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Fundação Educacional de Divinópolis- FUNEDI
Universidade do Estado de Minas Gerais -UEMG
Mestrado em Educação, Cultura e Organizações Sociais
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA TUBERCULOSE CONSTRUÍDAS POR PACIENTES
EM REGIME PRISIONAL
DIVINÓPOLIS, MINAS GERAIS
2009
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GUSTAVO DIAS ARAÚJO
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA TUBERCULOSE CONSTRUÍDAS POR PACIENTES
EM REGIME PRISIONAL
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Fundação Educacional de Divinópolis, unidade Universidade do Estado de Minas Gerais, como requisito à obtenção do título de Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais. Área de concentração: Saúde Coletiva
Orientador: Professor Doutor Gil Sevalho.
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DIVINÓPOLIS, MINAS GERAIS
2009
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Araújo, Gustavo Dias A663r Representações sociais da tuberculose construídas por pacientes em regime prisional [manuscrito] / Gustavo Dias Araújo. – 2009. 106 f., enc. Orientador : Gil Sevalho Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado de Minas Gerais, Fundação Educacional de Divinópolis. Bibliografia : f. 89-94 1. Tuberculose - Representação social. 2. Tuberculose - Regime prisional. I. Sevalho, Gil. II. Universidade do Estado de Minas. Fundação Educacional de Divinópolis. III. Título. CDD: 614.542
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AUTORIZAÇÃO PARA A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO CIENTÍFI CA DA DISSERTAÇÃO
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos de fotocopiadores e eletrônicos. Igualmente autorizo sua exposição integral nas bibliotecas e no banco virtual de dissertações da FUNEDI/UEMG.
Gustavo Dias Araújo
Divinópolis, 05 de abril de 2009.
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Dedicatória: Aos meus pais, Denise e Calazans, por minha vida.
Ao meu Avô Antônio pelo exemplo, amor e ajuda. A minha Avó Leila pelo carinho e fé na minha vida.
A esposa Michelle e Lívia por minha família. A Deus por ter-me dado tudo isto: Amo todos vocês.
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AGRADECIMENTOS
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho.
Ao meu Avô Antônio por acreditar em mim mostrando sempre honestidade, amizade, carinho e amor verdadeiro no caminho a trilhar. O senhor é e sempre será uma pessoa importante em minha vida.
Ao Professor Gil Sevalho pela amizade, pela participação e incentivo em todos os momentos do trabalho na orientação recebida.
Aos colegas do mestrado, pela grande amizade e principalmente pela presença constante em todos os momentos marcantes de minha vida.
Para o Senhor Deus, pois foi a tua mão que encontrei estendida, quando realmente precisei de um amigo. Foram teus olhos que fixei, quando me senti só. Tuas palavras me orientaram, mostrando o caminho correto, que eu não encontrava. Teu sorriso consolou-me. Sua força interior era tudo que precisava. E sempre acreditei em sua presença em minha vida, meu pai. Engraçado como em nossa vida passam milhares de pessoas a cada ano, essas pessoas chegam nos conquistam e por um motivo ou outro vão A cada dia plantamos uma nova semente, sem nunca esquecemos de cuidar daquelas que já estão desabrochando! Amizade é algo divino! Obrigado meus amigos pelo carinho. A minha família, muito obrigado, por estar ao meu lado nos momentos mais difíceis. Somente vocês me fazem ter certeza do caminho verdadeiro de amor, respeito, confiança e paz. Beijo a minha esposa e filha vocês são minha vida.
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“Não se contente em trilhar um caminho estabelecido.
Ao contrário, vá para onde não há caminho algum e deixe seu rastro”.
Muriel Strode
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RESUMO
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA TUBERCULOSE CONSTRUÍDAS POR
PACIENTES EM REGIME PRISIONAL.
Resumo: A tuberculose é uma das doenças mais antigas da humanidade, traz o peso de um histórico estigma e continua a ser um dos grandes desafios da Saúde Pública. Segundo a OMS (2002), a ocorrência da tuberculose na população prisional é maior do que na população em geral, embora dados qualitativos sobre esta questão sejam escassos no contexto brasileiro. O objetivo da dissertação apresentada é investigar as representações da tuberculose produzidas por internos do sistema prisional de uma cidade de médio porte do Estado de Minas Gerais. Realizou-se uma pesquisa qualitativa com entrevistas semi-estruturadas exploratórias, fundamentada na Teoria da Representação Social de Serge Moscovici. Segundo esta metodologia, foram entrevistados 5 presos no período de setembro a dezembro de 2008. Para a análise e interpretação dos resultados foi utilizado o método do Discurso do Sujeito Coletivo de Lefévre e Lefévre. Os presos com tuberculose, em seu discurso, percebem-se como alvo de preconceitos e violência em razão de sua condição. Isolamento, inclusive da própria família, dificuldades de ordem prática para o comprimento do tratamento no ambiente prisional, medo da morte e de represálias por parte dos demais presos são sentimentos e impressões que marcam as representações sociais encontradas no estudo. Os achados do estudo possibilitam a interpretação das representações sociais da tuberculose produzidas por pacientes em regime prisional, permitem uma aproximação da vivência dos presos com tuberculose, conformam um olhar sobre a dura realidade que marca suas experiências no ambiente da prisão. Palavras-chave: Tuberculose; sistema prisional; Representação Social.
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ABSTRACT
ABSTRACT: Tuberculosis is one of the oldest disease of humanity, it brings up a weight from a historical stigma and continuous to be a big challenge to Public Health. It’s known that (WHO, 2002) the occurrence of tuberculosis in the prison’s population is higher than in the general population, although qualitative data in this area is scarce in the Brazilian context. The objective of this dissertation is to investigate the representations of tuberculosis produced by interns of a prison system from a medium size city in Minas Gerais State. Methodology: It was done a qualitative research with semi-structure exploratory interviews, well- founded in the social Representation Theory of Serge Moscovici. According to this methodology, five prisoners were interviewed during the period of September to November in 2008. For the analysis and interpretation of the results, it was used the Collective Subject’s Speech method of Lefévre e Lefévre. Results: The prisoners with tuberculosis, in their speech, felt like targets of discrimination and violence due to their condition. Isolation, including from their own family, difficult in the accomplishment of the treatment in a prison environment, fear of the death, and others prisoners’ retaliations is feelings and impressions that mark the social representations found in the study. Discussion: The findings in the study make possible an interpretation of tuberculosis’ social representation produced by patients in a prison regime, it also can bring closer the prisoners with tuberculosis to a better social life, and form a vision over the tough reality which mark theses people experience in a prison environment. KEYWORDS: social representations, tuberculosis, prision.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1- Luiz XVI (1775) “Rei te toca e cura”...................................................................30
FIGURA 2- Cartaz da Inspetoria de Profilaxia, Rio de Janeiro, década de 1920.....................34
FIGURA 3- Cartaz da Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose, Rio de Janeiro, 1922............35
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QUADROS
QUADRO 1- Situação estimada nos 22 países prioritários-2002.............................................27
QUADRO 2- Monitoramento da Tuberculose nas unidades prisionais brasileiras..................27 QUADRO 3: Caracterização sociocultural e demográfica dos presos......................................59
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................. 15
2 OBJETIVO.................................................................................... 21
3 REVISÃO DE LITERATURA .................................................... 22
3.1 A tuberculose e sua Epidemiologia................................................. 23
3.2 História da Tuberculose................................................................... 27
3.3 História da Tuberculose no Brasil.................................................... 32
3.4 A Teoria da Representação Social.................................................... 38
3.5 Representação Social da Tuberculose.............................................. 41
3.6 Relações Interpessoais Prisionais..................................................... 45
3.7 A Política de Saúde Prisional........................................................... 47
4 METODOLOGIA .......................................................................... 48
4.1 Entrevista........................................................................................ 49
4.2 Seleção dos Entrevistados............................................................... 50
4.3 Critérios Éticos................................................................................ 51
4.4 Diário de Campo.............................................................................. 52
4.5 Triangulação de Dados.................................................................... 53
4.6 O Discurso do Sujeito Coletivo como Método para Análise das Representações
Sociais.......................................................................................................... 54
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS.............. 57
5.1 Cenário do Estudo............................................................................. 57
5.2 Caracterização do Perfil dos Entrevistados....................................... 58
5.3 Tabulação de Dados e Construção do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) 59
5.4 Interpretação, Análise e Discussão dos Resultados......................... 71
5.4.1 A tuberculose: o Preconceito Vivenciado pelo Preso Portador......... 73
5.4.2 A tuberculose: o Medo da Morte, o Isolamento, a Dificuldade de Cumprir o Tratamento
na Prisão...................................................................................................... 77
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5.4.3 As Relações Interpessoais Prisionais do Preso com Tuberculose e o Conhecimento da
População Carcerária em Relação à Doença................................................ 84
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................ 89
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................. 92
GLOSSÁRIO DAS ENTREVISTAS............................................... 98
APÊNDICE nº 01. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.... 99
APÊNDICE nº 02. Roteiro de entrevista............................................ 100
ANEXO nº 01. Parecer Comitê de ética............................................. 102 ANEXO nº 02. Autorização judicial.................................................. 103
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1 INTRODUÇÃO
Meu primeiro contato com pessoas com tuberculose se deu quando fui convidado para
trabalhar como enfermeiro em uma unidade prisional do Estado de Minas Gerais. Na ocasião,
tive a oportunidade de conhecer um pouco sobre a vida e o cotidiano dos presos, suas relações
prisionais e a forma deles conviverem com determinadas doenças, uma delas, em especial, a
tuberculose.
Atuando nessa unidade prisional cuidei de vários presos com tuberculose que, além de
cumprirem pena pelo seu crime, também não conheciam a doença e suas especificidades. Em
todas as consultas de enfermagem pude verificar que os presos solicitavam sempre muita
privacidade, conversavam à meia voz e cabisbaixos, para que os demais presentes na unidade
não os percebessem. Esse fato me intrigava, pois os presos assumiam atitudes de
autopreservação diante do diagnóstico de tuberculose, manifestando, em alguns casos,
sentimento de medo, culpa e vergonha.
Outro aspecto de destaque nesse processo é o isolamento social vivido pelo preso. A
falta de um suporte mais efetivo por parte dos profissionais de saúde, que deveriam manter
suas práticas educativas centradas na perspectiva informativa do preso doente ou sadio e dos
funcionários que trabalhavam nesta instituição não acontecia.
Sendo uma das doenças mais antigas da humanidade e também uma das mais estudadas,
a tuberculose continua a ser um dos grandes desafios da Saúde Pública em todos os países,
principalmente nos países em desenvolvimento. Provavelmente esta doença atravessará as
próximas décadas, consumindo uma grande parte dos recursos destinados à saúde e gerando
muito sofrimento e incapacidade física (HIJAR, 2001).
Do ponto de vista da biomedicina, a tuberculose (TB) é a doença infecto-contagiosa de
maior mortalidade mundial: cerca de dois milhões de óbitos ao ano e com aproximadamente
oito milhões de pessoas infectadas. É a principal causa de morte entre as mulheres e a segunda
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entre os homens, matando mais do que suicídios, guerras e hemorragias pós-parto (OMS,
2002).
O Brasil ocupa o décimo quinto lugar no mundo com casos de tuberculose, tendo
aproximadamente 116.000 mil casos, 6.000 óbitos e, aproximadamente, 100.000 novos casos
anualmente. Mundialmente o contágio da doença está ligado ao aumento da pobreza, à má
distribuição de renda e à urbanização acelerada. Países pobres possuem mais casos de
tuberculose do que os países ricos (cerca de sete vezes mais), por possuírem espaços urbanos
precários, falta de saneamento básico e grupos humanos em regimes especiais, sem nenhum
acompanhamento específico. Locais como favelas, mocambos, alagados e os regimes
prisionais são os principais focos desta doença. Em relação aos portadores, as infecções por
HIV/AIDS, adoecimento por sarampo, desnutrição, alcoolismo crônico, uso de drogas
imunossupressoras e a clausuras são os fatores determinantes para ser portador da doença
(OMS, 2002; FUNASA, 2002; HIJAR, 2001).
Em uma tese de doutorado de 2003, defendida na Universidade de São Paulo (USP),
onde se observou o diagnóstico da tuberculose na população carcerária dos distritos policiais
da zona oeste da cidade de São Paulo, observou-se à incidência da tuberculose nos presídios
superior a da população em geral. O coeficiente de prevalência de tuberculose por 100.000
detentos foi de 787 casos e pelo exame de cultura de bactérias 5.310, cerca de 30 e 203 vezes
maior que o da população da cidade de São Paulo (ABRAHÃO, 2003).
Muitos presos morrem nos presídios pela doença após terem recebido tratamento
médico, pois, este é de má qualidade. A carência de atenção à saúde, a precariedade de espaço
físico e a promiscuidade em que se encontram as pessoas privadas de liberdade são fatores
que as predispõem ao contágio e a mortalidade alta da tuberculose nesse espaço confinado
(HIJAR, 2001).
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Além de muitos presos morrerem pela tuberculose, os regimes prisionais semi-abertos,
as visitas íntimas, as saídas nos fins-de-semana e as transferências constantes favorecem a
transmissão dentro e fora dos presídios, o que aumenta a disseminação da doença
(AMARANTE, 2004).
A função do Sistema Prisional é proteger a sociedade contra o crime, cabendo
assegurar ao preso acesso aos direitos civis que lhe cabem, conforme a Constituição Federal.
O princípio de cuidados em saúde, na saúde prisional, norteados pela constituição federal de
1988, na composição doutrina igualitária e universal, serve para refletir sobre seguinte
questão:
“Deve servir de reflexão para aqueles que têm a responsabilidade de conceder ao detento o acesso à saúde que a pessoa livre, ao sentir dor, tem a responsabilidade de buscar o atendimento público ou privado; quando não atendido tem direito a acesso aos meios legais que lhe são garantidos constitucionalmente. Já a pessoa presa não tem a chave da cela para abri-la no momento da dor, não tem direito de sair livremente para buscar atendimento. Está sob a custódia do Estado, é conduzida (RONCALI, 2004).”
No que diz respeito ao cuidado da saúde do preso foi formulado o Plano Nacional de
Saúde no Sistema Penitenciário que reconhece a importância da implementação de ações e
serviços regidos pelos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), buscando
viabilizar uma atenção integral à saúde da população geral no Sistema Penitenciário Nacional.
O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário foi elaborado a partir de uma
perspectiva pautada na assistência e na inclusão das pessoas presas e respaldou-se em
princípios básicos que assegurem a eficácia das ações de promoção, prevenção e atenção
integral à saúde (BRASIL, 2005).
Em nível mundial a tuberculose tem-se destacado tanto como problema de saúde
pública como prisional. Em 2000, em uma conferência realizada em Amsterdã, da qual
participaram ministros de 20 dos 23 países mais ricos, além de entidades internacionais, foi
apontada a urgência do controle da tuberculose. Nesta reunião reiterou-se o compromisso dos
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países envolvidos em priorizar a luta contra a doença e enfatizou-se a importância de se
buscar parceiros em organizações não-governamentais para a realização desta tarefa
(BORGDORFF, 2002; RUIZ, 2002).
A Organização Mundial da Saúde, em 1993, diante do estado de emergência no mundo
que a tuberculose encontrava-se, foi recomendada a estratégia DOTS (direct observed
treatment shortcourse), que contempla: adesão política por parte das autoridades
governamentais; estabelecimento de uma rede laboratorial de baciloscopia; garantia de
medicação; um sistema de informação adequado e oferta de tratamento supervisionado
(BRASIL, 2002).
Mundialmente, diante do estado de emergência no mundo em que a tuberculose se
encontrava, a estratégia DOTS (direct observed treatment short course) contempla: adesão
política por parte das autoridades governamentais; estabelecimento de uma rede laboratorial
de baciloscopia; garantia de medicação; um sistema de informação adequado e oferta de
tratamento supervisionado (BRASIL, 2002).
No que diz respeito ao acompanhamento da administração do medicamento, a estratégia
DOTS, no Brasil, é o de programar quantitativos de medicamentos necessários para o
tratamento e separá-los para cada doente, orientando quanto ao uso da medicação e fazendo
supervisões diárias na unidade de saúde e no domicílio durante todo tratamento do portador
(BRASIL, 2002).
Na estratégia DOTS o tratamento supervisionado é componente central, exigindo
acompanhamento direto da administração do medicamento por um agente de saúde. O
quantitativo de medicamentos deve ser programado e devem ser realizadas supervisões e
visitas ao domicílio do doente para acompanhar o tratamento. O tratamento supervisionado
significa a observação direta pelo agente de saúde da administração de medicamento pelo
menos uma vez por semana durante o primeiro mês de tratamento. Espera-se que o tratamento
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supervisionado contribua para redução da resistência medicamentosa, para o aumento da
adesão ao tratamento e incremente os índices de cura.
No Brasil a estratégia DOTS integra as ações de saúde da família, mas, segundo
observadores (RODRIGUES et al., 2008), sua implantação tem sido tímida e sua cobertura
ainda é pequena diante da necessidade epidemiológica.
Borgdorff (2002) relata que no ano de 2000 houve uma intensificação de esforços
mundiais contra a tuberculose com objetivo de se reduzir em 50% a mortalidade pela doença
até 2010. Objetivo difícil de ser alcançado, apesar de todo empenho da “WHO DOTS” no
maior comprometimento para o combate à tuberculose, com a detecção de casos da doença
nos sintomáticos respiratórios em todo mundo e tratamento diretamente observado de curta
duração. Considerada a intervenção de maior impacto no combate à tuberculose, a ação não
garantiu um fornecimento regular das drogas antituberculose e um adequado sistema de
vigilância e monitoramento da doença.
Com a meta estipulada pelas Nações Unidas, FMI, Banco Mundial e G-8 de reduzir
50% dos casos de tuberculose no mundo até o ano 2010, as unidades penitenciárias se tornam
alvo dos estudos, por se tratarem de locais de grande contaminação, disseminação e fácil
tratamento ao nível ambulatorial (OMS, 2002).
Autores como Sontag (2002) e Goffman (1988) enfatizam que a tuberculose é uma
doença que envolve muito mais que a consupção do corpo, mas tabus e crenças de natureza
simbólica, cercados por um forte estigma, evidenciado desde épocas remotas entre diferentes
povos. Apesar dos avanços científicos que tornaram disponíveis tratamentos eficazes, ainda
hoje as crenças populares sobre a tuberculose parecem conservar muitas das imagens que
fizeram dela uma das doenças mais temidas em todos os tempos.
A proposta deste estudo nasceu da convergência dos aspectos até aqui apresentados, que
evidenciam a existência de muitas questões pouco conhecidas envolvidas com as experiências
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de quem vive com a doença e suas representações na contemporaneidade. A intenção foi a de
desenvolver um estudo com os presos de uma unidade prisional do Estado de Minas Gerais,
focalizando as representações e as experiências que eles têm do viver com tuberculose,
respondendo a seguinte questão: Qual a representação da tuberculose dentro do presídio?
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2 OBJETIVO
Conhecer as representações sociais da tuberculose produzidas por presos em uma
instituição penal de Divinópolis, Minas Gerais.
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3 REVISÃO DE LITERATURA
3.1 A TUBERCULOSE E SUA EPIDEMIOLOGIA
A infecção tuberculosa pode comprometer praticamente todos os órgãos, mas tem
especial predisposição pelos pulmões. Evolui segundo fases mais ou menos determinadas,
mas cada uma dessas pode apresentar diferentes tipos de evolução e apresentar complicações
diversas.
Descrita como doença infecto-contagiosa e endêmica, provocada pelo Mycobacterium
tuberculosis ou bacilo de Koch, a tuberculose pode atingir quase todos os tecidos do corpo,
em especial os pulmões com formação de tubérculos e corpos cavernosos. Somente pelo ato
de tossir, espirrar ou falar, a pessoa infectada expele milhares de gotículas no ar que contêm
cada uma delas um a quatro bacilos capazes de permanecer várias horas em suspensão para
aspiração e contaminação, fazendo com que as vias aéreas sejam a principal forma de
propagação da doença (BRASILEIRO FILHO, 2000).
Ao encontrar os mecanismos de defesa e alcançar os alvéolos pulmonares, o bacilo da
tuberculose ocasiona uma rápida resposta inflamatória, envolvendo macrófagos alveolares
residentes e neutrófilos rapidamente mobilizados resultando em uma rápida depuração dos
bacilos. Pode ocorrer, porém, uma falha nesse mecanismo, resultando em progressão da
inflamação e broncopneumonia inespecífica. Com isso o bacilo começa a se dividir e a
aumentar em número no foco de inoculação, principalmente porque nos primeiros quinze a
vinte dias de infecção o organismo ainda não desenvolveu uma resposta imunológica
específica que possa bloquear o processo de multiplicação celular (SOUZA, 2006).
O foco pulmonar, em geral, único e periférico e de consistência amolecida, é pequeno
e arredondado, tendo de 1 a 2 mm, sendo chamado de foco de Ghon. O período de tempo para
seu desenvolvimento é de cerca de três a quatro semanas. O momento do surgimento do
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tubérculo corresponde ao desenvolvimento da imunidade celular. Simultaneamente, a partir
do foco pulmonar, há uma disseminação linfática até o foco ganglionar, a partir de onde
haverá uma disseminação hematogênica para todo o organismo. Esse complexo, composto de
um foco pulmonar, linfangite e de um foco ganglionar, é chamado de complexo primário ou
de Ranke. No momento da disseminação hematogênica, o organismo, já com a imunidade
adquirida, impede o estabelecimento da doença da tuberculose, em 95% dos casos, encerrando
então, a primoinfecção (SOUZA, 2006).
Em indivíduos não imunizados ocorre um encapsulamento que resulta na formação de
uma lesão chamada de granuloma, que não é exclusiva da tuberculose, mas apresenta algumas
características morfológicas que, frequentemente, auxiliam no estabelecimento do diagnóstico
histológico da condição (SOUZA, 2006).
Para avaliação clínica denomina-se “caso de tuberculose” todo indivíduo com
diagnóstico confirmado por baciloscopia ou cultura, e aquele em que o médico, com base nos
dados clínicoepidemiológicos e no resultado de exames complementares, firma o diagnóstico
de tuberculose. Sendo “caso novo” a pessoa com tuberculose que nunca foi medicada ou se
medicou por menos de um mês por drogas antituberculosas (BRASIL, 2005).
Cerca de 1/3 da população mundial está infectada pelo bacilo de Koch, porém apenas
de 5 a 10% dos casos infectados desenvolverão a doença, não tendo como eliminar o bacilo de
todos os indivíduos infectados. Eles podem permanecer com os bacilos contidos pelas células
de defesa do organismo indefinidamente e só desenvolverem a doença quando tiverem as
defesas diminuídas (BRASIL, 2002).
Defesas imunológicas diminuídas, por exemplo, em pessoas infectadas com o HIV,
aumentam o risco em 10% de desenvolver a tuberculose em um ano, ao invés de 10% por
toda a vida para pessoas sem infecção pelo vírus, conforme a Organização Mundial de Saúde
(2002).
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Outras situações de risco incluem abuso de drogas injetáveis; infecção recente de
tuberculose nos últimos 2 anos; raio-x do tórax que sugira a existência de tuberculose (lesões
fibróticas e nódulos); diabetes mellitus, silicose, terapia prolongada com corticosteróide e
outras terapias imuno-supressivas, câncer na cabeça ou pescoço, doenças no sangue ou
reticuloendoteliais (leucemia e doença de Hodgkin), doença renal em estágio avançado,
gastrectomia, síndromes de mal-absorção crônicas, ou baixo peso corporal (10% ou mais de
peso abaixo do ideal), alcoolismo e drogas (BRASIL, 2005).
Calcula-se que uma pessoa bacilífera contamine cerca de 10 a 15 outras por ano na
comunidade com a qual tem contato, antes de iniciar o tratamento específico. A transmissão,
através da via inalatória, dificulta as chances de proteção humana. No Brasil, cerca de 90%
dos novos casos notificados apresentam a forma pulmonar da doença (BRASIL, 2005).
Conforme estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), durante a década de
1990-1999, um terço da população mundial estaria infectada pelo Mycobacterium
tuberculosis e ocorreriam no mundo 88 milhões de casos novos de tuberculose, dos quais, oito
milhões seriam atribuídos à infecção pelo HIV. Projeções feitas em 1995 indicaram que no
ano 2005 ocorreriam 11,9 milhões de casos novos de tuberculose. Do total de casos novos de
tuberculose estimados pela OMS, menos da metade é notificado, denotando a pouca
capacitação dos profissionais e a insuficiência nas políticas de controle da doença
(RAVIGLIONE E DES, 1995).
Em relação ao tratamento algumas medicações são utilizadas, sendo elas: Rifampicina
(R), Isoniazida (H), Pirazinamida (Z), Etambutol (E), Estreptomicina (S) e Etionamida (Et),
sendo estes de maioria oral. Os esquemas de administração da medicação estão baseados em
casos novos, recidiva e falência de outros tratamentos: Esquema I (Básico), 2RHZ / 4RH,
indicado nos casos novos de todas as Formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar;
Esquema II, 2 RHZ/7RH, indicado para a forma meningoencefálica da tuberculose; Esquema
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III (reforçado), 2RHZE/4RHE, indicado nos casos de recidiva após cura ou retorno após
abandono; Esquema IV, 3SZEEt/9EEt, indicado nos casos de falência de tratamento. A
duração do tratamento é caracterizado no Esquema I (6 meses), Esquema II (9 meses),
Esquema III (6 meses) e Esquema IV (12 meses) (BRASIL, 2002).
Monitorar a resposta ao tratamento também é uma ação importante no controle da
tuberculose. No caso dos bacilíferos, o controle do tratamento deve sempre ser feito pó meio
de baciloscopias mensais no escarro. Idealmente, durante todos os 6 meses de quimioterapia,
deve ser colhida amostra de escarro para exame bacteriológico direto, no 3º, 6º, 9º e 12º
meses, nos casos do esquema III e esquemas especiais (BRASIL, 2002).
A alta por cura se dá ao completar o tratamento para o paciente que apresentar duas
baciloscopias negativas: uma na fase de acompanhamento e outra no final do tratamento (cura
bacteriológica comprovada). A alta é dada com base em critérios clínicos e radiológicos,
quando da apresentação de baciloscopia negativa (BRASIL, 2002).
No Brasil estima-se que mais de 50 milhões de brasileiros estejam infectados pelo
bacilo da tuberculose. Calcula-se o surgimento de 110.000 novos casos de tuberculose a cada
ano, sendo que somente em torno de 80.000 deles seriam notificados. O número de óbitos por
tuberculose no Brasil ultrapassa os 6.000 por ano. O percentual de cura dos casos tratados é
de apenas 72%, quando deveria ser, no mínimo, de 85% conforme o Ministério da Saúde
(BRASIL, 2005).
Conforme estimativas de 2002, dos 22 países com maior carga de tuberculose mundial
foi notificada cerca de 6.910.000 casos/anuais. Neste grupo, a Índia ocupa a primeira posição
com 1.856.000 casos novos anuais, o Brasil, a l5º posição com 116.000 e o Afeganistão a
última com 70.000. Se classificados pelo coeficiente de incidência, o Zimbábue, que está em
21º lugar em número absoluto de casos, assume a liderança com 584/100.000 habitantes, e o
Brasil passa para o 22º com uma estimativa de 68/100.000 (QUADRO 1).
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Como mencionado anteriormente, os casos notificados de tuberculose no Brasil, nos
últimos anos, situam-se entre 80 e 90 mil casos novos/ano, conforme o Ministério da Saúde
(2005). Hijar (p.10, 2001) considera a seguinte apontamento:
“A distância deste número para o estimado pela OMS é enorme, e mesmo considerando-se a deficiência diagnóstica e a sub-notificação, fica difícil acreditar que se tenha de 20 a 30 mil casos desconhecidos a cada ano. Sabe-se, pela ausência de um modelo preciso, da dificuldade de estimar-se corretamente o número de casos, o que leva a uma reflexão sobre essas estimativas para que não se venha a recair em equívocos de planejamento e em frustrações quanto ao cumprimento de metas.”
Com relação aos custos financeiros, o mesmo é expressivo, considerando que a
tuberculose, dentre as doenças infecciosas, é a nona causa de internações, ocupa o vigésimo
sétimo lugar em gastos com internação (SUS), sendo a quarta causa de mortalidade no Brasil
(BRASIL, 2005).
A população prisional brasileira esta, atualmente, com cerca de 230.000 presos, sendo
50% menores de 30 anos, 95% são homens, pobres e 12% analfabetos. O Estado de Minas
Gerais possui, aproximadamente, 22 mil presos a maioria do sexo masculino e com
permanência média de 14 anos no sistema prisional (MINAS GERAIS, 2004).
Em 2005, do total de 22.000 presos em Minas Gerais foram examinados apenas 4995,
sendo destes, 11 casos confirmados de tuberculose (QUADRO 2). Os dados aparentam um
sub-registro de casos, no contexto de uma vigilância epidemiológica deficiente, já que em
países da Europa o número de casos é muito maior, mostrando a doença como aquela que
mais mata no sistema prisional mundialmente (OMS, 2002).
Frente à gravidade da situação mundial e à permanência em nível preocupante da
tuberculose em nosso meio seremos obrigados a conviver com as estimativas do Banco
Mundial, nas quais, em 2020 a tuberculose contribuirá com 55% das mortes observadas em
adultos nos países em desenvolvimento (HIJAR, 2001).
27
QUADRO 1 - Situação estimada nos 22 países prioritários, 2002.
ÍNDIA (1.856.000) TAILÂN DIA (88.000) CH INA (1.365.000) UGANDA (82.000) INDONÉSIA (595.000) M IAMAR (80.000) N IGÉRIA (347.000) MOÇAMBIQUE (79.000) BANGLADESH (332.000) CAMBOJA (75.000) ETIÓPIA (249.000) ZIMBABUE (74.000) FILIPINAS (249.000) AFEGANISTÃO (70.000) PAQUISTÃO (247.000) AFRICA DO SUL (228.000) RÚSSIA (193 .000) CONGO (163.000) QUÊNIA (149.000) VIETNÃ (148.000) TANZÂNIA (126.000) BRASIL (116.000 ) Total dos 22 países= 6.910.000 (Total Mundo = 8.735.000) Fonte: WHO Report – 2002.
QUADRO 2 - Monitoramento da Tuberculose nas unidades prisionais brasileiras, 2005.
UF: MINAS GERAIS Nº UNIDADES EXISTENTES: 28 (somente 24 receberam as planilhas) Nº UNIDADES INFORMADAS: 15 POPULAÇÃO CARCERÁRIA INFORMADA: 4995 POPULAÇAO CARCERARIA DA UF: 8814 Nº sintomáticos examinados = 421 Nº de contatos de casos BK + examinados = 11 Nº de contatos que fizeram quimioprofilaxia = 10 Nº de testes para HIV realizados em pacientes com TB = 13 Nº de HIV positivos em pacientes de TB = 2 DATA: 17/02/2006 RESPONSÁVEL = Ailton C. Alves Junior. . Fonte: MINAS GERAIS, 2007.
3.2 HISTÓRIA DA TUBERCULOSE
A tuberculose é uma doença que caminha junto ao homem durante séculos, sendo
encontradas evidências da enfermidade em esqueletos do período neolítico, entre 7000-3000
a.C na Alemanha e também nas múmias do Egito Antigo (BURNIE, 2005).
Burnie (2005) descreve que as manifestações da doença existem desde a Antiguidade,
particularmente entre os gregos. Hipócrates, impressionado com o emagrecimento progressivo
28
e debilitação do doente, designava a moléstia por tísica (phtisis, em grego), denominada
enfraquecimento do corpo.
Uma referência clássica a respeito da origem do termo é o estudo de Goffman (1988),
relatando que os gregos qualificavam, referindo-se aos sinais corporais que marcavam o
portador, o indivíduo como uma pessoa ritualmente poluída, com um status moral negativo, e
que deveria ser evitada, especialmente em lugares públicos.
Já os egípcios, considerados um dos povos mais sadios da Antiguidade, percebendo a
progressão em cadeia da tuberculose, mantinham seus doentes em isolamento de toda
comunidade. Na Roma Antiga foram descritos nos textos de Plínio, o Velho, também por
Galeno e por Areteu da Capadócia, os hábitos tísicos e a possibilidade de cura da doença por
meio do repouso e de climas melhores. Já entre os árabes, no século XI, Aviccena
compartilhava da opinião de que a tuberculose possuía natureza transmissível (BURNIE,
2005).
A magia desempenhou um papel importante na Idade Média, com o uso terapêutico de
amuletos, assim como a farmacopéia milagrosa. Prescrições de excreções de animais
repugnantes caminhavam ao lado de crenças absolutas nos poderes de demônios e feiticeiras.
Era natural a terapêutica através de exorcismos, sendo o sacerdote o substituto do médico, que
na época era impotente para curar doenças, acreditando que as mesmas estavam relacionadas
a “espíritos malignos” (BAILLY, 1950).
Foi nesse período que se originou a crença da cura da escrófula através do toque das
mãos do Rei, perdurando isso por muitos séculos. Pensava-se que os reis recebiam o poder de
curar após serem consagrados pelos “Santos Óleos”; somente quando este tratamento falhava
é que se aconselhava recorrer ao cirurgião. A tradição e o uso do poder de curar, como
atributo divino ou real, remontam desde épocas muito antigas. Imagens gregas de Esculápio
representam-no colocando as mãos sobre o doente para curá-lo. Escritos romanos falam de
29
imperadores curando cegos e outros doentes. A cura pela imposição de mãos também fez
parte da tradição cristã (BAILLY, 1950).
A escrófula foi conhecida na Inglaterra antiga como “Mal do Rei”. Encontra-se nas
crônicas de Eduardo, o Confessor (sec. X), o registro de curas obtidas pela imposição das
mãos reais sobre a parte doente. Em livros da casa de Eduardo I, há anotações sobre 43
pessoas tocadas pelo rei em quatro de abril, 192 pessoas na semana seguinte e 288 pessoas na
Páscoa do ano de 1277. Até Shakespeare refere-se à cura ao toque real em seu livro
“Macbeth” (BAILLY, 1950).
Bailly (1950) relata que nesta época, o rei da França também reivindicava para si o
mesmo poder milagroso. O rei preparava-se por meio de jejuns e orações junto aos túmulos,
local onde recebia os pacientes que desfilavam diante dele à procura da cura. O rei colocava
os dedos sobre a parte doente, fazia o sinal da cruz e pronunciava as palavras: “O Rei te toca e
Deus te cura” (FIGURA 1). O doente era abençoado e recebia comida e dinheiro para voltar
para casa.
Existiram divergências sobre a prioridade dos reis da Inglaterra sobre os reis da França
com relação ao toque real. Os franceses afirmavam que foi Clóvis (496 d.C.) o primeiro a usar
o poder de curar. Os ingleses retrucavam dizendo que os reis da França herdaram este poder
dos seus parentes, reis ingleses. Na Inglaterra, a prática caiu em desuso pouco tempo depois.
Na França, ela permaneceu até o século XIX. Há referências que Luiz XVI, quando de sua
coroação em 1775, tocou 2400 pacientes e Carlos X, em 1824, 121 doentes (BURNIE, 2005).
30
FIGURA 1 - Luiz XVI (1775) “Rei te toca e cura” FONTE : www.historiadatuberculose.com.br
Já no século XVIII, a tuberculose adquiriu o nome de Peste Branca em oposição à
Peste Negra (Bubônica), e seus índices de mortalidade eram altos por toda Europa. Devido a
isso, o rei Fernando VI, da Espanha, ordenou que os médicos informassem às autoridades de
saúde todos os casos de tuberculose, o que não deixava de ser um primitivo sistema de
notificação e controle para a época. Os doentes eram afastados da sociedade e, entre estes,
esteve o famoso músico Frederic Chopin, cujas roupas e objetos foram incinerados por medo
da população em contrair a doença (BURNIE, 2005).
Na Renascença, por volta do século XVI, o médico Gerolamo Fracastoro (1478-1553)
intuiu que a doença se transmitia por via aérea pó meio de um provável agente vivo eliminado
pelos doentes, e também recomendava o isolamento sanatorial como forma de controle da
doença. Fracastoro foi quem melhor formulou uma teoria para explicar a origem das doenças
epidêmicas, quando definia o contágio causado por infecção de partículas imperceptíveis,
denominadas semminaria, transmitidas de forma direta por meio da pele, ou indireta, por
meio de objetos ou, ainda, à distância, sem mediação. Percebe-se que a principal contribuição
do médico italiano foi buscar a identificação de um princípio, uma causa para a origem da
31
doença e não mais considerá-la como resultante de um desequilíbrio do corpo humano ou da
natureza (BURNIE, 2005).
