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ALEXSANDER LUIZ GUIMARÃES
A VALORIZAÇÃO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS
CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO
São Paulo/SP2010
ALEXSANDER LUIZ GUIMARÃES
A VALORIZAÇÃO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS
Monografia apresentada como requisito para Conclusão do curso de pós-graduação lato sensu em Direito Constitucional pelo Centro Universitário Salesiano – UNISAL, sob orientação do Professor Marcelo Jose Grimone.
São Paulo/SP
2010
Dedico este trabalho a todos os meus professores, sem os quais não conseguiria sequer redigir as primeiras palavras deste escrito.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, a DEUS,
que me possibilitou realizar este trabalho. A todos os
professores que contribuíram para o meu enriquecimento
cultural ao longo desse curso. Em especial ao meu paciente
orientador Prof° Marcelo Jose Grimone, pelo apoio, conversas
e discussões no processo de elaboração desta monografia,
que compartilhou parte da sua sabedoria, conduzindo o
trabalho de maneira firme, porém amiga, deixando uma
contribuição extremamente importante e positiva nesta fase
da minha vida acadêmica. Aos colegas de sala e a todos que,
direta ou indiretamente, colaboraram para a conclusão deste
trabalho.
Os princípios não permitem opções livres aos
órgãos ou agentes concretizadores da constituição (impredictibilidade dos
princípios); permitem, sim, projeções ou irradiações normativas com um certo
grau de discricionaridade (indeterminabilidade), mas sempre limitadas pela
juridicidade objetiva dos princípios. Como diz Dworkin, o ‘direito – e, desde logo,
o direito constitucional – descobre-se, mas não se inventa.
(J.J. CANOTILHO 1997).
RESUMO
A valorização dos precedentes é medida que se impõe na
atualidade, seja pela qualidade e maturação das decisões dos tribunais, seja pela
vinculação Constitucional por força da súmula vinculante.
Hoje o precedente é importante ferramenta impeditiva de
recurso, essencial para o alcance do escopo do Poder Judiciário que é oferecer uma
justiça qualitativa, eficaz e rápida.
Valorizar os precedentes judiciais não importa em
abdicação da independência do magistrado, ao contrário, é respeitar a instituição o
qual o juiz integra.
Palavras - chaves Precedente – Valorização – Súmula Vinculante – Celeridade do Provimento Jurisdicional.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO..................................................................................................09INTRODUÇÃO........................................................................................................101. ORIGEM HISTÓRICA.........................................................................................111.1. Civil law e common law ..................................................................................112. PRECEDENTES JUDICIAIS NO BRASIL ..........................................................152.1. Precedentes antes da CF/88............................................................................152.2. Precedentes após a CF/88 e previsão legal.....................................................163. DISTINÇÃO ENTRE PRECEDENTE, JURISPRUDÊNCIA E SÚMULA..............234. Transcendência dos votivos determinantes.........................................................255. PRECEDENTE E SEU EFEITO VINCULANTE .................................................. 275.1. Precedentes e o efeito erga omines................................................................. 306. PRECEDENTE NA PRÁTICA PROCESSUAL..................................................... 316.1. Cláusula de reserva de plenário........................................................................ 316.2. Obstrução de recurso voluntário e de oficio pelo relator................................... 316.3. Obstrução de recurso voluntário e de oficio pelo juiz........................................ 326.4. Recuso necessário ou ex oficio......................................................................... 326.5. Julgamento prima facie...................................................................................... 336.6. Embargos de divergência ................................................................................. 336.7. Julgamento por amostragem ............................................................................ 33
6.8. Análise de repercussão geral por amostragem ................................................ 346.9. Agravo no Superior Tribunal de Justiça............................................................. 356.10. Súmulas vinculantes........................................................................................ 356.11. Reclamação..................................................................................................... 366.12. Súmulas administrativas.................................................................................. 40 7. PRECEDENTE E O SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS - LEI 11.153/2009 417.1. Precedentes e a Justiça do Trabalho................................................................. 41 7.2. Regras eficientes para aplicação dos precedentes............................................ 427.3. O precedente e o dano moral............................................................................. 467.4 Tarifação e quantificação do dano moral............................................................ 488. PRECEDENTES E A FAZENDA PÚBLICA.......................................................... 489.CRÍTICAS AOS EFEITOS VINCULANTRES DOS PRECEDENTES .................. 509.1. Argumentos contrários....................................................................................... 509.2. Argumentos favoráveis...................................................................................... 5210. IMPORTÃNCIA DOS PRECEDENTES ............................................................. 5611. A SEGURANÇA JURÍDICA E OS PRECEDENTES .......................................... 5712. Outras ferramentas ............................................................................................. 60CONCLUSÃO............................................................................................................ 61REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................... 63
APRESENTAÇÃO
Quando tive que debruçar a cerca do tema a ser
discorrido se preocupei em apresentar um estudo científico que tivesse utilidade
prática e que se revestisse de uma função social. Partindo dessa premissa
pesquisei e estudei os “precedentes judiciais”, termo que sequer faz parte do
sistema jurídico codificado adotado por nosso País. A importância do tema está
ligado às súmulas vinculantes, recentemente incorporadas ao sistema jurídico
brasileiro por meio de emenda constitucional. A súmula vinculante hoje uma
novidade, mas os “precedentes judiciais” a muito tempo fazem parte do direito
brasileiro e convive harmonicamente com o sistema codificado. Como se verá
são inúmeras as possibilidades de utilização dos precedentes como ferramentas
jurídicas processuais. A existência de ferramentas legais dispostas no Código de
Processo Civil, entre outras leis extravagantes me motivou a escrever algumas
linhas a respeito deste tema, até então pouco explorado. Sem esquecer o
objetivo funcional e social deste trabalho procurei a objetividade, evitando
aprofundamentos demasiados. Neste contexto foi estudado a origem histórica
dos precedentes, inclusive no Brasil, os princípios e fundamentos que orientam o
instituto, a diferença entre o precedente e enunciado de súmula. Foi realizada
uma análise dos diversos institutos co-relacionados, comparando os precedentes
vinculantes do sistema do common law e da civil law. E expostos os principais
dispositivos legais que homenageiam os precedentes e sua correta utilização. Foi
necessário trazer a lume as críticas e contra os argumentos afetos á utilização e
vinculação dos juízes, tribunais e dos órgãos da administração pública nos seus
diferentes níveis. Por derradeiro, aventamos exemplos práticos da utilização dos
precedentes, sem ter a pretensão de exaurir o tema, mas apenas provocar o
leitor á descoberta de muitas de utilização deste instituto. Espero que a missão
seja cumprida ao longo do trabalho monográfico.
INTRODUÇÃO
Nos estudos jurídicos existentes, entende-se o termo
“precedente” de diversas maneiras. Assim, é necessário que se tenha em mente
um conceito pré-determinado para evitar possíveis e indesejáveis confusões
advindas do termo. Para os fins específicos aqui buscados, a idéia de precedente
será entendida como a retomada de uma ou mais decisões judiciais anteriores
que possam servir de modelo para outras decisões futuras. Nesse caminho é
“precedente” o uso reiterado de um modelo decisório de maneira a convergir para
uma mesma racionalidade decisória.
A questão ganha envergadura quando se verifica as
possibilidades de utilização dos precedentes: como elemento de persuasão;
sentença de improcedência prima facie; parâmetro para impedir recursos
repetitivos voluntários e de oficio; referência para análise existência de
repercussão geral; forma de suspender recursos repetitivos no julgamento por
amostragem, em nível especial e extraordinário; como elemento de repercussão
geral; vinculação das decisões do Judiciário, Executivo e até mesmo do
Legislativo no que toca as questões administrativas. Não nos esqueçamos da
vinculação à razão de decidir das sentenças proferidas em ações objetivas de
controle concentrado de constitucionalidade pelo STF. Tudo a serviço da redução
da insegurança jurídica, incertezas e imprevisibilidades, marca registrada da
potencialidade conflitiva do direito.
O crescimento da demanda social por uma prestação
jurisdicional mais célere, efetiva e segura deu origem a diversas mudanças e
profundas reflexões no mundo jurídico, vinculados à idéia de eficiência e
efetividade da prestação jurisdicional por parte do Estado. Diante dessas
inovações, surgiu a figura do “efeito vinculante” face à irreverência com que se
tratavam as súmulas persuasivas. O “engessamento” do Poder Judiciário
ocasionado pela proliferação dos conflitos e aumento das demandas, em especial
dos excessivos processos submetidos à análise do Supremo Tribunal Federal foi
outro motivo para criação do efeito vinculante do precedente.
A idéia foi expandir o efeito vinculante e erga omines já
existentes nas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento
de ações objetivas, tais como Adin; Adecon; Adpf.
1. ORIGEM HISTÓRICA
A doutrina destaca três principais sistemas de direito
contemporâneo: a família romano-germânica, ou civil law; a família anglo-
americana, também denominada common law e a família dos direitos socialistas.
Porém, para o desenvolvimento deste trabalho científico, surge como
particularmente importantes os sistemas de direito da civil law e common law 1.
Apesar de não ser objeto da pesquisa, é necessário ao
menos mencionar as famílias de menor relevância para nós, como a hindu, a
muçulmana, a judaica e a africana.
1.1. Civil law e common Law
O sistema da civil law se estriba no direito legislado,
origina-se de diplomas legais criados, em geral, pelo Poder Legislativo na sua
vertente lex populi, constituídos essencialmente por textos de códigos, de leis,
decretos etc. Nele os juristas procurar alicerces nas disposições legais que
devem ser concretizados caso a caso, por interpretação dos operadores do
Direito. Os países ligados à família romanogermânica, dentre eles o Brasil, são
também conhecidos como axiomáticos2.
____________________________________1 DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Tradução Hermínio A. Carvalho. 3ªed., São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 14.2 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário.1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 9
Já no sistema da common law o direito origina-se dos
usos e costumes e pelas decisões do Poder Judiciário, baseando-se em casos
concretos já decididos - precedentes. Valoriza-se aqui a atividade jurisprudencial
em desfavor da legislativa.
A lei escrita - statutes é vista como fonte
secundária, busca-se por meio de um raciocínio problemático, caso a caso,
decisões concretas, que só secundariamente podem adquirir autoridade
prospectiva geral. Os casos mais relevantes - leading cases, servem como
paradigma na solução de futuros casos idênticos ou muito similares. Pois bem,
no sistema da common law, as decisões judiciais cumprem dois papéis: o de
solucionar o litígio e o de criar um precedente válido para casos futuros como
norma judicada3.
Das diferenças existentes entre estes dois sistemas
jurídicos, duas merecem destaque: a primeira é a diferença com que a lei é vista
em ambos; enquanto no sistema romanista a lei é entendida como fonte principal,
não podendo o aplicador negar-se a aplicá-la sob pretexto de lacunas, no Brasil
artigos 4°, LICC, e 126 do CPC, devendo integra - las com base nos princípios e
na analogia, na common law a lei escrita é vista como fonte subsidiária. A
segunda, hoje fortemente mitigada, se refere à inexistência nos ordenamentos
dos países da civil law de algo semelhante à regra do stare decicis et non quieta
movere - “ficar com o que foi decidido e não mover o que está em repouso”, ou
seja, a possibilidade/obrigatoriedade da vinculação aos precedentes
jurisprudenciais emanados dos tribunais superiores. Contudo, o reconhecimento
da primazia da lei no sistema de direito romano-germânico não exclui a
necessidade de sua interpretação, já que a lei deve ser interpretada, deixando o
plano genérico e abstrato para incidir no caso concreto4.
_________________________________3 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário.1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 9.4 SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma nova aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 99.
Aos operadores do direito é atribuída á árdua e relevante
tarefa de descobrir o significado da lei, interpretando-a e adequando-a a cada
situação concreta posta sob sua análise, sendo a legislação escrita um escudo e
não um obstáculo à atividade jurisprudencial. Inegável que nos países em que
vige o sistema romano-germânico não está excluída a relevante função da
atividade jurisprudencial; a lei precisa ser interpretada e incube a jurisprudência
atuar no campo da interpretação, atualização, concretização e humanização da
lei, observando todavia, que a jurisprudência não pode infringir a lei -
contralegem, eis que é da própria essência do sistema de tradição romanística o
primado legal.
No que tange ao efeito vinculante, mister é que seja
efetuado um estudo dos precedentes do sistema do common law,
especificamente quanto as stare decisis. Primeiramente é de se reconhecer a
existência de diferenças, às vezes marcantes, entre os direitos de um mesmo
grupo ou família: como entre as do direito dos Estados Unidos e da Inglaterra5.
No primeiro, do stare Grã-Bretanha, onde se originou a regra do precedente é
marcante a rigidez de sua aplicação embora nos últimos tempos vem sendo
atenuada. A “teoria estrita do precedente”, utilizada na Inglaterra, pela qual a
vinculação é rígida, só não sendo aplicada se for demonstrada que, na situação
de fato subsequente, a lógica da decisão anterior não se aplica. Na segunda,
“teoria liberal”, ou regra americana, a aplicação da doutrina do stare decisis é
mais flexível, obedecendo a uma técnica que, embora encorajando a obediência
aos precedentes, admite que instâncias inferiores recusem o precedente,
fundamentadamente. Como se vê, na formação expressa do princípio, na
Inglaterra, se desconhece a maior parte das exceções e ressalvas que o
caracterizam nos Estados Unidos, e que fizeram do common law norte-americano
um ordenamento jurídico mais fluido e variável do que o inglês6.
________________________________5 SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma nova aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 98.6 STRECK, Lenio Luiz. Súmulas no Direito Brasileiro: eficácia, poder e função: a ilegitimidade constitucional do efeito vinculante. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 234.
Por exemplo, nos Estados Unidos não se discute o
direito de um tribunal inferior de recusar-se a seguir uma sentença precedente in
point ditada por um tribunal de hierarquia superior, da mesma jurisdição, se o
tribunal inferior considerar que o tribunal superior cometeu um erro crasso...7”
Apesar disso prevalece a regra de obediência aos
precedentes, stare decisis, segundo o qual o juiz deve ater-se às decisões
jurisdicionais tomadas no caso precedente, desde que entre os dois casos
existam semelhanças fático-jurídicas substanciais. Contudo a doutrina do uso dos
precedentes possui limites na sua aplicação, não se afigurando uma regra
inflexível, pois se tornaria inconciliável com o próprio desenvolvimento do direito.
Assim, se a aplicação do princípio produzir resultado indesejável, o juiz ou
tribunal poderá aplicar precedente diverso.
Por isso, a stare decisis não é apenas uma doutrina de
estabilidade e uniformidade, suas restrições e limitações, permitem ao
magistrado revisar a falsa interpretação da lei, se reconhecer que há fatores que
determinam a inaplicabilidade de decisões anteriores, o que é indispensável para
a mudança e o progresso8.
