Escala de Treino

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“A ESCALA DE TREINO” sua influência na Biomecânica do Cavalo de Desporto CURSO DE MESTRE DE EQUITAÇÃO =TESE = Março/Outubro 2007 CMEFD - Mafra Luís Lupi

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“A ESCALA DE TREINO”

sua influência na

Biomecânica do Cavalo de Desporto

CURSO DE MESTRE DE EQUITAÇÃO

=TESE=

Março/Outubro 2007 CMEFD - Mafra

Luís Lupi

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“A ESCALA DE TREINO”

sua influência na

Biomecânica do Cavalo de Desporto

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DEDICATÓRIA

Ao meu padrinho Titó (António de Freitas Pereira)

Ao meu tio Joaquim Miguel (General Duarte Silva)

Só não tem sido mais difícil viver sem eles porque afinal estão sempre presentes em

cada passo desta minha caminhada. AGRADECIMENTOS

À ENE na pessoa do Sr. Coronel João Sequeira – ‘o Infatigável’

Aos Mestres e aos Colegas do Curso – com quem aprendi a ensinar melhor

Aos meus cavalos – com quem aprendi a aprender melhor

À minha mãe – por tudo!!

Ao Dr. Costa Ferreira – o meu director que me apoiou desde o princípio

À Professora Doutora Sophie Biau – grande cientista de espírito aberto

À dupla Thierry Touzaint / JeanPierre Blanco – pelo estágio em Saumur

Às anónimas e aos anónimos – que, por amizade e até mesmo sem saberem, terão contribuído para este trabalho.

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ÍNDICE

Introdução ........................................................................................................................... 4

I Parte – A Escala de Treino................................................................................................. 6

1.- A Escala de Treino do Cavaleiro.......................................................................... 6

2.- A Escala de Treino do Cavalo ............................................................................. 7

- Origem ....................................................................................................... 7

- A Escala Propriamente Dita ....................................................................... 8

� I.- Ritmo ........................................................................................... 9 � II.- Souplesse .................................................................................... 11 � III.- Contacto .................................................................................... 13 � - (Contraponto) ................................................................................. 15 � IV.- Impulsão .................................................................................... 16 � V.- Rectitude ..................................................................................... 18 � VI.- Concentração ............................................................................. 19 � - Capacidade de Resposta às Ajudas .................................................. 20 � - (Contraponto) ................................................................................. 21 � - Novas Propostas I e II ..................................................................... 22

II Parte – Biomecânica do Cavalo de Desporto .................................................................... 24

- Considerações Gerais ............................................................................................ 24 - Escala de Treino, Biomecânica e Ginástica ............................................................ 27 - Biomecânica e Rédeas Auxiliares .......................................................................... 29 - A Escala de Treino e as Características do Trote .................................................... 30 - A Escala de Treino e as Transições ........................................................................ 31 - Biomecânica e Diagnóstico Precoce do Potencial dos Cavalos ............................... 32 - A Escala de Treino e a Locomoção ........................................................................ 33

- Características dos Andamentos de Cavalos de Nível Avançado ................ 34

III Parte – Conclusões ......................................................................................................... 36

- Higiene e Maneio .................................................................................................. 36 - O Panorama Nacional ............................................................................................ 37 - Ética ...................................................................................................................... 38

Bibliografia ......................................................................................................................... 39

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INTRODUÇÃO Tendo nascido numa época, numa família e num ambiente em que o cavalo fazia parte do quotidiano, o ‘montar a cavalo’ surgiu na minha vida como o andar a pé, como o falar, como o sorrir, … naturalmente!

Esta relação natural e empírica, com o que vim mais tarde a saber chamar-se ‘Equitação’, evoluiu na minha vida em várias vertentes, desde a Tauromaquia, os Raids, as Corridas de Galope, a Equitação de Trabalho e de Picadeiro, a Atrelagem, a Criação, a Caça e o Lazer, até às três Disciplinas Olímpicas. E como praticante, treinador e seleccionador, juiz, etc. E por esta ordem ou por outra ordem qualquer.

Este contacto alargado, baralhado e algo desordenado com o mundo equestre deu-me a conhecer, por um lado, um vasto leque de utilizações do cavalo, dos seus utilizadores e dos seus ambientes, enfim, da ‘fileira’ do cavalo. No entanto e por outro lado, retardou em mim a procura de um conhecimento organizado e mais científico e tecnicista da Equitação.

Retardou mas não anulou. Com o passar do tempo e com o esbranquiçar do já pouco cabelo, tenho-me aproximado de um patamar mais elevado da Equitação em que comecei a juntar as peças que usei de uma maneira dispersa e desordenada durante a minha vida à volta dos cavalos. As coisas complicadas foram perdendo razão de ser e os métodos simples vão revelando toda a sua importância e dimensão.

Mas foi a criação da actual Escola Nacional de Equitação (ENE) e o meu envolvimento com ela na carreira de Formador, que me ‘obrigaram’ definitivamente a tentar clarificar algumas questões. Questões simples! Como, por exemplo, um conceito para ‘Equitação’; ou o inesgotável ‘Calmo, P’ra Diante e Direito’; ou os actuais princípios da ‘Colocação em Sela’; ou as ‘Características do Cavalo Bem Trabalhado’; ou a ‘Ligeireza’, o ‘Equilíbrio’, etc., etc.

De repente recebo um convite para frequentar um estágio para Mestre de Equitação. O Máximo! O chegar ao topo! A oportunidade para a realização de um sonho! E como o Programa Oficial de Formação de Formadores de Equitação (POFFE) preconiza a elaboração da uma Tese, sobre um tema que tem que ser proposto e aceite, cá estamos nós! Com um tema simples! Foi proposto… e foi aceite!

A ‘ESCALA DE TREINO’!! Porquê? Porque ela me tem dado, e cada vez mais, os caminhos para o trabalho dos meus cavalos e para a orientação dos meus alunos. Porque só seguindo-a criteriosamente e interiorizando a sua filosofia é que um cavaleiro (com uma correcta colocação em sela e com a sua própria ‘escala de treino’ bem consolidada) pode chegar a ter um cavalo ‘Calmo, p’ra Diante e Direito’.

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Assim, proponho o seguinte esquema para marcar os princípios e as incontornáveis fases evolutivas da Equitação em geral numa perspectiva actual:

Não quero ainda entrar realmente no nosso tema sem antes fazer alguns reparos ao que é fundamental. A pedra de toque: a COLOCAÇÃO EM SELA. Porque é daí que tudo sai.

Sem querer repetir o que se repete todos os dias, o que se lê em cada livro, o que já devia estar esgotado mas que tem que continuar a repetir-se até à exaustão, no volteio com ou sem sela, na posição clássica ou de estribos curtos, na posição em suspensão ou sentado, etc., faço questão de realçar três aspectos que algumas vezes são esquecidos mas que são fundamentais para a desejada ‘quietude’ do cavaleiro:

• Os ‘cotovelos’ juntos às costelas a permitirem que …

• … A ‘linha das rédeas’ comece nos cotovelos e vá a direito até à embocadura e

• A ‘posição e a atitude das mãos’ à frente e uma de cada lado do garrote, firmes e resistentes às resistências e suaves e ligeiras à cedência.

A ideia sempre presente da ‘ligação ao movimento’ como característica e consequência de uma boa ‘colocação em sela’ deve estar ligada à ideia de ‘quietude’. A ligação destas ideias deve ter uma forma consistente nas directrizes dos professores e na mente dos praticantes.

Na realidade, se a flexibilidade, o equilíbrio, a solidez e o à vontade do cavaleiro não forem ligados a uma ideia de ‘quietude’ (‘still ’), pode haver uma grande eficácia técnica mas fica a faltar a estética, a beleza, a arte. E, sem estas, a Equitação fica incompleta porque é disso que se trata: Técnica e Arte.

Cavaleiro

“ Influente”

ESCALA DE TREINO

Ritmo Souplesse Contacto

Impulsão Rectitude

Concentração

Cavalo: Calmo

P’ra Diante Direito

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I Parte – A Escala de Treino 1.- A Escala de Treino do Cavaleiro Na verdade não nos parece que faça qualquer sentido abordar um método de treino para um cavalo, sem estabelecer algumas regras para quem o vai desenvolver. O cumprimento dessas regras por parte do cavaleiro é determinante para o sucesso do treino do cavalo. Essas regras são aquilo a que vamos chamar de ‘Escala de Treino do Cavaleiro’ e que podem ser apresentadas esquematicamente da seguinte maneira:

Colocação em Sela -» Ajudas -» Sentimento -» Influência Esta ‘Escala’ deve desenvolver-se no cavaleiro principiante, primeiro sobre um cavalo já bem

trabalhado (‘Cavaleiro novo – cavalo experiente…) em que, através de uma boa ‘colocação em sela’, o cavaleiro desenvolve: • o ‘Conhecimento’ da ligação ao movimento e • o ‘Sentimento’ da ligação ao movimento.

Seguidamente deve adquirir: • o ‘Conhecimento das Ajudas e da Técnica’ e • o ‘Sentimento para o uso das Ajudas e da Técnica’.

Sem ‘colocação em sela’ não há ‘influência’ Como resultado disto o cavaleiro desenvolve uma ‘Influência’ sobre o cavalo. Mais tarde e já ‘influente’, sobre um cavalo novo, deve o cavaleiro adquirir o conhecimento da fisiologia e da psicologia do cavalo e desenvolver o sentimento da sua condição física e potência (…cavalo novo – cavaleiro experiente’).

Com a boa relação cavaleiro/cavalo (empatia) que se criou, com talento e determinação (‘inspiração e transpiração’) e com um bom treinador, estão reunidas as condições para o sucesso.

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2.- A Escala de Treino do Cavalo Origem A revolução equestre do século XX, com a generalização das competições de Dressage na Europa, com a FEI a regulamentar, a tutelar e a formar juízes, com os programas de fomento da criação cavalar e de melhoramento das Raças e com as crescentes exigências nas performances do desporto equestre, levou naturalmente à definição de um método de treino que servisse a treinadores, cavaleiros e juízes.

É claro que esse método não é inventado de um dia para o outro. Muito pelo contrário, ele vem aglutinar as tendências e as várias ideias que se foram desenvolvendo aqui e ali.

Em jeito de exemplo não resisto a lembrar o ‘método’ progressivo que um tal senhor Coronel Cardo terá transmitido a um Mestre amigo, por volta dos anos 60:

• 1º- P’ra diante e estendido • 2º- P’ra diante, estendido e em equilíbrio • 3º- P’ra diante, em equilíbrio e em Ramener • 4º- P’ra diante, em equilíbrio, em Ramener e com avanço dos posteriores • 5º- Introdução ao Rassembler • 6º- Rassembler

O predomínio germânico a todos os níveis, sobretudo na disciplina de Dressage, com o seu conhecido e carismático rigor, levou então à definição de um método de treino. Um artigo assinado pelo Juiz Olímpico Nick Williams na revista ‘British Dressage’ de Out/Nov de 2006, deixa no ar alguma nebulosidade quanto a este assunto, mas acaba por deixar uma clara referência à origem Alemã da ‘Escala’ e a data sugerida é a de 1912 em que, numa revisão do Manual de Cavalaria Alemão de 1882, no Capítulo 25 da Parte III, “tudo é revelado”.

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A Escala propriamente dita A Escala que se apresenta traduz assim o método de treino para cavalos de Dressage desenvolvido na Alemanha e cada vez mais aceite e defendido pela FEI como ‘o guia’ para treinadores, cavaleiros e juízes tanto dos cavalos novos como dos mais avançados. É geralmente apresentada em esquema da seguinte forma:

A descrição dos conceitos de cada uma das fases e o seu encadeamento na Escala serão eventual e oportunamente contraditadas neste trabalho.

A ideia não é, logicamente, contestar o método inteligente e aturadamente desenvolvido, criteriosamente testado, profundamente discutido e consistentemente aceite. No entanto, porque se trata de um trabalho que pretende chegar também a outras modalidades equestres e a outras Raças de cavalos, para além das centro-europeias, nomeadamente as Barrocas, pontualmente ousaremos sugerir algumas alternativas.

Sendo aceite como indiscutível que ‘a Dressage é a base de toda a Equitação’, há, no entanto, conceitos que são mais importantes numas disciplinas do que noutras.

Mas analisemos, ponto por ponto, conceito por conceito, cada uma das fases da Escala aqui apresentada.

Ritmo

Souplesse

Contacto

Impulsão

Rectitude

Concentração

Capacidade de respostas às ajudas

Fase de Compreensão e Confiança

Desenvolvimento da Força Propulsora

Desenvolvimento da Força de Sustentação

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I.- RITMO (Regularidade, Actividade) É a 1ª característica a procurar e a desenvolver. É a batida regular (como a dum relógio) em cada um dos andamentos, movimentos, exercícios ou ‘ares’.

É nesta primeira fase que se aperfeiçoam os andamentos, estimulando o movimento para diante normalmente sobre círculos bem amplos ou em linhas direitas, em que o ‘Tempo’ e o tamanho de cada passada se devem repetir nas seguintes, tanto no Passo como no Trote como no Galope e nas Transições. É a altura de começar a pôr o cavalo atento e à frente das ajudas do cavaleiro.

As ajudas das pernas e do assento do cavaleiro são as preponderantes, solicitando o movimento para diante e activo, as acções das mãos estando reduzidas ao mínimo indispensável para manter o cavalo em ordem, numa atitude baixa e estendida. A posição do cavaleiro ligeiramente para a frente e o trote levantado sobre a diagonal de fora são ajudas suplementares que favorecem o cavalo.

A palavra ‘Ritmo’ vem do grego ‘rhein’ que quer dizer ‘deixar passar’ (to flow).

O termo alemão ‘Takt’ vem do latim ‘tactus’ e quer dizer ‘batida’.

Os defeitos ou alterações no Ritmo são:

• Falta de actividade • Apressado • Irregular • Marchado (no trote)

O Passo é um andamento difícil de melhorar mas fácil de estragar. Deve haver especial atenção à tendência eventual para a lateralização. Características como a Actividade dos posteriores, a ‘Souplesse’ e a facilidade para a Concentração, podem ser adivinhadas neste andamento.

Tic, Tac, Tic, Tac...

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O Trote, sendo o andamento de eleição para trabalhar e fazer evoluir os cavalos no plano, sobretudo nesta fase, pode revelar alterações de ritmo e de equilíbrio por deficiências de treino. É a altura de os tentar corrigir.

O Galope não deve decompor o segundo tempo em condições normais. Esta ocorrência deve-se a falhas de treino por falta de atenção à actividade dos posteriores.

A exigência no doseamento do ritmo exigido aos cavalos deve ter em atenção o tipo de cavalo de que se trata: cavalos ardentes não precisam da mesma exigência de actividade que os mais fleumáticos. O controlo dos andamentos torna-se, no entanto, absolutamente necessário.

A consolidação de um Ritmo consistente pode ser rápida nos cavalos mais adiantados, realizando-se durante o aquecimento. Nos cavalos novos, no entanto, pode e deve demorar o tempo que for necessário e ocupará certamente e em exclusivo as primeiras meias dúzias de sessões montadas.

Tic, Tac, Tic, Tac, Tic, Tac...

Em Dressage pura o treino do cavalo procura desenvolver um Ritmo constante que se vai tornando mais lento e com os movimentos mais elevados e brilhantes, o que constituirá o conceito de ‘Cadência’.

Em Equitação de Obstáculos, no entanto, o trabalho no plano, depois de ter o Ritmo controlado e confirmado, deve preparar o cavalo para as suas variações (do Ritmo) que os percursos possam impor, abstraindo daquele conceito de Cadência.

