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Microbiologia
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o
Monitoramento e controle microbiológico
indispensável para controlar a qualidade dos ambientes de fabricação e manipulação de produtos farmacêuticos (e de outros segmentos), o monitoramento microbiológico de salas limpas está em discussão internacional. No brasil, os critérios de contagem microbiana e as medidas de controle estão previstos em resolução técnica estabelecida pela aNViSa
Marcelo couto
monitoramento e o controle mi-
crobiológico em salas limpas e
demais áreas críticas do pro-
cesso de produção de medicamentos
fazem parte da rotina de garantia da
qualidade nas indústrias farmacêuticas
de todo o mundo. O objetivo é medir e
avaliar sistematicamente a quantidade
de micro-organismos vivos presentes
nesses ambientes e orientar medidas
preventivas e corretivas para eliminar
possíveis focos de contaminação.
“Embora saibamos que a maior parte
dos contaminantes seja proveniente
de matérias-primas, o controle am-
biental é uma importante variável do
processo e merece atenção”, destaca
a farmacêutica Déa de Aguirra, da
Yugue Assessores, especializada em
consultoria e treinamento.
As técnicas comumente empre-
gadas para medir a carga microbiana
envolvem:
a) Coleta por meio de amostrado-
res de ar (amostragem ativa): utiliza
equipamentos como os de impactação,
centrífuga e impinger, entre outros.
b) Sedimentação (amostragem
passiva): coleta realizada por exposi-
ção de placas de Petri contendo uma
formulação padrão de meio de cultura
suplementado com ágar (técnica de
sedimentação).
c) Técnica de contato: amostragem
realizada diretamente sobre a superfí-
cie do local desejado, principalmente
nos pontos críticos, utilizando peque-
nas placas contendo meios de cultura
sólidos apropriados, também conheci-
das como Placas RODAC – Replicated
Organisms Detection and Counting.
d) Coletas com hastes flexíveis
com pontas de algodão produzidas
para esta finalidade (swabs). O mate-
rial é semeado diretamente – ou após
submetê-lo a suspensão e/ou dilui-
ção – em placas de Petri ou caldos-
-padrão.
A análise dos resultados obtidos a
partir dessas técnicas serve de parâ-
metro básico para avaliar se a carga
microbiana total se mantém dentro dos
limites estabelecidos pelas orienta-
ções normativas.
A detecção da carga microbiana
presente no ambiente é fundamental
para a manutenção de um plano de
controle eficiente, elaboração dos
documentos e acompanhamento do
histórico de contaminação. Estas in-
formações são essenciais para a obe-
diência às Boas Práticas de Produção
(BPF), como a adoção de medidas
preventivas e corretivas relacionadas
aos procedimentos operacionais, va-
lidação dos processos de limpeza e
sanitização das instalações e treina-
mento do pessoal.
Os profissionais responsáveis pelo
monitoramento e controle microbiológi-
co, no entanto, esbarram em uma série
de desafios cotidianos, a começar pelo
manejo dos métodos e equipamentos
existentes para realizar as medições.
Uma situação: diferentes equipamen-
tos e métodos adotados nos testes
podem apresentar resultados diversos
para amostras realizadas ao mesmo
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tempo, em função das limitações téc-
nicas. Algumas vezes não é possível
sequer relacionar o resultado dos cha-
mados métodos rápidos (alternativos)
com os obtidos pelo método conven-
cional, no qual os micro-organismos
são desenvolvidos em meio de cultura.
Pelo método convencional, que
utiliza meios de cultura e requer tempo
de incubação (em geral de cinco dias),
o resultado não reflete o momento atu-
al e sim aquele em que a amostra foi
colhida. “O monitoramento neste caso
ajuda a compor um histórico e avaliar
se o ambiente está em tendência de
melhora, de piora ou de estabilização
dos resultados. Na prática, o que se
faz é obter a situação do passado e
extrapolá-la para o presente, mas isso
implica em considerável grau de incer-
teza”, aponta a consultora.
O desenvolvimento dos métodos
rápidos em microbiologia (também
conhecidos pela sigla em inglês RMM)
é uma tentativa de se obter um “retra-
to” do ambiente a partir de resultados
imediatos e mais precisos, tornando
o controle mais efetivo. Em geral, o
princípio adotado nestes casos não é
baseado na capacidade de os micro-
-organismos crescerem em um meio
de cultura, mas sim na análise da ati-
vidade ou do conteúdo das células, de-
monstrando dessa maneira resultados
em termos de unidades viáveis e não
unidades formadoras de colônias.