A força vinculante do precedente, mesmo nesses países,
não é absoluta e nem poderia sêlo, sob pena de engessar o direito, impedindo o
seu progresso. É preciso também ter em conta que a eficácia do stare decisis
não cobre o inteiro teor do julgado, senão a parte nuclear da motivação, onde
vem exposto o fundamento jurídico que embasa a conclusão, ou seja, a ratio
decidendi. Além disso, o precedente poderá ser sempre revisto se ficar
demonstrada o seu equívoco, em outras palavras, desde que haja novos e
persuasivos motivos para se adotar outra decisão. Para tanto o juiz utilizará de
técnicas para afastar esses leading precedents, denominadas overruling e
distinguishing 9.
______________________________7 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. O efeito vinculante e os poderes do juiz. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 10.8 Apud SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma nova aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 103.9 ROCHA, Lincoln Magalhães da. Direito Sumular. Rio de Janeiro: Shogun Arte, 1983, p. 47.
Desde sua origem a principal dificuldade para o
magistrado dos países que seguem a regra do precedente judicial consiste em
separar o que constitui a idéia central de um julgado - ratio decidendi, ou seja,
aquilo que irá vincular em casos posteriores, e o que são apenas considerações
secundárias - obter dicta, apenas persuasivo. Isso só será possível por meio de
leitura atenta e completa de tudo aquilo que levou os julgadores anteriores a
decidir de tal ou qual maneira10.
Na família romano-germânica, a jurisprudência cresce
em importância, deste modo percebe-se que está havendo uma atenuação cada
vez maior nas diferenças entre common law e civil law.
2. PRECEDENTES NO BRASIL
Para a correta compreensão da tendência de vinculação
dos precedentes judiciais no ordenamento jurídico brasileiro é imprescindível uma
abordagem histórica a respeito da evolução do nosso direito positivado e da
nossa jurisprudência.
2.1. Precedentes antes da CF/88
A influência dos precedentes judiciais sobre o direito
brasileiro remonta o período colonial, quando vigoravam no Brasil as Ordenações
do Reino, que previam os assentos, regulamentados no Título V, §5º, Livro I, das
Ordenações Filipinas. Acrescente-se que a Lei da Boa Razão editada em 1769,
previa que os assentos aprovados pelas Relações teriam força vinculante após
aprovados pela Casa de Suplicação de Lisboa.
_____________________________10 LIMA, Leonardo D. Moreira. Stare decisis e súmula vinculante: um estudo comparado.disponívelem:<http://www.pucrio.br/sobrepuc/depto/direito/revista/online/rev14_leonardo.html#_ftn10>. Acesso em 04 jun.2005.
Em 1808, com a chegada da Família Real Portuguesa,
que fugia da invasão do Reino pelas tropas de Napoleão, a Relação do Rio de
Janeiro adquiriu a qualidade de Casa de Suplicação para o Brasil, com poderes
de aprovar assentos11.
Com a independência do Brasil em 7 de setembro de
1822 e a outorga da Constituição de 25 de março de 1824, continuaram a vigorar
os assentos expedidos pela Casa de Suplicação Portuguesa. Em 1829, foi criado
o Supremo Tribunal de Justiça, que sucedeu a Casa de Suplicação do Rio de
Janeiro. A este Tribunal, como órgão de cúpula do Poder Judiciário, coube a
função de lavrar assentos de observância obrigatória, nos termos do Decreto
Legislativo n. 2.684, de 23.10.1875. Interessante mencionar que, assim como os
portugueses, após aprovados não podiam ser revistos ou cancelados pelo
Judiciário, mas tão-somente por meio de lei. A partir da proclamação da
República em 15 de novembro de 1889 e da promulgação da Constituição de
1891, a jurisprudência do STF ganhou força com o artigo 1º do Decreto n.
23.055, de 9.8.1933, que tornou obrigatório a todo o Judiciário brasileiro a
interpretação de leis em conformidade com o que dispunha a Corte
constitucional. Contudo, na vigência da Constituição de 1934, a codificação, em
nosso país, foi responsável pelo desaparecimento da vinculação da
jurisprudência, na medida em que nem o Código de Processo Civil de 1939, nem
o de 1973 previram tal fenômeno12. Como se nota a utilização dos precedentes e
sua respectiva força vinculativa é da essência do direito e judiciário brasileiro.
2.2. Precedentes judiciais após a CF/88 e previsão legal
Neste subitem traremos à tona as principais ferramentas para
utilização dos precedentes, para desde logo informar o leitor sobre a importância
do tema.
__________________________________
11 BALSALOBRE, André de Barros. A súmula vinculante como instrumento de uniformização da jurisprudência. Revista do Tribunal Regional Federal, 1ª Região, Agosto, v.14, n.8, 2002, p. 19/20.12 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes. Judiciário e segurança jurídica: a questão da súmula vinculante. 1ªed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004, p. 32.
Após quase seis décadas do Código de Processo Civil
de 1934, diversas alterações legislativas, constitucionais e jurisprudenciais vem
sendo realizadas para alterar e aperfeiçoar o sistema dos precedentes, bem
como o sistema constitucional no tocante à fiscalização normativa.
Essas mudanças encontram-se embasada na CF/88,
uma vez que ressalta o seu conteúdo normativo, apesar de inexistir, até então,
em seu texto originário, qualquer dispositivo que determine expressamente a
vinculação dos precedentes judiciais.
As primeiras braçadas do instituto foram para prestigiar a
hermenêutica Constitucional em face das demais normas infraconstitucionais. O
Estado brasileiro adotou simultaneamente duas formas de controle de
constitucionalidade dos atos normativos, a saber: controle concentrado e controle
difuso. O difuso pode ser exercido por todos os juízes a partir do julgamento das
causas em que seja suscitado o tema da constitucionalidade de determinado ato
normativo na causa de pedir como fundamento da procedência do pedido. No
entanto, a Constituição determina, em seu artigo 97, que somente pela maioria
absoluta dos membros dos tribunais, ou do respectivo órgão especial, é possível
declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo público, estando tal
procedimento disciplinado nos artigos 480 e 482 do CPC. Trata-se da cláusula de
reserva de plenário, também conhecida como cláusula de Full Bench. Essa
determinação constitucional causou certa celeuma na jurisprudência, entendendo
alguns não ser possível o controle de constitucionalidade difuso, visto que em
primeira instancia não existe julgamento colegiado13.
________________________________13 A argüição de relevância no recurso extraordinário, 1988. Para uma análise mais aprofundada do instituto, consulte-se, ainda, N. Doreste Baptista, Da argüição de relevância no recurso extraordinário, 1976.
Como segundo instituto em exame, inserido pelo
parágrafo único do artigo 481 do CPC, incluído pela Lei 9.756/98, dispõe que no
caso de a questão de constitucionalidade já ter sido examinada pelo plenário ou
por órgão especial do respectivo tribunal ou pelo Plenário do STF haverá
dispensa de submissão do incidente de constitucionalidade, tendo em vista a
vinculação jurídica existente. Eis que surge a primeira ferramenta prática que
homenageia o precedente judicial.
Na hipótese de não ter sido a questão de
constitucionalidade examinada anteriormente e, tendo sido admitido o incidente
de inconstitucionalidade, será lavrado acórdão e remetido cópia desse a todos os
membros do plenário ou do órgão especial, que terá a cognição limitada à
aferição de constitucionalidade.
Diante da multilateralidade do debate a respeito da
compreensão da Constituição Federal, passou a se defender a necessidade da
construção de uma sociedade aberta dos intérpretes da Constituição e a
vinculação do que for decidido. Para isso pluralizou-se o debate a esse respeito,
admitindo o diálogo do judiciário com as pessoas jurídicas de direito público
responsáveis pelo ato, o Ministério Público, os legitimados à propositura de ADI
e, considerada a relevância da matéria, todos aqueles órgãos ou entidades
representativos de setores sociais potencialmente atingidos pela decisão a ser
tomada - amicus curiae. Porém, fixada a interpretação, está ganha status de
norma e o julgamento do caso no órgão fracionário que suscitou o incidente deve
ser retomado estando esse órgão vinculado à solução a respeito da
constitucionalidade dada pelo tribunal. Assim, firma-se o precedente, que deve
ser respeitado, inclusive pelo próprio tribunal em suas câmaras ou turmas. Trata-
se da eficácia intra muros14.
______________________________14 José Miguel Garcia Medida, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruda Alvim Wambier, Repercussão geral e súmula vinculante, Reforma do Judiciário (obra coletiva), p. 374.
A redação dada ao artigo 557, caput, do CPC e a
inclusão de seu §1º pela Lei 9.756/98, trouxe outra inovação, a possibilidade de o
relator negar, de plano, recurso manifestamente contrário a enunciado de Súmula
ou jurisprudência do respectivo tribunal, do STF ou de qualquer tribunal superior
competente. Permite ainda, o provimento do recurso pelo relator na hipótese de a
decisão atacada encontrar-se em manifesto confronto com enunciado de Súmula
ou jurisprudência dominante do STF ou de qualquer tribunal superior. É um claro
aumento de poderes com a possibilidade de julgamento monocrático do relator,
que age sob delegação de poder, de maneira a respeitar o precedente firmado
pelo tribunal, inclusive na hipótese de reexame necessário. Para a utilização
desse mecanismo basta ser a jurisprudência dominante, a teor do dispositivo em
exame - não havendo necessidade de ser ela pacífica, pois a finalidade do
referido dispositivo, é o patrocínio do precedente.
Na mesma linha dos dispositivos até então citados
encontra-se o artigo 518, §1º do CPC, dispondo sobre o não recebimento do
recurso de apelação pelo juiz quando a sentença estiver em conformidade com
enunciado de Súmula do STJ ou do STF. Trata-se de Súmula impeditiva de
recurso voluntário, com inequívoco expediente de compatibilização vertical das
decisões judiciais. Há clara possibilidade de utilização do expediente para
obstaculizar o recurso de oficio.
O artigo 285-A do CPC, a seu turno, acrescentado pela
Lei 11.277/06, prestigia a racionalização da atividade judiciária e a
compatibilização vertical das decisões judiciais, economia processual e possibilita
ao juiz dispensar a citação do demandado e prolatar desde logo sentença,
reproduzindo o teor de sentença proferida de total improcedência em outros
casos idênticos na hipótese de a matéria controvertida ser unicamente de direito.
Obviamente, existindo enunciado de Súmula de tribunal local, do STJ ou do STF
ou mesmo decisão por amostragem a respeito do problema jurídico controvertido
em ações idênticas, o juiz de primeiro grau pode julgar liminarmente
improcedente em conformidade com o precedente. Todavia, jamais poderá o juiz
singular julgar, em sede liminar, improcedente o pedido, com base neste artigo,
de maneira contrária à orientação pacificada pelos referidos tribunais. Vale dizer,
na hipótese de existir enunciado de Súmula do STF no sentido de improcedência
do pleito há obrigação de se julgar liminarmente improcedente o pedido, tendo
em vista a vinculação em face do Tribunal Constitucional. Trata-se de decisão de
mérito sem citação da parte ré, evidenciando o elevado valor dado ao precedente
em nítido aumento dos poderes do juiz.
O artigo 543-A do CPC, acrescido pela Lei 11.418/06,
editada após a EC45/04, que incluiu o §3º no artigo 102 da CF/88, estabeleceu
ser a repercussão geral requisito intrínseco de admissibilidade do recurso
extraordinário. A Lei, assim como a EC, objetivou racionalizar a atividade
judiciária, permitindo ao STF desempenhar a sua função de outorga de unidade
ao direito por intermédio de sua compreensão da Constituição. Unidade esta que
busca a compatibilização das decisões judiciais relacionadas aos conflitos já
existentes e a uniformidade na interpretação constitucional nos conflitos que
estão por vir.
Nesta mesma linha, consigna o §1º do artigo 543-A do
CPC que para efeito da repercussão geral serão consideradas questões que
ultrapassem os interesses subjetivos das partes. Este parágrafo traz a
aceitabilidade, em sede de recurso extraordinário, de um caso que, podendo se
tratar de um leading case, sirva como precedente a ser observado em futuros
julgamentos de casos semelhantes. E o §3 º do mesmo artigo traz a presunção
absoluta de repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária
a enunciado de Súmula ou jurisprudência dominante do STF. Este parágrafo
objetiva aplicar os entendimentos constitucionais reiterados pelo Tribunal
Constitucional, para que seus precedentes não sejam desrespeitados por
tribunais e juízes de grau jurisdicional inferior. O §5º, de sua vez, assevera que
sendo negada a repercussão geral, esta decisão valerá para todos os recursos
que versarem sobre matéria idêntica. Acrescente-se que esta decisão vincula a
Corte Constitucional - vinculação horizontal, que tem o dever de observar a sua
própria jurisprudência, salvo revisão de tese pelo pleno, nos termos de seu
Regimento Interno. É perceptível a predileção do legislador infraconstitucional e
do constituinte derivado reformador em dar uniformidade ao posicionamento
constitucional tendo como norte os precedentes judiciais.
As Leis 11.418/06 e 11.672/08 que inseriram no CPC a
regulamentação a respeito dos recursos repetitivos (julgamento por amostragem),
também mostram a importância que vem se atribuindo aos precedentes e, por via
de consequência à unidade do direito, sobretudo quanto ao seu inegável efeito à
celeridade e economia processual.
Os artigos 543-B - STF e 543-C - STJ, do CPC, são
aplicados quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
controvérsia. Neste caso serão selecionados recursos que representam de
maneira adequada á controvérsia, ficando os demais sobrestados na origem até
o pronunciamento do tribunal. Após decisão de mérito proferida por este órgão
jurisdicional, os recursos sobrestados serão apreciados na origem, podendo ser
declarados prejudicados quando a decisão do tribunal tenha sido no sentido da
decisão recorrida ou reconsiderados no caso de contrariedade da decisão do
tribunal em cotejo com a decisão recorrida. Notadamente há vinculação ao
precedente não apenas diante dos feitos que se encontrem sobrestados, mas,
também, de outros que tramitam nos demais órgãos do Poder Judiciário, sob
pena de se esvaziar a utilidade do instrumento processual.
O artigo 546 do CPC, com a alteração dada pela Lei
8.950/94, disciplina os embargos de divergência, recurso que tem por objetivo
uniformizar a jurisprudência interna do STF e do STJ, de sorte a se firmar
precedentes judiciais a serem observados. Aqui impõe lembrar o enunciado de
Súmula n. 168 do STJ, que impede os embargos de divergência quando exista
jurisprudência do tribunal no mesmo sentido do acórdão embargado.
De se mencionar, ainda, o §3º do artigo 475 do CPC
incluído pela Lei 10.352/01, que dispensa o reexame necessário diante de
precedente fixado, e o §3º do artigo 544, do mesmo diploma, com redação dada
pela Lei 9.756/98, que traz a possibilidade de o relator conhecer do agravo para
dar provimento ao recurso especial quando a decisão atacada estiver em
contrariedade com enunciado de Súmula ou jurisprudência dominante do STJ.
Utilizando do mesmo raciocínio, nada obsta a admissão do agravo para que se
negue provimento ao recurso especial inadmitido na origem quando a decisão
impugnada estiver em conformidade com enunciado de Súmula ou jurisprudência
dominante do tribunal.
