais
intuitivo, maleável e adaptável, para índices não previstos ou mesmo para analisar a evolução
das hipóteses.
De acordo com Machado (2002), a análise de conteúdo foi criada inicialmente como uma
técnica de pesquisa visando uma descrição objetiva, sistemática e quantitativa de mídias como
jornais, revistas, filmes, rádio, TV. Na atualidade a análise de conteúdo é cada vez mais usada
107
para análise de material qualitativo oriundo de entrevistas de pesquisa. A autora argumenta
que a análise de conteúdo em sua forma clássica, quantitativa, demandava nove etapas:
1) Delimitação do universo de onde seria extraída a amostra;
2) Desenho da amostra sobre a qual a análise se realizará, feito por meio de técnicas de
amostragem;
3) Formulação, clara, precisa e sucinta do problema de pesquisa;
4) Exame cuidadoso do material a ser analisado;
5) Levantamento de hipóteses de trabalho;
6) Levantamento de variáveis e categorias de análise baseadas no problema de pesquisa;
7) Escolha das unidades de análise;
8) Pré-teste e melhoramento do esquema de análise construído;
9) Tabulação dos resultados e realização das análises pertinentes.
Machado (2002) afirma que no uso mais recente a análise conteúdo requer: uma definição
clara do problema em estudo; tratamento das entrevistas em profundidade; seleção explicitada
e justificada dos entrevistados com base nos objetivos que se pretende alcançar; e tratamento
do material da entrevista de acordo com os temas que surgem do próprio conteúdo obtido. A
autora aponta que o resultado da análise de conteúdo pode ser apresentado em forma de
tabela, na qual as células conteriam as falas particulares dos entrevistados. O simples
levantamento dos temas abordados nas entrevistas, em muitos casos, é o próprio objetivo da
pesquisa.
Neste trabalho será adotada a linha contemporânea da análise de dados, proposta por
Machado (2002). Serão feitas entrevistas semi-estruturadas em profundidade com três líderes
e alguns membros de equipes de desenvolvimento de novos produtos. Na seqüência os dados
108
serão analisados à luz da análise de conteúdo qualitativa (Bardin 1977), segundo uma
categorização temática.
4.8.2. O USO DE SOFTWARE EM PESQUISA QUALITATIVA
Flick (2004) afirma que o caráter essencial da pesquisa qualitativa vem sendo
influenciado pela mudança tecnológica ocorrida nos últimos anos. O autor menciona quatorze
possibilidades para uso de softwares no contexto da pesquisa qualitativa, que vai desde
anotações do campo, passando pela análise de conteúdo e culminando com a redação do
relatório. Flick (2004) menciona dois tipos de softwares. O primeiro ATLAS.ti, baseado na
abordagem da grounded theory e da codificação teórica segundo Strauss. Esse software
desenvolvido por Muhr na década de 90 é um programa construtor de redes conceituais que
auxilia operações no nível textual e conceitual. O outro software, o NUD.IST (atualmente
NVIVO), desenvolvido por Richards e Richards, também na década de 90, é um programa
construtor de teorias com base em códigos.
Freitas e Moscarola (2000) apresentam o software SPHINX em três versões. A
primeira, SPHINX PRIMO que permite definir o questionário, digitar as respostas, tratar e
analisar os resultados. A outra versão, SPHINX PLUS, é um programa que permite a
concepção e o tratamento de enquêtes, de análise estatística e de gestão de dados. A versão
SPHINX LÉXICA, integra funções de concepção e edição de enquêtes, de análise e gestão de
dados das versões anteriores, enriquecendo suas funções de navegação lexical e ofertando
novas alternativas de leitura, análise e quantificação de dados textuais.
Tentativamente, durante a fase de análise de dados, será testado o uso do software
NVIVO.
109
4.9. Resumo
Do exposto até este ponto, observa-se uma seqüência de etapas essenciais para o
planejamento da pesquisa. Essa seqüência está resumida no Quadro 25, juntamente com a
síntese dos procedimentos metodológicos.
Quadro 25 Síntese das principais etapas do trabalho e dos procedimentos metodológicos
Definição do
tema e
problema
O problema de pesquisa deste trabalho é: De que forma a atuação do líder contribui
para o processo de aprendizagem organizacional nas equipes de projetos de
desenvolvimento de novos produtos?
Justificativa da
escolha do
problema
Compreender a aprendizagem organizacional de criação do conhecimento e, a
atuação do líder nesse processo, em equipes de projetos de desenvolvimento de novos
produtos em uma empresa de grande porte na indústria cosmética.
Objetivos
gerais e
específicos
O objetivo geral deste trabalho é compreender a atuação do líder no processo de
aprendizagem organizacional do conhecimento em equipes de desenvolvimento de
novos produtos. Os objetivos específicos são:
1. Explicitar como os membros das equipes de desenvolvimento de novos
produtos adquirem um determinado conhecimento.
2. Explicitar como o conhecimento é compartilhado entre os membros das
equipes de desenvolvimento de novos produtos.
3. Explicitar como o conhecimento criado é retido na memória organizacional.
4. Entender as ações que o líder deve tomar para criar um clima propício à
aprendizagem.
Local/Campo
de pesquisa
Na área de desenvolvimento de novos produtos de uma empresa de grande porte na
indústria de cosméticos.
Procedimentos
metodológicos
1. Pesquisa qualitativa e uso do estudo de caso
2. Técnica de coleta de dados
2.1. entrevista semi-estruturada (em profundidade) com base em roteiro pré-
determinado
2.1.1. registro das entrevistas
2.1.2. transcrição das entrevistas
2.2. observação não participante
2.3. análise da documentação
3. Confiabilidade: Notas de Campo
4. Validade: triangulação de dados intra-métodos e várias fontes de evidências
5. Seleção da amostra: quatro equipes de projetos de desenvolvimento de novos
produtos compostas por quatro líderes e oito membros.
6. Análise de conteúdo, abordagem qualitativa com categorização temática
7. Relatório final
Pesquisador Roberto Zardo, Mestrando em Administração de Empresas
Fonte: Elaborado pelo Autor com base em Barros e Lehfeld (1986, p. 97)
110
5. PROJETO DE DESENVOLVIMENTO DE NOVOS PRODUTOS
“Para que o pessoal seja inovador e motivado, é preciso levar em conta as necessidades
humanas. Alguém que se sinta bem e se ache admirado, torna-se muito mais aberto a várias
coisas do quem sempre precisa defender-se”.
Andreas Rihs, CEO, Phonak
Inicialmente serão abordados alguns dados relevantes da empresa escolhida, Natura
Cosméticos S.A. Isto é necessário para que se possa entender a conexão entre aprendizagem
organizacional, criação do conhecimento e atuação do líder no processo de desenvolvimento
de novos produtos. Na seqüência, será abordado de forma sucinta o processo de
desenvolvimento de novos produtos da empresa, conhecido como Funil de Inovação. Não é
objetivo deste trabalho um aprofundamento teórico desse processo, mas sim possibilitar seu
entendimento quanto às interfaces com os processos de aprendizagem organizacional da
criação do conhecimento e a atuação do líder de equipes de projetos nesse processo.
5.1. Contextualização da Empresa Pesquisada
Visando contextualizar a empresa e o ambiente onde será feito este estudo de caso é
importante resgatar um breve histórico da Natura, que didaticamente foi dividido em três
ciclos. O primeiro ciclo reflete o nascimento da Natura em 1969, com uma loja e um
laboratório em São Paulo. Surgem duas grandes paixões: pelos cosméticos e seu poder de
transformação; e pelo cultivo das relações. Em 1974 inicia-se a opção pela venda direta, que
viabiliza o crescimento da empresa. Nasce a Consultora de beleza Natura (CN) e expande-se o
111
atendimento personalizado. Em 1979 novas empresas se juntam ao sistema. Na década de
oitenta a Natura ganha força com novos produtos e conquista novos mercados regionais no
Brasil. Ao contrário do que acontece com grande parte das empresas nesse período, a Natura
registra crescimento de trinta e cinco vezes em dez anos.
No segundo ciclo existe a fusão das quatro empresas que formavam o sistema Natura e
a ampla reorganização interna deram início à constituição da companhia. No início da década
de 90 ocorre a explicitação das Crenças e a formalização do compromisso social. A empresa
prepara-se para a abertura do mercado brasileiro. De 1993 a 1997 atinge um crescimento de
5,5 vezes em cinco anos. A internacionalização da Natura é iniciada em 1994 e expande
gradualmente, com Centros de Distribuição e formação de CN‟s na Argentina, Bolívia, Chile
e Peru. O terceiro ciclo tem início a partir de 2000 com o lançamento de nova marca; entrada
na área da saúde; novo posicionamento de mercado da Flora Medicinal, laboratório de
produtos fitoterápicos; início da utilização de princípios ativos da flora brasileira; lançamento
do site www.natura.net; e mudança da fábrica e áreas administrativas para o Novo Espaço
Natura em Cajamar. Uma ampla ação de relançamento da marca Natura na Argentina alcança
grande repercussão e causa impacto positivo nos indicadores de desempenho da operação.
Em maio de 2004, a Natura abre seu capital ao divulgar uma oferta pública de ações
ordinárias. A oferta é concretizada por meio de ações ordinárias negociadas no segmento do
Novo Mercado da BOVESPA (Bolsa de Valores de São Paulo).
Em relação à natureza das atividades, a Natura é uma empresa que produz cosméticos,
produtos de higiene, perfumaria e de saúde com marcas reconhecidas pelos consumidores,
como Chronos, Natura Ekos, Faces de Natura, Natura Fotoequilíbrio, Natura Maquilagem,
Natura Mamãe & Bebê e Natura Criança. Também merecem destaque as marcas de
perfumaria Essencial de Natura, Sintonia e Kaiak. Há, ainda, a linha Crer para Ver, que conta
112
com a participação de designers, artistas e fornecedores para a produção de camisetas,
embalagens e cartões, vendidos voluntariamente pelas CN‟s, com o objetivo de obter recursos
que financiem projetos voltados para as escolas da rede pública.
Os produtos chegam aos consumidores principalmente por meio de mais de trezentas e
cinqüenta mil CN‟s, que realizam a venda direta em aproximadamente cinco mil municípios
em todas as regiões do Brasil e no mercado latino-americano. Portanto, a Natura tem dois
clientes básicos: as 357.000 CN‟s e os 11.000.000 de consumidores finais. Ambos os dados
baseados nas informações fornecidas pela empresa referentes ao período encerrado em 31 de
março de 2004.
Em 2003, a Natura obteve uma receita bruta de R$ 1,9 bilhão. Em suas fábricas foram
produzidos mais de cento e quarenta milhões de itens e no Centro de Distribuição foram
processados, diariamente, cerca de dezessete mil pedidos. A estrutura organizacional,
analisada sob a ótica dos conceitos da cadeia de valor de Porter (1985), é composta por quatro
atividades primárias e seis de apoio. As primárias são: operações e logística (suprimentos,
planejamento e controle da produção, produção, manutenção, armazenagem e distribuição),
marketing de produtos e do canal (desenvolvimento de produtos, desenvolvimento do canal de
venda direta), comercialização (vendas diretas, planejamento mercadológico, operações nos
países da América Latina e atendimento aos clientes) e operações internacionais
(desenvolvimento de mercados, exceto o latino americano). As atividades de apoio são:
planejamento estratégico, gestão da qualidade, gestão de recursos humanos, gestão de
assuntos corporativos e responsabilidade social, gestão financeira e de assuntos jurídicos e
gestão da tecnologia da informação.
113
Para facilitar o processo de determinação e entendimento do processo de
desenvolvimento de novos produtos, é conveniente analisar o institucional da Natura,
composto por sua visão, razão de ser, estratégia, crenças e valores.
A visão da empresa:
“A Natura, por seu comportamento empresarial, pela qualidade das relações que
estabelece e por seus produtos e serviços, será uma marca de expressão mundial,
identificada com a comunidade das pessoas que se comprometem com a construção
de um mundo melhor através da melhor relação consigo mesmas, com o outro, com
a natureza da qual fazem parte, com o todo”. NATURA (2003, p. 6).
Sua razão de ser:
“Criar e comercializar produtos e serviços que promovam o bem-estar/estar-bem.
Bem estar é a relação harmoniosa, agradável, do indivíduo consigo mesmo, com seu
corpo. Estar bem é a relação empática, bem-sucedida, prazerosa, do indivíduo com o
outro, com a natureza da qual faz parte, com o todo”. NATURA (2003, p. 6).
Em relação a estratégia, ela declara:
“A Natura continuará ampliando sua participação no mercado, por meio do
aperfeiçoamento constante das suas relações com seus diversos públicos e do
desenvolvimento de produtos e serviços inovadores. Ao mesmo tempo, ampliará sua
presença internacional, seja por meio da consolidação dos atuais mercados, seja com
a conquista de novos na América Latina. Prospectar os mercados dos Estados
Unidos e da Europa, principalmente com a linha Natura Ekos, está igualmente entre
os objetivos da empresa. O uso sustentável dos recursos da biodiversidade brasileira
é a principal plataforma de crescimento dos negócios, tanto no Brasil quanto no
exterior. A opção pela venda direta, no Brasil e na América Latina, implica o
compromisso sempre renovado de estimular e participar do desenvolvimento
pessoal, material, social e profissional das consultoras Natura. A empresa continuará
investindo no estreitamento do vínculo com esse importante público e na ampliação
do número de consultoras em atividade. Ao estabelecer prioridades, a Natura
reafirma a diretriz de crescer com base em sua Razão de Ser – criar e comercializar
produtos que promovam o Bem-Estar e o Estar Bem. São princípios, por sua vez,
norteados pelas Crenças e Valores da empresa. Na condução dos seus negócios, a
Natura continuará adotando práticas de gestão baseadas nos conceitos do
desenvolvimento sustentável, observando os impactos econômicos, sociais e
ambientais de suas atividades. Como forma de disseminar esses princípios, a Natura
permanecerá investindo na educação e no conhecimento das diversas comunidades
com as quais se relaciona”. NATURA (2003, p. 7).
O conjunto dos quatro valores e das seis crenças da Natura explicitados no documento
visão de mundo Natura (2000) estão descritos nos Quadros 26 e 27, respectivamente.
114
Quadro 26 Conjunto dos valores da Natura
Humanismo – Cultivo
das relações.
Valoriza ao máximo as relações e o potencial humano. Respeita e
estimula a individualidade que enriquece a diversidade. Busca
contribuir para o aperfeiçoamento da sociedade e da qualidade das
relações com cada uma de suas ações.
Criatividade - Ousar,
inovar.
Busca soluções inovadoras com alegria, ousadia, determinação e
paixão. Objetiva o aperfeiçoamento contínuo com intuição,
sensibilidade e conhecimento.
Equilíbrio - Harmonia,
interdependência.
Inspira-se no equilíbrio e na dinâmica da natureza. Percebe o Homem
como parte da natureza, com a qual deve harmonizar-se, e valoriza a
interação com ela. Busca aliar consciência e competência. Discurso e
prática. Saber e fazer. Ética e Estética.
Transparência - Claro,
evidente, que se deixa
conhecer.
Vive seus processos abertamente. É franca, à vontade. É contra
ambigüidades, manipulações e discriminação em todas as relações.
Busca com determinação a qualidade e reconhece suas imperfeições.
Compartilha suas dúvidas e a busca de respostas.
Fonte: Visão de mundo Natura (2000)
115
Quadro 27 Conjunto de crenças da Natura
A vida é um encadeamento de
relações.
Nada no universo existe por si só. Tudo é interdependente.
Acreditamos profundamente que na percepção da
importância das relações exista a oportunidade de uma
grande revolução humana na busca da paz, da harmonia, da
beleza do ser.
A busca permanente do
aperfeiçoamento é que
promove o desenvolvimento
dos indivíduos, das
organizações e da sociedade.
No mundo, cada ser, cada organização, cada país tem
potencial para se aperfeiçoar e para aperfeiçoar suas ações.
Acreditamos que o processo de busca desse aperfeiçoamento
é sempre gerador de conquistas, enriquecimento e sabedoria.
O compromisso com a verdade
é o caminho para o
aperfeiçoamento e a qualidade
das relações.
Na sociedade de consumo em geral, e no mundo dos
cosméticos em particular, têm prevalecido o engano, o
ilusório, o falso na busca do êxito a qualquer preço. A
sociedade perde assim a oportunidade de viver relações
baseadas em verdades que personalizam e aperfeiçoam
indivíduos e organizações. Acreditamos que o compromisso
com a verdade é o caminho para uma evolução
transformadora em todas as relações, tanto pessoais quanto
de mercado.
A vida se manifesta através da
diversidade.
Quanto maior a diversidade, maior a riqueza e vitalidade de
todo o sistema, de toda a rede de relações. É assim na
ecologia ambiental. Assim é também na ecologia das
relações humanas. Acreditamos que o cultivo da interação
entre os diferentes gera-se a energia necessária à evolução
dos indivíduos, das organizações e da sociedade.
A busca da beleza, enquanto
aspiração da alma, da mente e
do corpo, deve estar liberta de
preconceitos e manipulações.
A beleza é um legítimo anseio de todo ser humano. Em
nossa sociedade esse anseio é manipulado com a imposição
de estereótipos e preconceitos que estabelecem para a beleza
padrões de idade, raça e comportamento. Acreditamos que
na desmistificação desta atitude e na relação harmoniosa de
nossa mente, cultivando e preservando nosso corpo, existe a
possibilidade de a beleza cada vez mais se manifestar e ser
percebida.
A empresa é um dinâmico
conjunto de relações. Seu valor
e sua perpetuação estão ligados
a sua capacidade de contribuir
para o aperfeiçoamento da
sociedade.