As idéias de Fracastoro, no entanto, foram muito combatidas, predominando o
conceito de transmissão da tuberculose pelos de gases “podres” eliminados pelos pacientes, os
denominados miasmas. Somente em 1865, Jean Antoine Villemin (1827-1892) demonstrou,
experimentalmente, a transmissão aérea da tuberculose através do desenvolvimento da doença
em cobaias expostas aos indivíduos doentes. Villemin propôs que um agente vivo seria o
responsável por isso, organismo que só seria identificado em 1882 por Robert Koch
(BURNIE, 2005).
Em uma noite de 24 de março de 1882, o médico alemão Robert Koch iniciou sua
conferência, relembrando para o público as terríveis estatísticas sobre a tuberculose: esta
deveria ser considerada como marco importante pelo número de mortes que provocava. Nesta
época, um em cada sete pessoas morria pela tuberculose no mundo. Considerada por muitos
como a conferência mais importante de toda a história da medicina, Robert Koch foi inovador
e inspirado ao levar para a tribuna praticamente seu laboratório inteiro: microscópios, tubos
de ensaio com culturas, lâminas de microscópio, corantes, reagentes, amostras de tecido e
tudo o mais necessário ao convencimento da audiência. Robert Koch (1882) colheu, analisou
e demonstrou tecidos dissecados de cobaias infectadas com materiais tuberculosos extraídos
de pulmões de macacos, cérebro e pulmões de humanos que morreram vitimados pela doença,
massas caseosas de pulmões cronicamente doentes e cavidades abdominais de gado infectado.
Paul Ehrlich, cientista que em 1908 seria laureado com o Nobel de Medicina, estava
presente e confessou que “esta noite foi a mais importante experiência de toda sua vida
científica!” (BURNIE, 2005, p.12):
“Quando Koch terminou a apresentação da sua descoberta - o Micobacterium tuberculosis -, o causador da tuberculose houve um completo silêncio na platéia. Nenhuma questão, nenhuma congratulação, nenhum aplauso. Todos pareciam atordoados. Lentamente todos se levantaram e dirigiram-se aos microscópios para ver a bactéria com seus próprios olhos.
32
Rapidamente a notícia se espalhou. Os resultados foram publicados na Alemanha em 10 de abril, no “The Times” inglês no dia 22 de abril e no “The New York Times” no dia 3 de maio. Robert Koch tornara-se então famoso e tornou-se conhecido como o “Pai da Bacteriologia”. No entanto, somente em 1905, e após 55 nomeações ao Prêmio Nobel, foi reconhecido com o prêmio “por suas investigações e descobertas em relação à tuberculose” (EHRLICH, 1906, citado por BURNIE, 2005, p.22).
No entender de Gonçalves (2000), a identificação do bacilo como agente etiológico foi
um marco fundamental para o conhecimento dos mecanismos das doenças. Em relação à
tuberculose, a descoberta do raios-X por Wilhem Conrad Von Roentgen (1845-1923), em
1895, trouxe outra importante contribuição para o diagnóstico e acompanhamento da
tuberculose.
O rápido desenvolvimento das técnicas radiológicas, que envolveram desde as
radiografias convencionais, passando pela fluoroscopia e chegando à tomografia,
proporcionou melhor estudo e mais adequada monitoração da doença no século XX. No
campo da radiologia destacou-se o brasileiro Manoel Dias de Abreu (1892-1962) que, com a
invenção da roentgenfotografia em 1936, posteriormente aclamada como abreugrafia,
possibilitou o estudo radiológico em massa da população e de baixo custo, causando na época
uma revolução nos métodos diagnósticos da tuberculose (GONÇALVES, 2000).
A tuberculose é uma doença social que caminha com a humanidade, precisamos
entender a sua história para avançarmos em suas particularidades.
3.3 HISTÓRIA DA TUBERCULOSE NO BRASIL
A tuberculose (TB) no Brasil, assim como no mundo, tem transcendente impacto,
principalmente nos finais do século XIX e início do XX, quando morria a metade dos
indivíduos acometidos pela doença.
O primeiro contato com a doença, no Brasil, ocorreu entre colonizadores e indígenas,
o que resultou na disseminação da doença e dizimação de várias tribos. Documentos desta
33
época registram que tribos inteiras desapareceram devido ao contato com colonizadores com
gripe, tuberculose e varíola (BERTOLLI FILHO, 2002).
Com a epidemia da tuberculose em toda Europa, muitos jesuítas vieram ao Brasil em
busca da cura ou até mesmo pelo fato de terem sido expulsos de suas cidades por
apresentarem a doença:
“O jesuíta Manuel da Nóbrega (1517-1570) era doente do pulmão: em uma carta datada de 1557 ele dizia que freqüentemente cuspia sangue e sentia-se cada vez mais enfraquecido. Um ano depois informava que tribos inteiras com as quais ele havia entrado em contato não existiam mais” (BERTOLLI FILHO, 2002, p.01).
Bertolli Filho (2002) relata a criação no Brasil, em 1886, do primeiro hospital
especializado no tratamento dos tuberculosos pobres que se localizava em Cascadura,
subúrbio do Rio de Janeiro. No mesmo período, os doentes ricos buscavam a cura na Europa
enquanto aqueles que tinham poucos recursos dirigiam-se para as áreas montanhosas do Vale
do Paraíba.
Gonçalves (2000) relata que Campos do Jordão, conhecida como a Suíça brasileira,
tornou-se, em poucos anos, um município habitado quase exclusivamente por tuberculosos.
Vários sanatórios destinados à elite brasileira e sul-americana foram montados em imponentes
edifícios, ao passo que os pobres moravam em pensões ou em sanatórios gratuitos, enquanto
os miseráveis buscavam abrigo em cocheiras ou mesmo no mato, sendo freqüente que alguns
deles morressem em plena via pública:
“Acrescente-se que houve a opção pela análise da produção escrita dos tísicos que viveram momentos cruciais de suas existências nas duas cidades-sanatório paulistas, que escamoteavam esta condição sob o rótulo administrativo de “estâncias climáticas”. A mais importante delas foi Campos do Jordão que, localizada na serra da Mantiqueira, desde o final do século XIX concentrava muitas das esperanças dos tuberculosos brasileiros. A outra opção era São José dos Campos, município vale-paraibano que era recomendado àqueles que não contassem com pecúlio suficiente para se sustentar na vizinha Campos do Jordão” (BERTOLLI FILHO, 2000, p. 494).
34
Em relação ao tratamento no Brasil, doenças como tuberculose, lepra, alcoolismo e
outras, eram vista, na década de 1920, como alvo de campanhas de saúde. Dois cartazes da
Inspetoria da tuberculose, confeccionados no Rio de Janeiro na década de 1920, são exemplos
de iconografia volta para educação do povo.
Como podemos observar, a FIGURA 2 sugere uma nova postura de vida orientada por
formas de conduta saudáveis. A influência romântica na descrição da doença situa-se no
centro da composição, área estratégica, onde um grupo de mulheres simboliza a luta entre o
mal, o que é indicado por corpos que despencam em torpor, e sua prevenção é indicada por
outro corpo feminino em postura ascensional, portador dos emblemas do conhecimento e da
ação: fogo e a espada (SOARES, 2007).
FIGURA 2: Cartaz da Inspetoria de Profilaxia, Rio de Janeiro, década de 1920. Fonte: SOARES, 2007, p. 131.
35
Na FIGURA 3 aparece ainda mais claramente a tradição romântica que associa Eros a
Tanatos, representados por uma mulher seminua que apaga com as vestes num gesto delicado,
metáfora aérea por excelência, uma morte negra (SOARES, 2007).
FIGURA 3- Cartaz da Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose, Rio de Janeiro, 1922. Fonte- SOARES, 2007, p. 132.
No séc. XX alguns médicos eugenistas, principalmente os norte-americanos,
associavam a doença à variabilidade de raça. Acreditavam que pessoas negras eram as
36
principais formas de contaminação da tuberculose e a exposição em ambientes fechados com
pessoas de cor se tornava um risco de contaminação, o que mostra a discriminação da doença
na época (BERTOLLI FILHO, 2002).
Os preconceitos contra os tuberculosos aumentaram após 1930, quando o país estava
sob o mando de Getúlio Vargas (1882-1954). Os representantes do governo repetiam com
insistência que a tuberculose era causada por comportamento desregrado. O doente do peito
era duplamente traidor dos interesses nacionais porque não só deixava de trabalhar como
também passava a pedir esmolas para garantir seu sustento e o de seus dependentes. Falava-se
também que, por serem responsáveis pelo próprio adoecimento, os tuberculosos não deviam
exigir o apoio do governo, sendo os pedintes chamados de subversivos pelo governo
(BERTOLLI FILHO, 2002).
Em relação ao pensamento romântico, Gonçalves (2000) escreve que o pensamento
romântico envolvendo a tuberculose ampliava a capacidade criativa dos doentes levando
muitos pacientes a se dedicar à literatura e às artes. Um desses foi o jornalista Nelson
Rodrigues (1912-1980), que, internado em um sanatório de pobres de Campos do Jordão,
disse que naquela cidade “até os pardais eram tuberculosos”, e foi lá onde ele escreveu peças
que, quando encenadas, se tornaram um marco inaugural do moderno teatro brasileiro.
A imagem romântica do tuberculoso em um nível superior foi substituída pela noção
de que o fraco do peito era um perigo para a sociedade. Como exemplo, poucos meses antes
de morrer, o compositor Noel Rosa (1910-1937) hospedou-se em uma pensão localizada em
Barra do Piraí, no interior fluminense. Quando o proprietário do estabelecimento percebeu
que o poeta era tuberculoso, expulsou-o imediatamente, sendo todos seus objetos incinerados
(BERTOLLI FILHO, 2002).
As respostas brasileiras à tuberculose iniciaram-se na sociedade com as “Ligas Contra
a Tuberculose”, difundindo avanços científicos, como a vacinação BCG iniciada em 1927. A
37
Inspetoria de Profilaxia da TB (1920), o Serviço Nacional de Tuberculose (1940) e a
Campanha Nacional Contra a Tuberculose (1946) coordenaram políticas nacionais como o
uso da quimioterapia, iniciando com a descoberta da estreptomicina em 1944 no cuidado da
doença no Brasil (HIJJAR et al, 2007).
Em 1944 o médico russo naturalizado americano Selman Waksman anunciou a
descoberta da estreptomicina, antibiótico que se tornou o primeiro medicamento específico
contra a tuberculose. Distribuída no Brasil dois anos depois, a estreptomicina tornou possível
a cura dos tuberculosos sem a necessidade de isolamento em regiões montanhosas. Com isso,
em menos de uma década os sanatórios fecharam suas portas, a tisiologia como especialidade
médica chegou ao fim e diminuiu o preconceito contra os doentes, mas não o medo da doença
(BERTOLLI FILHO, 2002).
Nas décadas de 1970 e 80 foram verificadas altas taxas de cura com o tratamento da
tuberculose com isoniazida e rifampicina, o que resultou na ilusão de que a doença estivesse
sob controle, ocorrendo redução do interesse da comunidade acadêmica e da sociedade civil
acerca da tuberculose. O surgimento da resistência bacteriana levou ao desenvolvimento de
vários esquemas terapêuticos. O esquema I (rifampicina, hidrazida e pirazinamida), o
principal de 1979 e ainda em uso, teve grande impacto epidemiológico (KRITSKI et al,
2007).
Atualmente, mesmo após o controle epidemiológico da enfermidade pulmonar, a
tuberculose continua a inspirar temores (mesmo que hoje compartilhados pelo câncer e pela
Aids), principalmente relacionados à resistência aos antibióticos usados de forma irracional e
ao aumento da mortalidade por esta doença no mundo.
38
3.4 A TEORIA DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL
Ao refletir sobre as questões apresentadas, identificam-se as representações sociais
como um possível suporte teórico metodológico para este estudo. Percebe-se que as
representações estão fortemente alicerçadas na experiência de viver com a tuberculose,
envolvendo sentimentos próprios, relacionamentos familiares e profissionais, numa
compreensão que vai para além do aspecto social, mas que é também pessoal.
Foi inaugurada a teoria da Representação Social, segundo Sá (1996), por Serge
Moscovici em sua obra La Psycanalyse, son image et son public (1961, 1976), em fins dos
anos cinqüenta. A Representação Social, tal como é explicado por Arruda (2002), ganha na
psicologia social uma teorização desenvolvida por Serge Moscovici, passando a servir de
ferramenta para outros campos, incluindo a saúde.
Cardoso e Gomes (2000) afirmam que tentar conceituar a Representação Social de
Serge Moscovici e suas implicações na tentativa de conhecer o universo social dos homens,
em geral, se torna muito difícil. A Representação Social, no campo saúde e doença, se
apresenta como interpretação, concepção ou entendimento de vários espaços/tempos
históricos acerca do que seria a doença.
Moscovici (1981, p. 181, citado por Sá, 1996, p. 31) esclarece que:
“por representações sociais, entendemos um conjunto de conceitos, proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso de comunicações interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa sociedade, dos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem também ser vistas como a versão contemporânea do senso comum.”
A Teoria das Representações Sociais envolve um conceito para trabalhar com o
pensamento social em sua dinâmica e em sua diversidade. Parte do princípio de que existem
formas diferentes de conhecer e de se comunicar, guiadas por objetivos diferentes, formas que
são móveis, e define duas delas: a consensual e a científica (ARRUDA, 2002).
39
Segundo Moscovici (1981), o universo consensual seria aquele que se constitui
principalmente na conversação informal, na vida cotidiana; e o universo científico se cristaliza
na sua forma elaborada e positivista, com seus cânones de linguagem e sua hierarquia interna.
Ambos, portanto, apesar de terem propósitos diferentes, são eficazes e indispensáveis para a
vida humana.
Para Escudeiro e Silva (1997), essas percepções estão inseridas em três dimensões:
cognitiva, afetiva e social. A dimensão cognitiva está voltada para a construção do saber
social. A dimensão afetiva tem relação com o simbólico e o imaginário desses saberes, que
afloram na dimensão dos afetos fazendo com que os sujeitos sociais concentrem-se no seu
meio, com emoções e sentimentos. Essa significação simbólica faz parte do ser humano,
sendo ao mesmo tempo um ato de conhecimento, como parte das representações sociais, e
está na realidade social de cada ser humano, em nossa sociedade. A dimensão social, por sua
vez, estabelece-se na sua constituição compartilhada as imagens registradas a partir da
realidade vivida.
As Representações Sociais constroem-se mais freqüentemente nas esferas consensuais
e subjetivas, embora as duas esferas não sejam totalmente estáveis. A visão corrente
conceitual afirma que no universo consensual, aparentemente, não há fronteiras. Todos podem
falar de tudo, enquanto no cientifico só falam os especialistas. As pessoas seriam todas sábios
amadores, capazes de opinar sobre qualquer assunto numa mesa de bar, diferentemente do que
ocorre nos meios científicos, nos quais as referências e sua literatura regem os modos de agir
(ARRUDA, 2002).
Moscovici (1978) resgata do emaranhado de conceitos sociológicos e psicológicos a
definição de representação social que, para ele, é uma forma de conhecimento particular que
permite a elaboração de comportamentos e a comunicação entre os indivíduos. A esfera
40
consensual e subjetiva na era contemporânea se diferencia do passado porque é influenciada
principalmente pela mídia e os meios de comunicação.
A realidade é socialmente construída e o saber é uma construção do sujeito, não é
desligada da sua inscrição social. Assim, Moscovici propõe uma psicosociologia do
conhecimento, com forte apoio sociológico, mas sem desprezar os processos subjetivos e
cognitivos (ARRUDA, 2002).
O conhecimento desta relação social é qualificado como o “saber prático”, se referindo
a forma de agir do sujeito sobre o mundo e sobre os outros na tentativa de adequação da
realidade ou sobre as condições que lhe são impostas (ARRUDA, 2002).
Para Minayo (2004), a Representação Social é definida como categoria de
pensamentos e sentimentos que expressam dada realidade na medida em que a explicam,
justificam ou questionam uma determinada ação. Traçar um paralelo no campo da saúde e
doença na esfera da Representação Social é dar sentido à subjetividade vivenciada de cada
indivíduo em sua organização social coletivamente compartilhada, pois o mesmo adquire
identidade a partir de uma realidade possível de ser analisada e entendida.
“As representações sociais não são apenas esforço de formulações mais ou menos coerentes de uma especifica forma de saber, mas também são interpretação e questão de sentido” (HERZLICH, 1991, p.65).
Não se pode esquecer que diferentes grupos sociais experimentam concepções
diversificadas relativas à etiologia da doença, respondendo a uma lógica diferente daquela do
saber médico. Souza e Versignassi (2008) interpretam os fenômenos corporais da doença; as
pessoas se apóiam em noções, símbolos e esquemas de referências interiorizadas de acordo
com seus meios sociais e culturais, influenciados na contemporaneidade pela mídia. O
imaginário coletivo sobre a tuberculose e o descobrimento da doença dentro da humanidade
impõe sobre o sujeito uma identidade que exclui ou insere em determinada comunidade.
“A importância da saúde, da doença, do corpo, dos fenômenos biológicos enquanto objetos metafóricos e enquanto suporte do significado da relação dos indivíduos com o social vem aumentando proporcionalmente ao avanço
41
do crescimento do papel da ciência e das técnicas biomédicas” (HERZLICH, 1991, p.60).
3.5 A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA TUBERCULOSE
As representações sobre a doença são produzidas e reelaboradas constantemente. Os
significados a respeito da doença são construídos convivência rotineira no ambiente das
instituições de saúde. E as representações sobre a doença são determinadas pelas condições
sociais de inserção dos sujeitos sociais (BORGES, 1995).
A tuberculose é uma doença que se apresenta na sua representação social de várias
maneiras em diferentes momentos da história. No início do século XX a doença mortal
tuberculose era vista como o resultado inevitável de uma vida promíscua, em desacordo com
os padrões socialmente aceitáveis, ao passo que no século XIX a doença servia como forma
de inspiração para os românticos e suas poesias (PORTO, 2007).