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II.- SOUPLESSE (Flexibilidade)

“ Com um cavalo descontraído é mais fácil usar economicamente a sua força.” Elmar Pollmann-Schweckhorst

Esta fase engloba vários conceitos: ‘Flexibilidade’, ‘Souplesse’, ‘Relax’, ‘Descontracção’. Opta-se, neste trabalho, pela designação estrangeirada de ‘Souplesse’ em vez de ‘Flexibilidade’. Efectivamente, parece-nos que o termo português não tem a projecção - a força no rigor - do termo que preferimos. A ‘Souplesse’ que se procura desenvolver nesta fase, deve ser mais do que a flexibilidade lateral e longitudinal encontrada na adaptação ao desenho das figuras de picadeiro num cavalo que avança sobre elas em bom ‘Ritmo’. Deve ser, também e ainda, a qualidade de um andamento marchado ou saltado, activo mas sem tensões, suave e com um bom balanço (swing) do dorso. A ausência de tensões não se refere só ao corpo (Descontracção física) mas também à mente (Descontracção mental) do cavalo. Mas, atenção: essa ‘ausência de tensões’ não quer dizer ‘total relaxamento’.

Só com esta qualidade bem desenvolvida é que a energia dos posteriores pode chegar à mão do cavaleiro através do corpo do cavalo e, vice-versa, as acções da mão do cavaleiro podem chegar aos posteriores através da boca, nuca, pescoço e dorso. A Souplesse é o resultado da invisível comunicação (empatia) entre o cavaleiro e o seu cavalo. O cavalo começa a chegar ao contacto com a rédea de fora e o cavaleiro começa a sentir a necessidade de controlar as espáduas e a encurvação. A ‘assiette’ do cavaleiro fica mais próxima do arreio e as transições do trote levantado ao sentado tornam-se oportunas. A atitude mantém-se estendida e baixa. Começa, no entanto, a desenvolver-se a atitude que caracteriza o desejado estado de espírito que define o ‘happy athlete’. Defeitos ou alterações na Souplesse:

• Tensão do dorso • Alterações de Ritmo • Falta de actividade dos posteriores • Falta de rectitude • Contacto tenso • Boca seca (cavalo mudo) ou ‘ranger de dentes’ • Orelhas para trás • Trajectórias exageradas no salto

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Sinais de Souplesse:

• Ausência dos defeitos indicados • Atitude alegre e descontraída • Respiração suave e ritmada • Cauda descontraída com movimentos balançados • Baixada de pescoço sem alterações do Contacto, do Ritmo e do Equilíbrio.

Para desenvolver a Descontracção Mental – indispensável á Descontracção Física – devemos ter em mente que estamos a lidar com um ‘animal’ que precisa de:

• Sentir companhia • Exercício em liberdade (Padock) • Trabalho variado (Passeios) • Maneio sem stress (Tratador)

A ‘descontracção mental do cavalo’ começa com a ‘descontracção mental do cavaleiro’.

Para a Descontracção Física, uma vez garantida a Descontracção Mental, deve ter-se atenção algumas pequenas coisas, como:

• Na box, pôr a comida no chão (natural extensão da linha de cima) • Fazer um aquecimento apropriado e progressivo • Ter o cavalo bem à frente das pernas do cavaleiro • Um correcto trabalho no círculo com o cavalo entre a perna de dentro e a rédea de

fora (depois de a rédea de dentro ter solicitado a encurvação). • Solicitar frequentemente a baixada de pescoço (com atenção à actividade dos

posteriores). • A respiração do cavaleiro deve ser síncrona com os movimentos do cavalo.

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III.- CONTACTO (Conexão, Ligação, Aceitação da Embocadura)

“Leveza num cavalo é sempre resultado de um contacto leve” Salomon de la Broue (1530-1620)

Um cavalo em bom ‘Ritmo’, quando chega a estar bem ‘Souple’, acaba por procurar e aceitar naturalmente o ‘Contacto’ com a embocadura e com a mão do cavaleiro, ao princípio numa atitude estendida e baixa, que se irá recolhendo e erguendo com a evolução do trabalho.

O Contacto entre a boca do cavalo e a mão do cavaleiro deve ser estável, leve, elástico e igual nas duas barras. Nesta fase começa a poder iniciar-se o trabalho de mobilização da garupa por acção da perna isolada em que o cavalo começa a obedecer à perna de posição.

É num Contacto correcto que o cavalo desenvolve um bom Equilíbrio montado e um bom Ritmo em todos os andamentos.

Em Dressage pura a nuca deve ser sempre o ponto mais alto excepto nas descidas de pescoço.

Na Equitação de Obstáculos, porém, uma atitude mais elevada deve ser aceite e até estimulada, se for essa a melhor para o Equilíbrio do cavalo, desde que se mantenham as outras características de um bom Contacto.

É muito importante que o cavaleiro interiorize que o cavalo chega ao Contacto em consequência da energia da actividade dos posteriores que chega à mão através de um dorso ‘Souple’. Puxar as rédeas para trás à procura daquele Contacto nada tem a ver com Equitação.

A solicitação da contraencurvação e de correctas transições descendentes desenvolvem as qualidades do trabalho feito nas fases anteriores da Escala.

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Sinais de um ‘bom’ Contacto:

• Leve ‘mascar’ da embocadura • A nuca é o ponto mãos alto (em Dressage pura) • Chanfro à frente da vertical, ou na vertical em exercícios mais concentrados • O perfil do cavalo encurta-se ligeiramente, alongando-se nos andamentos médios e

largos • O cavalo está ‘na mão’, com boa Atitude, bom Equilíbrio e bons Andamentos.

Sinais de ‘mau’ Contacto:

• Chanfro atrás da vertical (deficiências de treino) • ‘Atrás da mão’ (foge ao contacto) • ‘Pescoço partido’ (deficiências de treino) • Peso na mão (deficiências de Equilíbrio) • Por cima da mão (toda a linha de cima ao contrário) • Língua de fora ou boca aberta • Instabilidade da atitude • Flexão unilateral (entesourado)

Com a evolução do treino, o Contacto vai-se tornando cada vez mais leve e ligeiro e a ‘Ligeireza’ aparece naturalmente nos exercícios de maior concentração.

Mão a mais Pernas a mais

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Estas 3 primeiras etapas da nossa ‘Escala’ desenvolvem a compreensão e a confiança do cavalo. Se se tratar de um cavalo adulto, bem trabalhado, pode passar-se a um trabalho mais avançado sobre as fases seguintes, passados alguns minutos, garantindo um aquecimento adequado e progressivo. Se, pelo contrário, se tratar de um cavalo novo, é nestes 3 primeiros níveis que devemos passar mais algum tempo (os meses que forem necessários) para dar tempo ao amadurecimento físico e mental do nosso grande, mas jovem e frágil, futuro atleta. Antes de continuarmos, no entanto, gostaria de contrapor algumas ideias: Se pensarmos bem, será que é razoável – ou possível, em certos casos – desenvolver um ‘Ritmo’ capaz, sem ter em conta o desenvolvimento da ‘Souplesse’ e/ou abstraindo de qualquer tipo de ‘Contacto’? Na realidade há quem defenda consistentemente que “uma batida regular só pode ser esperada depois de conseguidos a Souplesse e o Relaxamento Mental”. O próprio dr. Kees Vellenga – Juiz Internacional de CCE – sugere ‘relaxation and confidence’ antes de ‘regularity’ . E insiste em que ‘quando a próxima fase é abordada, as anteriores devem ser mantidas’. Estas opiniões, que nos parecem fazer sentido, levariam à alteração da ordem dos conceitos na Escala. Questões como estas levam-nos a ter que justificar com clareza o ‘porquê’ da sucessão das fases da ‘Escala’, o que nem sempre é fácil. Porém, sendo aceite que:

• As fases estão todas interligadas, não se conseguindo desenvolver qualquer uma

delas abstraindo de outras; • Os cavalos são todos diferentes, cabendo à decisão do cavaleiro experiente, adaptar

a sucessão das fases para chegar aos objectivos; • Na prática, os elementos da ‘Escala’ correspondem aos pilares básicos do treino para

chegar a um cavalo ‘Calmo, p’ra Diante e Direito’; Sendo isto aceite, dizíamos, tampouco há razão para se alterar a ordem da ‘Escala’, mantendo-se assim, como o ‘Guia Oficial’ válido na actualidade.

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IV.- IMPULSÃO “…a vontade de avançar é o coração e a alma da equitação e começa na actividade dos posteriores do cavalo.”

Ludwig Seeger (1794-1865) É a predisposição constante para avançar, calma e generosamente, com passadas elásticas e entrada dos posteriores, à menor ‘solicitação’ ou, ainda melhor, à primeira ‘permissão’ do cavaleiro.

…Á ‘permissão’ do cavaleiro: Sublime! …À ‘solicitação’ do cavaleiro: Bom! Logo que o cavalo está descontraído e confiante e se mantém estável na mão, pode solicitar-se mais actividade nas passadas. Os membros anteriores e posteriores devem flectir-se mais, o corpo do cavalo deve balançar (swing) com elasticidade. O cavalo deve mostrar vontade de avançar sem tensão e sem esforço por parte do cavaleiro.

A Impulsão revela-se quando se deixa passar a energia acumulada. Quanto maior for a energia acumulada, maior será o desejo de avançar. (Tal como o regador, quanto mais água tiver, maior será a força e a quantidade do jorro que produz.)

Nada mais triste que um cavalo que, pura e simplesmente, não avança. Só o chicote do ajudante pode ajudar a resolver momentaneamente a situação, que se repetirá na primeira ocasião. O cavalo não está à frente das pernas.

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Com Impulsão a ‘Flexibilidade’ evolui no sentido da ‘Elasticidade’ desenvolvendo-se um estado de ‘tensão’ favorável aos conceitos da Escale de Treino. Essa ‘tensão’ será física ou mecânica (Positive Body Tension) e também, e não menos importante, ‘anímica’. A máxima expressão da Impulsão é o suave balançar do dorso sustentado por um também suave Contacto com a mão do cavaleiro, no Trote e no Galope.

O aumento de amplitude dorso-ventral dos movimentos é amortecido pelos músculos do dorso do cavalo e o cavaleiro não tem dificuldade em os acompanhar comodamente com uma boa colocação na sela. O correcto desenvolvimento da natural Impulsão é de fundamental importância para a preparação da Concentração. É com esta fase que começa o desenvolvimento do ‘Poder de Sustentação’. Manifestando-se com mais ou menos expressão conforme a energia armazenada na aproximação ao salto, constitui um dos ‘Factores de Decisão’, juntamente com a Velocidade (ou Ritmo) e o Equilíbrio, em Equitação de Obstáculos. Na prática a Impulsão desenvolve-se principalmente com:

• a conquista da vontade do cavalo • domínio das espáduas e das ancas • variações de andamentos, transições e meias paragens • a mão, que regula e dirige a força e o movimento • as pernas, que actuam repetidamente

Impulsão Natural Ao contrário do que pode parecer, os cavalos com uma Impulsão Natural muito desenvolvida podem tornar-se difíceis de treinar quando se avança na Escala de Treino. Não são capazes de variar o comprimento das passadas e manter o Ritmo, a Souplesse e a Impulsão. Assim, a Impulsão desejada para o desenvolvimento da ‘capacidade de resposta às ajudas’ é a adquirida pelo treino e não a congénita.

Segundo as mais recentes directivas da FEI ‘não pode haver Impulsão no Passo porque não há momento de suspensão’. Esta ideia não deixa de ser, no entanto, algo polémica. Podemos aceitar que a palavra ‘actividade’ no passo pode substituir a ideia de ‘impulsão’ neste andamento. Então e no Piafer, em que também não existe tempo de suspensão mas em que o conceito de ‘impulsão’ é levado ao extremo, que termo devemos usar?

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V.- RECTITUDE

“Só um cavalo Direito pode desenvolver todo o seu potencial” Elmar Pollmann-Schweckhorst

Os cavalos, como os humanos, têm um lado melhor que o outro, mais forte e mais capaz. E usam-no tanto mais, quanto mais difícil for o exercício que lhes pedimos. Nós queremos o cavalo direito, desenvolvendo o seu corpo simetricamente, para evitar defeitos físicos

provocados pelo excesso de trabalho do lado mais forte.

A Rectitude verifica-se nas linhas direitas e na simetria das encurvações nos cantos, nos círculos e nos trabalhos laterais. O cavalo é igual para os dois lados na ‘Souplesse’ e no ‘Contacto’.

Nos movimentos em uma pista os posteriores empurram na direcção do centro de gravidade e seguem a pista dos anteriores (tal como as carruagens de um comboio seguem a linha umas das outras).

Os defeitos de Rectitude corrigem-se com os exercícios laterais. Cedência à perna, Ladear, Travers e Renvers, Rotações directas e inversas e principalmente a Espádua a Dentro, com todas as suas vantagens ginásticas próprias. Também o Galope ao Revés pode prestar um grande serviço para o efeito.

O desenvolvimento da Rectitude num cavalo Impulsionado é essencial para a preparação da Concentração.

Deficiências de Rectitude na equitação de obstáculos levam a abordagens e a trajectórias defeituosas, recusas, enfim, a desempenhos sofríveis.

• Na Equitação de Obstáculos a Rectitude é um meio para atingir os objectivos;

• Na Dressage pura é um meio e um objectivo a atingir.

Mal : deitado sobre a volta Bem: equilibrado na volta

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VI.- CONCENTRAÇÃO (Reunião) Há um encurtamento da base de sustentação por avanço dos posteriores. O peso desloca-se para o postmão permitindo mais liberdade do antemão.

O grau de Concentração depende da dificuldade do movimento. O Contacto continua ligeiro. Os efeitos das ajudas do cavaleiro percorrem o corpo do cavalo desde a boca até às pernas e vice-versa.

A Concentração tem vários graus: o mais elevado é atingido nos ares de alta escola como passage, piafer, piruetas e levada. Aqui a entrada dos posteriores e o abaixamento das ancas é evidente, ligado a uma grande ligeireza e mobilidade do antemão no cavalo que assume uma atitude particularmente erguida e fixa.

Mas mesmo nas reprises de CCE, algum nível de Concentração é pedido nos exercícios de espáduas a dentro e ladeares, nas transições e no galope.

Para o cavalo saltador a facilidade em se Reunir ajuda muito ao controlo nas interdependências. Se o Ritmo é o mais importante nos cavalos novos, a facilidade em se deixar Reunir é importante para regular a passada e acertar o ponto ideal da batida para ‘limpar’ um salto de grandes dimensões.

Transições trote-galope-trote, meias paragens, paragens, recuar, meias piruetas, rotações directas, exercícios laterais, são trabalhos de eleição para desenvolver a Concentraçtação no plano, tanto na Dressage pura como na Equitação de Obstáculos. Os saltos na volta completam a ginástica dirigida neste sentido.

No Galope, as ajudas para a Reunião devem ser dadas no 3º tempo.

É o último grau da Escala de Treino cujo desenvolvimento serve, no entanto, para melhorar o brilhantismo de todo o resto do trabalho do cavalo.

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Seja qual for o grau de Concentração exigido, a maior flexão dos posteriores provocada pelo seu avanço e pelo abaixamento das ancas, desenvolve as suas Forças de Propulsão e de Sustentação dando maior elevação e projecção aos movimentos.

CAPACIDADE DE RESPOSTA ÀS AJUDAS

“ Os exercícios ginásticos para a Souplesse, Equilíbrio, Obediência e Concentração não devem ser poupados. Sem estes exercícios, nenhum cavalo terá movimentos livres e fáceis.”

La Guérinière (1688 – 1751) Com a aplicação deste método de trabalho faseado desenvolvem-se os seis conceitos que são as ‘características do cavalo bem trabalhado’. O cavalo fica, todo ele - a sua anatomia, esqueleto, músculos, articulações e espírito – mais disponível e predisposto para responder positiva e prontamente às Ajudas do seu cavaleiro. A harmonia do conjunto cavalo/cavaleiro torna-se completa revelando uma total ‘cumplicidade’ entre um e outro.

A posição hierárquica do cavaleiro deve ser aceite naturalmente pelo cavalo, sendo aquele capaz de lhe transmitir «liberdade através de submissão e movimento para diante através da capacidade de resposta às ajudas».

Alongamentos e encurtamentos, paragens e meias paragens e recuar, são os exercícios de eleição, que também servem de teste, para o desenvolvimento desta Capacidade de Resposta às Ajudas e que valem para a Equitação de Obstáculos, para a Dressage pura ou para qualquer outra modalidade Equestre. Este é o objectivo geral da Escala de Treino.

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Terminada a análise dos conceitos da Escala de Treino, é oportuno, mais uma vez, fazer o ponto da situação em relação a alguns assuntos que nos parecem discutíveis.

• O ‘Ritmo’ não está considerado como um conceito envolvido na fase de ‘desenvolvimento da força propulsora’! Será que não é? Não é através do seu desenvolvimento que se estimula a actividade dos movimentos para diante?

• A ‘Impulsão’ antes da ‘Rectitude’! Se é verdade que não é possível desenvolver a ‘Rectitude’, nomeadamente por intermédio dos exercícios laterais, sem ter garantida uma boa ‘Impulsão’, não é menos verdade que, trabalhar a ‘Impulsão’ de um cavalo com faltas de ‘Rectitude’, é uma tarefa quase escusada.

Devemos ser sensatos ao aplicar ou exigir a sequência dos conceitos da Escala e aceitar que:

“Todas as fases e os conceitos da Escala de Treino estão interligados. De facto a Impulsão é baseada na Souplesse pelo ‘souple’ jogo dos músculos que se contraem e distendem alternadamente. A Souplesse é desenvolvida por um bom Ritmo dos movimentos. O Ritmo também indica se a Impulsão que estamos a produzir é a correcta. Impulsão com defeitos de Ritmo não pode ser Souple e não pode desenvolver a ‘capacidade de resposta às ajudas’. Souplesse, Ritmo e Impulsão só podem ser conseguidos se o Contacto for correcto e só um cavalo com uma boa Rectitude se movimenta com um bom Contacto para as duas mãos. Mudanças de velocidade são a medida de eleição para produzir Impulsão e isso requer facilidade de Concentração a qual é impossível num cavalo sem Rectitude.”

Elmar Pollmann-Schweckhorst

Na realidade, bem antes de se falar na ‘Escala de Treino’, já Antoine Pluvinel relacionava várias das suas fases ao escrever que:

“Os trabalhos de Concentração, executados correctamente, tornam o cavalo leve e elevado, colocam-no sobre os posteriores e obrigam-no a empurrar-se como um todo; isso fá-lo aceitar prontamente as ajudas de mãos e de pernas. Permitem-lhe executar melhor os exercícios que lhe sejam pedidos e tornam consideravelmente mais fácil o conjunto das situações.”

Antoine Pluvinel (1555-1620)

• O ‘Equilíbrio’ não é contemplado na Escala! No entanto, num estágio de CCE que fiz em Janeiro deste ano em Saumur, com os treinadores e o Director Técnico de CCE da FFE, a maior parte do trabalho foi no plano, claro, e a palavra de ordem do treinador Jean Pierre Blanco era ‘Équilibre!!!’ . E o que acontece é que, ao preocuparmo-nos principalmente com o ‘Equilíbrio’ dos nossos cavalos, as fases da Escala acabam por se impor naturalmente e à medida das particularidades de cada cavalo. Assim sendo, não devia este conceito aparecer na Escala? Parece-nos que sim e mais: por ser um conceito fundamental em todas as fases e em todas as modalidades, sendo na Equitação de Obstáculos um dos três Factores de Decisão na abordagem ao salto, devia ter o mesmo realce que, por exemplo, a ‘capacidade de resposta às ajudas’.

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Posto isto e porque creio que a Equitação Académica, os seus princípios e os seus conceitos são algo que vai continuar a evoluir, ou a transformar-se, ou a adaptar-se, ouso apresentar duas propostas alternativas ao esquema da ‘Escala’ que apresentámos atrás, como eventuais candidatas a serem a ‘ESCALA DE TREINO’ num futuro mais ou menos próximo ou longínquo: PROPOSTA I

Equilíbrio +

Capacidade de Resposta às Ajudas

Neste curioso diagrama proposto por Elmar Pollmann-Schweckhorst no seu interessante livro ‘Training the Modern Show Jumper’ pode imaginar-se uma

segunda dimensão: todos os seis conceitos da Escala interagem igualmente em vez da ordem hierárquica da apresentação clássica. Aqui a ordem dos conceitos é vista de baixo para cima, em sentido ascendente, sendo a ‘Souplesse’ o ponto de partida.

Tudo gira em torno do ‘Equilíbrio’ e da ‘Capacidade de Resposta às Ajudas’

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PROPOSTA II

Nesta segunda proposta, os três Princípios do Ensino de Base do cavalo evoluem para os três estados da Equitação Superior através do desenvolvimento da Confiança, da Compreensão da Força Propulsora e do Poder de Sustentação. As últimas fases da Escala, assentes no desenvolvimento do ‘Equilíbrio’ e da ‘Capacidade de Resposta às Ajudas’, avançam em sentido ascendente e são incontornáveis nesta evolução.

Não pretendendo ter esgotado este assunto, espero ter, no mínimo, levantado a ‘ponta do véu’ com uma interpretação própria da Escala de Treino que, sem fugir à sua filosofia geral, deixe no ar algumas questões que nos façam, mais reflectidamente, continuar a ensinar e a aprender sempre mais e melhor. Entremos de seguida na influência que estes conceitos podem ter na Biomecânica do cavalo de desporto.

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II Parte – Biomecânica do Cavalo de Desporto CONSIDERAÇÕES GERAIS O cavalo tem particularidades anatómicas, cuja análise exaustiva não cabe no teor deste trabalho. No entanto há duas destas particularidades que devemos lembrar e que estão na origem de todo este emaranhado de ideias, teorias, técnicas, pensamentos, tratados, etc., que constituem no seu todo o que é a Equitação:

• O facto de todo o seu enorme corpo se apoiar sobre as unhas (cascos) de apenas um dedo nas pontas de cada um dos seus quatro membros, obrigam aos maiores cuidados na sua criação e na progressão do seu treino. • A ausência das clavículas a unir os membros anteriores à coluna vertebral, que tem como consequência um desequilíbrio aquando da sobrecarga do antemão com o peso do cavaleiro.

Há que recuperar o Equilíbrio que o cavalo perdeu por acção do peso do cavaleiro

Assim temos que corrigir o Equilíbrio de maneira progressiva e lógica, compatível com a integridade física do nosso grande mas frágil atleta. Os músculos e as articulações mais móveis (dos membros) ou menos móveis (das vértebras) são as estruturas envolvidas na dinâmica dos vertebrados em geral. No caso do cavalo, é com base na Tensão da Coluna Vertebral que todo o mecanismo propulsor, constituído pelos movimentos de flexão, extensão, adução, abdução e rotação, desenvolve a sua actividade. E, duma maneira simplista, tudo se desenvolve em torno de quatro grandes articulações que são activadas por cinco grupos de músculos.

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São as ARTICULAÇÕES

da Maxila , da Nuca, do Garrote e das Ancas

e os GRUPOS MUSCULARES

Inversores do Pescoço Flexores do Pescoço

Elevadores da Base do Pescoço Extensores do Dorso e Rim

Flexores do Dorso e Rim.

Existem ainda dois Ligamentos – o Superior Comum e o Inferior – que dão apoio aos movimentos das vértebras.

Com respeito às quatro Articulações citadas, é sobre cada uma delas que o cavaleiro vai agir de forma a flexibilizá-las, ficando as articulações dos membros em segundo plano de importância. Na verdade os membros agem em função daquelas grandes articulações de comando: executam as suas ordens e sustêm o corpo. Sendo indispensáveis, só são úteis em função da coluna vertebral.

Com respeito aos Grupos Musculares e ao seu papel, é importante ter bem clara a diferença entre ‘descontracção’, em que os músculos se alongam, e ‘trabalho’, em que os músculos se contraem.

Os INVERSORES do pescoço (Esplénio e Rombóide, Dentado e Omo-transverso) opõem-se à elevação da base do pescoço e à entrada dos posteriores. São a causa da maior parte das resistências. O trabalho positivo será então no sentido de os alongar e descontrair através de encurvações e extensões do pescoço.

Nuca

Elevadores da base do pescoço

Flexores do dorso e rim

Flexores do pescoço

Maxilar

Extensores do dorso e rim Garrote Ancas

Inversores do pescoço

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Os FLEXORES do pescoço (Esternocefálico e Escaleno) trabalham no sentido do alongamento dos seus antagonistas Inversores e indirectamente favorecem a elevação da base do pescoço. Actuam ainda na elevação do gesto do antebraço. Deve-se, por isso, fazê-los trabalhar em contracção pela atitude de Ramener em trote concentrado e saltando obstáculos sobretudo a trote, etc.

Os ELEVADORES da base do pescoço (Grande Dentado, Peitoral Ascendente e Peitoral Escapular) têm um importante papel no equilíbrio do cavalo montado. Fazem subir o garrote entre as espáduas. Acabam por ser o centro da máquina ao provocarem a elevação do antemão, ajudando no início a recuperar o equilíbrio perdido com o peso do cavaleiro e, mais tarde, favorecendo o Rassembler. As descidas e os alongamentos do pescoço, as meias paragens e o trabalho em terreno variado são exercícios indicados para os fazer trabalhar.

Os EXTENSORES do dorso e rim (Longo dorsal e ílio-espinais) provocam, por contracção, a tensão da coluna vertebral o que permite aos músculos das espáduas e das ancas, encontrarem um ponto de apoio sólido. Ajudam a elevar a base do pescoço e contribuem para a distensão dos posteriores. Fazem-se trabalhar alongando e encurtando os andamentos e em terreno variado, sobretudo nas subidas.

Os FLEXORES do dorso e rim (Abdominais, Grande Oblíquo e Psoas) provocam a descida e o avanço da bacia e a consequente entrada dos posteriores com abaixamento das ancas. Estimula-se as suas contracções nos andamentos lentos, paragens e recuar. O trabalho das espáduas a dentro tem aqui um papel muito positivo.

RESUMINDO e sendo certo que o que se procura em todas as modalidades equestres é a distensão dos posteriores, é fundamental desenvolver os mecanismos que levam à sua flexão. Para isso, torna-se absolutamente necessário obter:

• o arqueamento do dorso • a elevação da base do pescoço • a flexão da nuca – Ramener • a descontracção da maxila

‘…o que se procura em todas as modalidades equestres é a distensão dos posteriores!’

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ESCALA DE TREINO, BIOMECÂNICA E GINÁSTICA Estando o conceito de Biomecânica ligado ao “estudo científico de sistemas vivos com base em princípios físicos”, só através de exercícios ginásticos se pode conhecer e desenvolver este conceito devidamente adaptado e aplicado ao cavalo de desporto.

No seguimento do tema principal deste trabalho – a Escala de Treino – devemos aceitar que a progressão ginástica da Equitação se processa em três fases:

• Iniciação • Confirmação • Aperfeiçoamento

A fase de Iniciação corresponde às três primeiras fases da Escala.

A ‘Flexibilidade’ lateral do dorso põe em jogo as contracções e as distensões unilaterais dos músculos Extensores e dos Flexores do Dorso acontecendo a mesma mecânica em relação às encurvações do pescoço. Os trabalhos de flexibilização lateral alternada, evitam que o cavalo se ‘inverta’ pela contracção bilateral do músculo Longo Dorsal. O desenvolvimento do movimento para diante (‘Ritmo’) numa atitude baixa e estendida arredonda o dorso do cavalo (Flexibilidade longitudinal e lateral) e leva-o naturalmente ao ‘Contacto’. Os movimentos naturais do cavalo são potenciados e começam a criar-se as condições para corrigir defeitos de ’Rectitude’. Assim, melhorando a actividade dos posteriores, começou também a desenvolver-se a sua Força Propulsora.

A fase de Confirmação corresponde na nossa Escala às fases de desenvolvimento ou de correcção da ‘Rectitude’ e da ‘Impulsão’ preparando a ‘Concentração’. Os exercícios laterais, nomeadamente a Espádua a Dentro, começam a levar ao avanço unilateral do posterior do lado da encurvação. Neste caso, as fibras dos músculos abdominais encurtam-se unilateralmente, à medida que o posterior do mesmo lado avança e o dorso ganha tonicidade. A base do pescoço eleva-se a pouco e pouco e a nuca flecte-se tornando-se o ponto mais alto. A mandíbula cede e temos a atitude do Ramener. Nesta atitude os membros anteriores ficam aliviados de peso e ganham elevação.

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Esta atitude deve ser consequência do movimento para diante sobre uma mão que recebe e cede ou resiste mas nunca da tracção das rédeas, sob pena de se obter a situação do ‘pescoço partido’ pela 3ª ou 4ª vértebra cervical. Durante esta fase, ainda, e tendo sempre em atenção que deve ser pelo avanço dos posteriores que se vai melhorando o Equilíbrio e a Atitude, o Ritmo vai-se tornando mais lento, com a mesma Impulsão os movimentos ganham elevação e brilho e o cavalo melhora a sua mobilidade e a sua Capacidade de Resposta às Ajudas.

Impu

lsão

Eleva

ção

Amplitude

Impulsão

Impu

lsão

Impu

lsão

Eleva

ção

Amplitude

Impulsão

Impu

lsão

Com uma Impulsão constante a Elevação e a Amplitude dos movimentos variam em ordem inversa.

A fase de Aperfeiçoamento corresponde à última fase da Escala de Treino.

É a ‘Concentração’ no seu nível mais avançado: O Rassembler. A base de sustentação encurta-se francamente por avanço dos posteriores, as ancas baixam, o dorso arredonda-se e o

antemão ganha uma ligeira e uma mobilidade extremas. As variações de movimentos, as rotações directas, as paragens e o recuar prepararam o cavalo que está agora biodinâmica e equestremente preparado para realizar os ares de alta escola como o piafer, a passage, as piruetas a galope e até a levada.

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Uma equipa de cientistas (Barrey E., Biau S. e outros) especializados nesta área da Biomecânica e da Cinética, têm desenvolvido vários programas de estudo da locomoção dos cavalos de desporto em que a ‘Ecole Nationale d’Equitation’ em Saumur está envolvida. As características dos andamentos são medidas com um equipamento patenteado – o ‘Equimetrix’ – apropriado e desenvolvido para o efeito.

Passamos a apresentar resumidamente alguns destes estudos e dos seus resultados que nos parece terem interesse para o nosso tema. BIOMECÂNICA E RÉDEAS AUXILIARES A literatura e os pareceres de cavaleiros experientes indicam que a posição da cabeça e do pescoço dos cavalos está relacionada com as características da sua locomoção.

Um dos estudos foi feito com o objectivo de quantificar o efeito de 3 tipos de rédeas auxiliares na locomoção a passo e a trote. Foram testados 8 cavalos numa guia mecânica sem rédeas, com rédeas fixas, com Chambom e com o ‘Back lift’. As primeiras fecham o ângulo da nuca, enquanto que as outras abrem-no. Dois aparelhos de medida dos movimentos de acelerações e reduções foram fixados no externo e no sacro dos cavalos para medir as características cinéticas dos anteriores e dos posteriores a passo e a trote.

Rédeas fixas ‘Back lift’ ‘Chambom’

Este estudo levou às seguintes observações:

• Os 3 tipos de rédeas modificaram significativamente o passo e o trote com maior aumento da propulsão dos anteriores no trote.

• As Rédeas Fixas aumentam a actividade propulsora dos anteriores no trote e a actividade dorso ventral dos posteriores no passo.

• O Chambom aumentou a actividade dorso-ventral dos posteriores no trote e a propulsão dos anteriores no passo.