No que concerne a justiça trabalhista o artigo 896, com
redação dada pelas Leis 9756/98 e 9957/00 e 896-A da Consolidação das Leis
do Trabalho, acrescido pela MP n. 2.226/01, que dispondo sobre o recurso de
revista, objetivam a uniformização interpretativa e a observância dos precedentes
do TST, além de exigir para o seu exame divergência atual, ainda não pacificada
em enunciado de Súmula ou inexistir notória jurisprudência deste tribunal e da
causa oferecer transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza
econômica, política, social ou jurídica, na explícita intenção de se admitir apenas
leading cases com o fito de se fixar novos precedentes a serem observado15.
O artigo 14 da Lei 10.259/01 – Juizados Especiais
Federais, de sua vez, ao versar sobre o pedido de uniformização da interpretação
de lei federal no âmbito dos juizados especiais federais também oferta relevo aos
precedentes judiciais, uma vez que tem como pretensão aplicar entendimento
proferido pelas turmas de uniformização ou pelo STJ, de sorte a demonstrar que
o precedente há de ser observado por magistrados e turmas recursais.
Interessante é salientar que, na intenção de atribuir unidade ao direito, o pedido
em tela se utiliza, por similitude, do procedimento dos processos repetitivos com
o sobrestamento dos feitos e a vinculação do precedente fixado pelo STJ a eles.
No mesmo caminho veio á Lei 12.153/2009 – Juizados
Especiais no Âmbito das Fazendas Públicas, que trouxe idênticos dispositivos,
além de instituir o Sistema dos Juizados Especiais.
Por fim, a inovação que chancelou de vez a valorização
dos precedente judiciais em nosso País, advém da EC45/04, que estatuiu as
"Súmulas Vinculantes", com a inclusão do artigo 103-A na Constituição da
República.
_______________________________15 V., nesse sentido, Barbosa Moreira, A redação da Emenda Constitucional n. 45 (reforma da justiça), Revista Forense, v. 378, 2005, p. 44.
Este disposto consigna que depois de preenchidos os
requisitos: reiterados julgamentos sobre a matéria constitucional e decisão de
dois terços dos membros do STF, portanto oito Ministros, serão aprovados
enunciados de Súmula com efeito vinculante, ou seja, de observância obrigatória
em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário, administração pública direta e
indireta, englobando todos os entes federativos e legislativo em questões
administrativas.
No §1º deste artigo há o demonstrativo de que o objetivo
é dirimir controvérsia atual entre órgãos judiciários - ou entre esses e a
administração pública - que acarrete grave insegurança e relevante multiplicação
de processos. O §3º do dispositivo, a seu turno estabelece ser passível de
reclamação ao STF o ato administrativo ou decisão judicial que contrariar
enunciado de Súmula vinculante ou indevidamente aplica - la. É evidente a
intenção de se unificar a compreensão constitucional tornando-a obrigatória.
Importante relatar que no tocante à jurisprudência
constitucional é evidente o recrudescimento da valorização dos precedentes
judiciais e a sua final vinculação. A reiterada utilização dos precedentes - ratio
decidendi nas decisões prolatadas, traduz a nova tendência do Judiciário
brasileiro16. O novo expediente, em última análise, equivale à suspensão da
execução de lei declarada inconstitucional em controle difuso, não obstante à
discussão a respeito da mutação constitucional relacionada ao artigo 52, inciso X,
da CF/88, segundo a qual a competência para o Senado se limitaria a dar
publicidade à referida suspensão. Por tudo isso, nota-se, que tem sido atribuído
elevado valor aos precedentes, ai incluído a vinculação à razão de decidir nas
ações objetivas e aos enunciados de Súmula persuasivas dos tribunais,
mormente quando emanados do STF quando então pode ter força vinculante.
________________________________16 Reforma do Judiciário no Brasil pós-88, p. 104.
O sistema de constitucionalidade brasileiro movimenta-
se claramente ao encontro de sistemas alienígenas, sem, contudo, perder a sua
identidade. Há sem dúvida semelhanças com o direito costumeiro, visto que
neste modelo a observância dos precedentes ocorre naturalmente. Mas há
diferença na evolução do sistema brasileiro, pois se baseia em prescrição
legislativa, em que pese existir tendência jurisprudencial no sentido de se
observar os precedentes mesmo diante de situações que inexista comando
normativo neste sentido. Como descrito, esta nova tendência iniciou-se e
reiniciou-se tendo como lastro na legislação infraconstitucional.
3. DISTINÇÃO ENTRE PRECEDENTE, JURISPRUDÊNCIA E ENUNCIADO DE SÚMULAS.
Na doutrina há diferença entre precedente estrictu sensu,
jurisprudência e enunciado de súmulas. A jurisprudência consubstancia-se na
razão de decidir do juiz - ratio decidendi, que nas ações objetivas de controle
concentrado de constitucionalidade tem caráter vinculante. No Brasil somente o
decisum tem força vinculativa. Todavia a razão de decidir é que será utilizada
para a formação do precedente e do posterior enunciado de súmula, assim é de
essencial importância para este estudo17.
Tecnicamente, jurisprudência significa "a ciência da lei".
É a articulação das regras da lei com as situações factuais – caso concreto.
Neste contexto a jurisprudência pode consistir na decisão irrecorrível de um
tribunal, ou um conjunto de decisões dos tribunais ou a orientação que resulta de
um conjunto de decisões judiciais proferidas num mesmo sentido sobre uma
dada matéria e proveniente de tribunais da mesma instância ou de uma instância
superior.
______________________________
17 ROCHA, Lincoln Magalhães da. Direito Sumular. Rio de Janeiro: Shogun Arte, 1983, p. 58.
Aqui embora num mesmo sentido, as decisões são
isoladas. Como se vê a jurisprudência pode-se referir a "lei baseada em casos",
ou às decisões legais que se desenvolveram e que acompanham estatutos na
aplicação de leis em situações de fato18.
Súmula foi a denominação de que se valeu Victor Nunes
Leal, emérito Ministro do STF, nos idos de 1963, para definir, como pequenos
enunciados, o que o Supremo Tribunal Federal, vinha decidindo de modo
reiterado acerca de temas que se repetiam em seus julgamentos. Os enunciados
de súmula são preceitos genérico e abstratos, assentam-se num enunciado
prescritivo formal e nascem de reiteras decisões dos tribunais em um mesmo
sentido, sendo a súmula uma espécie de copilação das jurisprudências19. Assim,
como acima dito, é a razão de decidir constante do julgado que dá suporte a
estes enunciados de súmulas e neste processo, generalizam-se. Muitas vezes
esta generalização perde a sua referência e, mesmo assim, continua a ser
seguida, causando em muitos casos prejuízos aos jurisdicionados. Neste
modesto estudo tomaremos os precedentes em seu sentido lato, admitindo como
tal toda e qualquer manifestação reiterada em um mesmo sentido dos órgãos do
Poder Judiciário.
4. TRANSCENDÊNCIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES
Esta exposição restaria incompleta se deixarmos de
mencionar a importância dos motivos determinantes, o que a doutrina chama de
transcendência. A Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes
prestigia sobremaneira a observância obrigatória dos precedentes judiciais
emanados pela Corte Constitucional de sorte a consagrar a vinculação como sua
própria essência.
____________________________
18 SILVA, José Anchieta da. A súmula de efeito vinculante amplo no direito brasileiro: um
problema e não uma solução. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 65/66
19 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência Jurisprudencial e Súmula Vinculante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 165.
O efeito vinculante, via de regra decorrente de controle
abstrato de constitucionalidade não alcança, diferentemente do sistema alemão,
os fundamentos determinantes da decisão prolatada.
É a doutrina que tem como fito a extensão do conteúdo
essencial da decisão a outros casos ou atos normativos semelhantes, de maneira
a homenagear diversos princípios constitucionais, além de primar pela
racionalização da jurisdição. Leva em conta o fato de a Corte Suprema ser
detentora do monopólio exegético constitucional, sendo o órgão legitimado a dar
a última palavra em matéria de Constituição. É bem verdade que essa extensão
se desalinha do entendimento da doutrina processualista clássica, bem como do
direito processual pátrio, já que a decisão judicial, sentença ou acórdão, divide-se
em três partes; relatório, fundamentação e dispositivo. O primeiro tem como
função demonstrar a todos os interessados, em especial às partes, o
conhecimento do órgão jurisdicional de todos os fatos importantes relacionados à
relação processual. A fundamentação é exigência da cláusula aberta do devido
processo legal, artigo 5º, LIV, da CF/88, e é utilizada para que o magistrado
analise o problema jurídico decorrente das questões de fato e de direito postas
em juízo. A fundamentação da sentença tem que apresentar coerência lógica e
contextual, importando aí os nexos do direito como um todo e do senso comum
articulados no âmbito da motivação.
Os fundamentos, quando acolhidos, ensejam a
procedência do pedido. Também são levadas em conta a argumentações das
partes, para que se chegue a um nexo lógico e jurídico motivação –
fundamentação. A parte dispositiva da decisão demonstra o acolhimento ou a
rejeição do pedido da parte autora, no todo ou em parte, e o caminho a ser
seguido para a concretização da tutela jurisdicional. Assim, no direito processual
positivado vigente, apenas o dispositivo logra autoridade de coisa julgada e
transita em julgado, apesar da elevada importância da fundamentação para se
dimensionar o alcance do dispositivo e auxiliar sua compreensão. É o que dispõe
os artigos 467 e 469 do Código de Processo Civil. É o limite objetivo da coisa
julgada. A doutrina mais agressiva defende que a Teoria da Transcendência dos
Motivos Determinantes, em sede de controle de constitucionalidade, também
atingiria a coisa julgada20.
O Plenário do STF, ao admitir expressamente a
possibilidade de aplicar esta teoria em nosso ordenamento jurídico, consignou
que o efeito vinculante refere-se à própria ratio decidendi – Rcl. 1.987/DF. Então
a vinculação incide sobre a opção hermenêutica adotada na decisão, ou a tese
jurídica utilizada pelo órgão julgador, sem a qual a decisão não seria proferida em
determinado sentido. É fundamental para a correta aplicação desta nova teoria a
diferenciação entre a ratio decidendi e as considerações tecidas in obter dicta,
uma vez que o efeito vinculante não incide sobre estas 21.
A transcendência dos motivos determinantes pode ser
reconhecida da mesma forma em sede de ADPF no que diz respeito às leis
municipais. De se incluir as normas municipais editadas antes da CF/88, uma vez
que o direito brasileiro utiliza-se do fenômeno da recepção - não-recepção, não
admitindo a inconstitucionalidade superveniente. É possível, também, o
reconhecimento da transcendência dos motivos determinantes diante de normas
municipais em face da Constituição Estadual, por meio de reclamação perante o
respectivo Tribunal de Justiça. Evidente o significativo passo dado pela teoria no
rumo da modernização e racionalização da jurisdição constitucional22. Por
derradeiro resta dizer que a transcendência dos motivos determinantes tem
fundamento no artigo 102, §2º, da CF/88, determinando que as decisões
definitivas de mérito proferidas pelo STF em ADI ou ADC serão dotadas de efeito
vinculante, de sorte a não restringir a vinculação ao dispositivo do acórdão. O
mencionado dispositivo não retira a possibilidade de vinculação da ratio decidendi
no que concerne à ADPF, pois também se cuida de controle abstrato de
constitucionalidade.
________________________________20 JAMBO, Paloma Wolfenson. O poder vinculante das súmulas e a impossibilidade da identificação estreitadas causas submetidas à Justiça. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6961>. Acesso em: 04 jul. 2005.21 http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/default.asp22 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência Jurisprudencial e Súmula Vinculante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 174.
A Lei 9.882/99 prevê em seu artigo 10, §3º, que a
decisão relativa à ADPF tem eficácia contra todos e efeitos vinculante
relativamente aos demais órgãos do Poder Público. O caput do dispositivo
assevera que o STF fixará as condições e o modo de interpretação e aplicação
do preceito fundamental, o que reitera aplicação da transcendência na espécie.
De qualquer modo, a transcendência dos motivos
determinantes é mandamento constitucional, uma vez que reforça a posição da
Constituição como norma suprema e balizadora de todo o ordenamento jurídico.
Fica claro que a transcendência da razão de decidir é instituto que anda de mão
dada com o precedente, o que impõe sua valorização e utilização em que pese a
maior dificuldade técnica.
5. PRECEDENTES E O EFEITO VINCULANTE
Os limites subjetivos da coisa julgada, ou seja, quem
será atingido pela coisa julgada - res iudicata. Em se tratando de litígio individual,
a coisa julgada gera efeitos inter partes, atingem, em regra, apenas os sujeitos da
relação litigiosa, de maneira a não surtir efeitos perante terceiros para beneficiá-
los ou para prejudicá-los23. Todavia, no tocante à jurisdição constitucional - mais
especificamente na fiscalização normativa abstrata é diferente a abrangência
tendo em vista as peculiaridades do processo objetivo, quais seja a inexistência
de lide e de partes, além do fim de manutenir a ordem constitucional. O efeito
vinculante é instituto importado do Direito tedesco, que originalmente confunde-
se com a própria transcendência dos motivos determinantes. O efeito vinculante
tem como objetivo outorgar maior eficácia às decisões proferidas pela Corte24.
_______________________________23 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Controle de constitucionalidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.24 MUSCARI, Marco Antônio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p.36.
A Emenda Constitucional 3/93 conferiu esse efeito à
decisão definitiva de mérito de procedência ou de improcedência do pedido,
proferida pelo STF em ADI. A EC. 45/04, por seu turno, estendeu o efeito
vinculante à ADC, artigo 102, parágrafo 2º, da CR, bem como à "Súmula
vinculante" artigo 103-A da CR. Este efeito atinge toda a Administração Pública
direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Atinge também o
próprio Poder Judiciário, e até mesmo as turmas do STF, excepcionando o pleno,
para se evitar o fenômeno da fossilização da Constituição, que ocasionaria a
impossibilidade de se tomar decisões mais acertadas no futuro, ou seja, mais
conformes à vontade da Constituição tendo em vista as futuras mudanças fáticas
e de interpretação constitucional. Assim, o precedente torna-se vinculante para
todos, mas apenas persuasivo para o Pleno.
Questão indigesta é se haveria vinculação do Poder
Legislativo. Há entendimento em sentido positivo em face do referido poder, que
se tornaria impedido de editar nova norma com preceitos idênticos aos tidos por
inconstitucionais, norma derrogatória de decisão do STF, bem como norma que
convalide os atos praticados com base na lei declarada inconstitucional. Esta
corrente tem lastro na possibilidade de decretação de inconstitucionalidade de
norma legislada que desafie entendimento da Corte Constitucional levando a sua
ineficácia no mundo jurídico. Não são raras as vezes que o legislativo aprova lei
em desacordo com o entendimento esposado pelo Supremo e tem como
resposta a inconstitucionalidade da novel lei.
A declaração de nulidade de uma lei não obsta à sua
reedição, ou seja, a repetição do seu conteúdo em outro diploma legal. Tanto a
coisa julgada quanto a força de lei (eficácia erga omnes) não lograriam evitar
esse fato. Todavia, o efeito vinculante, que deflui dos fundamentos determinantes
- tragende Gründe da decisão, obriga o legislador a observar estritamente a
interpretação que o tribunal conferiu à Constituição25.