“Embora os métodos rápidos este-
jam conquistando cada vez mais acei-
tação, ainda há certa resistência dos
microbiologistas, em função do domí-
nio das práticas tradicionais, de algu-
mas limitações dos próprios métodos e
da falta de reconhecimento mais amplo
deles pelos órgãos reguladores, mas a
tendências é que a tecnologia ganhe
espaço”, comenta Ana Lucia Gonella,
mestre em microbiologia e doutoranda
em biotecnologia pela Unicamp – Uni-
versidade de Campinas.
limites de aceitação
Um dos maiores desafios, no en-
tanto, é a dificuldade de se estabelecer
limites de aceitação microbiana para os
diferentes tipos de ambientes de produ-
ção. “Também devemos considerar que
a identificação dos micro-organismos
é tão importante quanto os limites de
aceitação deles. Por exemplo, na área
de produtos injetáveis, submetidos
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a esterilização terminal, não é segu-
ra a presença de micro-organismos
gram-negativos ou termorresistentes,
enquanto na manufatura de produtos
com filtração esterilizante devemos nos
preocupar com a presença de bacté-
rias com tamanho ≤ 0,2µm”, destaca a
microbiologista Ana Lucia. Os debates
são ainda mais intensos em relação
aos limites para áreas controladas de
produtos não-estéreis.
O IEST – Instituto de Ciências
Ambientais e Tecnologia, sediado nos
Estados Unidos, desenvolveu uma re-
comendação sobre “Micro-organismos
em Salas Limpas”, a IEST-RP-CC023,
que é uma das importantes referências
sobre o assunto. O documento, que
aborda áreas estéreis e não-estéreis,
fornece diretrizes para o controle e a
medição da contaminação no ar e nas
superfícies, descrevendo procedimen-
tos e técnicas para alcançar o nível
de controle microbiano desejado. Ele
apresenta ainda uma introdução aos
métodos aceitos para controle e mo-
nitoramento e os recursos disponíveis
para a realização dessa atividade, além
de orientações sobre desinfetantes,
seu espectro de letalidade e técnicas
de aplicação.
“No Brasil, a SBCC também deu
uma valiosa contribuição para o tema
ao publicar a recomendação normativa
RN-007-05, adaptada à realidade na-
cional”, lembra Jean-Pierre Herlin, dire-
tor da Análise Engenharia e Consulto-
ria, um dos membros do comitê técnico
responsável pelo desenvolvimento da
RN. Publicado em 2005, como resul-
tado das atividades de um grupo de
especialistas, o documento, intitulado
“Metodologia e Limites Microbiológicos
em Áreas Limpas” continua em vigor e
é uma importante referência para os
interessados nessa questão.
No ano passado, a ANVISA – Agên-
cia Nacional de Vigilância Sanitária
publicou a sua resolução RDC 17/2010,
em substituição à RDC 210, que dispõe
sobre as Boas Práticas de Fabricação
de Medicamentos e na qual estão
previstos, entre diversos critérios, os
parâmetros de monitoramento e con-
trole microbiológico. “Os critérios de
contagem microbiana e os limites de
contaminação microbiológica apresen-
tados foram baseados nas referências
da Organização Mundial da Saúde e
na regulamentação dos medicamentos
adotada na diretiva europeia, a GMP
EU”, comenta Andréa Muggiati de
Abreu, gerente de Garantia da Quali-
dade do Instituto de Tecnologia do Pa-
raná - TECPAR. Ela reforça que essas
orientações, ao serem incorporadas na
resolução brasileira, tornaram-se com-
pulsórias no País.
A RDC 17, assim como já previa
a RDC 210, determina que as áreas
de produção onde estiverem sendo
processados produtos suscetíveis a
contaminação por micro-organismos
sejam monitoradas periodicamente,
considerando as diferentes classes das
áreas limpas. “Entre outros aspectos,
o documento estabelece que, quando
forem realizadas operações assépti-
cas, o monitoramento seja frequente e
se utilize métodos apropriados, entre
os quais estão incluídos aqueles que
envolvem placas de sedimentação,
amostragens volumétrica de ar e de
superfícies”, destaca a representante
do TECPAR. As áreas, obviamente,
não devem ser contaminadas pelos
métodos de amostragem e os resulta-
dos de monitoramento devem ser revi-
sados para fins de liberação do produto
terminado. Além disso, a resolução diz
que as superfícies e o pessoal deve ser
monitorados após operações críticas.