• O ‘Back lift’ aumentou a actividade dorso-ventral dos anteriores no passo e no trote.

• O uso destas rédeas auxiliares modificou a posição da cabeça e a actividade dos membros.

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A ESCALA DE TREINO E AS CARACTERÍSTICAS DO TROTE Foi feito um outro estudo, com o mesmo equipamento do caso anterior, em 14 cavalos de sela franceses de 4, 5 e 6 anos de idade e durante 3 anos de treino de Dressage, com o objectivo de analisar as alterações nos andamentos impostas por esse treino.

Foi dada especial atenção ao andamento de Trote e às suas características definidas no regulamento da FEI. Foi assumida a sua importância na modalidade em questão por ser o andamento que está na base do treino para a Passage nos níveis mais avançados de Concentração, em que as forças de Propulsão e de Sustentação são determinantes.

Oito variáveis foram utilizadas para quantificar o Ritmo, Regularidade, Simetria e a Actividade vertical e longitudinal nas figuras das reprises de Dressage a trote.

Este estudo levou às seguintes observações:

• A Frequência das passadas diminui (Cadência) especialmente a partir do segundo ano de treino, estabilizando aos 6 anos de idade.

• A Actividade dorso-ventral (Souplesse e Impulsão) aumenta significativamente logo durante o primeiro ano de treino.

• A Regularidade decresce significativamente quando os cavalos param o treino.

• A Concentração dos andamentos diminuiu a Simetria (Rectitude) e a Regularidade provavelmente pelas acções dos cavaleiros.

• A Simetria também diminui no começo do trabalho nos cavalos novos.

Elevação do garrote, flexão e avanço do corvilhão e pequena flexão do carpo e do boleto no tempo de maior propulsão do trote (à esquerda), nada tem a ver com o contrário (à direita)

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A ESCALA DE TREINO E AS TRANSIÇÕES Do ponto de vista dinâmico e mecânico, as Transições são definidas por uma mudança de andamento ou de movimento sem solução de continuidade na mobilidade dos membros (excepto na paragem). É a periodicidade e o Ritmo desses movimentos que se altera num determinado momento.

Este outro estudo foi feito com o objectivo de descrever as Transições dos movimentos em cavalos de Dressage. Foi utilizado o mesmo equipamento ‘Equimetrix’ e mais um outro medidor de ondas de impacto ‘Morlet’.

Foram testados dezoito cavalos durante as suas reprises em competição com base em nove variáveis nas transições galope-trote, galope-passo, galope-paragem, trote-passo, trote-paragem e passo-paragem. As variáveis quantificaram a duração da transição e a energia e a frequência da actividade dorso-ventral, durante cada transição.

Verificou-se o seguinte:

• A combinação dos dois sistemas de análise permitiu descrever quantitativamente algumas características temporais e cinéticas das transições dos andamentos.

• A duração das transições, a actividade dorso-ventral e a frequência são específicas para cada transição.

• As variações de frequência e de energia são minimizadas com uma transição mais prolongada e o Treino melhora a suavidade na ‘travagem’ e ‘desaceleração’.

Imagem do medidor de ondas ‘Morlet’ na transição Galope-Paragem.

‘Actividade’ dorso-ventral (em cima)

e tempo-frequência-energia de ‘desaceleração/travagem’ (em baixo)

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BIOMECÂNICA E DIAGNÓSTICO PRECOCE DO POTENCIAL DOS CAVALOS Há características específicas nos andamentos dos cavalos para Dressage que são particularmente procuradas. È natural que se tente estabelecer e definir a heritabilidade dessas características para seleccionar os reprodutores e assim melhorar as performances dos cavalos e das raças envolvidas. No entanto, o treino dos cavalos influi demasiado nas suas performances e nas características dos andamentos, como vimos anteriormente. Para eliminar esse factor que pode mascarar o verdadeiro valor genético de determinado animal, importa pôr em prática sistemas de diagnóstico precoce das qualidades desejadas ou dos defeitos a eliminar.

O estudo que agora apresentamos foi feito pela mesma equipe e com o ‘Equimetrix’, associado desta feita a um estudo biométrico. Teve o objectivo de comparar características do passo e do trote e a conformação em cavalos novos de várias raças. A amostra foi um total de 142 cavalos de 3 anos de idade alemães, franceses e espanhóis.

Com toda a heterogeneidade de elementos encontrada e depois de trabalhados os dados obtidos a conclusão é a esperada:

• As características dos movimentos dos cavalos alemães são as mais adaptadas à Dressage de competição e os resultados deste grupo podiam ser usados como referência para uma avaliação precoce em Dressage.

• Os cavalos PRE podem ser considerados uma referência para movimentos recolhidos usados no trabalho do campo e na Equitação de Picadeiro.

• Estes testes de andamentos e conformação podiam ser aplicados numa raça ou num programa de cruzamentos para detectar com mais precisão cavalos novos com potencial para Dressage.

O estudo biométrico e as mensurações de conformação foram tirados de medidas na análise das imagens.

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A ESCALA DE TREINO E A LOCOMOÇÃO (Resumo dos estudos apresentados) A aptidão dos cavalos para a Dressage tem a ver com uma série de características: Conformação, Andamentos, ‘Montabilidade’ (Ridability), Temperamento, etc.

A genética tem alguma influência nestas características segundo as moderadas ou altas heritabilidades encontradas em algumas variáveis nos andamentos e conformação. Tem, no entanto, uma influência muito baixa na performance em competição porque o treino e o ambiente têm um efeito (físico e mental) preponderante.

Os cavalos de raças Alemãs e cruzadas estão mais adaptados à competição de Dressage a nível internacional porque as regras da FEI correspondem às características dos seus andamentos.

Para a selecção precoce de cavalos com aptidão para Dressage os testes de performance podiam ser complementados com o uso de um equipamento de análise de andamentos que fornecesse elementos objectivos e mensuráveis das suas características. Comparando os cavalos testados com os resultados dos melhores cavalos (reprodutores) novos dos Studbooks, é possível ganhar tempo na selecção de reprodutores desportivos.

O cavalo de Dressage deve ser alvo de um treino aturado, para um bom desempenho em competição a alto nível. A Concentração dos andamentos é uma etapa importante para a progressão técnica do cavalo. A Concentração do trote é crucial para a Passage e para o Piafer. Para se chegar a conseguir uma boa Concentração devem observar-se no cavalo algumas características básicas dos andamentos nas primeiras fases do treino: Ritmo lento, boa Propulsão e Actividade vertical, boa Amplitude dorso-ventral. Será o justo acordo das ajudas de propulsão e de sustentação por parte do cavaleiro que definirão o Equilíbrio do cavalo.

Mudança de posição do ponto de Equilíbrio / Centro de gravidade (•)

Atitude mais estendida – avança / Atitude mais recolhida – recua

Durante o treino, a análise dos andamentos pode ser feita para avaliar a execução dos exercícios, alteração da frequência das passadas, actividade vertical e longitudinal e transições de andamentos.

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Antes de terminar, aqui ficam ainda algumas considerações a respeito das

Características dos andamentos de cavalos de nível avançado.

O Trote

Para a extensão do trote revela-se importante a inclinação da espádua e a amplitude da articulação do curvilhão.

No trote concentrado aumenta a amplitude dorso-ventral à custa do armazenamento de energia e distensão elástica, nas articulações dos membros posteriores, incluídas as articulações da pélvis. Com o aumento da Concentração, a Força de Propulsão é mais utilizada para aumentar essa Amplitude dorso-ventral em detrimento do movimento longitudinal. Aqui, uma ligeira dissociação positiva das diagonais, no contacto com o solo, pode ser observada.

Ligeira dissociação diagonal Positiva (à esquerda) e Negativa (à direita) no contacto com o solo. A primeira ocorre nos movimentos mais concentrados e a segunda quando há deficiências de equilíbrio

Passage e Piafer

Apesar de terem características cinéticas diferentes são exercícios ou ‘ares’ de alta escola que se pode aceitar que derivam do trote concentrado e que têm em comum:

• Pescoço elevado, tendo a nuca como ponto mais alto e o chanfro na vertical (‘ramener’)

• A Concentração atinge o seu nível mais elevado (‘rassembler’)

• Contacto ligeiro (flexão da mandíbula)

• Flexão acentuada dos joelhos e dos curvilhões

• Grande elegância e elasticidade do movimento

A dissociação das diagonais pode tornar-se mais evidente sendo obrigatoriamente ‘positiva’ na Passage e ‘positiva ou negativa’ no Piafer conforme a mecânica especial que o cavalo tenha desenvolvido neste ‘ar’ em que a ausência de um verdadeiro tempo de suspensão leva a uma dissociação peculiar das diagonais.

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O Galope

Enquanto o trote e os andamentos trotados são movimentos simétricos, o galope e as suas variações são movimentos assimétricos, que põe em jogo algumas articulações de maneira diferente nomeadamente nos membros posteriores.

O ponto de rotação dos membros anteriores está na zona proximal da escápula.

Nos membros posteriores difere do ‘trote’ (meio da anca) para o ‘galope’ (ilion).

É um andamento a três tempos de apoio e um tempo de suspensão em que, novamente, no segundo tempo de apoio, a diagonal no solo pode apresentar uma dissociação, que é penalizada nas variações desde o galope concentrado até ao galope largo, mas que é aceite como natural no galope de corridas em máxima extensão (dissociação negativa) e nas piruetas em máxima reunião (dissociação positiva com ausência do tempo de suspensão).

As ‘passagens de mão’ no ar são feitas, como o próprio nome indica, no tempo de suspensão e a posição dos posteriores deve ser alterada antes dos anteriores.

O Passo

É um andamento a quatro tempos com um longo ‘tempo’ entre as fases de apoio dos membros. É o mais lento dos andamentos mas dos mais complexos devido à grande variabilidade daquele ‘tempo’.

Varia do passo concentrado (1,37 m/s) ao passo largo (1,82 m/s) com um simultâneo ligeiro aumento da frequência das passadas. No entanto, a variação da velocidade do passo concentrado para o largo deve ser consequência de um aumento do comprimento da passada pelo aumento do ‘transpistar’ do apoio dos membros.

Foram detectadas frequentes alterações na mecânica do passo concentrado que se atribuem a acções do cavaleiro.

Exercícios laterais como o ladear ou as piruetas, têm uma mecânica própria.

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III Parte – Conclusões Higiene e Maneio Não pode terminar um trabalho deste género sem se fazer alguma alusão, ainda que breve, a pequenas coisas que podem fazer a diferença para melhor ou, pelo contrário, tornar todo o trabalho em pura perca de tempo.

O estado geral deve ser observado diariamente. Cavalos com feridas, mau pelo, com o comportamento ou a expressão alterados, ou com claudicação, não podem dar rendimento nem progredir no trabalho

Uma alimentação, forrageira e concentrada, em quantidade e qualidade, adequada ao tipo de trabalho que se espera ou que se exige ao nosso cavalo. E aqui inclui-se a idade, a raça, a época do ano (electrólitos no Verão), etc. A própria água para beber deve de boa qualidade e à descrição.

A sanidade no que respeita às desparasitações e vacinações atempadas e oportunas.

A atenção devida ao estado dos dentes, à ferração e aos cascos, ao estado dos arreios e protecções.

Os pisos em que se trabalha são determinantes na evolução do trabalho. Um piso de má qualidade inviabiliza o Ritmo e a Souplesse, inviabilizando a evolução do resto do treino.

As camas e o ambiente em geral. Poeiras, correntes de ar, demasiado calor ou frio são inimigos do bem estar do nosso companheiro de grandes momentos.

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O Panorama Nacional Sendo a filosofia geral da Escala de Treino declarada e assumidamente ‘impulsionista’ e sendo a nossa tradição equestre baseada na utilização do nosso cavalo de tipo ‘barroco’ - o Lusitano - mais apto para uma equitação barroca, mais recolhida, parece, à primeira vista que tivemos azar.

Mas não: Os princípios e os conceitos da Escala dão-nos a oportunidade de transformar esse aparente azar num factor positivo. Na realidade, se os cavaleiros portugueses que fazem competição e sobretudo os que se dedicam à Equitação de Escola ou de Picadeiro, ou até à Tauromaquia, interiorizarem estes princípios e conceitos e os aplicarem convictamente no dia a dia, o nosso cavalo ganhará uma nova dimensão, por um lado e, por outro, ganhará finalmente critérios objectivos de selecção.

O próprio senhor Cristoph Hess, num seminário que fez, dirigido a criadores de cavalos Lusitanos, em Lisboa no passado mês de Dezembro apresentou a sua opinião sobre este nosso cavalo e, entre muitas outras interessantíssimas coisas, afirmou:

“… tem (o cavalo Lusitano) como pontos fortes a inteligência, a força, e o potencial para a concentração. Como pontos fracos, o dorso curto que limita a actividade dos posteriores. Assim, afirmava, deve dar-se especial atenção à Escala de Treino e segui-la fielmente, aos seus princípios e à sua filosofia.”

Estou certo de que os criadores, os cavaleiros e as instituições como a nossa Escola Portuguesa de Arte Equestre e os seus directores, terão tudo a ganhar se conhecerem e aplicarem esta Escala como uma orientação para o seu trabalho de treino e como fonte de elementos de selecção e de diagnóstico precoce de qualidades e defeitos dos seus animais.

Senão vejamos:

-Será fruto do acaso o estrondoso sucesso desse grande ‘Meneur’, Félix Marie Brasseur, campeão do mundo por duas vezes com cavalos Lusitanos, numa disciplina tão adversa para estes cavalos como é a Atrelagem? É claro que não pode ser fruto do acaso, nem da sorte e quem achar que sim, desengane-se. Quem teve oportunidade de trabalhar com ele e com ele partilhar e discutir as suas ideias e os seus métodos, sabe que aquele sucesso se deve a uma evolução lógica e académica do treino dos seus cavalos que não é mais que o rigor na aplicação da Escala de Treino devidamente adaptada aos objectivos da modalidade.

Temos a Filosofia, temos a Técnica, temos o Cavalo, temos o Exemplo! Estamos à espera de quê?

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Ética “Há um sério risco de cavalos sujeitos a ‘surmenage’ e a competições demasiado frequentes porque há mais dinheiro para ganhar. Cumprir uma bem planeada época de competições é cada vez mais difícil para os cavaleiros”

Dr. Reiner Klimke

A Ética tem a ver com moralidade e com uma responsabilidade geral primária de qualquer acção humana.

Mas…

Qual é a dimensão moral no treino de cavalos?

Até que ponto é que o homem pode usar o cavalo para seu próprio proveito?

Qual é o limite da resistência do cavalo ao stress?

Até que ponto as razões económicas podem influenciar o uso do cavalo?

Até que ponto pode o homem ignorar as necessidades naturais do cavalo?

Nenhuma destas questões pode ser respondida de ânimo leve. Os pontos de vista do criador, do proprietário, do tratador, do cavaleiro de lazer ou de competição, do negociante, serão sempre diferentes.

Quantos casos não há de cavalos que aparentam grande potencial em novos e, quando chegam a determinado nível não avançam mais? Não é nossa obrigação de ‘gente de cavalos’ apercebermo-nos disso e adequarmos as nossas exigências ou expectativas àquelas a que o cavalo pode corresponder? E quando acontece o contrário, em que um cavalo, à partida vulgar, se vai revelando cada vez mais e melhor, à medida que as questões se complicam?

Questões como estas e tantas outras devemos pôr-nos a nós próprios frequentemente para fortalecermos a nossa diferença como ‘seres pensantes’.