__________________________________25 CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A inconstitucionalidade da súmula de efeito vinculantenoDireitobrasileiro.disponívelem:http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4248>. Acesso em: 25 nov. 2004.
Conclui-se que a decisão do STF não obsta a função
típica do legislativo, mas este deve observar estritamente a interpretação que o
tribunal extraiu da Constituição Federal sob pena clara afronta a harmonia dos
Poderes constituídos, pois se cabe ao Legislativo legislar, ao Poder judiciário
delegado pelo constituinte originário cabe o poder de interpretar e aplicar as leis,
e em matéria constitucional o STF é o tribunal originário.
Outra corrente defende a desviculação do Poder
Legislativo das decisões da Corte Suprema, sob o argumento de que não pode
ser vedado editar ato normativo ainda que contrário à decisão do STF, já que
haveria o comprometimento da relação de equilíbrio entre o Tribunal
Constitucional e o legislador, que se colocaria em uma posição subserviente, com
prejuízo do espaço democrático-representativo, arranhando o Estado
Democrático de Direito, assim como o princípio da Separação dos Poderes e o
poder do Tribunal Constitucional seria insuportável diante dos outros poderes.
Nesse sentido, o legislativo, assim, poderá, inclusive, legislar em sentido diverso
da decisão dada pelo STF, ou mesmo contrário a ela, sob pena, em sendo
vedada esta atividade, de significar inegável petrificação da evolução social26.
Isso porque o valor segurança jurídica, materializado
com a ampliação dos efeitos erga omnes e vinculante, sacrificaria o valor justiça
da decisão, visto que impediria a constante atualização das constituições e dos
textos normativos por obra do Poder Legislativo.
Não se discute porem, a inevitável vinculação da função
administrativa do Poder Legislativo. Como exemplo, registre-se que a vedação ao
nepotismo consignada no enunciado de Súmula vinculante n. 13 incide sobre
todos os poderes da República, inclusive o Legislativo. De se dizer, ainda, que a
função legislativa do Poder Executivo, pelo mesmo raciocínio, não se vincula.
_______________________________26 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
Não fosse assim, a função legislativa do Poder
Legislativo também se vincularia por via reflexa. Conclui-se que a vinculação diz
respeito à função e não ao poder em si. Por fim, faz-se necessário uma breve
consideração sobre a estreita relação entre o efeito vinculante e a figura da
reclamação. Não há dúvida de que tal relação redimensiona o controle de
constitucionalidade, haja vista a possibilidade de se fulminar atos normativos e
decisões incompatíveis com a Lei Fundamental.
5.1. Precedentes e a Eficácia erga omines
A eficácia erga omnes das decisões judiciais foi criada
com propósito semelhante ao do efeito vinculante, o de se outorgar maior eficácia
às decisões proferidas, diz-se que confere "força de lei" às decisões, porém
tendo em vista a inexistência de instrumento processual que assegurasse tal
eficácia, bem como o fato de a cultura jurisprudencial do stare decisis norte-
americano não estar enraizada em nosso sistema nacional, este efeito pouco
contribuiu para a efetividade das decisões27. De se dizer que ela é mais
abrangente, pois incide em face de todos, diferentemente do efeito vinculante
que, como explicitado restringe-se aos poderes públicos, não abrangendo os
particulares. Possui assim maior amplitude subjetiva. A eficácia do efeito erga
omines, no controle abstrato de constitucionalidade, traz consigo, salvo
disposição em contrário, a nulidade total de todos os atos emanados pelo Poder
Público com base na lei ou no ato normativo reconhecido como inconstitucional,
além de ocasionar o efeito repristinatório, em se tratando de norma revogadora
de outra norma.
O mesmo destino terá as decisões judiciais baseadas em
leis declaradas inconstitucionais pela STF em controle concentrado. É imperioso
o reconhecimento da importância prática desse efeito na atividade jurídica
cotidiana.
_______________________________27 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
6.0 PRECEDENTES NA PRÁTICA PROCESSUAL
Antes de analisarmos a utilidade prática dos precedentes
no processo, convém mencionar que os motivos determinantes ou razão de
decidir, sucintamente estudados acima, também constituem elementos de
persuasão do julgador e por conseqüência se enquadram na definição para fins
deste estudo. Além do que a razão de decidir quando aposta em ações objetivas
de controle concentrado de constitucionalidade tem efeito vinculante e
transcendente por força de disposição constitucional, conforme também já
estudado. Outra observação que não deve escapar, embora possa parecer óbvia,
recai sobre o efeito persuasivo, sem duvida o mais utilizado e o menos criticado.
Ressalte-se que não é nossa intenção exaurir o
conhecimento sobre as possibilidades de utilização dos precedentes, nem tão
pouco se aprofundar na aplicação dos que serão aqui exemplificados, mas
apenas levar ao conhecimento do leitor a existência e importância do tema na
atualidade.
6.1. Cláusula de reserva de plenário.
A cláusula de reserva de plenário é uma imposição
constitucional do artigo 97, e artigos 480 e 482 do CPC, segundo o qual os
Tribunais só podem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo pela
manifestação da maioria absoluta do Pleno ou do respectivo Órgão Especial.
Todavia se já houver precedente do próprio tribunal local ou do plenário do
Supremo Tribunal Federal a questão não será submetida novamente a análise do
órgão especial ou do plenário. É instrumento que valoriza tanto a manifestação
do tribunal local como do próprio STF, resultando na economia e eficiência dos
atos processuais.
6.2. Obstrução de recursos voluntários e de oficio pelo Relator
O artigo 557, caput do Código de Processo Civil e a
posterior inclusão do §1º pela Lei 9.756/98, trouxeram como inovação, a
possibilidade do relator negar de plano o recebimento de recurso manifestamente
contrário a enunciado de Súmula ou jurisprudência do respectivo tribunal, do STF
ou de qualquer tribunal superior. Permitiu ainda, que o relator julgue
monocraticamente o recurso na hipótese da decisão atacada estiver em
manifesto confronto com enunciado de Súmula ou jurisprudência dominante do
STF ou de qualquer tribunal superior competente. O relator age por delegação de
poder, de maneira a respeitar o precedente firmado pelo tribunal, inclusive na
hipótese de reexame necessário, conforme a súmula 253 do STJ.
6.3. Obstrução de recursos voluntários e de oficio pelo juiz
O juiz também ganhou poderes para negar seguimento a
recurso, artigo 518, §1º, do CPC, que dispõe sobre o não recebimento do recurso
de apelação pelo juiz quando a sentença estiver em conformidade com
enunciado de Súmula do STJ ou do STF. Nada impede a possibilidade de
utilização do expediente para obstaculizar os recursos de oficio. Há uma clara
diferença, pois o juiz de primeiro grau só pode obstar recurso com base em
súmula dos Tribunais Superiores, já o relator pode fazer com base em súmula do
próprio tribunal a qual está vinculado28.
6.4. Recurso necessário - ex oficio
Grande e louvável inovação foi à inserção do §3º do
artigo 475 do CPC incluído pela Lei 10.352/01, que dispensa o reexame
necessário das decisões de primeiro grau proferidas contra as fazendas públicas
quando em consonância com precedentes fixados pelos Tribunais Superiores.
_____________________________28 A motivação das decisões judiciais como garantia inerente ao Estado de Direito, Revista brasileira de direito processual, v. 16, 1978, p. 115.
O recurso ex oficio é condição de eficácia da sentença, e
por ser obrigatório a subida do processo constitui verdadeiro obstáculo aos
trabalhos do tribunal além de desvalorizar a decisão do juiz de primeiro grau.
Sem dúvida foi um imenso avanço na contenção do formalismo recursal.
6.5. Julgamento prima facie
O artigo 285-A do CPC, possibilitou ao juiz de primeiro
grau dispensar a citação do demandado e prolatar desde logo sentença
reproduzindo-se o teor de sentença proferida de total improcedência em outros
casos idênticos na hipótese de a matéria controvertida ser unicamente de direito.
Se existir súmula de tribunal local, do STJ ou do STF ou mesmo decisão por
amostragem a respeito da controvérsia jurídica, o juiz poderá julgar liminarmente
improcedente em conformidade com o precedente. É decisão de mérito proferida
sem citação da parte contrária, mostrando o relevo do precedente já em primeiro
grau de jurisdição.
6.6. Embargos de divergência
Os embargos de divergência é recurso tipicamente
uniformizador de jurisprudência interna dos Tribunais Superiores, artigo 546 do
CPC, com a alteração dada pela Lei 8.950/94, com o fim de se firmar
precedentes judiciais a serem observados. A Súmula n. 168 do STJ, impede os
embargos de divergência quando exista jurisprudência do tribunal no mesmo
sentido do acórdão embargado. É ferramenta por demais interessante porque
embora tenha como escopo a consolidação de jurisprudência pode ser obstado
por ela.
6.7. Julgamento por amostragem
Trata-se de técnica processual nova, aplicado quando há
multiplicidade de recursos repetitivos com fundamento em idêntica controversa
para o Superior Tribunal de Justiça, artigos 543-C, ou para o Supremo Tribunal
Federal, artigo 543-B, ambos do Código de Processo Civil. Nova porque foi
inserida em 2008 pela Lei 11.612. Fala-se em julgamento por amostragem,
porque o Presidente do Tribunal a quo ou mesmo do Tribunal ad quem, na
omissão daquele e desde haja jurisprudência dominante, admitirá um ou mais
recursos que possam representar bem a controvérsia, determinando a suspensão
dos demais a fim de que aguardem pronunciamento definitivo do Tribunal
Superior – acórdão paradigma com efeito expansivo29. Essa decisão será
utilizada como paradigma para os processos obstados e para aqueles que hão de
vir. Há dois efeitos importantes nesta espécie de precedente, o primeiro é a
possibilidade de suspender o tramite de todos os recursos repetitivos, o segundo
é a extensão da amostra a todos os recursos pendentes e futuros. A suspensão
dos recursos possibilita que os Desembargadores do Tribunal local possam se
dedicar a outros feitos, enquanto a aplicação do paradigma estende uma decisão
a todos os recursos, homenageando o principio da celeridade, eficiência e
economicidade. Não se trata de solução paliativa para “arquivar” recursos, mas
sim acelerar as decisões, pois o parágrafo sexto do artigo 543-C dá preferência
ao julgamento por amostragem em detrimento de outros.
A formação de acórdão paradigma expansivo é mais
célere do que a edição de enunciado de súmula e tem o mesmo efeito persuasivo
e obstativo de recursos, deixando claro tratar-se de uma evolução técnica. Resta
mencionar que este instrumental é aplicado nas questões de direito, ou seja, a
imensa maioria, já que o STJ e o STF só analisam questão de direito.
6.8. Análise de repercussão geral por amostragem
Idêntico mecanismo é utilizado pelo STF na sua análise
de repercussão geral 543-B do CPC. Como se sabe a repercussão geral é um
filtro recursal que se consubstancia num requisito especial de admissibilidade do
recurso extraordinário.
________________________________29 Cf. Cássio Scarpinella Bueno, Amicus curiae no processo civil brasileiro, p. 626-627.
O STF só analisa recursos extraordinários que tenham
repercussão geral, como forma de evitar a subida de recursos meramente
protelatórios. Como forma de operacionalizar a aplicação deste poderoso
instrumento obstativo de recursos, foi adotado o que podemos denominar de
análise de repercussão geral por amostragem, com todos os benefícios do
julgamento por amostragem anteriormente mencionados30.
Aqui o precedente é utilizado não como guia para
solução do meritum causae, mas apenas para verificar a existência ou não de um
pressuposto processual. A decisão autônoma sobre a existência da repercussão
geral será estendida a todos os recursos extraordinários suspensos. Presume-se,
porém a existência de repercussão geral quando o recurso extraordinário atacar
decisão contrária a súmula ou jurisprudência daquele tribunal. Por tratar de
instituto com relevante função jurídica, política, econômica e social admite-se a
manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia. É
a expressa admissão da figura do amicus curiae, figura presente no sistema da
common Law, deixando claro a tendência valorativa do precedente também em
nosso sistema31.
6.9. Agravo no Superior Tribunal de Justiça
O §3º do artigo 544, do Código de Processo Civil, com
redação dada pela Lei 9.756/98, dispõe que o relator poderá conhecer do agravo
para dar provimento ao recurso especial quando a decisão atacada estiver em
contrariedade com enunciado de Súmula ou jurisprudência dominante do STJ.
Nada impede a admissão do agravo para que se negue provimento ao recurso
especial inadmitido na origem quando a decisão impugnada estiver em
conformidade com enunciado de Súmula ou jurisprudência dominante do tribunal.
________________________________
30 O recurso extraordinário e a demonstração da repercussão geral, p. 187. Cf., ainda, Eduardo de Avelar Lamy, Repercussão geral no recurso extraordinário: a volta da argüição de relevância?, Reforma do Judiciário (obra coletiva), p. 179.31 Cf. Cássio Scarpinella Bueno, Amicus curiae no processo civil brasileiro, p. 629-633.
6.10. Súmulas vinculantes
O instituto da súmula vinculante é multifacetado, de
forma que para sua compreensão é necessário estudos sociológicas históricas e
até mesmo econômicas. A crise pela qual passam as instituições no Brasil tem
fomentado um reformismo pelo poder político. Como resposta à crise do Poder
Judiciário que não tem cumprido a contento sua função de efetiva prestação
jurisdicional desembocou na Reforma do Judiciário, através da Emenda 45,
dentre as muitas alterações trazidas surgiu a súmula vinculante.
Criada com o louvável fundamento de imprimir maior
celeridade e evitar o inchaço do Supremo Tribunal Federal pelas demandas
repetitivas, procrastinatórias e sobre as quais a maciça jurisprudência exauriu
todas as possibilidades, a súmula vinculante emergiu no cenário jurídico nacional
como a uma das soluções para a morosidade, ineficiência e insegurança jurídica.
O novo instituto visou essencialmente atingir a
administração pública como parte processual, pois a maioria dos processos que
tramitam naquele tribunal tem como parte um órgão da Administração Pública
seja como autor ou réu. E a maioria das vezes o administrado foi vencedor na
demanda, mas a Administração Pública continua a recorrer. Sendo a
Administração Pública a grande responsável pelo inchaço dos Tribunais, e como
o intento é agilizar a prestação jurisdicional reduzindo processos, o lógico foi
vincular a própria Administração Pública, e seus órgãos de defesa judicial, para
por fim ao demandismo das fazendas. Não é demais dizer que o efeito
vinculante buscou luzes no sistema norte-americano. Lá, para a funcionalidade
do sistema judicial que também possui salutar morosidade, as decisões da
Suprema Corte Americana gozam de efeito vinculante em relação aos demais
órgãos judiciais, como já visto.