As empresas existem para atender às necessidades dos
indivíduos e da sociedade através de produtos, serviços e
ações que contribuam para um desenvolvimento econômico
e ambientalmente sustentável, além de socialmente mais
justo. Acreditamos que seu valor se amplia
proporcionalmente à sua capacidade de estabelecer relações
de qualidade com consumidores, consultoras, colaboradores,
fornecedores, acionistas e toda a comunidade, promovendo
seu enriquecimento material, emocional e espiritual.
Fonte: Visão de mundo Natura (2000)
116
Para entender como a Natura se posiciona no processo de relacionamento com as
pessoas, internamente chamados de colaboradores, foi-se buscar no documento Vivendo a
Marca Natura (2000) a definição do Ser Natura e como ela define o indivíduo:
“Ser você mesmo tem sido um desafio numa sociedade tão cheia de regras, de
expectativas e de modelos de comportamento. No entanto, a nossa felicidade
depende do desenvolvimento pleno de nossa individualidade, da nossa evolução e da
possibilidade de sermos aceitos e amados pelo que de fato somos. Lutar por mudar
essa sociedade e ajudar as pessoas na busca de sua felicidade é colocar em prática a
Visão de Mundo Natura. É ser Natura. Por isso a presença do nome Natura num
produto, num evento, num lugar, num gesto qualquer deve sempre significar que ali
tem também um compromisso com o desenvolvimento pleno do indivíduo, seja
dirigido a ele mesmo, seja dirigido ao meio com o qual ele interage. Quando isso
acontece, a marca Natura ganha realidade, força, magnetismo e as pessoas podem
viver uma Experiência Natura”.
“O Indivíduo é isso: um ser não dividido, indivisível. É assim que a Natura vê uma
pessoa: um ser integral, com mil faces, mil papéis, mil compromissos, visões e
reações que mudam e variam no tempo e no espaço. Mudam porque as pessoas são
vivas e as relações também. Viver Natura através das relações é apaixonar-se por
essa riqueza do ser humano, reconhecendo a importância do outro em nossa vida e a
importância que cada um de nós tem na vida do outro. É aí que reside a
possibilidade de criar uma rede de relações que nos acolha, nos alimente e nos
promova, que suporte e embale nosso desenvolvimento e nossos sonhos. Ao atrair
consumidores, consultoras, parceiros, fornecedores, profissionais da saúde, da
beleza, da imprensa, do Brasil e de fora, e tantos outros que conosco se relacionam,
somos colaboradores e acionistas, responsáveis por aproximar, estimular, enriquecer
e fortalecer essa extensa e crescente rede de relações que conosco sonha e constrói
um mundo melhor”.
Buscando elucidar porque a Natura prefere chamar de colaboradores todas as pessoas
que fazem parte da sua força de trabalho, buscou-se no documento vivendo a marca Natura
(2000) como ela construiu este termo:
“Colaborar: laborar junto; trabalhar na mesma obra. Uma definição mais próxima
para a mais essencial das relações da Natura. Ao compartilhar com um grupo
crescente de pessoas sua Razão de Ser e Visão de Mundo, a Natura entende estarem
na dinâmica das relações humanas a força e a energia necessárias a sua contínua
evolução. Essa dinâmica se inicia e se norteia pela qualidade das relações que
somos capazes de construir com nossos colaboradores mais diretos. Criar um
ambiente propício à diversidade de idéias e visões e ao respeito à individualidade, à
liberdade de expressão e à criatividade, ao estímulo ao espírito empreendedor e à
confiança mútua, ao aprendizado e ao desenvolvimento pessoal e profissional, ao
reconhecimento e á recompensa e, fundamentalmente, à transparência nas relações é
antes de tudo nosso desejo e nosso dever. É viver a marca através das relações em
nossa casa. Só assim, com consciência e competência, poderemos almejar ser a
escolha voluntária de nossos colaboradores para juntos, prazerosamente, vivermos
nossos sonhos e ousarmos levar cada vez mais longe o projeto Natura”.
117
5.2. Desenvolvimento de Novos Produtos na Empresa Pesquisada
O objetivo deste tópico é fornecer conceitos básicos sobre o processo de desenvolvimento
de novos produtos na Natura. Os dados foram obtidos por meio de entrevista com a gerente
responsável pelo gerenciamento de projetos de desenvolvimento de novos produtos da Natura
e pela disponibilização de documentação específica mencionada nas referências
bibliográficas. Não é foco deste trabalho a análise do processo de desenvolvimento de novos
produtos de uma forma ampla. O modelo Natura (1999) para a gestão do processo de
inovação, que compreende o desenvolvimento de novos produtos, tem como objetivos:
Alinhar os projetos de desenvolvimento de novos produtos com as estratégias dos
Segmentos de Produtos;
Aumentar a eficiência na conclusão de projetos;
Encurtar o tempo necessário para a realização dos projetos;
Introduzir um modelo de aproveitamento de idéias advindas das áreas técnicas, para
inovações orientadas pela tecnologia;
Disciplinar as atividades dos projetos em cada uma das fases do processo. Evitar
investimentos e gestos desnecessários;
Tornar claro para todos como e qual é o processo decisório.
O modelo é composto por três elementos: Funil de Inovação; Comitês de decisão; e
Ferramentas de Tecnologia da Informação (TI). Para efeitos deste trabalho será considerado
apenas o Funil de Inovação. A Natura define projeto como uma atividade organizada e
realizada em equipe por um prazo determinado, que consome recursos da empresa e origina
um novo produto, que atende uma necessidade estratégica do negócio. Todos os projetos de
118
novos produtos são executados por meio de equipes de projeto. Essas equipes têm sempre
um(a) líder, membros fixos e convidados. O líder é nomeado pela diretoria e/ou vice-
presidência da Área de Negócios da Natura. Esse líder tem como principal responsabilidade o
resultado prático do que se deseja obter na execução do projeto. Cabe ao líder responder pelo
projeto desde seu início até o 6.o mês após o lançamento, verificar se os objetivos foram
atingidos de acordo com os planos e recomendar melhorias no processo.
O Funil de Inovação da Natura, baseado nos trabalhos de Clark e Wheelwright (1993) e
Wheelwright e Clark (1995), é uma representação gráfica de cincos fases que vai desde o
desenvolvimento de idéias exploratórias até o lançamento do produto e sua avaliação do 1.o ao
6.o mês. Com base em Clark e Wheelwright (1993), a Natura classifica seus projetos em três
categorias: inovador, plataforma e extensão. Os critérios para essa classificação consideram
duas variáveis: tecnologia (que pode variar entre: nova, derivada ou existente) e criação da
necessidade para os clientes (que pode variar entre: latente, extensão ou reformulação de
linha). No Quadro 28 estão explicitadas as cinco fases, os objetivos de cada uma delas, os
resultados esperados e as respectivas responsabilidades.
119
Quadro 28 Funil de Inovação da Natura
Pré-briefing Briefing Plano Executivo I Pl. Executivo II Avaliação 1.o ao 6.
o mês
Pesquisas;
competitive
intelligence;
hábitos do
consumidor;
ciência;
tendências
Desenvolvimento
de idéias
exploratórias.
Desenvolvimento
de idéias
factíveis.
Operacionalização
da idéia.
Implementação
da idéia.
Lançamento.
Objetivos de
cada fase
Criar idéias e
buscar
oportunidades de
uso e
desenvolvimento
de novas
tecnologias para
novos produtos.
Converter a
tecnologia em
protótipos;
definir conceito
técnico e
demonstrar
interesse pelo
consumidor e
comercial.
Desenvolver os
componentes do
mix do produto;
quantificar
interesse pelo
consumidor e a
robustez comercial
do produto.
Adquirir
moldes e
equipamentos;
definir mix
final do
produto;
produzir.
Atividades de
lançamento;
acompanhar indicadores
até 6.o mês.
Resultado Plano de
aquisição de
tecnologia; pré-
briefing
Protótipos;
conceitos
técnicos;
briefing.
Design; conceito;
plano executivo I.
Mix final;
plano executivo
II.
Avaliação do 1.o ao 6.
o
mês.
Responsável Grupo de
tecnologia de
conceitos
avançados
Diretoria de
Inovação.
Equipe de projetos. Equipe de
projetos.
Equipe de projetos.
Fonte: Adaptado do Modelo Natura para a gestão do processo de inovação (1999, p. 10)
Para este trabalho serão consideradas apenas as três fases aonde existe
responsabilidade da equipe de projeto: operacionalização e implementação da idéia e
lançamento do produto. Nessas três fases as principais responsabilidades da equipe do projeto
estão resumidas no Quadro 29.
120
Quadro 29 Principais responsabilidades das equipes de projetos
Fase Atividades
Operacionalização da
idéia.
Definição da data de lançamento e cronograma;
Pesquisa qualitativa/quantitativa de componentes do mix do
produto;
Definir e registrar marca;
Desenvolver design e gerar protótipos de embalagem;
Elaboração do plano executivo I;
Submeter plano executivo I à aprovação.
Implementação da idéia. Elaboração do briefing integrado de comunicação;
Pesquisa quantitativa do mix de produto;
Avaliação financeira do projeto;
Definição das estratégias finais de lançamento;
Elaboração do plano executivo II;
Submeter plano executivo II à aprovação.
Lançamento. Finalização do plano de vendas e marketing;
Suporte ao treinamento de vendas e eventos de lançamento;
Avaliação financeira e de investimentos do projeto;
Elaboração da avaliação do 1.o ao 6.
o mês;
Submeter avaliação do 1.o ao 6.
o mês à aprovação.
Fonte: Adaptado do Modelo Natura para a gestão do processo de inovação (1999, p. 22-24)
Convém ressaltar que a Natura é uma empresa que se preocupa em vivenciar suas
crenças e valores em todas suas atividades e, em especial, no processo de desenvolvimento de
novos produtos, conforme pode ser verificado no trecho no documento Vivendo a Marca
Natura (2000):
“Os produtos Natura devem ser instrumentos de informação, ampliadores de
consciência e de busca de aperfeiçoamento do indivíduo. Cumprir sua função
específica, com qualidade e eficácia, é pré-requisito. É o ponto de partida para
construir uma experiência que deve despertar as sensações, emoções e reflexões
capazes de transformar hábitos automáticos do cotidiano em momentos conscientes
e prazerosos. Por isso, os produtos Natura são sempre inspirados pela busca do
equilíbrio, da transparência, da criatividade e do humanismo. Utilizam o estado da
arte em tecnologia para criar soluções aos problemas que se propõem resolver.
Ousam inovar sob todos os aspectos e exploram com consciência e propósito o uso
das cores, das fragrâncias, das texturas, dos sons, das temperaturas; tudo o que for
necessário para garantir uma experiência completa e gratificante desde o primeiro
contato. As embalagens, os cartuchos, as bulas, os anúncios, toda a comunicação dos
produtos também estão comprometidos com a criação das melhores condições, de
atitude e informação, para que a experiência seja bem-sucedida. Num produto
Natura tudo é detalhe, nada é por acaso”.
121
5.3 Resumo
A escolha do processo de desenvolvimento de novos produtos baseou-se na aderência
com os temas desenvolvidos no presente trabalho: aprendizagem organizacional da criação do
conhecimento e atuação do líder em equipes de desenvolvimento de novos produtos. O
critério de escolha da empresa a ser pesquisada foi o reconhecimento que a Natura
Cosméticos tem quando o tema é lançamento de novos produtos. Em média, mais do que 30%
da receita gerada nos últimos três anos foi proporcionada por lançamentos de novos produtos
inovadores. Foi elaborada uma contextualização da empresa e discorrido brevemente sobre o
processo formal de gerenciamento de projetos de lançamentos de novos produtos (Funil de
Inovação).
122
6. O PROCESSO DE TRATAMENTO DOS DADOS
O processo de tratamento consistiu-se de três fases: 1) organização da análise; 2)
codificação e 3) categorização. Os dados foram analisados com base em Bardin (1977) e
Miles e Huberman (1994).
6.1 Organização da análise
Nesta fase foram completadas três atividades, sendo a primeira delas relativa à doze
entrevistas realizadas. Originalmente pensou-se em um conjunto de nove entrevistas,
consistindo de uma entrevista com o líder de equipe de projetos de desenvolvimento de novos
produtos e dois liderados seus. Definiu-se como unidade de análise o grupo de entrevistados
(líder e dois liderados), doravante chamado de cluster. Em função do depoimento espontâneo
de um membro de equipe de projetos que, mencionou, ao ser entrevistado, um líder de
projetos como sendo benchmark no processo de liderança e aprendizagem organizacional, foi
incluído mais um cluster de entrevistas para que esse líder mencionado e dois membros de sua
equipe também pudessem ser entrevistados. Foi usada a técnica do gravador para registro das
entrevistas conduzidas por um roteiro pré-definido. Ao longo das primeiras entrevistas, o
roteiro foi sendo constantemente aprimorado para facilitar o entendimento das perguntas. Ao
total foram feitas seis revisões, sendo que a última foi avaliada por três juízes, mestrandos de
Administração de Empresas da Universidade Presbiteriana Mackenzie. As entrevistas foram
transcritas integralmente por um terceiro e revisadas pelo pesquisador. Esses cuidados
consistiram em uma etapa importante pois “concede” ao instrumento de coleta de dados maior
fidedignidade e validade. Ao final das transcrições, chegou-se a duzentas e vinte e três
123
páginas que foram lidas e relidas várias vezes. Esse processo permitiu ao pesquisador um
contato mais aprofundado com o material o que contribuiu para um melhor entendimento do
conteúdo das entrevistas. De acordo com Bardin (1977), a etapa de leitura flutuante é
fundamental para deixar vir a tona as idéias emergentes para que o pesquisador possa fazer
uma adequada identificação das unidades de registro e posteriormente categorizá-las.
A segunda atividade foi a constituição de um corpus com a escolha do conjunto de
documentos adicionais com base nas regras de exaustividade, representatividade,
homogeneidade e pertinência propostas por Bardin (1977). Foram analisados os relatórios
anuais da Natura (2002 e 2003), o modelo para a gestão do processo de inovação (1999), a
oferta pública inicial de ações (2004), além de dossiês, monografias e das telas do software de
acompanhamento dos projetos por meio do Funil de Inovação.
Foi realizada observação não participante em uma reunião típica de equipe de projetos
de desenvolvimento de novos produtos. Esse tipo de reunião semanal conta com a
participação do líder de projetos, membros fixos e convidados, totalizando aproximadamente
oito pessoas. Essa observação foi acompanhada pelo pesquisador deste trabalho e por outro
pesquisador, mestrando em Administração de Empresas da Universidade Presbiteriana
Mackenzie. Foi registrada por meio de Notas de Campo para depreender, especialmente, a
atuação do líder da equipe. Foram observados os comportamentos, a comunicação verbal e
não verbal do líder e da equipe em relação aos processos de aquisição, compartilhamento,
retenção do conhecimento e clima de aprendizagem. Para tanto, apoiou-se em Porter (1969) o
qual aponta quatro categorias de comunicação não verbal: físicas (incluindo coisas como
expressões faciais, tato, olfato, linguagem corporal), estética, simbólica e sinais. Foram
observados na reunião comportamentos do líder e da equipe visando depreender como o líder
desempenha as três tarefas básicas no processo de condução de equipe de projeto de
124
desenvolvimento de novos produtos: a) criação de oportunidades para aprendizagem por meio
da projeção de cenários e eventos que induzem às atividades necessárias, b) cultivo do tom
correto como forma de nutrir normas e comportamentos de engajamento desejáveis e c)
liderança pessoal do processo de discussão orientando o debate, fazendo perguntas, ouvindo
com atenção e fornecendo feedback. Especificamente, procurou-se observar as características
do líder no processo de condução e discussão com sua equipe de projetos: manutenção do
foco em quem fala, injeção de pontos de vista apoiador e/ou negativo e envolvimento do uso
aberto de poder e autoridade em uma escala de respostas que varia desde o silêncio até a
ameaça. O critério usado para finalizar a única observação não participante foi o da saturação
teórica, ou seja, quando outras observações não estavam mais agregando conhecimento
adicional. Em virtude das dificuldades de agenda dos líderes e equipes de projetos, não foi
possível realizar outras observações não participante.
A terceira atividade foi a geração de algumas afirmações provisórias, fruto de leitura
flutuante e das observações que foram paulatinamente se tornando em suposições com alguma
consistência. Essas foram se constituindo em premissas durante o processo de análise.
125
6.2 Codificação
A unidade de registro adotada foi o tema. Nas atividades de referenciação, elaboração de
índices e preparação do material bruto para posterior análise foram preparados quatro
quadros, um para cada cluster, com seis colunas nas quais foram agrupadas as entrevistas por
temas. Na primeira coluna, foram listados os aspectos da aprendizagem abordando os temas
conforme descrito no roteiro de entrevista. As colunas dois, três e quatro apresentam os
núcleos temáticos extraídos das falas do líder e dos liderados, respectivamente. A quinta
coluna exibe o conteúdo do agrupamento desses temas concernentes à cada um dos aspectos
da aprendizagem. A sexta coluna identifica os fatores facilitadores e barreiras à aprendizagem
e cultura de trabalho de acordo com a abordagem de Flannery et alii (1997). O Quadro 30
exemplifica o procedimento adotado.
Quadro 30 Etapa de tratamento dos dados
Aspectos da aprendizagem Líder Membro 1 Membro 2 Agrupamento Observações
Como um determinado
conhecimento é adquirido.
Fatores facilitadores e barreiras
à aprendizagem e aspectos da
cultura de trabalho.
Como o conhecimento é
compartilhado entre os membros
de uma equipe.
Como o conhecimento é retido na
equipe e/ou organização.
Atuação do líder no processo de
aquisição do conhecimento.
Atuação do líder no processo de
compartilhamento do
conhecimento.