Page 40: Escala de Treino

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BIBLIOGRAFIA

Biau S, Barrey E (2005) Locomotion of Dressage Horses - Articles

Clayton HM. The Dynamic Horse

Chambry P (1972) En Piste – cahiers d’équitation secondaire

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Martins Abrantes Cor. Estágio de Dressage - Apontamentos

Podhajsky A L’Équitation

Pollmann-Schweckhorst E (2002) Training the Modern Show Jumper

Schoten MV. (2005) The Training Scale - Apontamentos

Silva AT. Apontamentos de Biomecânica

Steinbrecht G Le Gymnase du Cheval

Williams N (Oct/Nov 2006) The Origin of the German Scale of Training – British Dressage Magasine

Page 41: Escala de Treino

“A ESCALA DE TREINO”

sua influência na

Biomecânica do Cavalo de Desporto

CURSO DE MESTRE DE EQUITAÇÃO

=TESE=

Março/Outubro 2007 CMEFD - Mafra

Luís Lupi

Page 42: Escala de Treino

“A ESCALA DE TREINO”

sua influência na

Biomecânica do Cavalo de Desporto

Page 43: Escala de Treino

DEDICATÓRIA

Ao meu padrinho Titó (António de Freitas Pereira)

Ao meu tio Joaquim Miguel (General Duarte Silva)

Só não tem sido mais difícil viver sem eles porque afinal estão sempre presentes em

cada passo desta minha caminhada. AGRADECIMENTOS

À ENE na pessoa do Sr. Coronel João Sequeira – ‘o Infatigável’

Aos Mestres e aos Colegas do Curso – com quem aprendi a ensinar melhor

Aos meus cavalos – com quem aprendi a aprender melhor

À minha mãe – por tudo!!

Ao Dr. Costa Ferreira – o meu director que me apoiou desde o princípio

À Professora Doutora Sophie Biau – grande cientista de espírito aberto

À dupla Thierry Touzaint / JeanPierre Blanco – pelo estágio em Saumur

Às anónimas e aos anónimos – que, por amizade e até mesmo sem saberem, terão contribuído para este trabalho.

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ÍNDICE

Introdução ........................................................................................................................... 4

I Parte – A Escala de Treino................................................................................................. 6

1.- A Escala de Treino do Cavaleiro.......................................................................... 6

2.- A Escala de Treino do Cavalo ............................................................................. 7

- Origem ....................................................................................................... 7

- A Escala Propriamente Dita ....................................................................... 8

� I.- Ritmo ........................................................................................... 9 � II.- Souplesse .................................................................................... 11 � III.- Contacto .................................................................................... 13 � - (Contraponto) ................................................................................. 15 � IV.- Impulsão .................................................................................... 16 � V.- Rectitude ..................................................................................... 18 � VI.- Concentração ............................................................................. 19 � - Capacidade de Resposta às Ajudas .................................................. 20 � - (Contraponto) ................................................................................. 21 � - Novas Propostas I e II ..................................................................... 22

II Parte – Biomecânica do Cavalo de Desporto .................................................................... 24

- Considerações Gerais ............................................................................................ 24 - Escala de Treino, Biomecânica e Ginástica ............................................................ 27 - Biomecânica e Rédeas Auxiliares .......................................................................... 29 - A Escala de Treino e as Características do Trote .................................................... 30 - A Escala de Treino e as Transições ........................................................................ 31 - Biomecânica e Diagnóstico Precoce do Potencial dos Cavalos ............................... 32 - A Escala de Treino e a Locomoção ........................................................................ 33

- Características dos Andamentos de Cavalos de Nível Avançado ................ 34

III Parte – Conclusões ......................................................................................................... 36

- Higiene e Maneio .................................................................................................. 36 - O Panorama Nacional ............................................................................................ 37 - Ética ...................................................................................................................... 38

Bibliografia ......................................................................................................................... 39

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INTRODUÇÃO Tendo nascido numa época, numa família e num ambiente em que o cavalo fazia parte do quotidiano, o ‘montar a cavalo’ surgiu na minha vida como o andar a pé, como o falar, como o sorrir, … naturalmente!

Esta relação natural e empírica, com o que vim mais tarde a saber chamar-se ‘Equitação’, evoluiu na minha vida em várias vertentes, desde a Tauromaquia, os Raids, as Corridas de Galope, a Equitação de Trabalho e de Picadeiro, a Atrelagem, a Criação, a Caça e o Lazer, até às três Disciplinas Olímpicas. E como praticante, treinador e seleccionador, juiz, etc. E por esta ordem ou por outra ordem qualquer.

Este contacto alargado, baralhado e algo desordenado com o mundo equestre deu-me a conhecer, por um lado, um vasto leque de utilizações do cavalo, dos seus utilizadores e dos seus ambientes, enfim, da ‘fileira’ do cavalo. No entanto e por outro lado, retardou em mim a procura de um conhecimento organizado e mais científico e tecnicista da Equitação.

Retardou mas não anulou. Com o passar do tempo e com o esbranquiçar do já pouco cabelo, tenho-me aproximado de um patamar mais elevado da Equitação em que comecei a juntar as peças que usei de uma maneira dispersa e desordenada durante a minha vida à volta dos cavalos. As coisas complicadas foram perdendo razão de ser e os métodos simples vão revelando toda a sua importância e dimensão.

Mas foi a criação da actual Escola Nacional de Equitação (ENE) e o meu envolvimento com ela na carreira de Formador, que me ‘obrigaram’ definitivamente a tentar clarificar algumas questões. Questões simples! Como, por exemplo, um conceito para ‘Equitação’; ou o inesgotável ‘Calmo, P’ra Diante e Direito’; ou os actuais princípios da ‘Colocação em Sela’; ou as ‘Características do Cavalo Bem Trabalhado’; ou a ‘Ligeireza’, o ‘Equilíbrio’, etc., etc.

De repente recebo um convite para frequentar um estágio para Mestre de Equitação. O Máximo! O chegar ao topo! A oportunidade para a realização de um sonho! E como o Programa Oficial de Formação de Formadores de Equitação (POFFE) preconiza a elaboração da uma Tese, sobre um tema que tem que ser proposto e aceite, cá estamos nós! Com um tema simples! Foi proposto… e foi aceite!

A ‘ESCALA DE TREINO’!! Porquê? Porque ela me tem dado, e cada vez mais, os caminhos para o trabalho dos meus cavalos e para a orientação dos meus alunos. Porque só seguindo-a criteriosamente e interiorizando a sua filosofia é que um cavaleiro (com uma correcta colocação em sela e com a sua própria ‘escala de treino’ bem consolidada) pode chegar a ter um cavalo ‘Calmo, p’ra Diante e Direito’.

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Assim, proponho o seguinte esquema para marcar os princípios e as incontornáveis fases evolutivas da Equitação em geral numa perspectiva actual:

Não quero ainda entrar realmente no nosso tema sem antes fazer alguns reparos ao que é fundamental. A pedra de toque: a COLOCAÇÃO EM SELA. Porque é daí que tudo sai.

Sem querer repetir o que se repete todos os dias, o que se lê em cada livro, o que já devia estar esgotado mas que tem que continuar a repetir-se até à exaustão, no volteio com ou sem sela, na posição clássica ou de estribos curtos, na posição em suspensão ou sentado, etc., faço questão de realçar três aspectos que algumas vezes são esquecidos mas que são fundamentais para a desejada ‘quietude’ do cavaleiro:

• Os ‘cotovelos’ juntos às costelas a permitirem que …

• … A ‘linha das rédeas’ comece nos cotovelos e vá a direito até à embocadura e

• A ‘posição e a atitude das mãos’ à frente e uma de cada lado do garrote, firmes e resistentes às resistências e suaves e ligeiras à cedência.

A ideia sempre presente da ‘ligação ao movimento’ como característica e consequência de uma boa ‘colocação em sela’ deve estar ligada à ideia de ‘quietude’. A ligação destas ideias deve ter uma forma consistente nas directrizes dos professores e na mente dos praticantes.

Na realidade, se a flexibilidade, o equilíbrio, a solidez e o à vontade do cavaleiro não forem ligados a uma ideia de ‘quietude’ (‘still ’), pode haver uma grande eficácia técnica mas fica a faltar a estética, a beleza, a arte. E, sem estas, a Equitação fica incompleta porque é disso que se trata: Técnica e Arte.

Cavaleiro

“ Influente”

ESCALA DE TREINO

Ritmo Souplesse Contacto

Impulsão Rectitude

Concentração

Cavalo: Calmo

P’ra Diante Direito

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I Parte – A Escala de Treino 1.- A Escala de Treino do Cavaleiro Na verdade não nos parece que faça qualquer sentido abordar um método de treino para um cavalo, sem estabelecer algumas regras para quem o vai desenvolver. O cumprimento dessas regras por parte do cavaleiro é determinante para o sucesso do treino do cavalo. Essas regras são aquilo a que vamos chamar de ‘Escala de Treino do Cavaleiro’ e que podem ser apresentadas esquematicamente da seguinte maneira:

Colocação em Sela -» Ajudas -» Sentimento -» Influência Esta ‘Escala’ deve desenvolver-se no cavaleiro principiante, primeiro sobre um cavalo já bem

trabalhado (‘Cavaleiro novo – cavalo experiente…) em que, através de uma boa ‘colocação em sela’, o cavaleiro desenvolve: • o ‘Conhecimento’ da ligação ao movimento e • o ‘Sentimento’ da ligação ao movimento.

Seguidamente deve adquirir: • o ‘Conhecimento das Ajudas e da Técnica’ e • o ‘Sentimento para o uso das Ajudas e da Técnica’.

Sem ‘colocação em sela’ não há ‘influência’ Como resultado disto o cavaleiro desenvolve uma ‘Influência’ sobre o cavalo. Mais tarde e já ‘influente’, sobre um cavalo novo, deve o cavaleiro adquirir o conhecimento da fisiologia e da psicologia do cavalo e desenvolver o sentimento da sua condição física e potência (…cavalo novo – cavaleiro experiente’).

Com a boa relação cavaleiro/cavalo (empatia) que se criou, com talento e determinação (‘inspiração e transpiração’) e com um bom treinador, estão reunidas as condições para o sucesso.

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2.- A Escala de Treino do Cavalo Origem A revolução equestre do século XX, com a generalização das competições de Dressage na Europa, com a FEI a regulamentar, a tutelar e a formar juízes, com os programas de fomento da criação cavalar e de melhoramento das Raças e com as crescentes exigências nas performances do desporto equestre, levou naturalmente à definição de um método de treino que servisse a treinadores, cavaleiros e juízes.

É claro que esse método não é inventado de um dia para o outro. Muito pelo contrário, ele vem aglutinar as tendências e as várias ideias que se foram desenvolvendo aqui e ali.

Em jeito de exemplo não resisto a lembrar o ‘método’ progressivo que um tal senhor Coronel Cardo terá transmitido a um Mestre amigo, por volta dos anos 60:

• 1º- P’ra diante e estendido • 2º- P’ra diante, estendido e em equilíbrio • 3º- P’ra diante, em equilíbrio e em Ramener • 4º- P’ra diante, em equilíbrio, em Ramener e com avanço dos posteriores • 5º- Introdução ao Rassembler • 6º- Rassembler

O predomínio germânico a todos os níveis, sobretudo na disciplina de Dressage, com o seu conhecido e carismático rigor, levou então à definição de um método de treino. Um artigo assinado pelo Juiz Olímpico Nick Williams na revista ‘British Dressage’ de Out/Nov de 2006, deixa no ar alguma nebulosidade quanto a este assunto, mas acaba por deixar uma clara referência à origem Alemã da ‘Escala’ e a data sugerida é a de 1912 em que, numa revisão do Manual de Cavalaria Alemão de 1882, no Capítulo 25 da Parte III, “tudo é revelado”.

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A Escala propriamente dita A Escala que se apresenta traduz assim o método de treino para cavalos de Dressage desenvolvido na Alemanha e cada vez mais aceite e defendido pela FEI como ‘o guia’ para treinadores, cavaleiros e juízes tanto dos cavalos novos como dos mais avançados. É geralmente apresentada em esquema da seguinte forma:

A descrição dos conceitos de cada uma das fases e o seu encadeamento na Escala serão eventual e oportunamente contraditadas neste trabalho.

A ideia não é, logicamente, contestar o método inteligente e aturadamente desenvolvido, criteriosamente testado, profundamente discutido e consistentemente aceite. No entanto, porque se trata de um trabalho que pretende chegar também a outras modalidades equestres e a outras Raças de cavalos, para além das centro-europeias, nomeadamente as Barrocas, pontualmente ousaremos sugerir algumas alternativas.

Sendo aceite como indiscutível que ‘a Dressage é a base de toda a Equitação’, há, no entanto, conceitos que são mais importantes numas disciplinas do que noutras.

Mas analisemos, ponto por ponto, conceito por conceito, cada uma das fases da Escala aqui apresentada.

Ritmo

Souplesse

Contacto

Impulsão

Rectitude

Concentração

Capacidade de respostas às ajudas

Fase de Compreensão e Confiança

Desenvolvimento da Força Propulsora

Desenvolvimento da Força de Sustentação

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I.- RITMO (Regularidade, Actividade) É a 1ª característica a procurar e a desenvolver. É a batida regular (como a dum relógio) em cada um dos andamentos, movimentos, exercícios ou ‘ares’.

É nesta primeira fase que se aperfeiçoam os andamentos, estimulando o movimento para diante normalmente sobre círculos bem amplos ou em linhas direitas, em que o ‘Tempo’ e o tamanho de cada passada se devem repetir nas seguintes, tanto no Passo como no Trote como no Galope e nas Transições. É a altura de começar a pôr o cavalo atento e à frente das ajudas do cavaleiro.

As ajudas das pernas e do assento do cavaleiro são as preponderantes, solicitando o movimento para diante e activo, as acções das mãos estando reduzidas ao mínimo indispensável para manter o cavalo em ordem, numa atitude baixa e estendida. A posição do cavaleiro ligeiramente para a frente e o trote levantado sobre a diagonal de fora são ajudas suplementares que favorecem o cavalo.

A palavra ‘Ritmo’ vem do grego ‘rhein’ que quer dizer ‘deixar passar’ (to flow).

O termo alemão ‘Takt’ vem do latim ‘tactus’ e quer dizer ‘batida’.

Os defeitos ou alterações no Ritmo são:

• Falta de actividade • Apressado • Irregular • Marchado (no trote)

O Passo é um andamento difícil de melhorar mas fácil de estragar. Deve haver especial atenção à tendência eventual para a lateralização. Características como a Actividade dos posteriores, a ‘Souplesse’ e a facilidade para a Concentração, podem ser adivinhadas neste andamento.

Tic, Tac, Tic, Tac...

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O Trote, sendo o andamento de eleição para trabalhar e fazer evoluir os cavalos no plano, sobretudo nesta fase, pode revelar alterações de ritmo e de equilíbrio por deficiências de treino. É a altura de os tentar corrigir.

O Galope não deve decompor o segundo tempo em condições normais. Esta ocorrência deve-se a falhas de treino por falta de atenção à actividade dos posteriores.

A exigência no doseamento do ritmo exigido aos cavalos deve ter em atenção o tipo de cavalo de que se trata: cavalos ardentes não precisam da mesma exigência de actividade que os mais fleumáticos. O controlo dos andamentos torna-se, no entanto, absolutamente necessário.

A consolidação de um Ritmo consistente pode ser rápida nos cavalos mais adiantados, realizando-se durante o aquecimento. Nos cavalos novos, no entanto, pode e deve demorar o tempo que for necessário e ocupará certamente e em exclusivo as primeiras meias dúzias de sessões montadas.

Tic, Tac, Tic, Tac, Tic, Tac...

Em Dressage pura o treino do cavalo procura desenvolver um Ritmo constante que se vai tornando mais lento e com os movimentos mais elevados e brilhantes, o que constituirá o conceito de ‘Cadência’.

Em Equitação de Obstáculos, no entanto, o trabalho no plano, depois de ter o Ritmo controlado e confirmado, deve preparar o cavalo para as suas variações (do Ritmo) que os percursos possam impor, abstraindo daquele conceito de Cadência.