Sontag (2007), em seu estudo sobre a tuberculose e o câncer, traça um comparativo
entre essas duas doenças, analisa a utilização irreal e muitas vezes primitiva, em nossa cultura,
da doença em sentido figurado, da doença como metáfora. Seu ponto de vista é o de que a
enfermidade não é uma metáfora e que o modo mais verdadeiro de encarar a doença e a
maneira mais saudável de ficar doente é resistir a esses pensamentos metafóricos. As fantasias
florescem porque o câncer e a tuberculose são vistos como algo muito além da sua condição
de doenças possivelmente fatais.
Historicamente a tuberculose pode ser entendida como uma doença de morte
relacionada ao pulmão, tosse, palidez, emagrecimento e face rosada. Já no século XVI e XVII
ligava-se à sexualidade, (SONTAG, 2007, p. 18):
“A tuberculose era- ainda é – vista como capaz de gerar períodos de euforia, de apetite intenso e de exacerbado desejo sexual. Ter tuberculose foi considerado afrodisíaco e fonte de extraordinários poderes de sedução. [....] animação que advém do nervosismo, faces rosadas que aparece sinal de saúde, mas provém da febre-e um surto de vitalidade pode ser o sinal da morte que se avizinha.”
42
No inicio do século XVIII a tuberculose assumia sua representação como forma de
atraente, “de ato de deleitar a imaginação”, vindo associando-se ao conceito de mágico,
“misterioso”, “inspiração” e sobretudo como estado da alma sem limites, conforme Praz
(1996). O pensamento valorizava, na época, tudo que remetesse a uma experiência incomum,
inédita e que elevasse o poeta:
“Eu desejo uma doença grave, perigosa, longa mesma (sic), pois já me cansa essa monotonia da boa saúde. Mas queria a tísica com todas as suas peripécias, queria ir definhando liricamente, soltando sempre os últimos cantos da vida e depois expirar no meio de perfumes debaixo do céu azulado da Itália, ou nomeio dessa natureza sublime que rodeia o Queimado” (MONTENEGRO, 1971, p.27).
O jovem que aspirasse a carreira de literato deveria ostentar um pouco de magreza, cor
pálida e tosse, como complemento dos dotes intelectuais. A tuberculose foi um recurso
utilizado por muitos poetas românticos no seu projeto de negação do mundo e de expressão de
sua desilusão para com a vida social (MONTENEGRO, 1971; PORTO, 2007).
Neste aspecto, Sontag (2007) relata a tuberculose como algo do tempo que acelera a
vida, a realça e a espiritualiza. No movimento romântico a doença permaneceu como a forma
preferida de dar sentido à morte. “O tuberculoso moribundo é retratado como alguém que se
tornou mais belo e mais elevado” (SONTAG, 2007, p.21), consumindo-se pela paixão. A
mudança de ambiente traria a cura, como se a doença fosse ligada às cidades úmidas e
encharcadas.
O século XIX configura-se como um período marcado pela queda definitiva de uma
antiga ordem político-social e pela conformação de uma nova ordem, avessa a paixões
exaltadas e articuladas à idéia de produtividade, a burguesia. Burguesia esta que valoriza o
corpo e o torna matéria prima primordial para produzir o produto a ser vendido. Sua
afirmação passava a depender, entre outras possibilidades, do cultivo “de novas atitudes
diante da doença” (PORTO, 2007, p.32).
43
O trabalho de construção de mecanismos de controle higiênico do corpo produtivo não
se organizou de uma hora para outra nem se desenvolveu de um modo linear. O que parece ter
acontecido, a partir da segunda metade do século XIX, foi a extensão para as classes
trabalhadoras das estratégias elaboradas pela burguesia ainda em finais do século XVIII. O
corpo burguês construído a partir de preceitos biológicos, médicos ou eugênicos deveria ser
expressão de expansão infinita da força, do vigor, da saúde e da vida. A tuberculose se
apresenta como doença que enfraquece o homem e o torna descartável para a época
(BERTOLLI FILHO, 2001).
A tuberculose não é vista mais como manifestação física de uma espiritualidade
elevada; ao contrário, è identificada com as populações desfavorecidas, sendo motivo de
preocupação por ser sintoma caracterizado por desordem social e baixa produção:
“Aquelle tipo que vês é um semeador da Morte. Se tivessemos leis mais sabias, mais previdentes, esse monstro, em vez de andar por aqui manchando, com seu luto, o esplendor desta tarde e compromettendo a vida, estaria em um asilo, segregado dos homens. // Está tísico. (...) Sabe que está perdido, di-lo a todos e, propositadamente, dissemina o seu mal” (COELHO NETO, 1924, citado por BERTOLLI; 2001, p.166-7).
Concomitantemente à identificação do agente causal da tísica, procedeu-se à revisão
das avaliações anteriores acerca dos infectados que, de sensíveis, passaram a ser percebidos
como degenerados, vítimas da miséria e principalmente do desrespeito às regras morais da
época. O crescimento da tuberculose se deu no início da Revolução Industrial, quando o
desenvolvimento da produção fabril e a conseqüente urbanização levaram os trabalhadores a
morarem aglomerados e conviverem com condições de trabalho insalubres e desgastantes
(BERLINGUER, 1978; BERTOLLI FILHO, 2001).
No século XIX a doença era vista como forma de pobreza e de privação ligada à
preguiça e à forma de não trabalhar, “de roupas escassas, de corpos escassos, de quartos sem
aquecimento, de higiene deficiente, de alimentação inadequada.” As pessoas são levadas para
44
sanatórios como loucos, local onde são isolados para tratamento, surgindo assim a dicotomia
de elevação da alma e internação e isolamento como pela loucura (SONTAG, 2007, p. 20).
Ainda no século XX acreditava-se que a tuberculose estava intrinsecamente ligada à
hereditariedade. A noção da doença implicava a noção de herança de morte. A moléstia era
herdada enquanto constituição e, na época, a morte era eminente porque a cura inexistia. Caso
ocorresse uma morte relacionada à tuberculose em uma família essa era escondida pois a
moléstia estava associada a algum defeito hereditário, ou até mesmo à pobreza, conforme
Gonçalves (2000):
“Ser tuberculoso era uma pecha. Quando aparecia um caso de tuberculose na família era escondido, então, ‘Fulano tem uma mancha no pulmão’, uma coisa qualquer... Ninguém falava em tuberculose, não se mencionava. Quando um indivíduo era noivo e descobria que a noiva ficara tuberculosa, ele desmanchava o casamento” (PORTO E NASCIMENTO, 2005, p.131).
O adoecimento de várias pessoas da mesma família, ao mesmo tempo, levava os
médicos da época a considerarem a tuberculose como hereditária. A teoria médica mais
corrente definia a tuberculose como uma doença “a constituição”, ou seja, nascia-se com o
organismo predisposto ou com a moléstia (GONÇALVES, 2000).
Outra concepção de doença, ainda do século XX, a da degeneração do indivíduo (mal
social), reunia idéias que demarcavam os comportamentos sociais (estilo de vida) e as
condições de vida (moradia, higiene, trabalho) como relevantes para o adoecimento. A culpa,
nesse caso, recaía sobre o indivíduo na medida em que o adoecimento era consequência dos
maus hábitos, das péssimas condições de higiene e de vida. Os cortiços eram vistos como
propagadores e acumuladores de sujeira e perigo social, antro de doenças, pessoas perigosas e
locais onde ocorriam às conspirações contra o governo, principalmente no Brasil
(GONÇALVES, 2000).
A tuberculose estava ligada a representações aparentemente opostas, tais como: a de
uma visão romântica da doença, do amor transformado e da degeneração do indivíduo; a
45
doença do mal social; da fraqueza e a peste branca (GUIMARÃES, 1990; BERTOLLI
FILHO, 2000).
Em 1919, a tuberculose foi denominada como algo racista por Hitler, que, em seu
primeiro artigo público político denominou a doença como “uma tuberculose racial entre as
nações”, acusando os judeus por sua disseminação pela Europa (SONTAG, 2007).
A morte física prometida pela doença tinha como etapa anterior a exclusão social, que
nas confidências pessoais era declarada como muito mais sombria e dolorida que os
padecimentos físicos produzidos pela infecção:
“Mesmo quando se admite ser doença curável há a crença de que sempre fica alguma coisa por dentro. O doente com “mancha no pulmão” carrega uma marca que altera profundamente sua inserção no grupo social. Idéias ultrapassadas aparecem como que cristalizadas no imaginário popular. Enfrentar o problema como dado real, tanto para o doente como para aqueles que o cercam, não é tarefa simples como poderia parecer” (PORTO, 2007, p. 46).
Nos séculos XVIII, XIX e meados do XX não existiam métodos diagnósticos ou
terapêuticas eficazes para combater a tuberculose. Talvez resida aí a razão para tantas
representações com tão diferentes origens. Não se sabia qual era o agente causador da doença,
nem como lidar com ela. A doença se apresenta de varias formas e níveis diversos, através
dos anos, delimitados por uma linha tênue e fluida entre indivíduo e grupo. O que criava
varias interpretações sobre a doença e o medo de encarar a morte.
3.6 O ESPAÇO PRISIONAL E SUAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS
Na relação interpessoal dos presos portadores de tuberculose cada prisão possui sua
particularidade única, não se podendo limitar os discursos formulados sobre a mesma. Como
microcosmo individual pode-se dizer que a prisão possui seus próprios discursos e formas de
agir, sendo regida por suas identidades e leis na manutenção da ordem interna, conforme
Goffman (1999).
46
“O novato chega ao estabelecimento com uma concepção de si mesmo que se tornou possível por algumas disposições sociais estáveis no seu mundo doméstico. Ao entrar, é imediatamente despido por apoio dado por tais disposições....Geralmente, o processo de admissão também leva a outros processos de perda e mortificação” (GOFFMAN, 1999, p.24-25).
Segundo Goffman (1999) para que o preso consiga iniciar sua nova vida prisional ele
necessita se despir de todas suas “identidades domésticas”, criando assim uma nova
identidade institucionalizada pelo presídio. O microcosmo prisional possui leis baseadas na
procura da manutenção de uma ordem interna, e neste contexto a tuberculose causa um
desequilíbrio interno em sua harmonia, gerado pelo desconhecimento e medo em relação à
doença.
Nessa microfísica do poder, usando-se uma expressão conhecida de Michel Foucalt, o
preso ao entrar em seu novo mundo será orientado pelo líder de cela a cumprir tarefas e a
realizar rotinas diárias que mantêm a organização interna da cela:
“Inicialmente, o preso realiza a faxina até que um novato entre na cela. Ele tem horário de refeição que não pode usar o banheiro e nem escovar os dentes até que todos acabem suas refeições. Dorme as 10:00 h da noite em completo silêncio e na “praia”(chão). Se o preso negar a realizar estas rotinas, o mesmo é expulso da cela e se permanecer negando as ordens poderá até apanhar de todos na cela. A.O, 2007. Sentenciado preso aproximadamente 15 anos (ARAÚJO, p.8, 2007).”
O desconhecimento acerca da tuberculose por parte da população prisional aumenta o
medo e a discriminação na cela, o que dificulta o tratamento e a cura dos doentes. A busca de
inclusão social e a transmissão do conhecimento sobre promoção da saúde para a população
prisional propiciam uma melhor ressocialização do preso doente.
A prisão é um local denominado por Souza e Versignasse (2008, p. 20) como “um país
de economia própria, movida à extorsão, suborno e comércio ilegal. Um lugar cheio de leis
não escritas, impostas pelo crime organizado” que necessita de um cuidado específico e
conhecimento próprio em relação ao modo de viver de sua população. As 1116 prisões do
47
Brasil formam um lugar cheio de leis não escritas, impostas pelo crime organizado, onde a
discriminação entre-muros e extra-muros ainda existe.
3.7 A POLÍTICA DE SAUDE PRISIONAL
O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário foi instituído em 9 de setembro
de 2003, reconhecendo a importância da implementação de ações e serviços regidos pelos
princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde. Buscando viabilizar uma atenção integral à
saúde da população no Sistema Penitenciário Nacional, as ações e serviços, estes de atenção
básica em saúde, são organizados nas unidades prisionais e realizados por equipes
interdisciplinares de saúde.
“O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário foi elaborado a partir de uma perspectiva pautada na assistência e na inclusão das pessoas presas e respaldou-se em princípios básicos que assegurem a eficácia das ações de promoção, prevenção e atenção integral à saúde” (BRASIL, 2003, p.5).
Este Plano Nacional de Saúde, além de proporcionar a saúde a todos os presos do
sistema prisional, busca a promoção da saúde, o cuidado e a conscientização dos presos sobre
as doenças em geral. Aponta, assim, para a inclusão prisional como forma de retorno à
sociedade, respeitando o próximo e o direito a vida assegurada pelo direito natural.
48
4 METODOLOGIA
4.1 ENTREVISTA
Minayo (2004) afirma que, a pesquisa qualitativa responde a questões muito
particulares, preocupando-se com um nível de realidade que não pode ser quantificado. A
pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças,
valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos
e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis de uma
pesquisa quantitativa.
A entrevista, no sentido amplo de comunicação verbal, é a técnica mais usada no
processo de trabalho de campo. È o principal instrumento para levantamento das
representações sociais, sendo um método indispensável em qualquer estudo qualitativo
(MINAYO, 2004; ABRIC, 1994).
Nesta pesquisa, foram utilizadas questões abertas, onde o sujeito tem liberdade total
para abordar o assunto sob o seu ponto de vista, permitindo tanto a obtenção de informações
objetivas, como outras de caráter subjetivo, referentes às atitudes, opiniões e valores dos
indivíduos entrevistados (MINAYO, 2004).
A fala do sujeito, em uma entrevista qualitativa, constitui uma subjetividade
vivenciada e não a verdade em relação ao seu dia a dia. Britten (2000) revela que existem
elementos na pesquisa qualitativa que, na fala do sujeito, podem podem ser omitidas durante a
entrevista. A fala do sujeito, então, não significa a única forma legítima de validar a pesquisa,
mas uma das maneiras de ser conduzida:
“base numa estrutura solta, a qual consiste em questões abertas que definem a área a ser explorada, pelo menos inicialmente, e a partir da qual o entrevistador ou o entrevistado podem divergir a fim de prosseguir com uma idéia ou uma resposta em maiores detalhes” (BRITTEN, 2000, p. 22).
49
Uma boa entrevista deve ser neutra, sensível e clara para o entrevistado. No decorrer
desta entrevista qualitativa, questões adicionais foram introduzidas na medida em que nos
familiarizamos com o tópico que está sendo discutido, levando em conta a maneira como as
perguntas foram percebidas pelos presos e seus efeitos sobre os mesmos (PATTON, 1987).
As entrevistas foram conduzidas com base em uma estrutura solta, a qual consistindo
de questões abertas definidoras da área explorada, seguindo-se um roteiro-guia. O objetivo
principal das entrevistas foi o de mapear práticas, crenças, valores e sistemas de universos
sociais específicos, em que conflitos e contradições não estejam claramente explicitados
(DUARTE, 2004).
“Tomando as Ciências Sociais como base da pesquisa Qualitativa, podemos afirmar que seu objeto reflete: uma historicidade (sociedades humanas vivem o presente, estão marcadas pelo passado e projetadas para o futuro); uma consciência histórica (seres humanos e grupos sociais atribuem significado e intencionalidade a suas ações); uma identidade entre o sujeito e o objeto (investigador e investigados, embora com referenciais diferentes partilhe da cultura humana) e um caráter ideológico (nele se refletem interesses e visões de mundo)” (MINAYO, 2001; citado DESLANDES; GOMES, p.104, 2004).
É importante que na entrevista o pesquisador tenha controle sobre sua abordagem.
Existem três formas de estratégias que foram utilizadas para obtermos esse controle: “...
conhecer o objetivo da entrevista (doença), fazer as perguntas certas para obter a informação
necessária e oferecer feedback verbal e não verbal adequado” (BRITTEN, p.25-26, 2000).
Por meio destas entrevistas, buscou-se sempre que o preso expressasse sua
subjetividade em relação à doença e à instituição vivenciadas. Pode-se, assim, relacionar sua
fala aos objetivos desta dissertação na procura de entender a representação social da
tuberculose produzida no viver carcerário.
“tomar depoimentos como fonte de investigação implica extrair daquilo que é subjetivo e pessoal neles o que nos permite pensar a dimensão coletiva, isto é, que nos permite compreender a lógica das relações que se estabelecem (estabeleceram) no interior dos grupos sociais dos qual o entrevistado participa (participou), em um determinado tempo e lugar” (DUARTE , 2004, p.144).
50
A construção das entrevistas foi fundamentada em uma questão importante: o que
perguntar? Desenvolvido um referencial teórico ou conceitual que guiou a dissertação e
identificou os conceitos centrais, foram construídos tópicos-guia, tendo como fio condutor
inicial uma questão central: qual a representação social da tuberculose na sua vida prisional?
(APÊNDICE 2)
O tópico ou roteiro guia é, para Gaskell (2003), parte vital da construção de uma
pesquisa qualitativa e necessita de atenção redobrada para sua construção. Sua essência foi
planejada para dar conta dos fins e objetivos de pesquisa na combinação de uma leitura crítica
apropriada, um reconhecimento do campo e pensamento criativo do pesquisador.
Por motivos de segurança interna não foi possível gravar as entrevistas, tendo sido
todas transcritas no final de cada uma para devida análise posterior. Esse fato, definido por
ordem judicial, representou um fato metodológico importante. Segundo Minayo (2001),
Gaskell (2003) e Duarte (2004) um método adequado para coleta de dados durante a
entrevista é a gravação dos depoimentos em fita magnética e sua posterior transcrição pelo
pesquisador. Como não foi possível a gravação das entrevistas, foi reservado um tempo após
o encontro com os presos para que todos os depoimentos fossem transcritos pelo pesquisador
no diário de campo.
4.2 SELEÇÃO DOS ENTREVISTADOS
A definição de critérios para a seleção dos sujeitos que compõem o universo de
investigação é algo primordial, pois interfere diretamente na qualidade das informações a
partir das quais será possível construir a análise e chegar à compreensão mais ampla do
problema delineado (DUARTE, 2004).