Ações que o líder deve fazer para
que o conhecimento fique retido
na equipe e/ou organização.
Ações que o líder deve criar para
estabelecer um clima adequado à
aprendizagem na equipe.
Influência do Funil de Inovação
na aquisição, compartilhamento e
retenção do conhecimento.
Fonte: Elaborado pelo autor
126
Na seqüência foi elaborado mais um conjunto de quatro quadros (um por cluster) com
cinco colunas. A primeira coluna contendo aspectos da aprendizagem. A segunda
representando o conteúdo das falas dos entrevistados em relação ao processo de como o
conhecimento é adquirido, compartilhado e retido e a atuação e as ações do líder nestes três
processos. A terceira coluna identifica a fonte de aquisição interna ou externa e o que era
compartilhado e retido. A terceira coluna apresenta o agrupamento das falas dos entrevistados
em relação ao Funil de Inovação. A quarta coluna exibe alguma característica pessoal do
membro e/ou do líder e se o conhecimento é compartilhado e retido formal ou informalmente.
A quinta coluna exibe um primeiro esboço de categorização. O Quadro 31 exemplifica o
trabalho realizado nessa etapa.
Quadro 31 Etapa de categorização
Como um determinado conhecimento é
adquirido.
Como
(Processo).
Fonte (interna
ou externa)
Característica pessoal do
respondente.
Esboço de
categorias.
Como o conhecimento é compartilhado
entre os membros de uma equipe.
Como
(Processo).
O quê? Estruturado/ Não
estruturado.
Esboço de
categorias.
Como o conhecimento é retido na equipe
e/ou organização.
Como
(Processo).
O quê? Estruturado/ Não
estruturado.
Esboço de
categorias.
Atuação do líder no processo de
aquisição do conhecimento.
Forma de
atuação.
Não se aplica
(NA).
Característica pessoal do
respondente.
Esboço de
categorias.
Atuação do líder no processo de
compartilhamento do conhecimento.
Forma de
atuação.
NA. Característica pessoal do
respondente.
Esboço de
categorias.
Ações que o líder deve fazer para que o
conhecimento fique retido na equipe e/ou
organização.
Forma de
atuação.
NA. Característica pessoal do
respondente.
Esboço de
categorias.
Ações que o líder deve criar para
estabelecer um clima adequado à
aprendizagem na equipe.
Forma de
atuação.
NA. Característica pessoal do
respondente.
Esboço de
categorias.
Influência do Funil de Inovação na
aquisição, compartilhamento e retenção
do conhecimento.
Antes do
Funil de
Inovação.
Depois do
Funil de
Inovação.
NA. Esboço de
categorias.
Fonte: Elaborado pelo autor
127
6.3 Categorização
Nesta etapa foram feitos repetidos reagrupamentos, tomando-se como base referencial
os critérios de categorização propostos por Bardin (1977): semântico (categorias temáticas);
sintático (verbos e adjetivos); léxico (classificação das palavras segundo o seu sentido) e
expressivo. Neste trabalho foi adotado o critério semântico. A categorização foi feita por
“caixas” aonde os temas foram alocados de acordo com a estrutura teórica do processo de
aprendizagem. Tomou-se o cuidado em observar as regras de qualidade de uma categorização:
a) da exclusão mútua, evitando-se que um elemento estivesse presente em mais de uma
categoria; b) da homogeneidade, que visa dar estabilidade às categorias; c) da objetividade e
fidelidade e d) da produtividade, aonde se buscou suprir dados e resultados que permitam ao
pesquisador fazer inferências e levantar novas premissas. Os Quadros 32 e 33 sintetizam as
categorias de análise para a aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento e a
atuação do líder e a influência do Funil de Inovação nestes processos, para cada um dos
clusters (C1, C2, C3 e C4).
128
Quadro 32 Categorias de análise para aquisição, compartilhamento e retenção do
conhecimento
Aspectos da aprendizagem Categorias C1 C2 C3 C4
Aquisição do
conhecimento
Ações
- Enfrentar desafios
- Aprender empiricamente
- Pesquisar
- Compartilhar
- Inquirir
Atitudes
- Ter vontade e curiosidade para aprender
- Não ter vergonha de tirar dúvidas
Comportamentos
- Pedir ajuda quando necessário
- Buscar outros meios de aprendizagem
- Procurar quem tem mais experiência
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Compartilhamento do
conhecimento entre os
membros de uma equipe
Reunir a equipe
Inquirir
Compartilhar
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Retenção do conhecimento Praticar
Documentar
Reter talentos
Compartilhar
Reunir a equipe
Inquirir
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Fonte: Elaborado pelo Autor
129
Quadro 33 Categorias de análise da atuação do líder
Tema Categorias C1 C2 C3 C4
Atuação do líder no
processo de aquisição
do conhecimento
Direcionar
- Gerar necessidade
- Dar exemplos (exemplificar)
- Propor novas abordagens
Facilitar o processo de aprendizagem
- Usar as competências da equipe
- Dialogar
- Compartilhar riscos
- Dar oportunidades para praticar
- Acreditar nas idéias das pessoas
Envolver-se com a equipe
- Ajudar
- Ter orgulho de falar que algo foi feito
- Não ter medo de fazer o trabalho
X
X
x
x
x
X
x
x
x
X
x
x
x
X
x
x
X
x
X
X
x
x
X
x
x
x
Atuação do líder no
processo de
compartilhamento do
conhecimento
Facilitar o processo de compartilhamento
- Orientar a equipe
- Fazer reunião de aprendizado
- Contatar pessoas experientes
- Cobrar a equipe
- Estar junto com a equipe
- Dar espaço para a equipe
- Estimular a equipe
Valorizar a equipe
Criar relacionamento baseado na confiança
Disseminar as idéias da equipe
X
x
x
x
x
X
X
x
x
x
X
X
x
X
X
x
x
x
X
Ações que o líder deve
fazer para que o
conhecimento fique
retido na equipe e/ou
organização
Orientar a equipe para documentar o conhecimento
Estimular a equipe para compartilhar
Estimular a equipe para praticar
Fazer “rescaldo” do projeto
Disponibilizar recursos e conhecimento
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Ações que o líder deve
criar para estabelecer
um clima adequado à
aprendizagem na equipe
Criar oportunidades de aprendizagem
Criar clima adequado à aprendizagem
- Dar liberdade para errar
- Motivar e envolver a equipe
- Suportar a equipe
- Confiar na equipe
Dialogar
- Dar e receber feedback
- Construir relacionamento com equipe
Estabelecer critérios para escolha da equipe
Respeitar a diversidade
X
X
x
x
X
X
X
x
x
X
X
x
X
X
X
x
X
X
Fonte: Elaborado pelo Autor
130
Para Bardin (1977), o processo de tratamento de dados é complementado pelas fases
de inferência e interpretação. A autora define a etapa de inferência como sendo uma espécie
de interpretação controlada composta de duas etapas: pólos de análise que fornecem
informações suplementares ao leitor e processo/variáveis de inferência em que é estabelecido
o processo de indução a partir de fatos. A fase da inferência é fundamental para que o
pesquisador possa fazer uma adequada interpretação dos dados, cabendo ao pesquisador
utilizar os resultados de análise com finalidades teóricas e/ou pragmáticas, fornecer subsídios
e orientações para uma nova análise.
131
7. A ANÁLISE E A INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
O processo de análise e interpretação foi estruturado em cinco partes:
I. O multi-método (intra método) na prática;
II. A caracterização da organização pesquisada e indicadores da cultura de
trabalho;
III. A caracterização dos entrevistados;
IV. A aprendizagem organizacional: o processo, os fatores facilitadores, as
barreiras, os aspectos da cultura de trabalho da organização;
V. A atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional.
132
7.1 O multi-método (intra método) na prática
Foram usadas na coleta de dados as técnicas de entrevistas semi-estruturadas, a
observação não participante e a análise documental disponibilizada pela organização
pesquisada. A confiabilidade dos dados da observação não participante foi obtida por meio
das Notas de Campo elaboradas por dois observadores. A aplicação da triangulação dos dados
intra-métodos demandou do pesquisador um esforço contínuo de confrontar as diferentes
fontes de evidência, buscando coerências, convergências, incoerências e ambigüidades. Esse
processo possibilitou uma validade maior aos resultados. Usou-se a técnica peer debriefing
recomendada por Lincoln e Guba (1985) em que as entrevistas transcritas foram comentadas e
compartilhadas com experts em análise de conteúdo, os textos foram compartilhados por
pessoas de reconhecida capacidade nos temas aprendizagem organizacional, liderança e
equipes de desenvolvimento de novos produtos. O próprio trabalho da orientadora criticando,
indicando caminhos e desafiando o pesquisador a “ver outros ângulos”, constitui-se em uma
etapa importante do peer debriefing. Adicionalmente foi usado o modelo circular do processo
de pesquisa, proposto por Flick (2004). Esse modelo orienta o pesquisador a estar
constantemente fazendo comparações entre as unidades de análise, as suposições preliminares
e as teorias.
Para as entrevistas, foi usado um roteiro pré-definido com oito questões amplas e
abertas. Esse roteiro foi adaptado ao longo das primeiras entrevistas, visando facilitar o
entendimento das perguntas por parte dos entrevistados. As entrevistas transcritas foram
constantemente usadas e comparadas com a observação não participante e com os
documentos disponibilizados pela organização pesquisada.
133
O critério usado para finalizar a observação foi o da saturação teórica, ou seja, quando
outras observações não estavam mais agregando conhecimento adicional. Para orientar os
observadores em relação as três tarefas básicas para o líder da equipe de projeto de
desenvolvimento de novos produtos foram usados os referencias de Garvin (2002, p. 209-234,
235).
Os documentos disponibilizados e/ou públicos da organização pesquisada usados
foram: site na internet, relatórios anuais (2002 e 2003), o modelo de gestão do processo de
inovação (1999) que explicita em detalhes o Funil de Inovação, a visão de mundo Natura
(2000), o folder vivendo a marca Natura (2000), o folder preparado pela empresa para a oferta
pública inicial de ações (2004), três dossiês e duas monografias elaborados pela área de
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) contendo detalhes do desenvolvimento de projetos de
desenvolvimento de novos produtos. Foi permitido ao pesquisador navegar pelas telas de um
software específico do Funil de Inovação, que registra o andamento dos projetos de
desenvolvimento de novos produtos.
134
7.2 Caracterização da organização pesquisada e indicadores da cultura de trabalho
A organização pesquisada atua na indústria de cosméticos onde é reconhecida como a
maior empresa de capital brasileiro em termos de receita bruta. É uma empresa integrada que
desenvolve, produz, distribui e comercializa cosméticos, fragrâncias e produtos de higiene
pessoal, usando primordialmente o canal de venda direta realizada por autônomas chamadas
de Consultoras. Em 2003 a empresa produziu mais de cento e trinta milhões de unidades,
oferecendo aos clientes um portifólio de mais de quinhentos e dez produtos. A organização
atende o mercado brasileiro em mais de cinco mil municípios, por meio da rede de
aproximadamente trezentas e cinqüenta e cinco mil Consultoras. Atua na América Latina com
operações comerciais na Argentina, Chile e Peru e, distribui produtos via dealer na Bolívia. O
Quadro 34 apresenta alguns dados da empresa pesquisada.
Quadro 34 Caracterização da organização pesquisada
Unidade 2001 (1)
2002 (1)
2003 (1)
Receita operacional bruta Milhões de R$ 1.168,0 1.411.2 1.901,1
Receita operacional líquida Milhões de R$ 875,5 993,1 1.328,9
Lucro líquido Milhões de R$ 9,5 21,7 63,9
EBIDTA ajustado Milhões de R$ 120,3 199,2 295,7
Consultoras Natura no Brasil Milhares 287 307 355
Colaboradores no Brasil Pessoas 3.041 2.641 2.696
Colaboradores na Argentina Pessoas 134 129 157
Colaboradores no Chile Pessoas 58 54 61
Colaboradores no Peru Pessoas 60 60 72
Colaboradores - Total Pessoas 3.293 2.884 2.986
Fonte: Elaborado pelo autor com base na oferta pública inicial de ações (Natura, 2004 p. 30,
120).
(1) =
dados referentes ao exercício social encerrado em 31 de dezembro de cada ano
mencionado.
135
A análise de aspectos da cultura de trabalho na organização pesquisada aponta que a
empresa tem uma cultura baseada na flexibilidade e no que Flannery et alii (1997) definem
como cultura baseada no tempo, aonde se evidencia uma preocupação muito grande com o
desenvolvimento de novos produtos e serviços com ciclos cada vez mais curtos. Os autores
afirmam que a analogia com esportes é uma maneira eficaz de explicar a confusa retórica
gerencial. Todavia, deve-se tomar o cuidado para não reforçar a percepção machista existente
na maioria dos esportes. Consideram que nas empresas e também nos esportes não existem
apenas uma cultura, mas sim várias delas em funcionamento. Exemplificam usando o
atletismo como uma mescla de várias culturas. Analisando metaforicamente aspectos da
cultura de trabalho da organização pesquisada, depreende-se das análises das entrevistas, dos
documentos e da observação não participante que a empresa opera com maior ênfase na
combinação de basquete e beisebol, ou seja, com foco acentuado na cultura baseada no tempo,
buscando a flexibilidade, e com menor intensidade em redes, buscando o atendimento aos
clientes. Conseqüentemente, as metáforas do futebol americano e futebol são menos
observadas. Ou seja, as culturas voltadas para funções, com foco em tecnologia, e para
processos, com foco na confiabilidade, não têm a mesma força das outras duas mencionadas
anteriormente.
136
7.3 Caracterização dos entrevistados
Os dados de idade média, de tempo médio de empresa, de tempo médio como
participante de equipe de projetos e da formação acadêmica dos doze entrevistados, sendo
oito membros e quatro líderes de equipes de projetos de desenvolvimento de novos produtos
estão sintetizados no Quadro 35.
Quadro 35 Caracterização dos entrevistados
Idade média
(anos)
Tempo
médio de
empresa
Tempo
médio em
projetos
Função Formação
Membros
(8)
31 6,5 4 Gerente = 1
Coordenador = 4
Pesquisador = 3
Engenharia/Desenho Industrial = 3
Administração/Comércio Exterior = 2
Farmácia e Bioquímica/Química = 3
Líderes
(4)
30,5 7 4 Gerente = 4 Engenharia/Desenho Industrial = 1
Administração/Comércio Exterior = 2
Farmácia e Bioquímica/Química = 1
Todos
(12)
31 7 4 Gerente = 5
Coordenador = 4
Pesquisador = 3
Engenharia/Desenho Industrial = 4
Administração/Comércio Exterior = 4
Farmácia e Bioquímica/Química = 4
Fonte: Elaborado pelo autor
Caracterização dos entrevistados do cluster 1
Os três respondentes deste cluster atuam em equipe de projetos de desenvolvimento de
novos produtos. Um dos entrevistados tem a função de gerente e lidera a equipe e os outros
dois são coordenadores das áreas de marketing e desenvolvimento de embalagens,
respectivamente. Não existem variações significativas quando se compara esse cluster com o
conjunto dos quatro clusters em relação a idade, o tempo de empresa e o tempo de trabalho
em projetos. Uma diferença observada nesse cluster em relação aos outros três é que nenhum
respondente atua na função de pesquisador. Outra constatação é que nesse cluster temos os
137
extremos em relação idade (trinta e nove anos que é a maior e vinte e seis anos que é a
menor), tempo de empresa (nove anos, um dos mais altos e, seis meses que é o menor tempo)
e tempo em projetos (nove anos que é o maior tempo e, seis meses que representa o menor
tempo). Não existem variações significativas na formação dos respondentes desse cluster em
relação aos demais.
Caracterização dos entrevistados do cluster 2
Um dos entrevistados, neste cluster, tem a função de gerente e lidera a equipe e os
outros dois são: uma coordenadora de desenvolvimento de embalagens e uma pesquisadora de
P&D. Não existem variações significativas quando se compara esse cluster com o conjunto
dos quatro clusters em relação a idade, o tempo de empresa, o tempo de trabalho em projetos
e a formação dos respondentes.
Caracterização dos entrevistados do cluster 3
Neste cluster um dos entrevistados tem a função de gerente e lidera a equipe, os outros
dois são: uma coordenadora de logística e uma pesquisadora de P&D. A idade média (trinta e
três anos) e o tempo de empresa (dez anos) desse cluster é o mais alto quando comparado com
o conjunto dos quatro clusters. O tempo médio trabalhado em projetos e a formação estão em
linha com os demais clusters. Não existem variações significativas na formação dos
respondentes desse cluster em relação aos demais.
138
Caracterização dos entrevistados do cluster 4
Foram entrevistados três colaboradores que atuam em equipe de projetos de
desenvolvimento de novos produtos. Um dos entrevistados tem a função de gerente e lidera a
equipe, os outros dois são: um gerente de desenvolvimento de embalagem e uma pesquisadora
de P&D. Esse cluster apresenta as menores médias de idade (vinte e oito anos) , tempo de
empresa (cinco anos) e tempo em projetos (três anos) quando comparado com o conjunto dos
quatro clusters. É também o único cluster que tem um liderado com a função de gerente. Não
existem variações significativas na formação dos respondentes desse cluster em relação aos
demais.
139
7.4 A aprendizagem organizacional: o processo, os fatores facilitadores, as barreiras e os
aspectos da cultura de trabalho da organização
A leitura flutuante, processo de idas e vindas algumas vezes angustiante para o
pesquisador, permitiu o delineamento de duas estruturas para análise. A primeira composta
pelos temas aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento tanto para os membros
quanto para os líderes das equipes de desenvolvimento de novos produtos. Nessa estrutura
também foram consideradas as respostas dos entrevistados em relação a influência do Funil de
Inovação nesses três processos. A segunda estrutura, que será discutida mais adiante, foi
composta pelas respostas sobre a atuação dos líderes nos processos de aquisição,
compartilhamento e retenção do conhecimento e ações que os líderes devem fazer para a
criação de um clima propício à aprendizagem.
