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Trigonometria: uma intervenção pedagógica no 2º ano do Ensino Médio de um colégio estadual de Dois Vizinhos

Eliandro Filipiak1

Andréia Büttner Ciani2

Jean Sebastian Toillier3

Resumo: O artigo trata do estudo, elaboração e aplicação de uma intervenção pedagógica para o ensino de Trigonometria no Ensino Médio. O estudo abrangeu a história da Trigonometria, a utilização do Geogebra e a construção e utilização de materiais manipuláveis como ferramentas para resolução de questões inerentes às noções iniciais de Trigonometria. Toda a proposta foi elaborada para ser aplicada no ensino matutino. Porém, teve de ser adaptada às condições e necessidades de uma turma do noturno. O desenvolvimento da proposta se mostrou produtivo tanto para nós professores, quanto para os estudantes.

Palavras-chave: Trigonometria. História da Matemática. História da Trigonometria.

Geogebra. Ensino da Matemática no Ensino Médio.

Introdução

São vários os desafios enfrentados pelos professores no ensino dos

conteúdos que são inerentes à matemática escolar. Podemos citar como exemplo o

desafio de provocar o interesse nos alunos, principalmente no Ensino Médio.

Algumas variáveis do ensino e aprendizagem de Matemática no Ensino

Médio, tais como pouquíssimo interesse do aluno, o formato da aula de quadro, giz e

livro didático, sendo o conteúdo apresentado de maneira resumida, culminando em

uma fórmula ou um formato de exercício e inúmeros conteúdos não ministrados. De

tão corriqueiras, estas variáveis já se tornaram constantes. Sendo que alunos

interessados, aulas diferenciadas, que não seguem exclusivamente o livro didático e

a totalidade dos conteúdos vencida, são consideradas raras exceções.

1 Licenciado em Ciências com habilitação em Matemática pelas Faculdades Integradas de Palmas.

Professor de Matemática que atua no Colégio Estadual de Dois Vizinhos.

² Doutorado em Ensino de Ciências e Educação Matemática (UEL - Londrina). Professora na

UNIOESTE - Cascavel.

³ Doutorando em Educação Matemática e seus Fundamentos Filosóficos e Científicos (UNESP – Rio

Claro). Professor na UNIOESTE – Cascavel.

O conteúdo de Trigonometria é comumente não abordado, justificado pela

falta de tempo, poucas aulas de Matemática na grade curricular. No entanto, outras

hipóteses podem ser levantadas como a falta de conhecimento do conteúdo pelo

professor e maneiras de ensiná-lo. Experiências ruins de ensino, culminando em

total desinteresse, por parte dos alunos, acabam levando os professores a evitá-lo

em sua sala de aulas. Lançamos esta hipótese sustentada em nossas observações

e vivências como professores de Matemática.

Por outro lado, também como parte integrante da tradição da sala de aula,

muitos professores ainda se assentam em uma didática de sala de aula que

privilegia o giz e quadro negro. Esta didática permanece vinculada ao comodismo do

processo mecânico de resolução de exercícios apresentados em nossos livros

didáticos. A junção destas duas características da didática tradicional de sala de

aula pode ser uma das possíveis explicações para que a Matemática ainda sofra

com o estigma de ser uma matéria chata para muitos, incompreensível para alguns

e relevante para poucos. Há algum tempo, isso já se consolidou em um paradigma.

Na busca de romper com este paradigma consolidado, visamos mostrar com

este trabalho uma prática pedagógica que leve à construção histórica de conceitos

utilizados pela Matemática no ramo da Trigonometria e também a experimentação

como proposta metodológica para a sala de aula. Embora em nenhum momento

deixe de mostrar o quão importante é a parte teórica e a prática de resolução de

problemas, procuramos dar lugar também à experimentação com a construção de

teodolitos, demonstrando assim a aplicação no mundo de hoje dos assuntos teóricos

apresentados pelo professor.

Também vamos mostrar a possibilidade de incluir Tecnologias de Informação

e Comunicação – TICs - através da utilização do software Geogebra na construção

de gráficos nas funções trigonométricas.