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II.- SOUPLESSE (Flexibilidade)

“ Com um cavalo descontraído é mais fácil usar economicamente a sua força.” Elmar Pollmann-Schweckhorst

Esta fase engloba vários conceitos: ‘Flexibilidade’, ‘Souplesse’, ‘Relax’, ‘Descontracção’. Opta-se, neste trabalho, pela designação estrangeirada de ‘Souplesse’ em vez de ‘Flexibilidade’. Efectivamente, parece-nos que o termo português não tem a projecção - a força no rigor - do termo que preferimos. A ‘Souplesse’ que se procura desenvolver nesta fase, deve ser mais do que a flexibilidade lateral e longitudinal encontrada na adaptação ao desenho das figuras de picadeiro num cavalo que avança sobre elas em bom ‘Ritmo’. Deve ser, também e ainda, a qualidade de um andamento marchado ou saltado, activo mas sem tensões, suave e com um bom balanço (swing) do dorso. A ausência de tensões não se refere só ao corpo (Descontracção física) mas também à mente (Descontracção mental) do cavalo. Mas, atenção: essa ‘ausência de tensões’ não quer dizer ‘total relaxamento’.

Só com esta qualidade bem desenvolvida é que a energia dos posteriores pode chegar à mão do cavaleiro através do corpo do cavalo e, vice-versa, as acções da mão do cavaleiro podem chegar aos posteriores através da boca, nuca, pescoço e dorso. A Souplesse é o resultado da invisível comunicação (empatia) entre o cavaleiro e o seu cavalo. O cavalo começa a chegar ao contacto com a rédea de fora e o cavaleiro começa a sentir a necessidade de controlar as espáduas e a encurvação. A ‘assiette’ do cavaleiro fica mais próxima do arreio e as transições do trote levantado ao sentado tornam-se oportunas. A atitude mantém-se estendida e baixa. Começa, no entanto, a desenvolver-se a atitude que caracteriza o desejado estado de espírito que define o ‘happy athlete’. Defeitos ou alterações na Souplesse:

• Tensão do dorso • Alterações de Ritmo • Falta de actividade dos posteriores • Falta de rectitude • Contacto tenso • Boca seca (cavalo mudo) ou ‘ranger de dentes’ • Orelhas para trás • Trajectórias exageradas no salto

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Sinais de Souplesse:

• Ausência dos defeitos indicados • Atitude alegre e descontraída • Respiração suave e ritmada • Cauda descontraída com movimentos balançados • Baixada de pescoço sem alterações do Contacto, do Ritmo e do Equilíbrio.

Para desenvolver a Descontracção Mental – indispensável á Descontracção Física – devemos ter em mente que estamos a lidar com um ‘animal’ que precisa de:

• Sentir companhia • Exercício em liberdade (Padock) • Trabalho variado (Passeios) • Maneio sem stress (Tratador)

A ‘descontracção mental do cavalo’ começa com a ‘descontracção mental do cavaleiro’.

Para a Descontracção Física, uma vez garantida a Descontracção Mental, deve ter-se atenção algumas pequenas coisas, como:

• Na box, pôr a comida no chão (natural extensão da linha de cima) • Fazer um aquecimento apropriado e progressivo • Ter o cavalo bem à frente das pernas do cavaleiro • Um correcto trabalho no círculo com o cavalo entre a perna de dentro e a rédea de

fora (depois de a rédea de dentro ter solicitado a encurvação). • Solicitar frequentemente a baixada de pescoço (com atenção à actividade dos

posteriores). • A respiração do cavaleiro deve ser síncrona com os movimentos do cavalo.

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III.- CONTACTO (Conexão, Ligação, Aceitação da Embocadura)

“Leveza num cavalo é sempre resultado de um contacto leve” Salomon de la Broue (1530-1620)

Um cavalo em bom ‘Ritmo’, quando chega a estar bem ‘Souple’, acaba por procurar e aceitar naturalmente o ‘Contacto’ com a embocadura e com a mão do cavaleiro, ao princípio numa atitude estendida e baixa, que se irá recolhendo e erguendo com a evolução do trabalho.

O Contacto entre a boca do cavalo e a mão do cavaleiro deve ser estável, leve, elástico e igual nas duas barras. Nesta fase começa a poder iniciar-se o trabalho de mobilização da garupa por acção da perna isolada em que o cavalo começa a obedecer à perna de posição.

É num Contacto correcto que o cavalo desenvolve um bom Equilíbrio montado e um bom Ritmo em todos os andamentos.

Em Dressage pura a nuca deve ser sempre o ponto mais alto excepto nas descidas de pescoço.

Na Equitação de Obstáculos, porém, uma atitude mais elevada deve ser aceite e até estimulada, se for essa a melhor para o Equilíbrio do cavalo, desde que se mantenham as outras características de um bom Contacto.

É muito importante que o cavaleiro interiorize que o cavalo chega ao Contacto em consequência da energia da actividade dos posteriores que chega à mão através de um dorso ‘Souple’. Puxar as rédeas para trás à procura daquele Contacto nada tem a ver com Equitação.

A solicitação da contraencurvação e de correctas transições descendentes desenvolvem as qualidades do trabalho feito nas fases anteriores da Escala.

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Sinais de um ‘bom’ Contacto:

• Leve ‘mascar’ da embocadura • A nuca é o ponto mãos alto (em Dressage pura) • Chanfro à frente da vertical, ou na vertical em exercícios mais concentrados • O perfil do cavalo encurta-se ligeiramente, alongando-se nos andamentos médios e

largos • O cavalo está ‘na mão’, com boa Atitude, bom Equilíbrio e bons Andamentos.

Sinais de ‘mau’ Contacto:

• Chanfro atrás da vertical (deficiências de treino) • ‘Atrás da mão’ (foge ao contacto) • ‘Pescoço partido’ (deficiências de treino) • Peso na mão (deficiências de Equilíbrio) • Por cima da mão (toda a linha de cima ao contrário) • Língua de fora ou boca aberta • Instabilidade da atitude • Flexão unilateral (entesourado)

Com a evolução do treino, o Contacto vai-se tornando cada vez mais leve e ligeiro e a ‘Ligeireza’ aparece naturalmente nos exercícios de maior concentração.

Mão a mais Pernas a mais

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Estas 3 primeiras etapas da nossa ‘Escala’ desenvolvem a compreensão e a confiança do cavalo. Se se tratar de um cavalo adulto, bem trabalhado, pode passar-se a um trabalho mais avançado sobre as fases seguintes, passados alguns minutos, garantindo um aquecimento adequado e progressivo. Se, pelo contrário, se tratar de um cavalo novo, é nestes 3 primeiros níveis que devemos passar mais algum tempo (os meses que forem necessários) para dar tempo ao amadurecimento físico e mental do nosso grande, mas jovem e frágil, futuro atleta. Antes de continuarmos, no entanto, gostaria de contrapor algumas ideias: Se pensarmos bem, será que é razoável – ou possível, em certos casos – desenvolver um ‘Ritmo’ capaz, sem ter em conta o desenvolvimento da ‘Souplesse’ e/ou abstraindo de qualquer tipo de ‘Contacto’? Na realidade há quem defenda consistentemente que “uma batida regular só pode ser esperada depois de conseguidos a Souplesse e o Relaxamento Mental”. O próprio dr. Kees Vellenga – Juiz Internacional de CCE – sugere ‘relaxation and confidence’ antes de ‘regularity’ . E insiste em que ‘quando a próxima fase é abordada, as anteriores devem ser mantidas’. Estas opiniões, que nos parecem fazer sentido, levariam à alteração da ordem dos conceitos na Escala. Questões como estas levam-nos a ter que justificar com clareza o ‘porquê’ da sucessão das fases da ‘Escala’, o que nem sempre é fácil. Porém, sendo aceite que:

• As fases estão todas interligadas, não se conseguindo desenvolver qualquer uma

delas abstraindo de outras; • Os cavalos são todos diferentes, cabendo à decisão do cavaleiro experiente, adaptar

a sucessão das fases para chegar aos objectivos; • Na prática, os elementos da ‘Escala’ correspondem aos pilares básicos do treino para

chegar a um cavalo ‘Calmo, p’ra Diante e Direito’; Sendo isto aceite, dizíamos, tampouco há razão para se alterar a ordem da ‘Escala’, mantendo-se assim, como o ‘Guia Oficial’ válido na actualidade.

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IV.- IMPULSÃO “…a vontade de avançar é o coração e a alma da equitação e começa na actividade dos posteriores do cavalo.”

Ludwig Seeger (1794-1865) É a predisposição constante para avançar, calma e generosamente, com passadas elásticas e entrada dos posteriores, à menor ‘solicitação’ ou, ainda melhor, à primeira ‘permissão’ do cavaleiro.

…Á ‘permissão’ do cavaleiro: Sublime! …À ‘solicitação’ do cavaleiro: Bom! Logo que o cavalo está descontraído e confiante e se mantém estável na mão, pode solicitar-se mais actividade nas passadas. Os membros anteriores e posteriores devem flectir-se mais, o corpo do cavalo deve balançar (swing) com elasticidade. O cavalo deve mostrar vontade de avançar sem tensão e sem esforço por parte do cavaleiro.

A Impulsão revela-se quando se deixa passar a energia acumulada. Quanto maior for a energia acumulada, maior será o desejo de avançar. (Tal como o regador, quanto mais água tiver, maior será a força e a quantidade do jorro que produz.)

Nada mais triste que um cavalo que, pura e simplesmente, não avança. Só o chicote do ajudante pode ajudar a resolver momentaneamente a situação, que se repetirá na primeira ocasião. O cavalo não está à frente das pernas.

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Com Impulsão a ‘Flexibilidade’ evolui no sentido da ‘Elasticidade’ desenvolvendo-se um estado de ‘tensão’ favorável aos conceitos da Escale de Treino. Essa ‘tensão’ será física ou mecânica (Positive Body Tension) e também, e não menos importante, ‘anímica’. A máxima expressão da Impulsão é o suave balançar do dorso sustentado por um também suave Contacto com a mão do cavaleiro, no Trote e no Galope.

O aumento de amplitude dorso-ventral dos movimentos é amortecido pelos músculos do dorso do cavalo e o cavaleiro não tem dificuldade em os acompanhar comodamente com uma boa colocação na sela. O correcto desenvolvimento da natural Impulsão é de fundamental importância para a preparação da Concentração. É com esta fase que começa o desenvolvimento do ‘Poder de Sustentação’. Manifestando-se com mais ou menos expressão conforme a energia armazenada na aproximação ao salto, constitui um dos ‘Factores de Decisão’, juntamente com a Velocidade (ou Ritmo) e o Equilíbrio, em Equitação de Obstáculos. Na prática a Impulsão desenvolve-se principalmente com:

• a conquista da vontade do cavalo • domínio das espáduas e das ancas • variações de andamentos, transições e meias paragens • a mão, que regula e dirige a força e o movimento • as pernas, que actuam repetidamente

Impulsão Natural Ao contrário do que pode parecer, os cavalos com uma Impulsão Natural muito desenvolvida podem tornar-se difíceis de treinar quando se avança na Escala de Treino. Não são capazes de variar o comprimento das passadas e manter o Ritmo, a Souplesse e a Impulsão. Assim, a Impulsão desejada para o desenvolvimento da ‘capacidade de resposta às ajudas’ é a adquirida pelo treino e não a congénita.

Segundo as mais recentes directivas da FEI ‘não pode haver Impulsão no Passo porque não há momento de suspensão’. Esta ideia não deixa de ser, no entanto, algo polémica. Podemos aceitar que a palavra ‘actividade’ no passo pode substituir a ideia de ‘impulsão’ neste andamento. Então e no Piafer, em que também não existe tempo de suspensão mas em que o conceito de ‘impulsão’ é levado ao extremo, que termo devemos usar?

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V.- RECTITUDE

“Só um cavalo Direito pode desenvolver todo o seu potencial” Elmar Pollmann-Schweckhorst

Os cavalos, como os humanos, têm um lado melhor que o outro, mais forte e mais capaz. E usam-no tanto mais, quanto mais difícil for o exercício que lhes pedimos. Nós queremos o cavalo direito, desenvolvendo o seu corpo simetricamente, para evitar defeitos físicos

provocados pelo excesso de trabalho do lado mais forte.

A Rectitude verifica-se nas linhas direitas e na simetria das encurvações nos cantos, nos círculos e nos trabalhos laterais. O cavalo é igual para os dois lados na ‘Souplesse’ e no ‘Contacto’.

Nos movimentos em uma pista os posteriores empurram na direcção do centro de gravidade e seguem a pista dos anteriores (tal como as carruagens de um comboio seguem a linha umas das outras).

Os defeitos de Rectitude corrigem-se com os exercícios laterais. Cedência à perna, Ladear, Travers e Renvers, Rotações directas e inversas e principalmente a Espádua a Dentro, com todas as suas vantagens ginásticas próprias. Também o Galope ao Revés pode prestar um grande serviço para o efeito.

O desenvolvimento da Rectitude num cavalo Impulsionado é essencial para a preparação da Concentração.

Deficiências de Rectitude na equitação de obstáculos levam a abordagens e a trajectórias defeituosas, recusas, enfim, a desempenhos sofríveis.

• Na Equitação de Obstáculos a Rectitude é um meio para atingir os objectivos;

• Na Dressage pura é um meio e um objectivo a atingir.

Mal : deitado sobre a volta Bem: equilibrado na volta

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VI.- CONCENTRAÇÃO (Reunião) Há um encurtamento da base de sustentação por avanço dos posteriores. O peso desloca-se para o postmão permitindo mais liberdade do antemão.

O grau de Concentração depende da dificuldade do movimento. O Contacto continua ligeiro. Os efeitos das ajudas do cavaleiro percorrem o corpo do cavalo desde a boca até às pernas e vice-versa.

A Concentração tem vários graus: o mais elevado é atingido nos ares de alta escola como passage, piafer, piruetas e levada. Aqui a entrada dos posteriores e o abaixamento das ancas é evidente, ligado a uma grande ligeireza e mobilidade do antemão no cavalo que assume uma atitude particularmente erguida e fixa.

Mas mesmo nas reprises de CCE, algum nível de Concentração é pedido nos exercícios de espáduas a dentro e ladeares, nas transições e no galope.

Para o cavalo saltador a facilidade em se Reunir ajuda muito ao controlo nas interdependências. Se o Ritmo é o mais importante nos cavalos novos, a facilidade em se deixar Reunir é importante para regular a passada e acertar o ponto ideal da batida para ‘limpar’ um salto de grandes dimensões.

Transições trote-galope-trote, meias paragens, paragens, recuar, meias piruetas, rotações directas, exercícios laterais, são trabalhos de eleição para desenvolver a Concentraçtação no plano, tanto na Dressage pura como na Equitação de Obstáculos. Os saltos na volta completam a ginástica dirigida neste sentido.

No Galope, as ajudas para a Reunião devem ser dadas no 3º tempo.

É o último grau da Escala de Treino cujo desenvolvimento serve, no entanto, para melhorar o brilhantismo de todo o resto do trabalho do cavalo.

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Seja qual for o grau de Concentração exigido, a maior flexão dos posteriores provocada pelo seu avanço e pelo abaixamento das ancas, desenvolve as suas Forças de Propulsão e de Sustentação dando maior elevação e projecção aos movimentos.

CAPACIDADE DE RESPOSTA ÀS AJUDAS

“ Os exercícios ginásticos para a Souplesse, Equilíbrio, Obediência e Concentração não devem ser poupados. Sem estes exercícios, nenhum cavalo terá movimentos livres e fáceis.”