No processo de aquisição do conhecimento, as respostas apontam para cinco
categorias. Para os respondentes dos quatro clusters analisados, enfrentar desafios, aprender
empiricamente, pesquisar, compartilhar e inquirir foram as formas como o líder e os liderados
adquirem um determinado conhecimento. Houve uma uniformidade nos clusters exceto para a
ação de inquirir, que foi observada em dois dos quatros clusters. Nas cinco categorias
mencionadas, ficou evidenciado que ter vontade e curiosidade para aprender é uma atitude no
processo de aquisição do conhecimento. Foram observados três comportamentos (pedir ajuda
quando necessário, buscar outros meios de aprendizagem e procurar quem tem mais
experiência) mencionados apenas pelos respondentes do cluster 3. Para facilitar a visualização
foram usadas auto-formas (desenhos) para representar cada uma das categorias. O desenho em
forma de raio (algo nem sempre previsível porém inerente ao ambiente) representa enfrentar
desafios, o octógono (indicando que o processo de “desbastar” arestas é feito por tentativa e
140
erro) foi usado para representar o processo de aprender empiricamente, o texto explicativo em
elipse (indicativo do pensamento do pesquisador) foi usado para representar a categoria
pesquisar, o texto explicativo em setas cruzadas (indicativo da “distribuição aos quatro
quadrantes” de um determinado conhecimento) representa a categoria compartilhar e o
losango (usado na elaboração de fluxogramas indicando uma etapa que demanda decisão)
representa a categoria inquirir.
Analisando-se a categoria, enfrentar desafios, depreende-se da leitura das entrevistas
transcritas que o processo de aquisição começa quando um membro ou a equipe toda recebe
ou percebe um desafio que pode ser tanto interno (solicitação de um líder de projeto, por
exemplo) como externo à organização (demanda de clientes ou do mercado, por exemplo).
Deve-se considerar que a organização analisada faz parte da indústria cosmética que é
altamente demandante de novidades. Para atender a essa demanda, a organização lança no
mercado novos produtos todos os anos, em média 30% no portifólio, que são conduzidos
pelas equipes de projetos de desenvolvimento de novos produtos. Convém ressaltar que a
organização pesquisada, por meio de seu conjunto de crenças e valores, em especial a
criatividade e o aperfeiçoamento contínuo, reforça que seus colaboradores e equipes devem
constantemente enfrentar desafios. Para esse grupo de respondentes, o enfrentar desafios é um
processo de superação das pressões externas e internas. Os membros das equipes aprendem
pela complexidade dos projetos e necessidades dos clientes, pela pressão exercida por estes
mesmos clientes e pela busca da ampliação de um determinado conhecimento. Segundo Fiol e
Lyles (1985) a tensão entre estabilidade, mudança e a crise são incentivos para que a
aprendizagem organizacional ocorra. O ponto levantado pelos autores pode ser observado
quando um dos respondentes mencionou que “sabia que o processo era crítico para atender as
141
necessidades dos clientes” e que “conhecia pouco, não tinha o mínimo conhecimento do
assunto do projeto”. Foram observados dois fatores facilitadores. O primeiro, “o problema
(desafio) acabou unindo ainda mais a equipe para buscar o conhecimento que levasse ao
atendimento da demanda criada”. Outro fator facilitador observado foi que a organização
pesquisada tem que gerar os próprios conhecimentos o que a diferencia de outras que
possuem “casas matrizes no exterior” que dispõem de centros dedicados à pesquisa. Em
relação a barreira à aprendizagem, foi relatado pelos respondentes que o tempo destinado ao
desenvolvimento de projetos é curto, ou seja, não existe tempo suficiente para o aprendizado,
pois tão logo um projeto é terminado já existem vários aguardando vez na “fila”. Esse ponto
também pode ser considerado como um aspecto da cultura de trabalho (Flannery et alii, 1997)
da organização que é baseada no tempo na qual a flexibilidade é altamente valorizada.
O aprender empiricamente foi a categoria que apresentou a maior freqüência de
citações dentre as cinco categorias. Os respondentes afirmam que aprendem na prática
cotidiana, fazendo e refazendo, errando e acertando, “fomos trabalhando e tudo que podia dar
errado deu errado”. Para Nonaka e Takeuchi (1997) e Kolb (1976), o aprendizado é um
processo que ocorre baseado na experiência, sendo que os primeiros autores consideram que o
aprendizado mais poderoso é aquele que vem da experiência direta. O aprender
empiricamente é reforçado pela crença do compromisso com a verdade e do valor
transparência que são evidenciados na organização pesquisada. Em outras palavras, o erro é
considerado parte do processo de aprendizado e as pessoas são incentivadas a não “varrerem
erros para debaixo do tapete”. Outro aspecto ressaltado pelos respondentes é que eles
aprendem “vendo como outras pessoas mais experientes fazem”, “repetindo o conhecimento
adquirido”, “sentando, fazendo juntos”. Depreende-se pelos depoimentos dos sujeitos que
142
existe um aprendizado pela imitação. Segundo Huber (1991), o aprendizado vicário é um
processo de aquisição de conhecimento por meio da imitação do que outras pessoas fazem e
por processos de imitação do que outras organizações fazem, por exemplo benchmarking e
business intelligence.
Pesquisar é uma categoria em que as fontes externas foram citadas com uma
freqüência maior que as internas. É importante ressaltar que nesse tipo de indústria, a prática
do benchmarking é utilizada freqüentemente como admite um respondente: “buscava muita
coisa na concorrência, pois o objetivo era tentar usar um selo (parte da embalagem) parecido
com o do concorrente”. Outras formas de pesquisar, relatadas pelos sujeitos, são a busca
estruturada de patentes, “aprendo fazendo rastreamento de patentes (sic) ”, a navegação em
sites específicos “a internet é uma fonte muito rica em informação”. Os fornecedores também
foram apontados como fontes externas de pesquisa, com a finalidade de “conhecer novas
matérias primas” um dos sujeitos afirmou que visitava constantemente fornecedores externos.
Segundo Huber (1991), o exame detalhado, a pesquisa focada e o monitoramento do
desempenho são etapas do processo de aquisição do conhecimento. Argyris e Schön (1978)
afirmam que a pesquisa tanto individual quanto coletiva constrói e modifica as teorias em uso
e auxilia no processo de aquisição do conhecimento.
A categoria compartilhar foi evidenciada tanto no processo de aquisição, como nos
processos de compartilhamento e retenção, que serão explorados mais adiante neste trabalho.
Uma premissa plausível neste momento é que a aquisição de um determinado conhecimento é
uma etapa embutida nas etapas do compartilhamento e retenção desse conhecimento
adquirido. Essa premissa pode ser referendada teoricamente com autores citados por Kim
143
(1993), Argyris, Schön, Lewin, Kofman e Schein, que afirmam que o processo de
aprendizagem organizacional é cíclico e não linear. Ficou evidenciado que o
compartilhamento está subjacente à praticamente todas as crenças e valores (relacionamento,
humanismo, diversidade, aperfeiçoamento contínuo, criatividade, compromisso com a
verdade e transparência) da organização pesquisada. Depreende-se que uma forma efetiva de
se aprender determinado conhecimento é por meio do compartilhamento em que “todo mundo
trocava” experiências e conhecimentos. A existência do “dividir com o outro grupo, bater um
papo, trocar experiência com outras pessoas”, mostrando que “as pessoas conseguem interagir
entre elas, participando dos times de projetos” e ainda, “tendo a oportunidade de estar com
pessoas de diversas áreas” são a essência do processo relatado pelos respondentes.
Inquirir também é uma categoria presente nos processos de aquisição,
compartilhamento e retenção do conhecimento. Em função do aspecto relacional forte entre as
pessoas na organização pesquisada essa categoria de aquisição de um determinado
conhecimento tem relação com as crenças e valores do aperfeiçoamento contínuo e da
criatividade. Para os respondentes, inquirir é uma forma de aquisição de conhecimento, como
pode ser observado por alguns depoimentos dos sujeitos: “fui perguntando, pedindo
explicação”, “perguntar para outra pessoa que entende”, “discutir tudo, questionar”.
A atitude de ter vontade e curiosidade para aprender foi um aspecto importante
relatado pelos respondentes dos quatro clusters, pois “você aprende quando tiver com vontade
de aprender”. Conforme relatado, poder-se-ia afirmar que na realidade a atitude de ter vontade
e curiosidade para aprender é uma condição, um pré-requisito para quem busca adquirir um
determinado conhecimento. No cluster 3 um respondente ressalta a importância de “não ter
vergonha de tirar dúvidas”, assim como “pedir ajuda quando necessário”, “buscar outros
144
meios de aprendizagem” e “procurar quem tem mais experiência” foram comportamentos
valorizados. Pode-se argumentar que as atitudes e comportamentos observados reforçam a
importância do significado no processo de aquisição de um determinado conhecimento. Morin
(2003) e Mello (1988) mencionam que todo o conhecimento envolve uma relação entre o
sujeito e o objeto, e que o sujeito aprende quando o objeto tem significado para ele. Adquirir
determinado conhecimento tem relação direta com o conjunto de atitudes e comportamentos
que expressam a vontade e a curiosidade do sujeito em aprender algo. Em suma, para os
respondentes a aquisição de um determinado conhecimento é um processo de enfrentar
desafios, aprender empiricamente, pesquisar, compartilhar e inquirir, conforme
esquematizado na Figura 12.
Figura 12 Representação esquemática do processo de aquisição do conhecimento
Fonte: Elaborado pelo Autor
Adquirir
145
Para o processo de compartilhamento do conhecimento entre os membros de uma
equipe de projetos de desenvolvimento de novos produtos, as respostas apontam para três
categorias: reunir a equipe, inquirir e compartilhar. Observa-se que inquirir e compartilhar
também estão presentes no processo de aquisição e serão mencionadas como essenciais para o
processo de retenção do conhecimento que será apresentado na seqüência. Foi usado a auto-
forma, desenho do sol (esquematicamente pode-se ver uma mesa redonda e oito pessoas ao
redor dela. Oito é o número médio de membros em uma equipe de projetos na empresa
pesquisada) para facilitar a visualização da categoria de reunir a equipe .
O compartilhar acontece quando se reúne a equipe, tanto de forma estruturada/
formalizada (fóruns, reuniões semanais) como não estruturada/informal (reunião no
“cafezódromo”, no corredor etc.). Essa resposta foi a mais enfática das oito questões do
roteiro de entrevistas. Após as primeiras entrevistas, o pesquisador já “antecipava” as
respostas das pessoas quando eram questionadas sobre a forma de compartilhar o
conhecimento entre elas. Analisando-se a quantidade de categorias, fica evidenciado que o
menor número, três, foi evidenciado no processo de compartilhamento. Para o processo de
aquisição, foram observadas cinco categorias e seis para o processo de retenção. Para a
empresa pesquisada, a reunião de equipe é o foro adequado para discutir as atividades da
equipe pois “a reunião de time é o momento que você (membro e líder) senta, fala,
compartilha”, é o momento também usado para “apresentar (para a equipe) aquilo que eu
(membro) estava trabalhando”. O ato de reunir a equipe é talvez a representação mais
fidedigna das crenças e dos valores de relacionamento, humanismo e diversidade da
organização pesquisada. Na observação não participante, feita por dois pesquisadores em uma
reunião típica de equipe de projetos, também ficou evidenciado que essa forma é a mais usada
146
para compartilhar conhecimentos entre os membros da equipe. Para Huber (1991), as
reuniões de trabalho, são exemplos de processos de compartilhamento do conhecimento, pois
elas propiciam um entendimento comum e um ganho de significado desse mesmo
conhecimento.
No processo de compartilhamento do conhecimento, depreende-se que a reunião de
equipe faz parte dos aspectos da cultura de trabalho da organização, enfatizando que, “tudo
acontece em reunião de time aqui”. Outro aspecto da cultura de trabalho evidenciado é que
“as pessoas procurarem darem as dicas (sic)”. Depreende-se, em função da recorrência desse
tipo de resposta, que na organização pesquisada as pessoas têm a predisposição para trocarem
com certa facilidade observações que podem ser úteis para a realização do trabalho em uma
equipe de projetos para desenvolvimento de novos produtos. Algumas barreiras à
aprendizagem foram mencionadas pelos respondentes, como é a caso do retrabalho ressaltado
por um sujeito que cita: “... retrabalhei, chequei, rechequei inúmeras vezes ...”. Isto, no
entanto, é distinto da redundância defendida por Nonaka e Takeuchi (1997), pois ficou
evidenciado que o retrabalho mencionado é feito de modo não planejado. Outra barreira que
merece destaque é a falta de atitude para consultar o que já foi desenvolvido e registrado por
outras pessoas ou equipes. Esse ponto ficou evidenciado quando um respondente ressaltou
que “as pessoas não têm o hábito de consultar o que está definido, o que foi decidido e que
está registrado no Funil (de Inovação)”. Depreende-se dessa afirmação que as pessoas apesar
de terem a sua disposição uma ferramenta específica para registrar e compartilhar o
conhecimento não a tem utilizado regularmente.
Uma premissa a ser levantada é que provavelmente pela necessidade de se lançar
novos produtos em uma velocidade acelerada (em média a organização pesquisada lança um
novo produto a cada três dias) existe um apelo mais forte para se iniciar um novo projeto, que
147
já está na fila, do que “parar” por alguns momentos, registrar e compartilhar o conhecimento
de um projeto concluído. Em resumo, para os respondentes o compartilhamento do
conhecimento é um processo de reunir a equipe, compartilhar e inquirir, conforme
representado esquematicamente na Figura 13.
148
Figura 13 Representação esquemática do processo de compartilhamento do conhecimento
Fonte: Elaborado pelo Autor
Para o processo de retenção do conhecimento na memória organizacional as respostas
evidenciam seis categorias, sendo três delas já apontadas e discutidas nos processos
anteriores, (compartilhar, reunir a equipe e inquirir) e as outras três são específicas: praticar,
documentar e reter talentos que foram representadas pelas auto-formas de retângulo de
ângulos arredondados (que é usado na elaboração de fluxogramas para indicar ação), de
conjunto de folhas de papel (que esquematicamente representa uma série de documentos) e
disco de armazenagem (usado em fluxogramas para representar a armazenagem de dados),
respectivamente. Para os respondentes dos quatro clusters analisados, praticar e documentar
foram as formas apontadas pelos líderes e liderados usadas para a retenção do conhecimento.
A retenção de pessoas foi evidenciada nos clusters 1 e 3. Reunir a equipe foi evidenciada no
cluster 2 e inquirir no 4.
O depoimento de um respondente reflete o ato de praticar como sendo o processo
usado para retenção do conhecimento, quando menciona que se “eu compartilho, aumento a
minha retenção porque estou aplicando e, ao mesmo tempo, aumentando meu conhecimento”.
Compartilhar
149
Outro sujeito reforça este ponto ao se expressar: “eu retenho reaplicando, repetindo isto em
outros projetos. Vou solidificar mesmo esse conhecimento fazendo é na prática”. Depreende-
se que praticar é uma atividade que pode ser útil tanto na aquisição, no compartilhamento e
também na retenção do conhecimento. Kim (1993) afirma que aprendizagem é equivalente a
aquisição de conhecimento e que a memória é o processo pelo qual esse conhecimento
adquirido é retido. A crença do aperfeiçoamento contínuo vivenciada na organização
pesquisada enfatiza a prática como uma das possibilidades de retenção do conhecimento.
O documentar foi enfatizado pelos respondentes como decorrente da introdução do
processo do Funil de Inovação, em que o depoimento de um sujeito atesta esse argumento,
“escrevendo, documentando no briefing técnico. Registrando no Funil (de Inovação)”.
Constatou-se que o Funil de Inovação é o método mais usado para a retenção do
conhecimento na organização pesquisada. Antes da existência do Funil, segundo os
respondentes, o conhecimento era retido de forma desorganizada e totalmente dependente do
líder do projeto. A análise de monografias e dossiês atesta que, em especial, nas funções
desempenhadas por pesquisadores, existe uma preocupação constante no registro dos
conhecimentos adquiridos e compartilhados, para eventual uso posterior e retenção na
memória organizacional. Um dos dossiês analisados, que por questões de confidencialidade
não pode ser explicitado, continha descrições detalhadas, com desenhos e esquemas do
conhecimento adquirido e era de fácil leitura, mesmo para leigos como é o caso do
pesquisador deste trabalho. Durante a observação não participante, foi constatado que a
equipe usa uma planilha eletrônica para documentar as atividades de cada projeto que está
desenvolvendo. Percebeu-se que essa planilha é semanalmente atualizada e fica disponível
para todos os membros e demais equipes em um arquivo de rede denominado Y comum.
150
Portanto, o conhecimento explícito além de documentado permite ser acessado livremente.
Segundo Choo (2003), o conhecimento explicito é aquele que pode ser escrito, estruturado e
armazenado sem perdas significativas de informação. Davenport e Prusak (1998) reforçam
que o conhecimento é originado e aplicado na mente das pessoas e que nas organizações isso
fica embutido em rotinas, processos, práticas e normas além da parte documental.