Ao delimitar o projeto de intervenção pedagógica à trigonometria aplicada aos

alunos do 2º ano do ensino médio do Colégio Estadual de Dois Vizinhos - EFMP,

esta possibilidade pedagógica permite ao professor a abordagem histórica do

conteúdo, dá a oportunidade de construção de materiais para estudo, assim como

permite mostrar aos educandos onde este conhecimento está sendo aplicado no

mundo de hoje.

Ao abordar a História da Matemática como instrumento metodológico,

podemos melhorar a nossa prática pedagógica ao ensinar Trigonometria no Ensino

Médio para além da simples exposição dos conteúdos e a resolução mecânica dos

problemas apresentados nos livros didáticos a fim de motivar os alunos a entender

este conteúdo matemático.

A história da Trigonometria como abordagem inicial

A história da matemática se confunde com a própria história da humanidade.

Surgida da necessidade de quantificar e medir, ela se desenvolveu como uma

ferramenta importante na evolução do homem, levando-o do isolamento das

cavernas à imensidão do espaço sideral. Assim, utilizar a história como uma

proposta do ensino dos conteúdos matemáticos em sala de aula é recomendável e

necessária, pois:

A História da Matemática aumenta a motivação para a aprendizagem; tem ação problematizadora, utilizando em especial o diálogo; articula a matemática com outras ciências; mostra a importância da notação simbólica (linguagem) na constituição das formas e estruturas Matemáticas, no processo histórico de construção dos objetos matemáticos por diversas culturas e situa a Matemática cronologicamente: em relação aos produtores e à sua própria constituição, para poder compreender as condições de sua produção. (SAD, 2004, p. 4).

Para Berlinghoff e Gouvêa (2010), em qualquer fase de estudo de Matemática

precisamos compreender não somente os métodos de resolução, mas também qual

é o processo histórico pelo qual tal conhecimento se desenvolveu.

Questões históricas podem ajudar para que sejam alcançadas a respostas

que façam sentido, afinal cada povo que contribuiu para que tal conhecimento

matemático se desenvolvesse aplicou um pouco do seu ponto de vista. O modo com

pensaram e a forma em que agiram são ingredientes para entendermos sua

contribuição. Afinal, cada etapa no desenvolvimento da Matemática é evoluída com

base no que foi construído antes.

Assim, Gomes (2015, p. 194) nos diz que “[...] através da História o

estudante/professor passa a conhecer a Matemática como um saber que tem

significado dentro de um contexto e que foi, e está sendo, construído pela

necessidade de cada época”.

Como todo o conhecimento científico, a matemática sofreu ao longo do tempo

questionamentos e adequações. Muitos conhecimentos foram superados, outros

sofreram evolução e seu estudo foi sendo ramificado para que fosse detalhado e

melhorado. Dentre estas ramificações surge aquilo que conhecemos e estudamos

hoje como sendo a Trigonometria (trigonon = triângulo e metria = medição) ou,

medidas de triângulos. A sua origem deve-se também às necessidades práticas do

homem em relação à Astronomia, Agrimensura e Navegação.

Seu desenvolvimento se deu por meio dos estudos sobre semelhanças de

triângulos e, posteriormente, por meio das relações entre as medidas de seus lados

e ângulos, portanto está intimamente ligado ao desenvolvimento da geometria.

Vários povos contribuíram para o seu desenvolvimento, prova disso foi a

descoberta de um papiro datado de 1.650 a.C., denominado Papiro de Rhind, em

homenagem ao arqueólogo do século XIX chamado A. Henry Rhind que traz uma

série de 84 problemas matemáticos e que fazem menção a uma razão

trigonométrica chamada seqt, equivalente àquilo que chamamos hoje de cotangente,

que para os egípcios era de fundamental importância para que as inclinações das

faces das pirâmides permanecessem constantes (COSTA,1997). O seqt, conforme

representado na Figura 1, representava a razão entre o afastamento horizontal e a

elevação vertical da pirâmide.

Figura 1 - Uso da cotangente nas pirâmides egípcias

Fonte: http://www.ufrgs.br/espmat/disciplinas/geotri/modulo3/mod3_pdf/historia_triogono.pdf.