Ainda de acordo com a resolução
da ANVISA, as indústrias devem esta-
belecer limites de alerta e de ação para
a detecção de contaminação micro-
biológica, e para o monitoramento de
tendência da qualidade do ar nas suas
instalações. Os limites neste caso, ex-
pressos em unidades formadoras de
colônia (UFC), são os que constam na
tabela abaixo, adotados em consonân-
cia com o citado padrão europeu.
Os limites adotados levam em con-
sideração o grau de limpeza da sala.
Para aquelas classificadas como “A”,
onde estão localizadas zonas de alto
risco operacional e são realizados en-
vases e conexões assépticas, o limite
de UFC por metro cúbico nas amostras
Classificação RDC 17 e GMP UE
GRaU Da
sala
limites recomendados de contaminação microbiológica (valores médios)
amostra de ar UFC/m3
Placa de sedimentação
Ø90mm UFC/4h
Placa de contato Ø55mm
UFC/placa
amostra de luva (5 dedos)
UFC/luva
a <1 <1 <1 <1
B 10 5 5 5
C 100 50 25 –
D 200 100 50 – www.dmdsolutions.com.bre-mail: comercial@dmdsolutions.com.br - (19) 3386.0301 distribuidor autorizado
A DMD Solutions garante a qualidade de seus produtos e serviços.RECURSOS MODERNOS E INOVADORES
de ar deve ser menor que 1; em am-
bientes com grau “B”, que circundam
às de grau “A”, para preparações e en-
vases assépticos, esse número pode
chegar a 10; e nas áreas limpas onde
são realizadas etapas menos críticas
da fabricação de produtos estéreis os
limites podem atingir 100 UFC/m3 (grau
C) e 200 UFC/m3 (grau D). Padrões
também são estabelecidos para amos-
tragens de superfícies por meio das
análises de placas de sedimentação
para um período de quatro horas, de
placa de contato, além de amostras de
luva dos trabalhadores envolvidos.
O FDA, órgão norte-americano res-
ponsável pela regulação de alimentos
e medicamentos, também adota limites
de contaminação microbiológica para
as diferentes classes de áreas limpas,
conforme demonstra a tabela ao lado.
Classificação cGMP - FDa
Clean area Classification
(0.5 µm particles/ft3)
IsO Designation
b
≥ 0.5 µm particles/m3
Microbiological active air
action levelsc (cfu/m3)
Microbiological settling Plates action levelsc,d (diam. 90mm; cfu/4hours)
100 5 3,520 1e 1e
1000 6 35,200 7 3
10,000 7 352,000 10 5
100,000 8 3,520,000 100 50
Critical areaProduto e embalagem
estéreis expostosIsO Classe 5 para
partículas ≥ 0,5 µm
supporting clean areaÁrea imediatamente adjacente à linha de processo asséptico
IsO Classe 7 em operação ou Classe 6
ou Classe 5
less critical activities IsO Classe 8
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Os números integram as orientações
de Boas Práticas de Fabricação do
órgão, o cGMP (current Good Manu-
facturing Practices), e são igualmente
levados em conta pelas indústrias
farmacêuticas de todo o mundo, seja
em observância aos padrões e proce-
dimentos corporativos adotados pelas
suas matrizes ou para que estejam cre-
denciadas a exportar e comercializar
seus produtos nos Estados Unidos.
Novos conceitos e discussões
Na sua mais recente edição, a
USP – United States Pharmacopeia
acrescentou novos elementos para
a discussão da contagem microbia-
na e do controle de contaminações
microbiológicas. Autoridade oficial
não-governamental que define pa-
drões para medicamentos e outros
produtos para a saúde, a USP tem as
suas orientações acompanhadas de
perto. Na versão 2011 (USP 34) do
documento são recomendados novos
critérios, que levam em conta a taxa de
incidência de contaminações. O limite
tolerável é de 0,1%. Isso significa que a
cada 1.000 contagens realizadas seria
permitida apenas a ocorrência de uma
placa com até 15 unidades formadoras
de colônia (UFC).
“O problema é que essa contagem
leva um tempo considerável para ser
obtida. Se uma indústria estabele-
cer, por exemplo, que vai colher um
amostra por dia em determinada área
ou zona controlada, levará quase três
anos para completar 1.000 placas. Evi-
dentemente, esse tempo diminui à me-
dida que mais amostras sejam colhidas
em um mesmo dia, mas ainda assim
demanda longo período de avaliação”,
considera Silvia Eguchi, diretora de
Microbiologia da Dosage Pesquisas
Laboratoriais e coordenadora do GT 2
da SBCC, grupo de trabalho criado no
âmbito do ABNT CB-46 para tratar de
questões ligadas à biocontaminação
em áreas limpas.