Ficou evidente para os respondentes a necessidade de reter talentos, que detém o
conhecimento tácito, como parte do processo de retenção do conhecimento. O depoimento de
um respondente reforça que reter talentos significa reter o conhecimento: “a pessoa de P&D
saiu, trocou a pessoa de P&D e as pessoas que ficaram como elo não foram capazes de passar
isso. A comunicação não foi efetiva, ficou no tácito”. Para Fiol e Lyles (1985), os líderes
podem mudar ou serem mudados, as pessoas podem entrar e sair das organizações, porém, a
memória da organização retém certos comportamentos, mapas mentais e valores ao longo do
tempo. Cabe aqui outra indagação: Reter talentos significa reter conhecimento na
organização? A retenção pura e simples de talentos não garante por si só a retenção do
conhecimento. É necessário que as pessoas detentoras do conhecimento adquirido o
compartilhem com os demais e, que continuem praticando como forma de melhorar ainda
mais a retenção. Outro ponto é a necessidade que os detentores do conhecimento têm de se
manter atualizados, pesquisando, enfrentando desafios, aprendendo empiricamente,
compartilhando e inquirindo continuamente.
Não obstante, a iniciativa de desenvolvimento de atividades visando a retenção do
conhecimento, foram identificadas barreiras à aprendizagem tais como a falta de processos
formais para retenção do conhecimento, em que ao se expressar o sujeito disse: “as
apresentações que ficavam com as pessoas, se trocavam as pessoas, desaparecia tudo”. Outro
151
aspecto que pode ser classificado tanto como barreira ou aspecto da cultura de trabalho da
organização está explicitado no depoimento de um respondente: “... nós não devemos fazer
isso, nós não devemos fazer aquilo. Mas a gente sempre vem fazendo. E ... se você continua
fazendo isso, o risco de você correr de novo (sic) em um problema desse continua ...
eminente”. Os dois depoimentos e a observação não participante reforçam que na organização
pesquisada a cultura de trabalho que privilegia a flexibilidade e o tempo tem maior apelo que
àquelas voltadas para processos, funções e redes (Flannery et alii, 1997). Em suma, para os
respondentes a retenção do conhecimento é um processo de praticar, documentar, reter
talentos, compartilhar, reunir a equipe e inquirir, conforme demonstrado esquematicamente na
Figura 14.
Figura 14 Representação esquemática do processo de retenção do conhecimento
Fonte: Elaborado pelo Autor
Reter
152
Conclusão parcial dos processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento
No processo de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento não foram
evidenciadas variações significativas entre os quatro clusters analisados. Preliminarmente
poder-se-ia concluir que esse processo é relativamente universal na organização pesquisada.
Uma premissa que deve ser analisada é a relação entre o conjunto de crenças e de
valores da organização pesquisada e sua influência nos processos de aquisição,
compartilhamento e retenção do conhecimento. A organização ao estimular o relacionamento,
humanismo, diversidade, aperfeiçoamento contínuo, criatividade, compromisso com a
verdade e transparência, acaba estimulando também as pessoas para a aprendizagem.
Depreende-se daquilo que foi observado nas entrevistas, documentos e observação não
participante que o conjunto de crenças e de valores atua como facilitador no processo de
aprendizagem organizacional. A Figura 15 sintetiza essa influência.
Figura 15 Relação entre crenças e valores da organização pesquisada e o processo de
aprendizagem
Relacionamento,
humanismo,
diversidade
Compromisso
com a verdade,
transparência
Aperfeiçoamento
contínuo,
criatividade
153
Fonte: Elaborado pelo Autor
Poder-se-ia neste ponto levantar outra premissa. O processo de aprendizagem nas
equipes de desenvolvimento de novos produtos na organização pesquisada é um processo
circular na qual o compartilhamento tem papel fundamental ao conectar-se simultaneamente
com a aquisição e a retenção. A Figura 16 esquematiza essa premissa.
Figura 16 Esquema do processo de aprendizagem em equipes de desenvolvimento de novos
produtos na organização pesquisada
Fonte: Elaborado pelo Autor
Finalizando, os respondentes apontaram em todos os clusters que o Funil de Inovação
ajudou a documentar e melhorar o compartilhamento do conhecimento. Houve menção que o
Funil de Inovação permite adicionar coisas novas, facilitando, dessa forma, a aquisição do
conhecimento. A melhoria da comunicação, com livre acesso as informações foi apontada
como facilitadora do compartilhamento do conhecimento. Para os respondentes do cluster 4, o
Adquirir Reter
Compartilhar
154
Funil de Inovação ajudou a organizar e a simplificar o processo de desenvolvimento de novos
produtos, gerando ganhos de tempo. O Quadro 36 sintetiza a influência do Funil Inovação nos
processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento.
Quadro 36 O Funil de Inovação nos processos de aquisição, compartilhamento e retenção do
conhecimento
Categorias Cluster 1 Cluster 2 Cluster 3 Cluster 4
Aquisição do conhecimento
- Permitir que coisas novas sejam acrescentadas
Compartilhamento do conhecimento
- Melhorar o compartilhamento do conhecimento
- Proporcionar livre acesso ao conhecimento
- Melhorar processo de comunicação
Retenção do conhecimento
- Documentar o conhecimento
Outros
- Organizar o processo
- Simplificar o processo
- Gerar ganho de tempo
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Fonte: Elaborado pelo Autor
155
7.5 A atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional
No tópico anterior foi discutido o processo de aquisição, compartilhamento e retenção
do conhecimento. Neste tópico será discutida a atuação do líder nestes processos e ações que
ele deve criar para obter um clima adequado à aprendizagem. Diferentemente da estrutura
processual analisada, a estrutura que foca a atuação do líder apontou para uma variação que
merece ser destacada entre os clusters de entrevistados. Observou-se que o cluster 4
apresentou características diferenciadas em relação aos demais como, por exemplo, envolver-
se com a equipe no processo de aquisição, valorizar a equipe no processo de
compartilhamento, fazer “rescaldo” do projeto, disponibilizar recursos e conhecimento no
processo de retenção e respeitar a diversidade visando a criação de clima propício à
aprendizagem.
A leitura flutuante das entrevistas transcritas, a análise dos documentos e a observação
não participante foram fundamentais para a construção e desconstrução no processo de
categorização, partindo-se do Quadro 33 (p. 128) que, tentativamente, classificara a atuação e
ações do líder nos processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento em
um conjunto de dezessete categorias. O processo foi evoluindo por meio de agrupamento em
etapas de idas e vindas, que se por um lado angustiava o pesquisador, por outro acabou
mostrando um encadeamento coerente que resultou em um conjunto de três categorias:
direcionar, facilitar e administrar. Analogamente ao que foi feito na discussão do processo de
aprendizagem, optou-se por auto-formas, desenhos, para representar as categorias e facilitar a
visualização. A seta (dando a idéia orientadora de rumo) foi escolhida para representar a
categoria direcionar, o símbolo de agrupar (dois triângulos em forma de ampulheta)
representa a categoria facilitar e o símbolo de somador (um círculo dividido em quatro partes,
156
que podem ser interpretados esquematicamente como os processos de planejamento,
organização, direção e controle usados pelo líder) foi escolhido para representar a categoria
administrar. O Quadro 37 sintetiza o processo de categorização para a atuação e as ações do
líder nos processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento.
Quadro 37 Categorias de análise da atuação e ações do líder no processo de aprendizagem
Direcionar
Facilitar
Administrar
Adquirir - Gerar necessidade
- Exemplificar
- Propor novas
abordagens
- Dialogar
- Compartilhar riscos
- Dar oportunidades para praticar
- Acreditar nas idéias da equipe
- Ajudar
- Ter orgulho de falar que algo foi
feito
- Não ter medo de fazer o trabalho
- Usar as
competências da
equipe
Compartilhar - Contatar pessoas experientes
- Estar junto com a equipe
- Dar espaço para a equipe
- Estimular a equipe
- Valorizar a equipe
- Criar relacionamento de
confiança
- Disseminar as idéias da equipe
- Orientar a equipe
à compartilhar
- Fazer reunião de
aprendizado
- Cobrar a equipe
Reter - Orientar a equipe
para documentar
- Estimular a equipe à
compartilhar
- Estimular a equipe à praticar
- Disponibilizar
recursos e
conhecimento
- Fazer “rescaldo”
do projeto
Criar clima
adequado à
aprendizagem
- Criar oportunidades de
aprendizagem
- Dar liberdade para errar
- Motivar e envolver a equipe
- Suportar a equipe
- Confiar na equipe
- Dar e receber feedback
- Construir relacionamento com
equipe
- Respeitar a diversidade
- Estabelecer
critérios para
escolha da equipe
Fonte: Elaborado pelo Autor
157
O líder no papel de direcionador revelou-se como alguém que, no processo de
aquisição de um determinado conhecimento, gera necessidades e direciona a equipe, que usa
adequadamente exemplos para mostrar à equipe o caminho e que propõem novas abordagens
para a equipe. Esse líder orienta a equipe a documentar o conhecimento adquirido e
compartilhado, objetivando a retenção na memória organizacional.
A atuação do líder como gerador de necessidade foi ressaltada por um membro de
equipe que relatou:
“O líder „brifa‟ um projeto qualquer, dentro desse briefing existem algumas
necessidades técnicas, já especificadas, onde a área de P&D está contribuindo (...) .
É gerando essa necessidade, o papel dele (líder) é super importante no sentido de
querer ver os protótipos, de avaliar aquele conhecimento e protótipos gerados por
P&D”.
Para outro membro de equipe, o líder atua como organizador e orientador “cabendo ao
líder direcionar, orientar. Sem o líder, vira bagunça”. Todavia, durante a observação não
participante ficou evidenciado que o líder não é assim tão direcionador e que a equipe acaba
se auto coordenando.
Dar exemplos foi abordado de dois modos distintos. Por um lado, os membros
esperam que o líder contribua com exemplos práticos de como desenvolver um produto por
exemplo, “para desenvolver este protótipo eu (líder) recomendo que você use este caminho
(...) que nós já usamos no passado e deu certo”. Por outro lado, os membros têm uma
expectativa que o líder deva “ser referência para a equipe”, portanto, sendo um exemplo a ser
seguido. Para Ulrich (2000), o líder ao liderar mediante exemplos, dá à equipe uma
demonstração de caráter pessoal dando a dimensão vivencial dos valores e das crenças por
meio da prática. DiBella e Nevis (1999) são enfáticos, acrescentando que o líder deve dar o
exemplo fazendo aquilo que fala.
158
A mais significativa contribuição do líder direcionando, segundo os respondentes, é a
proposição de novas abordagens, levando a equipe “a pensar fora do quadrado”, a “fazer com
que a equipe faça de uma forma diferente”. Uma das formas diferentes relatada por um sujeito
é a do líder “propondo que os membros das equipes se tornassem Consultores” para que
pudessem “ver ao vivo e a cores” o que acontece no dia-a-dia dos clientes. Consultor(a) é a
denominação dada pela organização pesquisada para quem, de forma autônoma, vende seus
produtos e se relaciona com os consumidores finais. Outra forma de estímulo dada pelo líder
direcionador é que as equipes “olhem para fora, fazendo benchmarking”.
Em relação a atuação do líder direcionador no processo de retenção do conhecimento
na memória organizacional, percebeu-se um leque de possibilidades. Em um extremo
observou-se a postura menos democrática em que o líder “exige que a equipe documente e
formalize os conhecimentos”. No outro, o líder “desafiando a equipe a documentar e
disponibilizar para toda a organização”.
Os relatos dos respondentes confirmam o que alguns autores descrevem sobre o
processo de direcionar a equipe. Para Ulrich (2000), um dos atributos dos líderes no processo
de aprendizagem organizacional é direcionar, dar clara definição da trajetória (compressão
dos eventos externos, foco no futuro e conversão da visão em ação). Conger (1992) define
líder como alguém que estabelece orientação para uma equipe. House (1996) aponta quatro
comportamentos definidores do estilo de liderança: diretivo, apoiador, participativo e
orientado para resultados. Dois dos estilos apontados pelo autor foram observados na atuação
do líder direcionador. Um é o estilo diretivo do líder que se materializa por meio de ações tais
como: informar os membros da equipe o que se espera deles, programar e coordenar o
trabalho, fornecer orientação específica e esclarecer políticas, normas e procedimentos. O
outro é o estilo orientado para resultados em que o líder estabelece objetivos desafiadores,
159
busca melhorias, enfatiza a excelência do desempenho e demonstra confiança que os
membros obterão altos níveis de desempenho.
A atuação do líder como facilitador será analisada no processo de aquisição,
compartilhamento, retenção do conhecimento na memória organizacional e estabelecimento
de um clima propício à aprendizagem.
Atuação do líder no processo de aquisição de um determinado conhecimento
O líder facilitador mostrou ser aquele que promove o diálogo, que compartilha riscos
com a equipe, que dá oportunidades para a equipe praticar e que acredita nas idéias da
equipe. No cluster 4, diferentemente dos demais, o líder tem a predisposição para ajudar a
equipe e revelou atitudes de como conduzir a equipe a ter orgulho pelo trabalho realizado e
não ter medo de fazer um trabalho desafiador.
O líder facilitador procura criar oportunidades para dialogar com a equipe “dando
feedback” e “consultando a equipe para ter as respostas” necessárias ao andamento de uma
determinada etapa do projeto. O líder busca obter a opinião da equipe quando existem
demandas por propostas alternativas na condução do projeto, conforme ressaltado por um
sujeito que afirmou que “o líder sempre fica pedindo nossa contraproposta”. Nonaka e
Takeuchi (1997) enfatizam o processo de interação entre líderes e liderados por meio de
diálogos pessoais. Lyles (2001) reforça a importância das pessoas se envolverem ativamente
no processo de aquisição do conhecimento.
Observou-se que a determinação do líder em compartilhar os riscos em um
determinado projeto, pode ser entendida como uma forma de apoiar a equipe mesmo durante
as eventuais perdas que esses riscos venham acarretar. Em função da organização pesquisada,
160
desenvolver uma significativa quantidade de novos produtos por meio de equipe projetos e
pela sua crença do aperfeiçoamento contínuo e do valor criatividade, os riscos são vistos
como inerentes ao próprio processo. Cabe ao líder “preparar as pessoas, porque o tempo
inteiro a empresa incentiva o time a correr risco” e cabe ao líder “falar, explicar e
compartilhar os riscos” inerentes aos projetos que são desenvolvidos. Segundo Ulrich (2000),
o processo de apoiar a equipe para que compartilhe riscos é um atributo da liderança no
processo de aprendizagem organizacional.
Dar oportunidades para a equipe praticar foi uma forma de atuação do líder observada
tanto nas entrevistas quanto na observação não participante. Nas entrevistas foi ressaltado por
vários sujeitos que o líder “estimula a equipe a fazerem (sic) apresentações” objetivando
praticar aquilo que foi aprendido e possibilitando que “os membros façam o máximo” para
que o conhecimento possa ser adquirido constantemente. Durante a observação não
participante ficou evidenciado que a equipe, de modo lúdico e estimulada pelo líder, investe
parte significativa do tempo cheirando, tocando, manuseando, vendo amostras de vários
produtos da organização pesquisada e de concorrentes. Outro aspecto observado foi que o
líder “dá funções de maior responsabilidade” estimulando que as “pessoas possam sentirem-se
(sic) livres para errar e saber quais as conseqüências de um possível erro”. Isso pode ser
referendado pelo relato de um sujeito que afirmou que o líder “é tolerante quando a pessoa
não sabe trabalhar com esse tipo de material” e que “acredita nas idéias colocadas pela
equipe” e dando “legitimidade para a pessoa que vai atrás do conhecimento”.
Observou-se que a atuação do líder, na categoria de facilitar a aquisição de um
determinado conhecimento, no cluster 4 é diferenciada dos demais. O relato de um sujeito
evidenciou que o líder tem a disposição para fazer perguntas tais como “o que eu (líder)
preciso fazer para te ajudar” na aquisição de um determinado conhecimento? Uma premissa é
161
analisar até que ponto essa disposição do líder em oferecer ajuda pode de alguma forma
desencorajar a equipe a ir “mais fundo” na busca de um determinado conhecimento, pois caso
a equipe não consiga, tem sempre a opção de pedir ajuda para o líder. Por outro lado, essa
disposição pode ser chave para que a equipe sinta-se estimulada a desafiar e em caso de
dúvidas saber que pode contar com a ajuda do líder. Esse processo lembra aquele ditado
popular que diz que devemos ensinar a pessoa a pescar ao invés de simplesmente lhe darmos
o peixe. Entende-se que o ajudar nesse contexto é ensinar a pescar e não o entregar o peixe.
Observou-se que o líder desse cluster tem atitudes reforçadoras para o processo de aquisição
do conhecimento, conforme relatado por um sujeito ao afirmar que o líder faz com que “você
tenha orgulho de falar que algo foi feito”. Esse líder reforça, segundo um respondente, que as
pessoas “não devem ter medo de fazer qualquer tipo de trabalho” para que o projeto seja
concluído com qualidade. Finalizando, o depoimento de um sujeito reforça a diferenciação
desse líder em relação aos demais, pois “é uma pessoa apaixonada pelo que faz. O brilho nos
seus olhos acaba contaminando um pouco a equipe, motivando as pessoas, fazendo as pessoas
sentirem vontade, tesão, gostarem da coisa”.
Atuação do líder no processo de compartilhamento
Cabe ao líder facilitar o compartilhamento, segundo os respondentes, contatando
pessoas mais experientes, estando junto com a equipe, dando espaço e estimulando a equipe a
compartilhar, valorizando a equipe, criando relacionamento baseado na confiança e
disseminando as idéias da equipe.