Lembre-se que num sistema em que a lei não é a única
fonte primária do direito, resta clara a necessidade do efeito vinculante das
decisões judiciais32. No entanto, no Brasil, onde a jurisprudência é apenas uma
fonte de apoio e não uma fonte criadora do direito, a adoção de súmulas
vinculantes pode causar duvidas, inconsistências e dificuldades no
funcionamento judicial, o que deve ser sanado com o passar do tempo.
6.11. Reclamação
A reclamação, no direito brasileiro, é de criação
jurisprudencial – pretoriana, baseada na teoria dos poderes implícitos - implied
powers, segundo o qual quando a Constituição traça objetivos e
responsabilidades, ela dá, implicitamente, os meios para alcançá-los.
Entende-se que a competência não expressa dos
tribunais pode ser ampliada por construção interpretativa constitucional. Até
porque, vão seria o poder, outorgado ao Supremo Tribunal Federal de julgar em
recurso extraordinário as causas decididas por outros tribunais, se lhe não fora
possível fazer prevalecer os seus próprios pronunciamentos, acaso desatendidos
pelas justiças locais.
A criação desse remédio de direito para vindicar o
cumprimento fiel das sentenças, está na vocação do Supremo Tribunal Federal e
na amplitude constitucional e natural de seus poderes.
Com o advento da Constituição de 1988, a reclamação
ganhou envergadura constitucional, havendo disposição expressa de sua
utilização diante do STF, artigo 102, I, "l", e do STJ artigo 105, I, "f", ambos da
CF/88, para a preservação de suas respectivas competências e garantia da
autoridade de suas decisões. A previsão legal está disposta na Lei 8.038/90 nos
artigos 13 e 18. A mesma teoria é hoje utilizada para reconhecer o cabimento
deste instituto diante dos tribunais estaduais, tendo em vista que estes tribunais
são os guardiões da supremacia da Constituição do Estado.
________________________________32 SORMANI, Alexandre. Súmula vinculante: dispositivo não suprime liberdade de convicção do juiz. Revista Consultor Jurídico, 16 de março de 2005
A reclamação consiste no meio através do qual se leva
ao tribunal a notícia de usurpação ou invasão de sua competência e, ainda, de
desobediência, praticada por juiz ou tribunal de grau jurisdicional inferior. O STF
tem enfatizado por vezes que a reclamação reveste-se de idoneidade jurídico-
processual, se utilizada com o objetivo de fazer prevalecer à autoridade decisória
de seus julgamentos, notadamente quando impregnados de eficácia vinculante.
Mas para o seu manejo é necessário um processo prévio em que fora proferida a
decisão que se busca garantir. Uma vez admitida na reclamação, o tribunal cuja
autoridade tenha sido violada por decisão inferior condena o ato à ineficácia total,
sem reformá-lo ou anulá-lo, para que outro seja proferido, negando, assim, o
poder daquele órgão que realizou o ato. Fica demonstrado que o vício do ato
reside especificamente na ausência de poder para realizá-lo. Há, contudo grande
divergência quanto à natureza jurídica da reclamação. A primeira corrente tem o
a reclamação como expediente administrativo, devendo de logo ser deixada de
lado, haja vista que o órgão jurisdicional competente afastará a eficácia de ato de
juiz ou tribunal inferior invasivo de sua competência ou em desacordo com
anterior julgamento seu. Esse afastamento se realizará no exercício da jurisdição
e com pretendida eficácia sobre determinado litígio ou relação processual33.
Não há falar também em ação autônoma, haja vista que
não existe discussão de causa com terceiro. Também não é recurso, pois não
obedece ao princípio da taxatividade e não pretende reformar decisão, mas tão-
somente garanti-la. Nem tão pouco configura incidente processual, uma vez que
é manejada, em regra, após decisão final de mérito até antes do trânsito em
julgado.
Alguns entendem que se trata de instrumento de
extração constitucional, destinado a viabilizar a concretização de sua dupla
função de ordem político-jurídica, a preservação da competência e a autoridade
das decisões do Supremo Tribunal Federal, ou seja, é de instrumento sui generis.
_____________________________33 MÓSCA, Hugo. O Supremo Tribunal, ontem e hoje, 2° ed., Brasília: Guarany, 2001, p.130.
Há ainda, quem defenda tratar-se de direito de petição, o
que mais favorável, seja por razões econômicas, seja pela celeridade
processual34.
Importa mencionar a íntima relação entre o efeito
vinculante de decisões proferidas em sede de controle abstrato de normas e a
figura da reclamação, bem como a sua repercussão no âmbito do Pretório
Excelso. Não duvide que tal relação reforça o perfil da Corte como guardiã da
Constituição e dá nova dimensão ao próprio exercício da jurisdição constitucional,
na medida em que possibilita que esta fulmine decisões emanadas de instâncias
inferiores ou, até mesmo, atos de autoridades administrativas. É importante
mecanismo que instrumentaliza a normatividade constitucional e legal em
evidente ganho na coerência e unidade do sistema legal e constitucional, levando
em consideração que cabe reclamação em todos os graus recursais. Importante
dizer que a reclamação abre a possibilidade de os jurisdicionados alcançarem
com maior rapidez a prestação jurisdicional referente a questões já decididas seja
pelo STF, STJ ou por Tribunais locais, e no caso do STF, sem a necessidade de
enfrentar o violento filtro do recurso extraordinário.
Na verdade trata-se de tutela jurisdicional adequada,
tendo como lastro o direito fundamental à razoável duração do processo,
eficiência e efetividade da prestação jurisdicional. Em um primeiro momento o
STF, no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade, não admitia a
reclamação, tendo em vista a inexistência de decisão que demandasse execução
específica. Após mudança de posicionamento, passou o referido tribunal a aceitar
que a reclamação fosse ajuizada pelos legitimados para a propositura de ADI do
artigo 103 da CF/88, excluindo-se as partes envolvidas nos processos em curso,
nos quais se tenha verificado descumprimento de julgado da Corte (Reclamação
397-RJ).
____________________________34 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.112.
O posicionamento da Suprema Corte evoluiu e a partir
de 07/11/2002 (Reclamação 1.880-AgR/SP), passou a admitir como parte
legítima todos aqueles atingidos por decisões contrárias ao entendimento fixado
pelo STF em julgamento de mérito proferido em ADIn35.
Com a EC n. 45/2004, que deu nova redação ao §2º do
art. 102 da CF/88, colocou-se uma pá de cal sobre o assunto, de maneira que se
considera legitimado para o ajuizamento da reclamação àquele particular ou não
que venha a ser afetado, em sua esfera jurídica, por decisões de outros
magistrados ou tribunais que se revelem contrárias ao entendimento fixado, em
caráter vinculante, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos processos
objetivos de controle normativo abstrato instaurado mediante ajuizamento quer
de ação direta de inconstitucionalidade, quer de ação declaratória de
constitucionalidade. Diga - se o mesmo quanto à decisão se insurgir contra
enunciado de súmula vinculante.
O STF reconhece igualmente ao terceiro a qualidade
para agir quando se torne necessário assegurar o efetivo respeito a julgamentos
proferidos em controle normativo abstrato. Assim, confere-se legitimidade ativa -
ad causam ao particular que venha a ser afetado em sua esfera jurídica por
decisões de outros magistrados ou tribunais, ou mesmo por condutas da
administração pública, em todos os níveis, que sejam contrárias ao entendimento
fixado em caráter vinculante pelo STF.
Verifica-se, por conseguinte que o litígio jurídico-
constitucional suscitado em sede de controle abstrato, na perspectiva do pleito
posteriormente formulado, torna possível, no âmbito do processo reclamatório.
Evidencia-se, ainda a possibilidade de manejo da reclamação para a observância
do precedente mesmo quanto ás razões de decidir nas ações objetivas de
controle de constitucionalidade ou em sede de súmula vinculante. De se concluir
que a reclamação constitucional evoluiu e não mais se destina apenas a
assegurar a competência e a autoridade de decisões específicas do STF.
______________________________35 RE 203.859, pág. 19.
A reclamação consagra-se como instrumento voltado à
proteção da ordem constitucional em seu sentido amplo.
A ampla legitimação e o procedimento simples e célere,
como características, qualificam este mecanismo como eficaz protetor da ordem
constitucional, tal como interpretada pelo STF. Ademais, a observância do
entendimento da Suprema Corte, por óbvio, evita o esgotamento do sistema
recursal, tendo em vista que retira os pressupostos de admissibilidade recursais,
bem como novas ações referentes ao controle abstrato de constitucionalidade,
fazendo com que se homenageie o referido princípio. Hoje a reclamação se
consubstancia em poderoso instrumento para fazer valer a autoridade dos
precedentes tanto dos Tribunais Superiores quando dos locais, considerada a
teoria dos poderes implícitos.
6.12. Súmulas administrativas
Alguns órgãos do Poder Executivo firmam seus
entendimentos em enunciados de súmulas administrativas vinculando os demais
órgãos a eles atrelados. O parecer do Advogado Geral da União quando
aprovado pelo Presidente da República e publicado juntamente com o despacho
presidencial adquire caráter normativo e vincula todos os órgãos e entidades da
Administração Federal, que ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento. Já o
parecer não publicado no Diário Oficial da União obriga apenas as repartições
interessadas e os órgãos jurídicos da AGU ou a esta vinculados, a partir do
momento em que dele tenham ciência.
O Mesmo vale para diversos Estados da federação
representados por suas respectivas Procuradorias. A Procuradoria da Receita
Federal do Brasil tem relevante importância a este respeito, pois suas súmulas
são essenciais para orientar os contribuintes, visto que a obediência as súmulas
e pareceres eximem o contribuinte das multas punitivas e de mora.
Como visto esses precedentes administrativos não
deixam de ter sua importância, embora estejam longe de se igualarem aos
benefícios dos emanados pelo Poder Judiciário. Além de servirem de elemento
de convicção do administrador, ou do juiz no caso de pleitos judiciais, vincula os
demais órgãos administrativos daquele Poder. Constituem, por conseguinte um
instrumento relevante para todos àqueles que militam na seara administrativa e
principalmente tributária.
7. PRECEDENTES E O SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS – LEI 12.153/2009
A lei 12.153/2009, além de inovar com a criação dos
juizados especiais no âmbito das Fazendas Públicas, sistematizou os juizados
especiais já existentes - Juizado Especial Federal e Estadual, Cíveis e Criminais.
Esta lei também incorporou em seu texto as mais modernas técnicas de
valorização dos precedentes judiciais em franca utilização pelos tribunais, vale
dizer, os julgamentos por amostragem, que resultam na expedição de acórdãos
paradigmas extensivos. Este instrumento é uma evolução das súmulas e tem
como diferencial a sua rapidez, pois enquanto os enunciados de súmulas podem
demorar anos, os julgamentos por amostragem dependem de uma única decisão.
Outra inovação legislativa na seara dos juizados foi à
adoção expressa pela lei do procedimento de uniformização de jurisprudência e
interpretação de lei sobre direito material. Nada há a impedir que esses novos
instrumentos sejam aplicados aos juizados cíveis e criminais, visto que agora
compõe um sistema.
7.1. Precedentes e a Justiça do Trabalho
Os tribunais especializados da justiça do trabalho
admitem a aplicação subsidiária do CPC. A súmula 421 do TST aplica o artigo
557 do CPC a seus julgados. A própria Consolidação das Leis do Trabalho no
artigo 896, com redação dada pelas Leis 9.756/98 e 9.957/00 e artigo 896-A,
dispondo sobre o recurso de revista, uniformiza interpretação com base nos
precedentes do TST. E exige para o exame da matéria que a divergência entre
os regionais ou suas turmas sejam atuais, ainda não pacificada em enunciado de
súmula. A causa deve oferecer transcendência com relação aos reflexos gerais
de natureza econômica, política, social ou jurídica.
7.2. Regras eficientes para aplicação dos Precedentes
Para melhor eficiência na aplicação prática dos
precedentes deve ser utilizado o método de confronto, aferindo se o caso
concreto - sub judice guardada identidade ou pelo menos semelhança com os
anteriores já decididos. Trata-se da análise dos elementos fáticos e objetivos
caracterizadores da demanda. Na hipótese de aproximação analisa-se a razão de
decidir firmada nas demandas anteriores e, havendo parentesco tipológico,
aplica-se o precedente ou enunciado de súmula. Todavia, se houver distinção
entre o caso concreto e o paradigma não haverá coincidência entre os fatos
discutidos e aqueles que serviram de base à razão de decidir do precedente.
Neste caso deve ser afastada a aplicação do precedente. É claro que dificilmente
haverá absoluta identidade entre as circunstâncias de fato na comparação entre
o caso em julgamento e o paradigma, mais ainda assim é possível que a tese
jurídica extraída do precedente seja aplicada. Existem, pois dois caminhos a ser
seguidos pelo magistrado, a saber: Se entender que as peculiaridades do caso
concreto impedem a aplicação do precedente haverá o julgamento livre de
observância do precedente - restrictive distinguishing. Contudo se entender que,
a despeito das peculiaridades, é possível aplicar o precedente deverá estender a
tese jurídica - ampliative distinguishing37.
Acrescente-se que este expediente deve ser observado
em todos os dispositivos legais que de qualquer forma franqueiam a aplicação
dos precedentes, mesmo em se tratando de enunciados de súmulas, uma vez
que deve ser feito o confronto das situações de fato que caracterizam a situação
concreta com as circunstâncias em que se baseia aquele enunciado.
________________________________36 O princípio da liberdade na prestação jurisdicional, estudo apresentado na VIII Conferência Nacional da OAB, p. 385.37 O recurso extraordinário e a demonstração da repercussão geral, p. 187. Cf., ainda, Eduardo de Avelar Lamy, Repercussão geral no recurso extraordinário: a volta da argüição de relevância?, Reforma do Judiciário (obra coletiva), p. 199.
Situação distinta é o caso da superação da tese -
overruling. Onde o precedente perde o seu caráter persuasivo, sendo substituído
por outro precedente - overruled. Neste caso o juiz ou tribunal adotará nova
orientação abandonando a antiga. A alteração de posicionamento do tribunal
guarda semelhança com a revogação de uma lei por outra lei que trata de
maneira diversa a mesma matéria38. A decisão que implica superação de tese
exige maior carga de motivação, com a utilização de argumentos até então não
suscitados, bem como a justificação da superação. É perceptível que ao se
decidir de maneira diversa do já consolidado deve a Corte agir com elevada
cautela, mormente se não há superação total do precedente, mas apenas parcial,
uma vez que o juiz ou tribunal apenas limitará o âmbito de incidência do
precedente. Isso tem ocorrido no âmbito do STF sempre que ocorre mutação
constitucional, onde o entendimento consolidado com base na interpretação
anterior torna-se superado.
Modernamente, a modificação da doutrina vinculante é
vista como um aprimoramento do pensamento jurídico passado para adequá-lo
ao desenvolvimento social. Dentro dessa ótica, a invalidação parcial ou total de
uma doutrina vinculante é considerada como um instrumento intrasistêmico para
assegurar a necessária flexibilidade ao ordenamento jurídico. Esse fenômeno é
mais recorrente no direito público internacional, onde à doutrina autorizada é
fonte do direito internacional39.