Os gregos tiveram nomes expoentes no desenvolvimento do que se conhece

hoje como trigonometria. Tales de Mileto (625 – 546 a. C.) que aplicou os

conhecimentos sobre semelhança de triângulos quando mediu a altura da pirâmide

que Quéops, conforme ilustrado pela Figura 2, que segue.

Figura 2 - Tales de Mileto ao medir a pirâmide de Quéops

Fonte: Lindegger, 2000, p. 45.

Na Figura 2 podemos ver representada a razão entre a altura da pirâmide (H)

e a sombra da pirâmide (S) mais a metade do lado da pirâmide (b) é igual a razão

entre a altura da estaca (p) e a sombra desta estaca (s).

Um dos discípulos de Tales, Pitágoras (570 – 495 a. C.) e seus discípulos,

demonstraram o teorema que leva seu nome: o quadrado sobre a hipotenusa de um

triângulo retângulo é igual à soma dos quadrados sobre os catetos e que sustenta a

relação fundamental da Trigonometria.

Mas foi na Astronomia que o estudo da Trigonometria realmente mereceu

destaque e isso se deve ao fato de que todos os povos (babilônicos, egípcios,

chineses, Gregos, hindus) eram guiados e fascinados pela curiosidade nos astros

que estavam bem longe deles, no céu. E é com os gregos que o estudo dos astros

utiliza a Trigonometria, assim

Com os gregos pela primeira vez encontramos um estudo sistemático de relações entres ângulos (ou arcos) num círculo e os comprimentos das cordas que os subentendem. As propriedades das cordas, como medidas de ângulos centrais ou inscritos em círculos, eram conhecidas dos gregos dos tempos de Hipócrates, e é provável que Eudoxo tenha usado razões e medidas de ângulos para determinar o tamanho da terra e as distâncias relativas do sol e da lua (BOYER, 1996, p. 108).

Hiparco de Rodes (190–120 a.C.), considerado o pai da Trigonometria,

elabora uma tabela trigonométrica atribuindo valores para vários ângulos. Esta

Trigonometria desenvolvida era essencialmente utilizada como ferramenta na

medida de “distâncias inatingíveis” com seu uso na Astronomia, através dos estudos

da geometria esférica, cujo objetos eram os triângulos esféricos. Assim como outros

astrônomos gregos, Hiparco representava o céu como uma esfera gigantesca e os

astros tinham suas posições especificadas por ângulos. Trabalhar com ângulos não

era tarefa fácil, ele relacionou o ângulo com um segmento de reta e este segmento

seria uma corda na circunferência. Desta forma, “um ângulo central α em um círculo

de raio fixo r determina sua corda, e a chamamos (ou a seu comprimento) de corda

de A. Usando cordas, era possível calcular as posições, presente e futura, de astros

e planetas”. (BERLINGHOFF; GOUVÊA, 2010, p.189).

Figura 3 - A corda de um ângulo

Fonte: http://clickmatematica2.blogspot.com.br/.

Na índia encontramos o trabalho sobre as meias cordas que eram chamadas

de jya que chegaria aos nossos dias como sendo o que conhecemos hoje por seno.

Já o cosseno era visto como era apenas o seno do complemento, algo como:

sen (90º- α) = cos α. A ideia de tangente vem dos estudos árabes como uma função

“sombra” devido à razão entre a altura e tamanho da sombra projetada pelo Gnômon

(relógio de sol). (BERLINGHOFF; GOUVÊA, 2010).

É nesta perspectiva histórica que nasce a proposta deste trabalho. Mostrar ao

aluno que o surgimento da Trigonometria, muito antes de ser entendida como ramo

da matemática com todos os seus conceitos, está atrelada a tão simplesmente uma

necessidade do homem de sobreviver, como é o caso de sua aplicação para a

agricultura (agrimensura), mas também de evoluir, de explorar, de conhecer mais

através da medida de grandes distâncias (na navegação), ou distâncias inatingíveis

(medidas no cosmos). Mostrar ao aluno que esse desenvolvimento não foi tarefa

fácil, foi sim, entrelaçada entre erros e acertos. Antes de estar pronto ali no livro

didático, este conteúdo foi desenvolvido ao longo dos séculos, superando a ideia de

transmissão de conteúdos prontos e acabados num conjunto de técnicas e fórmulas

impossíveis de serem modificadas. (D’AMBROSIO, 1996).