La Guérinière (1688 – 1751) Com a aplicação deste método de trabalho faseado desenvolvem-se os seis conceitos que são as ‘características do cavalo bem trabalhado’. O cavalo fica, todo ele - a sua anatomia, esqueleto, músculos, articulações e espírito – mais disponível e predisposto para responder positiva e prontamente às Ajudas do seu cavaleiro. A harmonia do conjunto cavalo/cavaleiro torna-se completa revelando uma total ‘cumplicidade’ entre um e outro.

A posição hierárquica do cavaleiro deve ser aceite naturalmente pelo cavalo, sendo aquele capaz de lhe transmitir «liberdade através de submissão e movimento para diante através da capacidade de resposta às ajudas».

Alongamentos e encurtamentos, paragens e meias paragens e recuar, são os exercícios de eleição, que também servem de teste, para o desenvolvimento desta Capacidade de Resposta às Ajudas e que valem para a Equitação de Obstáculos, para a Dressage pura ou para qualquer outra modalidade Equestre. Este é o objectivo geral da Escala de Treino.

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Terminada a análise dos conceitos da Escala de Treino, é oportuno, mais uma vez, fazer o ponto da situação em relação a alguns assuntos que nos parecem discutíveis.

• O ‘Ritmo’ não está considerado como um conceito envolvido na fase de ‘desenvolvimento da força propulsora’! Será que não é? Não é através do seu desenvolvimento que se estimula a actividade dos movimentos para diante?

• A ‘Impulsão’ antes da ‘Rectitude’! Se é verdade que não é possível desenvolver a ‘Rectitude’, nomeadamente por intermédio dos exercícios laterais, sem ter garantida uma boa ‘Impulsão’, não é menos verdade que, trabalhar a ‘Impulsão’ de um cavalo com faltas de ‘Rectitude’, é uma tarefa quase escusada.

Devemos ser sensatos ao aplicar ou exigir a sequência dos conceitos da Escala e aceitar que:

“Todas as fases e os conceitos da Escala de Treino estão interligados. De facto a Impulsão é baseada na Souplesse pelo ‘souple’ jogo dos músculos que se contraem e distendem alternadamente. A Souplesse é desenvolvida por um bom Ritmo dos movimentos. O Ritmo também indica se a Impulsão que estamos a produzir é a correcta. Impulsão com defeitos de Ritmo não pode ser Souple e não pode desenvolver a ‘capacidade de resposta às ajudas’. Souplesse, Ritmo e Impulsão só podem ser conseguidos se o Contacto for correcto e só um cavalo com uma boa Rectitude se movimenta com um bom Contacto para as duas mãos. Mudanças de velocidade são a medida de eleição para produzir Impulsão e isso requer facilidade de Concentração a qual é impossível num cavalo sem Rectitude.”

Elmar Pollmann-Schweckhorst

Na realidade, bem antes de se falar na ‘Escala de Treino’, já Antoine Pluvinel relacionava várias das suas fases ao escrever que:

“Os trabalhos de Concentração, executados correctamente, tornam o cavalo leve e elevado, colocam-no sobre os posteriores e obrigam-no a empurrar-se como um todo; isso fá-lo aceitar prontamente as ajudas de mãos e de pernas. Permitem-lhe executar melhor os exercícios que lhe sejam pedidos e tornam consideravelmente mais fácil o conjunto das situações.”

Antoine Pluvinel (1555-1620)

• O ‘Equilíbrio’ não é contemplado na Escala! No entanto, num estágio de CCE que fiz em Janeiro deste ano em Saumur, com os treinadores e o Director Técnico de CCE da FFE, a maior parte do trabalho foi no plano, claro, e a palavra de ordem do treinador Jean Pierre Blanco era ‘Équilibre!!!’ . E o que acontece é que, ao preocuparmo-nos principalmente com o ‘Equilíbrio’ dos nossos cavalos, as fases da Escala acabam por se impor naturalmente e à medida das particularidades de cada cavalo. Assim sendo, não devia este conceito aparecer na Escala? Parece-nos que sim e mais: por ser um conceito fundamental em todas as fases e em todas as modalidades, sendo na Equitação de Obstáculos um dos três Factores de Decisão na abordagem ao salto, devia ter o mesmo realce que, por exemplo, a ‘capacidade de resposta às ajudas’.

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Posto isto e porque creio que a Equitação Académica, os seus princípios e os seus conceitos são algo que vai continuar a evoluir, ou a transformar-se, ou a adaptar-se, ouso apresentar duas propostas alternativas ao esquema da ‘Escala’ que apresentámos atrás, como eventuais candidatas a serem a ‘ESCALA DE TREINO’ num futuro mais ou menos próximo ou longínquo: PROPOSTA I

Equilíbrio +

Capacidade de Resposta às Ajudas

Neste curioso diagrama proposto por Elmar Pollmann-Schweckhorst no seu interessante livro ‘Training the Modern Show Jumper’ pode imaginar-se uma

segunda dimensão: todos os seis conceitos da Escala interagem igualmente em vez da ordem hierárquica da apresentação clássica. Aqui a ordem dos conceitos é vista de baixo para cima, em sentido ascendente, sendo a ‘Souplesse’ o ponto de partida.

Tudo gira em torno do ‘Equilíbrio’ e da ‘Capacidade de Resposta às Ajudas’

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PROPOSTA II

Nesta segunda proposta, os três Princípios do Ensino de Base do cavalo evoluem para os três estados da Equitação Superior através do desenvolvimento da Confiança, da Compreensão da Força Propulsora e do Poder de Sustentação. As últimas fases da Escala, assentes no desenvolvimento do ‘Equilíbrio’ e da ‘Capacidade de Resposta às Ajudas’, avançam em sentido ascendente e são incontornáveis nesta evolução.

Não pretendendo ter esgotado este assunto, espero ter, no mínimo, levantado a ‘ponta do véu’ com uma interpretação própria da Escala de Treino que, sem fugir à sua filosofia geral, deixe no ar algumas questões que nos façam, mais reflectidamente, continuar a ensinar e a aprender sempre mais e melhor. Entremos de seguida na influência que estes conceitos podem ter na Biomecânica do cavalo de desporto.

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II Parte – Biomecânica do Cavalo de Desporto CONSIDERAÇÕES GERAIS O cavalo tem particularidades anatómicas, cuja análise exaustiva não cabe no teor deste trabalho. No entanto há duas destas particularidades que devemos lembrar e que estão na origem de todo este emaranhado de ideias, teorias, técnicas, pensamentos, tratados, etc., que constituem no seu todo o que é a Equitação:

• O facto de todo o seu enorme corpo se apoiar sobre as unhas (cascos) de apenas um dedo nas pontas de cada um dos seus quatro membros, obrigam aos maiores cuidados na sua criação e na progressão do seu treino. • A ausência das clavículas a unir os membros anteriores à coluna vertebral, que tem como consequência um desequilíbrio aquando da sobrecarga do antemão com o peso do cavaleiro.

Há que recuperar o Equilíbrio que o cavalo perdeu por acção do peso do cavaleiro

Assim temos que corrigir o Equilíbrio de maneira progressiva e lógica, compatível com a integridade física do nosso grande mas frágil atleta. Os músculos e as articulações mais móveis (dos membros) ou menos móveis (das vértebras) são as estruturas envolvidas na dinâmica dos vertebrados em geral. No caso do cavalo, é com base na Tensão da Coluna Vertebral que todo o mecanismo propulsor, constituído pelos movimentos de flexão, extensão, adução, abdução e rotação, desenvolve a sua actividade. E, duma maneira simplista, tudo se desenvolve em torno de quatro grandes articulações que são activadas por cinco grupos de músculos.

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São as ARTICULAÇÕES

da Maxila , da Nuca, do Garrote e das Ancas

e os GRUPOS MUSCULARES

Inversores do Pescoço Flexores do Pescoço

Elevadores da Base do Pescoço Extensores do Dorso e Rim

Flexores do Dorso e Rim.

Existem ainda dois Ligamentos – o Superior Comum e o Inferior – que dão apoio aos movimentos das vértebras.

Com respeito às quatro Articulações citadas, é sobre cada uma delas que o cavaleiro vai agir de forma a flexibilizá-las, ficando as articulações dos membros em segundo plano de importância. Na verdade os membros agem em função daquelas grandes articulações de comando: executam as suas ordens e sustêm o corpo. Sendo indispensáveis, só são úteis em função da coluna vertebral.

Com respeito aos Grupos Musculares e ao seu papel, é importante ter bem clara a diferença entre ‘descontracção’, em que os músculos se alongam, e ‘trabalho’, em que os músculos se contraem.

Os INVERSORES do pescoço (Esplénio e Rombóide, Dentado e Omo-transverso) opõem-se à elevação da base do pescoço e à entrada dos posteriores. São a causa da maior parte das resistências. O trabalho positivo será então no sentido de os alongar e descontrair através de encurvações e extensões do pescoço.

Nuca

Elevadores da base do pescoço

Flexores do dorso e rim

Flexores do pescoço

Maxilar

Extensores do dorso e rim Garrote Ancas

Inversores do pescoço

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Os FLEXORES do pescoço (Esternocefálico e Escaleno) trabalham no sentido do alongamento dos seus antagonistas Inversores e indirectamente favorecem a elevação da base do pescoço. Actuam ainda na elevação do gesto do antebraço. Deve-se, por isso, fazê-los trabalhar em contracção pela atitude de Ramener em trote concentrado e saltando obstáculos sobretudo a trote, etc.

Os ELEVADORES da base do pescoço (Grande Dentado, Peitoral Ascendente e Peitoral Escapular) têm um importante papel no equilíbrio do cavalo montado. Fazem subir o garrote entre as espáduas. Acabam por ser o centro da máquina ao provocarem a elevação do antemão, ajudando no início a recuperar o equilíbrio perdido com o peso do cavaleiro e, mais tarde, favorecendo o Rassembler. As descidas e os alongamentos do pescoço, as meias paragens e o trabalho em terreno variado são exercícios indicados para os fazer trabalhar.

Os EXTENSORES do dorso e rim (Longo dorsal e ílio-espinais) provocam, por contracção, a tensão da coluna vertebral o que permite aos músculos das espáduas e das ancas, encontrarem um ponto de apoio sólido. Ajudam a elevar a base do pescoço e contribuem para a distensão dos posteriores. Fazem-se trabalhar alongando e encurtando os andamentos e em terreno variado, sobretudo nas subidas.

Os FLEXORES do dorso e rim (Abdominais, Grande Oblíquo e Psoas) provocam a descida e o avanço da bacia e a consequente entrada dos posteriores com abaixamento das ancas. Estimula-se as suas contracções nos andamentos lentos, paragens e recuar. O trabalho das espáduas a dentro tem aqui um papel muito positivo.

RESUMINDO e sendo certo que o que se procura em todas as modalidades equestres é a distensão dos posteriores, é fundamental desenvolver os mecanismos que levam à sua flexão. Para isso, torna-se absolutamente necessário obter:

• o arqueamento do dorso • a elevação da base do pescoço • a flexão da nuca – Ramener • a descontracção da maxila

‘…o que se procura em todas as modalidades equestres é a distensão dos posteriores!’

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ESCALA DE TREINO, BIOMECÂNICA E GINÁSTICA Estando o conceito de Biomecânica ligado ao “estudo científico de sistemas vivos com base em princípios físicos”, só através de exercícios ginásticos se pode conhecer e desenvolver este conceito devidamente adaptado e aplicado ao cavalo de desporto.

No seguimento do tema principal deste trabalho – a Escala de Treino – devemos aceitar que a progressão ginástica da Equitação se processa em três fases:

• Iniciação • Confirmação • Aperfeiçoamento

A fase de Iniciação corresponde às três primeiras fases da Escala.

A ‘Flexibilidade’ lateral do dorso põe em jogo as contracções e as distensões unilaterais dos músculos Extensores e dos Flexores do Dorso acontecendo a mesma mecânica em relação às encurvações do pescoço. Os trabalhos de flexibilização lateral alternada, evitam que o cavalo se ‘inverta’ pela contracção bilateral do músculo Longo Dorsal. O desenvolvimento do movimento para diante (‘Ritmo’) numa atitude baixa e estendida arredonda o dorso do cavalo (Flexibilidade longitudinal e lateral) e leva-o naturalmente ao ‘Contacto’. Os movimentos naturais do cavalo são potenciados e começam a criar-se as condições para corrigir defeitos de ’Rectitude’. Assim, melhorando a actividade dos posteriores, começou também a desenvolver-se a sua Força Propulsora.

A fase de Confirmação corresponde na nossa Escala às fases de desenvolvimento ou de correcção da ‘Rectitude’ e da ‘Impulsão’ preparando a ‘Concentração’. Os exercícios laterais, nomeadamente a Espádua a Dentro, começam a levar ao avanço unilateral do posterior do lado da encurvação. Neste caso, as fibras dos músculos abdominais encurtam-se unilateralmente, à medida que o posterior do mesmo lado avança e o dorso ganha tonicidade. A base do pescoço eleva-se a pouco e pouco e a nuca flecte-se tornando-se o ponto mais alto. A mandíbula cede e temos a atitude do Ramener. Nesta atitude os membros anteriores ficam aliviados de peso e ganham elevação.

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Esta atitude deve ser consequência do movimento para diante sobre uma mão que recebe e cede ou resiste mas nunca da tracção das rédeas, sob pena de se obter a situação do ‘pescoço partido’ pela 3ª ou 4ª vértebra cervical. Durante esta fase, ainda, e tendo sempre em atenção que deve ser pelo avanço dos posteriores que se vai melhorando o Equilíbrio e a Atitude, o Ritmo vai-se tornando mais lento, com a mesma Impulsão os movimentos ganham elevação e brilho e o cavalo melhora a sua mobilidade e a sua Capacidade de Resposta às Ajudas.

Impu

lsão

Eleva

ção

Amplitude

Impulsão

Impu

lsão

Impu

lsão

Eleva

ção

Amplitude

Impulsão

Impu

lsão

Com uma Impulsão constante a Elevação e a Amplitude dos movimentos variam em ordem inversa.

A fase de Aperfeiçoamento corresponde à última fase da Escala de Treino.

É a ‘Concentração’ no seu nível mais avançado: O Rassembler. A base de sustentação encurta-se francamente por avanço dos posteriores, as ancas baixam, o dorso arredonda-se e o

antemão ganha uma ligeira e uma mobilidade extremas. As variações de movimentos, as rotações directas, as paragens e o recuar prepararam o cavalo que está agora biodinâmica e equestremente preparado para realizar os ares de alta escola como o piafer, a passage, as piruetas a galope e até a levada.

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Uma equipa de cientistas (Barrey E., Biau S. e outros) especializados nesta área da Biomecânica e da Cinética, têm desenvolvido vários programas de estudo da locomoção dos cavalos de desporto em que a ‘Ecole Nationale d’Equitation’ em Saumur está envolvida. As características dos andamentos são medidas com um equipamento patenteado – o ‘Equimetrix’ – apropriado e desenvolvido para o efeito.

Passamos a apresentar resumidamente alguns destes estudos e dos seus resultados que nos parece terem interesse para o nosso tema. BIOMECÂNICA E RÉDEAS AUXILIARES A literatura e os pareceres de cavaleiros experientes indicam que a posição da cabeça e do pescoço dos cavalos está relacionada com as características da sua locomoção.

Um dos estudos foi feito com o objectivo de quantificar o efeito de 3 tipos de rédeas auxiliares na locomoção a passo e a trote. Foram testados 8 cavalos numa guia mecânica sem rédeas, com rédeas fixas, com Chambom e com o ‘Back lift’. As primeiras fecham o ângulo da nuca, enquanto que as outras abrem-no. Dois aparelhos de medida dos movimentos de acelerações e reduções foram fixados no externo e no sacro dos cavalos para medir as características cinéticas dos anteriores e dos posteriores a passo e a trote.

Rédeas fixas ‘Back lift’ ‘Chambom’

Este estudo levou às seguintes observações:

• Os 3 tipos de rédeas modificaram significativamente o passo e o trote com maior aumento da propulsão dos anteriores no trote.