________________________________38 118 MUSCARI, Marco Antônio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 70/71.39 SILVA, Antônio Álvares da. As súmulas de efeito vinculante e a completude do ordenamento jurídico. 1ª ed. São Paulo: Ltr, 2004.
Nas palavras do autor, nota-se que o overruling é salutar
para manutenção do sistema da vinculação dos precedentes, uma vez que, ao
permitir a mudança evita-se a petrificação do direito. Lembra, por conseguinte o
processo de revisão ou cancelamento de "Súmulas vinculantes" artigo 103-A,
§2º, da CR, sem com ele se confundir, pois este último é técnica positivada de
superação de precedentes judiciais. Frise-se que qualquer enunciado de súmula
quando revogado expressamente - express overruling ou tacitamente, quando cai
em desuso - implied overruling, são também variações da citada técnica40. O
confronto do caso fático com o precedente é um exercício que deve ser praticado
por todo operador do direito e não apenas pelo juiz.
Cabe aos advogados demonstrar ao magistrado a
existência e a possibilidade da aplicação do precedente naquele caso, bem como
todos os benefícios processuais que decorrerão da sua aplicação, máxime
quanto a possibilidade de obstrução dos recursos que fatalmente serão
interpostos pela parte sucumbente. O mesmo deve ocorrer em fase recursal,
pois como visto, as maiores aplicações dos precedentes ocorre nesta fase.
Aqui vai um exemplo prático da militância. No município
de Barueri - Estado de São Paulo, os servidores públicos são contemplados no
final do ano com o que se passou a chamar décimo quarto salário. Durante
longos anos a benesse foi concedida sem qualquer restrição a todos os
funcionários e servidores. Por “motivos políticos” a legislação foi profundamente
alterada condicionando e até mesmo em alguns casos suprimindo o direito.
A alteração prejudicial foi questionada em juízo com
base em diversos princípios constitucionais, entre os quais o direito adquirido e a
segurança jurídica.
________________________________40 CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A inconstitucionalidade da súmula de efeito vinculantenoDireitobrasileiro.Disponívelem:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4248>. Acesso em: 25 nov. 2004.
A tese foi acolhida na brilhante sentença exarada pela
digna magistrada da vara fazenda pública daquele município (Processo MS nº
068.01.2008.011669-8. Juíza titular Drª. Nilza Bueno da Silva), que condenou a
municipalidade a pagar os valores correspondentes: Como bem destacado pelo
autor, fere até mesmo o princípio da segurança jurídica uma pessoa prestar
concurso e ingressar no serviço público tendo conhecimento que percebia
vencimentos e vantagens determinadas pela legislação então vigente e, com o
passar dos anos, a Administração alterar, restringir tais direitos ou mesmo
suprimi-los. A Administração pode fazer alterações ou mesmo suprimir
benefícios, mas estas não podem se aplicar a servidores que já ingressaram no
serviço público e estão percebendo tais benefícios. Em nome até da segurança
das instituições é que o ordenamento jurídico protege o direito adquirido, não
permitindo alterações ou supressões de direitos a qualquer momento,
prejudicando servidores ou mesmo empregados no caso do setor privado. Tanto
é certo que os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho têm
na própria C.L.T. tal proteção. Seu artigo 468 dispõe que, nos contratos
individuais de trabalho “só é lícita alteração das respectivas condições por mútuo
consentimento e ainda assim desde que não resultem direta ou indiretamente
prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente dessa
garantia. Não se cuida de alteração de regime jurídico, como quer o requerido,
mas sim de preservação de direito adquirido41.
Como era muito recorrente a perda do benefício e os
valores consideráveis, houve o ajuizamento de diversas ações e por
consequência a evolução da tese. Pesquisando o tema descobriu-se que a tese
estava pacificada no Supremo Tribunal Federal na súmula 207.
A partir de então passou-se a colacionar o enunciado da
súmula na primeira pagina da vestibular, em destaque, alertando o juiz da
existência da súmula impeditiva de recursos voluntários e de oficio.
_________________________________41 Vara da Fazenda Pública de Barueri - MS nº 068.01.2008.011669-8. Juíza titular Drª. Nilza Bueno da Silva.
A nobre juíza, por sua vez, determinou que as sentenças
proferidas em outros processos idênticos fossem juntadas a fim de informar ao
tribunal o seu posicionamento. Não restou outra opção a fazenda senão recuar,
deixando de aplicar á lei retroativamente.
7.3. O Precedente e o dano moral
O Dano Moral, por muito tempo foi motivo de grandes
debates jurídicos, quanto à possibilidade de se obter indenização por lesão ao
seu objeto, qual seja a honra, a dignidade e a integridade psicológica, haja vista
que são bens incorpóreos, abstratos, aos quais não é possível atribuir um valor
exato e aritmético que os defina. Existia uma corrente negativa e outra positiva
quanto à possibilidade jurídica do pedido de indenização por danos morais.
A partir da vigência da Constituição Federal de 1988,
consolidou-se por definitivo, a possibilidade de reparação, com base no art. 5o,
incisos V e X, e no art. 186 e 927, caput, do Código Civil. Hoje os debates
concentram-se na forma de liquidação do dano moral, através de uma avaliação
associada a uma valoração, a qual tem caráter preponderantemente subjetivo,
uma vez que, a legislação pátria é omissa, recaindo sobre os nossos magistrados
a árdua tarefa de quantificarem o valor da indenização, mesmo quando requerido
de forma previamente mensurada pelo lesado42. O magistrado aplica o juris
dictio utilizando do Princípio do Livre Convencimento do Juiz, em prol de uma
justiça segura e equitativa, podendo recorrer à analogia, costumes e princípios
gerais do direito, conforme prevê o artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro. A idéia prevalente do livre arbítrio do Magistrado ganha corpo na
jurisprudência, na medida em que transfere para o juiz o poder de aferir, com o
seu livre convencimento e tirocínio a extensão da lesão e o valor da indenização
correspondente43.
________________________________42 REIS, Clayton. Avaliação do dano moral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.43 VALLER, Wladimir. A Reparação do Dano Moral no Brasil. 1a ed. São Paulo, E.V. Editora Ltda, 1994.
Afinal, é o juiz quem, usando de parâmetros subjetivos,
fixa a pena condenatória de réus processados criminalmente e/ou estabelece o
quantum indenizatório, em condenação de danos ressarcitórios, de natureza
patrimonial.
Frise-se que o quantum indenizatório não pode ser fator
impeditivo do dever de indenizar, porém, não se pode estabelecer um parâmetro
de valoração, somente em benefício da vítima, mas também não somente em
benefício do réu, ou seja, tem que haver a responsabilidade de um em prol da
satisfação do outro, contudo com equilíbrio, através de uma razoabilidade, para
não se incorrer em indenizações exorbitantes e nem ínfimas, com valores
extremamente irreais, através de uma prejudicada condenação. É aqui que entra
a utilização dos precedentes, que muito tem ajudado na formação de um
quantum para indenização do dano moral.
O Superior Tribunal de Justiça tem delimitado os valores
buscando um “meio termo” entre uma justa indenização e o enriquecimento sem
causa. Nesta esteira a utilização dos precedentes além de viabilizar a
qualificação do dano moral afasta o ultra-subjetivismo garantido finalisticamente
uma maior segurança jurídica nessa tormentosa seara44.
O processo, legitimamente relacionado ao poder político
jurisdicional, precisa ser apto a dar a quem tem um direito, na medida do que for
praticamente possível tudo aquilo a que tem direito e precisamente aquilo a quem
tem direito45.
_______________________________44 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes. Judiciário e segurança jurídica: a questão da súmula vinculante. 1ªed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004.45 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 365.
7.4. Tarifação e quantificação do dano moral
Tarifação significa tabelamento dos danos morais, o que
é inconstitucional, mesmo que por lei, por lesão à isonomia, artigo 5º da CF.
Nesse sentido a súmula 281 do STJ, prevê que indenização por danos morais
não está sujeita à tarifação prevista na antiga lei de imprensa.
Já a quantificação significa a necessária busca de um
valor, que deve ser feito em face da natureza insucetível de valoração típica dos
direitos da personalidade.
Os critérios para a quantificação dos danos morais,
segundo o STJ, são os seguintes: extensão do dano – art. 944 CC - (RESP
745.710/RJ - plataforma da Petrobras); grau de culpa dos envolvidos – art. 944
c/c 945 do CC; condições sociais, econômicas, culturais e até psicológicas dos
envolvidos (RESP 686.139/PR) 46. Ainda segundo essa corte, ao mesmo tempo
em que a indenização serve como desestímulo, não pode gerar a ruína do
ofensor nem o enriquecimento sem causa do ofendido, por isso, a indenização
deve ser fixada com prudência pelo magistrado (RESP 773.853/RS)47.
O costume jurisprudencial de fixar a indenização por
danos morais em salários mínimos, conforme orientação da antiga súmula 490 do
STF vem sendo superada pelos tribunais superiores frente a sua
inconstitucionalidade, pela suposta vedação contida no art. 7º, IV da CF.
8. PRECEDENTES E A FAZENDA PÚBLICA.
Sem dúvida onde se dá a maior aplicação dos
precedentes são nas ações em que figuram como autoras ou rés as entidades de
direito público, direta e indireta. Essas entidades sempre foram consideradas as
grandes vilãs pelo abarrotamento do Poder Judiciário em face da interposição
infindável de recursos meramente protelatórios. As fazendas se defendem
alegando ser dever de oficio do Procurador a interposição de recursos.
_________________________________46 RESP 745.710/RJ, pág. 0347 RESP 773.853/RS, pág. 09
Mas com a vinculação da administração pública ás
decisões emanadas pelo STF em ações objetivas de controle de
constitucionalidade – transcendência dos motivos determinantes, e
posteriormente aos enunciados de súmulas vinculantes, surgiu à esperança de
que os próprios autores, e não seus herdeiros recebam os valores preiteados.
Aqui a reclamação ganha especial importância para
forçar o cumprimento do precedente pelas fazendas. Mesmo as súmulas
persuasivas do STF e STJ admitem reclamação como forma de forçar a
administração a se curvar ao precedente. A simplicidade, rapidez, eficácia e
possibilidade de acesso aos tribunais superiores é o diferencial desse
instrumento. Lembre-se que em se tratando de direito previsto na Constituição do
Estado, caberá reclamação para o tribunal local, conforme entendimento
jurisprudencial amplamente admitido.
Mesmo os Fazendas Públicos, podem se utilizar dos
precedentes a seu favor, inclusive em sede de reclamação, bastando que o
entendimento jurisprudencial lhe seja favorável. O juiz, se bem avisado, será o
maior beneficiado ao aplicar os enunciados de súmulas persuasivas, vinculantes
ou até mesmo á transcendência dos motivos determinantes extraídos das ações
objetivas, pois estribado nesses precedentes poderá fazer valer todos os
instrumentos processuais para obstaculizar os recursos fazendários, até mesmo
os de oficio.
Não há duvida de que o juiz de primeiro grau ganhou
enormes poderes, visto que antes a sentença de primeiro grau era tida como
essencialmente precária quando prolatada em face das fazendas públicas. Hoje
se o édito condenatório estiver amparado em súmula de tribunal superior o juiz
poderá obstar o recurso de plano. A Constituição Federal e as leis processuais
estão colocando o Poder Judiciário em posição de cumprir o seu dom supremo
da finalidade, vale dizer, justiça rápida e qualitativa.
É bem verdade que isso não terá efeito concreto se não
houver uma efetiva fiscalização de quanto tempo o juiz está se dedicando a seus
processos, mas neste estudo o que importa é a existência das ferramentas legais
necessárias para alcançar o objetivo.
9. CRÍTICAS AOS EFEITOS VINCULANTRES DOS PRECEDENTES
De extrema importância é o cotejo acerca dos principais
argumentos utilizados, pela doutrina para a defesa e ataque sobre a aplicação e
vinculação dos precedentes. Todavia, em se tratando de direito, os debates
sempre foram benéficos aperfeiçoando as teses e promovendo a evolução desta
intrigante ciência.
9.1. Argumentos contrários.
O primeiro argumento contrário à vinculação dos
precedentes judiciais pelos magistrados e tribunais é de ordem prática. É de
conhecimento de todos que integram a seara jurídica o fato de que a grande
maioria dos juízes possui elevada carga de trabalho. Com a instituição do
Conselho Nacional de Justiça e as várias campanhas de cumprimento de metas
a intensidade do trabalho dos juízes se agigantou. Outro argumento é o déficit da
quantidade de magistrados, diante da demanda da sociedade brasileira, e a
hipertrofia da carga de trabalho destes profissionais tendo como consequência
sua alienação no tocante às decisões proferidas pelos tribunais superiores. Outro
reclame é que a vinculação dos magistrados e tribunais às súmulas vinculantes
engessaria o Poder Judiciário, de sorte a violar o princípio da independência
funcional do magistrado, retirando a possibilidade deste julgar de acordo com a
sua consciência.
Além disso se defende que não há instrumento jurídico
que imponha o comportamento do magistrado em julgar determinado feito em um
ou em outro sentido. O instituto é taxado como de finalidade elitiva, para
concentrar poderes nas cúpulas da estrutura jurídica do país, politizando em
demasia as instáncias jurisdicionais, forçando decisões conservadoras e em
desacordo com o que a sociedade consideraria justo.
No que diz respeito específicamente ao novel instituto da
súmula vinculante, a dotrina diz ser uma caricatura da regra do stare decisis et
quieta muovere do direito anglo-saxônico. Uma importação proveniente de um
sistema jurídico diverso do nosso, cujas bases são opostas e os fundamentos
incompatíveis com a nossa realidade48.
Argumenta-se que o modelo das atuais súmulas
não pode ser o padrão para as súmulas vinculantes trazidas pela Emenda 45,
porque elas são resumos do caso julgado, fornecendo pouco ou quase nada do
que acontecera de fato no processo ou processos que foram objeto de análise
para sumulação. E no sistema anglo-saxão ou common law a vinculação ocorre
pela ratio decidendi, ou seja, os fundamentos da decisão e não seu resultado,
como se pode observar nas súmulas brasileiras. Assim, teria que se mudar o foco
sob o qual se editam as súmulas, de modo a adequá-las para possibilitar
vinculação de julgamentos49.
Se defende também que o direito judicial induzido, pela
adoção da súmula vinculante é incompatível com o direito processual próprio do
sistema romano. No sistema romano ou civil law o juiz julga conforme as leis,
orientado pelo brocardo secundum leges non de legibus, ou seja, julga-se cada
caso de acordo com as leis vigentes e não de acordo com os precedentes, isto
fica ainda mais claro na observáncia do segundo brocardo non exemplis sed
legibus iudicandum sit, a norma no sistema romano é sempre anterior ao decisum
e não o inverso50. E subverter esta ordem é misturar os dois sistemas, cujas
conseqüências, ainda desconhecidas, poderiam nos conduzir a um descrédito no
Judiciário ainda maior por parte da população.