Assim, História da Matemática será utilizada como estratégia didática cujo

objetivo é mostrar os caminhos para que o aluno seja conduzido ao procedimento

para encontrar uma relação com o desenvolvimento do conteúdo. Ao estudarmos

como estes conhecimentos foram utilizados no passado, podemos dar significado às

aplicações que estão sendo feitas hoje, pois, “[...] o estudo da solução dada aos

problemas reais que foram enfrentados em épocas diversas pode fornecer

contribuições relevantes para o desenvolvimento de técnicas de modelagem”.

(VIANNA, 2000, p. 19).

Deste modo, este projeto pretende ir além da simples utilização da História da

Matemática como fonte de informação ou motivação e sim de agregar estas

tendências em torno do seu uso como instrumento didático.

Construção e utilização de materiais pedagógicos para o ensino e

aprendizagem de Trigonometria

A matemática escolar ainda enfrenta o estigma de ser um conjunto de regras

e procedimentos mecânicos, se valendo de professores e alunos que são

meramente instrumentos de transmissão e de recepção, respectivamente. Com esta

visão de ensino, professores e alunos vão para a sala de aula, como agentes de

transmissão e recepção de informações desprovidas de significados para além dos

muros escolares.

Por outro lado, entendemos que

A aprendizagem da Matemática consiste em criar estratégias que possibilitam ao aluno atribuir sentido e construir significado às ideias matemáticas de modo a tornar-se capaz de estabelecer relações, justificar, analisar, discutir e criar. Desse modo, supera o ensino baseado apenas em desenvolver habilidades, como calcular e resolver problemas ou fixar conceitos pela memorização ou listas de exercícios. (PARANÁ, 2008, p. 45).

Indo de encontro à primeira perspectiva de ensino e ao encontro desta última,

nossa proposta apresentada na unidade didática busca, por meio da construção de

materiais, inspirados pela história da matemática e apoiados no instrumento

Geogebra, este convite para viver experimentos, interagindo com eles contribui para

que o processo ensino e aprendizagem adquira significado para além do

cumprimento de regras e de carga horária escolar.

Quando o aluno não participa ativamente da construção de seu conhecimento

na aula, interagindo com o conteúdo, mas sendo apenas um expectador, deixamos a

função mais legítima da escola de lado. Acreditamos que

A experiência prática mostra também que o ensino direto de conceitos é impossível e infrutífero. Um professor que tenta fazer isso geralmente não obtém qualquer resultado, exceto o verbalismo vazio, uma repetição de palavras pela criança, semelhante a um papagaio, que simula um conhecimento dos conceitos correspondentes, mas que na realidade oculta um vácuo (VYGOTSKY, 1998, p. 104).

Neste aspecto, ao construir materiais para o estudo da trigonometria a fim de

fixar os conteúdos básicos da trigonometria (relações métricas do triângulo

retângulo, construção de modelo de teodolito, circunferência trigonométrica) envolve

a experimentação dos conceitos apresentados teoricamente por meio da História da

Matemática. Assim,

O professor deve propor situações que conduzam os alunos a (re)descoberta do conhecimento através do levantamento e testagem de suas hipóteses acerca de alguns problemas investigados, através de explorações (investigações), pois nessa perspectiva metodológica espera-se que eles aprendam o “quê” e o “porquê” fazem/sabem desta ou daquela maneira, para que assim possam ser criativos, críticos, pensar com acerto, a colher informações por si mesmos face a observação concreta e usar o conhecimento com eficiência na solução dos problemas do cotidiano. Essa prática, então, dá oportunidade ao aluno de construir sua aprendizagem, através da aquisição de conhecimentos e redescoberta de princípios. (MENDES, 2009, p. 110).

Tal experimentação permitirá ao aluno o entendimento de conceitos

trigonométricos, possibilitando que o aluno possa dar significado os conceitos que

aprende na parte teórica repassada pelo professor.