Um dos caminhos para se chegar
a padrões mundiais deve ser a revisão
da norma ISO 14698 – Partes 1 e 2,
publicada em 2003 com a finalidade
de oferecer princípios e metodologia
básica para avaliar e controlar a bio-
contaminação. O documento original,
porém, não foi muito adotado, pela
falta de parâmetros objetivos para a
realização de contagens e o estabe-
lecimento de limites microbiológicos
para as diferentes classes de áreas.
“Muitos profissionais consideram essa
norma um ‘guia’, por apresentar orien-
tações gerais, mas sem fixar critérios
de níveis de biocontaminação, obtidos
por dados do histórico do controle mi-
crobiológico”, comenta Silvia Eguchi,
que é a delegada brasileira no grupo
de trabalho da ISO encarregado de
discutir a norma. “Do jeito que está, ela
não é exatamente uma norma e, por
isso, especialistas de diversos países
foram convocados para a sua refor-
mulação”, acrescenta. O processo de
revisão, iniciado há quatro anos, deve
consumir pelo menos mais três, mas a
expectativa é que, ao final, os especia-
listas cheguem a números e critérios
globalmente aceitos.
O estabelecimento de padrões in-
ternacionais por meio da norma ISO
esbarra não apenas na dificuldade téc-
nica de se estabelecer números exatos
– nem sempre facilmente aplicáveis na
área de microbiologia –, mas também
na resistência regional: adotar critérios
mais rígidos que os atuais implica em
rever procedimentos e realizar investi-
mentos para se adaptar. Representan-
tes de alguns países participantes das
discussões temem que a introdução
de números na norma se sobreponha
a regulamentações, legislação e guias
locais seguidos atualmente.
Apesar disso, a expectativa é de
que as discussões continuem avan-
çando e, nos próximos anos, os crité-
rios estabelecidos sejam mais claros e
harmonizados em todo o mundo. Para
isso, o que se busca é estabelecer
padrões mínimos, aplicáveis de forma
prática e objetiva em todos os países
afiliados à ISO, o que representa uma
evolução do ponto de vista técnico e
também operacional e mercadológico
para uma indústria cuja produção se
dá em escala mundial e com atuação
em mercados globalizados.
A busca pelo aperfeiçoamento das
técnicas de contagem microbiana e a
definição de números consensuais,
que balizem os limites aceitáveis nos
diferentes ambientes classificados,
são os principais desafios vivencia-
dos pelos profissionais que atuam na
indústria farmacêutica – e também em
outros segmentos como os de alimen-
tos e de cosméticos – com o objetivo
de desenvolver práticas cada vez
melhores de produção, com adequado
controle microbiológico e segurança
dos seus produtos.
Expectativa é de que a norma iSo 14698, que está sendo revisada,
passe a oferecer limites de aceitação
baseados em consenso internacional
Composite
C M Y CM MY CY CMY K
A especialista em microbiologia
Silvia Eguchi, coordenadora do GT
2 da SBCC mantido pelo comitê
ABNT CB-46 para tratar de ques-
tões ligadas à biocontaminação
em áreas limpas defende o esta-
belecimento de critérios interna-
cionais e o aperfeiçoamento dos
métodos de mensuração e con-
trole microbiano nos ambientes
críticos classificados. Ela comenta
a questão dos números:
Como os limites aceitáveis são
definidos?
São convenções estabelecidas
pelos pesquisadores do assunto e
profissionais que militam na área,
a partir de estudos e das experiên-
cias práticas. Como se trata de cri-
térios estabelecidos pelo homem,
os limites fixados estão sujeitos a
questionamentos decorrentes do
avanço científico e do próprio de-
senvolvimento de análises estatís-
ticas aplicadas à microbiologia. Por
isso, é natural que sejam continua-
mente discutidos, de acordo com o
avanço técnico-científico.
Mas é importante ter números?
Sim, em termos. Eles são mais
importantes em áreas limpas,
onde a contaminação microbia-
na é muito baixa. Buscamos um
indicador numérico, baseado em
estatísticas e critérios científicos, a
ser tomado como referência. Seja
ele qual for, é importante que seja
acordado por especialistas dos
diversos países e tenhamos parâ-
metros claramente estabelecidos.
Caminhamos nesta direção e es-
tou confiante de que a revisão da
norma ISO 14698 será um avanço
para harmonizar padrões.
Questão dos números
Fot
o: G
lauc
ia M
otta
Composite
C M Y CM MY CY CMY K