O contato com pessoas mais experientes foi observado no depoimento de um sujeito
que afirmou que “o líder busca trazer para as reuniões algumas pessoas experientes” e pela
aproximação do líder “com determinada pessoa experiente”. Durante a observação não
162
participante, esse aspecto ficou evidenciado pela presença de um profissional técnico que foi
consultado em todas as questões relativas ao seu campo de expertise, não dominado pelos
demais membros da equipe. Não obstante, a participação desse expert ficou restrita apenas a
alguns momentos da reunião observada. Pode-se levantar a premissa que o conhecimento
técnico e a experiência sejam fundamentais, mas ao mesmo tempo limitam a participação
dessas pessoas quando o tema foge da alçada do leque de conhecimentos técnicos,
provocando uma certa “apatia” e baixa participação durante a maior parte no processo de
compartilhamento.
Estar junto com a equipe, dando espaço para que as pessoas compartilhem os
conhecimentos adquiridos, foi observado tanto nas entrevistas quanto na observação não
participante. O relato de um respondente reforça que o líder “dá espaço e abertura” para que a
equipe possa compartilhar e, esse mesmo líder senta junto com a equipe visando “dividir,
explicar” para melhorar o processo de tomada de decisão. Não obstante, durante a observação
não participante ficou evidenciado que no processo de tomada de decisão existe um
desconforto do líder e dos membros com esse tema, pois em três oportunidades e em tom de
desabafo foram ouvidas expressões tais como: “e aí a gente pergunta para as „meninas‟
(fazendo referência as superiores hierárquicas)”, a gente “leva para o gerente da Fábrica
decidir”, e “a impressão a laser (...) vou ter que aprovar com minha chefe e com o pessoal do
departamento X”. Depreende-se que existem oportunidades para a melhoria do processo de
tomada de decisão, fazendo com que a equipe possa assumir maiores responsabilidades e
possa compartilhar o conhecimento de um modo menos hierarquizado.
Para os sujeitos entrevistados, cabe ao líder facilitador do processo de
compartilhamento do conhecimento “pedir, estimular a participação de todos” e mostrar que
“o time faz a diferença”. Esse processo de estimular a equipe é o mesmo defendido por
163
DiBella e Nevis (1999) que afirmam que os líderes devem encorajar o desenvolvimento de
novas idéias e métodos de trabalho. Todavia, isto não foi evidenciado na observação não
participante, em que um dos observadores afirmou que “não vi o líder buscando a
participação” das pessoas técnicas que faziam parte da reunião e de outras que estavam tendo
uma participação limitada. Por outro lado, esse mesmo observador, constatou a existência de
um processo de “conversas paralelas” que não era obstado pelo líder e que, na ótica do
observador, era um processo positivo, pois ao concluírem as trocas por meio de conversas
paralelas, compartilhavam a informação com os demais membros da equipe.
Valorizar a equipe foi evidenciado no relato de um respondente que afirmou que o
líder “valoriza cada pessoa dentro do seu grupo”. Isto foi complementado por outro sujeito
que acrescentou que cabe ao líder “acreditar que os recursos internos da empresa eram
capazes” de fazerem determinada tarefa vital para o andamento do projeto. Nas palavras desse
mesmo respondente, o líder “deveria ter confiança que aquelas pessoas ali reunidas eram
capazes”. Depreende-se desse depoimento a existência de uma crítica “velada” (ou o não dito
da lingüistica) de que em algumas vezes existe uma preferência do líder por pessoas externas
em detrimento daquelas que podem ser consultadas dentro da própria organização pesquisada.
O líder facilitador do compartilhamento do conhecimento deve, segundo os
respondentes, criar relacionamento baseado na confiança. Esse ponto foi ressaltado por um
sujeito que afirmou que “agora ele (líder) nem participa mais porque foi naquele momento
que a gente estava começando a nossa relação, agora a gente estabeleceu essa relação de
confiança, então ele quase não participa mais”. Não foi possível para o pesquisador
aprofundar a questão de como era o processo antes, pois a palavra “agora” pode ser
interpretada como um rompimento na forma como o líder agia anteriormente. Outro detalhe
que merece aprofundamento da análise é em relação ao tempo e às atividades necessárias para
164
que a relação de confiança possa ser construída entre o líder e os membros da equipe. A
confiança pode ser evidenciada na observação não participante, em que se percebeu que a
condução da reunião estava sendo feita por um membro da equipe, com anuência do líder, e
que o líder depositava confiança no membro que estava liderando de fato a reunião.
Convém ressaltar que o conjunto de crenças e de valores da organização pesquisada
reforça o processo de compartilhamento baseado na confiança, por meio do relacionamento,
humanismo, aperfeiçoamento contínuo, compromisso com a verdade e a transparência.
Segundo Teixeira (2004), a conceituação de confiança vem sendo objeto de estudos de vários
autores há décadas. A autora cita Sheppard e Sherman (1998, p. 422) que afirmam que a
confiança consiste na “aceitação dos riscos associados ao tipo e à profundidade da
interdependência inerente a um dado relacionamento”. Depreende-se nos depoimentos que o
líder facilitador permite, após um período de convivência com a equipe, que um membro
assuma riscos que em tese deveriam ser de responsabilidade do líder. Cria-se, dessa forma,
um aprofundamento e uma interdependência relacional entre o líder e sua equipe.
Disseminar as idéias da equipe é uma das formas de atuação do líder no processo de
compartilhamento. Para os respondentes, isso é uma característica pessoal do líder e a
expectativa dos membros, expressada pelo depoimento de um sujeito, é que “ele (líder)
divulgue nossas idéias” para outras equipes, para os gestores e demais colaboradores da
empresa. DiBella e Nevis (1999) chamam a atenção, ao discutirem os fatores facilitadores no
processo de disseminação, para a falta de participação dos líderes na disseminação e uso do
conhecimento. Para os autores, isso é decorrente da preferência dos líderes em enfatizar mais
o processo de aquisição do conhecimento em detrimento dos demais. O alerta dos autores não
foi observado nas entrevistas e na observação não participante, porque o aspecto relacional da
organização pesquisada, expresso pelo conjunto de crenças e valores calcados no
165
relacionamento e no humanismo, mostraram ser fatores facilitadores da disseminação de
idéias e trocas de experiências.
Atuação do líder no processo de retenção
A atuação do líder para facilitar a retenção do conhecimento na memória
organizacional advém do estímulo dado às equipes para compartilharem e praticarem o
conhecimento adquirido. O estímulo à pratica apresentou a dimensão do líder praticando e
buscando que sua equipe o acompanhe nesse processo. O depoimento de um líder reforça esse
estímulo por meio de exemplo, aonde afirmou que “o primeiro produto que sai da máquina,
pego e levo para o centro de memória”. Outra dimensão observada foi a atuação do líder
“mantendo as pessoas por algum tempo realizando” com o objetivo de implementar as idéias
e fazer com que elas funcionem. Um ponto destoante foi observado por meio do depoimento
de um sujeito que afirmou que “bateu a cabeça, fazendo um projeto que a gente já tinha feito
mil vezes e está sempre dando errado”, evidenciando que houve dificuldade de retenção de
conhecimento. Pode-se depreender que o líder contribuiu para tal pelo tom irônico apreendido
na entrevista, por meio da declaração: “a gente já tinha feito mil vezes”.
Durante a observação não participante, os dois observadores constataram que
“ninguém registrou mais nada” além das providências que deveriam ter sido feitas no
acompanhamento das atividades de um determinado projeto. Em nenhum momento, foi
percebido pelos observadores a preocupação do líder da equipe em estimular os membros a
registrarem o conhecimento demonstrado, compartilhado informal e abertamente por meio de
várias experiências relatadas. Analisando-se sob a ótica da informalidade, algumas
declarações dos entrevistados evidenciaram a existência de processos informais de
166
compartilhamento, tais como: “eu ficava observando o que o colega estava fazendo na
bancada ao lado da minha”; “eu uso muito o cafezódromo para trocar idéias com os colegas”.
Ações para criar clima propício à aprendizagem
O líder para criar um clima que favoreça à aprendizagem deve, segundo os sujeitos
entrevistados, criar oportunidades de aprendizagem, dar liberdade para errar, motivar,
envolver, suportar e confiar na equipe, dar e receber feedback, construir relacionamento com a
equipe e respeitar a diversidade. O desenho da “carinha alegre” foi escolhido pela
demonstração de alegria observada ao longo das entrevistas, da observação não participante e
por um trecho da visão da organização pesquisada que declara seu comprometimento na
construção de um mundo melhor (representado pelo círculo). A alegria é uma característica
evidenciada na organização pesquisada.
A criação de oportunidades de aprendizagem mostrou uma ambigüidade entre o que
foi declarado e aquilo que foi verificado na observação não participante. Os depoimentos dos
líderes e membros apontam para atividades do líder “provocando a discussão”, “pedindo
opinião de todo mundo”, “envolvendo a equipe no processo decisório, alinhando
expectativas” que não foram evidenciadas na observação não participante. Foi constatado
pelos dois observadores uma falta de discussão, que poderia ter sido provocada pelo líder,
visando criar oportunidades de aprendizagem. O que aconteceu na reunião observada foi o
uso de métodos de estabelecimento e acompanhamento de objetivos e de atividades de
projetos. A exceção observada foi a discussão sobre o tema nanoemulsão o qual o líder
ironicamente perguntou: “O que é isso? Observou-se uma breve discussão sobre o inquirido
pelo líder, porém, praticamente nada foi acrescentado à aprendizagem da equipe.
167
Segundo Garvin (2002), cabe ao líder criar oportunidades de aprendizagem por meio
de tarefas, atividades e eventos que têm a finalidade primária de nutrir a aprendizagem. Cabe
a ele reunir a equipe em torno de um desafio comum com tempo e espaço adequados para que
a equipe exercite o verdadeiro pensamento, praticando, dessa forma, um processo de
aprendizagem por meio do compartilhamento de experiências. Embora a equipe tenha trocado
experiências em alguns momentos da reunião observada, em nenhum deles percebeu-se a
intenção do líder e dos membros em registrar aquilo que estava sendo discutido e aprofundar a
discussão visando ampliar o aprendizado. Então, pergunta-se onde se realizam as discussões?
Encontros informais seriam o foro mais privilegiado de discussões? É no dia-a-dia, sem
horário e local determinado? Estaria, a informalidade, assim, impregnada a ponto de uma
reunião formal não agregar conhecimento?
O estabelecimento de um clima propício à aprendizagem na qual o líder dá liberdade
para a equipe errar, que motiva e envolve as pessoas, que suporta e confia nas decisões da
equipe, foi observado tanto nas entrevistas como na observação não participante. O clima
“descontraído, com muita risada, divertido” declarado por um sujeito, foi comprovado na
observação não participante em que os observadores constataram “um clima agradável, com
brincadeiras na medida certa e muita risada”. Esse clima reflete a prática no dia-a-dia das
crenças e dos valores da organização pesquisada, que reforça o aspecto relacional entre as
pessoas atuando como facilitador da aprendizagem.
DiBella e Nevis (1999) afirmam que um clima de abertura aonde exista o livre
compartilhamento de erros e lições é um fator facilitador do processo de aprendizagem
organizacional. A afirmação dos autores foi observada no depoimento de um respondente que
confirmou a existência de liberdade para errar em especial quando o líder “deixa a equipe um
pouco mais livre, dando liberdade para errar”. Convém ressaltar que as equipes de projetos na
168
organização pesquisada têm que alcançar vários objetivos, tais como: desenvolvimento dos
componentes do mix do produto, quantificação do interesse dos clientes, aquisição de moldes
e equipamentos, realização de lotes pilotos, etc. Esses objetivos são cumpridos por meio de
centenas de atividades em cada projeto, sendo praticamente impossível a inexistência de
desvios/erros, que são vistos como inerentes ao processo. Todavia, percebeu-se na
organização pesquisada a liberdade para errar e ao mesmo tempo a não conivência com o
erro, explicitada na crença do aperfeiçoamento contínuo e que foi depreendida ao longo das
entrevistas e da observação não participante. Para Conger (1992), cabe ao líder obter
comprometimento da equipe em relação a orientação dada e, motivar as pessoas para
alcançarem os objetivos. Senge (2002) reforça a característica do líder de injetar pontos de
vista apoiadores para motivar e envolver a equipe. Esse papel motivacional foi explicitado
quando um sujeito declarou que seu líder “não deixa o time perder a auto-estima. Ele trata as
pessoas de igual maneira”.
Alguns fatores facilitadores da aprendizagem, assim como barreiras e aspectos da
cultura de trabalho puderam ser depreendidos. A informalidade, o clima de abertura e
tolerância ao erro e a descontração da equipe foram os pontos mencionados nos depoimentos
dos respondentes como facilitadores da aprendizagem. Em relação a barreira, a fala recorrente
dos respondentes: “as vezes você tem que fazer isso em prazos muito pequenos, você tem que
entregar o trabalho rapidamente” denota aspectos da cultura de trabalho da organização, que
tem uma demanda elevada pelo lançamento de novos produtos por meio da equipe de
projetos.
Complementando os aspectos da cultura de trabalho, alguns depoimentos indicam que
o líder tem autoridade limitada uma vez que as equipes de projeto se reportam apenas
funcionalmente e não hierarquicamente ao líder. Apontam que o líder tem uma função mais
169
administrativa do que executiva nos projetos. Os times de projetos são formados por
profissionais de diversas áreas e, na maioria, não têm subordinação direta com o líder do
projeto. Um depoimento chama a atenção sobre a forma como “a empresa supervaloriza a
liderança de marketing”. Depreendeu-se do depoimento, a existência de crítica do modo como
é conduzido o processo de liderança em equipes de desenvolvimento de novos produtos,
aonde os profissionais da área de marketing têm sido mais valorizados que os demais.
Segundo o depoimento do gerente responsável pelo gerenciamento de projetos de
desenvolvimento de novos produtos, todas as equipes de projetos são lideradas por pessoas da
área de Marketing.
Segundo os respondentes, os líderes reforçam que deveriam dialogar com a equipe por
meio do processo de dar e receber feedback. A maioria dos relatos apontam apenas uma via
nesse processo, que é o líder dando feedback aos indivíduos e à equipe. A exceção foi o
depoimento de um respondente que disse que o líder “faz reuniões individuais, pergunta o que
as pessoas pensam dele”. Tomando-se por base esse depoimento, poder-se-ia estabelecer uma
premissa de que um clima agradável, amigável e descontraído observado entre o líder e a
equipe não seja o suficiente para que os liderados sintam-se a vontade para dar feedback ao
líder. Talvez pelo estilo observado, na maioria dos depoimentos e na constatação feita durante
a observação não participante, por ser predominantemente diretivo e orientado para
realização, os líderes pesquisados têm dificuldades em abrir espaço para que os liderados
possam oferecer feedback. Outra premissa que pode ser levantada é verificar se existe, por
parte dos líderes, excesso de confiança na equipe que possa dificultar a solicitação de
feedback por parte do líder. Segundo Garvin (2002), cabe ao líder solicitar feedback crítico
visando combater o excesso de confiança.
170
Construir relacionamento com a equipe é uma ação, segundo os respondentes, que o
líder deve ter para criar um clima propício à aprendizagem. A maioria dos depoimentos e a
observação não participante mostraram que existe, por parte dos líderes, uma “política de
portas abertas”. Os observadores, ao visitarem os escritórios da organização pesquisada,
constataram que o layout não contempla salas fechadas, exceto as de reuniões que têm
paredes e portas envidraçadas, o que denota a vivência do valor transparência e reforça a
crença do relacionamento. Vários sujeitos declararam em seus depoimentos que os lideres
“permitem brincadeiras, proporcionam um clima amigável, permitem que as pessoas se
sintam à vontade”. Esses depoimentos foram comprovados na observação não participante.
Todavia, um sujeito deu um depoimento destoante dos demais ao afirmar que “o clima „ideal‟
para aprendizagem é aquele que existe muita compreensão e tolerância. Acho que falta aqui,
em alguns momentos, um pouco de tolerância”. Depreende-se do depoimento desse sujeito
que, provavelmente, pela necessidade da organização em lançar significativas quantidades de
novos produtos no mercado todos os anos, exerça sobre os líderes de projeto uma pressão por
ciclos cada vez mais curtos que acabam criando barreiras no relacionamento e,
consequentemente, afetando a aprendizagem.
O respeito à diversidade é uma das crenças mais valorizadas na organização
pesquisada. Isso pode ser constatado na reunião observada, nas entrevistas, nas leituras dos
documentos que explicitam o institucional da organização declarado pelos seus principais
executivos. O líder do cluster 4 chamou a atenção pela emoção demonstrada e pelo
depoimento que “não adianta querer que todo mundo seja risonho como eu e que tenha tesão
para fazer as coisas assim como eu faço. Eu tenho que respeitar a diversidade da minha
equipe”. Embora a diversidade seja uma das crenças da organização pesquisada, foi
observado que apenas o líder do cluster 4 fez menção a ela durante as entrevistas. Na
171
observação não participante foi constatado pelos dois observadores que sempre houve por
parte do líder um respeito pela diversidade de idéias, comportamentos e atitudes de todos os
participantes. A própria constituição da equipe com pessoas de várias áreas, formações,
distintos níveis de experiência e expertise é um exemplo do respeito à diversidade. Ulrich
(2000) afirma que um dos atributos de um líder no processo de aprendizagem organizacional
é desenvolver as capacidades da organização visando a alavancagem da diversidade. Para Cox
e Blake (1991), as organizações podem alcançar vantagens competitivas nos processos de
criatividade e inovação , resolução de problemas e gerenciamento de mudanças, se souberem
capitalizar os benefícios potenciais da diversidade nas equipes de trabalho. Adicionalmente,
podem criar vantagens competitivas em custos, melhorar os processos de atração de pessoas e
obterem sucesso em marketing, por meio do adequado gerenciamento da diversidade.