O software geogebra como ferramenta no ensino da Trigonometria

A resolução de problemas consiste numa parte fundamental do processo de

ensino aprendizagem por parte dos alunos. Porém, ensinar a resolver exercícios por

ensinar para que em um processo mecânico chegue a um resultado não é a

finalidade deste método de ensino, é necessário que o aluno participe do problema,

criando estratégias para que diante de outra situação problema, consiga resolvê-lo

também. Assim,

Uma grande descoberta resolve um grande problema, mas há sempre uma pitada de descoberta na resolução de qualquer problema. O problema pode ser modesto, mas se ele desafiar a curiosidade e puser em jogo as faculdades inventivas, quem o resolve por seus próprios meios, experimentará a tensão e vivenciará o triunfo da descoberta. Experiências tais, numa idade suscetível, poderão gerar o gosto pelo trabalho mental e deixar, por toda a vida, a sua marca na mente e no caráter. (POLYA, 1978, p. 48).

O desafio foi ir além do resolver questões utilizando o caderno e o lápis, mas

visualizar as situações por meio do uso do software Geogebra.

Segundo Lopes (2011, p. 3), “[...] o interesse dos alunos por essas

ferramentas vem motivando os professores e pesquisadores a buscarem formas de

aliar o uso da informática ao ensino e aprendizagem de Matemática”. A

experimentação do uso do computador poderá agregar mais significado fazendo-o

compreender melhor o objeto estudado. Já a escolha do software não é por acaso,

já que está disponível gratuitamente para download. Desta forma, há a

intencionalidade de que o aluno consiga trabalhar com o referido recurso não só na

escola, mas também em casa. O outro desafio é que o professor também esteja

preparado, afinal

A escolha do software deve se fundamentar na proposta pedagógica de matemática da escola, o professor deve escolher um tipo de software adequado para possibilitar que o aluno construa seu conhecimento, sem deixar de lado o profundo domínio que precisa ter tanto do conteúdo abordado como do programa que utilizará. (CLAUDIO; CUNHA, 2001 apud PICCOLI, 2006, p. 45).

Outro desafio, sempre a ser enfrentado pelo professor, ao se preparar para

trabalhar a referida proposta, reside em verificar as condições estruturais de sua

escola, o que inclui o bom funcionamento dos computadores no laboratório de

informática e a sua adequação à execução da proposta. Tal adequação do

laboratório de informática consome bastante tempo do professor.

Intervenção pedagógica na escola: desenvolvimento e resultados

As atividades descritas neste artigo foram aplicadas com os 25 alunos do 2º

ano “E” do Ensino Médio noturno do Colégio Estadual Dois Vizinhos – Ensino

Fundamental, Médio e Profissional – do município de Dois Vizinhos – Paraná.

Um dos primeiros desafios foi adaptar o projeto de intervenção à turma em

que foi aplicada, já que toda a sequência didática foi pensada para um público do

ensino diurno. Mas, de maneira geral, com as devidas adaptações, o projeto obteve

boa receptividade perante os alunos. Acreditamos que isso de deva, justamente ao

fato da abordagem histórica e da construção de materiais e da utilização do

Geogebra para a execução do projeto.

A primeira parte, utilizamos quatro aulas e acompanhamos o desenvolvimento

da Trigonometria como estudo das figuras semelhantes, neste caso particular,

introduzimos o estudo com a história de como Tales de Mileto mediu a altura de uma

pirâmide no Egito utilizando razão e proporção entre dois triângulos semelhantes.

Com a apresentação de um vídeo sobre quem foi Tales de Mileto (624-558 a.C.) e,

posteriormente a demonstração de como ele conseguiu calcular a altura da pirâmide

de Quéops no Egito.

Podemos perceber que alguns alunos, durante as atividades, lembraram de

que tinham aprendido o Teorema de Tales, mas que nunca haviam conhecido a

história da pessoa. Portanto, a história trouxe uma “cara” àquilo que eles conheciam

apenas como uma aplicação, que para muitos, permanece sem sentido.

Com as devidas adaptações para o ensino noturno, fizemos a demonstração,

no saguão da escola, utilizando cabos de vassoura e réguas, aproveitando a luz

proveniente das lâmpadas do ambiente. A condução e encaminhamento da

atividade foi relativamente fácil, já que os alunos cooperaram no trabalho

desenvolvido em grupos.