51
Para Turato (2003) na construção da amostragem em uma pesquisa qualitativa não faz
sentido quantas pessoas irão ser entrevistadas, mas qual a profundidade irá ser alcançada pelo
fato de os relatos abrangerem menos a generalização e mais a compreensão do objetivo.
Em relação à tuberculose, a incidência da doença no presídio em estudo é baixa. Este
pesquisador que, enquanto servidor público, esteve durante três anos e meio na instituição,
entre 2005 e 2008, como gerente de saúde, comprovou essa incidência. Assim foram
entrevistados todos os presos portadores de tuberculose internados no estabelecimento
prisional em estudo no período da pesquisa. Caso os números de entrevistados ultrapassassem
aquele suficiente para atender os objetivos da pesquisa, seria usado o método de saturação.
O método por saturação limita o número de entrevistados quando as informações
coletadas tornam-se repetições de conteúdo e novas falas passam a ter pouco acréscimo ao
estudo, decidindo-se então por encerrar a amostragem. Minayo (p.18,1999) entende que:
“saturação teórica como sendo a constatação do momento de interromper a captação de informações (obtidas junto a uma pessoa ou grupo) pertinentes a uma discussão de uma determinada categoria dentro de uma investigação [...], levando-se em consideração uma combinação dos seguintes critérios: os limites empíricos dos dados, a integração de tais dados com a teoria (que, por sua vez, tem uma determinada densidade) e a sensibilidade teórica de quem analisa os dados”.
Todos os entrevistados, anteriormente à entrevista, foram orientados sobre o objetivo e
a condução do estudo, leram e assinaram, segundo sua vontade, o termo de consentimento
livre e esclarecido; seus nomes não foram revelados, assim como a idade e o sexo para
segurança do preso e fidelidade dos relatos.
4.3 CRITÉRIOS ÉTICOS
Como este estudo envolveu seres humanos, de acordo com a Resolução 196/96, do
Conselho Nacional de Saúde, foi elaborado um Termo de Consentimento Esclarecido
52
(APÊNDICE 1) que foi lido e assinado pelos detentos que concordassem em participar da
pesquisa. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Conselho da Universidade do Estado de
Minas Gerais pelo parecer Nº.27/2008 (ANEXO 1) emitido em 25/09/2008.
Pelo caráter específico da pesquisa, estando os presos sob a tutela do Estado foi
necessária uma autorização judicial para sua realização dos exames de BAAR e pesquisa,
formalizada em 20 de janeiro de 2007 pelo ofício 3200/07, juntamente da autorização do
diretor do presídio (ANEXO 2).
4.4 DIÁRIO DE CAMPO
Durante as entrevistas realizadas e no convívio diário com o preso, o método
observacional é um instrumento de grande relevância. Os métodos observacionais são
definidos como uma maneira de o pesquisador sistematizar e acompanhar comportamentos e
interações durante a entrevista. O material descritivo bruto não fornece explicações, sendo a
pesquisa observacional instrumento de pesquisa necessária para que permita a outro
pesquisador ingressar e circular naquele ambiente ou grupo estudado (POPE E MAYS, 2000).
O registro dos dados observacionais baseia-se na atuação do pesquisador como
instrumento de pesquisa e documenta o mundo que ele possa observar. O layout do ambiente
e da fala do entrevistado caracteriza um conjunto de práticas e maneiras para evidenciar e
analisar de forma correta uma entrevista, no convívio diário com esta população prisional, ou
seja, durante a entrevista vivenciada (POPE E MAYS, 2000).
Pope e Mays (2000) afirmam que deve ser observado como os entrevistados
vivenciam o seu dia a dia. Neste aspecto, a experiência do pesquisador deste estudo no
sistema prisional durante três anos e meio como gerente de saúde permitiu uma maior
interação com o objeto estudado.
53
Este registro do convívio diário com o objeto e as observações pertinentes durante a
entrevista foram anotados no diário de campo nesta pesquisa. O diário de campo traz
anotações, impressões pessoais do pesquisador (incluindo dados da observação durante a
entrevista, como mudanças de entonação e atitudes), interrupções e interjeições durante a
entrevista e outras características apresentadas no curso da pesquisa.
Minayo (2004, p.100) caracteriza o diário de campo como um caderno em que:
“constam todas as informações que não sejam o registro das entrevistas formais. Ou seja, observações sobre conversas informais, comportamentos, cerimônias, festas, instituições, gestos, expressões que digam respeito ao tema da pesquisa. Fala, comportamento, hábitos, usos, costumes, celebrações e instituições compõem o quadro das REPRESENTAÇÕES SOCIAIS” (MINAYO, 2004, p.100).
4.5 TRIANGULAÇÃO DE DADOS
O método de triangulação tem como objetivo relacionar a fala subjetiva durante a
entrevista, as observações vivenciadas anotadas no diário de campo e os referenciais teóricos
estudados pertinentes à dissertação.
Para Pope e Mays (2000), a triangulação de dados serve como um método para
validação e rigor da pesquisa qualitativa. Na compreensão de Pope e Mays (2000, p. 48-49):
“detalhes a respeito de como a pesquisa foi conduzida são fundamentais para avaliar sua integridade e permitir que o leitor saiba quanto tempo foi despendido em campo, a proximidade do pesquisador com a ação ou o comportamento, quão típicos foram os eventos registrados e se foi realizada alguma tentativa para verificar as observações feitas.”
Para a análise destes dados as estratégias metodológicas utilizadas de triangulação dos
dados coletados a partir de diversas fontes permitem uma maior validade dos dados e uma
inserção mais aprofundada dos pesquisadores no contexto de onde emergem os fatos, as falas
e as ações dos sujeitos. A triangulação de dados incorpora contextos das experiências
vivenciadas e o rigor para validação de dados em uma pesquisa qualitativa.
54
A análise realizada por meio destes pressupostos permite o estabelecimento de inter-
relação entre os fatos, às falas e as ações dos indivíduos, permitindo uma compreensão mais
abrangente dos significados construídos socialmente na relação dos sujeitos com o meio
prisional (SPINK, 1993).
Para Adorno et al (1994) a proposta da triangulação propõe a sobreposição de uma
análise unidimensional, alicerçada em índices da realidade, a uma análise multidimensional,
ou do contexto. A análise realizada por meio desses pressupostos permite o estabelecimento
de inter-relação entre os fatos, às falas e as ações dos indivíduos, o que permite uma
compreensão mais abrangente dos significados construídos socialmente na relação dos
sujeitos com o seu meio.
No trabalho estudado foi preciso analisar uma representação levando em conta que ela
sempre é referência de alguém para alguma coisa (pessoa, grupo, relação, etc.) e está inserida
numa estrutura social, ou seja, assume elementos da cultura, da linguagem e das
representações do grupo no qual se insere o sujeito.
4.6 O DISCURSO DO SUJEITO COLETIVO COMO MÉTODO PARA ANÁLISE
DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Serge Moscovici (2003) estabeleceu a sua Teoria das Representações Sociais a partir
da perspectiva de que a sociedade contemporânea envolve mecanismos de comunicação
interpessoal diversificados e ágeis, como as várias formas de mídia, que produzem formas de
ver e compreender o mundo. Neste contexto, os grupos sociais constroem e alimentam, em
seu imaginário, formas próprias de perceber e comunicar às coisas que suportam suas relações
internas, entre seus membros, e externas, com outros grupos e com o sistema social.
Moscovici (2003, p. 311) acentua o senso comum, explicando que:
55
“... mais precisamente, o que tinha em mente era sua relação com a cultura, porque nessa ordem de coisas você deve assumir como ativo, real, somente o que entra nas maneiras e práticas, isso é na vida do senso comum. [...] tentei compreender e reabilitar o pensamento comum e o conhecimento comum. Ainda mais, não os considerei como algo tradicional, ou primitivo, como mero folclore, mas como algo muito moderno, originando-se parcialmente da ciência, como a configuração que assumem quando se tornam parte e parcela da cultura. Vi a transformação do conhecimento científico em conhecimento comum como área de estudo possível.”
Para Sá (1998), as representações sociais têm-se tornado um campo de abordagem
interessante no campo da enfermagem para o estudo da saúde e da doença.
Para abordar e tratar as representações sociais, Lefèvre e Lefèvre (2003) vêm
constituindo o método do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) para devida tabulação dos
dados.
O Discurso do Sujeito Coletivo é a forma para se extrair um determinado discurso de
uma pessoa ou de uma coletividade, na tentativa de mapear crenças e valores em sua escala
coletiva (LEFÈVRE e LEFÈVRE, 2003). Transforma a fala do objeto em um tipo de “soma
de discursos” com a proposta de organização e tabulação de dados colhidos em uma entrevista
qualitativa exploratória. Na entrevista de perguntas abertas, mais ou menos livres, a
importância de uma tabulação específica se faz necessária para devida validação dos dados.
O Discurso do Sujeito Coletivo foi criado por Lefèvre e Lefèvre (2003, pág. 15) como
premissa para organizar “a tabulação de dados qualitativos de naturezas verbais, obtidos por
depoimentos, artigos de jornal, matérias de revistas”, na tentativa de analisar o material verbal
coletado:
“Partindo-se do suposto que o pensamento coletivo pode ser visto como um conjunto de discursos sobre um dado tema, o Discurso do Sujeito Coletivo visa dar a luz ao conjunto de individualidades semânticas componentes do imaginário social” (LEFÈVRE e LEFÈVRE, 2003, p.16).
Tendo como figuras metodológicas para suas devidas analises as Expressões-Chave,
Idéias Centrais e Ancoragem. Definidas as mesmas como:
56
* Expressões-chave (ECH): são trechos, pedaços ou transcrições literais do discurso
que revelam a essência ou as questões da pesquisa, buscando o resgate literal do discurso.
* Idéias Centrais (IC): revelam de maneira sintetizada e sintética cada conjunto de
expressões-chave, não é uma interpretação, mas uma descrição do sentido de um depoimento
ou de um conjunto de depoimentos.
* Ancoragem (AC): é a manifestação oral relatada pelo sujeito a ser usada pelo
enunciador para caracterizar uma situação específica, sendo a manifestação lingüística
explícita de uma dada teoria que o autor do discurso professa, usada pelo enunciador para
enquadrar uma situação específica.
“O discurso do Sujeito Coletivo é um discurso-síntese redigido na primeira pessoa do singular e composto pelas Expressões-chave que têm a mesma Idéia Central ou Ancoragem” (LEFÈVRE e LEFÈVRE, 2003, p. 18).
O Discurso do Sujeito Coletivo é realizado com a montagem das figuras
metodológicas ou a reconstrução do discurso pessoal subjetivo, tendo como proposta
visualizar uma melhor Representação Social do tema abordado pela ótica do imaginário
coletivo.
“O Discurso do Sujeito Coletivo é, assim, uma estratégia metodológica que, utilizando uma estratégia discursiva, visa tornar mais clara uma dada representação social, bem como o conjunto das representações que conformam um dado imaginário” (LEFÈVRE e LEFÈVRE, 2003, p.16).
O Discurso do Sujeito Coletivo se apresenta como forma de analisar e interpretar a
subjetividade do objeto estudado na tentativa de tabular e validar a entrevista realizada no
sistema prisional em busca das representações sociais.
57
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
5.1 CENÁRIO DO ESTUDO
Esse estudo foi realizado no período de outubro de 2008 a fevereiro de 2009, na
população carcerária do Presídio Floramar, localizado na Cidade de Divinópolis no Estado de
Minas Gerais, subordinado à Secretaria de Estado da Segurança Pública (SEDS).
A Cidade de Divinópolis localiza-se na região Centro-Oeste de Minas Gerais, tendo
aproximadamente 204 mil habitantes, conforme os dados divulgados pelo IBGE em julho de
2005. Sua posição geográfica, sua infra-estrutura de transportes e seu potencial de
atendimento nas áreas da saúde, educação, segurança, comercio e indústria, credenciam
Divinópolis como pólo regional do centro-oeste mineiro, com uma população estimada em
mais de 1,2 milhões de pessoas em trânsito (IBGE, 2005).
O local de investigação, o Presídio Floramar (MINAS GERAIS, 2004), tem
capacidade para 187 presos, mas na atualidade abriga aproximadamente 450 presos. O
objetivo principal da instituição é a ressocialização do sentenciado em todos os níveis de
atenção, garantindo ao mesmo seu direito civil como cidadão.
O presídio possui quatro pavilhões em sua composição, divididos em uma ala central
,onde se localizam o pavilhão feminino e um pavilhão masculino, e outras duas alas laterais
onde se encontram pavilhões masculinos. O pavilhão central possui uma ala masculina e outra
feminina, sendo a masculino destinada a presos em celas especiais, denominada “seguro”,
sendo estes travestis, estupradores ou presos jurados de morte por outros presos. O pavilhão
masculino, de uma das laterais, é destinado a presos condenados ou que estão em algum
tratamento médico específico, como exemplo, a tuberculose, ao passo que a outra ala
masculina se destina a presos recém chegados ou que aguardam julgamento.
58
O presídio possui uma equipe multidisciplinar de saúde, tendo essa em sua
composição enfermeiro, médico, assistente social, dentista, técnica de higiene dental,
psicólogas e auxiliares de enfermagem que, juntos, trabalham a Atenção Básica de Saúde
Prisional respaldados na Portaria 1777 de setembro de 2003. A escolha deste presídio se deu
pelo fato de o pesquisador ter sido servidor público durante três anos e meio nesta instituição,
além de possuir presos em tratamento pela tuberculose.
5.2 CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DOS ENTREVISTADOS
No período de setembro a dezembro de 2008, avaliou-se a situação da tuberculose na
população carcerária neste presídio. Com uma incidência da doença muito baixa neste
presídio foi preciso entrevistar todos os presos portadores de tuberculose internados no
estabelecimento.Conforme quadro apresentado a seguir (QUADRO 3), o levantamento
sociocultural e demográfico da população de estudo contextualiza a investigação.
Os entrevistados foram identificados por números (1, 2, 3, 4 e 5) para facilitar a
descrição na análise do discurso do sujeito coletivo e manter o sigilo necessário em
abordagem como a que realiza neste estudo.
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QUADRO 3: Caracterização sociocultural e demográfica dos presos:
Sujeito Sexo Idade(anos) Escolaridade Est. Civil Tempo de
prisão (anos)
1 M 36 1ºGrau
incompleto
Solteiro 4
2 F 39 2ºGrau
incompleto
Solteira 2
3 M 38 1ºGrau
incompleto
Casado 3
4 M 37 2ºGrau
incompleto
Casado 2
5 M 20 1ºGrau
incompleto
Solteiro 2
A idade dos entrevistados neste este estudo variou de 20 a 40 anos, dois casados e três
solteiros, sendo quatros presos do sexo masculino e uma do sexo feminino.
Quanto à escolaridade três dos entrevistados possuíam o ensino médio incompleto e os
outros dois o ensino fundamental incompleto. O tempo de prisão variou de 2 a 4 anos de
prisão, no Presídio Floramar.
5.3 TABULAÇÃO DE DADOS E CONSTRUÇÃO DO DISCURSO DO SUJEITO
COLETIVO (DSC)
A entrevista é a técnica mais utilizada no processo de pesquisa qualitativa. Ela é um
instrumento privilegiado de coleta de informações para as ciências sociais. Ela encontra no
Discurso do Sujeito Coletivo um instrumento na possibilidade de integração sistemática e
rigorosa com a cultura contemporânea na reprodução de uma dada realidade.
Foram utilizados durante as entrevistas desta pesquisa um roteiro guia e o diário de
campo. Este último foi instrumento fundamental para anotações diárias do pesquisador em
suas observações vivenciadas no curso do trabalho. Dados subjetivos como desconfiança em
60
relação à entrevista, à ansiedade e cuidados ao falar de determinado temas relacionados ao
viver carcerário foram observados no decorrer de todas as entrevistas.
As entrevistas forma realizadas nos meses de outubro a dezembro de 2008, tiveram
duração de 20 a 30 minutos, não podendo ser gravadas por medidas de segurança estipuladas
pela instituição. Anteriormente foi esclarecido aos entrevistados o propósito da pesquisa e
solicitada autorização para transcrição das falas no decorrer das entrevistas.
No início de cada entrevista os presos perguntavam se o tempo de permanência deles
no encontro poderia ser breve, pois temiam represálias da parte dos demais ao retornarem as
suas celas. Uma demora poderia ser confundida com delação ou “caguetagem”.
O Discurso do Sujeito Coletivo é uma metodologia utilizada principalmente como
forma de análise das representações sociais. Para Lefèvre e Lefèvre (2003, p. 15) é definido
como:
“uma proposta de organização e tabulação de dados qualitativo de natureza verbal, obtidos de depoimentos, artigos de jornal, matéria de revista semanais, cartas, papers, revistas especializadas,etc.”
No conceito de Lefèvre e Lefèvre (2003), a tabulação dos dados orientada segundo
fases ou passos se torna necessária como procedimento para construção e análise do Discurso
do Sujeito Coletivo, tendo-se nesta pesquisa procedido da seguinte maneira:
1º passo: Analisar isoladamente todos os sujeitos entrevistados, copiando
integralmente o conteúdo de todas as entrevistas referentes, construindo-se o Instrumento de
Análise de Discurso (IAD 1) na coluna Expressões-Chave (ECH). Pelo fato de não poderem
ser gravadas as falas dos presos nas entrevistas, após término de cada uma foi dedicado pelo
entrevistador um tempo de aproximadamente 60 minutos para transcrição na tentativa de não
perder ou esquecer elementos do discurso do entrevistado.
61
As falas foram colocadas em um quadro denominado Instrumento da Analise do
Discurso (IAD 1) com suas Expressões-Chave (ECH), Idéias Centrais (IC) e Ancoragem
(AC), sendo as Idéias Centrais apresentadas em negrito e Ancoragem em itálico.
IAD 1 (Instrumento de Análise do Discurso)
Pergunta 1 – O que representa para você a tuberculose dentro do presídio?
Expressões-Chave Idéias Centrais Ancoragem
Ent.1-Eu tentava conversar com outros presos que pediam distancia, tanto os agentes também tinham medo de mim.
1º idéia: A doença representa isolamento.
C 2º idéia: A doença representa preconceito.
A
Presos que pediam distancia e tinham medo de mim.
C Tanto os agentes tinham medo de mim.
A
Ent.2-O sinônimo da doença dentro da cadeia é o preconceito. Foi o lugar que senti mais preconceito em toda minha vida... . Isso é ser bobo, uma ignorância, ter esse isolamento mesmo depois de tratada. Bom eu tenha medo de morrer aqui.
1º idéia: A doença representa preconceito.
A
2º idéia: A doença representa isolamento
C 3° idéia: A doença representa medo de morrer.
B
Foi o lugar que senti mais preconceito em toda minha vida.
A Uma ignorância ter esse isolamento.
C Bom eu tenho medo de morrer.
B Ent.3-Vou falar a verdade para você, eu fiquei aflito pensando que poderia morrer.O medo de morrer é grande demais
A doença representa medo de morrer
B
Fiquei aflito pensando que poderia morrer, o medo de morrer é grande demais.
B Ent.4-Entrei em depressão aqui dentro da cadeia. Afastei de muitos presos como se eu tivesse que descobrir quem era o culpado. ...nem minha família não vinha me visitar e eu sofri muito na cela
A doença representa isolamento
C
E nem minha família não vinha me visitar e eu sofri muito na cela sozinho
C
62
sozinho. Ent.5-Não queria saber de nada, só queria morrer e para mim a minha vida tinha acabado. Não queria que minha família me visitasse eu tenho filha e tive medo de pega-la.
1º idéia: A doença representa medo de morrer
B 2º idéia: A doença representa isolamento.
C
Só queria morrer e para mim a minha vida tinha acabado.
B
Não queria que minha família me visitasse.
C
Pergunta 2 - O que facilitou e dificultou o tratamento de sua doença?
Expressões-Chave Idéias Centrais Ancoragem
Ent.1-Quando chegava perto colocavam camisa no rosto e na boca mandavam à gente sair. Eu bebia e fumava muito rato na rua por isso fiquei doente, ou pequei de outro preso doente. Só escutava conversa de outros presos de longe.
1º idéia: A doença representa preconceito.
A
2º idéia: A doença representa isolamento.
C
Chegava perto colocavam camisa no rosto e na boca mandavam à gente sair.
A Só escutava conversa de outros presos de longe.
C
Ent.2-...era remédio demais e ficava às vezes tonta, vomitando e não parava nada no meu estomago. Além de tudo tendo que suportar o preconceito. Facilidade não teve nada.
1º idéia: Dificuldade de tratamento relacionada ao uso de medicamento.
D
2º idéia: A doença representa preconceito.
A
Era remédio demais e ficava às vezes tonta, vomitando e não parava nada no meu estomago.
D
Além de tudo tendo que suportar o preconceito.
A
Ent.3-E o que dificultou foi o horário incorreto de tomar o remédio na cadeia, cada hora era um horário. - O que facilitou foi minha esposa ter pegado na policlínica para mim o remédio.
Dificuldade de tratamento relacionada ao uso de medicamento.
D
O horário incorreto de tomar o remédio na cadeia
D
Ent.4-O que facilitou em nada e que dificultou é que nem minha mãe não vinha
A doença representa isolamento.
Dificultou é que nem minha mãe não vinha me visitar.
63
me visitar. D
D
Ent.5- O remédio vinha para mim todo dia , isso facilitou a minha cura. O que dificultou é as formas que somos tratados aqui dentro, a discriminação a gente parece bicho.
A doença representa preconceito.
A
A disponibilidade do medicamento facilita o tratamento J
As formas as quais somos tratados aqui dentro, a discriminação a gente parece bicho.
A O remédio vinha para mim todo dia, isso facilitou a minha cura. J
Pergunta 3 -Dentro da cela existem normas ou regras impostas ao preso doente com
tuberculose?
Expressões-Chave Idéias Centrais Ancoragem
Ent.1- Manda a gente sair da gaiola. Diziam que tinha que ir para uma cela sozinha. Isso não vai me atrapalhar em nada!? Se um preso esta doente a cela pede para ele se retirar. Fica marcado e apanha e todos começam chutar a bucuda. Tem hora para usar o boi, comer, limpar a cela e todos seguimos. Quem não segue vai pro seguro.
1º idéia: A doença representa isolamento.
C 2º idéia: A doença representa preconceito.
A 3º idéia: A doença representa seguir regras.
E
Diziam que tinha que ir para uma cela sozinha.
C Se um preso esta doente a cela pede para ele se retirar.
A Tem hora para usar o boi, comer, limpar a cela e todos nós seguimos.
E
Ent.2-Até quando durmo sou colocada de lado na cela para outras presas não ficarem perto de mim. Até minha escova de dente e roupa de cama é separada, já ouvi uma presa dizer que nem usaria minha roupa se fosse preciso.
1º idéia: A doença representa isolamento.
C 2º idéia: A doença representa preconceito.
A
3º idéia: A doença representa seguir regras.
E
Até quando durmo sou colocada de lado na cela.
C Para outras presas não ficarem perto de mim.
A Até minha escova de dente e roupa de cama é separada.
E
Ent.3- A gente pede isolamento do tal, por causa
1º idéia: A doença representa isolamento.
A gente pede isolamento
64
da família. E não precisa ser só a tuberculose, mas outra doença. A gente mora num banheiro e qualquer um pensam assim. Mas entendo eles é a lei é do cão. Ent.4-Eu não podia comer junto com eles e sempre pediam ao diretor para me tirar da cela. Isso aconteceu até eu ficar sozinho na cela o que é osso.
C 2º idéia: A doença representa seguir regras.
E
1º idéia: A doença representa preconceito.
A
2º idéia: A doença representa isolamento.
C
C È a lei é do cão.
E
Eu não podia comer junto com eles.
A Isso aconteceu até eu ficar sozinho na cela.
C
Ent.5- Meu copo, colher, o que é pessoal ficava comigo até eu ir para outra cela. Até os agentes conversam comigo à distância tudo é difícil para preso doente, mas fez errado tem que pagar.
1º idéia: A doença representa seguir regras.
E 2º idéia: A doença representa isolamento.
C
Meu copo, colher, o que é pessoal ficava comigo até eu ir para outra cela.
E Conversam comigo à distância.
C
Pergunta 4 - Para você a doença interferiu no convívio na cela?
Expressões-Chave Idéias Centrais Ancoragem
Ent.1-Só não recebia a visita e ficava sozinho o tempo inteiro, só conversava quando ia à enfermaria e nas visitas de domingo tinha que usar mascara.
A doença representa isolamento.
C
Não recebia a visita e ficava sozinho
C
Ent.2-Claro que interfere, eu não posso fazer nada e tudo meu é separado, mas eu
A doença representa preconceito.
Eu não posso fazer nada e tudo meu é separado.
65
tenho que pagar pouca cadeia e estou indo embora. Até meu cigarro eles não pedem, isso é bom...
A
A
Ent.3-Por exemplo eu estava tossindo muito a noite e não deixava os outros dormir. Eu dormia na praia e o frio era muito e não conseguia parar de tossir. Eles reclamavam da minha tosse e queriam me tirar, é o preconceito.
A doença representa preconceito.
A
Eles reclamavam da minha tosse e queriam me tirar, é o preconceito.
A
Ent.4- Interferiu na época, mas como não estou mais doente e não tenho mais nada, tudo passou.
A cura representa libertação
F
Interferiu na época, mas como não estou mais doente e não tenho mais nada, tudo passou.
F
Ent.5- Todo mundo ficava olhando para mim e vendo se eu ia tossir e quando tossia eles colocavam o coberto na cara. O preconceito na cela é difícil, mas com o tempo nos superamos.
A doença representa preconceito.
A
O preconceito na cela é difícil, mas com o tempo nos superamos.
A
Pergunta 5 - O que facilitaria para você o controle da doença dentro da prisão?
Expressões-Chave Idéias Centrais Ancoragem
Ent.1- Todos saberem o que é a doença e não ficar com medo da gente. Nem os agentes sabem da doença só falavam que tossia muito e emagrecia, mas isso aqui é normal... .
1º idéia: A doença representa preconceito
A
2º idéia: A doença desconhecida
G
E não ficar com medo da gente.
A
Nem os agentes sabem da doença.
G
66
Ent.2-Informação, reunião, não conversa sobre isso ou aquilo, mas sobre a doença.
A importância da informação sobre a doença.
H
Informação, reunião, não conversa sobre isso ou aquilo, mas sobre a doença.
H
Ent.3-Conversa com nós dentro da cela era bom. Mas não só falar sobre tuberculose, mas qualquer outra doença. Hoje qualquer analfabeto sabe sobre a doença, mas não como se pega.
A importância da informação sobre a doença.
H
Conversa com nós dentro da cela era bom.
H
Ent.4-Uma palestra, porque os presos têm a cabeça pequena voltada para o crime. O mundo lá fora é pequeno e temos que conversara mais para melhorar o contato com presos e família.
1º idéia: A importância da informação sobre a doença.
H 2º idéia: A importância do apoio familiar.
I
Uma palestra, porque os presos têm a cabeça pequena voltada para o crime.
H Para melhorar o contato com presos e família.
I
Ent.5-Ficar perto da família e deixar isto. Não vou cair na vida do crime nunca mais, a minha família é muito importante para mim.
A importância do apoio familiar.
I
Ficar perto da família e deixar isto
I
2º passo: Após a tabulação dos dados foram identificadas e agrupadas as Idéias
Centrais de cada discurso. Agrupando a Ancoragem e a Idéias Centrais pelas letras (A,B,C...)
procurando-se sempre expressar um mesmo sentido para o discurso:
- A–O que o preso com tuberculose vivencia na prisão:
O lugar que sentiu mais preconceito na vida.
Além de estar preso tinha que suportar o preconceito.
A discriminação é associada a um bicho.
O preconceito na cela é difícil de conviver.
-B–O que a doença transmite ao preso portador:
67
Ter medo de morrer na cela.
O medo de morrer é grande.
A vida teria acabado com a doença.
-C–O que a doença provoca ao preso:
A doença provocava isolamento.
Outros presos pediam distância do preso doente.
Fiava sempre sozinho sem visita da família.
Conversava com outros presos de longe.
Todos Afastavam quando chegavam perto.
Ficavam na cela sempre sozinhos.
-D–O que na prisão dificulta o tratamento:
Os remédios criavam efeito colateral durante o tratamento.
O preso sentia-se fraco e debilitado.
O isolamento dificulta o tratamento.
-E–O que a doença interfere nas relações interpessoais na cela:
Tem horário para usar o banheiro e comer.
Copo, colchão e talheres são separados do restante do preso doente.
Dentro da cela predomina a lei imposta.
-F –A cura representa libertação:
Após tratamento e cura, as relações prisionais não prejudicam mais.
-G –A doença é desconhecida na prisão:
Nem os funcionários do presídio conhecem a doença.
-H-A importância da informação sobre a doença:
Uma palestra para melhorar a relação do preso doente com outros
presos e família.
68
Conversa na cela com presos é necessário.
Esclarecimento sobre a doença a todos os presos.
-I-A importância do apoio familiar:
A aproximação da família ajuda no tratamento.
-J-O que facilitaria no tratamento:
A entrega da medicação para tratamento.
3º passo: O próximo passo, após o agrupamento das Idéias-Centrais de cada discurso,
é a construção do Instrumento da Análise do Discurso 2 (IAD 2). A construção desse
Instrumento de Analise inicia-se pelas Idéias-Centrais colocando-a em colunas junto as
Expressões-Chaves e tendo posicionamento próprio na produção de uma artificialidade
natural:
IAD 2 (Instrumento da Análise de discurso 2)
A-O que o preso com tuberculose vivencia na prisão:
Expressões-Chave DSC-1
Ent.1-Os agentes também tinham medo de mim.Chegava perto colocavam camisa no rosto e na boca mandavam à gente sair. Ent.2-Foi o lugar que senti mais preconceito em toda minha vida.Além de tudo tendo que suportar o preconceito. Ent.3-Eles reclamavam da minha tosse e queriam me tirar, é o preconceito. Ent.4-Eu não podia comer junto com eles. Ent.5-As formas que somos tratados aqui dentro, a discriminação a gente parece bicho.O preconceito na cela é difícil, mas com o tempo nos superamos.
Foi o lugar que senti mais preconceito em toda minha vida. Nunca sofri tanta discriminação em toda minha vida por ser portador da doença.
69
B–O que a doença transmite ao preso portador:
Expressões-Chave DSC-2
Ent.2-Bom eu tenho medo de morrer aqui. Ent.3-Fiquei aflito pensando que poderia morrer.O medo de morrer é grande demais. Ent.5-Não queria saber de nada, só queria morrer e para mim a minha vida tinha acabado.
O medo da morte por estar com tuberculose dentro da prisão é muito grande.
C–O que a doença provoca ao preso:
Expressões-Chave DSC-3
Ent.1-Eu tentava conversar com outros presos que pediam distancia.Só escutava conversa de outros presos de longe. Ent.2-Uma ignorância, ter esse isolamento mesmo depois de tratada. Ent.3- A gente pede isolamento. Ent.4-E nem minha família não vinha me visitar e eu sofri muito na cela sozinho. Ent.5-Não queria que minha família me visitasse eu tenho filha e tive medo de pega-la.
A doença provoca isolamento, distância da família e dos outros presos na cela. Ficamos em celas separadas até o fim do tratamento. Nem a família vem nos visitar e sofremos muito com isso.
D–O que na prisão dificulta o tratamento:
Expressões-Chave DSC-4
Ent.2-Era remédio demais e ficava às vezes tonta, vomitando e não parava nada no meu estomago. Ent.3-E O que dificultou foi o horário incorreto de tomar o remédio na cadeia. Ent.4-O que facilitou em nada e que dificultou é que nem minha mãe não vinha me visitar.
O que dificulta o tratamento da doença com a medicação são os efeitos colaterais, como vômitos, tontura e o horário incorreto de tomar o remédio na cadeia.
70
E–O que a doença interfere nas relações interpessoais na cela:
Expressões-Chave DSC-5
Ent.1- Tem hora para usar o boi, comer, limpar a cela e todos seguimos. Quem não segue vai pro seguro. Ent.2-Até minha escova de dente e roupa de cama é separada. Ent.3-Mas entendo eles, assim mesmo, é a lei é do cão. Ent.5-Meu copo, colher, o que é pessoal ficava comigo até eu ir para outra cela.
Nossas roupas e meu colchão são separadas das demais roupas, tenho horário próprio de usar o banheiro, comer e dormir. Se não sigo eu sou punido pela cela, é a lei do cão.
F –O que a cura representa ao preso:
Expressões-Chave DSC-6
Ent.4- Interferiu na época, mas como não estou mais doente e não tenho mais nada, tudo passou.
A cura da doença significa que poderá viver como outros na cela, uma libertação.
G–A doença é desconhecida na prisão:
Expressões-Chave DSC-7
Ent.1- Nem os agentes sabem da doença só falavam que tossia muito e emagrecia mas isso aqui é normal.
A doença na prisão é desconhecida, associam a doença ao fato de emagrecimento e tosse.
H-A importância da conscientização na prisão:
Expressões-Chave DSC-8
Ent.2-Informação, reunião, não conversa sobre isso ou aquilo, mas sobre a doença. Ent.3-Conversa com nós dentro da cela era bom. Ent.4- Uma palestra, porque os presos têm a cabeça pequena voltada para o crime.
A conscientização dos presos na prisão ajuda no tratamento e conhecimento sobre a doença.
71
I -A importância da família para o preso doente:
Expressões-Chave DSC-9
Ent.4-Temos que conversara mais para melhorar o contato com presos e família. Ent.5-Ficar perto da família e deixar isto. Não vou cair na vida do crime nunca mais, a minha família é muito importante para mim.
O contato com a família quando estamos doentes ajuda no tratamento e diminui o preconceito.
5.4 INTERPRETAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Durante toda pesquisa buscou-se avaliar todos os aspectos pertinentes para construção
de uma análise da representação social da tuberculose na vida carcerária. No convívio da vida
prisional este pesquisador pôde sentir o medo, a angústia, as incertezas, a descrença e o
espanto que o acompanharam durante toda a pesquisa.
O significado do viver com tuberculose está entrelaçado às experiências pessoais de
cada integrante do estudo, mas se expressam de maneira a representar seus viveres prisionais
com tuberculose. A avaliação das entrevistas, a análise do diário de campo e as pesquisas
bibliográficas foi uma revelação de contexto específico da doença no ambiente carcerário, que
tem suas regras e características muito próprias.
O diário de campo foi utilizado para registro das impressões, mostrando também o
comportamento observado durante o dia-a-dia na convivência prisional para o conhecimento
total do universo prisional pesquisado.
Duarte (2004) afirma que uma pesquisa é sempre, de alguma forma, um relato de
longa viagem empreendida pelo pesquisador, ou seja, uma viagem realizada por um sujeito
cujo olhar vasculha lugares muitas vezes já visitados ou não. Visitar o mundo prisional, onde
predominam leis internas e o perigo é sempre constante, tornaram a pesquisa desafiadora e a
busca do conhecimento revestiu-se de relevância.
72
As entrevistas permitiram fazer uma espécie de mergulho em profundidade, coletando
indícios dos modos como cada um dos presos vivencia sua realidade, levantando informações
consistentes que permitiram descrever a lógica que preside as relações no interior deste grupo,
o que, em geral, é mais difícil obter com outros instrumentos de investigação quantitativa.
As entrevistas são de fundamental importância para Duarte (2004) quando se deseja
mapear práticas, crenças, valores e sistemas classificatórios de universos sociais específicos,
mais ou menos bem delimitados, em que os conflitos e contradições não estejam claramente
explicitados. Por medida de segurança interna, nenhuma entrevista pode ser gravada, mas
logo após a realização das mesmas transcrevi todas no diário de campo observando sempre
dados objetivos e subjetivos da fala. Mostram-se sempre entrevistas carregadas de nervosismo
e ansiedade por parte de todos os presos participantes pelo medo de relatar sua vida prisional
e sofrer alguma represália na cela.
Os presos chegavam algemados, cabisbaixos e perguntando sempre se a sua
participação não influenciaria no seu convívio na cela. O nervosismo desaparecia durante as
entrevistas e durante o esclarecimento do que se tratava a pesquisa, pouco a pouco, o
ambiente se tornava menos tenso.
Os presos se mostravam ansiosos e preocupados por sua fala, temendo comprometer
sua vida na cela. O medo de relatar o cotidiano imposto na cela vivenciado por cada um, por
medo de represália dos outros presos, evidenciou-se durante as entrevistas.