Administrar é uma categoria em que o líder, de acordo com os respondentes, usa as
competências da equipe, orienta a equipe à compartilhar, faz reuniões de aprendizado, cobra a
equipe e estabelece critérios para escolha dos membros da equipe. Observou-se no cluster 4
depoimentos exclusivos em especial para o processo de retenção do conhecimento, que além
dos pontos mencionados foi constatado que o líder disponibiliza recursos, conhecimento e faz
“rescaldo” do projeto.
O líder utiliza as competências da equipe para “aproveitar a expertise e a senioridade
de uma pessoa que conhece bem o processo, porque ela já tinha passado por situações
semelhantes”, objetivando aproveitar o que cada “membro tem de melhor” para transmitir aos
outros membros da equipe. Depreendeu-se desse depoimento que o líder estava buscando usar
as competências de cada membro para resolver determinado problema ou propor
172
oportunidades de melhoria. Para Ulrich (2000), cabe ao líder criar oportunidades para que
todos contribuam com seus melhores talentos pessoais para o esforço da equipe.
“O líder me orientava chamando minha atenção para alguns pontos relevantes do
projeto” foi o depoimento de um sujeito ao ser questionado sobre a atuação do seu líder no
processo de compartilhamento do conhecimento. Outro depoimento reforça a atuação do líder
dentro e fora da sua equipe de projetos, pois ele “alertava as pessoas da equipe e os outros
líderes de equipe”. Observou-se que o líder atua orientando individualmente cada participante
da equipe, conforme relatado por um respondente ao afirmar que “o líder me acompanhava
muito, me orientava, me ensinava”. Não obstante, durante a observação não participante um
observador constatou que o líder da equipe não reforçava o processo de compartilhamento que
acontecia dentro da equipe. Para esse observador o líder deveria fazer questionamentos à sua
equipe, tais como: “nossa, isso que você está falando é muito importante, você deveria
explorar mais este ponto”.
Provavelmente, a maior ambigüidade observada neste trabalho diz respeito a
percepção dos líderes e membros das equipes em relação às reuniões de aprendizagem. Os
depoimentos afirmam que o líder faz reuniões de aprendizado “conversando com a equipe,
reunindo as pessoas, questionando, endossando, transmitindo o que havia sido vivenciado,
disseminando o histórico do projeto”. Para Huber (1991), a reunião da equipe é uma forma de
compartilhamento do conhecimento. Todavia, durante a observação não participante, os dois
observadores constataram que a reunião em si não revelou os aspectos salientados pelos
respondentes, em que a aprendizagem ocorre predominantemente na informalidade e não nas
reuniões formais. Teve sim um processo de follow-up das atividades da equipe em relação ao
conjunto de projetos que eles eram responsáveis. Um dos observadores afirmou que “não
senti que os questionamentos do líder levavam à equipe para refletir. Não observei perguntas
173
tais como: com base no que você está falando isso? De onde você tirou isso? O que senti é o
líder demostrando que precisamos providenciar coisas!”. Outro observador ressaltou o
depoimento em tom de desabafo de um membro da equipe ao afirmar que “aqui a gente é
rápido” referindo-se a pressão exercida sobre a equipe para que o tempo do projeto fosse
reduzido. Um observador constatou que:
“Várias coisas que foram passadas e que são importantes „passaram batido‟ porque
tem a pauta e tem que correr com ela (sic). Não sei se isso vai ser retomado outras
vezes, talvez vai ser, porque como é uma reunião de acompanhamento de
providências, acho que deve voltar em outros momentos”.
Uma premissa é verificar até que ponto a pressão por um volume elevado de projetos
para lançar novos produtos atua como barreira ao aprendizado das equipes e da organização
pesquisada. Outra premissa é até que ponto o retrabalho, declarado por vários respondentes,
feito atualmente nos projetos é reflexo da falta de aprendizado obtido com os projetos
anteriores. O provérbio oriental: “para chegar mais longe você deve ir mais devagar”, pode
ser inspirador para a análise e comprovação dessa premissa.
O depoimento do líder do cluster 4 comprova a fragilidade das reuniões de
aprendizado. O líder fez uma tentativa frustrada de reunião de aprendizado a qual denominou
de rescaldo do projeto. Rescaldo é um sinônimo masculino que pode ser usado como “a cinza
que ainda conserva algumas brasas” ou como o “ato de jogar água nas cinzas de um incêndio
para evitar que o fogo se inicie novamente” (MICHAELIS, 1998, p. 1069). É interessante
observar que ambos significados são reveladores. No primeiro, depreende-se que o rescaldo
serviria para manter viva a chama do conhecimento (compartilhamento e retenção do
conhecimento) possibilitando que outras equipes a usassem para iniciar um novo “fogo”
(projeto). No segundo, o sinônimo remete para o não aprendizado, pois as pessoas não
gostariam de se “queimar” novamente lembrando das “dores de cabeça” enfrentadas nos
projetos recém terminados e, portanto, jogariam “água” (evitar o sofrimento) para extinguir o
174
“fogo” (aquilo que foi aprendido, porém não compartilhado e retido na memória
organizacional). A tentativa relatada pelo líder, em linha com o segundo significado, não deu
certo porque “cada uma das pessoas não estavam (sic) mais naquele time” e, quando
procuradas alegavam que “o meu trabalho já foi cumprido e não quero voltar a „dor de
cabeça‟ que tive na época”.
Segundo os respondentes, cabe ao líder cobrar a equipe “fazendo cumprir as regras,
acompanhando os cronogramas, não deixando o processo solto” com o objetivo de
administrar o processo de compartilhamento do conhecimento. Um sujeito declarou que o
líder “puxa de forma a trazer todo o conhecimento para o grupo, ele sabe acompanhar
exatamente em que passo está o projeto”. Durante a observação não participante foi
constatado que o líder chama o grupo para cumprir determinadas providências como, por
exemplo, “gente a conversa tá boa, mas tem uma providência, então volta prá cá (sic)”. Esse
aspecto de cobrar a equipe está coerente com o observado em relação as reuniões de
aprendizado que são na realidade reuniões de acompanhamento de providências que deveriam
ser tomadas nos projetos.
Um dos líderes entrevistados declarou que “tem critérios bem definidos na escolha das
pessoas” que irão compor a sua equipe. Segundo esse líder este processo é importante para
criar um clima propício à aprendizagem:
“Se você pegar uma pessoa que tenha uma atitude assim mais bacana de
compartilhar acho que é o primeiro passo na hora de selecionar as pessoas. Porque
se a pessoa for ótima mas destruindo o clima, o clima para aprendizagem vai ficando
cada vez mais difícil. Então eu acho que peguei pessoas, assim, que têm jeito legal,
que são fáceis de lidar, que gostam de trabalhar em grupo e que trabalham com
muita transparência”.
Ulrich (2000) afirma que cabe ao líder ao organizar e posicionar as equipes, selecionar
as pessoas mais talentosas para a composição das equipes. O depoimento do líder chama a
atenção para aspectos de alinhamento com as crenças e valores da organização pesquisada,
175
como, por exemplo, a transparência e o relacionamento. Todavia, não está sendo observada a
crença da diversidade.
O depoimento do líder do cluster 4 em relação a sua atuação no processo de retenção
do conhecimento ressalta que ele procura “garantir que o conhecimento criado e
compartilhado na equipe vai ser disponibilizado” para a equipe e para a organização. Seu
depoimento é complementado quando afirma que “disponibiliza recursos para garantir que
esse conhecimento seja armazenado de alguma forma” na memória organizacional. Os
depoimentos de respondentes apontam que o líder do cluster 4 tem como características
pessoais ser “muito abelhudo”, “ser muito objetivo e claro” e ser “muito transparente”. Os
depoimentos reforçam que esse líder demonstra seu caráter pessoal ao vivenciar as crenças e
valores da organização, o que segundo Ulrich (2000) é um atributo da liderança no processo
de aprendizagem organizacional. A premissa a ser verificada é porque somente nesse cluster
foi observada uma disposição do líder em aportar recursos visando garantir a retenção do
conhecimento. Convém frisar que esse cluster foi incluído após depoimento espontâneo de
um sujeito, durante as entrevistas, que apontou o líder como sendo exemplo de atuação no
processo de aprendizagem organizacional.
176
Conclusão parcial da atuação e ações do líder nos processos de aquisição, compartilhamento e
retenção do conhecimento.
Para os respondentes a forma de atuação e ações do líder nos processos de aquisição,
compartilhamento, retenção e a criação de clima propício à aprendizagem podem ser
sintetizadas em três categorias. A primeira é direcionar as ações da equipe por meio da
geração de necessidades, pelos exemplos vividos pelo líder, pelo estímulo que o líder dá às
pessoas para “pensarem fora do quadrado” e pela orientação para que a equipe documente os
conhecimentos adquiridos e compartilhados. A segunda, que se mostrou a mais significativa,
é o papel do líder como facilitador, que compreende uma vasta gama de ações e atitudes que
vão desde dialogar com os membros da equipe, passando pela criação de relacionamento de
confiança e chegando até o processo de criação de oportunidades de aprendizagem. A terceira
é o processo de administrar usando as competências da equipe, orientando a equipe a
compartilhar, disponibilizando recursos e conhecimento, cobrando a equipe e estabelecendo
critérios bem definidos para a formação da equipe. De forma simplificada, as observações
apontam para uma participação pequena do líder, direcionando o processo de retenção e uma
participação média no processo de aquisição de um determinado conhecimento. A forma de
atuação do líder é mais significativa na facilitação dos processos de compartilhamento e
criação de clima propício à aprendizagem e moderada nos processos de aquisição e retenção.
A atuação administrativa do líder é moderada nos processos de aquisição, compartilhamento e
retenção e, pequena no processo de criação de clima propício à aprendizagem. A Figura 17
sintetiza a forma de atuação do líder nos processos de aquisição, compartilhamento, retenção
e criação de clima adequado à aprendizagem.
177
Figura 17 Atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional
Fonte: Elaborado pelo Autor
Ao relacionar-se o conjunto de crenças e de valores da organização pesquisada com a
forma de atuação do líder nos processos de aquisição, compartilhamento, retenção e ações
para criação de clima propício à aprendizagem, verifica-se que o papel de facilitador é comum
para todo o conjunto de crenças e de valores, o papel de administrador é comum para as
crenças de relacionamento, humanismo, diversidade, aperfeiçoamento contínuo e criatividade
e, o papel de direcionador tem relação com as crenças e os valores do aperfeiçoamento
contínuo e da criatividade. A Figura 18 sintetiza estas relações.
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Reter
Criar clima de
aprendizagem
ProcessoAtuação do líder
178
Figura 18 Conjunto de crenças e valores da organização pesquisada e sua relação com a forma
de atuação do líder no processo de aprendizagem
Fonte: Elaborado pelo Autor
Rel
acio
nam
ento
,
hum
anis
mo,
dive
rsid
ade
Compromisso
com a verdade,
transparência
Aperfeiçoam
ento
contínuo,
criatividade
179
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de análise possibilitou conclusões de aspectos significativos a respeito da
atuação do líder no processo de aprendizagem organizacional em equipes de desenvolvimento
de novos produtos, bem como da explicitação dos processos de aquisição, compartilhamento e
retenção do conhecimento nessas equipes. Flick (2004) chama a atenção dos pesquisadores
qualitativos em relação a habilidade de redigir e a capacidade de assumir posições assertivas
em suas conclusões. O autor com base em Becker (1986) menciona que os pesquisadores são
temerosos em assumir posições próprias. Esse temor acaba levando à redações inócuas, cujo
objetivo é evitar ser apanhado em erros crassos. Mesmo correndo o risco de ser apanhado em
erros, o pesquisador deste trabalho permitiu-se alçar vôos intelectuais mais audaciosos em
suas conclusões.
Não foram observadas variações significativas entre os conteúdos das respostas nas
quatro unidades de análise, clusters, em relação aos processos de aquisição, compartilhamento
e retenção do conhecimento. De forma sumarizada, pode-se afirmar que, para esse grupo de
respondentes, enfrentar desafios, aprender empiricamente e pesquisar são categorias
exclusivas para a aquisição de um determinado conhecimento. Para a retenção do
conhecimento, observou-se que praticar, documentar e reter talentos foram as categorias
exclusivas encontradas. Em relação ao processo de compartilhar, não foram observadas
categorias exclusivas e sim coincidentes (compartilhar e inquirir) com o processo de aquisição
e reunir a equipe que é coincidente com o processo de retenção. O inquirir e o compartilhar
foram categorias observadas nas três etapas do processo de aprendizagem organizacional:
aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento.
180
Uma conclusão é que o processo de aprendizagem, para esse grupo de respondentes, é
circular, aonde o compartilhar foi evidenciado de forma destacada em relação ao adquirir e
reter. O compartilhar mostrou-se de forma espontânea nos depoimentos dos sujeitos e na
observação não participante, levando o pesquisador a concluir que esse aspecto é fortemente
vivenciado na organização pesquisada. A análise de dados históricos, do conjunto de crenças
e valores e da observação não participante reforçam continuamente o compartilhamento na
organização pesquisada. Poder-se-ia afirmar que o compartilhar faz parte do DNA da
organização e que este é um fator facilitador do processo de aprendizagem organizacional.
Assim, o pagamento do 14.o salário, antes da existência de lei específica, o pagamento de
bônus em ações (phantom stock options) para dezenas de executivos, mesmo antes da abertura
de capital da empresa, a gestão participativa de reuniões, a existência de locais como
“cafezódromos”, “praças” e bancos dispostos em vários locais, o layout aberto dos escritórios,
a necessidade das pessoas estarem trocando experiências, etc. são exemplos que materializam
o compartilhamento na empresa pesquisada. Para Schein (2001), os artefatos visíveis
(ambiente físico na organização, como, por exemplo, a arquitetura, o layout, o modo como as
pessoas se vestem, os documentos, etc.) materializam um dos três níveis em que a cultura
organizacional pode ser apreendida.
O compartilhamento mostrou-se como o eixo do processo de aprendizagem
organizacional na pesquisa ao figurar como elo comum da aquisição e retenção. Quanto à esse
último aspecto, verificou-se que ele conduz à uma memória tácita ou explícita. A ferramenta
do Funil de Inovação foi introduzida visando a última, mas não há como negar que o tácito
existe na mente e nos corações dos líderes. O aspecto informal tende a socialiazá-lo. Nonaka e
Takeuchi (1997) reforçam que o compartilhamento é um processo social entre pessoas, tanto
na dimensão ontológica como na epistemológica. Kim (1993) chama a atenção para a falta de
181
consideração na maioria dos modelos de aprendizagem organizacional em relação ao papel
das pessoas e suas interações, fenômeno de compartilhamento socialmente construído, com as
demais e com o ambiente.
Capra (2002) lança o questionamento se o aprendizado é um fenômeno individual ou
é também um fenômeno social. O autor reforça que o conhecimento tácito é fruto da dinâmica
cultural que desemboca em uma rede de comunicações, tanto verbais como não verbais,
dentro do que ele denomina como comunidades de prática. Capra (2002) afirma que o meio
mais eficaz para potencializar o aprendizado em uma organização é obtido pelo apoio e
fortalecimento de suas comunidades de prática. As definições de Wenger e Snyder (2000) e
Valença (1997) sobre comunidades prática foram referendadas pelo trabalho de Moura
(2004), que estudou esse fenômeno considerando a realidade brasileira. Segundo Moura
(2004, p. 15), uma comunidade de prática é “qualquer grupo de pessoas, que possuindo uma
prática em comum e uma referência epistemológica em comum, se reúnem duradoura e
regularmente para refletir coletivamente sobre essa prática, aprendendo uns com os outros a
entendê-la e, principalmente, a fazê-la melhor”.
Ao se comparar as equipes de projetos observadas com as comunidades de prática,
percebe-se à luz dos conceitos de Wenger e Snyder (2000) que idealmente as comunidades de
prática têm como objetivo criar e compartilhar conhecimento e que as equipes de projetos
objetivam cumprir uma determinada tarefa. Percebe-se a existência de lacunas relativas ao
propósito, ao processo de formação das equipes, ao que mantém as pessoas unidas e a duração
entre equipes de projetos e comunidades de prática. As principais lacunas são em relação aos
propósitos e o que mantém a equipe unida. Nas comunidades de prática, o propósito maior é a
criação e compartilhamento do conhecimento, ao passo que nas equipes de projetos o objetivo
é concluir adequadamente um determinado projeto. O que mantém as pessoas unidas nas
182
equipes de projetos são os objetivos e os milestones, que difere das comunidades de prática
em que a união é mantida pela paixão, pela oportunidade de aprendizado e pela identificação
entre as pessoas e os objetivos. A duração das comunidades de prática é orgânica e depende
do interesse das pessoas ao passo que nas equipes de projetos existe um fim pré determinado,
que é o encerramento de um projeto.
Algumas perguntas poderiam ser feitas para verificar qual seria o ganho se as equipes
de projetos da organização pesquisada fossem “transformadas” em comunidades de prática.
Qual caminho a empresa deveria percorrer para alcançar esse propósito? Quais pessoas
deveriam participar dessa transformação e onde seriam mais úteis as comunidades de prática
na organização pesquisada? Em função daquilo que foi constatado nas entrevistas, na
observação não participante e nos documentos analisados, depreende-se que os conceitos
puros e integrais de comunidades de prática não seriam efetivos se aplicados nas equipes de
projetos. Dificilmente a empresa pesquisada abriria mão de ter datas definidas para lançar
novos produtos, bem como deixaria que as equipes de auto selecionassem. Todavia, um
caminho possível seria a incorporação de aspectos das comunidades de prática nas equipes de
projetos como, por exemplo, a ampliação do propósito com a inclusão da criação e
compartilhamento do conhecimento e por ações e exemplos que estimulassem nas pessoas a
paixão e o interesse pelo aprendizado. Em alguns depoimentos dos respondentes foi
mencionado que a organização pesquisada usa uma metodologia denominada Funil de
Tecnologia, cujo estudo não é escopo deste trabalho, aonde pequenos grupos de técnicos,
pesquisadores e cientistas se unem para desenvolver idéias e conceitos que posteriormente
serão transformados em projetos de lançamento de novos produtos. Percebe-se que o Funil de
Tecnologia está mais próximo do que Wenger e Snyder (2000) definem como comunidades
de prática.