Já nas atividades teóricas desenvolvidas em sala de aula a situação foi

diferente. Ficou evidente a falta de conhecimentos matemáticos prévios e a

dificuldade na interpretação dos enunciados das situações problema, por parte dos

alunos. Foi necessária uma grande intervenção e participação do professor para que

as atividades fossem desenvolvidas. Apenas uma terça parte dos alunos conseguiu

desenvolver a atividades relativamente sozinha.

Já na segunda parte, que ocupou duas aulas, os ângulos e os fragmentos

históricos do surgimento do conceito de ângulo e quais as unidades de medida que

constam hoje no Sistema Internacional de Medidas foram revistas e reapresentadas

para os alunos. Para introduzir o assunto, assistimos um vídeo e um texto Para

começar, vamos ver um texto extraído do site: https://goo.gl/bjYJ69 intitulado

“Medindo a Circunferência da Terra” conhecer como Eratóstenes (276 – 194 a. C.)

conseguiu medir o diâmetro da Terra utilizando seus conhecimentos sobre ângulos e

razão e proporção.

Com a apresentação teórica, os alunos tiveram a noção de onde vem as

nomenclaturas e como surgiu a ideia de ângulo para depois colocar seus

conhecimentos em prática na medição e conversão de ângulos de uma unidade de

medida para outra.

Novamente, pudemos perceber grandes dificuldades na utilização de

matemática básica, quando necessária para efetivação da resolução dos problemas

propostos para desenvolvimento em sala de aula. Houve a necessidade de diversas

intervenções do professor. Por exemplo, com o auxílio nas simplificações de frações

necessárias na conversão de graus para radianos.

Outro fator que chamou a atenção foi o fato de inúmeros alunos terem grande

dificuldade na manipulação do transferidor para marcar ângulos. Também notamos

desconfiança no primeiro contato com os ângulos negativos. Muitos alunos disseram

desconhecer que poderia haver ângulos negativos e maiores que 360º, além do

primeiro contato com a medida de ângulos em radianos.

Para a terceira parte propomos a relação estabelecida entre o estudo de

lados e ângulos em um triângulo. Utilizamos para esta parte um total de dez aulas e

foi apresentada aos alunos um pouco da história do surgimento de conceito das

razões trigonométricas seno, cosseno e tangente. Iniciamos com a história de como

Aristarco de Samos (310 – 230 a. C.) e de como estimou a distância entre a Terra e

o Sol utilizando conceitos de ângulos e lados de um triângulo retângulo passando

um vídeo sobre o tema. (ARISTARCO, 2016).

A partir daí introduzimos as razões trigonométricas citadas acima e como

elas são utilizadas para medir distâncias e alturas inacessíveis utilizando o triângulo

retângulo. Para isso, utilizamos o laboratório de informática em que estavam

instalados o software Geogebra na construção de triângulos semelhantes e para

posteriormente mostrar as razões que existem entre seus ângulos e lados. Grandes

dificuldades foram encontradas na etapa de utilização do software por parte dos

alunos. Enganados pela familiaridade dos adolescentes com as novas tecnologias,

nos deparamos com o despreparo destes alunos na manipulação do Geogebra. Esta

atividade tomou bastante tempo e exigiu paciência e atenção por parte do professor

e dos alunos. Enquanto uns desenvolviam a construção mais rapidamente outros

necessitavam de uma atenção maior.

Além disso, construímos um modelo de Teodolito, instrumento moderno que

utiliza as razões trigonométricas com mais precisão para estas medidas. Com o

instrumento podemos fazer a atividade prática de medir o comprimento e a altura do

ginásio de esporte. Dividimos a turma em dois grupos, cada qual com a

responsabilidade de anotar, elaborar o desenho, medir para posteriormente calcular

tais medidas.

Quando estes alunos concluíram suas atividades foi proposta a apresentação

de seus resultados para o outro grupo. Eles puderam perceber que encontraram

medidas um pouco diferente uns dos outros e foi aí que o professor interviu na

explicação de como medições e instrumentos imprecisos podem provocar distorções

nos resultados.

Depois de todas estas atividades dinâmicas foi a vez de retornar a sala de

aula para resolver exercícios da lista de atividades e do livro didático. Pudemos

perceber que os alunos assimilaram as informações e ficou mais fácil a resolução

das atividades.

Na quarta parte da aplicação do projeto trabalhamos com o conceito de

ângulos que vão além dos 360º, além de utilizar ângulos negativos.

Sendo assim, para utilizarmos e sabermos seus senos, cossenos e tangentes

nós estudaremos no círculo, que recebe o nome especial de ciclo trigonométrico.

Para que esta ideia nos fique bem clara, utilizamos o software Geogebra para

construí-lo e compreendermos o que significam as razões trigonométricas de

qualquer ângulo que gostaríamos de saber. Novamente podemos perceber a

dificuldade na manipulação do software.

Depois de muito trabalho colhemos os frutos, pois os alunos assimilaram bem

a construção e de como podemos calcular as razões trigonométricas em qualquer

quadrante e com qualquer sinal. Tanto é que as atividades propostas em sala de

aula foram resolvidas mais facilmente.

Finalmente a última parte, que consistiu em apresentar as funções

trigonométricas com a manipulação dos valores na dinamicidade do software

Geogebra. Embora tenham aprovado o uso e a manipulação no software podemos

perceber ainda a grande dificuldade na resolução das atividades da lista de

exercícios teóricas apresentadas no livro didático, necessitando de grandes

intervenções do professor.

Por exemplo, na interpretação dos problemas propostos e operações de

multiplicação e divisão de frações e multiplicação de números decimais. Embora o

software auxiliou na visualização do comportamento da mudança das variáveis, a

parte de resolução de exercícios demandou um pouco mais de tempo devido as

dificuldades encontradas na matemática dita como “básica” e na interpretação dos

dados.

Considerações Finais

Podemos concluir que o trabalho desenvolvido em sala de aula superou às

expectativas relativas ao desafio proposto. A proposta de abordar um pouco da

história da Trigonometria se mostrou válida como uma experiência de vivência da

matemática como além da simples resolução de exercícios propostos no livro

didático.

Já na primeira atividade, nos surpreendemos com o estranhamento, causado

nos alunos, a partir da abordagem histórica dos conteúdos. Esta reação à

abordagem nos forneceu fortes indícios da concepção de matemática que prevalece

no imaginário daqueles alunos. Eles revelaram a ideia de que os conteúdos de

Trigonometria, no caso, sempre estivessem postos. É como se estes conteúdos já

estivessem ali desde sempre, inalterados, sempre prontos e acabados.

A dinamicidade dos gráficos apresentados pelo software Geoebra contribuiu

também para o processo aprendizagem pois forneceu uma visão mais detalhada do

comportamento dos gráficos e suas respectivas variáveis.

A construção do teodolito e sua utilização pelos alunos permitiu que eles

conseguissem entender o processo e isso, ao que parece, re-significou a

aprendizagem como algo que pode ser aplicado na realidade deles.

A grande dificuldade enfrentada foi com a matemática elementar que os

alunos do ensino médio deveriam dominar, como as operações com frações e

números decimais, além da capacidade de interpretação dos enunciados das

situações problemas propostos quando se tratava de funções trigonométricas.

Como todo trabalho, foi uma proposta desafiadora tanto para o professor

quanto para o aluno. O grande desafio de ensinar e aprender em meio as

complexidades da educação atual. Depois de tudo ficou a certeza de que para que

este projeto precisa a cada aplicação ser melhorado e adaptado para que,

efetivamente, cumpra se papel: dar significado ao ensino da trigonometria no ensino

médio.

Referências

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/biograf/aristarco.php>. Acesso em: 13 dez. 2016.

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numérico. REVEMAT - Revista Eletrônica de Educação Matemática, UFSC, v. 2,

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EVES, Howard. Introdução à história da matemática. Tradução: Hygino Domingues. Campinas: Editora da Unicamp, 2004.

GOMES, Severino Carlos. Ensino de trigonometria numa abordagem histórica: um produto educacional. Holos, Rio Grande do Norte, v. 3, 31, p. 193-203, 2015.

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