13 Semanas - PerSe · 4 Apresentação Depois de muitos anos vendo cinema como simples expectador,...

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13 Semanas

Roteiro para Longa Metragem

2

13 semanas

Primeira Edição

Editora do Livre Pensador

Recife, Pernambuco

2013

Titulo Original

13 semanas

Primeira Edição

3

Copyright @ 2013 by Clodoaldo Turcato

Copyright da edição @ 2013

Editora Livre Pensador

Avenida Presidente Kennedy, 4834

Candeias

54430-030 – Jaboatão dos Guararapes – PE

Telefone (081) 3525.4516/ (081) 8162.4184

www.editoradolivrepensador.com

e-mail: editoradolivrepensador@editoradolivrepensador.com

Todos os direitos reservados.

A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em

parte, constitui violação dos direitos autorais. (Lei 9.610/98).

Capa: Clodoaldo Turcato

Ilustração de capa: Editora Livre Pensador

4

Apresentação

Depois de muitos anos vendo cinema como simples

expectador, passei a ver cinema como observador. Nunca

imaginara um dia escrever roteiros. No entanto, este ano fui

desafiado, numa dessas conversas de botequim, a fazer uma

roteirização, nessa bravata, me pus nesta empreitada.

Então tive que mergulhar num mundo à parte. A priori

parecia algo fácil, sem muita dificuldade, bem mais simples

que um romance. Que nada. Logo que comecei expus o

trabalho para companheiros bem mais qualificados e diante de

suas respostas, senti-me no jardim da infância aprendendo o

alfabeto. Partindo sempre do principio de que o que vale é a

estória, fui criando e no final tive que reescrever tudo, pois

roteiro tem padrões a serem seguidas.

Bom, eu reescrevi pelo menos cinco vezes este trabalho

e no final ficaram lacunas que pretendo corrigir noutras

oportunidades. Claro, que neste caminho, tive que me

enquadrar em formatações e nisso surgiram opiniões de todos

os lados, sugestões de livros, fórmulas e maneiras, que me

assustavam cada dia mais. Passei a ver muitos filmes e

imaginar o roteirista empenhado em sua criação. Fiz dezenas

de suposições e me pus a rever roteiros com o filme sendo

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exibido... uma loucura. E os filmes passaram a ser chatos, não

me divertiam mais – e os estudava tecnicamente.

A beleza do filme se perde quando se começa a

roteirizar. É como a música perde a graça quando iniciam os

ensaios, ou um livro quando começa a revisão, os retoques em

arte plástica – vira técnico.

E o pior é que não tem jeito, precisa ser assim, senão

não vira produto, como, infelizmente, a arte se torna. E assim,

persegui este projeto por meses, com idas e vindas, notas e

anotações, acabei com um texto razoável, que vos apresento a

seguir. Estou muito ansioso pelo que seguirá, como uma

maquinação, uma teima que segui por birra e assim me sinto

contente, independente do resultado comercial.

Cá está um texto novo e autobiográfico. Não poupei

nomes, muito menos situações, sem qualquer preocupação

como o politicamente correto – os meus conhecidos, que pus

aqui, certamente não vão gostar. Meus personagens falam a

linguagem da rua – talvez seja o trabalho mais próximo da

favela - e atiram seus impropérios sem mesuras. Pelo menos

não dirão que se trata de algo que não seja original.

Parte do texto é autobiográfico, tem muito de um

período que vivi em Diadema, e todos os nomes são originais.

Claro que a morte física do personagem Franco não ocorreu,

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porém existem muitos tipos de morte, e algumas coisa foram

pura ficção. Diria tratar-se de um roteiro com meias verdades.

Cá está o produto final, a disposição daqueles que

queiram ousar.

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1.EXT. RUA / MADRUGADA

FADE IN:

Um OBJETO é atirado do alto de uma pequena ponte. A

imagem é de madrugada, com o dia quase amanhecendo.

Algumas luzes acesas, silêncio na rua. O local é uma favela

ainda não identificada. O passeio da câmera acompanha o

objeto mostra ao fundo barracos num morro.

Não se vê quem arremessou, o objeto passa pela câmera e se

perde na escuridão.

2. EXT. BARRACO/MADRUGADA

DEOCÁDIA, trinta anos, branca, abre a porta de seu barraco..