____________________________________48 BARBOSA, José Olindo Gil. A Adoção da Súmula Vinculante no Sistema Judicial Brasileiro. Site do Advogado. Disponível em: < www.advogado.adv.br/artigos/ 2004/joseolindogilbarbosa/adocaosumula.htm >. Acesso em 08 jun. 2005. 49 SANTOS, Cláudio Sinoé Ardenghy dos. A emenda 45 - uma breve análise da coisa julgadaeoutrosaspectos.Disponívelem:<http://www.tex.pro.br/wwwroot/01de2005/aemenda45eacoisajulgada_claudio.htm>. Acesso em 12 jun. 2005.50 SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica e Concretização Judicial. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2000.
Ninguém pode impor ao juiz qualquer orientação sobre
qual deve ser a interpretação mais correta. Aliás, é muito comum que um texto
legal, pela sua literalidade confusa, permita mais de uma interpretação51. De
todas, deve prevalecer a que mais se coaduna com os princípios constitucionais,
sobretudo o da razoabilidade. Mas o juiz sempre tem a liberdade de escolha,
dentre todas as interpretações possíveis .
Como último argumento, dizem que o precedente,
maxime a súmula vinculante, estaria infringindo os limites da coisa julgada
porque estende seus efeitos á terceiros não participantes da demanda.
9.2. Argumentos favoráveis.
Apresentamos agora os necessários contra argumentos
à aplicação e vinculação dos precedentes a qual nos vinculamos. O primeiro leva
em consideração a excessiva carga de trabalho dos magistrados e a decorrente
impossibilidade destes terem conhecimento dos julgados do STF e STJ. De fato,
muitos magistrados encontram-se assoberbados, todavia não se exige que
tenham conhecimento de todos os julgados dos tribunais superiores. O que é
preciso é que o juiz se mantenha informado minimamente dos julgados
emblemáticos desses Tribunais 52. Apesar de se tratar de mais de 5.000 (cinco
mil) entes federativos, o órgão jurisdicional é apenas um.
_______________________________
51 SORMANI, Alexandre. Súmula vinculante: dispositivo não suprime liberdade de convicção do juiz. Revista Consultor Jurídico, 16 de março de 2005.52 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São Paulo: RT, 1997, p. 202 e ss.
Ademais, o mundo globalizado e informatizado de hoje
facilita o acompanhamento das decisões. A internet facilitou muito a vida
profissional dos magistrados, sobretudo para ter acesso aos julgados. É
fundamental o acompanhamento dos precedentes jurisprudenciais,
principalmente considerando sua importância legal e os feitos benéficos da sua
utilização53.
O próprio STF organiza os julgados mais importantes e
envia os informativos via e-mail aos usuários. É claro que em um ou outro caso
pode ser decido de maneira diversa, o que será corrigido pela via recursal. No
entanto, o magistrado não pode, por reiteradas vezes, persistir com o
comportamento insurgente. Trata-se de dever funcional do magistrado conhecer
minimamente a jurisprudência dos Tribunais Superiores e do Tribunal o qual
esteja vinculado sua atividade judicante54.
No que diz respeito à dificuldade de se distinguir a razão
de decidir de uma decisão do precedente paradigma com o caso concreto não
tem qualquer fundamento. Se idêntico ou pelo menos semelhante o caso sub
judice é de ser aplicado o precedente. De se dizer, que com o fluir do tempo e
com a consolidação da utilização dos precedentes, os Tribunais passarão a
delimitar qual a razão de decidir abraçada facilitando a vida funcional do
magistrado. E caso haja impossibilidade de se delimitar a ratio decidendi basta
que não se observe o precedente, pois, em verdade não foi fixado. Isso não retira
a possibilidade da utilização dos precedentes, apenas a excepciona55. Desta
forma, cumpre-se, da mesma forma, uma das finalidades do instituto, qual seja a
segurança jurídica.
Quanto á violação do princípio da independência
funcional do magistrado e o engessamento do Poder Judiciário não passam de
sofismas.
_______________________________53 SILVA, Bruno Mattos e. A súmula vinculante para a administração pública aprovada pela reforma do judiciário, p. 102 e SS.54 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São Paulo: RT, 1997.55 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São Paulo: RT, 1997, p. 207 e ss.
O magistrado, ao ingressar no Poder Judiciário, deve ter
consciência de que ele participa de um todo. Convém abrir um parêntese para
frisar que nos concursos públicos atuais, por vezes, a jurisprudência da Corte
Constitucional possui maior peso que o próprio texto da Constituição. A exigência
de se conhecer os precedentes fixados corrobora a tese acima esposada. Na
verdade quando o juiz integra os quadros do Poder Judiciário ele expressa
anuência de agir em conformidade com o seu órgão de cúpula. Não pode ele
depois se arvorar no direito de agir fundamentado na sua individualidade e
convicção, sob pena de praticar arbitrariedades. Cada indivíduo possui a própria
pré-compreensão de mundo. As questões levadas ao conhecimento do juiz,
mormente as de ordem constitucionais não podem ficar ao seu livre arbítrio,
máxime quando já existe precedente fixado por seu tribunal ou pelas Cortes
Superiores.
Não há falar em "engessamento", uma vez que o
magistrado não deixará de analisar se o caso concreto se subsume ao
precedente – distinguishing. De qualquer modo, o magistrado sempre criará a
norma individual, toda vez que proferir decisão de mérito.
Quanto à inexistência de ferramenta jurídica que
imponha o comportamento do magistrado a julgar determinado feito em um ou
em outro sentido cabe algumas considerações. O princípio da boa-fé processual
dirige-se também ao magistrado. Repita-se, o juiz que, sabidamente, destoa de
interpretação fixada em precedente do seu Tribunal local ou das Cortes
Superiores age com caráter protelatório, uma vez que se destranca a via recursal
até a última instância. Ao não observar a norma de conduta imposta pelo
mencionado princípio o magistrado incorre em ilícito processual. Neste particular,
é interessante observar que o artigo 14 do CPC, que arrola os deveres dos
sujeitos processuais, não encerra rol taxativo. Sendo assim, abre-se a
possibilidade de sanção administrativa ao magistrado que, reiterada e
conscientemente, se insurge contra os precedentes judiciais. Os precedentes
devem ser enaltecidos, principalmente os de natureza constitucional, pois ao
proceder à referida interpretação os Tribunais, em consonância com a força
normativa da constituição, lança mão do princípio da unidade da Constituição de
maneira a interpretar as normas constitucionais como integrantes de um sistema
interno e unitário - princípio do efeito integrador, que dá primazia ao
favorecimento da integração política e social e reforça a unidade política –
princípio máxima efetividade, atribui sentido às normais constitucionais que lhes
empreste maior eficácia - princípio da conformidade funcional, para que não se
subverta ou perturbe o esquema organizatório-funcional constitucionalmente
estabelecido - princípio da concordância prática, impossibilita o sacrifício de um
bem constitucionalmente protegido em detrimento da afirmação de outro e por
derradeiro, princípio da interpretação para que diante de normas infralegais
polissêmicas dê prevalência à interpretação compatível com a constituição.
Além do mais, é inegável que os magistrados que
judicam nos tribunais, sobretudo os superiores possuem maior conhecimento
jurídico e maior experiência, o que enseja maior qualidade nas suas decisões,
reforçando a necessidade destas serem observadas nos seus diversos aspectos.
Em regra quando os processos chegam á apreciação dos Tribunais Superiores já
houve intenso debate fático e jurídico o que facilita a análise e o aperfeiçoamento
da decisão.
Finalmente, antes de tecer qualquer crítica a respeito da
observância e vinculação dos precedentes judiciais é necessário despir o espírito
encarar o precedente como um aliado na consecução da rápida prestação
jurisdicional. Com isso se verá que a sua efetiva utilização não constitui um
atentando a liberdade ou convicção do juiz, mas uma homenagem, visto que os
julgamentos por amostragem, as súmulas persuasivas e vinculantes ou mesmo
os precedentes estricto sensu - vinculação a razão de decidir nas ações objetivas
em controle concentrado de constitucionalidade, são decisões provindas de
membros do próprio Judiciário. Muitos desses precedentes nasceram de décadas
de debates jurídicos, aperfeiçoando-se ao longo dos tempos, fruto de incontável
estudo e horas de reflexão, dedicação e árduo trabalho. Ignorar esse acervo de
conhecimento científico, é mais do que um desrespeito, é negar a própria
existência da Instituição.
Como se nota a própria origem do direito trás em suas
entranhas o precedente, ele existente mesmo antes da criação da Casa de
Suplicações hoje denominada Supremo Tribunal Federal.
Qualquer que seja a indeterminabilidade dos princípios
jurídicos, isso não significa que eles sejam impredictíveis. Os princípios não
permitem opções livres aos órgãos ou agentes concretizadores da Lei Maior
(impredictibilidade dos princípios); permitem, sim, projeções ou irradiações
normativas com um certo grau de discricionaridade (indeterminabilidade), mas
sempre limitadas pela juridicidade objetiva dos princípios. Como diz Dworkin,
citado por Canotilho, o direito – e, desde logo, o direito constitucional – descobre-
se, mas não se inventa56.
Finalmente, sob á exige de uma Republica Social
Democrática de Direito nenhuma liberdade é plena. A dos Juízes, como todas as
demais, também não é. É preciso ficar bem claro que até a vinculação o Juiz tem
plena liberdade para decidir e, depois dela, é também por um ato de liberdade
que se submete à uniformização da qual ele próprio faz parte. Assim a limitação
provém do exercício de um ato de liberdade devidamente legitimada.
Por fim, não há como negar a forte tendência, já
existente, de que os magistrados acompanhem os entendimentos sumulados. É
natural que os entendimentos se solidifiquem diante de vários casos, de forma
que os precedentes sempre tiveram um papel relevante no direito brasileiro e
servem de orientação para magistrados, promotores, procuradores e advogados
sobre o que tem sido o pensamento judicial a respeito dos temas e nunca foi
óbce para o pensamento jurídico.
_______________________________56 J.J. GOMES CANOTILHO (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6ª ed. Editora Almedina: São Paulo, 1997, p. 1169).
10. Importância dos precedentes
A jurisdição é uma função criativa. O magistrado não é
mais apenas a boca da lei, como definiu Montesquieu no seu Espírito das Leis57.
As normas positivadas, inclusive a Constituição, não determinam completamente
as decisões dos tribunais.
Existe um longo espaço que se mete entre a
generalidade da norma e a concretude da sua aplicação, cabe ao juiz estabelecer
um confronto entre aquilo que foi positivado e o que aconteceu concretamente.
Houvesse uma cristalização, de maneira que os atos
sociais fossem sempre os mesmos, a tarefa do magistrado se tornaria bem mais
simples, aplicando sempre a mesma fórmula, para chegar um mesmo e exato
resultado. Os imprevisíveis fatores psicológicos, tecnológicos, históricos e sócio-
culturais demandam esta atuação criativa jurisdicional.
Na verdade assim como a arte é a proa da vida, pois vai
onde a vida não pode ir, a vida estará sempre à frente do direito. A lei, principal
manifestação do direito, é inerte, incapaz de acompanhar o dinamismo da vida.
A vida, por seu turno, não obedece qualquer regra, simplesmente se dá, e o
direito vem na retaguarda tentando regrar suas manifestações. Isso traduz a
impossibilidade de os problemas da vida ser resolvidos apenas com uma
operação dedutiva - geral-particular, principalmente quando o julgador se depara
com situações nas quais os textos jurídicos existentes não apresentam soluções
claras.
Pelo princípio da proibição do non liquet, os magistrados
têm o dever constitucional de decidir artigo 5º, inciso XXXV, da CF/8858. Quando
os tribunais decidem, buscam fixar um entendimento mais adequado possível
ante da Constituição e as leis, portanto cria norma.
______________________________57 SILVA, Evando Lins e. Crime de hermenêutica e súmula vinculante. Disponível em: campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m05-011.htm. Acesso em 08 jun. 2010. 58 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo: Saraiva, 1990.
Esta norma judicada, que encontra fundamentação no
decisium contém uma característica que a distingue das demais normas
legisladas, qual seja a possibilidade de se tornar indiscutível pela coisa julgada
material59. Trata-se do precedente judicial, ou seja, parâmetro que deve ser
seguido, e neste contexto, por indução, cria-se a regra geral a ser observada. É
de fundamental importância a vinculação da interpretação extraída das reiteradas
decisões proferidas pelos tribunais, principalmente do STF, órgão que detém a
última palavra no tocante à exegese constitucional 102, caput, da CF/88.
Conclui-se que a não observância do entendimento
fixado pelo Tribunal Constitucional debilita sobremaneira o princípio da força
normativa da constituição, pois quando o tribunal constitucional decide um
problema constitucional concreto, a sua interpretação se projeta por todo o
ordenamento jurídico de maneira a orientá-lo. Não fosse assim, haveria o
enfraquecimento da constituição, com o enfraquecimento de sua força normativa,
e violação de seus princípios basilares, quais sejam a igualdade e a segurança
jurídica.
11. A SEGURANÇA JURÍDICA E OS PRECEDENTES
A despeito do princípio da segurança jurídica, não se
pode olvidar que é corolário do Estado Democrático de Direito, insculpido no
artigo 1º da CF/88. Visa proteger e preservar as justas expectativas das pessoas,
de sorte a evitar possíveis arbitrariedades do Estado.
A partir deste princípio veda-se a adoção de medidas
judiciais capazes de frustrar a confiança depositada no Poder Judiciário. Com
efeito, o jurisdicionado, de boa-fé, possui legitimas expectativas - princípio da
não-surpresa, diante de reiteradas decisões tomadas em um mesmo sentido.
___________________________59 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 1999.
Beira ao absurdo o jurisdicionado ser parte em lide cujo
entendimento constitucional do magistrado de primeira instância destoa do
Tribunal Constitucional. Devido à elevada carga axiológica deste princípio até
mesmo o STF, ao alterar o seu posicionamento - overruling age com muita
cautela, por vezes, modulando os efeitos de suas decisões, decidindo, por
exemplo, pro futuro60. O princípio ora referido possui estreita ligação com o
princípio da igualdade artigo 5º, caput, da CF/88. Ele não se restringe à igualdade
jurisdicional, devendo ser observado, inclusive, pela administração pública. Fica
claro que a não vinculação dos precedentes pode ensejar injustiças.
O intérprete / autoridade pública não poderá aplicar as
leis e atos normativos aos casos concretos de forma a criar ou aumentar
desigualdades arbitrárias. Ressalte-se que, em especial o Poder Judiciário, no
exercício de sua função jurisdicional de dizer o direito ao caso concreto, deverá
utilizar os mecanismos constitucionais no sentido de dar uma interpretação única
e igualitária às normas jurídicas61.
Esta foi a mens legislatoris do constituinte ao prever o
recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, uniformização na
interpretação da Constituição Federal e o recurso especial ao Superior Tribunal
de Justiça, uniformização na interpretação da legislação federal. Sempre em
respeito ao princípio da igualdade, a legislação processual deve estabelecer
mecanismos de uniformização de jurisprudência de todos os Tribunais.
_________________________________ 60 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.61 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito. São Paulo: RT, 2004.
Acrescente-se que os princípios acima descritos
relacionam-se, de maneira íntima, com o princípio da unidade da Constituição,
que tem como função interpretar as normas constitucionais como integrantes de
um sistema unitário e com o princípio da máxima efetividade, que visa a atribuir
maior eficácia às normas constitucionais, pelos motivos já expendidos.
Neste contexto insere-se o direito fundamental ao devido
processo legal que está previsto no artigo 5º, inciso LIV, da CF/88. Trata-se de
princípio base do processo, sob o qual todos os demais se sustentam. Em seu
aspecto substantivo - substantive due process, insere-se a necessidade de a
decisão judicial ser substancialmente razoável62.
A insegurança diante do Poder Judiciário, que soluciona
cada lide de maneira diversa, a depender do julgador, e o enorme prazo de
tramitação processual reforçam o desestímulo e insegurança, tanto pelo
jurisdicionado como pelo administrado. Fica claro que a administração pública
também deve se orientar e até mesmo se vincular às razões de decidir dos
precedentes do Pretório Excelso, máxime no tocante às declarações de
inconstitucionalidade e súmulas vinculantes.
O princípio da boa-fé processual, que impõe aos sujeitos
do processo a necessidade de se comportarem de acordo com a boa-fé,
diferentemente do que pensa parcela da doutrina, não se restringe às partes.
Incide sobre todos aqueles que de qualquer forma participem da relação
processual, incluindo o órgão jurisdicional. Nesta lógica, a decisão de magistrado
que, sabidamente, destoa de interpretação constitucional fixada em precedente
de tribunal superior possui manifesto caráter protelatório, conquanto abre a via
recursal até a última instância. Acrescente-se que este princípio é norma de
conduta, ou seja, impõe conduta processual ao magistrado e administradores,
que se não observá-la incorre em ilícito processual.
_____________________________________62 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.
12. Outras ferramentas
Como um dos escopos desse trabalho é trazer a lume os
benefícios legais da correta utilização dos precedentes e a celeridade processual
hodiernamente é a mais importante desses benefícios, entendemos ser
pertinente ao menos mencionar algumas ferramentas legais, que se bem
manejadas contribuirá para esse efeito.
Primeiramente os operadores do direito devem estar
atentos as leis que tem como fim concretizar a rápida solução dos litígios, seja
fundada em aspectos subjetivos, como o Estatuto do Idoso; Lei do Deficiente
Físico, Estatuto da Criança e Adolescente; ou aspectos objetivos, Juizado
Especial Cível e Criminal; Juizado Especial Federal; Juizado Especial das
Fazendas Públicas etc.
A atenção do operador do direito deve se voltar também
aos ritos próprios de cada ação, sumários; sumaríssimo, bem como de
instrumentos processuais que a depender do caso concreto levará a um rápido
julgamento, como o julgamento antecipado da lide; execuções de pequeno valor
entre outras.
Enfim, para cada pleito o advogado deve utilizar as
ferramentas existentes que levará a uma solução rápida do direito de seu cliente,
pois isso o definirá como bom ou mau profissional.
CONCLUSÃO
O sistema jurídico brasileiro evoluiu, mesmo em não se
tratando de questões constitucionais, para um modelo que valoriza e vinculação
dos precedentes judiciais, seja por meio dos preceitos genérico-abstratos dos
enunciados de súmulas, seja por intermédio da comparação analógico-concreta
dos precedentes judiciais propriamente ditos. Além dos diversos dispositivos
inseridos na legislação processual conforme demonstrado, a proliferação
excessiva de enunciados de Súmulas persuasivos e vinculantes também é prova
deste fenômeno, demonstrando que hoje a jurisprudência é alçada à fonte de
Direito. Esta evolução decorreu da necessidade de se descongestionar a via
judicial tendo em vista o número excessivo de recursos previstos na legislação
brasileira, característica marcadamente originária do modelo romano-germânico -
aliada à falta de estrutura do Poder Judiciário e a pouca dedicação dos juízes ao
processo. O objetivo é dar racionalidade orgânica e eficiência à instituição
judiciária, de maneira a incentivar o acesso a uma justiça econômica, qualitativa e
razoavelmente célere. Desta forma, devem ser tutelados os diversos direitos
fundamentais, entre os quais a prestação judicial adequada, que decorre do
devido processo legal, a igualdade e a segurança jurídica.
No tocante ao direito Constitucional a evolução teve
especiais contornos o que acabou se transmitindo á todos os ramos do direito
com base numa interpretação conforme. Todos os segmentos do direito devem
ser interpretados sob a égide da Lei Máxima e o órgão jurisdicional detentor do
monopólio da exegese constitucional é o STF. E restringir a incidência do
entendimento fixado por este tribunal é atentar contra a própria Constituição. A
não vinculação a razão de decidir e aos enunciados de súmulas vinculantes
consagradas pela Corte Suprema equivale tornar inútil a força normativa da
Constituição Federal. A debilidade subsistirá mesmo diante da ratificação do
precedente após o esgotamento da via recursal. E mais, a não aplicação dos
precedentes aliado a multiplicação desmedida de processos prejudica
sobremaneira o prazo para a consecução da tutela constitucional gerando o
descrédito ao judiciário.
Em suma, o papel dos precedentes é o resguardo da
segurança jurídica e da igualdade, de maneira a eliminar as antinomias
normativas e a preservar a coerência e harmonia do sistema jurídico. Como
sabemos o poder político nem sempre age imbuído do senso republicano,
expedindo, por reiteradas vezes, atos normativos sabidamente violadores da Lei
e da Constituição Federal, o que impõe uma resposta rápida e segura pelo
Judiciário que é a última ratio na fiscalização dos atos deste poder.
Hoje é inconcebível pensar em segurança jurídica,
celeridade e eficiência sem levar em conta a existência e aplicação dos
precedentes e todos os consectários da sua correta utilização. O juiz, o promotor,
o advogado, enfim todos os operadores do direito que não se valem dessas
ferramentas no exercício prático funcional jamais será um colaborador para o
alcance daqueles escopos. No que toca a Advocatícia, o manejo dos
precedentes, máxime as súmulas persuasivas e vinculantes, tornam-se ainda
mais importante. É que a rapidez com que o advogado resolve os problemas
trazidos por seus clientes indicará sua qualidade profissional. Não é nenhum
exagero dizer que tão importante quanto vencer uma demanda é fazer com que
isso ocorra rapidamente, pois um problema solucionado extemporaneamente é
problema não solucionado. Em resumo a valorização e efetiva utilização de
todos os instrumentos legais que os precedentes oferecem, faz parte do presente
é do futuro dos operadores do direito. Somos os principais responsáveis pela
efetivação desses instrumentos, visto que o Poder Legislativo fez sua parte.
Todos os operados do direito, quando procurarem a
tutela jurisdicional deve ter ciência de que: “a justiça não é um legado apenas do
Poder Judiciário, mas de todos os Poderes e órgão da nossa Republica
Democrática de Direito.
Compete ao Poder Legislativo fazer as leis e fiscalizar a
administração da coisa pública pelo Executivo, com justiça; compete ao Poder
Executivo executar as leis e administrar a coisa pública, com justiça; compete ao
Poder Judiciário dizer o direito, com justiça; compete ainda, ao Promotor de
Justiça como órgão de execução do Ministério Público, ao Advogado como órgão
executor da Advocacia brasileira, aos Delegados de Polícia como órgão do
Executivo; e a todo cidadão, praticar atos orientados pela justiça e boa fé”. Desta
forma, e apenas desta forma, o Judiciário estará livre para se debruçar sobre
causas complexas e realmente relevantes, dignas de movimentar a máquina
estatal.
REFERÊNCIAS
1 DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Tradução
Hermínio A. Carvalho. 3ªed., São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 14.
2 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário.1ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2002, p. 9.
3 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário.1ª ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2002, p. 9.
4 SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma nova
aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 99.
5 SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma nova
aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 98.
6 STRECK, Lenio Luiz. Súmulas no Direito Brasileiro: eficácia, poder e função: a
ilegitimidade constitucional do efeito vinculante. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 1998, p. 234.
7 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. O efeito vinculante e os poderes do juiz. São Paulo:
Saraiva, 1999, p. 10.
8 Apud SOUZA, Carlos Aureliano Motta de. O papel constitucional do STF: uma
nova aproximação sobre o efeito vinculante. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p.
103.
9 ROCHA, Lincoln Magalhães da. Direito Sumular. Rio de Janeiro: Shogun Arte,
1983, p. 47.
10 LIMA, Leonardo D. Moreira. Stare decisis e súmula vinculante: um estudo
comparado.disponívelem:<http://www.pucrio.br/sobrepuc/depto/direito/revista/
online/rev14_leonardo.html#_ftn10>. Acesso em 04 jun.2005.
11 BALSALOBRE, André de Barros. A súmula vinculante como instrumento de
uniformização da jurisprudência. Revista do Tribunal Regional Federal, 1ª Região,
Agosto, v.14, n.8, 2002, p. 19/20.
12 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes. Judiciário e segurança jurídica: a
questão da súmula vinculante. 1ªed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004, p.
32.
13 A argüição de relevância no recurso extraordinário, 1988. Para uma análise
mais aprofundada do instituto, consulte-se, ainda, N. Doreste Baptista, Da
argüição de relevância no recurso extraordinário, 1976.
14 José Miguel Garcia Medida, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruda Alvim
Wambier, Repercussão geral e súmula vinculante, Reforma do Judiciário (obra
coletiva), p. 374.
15 V., nesse sentido, Barbosa Moreira, A redação da Emenda Constitucional n. 45
(reforma da justiça), Revista Forense, v. 378, 2005, p. 44.
16 Reforma do Judiciário no Brasil pós-88, p. 104.
17 ROCHA, Lincoln Magalhães da. Direito Sumular. Rio de Janeiro: Shogun Arte,
1983, p. 58.
18 SILVA, José Anchieta da. A súmula de efeito vinculante amplo no direito
brasileiro: um problema e não uma solução. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p.
65/66.
19 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência Jurisprudencial e Súmula
Vinculante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 165.
20 JAMBO, Paloma Wolfenson. O poder vinculante das súmulas e a
impossibilidade da identificação estreitadas causas submetidas à Justiça.
Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6961>. Acesso em:
04 jul. 2005.
21 http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/default.asp.
22 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência Jurisprudencial e Súmula
Vinculante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 174.
23 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Controle de constitucionalidade. 5.
ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
24 MUSCARI, Marco Antônio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 1999, p.36.
25 CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A inconstitucionalidade da súmula de efeito
vinculantenoDireitobrasileiro.disponívelem:http://www1.jus.com.br/doutrina/
texto.asp?id=4248>. Acesso em: 25 nov. 2004.
26 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no
direito brasileiro. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
27 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009.
28 A motivação das decisões judiciais como garantia inerente ao Estado de
Direito, Revista brasileira de direito processual, v. 16, 1978, p. 115.
29 Cf. Cássio Scarpinella Bueno, Amicus curiae no processo civil brasileiro, p.
626-627.
30 O recurso extraordinário e a demonstração da repercussão geral, p. 187. Cf.,
ainda, Eduardo de Avelar Lamy, Repercussão geral no recurso extraordinário: a
volta da argüição de relevância?, Reforma do Judiciário (obra coletiva), p. 179.
31 Cf. Cássio Scarpinella Bueno, Amicus curiae no processo civil brasileiro, p. 629-633.
32 SORMANI, Alexandre. Súmula vinculante: dispositivo não suprime liberdade
de convicção do juiz. Revista Consultor Jurídico, 16 de março de 2005.
33 MÓSCA, Hugo. O Supremo Tribunal, ontem e hoje, 2° ed., Brasília: Guarany,
2001, p.130.
34 COSTA, Sílvio Nazareno. Súmula vinculante e reforma do judiciário. 1ª ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2002, p.112.
35 RE 203.859, pág. 19.
36 O princípio da liberdade na prestação jurisdicional, estudo apresentado na VIII
Conferência Nacional da OAB, p. 385.
37 O recurso extraordinário e a demonstração da repercussão geral, p. 187. Cf.,
ainda, Eduardo de Avelar Lamy, Repercussão geral no recurso extraordinário: a
volta da argüição de relevância?, Reforma do Judiciário (obra coletiva), p. 199.
38 118 MUSCARI, Marco Antônio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 1999, p. 70/71.
39 SILVA, Antônio Álvares da. As súmulas de efeito vinculante e a completude do
ordenamento jurídico. 1ª ed. São Paulo: Ltr, 2004.
40 CHIARINI JÚNIOR, Enéas Castilho. A inconstitucionalidade da súmula de efeito
vinculantenoDireitobrasileiro.Disponívelem:<http://www1.jus.com.br/doutrina/
texto.asp?id=4248>. Acesso em: 25 nov. 2004.
41 Vara da Fazenda Pública de Barueri - MS nº 068.01.2008.011669-8. Juíza
titular Drª. Nilza Bueno da Silva.
42 REIS, Clayton. Avaliação do dano moral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
43 VALLER, Wladimir. A Reparação do Dano Moral no Brasil. 1a ed. São Paulo,
E.V. Editora Ltda, 1994.
44 TOSTES, Natacha Nascimento Gomes. Judiciário e segurança jurídica: a
questão da súmula vinculante. 1ªed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004.
45 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do Processo. São Paulo:
Malheiros, 2002, p. 365.
46 RESP 745.710/RJ, pág. 03
47 RESP 773.853/RS, pág. 09
48 BARBOSA, José Olindo Gil. A Adoção da Súmula Vinculante no Sistema
Judicial Brasileiro. Site do Advogado. Disponível em: <
www.advogado.adv.br/artigos/ 2004/joseolindogilbarbosa/adocaosumula.htm >.
Acesso em 08 jun. 2005.
49 SANTOS, Cláudio Sinoé Ardenghy dos. A emenda 45 - uma breve análise da
coisajulgadaeoutrosaspectos.Disponívelem:<http://www.tex.pro.br/wwwroot/
01de2005/aemenda45eacoisajulgada_claudio.htm>. Acesso em 12 jun. 2005.
50 SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica e Concretização Judicial.
Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2000.
51 SORMANI, Alexandre. Súmula vinculante: dispositivo não suprime liberdade
de convicção do juiz. Revista Consultor Jurídico, 16 de março de 2005.
52 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São
Paulo: RT, 1997, p. 202 e ss.
53 SILVA, Bruno Mattos e. A súmula vinculante para a administração pública
aprovada pela reforma do judiciário, p. 102 e SS.
54 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São
Paulo: RT, 1997.
55 GOMES, Luiz Flávio. A dimensão da magistratura no Estado de Direito. São
Paulo: RT, 1997, p. 207 e ss.
56 J.J. GOMES CANOTILHO (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6ª
ed. Editora Almedina: São Paulo, 1997, p. 1169).
57 SILVA, Evando Lins e. Crime de hermenêutica e súmula vinculante. Disponível
em: campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m05-011.htm. Acesso em 08 jun.
2010.
58 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos
e políticos. São Paulo: Saraiva, 1990.
59 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16. ed. rev. e
atual. São Paulo: Malheiros, 1999.
60 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
61 TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do Direito. São
Paulo: RT, 2004.
62 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.