183
Outra conclusão é que o conjunto de crenças e valores da organização pesquisada e,
provavelmente de outras organizações, tem uma relação significativa com o processo de
aprendizagem organizacional. Neste estudo ficou claro que a vivência das crenças e valores
atuam como facilitadores da aprendizagem. Estudos em outras organizações seriam
convenientes estudos para verificar a validade dessa premissa. A crença do aperfeiçoamento
contínuo e o valor criatividade mostraram estar relacionadas com as categorias de enfrentar
desafios, inquirir, pesquisar, documentar, praticar, aprender empiricamente e compartilhar.
Deve-se ressaltar que a organização pesquisada é desafiada pelo mercado a lançar uma grande
quantidade de novidades todos os anos e, isto é materializado por equipes de projetos de
lançamento de novos produtos. Portanto, a melhoria contínua e a criatividade são
fundamentais para que ela possa ter êxito em um mercado altamente demandante e
competitivo. A crença do compromisso com a verdade e o valor transparência mostraram ter
relação com as categorias compartilhar e aprender empiricamente. O mercado de cosméticos
tem forte apelo para aspectos intangíveis como beleza, por exemplo, e a organização
pesquisada prima por lançar produtos que cumpram o prometido. Esse aspecto ficou
evidenciado na leitura dos documentos da organização pesquisada, em especial no seu
conjunto de crenças (2000) que explicita:
“A beleza é um legítimo anseio de todo ser humano. Em nossa sociedade esse anseio
é manipulado com a imposição de estereótipos e preconceitos que estabelecem para
a beleza padrões de idade, raça e comportamento. Acreditamos que na
desmistificação desta atitude e na relação harmoniosa de nossa mente, cultivando e
preservando nosso corpo, existe a possibilidade de a beleza cada vez mais se
manifestar e ser percebida”.
Para cumprir isso, as equipes de projetos têm embutido na sua forma de agir um forte
compromisso com a verdade e a transparência é um valor de diferenciação da organização
pesquisada. As crenças do relacionamento, a diversidade e o valor do humanismo
apresentaram evidências de relação com as categorias reunir a equipe e reter talentos.
184
Depreende-se que para lançar novos produtos em um mercado altamente competitivo, a
organização usa a estratégia de criar equipes de projeto para cumprir essa tarefa e com isso, o
êxito dessas equipes tem dependência da forma de relacionamento entre os membros, que são
um exemplo de diversidade de idéias e formação acadêmica, entre outros.
Finalizando as conclusões do processo de aprendizagem, foi observado que a
introdução da ferramenta Funil de Inovação pode ser analisada por vários ângulos. Constatou-
se que ela contribuiu para a melhoria dos processos de compartilhamento e acesso ao
conhecimento, de padronização na documentação e, ajudou a organizar e simplificar o
processo, gerando ganhos de tempo para as equipes de projetos. Todavia, foi constatado que a
exiguidade de tempo para registrar os aprendizados aliada a falta de disciplina em seguir as
etapas propostas pela ferramenta acaba atuando como uma barreira à aprendizagem. Poder-se-
ia concluir que a ferramenta em si, por melhor que possa ser, é necessária mas não é suficiente
para melhorar o processo de aprendizagem dos membros das equipes de projeto na empresa
pesquisada. Seria importante analisar a influência de ferramentas similares em outras
empresas, a fim de verificar se o fenômeno observado é típico da empresa pesquisada ou é um
padrão em equipes de projetos que são altamente demandadas por quantidades crescentes de
novos produtos todos os anos.
Sinteticamente o líder no processo de aprendizagem organizacional, nas equipes
pesquisadas, atua como direcionador, facilitador e administrador de ações que objetivam
melhorar os processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento e criação
de clima adequado à aprendizagem. A similaridade entre as unidades de análise observadas
nos processos de aquisição, compartilhamento e retenção do conhecimento não foi
evidenciada quando foram analisadas a atuação e as ações dos líderes nesses processos. O
cluster 4 diferenciou-se dos demais, que mantiveram uma similaridade na atuação do líder,
185
por meio do envolvimento do líder com a equipe, pela valorização dada pelo líder à equipe,
pela iniciativa do líder em fazer reunião de aprendizado, pela disponibilização de recursos e
conhecimento e pelo respeito à diversidade.
Foi observado que todos os líderes pesquisados se envolvem com a equipe, por meio
de incentivo, estando junto em todos os momentos cruciais do projeto e entendendo as
dificuldades de cada membro. Todavia, a combinação envolvimento e valorização da equipe,
em especial fora do âmbito da própria equipe, foi observado apenas no cluster 4, aonde os
depoimentos dos liderados e do líder estiveram sempre alinhados evidenciando que os
liderados sentiram-se mais valorizados que nos outros clusters pesquisados. A valorização
pode ser resumida, segundo os respondentes, em ações do líder demostrando que acredita na
capacidade das pessoas da sua equipe e da organização e, que estabelece um clima de
confiança entre os membros da equipe. Pode-se concluir que o envolvimento do líder com a
equipe é condição essencial e que o resultado é amplificado se os membros tiverem clara
demonstração de que são valorizados não somente “intra muros” mas também no âmbito
organizacional.
É razoável e esperado que o líder deve disponibilizar recursos para que sua equipe
possa conduzir e concluir adequadamente os projetos que lhes são atribuídos. Todavia, isso
não foi evidenciado nas entrevistas e na observação não participante, exceto no caso do
cluster 4, em que tanto os liderados quanto o líder afirmaram que recursos tais como
softwares, metodologias, orçamento, pessoas etc. foram disponibilizados de forma adequada
pelo líder. Os liderados acrescentaram que o líder estimula e cobra da equipe o registro dos
aprendizados no Funil de Inovação. Esse líder disponibiliza talvez o recurso mais escasso na
empresa pesquisada, segundo os depoimentos dos respondentes, que é o tempo das pessoas
para “darem uma paradinha” e registrarem os conhecimentos que foram aprendidos. O líder
186
do cluster 4 foi o único a relatar uma experiência de reunião efetivamente de aprendizado, a
qual chamou de “rescaldo do projeto”. Nessa reunião fora do local normal de trabalho o líder,
segundo o relato dos respondentes, conduziu atividades nutridoras da aprendizagem
formulando perguntas tais como: “o que precisamos fazer?; quais sucessos e fracassos vocês
gostariam de compartilhar?; quais informações, „sacadas‟ vocês gostariam de compartilhar?”.
Segundo Garvin (2002), perguntas como as efetuadas pelo líder são exemplos adequados de
como conduzir uma reunião de aprendizado.
O respeito à diversidade foi espontaneamente declarado pelo líder e confirmado pelos
depoimentos dos liderados apenas no cluster 4. Ao entrevistar o líder desse cluster o
pesquisador sentiu que as respostas foram dadas com uma dose de emoção não observada
com a mesma intensidade nos demais líderes entrevistados, aonde ficou mais evidente a razão.
Constatou-se que o líder desse cluster consegue transitar entre emoção e razão de forma
equilibrada, ora “protegendo e defendendo os filhotes”, por exemplo, valorizando-os perante
as demais equipes e a organização, ora desafiado os “filhotes a alçarem vôo livre”, por
exemplo, ao exigir que um determinado protótipo fosse feito em tempo record. Segundo Cox
e Blake (1991), a capitalização da diversidade em equipes de trabalho alavanca a capacidade
competitiva das organizações por meio da melhoria nos processos de criatividade, solução de
problemas, gerenciamento de mudanças e maior flexibilidade organizacional.
O pesquisador deste trabalho percebeu que o alinhamento do líder do cluster 4 com as
crenças e valores da organização pesquisada foi constatado de uma maneira espontânea,
aonde as palavras e exemplos fluíam, durante as entrevistas, naturalmente. A percepção é de
que este líder tem fortemente internalizado as crenças e valores da organização pesquisada e
transmite naturalmente isso aos seus liderados estimulando-os a fazerem o mesmo.
Entendendo-se que a liderança é um processo socialmente construído, poderia ser objeto de
187
investigação, por parte da empresa pesquisada, compreender esse processo, a fim de formar
outros líderes com características similares às observadas no líder desse cluster.
Pode-se afirmar que o processo de aprendizagem, na organização pesquisada é
circular e composto de três etapas: aquisição, compartilhamento e retenção de um
determinado conhecimento. Foram evidenciadas barreiras como, por exemplo, rapidez
excessiva, falta de tempo e alta flexibilidade, que por sua vez são afetadas tanto pela cultura
de trabalho como pelas variáveis do ambiente externo. Os resultados observados podem ser
expressos em um modelo de aprendizagem similar àquele defendido por Huber (1991). Para
esse autor uma organização aprende quando consegue que seus membros adquiram,
distribuam, interpretem e retenham na memória organizacional um determinado
conhecimento. Todavia, o modelo de Huber (1991) não enfatiza a atuação do líder no
processo de aprendizagem.
Neste estudo ficou evidente que a atuação do líder é determinante no processo de
aprendizagem organizacional. De forma sintética, constatou-se que os líderes, na organização
pesquisada, atuam direcionando, facilitando e administrando o processo de aprendizagem,
também de forma circular. Depreendeu-se que a cultura organizacional é nutridora de fatores
facilitadores à atuação do líder no processo de aprendizagem, aonde o clima organizacional
aliado ao conjunto de crenças e valores têm papel destacado. O modelo circular de atuação do
líder no processo de aprendizagem apresentou similaridades com os modelos de Garvin
(2002) e Senge (2002). Para esses autores cabe ao líder criar oportunidades de aprendizagem,
estabelecer clima e tom adequados à aprendizagem, liderar as discussões, atuar nos papéis de
projetista, professor e servidor (steward).
A Figura 19 representa o modelo de aprendizagem organizacional emergido dos
dados, que pouca similaridade se observou na literatura pesquisada, no que tange à atuação do
188
líder no processo de aprendizagem. Convém ressaltar a evolução ocorrida no modelo
“quadrado”, com forte visão de processos, com foco interno e elaborado com base em
modelos teóricos, proposto no referencial teórico (Figura 10, p. 74). Já o modelo concebido,
por meio de pesquisa, mostrou ser mais aberto, considerando variáveis do ambiente externo,
aspectos da cultura de trabalho, níveis de cultura organizacional, barreiras e fatores
facilitadores da aprendizagem e, principalmente, um modelo que foi sendo construído a partir
das constatações nas entrevistas, na observação não participante e na análise dos documentos.
189
Figura 19 Representação esquemática da atuação do líder no processo de aprendizagem em
equipes de desenvolvimento de novos produtos
Fonte: Elaborado pelo Autor
Em suma, este trabalho apontou que o processo de aprendizagem organizacional
composto pelas atividades de adquirir, compartilhar e reter o conhecimento pode ser
considerado como standard e a diferença ficou evidenciada na atuação e nas ações do líder
nesses processos e na criação de um clima propício à aprendizagem. Poder-se-ia afirmar que
os esforços no processo de aprendizagem devem ser feitos, entretanto, deve-se focar na
atuação do líder. Cabe ao líder produzir a diferença na busca incessante das organizações em
alcançarem índices de competitividade comparáveis aos benchmarks mundiais. Para De Geus
(1997), a capacidade dos líderes em promover a aprendizagem e incentivar suas equipes a
aplicar mais rápido que os concorrentes é talvez a única vantagem competitiva das
organizações inseridas em uma economia globalizada. As conclusões apontadas neste trabalho
podem ser usadas, com a devida crítica e adaptação necessária, por organizações que
necessitem desenvolver novos produtos, em uma velocidade e quantidade acima da média da
indústria, por meio de equipes de projeto, em especial naquelas que estão experimentando o
Variáveisdo ambiente
externo
Cultura organizacional
Culturade
trabalho
Adquirir Reter
Compartilhar
Barreiras:
rapidez, tempo,
flexibilidade
Fatores facilitadores:
clima, crenças,valores
Direcionar Facilitar
Administrar
Processo deaprendizagem
Atuação dolíder
190
processo acelerado de inserção em uma economia globalizada, como é o caso da organização
objeto de pesquisa neste trabalho.
191
LIMITAÇÕES DO ESTUDO
Este estudo foi desenvolvido tendo como base quatro líderes e oito liderados, em
equipes de projetos de desenvolvimento de novos produtos, de uma empresa nacional de
grande porte que atua na indústria cosmética. Convém ressaltar que a empresa pesquisada tem
um total de oito líderes de equipes de projetos, portanto, mesmo sendo uma pesquisa
exploratória, pode-se considerar que o número pesquisado de líderes foi representativo.
Portanto, o contexto e o ambiente desta pesquisa evidenciaram resultados específicos
para as equipes de projetos de desenvolvimento de novos produtos da empresa pesquisada.
Não se pode generalizar os resultados, quer seja para outras equipes da mesma organização,
ou mesmo de outras organizações.
192
RECOMENDAÇÕES
Em função das limitações deste estudo, outras pesquisas poderiam ser feitas visando
explorar e aumentar a variedade de interpretações sobre o tema, comprovar as premissas
apontadas e buscar respostas às indagações feitas durante a etapa de análise:
Verificar se as conclusões deste trabalho podem ser validadas dentro da mesma
organização e em outras organizações na mesma indústria;
Verificar a atuação do líder de projetos no processo de aprendizagem em outros
tipos de indústria;
Analisar as vantagens e métodos para transformação de equipes de projetos em
comunidades de prática;
Aprofundar o estudo da aprendizagem organizacional considerando outras
variáveis além da atuação do líder;
Aprofundar os estudos sobre a influência da cultura de trabalho e cultura
organizacional na atuação de líderes de projeto no processo de aprendizagem
organizacional.
193
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Administração de Empresas, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo.
200
APÊNDICE A – Roteiro de entrevistas
Roteiro 1 Entrevista com líder de equipe de projetos
Idade: Tempo de empresa: Tempo como líder de projetos:
Função:
Formação:
1. De que maneira você diria que uma equipe apreende determinado conhecimento adquirido
no desenvolvimento de um projeto? E na sua opinião qual seria a influência do líder nesse
processo? Agora, pensando/lembrando o último projeto que você liderou, de um modo
geral, de que maneira sua equipe apreendeu determinados conhecimentos? E qual foi a sua
influência nisso? Cite pelo menos um exemplo.
2. Em sua opinião como seria o compartilhamento do conhecimento entre os membros de
uma equipe de projeto de desenvolvimento de novos produtos? E como seria a atuação do
líder? Agora, pensando/lembrando o último projeto que você liderou, como foi o
compartilhamento do conhecimento entre a equipe? E como foi a sua atuação nisso? Citar
exemplo.
3. Como um líder deveria proceder para reter os conhecimentos adquiridos pela equipe nesse
processo? Agora pensando em sua experiência, como você se preocupa em reter esse
conhecimento adquirido? Você poderia relatar uma experiência sua aonde houve a
retenção de conhecimento? Porque você considera que isso ocorreu? Agora você poderia
contar uma experiência em que não houve a retenção de conhecimento? Na sua opinião
201
como e porque nesse caso não houve a retenção de conhecimento? Agora pensando nessas
duas situações o que você pode aprender?
4. Que ações você usa para criar um clima que promova a aprendizagem? Quão perto ou
longe estas ações estão do “clima desejado/esperado” que você considera importante para
a criação de um clima promotor da aprendizagem?
5. Conte como ocorria a aprendizagem antes da existência do Funil de Inovação. O que
mudou com a introdução do Funil de Inovação?
6. Tem mais alguma coisa sobre os temas aprendizagem e liderança que você gostaria de
acrescentar?
Roteiro 2 Entrevista com membro de equipe de projeto
Idade: Tempo de empresa: Tempo como membro de equipe de projetos:
Função:
Formação:
1. De que maneira você diria que uma equipe apreende determinado conhecimento adquirido
no desenvolvimento de um projeto? E na sua opinião qual seria a influência do líder nesse
processo? Agora, pensando/lembrando o último projeto que você participou, de um modo
geral, de que maneira você apreendeu determinados conhecimentos? E qual foi a
influência do líder de projeto nisto? Citar exemplo.
2. Em sua opinião como seria o compartilhamento do conhecimento entre os membros de
uma equipe de projeto de desenvolvimento de novos produtos? E como seria a atuação do
202
líder? Agora, pensando/lembrando o último projeto que você participou, como foi o
compartilhamento do conhecimento entre a equipe? E como foi a atuação do seu líder de
projeto nisso? Citar exemplo.
3. Como um líder deveria proceder para reter os conhecimentos adquiridos pela equipe nesse
processo? Agora pensando em sua experiência, como você se preocupa em reter esse
conhecimento adquirido? Você poderia relatar uma experiência sua aonde houve a
retenção de conhecimento? Porque você considera que isso ocorreu? Agora você poderia
contar uma experiência que não houve a retenção de conhecimento? Na sua opinião como
e porque nesse caso não houve a retenção de conhecimento? Agora pensando nessas duas
situações o que você pode aprender?
4. Que ações seu líder de projeto usa para criar um clima que promova a aprendizagem?
Quão perto ou longe estas ações estão do “clima desejado/esperado” que você considera
importante para a criação de um clima promotor da aprendizagem?
5. Conte como ocorria a aprendizagem antes da existência do Funil de Inovação. O que
mudou com a introdução do Funil de Inovação?
6. Tem mais alguma coisa sobre os temas aprendizagem e liderança que você gostaria de
acrescentar?
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