Seu rosto está cansado, cabelos desarrumados, bocejando –

acabara de acordar. Ela está com um saco com lixo na mão.

Após esticar-se, ela atravessa a rua para colocar o lixo no

monte junto com outros arrumados para serem recolhidos pelo

caminhão de lixo. Ao fundo outros moradores que começam a

acordar e ligam as luzes das casas.

Barulhos do dia amanhecendo.

3.EXT. RUA/MADRUGADA

A ruela esta cheia de sujeira, ruas com buracos e o monte de

lixo. Pessoas que abrem as portas, gente que boceja, falatório,

chamados.

A cidade começa efervescente.

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4.EXT. RUA/MADRUGADA

Deocádia se afasta em direção ao monte lixo. Ela usa um

vestido que dá formas ao seu corpo, tem quadris largos e

rebola bastante. Deocádia coloca o lixo no monte com cara de

nojo, fecha o nariz com as mãos. Deocádia se vira faz

expressão de nojo. Ela dá alguns passos e é atingida pelo

objeto da Cena 1.

DEOCÁDIA

(grita)

Ai!

Deocádia passa a mão no rosto sangrando e tenta buscar o que

lhe atingiu.

5. EXT. RUA/MADRUGADA

Um pedaço de papel pardo e um estilete escolar estão no chão.

A lâmina dos estilete brilha fora do pacote.

DEOCÁDIA

Nico!

Deocádia, assustada corre pra dentro de casa, gritando pelo

marido.

DEOCÁDIA (cont.)

(grita desesperada)

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Nico! Nico! Eu tô sangrando!

6. INT. BARRACO/ MADRUGA

NICO, moreno, quarenta anos, na cama, esfregando os olhos,

acordado pelos gritos de Deocádia.

V.O (gritos Deocádia)

Nico pula da cama assustado.O barraco é composto de móveis

simples, paredes de madeirite, telhado de amianto sem forro,

ligações elétricas confusas (gambiaras), vários “T” com

eletrodomésticos plugados.

7 INT. BARRACO / MADRUGADA

Deocádia entra no barraco e procura por uma toalha. Nico

surge no quadro e vai de encontro à esposa aflita.

NICO

O que foi isso, Nêga? Tá sangrando... que foi?

Deocádia senta-se, segura a toalha no ferimento, que ensopa de

sangue.

DEOCÁDIA

Não sei, Nêgo... Eu tava colocando o lixo e, e..., bom, alguém

me acertou.

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Nico ajuda Deocádia com o ferimento. Nico está preocupado e

sem saber o que fazer direito.

NICO

(assustado)

Meu Jesus, tá sangrando muito! Quem foi o...

Deocádia mantem a toalha na altura da cabeça ferida:

DEOCÁDIA

O que é isso? Calma Nico... pega o álcool na prateleira. Deixa

de sacolejar. Te falei que não vi, porra!

Nico se levanta e vai até a prateleira e pega uma garrafa com

álcool e entrega para Deocádia.

NICO

O que te feriu, Nêga? Nossa Senhora, tá muito fundo..

DEOCÁDIA

Não sei, nego... um negócio caiu de cima do viaduto e deu na

minha cabeça. Não vi... tá lá perto do lixo...

Nico está indignado.

NICO

E quem foi? Quem foi Nêga, que pego o cara.

DEOCÁDIA

Não vi, Nêgo. Quando fui levar o lixo e aquele troço me

atingiu. Não deu pra ver nada, nada, porra!

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Nico que se levanta, coloca as mãos na cinta, parece indeciso

sobre o que fazer.

NICO

Se eu pego o filha da puta eu nem sei o que faço com ele...

Deocádia levanta a cabeça e balança pela bravata do marido.

Nico saí do barraco.

8.EXT.RUA/MADRUGADA

Nico saí do barraco olhando para todos os lados buscando o

objeto que atingira sua esposa O encontra próximo ao monte

de lixo, abaixa-se e o apanha. O estilete está sujo com sangue.

Ao aproximar dos olhos, Nico observa que tem sangue seco e

molhado.

Nico arregala os olhos, desconfiado.

NICO

Eta!