Todos os presos que tiveram tuberculose na vida prisional durante o período de
investigação foram entrevistados.
Para interpretação dos discursos produzidos pelos presos, recorreu-se à literatura de
vários autores e suas teorias explicativas, que serviram para contextualizar analiticamente os
temas centrais que emergiram durante as entrevistas, sendo estes categorizados como: “A
tuberculose: o preconceito vivenciado pelo preso portador”; “A tuberculose: o medo da morte,
73
o isolamento e a dificuldade do tratamento na prisão” e “As relações interpessoais prisionais
do preso com tuberculose e o conhecimento da população carcerária em relação à doença”.
Capturar e interpretar as representações sociais da tuberculose no viver prisional
significou um envolvimento social com um imaginário especial:
“é reconstruir, com pedaços de discursos individuais, como em um quebra-cabeça, tantos discursos-síntese quantos se julgue necessário para expressar uma dada figura, ou seja, um dado pensar ou representação social sobre o fenômeno”(Lefèvre e Lefèvre; 2003. p.15).
A representação do que é a tuberculose emergiu no discurso dos sujeitos construídos
nas relações com o universo do viver prisional. Trata-se de um conhecimento prático, do
senso comum, que forma uma concepção de vida na orientação das ações individuais
(MOSCOVICI, 2003).
5.4.1 A TUBERCULOSE: O PRECONCEITO VIVENCIADO PELO PRESO
PORTADOR
Minayo (2004) descreve que os sintomas e os agentes etiológicos trazem uma carga
histórica, cultural, política e ideológica, e não podem ser contidos apenas numa fórmula
numérica ou num dado estatístico. Para entender o preconceito prisional, identificar o discurso
se faz necessário à palavra ser classificada como:
“uma postura ou idéia pré-concebida, uma atitude de alienação a tudo aquilo que foge dos “padrões” de uma sociedade. Preconceito é um juízo preconcebido, manifestado geralmente na forma de uma atitude discriminatória perante pessoas, lugares ou tradições considerados diferentes ou estranhos” (KRISTIKIL , pg. 345, 2007).
O preso é excluído da sociedade como algo que deve ser depositado fora das cidades.
A segregação que atinge os presos aparece em suas falas na definição metafórica da cela
como um banheiro, depósito de dejetos. A prisão é local de expurgo social:
Ent 3 - A gente mora num banheiro e qualquer um pensa assim.
74
Em relação à doença, durante décadas muitas famílias se recusavam a falar sobre a
tuberculose por temor de que a moléstia acelerasse o seu curso no seu filho e por medo de
represálias da parte da sociedade, em meados do século XVIII. Ouvir saber que alguém tinha
tuberculose equivalia a uma sentença de morte, sendo comum esconder do tuberculoso a
identidade de sua doença e após sua morte não contar aos seus filhos (SONTAG, 2007;
BERTOLLI FILHO, 2002).
Na história da doença no Brasil, o preconceito contra os tuberculosos foi intensificado
desde 1930, quando o país estava sob o mando de Getúlio Vargas (1882-1954). Os
representantes do governo repetiam com insistência que a tuberculose era causada por
comportamento desregrado. O doente do peito era duplamente traidor dos interesses nacionais
porque não só deixava de trabalhar como também passava a pedir esmolas para garantir seu
sustento e o de seus dependentes. Falava-se também que, por serem responsáveis pelo próprio
adoecimento, os tuberculosos não deviam exigir o apoio do governo, sendo os pedintes
chamados de subversivos pelo governo (BERTOLLI FILHO, 2002).
A culpabilização do doente por sua situação é fato histórico ainda presente, e neste
aspecto que envolve preconceito e isolamento mesmo da parte do poder público e dos órgãos
que devem zelar pela saúde pública, a tuberculose é modelar.
Gonçalves (2000) coloca que algumas concepções da tuberculose a referem como uma
doença que vem do outro, do comportamento desregrado e amoral, do ar impuro, do local
aglomerado e não higiênico, do que é colocado para fora e que contagia; do crescimento
acelerado e desestruturado da vida. Coloca o sujeito com tuberculose como o verdadeiro
culpado por ser portador da doença sendo impuro para o convívio social.
Sontag (2007, p. 76) comenta que doenças incuráveis se prestam com especial vigor à
adjetivação de situações negativas, justamente por catalisarem, em função de sua
incurabilidade e de seu caráter caprichoso, o horror coletivo ante o perigo da desagregação:
75
“Qualquer moléstia importante cuja causa é obscura e cujo tratamento é ineficaz tende a ser sobrecarregada de significação. Primeiro, os objetos do medo mais profundo (corrupção, decadência, poluição, anomia, fraqueza) são identificados com a doença. A própria doença torna-se uma metáfora. Então, em nome da doença (isto é, usando-a como metáfora), aquele horror é imposto a outras coisas. A doença passa a adjetivar.”
Mostra a história que cortiços que abrigavam os socialmente excluídos eram vistos
como mantenedores propagadores e acumuladores de sujeira e perigo social, antro de
doenças, pessoas perigosas e propagadores de doença.
“Ser tuberculoso era uma pecha. Quando aparecia um caso de tuberculose na família era escondido, então, ‘Fulano tem uma mancha no pulmão’, uma coisa qualquer... Ninguém falava em tuberculose, não se mencionava. Quando um indivíduo era noivo e descobria que a noiva ficara tuberculosa, ele desmanchava o casamento” (PORTO, 2007, p. 46).
A prisão que se situa as periferias das grandes cidades é alvo da mesma discriminação
pela sociedade. No mundo prisional, quando se questiona sobre o que representa a tuberculose
para o preso na prisão, encontra-se o seguinte discurso:
DSC 1
Foi o lugar que senti mais preconceito em toda minha vida. Nunca sofri tanta
discriminação em toda minha vida por ser portador da doença.
Muitos presos por fazerem uso abusivo de drogas, levarem vida sedentária e
alcoolismo, trazem consigo a marca do mal e da destruição inclusive entre os demais:
Ent.5 - As formas que somos tratados aqui dentro, a discriminação a gente parece bicho.O preconceito na cela é difícil mas com o tempo nos superamos.
No sistema prisional não é diferente, na prisão a doença é temida ainda por ser
expressão de algo que é socialmente digno de censura, bem como por representar o estágio
último de miséria humana. Nesse sentido, persiste no imaginário social como uma forma de
76
relação da sociedade com o doente, o processo de estigmatização da tuberculose e do
tuberculoso se mostra claramente na vida prisional (PORTO, 2007).
DSC 7
A doença na prisão é desconhecida, associam a doença ao fato de emagrecimento e
tosse.
Nos discursos produzidos pelos presos a tuberculose, doença não devidamente
conhecida envolve a produção da metáfora do doente do pulmão ligado à tosse. Burnie (2005)
descreve que as manifestações da doença existem desde a Antigüidade, particularmente entre
os gregos que, impressionados pelo emagrecimento progressivo e debilitações do doente,
designavam a moléstia por tísica (phtisis, em grego), que se denominava enfraquecimento do
corpo.
Sontag (2002), em seu estudo sobre a tuberculose e o câncer, traça um comparativo
entre essas duas doenças, analisa a utilização irreal e muitas vezes primitiva, em nossa cultura,
da doença em sentido figurado, da doença como metáfora. Seu ponto de vista é o de que a
enfermidade não é uma metáfora e que o modo mais verdadeiro de encarar a doença inclusive
a maneira mais saudável de ficar doente, é resistir a esses pensamentos metafóricos. As
fantasias florescem, porque o câncer e a tuberculose são vistos como algo muito além da sua
condição de doenças possivelmente fatais.
Ent.3 - Eles reclamavam da minha tosse e queriam me tirar, é o preconceito.
A tuberculose, como dito anteriormente em sua evolução sempre foi entendida como
doença de um só órgão, o pulmão. Durante toda a história a tuberculose causava desalento que
era suscitado não apenas pela enfermidade que corrompia o corpo, mas também pela carga
simbólica que a tuberculose impunha às suas vítimas e às pessoas que lhes eram próximas.
77
Assim, a morte física prometida pela doença tinha como etapa anterior à discriminação social
que, nas confidências pessoais, era declarada como muito mais sombria e dolorida que os
padecimentos físicos produzidos pela infecção (BERTOLLI FILHO, 2000).
A visão pela qual os doentes com tuberculose passaram a ser vistos e tidos como
perigosos, já que eram capazes de disseminar a doença a quem não compartilhava das mesmas
condições de vida, esteve presente na história e também na vida prisional, assegura Guillaume
(1988).
Ao longo dos séculos, a tuberculose possuiu várias representações. Foi a doença dos
românticos, das pessoas com vida desregrada, dos infortunados, porém o tempo encarregou-se
de modificações tão profundas que quase se poderia dizer não existir hoje uma única figura
para descrever a doença. Entretanto, o que se observa na fala anteriormente citada é que a
doença ainda é percebida como ligada à pobreza, aos menos favorecidos, doença da
promiscuidade, o que demonstra sua discriminação histórica.
Tendo como evolução histórica da doença, ela carregando o fardo discriminação por
toda a sociedade e mesmo após o uso de medicações que a curam, ela emerge na
contemporaneidade com muito sofrimento e exclusão ao doente:
“A tuberculose não é reemergente para aqueles que a estiveram sofrendo e foram
marginalizados em decorrência da doença ao longo de toda a sua vida.”(OTT, 1996, p. 376,
citado por PORTO, 2007).
5.4.2 A TUBERCULOSE: O MEDO DA MORTE, O ISOLAMENTO, A
DIFICULDADE DE CUMPRIR O TRATAMENTO NA PRISÃO
As palavras de Rubem Alves (2001, p. 3) enfatizam o que seria o medo da morte:
“Já tive medo da morte. Hoje não tenho mais. O que sinto é uma enorme tristeza. Concordo com Mário Quintana: Morrer, que me
78
importa? (...) O diabo é deixar de viver. A vida é tão boa! Não quero ir embora...”.
O medo da morte é um sentimento que proporciona um estado de alerta demonstrado
pelo receio de fazer alguma coisa, geralmente por se sentir ameaçado, tanto fisicamente como
psicologicamente (GOFFMAN, 1988).
De acordo com Sontag (2007), as doenças que causam mais medo são as consideradas
não apenas letais, mas também, desumanizadoras, com uma associação aos seus portadores de
alterações físicas e comportamentais peculiares. A morte é encarada pelo preso como algo
punitivo, sendo o medo de morrer na prisão algo marcante no discurso:
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O medo da morte por estar com tuberculose dentro da prisão é muito grande.
Historicamente, no movimento romântico a doença permaneceu como a forma
preferida de dar sentido à morte “O tuberculoso moribundo é retratado como alguém que se
tornou mais belo e mais elevado” (SONTAG, 2007, p.21).
No século XIX a tuberculose se apresenta como doença que enfraquece o homem e o
torna descartável para a sociedade consumista:
“Aquele tipo que vês é um semeador da Morte. Se tivéssemos leis mais sabias, mais previdentes, esse monstro, em vez de andar por aqui manchando, com seu luto, o esplendor desta tarde e comprometendo a vida, estaria em um asilo, segregado dos homens. // Está tísico. (...) Sabe que está perdido, di-lo a todos e, propositadamente, dissemina o seu mal” (COELHO NETO, 1924, citado por BERTOLLI FILHO, 2001, p.166-7).
Na Revolução Industrial, onde se dá a produção de corpos como produtores da
economia e do lucro, a doença é punitiva e semeadora da morte. O medo da morte se mostra
presente principalmente na revolução industrial onde o corpo se torna máquina na produção
de matéria para consumo e lucro, onde estar doente significa para o Estado um peso em sua
economia (GONÇALVES, 2000).
79
Apesar do tratamento e cura, no século XX, em relação à doença, o medo de morrer
dentro da prisão ainda é bastante presente:
Ent.3 - Fiquei aflito pensando que poderia morrer.O medo de morrer é
grande demais.
Dentro da prisão o preso se torna vulnerável frente à sociedade porque sua liberdade se
torna o bem tomado pelo Estado e conseqüentemente sua vida social se torna restrita à visita
dos familiares nos finais de semana.
Jeremy Bentham foi um filósofo e jurista inglês conhecido pela idealização do
panoptismo que corresponde à observação total e à tomada integral por parte do estado
disciplinador da vida de um indivíduo e por isso é a vida que está em jogo no aprisionamento
de um indivíduo. Ele relata que a vida é o principal bem que se torna irreversível à vida
humana. Por esse motivo, a criação das prisões se torna necessária para imposições das leis do
homem. O medo da morte e a perda da liberdade estão ligados fortemente ao medo de ser
preso e ser portador da tuberculose.
“A privação da liberdade é ressentida por todos, ela é medida pela duração, e a duração é perfeitamente divisível. A prisão é uma maquina de subtrair o tempo. Combinada com os trabalhos forçados, aí esta uma punição de alta rentabilidade” (MILLER, 2004, p. 87).
Além da vida que é tomada ao preso na prisão, a doença diminui a sua expectativa de
viver após pena cumprida imposta pela sociedade. O isolamento frente ao mundo externo, a
prisão e o medo de morrer no cárcere aumentam a angústia do preso portador da doença.
DSC 3
A doença provoca isolamento, distância da família e dos outros presos na cela.
Ficamos em celas separadas até o fim do tratamento. Nem a família vem nos visitar e
sofremos muito com isso.
80
A fala dos entrevistados na construção do discurso mostra um sentimento subjetivo
carregado de solidão que o preso com tuberculose carregava com ele. O mesmo ocorre na
prisão como na evolução histórica da doença em que o portador da doença era isolado da
sociedade em áreas montanhosas e às vezes expurgado do local de vivência, por ser
tuberculoso.
“Em Campos do Jordão e em São José dos Campos, os autores tísicos viviam a vida estancada num limbo que beirava a eternidade, tendo como espelho maior o "ruço" que cobria a serra da Mantiqueira e se espalhava pelo vale do Paraíba. O sentimento de impotência e a solidão imposta faziam com que todos ansiassem pela novidade que nunca chegaria” (BERTOLLI FILHO, 2000, p. 500).
O contato com o preso portador de tuberculose, para Sontag (2007), provoca a
sensação de violação do tabu, como se o contato diário com o doente colocasse todos no
mesmo patamar ocasionando em conseqüência o isolamento.
Historicamente a instituição do exílio e da exclusão dos doentes do convívio em
sociedade, comportamentos que deram origem às práticas de isolamento. Nos presídios o
isolamento por medo tanto da doença quanto da discriminação vivenciada dificulta a forma de
viver do preso doente.
O isolamento é a forma que os outros presos têm de escapar da doença na sensação de
que o preso portador de tuberculose representa forma de perigo para sua vida prisional.
No final do século XIX o combate à tuberculose esteve centrado em dois
estabelecimentos: o dispensário e o sanatório. Enquanto o primeiro se dedicava à procura dos
focos de contágio, à difusão de noções de higiene e à prestação de assistência médica e social
aos doentes, o segundo esteve voltado ao isolamento nosocomial e tratamento continuado.
Pretendia-se assim dificultar a disseminação da enfermidade. O mesmo ocorre nas prisões,
como se o isolamento provisório do preso doente fosse uma forma de prevenir a sociedade
desta doença (CAMPOS, 1965).
81
A primeira concepção é a de que a tuberculose é uma doença que passa de uma pessoa
para outra e, portanto, o espaço de interação física torna-se um espaço de risco, o que dificulta
o tratamento tanto no uso de medicações, quanto na forma de apoio ao preso portador da
doença.
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O que dificulta o tratamento da doença com a medicação são os efeitos colaterais,
como vômitos, tontura e o horário incorreto de tomar o remédio na cadeia.
Nessas falas ficam evidentes as manifestações colaterais do uso dos medicamentos,
como sinais e sintomas de vômitos, tonturas e emagrecimentos, bem como a dificuldade de
cumprimento de horários para tomar os medicamentos. Para os presos não se trata somente do
ato de tomar alguns comprimidos, mas o fato de dependerem de outros para dar a medicação e
cuidados adequados.
Gonçalves et al (1999) referem que tomar o medicamento vai depender de como a
pessoa controla ou articula o seu corpo, e qual a sua visão do que é ou não uma boa resposta
do corpo às sensações desagradáveis. E de como o paciente, ao receber o diagnóstico de
tuberculose, leva um choque ou tem dificuldade de aceitá-lo inicialmente.
Autores brasileiros têm acompanhado e procurado avaliar a implantação e o
desenvolvimento da estratégia DOTS, especialmente a questão do tratamento supervisionado,
na perspectiva dos profissionais de saúde (RODRIGUES et al., 2008) e dos pacientes
(VENDRAMINI et al., 2002).
Na opinião dos pacientes pesquisados em Ribeirão Preto por Vendramini et al. (2002)
o suporte familiar foi considerado relevante para o bom desenvolvimento da terapêutica com
medicamentos na perspectiva da estratégia DOTS. Por outro lado, a dependência do horário
da visita do agente de saúde para supervisão direta da administração do medicamento pode
82
acarretar problemas em relação à rotina de vida e de trabalho dos pacientes que estão sob
acompanhamento.
Em minha experiência profissional no atendimento à população carcerária percebi que
são muitas as dificuldades dos presos portadores de tuberculose em relação ao cumprimento
da terapêutica com medicamentos. O isolamento em relação à família e o preconceito dos
demais presos para com o doente são fatos revelados por este estudo que é aqui apresentado
que comprometem o bom andamento da estratégia DOTS e de seu componente fundamental
que é o tratamento supervisionado. As rotinas próprias da instituição dificultam ou impedem
que a medicação seja dada de forma adequada ao preso tuberculoso. A inspeção diária das
celas, revistas, hora para o banho de sol e outros procedimentos dificultam a entrega pela
enfermaria da medicação na hora prescrita pelo médico e o cumprimento do tratamento
supervisionado. É importante observar que o tratamento supervisionado integra ou facilita
abordagens educativas e deve ser ressaltado que a população de presidiários é um elo de risco
importante no contexto epidemiológico da tuberculose.
Rodrigues et al. (2008) apontam que os resultados de sua pesquisa com profissionais
de saúde da Paraíba mostraram que a relevância do tratamento supervisionado é percebida por
eles, bem como as dificuldades operacionais envolvidas no desenvolvimento desta estratégia.
Doenças infecciosas agudas com sintomas dolorosos e estressantes promovem
geralmente um maior grau de adesão ao tratamento do que as doenças crônicas,
particularmente aquelas de longa duração, como no caso da tuberculose (MEDICALL, 1940).
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) demonstra que há o problema dos efeitos
secundários dos medicamentos para tuberculose, que podem influir de maneira negativa sobre
a adesão ao tratamento da doença. Na maioria das vezes, os efeitos colaterais dos
medicamentos são suportáveis ou transitórios, embora, em certos casos, eles possam por em
risco a vida da pessoa.
83
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A cura da doença significa que poderá viver como outros na cela, uma libertação.
Para os presos, a cura pela doença significa uma libertação, ou seja, a forma de
conviver com as pessoas e a família novamente, como se fosse um passe livre para uma nova
vida e criação de uma nova identidade (GOFFMAN, 1999).
Percebe-se que, nos relatos sobre o tratamento, os entrevistados colocavam-se como
pessoas que estavam travando uma luta, construindo uma imagem de vencedores que ao
conseguirem levar o tratamento adiante conseguirão um prêmio: a sua libertação.
Na relação com o preso o familiar é colocado num contínuo conflito entre a
colaboração/solidariedade e conflitos e discriminação, isso pode ser exemplificados pela
instabilidade emocional provocada pela doença no contexto social da prisão que gera
sofrimento e remete à necessidade da busca de suporte, o qual pode ser promovido pelo
serviço de saúde. A finalidade desse suporte é ajudar o familiar a permanecer ao lado do
preso.
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O contato com a família quando estamos doentes ajuda no tratamento e diminui o
preconceito.
A família é o primeiro grupo social no qual se está inserido. È a unidade nuclear do
indivíduo, deve acolher, permitindo desenvolver as habilidades, experiências, vivências e
novas relações humanas. A família é o ambiente em que a pessoa recebe todo o apoio afetivo,
psicológico, valores humanos e éticos, além de outras ferramentas necessárias para seu pleno
desenvolvimento físico e mental (GONZALES, 1999; OLIVEIRA e JORGE, 1998).
84
Pessini (2002) descreve que o sofrimento vai além do saber físico. Caracteriza-se por
uma junção de conotações culturais, subjetivas, sociais e espirituais, ou seja, é a ansiedade, a
depressão, a solidão e o sentimento de não-sentido da vida. Em função disso, o sofrer acentua
o processo de desestruturação da família porque invade toda a sua integridade enquanto
grupos sociais, alterando todas as perspectivas futuras.
Na prisão isso é acentuado e caracterizado pelo fato de à família isolar o preso por
motivos sociais ou mesmo discriminatórios impostos pela sociedade tanto a sua quanto ao
preso pelo medo de condenar o único alicerce que o liga ao mundo exterior.
A fragilidade, o medo, a angústia do preso com sua situação de também tuberculoso
podem levar o indivíduo a um processo de auto segregação que antecede a exclusão que irá
sofrer, movimentada pelos demais presos. O indivíduo isola-se antes que seja excluído pelos
demais. Esse isolamento é entendido como uma forma de minimizar o sofrimento futuro pela
possível exclusão a que devem ser expostos os presos doentes, inclusive de seus familiares.
5.4.3 AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS PRISIONAIS DO PRESO COM
TUBERCULOSE E O CONHECIMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRI A EM
RELAÇÃO À DOENÇA
Foucault (1977), em seu livro Vigiar e Punir, busca analisar as práticas punitivas na
modernidade partindo da instituição que melhor corporifica a tecnologia de poder específica
da contemporaneidade: essa instituição é a prisão e a tecnologia de poder que aí tão bem se
aplica é a disciplina (ALVAREZ, 2004).
A prisão se tornou à pena por excelência, pena esta não mais voltada para o suplício
ou o castigo simbólico e exemplar, mas sim para a disciplina do corpo e da “alma” do detento.
Na verdade, a análise procura mostrar que as práticas disciplinares próprias da prisão têm um
85
alcance que irá muito além dos muros da instituição, ao constituírem tecnologias de poder
que, partindo das práticas prisionais, espalham-se por toda a sociedade, em instituições como
fábricas, hospitais, escolas (FOUCAULT, 1977).
Segundo Goffman (1999), é o estabelecimento de uma nova identidade social que
torna os indivíduos diferentes uns dos outros. Ele deixa de ser considerado um ser comum e
um ser total, reduzindo-se a uma pessoa carregada de atributos. Para que o preso consiga
iniciar sua nova vida prisional, ele necessita se despir de todas suas “identidades domésticas”,
criando assim uma nova identidade institucionalizada pelo presídio.
Os microcosmos prisionais, que possui leis próprias definidas pelos presos, baseado na
procura da manutenção de uma ordem interna, fazem com que a tuberculose na sua
subjetividade cause um desequilíbrio interno gerado pelo medo e desconfiança de encarar a
doença.
Os discursos mostram a busca de uma ordem interna imposta pela comunidade da cela
ao preso portador de tuberculose orientada pela banalização e pelo preconceito. O habito
diário é imposto ao preso portador pela cela e o seu isolamento compõe a tentativa de um
equilíbrio interno.
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Nossas roupas e meu colchão são separadas dos demais, tenho horário próprio de
usar o banheiro, comer e dormir. Se não sigo eu sou punido pela cela, é a lei do cão.
Um dos aspectos mais destacados pelos integrantes do grupo foi a repercussão da
doença em suas vidas prisionais. O discurso mostra que a doença influencia na forma do preso
acometido pela doença de viver na cela, desde a separação de suas roupas do restante dos
presos da cela até a definição de horários para ir ao banheiro e se alimentar.
86
A superlotação das celas, a insalubre e a precariedade tornam o ambiente propício à
proliferação de epidemias e ao contágio de doenças, que acabam provocando a imposição de
normas dos presos sadios para os presos portadores. A falta de higiene das celas, o
sedentarismo, o uso de drogas, fazem com que o preso portador da tuberculose seja um ponto
crítico na saúde prisional. Loïc Wacquant (2001, p.115) revela que: “o superpovoamento das
prisões pesa enormemente no funcionamento dos serviços correcionais e tende a relegar a
prisão à sua função bruta de depósito dos indesejáveis”.
O medo do contágio por parte dos outros presos proporciona ao preso doente uma vida
à parte do resto da população prisional:
Ent 5 - Meu copo, colher, o que é pessoal ficava comigo até eu ir para outra cela.
César Roberto Bitencourt (pg35, 2004), em seu livro “À Falência da pena de prisão”
fala da desumanização e crueldade impostas ao preso doente e sadio no ambiente carcerário:
“[...] existem centros penitenciários em que a ofensa à dignidade humana é rotineira, tanto em nações desenvolvidas como em subdesenvolvidos. As mazelas da prisão não é privilégio apenas de países do terceiro mundo. De um modo geral, as deficiências prisionais compendiadas na literatura especializada apresentam muitas características semelhantes: mau trato verbal (insultos, grosseiros, etc.) ou de fato (castigos sádicos, crueldades injustificadas e vários métodos sutis de fazer o recluso sofrer, sem incorrer em evidente violação do ordenamento, etc.); superlotação carcerária, o que também leva a uma drástica redução do aproveitamento de outras atividades que o centro penal deve proporcionar (população excessiva reduz a privacidade do recluso, facilita grande quantidade de abusos sexuais e de condutas inconvenientes); falta de higiene (grande quantidade de abusos sexuais e de condutas inconvenientes); falta de saúde (grande quantidade de insetos e parasitas, sujeiras e imundícies nas celas, corredores, cozinhas, etc.).”
.
Em relação à conscientização sobre a doença a educação prisional é importante para
minimizar e controlar o estigma e o preconceito vivenciados pelos doentes.
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87
A conscientização dos presos na prisão ajuda no tratamento e conhecimento sobre a
doença.
O processo educativo em grupo valoriza a aproximação das pessoas, favorece ao
fortalecimento das potencialidades individuais e também grupais, na valorização da saúde, na
utilização dos recursos disponíveis e no exercício da cidadania (ALONSO,1999).
Freire (1980) discute a questão ética de valor e respeito ao outro nos seus
ensinamentos acerca da educação, possibilita o desenvolvimento da educação em saúde de
maneira dialógica o que promove a autonomia individual das pessoas. Os ensinamentos de
Freire certamente são relevantes para a remoção da exclusão social do preso com tuberculose.
Freire (1980) revela que a educação que se impõe aos que verdadeiramente se
comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como
seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdos. Não pode basear-se numa consciência
especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos
conscientes” que possua consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de
conteúdos, mas o da problematização dos homens e suas relações com o mundo vivenciado,
mesmo sendo este mundo o prisional.
É de suma importância a educação em saúde na área prisional, na medida em que é
vista como instrumento de ressocialização, de desenvolvimento de habilidades e de educação
para diminuição da discriminação interna. Os objetivos de encarceramento devem ultrapassar
as questões de punição, isolamento e detenção. A educação em saúde é uma tentativa de
resgate social na minimização da discriminação social.
Para Souza (2009) é preciso reforçar a premissa de que as pessoas presas, qualquer
que seja a natureza de sua transgressão, mantêm todos os direitos fundamentais que têm todas
as pessoas humanas, e principalmente o direito de gozar dos mais elevados padrões de saúde
física e mental. As pessoas estão privadas de liberdade e não dos direitos humanos inerentes à
88
sua cidadania. A educação e a informação em saúde possibilitam essa inclusão social do preso
tuberculoso, principalmente em sua vida prisional.
89
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tuberculose é uma das doenças mais antigas da humanidade, traz o peso de um
histórico estigma e continua a ser um dos grandes desafios da Saúde Pública. É sabido que a
ocorrência da tuberculose na população prisional é maior do que na população em geral,
embora dados qualitativos sobre esta questão sejam escassos no contexto brasileiro.
As representações sociais de saúde/doença e as concepções sobre a etiologia e o
contágio da tuberculose demonstram que a sabedoria prática das pessoas sobre esta doença
não se restringe aos ensinamentos biomédicos. Pelo contrário, há um amplo leque de
possibilidades de ação de controle que foge ao âmbito restrito do serviço prestado e do
cuidado rotineiro que o acompanha (GONÇALVES et al, 1999).
As representações sociais sobre a doença são produzidas e elaboradas constantemente.
Os significados a respeito da doença são construídos por meio da comunicação na
convivência rotineira no ambiente das instituições. As representações sobre a doença são
determinadas pelas condições sociais de inserção dos sujeitos sociais no enfrentamento da
doença. As representações sociais, então, legitimam o senso comum como forma de
conhecimento, colocando-o como teia de significados, capaz de criar a realidade social
(BORGES, 1995).
Em relação aos presos, a representação social da tuberculose no espaço prisional
significa muito mais do que somente estar doente, mas viver numa instituição que cria uma
identidade nova e exige uma nova forma de socialização. Nesse sentido persiste no
imaginário social prisional o histórico processo de estigmatização da tuberculose e do
tuberculoso.
Habitualmente se acredita que a prisão seja uma espécie de depósito de criminosos,
depósito de indivíduos inconvenientes, de tal forma que é necessário reformar as prisões,
90
fazer delas um instrumento de transformação dos indivíduos e, principalmente, oferecer a eles
novas oportunidades de inclusão na sociedade.
Para Foucault (1977) as prisões são fábricas de delinquentes, sendo úteis tanto no
domínio econômico como no político. No entendimento do pesquisador os presos, e ainda
mais os portadores de tuberculose participantes desta pesquisa, criam para a sociedade uma
responsabilidade social indesejada, um estorvo que deve ser enfrentado no esforço
disciplinador forjado pelo sistema social dominante.
O Sistema Único de Saúde com sua juventude, suas limitações e formas incorretas de
gestão ainda é a melhor forma de promoção da saúde até o momento apresentada, porque em
seus princípios estimula a universalidade do acesso à saúde como forma de inclusão social.
É preciso reforçar a premissa de que as pessoas presas, qualquer que seja a natureza de
sua transgressão, mantêm todos os direitos fundamentais que tem todo o ser humano e,
principalmente, o direito de gozar dos mais elevados padrões de saúde física e mental. As
pessoas estão privadas de liberdade e não dos direitos humanos inerentes a sua cidadania.
A pesquisa qualitativa permite uma relação maior com os entrevistados e a
profundidade de depoimentos é rica. Em relação aos discursos produzidos pelos presos, várias
interpretações e análises poderam ser feitas.
Os presos com tuberculose, em seu discurso, percebem-se como alvo de preconceitos e
violência em razão de sua condição. Isolamento, inclusive da própria família, dificuldades de
ordem prática para o comprimento do tratamento no ambiente prisional, medo da morte e de
represálias por parte dos demais presos são sentimentos e impressões que marcam as
representações sociais encontradas no estudo.
O que se pode ver é que nas prisões a saúde ainda é considerada não como um direito,
mas como uma concessão da administração penitenciária. E o preso portador de tuberculose
tem como complicadores em relação à doença o preconceito, o medo de morrer e o
91
isolamento que lhe é imposto pelos que convivem na cela e pelos familiares. É alvo da
violência no ambiente interno da prisão e, como preso e portador de uma doença
estigmatizada, no ambiente familiar e nas sociais com o meio externo à prisão.
Os achados do estudo permitem uma aproximação da vivência dos presos com
tuberculose, conformam um olhar sobre a dura realidade que marca suas experiências no
ambiente da prisão.
Na ação da realização da pesquisa foi percebido que desenvolver uma prática
educativa em grupo é importante e pode permitir que as pessoas ampliem a compreensão
sobre a doença, diminuíam o preconceito em relação ao preso com tuberculose.
A teoria da representação social de Moscovici vem reforçar a compreensão de como as
representações sociais são elaboradas coletivamente a partir da realidade cotidiana, o que traz
esclarecimentos relevantes e úteis para elaboração de estratégias de promoção da saúde
orientadas para a população carcerária. A tuberculose dificilmente deixará de ser motivo de
preocupação nos próximos séculos, mas pode ser cuidada e controlada na tentativa de
diminuição do seu impacto na vida do doente e no seu convívio social.
92
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98
APÊNDICE 1 - Glossário de termos usados nas entrevistas
Bagaça = É o mesmo que enfraquecido, debilitado.
Boi = Denominação dada ao banheiro na cela.
Bucuda = Denominação dada à porta da cela.
Caguetando = É o mesmo que delatar, ou seja denunciar os outros presos de algo ocorrido.
Gaiola = Denominação dada à cela.
Osso = O mesmo que difícil, trabalhoso e árduo.
Pedra = Denominação dada à droga vulgarmente chamada de “crack” pelos usuários.
Praia = O chão da cela usado para dormir por presos recém chegados à unidade prisional.
Rato = Denominação dada à droga vulgarmente chamada de “maconha” pelos usuários.
Seguro = Pavilhão usado para presos que necessitam de proteção especial junto a outros
presos, exemplificando são os estupradores ou presos que possuem divida junto a outros
presos.
Tereza = Pedaço de lençol usado pelos presos para enforcar na tentativa de auto-extermínio.
99
APÊNDICE 2
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,_______________________________________________________________________, do sexo_________________________,de______anos de idade, preso do presídio Floramar do município
de Divinópolis Minas Gerais, declaro ter sido informado e estar devidamente esclarecido sobre os
objetivos e intenções deste estudo, sobre as entrevistas a que estarei sendo submetido, sobre os riscos e
desconfortos que poderão ocorrer. Recebi garantias de total sigilo e de obter esclarecimentos sempre que
o desejar. Sei que tenho direito a informações sobre a pesquisa se necessário. Sei que minha participação
está isenta de despesas. Concordo em participar voluntariamente deste estudo e sei que posso retirar meu
consentimento a qualquer momento, sem nenhum prejuízo ou perda de qualquer benefício.
_________________________________________________________________________
Assinatura do sujeito de pesquisa.
______/______/_______.
__________________________________________________________________________
Assinatura da testemunha
______/______/______
Pesquisador responsável
Eu Gustavo Dias Araújo responsável pelo projeto TUBERCULOSE E A SUA REPRESENTAÇÃO
SOCIAL PRISIONAL declaro que obtive espontaneamente o consentimento deste sujeito de pesquisa
para realizar este estudo.
Assinatura do preso Data:
100
APÊNDICE 3 - ROTEIRO DA ENTREVISTA
DATA: ___/___/___ NºCELA:_________________________________
NOME:
DATA DE NASCIMETO:
SEXO:
NÍVEL DE INSTRUÇÃO:
sem instrução�
1º grau incompleto� 1º grau completo �
2º grau incompleto� 2º grau completo �
superior incompleto� superior completo �
JÁ ESTEVE PRESO ANTES? Sim� Não�
Quantas vezes?
Por quanto tempo?
Onde?
TEMPO DE PERMANÊNCIA NESTE PRESÍDIO:
Pergunta central:
1 - PARA VOCE, O QUE REPRESENTA A TUBERCULOSE DENTRO DO PRESIDIO?
Demais perguntas (Roteiro Guia):
2 - DENTRO DA CELA EXISTEM NORMAS OU REGRAS IMPOSTAS A UM
PRESO DOENTE COM TUBERCULOSE? CASO EXISTAM, VOCÊ PODE ME DAR
EXEMPLOS?
3 - VOCÊ TEVE CONTATO COM ALGUM PRESO COM TUBERCULOSE OU QUE
ESTÁ EM TRATAMENTO PARA A DOENÇA?
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4 - O QUE FACILITOU E DIFICULTOU O TRATAMENTO DE SUA DOENÇA?
PARA VOCÊ, A CONDIÇÃO DE SER PORTADOR DA DOENÇA INTERFERE
NO CONVÍVIO DENTRO DA CELA? POR QUE?
5 - O QUE VOCÊ PENSA QUE FACILITARIA O CONTROLE DESTA DOENÇA
DENTRO DOS PRESIDIOS?
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Anexo 1: PARECER N°. 27/2008 Interessado: Gustavo Dias Araújo
Data: 25/09/2008
Decisão
O Comitê de Ética em Pesquisa da FUNEDI, avaliou em 25/09/2008, o projeto intitulado “REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA TUBERCULOSE PRODUZIDAS POR PACIENTES EM REGIME PRISIONAL" e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido do referido projeto, obtendo o seguinte parecer: APROVADO.