• As Rédeas Fixas aumentam a actividade propulsora dos anteriores no trote e a actividade dorso ventral dos posteriores no passo.

• O Chambom aumentou a actividade dorso-ventral dos posteriores no trote e a propulsão dos anteriores no passo.

• O ‘Back lift’ aumentou a actividade dorso-ventral dos anteriores no passo e no trote.

• O uso destas rédeas auxiliares modificou a posição da cabeça e a actividade dos membros.

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A ESCALA DE TREINO E AS CARACTERÍSTICAS DO TROTE Foi feito um outro estudo, com o mesmo equipamento do caso anterior, em 14 cavalos de sela franceses de 4, 5 e 6 anos de idade e durante 3 anos de treino de Dressage, com o objectivo de analisar as alterações nos andamentos impostas por esse treino.

Foi dada especial atenção ao andamento de Trote e às suas características definidas no regulamento da FEI. Foi assumida a sua importância na modalidade em questão por ser o andamento que está na base do treino para a Passage nos níveis mais avançados de Concentração, em que as forças de Propulsão e de Sustentação são determinantes.

Oito variáveis foram utilizadas para quantificar o Ritmo, Regularidade, Simetria e a Actividade vertical e longitudinal nas figuras das reprises de Dressage a trote.

Este estudo levou às seguintes observações:

• A Frequência das passadas diminui (Cadência) especialmente a partir do segundo ano de treino, estabilizando aos 6 anos de idade.

• A Actividade dorso-ventral (Souplesse e Impulsão) aumenta significativamente logo durante o primeiro ano de treino.

• A Regularidade decresce significativamente quando os cavalos param o treino.

• A Concentração dos andamentos diminuiu a Simetria (Rectitude) e a Regularidade provavelmente pelas acções dos cavaleiros.

• A Simetria também diminui no começo do trabalho nos cavalos novos.

Elevação do garrote, flexão e avanço do corvilhão e pequena flexão do carpo e do boleto no tempo de maior propulsão do trote (à esquerda), nada tem a ver com o contrário (à direita)

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A ESCALA DE TREINO E AS TRANSIÇÕES Do ponto de vista dinâmico e mecânico, as Transições são definidas por uma mudança de andamento ou de movimento sem solução de continuidade na mobilidade dos membros (excepto na paragem). É a periodicidade e o Ritmo desses movimentos que se altera num determinado momento.

Este outro estudo foi feito com o objectivo de descrever as Transições dos movimentos em cavalos de Dressage. Foi utilizado o mesmo equipamento ‘Equimetrix’ e mais um outro medidor de ondas de impacto ‘Morlet’.

Foram testados dezoito cavalos durante as suas reprises em competição com base em nove variáveis nas transições galope-trote, galope-passo, galope-paragem, trote-passo, trote-paragem e passo-paragem. As variáveis quantificaram a duração da transição e a energia e a frequência da actividade dorso-ventral, durante cada transição.

Verificou-se o seguinte:

• A combinação dos dois sistemas de análise permitiu descrever quantitativamente algumas características temporais e cinéticas das transições dos andamentos.

• A duração das transições, a actividade dorso-ventral e a frequência são específicas para cada transição.

• As variações de frequência e de energia são minimizadas com uma transição mais prolongada e o Treino melhora a suavidade na ‘travagem’ e ‘desaceleração’.

Imagem do medidor de ondas ‘Morlet’ na transição Galope-Paragem.

‘Actividade’ dorso-ventral (em cima)

e tempo-frequência-energia de ‘desaceleração/travagem’ (em baixo)

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BIOMECÂNICA E DIAGNÓSTICO PRECOCE DO POTENCIAL DOS CAVALOS Há características específicas nos andamentos dos cavalos para Dressage que são particularmente procuradas. È natural que se tente estabelecer e definir a heritabilidade dessas características para seleccionar os reprodutores e assim melhorar as performances dos cavalos e das raças envolvidas. No entanto, o treino dos cavalos influi demasiado nas suas performances e nas características dos andamentos, como vimos anteriormente. Para eliminar esse factor que pode mascarar o verdadeiro valor genético de determinado animal, importa pôr em prática sistemas de diagnóstico precoce das qualidades desejadas ou dos defeitos a eliminar.

O estudo que agora apresentamos foi feito pela mesma equipe e com o ‘Equimetrix’, associado desta feita a um estudo biométrico. Teve o objectivo de comparar características do passo e do trote e a conformação em cavalos novos de várias raças. A amostra foi um total de 142 cavalos de 3 anos de idade alemães, franceses e espanhóis.

Com toda a heterogeneidade de elementos encontrada e depois de trabalhados os dados obtidos a conclusão é a esperada:

• As características dos movimentos dos cavalos alemães são as mais adaptadas à Dressage de competição e os resultados deste grupo podiam ser usados como referência para uma avaliação precoce em Dressage.

• Os cavalos PRE podem ser considerados uma referência para movimentos recolhidos usados no trabalho do campo e na Equitação de Picadeiro.

• Estes testes de andamentos e conformação podiam ser aplicados numa raça ou num programa de cruzamentos para detectar com mais precisão cavalos novos com potencial para Dressage.

O estudo biométrico e as mensurações de conformação foram tirados de medidas na análise das imagens.

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A ESCALA DE TREINO E A LOCOMOÇÃO (Resumo dos estudos apresentados) A aptidão dos cavalos para a Dressage tem a ver com uma série de características: Conformação, Andamentos, ‘Montabilidade’ (Ridability), Temperamento, etc.

A genética tem alguma influência nestas características segundo as moderadas ou altas heritabilidades encontradas em algumas variáveis nos andamentos e conformação. Tem, no entanto, uma influência muito baixa na performance em competição porque o treino e o ambiente têm um efeito (físico e mental) preponderante.

Os cavalos de raças Alemãs e cruzadas estão mais adaptados à competição de Dressage a nível internacional porque as regras da FEI correspondem às características dos seus andamentos.

Para a selecção precoce de cavalos com aptidão para Dressage os testes de performance podiam ser complementados com o uso de um equipamento de análise de andamentos que fornecesse elementos objectivos e mensuráveis das suas características. Comparando os cavalos testados com os resultados dos melhores cavalos (reprodutores) novos dos Studbooks, é possível ganhar tempo na selecção de reprodutores desportivos.

O cavalo de Dressage deve ser alvo de um treino aturado, para um bom desempenho em competição a alto nível. A Concentração dos andamentos é uma etapa importante para a progressão técnica do cavalo. A Concentração do trote é crucial para a Passage e para o Piafer. Para se chegar a conseguir uma boa Concentração devem observar-se no cavalo algumas características básicas dos andamentos nas primeiras fases do treino: Ritmo lento, boa Propulsão e Actividade vertical, boa Amplitude dorso-ventral. Será o justo acordo das ajudas de propulsão e de sustentação por parte do cavaleiro que definirão o Equilíbrio do cavalo.

Mudança de posição do ponto de Equilíbrio / Centro de gravidade (•)

Atitude mais estendida – avança / Atitude mais recolhida – recua

Durante o treino, a análise dos andamentos pode ser feita para avaliar a execução dos exercícios, alteração da frequência das passadas, actividade vertical e longitudinal e transições de andamentos.

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Antes de terminar, aqui ficam ainda algumas considerações a respeito das

Características dos andamentos de cavalos de nível avançado.

O Trote

Para a extensão do trote revela-se importante a inclinação da espádua e a amplitude da articulação do curvilhão.

No trote concentrado aumenta a amplitude dorso-ventral à custa do armazenamento de energia e distensão elástica, nas articulações dos membros posteriores, incluídas as articulações da pélvis. Com o aumento da Concentração, a Força de Propulsão é mais utilizada para aumentar essa Amplitude dorso-ventral em detrimento do movimento longitudinal. Aqui, uma ligeira dissociação positiva das diagonais, no contacto com o solo, pode ser observada.

Ligeira dissociação diagonal Positiva (à esquerda) e Negativa (à direita) no contacto com o solo. A primeira ocorre nos movimentos mais concentrados e a segunda quando há deficiências de equilíbrio

Passage e Piafer

Apesar de terem características cinéticas diferentes são exercícios ou ‘ares’ de alta escola que se pode aceitar que derivam do trote concentrado e que têm em comum:

• Pescoço elevado, tendo a nuca como ponto mais alto e o chanfro na vertical (‘ramener’)

• A Concentração atinge o seu nível mais elevado (‘rassembler’)

• Contacto ligeiro (flexão da mandíbula)

• Flexão acentuada dos joelhos e dos curvilhões

• Grande elegância e elasticidade do movimento

A dissociação das diagonais pode tornar-se mais evidente sendo obrigatoriamente ‘positiva’ na Passage e ‘positiva ou negativa’ no Piafer conforme a mecânica especial que o cavalo tenha desenvolvido neste ‘ar’ em que a ausência de um verdadeiro tempo de suspensão leva a uma dissociação peculiar das diagonais.

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O Galope

Enquanto o trote e os andamentos trotados são movimentos simétricos, o galope e as suas variações são movimentos assimétricos, que põe em jogo algumas articulações de maneira diferente nomeadamente nos membros posteriores.

O ponto de rotação dos membros anteriores está na zona proximal da escápula.

Nos membros posteriores difere do ‘trote’ (meio da anca) para o ‘galope’ (ilion).

É um andamento a três tempos de apoio e um tempo de suspensão em que, novamente, no segundo tempo de apoio, a diagonal no solo pode apresentar uma dissociação, que é penalizada nas variações desde o galope concentrado até ao galope largo, mas que é aceite como natural no galope de corridas em máxima extensão (dissociação negativa) e nas piruetas em máxima reunião (dissociação positiva com ausência do tempo de suspensão).

As ‘passagens de mão’ no ar são feitas, como o próprio nome indica, no tempo de suspensão e a posição dos posteriores deve ser alterada antes dos anteriores.

O Passo

É um andamento a quatro tempos com um longo ‘tempo’ entre as fases de apoio dos membros. É o mais lento dos andamentos mas dos mais complexos devido à grande variabilidade daquele ‘tempo’.

Varia do passo concentrado (1,37 m/s) ao passo largo (1,82 m/s) com um simultâneo ligeiro aumento da frequência das passadas. No entanto, a variação da velocidade do passo concentrado para o largo deve ser consequência de um aumento do comprimento da passada pelo aumento do ‘transpistar’ do apoio dos membros.

Foram detectadas frequentes alterações na mecânica do passo concentrado que se atribuem a acções do cavaleiro.

Exercícios laterais como o ladear ou as piruetas, têm uma mecânica própria.

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III Parte – Conclusões Higiene e Maneio Não pode terminar um trabalho deste género sem se fazer alguma alusão, ainda que breve, a pequenas coisas que podem fazer a diferença para melhor ou, pelo contrário, tornar todo o trabalho em pura perca de tempo.

O estado geral deve ser observado diariamente. Cavalos com feridas, mau pelo, com o comportamento ou a expressão alterados, ou com claudicação, não podem dar rendimento nem progredir no trabalho

Uma alimentação, forrageira e concentrada, em quantidade e qualidade, adequada ao tipo de trabalho que se espera ou que se exige ao nosso cavalo. E aqui inclui-se a idade, a raça, a época do ano (electrólitos no Verão), etc. A própria água para beber deve de boa qualidade e à descrição.

A sanidade no que respeita às desparasitações e vacinações atempadas e oportunas.

A atenção devida ao estado dos dentes, à ferração e aos cascos, ao estado dos arreios e protecções.

Os pisos em que se trabalha são determinantes na evolução do trabalho. Um piso de má qualidade inviabiliza o Ritmo e a Souplesse, inviabilizando a evolução do resto do treino.

As camas e o ambiente em geral. Poeiras, correntes de ar, demasiado calor ou frio são inimigos do bem estar do nosso companheiro de grandes momentos.

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O Panorama Nacional Sendo a filosofia geral da Escala de Treino declarada e assumidamente ‘impulsionista’ e sendo a nossa tradição equestre baseada na utilização do nosso cavalo de tipo ‘barroco’ - o Lusitano - mais apto para uma equitação barroca, mais recolhida, parece, à primeira vista que tivemos azar.

Mas não: Os princípios e os conceitos da Escala dão-nos a oportunidade de transformar esse aparente azar num factor positivo. Na realidade, se os cavaleiros portugueses que fazem competição e sobretudo os que se dedicam à Equitação de Escola ou de Picadeiro, ou até à Tauromaquia, interiorizarem estes princípios e conceitos e os aplicarem convictamente no dia a dia, o nosso cavalo ganhará uma nova dimensão, por um lado e, por outro, ganhará finalmente critérios objectivos de selecção.

O próprio senhor Cristoph Hess, num seminário que fez, dirigido a criadores de cavalos Lusitanos, em Lisboa no passado mês de Dezembro apresentou a sua opinião sobre este nosso cavalo e, entre muitas outras interessantíssimas coisas, afirmou:

“… tem (o cavalo Lusitano) como pontos fortes a inteligência, a força, e o potencial para a concentração. Como pontos fracos, o dorso curto que limita a actividade dos posteriores. Assim, afirmava, deve dar-se especial atenção à Escala de Treino e segui-la fielmente, aos seus princípios e à sua filosofia.”

Estou certo de que os criadores, os cavaleiros e as instituições como a nossa Escola Portuguesa de Arte Equestre e os seus directores, terão tudo a ganhar se conhecerem e aplicarem esta Escala como uma orientação para o seu trabalho de treino e como fonte de elementos de selecção e de diagnóstico precoce de qualidades e defeitos dos seus animais.

Senão vejamos:

-Será fruto do acaso o estrondoso sucesso desse grande ‘Meneur’, Félix Marie Brasseur, campeão do mundo por duas vezes com cavalos Lusitanos, numa disciplina tão adversa para estes cavalos como é a Atrelagem? É claro que não pode ser fruto do acaso, nem da sorte e quem achar que sim, desengane-se. Quem teve oportunidade de trabalhar com ele e com ele partilhar e discutir as suas ideias e os seus métodos, sabe que aquele sucesso se deve a uma evolução lógica e académica do treino dos seus cavalos que não é mais que o rigor na aplicação da Escala de Treino devidamente adaptada aos objectivos da modalidade.

Temos a Filosofia, temos a Técnica, temos o Cavalo, temos o Exemplo! Estamos à espera de quê?

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Ética “Há um sério risco de cavalos sujeitos a ‘surmenage’ e a competições demasiado frequentes porque há mais dinheiro para ganhar. Cumprir uma bem planeada época de competições é cada vez mais difícil para os cavaleiros”

Dr. Reiner Klimke

A Ética tem a ver com moralidade e com uma responsabilidade geral primária de qualquer acção humana.

Mas…

Qual é a dimensão moral no treino de cavalos?

Até que ponto é que o homem pode usar o cavalo para seu próprio proveito?

Qual é o limite da resistência do cavalo ao stress?

Até que ponto as razões económicas podem influenciar o uso do cavalo?

Até que ponto pode o homem ignorar as necessidades naturais do cavalo?

Nenhuma destas questões pode ser respondida de ânimo leve. Os pontos de vista do criador, do proprietário, do tratador, do cavaleiro de lazer ou de competição, do negociante, serão sempre diferentes.

Quantos casos não há de cavalos que aparentam grande potencial em novos e, quando chegam a determinado nível não avançam mais? Não é nossa obrigação de ‘gente de cavalos’ apercebermo-nos disso e adequarmos as nossas exigências ou expectativas àquelas a que o cavalo pode corresponder? E quando acontece o contrário, em que um cavalo, à partida vulgar, se vai revelando cada vez mais e melhor, à medida que as questões se complicam?

Questões como estas e tantas outras devemos pôr-nos a nós próprios frequentemente para fortalecermos a nossa diferença como ‘seres pensantes’.

Page 80: Escala de Treino

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BIBLIOGRAFIA

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