FADE OUT:

09.INT. QUARTO CLODOALDO/ DIA

FADE IN:

Caracteres 13 semanas antes

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CLODOALDO, 42 anos, branco, deficiente físico, está

sentado em frente ao computador acessando Facebook. Ao

lado de Clodoaldo tem um par de muletas tipo canadense e

uma cadeira de rodas. O local é pobre, desarrumado, com

móveis quebrados, cercado por madeirite cor rosa. Na tela do

computador existe um convite de amizade pendente com o

nome ANTONIO CARLOS FRANCO. Clodoaldo demonstra

estranhar o convite. Passa a língua pelos lábios, se recosta,

pensa alguns segundos e clica no perfil de Franco.

Na tela do computador e mostra o perfil de FRANCO:

brasileiro, solteiro, professor, residente em Diadema, São

Paulo. Ainda com a câmera na tela e passam várias telas

demonstrando que Clodoaldo está avaliando o perfil de Franco,

enquanto se ouve algazarra de crianças.

10. INT.BARRACO/DIA

Surge atrás de Clodoaldo ESDRAS, sete anos, moreno,

vestindo apenas calção, que entra em direção a pia, enche um

copo com água e bebe rapidamente.

Clodoaldo para de escrever e olha contrariado para o menino e

o repreende.

CLODOALDO

Não vê que estou trabalhando? ...Poderia fazer menos barulho.

Esdras olha indiferente sinaliza que esta com sede, sem tirar o

copo da boca mantém olhar em Clodoaldo. Acaba de beber, se

vira e saí gritando:

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ESDRAS

(gritando)

Minha vez!

Clodoaldo que olha para trás contrariado e chama pela esposa:

CLODOALDO

(grita)

Eliete!

11.INT. BARRACO/ DIA

ELIETE, morena, 45 anos, entra na casa e vai ao quarto onde

está Clodoaldo.

ELIETE

O que foi filho?

CLODOALDO

Como é que vou trabalhar assim. Sempre com esta barulheira.

Esdras acabou de entrar e no maior barulho do mundo... acaba

com minha concentração.

ELIETE

Filho, o que tu quer que eu faça. Aqui é assim...

CLODOALDO

Eu sou um escritor. (coloca a cabeça entre as mãos e volta a

olhar pra Eliete). Será que você poderia entender que preciso

me concentrar, senão não consigo produzir? É barulho pra todo

lado, meninos gritando, cachorros latindo... meu Deus do céu!

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Eliete se aproxima acaricia a cabeça de Clodoaldo, beija-lhe a

testa e o abraça.

ELIETE

Quer um café?

Clodoaldo assinala com a cabeça positivamente e devolve a

carícia, arrependido por ter se alterado com ela. Em seguida se

desenlaça de Eliete e volta os olhos para o computador

12. INT. BARRACO/ DIA

Elite que sai do quarto e vai até a pia onde pega a garrafa

térmica e serve café em um copo comum de vidro.

13. INT. QUARTO CLODOALDO/DIA

Clodoaldo aceita o convite de amizade de Franco. Em seguida

torna para a página inicial. Depois volta para um texto que está

escrevendo, copiado de um caderno em espiral que esta ao lado

do computador. Eliete, que entra no quarto estende o café.

Clodoaldo pega o copo de café, coloca ao lado do computador

e mal olha pra Eliete

ELIETE

Vou terminar a roupa, filho. Depois faço sua janta.

Eliete sai do quarto, enquanto Clodoaldo volta a escrever.

15

14 EXT. LAJE /DIA

Eliete está estendendo roupas no varal que fica sobre uma laje.

O local é cercado de barracos de madeira. Ouvem-se barulhos

de crianças na rua, funk alto, cães latindo... a tarde cai.

Movimento de gente na rua, barulhos de animais: a favela tem

vida própria.

Eliete segue o trabalho árduo de roupas, de repente ela para,

sente dores na barriga, tonturas e senta num sofá velho que está

próximo. Eliete olha para os lados para ver se alguém a viu.

Depois molha o rosto com água e segue o trabalho.

Passagem de tempo.

15 INT. QUARTO CLODOALDO/ DIA

Clodoaldo segue no computador portátil. De repente seu

trabalho é interrompido por um grito de Eliete. Elite está na

laje fora do quadro.

ELITE

(gritando)

Filho! Chama as crianças pra tomar banho.

Clodoaldo para de digitar. Sacode a cabeça, contrariado.

No Facebook tem uma mensagem de Franco. Abre e lê “ Olá,

tudo bem?”

Ouve-se novamente o grito de Eliete ao longe: